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Orion 3 & 4

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Anôa pegou em Mali, que tinha saído de dentro<br />

dela, e devolveu-a à mãe, uma das mães, uma mãe biónica<br />

com uma inteligência artificial cujo único objetivo era ser<br />

mãe, saltou da cama, cobriu-se com um vestido de linho<br />

com pequenas flores pintadas na bainha, calçou as<br />

sandálias de corda e saiu com um beijo nas bochechas de<br />

Mali e outro no rosto metálico da mãe.<br />

Diziam que em tempos tinham sido pessoas de<br />

verdade, modificadas eletronicamente, fora-lhes<br />

incorporado uma inteligência artificial programada para<br />

o desempenho daquela função, tal como aos Educadores<br />

e aos Cuidadores.<br />

Anôa fazia isto muitas vezes, escapava das aulas a<br />

meio da manhã e dava uma corrida rápida até à praia no<br />

rio.<br />

Quinhentos metros de floresta fechada a<br />

separavam do recreio da escola até àquela pequena clareira<br />

de areia grossa salpicada por pedras. Ágil, ao primeiro pé<br />

na areia, desfazia-se da roupa em segundos e após dois<br />

saltos atirava-se de cabeça para o fundo do rio surgindo<br />

alguns metros mais baixo na curva onde a praia acabava e<br />

começava a formação côncava com a graça de um ilha ao<br />

centro.<br />

Anôa não precisava de grande esforço para chegar<br />

ao topo onde se deitava, deliciada, de rosto voltado para<br />

a superfície das águas calmas do rio, as pernas dançavam<br />

atrás da sua cabeça. Era uma menina quase mulher, tinha<br />

crescido de uma forma muito rápida, o que lhe<br />

proporcionou uma estranha magreza de ossos salientes e<br />

pouca carne. Era preocupação constante das mães que<br />

insistiam na sua alimentação.<br />

De olhos pequenos, redondos, curiosos, de um<br />

verde muito vivo e nariz aquilino num rosto em forma de<br />

coração onde os lábios pareciam que bailavam animados<br />

de boa disposição. Anôa não era bonita mas era<br />

engraçada, bem-humorada, cheia de vitalidade e boa<br />

disposição, uma força da natureza que cansava todos e era<br />

causa de distração.<br />

Ali era o seu lugar secreto, onde podia admirar um<br />

velho peixe de dentes afiados e que já considerava seu<br />

amigo. Acompanhava o seu ritual, diário, que consistia<br />

em apanhar conchas do fundo do rio e, depois,<br />

consecutivamente, atirava-as contra a rocha até se<br />

partirem para se alimentar do seu conteúdo. Fazia isto<br />

repetidamente, incansável, chegando a durar duas horas a<br />

partir as conchas mais rígidas e disso dependia a sua vida.<br />

Anôa sentia-se fascinada com aquela determinação.<br />

Aquela tarefa tinha o fim de suprimir a<br />

necessidade do peixe se alimentar. Se deixasse de o fazer<br />

morreria de fome, chegou a essa conclusão como uma<br />

revelação.<br />

Executar uma tarefa. Seria isso possível?<br />

Extraordinário!! Tinha que experimentar.<br />

Atirou-se á água, apanhou duas conchas, partiu-as<br />

de encontro à rocha e engoliu a magra recompensa. Pulou<br />

e riu, cheia de orgulho em si própria, um novo<br />

sentimento se apoderava dela, uma autossatisfação<br />

impossível de ser descrita.<br />

Tinha executado uma tarefa que lhe<br />

proporcionou alimento. Isso era novidade.<br />

No reduto do Círculo Arco Íris os Cuidadores<br />

executavam todas as tarefas de subsistência enquanto as<br />

Mães cuidavam das crianças e os Educadores ensinavam.<br />

Era assim desde que aquela Colónia tinha<br />

chegado àquele planeta, uma nave com um exército de<br />

Cuidadores, Mães e Educadores, cuja única finalidade era<br />

defender, criar e educar uma centena de humanos, ainda<br />

em estado embrionário, ativados quando a chegada após<br />

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