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esqueceu o que sentiu. Só agora estamos começan<strong>do</strong> a compreender<br />
melhor o papel que as emoções desempenham em nossas experiências.<br />
Cada <strong>capítulo</strong> deste <strong>livro</strong> trata de uma emoção intensa. Os seis <strong>primeiro</strong>s<br />
examinam emoções negativas, como <strong>do</strong>r, me<strong>do</strong>, ansiedade,<br />
tristeza, culpa/vergonha e raiva. Os <strong>do</strong>is últimos abordam a felicidade<br />
e o amor. Embora essas duas emoções não sejam negativas, a falta de<br />
habilidade <strong>para</strong> lidar com elas pode causar grande sofrimento.<br />
E como Deus cura as feridas? Certamente não é eliminan<strong>do</strong>-as, por<br />
mais que Lhe imploremos isso. O sofrimento emocional é inevitável,<br />
mas Deus <strong>do</strong>tou o ser humano de grande sabe<strong>do</strong>ria <strong>para</strong> lidar<br />
com essas oito emoções presentes na vida de to<strong>do</strong>s. Usei passagens da<br />
Bíblia <strong>para</strong> mostrar como Deus cura a <strong>do</strong>r emocional. Seus méto<strong>do</strong>s<br />
nem sempre são aqueles que você pede e podem lhe causar surpresa.<br />
Minha formação e minha prática me levaram a concluir que a boa<br />
psicologia e a boa teologia são capazes de nos indicar o caminho da<br />
saúde. Décadas de pesquisa sustentam essa conclusão, assim como o<br />
depoimento de milhares de pessoas que compartilharam comigo suas<br />
experiências. Somos criaturas emocionais e espirituais que ferimos e<br />
amamos. Aprender o que Deus faz <strong>para</strong> curar o sofrimento irá mostrar<br />
também como Ele pode trazer mais amor à sua vida.<br />
Gostaria de lhe dar uma sugestão <strong>para</strong> que possa tirar melhor proveito<br />
deste <strong>livro</strong>. Se quiser, siga a ordem sugerida no sumário, mas<br />
você também pode começar pelas emoções que mais o afetam, marcan<strong>do</strong><br />
os casos clínicos com que mais se identifica <strong>para</strong> voltar a eles<br />
depois. Pense nas situações em que experimentou as emoções descritas<br />
e como reagiu a elas.<br />
A terapia é um processo demora<strong>do</strong> e que exige paciência. Pois, <strong>para</strong><br />
que ela funcione, é necessário desmontar estruturas perversas que problemas<br />
de infância construíram em nosso sistema emocional. Só assim<br />
seremos capazes de fazer escolhas mais livres, que promovam nosso<br />
crescimento e felicidade. Com um profun<strong>do</strong> efeito terapêutico, este<br />
<strong>livro</strong> vai alimentar você de sabe<strong>do</strong>ria e de fé no poder curativo <strong>do</strong> amor<br />
de Deus – e esses serão seus preciosos instrumentos de transformação.<br />
Capítulo 1<br />
Dor & sofrimento<br />
O PrOBLEMA DA DOr<br />
“Meu Deus, meu Deus, por que me aban<strong>do</strong>naste?”<br />
Mateus 27:46<br />
Quan<strong>do</strong> estava na cruz, Jesus pronunciou palavras que expressavam<br />
o mais completo aban<strong>do</strong>no. Na hora de seu maior sofrimento, o filho<br />
de Deus bra<strong>do</strong>u: “Meu Deus, meu Deus, por que me aban<strong>do</strong>naste?”<br />
Teólogos debateram essa frase durante anos, mas uma coisa é certa: não<br />
é uma declaração de falta de fé. Trata-se da conseqüência de um trauma<br />
psicológico. Um trauma muito intenso nos dá uma imensa sensação de<br />
solidão. Se você já se sentiu aban<strong>do</strong>na<strong>do</strong> por Deus em seu sofrimento,<br />
não é o único. O próprio Jesus experimentou esse tipo de <strong>do</strong>r.<br />
O sofrimento traumático é to<strong>ler</strong>ável<br />
se não tivermos de atravessá-lo sozinho.<br />
Um <strong>do</strong>s melhores <strong>livro</strong>s sobre o tema <strong>do</strong> sofrimento no último<br />
século é O problema <strong>do</strong> sofrimento, de C. S. Lewis. Depois que escreveu<br />
o <strong>livro</strong>, Lewis conheceu Joy Gresham, uma poetisa americana<br />
que estava estudan<strong>do</strong> na Inglaterra. Casaram-se, e Lewis desenvolveu<br />
com ela um profun<strong>do</strong> relacionamento amoroso, diferente de tu<strong>do</strong><br />
que conhecera até então. Mas, tragicamente, Joy morreu de câncer,<br />
deixan<strong>do</strong> o mari<strong>do</strong> inconsolável e desesperança<strong>do</strong>. Foi depois desse<br />
grande sofrimento que ele escreveu A anatomia de uma <strong>do</strong>r: um luto<br />
8 9
observa<strong>do</strong>, sua própria história de superação da intensa <strong>do</strong>r <strong>do</strong> luto e<br />
da perda. Lewis escreveu:<br />
Enquanto isso, onde está Deus? Esse é um <strong>do</strong>s sintomas mais inquietantes.<br />
Quan<strong>do</strong> você está feliz, tão feliz que não tem nenhuma<br />
necessidade Dele... e se volta <strong>para</strong> Ele com gratidão e louvor, é<br />
recebi<strong>do</strong> de braços abertos. Mas vá até Ele quan<strong>do</strong> estiver em desespero,<br />
quan<strong>do</strong> tu<strong>do</strong> parece ter si<strong>do</strong> em vão, e o que encontrará?<br />
Uma porta fechada e o barulho de uma tranca sen<strong>do</strong> passada<br />
duas vezes. Depois disso, um silêncio. Você pode ir embora.<br />
A franqueza de Lewis nos ajuda a entender a intensidade <strong>do</strong> sofrimento.<br />
O trauma provoca a sensação de que ninguém é capaz de nos<br />
compreender. Se a <strong>do</strong>r for muito grande, ela pode nos afastar das outras<br />
pessoas e até de Deus. Não é uma falha ou uma fraqueza. É uma<br />
característica <strong>do</strong> trauma pelo qual podemos passar um dia. Se isso<br />
acontecer, provavelmente nos sentiremos sozinhos e amedronta<strong>do</strong>s.<br />
Embora a Bíblia não explique bem o porquê dessa <strong>do</strong>r, ela nos oferece<br />
boas sugestões <strong>para</strong> lidar com ela.<br />
A coisa mais importante que Deus nos concedeu <strong>para</strong> que o sofrimento<br />
nos faça crescer, em vez de nos derrotar, é a Sua presença. Quan<strong>do</strong> estiver<br />
sofren<strong>do</strong>, volte-se <strong>para</strong> Ele e peça-Lhe <strong>para</strong> ser sua força. Como psicólogo,<br />
sei que o sofrimento traumático é to<strong>ler</strong>ável se não tivermos de atravessá-lo<br />
sozinho. Deus também não deseja isso. Ele prometeu estar presente <strong>para</strong><br />
nos sustentar em momentos de necessidade. É assim que Deus cura a <strong>do</strong>r.<br />
O SOFrIMENTO NOS TOrNA<br />
UMA PESSOA MELhOr OU PIOr?<br />
“Meus irmãos, tende por motivo de grande alegria o serdes<br />
submeti<strong>do</strong>s a múltiplas provações, pois sabeis que a vossa fé,<br />
bem provada, leva à perseverança.”<br />
Tiago 1:2-3<br />
As pessoas mais sábias que conheço já sofreram muito na vida.<br />
Mas também é verdade que as mais amargas também passaram por<br />
provações. Como isso acontece? A <strong>do</strong>r é uma força poderosa que nos<br />
empurra <strong>para</strong> uma determinada direção. Ela pode nos guiar <strong>para</strong> a<br />
maturidade e a sabe<strong>do</strong>ria ou <strong>para</strong> o desespero e a alienação.<br />
Não é o fato de sofrer que nos torna uma pessoa melhor ou pior,<br />
mas <strong>aqui</strong>lo que fazemos com o sofrimento. Ele é apenas uma força<br />
que nos impele – pode nos impelir de mo<strong>do</strong> brusco ou chegar lentamente<br />
e permanecer durante um longo perío<strong>do</strong> de tempo. Não podemos<br />
escolher o tipo de sofrimento que vamos enfrentar na vida,<br />
mas podemos escolher a direção que decidimos seguir.<br />
O sofrimento é uma força poderosa, mas podemos<br />
escolher a direção que queremos seguir.<br />
Adam procurou a terapia por causa <strong>do</strong> estresse. Trabalhava durante<br />
longas horas numa firma de consultoria e se sentia sobrecarrega<strong>do</strong><br />
com as responsabilidades <strong>do</strong> trabalho e de casa. Dedicara sua<br />
vida ao serviço religioso durante vários anos, esperan<strong>do</strong> se tornar<br />
pastor, mas isso nunca chegou a acontecer. Agora, Adam buscava a<br />
terapia <strong>para</strong> lidar com o estresse decorrente de um trabalho exigente,<br />
uma vida familiar complicada e sonhos frustra<strong>do</strong>s.<br />
Ele era o caçula de três irmãos e tinha apenas 7 anos quan<strong>do</strong> seus<br />
pais se divorciaram. Os pais não acreditavam em Deus, não se amavam<br />
e não tinham tempo <strong>para</strong> se preocupar com o filho. Por isso,<br />
Adam procurou ser auto-suficiente e decidiu não seguir o caminho<br />
<strong>do</strong>s irmãos mais velhos, que os havia leva<strong>do</strong> às drogas e à autodestruição.<br />
Dedicou-se aos estu<strong>do</strong>s, trabalhan<strong>do</strong> em meio expediente <strong>para</strong> se<br />
sustentar. Decidira desde ce<strong>do</strong> que ser responsável e optar pelo bem<br />
seria a melhor escolha.<br />
Adam se tornou cristão ainda no ensino médio e se casou com uma<br />
boa moça também cristã logo depois de se formar. Os <strong>do</strong>is sonhavam<br />
em ser pastores e servir a Deus, trabalhan<strong>do</strong> pelos mais necessita<strong>do</strong>s.<br />
10 11
Logo depois <strong>do</strong> casamento, a mulher engravi<strong>do</strong>u. To<strong>do</strong>s os sonhos de<br />
felicidade pareciam estar se realizan<strong>do</strong>. Mas as coisas nem sempre são<br />
como parecem.<br />
Pouco depois <strong>do</strong> nascimento da filha, Adam e sua mulher descobriram<br />
que a criança sofria de uma grave <strong>do</strong>ença mental. A menina<br />
nunca seria independente, precisan<strong>do</strong> de constante assistência.<br />
Ficaram arrasa<strong>do</strong>s. Sua única filha estava condenada a sofrer por toda<br />
a vida. Como Deus podia permitir que isso acontecesse a duas pessoas<br />
que queriam servi-Lo? Por que tanto sofrimento tinha que recair<br />
sobre uma criança inocente?<br />
Por causa <strong>do</strong>s cuida<strong>do</strong>s especiais de que a filha necessitava, Adam<br />
teve de arranjar um outro emprego e aban<strong>do</strong>nou o sonho <strong>do</strong> sacerdócio.<br />
Por amor à filha, aceitaram esse novo plano <strong>para</strong> suas<br />
vidas. Adam trabalhava com afinco e procurava seguir o caminho<br />
<strong>do</strong> bem.<br />
– Não consigo ganhar o suficiente –, disse ele, frustra<strong>do</strong>.<br />
– É sufocante quan<strong>do</strong> as necessidades parecem inesgotáveis – respondi.<br />
– Ir <strong>para</strong> o trabalho – ele prosseguiu –, que é brutalmente exigente,<br />
é a parte mais fácil <strong>do</strong> meu dia. Depois tenho que voltar <strong>para</strong> casa e<br />
enfrentar os maiores obstáculos da minha vida. Sempre pensei que<br />
Deus me quisesse como pastor. Mas já não sonho mais. A vontade<br />
de Deus é que eu cuide da minha família.<br />
– Ter fé não é fácil. Ainda mais quan<strong>do</strong> não sabemos o que esperar<br />
– completei.<br />
– É – disse Adam. – Minha idéia <strong>do</strong> que Deus queria <strong>para</strong> minha<br />
vida mu<strong>do</strong>u. Estou apenas tentan<strong>do</strong> encontrar forças <strong>para</strong> ser o<br />
homem de que minha filha precisa. Li que São Francisco de Assis<br />
certa vez disse: “Pregue sempre o Evangelho e, quan<strong>do</strong> necessário, use<br />
as palavras.” Acho que agora entendi o que ele queria dizer. Pregar o<br />
evangelho é dar amor <strong>para</strong> minha filha.<br />
Adam luta diariamente contra a desesperança e a frustração. Mas<br />
decidiu que o sofrimento não iria derrotá-lo. Ele poderia ter resis-<br />
ti<strong>do</strong>, se torna<strong>do</strong> amargo e poderia ter acaba<strong>do</strong> como o restante de<br />
sua família, renden<strong>do</strong>-se às drogas e à autocomiseração. No entanto,<br />
mesmo desanima<strong>do</strong> e por vezes revolta<strong>do</strong> contra Deus, Adam escolheu<br />
deliberadamente a direção de sua vida. Ele se levanta to<strong>do</strong>s os<br />
dias disposto a fazer o bem <strong>para</strong> sua família, com a convicção de<br />
que, de algum mo<strong>do</strong>, Deus lhe dará forças <strong>para</strong> sobreviver. O resulta<strong>do</strong>?<br />
Adam é um homem em pleno processo de crescimento.<br />
Apesar de ele próprio não se sentir assim, Adam é uma das melhores<br />
pessoas que conheço.<br />
O sofrimento é uma força poderosa. Não conseguiremos evitá-lo,<br />
mas poderemos escolher a direção em que ele nos levará. Deixaremos<br />
a <strong>do</strong>r nos isolar e nos empurrar <strong>para</strong> a solidão e a amargura, ou decidiremos<br />
nos fortalecer com o sofrimento <strong>para</strong> nos tornarmos pessoas<br />
cada vez melhores?<br />
A Bíblia nos ensina: “Meus irmãos, tende por motivo de grande alegria<br />
o serdes submeti<strong>do</strong>s a múltiplas provações, pois sabeis que a vossa<br />
fé, bem provada, leva à perseverança.” Perseverança é diferente de paciência.<br />
A paciência é receptiva e passiva. Ela nos ajuda a esperar pelas<br />
coisas que não temos ainda e nos dá a capacidade de aguardar até que<br />
algo melhor aconteça. Mas, <strong>para</strong> que o sofrimento contribua <strong>para</strong> o<br />
nosso crescimento, é preciso mais <strong>do</strong> que apenas suportá-lo. Assim<br />
como Adam, é preciso acordar to<strong>do</strong>s os dias e optar por praticar o<br />
bem. Não se trata de meramente manter uma atitude positiva nas<br />
provações, mas de agir com amor. É dessa forma que o sofrimento é<br />
capaz de produzir a perseverança. Esse tipo de comportamento, além<br />
de ajudar na superação da <strong>do</strong>r, traz alegria sempre que você enfrenta<br />
múltiplas provações.<br />
A Bíblia diz que Deus nos ajuda em nosso sofrimento. Isso<br />
não significa que Deus irá acabar com o sofrimento, mas que<br />
nos criou <strong>do</strong>ta<strong>do</strong>s de força e recursos <strong>para</strong> enfrentá-lo. A capacidade<br />
de perseverar é um desses <strong>do</strong>ns divinos que contribuem<br />
<strong>para</strong> nos tornarmos pessoas melhores, e não nos deixarmos destruir<br />
pela <strong>do</strong>r.<br />
12 13
SOFrEr SOzINhO<br />
“Recusar a misericórdia a seu próximo é<br />
aban<strong>do</strong>nar o temor <strong>do</strong> Poderoso.”<br />
Jó 6:14<br />
As pessoas que estão sofren<strong>do</strong> podem se encontrar no meio de<br />
uma multidão e, mesmo assim, se sentirem isoladas e estranhas ao<br />
grupo. Ficam presas a lembranças <strong>do</strong> passa<strong>do</strong> e não conseguem viver<br />
o presente. É comum sofrerem uma certa perda de identidade, não<br />
conseguin<strong>do</strong> estabelecer ligação com os outros. Não se envergonhe se<br />
já sentiu que ninguém poderia entendê-lo ou avaliar a profundidade<br />
de sua <strong>do</strong>r, nem mesmo Deus. O isolamento é uma característica <strong>do</strong><br />
sofrimento traumático.<br />
Paul é um pastor talentoso, brilhante e sensível, e líder de sua igreja.<br />
Durante muitos anos, aju<strong>do</strong>u milhares de pessoas a terem uma vida<br />
melhor e a se aproximarem de Deus. Era tão dedica<strong>do</strong> ao seu ministério<br />
que só se casou mais tarde. Alicia era bonita, muito espiritualizada<br />
e querida por to<strong>do</strong>s. Paul amava a esposa apaixonadamente e se considerava<br />
o homem mais feliz <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>.<br />
O casal viveu vários anos de maravilhosa felicidade e teve <strong>do</strong>is<br />
belos filhos antes que a tragédia acontecesse. Um dia, Alicia morreu<br />
em um acidente de automóvel. Paul ficou completamente destruí<strong>do</strong>.<br />
Sentia uma <strong>do</strong>r tão intensa quanto o amor que antes sentia pela esposa.<br />
Tentava encontrar uma explicação <strong>para</strong> essa tragédia, mas não<br />
conseguia.<br />
– Como o Deus que tanto amei permitiu que uma coisa tão terrível<br />
me acontecesse? – lamentou-se um dia <strong>para</strong> mim.<br />
– Não sei – respondi calmamente. Eu percebia que não se tratava<br />
de uma questão teológica. Paul havia aconselha<strong>do</strong> centenas de pessoas<br />
sofre<strong>do</strong>ras durante anos, mas não era de uma explicação racional<br />
que ele precisava. Precisava da minha ajuda <strong>para</strong> seu coração.<br />
– Eu não sei como vou sobreviver à <strong>do</strong>r – repetia.<br />
– Não consigo nem imaginar o quanto você sofre – respondi, abraçan<strong>do</strong>-o.<br />
Muitos anos depois, descobri que foi essa minha última afirmação<br />
que realmente confortou Paul. Naquele momento, a dimensão<br />
de sua <strong>do</strong>r criara um abismo entre ele e to<strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, até entre ele<br />
e Deus. Sentia profundamente que ninguém poderia compreender<br />
o tamanho <strong>do</strong> seu sofrimento. Comentários superficiais e consola<strong>do</strong>res<br />
pareciam um insulto e o faziam se sentir ainda mais sozinho.<br />
Para<strong>do</strong>xalmente, a única coisa que o fez se sentir compreendi<strong>do</strong> foi o<br />
fato de eu dizer que simplesmente não conseguia imaginar a profundidade<br />
de sua <strong>do</strong>r. Foi o mais próximo que alguém conseguiu chegar<br />
da gravidade d<strong>aqui</strong>lo que ele experimentava.<br />
Por causa da sua <strong>do</strong>r, Paul tirou uma licença e se afastou durante<br />
um tempo de suas atividades como pastor. Mais tarde voltou <strong>para</strong> o<br />
trabalho que amava, embora carregue até hoje uma cicatriz no coração.<br />
Acredito que ele sobreviveu à tragédia porque, apesar de se sentir<br />
muito só em seu sofrimento, não ficou sozinho. Aos poucos foi<br />
permitin<strong>do</strong> que algumas pessoas se aproximassem. Não havia muitas<br />
palavras <strong>para</strong> ajudá-lo, mas simplesmente ficávamos ao seu la<strong>do</strong>, disponíveis<br />
e solidários. E esses simples atos foram ajudan<strong>do</strong>-o a superar<br />
a <strong>do</strong>r.<br />
O sofrimento traumático acaba com a esperança e nos afasta <strong>do</strong>s outros.<br />
As palavras <strong>do</strong>s amigos talvez sejam inúteis, mas a presença deles<br />
não é. Às vezes, ficar ao nosso la<strong>do</strong> não é a única coisa que os amigos<br />
podem fazer por nós. Na verdade, é o melhor que podem fazer.<br />
A perseverança não é o único <strong>do</strong>m que Deus nos concede em momentos<br />
de sofrimento intenso <strong>para</strong> nos ajudar a sobreviver e a sermos<br />
uma pessoa melhor. Deus também nos criou com a capacidade<br />
de nos relacionarmos com os outros, mesmo quan<strong>do</strong> nos sentimos<br />
desesperadamente sós. Como no caso de Paul, podemos achar que<br />
não conseguimos ou mesmo não queremos a companhia de alguém,<br />
mas somos capazes de escolher estar com os amigos a fim de superarmos<br />
a <strong>do</strong>r.<br />
14 15
Às vezes, estar próximo não é a única coisa<br />
que se pode fazer, mas o melhor que se pode fazer.<br />
A Bíblia ensina que “recusar a misericórdia a seu próximo é aban<strong>do</strong>nar<br />
o temor <strong>do</strong> Poderoso”. Paul sobreviveu graças aos amigos que<br />
o am<strong>para</strong>ram durante o sofrimento. Embora ele não percebesse, alguém<br />
próximo e solidário faz muita diferença. Você também pode<br />
sobreviver a um sofrimento traumático se não enfrentá-lo sozinho.<br />
SOBrEVIVENTE OU VíTIMA?<br />
“Ele dá força ao cansa<strong>do</strong>, e ao desfaleci<strong>do</strong> renova o vigor.”<br />
Isaías 40:29<br />
Pessoas são vítimas de crimes de abuso e de violência to<strong>do</strong>s os dias.<br />
Se você já foi vítima de abuso ou de violência, é fundamental saber<br />
que a culpa não foi sua. É comum se acusar a vítima de ter contribuí-<br />
<strong>do</strong> de alguma forma <strong>para</strong> a agressão que sofreu. Esta é a pior maneira<br />
de explicar o absur<strong>do</strong> sofrimento, além de só aumentar a <strong>do</strong>r. Parte<br />
da cura consiste em <strong>para</strong>r de se culpar pelo que aconteceu. Mas é importantíssimo<br />
tomar consciência: embora ser vítima de abuso não<br />
seja culpa sua, continuar na situação de vítima certamente é.<br />
To<strong>do</strong> mun<strong>do</strong> atravessa circunstâncias difíceis na vida. Se essas<br />
circunstâncias forem muito difíceis, há duas maneiras de sair delas:<br />
como sobrevivente ou como vítima. Sobreviventes são pessoas que,<br />
apesar das dificuldades e sofrimentos, mantêm seu poder pessoal e a<br />
crença de que podem agir de forma diferente quan<strong>do</strong> surgirem novas<br />
provações. Vítimas são aquelas que, a partir <strong>do</strong> que sofreram, passam<br />
a se sentir impotentes e derrotadas. Se você se considera uma vítima<br />
<strong>do</strong> que lhe aconteceu no passa<strong>do</strong>, corre o enorme risco de se sentir<br />
impotente em relação ao que pode lhe acontecer no futuro.<br />
É importante entender qual é o poder que nos permite ser sobreviventes.<br />
Não é um poder exerci<strong>do</strong> sobre os outros, mas com os outros.<br />
Não é <strong>do</strong>minação, mas cooperação. Os sobreviventes são pessoas que<br />
foram vítimas de sofrimento, mas conservaram seu poder, enquanto<br />
que as vítimas o perderam. Esse poder inspira os que nos rodeiam a<br />
darem o melhor de si.<br />
Ser vítima não é culpa sua, continuar na situação<br />
de vítima certamente é.<br />
Doris procurou a psicoterapia por recomendação de seu advoga<strong>do</strong>.<br />
Ela se acidentara quan<strong>do</strong> trabalhava numa grande firma de contabilidade.<br />
Seu advoga<strong>do</strong> temia que ela entrasse em depressão e queria que<br />
eu examinasse o caso.<br />
Doris crescera em um bairro pobre da cidade, e a família sentia muito<br />
orgulho por ela ter estuda<strong>do</strong> e consegui<strong>do</strong> um emprego em uma empresa<br />
respeitável. Era uma pessoa bem-sucedida, pelo menos até o acidente.<br />
Agora Doris tinha me<strong>do</strong> de não ser mais capaz de prosseguir em<br />
sua trajetória de sucesso. Sentia <strong>do</strong>res constantes nas costas, o que<br />
dificultava muito sua permanência no emprego. O advoga<strong>do</strong> dissera<br />
que ela poderia receber uma indenização significativa que lhe daria<br />
autonomia financeira. Doris estava confusa e sofria. A idéia de conseguir<br />
uma alta soma em dinheiro a agradava, mas pensar que não<br />
voltaria a trabalhar a deprimia.<br />
– Não sei que rumo tomar – disse Doris, olhan<strong>do</strong> <strong>para</strong> fora.<br />
– O que você acha que pode fazer? – perguntei.<br />
– De fato, não sei. Meu advoga<strong>do</strong> está me pressionan<strong>do</strong> <strong>para</strong> procurar<br />
médicos que atestem a gravidade <strong>do</strong> dano físico que sofri. Ele diz que<br />
o caso é bom e que a empresa deve pagar pelo que aconteceu comigo.<br />
Não estou convencida, porque gosto tanto <strong>do</strong> meu emprego... É como<br />
se minha vida tivesse acaba<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> estava apenas começan<strong>do</strong>.<br />
– Isso é triste – comentei.<br />
– Eu sei. Tristeza é o que sinto a maior parte <strong>do</strong> tempo. E eu era tão<br />
feliz. O que está acontecen<strong>do</strong> comigo? – perguntou Doris, olhan<strong>do</strong><br />
diretamente <strong>para</strong> mim.<br />
16 17
A resposta não era simples. A <strong>do</strong>r física constante deprime, e ela<br />
estava sofren<strong>do</strong> com isso. Mas achei que esta não era a única causa da<br />
depressão. Doris também se sentia impotente.<br />
O advoga<strong>do</strong> a fizera acreditar que ela não voltaria a trabalhar, que<br />
não tinha meios <strong>para</strong> mudar seu futuro e que deveria ser compensada<br />
por isso. Uma alta recompensa financeira, somada à crença de que<br />
jamais voltaria a ser produtiva, funcionava como um grande incentivo<br />
<strong>para</strong> ela abrir mão de seu poder pessoal. Se pudesse convencer<br />
os outros de que estava realmente impedida de trabalhar, ganharia o<br />
caso. Mas isso fazia com que Doris se sentisse uma vítima.<br />
A vida é complicada. Às vezes, a solução ideal em termos legais<br />
ou políticos não é a melhor em termos psicológicos. Quero deixar<br />
claro que não acredito que um processo judicial acabe transforman<strong>do</strong><br />
uma pessoa em vítima. Tenho bons amigos advoga<strong>do</strong>s que realizam<br />
um trabalho espetacular <strong>para</strong> que seus clientes exerçam seus direitos.<br />
Mas, no caso de Doris, embora a ação judicial a ajudasse financeiramente,<br />
a agredia psicologicamente. Em termos legais, era interessante<br />
que ela fosse uma vítima, mas, psicologicamente, Doris não queria se<br />
sentir assim.<br />
Empenhei-me junto com Doris <strong>para</strong> ajudá-la a se tornar uma sobrevivente<br />
de seu sofrimento. Ela se sentia impotente em relação ao<br />
que lhe acontecera, mas rejeitava a idéia de ser uma vítima. Gostava<br />
de se ver como uma batalha<strong>do</strong>ra, e nenhum dinheiro compensaria<br />
essa conquista. O dano físico não enfraqueceu seu poder. Acreditava<br />
que podia enfrentar suas batalhas judiciais, mas recusava a condição de<br />
impotência. Doris é uma sobrevivente, o sofrimento não a derrotou.<br />
Ao tomar consciência disso, ela reagiu recuperan<strong>do</strong> sua força, tornan<strong>do</strong>-se<br />
exemplo e inspiração <strong>para</strong> to<strong>do</strong>s que a conhecem.<br />
Deus não nos aban<strong>do</strong>na em nosso sofrimento e nos deu recursos<br />
<strong>para</strong> nos tornarmos sobreviventes, e não vítimas. Ele promete força<br />
ao cansa<strong>do</strong> e vigor ao desfaleci<strong>do</strong>. A verdadeira força e o verdadeiro<br />
poder não são instrumentos <strong>para</strong> <strong>do</strong>minar os outros, mas <strong>para</strong> ajudálos<br />
a crescer. Deus nos criou com poder suficiente <strong>para</strong> sobreviver ao<br />
sofrimento. Você não deve se culpar por estar cansa<strong>do</strong> ou debilita<strong>do</strong>,<br />
mas sempre pode escolher sobreviver recorren<strong>do</strong> aos recursos de que<br />
dispõe: amigos, aconselhamento profissional e sobretu<strong>do</strong> a ajuda de<br />
Deus. Peça, com a maior convicção e intensidade, força e sabe<strong>do</strong>ria<br />
<strong>para</strong> fazer a melhor escolha. Você saberá então a diferença entre ser<br />
sobrevivente e ser vítima.<br />
COMO CONFIAr DE NOVO<br />
“Por temor diante da gritaria da multidão e por me<strong>do</strong> <strong>do</strong> desprezo<br />
<strong>do</strong>s parentes me mantive cala<strong>do</strong> e sem pôr os pés fora da porta.”<br />
Jó 31:34<br />
Ser traí<strong>do</strong> por alguém a quem estamos liga<strong>do</strong>s afetivamente ou de<br />
quem dependemos afeta nossa capacidade de confiar. Isso é ainda<br />
mais verdadeiro quan<strong>do</strong> a traição vem <strong>do</strong>s próprios pais, que deveriam<br />
proporcionar segurança. Se você foi molesta<strong>do</strong> ou engana<strong>do</strong> por<br />
pessoas que supostamente deveriam fazê-lo se sentir seguro, é possível<br />
que tenha aprendi<strong>do</strong> o quanto é arrisca<strong>do</strong> ser vulnerável.<br />
Essa é a razão pela qual temos leis que protegem as crianças de<br />
abusos. Abalar a confiança de uma criança é capaz de prejudicá-la<br />
por toda a vida, porque desenvolve nela a crença de que não se pode<br />
acreditar em ninguém. A criança cresce e segue pelo resto da vida<br />
sentin<strong>do</strong> que evitar o sofrimento é mais importante <strong>do</strong> que seguir em<br />
frente. É como tentar subir uma ladeira de bicicleta com os freios aciona<strong>do</strong>s.<br />
Não se volta <strong>para</strong> trás, mas avançar será muito mais difícil.<br />
Ser traí<strong>do</strong> por alguém de quem dependemos<br />
afeta nossa capacidade de confiar.<br />
Charlene é uma mulher atraente, inteligente e excelente profissional,<br />
mas tem dificuldade em manter um relacionamento íntimo com<br />
um homem. Ela veio <strong>para</strong> a terapia em busca de ajuda <strong>para</strong> sua vida<br />
18 19
amorosa. Desejava casar e ter filhos, mas suas experiências com homens<br />
a tinham decepciona<strong>do</strong>.<br />
– Onde estão os homens bons? – perguntou-me certo dia.<br />
– Está sen<strong>do</strong> difícil encontrar um? – indaguei.<br />
– Eu não acredito que haja um homem em quem eu possa confiar,<br />
que assuma um compromisso comigo e que não me aban<strong>do</strong>ne<br />
quan<strong>do</strong> surgirem dificuldades. To<strong>do</strong>s os homens parecem meninos<br />
que querem apenas se divertir – lamentou-se.<br />
– Acho que você está queren<strong>do</strong> meu ponto de vista como homem –<br />
eu disse. – Mas talvez seja difícil confiar em mim, porque sou homem<br />
também.<br />
– Não, com você é diferente – ela discor<strong>do</strong>u. – Eu confio em você.<br />
Mas depois de algum tempo percebi que Charlene tinha dificuldade<br />
em concordar com qualquer coisa que eu dissesse. Se eu sugeria<br />
um sentimento que ela poderia estar experimentan<strong>do</strong>, negava. Se eu<br />
tentava repetir o que ela acabara de me dizer, discordava das minhas<br />
palavras. Sem perceber, Charlene precisava se opor a mim. Não fazia<br />
isso deliberadamente, mas não se sentia segura <strong>para</strong> me aceitar.<br />
Em algum momento da terapia, Charlene me disse que fora molestada<br />
pelo pai. Já estivera em tratamento antes com uma terapeuta mulher<br />
e havia discuti<strong>do</strong> longamente esse ponto, mas achava que não tinha<br />
esgota<strong>do</strong> o assunto. Enfrentara o pai antes de ele morrer e tinha fica<strong>do</strong><br />
satisfeita por tê-lo obriga<strong>do</strong> a encarar seu comportamento perverso.<br />
Começamos a examinar as marcas que o abuso havia deixa<strong>do</strong> nela.<br />
Por ter si<strong>do</strong> molestada pelo próprio pai, Charlene acreditava que ser<br />
vulnerável a qualquer pessoa, sobretu<strong>do</strong> a um homem, era extremamente<br />
arrisca<strong>do</strong> e destrutivo. Se seu próprio pai tinha viola<strong>do</strong> sua delicada<br />
vulnerabilidade infantil, como poderia confiar que alguém não<br />
faria o mesmo? Sua reação automática aos homens era de autoproteção.<br />
O mais seguro era se defender deles, mesmo que isso conflitasse<br />
com seu sonho de casamento.<br />
Depois de alguns meses de tratamento, Charlene já não agia de<br />
mo<strong>do</strong> tão defensivo em relação aos homens. Agora ela sabe que tem<br />
condições de discernir e se proteger e está descobrin<strong>do</strong> que a vulnerabilidade<br />
nem sempre leva ao abuso. Também aprendeu, em seu<br />
relacionamento comigo, que é possível se entregar a alguém e desenvolver<br />
um relacionamento sóli<strong>do</strong> e seguro. O me<strong>do</strong> de se expor não a<br />
deixava ver isso.<br />
Pessoas que se sentiram traídas em seus relacionamentos geralmente<br />
me perguntam: “Como vou poder confiar de novo?” Da<br />
mesma maneira que Charlene, elas acham que precisam esmiuçar o<br />
outro <strong>para</strong> determinar se ele é confiável ou não. Mas consegui ajudá-la<br />
a ver que não é o conhecimento detalha<strong>do</strong> das outras pessoas<br />
que nos dá segurança, mas o conhecimento de nós mesmos. Charlene<br />
não precisa analisar profundamente to<strong>do</strong>s os homens que encontra,<br />
ela precisa se conhecer profundamente. À medida que consegue<br />
ver com mais clareza seus próprios sentimentos, ela deixa de achar<br />
que to<strong>do</strong>s os homens são perigosos ou imaturos. Seu me<strong>do</strong> de ser vulnerável<br />
impedia que ela identificasse sentimentos capazes de indicar<br />
se um relacionamento era seguro ou não. Isso a aju<strong>do</strong>u a desenvolver<br />
a confiança.<br />
ANTECIPAr A DECEPçãO<br />
“Em seguida voltará os olhos <strong>para</strong> a terra; por toda parte só se vê<br />
angústia, escuridão, noite de aflição e trevas dissolventes.”<br />
Isaías 8:22<br />
Para se protegerem de um possível sofrimento futuro, algumas<br />
pessoas antecipam a decepção, esperan<strong>do</strong> o pior, sem perceberem as<br />
conseqüências negativas dessa atitude. Sua lógica é: se imagino que<br />
isso vai acontecer, vou sofrer menos. No entanto, antecipar a decepção<br />
é quase sempre pior <strong>do</strong> que a própria decepção.<br />
Celina é uma mulher de negócios talentosa, bem casada e mãe de<br />
duas crianças maravilhosas. Seu mari<strong>do</strong> é um arquiteto bem-sucedi<strong>do</strong><br />
e pai dedica<strong>do</strong>. À primeira vista, eles parecem formar uma famí-<br />
20 21
lia perfeita. Sucesso no trabalho e felicidade em casa. Quem poderia<br />
querer mais?<br />
No entanto, Celina procurou a terapia porque as coisas nem sempre<br />
correspondem às aparências. Ela trabalhava <strong>para</strong> uma empresa<br />
na qual freqüentemente era solicitada a fazer apresentações. Era uma<br />
boa comunica<strong>do</strong>ra e muito respeitada pelos colegas, mas isso não a<br />
ajudava nos dias que antecediam as palestras. Embora tivesse sucesso<br />
na maioria das vezes, ela ficava se torturan<strong>do</strong> por antecipação.<br />
– Tenho outra grande apresentação nesta terça – disse Celina, ansiosa.<br />
– Você parece nervosa – respondi.<br />
– Bem, um de meus sócios na empresa vai estar lá – acrescentou<br />
tensa. – E, na última vez em que ele esteve presente, ficou senta<strong>do</strong>,<br />
quieto. Não esboçou um sorriso, um sinal, nada. O que é que ele estava<br />
pensan<strong>do</strong>? O que é que eu preciso fazer <strong>para</strong> ser aprovada por<br />
ele? Acho que esse homem tem algo contra as mulheres.<br />
– É desgastante ser mulher numa carreira em que os homens pre<strong>do</strong>minam<br />
– comentei.<br />
– Eu sei. Nunca sinto que estou dan<strong>do</strong> o que eles querem. Meu pai<br />
é que estava certo. Eu não deveria ter me meti<strong>do</strong> nisso – disse, colocan<strong>do</strong><br />
o rosto entre as mãos.<br />
O que era estranho na ansiedade de Celina é que suas apresentações<br />
eram sempre bem-sucedidas, o que deveria aumentar sua segurança.<br />
Mas bastavam uma ou duas reações de desapontamento<br />
<strong>para</strong> martirizá-la.<br />
À medida que sua terapia avançava, descobrimos um ponto importante<br />
na ansiedade de Celina e em seu me<strong>do</strong> <strong>do</strong> trabalho. Ela estava<br />
antecipan<strong>do</strong> a decepção. Celina era a irmã mais nova de Alan, o filho<br />
brilhante que os pais valorizavam. Cresceu ouvin<strong>do</strong> elogios entusiásticos<br />
sobre as realizações <strong>do</strong> irmão e sua importância como o “filho mais<br />
velho”. Viver sob essa sombra deu a Celina a sensação de que desapontava<br />
constantemente os pais. Sair-se bem na escola ou em atividades<br />
extracurriculares nunca era suficiente. Ela jamais seria como o irmão e<br />
não havia nada que pudesse fazer a respeito. Ele era o principal motivo<br />
de orgulho <strong>do</strong>s pais. Ela era apenas a irmã mais nova de Alan.<br />
Antecipar a decepção é quase sempre pior<br />
<strong>do</strong> que a própria decepção.<br />
A mudança é lenta, mas Celina está perceben<strong>do</strong> que as raízes de<br />
seu sentimento remontam à infância e que tentar se proteger <strong>do</strong> desapontamento,<br />
antecipan<strong>do</strong>-o, não ajuda em nada. Durante muitos<br />
anos ela se via como uma constante decepção <strong>para</strong> os pais, mas agora<br />
é adulta e não depende da aprovação <strong>do</strong>s outros <strong>para</strong> saber quem é.<br />
É claro que nem todas as suas palestras serão um sucesso e que algumas<br />
pessoas ficarão desapontadas. Mas não significa que ela seja uma<br />
decepção. Em vez de tomar posse de seu valor e de se alegrar, Celina<br />
direcionava sua energia <strong>para</strong> se prevenir da decepção que antecipava.<br />
E isso estava causan<strong>do</strong> um sofrimento desnecessário em sua vida.<br />
A Bíblia nos diz que há pessoas como Celina que só verão angústia,<br />
escuridão, noite de aflição e trevas dissolventes. Mas a antecipação negativa<br />
traz sempre um sofrimento inútil e desgastante. Em vez de antecipar<br />
a decepção, elas devem desenvolver a capacidade de to<strong>ler</strong>á-la<br />
se e quan<strong>do</strong> vier. Causar decepção não significa que você seja uma<br />
decepção. Decepções surgem durante a vida, e é preciso coragem e<br />
sabe<strong>do</strong>ria <strong>para</strong> conviver com elas. Nosso objetivo não deve ser uma<br />
vida sem decepções, pois isso é impossível. É ter força <strong>para</strong> lidar com<br />
elas quan<strong>do</strong> surgirem.<br />
Deus disse, “Aquele que me escuta, porém, habitará com segurança,<br />
viverá tranqüilo, sem recear dano algum”. É claro que isso não significa<br />
que nenhum mal vai lhe acontecer. Basta <strong>ler</strong> a Bíblia <strong>para</strong> descobrir<br />
que pessoas dedicadas a Deus tiveram de lidar com muita <strong>do</strong>r e<br />
sofrimento. O que realmente significa é que, se confiarmos em Deus,<br />
não precisaremos temer o mal, pois, quan<strong>do</strong> ele vier, Deus nos dará<br />
capacidade <strong>para</strong> lidar com ele. Aprender a to<strong>ler</strong>ar e lidar com as decepções<br />
– em vez de antecipá-las – é de grande ajuda na vida.<br />
22 23
FErIMOS AQUELE QUE MAIS AMAMOS<br />
“Os golpes <strong>do</strong> amigo são leais, mas o inimigo é pródigo em beijos.”<br />
Provérbios 27:6<br />
Dizemos às pessoas mais amadas coisas que jamais diríamos nem<br />
mesmo aos nossos amigos, porque estes não as to<strong>ler</strong>ariam. Se você<br />
tratasse seus amigos da maneira como trata seu cônjuge ou parentes<br />
mais próximos, não teria amigos. Este é um aspecto desagradável da<br />
intimidade: o amor faz as pessoas perderem a cerimônia.<br />
Quan<strong>do</strong> amamos alguém, queremos aprofundar a relação. A Bíblia<br />
nos diz que “o inimigo é pródigo em beijos”, o que significa que os inimigos<br />
são amáveis com pessoas de quem não gostam apenas <strong>para</strong> defender<br />
seus próprios interesses. Falta sinceridade a seus beijos, e eles<br />
exageram em suas manifestações <strong>para</strong> encobrir os reais sentimentos.<br />
Mas “os golpes <strong>do</strong> amigo são leais” porque amigos são sinceros e dizem<br />
a verdade, mesmo que às vezes isso magoe. O problema é como sermos<br />
“verdadeiros” quan<strong>do</strong> somos feri<strong>do</strong>s por alguém que amamos. Muitas<br />
vezes, ao querermos ser sinceros a respeito de nossos sentimentos feri<strong>do</strong>s,<br />
achamos que podemos magoar quem nos agrediu.<br />
Para amar alguém de verdade é preciso aceitar a própria vulnerabilidade.<br />
Tirar a máscara superficial, politicamente correta, e deixar que<br />
o outro nos veja como somos realmente. Isso é necessário no amor.<br />
No entanto, ser vulnerável é também correr o risco de ser feri<strong>do</strong> profundamente.<br />
Quan<strong>do</strong> isso acontece, somos capazes de dizer e fazer<br />
coisas prejudiciais de forma violenta com as pessoas mais próximas.<br />
E é nesse momento que magoamos aqueles que mais amamos.<br />
O mo<strong>do</strong> como falamos com alguém é tão importante<br />
quanto o que estamos tentan<strong>do</strong> dizer.<br />
Donna e Michael procuraram a terapia de casal por causa das<br />
constantes brigas, uma das razões que geralmente levam os casais à<br />
psicoterapia. As pessoas se casam porque se sentem atraídas pelas características<br />
<strong>do</strong> outro, que são diferentes das suas. Mas, com o passar<br />
<strong>do</strong> tempo, essas mesmas características começam a irritar e provocam<br />
um enorme desgaste. Era o caso de Donna e Michael.<br />
– A terapia não está funcionan<strong>do</strong>. Ele não mu<strong>do</strong>u nada – queixou-se<br />
Donna no início de nossa quinta sessão.<br />
– Do que é que você precisa? – perguntei. Percebi que eu teria que<br />
ser firme <strong>para</strong> não perder o controle da sessão. Procurar a terapia <strong>para</strong><br />
tentar mudar o parceiro é um erro cometi<strong>do</strong> pela maioria das pessoas<br />
que estão precisan<strong>do</strong> de ajuda. Eu queria que cada um <strong>do</strong>s <strong>do</strong>is permanecesse<br />
foca<strong>do</strong> em suas próprias necessidades e sentimentos e que<br />
não caíssem na armadilha de se acusarem mutuamente, o que é inútil<br />
e destrutivo.<br />
– Eu preciso que ele pare de mentir! – respondeu Donna enfaticamente.<br />
– Acusações não vão ajudar – eu disse com firmeza. – Então tente<br />
falar <strong>do</strong>s seus sentimentos e não <strong>do</strong> que está erra<strong>do</strong> com Michael.<br />
– Tu<strong>do</strong> bem. Eu sinto que ele precisa <strong>para</strong>r de ser mentiroso – ela<br />
afirmou com uma certa rispidez.<br />
– Isso não é um sentimento – repeti. – O que você está sentin<strong>do</strong><br />
neste exato momento?<br />
A expressão <strong>do</strong> rosto de Donna mu<strong>do</strong>u. Notei que ela tentava entender<br />
o que eu dizia. Estava acostumada a falar <strong>do</strong>s defeitos <strong>do</strong> mari<strong>do</strong><br />
e não a expressar seus próprios sentimentos. Mas atacar o caráter<br />
dele não a levava a lugar algum, e eu pretendia oferecer algumas ferramentas<br />
<strong>para</strong> ajudá-la.<br />
– Sinto me<strong>do</strong> – falou com os lábios trêmulos. – Michael me disse<br />
que eu podia sair <strong>do</strong> emprego porque ele cuidaria de nós financeiramente,<br />
e agora eu descubro que estamos deven<strong>do</strong> 80 mil dólares.<br />
Como você acha que eu me sinto? Estou apavorada, com me<strong>do</strong> de<br />
perder tu<strong>do</strong> o que temos – completou, irrompen<strong>do</strong> em lágrimas.<br />
– Michael – falei calmamente, dirigin<strong>do</strong>-me a ele. – Você sabia que<br />
Donna se sentia assim?<br />
24 25
– Bem, não – respondeu Michael, olhan<strong>do</strong> <strong>para</strong> seus sapatos. – O<br />
que eu sabia é que ela estava furiosa, e eu detesto conversar quan<strong>do</strong><br />
ela está com raiva.<br />
– E o que você sente ao ouvir isso agora? – perguntei.<br />
– Eu me sinto muito mal, porque vejo que ela está assustada – ele<br />
respondeu com mais segurança. – Não quero que minha mulher<br />
sinta me<strong>do</strong>. Fizemos uma segunda hipoteca <strong>para</strong> termos uma reserva<br />
quan<strong>do</strong> precisássemos, e eu usei o dinheiro <strong>para</strong> pagar a construção da<br />
casa. Estou com os pagamentos em dia. Não menti <strong>para</strong> ela, só achei<br />
que cabia a mim cuidar das finanças, e é exatamente o que estou fazen<strong>do</strong>.<br />
Peço desculpa se não avisei que estava sacan<strong>do</strong> dinheiro da reserva.<br />
Achei que você queria deixar esses assuntos por minha conta.<br />
realmente Donna e Michael se amavam muito. Mas, quan<strong>do</strong> alguém<br />
que amamos nos magoa, sentimos muita raiva. Donna estava<br />
com raiva de Michael porque precisava se sentir segura com o homem<br />
que amava. Estava furiosa porque desejava confiar nele e não conseguia.<br />
Mas Michael não conseguia captar a mensagem. Tu<strong>do</strong> o que ele<br />
ouvia era que a mulher não confiava nele e que ele era um fracasso<br />
como mari<strong>do</strong>.<br />
Michael amava Donna e queria cuidar dela. Trabalhava muito <strong>para</strong><br />
sustentar a família a que se dedicava inteiramente. Donna, porém,<br />
não entendia assim. A mensagem que ela captava era que ele estava<br />
esconden<strong>do</strong> algo e que talvez pensasse em aban<strong>do</strong>ná-la.<br />
Com o tempo, Donna e Michael <strong>para</strong>ram de ferir um ao outro.<br />
Donna deixou de atacar o mari<strong>do</strong>, e Michael abriu-se com ela de<br />
um mo<strong>do</strong> que a fez se sentir segura. Agora eles vêem que o mo<strong>do</strong><br />
de falar com alguém é tão importante quanto o que você está queren<strong>do</strong><br />
dizer. A raiva e a desconfiança só criam afastamento. Donna<br />
e Michael desejavam ficar próximos – só precisavam de uma ajuda<br />
<strong>para</strong> alcançar isso.<br />
Qual é sua expectativa em relação ao casamento? Você acha que<br />
seu parceiro nunca vai cometer uma falha? Que você nunca vai se magoar?<br />
Se pensar assim, sofrerá uma grande decepção. O importante é<br />
acreditar que você está com alguém que não deseja feri-lo, mas que,<br />
ainda assim, é capaz disso, porque é um ser humano. Alguém que deseja<br />
construir uma relação de companheirismo e cumplicidade. Uma<br />
pessoa capaz de pedir desculpa e de se empenhar <strong>para</strong> não repetir o<br />
comportamento que o magoou. É isso que os amigos fazem, e esta é a<br />
razão pela qual a Bíblia diz que os golpes <strong>do</strong> amigo são leais. Não se esqueça<br />
que amigos falam uns com os outros basea<strong>do</strong>s no respeito e na<br />
certeza de que são ama<strong>do</strong>s, mas não com a intenção de ferir. Não há<br />
nada melhor <strong>do</strong> que construir um verdadeiro relacionamento amoroso<br />
com alguém que é ao mesmo tempo amante e amigo.<br />
LIMITES PODEM FErIr, MAS AJUDAM<br />
“Toda correção, com efeito, no momento não parece<br />
motivo de alegria, mas de tristeza.”<br />
hebreus 12:11<br />
A vida machuca. O nosso desejo é amplo, mas a to<strong>do</strong> momento<br />
nos de<strong>para</strong>mos com limites. Não gostamos deles, mas limites são absolutamente<br />
necessários <strong>para</strong> nos dar parâmetros que nos ajudem a<br />
crescer. O importante é aprender a lidar com os limites. Porque, embora<br />
possam nos machucar, eles mostram a direção <strong>para</strong> um crescimento<br />
saudável.<br />
Os limites são uma maneira de dizer “sim” e “não” ao mesmo<br />
tempo. Na infância, você teve de aprender onde terminavam os seus<br />
direitos e começavam os <strong>do</strong>s outros. Entender o significa<strong>do</strong> <strong>do</strong> “não”<br />
aju<strong>do</strong>u-o a perceber que o mun<strong>do</strong> não girava em torno de você e que<br />
era fundamental conhecer os limites <strong>para</strong> construir uma vida feliz.<br />
Dizer “não” <strong>para</strong> algumas coisas permite que digamos “sim” <strong>para</strong> outras.<br />
São nossas escolhas: <strong>para</strong> ganhar alguma coisa, precisamos perder<br />
outra.<br />
Podemos até não gostar, mas ter limites estabeleci<strong>do</strong>s e defini-los<br />
<strong>para</strong> aqueles que nos cercam é altamente positivo.<br />
26 27
É fundamental conhecer seus próprios limites<br />
<strong>para</strong> construir uma vida feliz.<br />
Minha mulher, Barbara, e eu pensamos muito antes de escolher<br />
o jardim-de-infância <strong>para</strong> onde iríamos enviar nosso filho Brendan.<br />
Queríamos um lugar onde ele pudesse se desenvolver em termos<br />
acadêmicos, porém, mais importante <strong>do</strong> que isso, queríamos que ele<br />
se tornasse um homem de caráter. Seu desenvolvimento espiritual e<br />
emocional era tão essencial quanto seu desempenho acadêmico.<br />
Encontramos uma escola maravilhosa, com professores atenciosos,<br />
programas dinâmicos e ênfase no desenvolvimento espiritual e<br />
emocional <strong>do</strong>s alunos. Ficamos radiantes.<br />
Brendan fez logo vários amigos. Em pouco tempo já era o melhor<br />
amigo de David, provavelmente a criança mais brilhante da turma e<br />
um líder natural. David era autoritário, conhecia as regras de todas<br />
as brincadeiras (ou as criava se não conhecesse) e se colocava como o<br />
principal responsável por tu<strong>do</strong>. Brendan a<strong>do</strong>rava David.<br />
Aos poucos uma hierarquia foi se estabelecen<strong>do</strong>. As crianças<br />
menos extrovertidas por vezes não eram chamadas a opinar, enquanto<br />
que as mais autoritárias (como David e Brendan) participavam<br />
de todas as tomadas de decisão. E havia um menino em particular,<br />
robert, que às vezes era excluí<strong>do</strong> <strong>do</strong>s jogos.<br />
Barbara logo notou o que estava acontecen<strong>do</strong> e procurou a mãe de<br />
David <strong>para</strong> falar de suas preocupações e descobrir o que poderia ser<br />
feito, sobretu<strong>do</strong> em relação a robert. Para surpresa de minha mulher,<br />
a mãe de David não via problema algum no comportamento <strong>do</strong> filho.<br />
Disse que ele era um líder natural e que não ia fazer nada <strong>para</strong> conter<br />
sua forma de agir. Achava que as crianças deveriam resolver seus<br />
problemas sem a interferência <strong>do</strong>s pais e, se as outras não conseguiam<br />
fazer frente a David, deveriam aprender a se defender melhor.<br />
Barbara discordava. To<strong>do</strong>s os dias, ao levar Brendan <strong>para</strong> a escola, ela<br />
conversava com ele, procuran<strong>do</strong> incutir em nosso filho o respeito pelos<br />
colegas mais tími<strong>do</strong>s, mostran<strong>do</strong>-lhe o sofrimento de se sentir excluí<strong>do</strong> e<br />
mesmo agredi<strong>do</strong>. Após alguns “castigos” e privilégios perdi<strong>do</strong>s, Brendan<br />
começou a respeitar mais as outras crianças. Ele não gostava muito, mas,<br />
através da disciplina, aprendeu a lidar melhor com os colegas.<br />
Um dia, ao chegar à escola, Brendan correu to<strong>do</strong> entusiasma<strong>do</strong> até<br />
David <strong>para</strong> cumprimentar seu melhor amigo.<br />
– Brendan! – falou David inocentemente. – Adivinha...<br />
– O quê? – Brendan perguntou, esperan<strong>do</strong> ansiosamente o começo<br />
da brincadeira seguinte.<br />
– Eu decidi que to<strong>do</strong> mun<strong>do</strong> vai odiar o robert – respondeu<br />
David.<br />
– O quê? – se espantou Brendan.<br />
– É isso mesmo – continuou David. – Eu não gosto dele, e to<strong>do</strong>s os<br />
outros disseram que não vão mais ser amigos dele.<br />
Nosso filho parou um instante, olhou bem nos olhos <strong>do</strong> amigo,<br />
e disse com toda a firmeza de que um menino de 6 anos era capaz:<br />
“Não.”<br />
Meio choca<strong>do</strong>, David encarou Brendan.<br />
– Não – repetiu Brendan. – Isso não é legal. Se você não é mais<br />
amigo <strong>do</strong> robert, então não sou mais seu melhor amigo. – E simplesmente<br />
virou as costas e correu <strong>para</strong> se juntar às outras crianças que<br />
estavam brincan<strong>do</strong> por perto.<br />
Em pouco tempo as coisas pioraram, não <strong>para</strong> robert, mas <strong>para</strong><br />
David. Ele começou a ter problemas de disciplina na sala de aula, as<br />
outras crianças <strong>para</strong>ram de segui-lo nas brincadeiras e várias mães<br />
procuraram a mãe de David <strong>para</strong> falar <strong>do</strong> mau comportamento <strong>do</strong><br />
menino. Por fim, ela resolveu mudar seu mo<strong>do</strong> de educar o filho.<br />
recusar-se a estabelecer limites <strong>para</strong> o mau comportamento de David<br />
não o ajudava a se desenvolver adequadamente. Definir limites não<br />
apenas contribuía <strong>para</strong> que ele prejudicasse menos os outros, como<br />
também o ajudava a <strong>para</strong>r de prejudicar a si mesmo, pois começava a<br />
ser rejeita<strong>do</strong> como um tirano.<br />
Não estou dizen<strong>do</strong> que Brendan se transformou por causa da aplicação<br />
de uns castigos e da perda de alguns privilégios. Barbara e eu<br />
28 29
gastamos muito tempo e energia estabelecen<strong>do</strong> limites <strong>para</strong> ele durante<br />
anos. E ainda que fosse quase sempre difícil <strong>para</strong> ele (e <strong>para</strong><br />
nós), valeu a pena. Talvez nosso filho tenha deixa<strong>do</strong> de se divertir por<br />
não fazer todas as coisas <strong>do</strong> seu jeito, mas em compensação foi desenvolven<strong>do</strong><br />
o caráter. Acreditamos que qualquer desconforto causa<strong>do</strong><br />
pelo estabelecimento de limites foi muito menor <strong>do</strong> que o sofrimento<br />
que teria na vida se não houvesse esses limites. Deus nos disse que<br />
“toda correção, com efeito, no momento não parece motivo de alegria,<br />
mas de tristeza. Depois, no entanto, produz naqueles que foram exercita<strong>do</strong>s<br />
um fruto de paz e de justiça”.<br />
PESSOAS FErIDAS FErEM<br />
“Vede que ninguém retribua o mal com o mal;<br />
procurai sempre o bem uns <strong>do</strong>s outros e de to<strong>do</strong>s.”<br />
I Tessalonicenses 5:15<br />
Às vezes, quan<strong>do</strong> somos magoa<strong>do</strong>s ou agredi<strong>do</strong>s, queremos “acertar<br />
as contas” <strong>para</strong> que o outro sinta a mesma <strong>do</strong>r. Pessoas feridas<br />
e ressentidas atacam impie<strong>do</strong>samente quem as agride, prejudican<strong>do</strong><br />
sobretu<strong>do</strong> a si mesmas. Por isso, lembre-se que quan<strong>do</strong> nos sentimos<br />
feri<strong>do</strong>s corremos o risco de ferir quem nos atacou.<br />
Se você foi feri<strong>do</strong>, corre o risco de ferir também.<br />
Erramos ao pensar que alguém é mau porque nos fez mal. Isso nos<br />
dá motivos <strong>para</strong> feri-lo também. O raciocínio subjacente é: pessoas<br />
más fazem mal a outras e por isso devem sofrer. Talvez nossa <strong>do</strong>r não<br />
diminua, porém achamos que isso nos fará sentir um pouco melhor.<br />
Mas nem sempre é verdade.<br />
ruth e Alex se apaixonaram quan<strong>do</strong> estavam no último ano da faculdade.<br />
Tinham muito em comum. Ela queria se formar enfermeira<br />
e depois casar, ter filhos e ser <strong>do</strong>na-de-casa. Alex queria ser médico e<br />
se casar com uma mulher de princípios tradicionais, que valorizasse o<br />
papel de <strong>do</strong>na-de-casa. Os <strong>do</strong>is combinavam em suas posições políticas<br />
e religiosas e se sentiam atraí<strong>do</strong>s um pelo outro. Seis meses depois<br />
ficaram noivos.<br />
Contu<strong>do</strong>, no amor nem sempre as coisas são como se planeja.<br />
Depois de forma<strong>do</strong>s, Alex ingressou na residência médica e ruth<br />
começou a trabalhar como enfermeira em um hospital numa cidade<br />
vizinha. Conviveram pouco no ano seguinte, mas isso não constituía<br />
problema, pois tinham planos maiores <strong>para</strong> a vida. Encontravam-se<br />
nos finais de semana quan<strong>do</strong> Alex tinha algum tempo disponível, o<br />
que era difícil, mas os <strong>do</strong>is sentiam que estavam lutan<strong>do</strong> por algo que<br />
valia a pena.<br />
Com o passar <strong>do</strong> tempo, o relacionamento mu<strong>do</strong>u. Alex aproximou-se<br />
de seus companheiros de estu<strong>do</strong>, e ruth se sentia mais bem<br />
compreendida pelos colegas <strong>do</strong> hospital <strong>do</strong> que pelo noivo. Um dia os<br />
<strong>do</strong>is chegaram à conclusão de que precisavam ter uma conversa.<br />
– O que está acontecen<strong>do</strong> conosco? – ruth perguntou após alguns<br />
minutos de silêncio. – Não somos mais carinhosos um com o outro,<br />
só falamos de trabalho, e não me lembro da última vez em que você<br />
disse que me amava.<br />
– Eu sei – falou Alex com tristeza. – Acho que as coisas mudaram.<br />
– O que isso significa? – perguntou ruth. – Concordamos em nos<br />
se<strong>para</strong>r durante algum tempo <strong>para</strong> construir nossos sonhos <strong>para</strong> o<br />
futuro. Está tentan<strong>do</strong> dizer que não me ama mais?<br />
– Não sei – respondeu Alex, baixan<strong>do</strong> os olhos. – Nós nos afastamos<br />
muito. Se já não nos sentimos como antes, não sei se devemos<br />
nos casar. Simplesmente não sei.<br />
– Ah, mas eu sei – exclamou ruth com raiva. – Sei que você prometeu<br />
casar comigo quan<strong>do</strong> ficamos noivos e não posso acreditar que<br />
esteja desistin<strong>do</strong> da promessa. Depois de tu<strong>do</strong> o que fiz <strong>para</strong> conseguir<br />
esse trabalho, agora você vem me dizer que não sabe mais! Detesto<br />
ouvir o que você está dizen<strong>do</strong> e detesto você por fazer isso comigo.<br />
Como pude ser tão idiota!<br />
30 31
Alex e ruth romperam. Alex se sentia mal e desaponta<strong>do</strong><br />
porque seus planos não deram certo, mas ruth estava furiosa,<br />
magoada e humilhada. Quan<strong>do</strong> se apaixonam, as pessoas têm a<br />
profunda sensação de estarem conectadas, o que as faz sentir que<br />
podem contar uma com a outra <strong>para</strong> sempre. ruth sentia muita<br />
raiva.<br />
Nas três semanas seguintes ela não conseguia <strong>para</strong>r de pensar<br />
em Alex. As músicas que ouvia traziam lembranças dele, os médicos<br />
<strong>do</strong> hospital a faziam pensar nele, e ela detestava suas noites<br />
porque se sentia só e traída. O que antes era uma promessa, ela<br />
agora percebia como uma mentira. ruth não conseguia se desligar<br />
disso.<br />
ruth falou abertamente com amigos comuns sobre o que ela considerava<br />
uma falta de caráter de Alex e não poupou críticas ao ex-noivo<br />
com outros médicos. Chegou a achar que precisava proteger outras<br />
mulheres das manobras dele. Então se dirigiu ao hospital onde Alex<br />
trabalhava e desfiou uma lista <strong>do</strong>s seus defeitos de caráter diante de<br />
to<strong>do</strong>s os seus colegas. ruth provavelmente sabia que o estava prejudican<strong>do</strong><br />
pessoal e profissionalmente, mas achava que Alex merecia isso.<br />
Afinal de contas, ele era um mentiroso.<br />
ruth feriu Alex com seu rancor, deixan<strong>do</strong>-o constrangi<strong>do</strong> e furioso.<br />
Ela acabou seguin<strong>do</strong> seu caminho, mas se prejudicou profundamente<br />
ao atacar Alex da forma como o fez. Mostrou-se descontrolada<br />
e insegura aos olhos de to<strong>do</strong>s.<br />
Pessoas feridas ferem. Nem Alex nem ruth eram más pessoas,<br />
mas como to<strong>do</strong>s os seres humanos, eram capazes de ferir e ser feri<strong>do</strong>s.<br />
Deus nos a<strong>ler</strong>tou <strong>para</strong> não retribuir o mal com o mal, porque<br />
sabe que isso não nos faz crescer. Com seu comportamento,<br />
ruth não aju<strong>do</strong>u Alex em nada, além de tornar mais difícil <strong>para</strong><br />
ela própria confiar em outro homem no futuro. Podemos aprender<br />
alguma coisa com o erro de ruth. Se você foi magoa<strong>do</strong> por alguém<br />
próximo, lembre-se que está sujeito a revidar com seu rancor. E que<br />
isso não lhe fará bem.<br />
NEGAçãO<br />
“...e ser acha<strong>do</strong> nele, não ten<strong>do</strong> como minha<br />
justiça aquela que vem da Lei…”<br />
Filipenses 3:9<br />
A negação é uma tentativa de afastar o sofrimento. É um mecanismo<br />
de defesa psicológica, geralmente inconsciente, que usamos<br />
<strong>para</strong> nos proteger de sentimentos <strong>do</strong>lorosos. Se você diz a si mesmo<br />
que não sente tristeza em relação a alguma coisa, pode ser capaz de se<br />
convencer e de convencer os outros de que seu sofrimento acabou.<br />
Ninguém gosta de sofrer. A negação pode ser uma forma de fingir<br />
que não estamos sofren<strong>do</strong>.<br />
Vez por outra a negação é um mecanismo de defesa necessário.<br />
É insuportável sentir <strong>do</strong>r o tempo to<strong>do</strong>. Portanto, às vezes negamos<br />
<strong>para</strong> fugir da <strong>do</strong>r. Mas se não estivermos conscientes de que estamos<br />
usan<strong>do</strong> a negação, ela pode ser perigosa. É possível que cause ainda<br />
mais sofrimento <strong>do</strong> que aquele que estamos tentan<strong>do</strong> negar.<br />
Deus não quer que neguemos nosso sofrimento.<br />
Ele quer nos dar forças <strong>para</strong> enfrentá-lo.<br />
Daniel freqüenta a igreja regularmente e, membro assíduo <strong>do</strong>s cultos,<br />
é respeita<strong>do</strong> por seus conhecimentos. Deseja ocupar uma função<br />
na igreja, mas sente-se frustra<strong>do</strong> porque seu pastor acha que posições<br />
de responsabilidade só devem ser concedidas após muita consideração.<br />
Como a Bíblia diz: “Meus irmãos, não haja muitos entre vós a se<br />
arvorar em mestres; sabeis que sereis julga<strong>do</strong>s mais severamente.”<br />
Daniel é um homem bom, mas nem sempre foi assim. Cresceu em<br />
meio a abusos, casou-se com uma alcoólatra, tal como era sua mãe, e<br />
enfrentou uma vida de crimes e vícios antes de se converter. Já passou<br />
por maus boca<strong>do</strong>s e sempre agradece a Deus por sua conversão.<br />
Agora está casa<strong>do</strong> com uma mulher bon<strong>do</strong>sa e tem um emprego es-<br />
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tável. Ele fala de seu passa<strong>do</strong> dan<strong>do</strong> testemunho de como Deus pode<br />
nos salvar <strong>do</strong> peca<strong>do</strong>. Entretanto, Daniel nega todas as marcas que o<br />
sofrimento deixou nele. Sua negação faz com que seu pastor perceba<br />
que Daniel baseia mais sua força na negação <strong>do</strong>s próprios problemas<br />
<strong>do</strong> que na confiança na força de Deus.<br />
O chefe de Daniel começou a constatar alguns problemas em<br />
seu desempenho profissional. Daniel não os admitiu e, depois de<br />
cometer uma série de erros que tentou minimizar, foi finalmente<br />
demiti<strong>do</strong>, o que o deixou muito humilha<strong>do</strong>. Sentiu-se injustiça<strong>do</strong><br />
em vez de encarar seus erros de frente. Negou tanto as faltas<br />
quanto o sofrimento decorrente da demissão e atribuiu toda a<br />
culpa ao chefe.<br />
A angústia de Daniel e os sentimentos de vergonha e fracasso reprimi<strong>do</strong>s<br />
o levaram de volta às drogas. Mesmo saben<strong>do</strong> que estava erra<strong>do</strong>,<br />
não conseguiu evitar. Escolheu o deus <strong>do</strong> vício em vez <strong>do</strong> Deus<br />
da vida <strong>para</strong> tentar estancar a <strong>do</strong>r.<br />
Os meses seguintes foram um pesadelo <strong>para</strong> Daniel e sua mulher.<br />
Ele desapareceu durante dias, e ela foi obrigada a gastar suas<br />
economias <strong>para</strong> quitar a hipoteca da casa. Daniel estava reviven<strong>do</strong><br />
seu passa<strong>do</strong> e arrastan<strong>do</strong> com ele as pessoas mais próximas. Não<br />
feria apenas a si próprio. Estava prejudican<strong>do</strong> também aqueles que<br />
o amavam.<br />
Daniel finalmente conseguiu <strong>para</strong>r de consumir drogas e voltou a<br />
ter uma vida saudável. Agora sua mulher está mais tranqüila, mas talvez<br />
sejam necessários anos <strong>para</strong> que ela consiga recuperar a confiança<br />
no mari<strong>do</strong>. Daniel voltou <strong>para</strong> a igreja, mas o pastor se preocupa com<br />
sua estabilidade emocional e espiritual. Ele ainda fala na graça divina<br />
e no quanto é grato por ter seus peca<strong>do</strong>s per<strong>do</strong>a<strong>do</strong>s. Mas não creio<br />
que o pastor lhe dará qualquer cargo de confiança.<br />
Por ter sofri<strong>do</strong> muito no passa<strong>do</strong>, Daniel quer acreditar que Deus é<br />
capaz de eliminar o sofrimento de sua vida agora. Isso é negação, não<br />
é fé. Deus não quer que neguemos nosso sofrimento. Ele nos dá forças<br />
<strong>para</strong> enfrentá-lo. É esse o princípio espiritual que norteia a advertên-<br />
cia <strong>do</strong>s Alcoólicos Anônimos: um dia de cada vez. Deus não remove<br />
o sofrimento de nossa vida, mas nos dá recursos <strong>para</strong> lidar com ele<br />
diariamente. Negar nossas <strong>do</strong>res e nossos problemas é apenas justificar<br />
nossos atos. Encará-los de frente, assumir a responsabilidade por<br />
eles e pedir a Deus força e sabe<strong>do</strong>ria <strong>para</strong> lidar com as dificuldades é<br />
sempre uma alternativa melhor.<br />
Alguns psicólogos não aprovam os princípios <strong>do</strong>s Alcoólicos<br />
Anônimos. A prática <strong>do</strong>s AA de se voltar <strong>para</strong> uma Força Superior no<br />
intuito de enfrentar o sofrimento, como também de admitir a própria<br />
impotência em relação a algumas coisas, não se encaixa na visão de<br />
alguns terapeutas. Eu concor<strong>do</strong> com esses princípios. Perceber que<br />
você não é Deus e que precisa de alguém <strong>para</strong> ajudá-lo é um sinal de<br />
força, não de fraqueza.<br />
A SOLUçãO PArA O SOFrIMENTO:<br />
COMO DEUS CUrA A DOr<br />
“Então clamarás e Iahweh responderá, clamarás<br />
por socorro e ele dirá: ‘Eis-me <strong>aqui</strong>!’”<br />
Isaías 58:9<br />
Sofrer não é uma opção, pois muitas vezes o sofrimento se impõe.<br />
Mas a forma de sofrer é uma escolha nossa. Podemos escolher entre<br />
sofrer em silêncio ou chorar e gritar. Podemos buscar o significa<strong>do</strong><br />
por trás <strong>do</strong> sofrimento ou simplesmente aceitá-lo tal como é. Existem<br />
muitas abordagens. Contu<strong>do</strong>, independentemente da forma escolhida,<br />
devemos aprender a melhor maneira de sofrer se quisermos<br />
fazer da <strong>do</strong>r uma ferramenta <strong>para</strong> o nosso crescimento.<br />
No dia 11 de setembro de 2001 levantei-me por volta de 5h30 <strong>para</strong><br />
dar uma entrevista por telefone a uma rádio. Eu estava em minha<br />
casa, em Los Angeles, a quase 5 mil quilômetros de Nova York.<br />
Subitamente a entrevista<strong>do</strong>ra deu um grito e exclamou:<br />
– Alguém explodiu o World Trade Center!<br />
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Eu não sabia o que dizer. Aquilo parecia inacreditável. Ela pediu<br />
<strong>para</strong> interrompermos a ligação porque estava preocupada com o mari<strong>do</strong>,<br />
que saíra ce<strong>do</strong> de casa.<br />
Desliguei o telefone, liguei a televisão e vi a Torre Norte <strong>do</strong> World<br />
Trade Center envolta em fumaça. Parecia um pesadelo, mas não o<br />
noticiário matinal. E depois, bem diante <strong>do</strong>s meus olhos, assisti ao<br />
segun<strong>do</strong> avião atingir a Torre Sul e explodi-la em chamas. Fiquei estarreci<strong>do</strong>.<br />
Sofrer não é uma opção, mas a forma<br />
de sofrer é uma escolha nossa.<br />
Aquele acidente horrível desencadeou uma série de acontecimentos.<br />
Em uma hora e meia, um <strong>do</strong>s mais importantes centros financeiros<br />
<strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s foi destruí<strong>do</strong>, matan<strong>do</strong> mais de 3 mil pessoas<br />
inocentes. Bilhões de especta<strong>do</strong>res no mun<strong>do</strong> to<strong>do</strong> testemunharam<br />
a tragédia. O impacto inicial <strong>do</strong> terrorismo teve seu efeito. Ninguém<br />
se sentia seguro. Pessoas comuns levan<strong>do</strong> vidas comuns podiam ser<br />
mortas instantaneamente, e não havia nada a fazer. Poderia ter aconteci<strong>do</strong><br />
com qualquer um de nós ou com to<strong>do</strong>s nós.<br />
Mas algo com que os terroristas não contavam aconteceu. As pessoas<br />
não ficaram acuadas pelo me<strong>do</strong> nem fugiram <strong>para</strong> se esconder.<br />
To<strong>do</strong>s queriam se envolver. Amigos e parentes daqueles que morreram<br />
no acidente correram <strong>para</strong> o local e começaram uma vigília<br />
que levaria dias, a fim de ajudar na busca e no resgate das vítimas.<br />
Inúmeras pessoas por to<strong>do</strong> o país se prontificaram a <strong>do</strong>ar sangue <strong>para</strong><br />
os feri<strong>do</strong>s. Doa<strong>do</strong>res esperaram durante horas de pé nas filas <strong>para</strong> ajudar<br />
pessoas que não conheciam. O índice de violência em Nova York<br />
diminuiu. As casas se abriram <strong>para</strong> acolher quem necessitasse, e as<br />
diferenças políticas entre os líderes pareceram desaparecer à medida<br />
que o país se reorganizava <strong>para</strong> suportar a crise. As pessoas precisavam<br />
umas das outras, e nos momentos de necessidade havia sempre<br />
alguém disponível.<br />
Os trágicos acontecimentos <strong>do</strong> 11 de Setembro nos ensinaram algo<br />
sobre o sofrimento. A tragédia pode acontecer a qualquer um de nós,<br />
e o sofrimento é inevitável na vida. Mas somos capazes de escolher<br />
como reagir a ele. Se nos encolhemos no isolamento que o trauma<br />
provoca, corremos o risco de nos tornarmos amargos e desesperança<strong>do</strong>s.<br />
Mas, se na hora da necessidade estendemos a mão ao outro,<br />
descobrimos que tanto ele ganha força <strong>para</strong> sobreviver como também<br />
nós crescemos como seres humanos.<br />
O ex-secretário-geral das Nações Unidas, Dag hammarskjöld –<br />
um vence<strong>do</strong>r <strong>do</strong> Prêmio Nobel da Paz –, disse certa vez: “Não reze<br />
pela paz, reze pela força.” Deus não nos prometeu uma vida sem sofrimento,<br />
mas prometeu nos dar forças. Talvez seja impossível eliminar<br />
ou mesmo abrandar a intensidade <strong>do</strong> nosso sofrimento, mas podemos<br />
torná-lo mais to<strong>ler</strong>ável voltan<strong>do</strong>-nos <strong>para</strong> Deus e recorren<strong>do</strong> aos<br />
outros. Creio que esta é a solução <strong>para</strong> enfrentar o sofrimento: Não<br />
queira sofrer sozinho, peça a Deus <strong>para</strong> lhe dar forças <strong>para</strong> sobreviver.<br />
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