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ANO X • Nº 105 • OUTUBRO DE 2018 • R$ 10<br />
E C O N O M I A | P O L Í T I C A | E S P O R T E S | H U M O R | C U LT U R A<br />
ZEMA:<br />
O NOVO,<br />
A SURPRESA<br />
DE ONDE MENOS<br />
SE ESPERAVA, UMA<br />
GIGANTESCA ONDA<br />
DE VOTOS LEVA O<br />
EMPRESÁRIO<br />
ROMEU ZEMA À<br />
LIDERANÇA<br />
ABSOLUTA NA<br />
DISPUTA PELO<br />
GOVERNO DE MINAS. A<br />
MESMA INUNDAÇÃO<br />
SURPREENDENTE<br />
DEVOLVE DILMA ROUSSEFF<br />
AO RIO GRANDE DO SUL,<br />
SEM GLÓRIAS.<br />
PAULO BRANT VAI CONVIDAR O EX-PREFEITO MÁRCIO LACERDA PARA SUA POSSE<br />
NOMES & NOTAS - PÁGINA 11
6 20 24<br />
OPINIÃO<br />
SOBERBA DOS DIRIGENTES DO<br />
PT CRIOU JAIR BOLSONARO,<br />
REVELA FILÓSOFO BERTOCHE<br />
São muitas as explicações para<br />
o surgimento do fenômeno Jair<br />
Bolsonaro, um obscuro deputado<br />
que pode chegar à Presidência<br />
da República. O pensador<br />
Gustavo Bertoche diz que se<br />
trata de criação indesejada do<br />
seu próprio rival, o PT.<br />
REPORTAGEM DE CAPA<br />
DE ONDE MENOS SE ESPERAVA<br />
SURGIU ROMEU ZEMA, QUE<br />
PODE SER ELEITO GOVERNADOR<br />
Dois dias antes das eleições, o<br />
empresário Romeu Zema parecia<br />
cumprir o apagado destino de<br />
candidato desconhecido apresentado<br />
por partido estreante. Em<br />
outras palavras, iria desaparecer<br />
na apuração dos votos para a<br />
eleição ao governo de Minas. Mas<br />
ocorreu o contrário: ele expulsou<br />
Pimentel do segundo turno e desponta<br />
como favorito para ocupar<br />
o Palácio da Liberdade.<br />
CARTA DO PLANALTO<br />
HÁ MUITOS GENERAIS, MAS<br />
APENAS DOIS CAPITÃES<br />
CHEGARAM AO TOPO NO PAÍS<br />
A história registra os nomes de<br />
muitos marechais e generais que<br />
chegaram ao topo da política<br />
brasileiras, a começar por Deodoro<br />
da Fonseca, que proclamou<br />
a República. Mas fala em apenas<br />
dois capitães que se tornaram<br />
famosos. São eles: Luís Carlos<br />
Prestes (foto), o líder da Coluna<br />
Prestes e Jair Bolsonaro, o candidato<br />
à presidência da República.<br />
ANO X - Nº 105 - OUTUBRO DE 2018<br />
ÍNDICE<br />
CARTA DE LISBOA 30<br />
CARTA DO SERTÃO 32<br />
CARTA DO CANADÁ 34<br />
MEU EMPREGO 36<br />
AQUI ENTRE NÓS 40<br />
ERA SÓ O QUE FALTAVA 46<br />
PALAVRA DO LEITOR 52
42 48 50<br />
A CONDIÇÃO HUMANA<br />
FALAR MAL DOS OUTROS PELAS<br />
COSTAS É UM MODO DE CUIDAR<br />
DA PRÓPRIA SAÚDE<br />
A moral e os bons costumes<br />
condenam o caráter daqueles<br />
que aproveitam a ausência dos<br />
amigos para falar mal deles,<br />
pelas costas. A ciência acaba de<br />
revelar que a sentença é injusta:<br />
o comentário pouco lisonjeiro e,<br />
quase sempre, a grossa mentira<br />
contra terceiros, são ações fundamentais<br />
para se manter a própria<br />
saúde em prefeito<br />
funcionamento.<br />
DEIXARAM-NOS<br />
CHARLES AZNAVOUR SE VAI,<br />
MAS PERMANECE NO CORAÇÃO<br />
DE TODOS OS MINEIROS<br />
A revista <strong>Matéria</strong><strong>Prima</strong> cuida dos<br />
mineiros e daqueles que contribuem<br />
para a felicidade e bem<br />
estar do povo montanhês. Foi o<br />
caso do eterno cantor Charles<br />
Aznavour, sempre presente nos<br />
momentos de maior aflição dos<br />
nossos corações apaixonados.<br />
HORA EXTRA<br />
PARÉS, O CHARGISTA QUE<br />
IRONIZA O ABSURDO QUE É A<br />
VIDA AQUI NA TERRA<br />
Fomos a Buenos Aires buscar o<br />
chargista argentino Diego Parés,<br />
48 anos, um demolidor de verdades<br />
absolutas, sobretudo as<br />
transcendentais, por meio de seu<br />
traço divertido e quase sempre<br />
ingênuo. Embora desconhecido<br />
no Brasil, é um dos mais respeitados<br />
artistas gráficos do seu<br />
país. Selecionamos alguns desenhos<br />
hilariantes pra você.<br />
E C O N O M I A |P O L Í T I C A |E S P O R T E S |H U M O R |C U L T U R A<br />
EXPEDIENTE<br />
Márcio Rubens Prado (IN MEMORIAM)<br />
31 2534-0600<br />
MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR<br />
durvalcg@yahoo.com.br<br />
DIRETOR RESPONSÁVEL E EDITOR GERAL:<br />
Durval Guimarães<br />
EDITOR DE TEXTO: Carlos Alenquer<br />
PROGRAMAÇÃO VISUAL: Antônio Campos<br />
IMAGENS:<br />
Creative Commons OCO<br />
COLABORADORES:<br />
ADALBERTO FERRAZ; ALBERTO SENA;<br />
ARTHUR VIANNA; CATARINA<br />
BALLESTEROS; DULCE NETO; IVANI<br />
CUNHA; JOÃO PAULO COLTRANE; JOSÉ<br />
ANTÔNIO SEVERO; SANDRO FIORANI;<br />
ROMERSON CANGUSSU; SYMPRHRONIO<br />
VEIGA; TIÃOZITO.<br />
REDAÇÃO, ADMINISTRAÇÃO E PUBLICIDADE: Rua Canopus, 11 • Sala 5 • São Bento • CEP 30360-112 • Belo Horizonte • MG
OPINIÃO<br />
BOLSONARO É UM<br />
PRODUTO DOS IMENSOS<br />
ERROS DA ESQUERDA<br />
GUSTAVO BERTOCHE (*)<br />
De onde surgiu o Bolsonaro?MMMM<br />
NDes culpem os amigos, mas não é<br />
de um “machismo”, de uma “homofobia”<br />
ou de um “racismo” do brasileiro.<br />
A imensa maioria dos eleitores do<br />
candidato do PSL não é machista, racista,<br />
homofóbica nem defende a tortura. A<br />
maioria deles nem mesmo é bolsonarista.<br />
O Bolsonaro surgiu daqui mesmo, do<br />
campo das esquerdas. Surgiu da nossa incapacidade<br />
de fazer a necessária autocrítica.<br />
Surgiu da recusa em conversar com<br />
o outro lado. Surgiu da insistência na ação<br />
estratégica em detrimento da ação comunicativa,<br />
o que nos levou a demonizar,<br />
sem tentar compreender,<br />
os que<br />
pensam e sentem de<br />
modo diferente.<br />
É, inclusive, o que<br />
estamos fazendo ago -<br />
ra. O meu Facebook<br />
e o meu WhatsApp<br />
estão cheios de ataques<br />
aos “fascistas”,<br />
àqueles que têm<br />
“mãos cheias de sangue”,<br />
que são “machistas”,<br />
“homofóbicos”,<br />
“racistas”. Só<br />
que o eleitor médio<br />
do Bolsonaro não é<br />
PT FINANCIOU<br />
METRÔ DA<br />
VENEZUELA<br />
nada disso nem se identifica com essas<br />
pechas. As mulheres votaram mais no<br />
Bolsonaro do que no Haddad. Os negros<br />
votaram mais no Bolsonaro do que no<br />
Haddad. Uma quantidade enorme de gays<br />
votou no Bolsonaro.<br />
Amigos, estamos errando o alvo. O problema<br />
não é o eleitor do Bolsonaro. Somos<br />
nós, do grande campo das esquerdas.<br />
O eleitor não votou no Bolsonaro POR-<br />
QUE ele disse coisas detestáveis. Ele votou<br />
no Bolsonaro APESAR disso.<br />
O voto no Bolsonaro, não nos iludamos,<br />
não foi o voto na direita: foi o voto anti-esquerda,<br />
foi o voto anti-sistema, foi o voto anti-<br />
6<br />
OUTUBRO DE 2018 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
ESTÁ HAVENDO UMA ONDA BOLSONARO, MAS PODERIA SER UMA ONDA DE<br />
QUALQUER OUTRO CANDIDATO ANTI-PT. EU SUSPEITO QUE O BOLSONARO SÓ<br />
SURFA NESSA ONDA SOZINHO PORQUE É O MAIS ANTIPETISTA DE TODOS<br />
corrupção. Na cabeça de muita gente (aqui<br />
e nos EUA, nas últimas eleições), o sistema,<br />
a corrupção e a esquerda estão ligados. O<br />
voto deles aqui foi o mesmo voto que elegeu<br />
o Trump lá. E os pecados da esquerda de lá<br />
são os pecados da esquerda daqui.<br />
O Bolsonaro teve os votos que teve porque<br />
nós evitamos, a todo custo, olhar para<br />
os nossos erros e mudar a forma de fazer<br />
política. Ficamos presos a nomes intocáveis,<br />
mesmo quando demonstraram sua<br />
falibilidade. Adotamos o método mais podre<br />
de conquistar maioria no congresso e<br />
nas assembleias legislativas, por termos<br />
preferido o poder à virtude. Corrompemos<br />
os veículos de mídia com anúncios de empresas<br />
estatais até o ponto em que eles<br />
passaram a depender do Estado. E expulsamos,<br />
ou levamos ao ostracismo, todas<br />
as vozes críticas dentro da esquerda.<br />
O que fizemos com o Cristóvão Buarque?<br />
O que fizemos com o Gabeira? O que<br />
DILMA INAUGURA<br />
MARIEL, O PORTO CUBANO<br />
fizemos com a Marina? O que fizemos<br />
com o Hélio Bicudo? O que fizemos com<br />
tantos outros menores do que eles?<br />
Os que não concordavam com a nossa<br />
vaca sagrada, os que criticavam os métodos<br />
das cúpulas partidárias, foram calados<br />
ou tiveram que abandonar a esquerda<br />
para continuar tendo voz.<br />
Enquanto isso, enganávamo-nos com os<br />
sucessos eleitorais, e nos tornamos um<br />
movimento da elite política. Perdemos a<br />
capacidade de nos comunicar com o povo,<br />
com as classes médias, com o cidadão<br />
que trabalha 10h por dia, e passamos a<br />
nos iludir com a crença na ideia de que<br />
toda mobilização popular deve ser estruturada<br />
de cima para baixo.<br />
A própria decisão de lançar o Lula e o<br />
Haddad como candidatos mostra que não<br />
aprendemos nada com nossos erros - ou,<br />
o que é pior, que nem percebemos que estamos<br />
errando, e colocamos a culpa nos<br />
outros. Onde estão as<br />
convenções partidárias<br />
lindas dos anos<br />
80? Onde estão as<br />
correntes e tendências<br />
lançando contrap<br />
r é - ca n d i d a tos?<br />
Onde estão os debates<br />
internos? Quando<br />
foi que o partido passou<br />
a ter um dono?<br />
Em suma: as esquerdas<br />
envelheceram,<br />
enriqueceram e<br />
se esqueceram de<br />
suas origens.<br />
z<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 7
MST E SEUS<br />
MILITANTES<br />
ARMADOS E<br />
VIOLENTOS<br />
O que nos restou foi a criação de slogans<br />
que repetimos e repetimos até que<br />
passamos a acreditar neles. Só que esses<br />
slogans não pegam no povo, porque não<br />
correspondem ao que o povo vivencia.<br />
Não adianta chamar o eleitor do Bolsonaro<br />
de racista, quando esse eleitor é negro<br />
e decidiu que não vota nunca mais no<br />
PT. Não adianta falar que mulher não vota<br />
no Bolsonaro para a mulher que decidiu<br />
não votar no PT de jeito nenhum.<br />
Não, amigos, o Brasil não tem 47% de<br />
machistas, homofóbicos e racistas. Nós<br />
chamarmos os eleitores do Bolsonaro<br />
disso tudo não vai resolver nada, porque<br />
o xingamento não vai pegar. O eleitor médio<br />
do cara não é nada disso. Ele só não<br />
quer mais que o país seja governado por<br />
um partido que tem um dono.<br />
E não, não está havendo uma disputa<br />
entre barbárie e civilização. O bárbaro<br />
não disputa eleições.<br />
(Ah, o Hitler disputou<br />
etc. Você já leu o<br />
Mein Kampf? Eu já.<br />
Está tudo lá, já em<br />
1925. Desculpe, ami -<br />
go, mas piadas e frases<br />
imbecis NÃO<br />
SÃO o Mein Kampf.<br />
Onde está a sua capacidade<br />
hermenêutica?).<br />
Está havendo uma<br />
onda Bolsonaro, mas<br />
poderia ser uma<br />
onda de qualquer outro<br />
candidato anti-PT.<br />
Eu suspeito que o<br />
Bolsonaro só surfa<br />
nessa onda sozinho<br />
porque é o mais antipetista<br />
de todos.<br />
E a culpa dessa<br />
onda ter surgido é nossa, exclusivamente<br />
nossa. Não somente é nossa, como continuará<br />
sendo até que consigamos fazer<br />
uma verdadeira autocrítica e trazer de<br />
volta para nosso campo (e para os nossos<br />
partidos) uma prática verdadeiramente<br />
democrática, que é algo que perdemos há<br />
mais de vinte anos. Falamos tanto na defesa<br />
da democracia, mas não praticamos<br />
a democracia em nossa própria casa. Será<br />
que nós esquecemos o seu significado e<br />
transformamos também a democracia em<br />
um mero slogan político, em que o que é<br />
nosso é automaticamente democrático e<br />
o que é do outro é automaticamente fascista?<br />
É hora de utilizar menos as vísceras e<br />
mais o cérebro, amigos. E slogans falam<br />
à bile, não à razão.<br />
(*) Gustavo Bertoche é filósofo<br />
8<br />
OUTUBRO DE 2018 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
NOMES & NOTAS<br />
PAULO BRANT DEVE LEVAR<br />
MÁRCIO LACERDA À SUA POSSE<br />
NO PALÁCIO DA LIBERDADE<br />
Numa demonstração de que não é<br />
pessoa de guardar mágoas ou<br />
ressentimentos, o ex-diretor do<br />
Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais,<br />
Paulo Brant, pretende convidar o exprefeito<br />
Márcio Lacerda, de Belo Horizonte,<br />
para sua posse como<br />
vice-governador de Minas, caso seja<br />
eleito na chapa do empresário Romeu<br />
Zema. A informação é de amigos próximos<br />
ao candidato.<br />
Há dois anos, Brant viveu uma das situações<br />
mais humilhantes que um cidadão<br />
pode enfrentar, quando foi desconvidado<br />
por Márcio Lacerda (então no PSB)<br />
para disputar a prefeitura de Belo Horizonte.<br />
Poucos conhecem o fato, que foi<br />
descrito, na época, com muito constrangimento<br />
por Brant: “Eu acabara de me<br />
despedir dos meu colegas da indústria<br />
Cenibra, para me dedicar à campanha,<br />
quando fui abordado por três assessores<br />
do Márcio, para me informar que não era<br />
mais o candidato do partido dele”.<br />
Os assessores citados eram gente de<br />
terceiro escalão e o comunicado ocorreu<br />
minutos depois que Brant renunciou ao<br />
emprego de presidente da empresa, que<br />
LIVRE DA PRISÃO E DA<br />
TORNOZELEIRA,KÁTIA<br />
RABELO RETOMA O<br />
CONVÍVIO SOCIAL<br />
Um ano depois de autorizada a cumprir<br />
o restante da sua pena em liberdade<br />
condicional, a ex-presidente<br />
do extinto Banco Rural, Kátia<br />
Rabello retomou sua vida em sociedade.<br />
Ela foi uma das convidadas de honra do<br />
esplêndido concerto com os pianistas<br />
João Carlos Martins e Arthur Moreira<br />
Lima, realizado na imponente sede da locadora<br />
de automóveis Localiza, recente-<br />
mente inaugurado em Belo Horizonte.<br />
Participaram do evento, ocorrido na<br />
noite de 24 de setembro, cerca de 200<br />
convidados. Poucos perceberam a sua presença.<br />
Discreta como o seu elegante vestido<br />
preto, a ex-banqueira estava acompanhada<br />
do namorado, que substitui o<br />
ex-marido, o pianista José Namen.<br />
Com o nome “4 Mãos e Infinitos Corações”,<br />
o espetáculo foi promovido pela associação<br />
educativa sem fins lucrativos, Junior<br />
Achievement Minas Gerais. O valor<br />
arrecadado não foi informado e será revertido<br />
para a instituição de benemerência,<br />
cujo objetivo é despertar o espírito empreendedor<br />
nos jovens de escolas públicas.<br />
Kátia Rabelo cumpre pena em liberdade<br />
10<br />
OUTUBRO DE 2018 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
MÁRCIO LACERDA E PAULO BRANT PODERÃO FESTEJAR, NOVAMENTE, NA POSSE<br />
é produtora de celulose, com salário de<br />
R$ 100 mil mensais. O pior, no entanto,<br />
foi dito em seguida: o prefeito tomara a<br />
decisão de desconvidar o seu candidato,<br />
diante de suspeitas de que Brant teria<br />
participado de desvios de recursos públicos<br />
no BDMG.<br />
As denúncias jamais foram comprovadas<br />
e a vida seguiu em<br />
frente. O novo candidato<br />
de Lacerda, que era o<br />
seu vice-prefeito Délio<br />
Malheiros, ficou em<br />
quinto lugar na disputa,<br />
com apenas 5% dos votos<br />
e nem foi para o segundo<br />
turno. Há dois<br />
meses, Lacerda não conseguiu<br />
se registrar como<br />
candidato do PSB ao governo<br />
de Minas e perdeu<br />
sua influência na política.<br />
Brant assumiu importante<br />
cargo na diretoria da Federação<br />
das Indústrias de Minas Gerais e, há<br />
poucos meses, foi convidado para ser o<br />
vice-governador na chapa de Romeu<br />
Zema, o candidato mais votado na disputa<br />
com o senador Antônio Anastasia<br />
para o governo de Minas. Agora, em 28<br />
de outubro, será batido o martelo.<br />
condicional desde setembro do ano passado<br />
por sentença do ministro Luís Roberto<br />
Barroso, do STF. Ela fora condenada a 14<br />
anos e cinco meses de prisão por lavagem<br />
de dinheiro, evasão de divisas e gestão<br />
fraudulenta de instituição financeira.<br />
Katia começou a cumprir a pena em novembro<br />
de 2013, progrediu para o semiaberto<br />
(no qual somente dorme na prisão)<br />
em dezembro de 2015 e passou para o regime<br />
aberto (onde cumpre pena fora da<br />
prisão) em novembro do ano passado.<br />
Na liberdade condicional, o condenado<br />
continua em liberdade até o final de sua<br />
pena, que pode ser extinta posteriormente<br />
se não voltar a cometer crimes e caso se<br />
apresente regularmente à Justiça.<br />
A EX-BANQUEIRA<br />
KÁTIA RABELLO<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 11
OS IMPOSSÍVEIS PALANQUES<br />
NO 2º TURNO<br />
Dilma Rousseff no palanque tucano<br />
em MG? Parece fake, mas poderia<br />
acontecer. A situação em Minas Gerais<br />
está tão confusa que qualquer dia<br />
pode ser possível ver a ex-presidente pedindo<br />
votos para seu arquirrival, Antônio<br />
Anastasia, em nome da luta contra o<br />
anunciado fascismo do capitão Jair Bolsonaro.<br />
Difícil, mas não impossível.<br />
Em troca de um apoio tucano a Fernando<br />
Haddad, Dilma e o governador Fernando<br />
Pimentel poderiam, ambos fora do<br />
jogo, eventualmente, numa composição<br />
de segundo turno, formar ao lado dos tucanos.<br />
E assim, se veria uma cena surrealista:<br />
a ex-presidente ao lado do carrasco<br />
que puxou a corda da forca? Por isso não<br />
é descartado que a ex-presidente, em<br />
nome de um apoio a Fernando Haddad tenha<br />
de engolir esse sapo. Esse seria um<br />
exemplo de como um acerto regional<br />
pode levar a circunstâncias incríveis.<br />
O cenário: o candidato tucano Antônio<br />
Anastasia não é uma figura intragável<br />
para o petista médio. Ele é originário do<br />
núcleo ideológico do PSDB fernandista (e<br />
covista), com um pé na esquerda, que<br />
bem poderá ter o apoio do PT se em troca<br />
levar votos a Fernando Haddad e se contribuir<br />
à derrota de Jair Bolsonaro em Minas<br />
Gerais. E, como bem sabem os derrotados<br />
do passado, quem vence em Minas<br />
ganha a eleição no Brasil. Muita coisa<br />
ainda vai acontecer até 28 de outubro.<br />
O PT não pode nem deve se fiar em todos<br />
os resultados do primeiro turno. Uma<br />
dessa áreas de desconfiança é contar com<br />
votação maciça no Nordeste. Muita coisa<br />
pode mudar por ali. Os pragmáticos políticos<br />
da região são useiros de movimentos<br />
surpreendentes.<br />
Eleitos com apoio de Lula, muitos governadores<br />
e senadores nordestinos vencedores<br />
em 7 de outubro também podem<br />
mudar de lado. Esta é a dúvida, pois um<br />
grande eleitor de Fernando Haddad no primeiro<br />
turno foi o MDB nordestino. Isto<br />
muda a correlação de forças.<br />
Esta é uma lógica da política brasileira:<br />
governos regionais, dependentes do poder<br />
central, não costumam ir além de certo<br />
ponto no seu antagonismo com o Palácio<br />
do Governo nacional. Portanto, é de se esperar<br />
que os reeleitos e os novos mandatários<br />
nordestinos não petistas (como Renan<br />
Calheiros, em Alagoas, ou, no Norte,<br />
Jader Barbalho, em Belém) mudem de<br />
lado, se a recandidatura Haddad derreter,<br />
pois apoiar um candidato derrotado, que<br />
sequer é de seu partido, não é norma naquela<br />
região nem prática de suas raposas.<br />
Com isto, as contas devem ser refeitas.<br />
A verdade é que candidatos adversários<br />
do PT, eleitos ou disputando em segundo<br />
turno, já estão vislumbrando a<br />
seca que os aguarda já nos primeiros<br />
dias de mandato. O candidato Jair Bolsonaro<br />
não escondeu sua disposição. Disse<br />
que com todas as letras, na TV e na mídia,<br />
para quem quisesse ouvir: governadores<br />
de oposição darão com a cara na<br />
porta do Palácio do Planalto. Podem tirar<br />
o cavalo da chuva. Ou melhor, podem<br />
deixar o equino se molhando porque não<br />
terão colher de chá. Vida dura. (José Antônio<br />
Severo)<br />
12<br />
OUTUBRO DE 2018 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
AÉCIO PEDIU AJUDA À LEGENDA PARA SE<br />
ELEGER: NÃO TEVE VOTOS SUFICIENTES<br />
Segundo o Tribunal Regional Eleitoral-<br />
MG, eram necessários 190 mil<br />
votos para se eleger ao cargo de<br />
deputado Federal por Minas Gerais. O<br />
senador Aécio Neves obteve apenas 106<br />
mil e no entanto foi incluído na relação<br />
dos vitoriosos. Isso deve à ajuda dos votos<br />
recebidos por candidatos menos votados<br />
do seu partido. É o chamado voto<br />
de legenda. A votação do ex-governador<br />
mineiro por duas vezes foi raquítica<br />
quando comparada com os 5,4 milhões<br />
recebidos na disputa contra Dilma Rousseff,<br />
em 2014. A votação do governador<br />
Fernando Pimentel, candidato à reeleição<br />
e da ex-presidente Dilma Rousseff,<br />
pretendente ao Senado, não foi menos<br />
decepcionante.<br />
ANASTASIA, AÉCIO<br />
E DILMA: ACORDO<br />
À VISTA<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 13
FECOMÉRCIO-MG<br />
APOIA DOIS<br />
CANDIDATOS.<br />
COM O MESMO<br />
FERVOR CÍVICO<br />
Omissa no primeiro turno das<br />
eleições ao governo de Minas,<br />
quando os principais<br />
concorrentes pareciam ser o tucano<br />
Antônio Anastasia e o petista Fernando<br />
Pimentel, a Federação do Comércio<br />
de Minas Gerais parece que<br />
se envergonhou desse silêncio obsequioso.<br />
Então, em nota distribuída à<br />
imprensa, logo após os resultados<br />
de sete de outubro, a diretoria da<br />
entidade se apressou em informar<br />
que apoiará vigorosamente os dois<br />
competidores, Anastasia e Zema.<br />
Como a nota não é assinada por<br />
ninguém, o leitor fica sem saber<br />
quem são os corajosos signatários<br />
da manifestação. Oficialmente o<br />
presidente interino da entidade é<br />
Lúcio Emílio de Faria Júnior, mas a<br />
eleição realizada recentemente foi<br />
anulada pela Justiça do Trabalho. A<br />
Fecomércio-MG, que é contemplada<br />
com quase R$ 1 bilhão pelo<br />
governo federal, anualmente, por<br />
meio do Sesc e Senac, frequenta<br />
com mais assiduidade as páginas<br />
do noticiário jurídico-policial na imprensa<br />
que as da editoria de economia.<br />
Em tempo: a entidade não<br />
era obrigada a se posicionar eleitoralmente.<br />
OS HOMENS<br />
COM MENOS<br />
DE 30 ANOS<br />
SÃO A<br />
MAIORIA DAS<br />
VÍTIMAS<br />
DO SELFIE<br />
Entre outubro de 2011 e novembro<br />
de 2017 morreram 259 pessoas<br />
em todo o mundo enquanto tiravam<br />
selfies. A conclusão foi do All India<br />
Institute of Medical Sciences, num artigo<br />
publicado pelo Journal of Family.<br />
A Índia é o país que lidera a tabela<br />
com mais vítimas mortais, totalizando<br />
159 pessoas. A Rússia, os Estados Unidos<br />
e o Paquistão dão sequência à lista.<br />
Não há estatísticas sobre esse tipo de<br />
óbito no Brasil mas não nos faltam distraídos<br />
capaz de cometê-los.<br />
A maior parte das vítimas eram homens<br />
(perto dos 72%), com idades su-<br />
14<br />
OUTUBRO DE 2018 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
periores aos 30 anos. São eles os que<br />
mais riscos correm para captar a selfie<br />
perfeita, apesar de serem as mulheres<br />
quem tire mais fotografias deste gênero.<br />
A principal causa de mortes é o afogamento,<br />
sendo que muitas das vítimas<br />
são arrastadas nas praias ou caem de<br />
barcos. Fotografias em frente a composições<br />
ferroviárias em movimento, por<br />
exemplo, estão incluídas na causa descrita<br />
como “transporte” que é a segunda<br />
causa de morte mais recorrente<br />
identificada pelo estudo. As quedas de<br />
montanhas e os incêndios são a terceira<br />
causa de morte mais comum.<br />
As mortes em selfies com armas de<br />
fogo, que incluem disparos acidentais<br />
contra si próprios, lideram o número de<br />
mortes nos Estados Unidos, ao contrário<br />
do que se vê noutros países.<br />
No entanto, estes números correspondem<br />
a valores mais baixos do que<br />
os reais, uma vez que as selfies não<br />
são citadas em várias certidões de<br />
óbito. Um exemplo é quando uma pessoa<br />
morre na sequência de um acidente<br />
de carro por estar tirarando uma<br />
selfie. Este fato faz com que o número<br />
real de vítimas mortais de selfies seja<br />
ainda maior.<br />
SEMPRE ALGUÉM<br />
SE DESPENCANDO<br />
POR CAUSA DE<br />
UMA FOTO<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 15
19 PERGUNTAS QUE DEIXAM<br />
QUALQUER CANDIDATO<br />
A EMPREGO MALUCO<br />
Para reduzir os riscos de contratar<br />
as pessoas erradas, as empresas<br />
praticamente abandonaram as perguntas<br />
óbvias das entrevistas de emprego<br />
e testam os candidatos com questões<br />
do arco da velha. Veja a lista de<br />
perguntas mais usadas por empresas<br />
aqui em Belo Horizonte.<br />
Algumas são quase bizarras e a<br />
grande conclusão é que não vale a pena<br />
levar respostas decoradas. O ideal é refletir<br />
sobre a sua trajetória e motivações e ir<br />
preparado para encontrar as melhores<br />
respostas para as piores perguntas. Vejam<br />
abaixo o que listamos.<br />
1 - O que o faz feliz quando trabalha<br />
numa sexta-feira à noite?<br />
2 - Como colocaria uma girafa dentro de<br />
congelador da sua geladeira?<br />
3 - O que menos espera deste emprego?<br />
4 - Se fosse o presidente do Banco HSBC<br />
qual seria a sua estratégia perante a<br />
crise brasileira?<br />
5 - Se tivesse de levar um amigo em estado<br />
grave para um hospital, conduziria<br />
em alta velocidade e passaria sinais<br />
vermelhos?<br />
6 - Preferiria lutar com um pato do tamanho<br />
de um cavalo ou com cem cavalos<br />
do tamanho de um pato?<br />
7 - Fale sobre uma situação em que tenha<br />
falhado?<br />
8 - Quais são as três palavras que os<br />
seus pais usariam para o descrever?<br />
9 - Como é que você saiu de uma situação<br />
difícil no passado?<br />
10 - Por que razão 99% não é suficientemente<br />
bom?<br />
11 - De quantas formas conseguiria encontrar<br />
uma agulha num palheiro?<br />
12 - Como explicaria o Facebook à sua<br />
avó?<br />
13 - Se entrasse numa sala cheia de pessoas<br />
com interesses diferentes, o<br />
que faria?<br />
14 - Que critério usaria para avaliar o seu<br />
próprio desempenho?<br />
15 - Qual é a principal razão que o faz<br />
saltar da cama todas as manhãs?<br />
16 - Qual foi a decisão mais difícil que<br />
teve de tomar nos últimos 12 meses?<br />
17 - Dê um exemplo dos seus níveis mais<br />
elevados de persistência.”<br />
18 - Numa luta entre um tigre e um leão,<br />
que é que vence? Por quê?<br />
19 - Como acha que os seus subordinados<br />
o descreveriam?<br />
A vida é dura, moçada. Mas para facilitar<br />
sua aprovação no emprego, num dos momentos<br />
de convescote cá na redação<br />
(atualmente de 15h30m às 15h45m, devido<br />
à crise), ajudamos com as seguintes<br />
respostas para cada uma das perguntas.<br />
(Nota da Redação: mas não garantimos<br />
que elas sejam o que os entrevistadores<br />
desejam ouvir.)<br />
1 - Trabalhar sexta à noite não me faz fe-<br />
16<br />
OUTUBRO DE 2018 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
liz em nenhuma circunstância.<br />
2 - Partiria a girafa em 100 pedaços. O<br />
pescoço, jogaria pela janela.<br />
3 - O que menos espero deste emprego é<br />
que ele me faça trabalhar no fim de<br />
semana.<br />
4 - Não me preocuparia. Aliás, nenhum<br />
presidente de banco se preocupa com<br />
isso.<br />
5 - Avançaria sinais e até atropelaria<br />
quem estivesse pela frente. Claro.<br />
6 - Preferiria lutar com 100 patos do tamanho<br />
de uma barata.<br />
7- Falhei ao chamar uma garota pruma<br />
volta sem olhar antes o tamanho de<br />
seu namorado.<br />
8 - As três palavras com as quais meus<br />
pais usam até hoje para me descrever<br />
são quatro: incrível, fantástico, jamais<br />
ousado!<br />
9 - Me livrei da situação difícil saindo<br />
pela porta dos fundos.<br />
10 - Você acha mesmo que<br />
99% não é suficientemente<br />
bom? De onde<br />
você tirou isso?<br />
11 - Para achar uma agulha<br />
no palheiro, só tocando<br />
fogo no feno; o que sobrar,<br />
vermelhinho, é a<br />
agulha.<br />
12 - Não há como explicar o<br />
Facebook à minha avó.<br />
Ela navega melhor do<br />
que eu.<br />
13 - Se eu entrasse numa<br />
sala cheia de pessoas<br />
com interesses diferentes,<br />
procuraria o grupo<br />
que está conversando sobre<br />
sexo.<br />
14 - Não usaria nenhum critério<br />
para avaliar meu<br />
próprio desempenho:<br />
sou bom demais pra me preocupar<br />
com isso.<br />
15 - A principal razão que me faz saltar<br />
da cama todas as manhãs: saber<br />
que logo à noitinha tem happy hour.<br />
16 - A decisão mais difícil dos últimos 12<br />
meses: explicar pra minha mulher<br />
que a Fulana e eu somos apenas<br />
bons amigos.<br />
17 - Meu nível mais elevado de persistência:<br />
esperar na fila do Jângal, ali no<br />
Carmo, pra ficar lá dentro sem poder<br />
conversar por causa do barulho.<br />
18 - Numa luta entre um tigre e um leão<br />
não vou ficar esperando pra ver<br />
quem vence. Por quê? Não sou<br />
bobo.<br />
19 - Minhas subordinadas me descreveriam<br />
como o chefe mais amoroso,<br />
sensível e atencioso que já tiveram.<br />
Quanto aos subordinados, não me<br />
interessa.<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 17
ATÉ OS NOVILHOS<br />
SÃO ARRASTADOS<br />
PARA FORA DO<br />
MERCADO DE<br />
TRABALHO NA<br />
ESPANHA<br />
A CRISE É BRAVA:<br />
ATÉ OS TOUROS ESTÃO<br />
PERDENDO EMPREGO<br />
NAS TOURADAS<br />
A CRISE ESPANHOLA NÃO PERDOA NINGUÉM: NEM MESMO<br />
QUEM JÁ ESTAVA A CAMINHO DOS AÇOUGUES DE MADRID<br />
Há dez anos, quando cheguei à Espanha,<br />
fui conduzido a um cubículo<br />
do aeroporto de Barajas, que mais<br />
parecia uma lata de sardinha. Era assim<br />
que eles tratavam os brasileiros. Mas os<br />
tempos mudam. Nas últimas semanas fui<br />
abordado várias vezes por jovens que-<br />
rendo ser adotados por brasileiros. Segundo<br />
eles informam, a lei brasileira permite<br />
a adoção de estrangeiros, com idade<br />
inferior a 24 anos. Perguntam até quanto<br />
eu cobraria pela adoção fraudulenta.<br />
Situação pior aqui em Madrid é a de<br />
quem não pode sequer sonhar com<br />
18<br />
OUTUBRO DE 2018 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
essa maracutaia. É o caso dos touros,<br />
personagens das famosas touradas espanholas.<br />
Por conta do desemprego,<br />
ninguém mais compra ingressos para<br />
esse espetáculo sangrento e emocionante.<br />
A televisão pública também está<br />
impedida de transmitir as touradas e<br />
em muitas regiões, como a Catalunha,<br />
elas simplesmente foram proibidas, em<br />
nome da sustentabilidade, da proteção<br />
dos animais ou de qualquer invencionice<br />
dos ambientalistas. O certo é que,<br />
desde 2007, o número de touradas caiu<br />
em pelo menos 50% nas regiões em<br />
que ainda são permitidas. A cadeia produtiva<br />
das touradas envolve 200 mil<br />
pessoas e se considerarmos a produção<br />
dos touros, sua movimentação anual de<br />
recursos é de 2,5 bilhões de euros,<br />
anuais. Em Barcelona os espetáculos<br />
são considerados contravenções como<br />
o nosso jogo de bicho, só que mais difícil<br />
de praticar.<br />
Nada resiste a essa constelação de<br />
adversidade, que inclui o aumento dos<br />
impostos. Os preços dos ingressos variam<br />
de US$ 5 a US$ 80, semelhante<br />
aos valores cobrados dos torcedores de<br />
futebol na nossa Arena Independência.<br />
O governo leva 25% da renda. Lamentavelmente,<br />
a causa pior do desastre é<br />
atribuída à falta de emoção e a previsibilidade<br />
do resultado, no qual a vitória<br />
quase sempre é do toureiro. Há teóricos<br />
que defendem a adoção de medidas que<br />
tornem essa luta menos desigual. Por<br />
exemplo: touros e toureios não poderiam<br />
portar armas. Seja qual for a decisão,<br />
não é brilhante também o futuro<br />
dos 712 toureiros matadores inscritos na<br />
liga espanhola. A tourada é uma arte,<br />
como o cinema e o teatro, só que na<br />
arena se morre de verdade. (Lauro Cunha-Lemos,<br />
de Madrid)<br />
A VIDA DE CASADO<br />
É MUITO BOA. SÓ<br />
PERDE PARA A<br />
VIDA DE SOLTEIRO<br />
Estudo publicado no periódico<br />
científico Journal of Social and<br />
Personal Relationships (Jornal<br />
de Relações Pessoais e Sociais, em<br />
tradução livre), indica que as pessoas<br />
que se mantêm solteiras estão<br />
positivamente mais relacionados e<br />
ligadas com quem os rodeia e são<br />
mais solidárias com pais, irmãos, vizinhos<br />
e amigos.<br />
Além disso, o estudo revela ainda<br />
que estar solteiro aumenta o círculo<br />
social, tanto dos homens como das<br />
mulheres: tendência que prevalece<br />
mesmo quando se tem em conta outras<br />
elementos estruturais dos relacionamentos<br />
sociais.<br />
Recentemente, durante uma palestra,<br />
a psicóloga e também cientista<br />
norte-americana Bella DePaulo<br />
confirmou o acerto desse estudo ao<br />
informar que a sociedade em geral<br />
tem tendência a desvalorizar as vidas,<br />
as relações e as histórias das<br />
pessoas que são solteiras: “Geralmente,<br />
damos prioridade às narrativas<br />
românticas dos indivíduos casados,<br />
queremos saber como se<br />
conheceram, quantos filhos têm etc.,<br />
comparativamente à trajetória de<br />
vida de quem escolheu permanecer<br />
independente”.<br />
A psicóloga explicou ainda que a<br />
maioria das pessoas que se casam,<br />
não vive “feliz para sempre”.<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 19
REPORTAGEM DE CAPA<br />
QUEM SERÁ O NOVO<br />
GOVERNADOR?<br />
‘PERGUNTA<br />
NO POSTO ZEMA’<br />
DE NOME DE POSTO DE GASOLINA A FENÔMENO<br />
ELEITORAL, ZEMA ESTÁ A UM PASSO DE VIRAR<br />
GOVERNADOR DE MINAS DE MANEIRA INÉDITA.<br />
ORION TEIXEIRA *<br />
Bastaram alguns minutos de exposição<br />
de tempo de televisão, que lhe<br />
foi negado durante toda a campanha,<br />
e uma senha afinada com a onda<br />
conservadora para que o empresário Romeu<br />
Zema, filiado ao Partido Novo, fosse<br />
catapultado dos magros 5% a 10% que lhe<br />
davam as pesquisas para líder isolado das<br />
urnas do dia 7 de outubro na eleição para<br />
governador de Minas.<br />
Acostumado a conquistas que fizeram<br />
dele um empresário vitorioso, o desconhecido<br />
Zema (já chamado de Zuma por um<br />
jornal da capital) obteve três grandes feitos<br />
em sua primeira disputa eleitoral: garantiu<br />
um imprevisível 2º turno em Minas,<br />
bateu um governador, Fernando Pimentel<br />
(PT), tirando-o da eleição e ainda alcançou<br />
42,73% dos votos, ou 4.138.967, superando<br />
também o ex-governador e líder das pesquisas,<br />
Antônio Anastasia (PSDB).<br />
VIRADA FENOMENAL - Com apenas 6 minutos<br />
na propaganda eleitoral gratuita de rádio<br />
e TV, o empresário natural de Araxá viajou<br />
por quase 200 cidades e trabalhou em silêncio,<br />
no estilo mineiro, só quebrando-o<br />
quando viu abertos os microfones da TV<br />
Globo a cinco dias da votação. O que fez<br />
ele, além de exibir uma coerência e firmeza<br />
de posições, atacando a velha política, comparando-a<br />
ao mau cheiro de um chiqueiro<br />
no ambiente harmonioso de uma fazenda?<br />
Como se conhecesse a senha, pediu votos<br />
para seu candidato presidencial, João<br />
Amoedo (Novo), e para o concorrente dele,<br />
Jair Bolsonaro (PSL), num gesto oportunista<br />
e de infidelidade partidária que, se<br />
desagradou o conceito de novo e a direção<br />
nacional da nova legenda, acabou por fazer<br />
dele um fenômeno eleitoral. Até então,<br />
a sucessão presidencial não tinha tido influência<br />
na mineira por que os candidatos<br />
20<br />
OUTUBRO DE 2018 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
da polarização o PT e o PSDB não tinham<br />
presidenciáveis competitivos.<br />
Aliados de Bolsonaro, o líder da votação<br />
no 1º turno das presidenciais, estavam votando<br />
em Anastasia para derrotar o governo<br />
petista, mas quando perceberam<br />
que o terceiro colocado, Romeu Zema estava<br />
crescendo, mas ajudando a colocar o<br />
petista no 2º turno, se mobilizaram na última<br />
semana de campanha para evitar o<br />
risco PT. Além disso, Zema acabou sendo<br />
a porta de saída para quem não aguentava<br />
mais a política tradicional e a polarização<br />
política dominante há 24 anos no país e<br />
há 16 anos no estado.<br />
O PESO DA TV, DE NOVO! - No 2º turno, em<br />
vez de seis segundos de TV e participação<br />
somente em um debate, Zema enfrentará<br />
Anastasia em pé de igualdade. Dizem no<br />
interior mineiro que o risco que corre o pau<br />
também corre o machado. Sem TV na 1ª<br />
fase, aparecer muito agora pode ser ruim<br />
para ele, que ficará mais exposto assim<br />
como ficarão seus defeitos e qualidades.<br />
Também não foi autorizado pelo partido,<br />
nessa fase final, a explorar apoio a<br />
Bolsonaro, embora a vinculação pode ser<br />
reafirmada de outras formas, para o bem<br />
e para o mal.<br />
De olho mais aberto agora, o rival<br />
Anas ta sia pretende expor as contradições<br />
políticas dele e de sua vida pessoal, questionando<br />
busca de apoios controversos,<br />
do PT e a Bolsonaro. O tucano não esperou<br />
sequer a bandeirada do TRE mineiro.<br />
Dois dias depois do fim do 1º turno, foi<br />
ao ataque para condenar o aceno feito<br />
por Zema aos petistas.<br />
E mais, numa atitude ousada, Anastasia<br />
decidiu não apoiar nenhum dos duelistas<br />
z<br />
O CANDIDATO A<br />
GOVERNADOR DE<br />
MINAS,ROMEU<br />
ZEMA<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 21
na final presidencial. Pagando o preço pela<br />
decisão, ele teria dito que preferiria perder<br />
a ter que associar seu nome a Bolsonaro.<br />
Na avaliação do tucano, se o candidato do<br />
PSL virar presidente, terá validade curta.<br />
Na finalíssima, Zema vai explorar três<br />
frentes, desde a vinculação a Bolsonaro,<br />
atacar a velha política da qual considera<br />
Anastasia representante e mostrar-se como<br />
gestor privado bem-sucedido. De sua parte,<br />
Anastasia tentará neutralizar os efeitos da<br />
sucessão presidencial e pôr em debate os<br />
desafios da realidade econômica do estado<br />
e a experiência administrativa pública que<br />
o rival não tem. Seja quem for o eleito, ele<br />
terá que enfrentar grave crise fiscal, com<br />
déficit de R$ 11,4 bilhões.<br />
O MAIS RICO DOS CANDIDATOS - A família<br />
Zema possui, em 170 cidades,<br />
uma rede de 430 lojas, com 5 mil<br />
funcionários, desde móveis e eletrodomésticos,<br />
o carro-chefe dos negócios,<br />
até a distribuição de<br />
combustíveis. Declarou<br />
à Justiça Eleitoral patrimônio<br />
de R$ 70<br />
milhões e gastou, no<br />
1º turno, menos de<br />
R$ 1 milhão de recursos<br />
oriundos,<br />
em sua maioria,<br />
do próprio partido,<br />
já que o<br />
Novo rejeita o uso<br />
de verba pública<br />
e se financia por<br />
meio de 25 mil filiados<br />
contribuintes<br />
no país. Anastasia<br />
gatou mais<br />
de R$ 11 milhões,<br />
e Pimentel, mais<br />
de R$ 7 milhões.<br />
GOVERNO ZEMA? - Não existem nomes conhecidos<br />
ou especulados para compor a<br />
equipe de um eventual governo Zema.<br />
Quem se habilita? Segundo ele adiantou,<br />
o primeiro escalão será técnico, não terá<br />
deputados e ficará sem receber salários<br />
até a normalização da situação econômica<br />
do estado. Disse que irá vender os helicópteros<br />
do estado e estatais, além de dispensar<br />
a residência oficial.<br />
QUEM É O NOVO? - Fundado em fevereiro de<br />
2011 por 181 cidadãos de 35 profissões diferentes<br />
que nunca exerceram mandato<br />
político, o Novo é contra o financiamento<br />
via fundo partidário e eleitoral, e defende<br />
a extinção de ambos. Todo o<br />
dinheiro utilizado na manutenção<br />
do partido provém dos filiados,<br />
apoiadores e doadores, que também<br />
ajudam a financiar as campanhas,<br />
de forma voluntária, juntamente<br />
com os candidatos.<br />
Dizem que irão devolver o dinheiro<br />
dos fundos recebido, R$ 1,7<br />
milhão.<br />
PSDB É ENGOLIDO POR BOL-<br />
SONARO - A baixa votação<br />
do senador Aécio Neves,<br />
de só 106 mil votos, a<br />
uma vaga na Câmara<br />
dos Deputados confirmou<br />
também o baixo<br />
desempenho de seu<br />
partido, o PSDB. O<br />
presidenciável tucano,<br />
Geraldo Alckmin,<br />
obteve menos<br />
de 5% dos votos e,<br />
em todo o país, o<br />
partido foi atropelado<br />
e substituído por<br />
Jair Bolsonaro. Adver-<br />
22<br />
OUTUBRO DE 2018 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
sário desse na reta final, o PT tenta sobreviver<br />
à onda conservadora.<br />
FUTURO SOMBRIO - O governador Fernando<br />
Pimentel (PT) perdeu a reeleição e o futuro<br />
político, ao ficar de fora do 2º turno da sucessão<br />
estadual deste ano. Ficou em 3º lugar,<br />
com 23,12 %, ou 2.239.979, e atrás do<br />
principal rival, o tucano Antônio Anastasia,<br />
que obteve 29,06%, ou 2.814.704, e do<br />
desconhecido empresário Romeu Zema<br />
(Novo), que liderou a votação com 42,73<br />
%, ou 4.138.967 votos. O petista foi vítima<br />
da onda antipetista e até do fogo amigo,<br />
que nos últimos dias de campanha comprou<br />
pacotes de mensagens de celular em<br />
favor de Zema com o intuito de garantir o<br />
2º turno. Saiu pela culatra.<br />
Seu futuro imediato, agora, depende da<br />
eleição do petista Fernando Haddad, que<br />
se eleito presidente, poderá acomodá-lo<br />
em algum ministério. Caso contrário, deverá<br />
sofrer o estresse daqueles que perderam<br />
o foro privilegiado e o status do cargo<br />
e são investigados em operações da Polícia<br />
Federal. Em junho passado, o Superior Tribunal<br />
de Justiça enviou à Justiça de Minas<br />
ação penal contra ele, referente à Operação<br />
Acrônimo, na qual é investigado por suposto<br />
esquema de lavagem de dinheiro em<br />
campanhas eleitorais envolvendo gráficas<br />
e agências de comunicação.<br />
Outro processo enviado refere-se à denúncia<br />
de tráfico de influência quando era<br />
ministro do Desenvolvimento, Indústria e<br />
Comércio Exterior (2011/2014).<br />
INTRANSIGÊNCIA E SALTO ALTO DERROTAM<br />
DILMA - A ex-presidente Dilma Rousseff<br />
também perdeu a eleição para o Senado.<br />
Além da onda antipetista e da conjuntura<br />
nacional, foi vítima de seu próprio temperamento.<br />
Na campanha, impôs seu estilo<br />
ao PT mineiro, impedindo a reedição da<br />
ali ança do PT com o MDB, seu algoz no<br />
impeachment, e escolheu sozinha os suplentes<br />
de sua chapa. Iludida<br />
pelas pesquisas que rea fir -<br />
ma vam sua liderança na disputa,<br />
ela calçou o traiçoeiro<br />
salto alto. Todos davam como<br />
certo que uma das duas vagas<br />
era dela. De líder das<br />
pesquisas - até sábado (6),<br />
véspera da eleição, era apontada<br />
como favorita por 28%<br />
- despencou para o quarto<br />
lugar, com apenas 15,29%<br />
dos votos (exatos 2.684.023)<br />
embora tenha gasto mais de<br />
R$ 4 milhões.<br />
(*) Orion Teixeira foi editor<br />
de Política, por mais de 15<br />
anos, do jornal HOJE EM<br />
DIA. Foi também seu colunista<br />
político (2013/2017)<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 23
CARTA DO PLANALTO - José Antônio Severo (*)<br />
BOLSONARO E PRESTES,<br />
OS DOIS CAPITÃES<br />
QUE CHEGARAM<br />
AO TOPO NA POLÍTICA<br />
JOSÉ ANTONIO SEVERO<br />
Há um ditado dos Exércitos: ”como<br />
na Cavalaria, rápido e malfeito”.<br />
Arma de ruptura, a Cavalaria, nas<br />
batalhas antigas, ia na frente, abrindo as<br />
linhas inimigas, mas deixava o serviço<br />
completo para a Infantaria, que vinha<br />
atrás, consolidando a vitória e ocupando<br />
o território. Esse chiste é sempre lembrado<br />
quando o general Mourão faz das<br />
suas, como candidato a vice-presidente<br />
24<br />
OUTUBRO DE 2018 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
“... PARA UM POLÍTICO, PIOR QUE UMA CARGA DE CAVALARIA É UMA<br />
EX-MULHER NA RUA. MESMO MUDANDO DE LADO DEIXAM TANTAS<br />
ARESTAS QUE FICAM IMPOSSÍVEIS DE APLAINAR.”<br />
na chapa do capitão Bolsonaro.<br />
A pior comparação do irrequieto general<br />
veio do candidato do PDT, Ciro Gomes,<br />
que o cognominou de “jumento de<br />
carga”, metáfora do animalzinho usado<br />
nos campos de batalha para levar alimentos<br />
e munições para os combatentes na<br />
linha de frente. Indiferentes às balas e estrondos<br />
de bombas e canhões, os asininos<br />
chegam onde outros carregadores<br />
não vão. Entretanto, um chiste que poderia<br />
ser um elogio no interior de uma caserna,<br />
soou como uma ofensa aos ouvidos<br />
leigos do eleitorado, dando a<br />
entender que Mourão carregaria humildemente<br />
seu capitão Jair às costas. O candidato<br />
a vice-presidente é oficial da Arma<br />
de Cavalaria.<br />
Entretanto, para um político, pior que<br />
uma carga de cavalaria é uma ex-mulher<br />
na rua. Mesmo mudando de lado deixam<br />
tantas arestas que ficam impossíveis de<br />
aplainar. Como neste caso da ex de Bolsonaro,<br />
Ana Cristina: ela mudou de lado<br />
outra vez, recuperou o nome dele, mas<br />
deixou para trás um processo escabroso<br />
com todas as baixarias inconvenientes<br />
neste momento. Pior que a diabruras do<br />
general Mourão.<br />
z<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 25
O CAPITÃO<br />
JAIR<br />
BOLSONARO<br />
Bolsonaro é o segundo capitão a pontificar<br />
na política brasileira. O primeiro foi o<br />
gaúcho Luiz Carlos Prestes, da arma de<br />
Engenharia. Bolsonaro, sessentão, parece<br />
confirmar o estigma e a imagem histórica<br />
dos capitães, pois era firme e desassombrado,<br />
tal como o candidato do PSL de<br />
nossos dias. O legendário “Cavaleiro da<br />
Esperança” (epíteto que lhe foi atribuído<br />
pelo escritor Jorge Amado) faleceu nonagenário,<br />
irrequieto, como um autêntico capitão,<br />
intransigente e audaz como se estivesse<br />
comandando uma carga de seus<br />
guerreiros na legendária Coluna Prestes.<br />
Prestes deixou<br />
um legado:<br />
ele foi o personagem<br />
seminal<br />
da esquerda<br />
brasileira. Por<br />
mais que os<br />
partidos e facções<br />
divirjam<br />
ideologicamente,<br />
todos<br />
mantêm uma<br />
postura inspirada<br />
no Castilhismo<br />
do capitão,<br />
que<br />
constitui o etos<br />
dessas correntes.<br />
Sua postura<br />
é atribuída erroneamente,<br />
por<br />
algumas semelhanças,<br />
ao stalinismo<br />
do comunismo<br />
dos anos 40/50. Prestes já era<br />
assim como sempre foi muito antes de<br />
se converter ao comunismo. Deixou para<br />
seus pósteros uma esquerda castilhista<br />
Essa doutrina do caudilho gaúcho é<br />
uma visão própria do positivismo (assim<br />
como Lênin fez sua interpretação do<br />
marxismo), a mesma de Bolsonaro, oficial<br />
de artilharia como Floriano Peixoto,<br />
Hermes da Fonseca e Ernesto Geisel.<br />
O “Marechal de Ferro” foi parceiro de<br />
Júlio de Castilhos na paz e na guerra. O<br />
governador gaúcho, com sua Brigada Militar<br />
(que em 1893 era uma milícia do<br />
Partido Republicano), foi o sustentáculo<br />
da repressão aos levantes dos maragatos,<br />
no Rio Grande, e da Armada, na baia da<br />
Guanabara. Floriano, por seu turno, assegurou<br />
a Castilhos a continuidade da vigência<br />
de sua constituição singular, diferente<br />
daquela da<br />
nascente Estados<br />
Unidos do Brasil.<br />
A constituição de<br />
14 de Julho, do<br />
Rio Grande do<br />
Sul, não tinha<br />
três poderes (o<br />
executivo mandava<br />
em tudo) e<br />
permitiu cinco<br />
reeleições (quatro<br />
sucessivas)<br />
do seu sucessor<br />
Borges de Medeiros.<br />
Bolsonaro é<br />
o herdeiro desse<br />
positivismo adulterado.<br />
Entre ditadores<br />
e presidente, a<br />
Infantaria deu<br />
três (Dutra, Castello<br />
e Costa e<br />
Silva), a Cavalaria de dois (Médici e Figueiredo).<br />
Com Bolsonaro podem ser<br />
quatro da Artilharia.<br />
Outra comparação que se faz de Bolsonaro<br />
é com seu colega paraquedista<br />
Hugo Chávez, da Venezuela. Os dois vêm<br />
26<br />
OUTUBRO DE 2018 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
dessa nova especialidade dos soldados<br />
alados, tipos de índole arrojada, impetuosos,<br />
temerários, preparados para lutar<br />
atrás das linhas inimigas. Com isto, dizse<br />
que Bolsonaro vai tirar a pele de cordeiro<br />
e se projetar como um nacionalista<br />
ferrenho, tal qual Chávez, que assumiu se<br />
lançou na política com imagem de golpista<br />
de direita, foi eleito presidente pelos<br />
liberais e conservadores e depois deu<br />
meia-volta à esquerda. Também pode haver<br />
uma certa analogia, pois assim como<br />
Bolsonaro, o ditador venezuelano não era<br />
general, mas um simples tenente-coronel.<br />
Não foi por<br />
isto que os generais<br />
de seu<br />
país lhe negaram<br />
continência.<br />
A grande diferença<br />
entre os<br />
dois seria o legado<br />
histórico<br />
que cada qual<br />
teria no campo<br />
da política externa.<br />
O Brasil é<br />
um País de índole<br />
pacifica,<br />
mas que nunca<br />
deixou barato<br />
aos que lhe profanaram<br />
o território.<br />
Solano Lopez<br />
e Adolf Hitler<br />
que o digam.<br />
Já Chávez julgava-se<br />
herdeiro<br />
O CAPITÃO LUÍS<br />
CARLOS<br />
PRESTES<br />
do fundador do pan-americanismo, com<br />
deveres e obrigações com os demais povos<br />
de nosso subcontinente latino-americano.<br />
Como Simon Bolívar, o libertador<br />
da metade norte da América do Sul, ele<br />
arvorou-se a cumprir o legado de seu antecessor,<br />
criando o bolivarianismo. Naquela<br />
época da conferência do Panamá,<br />
o Brasil não aderiu ao Libertador. Pelo<br />
contrário, o patriarca venezuelano considerava<br />
o Brasil um corpo estranho na<br />
América Espanhola. Chávez perdoou os<br />
falantes lusitanos, deixando de fora apenas<br />
os anglo saxões. Menos mal.<br />
Por fim a questão da hierarquia militar.<br />
Não obstante nada impeça um capitão<br />
de ser comandante em chefe das Forças<br />
Armadas, se a Lei lhe conferir esse poder,<br />
soa estranho para o público leigo um general<br />
fazer continência para baixo, como<br />
se diz. Seria humilhante.<br />
Isto<br />
não é verdade<br />
em quaisquer<br />
sentidos, pois<br />
nas Forças Armadas<br />
o que há<br />
de mais importante<br />
é a antiguidade.<br />
Nesse<br />
quesito, Jair Bolsonaro<br />
é da<br />
mesma turma<br />
dos generais do<br />
alto comando<br />
presente. Se tivesse<br />
continuado<br />
no Exército,<br />
feito tudo<br />
direitinho, estudado<br />
e se comportado<br />
de<br />
acordo com os<br />
regulamentos,<br />
poderia hoje ser um quatro estrelas. Então<br />
também não há continência para<br />
baixo. Bolsonaro trata seus generais por<br />
“você”, como a qualquer colega de turma<br />
na Academia e nos primeiros passos da<br />
vida profissional.<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 27
O TRIÂNGULO NÃO QUER<br />
MAIS SE SEPARAR E, SIM,<br />
MANDAR EM<br />
MINAS GERAIS<br />
MINAS GERAIS SÃO MUITAS, DIZIA GUIMARÃES<br />
ROSA. UMA DELAS MOSTRA SUA CARA: O<br />
TRIÂNGULO MINEIRO CHEGA A BELO HORIZONTE<br />
Romeu Zema, fortíssimo candidato a<br />
governador de Minas Gerais, fenômeno<br />
eleitoral que dificilmente será<br />
batido no segundo turno, representa a entrada<br />
dessa província no concerto da federação<br />
das Geraes.<br />
Região até pouco tempo tida como separatista,<br />
olhando para o Centro Oeste<br />
agrícola, distante das serranias, abre com<br />
chave de ouro seu desembarque na política<br />
mineira, apresentando-se como uma<br />
ameaça às forças tradicionais, à esquerda,<br />
centro e direita ou suas combinações, que<br />
governaram o Estado desde sua criação lá<br />
nos tempos das minerações e brigas dos<br />
emboabas com os bandeirantes de Piratininga.<br />
Nenhum outro político do Triângulo<br />
chegou à Alterosas com tamanho impacto<br />
como Zema.<br />
Do outro lado, ele enfrentará o ex-governador<br />
e professor Antônio Anastasia,<br />
que representa a configuração mais expressiva<br />
de uma liderança Minas Gerais,<br />
tanto por sua origem política, quanto por<br />
sua posição na Academia e pela repercussão<br />
de sua atuação no Senado Federal.<br />
Zema, um desconhecido dos cafundós<br />
(desculpem a força de expressão) batendo<br />
um gigante da política metropolitana. Davi<br />
contra Golias.<br />
Segundo algumas pessoas próximas ao<br />
tucanato, Anastasia estaria desconcertado<br />
com a trajetória de sua empreitada eleitoral.<br />
Saiu tudo ao contrário do previsto e,<br />
entretanto, ao fim e ao cabo, bem como<br />
ele imaginava que seria. Só que ninguém<br />
lhe ouviu. Tanto que resistira o quanto<br />
pode a assumir essa posição de candidato<br />
outrora considerado imbatível. Só que não<br />
contava com o ataque de onde veio.<br />
Político experiente, com razão temia a<br />
máquina do governador Fernando Pimentel<br />
e a força do petismo vinda do carisma<br />
de Lula e da liderança da ex-presidente<br />
Dilma Rousseff nas pesquisas para o Senado,<br />
ambos reforçados pela vitimização<br />
dos dois: Lula pela prisão e Dilma pelo<br />
“golpe”. Nada disso: a tormenta veio do<br />
poente, de onde menos se esperava.<br />
Ofereceu-se a Anastasia um canteiro de<br />
28<br />
OUTUBRO DE 2018 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
osas: diziam-lhe que teria pela frente um<br />
adversário enfraquecido pelas vicissitudes<br />
da administração destroçada no meio de<br />
um país em grave crise econômica, estado<br />
falido e sem condições de responder prontamente<br />
a estímulos para recuperação, forças<br />
políticas (PT e aliados) desorganizadas,<br />
combalidas, sufocadas por acusações<br />
e ameaças de todo o tipo. Convenhamos,<br />
um cenário atraente, mesmo para um mineiro<br />
precavido.<br />
Do seu lado Anastasia contava a seu favor<br />
com uma candidatura nacional imbatível,<br />
alicerçada na maior coalização partidária<br />
de toda a história deste país,<br />
tempos de televisão à vontade e muito dinheiro<br />
dos fundos eleitorais das quotas<br />
dessas agremiações<br />
aliadas e coligadas.<br />
Além disso, Geraldo<br />
Alckmin apresentavase<br />
como um candidato<br />
vencedor, com um currículo<br />
brilhante, quatro<br />
vezes ex-governador de<br />
São Paulo, esgrimindo<br />
uma administração tida<br />
como invejável. Não<br />
bastasse, as pesquisas<br />
davam-lhe vitória no<br />
primeiro turno. Anastasia<br />
não teria do que reclamar.<br />
Recuar seria<br />
quase uma traição.<br />
Como bom mineiro, Anastasia duvidava.<br />
Resistiu o que pode. Quando voltou,<br />
encontrou tudo mais ou menos nos conformes.<br />
Até às vésperas da eleição. Então<br />
tudo desabou: a aliança nacional não decolou,<br />
a liderança local esvaiu-se e o tiro<br />
que lhe atingiu veio de lado inesperado.<br />
Neste momento o candidato tucano está<br />
num beco: se vencer, terá pela frente um<br />
governo nacional hostil, finanças federais<br />
Região até pouco tempo tida<br />
como separatista, olhando para<br />
o Centro Oeste agrícola, distante<br />
das serranias, abre com chave<br />
de ouro seu desembarque na<br />
política mineira, apresentandose<br />
como uma ameaça às forças<br />
tradicionais, que governaram o<br />
Estado desde sua criação<br />
inexistentes, recursos locais a zero e uma<br />
oposição petista feroz. Um governo de<br />
sangue, suor e lágrima. Perdendo, voltando<br />
ao Senado, onde tem mais quatro<br />
anos para se recuperar, teria uma larga estrada<br />
aberta, ou seja, um parlamento de<br />
novatos, onde sua experiência e acatamento<br />
o converteria num dos principais<br />
nomes da República.<br />
Já Zema parece em rota de colisão com<br />
as principais e mais bem organizadas forças<br />
políticas do Estado. De um lado o PT<br />
deve fazer-lhe oposição implacável, como<br />
é seu estilo e sua capacidade; de outro, os<br />
tucanos também não darão trégua, em antagonismo<br />
aberto, devido ao confronto de<br />
segundo turno, produto negativo de uma<br />
campanha frente a<br />
frente, resultante dos<br />
embates desta luta final.<br />
Isto promete um<br />
começo de governo tumultuado,<br />
sem muitas<br />
condições para oferecer<br />
alívio imediato às forças<br />
que o apoiaram na<br />
eleição pedindo soluções<br />
urgentes.<br />
Minas Gerais promete<br />
um pleito de segundo<br />
turno animado.<br />
Na eleição nacional o<br />
PT usará todas as forças<br />
remanescentes da máquina estadual para<br />
apoiar seu candidato Fernando Haddad. No<br />
estadual, os tucanos estarão em choque<br />
com os adversários do capitão Jair Bolsonaro.<br />
Cada qual com seu facão a distribuir<br />
golpes às escuras. Será uma briga de foice<br />
no escuro Boa prova para o Triângulo.<br />
* O jornalista José Antônio Severo<br />
é correspondente de <strong>Matéria</strong><strong>Prima</strong><br />
em Brasília.<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 29
CARTA DE LISBOA Eliane Machado<br />
NEM ÀS PAREDES<br />
CONFESSO<br />
O TÍTULO ACIMA É NOME DE UM<br />
FAMOSÍSSIMO FADO, A NOVA PAIXÃO<br />
MUSICAL DA NOSSA CRONISTA, QUE<br />
ASSINA O TEXTO E AGORA RESIDENTE<br />
NO ULTRAMAR<br />
Énormal quando você viaja, principalmente<br />
para lugares que você nunca viu, levar<br />
uma série de sugestões de coisas para<br />
fazer e de locais para visitar. Algumas, você<br />
fica louca pra fazer rapidamente.<br />
Outras, nem tanto. E tem aquelas que<br />
você tem certeza que não vai fazer ou nem<br />
vai visitar.<br />
Uma destas, que jurava de pé junto que<br />
não me pegaria, era o fado. Não gosto de<br />
música de sofrência. Mas aí você chega em<br />
Lisboa e o fado está por toda parte. Faz parte<br />
da programação dos vários festivais de música<br />
que cortam o verão de Norte a Sul do País.<br />
Está na TV, nas ruas, nos muros das ruelas.<br />
QUE RITMO É ESSE? O primeiro vídeo que<br />
assisto na internet não mexe muito comigo.<br />
Mas os comentários sim: elogio de todas as<br />
nacionalidades. Um uruguaio escreve:<br />
– Conforta minha alma e faz da música<br />
portuguesa linda, pois nela a melancolia é<br />
aceita como uma dimensão humana.<br />
Um espanhol pergunta:<br />
– Por que é tão triste?<br />
Prontamente respondida por um português:<br />
– Porque os portugueses são um povo<br />
triste e o fado surgiu para alegrar a alma.<br />
Resolvi não levar muito a sério a resposta,<br />
mas uma coisa ficou martelando em minha<br />
cabeça: alma! E foi atrás do significado<br />
dessa palavra que eu mirei.<br />
Mas antes as definições, mesmo que pareçam<br />
redundantes: fado é um estilo musical<br />
português. A palavra veio do latim fatum,<br />
que significa destino. Não se sabe exatamente<br />
quando e onde surgiu. São inúmeras as<br />
teorias sobre a origem. A única unanimidade<br />
é que surgiu das inúmeras culturas presentes<br />
em Lisboa, sendo portanto um ritmo urbano.<br />
Só passou a ser conhecido depois de 1840,<br />
nas ruas da capital portuguesa.<br />
ORIGEM E ACEITAÇÃO. Alguns dizem que o<br />
fado mais antigo é o Fado do Marinheiro,<br />
cantado pelos próprios na proa do navio.<br />
Ainda na época dos descobrimentos.<br />
Ganhou fama e o mundo a partir da primeira<br />
metade do século 20, quando os cantores<br />
e tocadores saíram das vielas e foram<br />
para os palcos, o cinema e a TV. Quando o<br />
fado deixou de ser marginal.<br />
Quem estabelece a harmonia e o ritmo é<br />
a viola do fado: um instrumento muito semelhante<br />
ao nosso violão, mas com 6 cordas<br />
de aço. E não custa baratinho não. Vai de<br />
197 euros a 510 euros.<br />
A grande musa foi e ainda é Amália Rodrigues.<br />
Grande embaixadora e rainha, que<br />
espalhou o estilo pelo mundo no século<br />
passado. Em uma de suas últimas entrevistas,<br />
dada à repórter Felícia Cabrita e publicada<br />
no Portal do Fado, se confessa “doentemente<br />
30<br />
OUTUBRO DE 2018 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
tímida” e que rezava muito antes de entrar<br />
em cena.<br />
FADO DE RAIZ. Amália ganhou do nosso poeta<br />
Vinícius de Morais, o fado “Saudades do<br />
Brasil em Portugal”, que eu tive o prazer de<br />
ouvir. Ao vivo e a cores. Já, já chego lá.<br />
Sua morte, em 1999, provocou uma grande<br />
comoção nacional. Amália saiu de cena<br />
sem saber que, 12 anos depois, o seu<br />
querido fado seria elevado à categoria de<br />
Patrimônio Cultural e Imaterial da Humanidade,<br />
pela UNESCO.<br />
De posse de todas essas informações e<br />
de uma visita ao Museu do Fado (claro que<br />
existe um museu que não só mantém viva a<br />
memória, como oferece várias atividades<br />
pedagógicas e oficinas para pessoas de<br />
várias idades) vamos ao que interessa: a<br />
uma apresentação do fado. Mas não o fado<br />
para turista. O fado autêntico.<br />
SILÊNCIO PARA OUVIR. De imediato uma dificuldade<br />
que eu não contava: são poucas as<br />
casas que apresentam este tipo de fado,<br />
também conhecido como fado vadio. E nas<br />
que existem, em bairros como a Alfama,<br />
Mouraria e Bairro Alto, os verdadeiros redutos,<br />
só com reservas e muita antecedência.<br />
Porque lotam. Geralmente são lugares pequenos,<br />
intimistas, sem luxo. Mesas compartilhadas.<br />
Todos muito próximos. Nestes<br />
locais o cerimonial é mantido. Não se fala<br />
alto. Durante a apresentação, silêncio absoluto.<br />
Completa reverência. É o fado ouvido com<br />
todos os sentidos. Quase ao toque da mão.<br />
A fadista da casa é Ana Margarida. Dez<br />
anos de profissão. Conhecida em Portugal e<br />
no exterior (ou no estrangeiro, como dizem<br />
aqui). Já tem álbum gravado. Faz parte da<br />
nova geração de fadistas. Um vozeirão!<br />
pra falar com ela.<br />
Me recebe durante a apresentação de um<br />
outro fadista. Um amigo que passou por lá e<br />
resolveu cantar. E finalmente faço a pergunta<br />
que não quer calar:<br />
– O que é o fado? Onde entra a alma?<br />
Ana abre um sorriso e diz:<br />
– O fado é vida. Conta toda a nossa<br />
história. Está em nossa maneira de ser portuguesa.<br />
Esse sentir muito. Este gostar. Não<br />
somos mais do que contadores de histórias.<br />
Na maior parte das vezes, histórias de amores<br />
não felizes, mas também histórias que tem<br />
muito a ver com esse povo. Povo que foi<br />
grande em suas descobertas, mas que depois<br />
tenha sentido que morreu na praia. É um<br />
povo saudosista.<br />
E a medida que vamos conversando, fui<br />
relembrando tudo que li e ouvi.<br />
Se é verdade que nem todos conhecem a<br />
palavra “saudade”, não é o caso dos portugueses!<br />
Com certeza!<br />
Os portugueses têm muitas saudades:<br />
dos marinheiros que partiram e deixaram<br />
sua terra? Os parentes que viram seus familiares<br />
partirem? De um passado glorioso?<br />
De amores perdidos? Os portugueses têm<br />
saudades. E ponto! E saem cantando isso a<br />
plenos pulmões. Através do fado. Ali está a<br />
alma deste povo.<br />
E assim, uma carioca de origem, com<br />
uma grande passagem pela Bahia, criada e<br />
formada em Minas ao som dos Beatles,<br />
Bossa Nova, Tropicália e<br />
Clube da Esquina, apreciadora<br />
de jazz e blue<br />
confessou seu encantamento<br />
pelo fado.<br />
E Ana Margarida:<br />
– Sou sua fã!<br />
SAUDADE, SEMPRE. Já no primeiro intervalo,<br />
me identifico ao proprietário da casa e peço<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 31
CARTA DO SERTÃO Tiãozito *<br />
EM REPRESÁLIA<br />
E EM DESACORDO<br />
COM O LUAR<br />
Alguém, adversário político do vereador<br />
Hermes Teixeira, fez publicar<br />
na secção “O Impossível<br />
Acontece”, da extinta revista “O Cruzeiro”,<br />
por politicagem e com intenções<br />
criticas e jocosas, que aquele edil<br />
pedira ao prefeito municipal, através<br />
da Câmara Municipal, autorizar apagar<br />
as luzes das ruas, quando em noite de<br />
luar, a título de economia para o município,<br />
uma vez que a iluminação pública,<br />
àquela época, era gerada por<br />
motor a óleo diesel.<br />
Ora, senhores políticos, com muitas<br />
ruas da cidade propositalmente às escuras<br />
ou com suas lâmpadas apagadas<br />
mais cedo, atualmente o nobre edil seria<br />
fartamente elogiado e aplaudido,<br />
nestes tempos de forçoso racionamento<br />
de energia, tão implorado pelo governo.<br />
Ou seja: os tempos mudam, mas os políticos<br />
continuam os mesmos.<br />
Tenho uma teoria, desde minha não<br />
tão distante e bem vivida juventude, facilmente<br />
comprovada pelos leitores:<br />
qualquer pessoa que tenha horário de<br />
trabalho, ou melhor, que trabalhe, por<br />
exemplo, das oito às doze e das treze<br />
às dezessete horas, não tem tempo de<br />
ser politico. Também os profissionais<br />
liberais, grande maioria, voltados para<br />
o sério exercício da profissão, não pensam<br />
nunca em pertencer aos partidos<br />
políticos. Não pensem que estou dizendo<br />
que os partidos políticos são<br />
compostos apenas por desocupados e<br />
vadios, existem exceções, mas eis aí<br />
uma das razões de, no Brasil e na<br />
Bahia, principalmente no interior<br />
e mais ainda aqui em nossa região,<br />
os governantes e legisladores<br />
serem, em alta percentagem,<br />
semi-analfabetos ou<br />
muito pouco esclarecidos.<br />
Dou-lhes aqui dois bons e<br />
curiosos exemplos.<br />
José A.Aguiar, então representante<br />
do distrito de Aracatu<br />
na Câmara Municipal de<br />
Brumado, propusera à Mesa a<br />
liberação de uma verba destinada<br />
à abertura de uns tanques<br />
para captação das águas<br />
pluviais, em busca de minorar<br />
as agruras da seca em sua região.<br />
As reuniões eram realizadas<br />
no Salão Nobre do antigo<br />
Paço Municipal e sempre às<br />
duas horas da tar de. A solama<br />
batia firme lá fora, provocando<br />
uma modorra braba<br />
e José, que tomara umas e outras<br />
32<br />
OUTUBRO DE 2018 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
antes do almoço, cochilava tranquilo<br />
na sua cadeira. A matéria acima citada<br />
já posta em votação, o sr. Presidente<br />
bate a campainha e interpela:<br />
— Sr. .José, Sr. José, sua vez de votar!<br />
E o nobre colega, desperto de sobressalto,<br />
sem saber do que se tratava, mas<br />
eterno adversário do prefeito, lascou:<br />
— Eu desacordo, incelença!<br />
Seu Arthur Revenster, secretário da<br />
Câmara e responsável<br />
direto pela redação<br />
da moção<br />
daquela vereança, não perdoou e<br />
corrigiu enfático:<br />
— Pois pode ACORDAR que é o<br />
seu pedido que está sendo votado,<br />
EX CELÊNCIA!!!<br />
De outra feita e na mesma Câmara,<br />
agora sob presidência do respeitado<br />
agrônomo dr. José Borges<br />
Sampaio, sendo secretária<br />
Liá Farani,<br />
fazia esta a leitura da<br />
ata da sessão anterior,<br />
para sua regimental<br />
aprovação:<br />
— “... e eis<br />
que usou da<br />
palavra o vereador<br />
Pedro<br />
Antônio Chaves<br />
e propôs ao plenário<br />
o acatamento<br />
da mensagem<br />
do Sr. Prefeito,<br />
quando o vereador<br />
Antenor Miranda Moreira,<br />
em represália ...”<br />
— Eu não disse<br />
esta palavra,<br />
minha senhora, e, portanto, não<br />
concordo com esta ata! — explodiu<br />
o legislador Antenor.<br />
Gerou-se tremenda confusão,<br />
um disse que não disse, dr.<br />
Sampaio tentava explicar o que<br />
era represália, a secretária idem, ninguém<br />
chegou a um consenso e os respeitáveis<br />
e legítimos representantes do<br />
povo anularam a pobre ata por unanimidade.<br />
Creiam!<br />
(*) Sebastião Cardoso, o Tiãozito, é tabelião<br />
aposentado em Brumado (BA)<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 33
?????????????<br />
CARTA DO CANADÁ Arthur Vianna<br />
UMA DAS PLANTAÇÕES<br />
DE MACONHA<br />
REGULAMENTADAS PELO<br />
GOVERNO CANADENSE<br />
CANADÁ APROVA<br />
MACONHA RECREATIVA<br />
ANTIGA PROIBIÇÃO TEM ORIGEM NO PRECONCEITO QUE OS NORTE-<br />
AMERICANOS JÁ MANTINHAM NA DÉCADA DE 20 CONTRA A IMIGRAÇÃO<br />
DE MEXICANOS, QUE PROVAVELMENTE USAVAM O PRODUTO<br />
Otema – liberalização da maconha<br />
para uso medicinal e recreativo –<br />
está na ordem do dia em diversos<br />
países, tendo o Uruguai, em 2013, sido a<br />
primeira nação do mundo a legalizar o<br />
cultivo, a venda e o consumo do produto.<br />
Hoje, mais de 30 países já demonstram<br />
uma abertura com relação à utilização<br />
da maconha pela população adulta. Portugal<br />
e Espanha já flexibilizaram suas<br />
leis há mais de 20 anos. E, para alguns<br />
estados norte-americanos, como Washington,<br />
Colorado e Alaska, o consumo<br />
recreativo é tolerado. No Brasil, uma lei<br />
que prevê a liberação da maconha para<br />
uso recreativo está em discussão na Câ-<br />
34<br />
OUTUBRO DE 2018 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
mara Federal.<br />
Em outros países, o uso<br />
da cannabis continua a ser<br />
totalmente proibido e até<br />
com punições que podem<br />
chegar, como na Arábia<br />
Saudita, a prisão perpétua<br />
ou pena de morte.<br />
Pela importância do assunto,<br />
entrevistei, em Toronto,<br />
o médico brasileiro dr.<br />
Ilan Nachim, especialista<br />
em medicina de família e<br />
um estudioso em medicina<br />
para dor e dependência. Ele<br />
abriu uma das primeiras clínicas<br />
médicas de cannabis<br />
no Canadá e faz regularmente<br />
palestras sobre a<br />
cannabis medicinal. Atualmente,<br />
trabalha no Centro<br />
de Dependência e Saúde<br />
Mental e em clínicas comunitárias<br />
que ajudam pessoas com problemas<br />
de dependência química.<br />
DR. ILAN NACHIM, MEDICO BRASILEIRO ESPECIALISTA<br />
EM MEDICINA DE FAMÍLIA NO CANADÁ<br />
COM A PALAVRA<br />
O DR. NACHIM<br />
– A OMS-Organização Mundial de<br />
Saúde reconhece vários estudos que<br />
demonstram os efeitos terapêuticos<br />
dos canabioides, desde o tratamento<br />
da dor neuropática até certos tipos de<br />
convulsões, sintomas de esclerose<br />
múltipla e outras doenças.<br />
– Embora utilizada há séculos, o preconceito<br />
que ainda cerca o uso da maconha<br />
é resultado de uma campanha<br />
que começou nos EUA, entre os anos<br />
de 1920 e 1930, para criticar a imigração<br />
de mexicanos no país. Hoje, a dependência<br />
da substância é vista como<br />
uma preocupação mental de saúde, um<br />
problema médico, e não como crime.<br />
– Antes de aprovar a atual legislação<br />
para a venda e o consumo, o governo<br />
canadense desenvolveu um programa<br />
de educação pública, destacando os<br />
riscos do uso da maconha. O Centro de<br />
Dependência e Saúde Mental, em Toronto,<br />
publicou diretrizes de baixo risco<br />
para os usuários recreativos, incluindo<br />
o uso de cepas de menor potência e<br />
utilização de vaporizador ou ingestão<br />
em vez de fumar. Eles também encorajam<br />
mulheres grávidas e pessoas que<br />
correm risco de complicações de<br />
saúde mental a evitar completamente<br />
o uso de cannabis.<br />
– Certamente existem riscos associados<br />
ao uso da maconha, seja de<br />
forma recreativa ou médica. Nunca se<br />
deve supor que é inofensivo. No<br />
entanto, a cannabis não é o demônio<br />
que foi inventado há algumas décadas.<br />
Nos próximos anos, o estigma<br />
associado ao consumo da maconha<br />
será visto de forma semelhante ao álcool<br />
e ao tabaco.<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 35
MEU EMPREGO<br />
49 DICAS PARA<br />
VOCÊ SOBREVIVER<br />
AOS PIORES DIAS<br />
NO TRABALHO<br />
QUANDO O JOGO FICA<br />
BRUTO, O MELHOR<br />
REMÉDIO, ÀS VEZES, É<br />
CONTAR ATÉ TRÊS. OU ATÉ<br />
CEM, SE FOR O CASO<br />
RODRIGO DE ALMEIDA MARTINS<br />
Todos nós conhecemos muitas histórias<br />
de funcionários que, no auge do<br />
desespero, mandaram o chefe para<br />
a tonga da mironga. E, na saída, ainda atiraram<br />
o computador no chão. Mas, não se<br />
esqueça de que mesmo essas pessoas se<br />
deparam, em seguida, com a dificuldade<br />
de se obter novo emprego. E, então, no<br />
maior constrangimento, começam a distribuir<br />
o currículo pelo mundo afora. Em<br />
outras palavras, a briga é a pior forma de<br />
se resolver os problemas. Claro que ficar<br />
estressado de vez em quando é normal.<br />
Por isso, enumeramos uma lista de coisas<br />
que você deve fazer. Ou, então, evitá-las.<br />
Imprima a lista e a leia de vez em quando,<br />
para nunca tomar decisões precipitadas.<br />
1<br />
Não<br />
2<br />
Controle<br />
3<br />
Cultive<br />
4<br />
Resista<br />
5<br />
Evite<br />
prometa o que você não pode<br />
entregar.<br />
suas emoções, para não ser<br />
controlado por elas.<br />
seu senso de<br />
humor.<br />
ao perfeccionismo.<br />
julgar os colegas ou<br />
menosprezá-los.<br />
36<br />
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6<br />
Durma<br />
7<br />
Comece<br />
8<br />
Tente<br />
9<br />
Faça<br />
em casa todo o sono que<br />
você necessita.<br />
a trabalhar 15 minutos mais<br />
cedo.<br />
cumprir os horários. Seja uma<br />
pessoa regular.<br />
uma caminhada logo depois do<br />
almoço. Ou, no mínimo, uns exercícios<br />
de alongamento.<br />
10<br />
11<br />
12<br />
13<br />
14<br />
15<br />
16<br />
Afaste o sono no trabalho com<br />
uma xícara de café.<br />
Almoce uma comida mais leve. O<br />
ideal é fazer como os tropeiros: almoçar<br />
pela manhã, antes de sair<br />
para o trabalho. Depois, faça pequenos<br />
lanches ao longo do dia.<br />
Aprenda a reconhecer os sintomas<br />
do estresse (ansiedade, dor de cabeça,<br />
raiva). Assim, você pode cortar<br />
o mal pela raiz.<br />
Faça amigos e aliados no trabalho.<br />
Fale sobre o seu estresse com alguém.<br />
Preste atenção na sua respiração.<br />
Sempre que puder, respire fundo.<br />
17<br />
Coloque fotos da família, ou outras<br />
imagens que o façam feliz<br />
em sua área de trabalho.<br />
Viva o presente. Não agonize<br />
sobre o passado, nem se preocupe<br />
com o futuro.<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 37
18<br />
19<br />
20<br />
Fique algum tempo sozinho.<br />
Encontre formas inofensivas para<br />
desabafar. Por exemplo, chorar, ou<br />
morder o travesseiro.<br />
Modifique sua rotina, nem que<br />
seja a de chegar ao trabalho por<br />
outras ruas.<br />
Evite ser aquela pessoa que faz<br />
21 tudo e quebra todos os galhos no<br />
serviço.<br />
22<br />
23<br />
24<br />
25<br />
26<br />
27<br />
Nunca se esqueça do<br />
que é realmente importante<br />
na vida.<br />
Aprimore suas habilidades,<br />
torne-se melhor<br />
e faça mais<br />
rapidamente as suas<br />
tarefas.<br />
Faça o que você realmente<br />
sabe e o que é<br />
esperado de você.<br />
Em caso de dúvida<br />
sobre isso, converse<br />
com o seu chefe.<br />
Tente olhar para os<br />
problemas sob diferentes<br />
pontos de<br />
vista.<br />
Tente fazer um trabalho<br />
que se adapte à<br />
sua personalidade.<br />
Aprenda a dizer<br />
“não”.<br />
28<br />
29<br />
30<br />
31<br />
32<br />
Sempre tenha um plano de contingência<br />
(um “plano B”).<br />
Seja uma pessoa organizada.<br />
Mantenha limpa a sua área de trabalho.<br />
Nunca deixe para amanhã o que<br />
você pode fazer hoje.<br />
Faça seu trabalho com ergonomia.<br />
Poltronas ruins deixá-lo-ão cansado<br />
ou doente.<br />
38<br />
OUTUBRO DE 2018 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
Vista roupas confortáveis e elegantes.<br />
Seja discreto. 37<br />
33<br />
Seja uma pessoa positiva. A princípio,<br />
tudo pode ser feito. E real-<br />
38<br />
34<br />
mente pode.<br />
Pense, contemple. Preste atenção<br />
35<br />
39<br />
em tudo. Não seja um distraído.<br />
Procure entender a lógica da empresa,<br />
sua posição no mercado.<br />
36<br />
40 Colabore com o seu chefe.<br />
41<br />
42<br />
43<br />
44<br />
45<br />
46<br />
47<br />
48<br />
49<br />
Escreva sobre as coisas que você<br />
gosta no seu trabalho.<br />
Faça uma lista de todas as suas<br />
realizações no ano passado.<br />
Seja claro sobre seus objetivos de<br />
vida e, a cada dia, dê um passo<br />
em direção a eles, não importando<br />
se a caminhada for pequena.<br />
Aprenda a amar a si mesmo<br />
como você é.<br />
Coloque um sorriso em seu rosto.<br />
Aprenda um hobby que o faça<br />
feliz.<br />
Aprenda a priorizar. Aprenda a delegar.<br />
Pare de se comparar aos outros.<br />
Pergunte, quando necessitar de<br />
ajuda.<br />
Se o serviço é grande, tente fazê-lo<br />
por partes. Em outras palavras, se<br />
for muita areia para seu pequeno<br />
caminhão, faça duas viagens.<br />
Conheça suas limitações e tente<br />
mostrá-las aos colegas.<br />
Não tente controlar o incontrolável.<br />
Não desista nunca.<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 39
AQUI ENTRE NÓS Symphrônio Veiga<br />
Com o texto errado<br />
Era muito criterioso o trabalho de<br />
correção de textos nas redações de<br />
jornais impressos. Redatores experientes<br />
e revisores atentos trabalhavam<br />
com eficiência garantida. No final da<br />
primeira década (de 50 a 60) da metade<br />
do século passado, aos 18 anos de<br />
idade, já era um bisonho ‘foca’ da Folha<br />
de Minas, portador de registro profissional<br />
do Ministério do Trabalho.<br />
Aprendi muito também durante as aulas<br />
de Português, no Colégio Tristão de<br />
Athayde. O professor Orosimbo me<br />
dava dicas de como escrever certo. Na<br />
redação do jornal, as matérias passavam<br />
por revisões de textos e das<br />
provas gráficas encaminhadas pelos<br />
linotipistas. Os erros eram perseguidos.<br />
E mesmo assim alguns<br />
escapavam. Hoje não existe o setor<br />
de revisão de textos e nem de<br />
provas gráficas. Por isso, cobrase<br />
rigor correção na redação do repórter.<br />
Vejam as dicas de como escrever<br />
certo para jornal impresso. A<br />
maioria é resultado de anotações de<br />
copidesques e de revisores, também<br />
do prof. Orosimbo.<br />
— Evite frases exageradamente<br />
longas, por dificultarem<br />
a compreensão<br />
da ideia contida nelas, e,<br />
concomitantemente, por<br />
conterem mais de uma<br />
ideia central, o que nem<br />
sempre torna o seu conteúdo<br />
acessível, forçando,<br />
desta forma, o<br />
pobre leitor a separá-la<br />
em seus componentes<br />
diversos, de forma a<br />
torná-las compreensíveis,<br />
o que não deveria<br />
ser, afinal de contas,<br />
parte do processo da leitura,<br />
hábito que devemos<br />
estimular através do uso<br />
de frases mais curtas.<br />
— Analogias na escrita<br />
são tão úteis quanto chifres<br />
numa galinha.<br />
— Não abuse das exclamações!<br />
Seu texto fica<br />
horrível! Sério!<br />
— Estrangeirismos estão<br />
out, palavras de origem<br />
portuguesa estão in.<br />
— Seja seletivo no<br />
emprego de gíria, bicho.<br />
Mesmo que sejam<br />
maneiras. Sacou, galera?<br />
MULHER SINCERA<br />
Tarde da noite o telefone toca.<br />
Marido: ‘Se for pra mim, diga que não<br />
estou em casa’.<br />
Mulher atende e diz: ‘Ele está em casa’.<br />
E desliga.<br />
Marido: Droga!!!<br />
Mulher: Era pra mim.<br />
40<br />
OUTUBRO DE 2018 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
— Palavras de baixo<br />
calão podem<br />
transformar seu texto<br />
numa merda.<br />
— Nunca generalize: generalizar<br />
sempre é um<br />
erro.<br />
— Use a pontuação corretamente<br />
o ponto e a<br />
vírgula especialmente<br />
será que ninguém sabe<br />
mais usar o sinal<br />
de interrogação<br />
— Nunca use<br />
siglas desconhecidas,<br />
conforme<br />
recomenda<br />
a<br />
N.A.O.R.<br />
— Evite abrev.<br />
etc.<br />
— “não esqueça<br />
das maiúsculas”,<br />
como já dizia<br />
orosimbo, meu<br />
professor de português<br />
lá no colégio tristão de<br />
atahyde, em santa tereza,<br />
belo horizonte.<br />
— Evite repetir a mesma<br />
palavra, pois essa palavra<br />
vai ficar repetitiva. A<br />
repetição vai fazer com<br />
que a palavra seja<br />
repetida.<br />
— Não abuse das citações.<br />
Como costuma dizer<br />
meu pai: “Quem só<br />
cita os outros não tem<br />
ideias próprias”.<br />
— Frases incompletas podem<br />
causar.<br />
— Seja mais ou menos específico.<br />
— Evite mesóclises. Repita<br />
comigo: “mesóclises:<br />
evitá-las-ei!”<br />
— Cuidado com a orthographia,<br />
para nao estrupar<br />
a lingua.<br />
— Seja incisivo e coerente.<br />
Ou talvez seja melhor<br />
não...<br />
— Não seja redundante,<br />
não é preciso dizer a<br />
mesma coisa de formas diferentes,<br />
isto é, basta mencionar<br />
cada argumento<br />
uma só vez. Em outras palavras,<br />
não fique repetindo<br />
a mesma ideia.<br />
— A voz passiva deve ser<br />
evitada.<br />
MOMENTOS GOZOSOS<br />
Após uma eucaristia<br />
noturna, o casto e<br />
derreado frei Mardoqueu<br />
explica para a impoluta<br />
Ozilda, no convento da<br />
Medalha Milagrosa, em<br />
Uberaba<br />
(MG), o que<br />
significa o fim<br />
dos momentos<br />
gozosos na meia<br />
idade:<br />
— É quando<br />
o trabalho já<br />
não dá prazer<br />
e o prazer<br />
começa a<br />
dar trabalho.<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 41
A CONDIÇÃO HUMANA<br />
FALAR DOS OUTROS<br />
PELAS COSTAS<br />
FAZ BEM PARA<br />
A SAÚDE<br />
(A SUA)<br />
FOFOCAR COM ALGUÉM SOBRE OS<br />
DEFEITOS (DOS OUTROS) É UM<br />
COMPORTAMENTO TÃO NATURAL<br />
COMO BEBER ÁGUA. E ISSO NÃO É<br />
NECESSARIAMENTE MAU<br />
SARA SÁ<br />
Existe a política, o esporte, a música,<br />
a economia. No entanto, todos<br />
estes assuntos importantes e<br />
sérios só ocupam um terço do tempo<br />
que gastamos em nossas conversas. A<br />
fatia do leão dos momentos com parentes<br />
e amigos está por conta dos assuntos<br />
sociais (chamemos-lhe assim): casamentos,<br />
batizados, amores e ódios. A<br />
conclusão é de Robin Dunbar, o professor<br />
da Universidade de Oxford, referência<br />
no estudo da Antropologia e da Psicologia<br />
Evolutiva.<br />
Numa análise conduzida pelo pesquisador,<br />
que se dedica também ao acompanhamento<br />
de primatas, dois terços de<br />
todas as conversas, que mantemos ao<br />
longo da vida, são sobre relações pessoais,<br />
que é como quem diz: fofocar. Em<br />
termos sociológicos, define-se o termo<br />
como o ato de falar de alguém, emitindo<br />
uma avaliação da pessoa e do seu comportamento,<br />
quando o visado não está<br />
presente. O famoso falar pelas costas.<br />
Todos praticamos este exercício, homens<br />
e mulheres, novos e velhos, na aldeia<br />
ou na cidade, no café ou nas redes<br />
sociais. E não vem mal nenhum ao<br />
mundo por isso, apesar de, desde pequeninos,<br />
nos sentirmos culpados por<br />
42<br />
OUTUBRO DE 2018 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
este tipo de atitudes. Aliás, classificar alguém<br />
como fofoqueiro tem normalmente<br />
uma conotação negativa. E é verdade<br />
que, por vezes, o mexerico pode ser<br />
usado de forma nefasta para autopromoção,<br />
confundindo-se com a intriga.<br />
Porém, psicólogos e antropólogos têm<br />
realçado outros aspectos, e positivos, do<br />
ato de falar acerca da vida de outrem. E<br />
isso, além de não ser um comportamento<br />
negativo, pode estar na base do<br />
aparecimento da linguagem. “O fato de<br />
estes temas serem tão importantes para<br />
nós sugere que esta seja uma função primordial<br />
da linguagem”, afirmou Robin<br />
Dunbar, num artigo publicado na revista<br />
The Atlantic. “A fofoca é o que possibilita<br />
a existência de sociedades humanas, tal<br />
como as conhecemos.”<br />
FORA DO MEXERICO, FORA DO GRUPO. Por<br />
que razão precisamos de desenvolver<br />
uma forma tão eficaz de comunicar?<br />
Na teoria deste pesquisador,<br />
a necessidade foi surgindo à medida<br />
que os humanos cresceram<br />
e se multiplicaram. De grupos pequenos,<br />
em que todos os elementos<br />
se conheciam bem, os<br />
nossos antepassados passaram<br />
a viver em comunidades<br />
cada vez maiores. A sobrevivência<br />
num ambiente hostil<br />
e agreste obrigou a que<br />
houvesse uma boa comunicação<br />
e uma excelente<br />
cooperação entre o<br />
grupo. Ao mesmo tempo,<br />
também se tornou essencial<br />
perceber quem é quem<br />
– onde estão as ameaças e a<br />
concorrência, quer em termos de alimento<br />
quer em termos de acasalamento.<br />
Quem é de confiança, quem é mentiroso,<br />
quem daria o melhor parceiro, o aliado<br />
mais forte. Dar e receber este gênero de<br />
informação passou a ser essencial. “Os<br />
indivíduos que eram mais competentes a<br />
usar a sua inteligência social, a interpretar,<br />
prever e influenciar o comportamento<br />
dos outros tornaram-se mais<br />
bem-sucedidos do que os que não o<br />
eram”, escreve o professor de Psicologia<br />
Frank T. McAndrew, da Universidade<br />
Knox, nos Estados Unidos da América,<br />
num artigo de divulgação científica do<br />
site The Conversation.<br />
z<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 43
Os genes destes indivíduos – os vencedores<br />
do grupo – prevalecem até hoje, ou<br />
seja, a nossa preocupação com a vida<br />
dos outros é uma herança do cérebro<br />
pré-histórico, que nos dá vantagem competitiva.<br />
“Hoje em dia, alguém que seja<br />
especialista em falar da vida dos outros é<br />
um influenciador e um membro popular<br />
do seu grupo social. Divulgar segredos é<br />
uma forma de estabelecer ligação e partilhar<br />
um bom mexerico com outra pessoa<br />
é um sinal de confiança profunda:<br />
quem o faz acredita que quem recebe<br />
esta informação sensível não a vai usar<br />
contra si”, continua Frank McAndrew.<br />
É por isso que, por um lado, os mais talentosos<br />
na arte da fofoca estão sempre<br />
mais bem informados e gozam de boa reputação<br />
nos grupos alargados de pessoas.<br />
Por outro, os que se mantêm à margem<br />
das conversas sobre a vida alheia acabam<br />
por não ser bem aceitos, sendo classificados<br />
como pessoas não confiáveis.<br />
DIZE-ME O QUE FALAS... Estudos feitos em<br />
ambientes de trabalho confirmam esta<br />
tese. A fofoca inofensiva, entre colegas,<br />
pode cimentar a coesão do grupo, além<br />
de animar os espíritos. Também é importante<br />
para os recém-chegados, que,<br />
ao participarem numa conversa deste<br />
tipo, imediatamente percebem as normas<br />
e os valores que vigoram na organização.<br />
Em ambiente de trabalho profissional,<br />
a má-lingua tem ainda outra<br />
relevância que é a possibilidade<br />
de se transformar num<br />
estímulo. O receio de que nos<br />
tornemos alvo de mexerico pode<br />
ser uma força positiva que impede<br />
que nos aproveitemos dos outros.<br />
Por exemplo, num estudo feito<br />
com mariscadores de lagosta do Maine,<br />
nos EUA, verificou-se que aqueles que<br />
desrespeitaram as normas de quando e<br />
como as lagostas podiam ser apanha-<br />
44<br />
OUTUBRO DE 2018 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
das eram expostos pelo grupo, ficando<br />
proscritos durante um período.<br />
Há uma certa função social, que permite<br />
interiorizar os comportamentos<br />
aceitáveis e os condenáveis, reforça um<br />
trabalho de um grupo de investigadores<br />
da Universidade de Queensland, Austrália.<br />
“O mexerico do dia a dia ajuda-nos a<br />
construir ligações sociais e a desenvolver<br />
um melhor conhecimento dos grupos e<br />
das sociedades aos quais pertencemos”,<br />
refere-se num comunicado.<br />
Veja-se o caso #MeToo e o movimento<br />
contra o assédio sexual que começou<br />
com o disse-me-disse em torno<br />
do produtor de Hollywood Harvey<br />
Weinstein. “A<br />
fofoca sobre<br />
Harvey<br />
Weinstein<br />
teve sem<br />
dúvida muitas<br />
consequên-<br />
cias negativas para ele, tais como a<br />
perda de trabalho e a expulsão de uma<br />
série de empresas e sociedades, mas<br />
pode também ter tido consequências<br />
para todos nós, os que participamos<br />
nela”, sublinha a psicóloga social daquela<br />
instituição australiana, Jolanda<br />
Jetten. “Fofocar permite-nos monitorizar<br />
a reputação de outras pessoas e, ao<br />
ficarmos a par dos seus comportamentos,<br />
estamos mais bem posicionados<br />
para decidir se devemos confiar nelas<br />
ou não, no futuro”, resume a psicóloga.<br />
A FOFOCA<br />
TEM ETIQUETA<br />
Não é por se tratar de um “prazer culposo” que a<br />
fofoca não deve ter regras. Siga as dicas e tire partido<br />
de uma boa conversa sobre a vida dos outros:<br />
1 MANTER SEGREDO:<br />
Convém ser discreto, para não criar<br />
conflitos.<br />
2 PARTILHAR INFORMAÇÃO ÚTIL:<br />
É preciso que a informação partilhada<br />
seja vantajosa para o grupo, de<br />
modo a ser valorizada.<br />
3 NÃO CONTAR MENTIRAS:<br />
Faltar à verdade pode fazê-lo<br />
perder a credibilidade, além<br />
de prejudicar o visado de<br />
forma injusta.<br />
4 ESTABELECER LIGAÇÃO<br />
COM O OUVINTE:<br />
A passagem da informação deve ser<br />
acompanhada por emoção, o que<br />
potencializa a relação entre os<br />
fofoqueiros.<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 45
ERA SÓ O QUE FALTAVA Ivani Cunha<br />
BUSCAR OVOS<br />
NO MATO,<br />
UM PROGRAMÃO<br />
Quem já passou dos sessenta não<br />
se esquece da gravadora cujos<br />
discos traziam, na capa, a foto de<br />
um cão sentado diante de um gramofone.<br />
Sempre achei muito simpático aquele<br />
cachorro que, vim a saber pela internet,<br />
cha mava-se Nipper. O animal parecia<br />
apreciar o som gerado pelo disco de vinil.<br />
Que música ele estaria ouvindo? Talvez a<br />
“Jardineira” ou “O Ébrio”, esta cantada<br />
por Vicente Celestino... São as minhas<br />
lem bran ças mu sicais mais remotas.<br />
Em meados dos anos 50, as vilas da<br />
periferia de Belo Horizonte atravessavam<br />
seus dias no esquecimento, sem receber<br />
quase nenhuma benfeitoria do poder público.<br />
A vila onde eu morava, na Região<br />
Noroeste da capital, era tão malcuidada<br />
quanto as demais. Lembro-me de um<br />
grande pasto, que seria loteado muitos<br />
anos depois. Parte daquela área é ocupada<br />
atualmente pelo Cemitério da Paz,<br />
que pode ser visto em toda a sua extensão<br />
pelas pessoas que olham do alto do<br />
Bairro Caiçara, do outro lado da Avenida<br />
Carlos Luz, ou da parte mais alta do<br />
Bairro Senhor Bom Jesus.<br />
Falar daquela época me faz lembrar<br />
também da aventura diária de sair à<br />
busca de ovos de galinha nos matos que<br />
tomavam conta dos lotes vagos. Às vezes<br />
não era preciso ir além do lote em frente<br />
a nossa casa para encontrar ovos deixados<br />
nas moitas por galinhas fujonas. Os<br />
46<br />
OUTUBRO DE 2018 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
galinheiros, de cercas bastante precárias,<br />
facilitavam a vida dessas galinhas. Assim<br />
era na maioria das residências, que tinham<br />
seu galo, algumas poedeiras e alguns<br />
frangos. Esses plantéis às vezes duravam<br />
pouco porque qualquer doença se<br />
agravava e dizimava o galinheiro.<br />
Essa vida, que reproduzia o estilo da<br />
época em que as galinhas foram introduzidas<br />
no Brasil, pouco depois do descobrimento,<br />
seguiu enquanto os pioneiros<br />
da avicultura buscavam intercâmbio com<br />
especialistas de outros Estados e do exterior,<br />
sobretudo Estados Unidos. As<br />
grandes agroindústrias avícolas brasileiras<br />
ganharam estrutura no início dos<br />
anos 60, mas as transformações não<br />
chegaram de repente a Minas Gerais.<br />
Vieram por intermédio de benfeitores<br />
como o médico Haroldo Vasconcellos e<br />
outros, abrindo caminho para a produção<br />
das aves em granjas, com seleção<br />
genética, alimentação apropriada e atenção<br />
à saúde dos plantéis. Nessa época,<br />
os meninos que antes buscavam ovos no<br />
mato já eram jovens e, em vez de sair<br />
atrás das galinhas, estavam envolvidos<br />
em caçadas de outras modalidades. No<br />
ritmo das mudanças, não havia mais lotes<br />
tomados pelo matagal e os garotos<br />
dos novos tempos sabiam apenas de ouvir<br />
dizer que tempos atrás buscavam-se<br />
ovos no mato e garotos se escondiam ali<br />
para matar aulas em pequenas cabanas<br />
de galhos e folhas e em rasas cavernas.<br />
Até muito tempo depois do advento<br />
da avicultura organizada e da ocupação<br />
dos lotes, só se ouvia sapos e grilos nas<br />
madrugadas dessa vila de ruas de terra<br />
e muito mato. O canto alternado dos galos<br />
em locais diversos e os sons das galinhas<br />
e de seus pintinhos eram despertadores<br />
de grande precisão. Depois que o<br />
sol tomava conta de tudo, era a vez de<br />
um rádio instalado numa casa situada<br />
na parte mais alta do lugar, ao lado da<br />
capela. Foi há tanto tempo que posso estar<br />
enganado, e talvez se tratasse de<br />
uma radiola instalada numa casa em local<br />
privilegiado, alcançado pela eletricidade,<br />
enquanto as demais se iluminavam<br />
com lampiões ou lamparinas. As<br />
músicas eram sempre as mesmas: “Oh<br />
jardineira, por que estás tão triste, o que<br />
foi que te aconteceu? Foi a Camélia que<br />
caiu do galho, e deu dois suspiros, e depois<br />
morreu ...”; ou o lamento do homem<br />
que se afoga na bebida para esquecer a<br />
ingrata amada que o abandonou ... e<br />
cuja letra não consigo lembrar.<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 47
DEIXARAM-NOS<br />
INAUGURAMOS NESTA EDIÇÃO A NOSSA SEÇÃO DE OBITUÁRIOS,<br />
QUE PRETENDE HOMENAGEAR AQUELES QUE NASCERAM,<br />
VIVERAM OU QUE OFERECERAM ESPERANÇA À VIDA DE CADA<br />
UM DE NÓS. COMO O INESQUECÍVEL CANTOR FRANCÊS<br />
CHARLES ASNAVOUR (22/5/1924 E 1º/10/2018).<br />
UMA DOLOROSA DATA<br />
PARA OS ENAMORADOS<br />
FERREIRA FERNANDES (*)<br />
Charles Aznavour nasceu em Paris,<br />
mas nasceu Shahnour Vaghinagh<br />
Aznavourian. Ou mais complicado<br />
do que isso se o seu nome fosse escrito<br />
em armênio, língua antiga, ainda mais do<br />
que o francês mais antigo. Shahnour foi<br />
um francês de acaso, os pais iam a caminho<br />
da América. O parto interrompeu a viagem<br />
dos Aznavourian, se não eles bem poderiam<br />
estar num convés de navio,<br />
entrando na bacia do rio Hudson e balbuciando<br />
a ilusão: “América, América!”, como<br />
no filme de Elia Kazan, com os imigrantes<br />
armênios frente à Estátua da Liberdade, fugindo<br />
do genocídio que lhes acontecia naqueles<br />
tempos. Shahnour foi um moderno<br />
cidadão comum, nasceu num acaso.<br />
Tantas línguas, datas, filmes, lugares,<br />
tanto, porque é inevitável que seja assim,<br />
a história comum dos homens é vasta. A<br />
de Charles Aznavour também é comum:<br />
ele é só mais um francês que veio do<br />
mundo (como os cantores Montand, italiano,<br />
Brel, belga, Moustaki, grego de Alexandria,<br />
Dalida, italiana do Cairo). Filho de<br />
viajantes, da imigração, como a modernidade<br />
chama a uma das mais vulgares atividades<br />
humanas. Com este acréscimo,<br />
também vulgar: ele é dos imigrantes que<br />
se confundiram com a nova pátria e a enriqueceram.<br />
O francês de acaso é autor<br />
das palavras de mil canções (está bem,<br />
metade disso), muitas delas de sucesso<br />
mundial: Lá Mamma, Sa Jeunesse, La Bohème,<br />
Que C’est Triste Venise...<br />
Mas quero falar-vos de uma que não é<br />
de letra sua, só algumas palavras em canção<br />
de outro. Há dez anos, 2008, o filho<br />
de imigrantes da década de 20 do século<br />
passado cantou numa canção de um imigrante<br />
do novo milénio. O haitiano Kery<br />
James, negro e rapper, gravou À l’Ombre<br />
du Show Business, À Sombra do Negócio<br />
do Espetáculo... Herói popular das banlieues<br />
que cercam Paris, Kery James lançava<br />
um rap com inspiração que parecia<br />
vinda de algures, negra, o vídeo abria com<br />
fotos de Miles Davis, Billie Holyday, Ella<br />
Fitzgerald, mas, de repente, a foto de<br />
Charles Aznavour.<br />
A língua francesa surgia num rap duro<br />
e sincopado, mas tão de francês límpido<br />
e cortante como uma canção da Comuna<br />
de Paris. Kery James desesperava: “A mi-<br />
48<br />
OUTUBRO DE 2018 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
O JÁ SAUDOSO<br />
CHARLES AZNAVOUR<br />
nha arte é um diamante atulhado de cimento”.<br />
Esperava: “Oh, como amo a língua<br />
de Molière, estou ao nível das suas palavras,<br />
sabes tu...”, cantava o haitiano. Aí,<br />
aparece a voz rugosa de sempre, mas<br />
nunca partida nem então com 84 anos, do<br />
seu companheiro de destino: “É preciso<br />
ser otimista, meu irmão”, canta Aznavour,<br />
em resposta: “Porque toda uma juventude<br />
te segue/ A luz pode renascer...” Uma canção<br />
desesperada de um jovem transcende<br />
as diferenças graças a um velho que nos<br />
diz: assim queiramos nós...<br />
Charles Aznavour, um antigo francês<br />
de acaso, um francês de sempre, morreu<br />
hoje. Há dois dias, o presidente francês<br />
Emmanuel Macron<br />
esteve em<br />
Saint-Martin, ilha<br />
francesa das Antilhas<br />
devastada<br />
há um ano por<br />
um ciclone e on -<br />
de escandalosamente<br />
a reconstrução<br />
continua<br />
lenta. Um adolescente<br />
negro<br />
fez uma fotografia<br />
com Macron<br />
e nela vê-se o jovem<br />
a exibir um<br />
indelicado dedo<br />
médio te so...<br />
Gran de es cân -<br />
dalo nos salões<br />
p a r i s i e n s e s ,<br />
maior do que o<br />
denunciado dias<br />
antes por as roças<br />
bananeiras<br />
das Antilhas francesas<br />
serem envenenadas<br />
pelo<br />
hexabromobifenil, produto tóxico que causa<br />
cancro há várias décadas.<br />
Macron mandou pastar os hipócritas e<br />
não criticou o jovem malcriado: “Amo cada<br />
filho da República, quaisquer que sejam<br />
as suas tolices, porque muitas vezes, porque<br />
filho da República, ele não escolheu<br />
onde nasceu e não teve a oportunidade de<br />
fazer outra coisa.” O artista Charles Aznavour<br />
saberia dizer isto com mais melodia<br />
e melhores palavras, mas no fundo era o<br />
que diria.<br />
(*) Ferreira Fernandes é jornalista,<br />
editor do Diário de Notícias, de<br />
Lisboa.<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 49
HORA EXTRA<br />
O HUMOR<br />
CORROSIVO<br />
DO ARGENTINO<br />
DIEGO<br />
PARÉS<br />
COMO NÃO HÁ JEITO DE FAZER HUMOR SEM OFENDER<br />
ALGUÉM, SUA RESPOSTA AOS POLITICAMENTE CORRETOS É:<br />
DANEM-SE. OU UMA FRASE AINDA PIOR<br />
JOÃO PAULO COLTRANE<br />
Em setembro do ano passado, o nosso<br />
amado editor geral foi a Montevidéu<br />
prestar sua homenagem ao centenário<br />
de La Cumparsita, maravilhoso<br />
tango do uruguaio Gerardo<br />
Mattos Rodriguez.<br />
A música foi composta<br />
quando o autor tinha<br />
apenas 19 anos e se<br />
sentia condenado à<br />
morte, pois fora atingido<br />
por tuberculose.<br />
Numa época em que<br />
não existia a penicilina,<br />
a doença era sinônimo<br />
de morte certa.<br />
Milagrosamente o<br />
autor não morreu. Levada<br />
para argentina, a<br />
partitura ganhou letra<br />
de Pascual Acursi e se tornou sucesso<br />
mundial na voz magnífica de Carlos Gardel.<br />
Nesses cem anos, o tango recebeu<br />
mais de 500 gravações e se tornou uma<br />
das dez músicas mais<br />
tocadas no mundo.<br />
Duas outras são brasileiras:<br />
Aquarela do Brasil e<br />
Garota de Ipanema.<br />
Ainda em Buenos Aires,<br />
onde tentou tocar a<br />
música no túmulo de<br />
Gardel, o amado editor<br />
ligou-me para dizer que<br />
tinha um presente para<br />
mim. Esqueci de revelar<br />
aos amáveis leitores que<br />
o maioral da nossa redação<br />
atormenta os<br />
seus vizinhos com os<br />
50<br />
OUTUBRO DE 2018 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
trinados de um saxofone tenor que ele garante<br />
ser idêntico ao de Charlie Parker.<br />
Sim, idêntico mas apenas na mesma marca<br />
Selmer francesa (que, no caso, merecia<br />
melhor destino). Mais não falo porque<br />
procurar emprego não é empreitada fácil.<br />
Ao atender o telefone, em me recordei<br />
dos seus habituais presentes de viagens<br />
que consistem invariavelmente em canecos<br />
para café ou chocolate, adornado com inscrições<br />
do tipo Estive em<br />
Aparecida e me lembrei de<br />
você. Tenho uns dez copos<br />
desses no armário da minha<br />
casa, sempre na esperança<br />
que minha governanta,<br />
dona Lindaura derrube<br />
alguns no piso de cerâmica.<br />
Mas isso nunca aconteceu.<br />
Parece que sua viagem<br />
foi a do nunca. Em Montevidéu,<br />
já não existe mais o bar,<br />
La Giralda, onde a música<br />
foi apresentada pela primeira<br />
vez. Em Buenos Aires, o<br />
motorista de taxi lhe garantiu que, assim<br />
como Elvis, Gardel também não morreu e<br />
está cantando como nunca. Por último, o<br />
presente recebido não foi o caneco, mas o<br />
fantástico livro Humor Petiso (Humor pequeno)<br />
do chargista Diego Parés.<br />
Aqui peço licença para falar um pouco<br />
do artista. Parés nasceu em 11 de maio de<br />
1970 e com apenas 22 anos apareceram<br />
suas primeiras publicações do grande diário<br />
La Nación, de Buenos Aires.<br />
Editou vários livros, entre<br />
eles o divertido A Esperança<br />
foi a Última que se<br />
Perdeu. Eu poderia gastar<br />
rios de tinta para falar sobre<br />
seu humor absurdo, como<br />
os narigões de seus personagens,<br />
e absolutamente inteligente,<br />
como é da tradição<br />
do humor argentino.<br />
Prefiro mostrar os desenhos.<br />
Veja você mesmo e nos envie<br />
seus comentários.Parte<br />
superior do formulário<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 51
PALAVRA DO LEITOR<br />
EU SEI ABRIR PORTAS<br />
Leio frequentes notícias dizendo que<br />
este ou aquele político será nomeado secretário<br />
ou ministro porque é especialista<br />
em abrir portas para bons negócios. Abrir<br />
portas é a minha especializada e faço melhor<br />
que todos. Sou porteiro de um hotel<br />
cinco estrelas de Belo Horizonte desde<br />
sua fundação, há mais de 15 anos. Confesso<br />
que me comovi quando constatei que a<br />
abertura de portas era, finalmente, valorizada<br />
como merece. Tendo em conta a minha<br />
experiência de cerca de 20 anos precisamente<br />
nessa área, creio que sou um<br />
bom candidato a desempenhar funções<br />
em qualquer instituição.<br />
JOSÉ GERALDO MACEDO<br />
BH/MG<br />
SEJAM SÉRIOS,<br />
PELO MENOS UMA VEZ<br />
O Brasil está repleto de problemas, como<br />
todos os candidatos disseram na campanha<br />
eleitoral. No entanto, essa revista parece<br />
que é editada em outro planeta, com<br />
páginas e páginas sobre piadas e conversas<br />
engraçadinhas, sobretudo na depreciação<br />
de mulheres. Porque vocês não tratam de<br />
algo sério, pelo menos uma vez na vida?<br />
MÔNICA ALVARENGA MATTOS<br />
BH/MG<br />
NOTA DA REDAÇÃO – Deveremos publicar,<br />
numa edição futura, a tese de um conhecido<br />
hematologista da Transilvânia desenvolvida<br />
com o propósito de provar que o estresse<br />
abandona o corpo humano se a<br />
pessoa ri pelos menos 120 minutos a cada<br />
dia. É o tempo de uma partida de futebol,<br />
incluindo o intervalo de descanso dos atletas<br />
e mais os acréscimos em cada tempo.<br />
Segundo o cientista, o tempo liberado será<br />
imediatamente ocupado por muitas manifestações<br />
de alegria, mesmo se ele estiver<br />
num congestionamento durante toda a<br />
tarde no Anel Rodoviário.<br />
52<br />
OUTUBRO DE 2018 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
Segundo trechos do documento, antecipados<br />
com exclusividade para Ma té -<br />
riaPri ma, os benefícios do riso vão muito<br />
além da diversão, propriamente, que é<br />
cada vez mais importante. O riso pode ser<br />
um redutor da pressão arterial, um impulsionador<br />
do sistema imunológico, um destruidor<br />
de bactérias e um fazedor de amigos.<br />
A seguir, o que ele sugere.<br />
Ame sua risada. Nunca se preocupe se as pessoas<br />
vão pensar que o seu riso é alto, nasal<br />
ou um detestável cacarejo. Isso é problema<br />
delas, os invejosos e críticos. Lembre-se de<br />
que sua risada é parte de sua identidade e au -<br />
to-estima, e é essencial para consolidar psico -<br />
logicamente quem você é. Inibir a gargalhada<br />
é colocar sua saúde e felicidade em risco.<br />
Veja o riso como uma coisa positiva. Claro a risada<br />
pode ter o sentido do deboche isso deve<br />
ser evitado. A não ser que você deseja ouvir:<br />
“Você tá rindo de que, seu palhaço?”.<br />
Mas rir com os amigos é ótimo. A risada é<br />
boa quando não é à custa de ninguém, exceto<br />
do Joãozinho, do português, ou do papagaio,<br />
que nunca reclamam.<br />
Não se preocupe em ser engraçado. As pessoas<br />
gostam de pessoas divertidas. Se você<br />
não sabe contar histórias divertidas nem<br />
piadas, basta se vestir com um nariz de<br />
palhaço ou um chapéu-coco do Chaplin<br />
e saia espalhando alegria. Busque a<br />
companhia de pessoas que têm um<br />
senso de humor. É muito melhor que<br />
aqueles que só falam de política, futebol e<br />
religião. Passe um tempo com seus amigos<br />
alegres. Pague uma cerveja para aquele<br />
primo pateta. Os laços sociais e os benefícios<br />
do riso são bens valiosos e vale o esforço.<br />
SAUDADES DO VOTO NULO<br />
Tivemos as eleições para presidente da<br />
República e governadores. A urna eletrônica<br />
tornou a apuração das eleições muito<br />
rápida. Gasta-se mais tempo para votar<br />
que para contar os votos. A eleição tornouse<br />
higiênica, insípida e inodora, pois sinto<br />
falta do voto nulo e da possibilidade de o<br />
eleitor, como eu, manifestar abertamente<br />
sua opinião sobre certos políticos e também<br />
sobre a mãe deles.<br />
Infelizmente, o estudo dos resultados eleitorais<br />
ignora quase sempre a evolução da<br />
mais fascinante categoria de votos. Os votos<br />
nulos eram depositados na urna por eleitores<br />
que faziam questão de ir à eleição para<br />
deixar claro que não faziam questão nenhuma<br />
de votar. Pessoas que respeitam o sistema<br />
eleitoral o suficiente para comunicarem oficialmente<br />
que não o respeitam de todo.<br />
É gente que ia, ordeiramente, fazer um pequeno<br />
desacato. No entanto, estes rebeldes<br />
da democracia são ignorados pela justiça<br />
eleitoral. Os votos brancos são todos iguais,<br />
mas cada voto nulo é nulo à sua maneira.<br />
LUÍS FLÁVIO ARAÚJO<br />
BH/MG<br />
TERAPIAS ALTERNATIVAS<br />
NÃO CURAM, MATAM<br />
Muito reveladora a entrevista com o<br />
Doutor Enaldo Lima, diretor do Hospital Integrado<br />
do Câncer, da Rede Mater Dei de<br />
Saúde sobre as vitórias diárias no combate<br />
a essa terrível enfermidade.<br />
Mas me preocupa, em especial, o desespero<br />
de pessoas que buscam soluções não<br />
científicas para sua doença. Há algum<br />
tempo, brasileiros desesperados, portado-<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 53
es de câncer, buscam socorro numa suposta<br />
pílula contra o câncer, produzida por<br />
um charlatão no interior de São Paulo. Tive<br />
na família um doloroso caso de parente que<br />
desistiu da medicina e procurou tratamento<br />
alternativo. Morreu em menos de um ano.<br />
Desse lamentável episódio, percebi que,<br />
quando um doente procura um terapeuta<br />
alternativo antes de procurar um médico<br />
corre o risco de não ter um diagnóstico correto<br />
para a sua doença e, quando finalmente<br />
decide ir ao médico (se o chegar a<br />
fazer), pode ser tarde demais. Um diagnóstico<br />
errado pode implicar um tratamento<br />
que, no mínimo, não tem qualquer impacto<br />
na saúde do doente — não trata o verdadeiro<br />
problema, mas também não prejudica<br />
— ou, no limite, pode agravar a doença. A<br />
falta de tratamento adequado deixa a<br />
doença evoluir por si.<br />
“Os doentes com câncer que escolhem<br />
iniciar os tratamentos com terapias alternativas,<br />
sem recorrer aos tratamentos convencionais,<br />
têm maior probabilidade de<br />
morrer”, concluíram os investigadores da<br />
Uni ver si da de de Yale num artigo publicado<br />
na revista científica Journal of the National<br />
Cancer Institute. Os autores do trabalho<br />
lembram que se focaram em cânceres que<br />
podiam ser eliminados com tratamentos<br />
convencionais (usados pela medicina ocidental).<br />
Foi o caso de Steve Jobs, que tinha<br />
uma forma de câncer pancreático relativamente<br />
fácil de tratar, mas que optou por<br />
fazê-lo com terapias alternativas. Quando<br />
decidiu recorrer à medicina convencional já<br />
foi tarde demais, o câncer já tinha se espalhado<br />
por outros órgãos.<br />
PAULO HENRIQUE BERNARDES<br />
BH/MG<br />
JUSTIÇA SEM SOLUÇÃO<br />
O promotor Eduardo Nepomuceno declarou<br />
em entrevista à revista <strong>Matéria</strong><br />
<strong>Prima</strong> que corrupção prospera no país devido<br />
à impossibilidade de se investigar todos<br />
os casos de roubo do patrimônio público.<br />
Segundo ele, o Ministério Público só<br />
toma conhecimento de 1% dos casos de<br />
desvio de recursos nacionais. Diante disso,<br />
o crime compensa.<br />
Concordo. Mas há outros problemas<br />
graves que impedem a realização da justiça<br />
no país. Atualmente, há mais de 92 milhões<br />
de processos em andamento no Brasil,<br />
o que representa algo como um<br />
pro cesso para cada dois habitantes, se<br />
considerarmos a população de 202,7 milhões<br />
de brasileiros. Na Austrália, há um<br />
processo para cada 6,4 mil cidadãos.<br />
Tomando-se como base o ano de 1988,<br />
quando foi promulgada a Constituição Federal,<br />
tem-se que nesses 30 anos o número<br />
de processos ajuizados multiplicouse<br />
em mais de 80 vezes. Em 1988, foram<br />
movidas 350 mil novas ações; em 2001: 12<br />
milhões; em 2009: 25,3 milhões; em 2011:<br />
26,2 milhões; em 2017: 28,2 milhões.<br />
Ainda que tenha quintuplicado o número<br />
de juízes − de 4.900 juízes em 1988,<br />
para 20.230 em 2017 – o Judiciário não<br />
tem como acompanhar esse ritmo. Em<br />
média, o Brasil possui a segunda maior<br />
carga de trabalho do mundo (4.616 processos<br />
juiz/ano), e tem a maior taxa de congestionamento<br />
(70%), o que implica que<br />
a cada 100 novos processos entrados, somente<br />
30 terão solução em curto prazo, e<br />
70 ficarão nas prateleiras, mesmo que o<br />
país se esforce para ser o terceiro em produtividade,<br />
segundo dados de 2008.<br />
O Brasil se tornou um país litigioso. Tudo<br />
é resolvido na Justiça. Não há jeito de se<br />
resolver alguns problemas de forma autônoma<br />
sem necessidade de mediação de<br />
um juiz de Direito?<br />
ADALBERTO GASPARINI<br />
BH/MG<br />
54<br />
OUTUBRO DE 2018 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR