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Nação, guerra e utopia em - Adelino Torres

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NAÇÃO, GUERRA E UTOPIA EM PEPETELA<br />

de passag<strong>em</strong> a novos estágios de conhecimento e domínio sobre a realidade, a<br />

floresta de Mayombe pode ainda ser entendida como o local iniciático onde se<br />

preparam os corpos e os espíritos para a passag<strong>em</strong> da época colonial para a da<br />

liberdade, como b<strong>em</strong> refere Ana Mafalda Leite (1995: 119).<br />

Às características simbólicas da floresta, o Mayombe aqui ficcionado<br />

acresce ainda as da montanha, colocando-se o romance na senda de toda uma<br />

tradição que vê nas alturas desabitadas e inacessíveis o cenário natural da luta<br />

nacionalista. 16 Também na literatura de divulgação dos movimentos<br />

revolucionários de meados do século XX a montanha assume um estatuto quase<br />

icónico, sendo considerada o terreno de eleição de uma luta de guerrilha que, na<br />

senda da revolução mexicana liderada por Zapata, e tomando sobretudo como<br />

ex<strong>em</strong>plo as revoluções chinesa, vietnamita e cubana, apela <strong>em</strong> primeira instância<br />

às populações camponesas e não ao proletariado urbano, como acontecia na<br />

experiência da revolução russa – e l<strong>em</strong>bre-se a este respeito a importância do<br />

proletariado urbano no pensamento de Karl Marx.<br />

Em d<strong>em</strong>anda do vínculo entre povo e guerrilha<br />

Dada a riqueza de significados associados quer à floresta quer à<br />

montanha, é significativo que a acção de Mayombe se inicie com um ataque à<br />

exploração madeireira onde são derrubados os “gigantes do Mayombe”, as<br />

grandiosas árvores com as quais repetidamente se identificam os guerrilheiros.<br />

Considerado “um golpe económico dado ao inimigo” (M: 20), o assalto é<br />

precedido de uma discussão de teor estratégico entre os três el<strong>em</strong>entos que<br />

constitu<strong>em</strong> o comando do grupo: no sentido de conquistar o apoio popular para<br />

Associando-se esta limpidez à clareza de objectivos que guiam os guerrilheiros, produz-se a<br />

imag<strong>em</strong> de uma <strong>guerra</strong> onde predomina o el<strong>em</strong>ento racional.<br />

16 Pode pensar-se no modo como, na historiografia nacionalista portuguesa, a luta de guerrilha<br />

dos povos da Lusitânia, travada a partir dos então chamados Montes Hermínios contra o<br />

poderoso exército romano, é considerada uma manifestação precoce e profética da<br />

nacionalidade; ou, mais recent<strong>em</strong>ente, no lugar de destaque que a montanha ocupou na história<br />

da resistência armada à ocupação indonésia de Timor Leste, da qual resultou a independência<br />

desse território e o seu reconhecimento como nação.<br />

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