Prosa 1 - Academia Brasileira de Letras
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João <strong>de</strong> Scantimburgo<br />
fato, o eram, as aspirações <strong>de</strong> conforto ou <strong>de</strong> luxo então existentes, só pelo comércio<br />
<strong>de</strong> importação po<strong>de</strong>riam<br />
Não surpreen<strong>de</strong>, por isso, que um autor da meta<strong>de</strong> do século XII assinale a<br />
presença <strong>de</strong> mercadores portugueses num dos gran<strong>de</strong>s centros comerciais do<br />
Levante fornecedores <strong>de</strong> produtos ricos – a célebre feira <strong>de</strong> São Demétrio em<br />
Tessalônica. Estavam, então, os portugueses, na vanguarda em matéria <strong>de</strong> comércio<br />
e <strong>de</strong> navegação. A “bolsa” <strong>de</strong> mercadores do tempo do rei Dom Diniz,<br />
a primeira companhia <strong>de</strong> seguro marítimo mútuo, criada por Dom Fernando,<br />
a carta <strong>de</strong> privilégio <strong>de</strong> 6 <strong>de</strong> junho <strong>de</strong> 1377, do mesmo rei, são peças <strong>de</strong> um só<br />
plano que a dinastia <strong>de</strong> Avis pôs em prática, para formar o conjunto que iria<br />
possibilitar ao Infante Dom Henrique, ao rei Dom João II e a Dom Manuel os<br />
caminhos do mar-oceano. Um dos dispositivos da carta <strong>de</strong> privilégio <strong>de</strong> 6 <strong>de</strong><br />
junho <strong>de</strong> 1377 permitia o livre uso <strong>de</strong> ma<strong>de</strong>iras das matas da Coroa por quem<br />
quisesse construir navios. Os pinhais da Leiria, plantados por Dom Diniz, significavam<br />
uma antevisão. As caravelas iriam fazer-se com as suas ma<strong>de</strong>iras. As<br />
dinastias têm o valor histórico <strong>de</strong> serem contínuas. A tradição, que é uma força<br />
<strong>de</strong> coesão social, não sofre as síncopes que se observam nos regimes rotativos,<br />
on<strong>de</strong> se per<strong>de</strong>m energias preciosas, pela superstição da mudança, tantas vezes<br />
<strong>de</strong>snecessária. Não fossem a Casa <strong>de</strong> Avis e a Casa <strong>de</strong> Bragança, as dinastias<br />
que <strong>de</strong>scerraram novos horizontes à convivência humana, à consecução da riqueza,<br />
à glória do cristianismo, e talvez outra fosse a face da terra.<br />
Todos os que são provi<strong>de</strong>ncialistas na História vêem a mão da Providência<br />
na escolha <strong>de</strong> Portugal para a formidável obra dos <strong>de</strong>scobrimentos. Foi Portugal<br />
estimulado pela tentação da riqueza. Era econômico o móvel da sua expansão,<br />
sem dúvida. Mas não somente econômico. “Aos estímulos oriundos do<br />
mundo da economia”, acentua Damião Peres, “cumpre acrescentar aqueles<br />
que, como forças espirituais, os vivificavam – os <strong>de</strong> natureza científica e religiosa.<br />
A curiosida<strong>de</strong> científica foi <strong>de</strong>certo um não <strong>de</strong>spiciendo fator da expansão<br />
portuguesa, pois que os estudos cosmográficos eram objeto <strong>de</strong> viva atenção em<br />
Portugal, já na primeira meta<strong>de</strong> do século XIV; porém muito mais atuou, sem<br />
dúvida, o pensamento <strong>de</strong> cruzada, que reacendia a secular tradição portuguesa<br />
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