Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
minha mãe, simplesmente por vê-la expressar preocupação com a menina. Talvez<br />
ninguém nunca fal<strong>as</strong>se com Rebecca, sei lá. Assim que terminou o<br />
interrogatório, minha mãe entrou em ação.<br />
— Então, está pronta para resgatar aquela cozinha azul-desinfetante dos anos<br />
1970 direto para o século XXI? É um investimento que você vai recuperar em<br />
dobro quando vender o imóvel. Eu garanto. Retorno garantido.<br />
A sra. Shaeffer não parecia muito interessada em reformar a cozinha nem em<br />
vender a c<strong>as</strong>a, m<strong>as</strong> não queria decepcionar minha mãe. Na hora, senti como se<br />
ela estivesse extorquindo a mulher, tentando arrancar dela uma grana preta por<br />
algo que dificilmente seria uma prioridade. Aquela foi a primeira vez que<br />
realmente desgostei da minha mãe. Eu a odiei um pouco naquele dia, embora<br />
soubesse que aquele era seu trabalho e que persuadir <strong>as</strong> pesso<strong>as</strong> a reformar a c<strong>as</strong>a<br />
era o que nos permitia levar o estilo de vida de que a gente tanto gostava — só<br />
que no fundo eu não gostava tanto <strong>as</strong>sim do “nosso estilo de vida”, e estava<br />
começando a achar que meus pais também não.<br />
Quando nos despedimos da sra. Shaeffer e sua filha, minha mãe olhou para<br />
trás, para ter certeza de que não nos ouviriam, e disse:<br />
— Se a garota está tão doente que não pode ir à escola, como pode estar no<br />
shopping caindo de boca num frango xadrez? É revoltante que ela deixe a filha<br />
engordar tanto e jogue a culpa na <strong>as</strong>ma. Muit<strong>as</strong> cois<strong>as</strong> na vida têm origem na<br />
nossa saúde mental, Nanette. Anote o que digo. Fico feliz que eu não precise me<br />
preocupar com isso em você. Nem com sua aparência. Temos tanta sorte!<br />
— Por que você insistiu daquele jeito para a sra. Shaeffer reformar a cozinha?<br />
— perguntei, m<strong>as</strong> me arrependi no instante seguinte, por medo de que ela se<br />
sentisse atacada.<br />
Minha mãe respondeu prontamente:<br />
— Eu levo beleza, cl<strong>as</strong>se e estilo ao lar de mulheres comuns, que não têm<br />
outros atrativos. Elevo a autoestima del<strong>as</strong>. Sabia que estudos comprovam que até<br />
a vida sexual dos c<strong>as</strong>ais melhora após uma reforma na c<strong>as</strong>a? É verdade.<br />
Estava claro que minha mãe acreditava totalmente naquilo e que agora<br />
tentava me convencer, então não falei mais nada, embora no fundo quisesse<br />
morar numa c<strong>as</strong>a velha e antiquada que realmente tivesse vida e fosse cheia de<br />
mistério, história e magia — o oposto da nossa, em que eu me sentia num<br />
catálogo atualizado constantemente com <strong>as</strong> nov<strong>as</strong> tendênci<strong>as</strong>. E não queria nem<br />
imaginar os efeitos daquilo sobre o que meus pais faziam entre quatro paredes.<br />
Meu pai trabalha com alguma coisa relacionada ao mercado de ações, m<strong>as</strong>