FONSECA, Sherloma Starlet. Memórias de um constitucionalista
FONSECA, Sherloma Starlet. Memórias de um constitucionalista
FONSECA, Sherloma Starlet. Memórias de um constitucionalista
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Duarte foi relegado ao segundo plano em meio à elite intelectual. Segundo Marli Hayashi 8 ,<br />
em entrevista a Luiz Sugimoto (2003, p. 12), as dificulda<strong>de</strong>s enfrentadas pelo autor para<br />
efetivar seus projetos <strong>de</strong>ve-se ao fato <strong>de</strong> que ele “nunca foi figura unânime e cordata 9 . Muito<br />
pelo contrário, <strong>de</strong>senten<strong>de</strong>u-se com inúmeras pessoas e fez inimigos. […] consolidara a fama<br />
<strong>de</strong> h<strong>um</strong>anista e antitecnocrático, progressista patriota e antitotalitário, polemista <strong>de</strong><br />
temperamento ar<strong>de</strong>nte”.<br />
Paulo Duarte orgulhava-se <strong>de</strong> se manter fiel a seus princípios, apresentando-se como<br />
sujeito que expunha suas escolhas e opiniões, divergindo quando julgasse necessário e<br />
fazendo oposição <strong>de</strong> frente, ass<strong>um</strong>indo o preço que lhe fora cobrado.<br />
Penso que meu caso é diferente. Jamais tive tempo <strong>de</strong> ganhar dinheiro nem<br />
nunca tive coragem <strong>de</strong> ficar rico. E as minhas preocupações e escrúpulos<br />
nunca permitiram disputasse postos altos que chegaram a me atrair. Depois,<br />
muito cedo <strong>de</strong>scobri que, para a gente fazer <strong>um</strong>a carreira triunfal, na política<br />
e na fortuna principalmente, pelo menos em nosso país, é preciso praticar<br />
antes <strong>um</strong>a porção <strong>de</strong> porcarias. E eu sonhei e lutei sempre por ser <strong>um</strong> sujeito<br />
asseado. Talvez não o tivesse conseguido <strong>de</strong> todo, mas a culpa não foi<br />
minha, <strong>de</strong>ve-se à fatalida<strong>de</strong> h<strong>um</strong>ana. O culto da submissão, do aplauso<br />
incondicional, da bajulação e da subserviência, em tempo alg<strong>um</strong> foi meu<br />
divertimento. (DUARTE, 1974, p. 2)<br />
Por vezes suas análises sobre a história e o presente do país ass<strong>um</strong>iram posturas<br />
diversas: manifestou-se contra o perrepismo e a tradicional permanência do partido à frente do<br />
Executivo; opôs-se a mo<strong>de</strong>rnização getulista; <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>u o voto secreto, mas tinha alg<strong>um</strong>as<br />
ressalvas sobre a ampliação da participação popular nas eleições. Acreditava que <strong>um</strong>a nova<br />
mentalida<strong>de</strong> ainda iria se formar, porque o cidadão brasileiro ainda não estava pronto.<br />
Seguindo essa preocupação, Paulo Duarte i<strong>de</strong>alizou o Departamento <strong>de</strong> Cultura como meio <strong>de</strong><br />
ação intelectual junto à massa, muitas vezes tutelada pela pressão do Estado e dos meios <strong>de</strong><br />
comunicação.<br />
Paulo Duarte foi <strong>um</strong> tenaz <strong>de</strong>fensor <strong>de</strong> <strong>um</strong> projeto paulista para o Brasil. O governo <strong>de</strong><br />
Getúlio Vargas e dos tenentes ameaçou as pretensões <strong>de</strong> São Paulo. Armando Sales Oliveira,<br />
nomeado interventor, empreitou permanente campanha eleitoral para suce<strong>de</strong>r Vargas no po<strong>de</strong>r.<br />
O projeto armandista voltava-se para construção <strong>de</strong> <strong>um</strong>a “<strong>um</strong>a nova unida<strong>de</strong> nacional” a partir<br />
<strong>de</strong> <strong>um</strong> “regionalismo equilibrado” (BARBATO JR, 2004).<br />
8 Marli Hayashi, em sua tese <strong>de</strong> doutorado intitulada Paulo Duarte, <strong>um</strong> Dom Quixote Brasileiro (2001), estudou<br />
a trajetória do autor como membro da USP e editor da Revista Anhembi.<br />
9 Após a morte <strong>de</strong> Juanita, a esposa do autor, sua companheira <strong>de</strong> toda a vida, ele adoeceu e veio a falecer em 24<br />
março <strong>de</strong> 1984. Hayashi comenta que talvez sirva como prova da figura dissonante do jornalista o fato que no<br />
enterro <strong>de</strong>le havia apenas cerca <strong>de</strong> trinta pessoas, <strong>de</strong>ntre as quais Florestan Fernan<strong>de</strong>s, Hélio Bicudo, José<br />
Mindlin, Luiz Vieira <strong>de</strong> Carvalho Mesquita e Alípio Corrêa Neto.<br />
18