RCIA - ED. 98 - SETEMBRO 2013
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crônica<br />
PRIMAVERA<br />
LUIZ CARLOS B<strong>ED</strong>RAN*<br />
O mês aziago e<br />
sombrio de agosto,<br />
o dos estertores<br />
do inverno,<br />
o dos acontecimentos trágicos que coincidentemente<br />
sempre acontecem no mundo<br />
neste mês, mais aqueles que ocorreram na<br />
cidade, manchada indelevelmente pela deletéria<br />
simbiose entre política e polícia, felizmente<br />
já terminou, faz parte do passado e<br />
virou História.<br />
Agora que estamos em pleno setembro,<br />
o mês do início da primavera, essa estação<br />
do ano que deveria ser permanente, porque<br />
é a mais bonita de todas e não apenas pelo<br />
desabrochar das flores, mas, sobretudo<br />
pela renovação da natureza, é o caso de se<br />
pensar sobre as consequências da rápida<br />
degradação ambiental que tem ocorrido em<br />
nosso país.<br />
Todo mundo quer aproveitar ao máximo<br />
as benesses produzidas pela sociedade<br />
de consumo, como se o nosso planeta<br />
fosse acabar amanhã, e assim desperdiça<br />
abusivamente o que poderia aproveitar de<br />
modo racional. Esquecemo-nos de que,<br />
não somente o mundo não se extinguirá tão<br />
rapidamente, como a natureza é renovável,<br />
mas apenas até certo ponto.<br />
É verdade que a popularização no usufruir<br />
dos bens de consumo que nos atingiu<br />
a todos, nos tornou mais felizes; no entanto,<br />
tudo tem seu preço e esse preço é alto, pois<br />
não conseguimos controlar essa ânsia consumista<br />
e ainda não nos conscientizamos<br />
de que sacrificaremos as gerações posteriores,<br />
as de nossos filhos e netos. Esses<br />
depois nos cobrarão: “- Por que os nossos<br />
pais e avós deixaram acontecer? Por que<br />
eles não pensaram nisso?”.<br />
Desperdício de energia elétrica que nos<br />
obriga a construir mais usinas hidro ou termoelétricas<br />
ou usando dos derivados do<br />
petróleo, cuja exploração tem limites (hoje<br />
sendo substituída (nos EUA) pelo xisto,<br />
mais viável economicamente); alimentos<br />
aproveitáveis jogados ao lixo e este não<br />
sendo reciclável; destruição de florestas<br />
indiscriminadamente, levando a terra à<br />
erosão e à desertificação e ao aumento da<br />
temperatura (nos próximos 100 anos, mais<br />
3 graus, segundo os cientistas).<br />
Tudo isso prezado leitor e querida leitora,<br />
toda essa conversa mole, para dizer que<br />
fiquei chocado com a degradação ambiental<br />
do Rio Taquari, no Mato Grosso do Sul,<br />
que desemboca no Pantanal - de onde vim<br />
recentemente de uma pescaria após uma<br />
ausência de alguns anos - e fui obrigado a<br />
fazer essa inferência entre a primavera e a<br />
natureza.<br />
Um rio que conheço há décadas, que<br />
era muito piscoso, mas já não o é mais, não<br />
somente pelo assoreamento causado pelas<br />
grandes plantações de soja em seu entorno,<br />
como pela construção de barragens pelos<br />
fazendeiros, para o aproveitamento da terra<br />
para o gado, mas, inevitavelmente impedindo<br />
a reprodução de peixes nos baixios.<br />
O pior de tudo foi ver o lixo da cidade<br />
sendo levado pela correnteza, como latinhas<br />
de cerveja, garrafas pet, materiais<br />
não-biodegradáveis, para ir se acumular<br />
eternamente num dos maiores biomas do<br />
planeta, o Pantanal, demonstrando uma absurda<br />
falta de conscientização popular com<br />
relação ao meio ambiente, aliada à completa<br />
ausência de fiscalização pela polícia ambiental<br />
para coibir esse desleixo.<br />
Mas como estamos em setembro, não<br />
devemos nos abater pelo pessimismo; ao<br />
contrário, sejamos otimistas, pois ainda há<br />
esperança de um futuro melhor (um lugar<br />
comum, mas verdadeiro).<br />
Por isso lembro Mário Quintana, na<br />
“Canção da Primavera”:<br />
“Primavera cruza o rio / cruza o sonho<br />
que tu sonhas. / Na cidade adormecida /<br />
Primavera vem chegando.// Catavento enloqueceu,<br />
/ ficou girando, girando. / Em torno<br />
do catavento / Dancemos todos em bando.<br />
// Dancemos todos, dancemos, / Amadas,<br />
Mortos, Amigos, / Dancemos todos até<br />
/ Não mais saber-se o motivo... // Até que<br />
as paineiras tenham / Por sobre os muros<br />
florido!”.<br />
*Sociólogo e articulista da Revista<br />
Comércio & Indústria de Araraquara