13.04.2013 Views

Prólogo - Romances Nova Cultural

Prólogo - Romances Nova Cultural

Prólogo - Romances Nova Cultural

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

<strong>Prólogo</strong><br />

M esmo não sendo famosa, estou entre os seiscentos<br />

convidados e cerca de cinquenta paparazzi, em uma<br />

festa de casamento. Uso um brilhante vestido vermelho, com<br />

acessórios de plumas, sapatos vermelhos rubis tipo Tina<br />

Turner, e pernas nem vagamente parecidas com a da legendária<br />

cantora.<br />

Mas essa não é a parte interessante. Sou dama de honra do<br />

casamento do meu ex-marido. Ele está se casando com uma das<br />

mulheres mais famosas do mundo. Por isso tantos convidados<br />

e os paparazzi.<br />

Oh... E ele está cometendo o maior erro da sua vida.<br />

E eu ainda estou apaixonada por ele. Mas não posso lhe<br />

confessar isso.<br />

Por que eu me meti em tal enrascada?<br />

Cometi o erro por ter saído da cama há duas semanas...


Capítulo I<br />

G osto de pensar que todos temos arrependimentos na vida.<br />

Certamente, todos conhecemos alguém que diz: “Não<br />

tenho arrependimentos, porque se eu tivesse feito alguma<br />

oisa errada não seria a pessoa que sou hoje”.<br />

Mas eu gostaria de pensar que essas pessoas estão iludidas.<br />

Termino de ler a passagem em voz alta e ergo os olhos do<br />

meu laptop para olhar para Vanessa Waters, servindo-se de uma<br />

taça de champanhe.<br />

— Que maravilha! — ela diz com o entusiasmo. — Muito<br />

melhor do que eu estava dizendo. A propósito, o que eu dizia?<br />

Volto a olhar para o laptop e leio mais uma vez o trecho.<br />

— Não me importa quantos relacionamentos fracassados<br />

teve Ben Affleck. Ele ainda é Ben Affleck.<br />

— É verdade — Vanessa diz, entregando-me uma taça de<br />

champanhe antes de sentar-se em um sofá à minha frente. — Para<br />

ser franca, ouvi rumores de que ele está em um bangalô aqui<br />

neste hotel. Gostaria de andar por aí para tentarmos vê-lo?<br />

— Não vou andar pelo hotel na companhia de uma das<br />

mulheres mais famosas do mundo — eu digo com firmeza. —<br />

<strong>Nova</strong>mente... — acrescento em voz baixa.<br />

— Você não gosta de se divertir. Está bem, volte para a<br />

minha história. Não se vive antes de ter feito um drag queen<br />

em Vegas.<br />

— Personificar — digo, enquanto transcrevo os pensamentos<br />

dela no laptop.<br />

— O quê?<br />

— Personificar. É personificar um drag queen. Fazer implica<br />

que fez sexo com ele.


O amOr custa carO<br />

— Eu fiz.<br />

— Você fez sexo com um drag queen? — Olho para ela<br />

desconfiada.<br />

— Querida, nem todos eles são gays. — Ela recosta-se no sofá,<br />

sem dar importância. — Está bem, já que você quer. Personificar.<br />

Mas creio que fazer sexo com um drag queen é muito mais<br />

interessante.<br />

— Quantas vezes temos que repetir isso... — digo, suspirando.<br />

— Não precisa mentir na sua autobiografia. Você teve uma vida<br />

muito interessante. Conheceu muita gente, fez tudo que...<br />

— Meu Deus, já são quatro horas. — Vanessa olha, chocada,<br />

para o seu Rolex, e desliga meu gravador. — Ficamos presas o dia<br />

todo. Por isso estou tão cansada.<br />

Estou aqui há duas horas. Tentar fazer com que aquela mulher<br />

me ajude a escrever sua autobiografia é quase tão produtivo<br />

quanto tentar fazer um gatinho lutar com um cachorro. Ligo o<br />

gravador novamente.<br />

— Você quer me dizer mais a respeito dos homens com os<br />

quais dormiu nos anos setenta?<br />

— Eles eram quentes na cama, mas nunca telefonavam no dia<br />

seguinte. — Vanessa espalhou caviar sobre uma torrada e me<br />

oferece.<br />

Pego o caviar, como tenho feito todos os dias desde que<br />

começamos a escrever as memórias dela.<br />

— Sabe, você poderia pedir apenas champanhe, sem caviar.<br />

— Mas eu pareceria uma alcoólatra — Vanessa quase grita.<br />

— O que os garçons iriam pensar de uma mulher que apenas<br />

pede champanhe na hora do almoço? Já é difícil esperar até as<br />

duas horas da tarde.<br />

— Você não acorda antes das duas.<br />

— É porque não posso beber champanhe antes. Se pudesse eu<br />

levantaria ao meio-dia.<br />

Vanessa está hospedada em uma suíte do Hotel Beverly Hills<br />

enquanto sua casa em Bel Air está sendo reformada pela quinta<br />

vez em cinco anos. Todos os dias temos a mesma rotina. No final<br />

da manhã, eu deixo minha casa em Hollywood Hills e vou até<br />

o hotel. Por volta do meio-dia, chego à suíte, bato na porta e tento


Geneviève Montcombroux<br />

tirá-la da cama. Geralmente, ela leva cinco minutos para abrir<br />

a porta, então me pede para voltar à uma da tarde, dizendo que<br />

não está pronta para começar o dia.<br />

— Você poderia pedir várias garrafas de champanhe à noite<br />

e guardar uma para o café da manhã. Ninguém desconfiaria —<br />

sugiro.<br />

— Sim, mas desse modo o champanhe não estaria em um<br />

balde de prata. Muito do prazer da bebida é a apresentação.<br />

Eu anoto o que ela disse. Não sei onde vou escrever aquilo,<br />

mas foi a coisa mais interessante que ela disse até agora.<br />

Sou uma escritora-fantasma, que escreve em nome de outras<br />

pessoas; e sou especializada em autobiografias.<br />

São memórias de pessoas famosas como Paris Hilton e<br />

Donald Trump que se transformam em bestsellers na primeira<br />

semana do lançamento. É isso que escrevo.<br />

Na verdade sou uma romancista. Bem, não realmente. Mas<br />

escrevi um romance. Chama-se “O Édito de Edith”. Ainda não<br />

foi editado e enquanto espero por um agente, continuo a escrever<br />

autobiografias de celebridades. Embora me entristeça não<br />

ver um livro com as palavras de Samantha Evans na capa, adoro<br />

ver meu nome nos cheques com que me pagam.<br />

Cerca de dois meses atrás, Vanessa concordou em escrever<br />

suas memórias para a Editora Sideways. E, em troca de um<br />

provável bestseller, Amy Sideways, a proprietária da editora,<br />

deu-lhe um adiantamento de um milhão de dólares.<br />

E eu... Desde que comecei a trabalhar no livro de Vanessa,<br />

tenho sido mergulhadora, compradora de sapatos, e acompanhante<br />

de Vanessa nas suas várias incursões ociosas pela cidade.<br />

Não tenho escrito muito.<br />

— O que acha de falarmos a respeito de seus ex-maridos?<br />

— indago.<br />

Vanessa dá de ombros.<br />

— São todos velhos barrigudos, casados com mulheres de<br />

mais de trinta...<br />

— Já ouvi isso. — Esfrego minha testa com exasperação.<br />

— Vamos tentar alguma coisa nova. Algumas pessoas dizem<br />

que você é uma das mulheres mais sexy do século vinte. O que


O amOr custa carO<br />

responderia a isso?<br />

Vanessa piscou, aparentando desconfiança.<br />

— Quem diz isso?<br />

— Os homens.<br />

— Hum... — Ela pensa na declaração. — Eles me comparam<br />

com Sophia Loren ou Pamela Anderson?<br />

— Não sei. Que diferença faz?<br />

— Porque minha resposta seria diferente dependendo disso.<br />

Sophia Loren é apaixonante à primeira vista. Os homens morreriam<br />

por ela. Pamela Anderson é quente. Mas os homens não se<br />

casariam com ela. Querem tê-la, e depois se vão. Isso seria um<br />

insulto.<br />

— Não se apaixona à primeira vista. Leva-se anos para...<br />

— É claro que pode-se apaixonar à primeira vista. Pessoas<br />

fazem isso o tempo todo.<br />

— E as pessoas se divorciam o tempo todo, também.<br />

— Não significa que não estejam apaixonados. Apenas significa<br />

que se estressaram.<br />

Ergo os ombros para fingir que concordo com ela. Vanessa<br />

inclina a cabeça para o lado para me observar do modo como<br />

Jane Goodall estuda a conduta de um chimpanzé.<br />

— Aconteceu com você... — ela afirma, percebendo alguma<br />

coisa em mim pela primeira vez.<br />

Eu ergo os olhos das minhas anotações.<br />

— Aconteceu o quê?<br />

— Você se apaixonou à primeira vista. E deixou que ele se<br />

fosse.<br />

Eu deveria ter me lembrado de que, como atriz, Vanessa tem<br />

o hábito de estudar pessoas. É o serviço dela. Poderia ser uma<br />

psiquiatra.<br />

Na verdade, Vanessa tinha cem por cento de razão. Apaixoneime,<br />

à primeira vista, por Jeff Stevens quando tinha vinte anos. Eu<br />

o vi na festa de confraternização, na primeira semana de aula do<br />

terceiro ano da Universidade de Los Angeles.<br />

Mal pude respirar. Nunca tinha tido uma reação como aquela.


10<br />

Geneviève Montcombroux<br />

Ele era... Ele tinha alguma coisa especial.<br />

Posso até descrevê-lo: cabelos escuros, olhos castanhos,<br />

corpo de atleta e alto. Oh, ele era lindo! Meu coração batia forte<br />

toda vez que o via. Ficava nervosa e apaixonada todas as vezes<br />

que ele batia na minha porta durante os dois anos seguintes.<br />

Eu me sentia realmente vazia quando ele não estava por perto.<br />

Sucumbia a todas as tolices que jovens casais fazem quando<br />

estão apaixonados: as demonstrações de afeto em público, o<br />

modo de falar imitando bebês, ficar no telefone a noite toda<br />

e deixar o telefone ligado sobre o travesseiro para poder ouvir<br />

sua respiração enquanto não pegava no sono.<br />

Aqueles anos de faculdade foram maravilhosos e eu estava<br />

convencida de que tudo seria perfeito para o resto das nossas<br />

vidas. E que seríamos eternamente apaixonados.<br />

E quase aconteceu.<br />

Nos casamos depois da formatura na presença de amigos<br />

que pensavam que aquilo não ia durar, mas que nada disseram<br />

naquela ocasião.<br />

Aos vinte e dois anos, não percebi que odiaria a faculdade<br />

de Direito. Não percebi que sendo baterista de uma banda, Jeff<br />

iria viajar pelo país, constantemente, deixando-me em casa<br />

preocupada com o assédio das fãs que dormiriam com ele em<br />

um piscar de olhos.<br />

Mas, principalmente, não percebi que a vocalista da banda,<br />

um dia o roubaria de mim.<br />

De qualquer modo, depois de aborrecer Vanessa com os<br />

detalhes da minha fracassada vida sentimental e recusando-me a<br />

vagar pelo hotel à procura de Ben Affleck, fiz minhas malas<br />

para o fim de semana em casa.<br />

Moro em uma casa fantástica de quatro quartos que parece<br />

uma vila italiana, em Mulholland Drive, com uma fantástica vista<br />

da cidade. Óbvio, que para pagar o aluguel de um lugar como<br />

esse preciso de companheiras. E tenho duas: Liz e Megan.<br />

Megan é uma pequena chinesa americana, cuja mãe chinesa<br />

é a segunda esposa de um descendente de suecos, que já tinha<br />

uma filha. Liz, que parece a boneca Barbie, é tecnicamente irmã<br />

adotiva de Megan. Mas elas estão juntas desde que tinham três


O amOr custa carO 11<br />

anos de idade e agem exatamente como irmãs. Elas ficariam<br />

bravas se eu falasse assim. Para elas, são irmãs de verdade.<br />

Quando entro em casa, vejo Liz encostada no batente da porta,<br />

observando um grupo de quatro pessoas correr ao redor da casa.<br />

O primeiro é um velho chinês com uma longa barba branca,<br />

carregando uma bússola, e falando com uma velha chinesa de<br />

cerca de setenta anos, que faz anotações em um papel, preso a<br />

uma prancha. Atrás dela está Lauren, a mãe de Megan e madrasta<br />

de Liz, gritando para eles em inglês, e atrás dela está Megan,<br />

segurando um bule de chá e parecendo estonteada.<br />

Eu paro à porta e observo a cena.<br />

— Por que temos um velho chinês correndo ao redor da casa<br />

carregando uma bússola e falando com uma velha chinesa que<br />

toma notas em uma prancha; sua madrasta gritando para eles<br />

e sua irmã correndo atrás de todos com um bule de chá?<br />

— Se eu ganhasse um centavo pelas vezes que fiz essa<br />

mesma pergunta... — Liz diz, inexpressivamente.<br />

— Estamos tendo uma seção de Feng-Shui — diz Megan.<br />

— Junte-se a nós.<br />

Entro na sala de visitas, onde o homem está à janela,<br />

olhando ora para a vista e ora para a bússola.<br />

— Aquele é o sr. Li — diz Megan. — Ele é um mestre em Feng<br />

Shui. Lembra-se da minha avó, Lucy...<br />

A velha curva-se polidamente para mim. E eu retribuo a reverência.<br />

Lauren, a mãe de Megan me beija.<br />

— Desculpe-me. Minha mãe implorou para que as garotas<br />

permitissem deixá-los fazer isso.<br />

O homem corre até nosso sofá, olha para a bússola e diz alguma<br />

coisa em chinês. Vovó Lucy toma nota e diz alguma coisa para<br />

ele e para Lauren em chinês.<br />

A velha arregala os olhos e diz alguma coisa áspera para a<br />

filha, em chinês.<br />

— O que ela disse? — pergunto a Megan.<br />

— Ela disse que “americana estúpida não respeita os velhos<br />

hábitos. Casou com homem de olho redondo”, que quer dizer...<br />

— Sim, já entendi — asseguro a Megan.<br />

A avó acaricia o braço de Liz e olha para mim.


12<br />

Geneviève Montcombroux<br />

— É a única com um quarto vermelho? — ela pergunta,<br />

sorrindo muito educadamente.<br />

Olho para os dois lados antes de responder:<br />

— S-sim.<br />

— Oh, quarto bom. Muito bom... casamento. Não tão bom...<br />

carreira. Mas você deixou... tem bebês, sim?<br />

— Espere, vou casar logo? — pergunto cheia de esperança,<br />

olhando para o mestre em Feng Shui.<br />

O homem sorri e se curva diante de mim.<br />

— Ah, meu inglês não bom, mas você encontrar homem...<br />

hum... — Ele franze o rosto enrugado, tentando pensar na palavra<br />

em inglês. — Você encontrar homem e esse ano você casa. Ele a<br />

fará sentir borboletas na barriga. Não tem borboletas há muitos<br />

anos. Finge que tem. Mas não tem. Esse homem traz borboletas.<br />

Meu rosto se ilumina.<br />

— Sim. É Eric. O homem que estou namorando. Então vou me<br />

casar com ele?<br />

O homem confirma.<br />

— Quarto muito bom casamento.<br />

Quando ele se encaminha para nosso escritório com os<br />

ancestrais de Megan seguindo-o de perto, eu olho para Liz e para<br />

Megan.<br />

— O que mais ele disse?<br />

— Que eu odeio homens e que não quero me casar, e que<br />

Megan precisa desesperadamente deitar-se com alguém —<br />

responde Liz.<br />

Surpresa, eu arregalo os olhos.<br />

— Ele viu tudo isso nos seus quartos?<br />

— Não, sou eu que digo... — Liz ergueu os ombros.<br />

— Garotas, precisamos de vocês aqui — Lauren grita do<br />

escritório.<br />

Nós três nos encaminhamos para o escritório. Lucy imediatamente<br />

começa a arrumar o cômodo. O sr. Li lhe diz alguma coisa<br />

em chinês.<br />

— O que ele está dizendo? — indago.<br />

— Vocês deveriam mudar as escrivaninhas para perto da<br />

janela — Lucy responde. — Há mais criatividade lá. — Ela


O amOr custa carO 13<br />

olha para a pilha de papéis espalhados no chão. — E contratem<br />

uma empregada, também.<br />

Li bate com o dedo na escrivaninha. Mais mandarim. Lucy<br />

traduz para nós.<br />

— O trabalho mais apaixonante na casa é feito aqui. Muita<br />

paixão...<br />

— É a minha escrivaninha — Liz diz, orgulhosa.<br />

Li passa por mim e sai do escritório. Caminha até a porta da<br />

frente e diz mais alguma coisa para Lucy.<br />

— Hum, não podemos fazer isso — Megan diz ao homem<br />

enquanto Lauren exclama em inglês:<br />

— Não, de jeito nenhum!<br />

— O que ele disse? — pergunto a Megan.<br />

— Ele diz que para ter uma sorte melhor nos próximos cinco<br />

anos, precisamos mudar nossa porta a quatro graus para o norte.<br />

— Como assim?<br />

— Quando os chineses têm uma casa para aplicar o Feng Shui,<br />

não mudam apenas a mobília. Eles harmonizam a arquitetura<br />

com o ambiente. Nossa casa é boa, mas poderia ser melhor.<br />

— Parece minha vida sexual — resmunga Liz.<br />

Depois de mais meia hora de Feng Shui, que contrariou o<br />

que a maioria dos americanos pensa a respeito da decoração<br />

interior e mudanças na mobília, a família das minhas amigas se<br />

foi, garantindo-nos que nossa casa teria noventa por cento de<br />

sorte nos próximos cinco anos. Então fomos nos aprontar para<br />

nossos compromissos daquela noite.<br />

Liz e Megan saem com os namorados cerca de vinte minutos<br />

mais tarde e me deixam com o dilema de escolher um vestido<br />

para sair com Eric.<br />

Também me deixaram uma caixa de “Twinkies” e não tenho<br />

certeza se as amo ou se as odeio por causa disso. Continuo sem<br />

saber o que vestir. Como um pedaço do chocolate e torno a<br />

experimentar outro vestido. Por que esse círculo vicioso de<br />

experimentar roupas que a fazem parecer gorda, que a faz comer<br />

compulsivamente, e que a engorda? E por que os homens não


14<br />

Geneviève Montcombroux<br />

passam por isso?<br />

Bem, voltando ao que importa, estou muito animada com meu<br />

encontro, e não apenas porque o mestre do Feng Shui me disse<br />

que vou me casar com Eric, meu namorado incrivelmente quente<br />

e “sexy” e maravilhoso. Esta noite vou conhecer sua amiga de<br />

infância, Libby. É um fato importante, pois a família dele voltou<br />

para Houston, e ela é a pessoa mais próxima de um membro da<br />

família que posso conhecer por enquanto.<br />

Eric... Estamos namorando há cerca de três meses, e ele é a<br />

recompensa pelo fracasso da minha vida sentimental nos últimos<br />

cinco anos. Eu o conheci numa noite em que levei Liz ao Pronto-<br />

Socorro. Ela teve um ataque de pânico depois de enfrentar uma<br />

briga com Fred, seu namorado. Na verdade, ela precisava apenas<br />

de um “Valium” e de um cigarro, mas como recusou ambos,<br />

decidi levá-la ao hospital.<br />

E encontrei meu príncipe encantado.<br />

Ele era incrível: trinta e dois anos, bronzeado, alto, lindo, maravilhoso.<br />

Quando ele caminhou até nós, e fiquei sem respiração. Tinha<br />

certeza de que Eric ficaria caidinho por Liz. Afinal, todos ficam.<br />

Contudo, depois de conversarmos um pouco, ele me convidou<br />

para sair.<br />

E temos sido felizes desde então.<br />

Esta noite vamos ao restaurante “Pólo Lounge” porque Libby,<br />

sua melhor amiga desde o primeiro grau, está hospedada naquele<br />

hotel. Estou um pouco nervosa em conhecê-la, por isso fico mudando<br />

a cor do batom a toda hora. Como se ela fosse notar meu batom.<br />

Mas o fato de Eric continuar dizendo que ela é praticamente<br />

da família, me faz querer causar uma boa primeira impressão.<br />

A campainha toca.<br />

— Estou indo! — saindo do banheiro.<br />

Abro a porta para encontrar Eric maravilhoso, trajando um<br />

terno “Armani” verde-escuro e segurando um buquê de rosas<br />

vermelhas.<br />

— Esqueci do nosso aniversário, não é? — pergunto, me sentindo<br />

culpada. Droga!<br />

Eric dá de ombros.<br />

— Sou um tolo por prestar tanta atenção em datas — ele diz,


O amOr custa carO 15<br />

alegremente, entregando-me as rosas. — Por que não fingimos<br />

que eu trouxe as rosas apenas porque a amo e senti muita saudade<br />

de você?<br />

— Oh, são lindas! — Sorrio e o beijo. — Tenho tempo de<br />

colocá-las em um vaso antes de sairmos?<br />

— Sim. Libby está vindo do aeroporto, portanto temos cerca<br />

de meia hora. Você está linda.<br />

— Acha mesmo? — pergunto insegura, olhando para meus<br />

sapatos. — Estou pensando em colocar sapatos de saltos mais baixos<br />

e talvez um vestido não tão curto. Não quero que sua amiga me<br />

ache vulgar.<br />

— Você está perfeita — Eric diz, lascivamente. — E já que<br />

temos meia hora...<br />

— Se pensa que vou me arriscar a chegar atrasada e causar<br />

má impressão à sua melhor amiga, está equivocado — brinco.<br />

— Mas prometo compensá-lo mais tarde.<br />

— Como? — Ele me enlaça pela cintura e me beija.<br />

— Bem, deverá me trazer em casa mais tarde. — Finjo<br />

timidez e retribuo o beijo.<br />

Eric me segue até a cozinha, onde pego um vaso e o encho<br />

de água.<br />

— Tenho mais uma coisa para você. — Ele tira uma chave do<br />

bolso. — Foi feita esta tarde.<br />

— Você me fez uma chave? — pergunto, pasmada. Coloco as<br />

flores no vaso, rapidamente, e examino a chave como se fosse<br />

um anel de noivado.<br />

— Parece surpresa.<br />

— Bem, é que... Ninguém fez uma chave para mim antes.<br />

Quero dizer, acho que meu ex-marido, mas quando vivíamos<br />

juntos. Oh, meu Deus. Adorei!<br />

— Bem, como estarei em <strong>Nova</strong> York na próxima semana,<br />

talvez pudesse pedir que molhe minhas plantas e... — Sua frase<br />

é interrompida, pois me jogo nos braços dele e beijo seus lábios<br />

com volúpia, quase o derrubando. Estou muito excitada.<br />

— Realmente, adorei! — exclamo, sorrindo.<br />

Eric parece divertir-se com meu entusiasmo e sorri.<br />

— Ótimo. Eu não sabia que um artigo de quatro dólares a


16<br />

Geneviève Montcombroux<br />

deixaria tão feliz. Eu deveria ter trazido as flores outro dia.<br />

Olho para ele, um pensamento me ocorrendo, subitamente.<br />

— Você também precisa de uma chave — digo, antes de<br />

correr para meu quarto.<br />

Eric me segue. Encosta-se no batente da porta enquanto<br />

procuro na gaveta da cômoda, tentando encontrar minha chave<br />

extra.<br />

— Você não tem que me dar uma chave apenas porque dei<br />

uma para você.<br />

— Não, não. Eu insisto. É recíproco.<br />

— Está bem, fico feliz.<br />

— Desculpe. — Coloco algumas roupas íntimas sobre a cama.<br />

— A advogada fracassada falou mais alto em mim.<br />

Eric pega um sutiã preto de renda da pilha e o inspeciona.<br />

— Se não encontrar a chave, talvez possa me dar isso. Com<br />

você dentro.<br />

Fecho a gaveta da cômoda e tento minha caixa de joias.<br />

— Aqui está ela! — exclamo feliz comigo mesma. E a entrego<br />

a ele. — Está velha, mas permitirá que abra a porta.<br />

— E o que faço para colocar você dentro disso? — Eric diz,<br />

segurando o sutiã e jogando-me na cama.<br />

Começamos a nos beijar.<br />

— Não estou brincando. — Agarro-me a ele. — Não queremos<br />

nos atrasar.<br />

E um minuto depois...<br />

— Não faça isso — digo já sem muita convicção. — Você<br />

vai estragar minhas meias.<br />

Mais um minuto...<br />

— Ei, você vai amassar meu vestido.<br />

Mais outro...<br />

— Está bem, mas temos apenas dez minutos.<br />

Quarenta e cinco minutos depois, estávamos atrasados e<br />

correndo até o saguão do Hotel Beverly Hills para encontrarmos<br />

com Libby.<br />

Agora uso um vestido preto muito mais simples, porque o<br />

outro ficou sujo de maquiagem quando Eric o tirou pela minha<br />

cabeça.


O amOr custa carO 1<br />

Também tive que trocar os sapatos, pois o salto do outro<br />

quebrou quando... Bem, não preciso entrar em detalhes.<br />

— Encontre-me no “Polo Lounge”. Preciso ir ao toalete<br />

retocar a maquiagem.<br />

Eric pára e segura minhas mãos, tentando me empurrar em<br />

direção ao restaurante.<br />

— Não há necessidade. Você está linda. Vamos.<br />

— Minha aparência é de quem acabou de fazer sexo.<br />

— Você fez...<br />

— Então... Tenho que retocar o batom e o pó. Além disso, terá<br />

um tempo para ver Libby antes de me apresentar a ela.<br />

— Mas...<br />

— Vá. Logo estarei com você — concluo e corro para o<br />

toalete.<br />

Cerca de um minuto depois, estou novamente com os cabelos<br />

perfeitos. Pego dois batons. Um vermelho vibrante, mas que não<br />

faz meu estilo. Sou tímida. Pego um mais claro e o aplico. Bom.<br />

Subitamente, Isabella Robles, cantora, atriz de cinema, uma<br />

diva internacional, entra no banheiro como um morcego saindo<br />

do inferno.<br />

— Por que maldição, eu lhe dei o emprego? — ela grita, fazendo-me<br />

pular de susto.<br />

Uma pequena garota hispânica a segue em silêncio. Olha para<br />

o chão e diz com humildade:<br />

— Se ficar calma por um minuto eu poderia explicar...<br />

Isabella aponta o dedo indicador para o rosto da moça.<br />

— Nunca diga para eu me acalmar! Sabe quantas pessoas<br />

matariam pelo seu emprego? Droga, eu poderia substituí-la<br />

apenas chamando a camareira e pedindo que me envie um<br />

macaco.<br />

A pobre garota mantém os olhos baixos e apenas murmura:<br />

— Sim, madame.<br />

— Eu poderia pôr um anúncio no jornal, e teria milhares de<br />

pessoas implorando pelo seu lugar.<br />

— Sim, madame.<br />

— Você tem sorte! — Isabella exclama, com rispidez.<br />

Ela caminha até o espelho perto de mim, abre uma grande


1<br />

Geneviève Montcombroux<br />

bolsa Hermès e tira um pó compacto Bobbi Brown.<br />

— Pedi rosas vermelhas e não ranunculus! O que pensa que<br />

eu sou? Uma idiota? Achou que eu não perceberia?<br />

Francamente, eu não teria notado. Acho que realmente se<br />

parecem com grandes rosas.<br />

Isabella começa a retocar a pele bronzeada.<br />

— Antes disso, meu jato particular decolou tarde. Estou<br />

pagando a eles milhares de dólares e não se pode ter certeza de<br />

decolarmos na hora certa.<br />

A pobre assistente está a ponto de chorar.<br />

— Infelizmente, o Air Force One ia decolar a...<br />

— Cale a boca! — Isabella a interrompe. — Além de tudo<br />

isso, ordenei que pedisse uma Dom Perignon e o hotel me enviou<br />

uma Clos du Mesnil. Nunca ouvi falar nesse champanhe. O que<br />

eu sou, alguma tola?<br />

Tento desviar os olhos, mas não consigo deixar de olhar seu<br />

reflexo no espelho. Ela é maravilhosa. Por outro lado é uma<br />

imbecil e tenho pena de sua assistente.<br />

Isabella volta-se para olhar para a moça.<br />

— Responda-me! Acha que sou uma tola?<br />

A garota ergue os olhos, em pânico.<br />

— Não, madame — ela sussurra.<br />

— Bem, então por que concordou que me mandassem uma<br />

Cloh due Mehnee?<br />

Durante alguns segundos, nenhuma das duas diz nada.<br />

— A pronuncia certa é Clos du Mesnil — eu digo.<br />

Isabella olha para mim como se só então tivesse notado<br />

minha presença no local. Ou no universo. Eu continuo:<br />

— É fabricada por Krug e suas vindimas são as mais caras<br />

do mundo, incluindo a safra de 1992.<br />

Isabelle parece preste a me esmurrar. Finalmente, joga o pó<br />

na bolsa e diz:<br />

— Bem, nunca ouvi falar. E só tomo Dom Perignon.<br />

Dou de ombros, conscientemente tirando-a do meu caminho<br />

do mesmo jeito que ela está tentando fazer comigo.<br />

— Ainda assim, quero ranunculus no meu bangalô quando meu<br />

namorado chegar — ela insiste. — E certifique-se que Edward


O amOr custa carO 1<br />

esteja na minha suíte por volta das dez da manhã. Não faço<br />

colorterapia há uma semana e estou começando a ficar<br />

constipada.<br />

Com isso, Isabella Robles sai do banheiro.<br />

Depois da saída da diva, sua assistente olha para mim.<br />

— Obrigada. Temi que ela fosse me dispensar. Meu nome é<br />

Alise.<br />

— Sam. Não agradeça.<br />

Percebo que a garota escolhe as palavras com cuidado.<br />

— Ela não está normal. Ficou noiva na véspera do Ano Novo,<br />

está planejando um grande casamento no Dia dos Namorados,<br />

e está um pouco estressada.<br />

— Ela está planejando se casar em seis semanas? Há um bebê<br />

a caminho?<br />

— Acho que não. Ela é muito famosa e seu casamento terá<br />

que ser perfeito. Já esteve noiva cinco vezes, sem incluir o atual.<br />

Em todas passou meses planejando a festa, e todas as vezes, deu<br />

errado. Ela quer que esse seja perfeito e acha que se fizer tudo<br />

diferente dos anteriores dará certo.<br />

— Bem, boa sorte para ela — digo, suspirando.<br />

Despedimo-nos e volto ao restaurante.<br />

Eric está sentado à uma das mesas na parte de trás do salão,<br />

falando com uma mulher à sua frente. Excitada, me apresso.<br />

— Vocês nem podem acreditar quem eu acabei de ver no<br />

toalete agindo como lou...<br />

Nesse momento, vejo que a mulher na companhia de Eric é<br />

nada menos do que Isabella.<br />

— Olá... — balbucio, sem-graça.<br />

Droga!<br />

Ela sorri para mim docemente, como se nunca tivesse me<br />

visto antes e estica a mão para me cumprimentar.<br />

— Olá. Sou Isabella Robles.<br />

— Samantha Evans. — Meio sem jeito, pego a mão dela.<br />

— Eric me falou muito de você — ela diz, sorrindo. Um sorriso<br />

perfeito.<br />

— Eu gostaria de dizer o mesmo. — Olho para Eric e sento-<br />

me devagar.


20<br />

Geneviève Montcombroux<br />

— Eu lhe disse que ela era cantora — Eric declara na<br />

defensiva.<br />

— Você me disse que o nome dela era Libby — respondo por<br />

entre os dentes.<br />

— Oh, é o meu apelido — Isabella fala, sem notar que Eric e<br />

eu estávamos brigando pela primeira vez.<br />

— Que interessante. — Olho fixamente para Eric.<br />

Steve, o maître, se aproxima.<br />

— Como vai, Sam.<br />

— Olá, Steve — murmuro sem afastar os olhos de Eric.<br />

— Posso trazer alguns drinques? — Steve pergunta.<br />

Antes que eu pudesse falar, Isabella pede:<br />

— Uma garrafa de Clos du Mesnil 1992 — ela pronuncia com<br />

perfeição e com evidente orgulho.<br />

— Ótima escolha — Steve elogia.<br />

— Podemos começar com o caviar Beluga? — pergunto, de<br />

repente.<br />

Eric e Isabella olham para mim surpresos.<br />

— Não é o que pensam. Estou escrevendo um livro sobre<br />

alguém que se hospeda aqui e ela sempre pede esse caviar.<br />

Isabelle fica eriçada, não sei a razão. Olha para Steve e<br />

pede duas porções do caviar.<br />

— Vocês realmente não têm que... — eu começo.<br />

— Não, não. Quero que tenha o que a deixa feliz — ela diz<br />

com tanta doçura que fico enjoada.<br />

Depois que Steve se afasta, Isabella se inclina par a frente<br />

e pergunta:<br />

— Quem são seus amigos no hotel?<br />

— Na verdade, sou escritora e essa pessoa é uma cliente que<br />

estou ajudando a escrever um livro.<br />

— Qual o nome dela?<br />

— Vanessa Waters — Eric diz, orgulhoso. — Estou lhe dizendo,<br />

Sam é uma ótima escritora. Ler suas obras fez com que eu<br />

me apaixonasse por ela.<br />

— É mesmo? — Isabella se mostra interessada. — Escreveu<br />

alguma coisa que eu possa ter lido?<br />

— Não — digo ao mesmo tempo em que Eric diz “sim”.


O amOr custa carO 21<br />

Eu o chuto por debaixo da mesa. E olho para ela enquanto<br />

respondo:<br />

— Desculpe, mas não posso responder para quem escrevo.<br />

— Mas ele pode — Isabella aponta para Eric. — Eu sempre<br />

pensei em escrever um livro. Gostaria de escrever sobre como<br />

planejar o casamento perfeito.<br />

— Deve ter alguma experiência a esse respeito — declaro,<br />

para logo em seguida abaixar o tom de voz. — Quero dizer, Eric<br />

me disse que você se casará dentro de poucas semanas,<br />

Eric olha para mim, confuso.<br />

— Oh, sim! — Isabella sorri. — O casamento será inigualável.<br />

Veja você, já planejei cinco casamentos, mas não me satisfizeram.<br />

Então, o sexto deverá ser estupendo.<br />

Enquanto ela começa a falar sobre o noivo que conheceu há<br />

quatro meses, observo um homem parado à porta olhando ao<br />

redor. Céus, ele se parece com...<br />

— Oh, meu Deus! — Levanto-me, involuntariamente, e bato<br />

com a perna na mesa. — Ai — grito, agarrando meu joelho.<br />

Eric se levanta para me amparar.<br />

— Querida, você está bem?<br />

— Estou... É que achei ter visto alguém que eu conheci...<br />

Sento-me novamente, tentando recuperar minha compostura.<br />

Olho para Isabella.<br />

— Você estava dizendo alguma coisa sobre como namorar<br />

um homem durante quatro meses ser tão bom quanto se namorasse<br />

durante um ano e meio?...<br />

— Sim. Os relacionamentos em Hollywood não são normais.<br />

Acontecem tantas coisas que...<br />

— Sam? — Ouço uma voz familiar. Desvio o olhar, e ele<br />

está lá.<br />

Jeff, meu ex-marido. O amor da minha vida. Parado ali, vestido<br />

num perfeito terno azul. Ele dá aquele sorriso que me faz<br />

derreter.<br />

— Como vai você? — ele pergunta, carinhoso.<br />

Arregalo os olhos. Por que não pus meu vestido vermelho?<br />

Por que não me mantive magra, sabendo que poderia encontrá-lo<br />

por acaso nos próximos setenta anos?

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!