PHILIP

XXVI
Philip, como você passou sua manhã?
Chico acabara de trocar seu
uniforme por uma roupa mais
parecida com ele.
Pensando apenas, Chico.
Ah... Que pena.
Eu brinquei, pulei e bati no meu amigo.
- Mas... Não foi por isso
que você ficou de
castigo ontem?
- Claro. E hoje bati nele
porque ele não devia
ter me dedado.
- O que quer dizer
“dedado”?
- Quer dizer delatar.
- Então, Chico, para se constatar
um fato é preciso que alguém
o delate?
- De certa forma, sim.
- Não compreendo. Sempre acreditei
na possibilidade de guardar
para mim certas coisas. Quero dizer...
Ter segredos.
Chico continuava amarrando o tênis
como se não estivesse ouvindo a contestação
de Philip.
- Você está me ouvindo, Chico?
- Claro que sim, Philip. (seu rosto quase
grudado na gaiola) – mas os seus segredos
são realidades que só existem para você.
Se você não tivesse falado comigo, eu
simplesmente continuaria achando que os
pássaros não falam e essa seria a minha realidade,
ou não?
Chico
, você está dizendo
Philip estava confuso.
que eu me dedurei?
Chico ria a ponto de se curvar.
Aquelas palavras ditas por um
pássaro tão conservador...
- Claro... A gente procura
delatar aquilo que queremos
que os outros
saibam. Raramente
corremos o risco de
esperar que as pessoas
percebam. Assim
delatamos com
olhar, gestos, palavras,
de mil jeitos
diferentes.
- É possível você
descobrir o que não
quero dizer?
- Sim, porque escapa
pelo seu olhar.
- Então de todo jeito
vou me delatar.
- Se o que você sente é
tão grande que não cabe
só dentro de você, escapará
de alguma forma
e caberá a mim perceber.
- Seria um assalto...
- Não, Philip. Ninguém rouba
se beber a água que transborda
da jarra.
- Prefiro deixar intacta minha
preservação. Prefiro
confessar de livre e espontânea
verdade:
eu amo você, Chico.