Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
— Não — respondi.<br />
As pesso<strong>as</strong> da minha idade não frequentavam aquele café.<br />
— Talvez você nunca mais a veja.<br />
— E…?<br />
— Você só viu cinco minutos da história de Ruth. E é <strong>as</strong>sim que são <strong>as</strong> cois<strong>as</strong>.<br />
Só que Ruth vai seguir sua vida mesmo se você não voltar a vê-la. Ela faz uma<br />
porção de cois<strong>as</strong> que algum<strong>as</strong> pesso<strong>as</strong> veem e outr<strong>as</strong> não. A sua versão da história<br />
de Ruth serão os cinco minutos que você ficou aqui e foi atendida por ela. É<br />
<strong>as</strong>sim que são <strong>as</strong> cois<strong>as</strong>.<br />
— Entendi. M<strong>as</strong> o que isso tem a ver com O ceifador de chicletes? Ruth é real.<br />
Wrigley é um personagem fictício.<br />
— Não existe isso de personagem fictício.<br />
— Como <strong>as</strong>sim?<br />
Ele tomou um gole de café e abriu um sorriso.<br />
— Olha, eu escrevi esse livro há muito tempo. Você nem era n<strong>as</strong>cida. É difícil<br />
lembrar o que eu pensava naquela época. Mal lembro o que comi hoje de<br />
manhã! Você me parece uma jovem inteligente. Não precisa que eu lhe explique<br />
nada.<br />
Minha cabeça girava. Voltei a minha lista de pergunt<strong>as</strong>.<br />
— O que você quer dizer quando fala que Wrigley quer desistir? No livro. Ele<br />
fala isso toda hora. Desistir de quê?<br />
Ele arqueou <strong>as</strong> sobrancelh<strong>as</strong>.<br />
— Você nunca teve vontade de largar alguma coisa que todo mundo faz você<br />
sentir que precisa continuar fazendo? Nunca teve vontade de… parar?<br />
— Não sei… quer dizer… acho que sim — respondi, embora eu soubesse<br />
exatamente como era aquela sensação.<br />
Um silêncio se instalou entre nós, como naqueles momentos em que de<br />
repente notamos <strong>as</strong> partícul<strong>as</strong> de poeira dançando à nossa volta ao sol da tarde e<br />
nos perguntamos como não reparamos naquilo antes.<br />
— Por que não falamos menos sobre minha carreira frac<strong>as</strong>sada como<br />
romancista e mais sobre você? — sugeriu ele, enfim quebrando o silêncio. —<br />
Você se considera uma pessoa feliz?<br />
Acho que ninguém nunca se dera ao trabalho de me fazer aquela pergunta.<br />
— Como <strong>as</strong>sim? — falei, tentando ganhar tempo para pensar em uma<br />
resposta inteligente.<br />
Quando foi a última vez que alguém lhe perguntou se você era feliz e olhou