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R I 5 - Unicuritiba

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PERCURSO:<br />

CURITIBA EM TURISMO<br />

ISSN 1678-569X<br />

ENTIDADE MANTENEDORA:<br />

ASSOCIAÇÃO DE ENSINO NOVO ATENEU<br />

Percurso: Curitiba em Turismo Curitiba a. 6 n. 6 2007<br />

p. 1-136<br />

1


2<br />

Publicação oficial do UNICURITIBA<br />

EXPEDIENTE<br />

Endereço: Rua Chile, 1.678 – CEP 80220-181 – Curitiba, PR – Brasil<br />

Telefone: (41) 3213-8700<br />

Site: www.unicuritiba.edu.br<br />

E-mail: npea@unicuritiba.edu.br<br />

UNICURITIBA<br />

Reitor: Danilo Vianna<br />

Pró-Reitor Acadêmico: Antonio Gonçalves de Oliveira<br />

Pró-Reitor Administrativo: Renato Silva<br />

Comissão Editorial: Cristina Luiza C. Surek, Carlos Luiz Strapazzon, Marlus Vinicius<br />

Forigo, Gisela Maria Bester Benitez, Nilson Cesar Fraga, Olga Maria Coutinho<br />

Pépece, Benedito Costa Neto Filho.<br />

Revisão: Antonio Carlos Amaral Lincoln<br />

Diagramação: Tatiane Andrade de Oliveira<br />

Impressão: Associação de Ensino Novo Ateneu (AENA)<br />

Tiragem: 200 exemplares<br />

Data: 2007<br />

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)<br />

Biblioteca do UNICURITIBA<br />

Percurso: Curitiba em turismo / UNICURITIBA. – Centro<br />

Universitário Curitiba. – A. 1, n.1, (2002). – Curitiba:<br />

UNICURITIBA, 2002 - .<br />

24 cm<br />

Anual.<br />

A partir do a. 3, n.3, 2004, a revista sofreu reformulações quanto à<br />

padronização.<br />

ISSN 1678-569X.<br />

1. Turismo – Periódicos. I. UNICURITIBA<br />

CDD (21.ed.) – 338.4791


CONSELHO CIENTÍFICO<br />

Cláudia do Carmo Destefani<br />

Gil Fernando Polidoro<br />

Janaina Zito Losada<br />

Maria do C. M. Brandão Rolin<br />

Nilson Cesar Fraga<br />

Rosane Beyer<br />

Simone Cristina Iubel Carneiro<br />

CONSELHO EDITORIAL<br />

Antônio Castelnou (UFPR) – PR<br />

Giovanni de Farias Seabra (UFPB) – PB<br />

Luiz Gonzaga Godoi Trigo (UNICAMP) – SP<br />

Luzia Neide M. T. Coriolano (UEC) – CE<br />

Marcos Aurélio Tarlombani da Silveira (UFPR) – PR<br />

Maria Elisa Zanella (UFC) – CE<br />

Marilia Gomes dos Reis Ansarah (EAESP) – SP<br />

Miguel Bahl (UFPR) – PR<br />

EDITOR<br />

Nilson Cesar Fraga<br />

COORDENAÇÃO EDITORIAL<br />

Marlus Vinícius Forigo<br />

3


APRESENTAÇÃO<br />

Apresentamos a sexta edição de PerCurso: Curitiba em turismo,<br />

que se encontra habilitada pelo sistema de classificação de periódicos,<br />

anais, revistas e jornais, da Capes – Sistema Qualis, como “B” nacional,<br />

área Multidisciplinar, fruto de um processo contínuo de melhoramento em<br />

busca da qualidade do material científico publicado no Centro Universitário<br />

Curitiba (UNICURITIBA).<br />

Este volume vem caracterizado por um conteúdo diversificado,<br />

atendendo às especificidades dessa área do conhecimento, com artigos<br />

produzidos na Universidade Federal do Paraná, Universidade Federal do<br />

Pampa (RS), Universidade de Caxias do Sul, Universidade do Vale do<br />

Itajaí (SC) e do UNICURITIBA, fruto de trabalhos de Graduação, Mestrado<br />

e Doutorado, além da Iniciação Científica, que é a base da construção do<br />

conhecimento e formação continuada de cientistas brasileiros.<br />

Um dos trabalhos apresentados propõe estudar a formação<br />

socioespacial e cultural do município de Mato Rico, no Estado do Paraná,<br />

com fundamento nas experiências e na história de vida de seus primeiros<br />

moradores (os descendentes de colonizadores ucranianos, que deram<br />

origem à Colônia Ucraniana de Mato Rico), com a possibilidade de inserção<br />

da atividade turística para gerar renda, trabalho e riqueza no município.<br />

Num plano mais teórico do turismo, é exposto o conceito de vilas<br />

de ecoentretenimento, destacando o contexto em que surgiram, bem como<br />

suas principais características e sua aplicação concreta dentro do<br />

Programa de Desenvolvimento do Ecoturismo na Amazônia Legal<br />

(PROECOTUR), coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente.<br />

O turismo, enquanto atividade econômica, pode contribuir para o<br />

desenvolvimento social, econômico e cultural de uma região. Para se<br />

compreender essa hipótese, é importante introduzir não apenas os<br />

princípios orientadores de desenvolvimento, mas simultaneamente refletir<br />

sobre as estratégias de estruturação e o desenvolvimento da atividade<br />

em regiões específicas. É com base nas particularidades de cada região<br />

que é possível apontar os fatores positivos e negativos da atividade. Todavia,<br />

mais do que abordar, em termos gerais, essa problemática, aqui<br />

efetivamente se estudam as estratégias de planejamento e gestão da<br />

atividade turística na rota do Vale dos Vinhedos (RS).<br />

“O Novo clima do Paraná” propõe a análise e a identificação das<br />

alterações registradas no clima paranaense em determinado período. As<br />

mudanças climáticas observadas são decorrentes de fatores endógenos<br />

e exógenos. Internamente, desde o século XIX, o Paraná teve transformada<br />

5


6<br />

sua paisagem, principalmente pela expansão agrícola, industrialização e<br />

urbanização. O conhecimento dessa questão socioambiental se faz<br />

pertinente no momento, pois é indiscutível a relação do clima com a<br />

sociedade e com a atividade turística.<br />

O segundo “Roteiro de turismo de guerra”, do Núcleo de Pesquisa<br />

de Turismo de Guerra (NPTG/Turismo/UNICURITIBA), focaliza o Sudoeste<br />

do Paraná, onde ocorreu o Levante dos Posseiros, em 1957.<br />

Esta edição PerCurso fica entregue à comunidade científica, e<br />

reiteramos nosso convite a esta para o envio de trabalhos que serão<br />

publicados em edições futuras, permitindo que o debate acadêmico do<br />

Turismo seja ampliado e que a cada ano se intensifique e se faça<br />

necessário.<br />

Nilson César Fraga<br />

EDITOR


SUMÁRIO<br />

COLÔNIA UCRANIANA DE MATO RICO, PR:<br />

ESPAÇO, MEMÓRIA E PERSPECTIVAS DO<br />

TURISMO SOCIOCULTURAL<br />

Clotilde Zai e Nilson César Fraga ............................................................ 9<br />

VILAS DE ECOENTRETENIMENTO ® : UMA VISÃO<br />

PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL<br />

DE DESTINOS ECOTURÍSTICOS – PROPOSTA<br />

PARA DESTINOS TURÍSTICOS NA AMAZÔNIA<br />

Doris Ruschmann, Joaquim Rondon e<br />

Jens Ruschmann .................................................................................... 43<br />

ESTRATÉGIAS DE DESENVOLVIMENTO LOCAL:<br />

O CASO DO TURISMO NA ROTA VINÍCOLA<br />

DO VALE DOS VINHEDOS<br />

C. B. Marques, C. H. S. Santos e J. M. Rocha ....................................... 59<br />

O NOVO CLIMA DO PARANÁ<br />

Mozart Nogarolli ....................................................................................... 81<br />

SUDOESTE PARANANESE: 50 ANOS DO LEVANTE DOS<br />

POSSEIROS – IDENTIDADE LOCAL E REGIONAL RESGATADA<br />

POR MEIO DO ROTEIRO DE TURISMO DE GUERRA<br />

Rafael Carlos Prieto Fernandes, Vanessa Márcia Vargas e<br />

Nilson César Fraga ............................................................................... 107<br />

NORMAS EDITORIAIS ........................................................................ 131<br />

7


Clotilde Zai e Nilson César Fraga<br />

COLÔNIA UCRANIANA DE<br />

MATO RICO, PR:<br />

ESPAÇO, MEMÓRIA<br />

E PERSPECTIVAS DO<br />

TURISMO SOCIOCULTURAL<br />

CLOTILDE ZAI<br />

___________________________________________________________<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 9-41, 2007.<br />

9<br />

Bacharel em Turismo,<br />

Mestranda em Geografia (UFPR)<br />

NILSON CÉSAR FRAGA<br />

___________________________________________________________<br />

Doutor em Meio Ambiente e Desenvolvimento pela UFPR,<br />

Professor do UNICURITIBA e da<br />

Pós-Graduação em Geografia da UFPR


10 Colônia Ucraniana de Mato Rico, PR ...<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 9-41, 2007.


Clotilde Zai e Nilson César Fraga<br />

RESUMO<br />

O presente trabalho visa apresentar um levantamento histórico do município<br />

de Mato Rico, dando prioridade à comunidade em que se iniciou o<br />

processo de colonização, a Colônia Ucraniana. Dessa forma, elaborou-se<br />

uma espécie de inventário patrimonial, considerando as festas tradicionais,<br />

o folclore, os hábitos alimentares, tendências artísticas, religiosidades<br />

e outros aspectos culturais. Pretende-se que a identidade dos habitantes<br />

de Mato Rico seja preservada, valorizada e mais bem aproveitada<br />

em pesquisas sobre a renovação da identidade da comunidade com depoimentos<br />

dos primeiros habitantes da localidade. O método utilizado para<br />

pesquisa é de levantamento, por meio de dados fornecidos em entrevistas.<br />

Visa esclarecer objetos pouco conhecidos e descrever fenômenos<br />

pela oralidade, com entrevistas para coleta de referências a respeito do<br />

processo de formação histórica vivida pelos primeiros habitantes do município<br />

de Mato Rico (PR).<br />

Palavras-chave: levantamento histórico, patrimônio, cultura.<br />

ABSTRACT<br />

The present work aims at to present a historical survey of the Rich city of<br />

Weeds, focusing the Ucraniana Colony, elaborating a species of patrimony<br />

inventory, considering the traditional parties, the alimentary folklore, habits,<br />

artistic trends, culture religion and other aspects. Thus the identity of the<br />

inhabitants of Rich Weeds is preserved, valued and better used to advantage<br />

in research on the renewal of the identity of the local community by means<br />

of depositions of the first inhabitants of the locality. The method used for<br />

research is of survey, by means of data supplied in interviews. It aims at to<br />

little clarify objects known and to describe phenomena through by means<br />

of the orality, with interviews for collection of data, referring to the process<br />

of historical formation lived by the first inhabitants of the city of Mato Rico –<br />

state of the Paraná.<br />

Keyword: historical survey, patrimony, culture.<br />

11<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 9-41, 2007.


12 Colônia Ucraniana de Mato Rico, PR ...<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 9-41, 2007.


Clotilde Zai e Nilson César Fraga<br />

1 INTRODUÇÃO<br />

Ao abordarmos a identidade cultural de determinado localismo 1 ,<br />

pode-se compreender o processo de formação histórica desse território.<br />

Assim, a presente pesquisa propõe estudar a história da formação<br />

socioespacial e cultural do município de Mato Rico, no Estado do Paraná,<br />

a partir das experiências e da história de vida de seus primeiros moradores,<br />

os descendentes de colonizadores ucranianos que deram origem à<br />

Colônia Ucraniana, que compreende a área de estudo proposta para o<br />

presente trabalho.<br />

O município de Mato Rico foi habitado pelas primeiras famílias em<br />

1938, segundo dados coletados em entrevistas com os pioneiros. Partindo<br />

da necessidade de um resgate histórico e cultural desse município,<br />

houve o estímulo para o desenvolvimento da pesquisa, que visa preencher<br />

a lacuna atual da falta de informações publicadas da história do município,<br />

da cultura e dos hábitos locais, fortemente estampados e influenciados<br />

pelo povoamento, crenças e costumes da etnia ucraniana.<br />

O objetivo do trabalho é demonstrar o processo de formação<br />

socioespacial e cultural dessa localidade, construindo uma espécie de<br />

inventário patrimonial e considerando as festas tradicionais, o folclore, os<br />

hábitos alimentares, tendências artísticas, religiosidades e outros aspectos<br />

culturais, de tal forma que valorize e preserve aspectos da comunidade<br />

de Mato Rico e que possa ser mais bem aproveitada em possíveis<br />

pesquisas sobre a renovação da identidade da comunidade local por meio<br />

de depoimentos dos primeiros habitantes.<br />

O método utilizado para pesquisa é de levantamento, por meio de<br />

dados fornecidos em entrevistas. Visa esclarecer objetos pouco conhecidos<br />

e descrever fenômenos por meio da oralidade, com entrevistas para<br />

coleta de dados, referentes ao processo de formação histórica vivida pelos<br />

primeiros habitantes do município de Mato Rico.<br />

1 Localismo é conceituado por Ulf Hannerz como: “[...] culturas territorialmente ancoradas<br />

ou ‘culturas limitadas que envolvem relações frente a frente, entre povos que não<br />

se movimentam em grande escala.” (Cosmopolitas e locais na cultura global. In:<br />

FEATHERSTONE, Mike (Org.). Cultura global: nacionalismo, globalização e<br />

modernidade. 3. ed. Rio de Janeiro: Vozes, 1990.<br />

13<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 9-41, 2007.


14 Colônia Ucraniana de Mato Rico, PR ...<br />

As pesquisas realizadas para elaboração deste trabalho são de<br />

fontes bastante amplas, compreendendo documentos cartográficos, entrevistas,<br />

depoimentos, fotos e participação em eventos realizados pela<br />

comunidade. Optou-se por utilizar as fontes orais de forma espontânea,<br />

de acordo com o relato de cada entrevistado, para, assim, enriquecer e se<br />

fazer entender um pouco mais das lutas e conquistas de cada um. Conforme<br />

estudos realizados por P. Litvin (1998, p. 14), “[...] cada cultura possui<br />

uma historicidade própria. Os elementos constituintes da comunidade<br />

produzem e constroem a sua própria história.”<br />

Analisando a conceituação de Morais (Não consta nas referências.)<br />

(2000, p. 22), a imagem que o imigrante constrói de seu lugar de<br />

origem somente tem sentido no interior de sua própria comunidade. Aqui<br />

no Brasil, os valores, as tradições e as impressões que marcam sua<br />

memória se referem a um lugar, ou a um país, que não existe mais, diferente<br />

das lembranças de um indivíduo que nunca deixou sua terra natal.<br />

M. Weber (1998, p. 37), em seus estudos sobre as teorias da etnicidade,<br />

teve por objetivo mostrar que o contato do imigrante com a nação receptora,<br />

o contraste cultural, social e econômico o aproximam, ainda mais, de seu<br />

grupo de origem e dos valores compartilhados por essa comunidade. Esses<br />

grupos além de representarem, em alguns casos, os aspectos étnicos,<br />

correspondem, principalmente, à representação dos valores culturais,<br />

ou seja, alimentam uma crença subjetiva em uma comunidade de<br />

origem fundada nas semelhanças da aparência externa nos costumes e,<br />

até mesmo, nas lembranças da migração, de modo que essa crença se<br />

torna importante para o processo de colonização, pouco importando que<br />

uma comunidade de sangue exista ou não objetivamente.<br />

Dessa forma, o trabalho foi apresentado em capítulos. No capítulo<br />

primeiro, após a introdução, pode-se notar a caracterização da área de<br />

estudo. No segundo, lança-se um olhar sobre a história oral mostrando a<br />

literatura utilizada no desenvolvimento da pesquisa. No terceiro capítulo,<br />

traça-se uma viagem pela história de Mato Rico discorrendo sobre relatos<br />

dos primeiros moradores da Colônia. No quarto capítulo, é feita a apresentação<br />

dos atrativos naturais, patrimônio artesanal, gastronomia típica e<br />

arquitetura da comunidade, como incentivo à valorização da atividade turística.<br />

No quinto capítulo, desenvolvem-se as considerações finais.<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 9-41, 2007.


Clotilde Zai e Nilson César Fraga<br />

2 CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO<br />

O município foi habitado pelas primeiras famílias, em 1938, que<br />

foram residir na Colônia Mato Rico. A emancipação política, enquanto unidade<br />

administrativa municipal, ocorreu em 31/1/1991, quando se<br />

desmembrou de Pitanga. Atualmente, integra a microrregião de Pitanga,<br />

na porção central do Estado do Paraná (figura 1). Tem como limites<br />

territoriais os municípios de Pitanga, Roncador e Palmital, cujas distâncias<br />

entre as sedes administrativas são 58 km até Pitanga, 24 km até<br />

Roncador e, aproximadamente, 450 km até a capital do Estado. Seus acessos<br />

são rodoviários e por estradas sem pavimentação.<br />

Além de ucranianos, fixaram-se na região, descendentes de poloneses,<br />

italianos e portugueses, bem como a importante influência indígena<br />

e de afrodescendentes originários do Sudeste e Nordeste do Brasil, os<br />

quais fizeram o papel de miscigenar a formação étnica e cultural, não só<br />

de Mato Rico, enquanto localidade e município, mas ainda de todo o Paraná.<br />

As atividades econômicas predominantes no município e na Colônia<br />

são: agricultura familiar tendo como principais cultivos milho, soja e<br />

trigo; secundariamente feijão, arroz, algodão e mandioca; na pecuária, com<br />

técnica extensiva, gado de corte e leite; outras atividades são apicultura e<br />

sericicultura.<br />

No contexto regional do Estado do Paraná, o município de Mato<br />

Rico, que compreende a área de estudo, está entre os três que apresentam<br />

os piores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH 2 ) paranaense,<br />

igual a 0,640, segundo dados do Programa das Nações Unidas para o<br />

Desenvolvimento (PNUD), 2007.<br />

2 O IDH foi criado para medir o nível de desenvolvimento humano dos países, com base<br />

em indicadores de educação (alfabetização e taxa de matrícula), longevidade (expectativa<br />

de vida ao nascer) e renda (PIB per capita). Seus valores variam de 0 (nenhum<br />

desenvolvimento humano) a 1 (desenvolvimento humano total). Países com IDH até<br />

0,499 são considerados de desenvolvimento humano baixo; com índices entre 0,500<br />

e 0,799 são considerados de desenvolvimento humano médio; com índices maiores<br />

que 0,800 são considerados de desenvolvimento humano alto. O ÍDH que é utilizado<br />

para aferir o nível de desenvolvimento humano em municípios denomina-se IDH municipal<br />

ou IDH-M. Embora meça os mesmos fenômenos – educação, longevidade e<br />

renda –, os indicadores levados em conta não são mais adequados para avaliar as<br />

condições de núcleos sociais menores (IBGE, 2007).<br />

15<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 9-41, 2007.


16 Colônia Ucraniana de Mato Rico, PR ...<br />

FIGURA 1 - MAPA DE LOCALIZAÇÃO DO MUNICÍPIO DE MATO RICO E<br />

DA COLÔNIA<br />

Latitude 24º 35' 34" sul<br />

Longitude 52º 23' 36" oest e<br />

BRASIL PARANÁ<br />

Equador<br />

Trópicode<br />

Capricórnio<br />

MUNICÍPIO<br />

LEGENDA:<br />

Colônia Mato Rico<br />

Sede do muncípio de Mato Rico<br />

Limites municipais<br />

Estradas não pavimentadas<br />

0 3 6 9 km<br />

W<br />

N<br />

S<br />

E<br />

Organizados: Claudinei Taborda da Silveira<br />

Fonte: Dados cartográficos digitais, IBGE (2001)<br />

DE MATO RICO<br />

Limite com o município de Palmital<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 9-41, 2007.<br />

Limite com o município de Roncador<br />

Colônia<br />

Mato Rico<br />

Sede municipal<br />

de Mato Rico<br />

de Pitanga<br />

Limite com o município<br />

Latitude 24º 47' 53" sul<br />

Longitude 52º 04' 33" oeste<br />

A organização fundiária da Colônia Mato Rico e do município é composta<br />

de pequenas propriedades, com áreas médias de 22,4 ha. A população<br />

mato-riquense é formada por 82% de pequenos agricultores familiares<br />

(proprietários, meeiros, arrendatários e posseiros) e caracteriza-se<br />

pela baixa ou até média tecnologia com mão-de-obra familiar (IBGE, 2007).


Clotilde Zai e Nilson César Fraga<br />

O município de Mato Rico tem uma área de 404,455 km 2 e está em<br />

altitude média de 700 metros, localizando-se geograficamente entre as<br />

coordenadas de latitude de 24º42' sul e longitude 52º8' oeste.<br />

1.2 UM OLHAR SOBRE A HISTÓRIA ORAL<br />

É interessante notar que, segundo Azevedo (apud CASSIANO, 1998<br />

p. 154) “[...] a história oral, por meio da história reconstituída, pode contribuir<br />

para a reconstrução de práticas culturais e de grupos que não tem<br />

acesso à escrita”, sendo essa uma forma de pesquisa que valoriza as<br />

culturas locais e identidades, possibilitando registros dos costumes e acompanhamento<br />

da transformação da identidade dos povos.<br />

Analisando os escritos de Cléria (1997), a história oral é construída<br />

com base nos fazeres corriqueiros das pessoas e nos valores simbólicos,<br />

no entendimento analítico da coimunidade, na compreensão dos mitos,<br />

ritos, utopias, ou seja, no imaginário e nas ações.<br />

A Organização Mundial do Turismo (OMT) fez uma inclusão de item<br />

específico sobre “patrimônio humano”, conforme Bayle (apud AZEVEDO,<br />

1998 p. 153), incluindo dados demográficos, condições de vida e hábitos<br />

sociais que vêm reforçar a perspectiva de valorização da oralidade enquanto<br />

pesquisa.<br />

Em seus escritos, A. Pelegrini Filho (1997, p. 93-157) reforça a<br />

idéia de que preservar não é apenas guardar algo tangível, mas a história<br />

contada, as manifestações culturais e os costumes, enfim tudo o que envolve<br />

essas manifestações e culturas deve ser mantido vivo na memória<br />

das gerações futuras.<br />

17<br />

Preservar é gravar depoimentos, sons, músicas populares e eruditas.<br />

Preservar é manter vivos, mesmo que alterados usos e costumes<br />

populares. É fazer, também, levantamentos de qualquer<br />

natureza, de sítios variados. Devemos, então, de qualquer maneira,<br />

garantir a compreensão de nossa memória social preservando<br />

o que for significativo dentro de nosso vasto repertório de elementos<br />

componentes do “Patrimônio Cultural”.<br />

Para Azevedo (1998, p. 149), “[...] cultura é a força maior, mais<br />

abrangente, geradora de patrimônio, elemento subjacente do turismo. Força<br />

que envolve o pensar, o sentir, o fazer, o viver, enfim.” Representa, portanto,<br />

o código mais profundo que revela a feição singular de um povo, ou<br />

seja, sua identidade. Fazendo uma relação entre cultura e patrimônio apli-<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 9-41, 2007.


18 Colônia Ucraniana de Mato Rico, PR ...<br />

cados ao turismo, é possível observar fortemente os esteios insubstituíveis<br />

que permitem usufruir o encontro de singularidades, já que o turismo por<br />

natureza e essência, implica busca de diferenças.<br />

Segundo D. Ribeiro (1995):<br />

A noção de patrimônio como recurso para o desenvolvimento é<br />

uma construção recente e está intimamente associada à<br />

especificidade que lhe permite fazer do espaço onde se localiza<br />

um lugar diferente de todos os outros, transformando-o numa atração<br />

turística que combina elementos tão diferenciados como a<br />

arquitetura, o artesanato, a gastronomia, as festas, as crenças, os<br />

modos de vida tradicionais e outros bens não materiais que lhe<br />

estão associados, ensejando a experiência da descoberta, de<br />

exotismo, de auto-realização e de evasão do cotidiano.<br />

O patrimônio histórico e cultural de uma localidade constitui-se<br />

numa das principais motivações para o turista buscar seu destino de<br />

visitação. Conforme estudos de D. Ribeiro (1995), os componentes mencionados,<br />

além de atrair o turista, promovem o desenvolvimento local.<br />

1.3 UMA VIAGEM PELA HISTÓRIA DA COLÔNIA DE MATO RICO<br />

As terras da região de Mato Rico foram ocupadas por volta de 1938<br />

por pioneiros migrantes que adquiriram a posse no governo estadual, para<br />

desenvolvimento agrícola. O povoamento cresceu e se desenvolveu a partir<br />

de 1941, quando os moradores começaram a se estabelecer ao longo da<br />

estrada que dava acesso à cidade.<br />

Mato Rico recebeu essa denominação em função da rica mata de<br />

araucária e muitas colméias de abelhas.<br />

Uma das comunidades do município é hoje denominada Colônia,<br />

por tratar-se da povoação de imigrantes europeus vindos para o Brasil em<br />

busca de melhores condições de vida. Na época que as famílias saíram<br />

de seu país de origem, a Ucrânia estava sob domínio do império austrohúngaro<br />

e, como comenta J. V. Kotviski (2005), “[...] milhares de pessoas<br />

deixavam a terra natal, com dor no coração, mas certas de que no novo<br />

país, seus filhos não seriam humilhados, como eles que viviam em condições<br />

miseráveis pela imposição dos opressores.”<br />

Os descendentes ucranianos e poloneses povoaram o Paraná, primeiramente<br />

na região de Prudentópolis, a partir de 27/4/1895, provindos<br />

da Galícia (Ucrânia Ocidental), em busca de terra fértil e pela semelhança<br />

climática. Depois, entraram em outros locais, como o município de Mallet,<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 9-41, 2007.


Clotilde Zai e Nilson César Fraga<br />

localizado no Sul do Estado, de onde algumas famílias se deslocaram<br />

para Mato Rico em 1938 (figura 2).<br />

Segundo documentos da Sociedade Ucraniano-Brasileira, em 1908<br />

ocorreu a segunda etapa da colonização, durante a construção da estrada<br />

de ferro que liga São Paulo ao Rio Grande do Sul. O governo brasileiro,<br />

no intuito de atrair os interessados para essa grande obra, pagava as passagens<br />

de navio e as despesas com alimentação para os imigrantes. Com<br />

isso, milhares de eslavos foram instalando-se nas margens da ferrovia<br />

que construíram, em Irati, Ponta Grossa, Mallet, Dorizon, Paulo Frontin,<br />

União da Vitória e outros locais. Essa segunda etapa se prolongou até a<br />

Segunda Guerra Mundial. Muitos ucranianos emigraram, motivados principalmente<br />

por já terem familiares no Paraná. Atualmente no Brasil, há<br />

cerca de 500.000 ucranianos e descendentes, dos quais 90% estão no<br />

Paraná.<br />

FIGURA 2 - MAPA ILUSTRATIVO APRESENTANDO DOIS MUNICÍPIOS<br />

QUE RECEBERAM IMIGRANTES UCRANIANOS NO ESTA-<br />

DO DO PARANÁ<br />

W<br />

N<br />

S<br />

E<br />

Colonização<br />

de<br />

Mato Rico<br />

Mato Rico<br />

Mallet<br />

Entrada de<br />

imigrantes<br />

ucranianos<br />

0 100 200 300 km<br />

FONTE: Claudinei Taborda da Silveira, 2007.<br />

19<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 9-41, 2007.


20 Colônia Ucraniana de Mato Rico, PR ...<br />

O que os impulsionava procurar outros locais, com a impossibilidade<br />

de prover seu sustento, era a busca da liberdade, como mostra o<br />

poema de Helena Kolodi (1997, p. 152), a seguir. Em decorrência disso,<br />

surgiram as grandes levas de imigrantes que eram atraídos por melhores<br />

condições fora dos limites territoriais ucranianos.<br />

No fluir secreto da vida,<br />

Atravessei os milênios.<br />

Vim dos vikings navegantes,<br />

Cujas naus aventureiras<br />

Traçaram rotas nos mapas.<br />

Ousados conquistadores,<br />

Fundaram Kiev antiga,<br />

Plantando um marco na história<br />

De meus ancestrais.<br />

Vim da Ucrânia valorosa,<br />

Que foi Russ e foi Rutênia.<br />

Povo indomável, não cala<br />

A sua voz sem algemas.<br />

Vim das levas imigrantes<br />

Que trouxeram na equipagem<br />

A coragem e a esperança.<br />

Em sua luta sofrida,<br />

Correu no rosto cansado,<br />

Com o suor do trabalho,<br />

O quieto pranto saudoso.<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 9-41, 2007.<br />

(KOLODI, H. Luz Infinita. 1997, p. 152 )<br />

A coragem de buscar o novo e o desconhecido, enquanto a saudade<br />

dos que ficaram apertava, porém nada havia a fazer, além de cultivar<br />

sua cultura, seus costumes e permanecer no espaço brasileiro.<br />

Após a instalação das primeiras famílias imigrantes, o governo<br />

enviou agrimensores para fazerem as medições das terras que foram<br />

divididas em lotes de dez alqueires por famílias. A seguir, transcreve-se<br />

parte do relato de Miroslau Ivanchechin (2002).


Clotilde Zai e Nilson César Fraga<br />

– O governo brasileiro dava, pra cada família que chegasse,<br />

um lote de dez alqueires de terra e já avisavam: só pode cortá o mato<br />

em oito alqueire, os outros dois é pra para deixá reserva [...] 3<br />

As famílias, quando chegavam, permaneciam em barracas provisórias<br />

no meio da mata fechada, até serem medidas as terras e serem<br />

construídas suas casas nos lotes definitivos, geralmente próximos à água e<br />

em locais estratégicos, de forma que ficassem mais perto uns dos outros.<br />

Este é o depoimento de Maria Bednartchuk Gomach (2005):<br />

– Quando o agrimensor vinha medir as terras da região, era<br />

feito um mutirão pra ajudar. Então, chegaram em um local onde tinha<br />

açúcar amarelo guardado em lata, e, quando acabou, um rapaz que<br />

estava junto lavou a lata e derramou no rio. Então, o agrimensor disse<br />

que este lugar se chamaria Água Doce e fez o registro das terras.<br />

As medições eram feitas pelo espigão da serra. Cercava as serras e<br />

chamava de muquilão.<br />

O agrimensor levava o virado em uma mochila nas costas.<br />

As primeiras famílias que povoaram Mato Rico foram Ivanchechin<br />

e Bednartchuk, vindas do distrito de Dorizon, município de Marechal Mallet,<br />

em 1939. Ficaram praticamente unidas com Valdomiro Bednartchuk, sua<br />

esposa Ana Bednartchuk e os filhos João, Estefano, Carlos, Alberto,<br />

Genoveva (Eugênia), Eduardo, Helena, Verônica, Maria, Júlia e Miroslau<br />

Ivanchechin casado com Eugênia. Os filhos Carlos, Helena e Angelina<br />

permaneceram por mais um ano em Marechal Mallet e, em 1940, se juntaram<br />

ao restante da família, em Mato Rico.<br />

Segundo informações fornecidas em entrevista por Miroslau<br />

Ivanchechin, para confirmar se existiam realmente terras ainda não ocupadas,<br />

Valdomiro Bednartchuk e seu primeiro filho, João, foram conhecer<br />

e preparar o local antes de fazer a mudança. Quando chegaram tudo ainda<br />

era mata fechada e tiveram que desmatar alguns trechos, com foice e<br />

machado até a margem do rio, onde construíram um simples abrigo. Esse<br />

rio, mais tarde foi nomeado pelos agrimensores de São Lourenço. João ali<br />

plantou o primeiro espaço de terra e a primeira lavoura de milho. Conta,<br />

inclusive, que João ficou plantando milho, enquanto Valdomiro retornava<br />

3 Entrevista concedida por Miroslau Ivanchechin, em 16/6/2002 e em Mato Rico.<br />

21<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 9-41, 2007.


22 Colônia Ucraniana de Mato Rico, PR ...<br />

para buscar a família, e, pela demora, João mandou carta para que fossem<br />

rápido, antes que os porcos-do-mato acabassem com a lavoura, pois<br />

não conseguiu matá-los. Havia muitos para tão pouca comida e os animais<br />

eram bravos. Nessa época, além de porcos-do-mato, existiam também<br />

cateto e anta que acabavam com as poucas plantações, segundo<br />

depoimentos de Miroslau e Aniela (2005).<br />

De acordo com documentação da família, Miroslau Ivanchechin<br />

nasceu em Dorizon, em 16/5/1915, e se casou com Genoveva<br />

Bednartchuk, nascida também em Dorizon, em 5/11/1915. O casamento<br />

foi realizado no mês de janeiro de 1940, e no mês de abril do mesmo ano,<br />

com a família de Genoveva, (conhecida por todos como Eugênia), partiram<br />

para Mato Rico em busca de terras. A viagem foi de caminhão até a<br />

localidade de Borboleta, onde Valdomiro contratou um carroceiro que chegou<br />

ao Rio Quinze e não quis continuar, pois a estrada estava muito ruim<br />

e só tinha dois animais. Então, descarregaram a mudança, que era pequena,<br />

em um barracão onde Valdomiro Bednartchuk e as crianças ficaram<br />

alojados durante quinze dias até parar de chover e a estrada secar.<br />

Enquanto isso, segundo depoimento de Maria Bednartchuk Gomach (2005):<br />

– Miroslau, Eugênia, Eduardo e eu viemos a pé na frente, atravessamos<br />

um rio cheio e pousamos nas barras na casa dos Voidelo.<br />

Passamos na casa da Ana Gurak onde comemos pão de abóbora,<br />

feito de trigo moído na jorna 4 e ali permanecemos até que os demais<br />

chegassem. 4<br />

A mudança foi transportada de carroça até a propriedade de Alexandre<br />

Dziubate, na localidade de Rio das Barras, aproximadamente 4 km<br />

do destino. Dali em diante levaram seus pertences nas costas e a cavalo,<br />

até a casa à margem do rio, na atual comunidade de Colônia.<br />

Conta Miroslau que as estradas foram abertas com facão e machado<br />

pelos carroceiros que, muitas vezes, ficavam dias na estrada, com<br />

suas carroças atoladas, esperando a terra secar. Da Colônia até a cidade<br />

de Pitanga demorava, na época, dois dias de viagem, com parada apenas<br />

noturna.<br />

4 Jorna é uma espécie de moinho artesanal utilizado para fazer farinha de trigo, de<br />

milho e de centeio. Produz uma farinha grossa.<br />

4 Entrevista concedida por Maria Bednartchuk Gomach, em 6/1/2005 e em Mato Rico.<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 9-41, 2007.


Clotilde Zai e Nilson César Fraga<br />

Foram coletadas informações de Angelina (Aniela) Bednartchuk,<br />

que chegou a Mato Rico em 1941, já casada com Valdomiro Gruchovski,<br />

nascido em Dorizon, município de Mallet, no Paraná, em 12/5/1918, e ela<br />

nascida também em Dorizon, em 11/12/1917. Casaram-se, segundo certidão,<br />

em 1940, na cidade de Mallet, e moraram lá durante um ano, pois<br />

Valdomiro foi servir o Exército por seis meses.<br />

Chegaram a Mato Rico em 1941, moraram com a família de<br />

Valdomiro Bednartchuk, pai de Angelina, durante um ano, até construírem<br />

uma casa em suas terras, na hoje denominada Colônia Ucraniana. Nesse<br />

ano nasceu a primeira filha, Olga. Enquanto isso, andavam cerca de 3 km<br />

pela mata fechada que era cortada praticamente todos os dias em alguns<br />

lugares, pois segundo Angelina:<br />

– O taquaruçu abaixava e eles tinham que passar de joelhos<br />

por baixo dos espinhos para chegar até a lavoura que era feita toda<br />

na enxada. Eram jogadas as sementes de trigo e picada a terra com<br />

a enxada para cobrir. 5<br />

Disse Angelina que perto de sua casa era o caminho das antas<br />

passarem, que certo dia um “tigre” rondou perto de sua casa, sendo possível<br />

ouvir os uivos dele no mato e que os porcos-do-mato se aproximavam<br />

até o terreiro de sua casa à procura de alimento. Deve tratar-se dos<br />

uivos de uma onça, uma vez que no Brasil não existe tigre, pois é um<br />

animal que ocupava historicamente uma extensa área que engloba Rússia,<br />

Sibéria, Irã, Cáucaso, Afeganistão, antiga Ásia Central soviética, Índia,<br />

China, todo o Sudeste da Ásia e Indonésia (ilhas de Sumatra, Java e Bali).<br />

Atualmente, encontra-se extinto em muitos países da Ásia.<br />

Quando os moradores da Colônia encontraram as pessoas que<br />

moravam nas proximidades de Mato Rico, hoje cidade, começaram a fazer<br />

trocas e vendas de verduras, frutas, legumes, ovos e outros alimentos<br />

produzidos no local. Criavam porcos, galinhas, patos, cavalos e vacas.<br />

Angelina e Valdomiro tiveram 15 filhos. São eles: Olga, Ana, Demétrio,<br />

Júlia, João, Estefano (falecido), Miroslau (falecido), os gêmeos Pedro (faleceu<br />

aos oito meses) e Paulo, Teodoro (faleceu aos sete dias), Miguel,<br />

Maria, José, Ilda e Ivo.<br />

5 Entrevista concedida por Angelina Bednartchuk Gruchovski, em 5/1/2005 e em Mato<br />

Rico.<br />

23<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 9-41, 2007.


24 Colônia Ucraniana de Mato Rico, PR ...<br />

Quando as pessoas adoeciam, eram levadas a cavalo até a estrada<br />

de acesso, que ligava Mato Rico a Pitanga, denominada por eles Estrada<br />

Grande. Pitanga era o lugar mais próximo onde tinha hospital e farmácia.<br />

O transporte no início era de carroça e anos depois de jipe. O enfermo<br />

só seria levado para o hospital, se a doença fosse realmente grave; caso<br />

contrário, eram feitos remédios caseiros ensinados pelos padres. Pela<br />

distância dos hospitais e de outras condições médicas, todos os nascimentos<br />

eram pelas mãos de parteiras, e a primeira atendente da comunidade<br />

foi Luiza Parnanguara.<br />

Conta Maria Gomach, que nessa época, havia uma doença com o<br />

nome de crupe (afecção diftérica da laringe, cujas falsas membranas dificultam<br />

a respiração) que atingia crianças e que causou várias mortes na<br />

comunidade. A primeira vacina que veio para essa região foi para prevenir<br />

as crianças dessa doença. As mães levavam seus filhos até a cidade de<br />

Roncador, para serem vacinados.<br />

Acometido de crupe, faleceu um filho recém-nascido do pioneiro<br />

João Sitko, que não tinha como sepultá-lo. Então escolheram o lugar doado<br />

por Valdomiro Bednartchuk onde enterraram a criança. Segundo a religiosidade<br />

das famílias, todo cemitério deve ser abençoado e aspergido<br />

com água benta, por isso Valdomiro chamou um padre para dar a bênção<br />

ao local. Depois desse fato, sepultaram um menino de 14 anos, chamado<br />

Paulo, filho também de João Sitko, e os demais falecidos seguintes da<br />

comunidade.<br />

Outra família pioneira é a de Adriano Kasnok, nascido em Dorizon.<br />

Depois morou em Apucarana e vinha a Mato Rico visitar sua irmã, Maria<br />

Kasnok, esposa de Carlos Bednartchuk, quando encontrou Júlia<br />

Bednartchuk, irmã de Carlos, nascida também em Dorizon, em 6/7/1929.<br />

Adriano e Júlia se casaram anos depois e tiveram cinco filhos: Ana, Teodoro,<br />

Pedro, Irineu e Bernardo, todos nascidos na Colônia.<br />

Segundo depoimento de Júlia Kasnok, ela é doadora do quadro de<br />

Nossa Senhora do Rocio que ganhou do Padre João Coelher e que deu<br />

origem ao nome da primeira escola e capela da comunidade de Colônia.<br />

Outra pioneira de Mato Rico é Maria Bednartchuk, nascida em<br />

Dorizon, em 28/8/1924. Casou-se em 1945 com Valdomiro Gomach<br />

(Ladislau como gostava de ser chamado), nascido em Roncador, em 1º/<br />

9/1920. Moraram alguns anos em Roncador onde tiveram a primeira filha,<br />

Cecília (Cila). Pela dificuldade em permanecer em lugar isolado e de mata<br />

muito fechada, resolveram mudar para Mato Rico, ficando, então, próximos<br />

dos parentes de Maria.<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 9-41, 2007.


Clotilde Zai e Nilson César Fraga<br />

De acordo com depoimentos de Angelina e Maria, era cultivado na<br />

comunidade o trigo e moído na jorna para fazer a farinha que ficava um<br />

pouco grossa e dava um pão escuro. O primeiro moinho foi instalado na<br />

localidade de Rio da Anta e depois levado para Colônia, na casa de Miroslau<br />

Ivanchechin. O moinho era movido a água, mudaram para gasolina e, em<br />

1965, Miroslau transformou-o de gasolina para carvão, passando a utilizar<br />

sabugo de milho como combustível.<br />

A vegetação era vasta e densa, rica em árvores nativas, como pinheiro-do-paraná<br />

(Araucária angustifolia), óleo pardo, gabirova, pitanga<br />

peroba, cabreúva, cedro, canela. Houve uma época em que a extração da<br />

madeira foi fortemente explorada na região de Mato Rico por seus colonizadores.<br />

A demanda era tanta que instalaram várias serrarias nessa localidade.<br />

A primeira de propriedade de Arcindino Nizé, nos anos 50.<br />

As primeiras madeiras serradas eram de forma manual, tarefa<br />

pesada executada por dois homens no manejo de uma serra montada em<br />

um estaleiro, onde ficava uma pessoa em cima e outra em baixo, puxando<br />

a serra para cima e para baixo até que a madeira se dividia formando<br />

tábuas, vigotes e pranchões.<br />

Nessa época, havia abundância de caça, e eram encontrados<br />

muitos animais silvestres, por conta da grande extensão de mata fechada.<br />

Avistavam bandos de perdizes, onças, tamanduás-bandeira, porcosdo-mato,<br />

catetos, veados, jacus, macacos, antas, pacas, tatus, cutias e<br />

outros. Havia ainda enorme quantidade de pássaros, que, muitas vezes,<br />

arrasavam as plantações de milho, trigo e hortaliças.<br />

Conta Miroslau que outras famílias se instalaram nas redondezas<br />

e na mesma época: Marcondes, Gurak, Urbinski, Sitko, Amaro,<br />

Borranhenco, Venceslau dos Santos, Kutinevicz, Andrieski e outras. As<br />

famílias faziam compras em Roncador (30 km) ou na localidade de Rio<br />

Vorá (36 km), mais tarde em Mato Rico, no armazém da família Kramek.<br />

Pela informação de Miroslau Ivanchechin:<br />

– Os Kramek chegaram na casa de pau roliço, coberta de tábua<br />

onde os agrimensores paravam quando vinham para medir as<br />

terras. Os Kramek procuraram João Sitko para construir a casa deles,<br />

mas João não podia deixar sua família com filhos pequenos e<br />

então me procurou e eu fui construir a casa deles. 6<br />

6 Entrevista concedida por Miroslau Ivanchechin, em 4/1/2005 e em Mato Rico.<br />

25<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 9-41, 2007.


26 Colônia Ucraniana de Mato Rico, PR ...<br />

De acordo com entrevista, Valdomiro Bednartchuk (em alguns documentos<br />

chamado de Ladislau) e Anna (figura 3), sua esposa, foram a<br />

Palmital 43, para participar de uma missa, e conversaram com um padre<br />

para rezar na casa deles e nessa ocasião “marcaram a primeira celebração<br />

em seu rancho” (Miroslau, 2005). A partir desse momento, de três em<br />

três meses, alguém se deslocava até a localidade de Palmital 43 para<br />

encontrar o padre e ajudar a carregar as malas.<br />

Contam alguns pioneiros que o nome do primeiro padre era Eurídes,<br />

outros afirmaram que era Irizar Malanhak e uma publicação no periódico<br />

Folha de Mato Rico, consta que era Aloísio Jacobi (figura 4).<br />

Ainda, segundo Miroslau Ivanchechin:<br />

– Só tinha um jeito. Em casa e com os parentes só falá em<br />

ucraíno e não deu outra. Até os primeiros vizinhos que eram baianos<br />

aprendiam com a gente, eles gostavam scutá e aprendiam bem fácil.<br />

Era até bonito de vê. Eles vinham de noite na nossa casa para aprendê<br />

falá... Tinha um deles que gostava aprende falá palavrão, mas eles<br />

vinham pra come, diziam que nossa comida tinha gosto bom... Até<br />

hoje, eles vêm visitá a gente. Eu gosto deles, são amigo da família.<br />

Parece até que são parentes de tanto que nóis é amigo [...] Se você<br />

perguntá alguma coisa pra eles te falam. Me sinto feliz em saber que<br />

pessoas de outras raças aprendem nossa língua. 7<br />

Por volta de 1945, Padre Aloísio Jacobi rezou na comunidade pela<br />

primeira vez, vindo da Diocese de Guarapuava a cavalo. A comunidade<br />

passou a ter missas, e, para aproveitar a visita do padre, realizavam-se<br />

batizados, consagrações, primeiras eucaristias, crismas e até casamentos,<br />

na residência de Valdomiro e Anna. As pessoas se deslocavam de<br />

longe para participar das celebrações, inclusive de Palmital de Baixo, aproximadamente<br />

20 km, Rio Cantu, Juquiri, e as que moravam muito distante<br />

precisavam pernoitar no local. Por isso, Valdomiro disponibilizava um galpão<br />

utilizado para armazenar cereais e implementos agrícolas onde os fiéis<br />

dormiam, e cada um era responsável pela própria alimentação durante<br />

aquele dia.<br />

7 Entrevista concedida por Miroslau Ivanchechin, em 16/6/2002 e em Mato Rico.<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 9-41, 2007.


Clotilde Zai e Nilson César Fraga<br />

FIGURA 3 -<br />

FAMÍLIA BEDNARTCHUK<br />

FONTE: acervo fotográfico de Miroslau Ivanchechin.<br />

FIGURA 4 -<br />

PADRE ALOÍSIO JACOB<br />

Os imigrantes hospedavam os padres e professores em suas casas,<br />

como demonstra o relato de Miroslau Ivanchechin:<br />

– Como aqui não tinha igreja, nóis hospedava os padre e eles<br />

rezavam na nossa casa mesmo. Vinham todos os vizinho aqui [...] Lembro<br />

ainda que o primeiro padre que veio rezá missa aqui em casa era<br />

um padre brasileiro (referindo-se ao padre latino), o Padre Antônio, e<br />

o padre ucraíno foi o Padre João. Eles vinham de poso e era só uma<br />

vez por mês [...]<br />

Quando constuímo a primeira escola, fizemos um mutirão. Veio<br />

de Prudentópolis para ensinar a Professora Justina Svinitska, que<br />

chamava eu e a baba de “tato e mama”, porque era moça nova ainda<br />

e tinha muita saudade dos pais dela que moravam lá longe e não<br />

tinha como se visitar. Ela era uma moça muito querida [...] não tinha<br />

onde ficá, morava aqui em casa. Era como se fosse da família. 8<br />

Em 1952, a comunidade se reuniu em mutirão e construiu a primeira<br />

escola de Mato Rico. Cada família ajudou conforme sua disponibilidade.<br />

Alguns doaram pregos, outros madeira, mão-de-obra e assim até o<br />

término da tão esperada construção. Como não havia igreja nessa época,<br />

as atividades religiosas, como missa e catequese, passaram a ser realizadas<br />

nessa escola.<br />

8 Entrevista concedida por Miroslau Ivanchechin, em 16/6/2002 e em Mato Rico.<br />

27<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 9-41, 2007.


28 Colônia Ucraniana de Mato Rico, PR ...<br />

Os primeiros professores a lecionar e catequizar na escolinha da<br />

Colônia foram Justina Svinistska vinda de Prudentópolis, depois Alberto<br />

Bales, Cecília, Emília Rubinsk e Ana Gruchoski.<br />

Como se constata em relatos dos entrevistados da Colônia, um<br />

dos padres que lá celebrou missas, chamado João Coelher, comercializava<br />

quadros de santos e presenteava as moças, chamando-as de filhas de<br />

Maria. A pioneira Júlia Kasnok conta que ganhou um quadro com a imagem<br />

de Nossa Senhora do Rocio (padroeira do Paraná) do Padre João<br />

Coelher, que se deslocava de Guarapuava para as visitas nas comunidades.<br />

Por isso, ela sugeriu que o nome da escola fosse o da santa, e todos<br />

aceitaram. Mais tarde foi construída a igreja brasileira (romana), assim<br />

denominada pela comunidade e que continua até os dias atuais com o<br />

nome da padroeira, a mesma santa sugerida por Júlia. O primeiro batizado<br />

realizado na escolinha foi dos gêmeos Pedro e Paulo Gruchovski, filhos<br />

de Valdomiro Gruchovski e Angelina B. Gruchovski.<br />

Em ocasião especial para comunidade, foi escolhido o local para<br />

construção da Igreja Nossa Senhora do Rocio, pelo polonês Padre<br />

Estanislau Sosnovski, em 8/11/1985. Nessa ocasião foi plantado no local<br />

o marco da igreja católica pelos missionários. Esse cruzeiro está localizado<br />

na frente da capela construída pela comunidade.<br />

A escolinha (assim denominada pela comunidade) passou então a<br />

ser utilizada apenas para ministrar aulas de alfabetização, catequese e<br />

reuniões eventuais da comunidade, até que o ensino foi centralizado na<br />

cidade de Mato Rico e foi desmanchada a escola, com aproveitamento da<br />

madeira para construção do atual barracão da Associação de Agricultores<br />

da Colônia, ao lado da igreja.<br />

De acordo com depoimento de descendentes ucranianos, os mesmos<br />

padres que visitavam Mato Rico, passavam também por Campo<br />

Mourão, e os primeiros a visitarem esta cidade foram Benedito Melnik,<br />

José Martenétze e, mais tarde, Irenarco Malanhak, todos da ordem de São<br />

Basílio Magno, conhecidos como padres basilianos.<br />

A capela da comunidade ucraniana tem o nome de Igreja Nossa<br />

Senhora de Fátima, sugerido pelo idealizador da construção, o pioneiro<br />

Valdomiro Gruchovski, que foi o doador do terreno. A igreja está localizada<br />

na Colônia de Mato Rico e foi construída por iniciativa dos descendentes<br />

ucranianos com intuito de manter a religiosidade e os costumes cristãos.<br />

Em 1966, novamente se reuniram em mutirão para a construção da primeira<br />

capela em estilo ucraniano na Colônia (figura 5). Os principais construtores,<br />

segundo Miroslau, foram Miguel Repiak, Repula, Paitchuk, Miroslau<br />

Ivanchechin e Valdomiro Gruchovski.<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 9-41, 2007.


Clotilde Zai e Nilson César Fraga<br />

FIGURA 5 - PRIMEIRA CAPELA UCRANIANA<br />

29<br />

Houve também a escolha da primeira comissão<br />

para encaminhar os trabalhos da comunidade.<br />

Na ocasião, começaram os registros<br />

dos acontecimentos da comunidade,<br />

em livro de atas e com assinatura dos<br />

participantes de cada reunião.<br />

Segue a primeira ata da comissão (1966),<br />

que teve como presidente o Sr. Valdomiro<br />

Gruchovski, pioneiro que ficou por muitos<br />

anos à frente da organização da igreja.<br />

FONTE: acervo da Capela Nossa Senhora de Fátima, 1969.<br />

Ata nº 1<br />

Aos vinte e nove de outubro de mil novecentos e sessenta e sete,<br />

na residência do Sr. Valdomiro Gruchovski, em Colônia de Mato<br />

Rico, reuniu-se a comissão da igreja do rito ucraniano, cuja padroeira<br />

é Nossa Senhora de Fátima, e cuja comissão lançou no livrocaixa<br />

o movimento de suas ações desde os primeiros tempos até<br />

a presente data, pois até hoje não havia nem livro-caixa nem livro<br />

de atas.<br />

Ficou assim organizada a referida Comissão:<br />

Sr. Valdomiro Gruchovski – Presidente<br />

Sr. Eroslau Tkaczuk – secretário<br />

Sr. Vitorino Gruchovski – tesoureiro<br />

Sr. Miguel Repiak – conselheiro<br />

Sr. Pedro Dal Santo – conselheiro<br />

Sr. Simão Mareniaque – conselheiro<br />

Essa foi a primeira comissão da Igreja e permaneceu oito anos,<br />

assumindo, então, Estefano Gruchovski, no período 1975-1981. Grande<br />

parte das reuniões ocorreu na residência da família pioneira e fundadora,<br />

Valdomiro Gruchovski e sua esposa, Angelina Bednartchuk Gruchovski.<br />

Mais tarde, as reuniões passaram a se realizar na própria capela.<br />

Em reunião da comissão, foi decidida a execução da primeira reforma<br />

e pintura externa da capela. Nessa mesma sessão resolveram dar<br />

início à construção de um barracão onde futuramente seriam feitas as<br />

festas da comunidade.<br />

Em 4/8/1980, iniciou-se o mutirão para demolição da antiga capela.<br />

No lugar dela foi construída a nova, com término em 1981. Os anos<br />

foram-se passando e como a construção era em madeira, passou por<br />

reformas e pinturas, mas teve de ser também demolida, em 2005. Atual-<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 9-41, 2007.


30 Colônia Ucraniana de Mato Rico, PR ...<br />

mente, encontra-se em fase final de construção a nova capela, com recursos<br />

e doações da comunidade.<br />

Durante esses anos aconteceram muitos fatos importantes e<br />

marcantes para a comunidade, como a construção da gruta de Nossa<br />

Senhora de Fátima.<br />

A construção e inauguração do atual barracão, estruturado com<br />

churrasqueira, cozinha, mesas e bancos, ocorreu em 2004 e possibilitou<br />

eventos maiores, com resgates históricos e culturais da comunidade<br />

ucraniana, na arrecadação de fundos para a igreja, uma vez que são feitos,<br />

almoços e jantares com pratos típicos da culinária ucraniana e pratos<br />

regionais.<br />

3 POTENCIAIS TURÍSTICOS DA COLÔNIA<br />

Encontram-se, na literatura, diversos textos que discorrem sobre<br />

a sustentabilidade aplicada ao turismo, fomentando a discussão sobre a<br />

integração entre o uso turístico e a preservação do meio ambiente e destacando<br />

os cuidados sobre a responsabilidade social na instalação de<br />

empreendimentos, voltados não somente para o lucro, mas também para<br />

proporcionar a melhoria da qualidade de vida das populações fixas de núcleos<br />

receptores (RUSCHMANN, 1997).<br />

Mato Rico conta com diversos atrativos, que podem ser explorados<br />

turisticamente, por meio de pesquisas, empreendimentos turísticos e<br />

principalmente incubadoras de projetos que poderão ser aplicados, valorizando<br />

os aspectos culturais e ambientais do município. A vocação atual<br />

de Mato Rico o município para o turismo é para o turismo rural, cultural e<br />

ecoturismo, podendo ser explorado também em alguns pontos específicos<br />

o turismo de aventura.<br />

A Colônia Mato Rico tem sua economia basicamente voltada à<br />

agropecuária, e, por isso, o turismo rural é uma forte opção para<br />

complementação e até mesmo atividade principal, em alguns casos, das<br />

famílias de média e pequena produção rural, trabalhando com agricultura<br />

e na diversidade no campo, já que as propriedades se caracterizam pela<br />

baixa ou até média tecnologia com mão-de-obra familiar. Conta com<br />

paisagismo privilegiado, por se tratar de uma região montanhosa e rochosa,<br />

sendo habilitada ao turismo de aventura com a prática de montanhismo,<br />

rapel, escalada e outros esportes radicais que se adaptem às inúmeras<br />

cachoeiras e paredões naturais de que a área dispõe.<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 9-41, 2007.


Clotilde Zai e Nilson César Fraga<br />

Ao longo dos anos de colonização no Estado do Paraná, os<br />

ucranianos foram, em grande escala, responsáveis pela introdução de<br />

novas lavouras e métodos de cultivo da terra. Durante o período, houve<br />

uma progressiva integração com outros grupamentos étnicos, o que não<br />

impediu, no entanto, que os costumes e tradições trazidos de seu país de<br />

origem se mantivessem.<br />

4 ATRATIVOS TURÍSTICOS NATURAIS<br />

Mato Rico possui uma paisagem favorecida por sua beleza cênica,<br />

composta de relevo ondulado, belas cachoeiras, paredões rochosos,<br />

rica rede de drenagem, vegetação exuberante em que predomina a<br />

araucária, conhecida também como pinheiro-do-paraná. Essa configuração<br />

propicia atividades voltadas ao ecoturismo e turismo de aventura, tais<br />

como treckking 9 , rapel, escalada, canoying 10 , arvorismo, banho de cachoeira<br />

e outros esportes de aventura.<br />

Um dos principais atrativos naturais da Colônia Mato Rico é a Cachoeira<br />

do Vogivoda, que propícia banho em sua volumosa queda d´água,<br />

canoying e rapel em seu paredão rochoso, mergulho na piscina natural<br />

formada por suas límpidas águas, contendo ainda vegetação rica em espécies<br />

e com bela paisagem para apreciação.<br />

Nas porções mais elevadas do relevo, podem identificados mirantes<br />

naturais, como o Morro das Bromélias, localizado na Fazenda Mato<br />

Rico, na localidade da Colônia. Da visão panorâmica que se tem de seu<br />

topo, podem ser visualizadas várias cidades do entorno: Roncador, Laranjal,<br />

Palmital e também a sede administrativa de Mato Rico, além da<br />

visão da paisagem regional. Há três represas propícias para banho e pesca;<br />

sua paisagem é composta de rica vegetação, com bromélias, orquídeas,<br />

cactos e outras plantas naturais da região. Existem animais silvestres:<br />

macaco, paca, quati e outras espécies.<br />

9 Treckking é uma modalidade em turismo de aventura, que se constitui em caminhadas<br />

por trilhas naturais em busca de lugares interessantes, possibilitando maior<br />

contato com a natureza. Disponível em: .<br />

10 Canoying é uma atividade de aventura, que se constitui na decida de cachoeiras por<br />

uma corda.<br />

31<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 9-41, 2007.


32 Colônia Ucraniana de Mato Rico, PR ...<br />

Outro atrativo identificado, que requer melhor detalhamento nos<br />

estudos e que pode ser explorado turísticamente, é uma das várias ramificações<br />

do Caminho do Peabiru 11 , que é um antigo acesso utilizado pelos<br />

povos indígenas – ia do Oceano Atlântico ao Pacífico. No trecho do caminho<br />

que está localizado na Colônia, foram encontrados inúmeros vestígios,<br />

tais como mapas líticos e artefatos produzidos pelos indígenas em<br />

pedra e argila, entre outros.<br />

O Caminho dos Porcadeiros é outro potencial turístico. Por tal caminho<br />

passavam, em meados do século passado, os criadores de suínos,<br />

levando suas manadas para comercializar em Ponta Grossa. No<br />

município de Mato Rico, o caminho começa na comunidade de Colônia;<br />

de Palmital vai para Vila Nova e prossegue por Pitanga até Ponta Grossa.<br />

Com o auxílio da Secretaria de Meio Ambiente e Turismo do município,<br />

está ainda em fase inicial o processo de instalação de uma pousada<br />

rural, com o nome de Recanto do Aconchego, já recebendo visitantes.<br />

Trata-se de um espaço rústico, alternativo e dinâmico com trilhas para<br />

caminhadas e eventos rurais. Oferece café colonial e refeições com pratos<br />

típicos ucranianos e da culinária rural. Tem capacidade de hospedar,<br />

inicialmente, seis pessoas e de servir refeições para quarenta pessoas.<br />

Vizinhos da pousada estão os produtores artesanais de cobertores<br />

de lã de carneiro, e o material utilizado na confecção dos cobertores é<br />

fornecido pelas propriedades rurais. O produto é comercializado na própria<br />

residência dos artesãos e também em feiras de produtores.<br />

Na mesma comunidade, há uma chácara de hortaliças e morangos,<br />

onde fornecem os produtos para o consumo da comunidade local in<br />

natura e em compotas, conservas, geléias, polpas e picles.<br />

5 PATRIMÔNIO ARTESANAL DA CULTURA UCRANIANA<br />

O imigrante ucraniano conseguiu preservar a arte por meio dos<br />

ensinamentos de mães para filhos. Além, disso, pesquisando, descobriram-se<br />

novos pigmentos retirados de plantas, incorporando às matizes e<br />

à influência da nova terra. Isso representa hoje um forte patrimônio cultural<br />

11 “O Caminho de Peabiru foi a mais importante via transcontinental da América do Sul<br />

pré-colombiana, segundo definiu Renhard Maack, da UFPR, em 1959. Era uma<br />

‘estrada’ indígena com tronco e ramais, formando uma rede. Tinha cerca de 3 mil<br />

km de extensão e ligava o Atlântico ao Pacífico.” (CADERNOS DA ILHA, 2004, p. 8).<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 9-41, 2007.


Clotilde Zai e Nilson César Fraga<br />

paranaense, uma vez que, no decorrer dos anos, os povos da Ucrânia<br />

passaram por drásticas transformações, resultando na perda de alguns<br />

costumes e tradições. Os imigrantes, que ao Brasil chegaram há algumas<br />

décadas, mantiveram os traços dessa cultura e hoje recebem os<br />

próprios visitantes europeus para ensinar tais costumes e artes perdidos<br />

por seus antepassados.<br />

4.1 PÊSSANKAS<br />

Segundo V. J. Kotviski (2004), as pêssankas de Páscoa demonstram<br />

que alguns costumes estão ligeiramente ligados à crença e que o<br />

ovo tem um sentido relacionado com a vida e a morte. Elas vêm confirmar<br />

essas crenças, pois, antes da Páscoa, os ucranianos mantinham o costume<br />

de colocar cachos de trigo sobre a mesa e ao redor dos ovos pintados<br />

que se apresentavam no mesmo número de falecidos que tinha a<br />

família. Outro costume era levar pêssankas para o cemitério.<br />

A delicada obra de arte representa, em símbolos, a história da humanidade,<br />

suas crenças, esperanças e anseios. São numerosos os símbolos<br />

usados nas pêssankas, comuns em toda a Ucrânia, e outros típicos<br />

a determinadas regiões. Os traços, figuras e cores que se utilizam na<br />

confecção das pêssankas denotam um determinado significado.<br />

Outro dos mais estimados e expressivos componentes da cultura<br />

ucraniana é o bordado. Ele revela o gosto pelo estético, o amor ao belo, o<br />

respeito à natureza, sendo usado de diversas maneiras. Dentre elas destacam-se:<br />

blusas, camisas e vestidos (na indumentária); toalhas, guardanapos,<br />

panôs e colchas (nas prendas domésticas e ornamentais); estola,<br />

toalhas de altar e casula (nas igrejas); toalhas utilizadas em recepções,<br />

nascimentos, batismos, noivados, casamentos e mortes (nos rituais religiosos,<br />

civis e vida familiar). Sempre requintados e altamente festivos, os<br />

bordados ucranianos parecem cintilantes mosaicos executados pela<br />

inimitável astúcia feminina transmitida de mãe para filha. Os bordados<br />

encontrados nos trajes folclóricos trazem lembranças alegres e tristes. O<br />

vermelho é o amor; o preto, a tristeza.<br />

Essa arte tem profundas raízes nos hábitos agrícolas e é representada,<br />

sobretudo, pelos bordados de motivos geométricos que conservam<br />

ainda numerosas características bizantinas, como os bordados de<br />

plantas estilizadas.<br />

As cores básicas do bordado ucraniano são preta e vermelha.<br />

Cores adicionais são amarela, azul e verde. No passado, foram tingidas<br />

33<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 9-41, 2007.


34 Colônia Ucraniana de Mato Rico, PR ...<br />

fibras de plantas, linhas e lãs com tinturas naturais de cascas de árvores,<br />

raízes, folhas, frutas, flores e sucos de insetos para confeccionar os bordados.<br />

4.2 GASTRONOMIA TÍPICA<br />

Segundo R. A. Carneiro Jr. (2004), a culinária ucraniana se formou<br />

através dos séculos. É destacada pela variedade dos pratos, pelo sabor<br />

refinado e pelo valor nutricional. A presença da massa é sempre certa,<br />

seja ela fermentada ou não.<br />

4.2.1 Pratos Tradicionais da Gastronomia Típica Ucraniana<br />

A borchtch é uma sopa de sabor azedado, à base de beterraba,<br />

repolho ou couve, com costela ou lombinho de porco, de preferência temperada<br />

com nata. Deve ser saboreada com acompanhamento de pão preto<br />

de centeio ou trigo. É servida como primeiro prato, logo depois do aperitivo.<br />

Tornou-se o prato nacional da família ucraniana.<br />

O perohê é uma espécie de pastel de massa amanteigada e fermentada,<br />

à base de trigo, cozido em água e recheado com uma mistura<br />

de batata e requeijão. Pode ser acompanhado de molho de carne. Conforme<br />

R. A. Carneiro Jr. (2004), a massa não fermentada se denomina<br />

varéneke – perohê cozido; e a fermentada halushkê – perohê frito e cozido<br />

– ou perichkê. Na Ucrânia, os perohês são feitos de massa de trigo<br />

fermentada, porém os cozidos, varéneke, na região da Galícia (Rússia),<br />

têm também o nome de perohê. Há muitas variedades de perohê e são<br />

preparadas para ocasiões especiais e aos domingos. O recheio varia,<br />

dependendo da ocasião em que é servido: nos dias festivos e na ceia de<br />

Natal, requeijão, batata, cerejas, maçãs, frutas secas e cozidas, semente<br />

de papoula (para temperar o requeijão) e purê de ervilha; na alimentação<br />

trivial, repolho frito com batata, feijão amassado e temperado e kasha de<br />

trigo mourisco (tatarka).<br />

O holubchi é uma espécie de charuto feito com recheio de carne,<br />

trigo mourisco ou arroz. É envolvido em folhas de repolho ou couve e cozido<br />

em panela fechada a vapor.<br />

O khrin é molho à base de raiz forte moída com beterraba e acompanha<br />

carne assada, principalmente a de porco.<br />

A kubassat é uma lingüiça de carne de porco defumada, frita ou<br />

assada, e de sabor muito leve.<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 9-41, 2007.


Clotilde Zai e Nilson César Fraga<br />

A kasha é um alimento de quirera de trigo mourisco, aveia, milho<br />

ou arroz. É servida no café, almoço e jantar, nas mais variadas formas.<br />

O salo é um toucinho característico na alimentação e pode ser<br />

servido cru, cozido, frito ou defumado. Serve como acompanhamento para<br />

batatas, kasha e broa, possuindo múltiplos usos.<br />

A nata tem sabor levemente azedo. É um molho à base de leite e<br />

acompanha quase todos os pratos da culinária ucraniana, principalmente<br />

a carne de porco.<br />

A carne utilizada na cozinha ucraniana geralmente é de porco,<br />

marreco e frango. Apresenta uma grande variação: assada, defumada,<br />

frita, abafada.<br />

A krakóvia é um embutido de carne nobre de porco e defumada.<br />

Lembra muito uma lingüiça, porém mais forte do que a calabresa.<br />

De sobremesa, o kutiá é um creme de trigo em grão cozido com<br />

passas e mel. Na ceia de Natal, o kutiá é servido como entrada. Os doces<br />

são à base de mel e cana-de-açúcar, como bolachas caseiras, rapadura,<br />

melado de cana e açúcar mascavo.<br />

As bebidas também são marcos na mesa desses descendentes<br />

europeus. A cerveja caseira é uma bebida fermentada não alcoólica, à<br />

base de lúpulo, água e açúcar ou mel. É muito produzida no município de<br />

Mato Rico, a princípio, para consumo próprio das famílias, que costumam<br />

oferecer essa bebida às visitas e a utilizam em comemorações especiais,<br />

como a Páscoa e o Natal. Atualmente, é vendida em feiras ou direto do<br />

produtor. Deve ser servida gelada.<br />

Contam os pioneiros da comunidade que os imigrantes europeus<br />

trouxeram as abelhas com ferrão (apismelifera). Então começou a se desenvolver<br />

a apicultura rústica. Todavia, a abelha era mansa, de origem<br />

alemã (também denominada preta) e de fácil manipulação. No município,<br />

se encontra ainda a verdadeira abelha brasileira, indígena ou sem ferrão,<br />

da família dos meliponídeos (mirim, mandaçaia, vorá, gurupim, mirimguaçu,<br />

mirim-preguiça), hoje em processo de extinção.<br />

Na época da colonização mato-riquense, quase todos os colonos<br />

possuíam algumas colméias pelo terreiro de suas casas. Os caixotes eram<br />

feitos de madeira lascada, e o processo de manipulação era artesanal.<br />

Conta-se que nessa época não se usava açúcar branco, só açúcar<br />

mascavo e mel. Atualmente, existem muitos apicultores, e a tendência é<br />

que o pequeno agricultor volte a ter sua caixa de abelha.<br />

As bolachas de mel são comercializadas nos eventos da colônia e<br />

também servidas na mesa das famílias pioneiras.<br />

35<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 9-41, 2007.


36 Colônia Ucraniana de Mato Rico, PR ...<br />

6 FESTIVIDADES LOCAIS<br />

Os descendentes ucranianos são pessoas alegres e se confraternizam<br />

com muita freqüência. Valorizam as datas comemorativas e festejam<br />

o dia de seus padroeiros com eventos importantes e marcantes para<br />

a comunidade.<br />

Na Colônia Ucraniana de Mato Rico, a comunidade construiu uma<br />

gruta em homenagem a Nossa Senhora de Fátima. A gruta recebe<br />

visitações diárias dos devotos e adoradores da imagem. Nesse local, podese<br />

apreciar o espaço arborizado ao lado da igreja em estilo ucraniano. A<br />

gruta foi inaugurada em 13 de maio de 2003, data em que se comemora o<br />

Dia da Padroeira. Em todo domingo de maio é realizada a festa da comunidade<br />

ucraniana de Mato Rico, com missa em rito ucraniano, encenação<br />

da aparição de Nossa Senhora aos três pastorzinhos 12 e primeira eucaristia<br />

das crianças preparadas por uma catequista da comunidade. Já na<br />

Igreja de Nossa Senhora do Rocio, que fica a três quilômetros da gruta,<br />

são realizadas as celebrações em português.<br />

As duas capelas da comunidade são católicas romanas e realizam<br />

esses festejos. A comunidade local prepara a festa com antecedência<br />

cuidadosamente para recepcionar os visitantes durante o dia todo. Tal<br />

evento ocorre no entorno das igrejas, contando com salão de festas e<br />

grande espaço ao ar livre e arborizado, para circulação das pessoas.<br />

Eventos como esse possibilitam valorizar e expandir os hábitos<br />

culturais da comunidade. Na Capela Nossa Senhora de Fátima, são realizados<br />

almoços e jantares com pratos típicos da culinária ucraniana: perohê,<br />

holubchi, macarronada caseira, frango recheado, bolachas caseiras. Há<br />

outros pratos da gastronomia típica regional, como churrasco (origem<br />

gaúcha) e quirerada (comida típica cabocla) à base de milho e carne suína,<br />

além da irresistível cerveja caseira.<br />

12 No dia 13 de maio de 1917, três crianças cuidavam de um pequeno rebanho na Cova<br />

da Iria, em Fátima, Portugal. Os pastorinhos chamavam-se Lúcia de Jesus, 10 anos,<br />

Francisco e Jacinta Marto, seus primos de 9 e 7 anos. Foi quando apareceu uma<br />

Senhora toda vestida de branco, segurando um terço também branco, espalhando<br />

uma luz muito intensa e cristalina. Essa foi a primeira de muitas outras aparições de<br />

Nossa Senhora de Fátima aos pastorinhos. Lúcia ainda vive, aos 94 anos, em Portugal.<br />

Disponível em: .<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 9-41, 2007.


Clotilde Zai e Nilson César Fraga<br />

A comunidade conta ainda com um campo de futebol, nos fundos<br />

da capela ucraniana, onde são realizados torneios durante as festas. O<br />

espaço é também locado para eventos de comunidades vizinhas, trazendo<br />

públicos diferentes para os festejos, estimulando o turismo regional e<br />

divulgando a cultura ucraniana que se torna um atrativo cultural e religioso.<br />

7 ARQUITETURA<br />

Os colonos, ao se instalarem em Mato Rico, encontraram muita<br />

madeira disponível, assim não foi difícil adequar sua técnica de construção<br />

européia em casas de madeira. Eram casas simples, com grandes<br />

varandas, mas destacavam-se pelas cores marcantes, simbolizando a<br />

cultura pelos ornamentos dos beirais no telhado, onde marceneiros com<br />

talento de artesão moldavam a madeira em formas que lembravam<br />

rendilhados. Eram os lambrequins. A pintura era uma verdadeira obra de<br />

arte com barrados florais pintados à mão livre.<br />

37<br />

A princípio, em sua origem européia, o lambrequim tinha a função<br />

de pingadeira, protegendo as empenas laterais da construção em<br />

madeira dos estragos da chuva. No Brasil passou a funcionar como<br />

elemento de decoração das residências, destacando-as com singularidade<br />

e beleza. (O LAMBREQUIM).<br />

O modelo-padrão continha aproximadamente 40 cm de comprimento,<br />

corte em ângulos de 45º, o qual resultava num ângulo reto, voltado<br />

para o solo. Apesar da semelhança, em cada casa era possível descobrir<br />

um formato diferente. E dessa forma a arquitetura ucraniana é facilmente<br />

identificada, podem ser encontradas ainda várias construções nesse estilo,<br />

inclusive a igreja da comunidade, em bom estado de conservação, servindo<br />

de atrativo turístico para descendentes e apreciadores dessa cultura.<br />

8 CONSIDERAÇÕES FINAIS<br />

O turismo é conhecido e considerado como uma importante atividade<br />

econômica, denominado por uns como a “indústria sem chaminés”,<br />

pois sua atividade é geradora de muitos empregos diretos e outros associados.<br />

Ainda, por outros é considerado como um fenômeno importante<br />

de caráter econômico, social, político, cultural e natural.<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 9-41, 2007.


38 Colônia Ucraniana de Mato Rico, PR ...<br />

A intenção deste trabalho foi apresentar a história de uma das colônias<br />

do município de Mato Rico, fazendo uma espécie de inventário cultural<br />

dessa comunidade ucraniana e buscando seus costumes, culinária, tradições,<br />

folclore e tendências artísticas em geral, além de envolver eventos<br />

realizados na transformação da identidade sociocultural de uma população.<br />

Observamos em todo o tempo de pesquisa as consideráveis contribuições<br />

dos imigrantes de todas as descendências na formação do município.<br />

Os ucranianos, por sua vez, colaboraram fortemente por serem<br />

os precursores da colonização, partindo da Colônia em que formaram ao<br />

povoarem esse espaço, acrescendo aos povos que os antecederam cultura,<br />

gastronomia, costumes e crenças que integram a diversidade cultural<br />

paranaense.<br />

São expressas neste trabalho diversas particularidades que representam<br />

o diferencial do município de Mato Rico, as quais resultam na conservação<br />

da comunidade ucraniana, o que contribuiu para relatar um pouco<br />

mais a história desse povo que ajudou a construir o Paraná.<br />

Acredita-se, dessa forma, favorecer a conscientização, em maior<br />

escala, da real necessidade de criar-se caminhos para que essa tradição<br />

não venha a se tornar, às gerações vindouras, apenas uma lembrança dos<br />

antepassados e de despertar o interesse no que se refere à importância da<br />

percepção na valorização do espaço turístico – a paisagem e o patrimônio<br />

cultural – como recurso para o desenvolvimento da comunidade.<br />

Sabe-se a importância da cultura dos povos como motivação das<br />

viagens turísticas. A cultura é percebida nos estudos e no desejo que os<br />

visitantes têm em conhecer o modo de vida de outros povos, o que provoca<br />

em muitos o desejo de identificar novas formas de se viver. Dessa<br />

maneira, indica-se o turismo como grande potencial para o desenvolvimento<br />

da Colônia Mato Rico, valorizando seus costumes e otimizando<br />

seu espaço, a fim de que a situação financeira das famílias venha obter<br />

melhorias.<br />

Concluí-se afirmando que a Colônia Mato Rico é um local com forte<br />

potencialidade natural, cultural e religiosa, não lhe faltando motivos para<br />

o desenvolvimento do turismo, o que poderá ser gerador de renda e emprego<br />

para o município.<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 9-41, 2007.


Clotilde Zai e Nilson César Fraga<br />

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Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 9-41, 2007.


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41<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 9-41, 2007.


Doris Ruschmann, Joaquim Rondon e Jens Ruschmann<br />

VILAS DE<br />

ECOENTRETENIMENTO ® :<br />

UMA VISÃO PARA O<br />

DESENVOLVIMENTO<br />

SUSTENTÁVEL DE DESTINOS<br />

ECOTURÍSTICOS –<br />

PROPOSTA PARA DESTINOS<br />

TURÍSTICOS NA AMAZÔNIA<br />

DORIS RUSCHMANN<br />

___________________________________________________________<br />

43<br />

Doutora e Mestre em Turismo pela USP,<br />

Docente no Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu<br />

em Administração e Turismo, na UNIVALI<br />

JOAQUIM RONDON<br />

___________________________________________________________<br />

Mestre em Ecoturismo pela USP,<br />

Arquiteto e consultor em ecodesign<br />

JENS RUSCHMANN<br />

___________________________________________________________<br />

Especialista em Gestão de Projetos de Turismo,<br />

Engenheiro<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 43-57, 2007.


44 Vilas de Ecoentretenimento ® : Uma visão para o ...<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 43-57, 2007.


Doris Ruschmann, Joaquim Rondon e Jens Ruschmann<br />

SUMÁRIO<br />

Neste documento apresenta-se o conceito de Vilas de Ecoentretenimento ® ,<br />

destacando o contexto em que surgiram, suas principais características e<br />

sua aplicação concreta dentro do Programa de Desenvolvimento do<br />

Ecoturismo na Amazônia Legal (PROECOTUR), coordenado pelo Ministério<br />

do Meio Ambiente. Discute-se, aqui, a maneira pela qual o conceito<br />

responde às exigências impostas pelas condicionantes da região amazônica<br />

no que diz respeito ao aproveitamento sustentável de seus recursos<br />

turísticos. Refere-se especificamente, à implantação da infra-estrutura,<br />

de equipamentos e serviços necessários para a configuração de produtos<br />

turísticos, a integração das comunidades receptivas, a viabilidade econômica<br />

e ao aumento da competitividade dos destinos na região. À apresentação<br />

dos conceitos e princípios fundamentais, somam-se as descrições<br />

de situações em que estes são aplicados concretamente, demonstrando,<br />

por um lado, a abrangência e o caráter genérico dos conceitos e diretrizes<br />

básicos, e, por outro, sua flexibilidade em adaptar-se às especificidades<br />

de cada situação.<br />

Palavras-chave: turismo, sustentabilidade, ecoentretenimento ® .<br />

ABSTRACT<br />

This document presents the concept of Ecoentertainment Villages (Vilas<br />

de Ecoentretenimento ® ), emphasizing the context in which it appeared, its<br />

main characteristics and its practical applications in PROECOTUR<br />

(Amazon Ecotourism Development Program), a program coordinated by<br />

the Brazilian Ministry for the Environment. The document discusses how<br />

the concept responds to the demands imposed by the conditions in the<br />

Amazon region, including the sustainable use of tourism resources, the<br />

implementation of infrastructure, equipment and services necessary to the<br />

establishment of ecotourism products, the integration of hosting<br />

communities, the economic feasibility and the increase in competitiveness<br />

of tourism destinations in the region. The conceptual discussion is followed<br />

by a description of some practical situations in which the concept is applied,<br />

demonstrating on one hand the breadth of range of the basic conceptual<br />

guidelines, and on the other its flexibility in adapting to specific situations.<br />

Keywords: tourism, sustainability, ecoentertainment.<br />

45<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 43-57, 2007.


46 Vilas de Ecoentretenimento ® : Uma visão para o ...<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 43-57, 2007.


Doris Ruschmann, Joaquim Rondon e Jens Ruschmann<br />

1 O CONTEXTO<br />

O conceito das Vilas de Ecoentretenimento ® foi desenvolvido como<br />

uma resposta aos desafios impostos ao desenvolvimento de destinos<br />

ecoturísticos em locais que contam, por um lado, com recursos naturais<br />

de grande potencial e, por outro, apresentam carências estruturais. Esses<br />

aspectos podem acarretar impactos ambientais e sociais negativos e<br />

comprometer o desenvolvimento sustentável de produtos turísticos. Seus<br />

princípios básicos foram delineados ao longo da elaboração do Plano de<br />

Desenvolvimento Ecoturístico dos pólos do Cantão e do Jalapão, no Estado<br />

de Tocantins, e os dos Estados de Amapá e de Roraima. 1<br />

O diagnóstico da situação desses locais, tendo em vista seu aproveitamento<br />

turístico, revelou problemas e oportunidades similares no que<br />

diz respeito à distribuição espacial dos recursos ecoturísticos, assim como<br />

carências na infra-estrutura. Perceberam-se fragilidades nos equipamentos<br />

e serviços turísticos e a necessidade de integração das respectivas<br />

populações, o que levou os autores em busca de uma solução de síntese<br />

que possa ser aplicada nos diferentes locais e, com a flexibilidade necessária,<br />

para adequar-se às particularidades de cada um.<br />

De maneira geral, verificou-se, em todos esses casos, que os recursos<br />

turísticos se encontram dispersos no entorno dos núcleos<br />

populacionais, com uma distância relativamente grande entre si. Trata-se<br />

de um padrão característico de destinos que têm como base recursos<br />

naturais, como cachoeiras, mirantes, trilhas, que ocorrem em locais específicos.<br />

Do ponto de vista da instalação de infra-estrutura e de equipamentos<br />

necessários à configuração do atrativo, esse padrão de distribuição<br />

representa um obstáculo, na medida em que a colocação dos devidos<br />

equipamentos em cada um dos atrativos implicaria custos mais elevados,<br />

além de um maior impacto ambiental nos locais dos atrativos. Tal situação<br />

induzirá, ainda, o risco de descaracterização desses locais, que têm, em<br />

seu aspecto “selvagem” e intocado, um dos maiores fatores de atratividade,<br />

com vistas ao segmento de ecoturismo.<br />

1 Programa do Ministério do Meio Ambiente (MMA), Banco Interamericano de Desenvolvimento<br />

(BID) e Programa de Desenvolvimento do Ecoturismo na Amazônia Legal<br />

(PROECOTUR), fase 1, em seus 15 pólos de ecoturismo.<br />

47<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 43-57, 2007.


48 Vilas de Ecoentretenimento ® : Uma visão para o ...<br />

A instalação dos serviços receptivos em cada atrativo, por sua vez,<br />

exigirá a manutenção de equipes em cada local, o que traz implicações<br />

negativas quanto a custos operacionais, impactos ambientais e<br />

descaracterização dos atrativos. Além disso, impõe dificuldades quanto à<br />

utilização da mão-de-obra local, em função da necessidade de deslocamentos,<br />

comprometendo, assim sua integração e os eventuais benefícios<br />

que os empreendimentos podem vir a trazer à comunidade receptiva.<br />

Nesse contexto, a concentração de equipamentos e de serviços<br />

turísticos, em núcleos estrategicamente posicionados em relação aos atrativos,<br />

revelou-se uma opção natural e estratégica para esses pólos e outras<br />

áreas ambientalmente frágeis, mas com grande potencial de<br />

atratividade para o ecoturismo. Além da otimização dos custos de instalação,<br />

da operação da infra-estrutura e equipamentos turísticos e da concentração<br />

dos impactos ambientais em um só local (o que facilita a<br />

mitigação de seus efeitos), a configuração desses núcleos traz como benefício<br />

adicional uma maior facilidade de visitação e de elaboração de roteiros<br />

turísticos. Isso cria maior sinergia entre equipamentos e serviços<br />

complementares, tais como meios de hospedagem, meios de alimentação,<br />

lojas de artesanato e suvenires, etc.<br />

Localizados em núcleos populacionais pré-existentes, como pequenas<br />

cidades próximas aos atrativos, esses núcleos de equipamentos<br />

e serviços turísticos facilitam ainda a inserção das comunidades locais na<br />

atividade turística, ampliando as oportunidades para os empreendedores<br />

locais. Aumentam as oportunidades de contato entre visitantes e essas<br />

comunidades, assim como o desenvolvimento de atrativos culturais, aspectos<br />

intensamente valorizados nas expectativas das viagens de<br />

ecoturistas.<br />

O conceito de Vilas de Ecoentretenimento ® procura dar forma a<br />

esses núcleos de concentração de equipamentos e serviços turísticos,<br />

criando um modelo que possa ser reproduzido em diferentes regiões com<br />

características similares, respeitando as especificidades de cada local.<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 43-57, 2007.


Doris Ruschmann, Joaquim Rondon e Jens Ruschmann<br />

FIGURA 1 - DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL DE RECURSOS TURÍSTICOS E<br />

NÚCLEOS POPULACIONAIS EM RORAIMA<br />

2 CARACTERÍSTICAS DAS VILAS DE ECOENTRETENIMENTO<br />

Estruturadas em núcleos populacionais preexistentes e estrategicamente<br />

localizados em relação aos atrativos naturais de cada região, as<br />

Vilas de Ecoentretenimento ® funcionarão como portais turísticos para a<br />

visitação dessas regiões. Nelas, o visitante poderá encontrar serviços de<br />

hospedagem de diferentes tipos, serviços de alimentação, informações e<br />

serviços turísticos de guias, passeios, aluguel de bicicletas e veículos,<br />

entre outros.<br />

49<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 43-57, 2007.


50 Vilas de Ecoentretenimento ® : Uma visão para o ...<br />

Um aspecto importante do modelo é o de que o acesso aos atrativos<br />

deverá dar-se sempre a partir das Vilas de Ecoentretenimento, com o<br />

acompanhamento de guias, e controlado por vouchers. Essa logística simplificará<br />

o trabalho do receptivo no local, a cobrança das taxas de visitação<br />

e o controle do fluxo de visitantes, de acordo com a capacidade de suporte<br />

de cada atrativo.<br />

A proposta de instalação das Vilas de Ecoentretenimento ® inclui,<br />

além dos equipamentos e serviços turísticos estabelecidos em parceria<br />

com a iniciativa privada e a comunidade, a infra-estrutura básica de saneamento,<br />

energia e telecomunicações, bem como um sistema de manejo<br />

de resíduos sólidos adequados à população local e ao fluxo de turistas<br />

esperado. Garantindo o conforto e a segurança do turista, essas intervenções<br />

beneficiarão toda a comunidade, que também passará a contar com<br />

tais serviços.<br />

Além de suprir a demanda de equipamentos e serviços turísticos<br />

necessários à estruturação dos atrativos e roteiros turísticos, as Vilas de<br />

Ecoentretenimento ® contribuirão para o aumento da atratividade dos destinos,<br />

agregando valor aos atrativos naturais e oferecendo opções de lazer<br />

e atividades turísticas para um segmento mais amplo. A proposta estrutura-se,<br />

dessa forma, tendo sempre como base as características locais.<br />

Por isso, às intervenções já descritas é necessário acrescentar outras<br />

ações, como a urbanização de praças e espaços públicos – com elementos<br />

como o paisagismo, pavimentação, iluminação pública e, ainda, tratamento<br />

da fachada das casas –, buscando realçar os elementos pitorescos<br />

de cada localidade e integrar os diversos equipamentos turísticos em<br />

um conjunto urbano mais interessante. Deve sempre ocorrer a instalação<br />

de novos atrativos.<br />

Os novos atrativos deverão, ao mesmo, tempo em que reforçam<br />

as características naturais, culturais e históricas do local, oferecer alternativas<br />

que enriqueçam o produto. Algumas das opções desses atrativos<br />

complementares que variam em função das especificidades de cada local<br />

podem ser:<br />

a) bases de projetos de pesquisa sobre a fauna e a flora local,<br />

abertas à visitação e com componentes de educação ambiental<br />

ou de participação de voluntários;<br />

b) centros de reintrodução de animais silvestres recuperados do<br />

tráfico, cativeiro ou acidentes, abertos à visitação;<br />

c) centros de referência ou museus com exposições sobre a cultura<br />

e a história local;<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 43-57, 2007.


Doris Ruschmann, Joaquim Rondon e Jens Ruschmann<br />

d) local para realização de eventos e apresentações de artistas<br />

locais;<br />

e) feiras de artesanato e exposições de artistas locais;<br />

f) locais para degustação de culinária típica;<br />

g) viveiros de plantas medicinais e terapêuticas locais.<br />

Esses equipamentos, além das atividades de caráter permanente,<br />

podem abrigar eventos esporádicos, como festivais folclóricos, exposições<br />

itinerantes, oficinas e seminários sobre assuntos como culinária local,<br />

artesanato, ecologia da região, etc., garantindo o fluxo de turistas,<br />

mesmo em períodos fora da alta estação. Para superar a sazonalidade,<br />

propõem-se alternativas que permitam compatibilizar as necessidades de<br />

um maior fluxo turístico – motivado pela sustentabilidade econômica da<br />

atividade – com as restrições ao fluxo de visitantes decorrentes do impacto<br />

ambiental nos atrativos naturais.<br />

Dentro de uma abordagem sistêmica do desenvolvimento turístico,<br />

as intervenções deverão ser complementadas por ações voltadas para<br />

a diversificação de atividades econômicas, a integração, o fomento de<br />

outros setores produtivos, por meio do desenvolvimento turístico e para a<br />

sustentabilidade das atividades turísticas.<br />

Nesse sentido, é essencial que essas ações sejam<br />

complementadas por iniciativas que estimulem a produção local de bens<br />

de consumo, como frutas, legumes e hortaliças, carne e laticínios, para o<br />

abastecimento de empreendimentos turísticos e da população. Iniciativas<br />

para estimular o comércio local, assim como investimentos em áreas como<br />

aquela da saúde e da educação, também deverão ser contempladas.<br />

3 APLICAÇÃO DO CONCEITO<br />

De acordo com esses princípios gerais, elaboraram-se estudos<br />

para a instalação de Vilas de Ecoentrenimento ® em cada um dos pólos<br />

que foram objeto dos Planos de Desenvolvimento de Ecoturismo nos três<br />

Estados mencionados. Tais estudos serviram, sobretudo, ao propósito de<br />

testar a validade do conceito, já que a efetiva execução do modelo deverá<br />

ser precedida de estudos mais aprofundados e concentrados, principalmente<br />

na identificação das problemáticas específicas de cada localidade.<br />

51<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 43-57, 2007.


52 Vilas de Ecoentretenimento ® : Uma visão para o ...<br />

Selecionaram-se as cidades de Mateiros, na região do Jalapão (TO),<br />

de Caseara, na região do Cantão (TO), a Vila Tepequém (RR) e a cidade<br />

de Serra do Navio (AP). Para cada local, com base em suas características<br />

específicas e nos recursos turísticos, propôs-se um zoneamento com<br />

a identificação de:<br />

a) uma área “núcleo” - em que deverão concentrar-se as intervenções<br />

em espaços públicos e equipamentos;<br />

b) áreas de consolidação que devem obedecer a critérios que garantam<br />

uma orientação comum no desenvolvimento da cidade;<br />

c) áreas de entorno voltadas para a produção de bens de consumo<br />

e para funções ecológicas, como a proteção de aqüíferos, a<br />

contenção de processos erosivos e de dispersão de fauna.<br />

Assim, enquanto em Mateiros, a área “núcleo” corresponde à praça<br />

da cidade, no caso de Caseara, a mesma área corresponde à faixa ao<br />

longo do Rio Coco, onde deverá ser construído um parque linear, com<br />

diversos equipamentos de lazer e de recreação.<br />

FIGURA 2 - ESQUEMA DA ANÁLISE ESPACIAL DE CASEARA, TO<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 43-57, 2007.


Doris Ruschmann, Joaquim Rondon e Jens Ruschmann<br />

FIGURA 3 - INTERVENÇÕES PROPOSTAS PARA CASEARA, TO<br />

As intervenções em infra-estrutura e equipamentos, apesar de<br />

norteadas pelos mesmos princípios, respondem de maneira diferente às<br />

condicionantes de cada local. Assim, às intervenções básicas, como<br />

melhorias no saneamento, recuperação de espaços públicos e fachadas,<br />

instalação de centros de visitante, organização de meios de hospedagem,<br />

entre outras, somam-se as de caráter essencialmente local, voltadas para<br />

a valorização das características específicas de cada destino. São os casos<br />

do centro de memória dedicado à história da criação da cidade de Serra<br />

do Navio e da base de pesquisa voltada para a continuidade do trabalho de<br />

desenvolvimento de tecnologias e princípios de adaptação de moradias e<br />

ambientes urbanos às condicionantes da Amazônia. É o caso ainda da<br />

casa do garimpo, na Vila Tepequém, na qual se sugere o resgate da história<br />

dessa atividade na região, a fim de permitir a interpretação da história<br />

pelos visitantes e, por outro, buscar soluções para a recuperação de áreas<br />

degradadas por antigas práticas de garimpo de alto impacto ambiental.<br />

53<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 43-57, 2007.


54 Vilas de Ecoentretenimento ® : Uma visão para o ...<br />

FIGURA 4 - ESQUEMA DE INTERVENÇÕES EM VILA TEPEQUÉM, RR<br />

FIGURA 5 - CROQUI PARA O CENTRO DE MEMÓRIA, EM SERRA<br />

DO NAVIO, RR<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 43-57, 2007.


Doris Ruschmann, Joaquim Rondon e Jens Ruschmann<br />

FIGURA 6 - CROQUI PARA A BASE DE PESQUISA, EM SERRA<br />

DO NAVIO, RR<br />

Nos exemplos mencionados, ressalta-se a complementaridade das<br />

atividades de pesquisa e de ecoturismo, um importante aspecto do conceito<br />

das Vilas de Ecoentretenimento ® . Esse aspecto se apresenta no<br />

sentido de ampliar a oferta de atrativos, valorizando o crescente interesse<br />

que temas sobre ecologia e culturas tradicionais despertam no sentido de<br />

cumprir o papel do ecoturismo como promotor da conservação e da<br />

melhoria da qualidade de vida nos locais onde se desenvolve.<br />

55<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 43-57, 2007.


56 Vilas de Ecoentretenimento ® : Uma visão para o ...<br />

4 ASPECTOS DA ESTRUTURAÇÃO<br />

A organização de Vilas de Ecoentretenimento ® , em função da<br />

abrangência de seu programa e da diversidade dos atores envolvidos, não<br />

se pode dar com base apenas em um esforço isolado, seja por parte do<br />

governo, seja por parte das comunidades receptivas, empresários, etc.<br />

Ao contrário, ela só será possível pela soma dos esforços nas diversas<br />

esferas envolvidas, em torno de diretrizes comuns, voltadas simultaneamente<br />

para o desenvolvimento econômico, proteção dos recursos naturais<br />

e culturais e para o bem-estar social.<br />

Nesse sentido, o conceito de Vilas de Ecoentretenimento ® deve<br />

ser entendido como um conjunto de diretrizes transversais a uma gama<br />

de projetos e iniciativas de caráter público e privado, com o objetivo de<br />

garantir o desenvolvimento turístico sustentável de uma determinada localidade,<br />

expresso não somente na valorização e continuidade de seus<br />

processos naturais e socioculturais, mas também na viabilidade econômica<br />

das iniciativas e na competitividade do destino – fatores fundamentais<br />

para a sustentabilidade em todas as suas dimensões.<br />

5 CONCLUSÃO<br />

Como parte do Plano de Desenvolvimento de Ecoturismo na Amazônia<br />

Legal, o conceito de Vilas de Ecoentretenimento ® encontra-se ainda<br />

em fase de amadurecimento e tem pela frente o desafio de ser posto em<br />

prática em situações reais na seqüência das atividades do PROECOTUR.<br />

No caso da confirmação da sua viabilidade, ter-se-á, em sua<br />

institucionalização nas localidades estudadas, um marco para o desenvolvimento<br />

sustentável do ecoturismo na região amazônica. 2<br />

No entanto, em que pesem os ajustes necessários que ocorrerão<br />

ao longo do processo de instalação, os princípios fundamentais da concentração<br />

dos impactos ambientais em um só local caracterizam-se como<br />

a base da proposta apresentada.<br />

2 Destaca-se que, no ano de 2007, ocorre a instalação de uma Vila de<br />

Ecoentretenimento ® nos moldes aqui apresentados, por meio de um programa-piloto,<br />

na localidade de Mateiros, no Pólo Ecoturístico do Jalapão (TO). O êxito da proposta<br />

induzirá a instalação nos demais pólos de ecoturismo da Amazônia.<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 43-57, 2007.


Doris Ruschmann, Joaquim Rondon e Jens Ruschmann<br />

A proposta prevê, fundamentalmente, a execução da infra-estrutura<br />

adequada, a ampliação de oportunidades para a inserção das comunidades<br />

receptivas, o aumento da sinergia entre os equipamentos e os serviços<br />

turísticos, o aumento e a diversificação da atratividade dos destinos,<br />

a viabilidade econômica e a competitividade. São aspectos fundamentais<br />

para o desenvolvimento sustentável do ecoturismo e se constituem em<br />

diretrizes importantes para nortear os diferentes programas e projetos<br />

voltados para o desenvolvimento do turismo na região amazônica do Brasil.<br />

Todavia, a proposta poderá ser replicada em outros locais com problemática<br />

similar, e as Vilas de Ecoentretenimento ® são, nesse sentido, instrumentos<br />

significativos de planejamento que podem contribuir para o desenvolvimento<br />

do turismo sustentável em todo o País.<br />

DOCUMENTO CONSULTADO<br />

RUSCHMANN CONSULTORES DE TURISMO. Planos de desenvolvimento<br />

sustentável do ecoturismo na Amazônia Legal: Amapá, Roraima,<br />

Tocantins. Fase 1. São Paulo: Ministério do Meio Ambiente (MMA)-Banco<br />

Interamericano de Desenvolvimento (BID).<br />

PROECOTUR - Programa de Desenvolvimento do Ecoturismo na<br />

Amazônia Legal – Fase I. São Paulo. 3.<br />

57<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 43-57, 2007.


58 Estratégias de Desenvolvimento Local ...<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 59-79, 2007.


C. B. Marques, C. H. S. Santos e J. M. Rocha<br />

ESTRATÉGIAS DE<br />

DESENVOLVIMENTO<br />

LOCAL: O CASO DO<br />

TURISMO NA ROTA VINÍCOLA<br />

DO VALE DOS VINHEDOS<br />

C. B. MARQUES<br />

___________________________________________________________<br />

59<br />

Mestranda em Turismo (UCS)<br />

C. H. S. SANTOS<br />

___________________________________________________________<br />

Doutor e professor do Mestrado em Turismo, na UCS<br />

J. M. ROCHA<br />

___________________________________________________________<br />

Professor da Universidade Federal do Pampa<br />

(UNIPAMPA/UFSM)<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 59-79, 2007.


60 Estratégias de Desenvolvimento Local ...<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 59-79, 2007.


C. B. Marques, C. H. S. Santos e J. M. Rocha<br />

RESUMO<br />

O turismo enquanto atividade econômica, pode contribuir para o desenvolvimento<br />

social, econômico e cultural de uma região. Para se compreender<br />

essa hipótese é importante introduzir não apenas os princípios<br />

orientadores de desenvolvimento, mas simultaneamente refletir sobre as<br />

estratégias da estruturação e o desenvolvimento da atividade em regiões<br />

específicas, pois é com base nas características peculiares de cada região<br />

que podem ser sugeridos os fatores positivos e negativos da atividade.<br />

Todavia, mais do que abordar, em termos gerais, essa problemática,<br />

aqui efetivamente se estudam as estratégias de planejamento e gestão da<br />

atividade turística na rota vinícola do Vale dos Vinhedos (RS).<br />

Palavras-chaves: turismo, estratégia, planejamento, desenvolvimento<br />

local, rota vinícola.<br />

ABSTRACT<br />

The tourism while economical activity, it can contribute to the development<br />

social, economical and cultural in an area. To understand this hypothesis it<br />

is important to not just introduce the guiding beginnings of development<br />

but, simultaneously, to contemplate on the strategies of the implantation<br />

and the development of the activity in specific areas. Because it is with<br />

base in the peculiar characteristics of each area that she can point the<br />

positive and negative factors of the activity. Though, more than to approach<br />

in general terms this problem, here indeed it is studied the planning<br />

strategies and administration of the tourist activity in the wine-producing<br />

route of the valley of the Vale dos Vinhedos (RS).<br />

Keywords: tourism, strategy, planning, local development, wine-producing<br />

route.<br />

61<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 59-79, 2007.


62 Estratégias de Desenvolvimento Local ...<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 59-79, 2007.


C. B. Marques, C. H. S. Santos e J. M. Rocha<br />

1 INTRODUÇÃO<br />

O turismo hoje é visto como a saída econômica de muitos municípios,<br />

sendo, em muitos casos, fator de incentivo às atividades não agrícolas<br />

em áreas rurais marginalizadas. Essa política de incentivo ao turismo<br />

rural foi motivada pelo de retorno do “homem urbano” ao campo.<br />

Em busca de uma vida mais livre e sem exposição à contaminação<br />

de produtos químicos e aos ruídos e distúrbios presentes nos espaços<br />

urbanos, a partir dos anos de 1980, o ambiente rural passou ser um<br />

atrativo turístico não só para os ambientalistas e amantes da natureza,<br />

mas também para as famílias urbanas. Assim, por essa nova demanda, o<br />

turismo rural pode vir a se tornar um importante promotor do desenvolvimento<br />

local sustentável, propiciando alternativas para melhoria da qualidade<br />

de vida das populações rurais. Tal atividade vem ao encontro da necessidade<br />

de novas alternativas para manutenção do homem dignamente<br />

nos espaços rurais, evitando o surgimento desorganizado de aglomerados<br />

urbanos, desprovidos de equipamentos e serviços, e permitindo a<br />

manutenção da vida segundo os critérios de habitabilidade recomendados<br />

pelo programa das Nações Unidas, o qual leva em consideração o<br />

índice de desenvolvimento humano (IDH) de cada país.<br />

Contudo, a demanda turística pelos espaços rurais acabou por expor<br />

a impossibilidade de um modo geral de os moradores dos espaços rurais<br />

fornecerem serviços e produtos com a qualidade que geralmente o turista<br />

espera. Isso leva à reflexão acerca de que, em termos de mudanças<br />

tecnológicas e proliferação da variedade de produtos, tem-se acentuado o<br />

papel da melhoria contínua do desempenho como um requisito estratégico<br />

e competitivo em muitas organizações.<br />

Percebe-se que o reconhecimento da importância da administração<br />

estratégica por diversos segmentos de mercado vem crescendo na proporção<br />

em que aumenta o nível de competitividade exigido das organizações,<br />

acelerando o ritmo das transformações no ambiente empresarial.<br />

O objetivo deste trabalho, com base na teoria das estratégias de<br />

Henry Mintzberg et. al. (2000), é verificar se as propostas de gestão do<br />

desenvolvimento regional do turismo na rota vinícola do Vale dos Vinhedos<br />

encaixam na concepção. O artigo foi estruturado da seguinte forma: inicialmente<br />

é realizada a fundamentação teórica a respeito das teorias estratégicas<br />

e desenvolvimento regional do turismo; depois se analisa o caso<br />

da rota vinícola do Vale dos Vinhedos como modelo de aplicação para as<br />

estratégias de desenvolvimento de acordo com as escolas formuladas<br />

por Henry Mintzberg et. al. (2000).<br />

63<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 59-79, 2007.


64 Estratégias de Desenvolvimento Local ...<br />

2 TURISMO RURAL<br />

Partindo do conceito de turismo de Cristopher Holloway (1994),<br />

que o conceitua, sobretudo, como uma indústria apoiada numa cadeia<br />

constituída por vários setores intervenientes que se entrecruzam e se<br />

complementam. Quando se analisa o turismo no meio rural, ele se constitui<br />

em uma atividade não agrícola que se apóia nas atividades agrícolas.<br />

Vale salientar que não só o turismo pode completar e reforçar as atividades<br />

agrícolas, como é o caso dos serviços, das comunicações, do artesanato,<br />

entre outras que as peculiaridades locais propiciam. Todas elas, e<br />

especialmente o turismo rural, criam mais postos de trabalho e redesenham<br />

o próprio espaço econômico rural. O turismo rural funciona como indutor<br />

do crescimento de ocupações não agrícolas no meio rural (SILVA, 1997<br />

apud SCHNEIDER, 2000).<br />

De acordo com F. J. Martinez e S. J. Monzonis (2000, p. 10), o<br />

turismo rural pode ser traduzido como a atividade capaz de unir as características<br />

da oferta e a motivação para a demanda. Assim, conceituam-no<br />

como a atividade turística realizada no espaço rural, composta de uma<br />

oferta integrada ao ócio e dirigida a uma demanda, cuja motivação principal<br />

é o contato com o entorno rural combinado a inter-relações com a<br />

sociedade local.<br />

Para José Graziano da Silva, Balsadi e Grossi (apud SILVA; DALE;<br />

VILARINHO, 1998, p. 78), o turismo rural gera ocupações complementares<br />

às atividades agrícolas e passa a fazer parte do cotidiano da propriedade<br />

rural, em menor ou maior intensidade, dependendo da propriedade,.<br />

O turismo rural passa a ter um papel importante na habitabilidade<br />

dos espaços rurais, servindo para a fixação do homem não só nas atividades<br />

agrícolas mas especialmente nos espaços rurais, o que torna um<br />

fator importante para amenizar o fluxo migratório. Essa nova tendência,<br />

de acordo com Maria Dolores García Ramón (1995, p. 98), é denominado<br />

neo-ruralismo.<br />

No Brasil o turismo rural como programa, está em fase de introdução<br />

pelo Instituto Brasileiro de Turismo (Embratur), devendo regulamentar<br />

as atividades do segmento que tem como foco de atratividade a relação<br />

do homem com o meio rural. Esse tipo de lazer tem como característica<br />

saídas de fim de semana, em que o turista viaja mais vezes e permanece<br />

menor espaço de tempo no local.<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 59-79, 2007.


C. B. Marques, C. H. S. Santos e J. M. Rocha<br />

Segundo Mário Carlos Beni (2002, p. 36), numa análise mais ligada<br />

ao busines, turismo rural é a dominação dada ao deslocamento de<br />

pessoas a espaços rurais em roteiros programados ou espontâneos, com<br />

ou sem pernoite, para a fruição dos cenários e instalações denominadas<br />

rurícolas. Salienta que os caminhos, as rotas e as formas de desenvolvimento<br />

dificilmente são compatíveis e comparáveis, pois, em cada país,<br />

região, município ou local, interage uma série de fatores de natureza econômica,<br />

social, política e cultural que, ao longo do tempo, foram moldadas<br />

de forma específica e única. Por isso são atrativos especiais.<br />

A perspectiva desse novo mundo rural determina um conteúdo de<br />

sustentabilidade ao desenvolvimento local, que, para Dóris V. de M.<br />

Ruschmann (1997, p.165), é entendido como uma ordenação das<br />

65<br />

[...] ações do homem sobre o território, ocupando-se em direcionar<br />

a construção de equipamentos e facilidades de forma adequada,<br />

evitando dessa forma os efeitos negativos nos recursos, que os<br />

destroem ou reduzem sua atratividade.<br />

Na possibilidade de alternativas para desenvolvimento local, podese<br />

observar um novo território rural de produção e consumo da sociedade<br />

urbano-industrial; o campo passou a caracterizar-se como uma referência<br />

de um bom lugar de viver. Com isso, surgem oportunidades de exploração,<br />

como o lazer associado ao convívio com o meio ambiente natural,<br />

a exemplo do turismo ecológico, artesanato rural, agroindústria familiar e<br />

consumo de vinhos. Iniciou-se, desse modo, um processo de sustentação<br />

do desenvolvimento dos espaços rurais, onde os elementos da cultura<br />

local são incorporados por novos valores, hábitos e técnicas.<br />

Os anos 90 apontaram para um novo papel do Estado, na agenda<br />

do desenvolvimento rural. Definiu-se como estratégia de ação das políticas<br />

públicas o desenvolvimento no âmbito local em que se efetivam as<br />

relações sociais de produção. O processo de desenvolvimento passou a<br />

ser visto não só como essencialmente econômico mas também político,<br />

cultural e geográfico, dentro de um contexto social em que ocorrem a produção<br />

das riquezas, a vida em sociedade, as relações de trocas culturais,<br />

etc. Esse emaranhado de interesses pode ser conflituoso, mas precisa<br />

ser sustentável. Assim, as estratégias governamentais passaram a incluir<br />

formas de controle social em que participação dos atores no processo de<br />

definição das atividades produtivas, no seio do território geográfico, social<br />

e econômico passou a ser imprescindível.<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 59-79, 2007.


66 Estratégias de Desenvolvimento Local ...<br />

3 ESTRATÉGIA E PLANEJAMENTO<br />

Henry Mintzberg (2001, p. 125) conceitua estratégia de forma<br />

abrangente e eclética, ressaltando que a definição não pode ser<br />

simplificada, necessitando de múltiplas abordagens, por isso, propõe cinco<br />

definições, denominadas por ele os “5 Ps da estratégia”: plano, pretexto,<br />

padrão, posição e perspectiva. Em outra obra (MINTZBERG et al., 2000),<br />

o autor cataloga dez diferentes visões sobre o processo de estratégia ou<br />

dez escolas para formulação de estratégia, a saber: design, planejamento,<br />

posicionamento, empreendedora, cognitiva, aprendizado, poder, cultural,<br />

ambiental e configuração. Portanto, o plano estratégico é formulado<br />

com o intuito de permitir que a companhia se posicione em seu ambiente.<br />

No sentido dessa complementaridade, a estratégia é abordada, por<br />

B. D. Henderson (1989, p. 8), como a busca deliberada de um plano de<br />

ação para desenvolver e ajustar a vantagem competitiva (conceito<br />

concorrencial originado do posicionamento) de uma empresa.<br />

Na estratégia como perspectiva, Henry Mintzberg (1996, p. 15) olha<br />

para dentro da organização, dentro das cabeças de seus estrategistas e<br />

para cima para a grande visão da empresa. O conteúdo não é apenas a<br />

posição escolhida, mas também a maneira enraizada (e compartilhada)<br />

de ver o mundo.<br />

K. Ohmae (1989, p. 55) afirma que no desenvolvimento da estratégia<br />

é importante levar em consideração a competição, mas não se deve<br />

colocá-la em primeiro lugar. De acordo com esse autor, estratégia não<br />

significa derrotar a concorrência, mas trabalhar no entendimento das necessidades<br />

inerentes dos clientes e, conseqüentemente, desenvolver um<br />

produto correto para atender àquelas necessidades e não somente uma<br />

versão melhorada dos produtos dos concorrentes.<br />

Igor H. Ansoff e Edward J. McDonell (1993, p. 295) afirmam que,<br />

principalmente pelo fato de o ambiente externo da empresa se tornar cada<br />

vez mais mutável e descontínuo em relação ao passado, aumenta a importância<br />

da administração estratégica, pois os objetivos, isoladamente,<br />

são insuficientes como regras de decisão para guiar a empresa de modo<br />

a adaptá-la a novos desafios, ameaças e oportunidades.<br />

A intervenção do Estado nesse novo espaço rural precisa ser estratégica<br />

no sentido dos 5 Ps de Henry Mintzberg e James B. Quinn (2001)<br />

e reposicionar esse espaço, considerando tanto as atividades agrícolas<br />

como as não agrícolas. Para tanto, precisa criar condições infra-estruturais<br />

para que se tenha um desenvolvimento local.<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 59-79, 2007.


C. B. Marques, C. H. S. Santos e J. M. Rocha<br />

4 DO DESENVOLVIMENTO RURAL PARA UM DESENVOLVIMENTO<br />

LOCAL<br />

O estudo da inovação propriamente dita, inicia com a obra de J. A.<br />

Schumpeter (1982), que aborda a ação de inovar como criadora de processos<br />

de ruptura no sistema econômico, afetando o equilíbrio do fluxo<br />

circular. Esse processo de ruptura (introdução da inovação) é provocado<br />

pelo empreendedor, que detém a habilidade de ser o primeiro a introduzir<br />

novas combinações de meios produtivos, transformando assim o fluxo circular<br />

estabelecido. Assim sendo, inovações nas condições de J. A.<br />

Schumpeter (1982) são representadas pelas novas combinações de produção<br />

que surgem descontinuamente, sendo um processo absolutamente<br />

revolucionário na condição de desenvolvimento econômico e substituindo<br />

a tradicional forma de competição (preços). O autor faz ainda uma distinção<br />

entre crescimento e desenvolvimento econômico. O primeiro é considerado<br />

um processo contínuo e gradual; já desenvolvimento econômico,<br />

por sua vez, é um fenômeno de mudança espontânea e descontínua nos<br />

canais de fluxo – perturbação do equilíbrio, que altera e desloca para sempre<br />

o estado de equilíbrio previamente existente (SCHUMPETER, 1982, p. 47).<br />

O desenvolvimento rural em sua interpretação clássica foi identificado<br />

como uma “revolução verde” 1 , pelo incremento de processos químicos<br />

e biológicos dos produtos agrícolas, em conceitos econômicos, com<br />

base em desenvolvimento de fatores da produção em grande escala. Esse<br />

processo motivou a industrialização das pequenas propriedades, para atender<br />

a um consumo em massa cada vez mais exigente e dinâmico. Nesse<br />

cenário se identificam características da reprodução do “sistema<br />

mercantilista” focalizado na comercialização internacional, unilateral e fortemente<br />

agressiva. Nos países subdesenvolvidos isso significava exportar<br />

todos os possíveis recursos econômicos produzidos. Nesse caso, a<br />

única função do Estado é fomentar o enriquecimento agrícola, de forma a<br />

atender à demanda por grandes commodities agrícolas, sem muitas preocupações<br />

do nível de bem-estar social das populações marginalizadas<br />

que, por motivos variados, haviam ficado de fora da “revolução verde” iniciada<br />

na década de 50.<br />

1 Revolução verde, o que se convencionou denominar o processo produtivo, surgido<br />

nos anos 50, prioriza o uso de agroquímicos nas plantações agrícolas.<br />

67<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 59-79, 2007.


68 Estratégias de Desenvolvimento Local ...<br />

A possibilidade de o desenvolvimento passar a ser visto a partir do<br />

local surgiu como um modo de promover nas comunidades mecanismos<br />

mais sustentáveis de manutenção econômica. As estratégias passaram,<br />

então, a ser: descobrir ou despertar vocações locais, desenvolver<br />

potencialidades específicas, fomentar o intercâmbio externo aproveitando-se<br />

de vantagens produtivas locais. Nisso, o conceito de “local” não<br />

deve ser confundido como sinônimo de pequeno e não alude necessariamente<br />

à diminuição ou redução. Pelo contrário, o local não é um espaço<br />

micro; pode ser tomado como um município ou, inclusive, como uma região<br />

compreendendo vários municípios. (Presidência da República e Conselho<br />

da Comunidade Solidária, 1998, p. ). Trata-se de um processo de<br />

desenvolvimento que incide, particularmente, na realidade uma determinada<br />

escala territorial: a região. Dessa forma, aproveita os recursos e as<br />

potencialidades endógenas; procura estimular a participação e o<br />

envolvimento das populações locais, promovendo um esforço na conjugação<br />

de vários interesses de diferentes intervenientes.<br />

Numa outra linha parecida, A. Sen (1999, p. 2) refere-se ao desenvolvimento<br />

como um processo “essencialmente amigável”, o que pode<br />

ser exemplificado por meio das trocas benéficas e do trabalho de redes de<br />

segurança social pelas liberdades políticas ou pelo desenvolvimento social,<br />

ou uma ou outra combinação dessas atividades de apoio. Nesse sentido,<br />

o desenvolvimento é essencialmente uma estratégia de ações interrelacionadas,<br />

em que a natureza do processo de desequilíbrio é superada<br />

por um equilíbrio na trajetória das principais variáveis econômicas e sociais.<br />

De acordo com A. Sem (1999, p. 1): “Nessa perspectiva, as pessoas<br />

têm de ser vistas como ativamente envolvidas [...] na conformação de seu<br />

próprio destino, e não apenas como beneficiárias passivas dos frutos de<br />

engenhosos programas de desenvolvimento.”<br />

Numa perspectiva mais tradicional da economia, o desenvolvimento<br />

envolve mudanças qualitativas no modo de vida das pessoas, das instituições<br />

e das estruturas produtivas. Nesse sentido, desenvolvimento caracteriza-se<br />

pela transformação de uma economia arcaica em moderna, eficiente,<br />

com a melhoria do nível de vida do conjunto da população.<br />

O desenvolvimento local compreende diversas abordagens, como<br />

distritos industriais, sistemas produtivos localizados, meios inovadores.<br />

Entretanto, o traço comum entre elas é que se trata de experiências de<br />

desenvolvimento baseadas em forças endógenas, em que as instituições<br />

e as autoridades locais exercem seus próprios papéis econômicos, independentes<br />

do Estado central (ou de outras instâncias que lhes sejam superiores).<br />

A economia local busca tirar seu dinamismo de fatores que lhe<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 59-79, 2007.


C. B. Marques, C. H. S. Santos e J. M. Rocha<br />

são próprios, vêm de seu passado e têm raízes em sua história e em<br />

suas condicionantes geofísicas. Muitas vezes, há traços culturais e sabedoria<br />

técnico-artesanal enraizados na unidade socioterritorial.<br />

Os atores locais (pessoas e instituições) exercem um papel fundamental<br />

num contexto em que a lógica econômica não é sempre dominante.<br />

Práticas cooperativas e iniciativas coletivas têm sido apontadas<br />

pela literatura como fatores decisivos para fortalecer o tecido social local,<br />

trazendo, muitas vezes, vantagens econômicas que de outra maneira não<br />

seriam obtidas. A força do desenvolvimento local vem do conjunto do tecido<br />

social, pois parte das aptidões humanas filtradas por fatores históricos,<br />

sociais e naturais. Bernard Pecqueur (1996, p. 19) considera que<br />

69<br />

[...] as experiências de desenvolvimento local demonstram a capacidade<br />

das coletividades locais de se adaptarem às imposições<br />

da internacionalização da concorrência a partir de seu potencial de<br />

organização. Verifica-se que há organizações bem locais que respondem<br />

à uniformização dos comportamentos provocada pela<br />

mundialização das trocas e que permitem encontrar formas mais<br />

eficazes de valorização de riquezas [...]<br />

Na visão de W. Sengenberger (1993, p. 55), o desenvolvimento<br />

local é uma nova preposição de impulso em que as economias locais<br />

podem, graças à melhor utilização de recursos, à melhor colaboração<br />

entre empresas e a trabalhadores qualificados para demandas endógenas,<br />

promover vantagens comparativas, em resposta aos imperativos de eficiência<br />

e inovação da qual não se pode fugir. Para esse autor, o desenvolvimento<br />

local transcende o interesse econômico imediato, na medida em<br />

que mobiliza os cidadãos a participarem da vida social, política e cultural<br />

da região, auxiliando no fortalecimento da identidade regional.<br />

5 ROTA VITIVINÍCOLA DO VALE DOS VINHEDOS: ESTRATÉGIA<br />

INTEGRADA AO DESENVOLVIMENTO LOCAL<br />

De acordo com Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, “vitivínicola”<br />

é o empreendimento que cultiva vinhas e produz o vinho; e “rota” significa<br />

caminho. Pela proposta do trabalho, a intenção do emprego da expressão<br />

“rota vitivínicola”, para identificar o lugar de estudo, tem a finalidade de<br />

chamar a atenção para o principal potencial econômico do local.<br />

Uma região vinícola é uma área geográfica para o cultivo e colheita<br />

de videiras, em grande escala. A fim de produzir seus sumos derivados,<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 59-79, 2007.


70 Estratégias de Desenvolvimento Local ...<br />

como suco, vinho e passa, as vinícolas atualmente são equipadas com<br />

processos tecnológicos, tanto na colheita, como na prensagem e nos processos<br />

de vinificação. No Brasil, o esforço dos viticultores resultou numa<br />

expansão do setor vitivinícola. Mais recentemente, especialmente a partir<br />

da década de 80, começaram a ocorrer investimentos com a instalação e<br />

a modernização das vinícolas (setor industrial), motivados por um mercado<br />

interno com potencial para produtos de melhor qualidade (vinhos finos)<br />

e mais caros. No mesmo período, a agroindústria de suco conseguiu se<br />

destacar pela qualidade e singularidade do produto elaborado, vindo a conquistar<br />

mercados internacionais.<br />

Paralelamente, verificou-se o processo de modernização<br />

tecnológica das vinícolas e processadoras de suco. Todavia, o setor de<br />

produção vitícola (produção agrícola) não participou dessa mudança com<br />

velocidade e objetividade necessárias, embora já houvesse tecnologias<br />

disponíveis, capazes de promoverem uma melhora significativa da produção.<br />

Como conseqüência desse quadro, a qualidade da matéria-prima<br />

nacional (uvas para processamento) tem apresentado potencial enológico<br />

inferior ao dos concorrentes, prejudicando nossa capacidade competitiva<br />

no atual contexto de mercado globalizado.<br />

O Vale dos Vinhedos é conhecido pelos vales que compõem sua<br />

paisagem natural. Essa região está situada na Serra Gaúcha (Estado do<br />

Rio Grande de Sul), entre os municípios de Bento Gonçalves, Garibaldi e<br />

Monte Belo do Sul. Atualmente, a cidade de Bento Gonçalves possui quatro<br />

distritos, e o Vale dos Vinhedos foi o último deles a ser criado, em 1990.<br />

Para formar esse distrito, foi desmembrada uma área de Monte Belo do<br />

Sul, que ainda não se havia emancipado de Bento Gonçalves, e outra área<br />

da sede do município.<br />

O Vale dos Vinhedos foi colonizado por imigrantes italianos que<br />

chegaram ao Brasil em busca de terras e da prosperidade. Cultivaram a<br />

terra e não foram apenas os cereais, as hortaliças e a criação de animais<br />

que caracterizaram sua estada na região. Trouxeram consigo inúmeros<br />

elementos culturais, entre eles o cultivo da videira, a preparação do vinho<br />

e seu consumo.<br />

Em 2004, foi realizado na região do Vale dos Vinhedos o Diagnóstico<br />

das Potencialidades da região 2 . Com base nos resultados obtidos na<br />

pesquisa, identificaram-se as potencialidades e as deficiências que são<br />

2 Diagnóstico realizado pela Universidade de Caxias do Sul (UCS) e Embrapa, de Bento<br />

Gonçalves, 2004.<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 59-79, 2007.


C. B. Marques, C. H. S. Santos e J. M. Rocha<br />

relevantes na formulação do prognóstico para o planejamento turístico da<br />

rota vinícola do Vale dos Vinhedos.<br />

A rota vinícola do Vale dos Vinhedos se caracteriza pela concentração<br />

de algumas das principais vinícolas do País, tanto empresas como<br />

cooperativas, além de pequenas e médias vinícolas, agroindústrias, agricultores<br />

familiares (na maioria viticultores) e uma crescente organização<br />

turística em torno da produção do vinho e da paisagem rural.<br />

Identifica-se como estratégia de planejamento e posicionamento<br />

uma estrutura de promoção da imagem do vinho associada à paisagem<br />

rural (agrícola e ecológica) e à gastronomia, numa busca de fortalecer<br />

tanto o setor turístico diretamente como a própria vitivinicultura, que depende<br />

parcialmente do turismo, em suas estratégias promocionais. Para<br />

potencializar as estratégias de desenvolvimento e planejamento da economia<br />

turística na região, foi fundada, em 1995, a Aprovale 3 com os objetivos<br />

de fomentar a atividade turística e a competitividade das vinícolas e de<br />

resguardar o patrimônio sociocultural da rota.<br />

De acordo com a Aprovale, o Vale dos Vinhedos é o roteiro certo<br />

para quem deseja conhecer a cultura da uva e do vinho. A conquista do<br />

Selo de Indicação de Procedência Vale dos Vinhedos (IPVV) 4 garante a<br />

origem com qualidade do que é produzido na região, distinguindo-os dos<br />

demais. Somente podem ostentá-lo os vinhos elaborados com as uvas<br />

provenientes do Vale dos Vinhedos e engarrafados em sua origem, além<br />

de serem aprovados em testes realizados por um grupo de especialistas<br />

composto de técnicos da Embrapa Uva e Vinho e da Aprovale.<br />

Com o trabalho da Aprovale e empresários do setor vinícola, com<br />

as ações do setor público e da comunidade local, foi obtido o Registro de<br />

Denominação como Indicação de Procedência, evidenciando-se nessa<br />

estratégia a busca de um padrão de qualidade (MINTZBERG, 1996). Esse<br />

destaque na qualidade dos produtos da região teoricamente melhora a<br />

competitividade e a solidez do setor vinícola. Analisada dessa forma, a<br />

estratégia empregada pode desenvolver certas competências na rota, as<br />

quais tendem a reforçar ou redirecionar tal padrão, fundamentando-se nos<br />

recursos e nas competências desenvolvidos e controlados pelas vinícolas<br />

associadas à Aprovale e, posteriormente, no ambiente competitivo em<br />

que os empresários se posicionam.<br />

3 Associação dos Produtores de Vinhos Finos do Vale dos Vinhedos.<br />

4 IPVV para vinhos provenientes da região de 81 km 2 , situada entre os municípios de<br />

Bento Gonçalves, Garibaldi e Monte Belo do Sul, no Estado no Rio Grande do Sul.<br />

71<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 59-79, 2007.


72 Estratégias de Desenvolvimento Local ...<br />

O incremento dado à valorização e à produção de bens locais,<br />

com base em recursos do território, pode dinamizar não apenas o tecido<br />

econômico (regenera atividades tradicionais e estimula a criação de emprego),<br />

como também pode contribuir para o reforço da identidade, aproximando<br />

a população ao território. Simultaneamente, surgiu a necessidade<br />

de incentivar o consumo desses produtos. Para tal, avançou-se para sua<br />

comercialização, equacionando-se formas de promoção, divulgação e distribuição.<br />

Com base nesse exemplo, constata-se que pelo reconhecimento<br />

de seu valor, a população avança para formas de rentabilização de seus<br />

recursos, assumindo um papel ativo e interveniente no processo de desenvolvimento<br />

do território em que se insere.<br />

No caso de estratégia de desenvolvimento do turismo na rota vinícola<br />

do Vale dos Vinhedos, pode observar-se que se trata de um espaço<br />

rural onde são ainda preservados valores e identidades determinantes das<br />

comunidades locais, com apoio na formação cultural induzida basicamente<br />

pela imigração italiana. Nesse contexto de desenvolvimento, percebe-se<br />

na região que a agricultura passou a cumprir um papel multifuncional, passando<br />

não só a ofertar produtos agrícolas para o consumo, mas ainda incorporando<br />

outros papéis relativos à integração de atividades econômicas.<br />

Compreendendo o desenvolvimento de forma diferente e contemplando<br />

o indivíduo, pode-se pensar nas áreas rurais como locais potenciais<br />

de industrialização (agroindústrias) e desenvolvimento social. Com isso<br />

se consegue melhor qualidade de vida dos que ficam nas áreas rurais e<br />

se incrementa o potencial de produção para as áreas urbanas.<br />

Desenvolver impõe um aproveitamento racional dos recursos. A<br />

afirmação incide na importância dos territórios como suporte para uma<br />

eficaz gestão de seus recursos naturais, culturais, humanos e econômicos.<br />

Os territórios não podem ser tomados como uma simples realidade<br />

geográfica ou um suporte físico da vida. Valorizar é reconhecer e utilizar. A<br />

título de exemplo, na rota do Vale dos Vinhedos, pode-se identificar como<br />

estratégia de ação das políticas públicas o desenvolvimento em âmbito<br />

local, em que ocorrem concretamente as relações sociais de produção.<br />

Dessa forma, a vantagem que um país, região ou localidade adquire está<br />

relacionada com sua capacidade de aprendizado, que condiciona o processo<br />

de inovação e o conseqüente desenvolvimento. Esses aspectos<br />

revelam a importância dos fatores econômicos e não econômicos no processo<br />

de aprendizado, inovação e competição, enraizados em cada localidade<br />

e imersos na cultura local.<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 59-79, 2007.


C. B. Marques, C. H. S. Santos e J. M. Rocha<br />

As iniciativas do setor público para a região podem ser classificadas,<br />

segundo Henry Mintzberg (1996), como estratégias de formação,<br />

estruturação e de negócios, conforme o quadro a seguir.<br />

FONTE: Autores.<br />

QUADRO 1 - ESTRATÉGIAS<br />

FORMAÇÃO ESTRUTURA NEGÓCIO<br />

Atividades que promovam<br />

a sensibilização da<br />

comunidade referente ao<br />

turismo.<br />

Divulgação e promoção<br />

institucional dos atrativos<br />

da região e do roteiro<br />

turístico da Rota Vinícola<br />

do Vale dos Vinhedos, por<br />

meio de vídeos, folders,<br />

palestras, filmes.<br />

Suporte técnico<br />

administrativo para<br />

realização do inventário<br />

turístico da região em<br />

parceria com a Universidade<br />

de Caxias do Sul (UCS).<br />

Elaboração da<br />

estruturação do<br />

Plano Diretor Rural.<br />

Adequação de serviços<br />

de infra-estrutura<br />

como o abastecimento<br />

de água nas localidades,<br />

iluminação pública e<br />

pavimentação das<br />

estradas municipais.<br />

Restauração e pintura<br />

dos capitéis à margem<br />

das estradas e rodovias.<br />

Apoio aos<br />

empreendimentos,<br />

especialmente vinícolas,<br />

facilitando o acesso por<br />

meio de terraplenagem.<br />

Apoio para projetos<br />

culturais, como festa do<br />

quentão e o coral do<br />

Vale dos Vinhedos.<br />

Negociação de<br />

parceria com a<br />

empresa de cartões<br />

de crédito Visa.<br />

Conforme relato dos representantes do poder público municipal<br />

(entrevistas em 29/5/2007 e 3/7/2006), tais ações foram organizadas e<br />

estão sendo monitoradas por meio da avaliação dos atores locais e do<br />

visitante.<br />

Pela análise das informações, em relevância à bibliografia de Henry<br />

Mintzberg et al. (2000), pode-se considerar que rota vinícola do Vale dos<br />

Vinhedos ainda possui carência de ações estratégias na promoção do<br />

desenvolvimento local. Percebe-se que as iniciativas mais emergentes e<br />

significativas partem da iniciativa privada e das instituições ligadas ao setor<br />

vinícola e turístico da região.<br />

73<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 59-79, 2007.


74 Estratégias de Desenvolvimento Local ...<br />

iniciativa<br />

privada<br />

FONTE: Autores.<br />

FIGURA 1 - AÇÕES ESTRATÉGICAS<br />

O desenvolvimento local foi considerado com base no que se apresenta<br />

na figura 1, que demonstra o desenvolvimento local como dependente<br />

dos setores.<br />

fraco (-)<br />

forte +<br />

forte +<br />

desenvolvimento local<br />

deficiente<br />

apoio estatal<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 59-79, 2007.<br />

instituições e<br />

entidades do setor<br />

deficiente<br />

Na análise, constatou-se que a iniciativa privada, as instituições e<br />

as entidades do setor vitivinícola proporcionam forte apoio ao desenvolvimento<br />

local, mas a iniciativa estatal é deficiente. Paralelamente, nota-se<br />

que o incentivo estatal é também deficiente, seguido por um apoio fraco<br />

das instituições e entidades do setor vitivinícola, em relação à iniciativa<br />

privada, conforme se observa na figura 1.<br />

Uma das principais características do planejamento turístico é organizar<br />

os espaços de uma maneira integrada, de forma a compor um<br />

produto completo e a partir daí desenvolver um diferencial mercadológico.<br />

Para Neil Smith (1988, p. 85), o produto turístico é uma composição de<br />

tudo o que se pode consumir, experimentar, observar e apreciar durante<br />

uma viagem. O Vale dos Vinhedos oferta seus produtos turísticos na forma<br />

de roteiros, sendo identificados como “roteiros de turismo” 5 que, nos<br />

últimos anos não constituem novidade no mundo das opções de lazer.<br />

Contudo, a configuração do espaço passa a ser importante no desenvolvimento<br />

do turismo, enquanto possibilidade de produzir o encantamento, a<br />

fantasia e a realização, pois o espaço em sua objetividade é um simples<br />

estar que não tem existência a não ser na relação com a consciência<br />

humana.<br />

5 Roteiros são percursos, caminhos, rotas percorridas por turistas, com o objetivo de<br />

usufruir um contexto, visto, em seu conjunto, de forma organizada e atrativa.


C. B. Marques, C. H. S. Santos e J. M. Rocha<br />

Nesse aspecto, o turista consome um produto global que resulta<br />

da experiência da viagem como um todo; a oferta desse produto global<br />

resulta na intervenção de uma rede responsável pela produção de<br />

subprodutos turísticos (alojamento, transporte, restauração, atrações) que,<br />

no todo, constituem os diversos componentes do produto turístico numa<br />

ótica global. A estada num hotel, a refeição num restaurante regional, o<br />

museu que se visita e onde se recolhe informação, a orientação proporcionada<br />

pelo posto de turismo e o artesanato adquirido no comércio local<br />

são alguns exemplos de subprodutos consumidos pelo turista ao longo de<br />

sua permanência num determinado território.<br />

Os produtos, bens ou serviços que um município ou uma região<br />

tem a oferecer para as pessoas que o visitam, em função de sua estrutura,<br />

complexidade e heterogeneidade, resultam na composição de um conjunto<br />

de atividades, tanto econômicas como sociais e culturais. É importante<br />

salientar que o planejamento turístico de uma região deve ser cuidadoso<br />

para evitar despesas inúteis, desequilíbrios locais e conseqüências<br />

sociais e culturais.<br />

Além de um espaço de preservação ambiental, a zona rural começou<br />

a ser visto pelos formuladores de políticas públicas também como<br />

uma oportunidade de gerar formas de ocupação e renda para segmentos<br />

da população que ai vivem e que, em geral, não têm a qualificação necessária<br />

para se inserirem nos setores urbanos em expansão. Portanto, as<br />

modificações, tanto no meio ambiente empresarial urbano como rural, têm<br />

conduzido as organizações a busca de estratégias de planejamento e de<br />

ajuste permanente às transformações tecnológicas, sociais e econômicas<br />

que os novos paradigmas colocam.<br />

A proposta de desenvolvimento do Vale dos Vinhedos assumiu uma<br />

postura baseada na inter-relação de atividades econômicas em torno do<br />

processo de produção: vitivinicultura e turismo. São setores que se relacionam<br />

à valorização sociocultural e à identidade construída na relação entre<br />

os empreendimentos econômicos da região.<br />

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS<br />

O processo produtivo da atividade turística não é autônomo e singular.<br />

São vários os setores econômicos responsáveis pela produção de<br />

produtos turísticos. Assim, pode-se afirmar que o turismo, além de gerar<br />

entrada de divisas, tem a capacidade de integrar a economia local e criar<br />

75<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 59-79, 2007.


76 Estratégias de Desenvolvimento Local ...<br />

produtos complementares, não necessariamente agrícolas, mas<br />

agregadores e fomentadores do desenvolvimento local.<br />

É crescente a percepção de que estratégias bem formuladas e<br />

adequadamente estruturadas se constituem em fatores fundamentais para<br />

que as organizações sejam bem-sucedidas em seus propósitos, mercê<br />

do maior alinhamento interno em torno de seus objetivos globais, do<br />

posicionamento da organização em relação a seu ambiente de atuação e<br />

da manutenção da coerência ao longo do tempo. Conseqüentemente, as<br />

atividades turísticas só poderão ser eficientes e viáveis num horizonte de<br />

médio e de longo prazo, se os recursos de que dependem forem mantidos<br />

e até melhorados. Deve ser prestada atenção ao ordenamento do<br />

território e à qualidade ambiental, bem como estimuladas ações estratégicas<br />

de certificação de qualidade do serviço turístico. Portanto, o turismo<br />

deveria ser estrategicamente planejado e refletir sobre o modelo de desenvolvimento<br />

turístico a aplicar adequadamente à realidade do território<br />

em causa. É nesse contexto que as teorias de estratégias de Henry<br />

Mintzberg (2000) podem contribuir para o desenvolvimento do turismo em<br />

rotas vinícolas, especificamente, no caso do Vale dos Vinhedos.<br />

Sendo as experiências de desenvolvimento local resultado de uma<br />

combinação particular de elementos históricos, sociais, econômicos e<br />

geográficos, deve-se ressaltar que, no limite, cada caso é único, e, por<br />

isso, o fenômeno não pode ser deliberadamente reproduzido em outro<br />

local. Fica difícil, pois, tomá-lo como modelo, o que, entretanto, é feito,<br />

muitas vezes, na formulação de políticas com a intenção de provocar o<br />

desenvolvimento numa dada região.<br />

Convém salientar que o fato do desenvolvimento local se basear<br />

na valorização de recursos internos da região não quer dizer que se esteja<br />

em presença de uma forma autárquica de desenvolvimento, o que não<br />

teria o mínimo sentido numa economia relacional como a atual. O desenvolvimento<br />

local não pode ser pensado como uma experiência fechada,<br />

cujo sucesso advenha desse fechamento ou auto-suficiência. Pelo contrário,<br />

se trata de um espaço que deve estabelecer relações e que deve<br />

utilizar as trocas com o exterior em seu beneficio. Essas relações estão,<br />

por conseguinte, sujeitas a certas condições e articuladas com as necessidades<br />

da região. As regiões ganhadoras são justamente as que encontram<br />

um modo próprio de integração aos mercados nacionais e internacionais<br />

e não aquelas que se fecham.<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 59-79, 2007.


C. B. Marques, C. H. S. Santos e J. M. Rocha<br />

Ao se tratar do desenvolvimento local, todavia, a questão se coloca<br />

em outros moldes. A sustentação de um processo de desenvolvimento<br />

depende não apenas do desempenho das empresas locais, mas também,<br />

e muito mais, da capacidade que devem ter os agentes de empreenderem<br />

uma ação coordenada em busca de estratégias comuns. Essa<br />

idéia se insere na concepção de desenvolvimento local.<br />

A definição e a estruturação de estratégias e políticas para o desenvolvimento<br />

turístico cabem aos vários membros individualmente. No<br />

entanto, o Estado, em suas várias esferas, deve definir políticas setoriais<br />

que tenham influência na atividade turística. No caso estudado, percebeuse<br />

que o Estado não vem dispensando o apoio infra-estrutural necessário,<br />

para que a região integre suas diferentes atividades e se consolide como<br />

um espaço rural com atratividade turística. Para que isso se concretize,<br />

exige-se a tomada de consciência de que o desenvolvimento das zonas rurais<br />

deve ser concebido no âmbito global, integrando as dimensões econômicas,<br />

sociais e culturais e, por fim, no reconhecimento de que esse desenvolvimento<br />

se apóia nas pessoas e em comunidades rurais dinâmicas.<br />

O turismo, diferente de outros setores, caracteriza-se pelo deslocamento<br />

do mercado até o produto. Para que ocorra um consumo efetivo<br />

do produto turístico, o turista terá de se deslocar até a estrutura que o<br />

suporta: o destino turístico. Não é possível dissociar uma abordagem do<br />

produto em turismo do destino turístico. Aliás, esse elemento favorece o<br />

desenvolvimento das estratégias de posicionamento, ambiental e de configuração<br />

para a região central da atividade turística.<br />

Por fim, o confronto com características específicas dessa atividade,<br />

que se identificam de uma forma geral em todas as regiões, objetiva:<br />

a) que seja possível a transformação de recursos locais em riqueza;<br />

b) que a comunidade local conceba o turismo como atividade econômica;<br />

c) que se estimule a criação de infra-estruturas locais.<br />

77<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 59-79, 2007.


78 Estratégias de Desenvolvimento Local ...<br />

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79<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 59-79, 2007.


80 O Novo Clima no Paraná<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 81-105, 2007.


Mozart Nogarolli<br />

O NOVO CLIMA<br />

DO PARANÁ<br />

MOZART NOGAROLLI<br />

___________________________________________________________<br />

81<br />

Mestre em Geografia pela UFPR,<br />

Especialista em Análise Ambiental pela UFPR<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 81-105, 2007.


82 O Novo Clima no Paraná<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 81-105, 2007.


Mozart Nogarolli<br />

RESUMO<br />

Este artigo propõe a análise e a identificação das alterações registradas<br />

no clima paranaense, no período em questão. As mudanças climáticas<br />

observadas são decorrentes de fatores endógenos e exógenos. Internamente,<br />

desde o século XIX, o Paraná teve transformada sua paisagem<br />

principalmente pela expansão agrícola, industrialização e urbanização.<br />

Externamente, foram os fatores associados a elementos de ordem planetária,<br />

tais como, o aquecimento global e os eventos de El Niño e La Niña,<br />

ODP, entre outros, que contribuíram para essas alterações. Na pesquisa,<br />

procurou-se identificar e mapear a evolução do clima paranaense, assim<br />

como correlacionar os resultados obtidos com as questões vinculadas às<br />

mudanças climáticas globais.<br />

Palavras-chave: clima, classificação climática, aquecimento global, evolução<br />

climática, Paraná.<br />

ABSTRACT<br />

The article proposes the analysis and identification of the alterations<br />

recorded in Paraná climate in the period in question. The climatic changes<br />

observed are the result of internal and external factors. Internally, since the<br />

XIX century, Paraná has been transforming it’s mainly landscapes by the<br />

agricultural expansion, industrialization and urban growth. Externally the<br />

factors have been associating with the elements of planetary order, such<br />

as, the Global Warming and the events of El Niño and La Niña, PDO, among<br />

others, that have contributed for these alterations. In this research, they<br />

have identified and mapped the evolution of Paraná climate, as well the<br />

correlation between the results obtained with the questions linked to the<br />

global climatic changes.<br />

Keywords: climate, climatic classification, global warming, climatic<br />

evolution, Parana.<br />

83<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 81-105, 2007.


84 O Novo Clima no Paraná<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 81-105, 2007.


Mozart Nogarolli<br />

1 INTRODUÇÃO<br />

O clima em sua complexidade sempre sofreu alterações, algumas<br />

cíclicas outras não. O que ora se observa é uma aceleração na alteração<br />

induzida pelas atividades antrópicas. O que se busca nesta pesquisa é<br />

identificar as alterações sofridas no clima do Paraná, nas últimas três décadas<br />

do século XX. A necessidade de compreensão dos fatores climáticos,<br />

desde muito cedo, despertou na sociedade o interesse em estudálos.<br />

Não é novidade a influência dos fatores climáticos sobre a vida. Segundo<br />

J. O. Ayoade (1996, p. 5): “O ar que se respira, o alimento e a água<br />

ingeridos, todos são influenciados pelo tempo meteorológico; até mesmo<br />

a maneira como se vive, o vestuário e a forma das habitações.” Ou seja, o<br />

clima contribui decisivamente sobre alterações físicas na superfície da<br />

Terra e na economia em geral, seja na agropecuária, na indústria, na produção<br />

de energia ou na guerra.<br />

O clima serve de incentivo às migrações. Povos procuram fugir de<br />

regiões de grandes secas ou de invernos inclementes buscando melhores<br />

condições para cultivo e sobrevivência. Como exemplo, podem ser<br />

mencionadas as migrações de povos asiáticos para a Europa, no início da<br />

era cristã até o século XIV e XV, que saíram em busca de áreas menos<br />

frias e mais férteis (CONTI, 1998a, p. 29).<br />

O fato do não-conhecimento do território e o clima contribuíram<br />

para impedimento do avanço do exército mongol em agosto de 1281. Havia<br />

a pretensão da tomada do Japão, contudo os soldados mongóis eram<br />

hábeis na batalha terrestre. Partiram em embarcações à vela com destino<br />

às ilhas japonesas e foram advertidos pelos chineses, os quais já haviam<br />

capitulado ante aos mongóis, das dificuldades de navegação no estreito<br />

japonês, em época de tufão. Na atualidade, mesmo com o grande aparato<br />

técnico e científico de que se dispõe, ainda não se pode prever a intensidade<br />

dos fenômenos climáticos, muito menos controlá-los, como é caso<br />

do furacão Katrina, que em outubro de 2005, na Louisiana, sul dos Estados<br />

Unidos, devastou a cidade de Nova Orleans.<br />

A conjuntura atual é marcada por contradições e desigualdades<br />

socioeconômico-ambientais amplas e complexas. Na globalização, a rapidez<br />

com que as informações circulam tem levado o mundo a se tornar<br />

cada vez menor, prevalecendo a idéia de que se vive num mundo único.<br />

Antes, o que não estava ao alcance dos olhares humanos não era percebido,<br />

quando não havia interesse, ou melhor, era desconhecido ou<br />

desconsiderado. Os focos de poluição e degradação podiam estar próxi-<br />

85<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 81-105, 2007.


86 O Novo Clima no Paraná<br />

mos, mas não se percebia; pensava-se de acordo com a falsa idéia de<br />

que “a poluição dele não pode me atingir”.<br />

As rápidas mudanças econômicas e sociais ocorridas no século<br />

XX podem ter afetado ou potencializado as mudanças no ambiente<br />

paranaense. As causas são várias: da redução do manto vegetal à substituição<br />

pela agricultura, urbanização e construção de usinas hidroelétricas,<br />

etc. O Paraná tem núcleos urbanos importantes, além de Curitiba: Londrina,<br />

Maringá, Ponta Grossa, Cascavel, entre outras cidades. A urbanização<br />

altera as condições climáticas locais pela interferência que promove.<br />

Do atendimento às necessidades e anseios da sociedade estabelecida<br />

decorre a necessidade da produção de bens de consumos, sejam alimentos,<br />

bem duráveis ou serviços. Essas são emergentes e crescentes<br />

e estimulam a expansão da agricultura e industrialização, que associada<br />

à premissa da produção de excedentes visando ao comércio com outras<br />

unidades da Federação ou exportação se constitui num ciclo contínuo de<br />

causa e efeito.<br />

O crescimento da população, da indústria, dos serviços e da agricultura<br />

exige energia para sua manutenção. A mais utilizada é a oriunda de<br />

combustíveis fósseis, como o petróleo e o carvão, que são altamente<br />

poluidores por lançarem carbono na atmosfera pela sua queima. Outra<br />

forma de energia, menos poluidora, é a hidrelétrica, porém, em relação ao<br />

clima, altera o albedo da superfície pela redução da vegetação e formação<br />

de espelhos d’água. O Paraná é um dos maiores produtores de energia<br />

hidrelétrica do País, e, para isso, construíram-se lagos artificiais, principalmente<br />

nos rios Iguaçu, Paraná e Paranapanema.<br />

O clima, enquanto elemento desse sistema ambiental constituído,<br />

no Paraná vem sofrendo interferências causadas pelas atividades<br />

antrópicas locais e globais. O clima realimenta o sistema promovendo<br />

alterações no ambiente e forçando novas interações nos meios de produção<br />

agrícola, por exemplo.<br />

Nas discussões das causas das mudanças climáticas globais, algumas<br />

já são conhecidas, como o acréscimo de gases de efeito na atmosfera,<br />

entre eles o gás carbônico, originado da queima de combustíveis<br />

fósseis, e o metano, produzido em agricultura irrigada, pela pecuária<br />

e nos centros urbanos por aterros sanitários. Esse acréscimo impede o<br />

retorno da radiação infravermelha refletida pela superfície terrestre, que<br />

fica aprisionada na baixa atmosfera, ocasionando a elevação na temperatura.<br />

A esse bloqueio da radiação dá-se o nome de efeito estufa, que antes<br />

de tudo é uma condição natural do planeta, servindo de regulador da temperatura<br />

e permitindo a existência de vida como se conhece.<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 81-105, 2007.


Mozart Nogarolli<br />

Esta pesquisa tem como elemento principal de estudo as variações<br />

climáticas ocorridas no Estado do Paraná e a base de dados<br />

meteorológicos fornecidos por 25 estações meteorológicas pertencentes<br />

ao INMET e ao Simepar/Iapar. As estações escolhidas estão espacialmente<br />

distribuídas por todo o Paraná. A série temporal escolhida para a análise<br />

compreende o período 1970-1999. Para seleção das estações<br />

meteorológicas, empregou-se como norma um período mínimo de 25 anos<br />

de levantamento e registro de dados meteorológicos.<br />

Os elementos climáticos envolvidos nessa análise são as temperaturas<br />

(mínima, máxima e média), a umidade relativa e a precipitação. A<br />

temperatura é a quantidade de calor que existe no ar. Como precipitação<br />

se entende a quantidade de chuva que cai num determinado lugar e num<br />

determinado tempo. Consideram-se precipitação todas as formas de água,<br />

líquida ou sólida, que caem das nuvens alcançando o solo: garoa, chuva,<br />

granizo, partículas de neve.<br />

O tratamento estatístico foi realizado no software Microsoft Excel,<br />

para o qual foi convertido o banco de dados, originalmente em arquivo de<br />

texto. Concluída a etapa da manipulação do banco de dados, passou-se à<br />

sua interpretação. A análise do banco de dados foi feita por meio de planilhas<br />

e gráficos e de um SIG. Mapeando-se o índice de evolução, geraram-se<br />

mapas de isolinhas para cada variável, o que resultou na identificação das<br />

alterações ocorridas e na elaboração de um mapa síntese da variabilidade<br />

climática no período estudado.<br />

2 CLIMA DO ESTADO DO PARANÁ<br />

O clima paranaense insere-se no domínio climático do Brasil meridional.<br />

Está disposto entre 20º e 32º latitude sul, que, para C. A. Monteiro<br />

(1963, p. 117),<br />

87<br />

[...] é a porção do território brasileiro compreendido nos domínios<br />

da zona extratropical. Não se espere, entretanto, por obra do fator<br />

latitude, a ocorrência de climas temperados típicos, já que outros<br />

fatores geográficos no continente sul-americano lhe conferem,<br />

antes, um caráter nitidamente subtropical.<br />

O Paraná, pelas características de sua paisagem e sendo atravessado<br />

no norte pelo Trópico de Capricórnio, apresenta-se em uma zona<br />

de transição do clima subtropical para o tropical, possibilitando um universo<br />

de estudos muito amplo. Reinhardt Maack (1968, p. 93) buscou identi-<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 81-105, 2007.


88 O Novo Clima no Paraná<br />

ficar essa diversidade climática por dois transectos: o primeiro no sentido<br />

norte-sul e o segundo no sentido leste-oeste. Em ambos observou que<br />

“[...] cortam zonas tropicais úmidas e zonas subtropicais, assim como<br />

regiões de clima quente a temperado com geadas periódicas.”<br />

O inverno está associado à estação fria, mas não como estação<br />

das chuvas, como ocorre na Região Norte do País. Os verões quentes<br />

são amenizados pela altitude nas regiões de planaltos. As chuvas são<br />

bem distribuídas durante o ano, porém com maior concentração nos meses<br />

estivais.<br />

O Estado do Paraná, mesmo em posição meridional, é afetado<br />

pelas massas de ar quentes vindas da Amazônia e fortemente atingido<br />

pelas massas polares frias e secas vidas do sul, o que confere uma situação<br />

propícia para a ocorrência de frontogênses.<br />

Quatro sistemas atmosféricos atuam na Região Sul do Brasil. Esses<br />

sistemas que caracterizam o clima são formados pelas massas de<br />

ar em sua ciclicidade e suas interações com os elementos geográficos.<br />

As massas de ar que atingem o Estado são a massa polar atlântica (MPa),<br />

que se desloca de sul a norte, se origina no anticiclone migratório polar e é<br />

fria e seca; a massa tropical atlântica (MTa), quente, úmida e se movimenta<br />

do Atlântico para o continente; massa equatorial continental (Mec), que<br />

se origina no anticiclone da Amazônia, é quente, úmida e se desloca no<br />

sentido norte-sul; massa tropical continental (MTc), quente, seca e tem<br />

origem na depressão do Chaco, no Paraguai (MENDONÇA, 2000, p. 27).<br />

O clima do Estado, pela visão empírica, era descrito como temperado<br />

e saudável por A. Saint-Hilaire (1995, p. 16) e Lacerda (1915, p 476).<br />

A. Saint-Hilaire ainda acrescenta que o clima da região tem inverno rigoroso<br />

e com chuvas concentradas no verão, sem período de secas prolongadas.<br />

Complementando, R. Avé-Lallemant (1995, p. 22) afirma que “[...] a<br />

umidade é atormentadora.”<br />

A diferenciação climática de certa maneira influenciou as imigrações,<br />

pois o clima do planalto, sendo “zona temperada doce”, é o que<br />

mais se assemelha ao clima europeu (MARTINS, 1989 p. 19). Assim o<br />

clima componente da paisagem pode ter influenciado a formação da “civilização<br />

paranaense”. W. Martins (1989, p. 20), sobre esse assunto ainda<br />

observa que:<br />

[...] é suficiente conviver com um paranaense típico para verificar<br />

que se trata do contrário do homem expansivo, amante de gestos<br />

escandalosos ou das atitudes coloridas, as expansões comunicativas<br />

ou dos entusiasmos fáceis. São traços de psicologia inegavelmente<br />

influenciados pela paisagem [...]<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 81-105, 2007.


Mozart Nogarolli<br />

Sobre o clima do Estado, visto sob óticas diversas, sejam elas as<br />

dos desbravadores ou exploradores ou ainda aquelas com olhar científico,<br />

com base na climatologia ou na historiografia, o que se tem é uma região<br />

de climas variados. O mesmo clima que condicionou a formação da paisagem<br />

original também foi importante na história da ocupação e mudança<br />

desse território, que sofre retroação dessas mudanças, ou seja, o clima<br />

faz parte de um sistema complexo no qual ocorrem interações dos elementos<br />

constituintes, sejam eles o relevo, a vegetação, a urbanização, a<br />

agricultura, etc. As condições de habitabilidade do ambiente, em função<br />

da evolução climática, podem obrigar a população a uma adaptação na<br />

agricultura, na indústria ou no turismo ou ainda nos hábitos culturais com<br />

invernos menos frios, por exemplo.<br />

Vive-se um Paraná climaticamente diferente daquele dos tempos<br />

dos exploradores dos séculos XVIII e XIX e diferente daquele de Reinhardt<br />

Maack. Comprovadamente, observam-se médias térmicas mais altas. As<br />

certezas de hoje podem apenas representar o fim de um ciclo como prevê<br />

L. C. B. Molion (2006), segundo esse autor se caminha para uma fase de<br />

resfriamento, que, se confirmada, pode provocar a volta das geadas freqüentes,<br />

principalmente no Sudoeste, Sul e na região de Curitiba. São<br />

velhas incertezas e novas conjecturas que (re)tornam à pauta. Todavia,<br />

só se podem buscar alternativas para solução de tais questionamentos a<br />

partir do momento em que se conhece o histórico dos registros climáticos<br />

e sua evolução.<br />

3 ANÁLISE DOS ELEMENTOS CLIMÁTICOS: EVOLUÇÃO CLIMÁTICA<br />

3.1 EVOLUÇÃO DAS TEMPERATURAS DO AR NO PARANÁ<br />

A temperatura é uma das variáveis meteorológicas mais diretamente<br />

afetadas pela ação do homem. A produção de dióxido de carbono<br />

gerada pela queima de combustíveis fósseis (basicamente petróleo e carvão)<br />

e a de metano, que é produzido por agricultura irrigada, promovem o<br />

que se conhece como efeito estufa.<br />

Nas discussões internacionais que tratam do aquecimento global<br />

é considerada principalmente a evolução da temperatura média. Na análise<br />

aqui proposta, optou-se por agregar a temperatura mínima e a máxima.<br />

Pretende-se assim a ampliação do conjunto de interpretação. Isso só foi<br />

possível pelo recorte espacial reduzido (Estado do Paraná), quando comparado<br />

à escala zonal ou global.<br />

89<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 81-105, 2007.


90 O Novo Clima no Paraná<br />

De início, percebe-se a importância da inclusão das temperaturas<br />

mínimas e máximas observando-se a tabela 1, onde se verifica a elevação<br />

ocorrida em níveis diferenciados entre as Tmin, Tmed e Tmax. Nele<br />

são apresentadas as médias históricas das temperaturas registradas para<br />

o Estado do Paraná e os níveis de sua evolução, aqui denominados grau<br />

de evolução.<br />

TABELA 1 - ESTADO DO PARANÁ: EVOLUÇÃO DAS TEMPERATURAS<br />

TEMPERATURA<br />

MÉDIA (ºC)<br />

mínima<br />

média<br />

máxima<br />

FONTE: Simepar, Iapar e INMET.<br />

MÉDIA HISTÓRICA (ºC)<br />

(1970 - 1999)<br />

15,44<br />

19,88<br />

26,10<br />

No quadro, tem-se claramente que a temperatura média mínima<br />

foi a que apresentou a maior alteração em sua evolução, registrando um<br />

acréscimo de 0,278ºC no período de 1970 a 1999. A temperatura máxima<br />

evolui positivamente em apenas 0,039ºC.<br />

3.1.1 Evolução da Temperatura Mínima<br />

Neste tópico, procurar-se-á tratar da temperatura mínima de maneira<br />

individualizada, buscando-se identificar sua evolução no contexto<br />

paranaense, no período em questão.<br />

No Paraná, a temperatura mínima, média e máxima é caracterizada<br />

pela forte influência do relevo. Nas regiões de menor altitude, a média<br />

da temperatura mínima fica entre 16 e 17ºC. Já nas regiões de maiores<br />

altitudes, são registradas as menores mínimas do Estado, ou seja, no<br />

Primeiro Planalto e na região dos Campos Gerais, a mínima permanece<br />

entre 12 e 14ºC. No litoral, Sudoeste (extremo), Norte e Noroeste, as médias<br />

das mínimas registradas ultrapassam os 16ºC.<br />

O maior número de estações com baixa alteração situa-se no Oeste<br />

e no Sudoeste do Estado. Isso ocorre em Palotina, Cascavel, Quedas do<br />

Iguaçu, Planalto e Clevelândia. No Noroeste e no Norte, três estações apresentaram<br />

pequena evolução: Paranavaí, Cianorte e Apucarana. Grande<br />

parte do Noroeste, do Norte e do Centro apresentou elevação na Tmin de<br />

0,2 a 0,4ºC. No entanto, as maiores elevações ocorreram no Leste, do<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 81-105, 2007.<br />

GRAU DE EVOLUÇÃO<br />

(ºC)<br />

0,278<br />

0,180<br />

0,039


Mozart Nogarolli<br />

litoral ao Segundo Planalto e na região metropolitana de Curitiba. Identificou-se<br />

como uma ilha de baixa elevação a estação de Cerro Azul, diferentemente<br />

do padrão da região em que se encontra.<br />

3.1.2 Evolução da Temperatura Média<br />

A temperatura média (Tmed) é parâmetro de acompanhamento<br />

internacional do aquecimento global. Todas as análises efetuadas sobre<br />

esse assunto tomam por base a Tmed. As temperaturas médias no Estado<br />

do Paraná ficam entre 16 e 22ºC, com os menores valores registrados<br />

no Sul do Estado. Nas regiões Norte, Oeste e no litoral são registradas as<br />

maiores médias de temperatura média.<br />

A temperatura mais alterada no Paraná foi a mínima; a menos alterada,<br />

a temperatura máxima. Como a Tmed representa a média das temperaturas<br />

registradas durante o dia, logicamente seu valor se situa entre a<br />

máxima e a mínima. Em relação à evolução térmica entre 1970 e 1999, no<br />

Paraná essa afirmação também é verdadeira.<br />

Em relação ao planeta, não há como se correlacionar, por causa<br />

das temporalidades diversas da análise global. Todavia, a elevação, no<br />

século XX, da Tmed no mundo é em torno de 0,92ºC 1 , apontada pelo<br />

Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC) como a maior elevação<br />

observada a partir da década de 40. No período de 1970 a 1999, a<br />

temperatura média do planeta elevou-se em aproximadamente 0,6ºC, valor<br />

superior ao apresentado pela Tmed no Paraná, 0,18ºC, no mesmo período.<br />

A diferença pode ser justificada pela posição geográfica do Estado,<br />

localizado no Hemisfério Meridional, no qual as elevações foram menores<br />

do que no Setentrional, segundo dados do IPCC.<br />

Nesse mesmo estudo, o IPCC aponta diferenças entre as áreas<br />

rurais e urbanas nos índices de elevação da Tmed. No comparativo, concluiu-se<br />

que as ilhas de calor têm efeito apenas em áreas urbanas, mas<br />

não são representativas no contexto global 2 . O Paraná apresentou evolu-<br />

1 INTERGOVERNMENTAL PANEL ON CLIMATE CHANGE (IPCC). Disponível em: . Acesso em: 2 dez. 2006.<br />

2 Estudo realizado pelo IPCC, a partir de 1979, utilizando-se observações de balões<br />

atmosféricos e satélites. Os dados coletados demonstraram que as ilhas de calor<br />

representam pouco em relação ao aquecimento global. Considerando-se apenas as<br />

áreas urbanas, o estudo identificou um incremento térmico de apenas 0,12ºC, em<br />

todo o século XX, enquanto no geral as temperaturas sofreram elevação de 0,65ºC.<br />

91<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 81-105, 2007.


92 O Novo Clima no Paraná<br />

ção de 0,18ºC, inferior à média global de 0,6ºC no mesmo período. O maior<br />

aumento Tmed ocorreu em Pinhais (0,335ºC), enquanto em Planalto podese<br />

considerar sem alteração, visto ter sofrido uma redução na Tmed no<br />

período em -0,002ºC. O gradiente de alteração da temperatura mínima<br />

registrada entre a maior elevação e a menor é de 0,337 de grau.<br />

Com relação à urbanização se confirma a hipótese apresentada<br />

pelo IPCC: o ambiente urbano tem pouco peso sobre o aquecimento como<br />

um todo. Curitiba que possui índice de urbanização do território de 100%,<br />

segundo o Ipardes (2006), sofreu elevação de 0,291ºC no período de 1970<br />

a 1999. Ainda sobre Curitiba, vale ressaltar que, para Tmin, teve a maior<br />

elevação, porém agora quando se trata da Tmed ficou em terceiro lugar,<br />

perdendo para Pinhais (0,335ºC) e Bela Vista do Paraíso (0,292ºC), onde<br />

ocorreram as maiores elevações sobre a média histórica.<br />

3.1.3 Evolução da Temperatura Máxima<br />

A temperatura máxima, entre as temperaturas, foi a que sofreu a<br />

menor alteração. Na maioria das estações meteorológicas analisadas, a<br />

elevação foi de centésimos de graus Celsius ou ainda apresentaram redução<br />

(evolução negativa) da média histórica. As reduções nas Tmax ocorreram<br />

nas estações de Paranaguá, Morretes, Curitiba, Ponta Grossa, Joaquim<br />

Távora, Planalto, Campo Mourão e Londrina. Três grandes centros<br />

urbanos, incluindo a capital do Estado apresentaram diminuição na média<br />

histórica: Curitiba, Londrina e Ponta Grossa.<br />

Quando se trata de alterações na Tmax relativas às áreas mais<br />

urbanizadas do Estado, foi identificada tendência à alteração menor de<br />

Tmax em grandes centros urbanos. Todavia, a classe de alteração com<br />

maior representatividade é de 0,0ºC a 0,1ºC, e doze estações<br />

meteorológicas estão nesse grupo. Uma das hipóteses poderia ser inconsistência<br />

na base de dados, mas não se identificou no conjunto de dados<br />

dessa estação meteorológica distorção como a apresentada pela de<br />

Curitiba para o ano de 1989, por exemplo.<br />

Para representar a evolução da Tmax entre 1970 e 1999, optou-se<br />

pela inserção de gráfico de apenas uma estação meteorológica, como já<br />

feito para as Tmin e Tmed. As demais se encontram em anexo. Quanto à<br />

maior alteração ocorrida na temperatura mínima, com relação ao aquecimento<br />

global, as evidências se confirmam a partir do comparativo entre a<br />

evolução das três temperaturas.<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 81-105, 2007.


Mozart Nogarolli<br />

3.2 EVOLUÇÕES DA PRECIPITAÇÃO<br />

O regime pluviométrico do Paraná é caracterizado por uma boa<br />

distribuição de chuvas durante o ano, com maior concentração nos meses<br />

de verão, tendo o período mais seco nos meses de inverno. O Estado<br />

apresenta os maiores volumes pluviométricos no litoral e na porção sudoeste.<br />

Na capital, a média histórica anual registrada é de 1.543 mm/ano.<br />

Paranaguá com 2.189 mm/ano é, das estações analisadas, a de maior volume<br />

registrado; Cerro Azul, a de menor volume, ou seja, 1.354 mm/ano.<br />

Seguindo-se em direção a Cascavel, as médias históricas se elevam,<br />

de tal modo a levar o Sudoeste do Paraná a apresentar os maiores<br />

índices pluviométricos anuais. Nessa região, nos municípios de Francisco<br />

Beltrão, Clevelândia, Quedas do Iguaçu e Laranjeiras, a média histórica<br />

ultrapassa os 2.000 mm/ano. O Norte do Estado tem volume precipitado<br />

na média menor que o Sudoeste, sendo o volume anual entre 1.500 e<br />

1.600 mm/ano. O comportamento da precipitação no período de 1970 a<br />

1999 está exemplificado no gráfico 6, que representa a estação de Curitiba;<br />

nele não são perceptíveis os ciclos como observados na evolução térmica.<br />

Contudo, na precipitação, tomando-se os valores registrados, configura-se<br />

um padrão de distribuição do volume de chuvas coincidentes com<br />

os picos de ENOS em sua fase quente, El Niño.<br />

A análise envolvendo as vinte e cinco estações meteorológicas,<br />

buscando-se identificar evolução da precipitação, apontou alterações diferenciadas<br />

– algumas com evolução positiva dos volumes precipitados e<br />

em outras, evolução negativa. A evolução da precipitação na região compreendida<br />

pelo vale do Rio Iguaçu registrou elevação. No Norte, identificou-se<br />

uma grande extensão do território paranaense no qual ocorreu redução<br />

no volume de chuvas, entre 1970 e 1999, desde Joaquim Távora até<br />

Cianorte. A região com os resultados mais críticos é a localizada entre os<br />

rios Tibagi e Ivaí. Em Londrina, Apucarana. Cianorte e Paranavaí ocorreram<br />

redução de mais de 50 mm ano. Não são valores significativos, quando<br />

comparados ao volume total anual de chuvas, porém a redução de chuvas<br />

em longo prazo, além da persistência dessa tendência, pode alterar as culturas<br />

desenvolvidas na região, como a soja, o algodão e o café.<br />

Já em todo o Sul do Estado, incluído o litoral e a costa oeste, observou-se<br />

elevação nos níveis pluviométricos, desde Paranaguá até Cascavel<br />

e Palotina. Essa região está basicamente compreendida pelo vale<br />

do Rio Iguaçu, no qual foram construídas hidrelétricas que ampliaram as<br />

áreas com espelho de água. Os lagos artificiais alteram os índices de<br />

evaporação, facilitando a formação de nuvens e o conseqüente aumento<br />

93<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 81-105, 2007.


94 O Novo Clima no Paraná<br />

das chuvas. No trecho do Rio Iguaçu abaixo de Cruz Machado, existem<br />

seis usinas hidrelétricas: Foz do Areia, Salto Segredo, Foz do Rio Jordão,<br />

Salto Santiago, Salto Osório e Salto Caxias. No Rio Paraná, há o grande<br />

lago da hidreelétrica de Itaipu.<br />

As estações de Laranjeiras do Sul e Francisco Beltrão apresentaram<br />

a maior elevação na média histórica. Na primeira, a elevação sobre a<br />

média histórica foi de 184,159mm, já na segunda estação o aumento foi<br />

de 179,314mm. É passível de afirmação o fato de que a variável precipitação<br />

sofreu alteração. Nos locais onde o volume de chuvas já é maior no<br />

acumulado ano, a tendência aponta para elevação na média. No Norte do<br />

Estado onde são registrados os menores índices, há uma tendência a<br />

chover menos. Esses elementos apresentados refletem diretamente sobre<br />

o meio social dessas regiões, ainda que de modo diferenciado.<br />

4 ANÁLISE SAZONAL<br />

Na proposição inicial, que motivou o desenvolvimento desta pesquisa, uma<br />

das questões levantadas foi: as estações do ano tiveram evolução diferenciada?<br />

Pois bem, neste capítulo desenvolvem-se as análises que eliminarão<br />

essa dúvida. No item sobre o método, tratou-se das estações do<br />

ano com a seguinte configuração:<br />

a) verão – janeiro, fevereiro, março;<br />

b) outono – abril, maio, junho;<br />

c) inverno – julho, agosto, setembro;<br />

d) primavera – outubro, novembro e dezembro.<br />

4.1 ANÁLISES SAZONAIS DAS TEMPERATURAS<br />

A representação da evolução da variável temperatura por estação<br />

do ano, para o Paraná, está presente no gráfico 1; quanto mais ao centro<br />

menor a elevação. No gráfico da temperatura mínima o centro representa<br />

0,10 graus Celsius; quanto mais externo o anel maior a elevação.<br />

A temperatura mínima foi a que sofreu a maior elevação. Do mesmo<br />

modo, a temperatura máxima registrou as menores elevações. Com<br />

relação às estações do ano, observa-se que a primavera e o outono mais<br />

se alteraram. O verão e o inverno foram as estações menos alteradas.<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 81-105, 2007.


Mozart Nogarolli<br />

GRÁFICO 1 - ESTADO DO PARANÁ: EVOLUÇÃO DAS<br />

TEMPERATURAS POR ESTAÇÃO DO ANO<br />

FONTE: Simepar e Iapar.<br />

No Paraná, a primavera teve a maior elevação, na Tmin 0,38ºC e<br />

na Tmax 0,26ºC. Os menores índices de elevação estão no verão. Nele a<br />

mínima elevou-se em 0,18ºC, e a máxima sofreu redução de -0,07ºC nas<br />

médias históricas. No inverno, a Tmin elevou-se em 0,23 ºC, um pouco<br />

acima do verão, porém menor que o outono e o inverno. Essas elevações<br />

das temperaturas no inverno, associadas às mudanças ocorridas na primavera<br />

e no outono, apontam para uma redução no período de dias daquela<br />

estação, bem como na intensidade dos dias frios. Isso ignifica, na<br />

prática, que o calor se inicia muito antes do verão oficial e se prolonga<br />

para além desse período. Tal fato aponta para tendência de antecipação e<br />

prorrogação do período mais quente do ano.<br />

95<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 81-105, 2007.


96 O Novo Clima no Paraná<br />

Em relação às estações meteorológicas, especificamente observa-se<br />

evolução em níveis diferenciados acerca das temperaturas mínimas.<br />

Todavia, o padrão predominante é da primavera com maior elevação.<br />

Das 25 estações meteorológicas, 23 apresentaram maior alteração<br />

na Tmin na primavera, uma no outono e uma no inverno. Ou seja, do conjunto<br />

total de estações 92% tiveram acréscimo na temperatura mínima na<br />

primavera, o que representa a grande maioria. Pode-se considerar exceção<br />

Joaquim Távora, a única na pesquisa a ter a maior elevação no outono<br />

(0,62ºC); no verão, 0,54ºC, e a primavera com menor alteração (0,29ºC).<br />

Essa variação ocorrida no verão é a maior de todas as estações<br />

meteorológicas analisadas.<br />

Com relação à temperatura média, apenas duas estações não apresentaram<br />

maiores elevações na primavera: Bela Vista do Paraíso, que<br />

registrou maior elevação (0,43ºC) no inverno, e Guarapuava (0,24ºC) no<br />

outono. As demais 23 estações tiveram maior aumento de temperatura<br />

média na primavera. A temperatura média é parâmetro para as discussões<br />

de aquecimento global, entretanto, no caso específico do Paraná,<br />

ela representa mais as alterações registradas pela temperatura máxima e<br />

pela mínima.<br />

Na corrente pesquisa, identificou-se que o maior aumento ocorreu<br />

na primavera de Pinhais (0,59ºC), o segundo maior aumento foi em<br />

Fernandes Pinheiro (0,48ºC), também na primavera. Londrina, em relação<br />

à temperatura média, teve a maior evolução negativa (-0,42ºC) registrada<br />

no outono. A temperatura máxima teve a maior alteração na primavera<br />

de Cascavel (0,63ºC), seguida por Cianorte (0,48ºC). Da análise do<br />

conjunto de estações, observa-se que, em relação à temperatura máxima,<br />

23 estações sofreram maior elevação na primavera, apenas quatro<br />

no inverno e uma no verão.<br />

Ainda cabe ressaltar que em oito estações, Joaquim Távora, Laranjeiras<br />

do Sul, Morretes, Paranaguá, Ponta Grossa e Umuarama, somente<br />

na primavera houve elevação na temperatura máxima, no outono,<br />

primavera e verão ocorreu redução da temperatura máxima. A temperatura<br />

mínima é a mais alterada em sua média histórica. Tanto na temperatura<br />

mínima, como na média ou na máxima, há uma maior concentração de<br />

estações meteorológicas com elevação na primavera. A identificação da<br />

primavera como período do ano com maiores níveis de alteração na temperatura<br />

confirma o senso comum de que o verão está mais longo.<br />

Em realidade, a elevação das temperaturas na primavera favorece<br />

essa interpretação. A primavera como estação de transição do período mais<br />

frio ao mais quente do ano, em teoria, deveria transcorrer como uma mes-<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 81-105, 2007.


Mozart Nogarolli<br />

cla das estações do inverno e do verão. Com a elevação da média da temperatura<br />

mínima em 0,38ºC e a máxima em 0,26ºC, os períodos mais frios<br />

na primavera foram reduzidos; a sensação é que o verão se antecipa.<br />

Com relação ao outono, ocorre o mesmo fato. Sendo a segunda<br />

estação do ano em nível de alteração da temperatura mínima (0,30ºC), propicia<br />

um alongamento do calor, ou seja, a sensação de que o verão está<br />

mais longo, muito embora, em relação à temperatura máxima, o outono<br />

tenha registrado no geral redução sobre a média histórica de -0,14ºC, significando<br />

uma redução no gradiente térmico entre as duas temperaturas.<br />

O verão sofreu as menores elevações das temperaturas, provavelmente<br />

justificadas pela maior concentração de chuvas nessa estação,<br />

quando os dias nublados limitam o aumento na temperatura. A temperatura<br />

mínima elevou-se em 0,18ºC, e a máxima reduziu-se na média histórica<br />

em -0,07ºC. Ocorreu a redução do gradiente entre as temperaturas, e<br />

a tendência apontou para máximas menores no verão.<br />

O inverno está menos frio, pois sofreu elevação em todas as temperaturas.<br />

A temperatura mínima ficou em 0,21ºC, a média em 0,18ºC e a<br />

máxima em 0,12ºC, na média histórica<br />

Sobre a evolução sazonal das temperaturas cabe reafirmar algumas<br />

respostas obtidas na análise dos dados. A primeira é que a primavera<br />

sofreu a maior alteração, seguida do outono; o verão, no contexto geral, a<br />

menor. No verão registrou-se redução da temperatura máxima e em ampla<br />

maioria das estações (24 de 25). Isso representa que há dias menos<br />

quentes nessa estação e que, no conjunto, quais sejam a elevação das<br />

temperaturas na primavera e no outono e a redução no verão, há uma<br />

expansão do período estival e uma diminuição do período hibernal. Outro<br />

ponto de destaque é a redução do gradiente térmico entre a mínima e a<br />

máxima, principalmente no verão e no outono.<br />

4.2 EVOLUÇÕES SAZONAIS DA PRECIPITAÇÃO<br />

A precipitação no Estado do Paraná se caracteriza por apresentar<br />

período mais chuvoso no verão e menos chuvoso no inverno. Quando se<br />

analisa o desenvolvimento do volumes precipitados no período desta pesquisa,<br />

correlacionado-os às estações do ano, observa-se que há um aumento<br />

na média histórica.<br />

No outono, encontraram-se os maiores índices de elevação. Na<br />

estação de Cascavel, o aumento da precipitação no outono foi de 96,25<br />

mm; em Francisco Beltrão; 89,46 mm; em Planalto, 77,32 mm. São esta-<br />

97<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 81-105, 2007.


98 O Novo Clima no Paraná<br />

ções meteorológicas nas quais os volumes de chuvas já são maiores<br />

naturalmente. A precipitação no verão elevou-se em sete das 25 estações.<br />

Dando continuidade à análise, encontrou-se nível de redução da<br />

precipitação concentrado basicamente na primavera e inverno, nas estações<br />

meteorológicas localizadas no Norte e Noroeste paranaense. Cianorte<br />

é o município que sofreu a maior redução na média (-80,07 mm), na primavera.<br />

O inverno, que representa o período menos chuvoso do ano, sofreu<br />

as menores elevações. Somente em Cascavel, Palotina e Francisco Beltrão,<br />

o inverno teve algum destaque no aumento nesse elemento climático.<br />

As alterações na precipitação em volume não são significativas,<br />

embora as tendências não devam ser desprezadas.<br />

4.3 SÍNTESE da Evolução Climática do Paraná<br />

O Estado do Paraná insere-se contexto climático do Brasil meridional,<br />

sobre o qual Nimer (1979) afirma:<br />

[...] a região Sul do Brasil embora não seja das mais uniformes no<br />

que diz respeito aos valores e regimes térmicos o é, no entanto, no<br />

que se refere à pluviometria e ao ritmo estacional de seu regime<br />

(...) na região Sul há o domínio exclusivo e quase absoluto do clima<br />

mesotérmico do tipo temperado.<br />

Partindo-se da possibilidade da atualização da caracterização climática<br />

apontada por Vianello (2000), buscou-se verificar possíveis<br />

alterações no mapa climático do estado do Paraná. Para isto partiu-se<br />

da base de dados desta pesquisa e utilizando os critérios de<br />

Köppen produziu-se um novo mapa climático do estado do Paraná.<br />

Concluindo, o Paraná é caracterizado por três tipos climáticos.<br />

Cfa: no litoral, centro e oeste do Estado.<br />

Cfb: no Primeiro Planalto e na região dos Campos Gerais.<br />

Cwa: na porção setentrional do Estado abaixo do paralelo 24.<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 81-105, 2007.


Mozart Nogarolli<br />

Essa classificação aponta para áreas de tipos climáticos homogêneos,<br />

mas há que se considerar que no âmbito deste estudo se optou por<br />

estabelecer padrões para a escolha das estações, sempre visando ao<br />

objeto principal da pesquisa, ou seja, a evolução climática.<br />

O Cfb é o mais vulnerável, podendo, com a elevação das temperaturas,<br />

passar a ser um clima do tipo Cfa. Para isso, bastaria que a temperatura<br />

média do mês mais quente ultrapassasse 22ºC. Curitiba, Ponta<br />

Grossa e Fernandes Pinheiro são cidades onde bastaria um aumento inferior<br />

a 1ºC na temperatura média do mês mais quente, para que o clima<br />

fosse classificado como Cfa. Persistindo um aumento linear na média<br />

igual ao registrado entre 1970 e 1999, em Curitiba, no final do século XXI o<br />

clima provavelmente será do tipo Cfa, assim como em Fernandes Pinheiro<br />

e Ponta Grossa.<br />

Quanto ao clima tipo Cfa, pode-se afirmar que sofreu maiores alterações<br />

no Sul e no Oeste do Estado. As maiores alterações ocorreram<br />

em Laranjeiras do Sul e Francisco Beltrão, considerando-se a média<br />

porcentual de alteração das variáveis. Nesses municípios, a alteração das<br />

variáveis foi superior a 2%, o que se justificam basicamente pela elevação<br />

nos índices pluviométricos em mais de 150 mm e pela elevação na temperatura<br />

mínima. Ainda sobre o Cfa cabe justificar a evolução negativa<br />

sofrida nas estações de Apucarana, Campo Mourão e Cianorte. Nelas, a<br />

diminuição nos níveis de precipitação causou a redução no índice<br />

porcentual de alteração. A continuidade na redução da precipitação nesses<br />

municípios provocará a mudança no tipo climático para Cwa.<br />

O clima Cwa caracteriza-se por verões quentes e por ter, pelo<br />

menos em um mês, precipitação inferior a 60 mm, no inverno. Comparando-se<br />

aos demais tipos climáticos identificados no Estado, é o que apre-<br />

99<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 81-105, 2007.


100 O Novo Clima no Paraná<br />

senta período seco mais acentuado. Sua área abrange a porção setentrional<br />

do Paraná, basicamente acima do Trópico de Capricórnio. Dos tipos<br />

climáticos que caracterizam o clima do Estado é o de menor alteração<br />

identificada.<br />

As tendências perceptíveis com base nos resultados obtidos nesta<br />

pesquisa apontam para uma ampliação do clima Cwa no próximo século.<br />

Essa ampliação resulta das mudanças climáticas identificadas no<br />

Paraná. O clima Cwa deverá avançar em direção ao sul absorvendo a<br />

princípio Cianorte, Apucarana e Campo Mourão, onde predomina na atualidade<br />

o clima Cfa. O Cfa, que perderá espaço para o Cwa, avançará em<br />

direção ao sudeste sobre áreas de domínio do clima Cfb. Os resultados<br />

dessas alterações produzirão futuramente um novo mapa climático do<br />

Paraná.<br />

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS<br />

O clima do Paraná, objeto principal desta pesquisa, foi tratado pela<br />

análise sistêmica, visando identificar possíveis alterações registradas nas<br />

últimas três décadas do século XX. A pesquisa teve origem na dúvida de<br />

como o clima do Estado poderia ter sido afetado pelo aquecimento global.<br />

Partiu-se da identificação das tendências de evolução dos elementos climáticos,<br />

associando-os aos fatores de uso e ocupação do solo e a fatores<br />

de ordem global com os ENOS e ODP. Com isso, procurou-se identificar<br />

quais são as mudanças climáticas já apresentadas no clima do Estado.<br />

Algumas questões ficaram abertas a novas pesquisas, entre as<br />

quais podem ser mencionadas: a resposta diferenciada apresentada na<br />

análise dos elementos climáticos da estação meteorológica de Cascavel,<br />

que apontou para índices de alteração muito superiores às estações da<br />

região e a análise dos extremos climáticos e sua freqüência.<br />

Nesta pesquisa ficou evidente a necessidade de análise das temperaturas<br />

em seu conjunto, envolvendo a mínima, a média e a máxima. A<br />

análise somente da média pode causar distorções. Em Laranjeiras do<br />

Sul, a temperatura média ficou muito próxima a zero de evolução (0,073ºC),<br />

porém a mínima sofreu elevação de 0,249ºC. Tomando-se apenas a Tmed<br />

poder-se-ia induzir erroneamente que o clima de Laranjeiras do Sul não<br />

sofre nenhuma alteração. É nesse sentido que se reforça a importância<br />

em estudos climáticos de âmbito regional, pela extensão e volume de dados,<br />

na construção de um sistema mais abrangente que agregue elementos<br />

nos quais sejam buscadas as respostas às alterações encontradas.<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 81-105, 2007.


Mozart Nogarolli<br />

101<br />

As mudanças no clima do Estado podem se originar de alguns<br />

fatores, entre os quais está a mudança do perfil da agricultura, quando<br />

ocorre a migração de cultura perene para culturas temporárias. Assim, o<br />

solo fica exposto parte do ano, aguardando a época de plantação. Isso<br />

altera o albedo 3 da superfície, elevando-o de tal modo a ocorrer maior absorção<br />

de raios solares aquecendo o solo e a temperatura ambiente.<br />

A alteração das temperaturas não se justifica pela urbanização.<br />

Um exemplo é a comparação que se pode traçar entre Londrina, segunda<br />

maior cidade do Paraná, onde ocorreu baixa elevação na média da temperatura,<br />

e Fernandes Pinheiro, pequeno município do Sul do Estado, onde<br />

houve maior elevação na temperatura. Todavia, deve-se esclarecer que o<br />

fato de diferentes níveis de urbanização não terem sido o fato preponderante<br />

na evolução, não as exime de participação nessa evolução, embora<br />

em menor grau. Em alguns casos específicos, como Londrina, Guarapuava<br />

e Francisco Beltrão, ocorreram redução da área de cultivo, mas foi substituída<br />

pela urbanização, uma compensando a outra no sistema climático.<br />

Há estações meteorológicas localizadas em município onde ocorreu expansão<br />

da agricultura de grãos, por exemplo, e as temperaturas não sofreram<br />

alterações não significativas.<br />

Na porção leste do Estado ocorreram as maiores elevações na<br />

Tmin. Contudo, as evoluções apresentadas acompanham os ciclos já<br />

descritos (ENOS e ODP). O que as diferencia das demais é a relação<br />

maritimidade versus continentalidade e a mancha urbana da região metropolitana<br />

de Curitiba.<br />

As maiores elevações de temperatura mínima ocorrem na porção sul<br />

do Estado, área do regime climático caracterizado como Cwb (Köppen). No<br />

Norte, clima do tipo Cwa, a temperatura mínima elevou-se em menor grau.<br />

Com relação às precipitações, as variações apresentadas são<br />

pequenas. As maiores elevações concentram-se no Sudoeste do Paraná:<br />

Francisco Beltrão e Laranjeiras do Sul, onde o regime pluviométrico é o<br />

maior do Estado. No Norte, em Apucarana, Londrina, Paranavaí, ocorreu<br />

diminuição nas médias acumuladas de chuvas no período, o que pode<br />

representar um problema para a agricultura, persistindo essa tendência.<br />

A industrialização é seguida da urbanização, pois, em tais áreas, o<br />

volume de aerossóis e gases de efeito estufa lançados à atmosfera são<br />

maiores. Curitiba a partir da década de 70 sofreu grande incremento<br />

3 Segundo J. O. Ayoade (1996, p. 29), o albedo varia conforme o tipo de superfície; as<br />

secas ou claras refletem mais radiação que superfícies escuras ou úmidas.<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 81-105, 2007.


102 O Novo Clima no Paraná<br />

demográfico, associado em grande parte à efetivação da Cidade Industrial<br />

de Curitiba (CIC) e à vinda de trabalhadores do campo. Esses trabalhadores<br />

foram substituídos pela mecanização, quando na troca das culturas<br />

perenes pelas temporárias. Na década de 80, Curitiba apresentava crescimento<br />

demográfico de 5,34%, terminando a década de 90 com crescimento<br />

de 2,13%.<br />

Bela Vista do Paraíso, segunda maior elevação de Tmed, é um município<br />

localizado no Norte do Estado. Nesse local ocorreu intensa migração<br />

de culturas perenes para temporárias, além da expansão da área cultivada.<br />

Em relação ao crescimento populacional, o município apresentou crescimento<br />

geométrico negativo no período equivalente a esta análise.<br />

Mais uma vez se evidencia a menor influência do clima urbano<br />

sobre o aquecimento. Não é que o clima urbano e as ilhas de calor possam<br />

ser desconsiderados, todavia têm pequeno peso sobre a elevação<br />

geral da temperatura 4 . Na Tmed, tal como na Tmin, no Paraná os ciclos<br />

de El Niño e ODP têm mais influência do que a urbanização,<br />

comprovadamente. E o Paraná, especificamente, passou a ter invernos<br />

mais brandos e de menor duração. Já a primavera e o outono, sofrendo<br />

maior alteração, acabam por ampliar o período mais quente do ano, confirmando-se<br />

o senso comum de que não “faz mais tanto frio como antigamente”.<br />

Nesse sentido, as temperaturas são mais afetadas pelas mudanças<br />

ocorridas a nível global, ainda que as elevações das temperaturas no<br />

Paraná registrem níveis inferiores aos apontados 5 para o planeta.<br />

A discussão sobre o aquecimento global tem-se fortalecido deixando<br />

de ser apenas uma discussão científico-acadêmica para tomar<br />

espaço na mídia. Esse crescente interesse pela questão vem em função<br />

dos eventos climáticos extremos que se têm verificado. No Brasil, podem<br />

ser mencionadas as secas na Amazônia, o furacão Catarina em 2005, as<br />

fortes chuvas no Sudeste e a intensificação da seca no Nordeste.<br />

O Paraná, em 2006, registrou um longo período de estiagem causando<br />

o racionamento de água potável para a população. Em relação à<br />

precipitação, o aumento das chuvas no Sudoeste do Estado pode ocasionar<br />

inundações e enchentes, como a registrada em 1983, provocando<br />

4 Sobre o clima urbano, o IPCC ainda afirma que os resultados confirmam as conclusões<br />

de que os efeitos na média de temperatura do século XX, globalmente, não<br />

excedem a 0,5ºC. Entretanto, as megalópoles no futuro não deverão ser<br />

desconsideradas.<br />

5 Fonte: IPCC<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 81-105, 2007.


Mozart Nogarolli<br />

103<br />

prejuízos para as populações e para agricultura. Todavia, haverá positivamente<br />

maior capacidade de produção em hidrelétricas na região. No Norte,<br />

persistindo a tendência às reduções da precipitação, podem ocorrer<br />

perdas na safra agrícola e, num nível extremo, dar início a processos de<br />

desertificação, principalmente na região de Paranavaí, localizada sobre<br />

arenito Caiuá. Deverá ocorrer intensificação de eventos extremos de chuva,<br />

causando prejuízos principalmente às populações menos favorecidas.<br />

Com a elevação da temperatura pode ocorrer aumento de doenças<br />

transmissíveis tropicais, dengue e malária, por exemplo. Alguns desses<br />

problemas já começam a ser identificados.<br />

Cabe agora a expansão do conhecimento e divulgação de suas<br />

causas e efeitos para toda a sociedade. Atualmente, a mídia tem destacado<br />

essas questões, o que é um ponto inicial. Mesmo que de diferentes<br />

formas (jornalística, oportunista, catastrófica ou documentarista), tem atingido<br />

a todas as classes. Já há pessoas de classes menos favorecidas<br />

com alguma ou total noção do que é aquecimento global. As discussões já<br />

começam a tomar as ruas, porém ainda é pouco, pois quem detém o<br />

poder ainda se mantém de olhos e ouvidos fechados para a questão. Há<br />

que se alterar a cultura economicista sobre o assunto e, pelo conhecimento,<br />

alcançar nova coerência econômico-ecológica para reverter tal fato.<br />

Algumas soluções já foram apontadas para se ter um rigoroso controle<br />

das emissões de CO 2 . O Protocolo de Kyoto que estabeleceu limite<br />

de emissão desse gás parece fadado ao insucesso. Não houve o<br />

engajamento global dos países. Os maiores emissores, Estados Unidos<br />

e Rússia, são reticentes quanto ao Protocolo de Kyoto, entretanto têm<br />

dado passos (curtos) em direção a alternativas menos poluentes, como o<br />

biocombustível. Positivamente, teve-se o comprometimento, em final de<br />

2006, da União Européia com a redução da emissão de 20% de gás<br />

carbônico até 2020 – meta mais arrojada que o proposto pelo Protocolo de<br />

Kyoto.<br />

No Brasil, há necessidade de uma forte atuação governamental<br />

com relação à floresta amazônica. A Amazônia, a maior floresta equatorial<br />

do planeta, vem a cada ano sendo vilipendiada pela derrubada ilegal de<br />

árvores para o comércio de madeiras nobres. O que resta é queimado,<br />

atirando-se à atmosfera toneladas de gás carbônico. O Brasil que já deu<br />

mostra de sua inventividade com o desenvolvimento de fontes de energias<br />

alternativas e menos poluidoras, tais como o álcool e o biodiesel, deve<br />

fazer sua parte desenvolvendo mecanismos de controle do que é feito na<br />

floresta amazônica, evitando a exploração econômica ilegal como atualmente<br />

ocorre.<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 81-105, 2007.


104 O Novo Clima no Paraná<br />

Novos desafios daí surgirão e muitos deles dependentes de mudanças<br />

no planejamento do Estado do Paraná, sejam no âmbito econômico<br />

(agricultura, industrialização, turismo) ou no social (prontidões na<br />

mitigação do avanço das doenças tropicais e de eventos climáticos extremos:<br />

secas no Extremo Norte e enchentes do Sudoeste).<br />

Essas são situações que se colocam em cenário futuro pela avaliação<br />

da evolução climática no período desta pesquisa, podendo se efetivar<br />

ou não. A consciência individual sobre a importância do tema direciona<br />

o cidadão a uma atitude positiva em relação à questão. Somente com o<br />

engajamento e ação de governantes, legisladores e da sociedade podem<br />

ser mitigadas as conseqüências das mudanças climáticas, garantindo com<br />

isso um futuro mínimo e digno às novas gerações.<br />

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105<br />

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1963. v. 4, tomo I.<br />

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1995.<br />

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Ed. da UFV, 2000.<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 81-105, 2007.


Rafael Carlos Prieto Fernandes, Vanessa Márcia Vargas e<br />

Nilson César Fraga<br />

SUDOESTE PARANANESE:<br />

50 ANOS DO LEVANTE DOS<br />

POSSEIROS – IDENTIDADE<br />

LOCAL E REGIONAL RESGATADA<br />

POR MEIO DO ROTEIRO DE<br />

TURISMO DE GUERRA<br />

107<br />

RAFAEL CARLOS PRIETO FERNANDES<br />

___________________________________________________________<br />

Turismólogo<br />

VANESSA MÁRCIA VARGAS<br />

___________________________________________________________<br />

Turismóloga<br />

NILSON CÉSAR FRAGA<br />

___________________________________________________________<br />

Doutor em Meio Ambiente e Desenvolvimento,<br />

Orientador e coordenador do NPTG/Turismo/UNICURITIBA<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 107-129, 2007.


108 Sudoeste Paranaense: 50 anos do levante dos ...<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 107-129, 2007.


Rafael Carlos Prieto Fernandes, Vanessa Márcia Vargas e<br />

Nilson César Fraga<br />

RESUMO<br />

109<br />

Este trabalho propõe a criação de um roteiro turístico por intermédio do<br />

Núcleo de Pesquisa de Turismo de Guerra – NPTG/FIC. Objetiva analisar<br />

o segundo roteiro de turismo de guerra no Brasil, na região Sudoeste do<br />

Paraná, onde ocorreu o Levante dos Posseiros, em 1957.<br />

Metodologicamente foram feitas pesquisas bibliográficas referentes à<br />

conceituação de temas discutidos, tais como roteiro turístico, turismo de<br />

guerra, Sudoeste do Paraná e o Levante de 1957. Apresenta-se uma abordagem<br />

inicial da conceituação de turismo e turismo de guerra, da formação<br />

territorial do Sudoeste do Paraná e sua ocupação, bem como sua<br />

proposta roteirizada do espaço delimitado nesta análise, cujo objetivo final<br />

é a construção do segundo roteiro de turismo de guerra, que será discutido<br />

e terá continuidade de pesquisa pelo Núcleo de Pesquisa do<br />

UNICURITIBA.<br />

Palavras-chave: roteiro turístico, turismo de guerra, Paraná, Sudoeste<br />

do Paraná, Levante dos Posseiros de 1957.<br />

ABSTRACT<br />

This is a project whose proposal is the creation of a tourism script by the<br />

Research of War Tourism Nucleus – NPTG/FIC. Its goal is to analyze the<br />

second script of war tourism in Brazil, in the southwestern region of Paraná,<br />

where occurred the revolt of the people who holds legal property titles in<br />

the year 1957. Bibliographical researches have been made regarding the<br />

conceptualization of tourism and war tourism, southwestern territorial<br />

formation of state of Paraná and its occupation, as well as the proposal of<br />

a delimited space in a script, whose final objective is the construction of<br />

the 2 nd script of war tourism, which will be argued and will have continuity of<br />

research for the Nucleus of research of the FIC.<br />

Keywords: tourist script, war tourism, Paraná, Southwest of Paraná, revolt<br />

of the people who holds legal property titles in the year 1957.<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 107-129, 2007.


110 Sudoeste Paranaense: 50 anos do levante dos ...<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 107-129, 2007.


Rafael Carlos Prieto Fernandes, Vanessa Márcia Vargas e<br />

Nilson César Fraga<br />

1 INTRODUÇÃO<br />

111<br />

Este artigo tem como objetivo trazer à luz da academia e da sociedade<br />

os fatos históricos que marcaram o processo de ocupação do Sudoeste<br />

do Paraná, por meio da organização de um roteiro de turismo de<br />

guerra, possibilitando ao futuro visitante o acesso a espaços e paisagens<br />

que o farão refletir sobre os fatos que contribuíram para a formação da<br />

identidade local e regional, bem como pelo roteiro promover o desenvolvimento<br />

turístico.<br />

A pesquisa traz o estudo do conceito de turismo e turismo de guerra,<br />

além de abordar uma análise da forma de ocupação ocorrida no Sudoeste<br />

do Estado, de povoamento efetivo recente onde o direito à terra é<br />

contestado de forma violenta e ilegal pelas companhias imobiliárias que<br />

se estabeleceram na região. Esse fato intensifica a luta pela terra, fazendo<br />

eclodir um movimento de resistência dos colonos, conhecido como a<br />

Revolta de 1957, movimento que significou uma ocupação democrática<br />

da terra, à medida que o latifúndio foi vencido.<br />

Para alcançar os objetivos propostos, se fez necessária análise<br />

de referencial secundário, levantados em instituições de ensino e acervos<br />

públicos na cidade de Curitiba, tais como Centro Universitário Curitiba<br />

(UNICURITIBA), Universidade Federal do Paraná (UFPR), a Biblioteca<br />

Pública do Paraná, Jornal de Francisco Beltrão e revista Gente do Sul.<br />

Os dados primários para o planejamento do roteiro foram coletados<br />

in loco, em viagem de campo na região da pesquisa. Foram percorridos<br />

mais de 1.500 quilômetros, em aproximadamente 20 municípios visitados,<br />

onde se procederam às entrevistas e fotografias das relíquias da insurreição<br />

e da paisagem regional.<br />

2 TURISMO E TURISMO DE GUERRA<br />

O turismo é uma atividade interdisciplinar que está relacionada a<br />

numerosos conceitos, desde sua concepção mercadológica, filosófica,<br />

psicológica e ainda poética. De acordo com Miguel Angel Acerenza (2002,<br />

p. 39): “A partir do ponto de vista técnico, podem existir, e em realidade<br />

existem, várias definições sobre o turismo, cada uma delas apropriada a<br />

diferentes propósitos.”<br />

Ainda que pareça confundir a já extensa abrangência do turismo,<br />

todos os conceitos vêm contribuir para diversificação de novos produtos<br />

turísticos, que buscam atender às necessidades de cada público. Afirma<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 107-129, 2007.


112 Sudoeste Paranaense: 50 anos do levante dos ...<br />

Maria das Graças de Menezes Paiva (1995, p. 21):<br />

Na produção e comercialização dos serviços turísticos a supremacia<br />

da visão mercadológica chega a seguimentar o turismo em<br />

diversos tipos, estabelecendo esforços mercadológicos específicos<br />

a cada clientela a ser atingida.<br />

O turismo como matéria de estudos universitários começou a interessar<br />

no período compreendido entre as duas guerras mundiais. Durante<br />

esse período, economistas europeus começaram a publicar os primeiros<br />

trabalhos, destacando a escola de Berlim (FUSTER, 1978, p.30). Em 1929,<br />

a escola berlinesa apresentou diversas conceituações que apresentavam<br />

o turismo como relação entre pessoas que se afastam temporariamente<br />

de seu lugar fixo de residência, por motivo de prazer relacionado ao corpo,<br />

espírito ou profissão, com os naturais do local visitado.<br />

Em 1942, os professores da Universidade de Berna, W. Hunziker e<br />

K. Krapf consideraram o turismo como<br />

“[...] a soma de fenômenos e de relações que surgem das viagens<br />

e das estâncias dos não residentes, desde que não estejam ligados<br />

a uma residência permanente nem a uma atividade remunerada.”<br />

(OMT, 2001, p. 37).<br />

Mais tarde surgiram outros conceitos, e, para muitos especialistas,<br />

o turista deve permanecer mais de 24 horas nos locais visitados, para<br />

que a viagem seja reconhecida como turismo. Outros incluem no turismo<br />

somente viagens de férias e de outras motivações que não seja o trabalho.<br />

Segundo Arrillaga (1976, p. 25), turismo é:<br />

O conjunto de deslocamentos voluntários e temporais determinados<br />

por causas alheias ao lucro; o conjunto de bens, serviços e<br />

organização que determinam e tornam possíveis estes deslocamentos,<br />

e as relações e fatos que entre aqueles e os viajantes têm<br />

lugar.<br />

Mas o conceito de turismo aceito do ponto de vista formal é dado<br />

pela Organização Mundial de Turismo (OMT):<br />

O turismo compreende as atividades que realizam as pessoas<br />

durante suas viagens e estadas em lugares diferentes ao seu<br />

entorno habitual, por um período consecutivo inferior a um ano,<br />

com finalidade de lazer, negócios ou outras.<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 107-129, 2007.


Rafael Carlos Prieto Fernandes, Vanessa Márcia Vargas e<br />

Nilson César Fraga<br />

113<br />

A OMT (2001, p. 38) esclarece o que se entende por entorno habitual:<br />

“O entorno habitual de uma pessoa consiste em certa área que circunda<br />

sua residência mais todos aqueles lugares que visita<br />

freqüentemente” (OMT, 2001, p. 38). Visitando locais turísticos em sua<br />

própria cidade, a pessoa utiliza a infra-estrutura turística e gera renda para<br />

o município, do mesmo modo que o turista que vem de outra localidade. A<br />

viagem sempre foi uma ação que se origina de um contexto em que está<br />

inserida a sociedade, em determinado momento histórico.<br />

No ano de 1830, a primeira ferrovia com trem a vapor teve seu<br />

início. Isso foi um marco para a atividade futura do turismo, pois a constante<br />

melhoria na tecnologia dos transportes, comunicações, hospedagem<br />

e serviços, com a vida nas cidades, o trabalho nas fábricas substituindo<br />

o doméstico, o aumento dos salários e mais tempo livre fizeram com<br />

que as pessoas tivessem novas necessidades. Na segunda metade do<br />

século XIX, as primeiras atividades turísticas foram praticadas, em virtude<br />

da intervenção de personalidades da sociedade inglesa, como Thomas<br />

Cook, Henry Wells, George Pullmann, Thomas Bennett, Louis Stangen e<br />

César Ritz.<br />

Segundo Andrade (2000), Thomas Cook foi a primeira pessoa a<br />

fazer uma viagem turística. Fretou um trem, transportando aproximadamente<br />

570 pessoas para um congresso antialcoólico, organizado por evangélicos,<br />

em 1841, na cidade de Leicester, na Inglaterra. E durante muitos<br />

anos, Cook realizou várias viagens pela Europa e Estados Unidos. Podem<br />

ser mencionadas outras pessoas importantes para o desenvolvimento da<br />

história do turismo. César Ritz foi um dos primeiros empreendedores do<br />

ramo hoteleiro; George Pullmann organizou a primeira viagem a bordo de<br />

uma locomotiva, proporcionando lazer, conforto e prazer, com padrão de<br />

primeira classe e por um preço diferenciado do que era cobrado naquela<br />

época; Thomas Bennett organizava viagens para os ingleses que visitavam<br />

a Noruega e mais tarde criou uma agência de viagens. De acordo<br />

com o mesmo autor, outro marco na “revolução” do turismo foi a invenção<br />

do automóvel, facilitando as viagens no século XX e a maior rapidez dos<br />

aviões, diminuindo o tempo das viagens, dando mais conforto e segurança<br />

para os viajantes.<br />

A partir dessa época, a sociedade colocou-se em movimento. Curtas<br />

viagens de final de semana e feriados e longas viagens de férias foram<br />

ficando cada vez mais freqüentes. As pessoas procuram fugir do cotidiano,<br />

buscando sempre mais conforto. Há uma necessidade de sair da rotina<br />

estressante, do esgotamento físico e psíquico comuns na sociedade<br />

contemporânea.<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 107-129, 2007.


114 Sudoeste Paranaense: 50 anos do levante dos ...<br />

Com o passar dos anos foram surgindo diversas conceituações<br />

para o turismo. Ainda que a palavra tour seja francesa, sua utilização no<br />

âmbito das viagens veio da Grã-Bretanha. The tour ou the grand tour significa<br />

a viagem que o jovem aristocrata inglês fazia na Europa, acompanhado<br />

normalmente de seu preceptor. Esses ingleses estudavam pouco, divertiam-se<br />

muito; mas a viagem assim denominada era considerada como<br />

complemento necessário de sua educação. The tour consagrava o<br />

gentleman (ANDRADE, 2000).<br />

Os conceitos criados pelos autores são numerosas e quase nunca<br />

coincidentes. O valor não está tanto no prestígio de quem os formulou,<br />

mas na coincidência com a realidade. A crítica que se pode fazer a quase<br />

todos eles não é que sejam errôneos, mas que são incompletos. Sua<br />

importância prática é muito relativa (ARRILLAGA, 1976, p.19). Sendo assim,<br />

percebe-se que o turismo tem evoluído bastante, desde os deslocamentos<br />

rudimentares até o turista atual que está cada vez mais exigente,<br />

e surgem tendências e segmentos, fazendo com que o turismólogo tenha<br />

de estar sempre “antenado” para não perder espaço no mercado turístico.<br />

Isso faz com que o turismo seja atualmente uma atividade profissional e<br />

respeitada, possibilitando novas inserções e modalidades de turismo, como<br />

o de guerra.<br />

Enfim, a guerra pode ser considerada um ato de violência, de caráter<br />

essencial e metódico, limitada no tempo e espaço, desenvolvida por<br />

regras e acordos, sangrenta ou apenas uma troca de ameaças. O resquício<br />

dela sobre os territórios, implica a possibilidade de visitação, que seria<br />

fruto de curiosidades dos homens e mulheres, cultos ou não. Visitar tais<br />

lugares, para conhecer, sentir e tirar conclusões a cerca da vida, sua e da<br />

humanidade – naquilo que ela produziu e gerou (FRAGA, 2002 apud<br />

MEDEIROS; HOBAL, 2005, p. 33).<br />

Aos leigos, a expressão “turismo de guerra” pode causar espanto,<br />

já que o discurso pacifista tem sido amplamente almejado por uma parcela<br />

significativa da população mundial e brasileira. Uma proposta de turismo<br />

com essa nomenclatura pode destoar da visão de mundo de muitos<br />

indivíduos. Ir além, à gênese da conceituação do turismo, faz-se necessário<br />

para o entendimento dele. A discussão acerca de turismo de guerra não<br />

pode ser vista apenas como a incorporação de uma nova terminologia, mas<br />

no conjunto do (re)pensar, planejar e organizar o turismo brasileiro.<br />

Os negócios turísticos operam uma (re)criação e inserção de novas<br />

“paisagens” no contexto territorial dessa atividade mercadológica, com<br />

profunda possibilidade econômica, principalmente em regiões carentes<br />

no plano socioeconômico de um país com dimensões de gigantismo e<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 107-129, 2007.


Rafael Carlos Prieto Fernandes, Vanessa Márcia Vargas e<br />

Nilson César Fraga<br />

115<br />

uma construção histórica pautada em guerras internas e revoltas populares<br />

com marcas no espaço, como Canudos, Contestado, Revolução<br />

Farroupilha, República Juliana, Revolução Federalista, e no próprio tema<br />

em análise: a Revolta dos Posseiros em 1957.<br />

Mas turismo de guerra não trata de programar viagens a lugares<br />

em conflito deflagrado, como Afeganistão, Iraque, Palestina ou outros em<br />

turbulência atual. Como Nilson César Fraga (2002, p. 44) resume, é na<br />

verdade fazer com que o visitante esteja em contato com lugares onde<br />

ocorreram tais conflitos, preservando fragmentos desses episódios, como<br />

forma de manter viva parte de sua história, por meio de museus, mausoléus,<br />

cemitérios, monumentos, sítios arqueológicos, entre outros elementos<br />

constantes na paisagem. O contato com o lugar, conforme Nilson<br />

César Fraga (2002, p. 49),<br />

[...] pode propiciar uma viagem mental à história de um país em<br />

construção. Pisando e sentindo paisagens antigas, o turista experimenta<br />

a insólita relação com o espaço poético e/ou a imagem<br />

poética.<br />

Assim o turismo de guerra não pressupõe pacotes turísticos para<br />

áreas conflagradas, mas para locais que viveram tais situações. Enfim,<br />

abre-se a possibilidade de (re)pensar o turismo brasileiro, criando-se possibilidades,<br />

tipos e formas, como o turismo de guerra,um atrativo a mais<br />

para os brasileiros em férias e(ou) adeptos do lazer cultural, ecológico, de<br />

aventura e outros.<br />

3 O QUE É ROTEIRO TURÍSTICO<br />

Roteiro turístico é um itinerário que envolve lugares a serem visitados,<br />

dentro de uma proposta turística baseada em planejamento. O roteiro<br />

depende dos interesses do público a ser atingido, podendo ser temático<br />

ou personalizado. 1<br />

Apesar de serem elementos fundamentais para o turismo, as viagens<br />

nem sempre possuem caráter turístico nem tampouco estão necessariamente<br />

vinculadas ao aproveitamento de um tempo livre. Em face<br />

dessa particularidade, faz-se necessário comentar alguns aspectos que<br />

1 Dentro da atividade turística esse termo é conhecido como forfait<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 107-129, 2007.


116 Sudoeste Paranaense: 50 anos do levante dos ...<br />

interferem tanto nas viagens como nos roteiros turísticos, pois, mesmo<br />

que os roteiros dependam da execução ou participação em uma viagem,<br />

também podem aglutinar temáticas e objetivos que estimulem as pessoas<br />

a viajar, complementando-os. Um roteiro turístico resume todo um processo<br />

de ordenação de elementos intervenientes na efetivação de uma<br />

viagem.<br />

O roteiro pode estabelecer as diretrizes para desencadear a posterior<br />

circulação turística, seguindo determinados trajetos, criando fluxos<br />

e possibilitando um aproveitamento racional dos atrativos a visitar (BAHL,<br />

2004, p. 31-32). O mesmo autor considera que os elementos inerentes<br />

aos roteiros turísticos são: sincronização, espaço-tempo, bens e serviços.<br />

A sincronização ocorre pela combinação de fatores vinculados ao<br />

espaço geográfico a ser abrangido ou percorrido; ao tempo de duração do<br />

deslocamento e necessário em cada destinação, bem como ao disponível<br />

pelos potenciais participantes para usufruto de uma programação turística;<br />

ao tipo de atrativos a serem visitados e aos serviços associados<br />

(transporte, hospedagem, alimentação, entre outros.<br />

O ser humano busca facilidades para a realização de seus deslocamentos,<br />

gerando um processo de escolhas e seleção de localidades<br />

oriundas de anseios diversos, o que proporciona melhor aproveitamento<br />

na decisão do viajar. Na opinião de L. F. Sartor (apud BAHL, 2004, p. 33):<br />

A viagem constitui-se num ato de liberdade intrínseca que, ao<br />

realizá-la, propicia renovações e maturidade, dimensionamento<br />

mais conteúdos do mudo. Cresce na medida em que assimila<br />

novos elementos dos povos visitados. Participa de um cotidiano<br />

desconhecido, que apresenta manifestações diversas, soma<br />

de toda uma cultura, manifestada através das artes, do folclore,<br />

da gastronomia, do artesanato, do comércio e da indústria, dos<br />

contatos humanos e materiais, do comportamento em geral da<br />

localidade.<br />

Segundo Miguel Bahl (2004, p. 35), um roteiro turístico bem idealizado<br />

é uma maneira de reunir diversos elementos que apresentam os<br />

mais diversos aspectos de uma região ou localidade. Há que se buscar<br />

nas origens o despertar de uma consciência que permita a promoção dessas<br />

localidades, por meio do turismo, proporcionando o desenvolvimento<br />

da região.<br />

Uma das grandes preocupações do planejamento de um roteiro, já<br />

em sua fase de elaboração, é relacionada ao tipo de clientela a que se<br />

dirigirão os programas ou de quem vai usufruí-los, tanto em termos de<br />

camada social como de faixa etária. Por meio dos roteiros turísticos, pode-<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 107-129, 2007.


Rafael Carlos Prieto Fernandes, Vanessa Márcia Vargas e<br />

Nilson César Fraga<br />

117<br />

se trabalhar uma gama muito ampla de atividades ligadas ao planejamento<br />

turístico espacial (BAHL, 2004, p. 91). Tem-se a oportunidade de desenvolver<br />

uma série de produtos que atinjam âmbitos diferentes, desde os<br />

roteiros que possuem uma vinculação espacial local até aqueles que podem<br />

abarcar aspectos macros, associados a ofertar roteiros de cunho<br />

mais amplo.<br />

Os roteiros locais, baseando-se na divisão administrativa do Brasil<br />

em municípios, Estados e regiões, são os que utilizam os recursos intrínsecos<br />

de cada localidade: estrutura urbana, acesso, circulação, serviços<br />

e os elementos de interesse turístico (monumentos, igrejas, museus, etc.),<br />

localizados na área de um município. Quando o rol de atrativos está confinado<br />

ao núcleo urbano, os roteiros podem denominar-se centrais (urbanos)<br />

ou periféricos, já que estão mais associados à particularidade de se<br />

utilizar o entorno dos núcleos urbanos das cidades, inseridos na área dos<br />

municípios (BAHL, 2004, p. 91).<br />

Para o turista que usufruirá os roteiros, as vantagens aparecem<br />

quando da seleção do que é oferecido: os locais que despertam interesse;<br />

o financiamento das despesas; uma previsão de permanência ordenada;<br />

comodidades de locomoção, alojamentos, refeições e passeios incluídos<br />

ou a serem feitos durante a estada em determinado local, o que possibilita<br />

que numa viagem posterior, tendo selecionado um dos locais para retorno,<br />

volte com algum conhecimento anterior sobre ele (BAHL, 2004, p. 33).<br />

Entre os elementos da oferta turística, subdivididos em naturais e<br />

artificiais, tem-se em linhas gerais, conforme Wahab (1977, p. 132-133<br />

apud BAHL, 2004, p. 35): naturais (clima, configuração física e paisagens,<br />

elemento silvestre, flora e fauna, centros de saúde) e artificiais (história,<br />

cultura e religião; infra-estrutura; vias de acesso e meios de transporte;<br />

superestruturas e modo de vida das pessoas). Ou ainda, conforme Iuys<br />

Renato Ignarra (1999 apud BAHL, 2004, p. 35):<br />

[...] atrativos turísticos naturais (montanhas; planalto e planícies;<br />

costas ou litoral; terras insulares; hidrografia; pântanos; fontes<br />

hidrotermais e/ou termais; parques e reservas de fauna e flora;<br />

grutas/cavernas/furnas; áreas de caça e pesca) e culturais [monumentos;<br />

sítios; instituições e estabelecimentos de pesquisa e lazer;<br />

manifestações; usos e tradições populares; realizações técnicas<br />

e cientificas, contemporâneas e acontecimentos programados];<br />

serviços turísticos (meios de hospedagem; alimentação;<br />

agenciamento; transporte turístico; locação de veículos e equipamentos;<br />

eventos; espaços de eventos; entretenimentos; informações<br />

turísticas; passeios e comércio turístico]; serviços de segurança;<br />

serviços de informação; serviços de comunicações; servi-<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 107-129, 2007.


118 Sudoeste Paranaense: 50 anos do levante dos ...<br />

ços de apoio e automobilísticos e comércio turístico) e infra-estrutura<br />

básica acessos; saneamento; energia; comunicações; vias<br />

urbanas de circulação; abastecimento de gás; controle de poluição<br />

e capacitação de recursos humanos.<br />

Dessa forma, deve haver também a preocupação em se estabelecer<br />

roteiros direcionados, pois a interatividade dos vários aspectos que<br />

interferem na elaboração de roteiros é bastante ampla. O exercício da<br />

criatividade na área de turismo é uma exigência, principalmente na elaboração<br />

de roteiros turísticos. Sob tais aspectos, o Levante de 1957, no Sudoeste<br />

do Paraná, como roteiro de turismo de guerra, se viabiliza por possuir<br />

a maioria dos elementos já mencionados.<br />

4 OCUPAÇÃO E FORMAÇÃO DO SUDOESTE DO PARANÁ<br />

A região do Sudoeste paranaense está localizada ao sul do Rio<br />

Iguaçu, seu limite norte, separando-a do Oeste paranaense. A região faz<br />

fronteira a oeste com a Argentina, ao sul com o Estado de Santa Catarina<br />

e a leste com os municípios de Mangueirinha e Clevelândia (LAZIER, 1986,<br />

p. 27). Situa-se no Terceiro Planalto paranaense, com terras de composição<br />

ácida, que correspondem aos patamares basálticos que descem suavemente<br />

do sul para o norte até o Vale do Iguaçu.<br />

As araucárias se destacavam, no passado, em sua vegetação.<br />

Era um aspecto marcante da paisagem natural em alguns locais, pois<br />

somavam cerca de 10 milhões de árvores, já não se encontram em abundância<br />

devido ao desmatamento para ocupação agrícola e extração de<br />

madeira para as indústrias locais (LAZIER, 1986, p. 28).<br />

Esses aspectos geográficos são úteis e necessários ao estudo do<br />

povoamento do Sudoeste do Paraná. Sabe-se que o desenvolvimento social<br />

e econômico de uma região está intimamente ligado aos aspectos geográficos,<br />

principalmente clima, vegetação e fertilidade do solo. Foi nesse<br />

sentido que ocorreu a grande migração interna em demanda da região,<br />

entre outros motivos em virtude das condições ecológicas existentes<br />

(LAZIER, 1986, p. 28). Portanto, nessa região com clima “saudável”, terras<br />

férteis, rica vegetação, bom sistema hidrográfico, que grande leva de<br />

paranaenses, gaúchos e catarinenses se localizaram e estruturaram uma<br />

economia e uma sociedade progressista. Sendo o Sudoeste do Paraná<br />

uma região fértil e rica foi, muito disputada, causando conflitos jurídicos,<br />

políticos e sociais. Argentina e Brasil disputaram a região. Os Estados do<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 107-129, 2007.


Rafael Carlos Prieto Fernandes, Vanessa Márcia Vargas e<br />

Nilson César Fraga<br />

119<br />

Paraná e Santa Catarina também entraram em conflito pela região. Os<br />

conflitos pela posse das terras da região envolveram ainda a Estrada de<br />

Ferro São Paulo–Rio Grande, a Clevelândia Industrial e Territorial Ltda.<br />

(CITLA), o governo federal, o governo do Paraná e principalmente, os posseiros<br />

(LAZIER, 1986, p. 28).<br />

A questão da posse da terra no Sudoeste do Paraná vem desde o<br />

Império e tem como ponto de referência a política de concessões de grandes<br />

lotes de terras pelo governo brasileiro como complementação de pagamento<br />

aos trabalhos realizados por empresas construtoras de ferrovias<br />

(GOMES, 1986, p. 29). Essas concessões têm sido registradas desde<br />

1889, quando Dom Pedro II, por meio do Decreto 10.432, de 10 de novembro,<br />

concedeu ao engenheiro João Teixeira Soares uma área de terras<br />

devolutas e nacionais equivalente a 9 km 2 (REGO, 1979 apud GOMES,<br />

1986, p. 29). O governo provisório da República, por meio do Decreto 305,<br />

de 7/4/1890, manteve, com algumas alterações, o Decreto Imperial. Em<br />

seguida, em 1891, essas concessões foram transferidas para a Companhia<br />

União Industrial e, em 6/5/1893, pelo Decreto 1.386, para a Companhia<br />

Estrada de Ferro São Paulo–Rio Grande, do grupo Brasil Railway<br />

Company (GOMES, 1986, p. 30). Foi essa companhia quem realmente<br />

construiu a Estrada de Ferro Itararé–Uruguay e o ramal Jaguariaíva (PR)–<br />

Ourinhos (SP), bem como recebeu parte das terras concedidas, ficando<br />

um resto para receber posteriormente. Coube ao Estado do Paraná a demarcação<br />

e titulação das áreas concedidas, tendo em vista que, pela<br />

Constituição da República, de 1891, as terras devolutas e nacionais passaram<br />

ao domínio dos Estados (GOMES, 1986, p. 30).<br />

O processo histórico de ocupação do Sudoeste do Paraná pode<br />

ser dividido em duas fases. A primeira, antes de 1940, de ocupação extensiva<br />

da terra, que se caracterizava por uma “economia cabocla”, voltada<br />

basicamente para a exploração da erva-mate, madeira e criação de suínos.<br />

Pedro Calil Padis (1981, p. 149), ao se referir à ocupação do Sudoeste<br />

paranaense, faz a seguinte observação sobre essa questão:<br />

Até a década de 50 eram cidades isoladas, que permaneceram<br />

praticamente estagnadas, que serviam apenas como postos militares<br />

avançados e a economia se restringia à subsistência [...] Seu<br />

povoamento se deu de forma bastante rápida, pois, com a Guerra<br />

do Contestado, muitas famílias, que se viram desabrigadas, dirigiram-se<br />

para essas novas colônias.<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 107-129, 2007.


120 Sudoeste Paranaense: 50 anos do levante dos ...<br />

A segunda fase é caracterizada pela ocupação intensiva, que se<br />

refere ao efetivo processo de ocupação da região. Esse processo, iniciado<br />

na década de 40, intensificou-se na década seguinte com os migrantes<br />

gaúchos e catarinenses, descendentes de europeus, que haviam colonizado<br />

as “regiões antigas” do Rio Grande do Sul e Santa Catarina. A partir<br />

de 1950 é que na região se iniciou um surto de transformação. Em menos<br />

de vinte anos surgiram 40 novas cidades. Os fluxos vinham principalmente<br />

de duas regiões: contingentes do Norte do Paraná, que deixaram de<br />

plantar café, e outros, que representavam a grande maioria, vinham do<br />

Rio Grande do Sul, onde sua pecuária perdia espaço para a de São Paulo,<br />

do Mato Grosso e de Goiás, fazendo com que pequenos proprietários vendessem<br />

suas terras para os maiores e saíssem à procura de novas terras<br />

e emprego, além de perder a produção de calçados para a de São Paulo.<br />

Em vista dessa situação, os gaúchos passaram a ocupar o interior de<br />

Santa Catarina, até chegar ao Sudoeste do Paraná. Para se ter idéia da<br />

quantidade de gaúchos que percorreram esse caminho, em 1968, das 24<br />

cidades do Oeste catarinense, 21 tinham prefeitos gaúchos eleitos (PADIS,<br />

1981, p. 156).<br />

Esses imigrantes ao chegar ao Sudoeste paranaense promoveram<br />

uma rápida transformação, revitalizando demográfica e economicamente<br />

os núcleos populacionais e contribuindo para a multiplicação destes.<br />

Tanto é que dos 63 municípios do Sudoeste do Paraná, 14 obtiveram<br />

autonomia na década de 50 e 43 no decênio seguinte. Em 1960, metade<br />

da população do Paraná era gaúcha, enquanto em cidades como Pato<br />

Branco, Francisco Beltrão, Dois Vizinhos, Marmeleiro e Renascença a<br />

população era 90% gaúcha (PADIS, 1981, p. 156). O que se observa em<br />

estudos é que a parte ocupada mais recentemente do Sudoeste se fez de<br />

elementos bastante jovens, filhos de colonos gaúchos, representando 75<br />

% da população com menos de 30 anos (PADIS, 1981, p. 159).<br />

A partir de 1938, mediante uma política de ocupação dos “espaços<br />

vazios”, Getúlio Vargas tentou viabilizar a estratégia da “Marcha para o<br />

Oeste”. De acordo com Maria Esperança Carneiro (1981 apud GOMES,<br />

1986, p. 16):<br />

A “Marcha para Oeste” constituiu-se na primeira política efetiva dos<br />

governos Federal e Estadual, no sentido de integração de novas<br />

áreas no processo de alargamento da fronteira econômica. Essa<br />

política conjunta tinha por objetivo o deslocamento espacial da<br />

força de trabalho para novas regiões férteis incrementado a agricultura<br />

extensiva com o intuito de iniciar o aumento da produção de<br />

alimentos para os centros urbanos do país, em grande expansão<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 107-129, 2007.


Rafael Carlos Prieto Fernandes, Vanessa Márcia Vargas e<br />

Nilson César Fraga<br />

121<br />

Na lógica dessa política que, em 1943, por intermédio do Decreto<br />

12.417, de 12 de maio, Getúlio Vargas criou a Colônia Agrícola Nacional<br />

General Osório (Cango), para atrair o excedente da mão-de-obra agrícola<br />

do Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Surgiu, então nessa época, a rota<br />

da Marcha para o Oeste, organizada pelo governo federal no Sudoeste do<br />

Estado, instalando uma das sete colônias agrícolas nacionais da Cango e<br />

ocupando uma área de 300 mil hectares. A Cango absorveu pequenos<br />

produtores rurais vindos de outras regiões, principalmente Rio Grande do<br />

Sul e Santa Catarina. Também absorveu pequenos posseiros que estavam<br />

em conflito com grileiros de terras nas frentes pioneiras, principalmente<br />

na que avança rumo oeste-sudoeste paranaense. Essa iniciativa<br />

do governo federal trouxe ao Paraná uma experiência de reforma agrária<br />

que deu certo e que impulsionou o desenvolvimento econômico da região<br />

(FRAGA et al., 2002, p. 42).<br />

Roberto Gomes (1977, p. 18) destaca a afirmação de Walter<br />

Pécoits, em entrevista concedida em novembro de 1977, na cidade de<br />

Francisco Beltrão:<br />

A sede ficava na atual cidade de Francisco Beltrão (dentro da Gleba<br />

Missões), e essa, na área do território, passou a colônia agrícola a<br />

ter também como objetivo a colonização da área de fronteira do<br />

território, a partir da instalação dos colonos gaúchos.<br />

Nos primeiros anos de atuação, a CANGO dava terra ao agricultor<br />

como ajuda técnica, de assistência social e de infra-estrutura.<br />

Segundo Walter Pécoits, que assumiu a liderança do Movimento<br />

de 1957, na cidade de Francisco Beltrão, se referindo a CANGO faz<br />

a seguinte observação:<br />

“Nesta colônia agrícola, o agricultor [...] chegava, recebia a terra, a<br />

casa, ferramentas agrícolas, sementes, assistência dentaria e<br />

médico-hospitalar. Tudo de graça [...] uma média de 10 a 20<br />

alqueires por agricultor [...] mediam a gleba e, conforme o colono<br />

vinha chegando, eles o colocavam na terra que escolhera e aceitara<br />

receber. Como às vezes chovia e acumulava o serviço, a CANGO<br />

criou um núcleo em Santa Rosa, a 7 ou 8 quilômetros daqui, e fez<br />

casas para que o agricultor morasse nelas até ser transportado<br />

para a casa construída no lote rural que havia recebibo<br />

Embora se instalasse uma serraria em Santa Rosa para a construção<br />

das casas dos colonos, só eram serrados os pinheiros velhos, os<br />

caídos ou pinheiro que estava doente, derrubado por tempestade. A preocupação<br />

com a reserva florestal fez com que a Cango nunca colocasse o<br />

agricultor debaixo de pinhal. O agricultor era acomodado em mato-branco,<br />

onde estavam as terras melhores. Essa preocupação em localizar o<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 107-129, 2007.


122 Sudoeste Paranaense: 50 anos do levante dos ...<br />

agricultor nas terras mais produtivas e preservar a floresta nativa, levou a<br />

Colônia Agrícola a contratar um número significativo de guardas florestais.<br />

Sendo uma região onde tudo estava por ser feito, dar infra-estrutura<br />

aos colonos implicou abrir estradas, construir pontes, escolas, etc.,<br />

contratar e manter professores, o que foi feito até 1957 (GOMES, 1986, p.<br />

19). O sistema de pequena propriedade adotado na colonização, sem ônus<br />

para o agricultor, com um serviço de infra-estrutura e assistência em saúde<br />

e educação totalmente gratuita, aliada a uma forte propaganda que se<br />

fazia no Rio Grande do Sul, atraiu em poucos anos milhares de famílias<br />

para a região. Na época da criação das colônias, intensa propaganda era<br />

feita nos programas sertanejos das rádios, de grande penetração no meio<br />

rural (GOMES, 1986, p. 19).<br />

No caso da Cango, mais do que esse programa, a notícia era<br />

espalhada de “boca em boca”, pelos que vinham para a região e voltavam<br />

para buscar a família. Além disso, os reservistas do Rio Grande do<br />

Sul, quando davam baixa do quartel, recebiam, com seus certificados,<br />

um boletim: “Procure a Cango no Estado do Paraná, onde o governo lhe<br />

dará a terra, lhe dará assistência médica, lhe dará sementes, etc.” (GO-<br />

MES, 1986, p. 19).<br />

O crescimento da população acompanhou o crescimento das condições<br />

que estavam sendo dadas, para que a região plantasse e colocasse<br />

a produção no mercado. Se inicialmente os colonos produziram quase exclusivamente<br />

para a subsistência, bem rápido foram criadas as condições<br />

para a produção de alimentos para o mercado (GOMES, 1986, p. 21).<br />

5 INÍCIO DO LEVANTE DE 1957<br />

Antes de se ater à revolta dos camponeses no Sudoeste do Paraná,<br />

se faz necessária uma contextualização das revoltas camponesas no<br />

Brasil, apresentando-se o processo complexo da terra no País. As primeiras<br />

grandes lutas camponesas no Brasil coincidiram com o fim do Império<br />

e o começo da República. As movimentações predominantemente camponesas,<br />

mas não exclusivamente, do sertão de Canudos, na Bahia (1893-<br />

1897), e do sertão do Contestado, no Paraná e em Santa Catarina (1912-<br />

1916), foram apresentadas e violentamente combatidas, por forças militares<br />

compostas de milhares de soldados do Exército e das polícias estaduais,<br />

como se fossem tentativas de restauração Monárquica (MARTINS,<br />

1986, p. 41).<br />

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Nilson César Fraga<br />

123<br />

Duas foram às modificações sociais que atingiram de fato os camponeses<br />

naquela época, de um lado a abolição da escravatura negra um<br />

ano antes do fim da República, em maio de 1888.; de outro, a transferência<br />

das terras devolutas do patrimônio da União para o patrimônio dos<br />

Estados. Antevendo o fim da escravatura, que decorria, necessariamente,<br />

do fim do tráfico negreiro da África para o Brasil, efetivado em 1850, por<br />

pressão do governo inglês, as classes dominantes tomaram providências<br />

de ordem legal para encaminhar o processo de substituição do escravo<br />

sem prejuízo para a economia da grande lavoura, principalmente café e<br />

cana (MARTINS, 1981, p. 41).<br />

Tais medidas se concretizavam na Lei de Terras, não por coincidência<br />

promulgada ao mesmo ano de 1850. Essa lei instituía um novo<br />

regime fundiário para substituir o regime de sesmarias, suspenso em julho<br />

de 1822 e não mais restaurado. Nesse meio tempo, teria multiplicado<br />

o número de posseiros em todo o país. A Lei de Terras impedia a abertura<br />

de posses, estabelecendo que ficavam proibidas as aquisições de terras<br />

devolutas por outro título que não fosse o de compra. Transformava as<br />

terras devolutas em monopólios do Estado controlado por uma forte classe<br />

de grandes fazendeiros (MARTINS, 1986, p. 42).<br />

Os camponeses não proprietários, os que chegassem depois da<br />

Lei de Terras ou aqueles que não tivessem suas posses legitimadas em<br />

1850, sujeitavam-se, pois, como assinalaria na época da abolição da escravatura<br />

um grande fazendeiro de café e empresário, a trabalhar para a<br />

grande fazenda, acumulando pecúlio, com o qual pudessem mais tarde<br />

comprar terras, até do próprio fazendeiro. O esquema era claro: mediante<br />

o trabalho árduo, os trabalhadores livres poderiam acumular e, em conseqüência,<br />

transformar-se em pequenos proprietários de terra. O acesso à<br />

terra dar-se-ia por meio de oferta compulsória de trabalho ao grande fazendeiro.<br />

Com essa mudança, a questão do campesinato é colocada em<br />

novos termos. Em primeiro lugar, liberta o camponês da grande propriedade,<br />

ao mesmo tempo em que o subjuga a ela (MARTINS, 1986, p. 42).<br />

Antes “posse” e “sesmaria” correspondiam a lógicas distintas e<br />

combinadas, podendo a concessão de sesmaria ocorrer em terras já tomadas<br />

por posseiros, problema que se resolvia pela superioridade jurídica<br />

da sesmaria e pelo vínculo de dependência que tal superioridade supunha<br />

do posseiro em relação ao sesmeiro. Agora o espaço do camponês<br />

passa a ser um espaço e do fazendeiro passa a ser outro. As modificações<br />

no regime fundiário abrem caminho para um novo campesinato de<br />

posseiros e agregados. Trata-se de um campesinato de pequenos proprietários,<br />

um campesinato moderno cada vez mais dependente do merca-<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 107-129, 2007.


124 Sudoeste Paranaense: 50 anos do levante dos ...<br />

do, um campesinato de homens livres, compradores de terras, cuja existência<br />

é mediatizada por uma terra já convertida em mercadoria (MARTINS,<br />

1986, p. 42). É o campesinato que marca fortemente a paisagem do Sul e<br />

do Sudeste. Ao mesmo tempo, já com a primeira Constituição republicana,<br />

de 1891, as terras devolutas foram transferidas para os Estados e<br />

colocadas nas mãos das oligarquias regionais.<br />

Cada Estado desenvolvera sua política de concessão de terras,<br />

começando aí as transferências maciças de propriedades fundiárias para<br />

grandes fazendeiros e grandes empresas de colonização interessadas<br />

na especulação imobiliária. Esse processo caracterizou principalmente<br />

os Estados do Sul e do Sudeste. (MARTINS, 1986, p. 43).<br />

A história política contemporânea do campesinato brasileiro, a grosso<br />

modo, abrange a fase que vai da abolição da escravatura (1888) até o<br />

golpe militar de 1964. As reivindicações e os surtos de inquietação ocorrem<br />

unicamente como recurso para ilustrar uma constatação ou demonstrar<br />

uma hipótese. Essa delimitação tem seu sentido: o fim da escravidão<br />

redefiniu as condições de existência do campesinato; o golpe de Estado<br />

pôs fim às alternativas que estavam contidas nas lutas camponesas da<br />

época e deixou aberto apenas o caminho da sindicalização. Ao mesmo<br />

tempo, por meio do Estatuto da Terra, de fins de 1964, abriu-se caminho<br />

para que o governo federal enquadrasse e administrasse as questões<br />

camponesas, pois esse estatuto abriu a possibilidade da reforma agrária<br />

localizada e restrita nas áreas de tensão social grave, ao mesmo tempo<br />

em que descartou a possibilidade de uma reforma agrária de âmbito nacional.<br />

O governo militar poderia, assim, a partir de então, controlar duas<br />

tendências aparentemente contraditórias em favor da primeira: de um lado,<br />

uma política deliberada de concentração fundiária e de constituição de<br />

grandes empresas no campo; de outro, uma política de redistribuição de<br />

terras nos lugares em que as tensões sociais podiam ser definidas como<br />

um perigo à segurança nacional, isso é, à estabilidade do regime militar<br />

(MARTINS, 1986, p. 31).<br />

6 PROPOSTA DO LEVANTE ROTEIRIZADO<br />

A presente proposta do 2º roteiro de turismo de guerra do Brasil na<br />

região do Sudoeste do Paraná tem por objetivo trazer à tona a lembrança<br />

dos fatos que marcaram o Levante dos Posseiros de 1957 e a luta camponesa,<br />

que teve como vencedores os colonos que expulsaram as companhias<br />

colonizadoras de terra.<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 107-129, 2007.


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125<br />

Foi percorrida, no período de 29/4 a 1º/5/2006, em visita de campo<br />

a região do futuro roteiro, coletando-se dados das principais cidades do<br />

conflito, num total de 1.457 quilômetros, com saída da cidade de Curitiba.<br />

Dessa forma, foram selecionadas 11 cidades para compor o segundo roteiro<br />

de turismo de guerra do Brasil. São elas: Laranjeiras do Sul, Quedas<br />

do Iguaçu, Três Barras do Paraná, Salto do Lontra, Realeza, Santo Antônio<br />

do Sudoeste, Barracão/Bernardo de Irigoyen/Dionísio Cerqueira (região<br />

de fronteira), além de Francisco Beltrão e Pato Branco, conforme se<br />

verifica no mapa da rede rodoviária do roteiro de turismo de guerra sobre o<br />

Levante dos Posseiros do Sudoeste do Paraná.<br />

No que concerne ao deslocamento pelo território do roteiro, se faz<br />

necessária a análise socioespacial atual, especialmente a rede rodoviária<br />

regional. Nesse sentido, o sistema rodoviário da mesorregião Sudoeste<br />

expressa a intensa fragmentação da área em municípios de pequenas<br />

dimensões geográficas e a conseqüente proximidade entre as respectivas<br />

sedes. É formado por uma densa malha de estradas predominantemente<br />

municipais. Não há um eixo viário estruturado, mas uma configuração<br />

radial das rodovias que partem de Francisco Beltrão, dada sua localização<br />

mais central, sendo daí distribuídas em diversas direções aos municípios<br />

locais.<br />

O roteiro terá a duração de dois dias, percorrendo-se as cidades<br />

mencionadas, num total de 1.200 quilômetros. Assim, o primeiro dia é dedicado<br />

à visita de Laranjeiras do Sul, Quedas do Iguaçu, atravessando-se<br />

o Rio Jacaratiá em uma balsa no sentido de Três Barras do Paraná, Salto<br />

do Lontra e Realeza, onde será feito o pernoite no Max Plaza Hotel.<br />

No segundo dia serão visitadas as cidades de Santo Antônio do<br />

Sudoeste e Barracão (PR), Dionísio Cerqueira (SC) e Bernardo de Irigoyen<br />

(Argentina). Os visitantes poderão atravessar a fronteira para conhecer<br />

um pouco do comércio na Argentina, além de perceber a diferença cultural,<br />

fato marcante na região, por sua complexidade. Ainda terão a experiência<br />

de poder vivenciar em um mesmo local a oportunidade de estar<br />

num curto espaço de tempo em duas cidades diferentes e em Estados<br />

diferentes, bem como em um país vizinho.<br />

A parada para o almoço deve se dar no Restaurante Toscana, em<br />

Dionísio Cerqueira (SC). No período da tarde, as visitas ocorrerão em Francisco<br />

Beltrão (museu, monumento do Cristo, etc.) e Pato Branco (Museu<br />

Histórico José Zanella, Teatro Municipal Naura Rigon e o centro cultural da<br />

cidade, etc.). Na seqüência se faz o retorno para Curitiba.<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 107-129, 2007.


126 Sudoeste Paranaense: 50 anos do levante dos ...<br />

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Conselho Editorial<br />

NORMAS EDITORIAIS<br />

131<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 131-136, 2007.


132 Normas Editoriais<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 131-136, 2007.


Conselho Editorial<br />

NORMAS EDITORIAIS<br />

133<br />

A revista PerCurso: Curitiba emTurismo, publicação oficial do<br />

UNICURITIBA, de circulação nacional e internacional, com periodicidade anual,<br />

destina-se à veiculação de artigos científicos e resenhas, frutos das atividades<br />

de pesquisas, do diálogo interdisciplinar com outras ciências, leituras e discussões<br />

acadêmicas na área de Turismo.<br />

Sua principal vocação é agregar valor científico ao debate sobre o<br />

turismo trazendo a contribuição de trabalhos escritos em vários idiomas e vinculados<br />

a programas de graduação e pós-graduação do Brasil e do exterior.<br />

Visando à qualificação dos debates e tendo em vista o projeto de<br />

inserção da Revista no sistema Qualis, da CAPES (órgão oficial do Ministério<br />

da Educação brasileiro), rege-se a publicação pelas normas editoriais<br />

a seguir, para a elaboração, a apresentação e a análise de textos, propostas<br />

pela Editoria da Revista e aprovadas pela Comissão Editorial do<br />

UNICURITIBA.<br />

1 Só veicula artigos inéditos, os quais deverão contribuir para a<br />

compreensão do fenômeno turístico. Deverão ser enviados à Editoria da<br />

Revista, em meio eletrônico (arquivos para o seguinte endereço:<br />

npea@unicuritiba.edu.br), conforme datas a serem estipuladas anualmente<br />

nas chamadas de artigos para a Revista.<br />

2 Todos os artigos devem apresentar a seguinte estrutura:<br />

a) como elementos pré-textuais – título (em fonte tamanho 14, em<br />

negrito e centralizado, com versões em inglês e em algum outro<br />

idioma de caráter internacional) seguido, à direita, da identificação<br />

da autoria e das credenciais desta (nomes completos de autores e<br />

co-autores, titulações, vínculos institucionais e atividades profissionais<br />

atuais), menção às subvenções recebidas, apoios e financiamentos,<br />

sumário (contendo os tópicos em que se divide o artigo,<br />

logo abaixo do título e dos nomes dos articulistas), resumo e palavras-chave<br />

em língua vernácula, resumo e palavras-chave em inglês<br />

e resumo e palavras-chave em outra língua estrangeira;<br />

b) como elementos textuais – introdução, desenvolvimento e conclusão;<br />

c) como elementos pós-textuais – lista de referências (somente<br />

as obras efetivamente citadas no texto deverão aparecer nas referências).<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 131-136, 2007.


134 Normas Editoriais<br />

3 Os trabalhos para a seção “Artigos Científicos” deverão ter entre<br />

10 e 25 páginas e ser digitados em Word 7.0 ou versão mais atualizada,<br />

formato do papel A4, fonte arial tamanho 12 e com espacejamento 1,5 entre<br />

as linhas, para o texto normal; para as citações diretas de mais de três<br />

linhas, notas de rodapé, paginação e legendas de ilustrações e tabelas, o<br />

tamanho da fonte passa a ser o 10, e o espacejamento, simples.<br />

4 As páginas devem apresentar margem esquerda e superior de 3<br />

cm, direita e inferior de 2 cm, e as citações diretas de mais de três linhas<br />

devem ser destacadas em parágrafo próprio com recuo de 4 cm da margem<br />

esquerda e sem aspas.<br />

5 No texto, as citações devem ser indicadas pelo sistema de chamada<br />

autor-data (exemplo: WARAT, 1985, p. 30), o qual admite somente notas<br />

de rodapé explicativas.<br />

6 As referências bibliográficas devem vir em lista única ao final do<br />

trabalho, ordenadas pelo sistema alfabético, digitadas em espaço simples,<br />

separadas entre si por espaço 1,5.<br />

7 As locuções em língua estrangeira e destaques deverão ser redigidos<br />

em itálico.<br />

8 Todos os textos devem seguir as demais normas da Associação<br />

Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) sobre citações e notas de rodapé,<br />

referências em documentos e outras especificidades (ver, notadamente a NBR<br />

14724, a NBR 10520 e a NBR 6023, todas de agosto de 2002).<br />

9 Os artigos (de ambas as seções) deverão ter suas introduções<br />

antecedidas por resumos em português e correspondentes em inglês<br />

(abstract) e em mais um idioma de divulgação internacional que não o do<br />

próprio texto (résumé, resumen, riassunto, resumo etc.) de até 10 linhas,<br />

bem como de 3 a 6 palavras-chave também com as correspondentes em<br />

inglês (keywords) e em mais um idioma de caráter internacional que não o<br />

do próprio texto (mots clés, palabras clave, parole-chiave, palavras-chave<br />

etc.), para fins de adequada indexação.<br />

10 As colaborações para a seção “Resenha” deverão conter de 2 a<br />

5 páginas, enquadrar-se na temática do número da Revista e versar sobre<br />

obra clássica, ainda não publicada no Brasil ou muito recente, desde que<br />

tenha impacto na temática da Revista, nada obstando que a obra reúna<br />

mais de uma dessas características<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 131-136, 2007.


Conselho Editorial<br />

135<br />

11 Artigos científicos e resenhas não poderão ser assinados por<br />

meio de pseudônimos. A identificação da autoria das resenhas segue os<br />

mesmos requisitos da dos artigos.<br />

12 Tanto no caso de artigos quanto no de resenhas, os autores ou<br />

co-autores deverão encaminhar seus trabalhos com ofício datado, contendo<br />

a declaração de ineditismo do texto, além dos seguintes dados: título do<br />

trabalho, nomes completos, endereços completos (inclusive os eletrônicos)<br />

e telefones. Deverão ainda veicular a autorização para a publicação e a<br />

cedência formal dos direitos de publicação, pelo preenchimento e anexação<br />

da Ficha de Autorização de Publicação de Obra Intelectual, disponível<br />

em www.unicuritiba.edu.br, link Núcleo de Pesquisa e Extensão Acadêmica<br />

Publicações Revista PerCurso: Curitiba em turismo.<br />

13 A permissão para o uso de ilustrações, imagens, tabelas, etc.,<br />

extraídas de outras publicações, bem como quaisquer outras licenças ou<br />

aprovações perante entidades detentoras de direitos autorais, é de plena<br />

responsabilidade dos autores dos artigos e das resenhas.<br />

14 Os artigos ou resenhas internacionais redigidos em espanhol<br />

deverão ser encaminhados e serão publicados em seu idioma original, caso<br />

em que, além dos resúmenes e palabras clave traduzidos em inglês, poderão<br />

também ter esses correspondentes em língua portuguesa.<br />

14.1 Artigos ou resenhas internacionais redigidos em outros idiomas,<br />

que não o espanhol, deverão ser encaminhados nos idiomas originais<br />

e terão tradução para o vernáculo (publicação bilíngüe).<br />

14.2 Artigos ou resenhas escritos por acadêmicos somente serão<br />

recebidos para análise se apresentados em co-autoria com professores<br />

orientadores de projetos de pesquisa, de extensão, de trabalhos de conclusão<br />

de cursos de graduação ou de pós-graduação (especialização, mestrado,<br />

doutorado e pós-doutorado).<br />

15 A publicação das colaborações recebidas estará condicionada à<br />

avaliação do Conselho Científico da Revista e de eventuais avaliadores ad<br />

hoc, que poderão aprová-las na íntegra, sugerir alterações ou recusá-las<br />

definitivamente.<br />

16 A Editoria da Revista enviará correspondência eletrônica confirmando<br />

o recebimento dos trabalhos, bem como a lista daqueles que forem<br />

selecionados para a respectiva publicação.<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 131-136, 2007.


136 Normas Editoriais<br />

17 A Editoria da Revista poderá executar, com ou sem recomendação<br />

do Conselho Científico e dos avaliadores ad hoc, pequenas alterações<br />

de caráter meramente formal nos textos recebidos, de modo a adequá-los<br />

aos padrões da ABNT, não sendo admitidas modificações de estrutura, conteúdo<br />

ou estilo, sem o prévio consentimento dos autores.<br />

18 Os autores de artigos e resenhas aprovados para publicação<br />

com sugestões de alterações (correções de linguagem, adequações à ABNT<br />

etc.) por parte dos avaliadores ou da Editoria da Revista serão contatados<br />

pela Instituição para realizá-las e, depois disso, emitir nova autorização de<br />

publicação. A Editoria pode recusar a publicação dos artigos ou das resenhas<br />

em relação aos quais foram feitas ressalvas pelos avaliadores, caso<br />

essas não tenham sido consideradas pelos respectivos autores.<br />

19 O Conselho Editorial, integrado por membros dotados de maturidade<br />

científica e senioridade em pesquisa, representantes de mais de um<br />

Estado da Federação brasileira e futuramente de alguns países, que auxilia<br />

a Editoria na definição do projeto editorial (temática) de cada número da<br />

Revista e na resolução de dúvidas a ele pertinentes.<br />

20 O Conselho Científico, composto pelos professores do<br />

UNICURITIBA e de alguns convidados externos, auxilia a Editoria da Revista<br />

tanto na revisão dos artigos recebidos (Ficha de Avaliação de Artigos) quanto<br />

na indicação de avaliadores ad hoc (internos ou externos à Instituição),<br />

quando necessário, como na captação de artigos conforme as temáticas da<br />

Revista. Na avaliação dos artigos serão mantidas em sigilo suas autorias.<br />

21 A Revista adota uma política de combate à endogenia, seguindo<br />

as diretrizes da CAPES, no sentido de que seja o menor possível o número<br />

de artigos publicados de autoria de professores da própria Instituição.<br />

22 A publicação não implica nenhuma espécie de remuneração, somente<br />

cabendo aos autores de artigos e resenhas o encaminhamento, gratuito,<br />

de 3 (três) exemplares do número da Revista em que tiver sido veiculada<br />

sua colaboração, havendo também o encaminhamento de 1 (um) exemplar<br />

para cada membro dos conselhos e aos revisores ad hoc.<br />

Percurso: Curitiba em Turismo, n. 6, p. 131-136, 2007.

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