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Revista LiteraLivre - 6ª edição

6ª Edição da Revista LiteraLivre, uma revista virtual e ecológica, criada para unir autores que escrevem em Língua Portuguesa em todo o mundo. 6nd Edition of LiteraLivre Magazine, a virtual and ecological magazine, created to bring together authors who write in Portuguese throughout the world. Http://cultissimo.wixsite.com/revistaliteralivre/comoparticipar

6ª Edição da Revista LiteraLivre, uma revista virtual e ecológica, criada para unir autores que escrevem em Língua Portuguesa em todo o mundo. 6nd Edition of LiteraLivre Magazine, a virtual and ecological magazine, created to bring together authors who write in Portuguese throughout the world. Http://cultissimo.wixsite.com/revistaliteralivre/comoparticipar

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<strong>LiteraLivre</strong> nº 6 – novembro de 2017<br />

nos separava da rua.<br />

Um tapa na mesa. Rouco e cavernoso. E o silêncio, enfim.<br />

Chega! O diretor queria o fim do berratório. Que me calasse como<br />

sempre. Que mastigasse e engolisse a inquietude que me devorava. Não mais!<br />

Repetiu o diretor, bruto como meus gritos. Berrei de novo. Para irritar os<br />

ouvidos e atordoar de vez. Eu encarava o diretor de boca aberta e beiços<br />

largos, numa gritaria estridente sem fim.<br />

A batida oca foi mais um tapa. Seguido do corpo erguido do diretor e a<br />

ordem repetitiva. Chega! Chega! Chega! E gritou também. Estendendo a<br />

última sílaba num longo rangido de fúria, mas também de desespero. O<br />

descontrole assusta. E ficamos os dois ganindo, frente a frente, enlouquecendo<br />

os que apenas aguardavam o fim de mais uma reunião. Os que ansiavam pelas<br />

conversas no café. Pelas piadas do fim de semana, pelas risadas sobre o happy<br />

hour da sexta anterior. Os jogos de futebol. A tentativa de convencer o outro<br />

de que haviam vivido. De que o sábado e o domingo não haviam sido em vão.<br />

De que a longa espera pela sexta-feira havia valido a pena. Mas quem vive de<br />

verdade?<br />

Atordoada, a supervisora foi a primeira a tapar as orelhas. Largou a<br />

caneta e abraçou a surdez, com as mãos na cabeça. O estagiário, tímido,<br />

preferiu os dedos indicadores. A gerente deixou fugir um riso acuado. O<br />

superintendente resistia a pegar o celular. Um vídeo, ou apenas um áudio.<br />

Seria a glória! O rei dos grupos de Whatsapp. Sem registro ninguém<br />

acreditaria. A reunião de segunda havia se transformado em La Salpêtrière.<br />

Trégua. Estanquei o berro. O diretor também. Paz. Calma. Busquei o ar<br />

abafado da sala lotada e tomei um novo fôlego. Devolvi o vento num som<br />

agudo, gritado ainda mais alto. CHEGA! E o diretor me acompanhou de novo,<br />

alargando a última sílaba com os olhos rachados em veias vermelhas. Uma<br />

sinfonia rosnada camuflada de balbúrdia.<br />

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