comércio em são paulo - Museu da Pessoa
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“Uma época eu saí <strong>da</strong><br />
confecção e cismei que<br />
ia ser o primeiro padeiro<br />
coreano de São Paulo. Aí<br />
eu saí procurando local pra<br />
instalar, mas exigiam luva<br />
alta. Passou uns seis meses,<br />
eu fiquei desesperado: ‘Pô,<br />
o dinheiro está acabando e<br />
não vou arrumar na<strong>da</strong>.’Então<br />
apareceu um ponto <strong>em</strong><br />
Perdizes, uma casa simples.<br />
Aí derrubei e fiz uma loja.<br />
‘Bom, aqui vai sair uma mina<br />
de ouro.’Investi dinheiro, fiz<br />
uma loja de conveniência<br />
com pa<strong>da</strong>ria. Foram três<br />
anos nesse ramo, cheguei<br />
a ter até 30 funcionários.<br />
Mas foi só dor de cabeça;<br />
eu percebi que esse ramo<br />
era para português, não<br />
para coreano. Ca<strong>da</strong> macaco<br />
no seu ramo, no seu galho,<br />
porque conhecimento <strong>da</strong><br />
colônia também pesa muito.”<br />
24<br />
padeiro<br />
In Sung Cho, Creações<br />
Light Breeze, Luz,<br />
nascido <strong>em</strong> 1956<br />
Ki Hyok Song<br />
Ki Hyok Song nasceu <strong>em</strong> Seul, na Coreia do Sul, <strong>em</strong> 22 de outubro de 1980, onde passou parte<br />
<strong>da</strong> infância, antes de se mu<strong>da</strong>r com a família para o Brasil. Após um período difícil de a<strong>da</strong>ptação<br />
escolar, cresceu e passou a aju<strong>da</strong>r os pais na loja de roupas, aberta na região do Brás. Aos poucos<br />
os negócios <strong>da</strong> família prosperaram e foram abertas novas lojas. Com o t<strong>em</strong>po decidiu abrir<br />
seu próprio <strong>comércio</strong>, no bairro do Bom Retiro, trabalhando com vestidos para festas.<br />
sete noites<br />
s<strong>em</strong> dormir<br />
“Minha mãe trabalhava como modelista. Não sei se vocês entend<strong>em</strong> de modelag<strong>em</strong>,<br />
mas é uma coisa que usa muito papel, então eu e meu irmão mais velho vivíamos<br />
brincando: a gente fazia espa<strong>da</strong> de papel, barco de papel, avião. Era uma infância feliz,<br />
mas a situação na Coreia estava difícil. Aí um dia uma amiga <strong>da</strong> minha mãe, que tinha<br />
vindo para o Brasil, fez contato com a gente. Ela tinha uma fábrica de algodão <strong>em</strong><br />
São Miguel Paulista. E ela falou para a minha mãe: ‘V<strong>em</strong> para cá que aqui está bom.’<br />
Aí o meu pai pegou o que ele tinha, minha mãe também; venderam tudo, a gente<br />
pegou o dinheiro e foi <strong>em</strong>bora. Primeiro paramos no Japão, depois fomos para a Itália,<br />
passamos um t<strong>em</strong>po nos Estados Unidos e, quando chegamos na Bolívia, acabou o<br />
dinheiro. Por sorte meu pai conheceu um coreano que era um sujeito b<strong>em</strong> rico lá. A<br />
gente ficou na casa dele uns três meses, e ele ain<strong>da</strong> levou a gente de carro de La Paz<br />
até o Rio de Janeiro. Até hoje ele é amigo do meu pai. A gente começou a vi<strong>da</strong> aqui <strong>em</strong><br />
São Paulo num apartamento na Rua Barão de Ladário. Meus pais ficavam num quarto,<br />
no outro quarto meu pai montou uma mesa para minha mãe trabalhar. O pessoal<br />
trazia a roupa, então minha mãe desm<strong>em</strong>brava a roupa, desenhava com giz no papel,<br />
recortava e levava o molde e a peça descostura<strong>da</strong> de volta para a costureira. Aí um<br />
dia um amigo do meu pai falou assim: ‘Sua modelag<strong>em</strong> cai b<strong>em</strong> melhor do que as<br />
dos outros. Por que você não abre uma loja?’ E meu pai respondeu: ‘Imagina! A gente<br />
não t<strong>em</strong> dinheiro.’ E esse amigo insistiu: ‘Eu banco. Porque vocês vão ganhar dinheiro<br />
rápido e depois de um ano vocês me pagam.’ No fim, meus pais decidiram abrir a loja,<br />
só que, como a gente estava apertado, eles alugaram um ponto que ficava um pouco<br />
fora do centro comercial do Brás. Ficava b<strong>em</strong> longe, na ver<strong>da</strong>de, <strong>da</strong> Rua Oriente, <strong>da</strong><br />
Rua Miller, <strong>da</strong> Rua Maria Marcolina. Para não ter loja e casa, a gente montou uma loja<br />
com a casa atrás. Putz! Isso é muito ruim, porque, imagina, de manhã cedo já t<strong>em</strong><br />
gente trabalhando ali do lado. Um tio meu que era marceneiro acabou vindo para cá.<br />
Ele comprou madeira e a gente fez uma loja to<strong>da</strong> de madeira e vidro. Você acredita<br />
que eu quebrei a vitrine no dia <strong>da</strong> inauguração? Não sei por que eu fui martelar uma<br />
madeira que estava segurando o vidro. Foi só um totozinho de na<strong>da</strong>. Puf!, não era para<br />
quebrar! Meu pai ficou muito bravo. Mas enfim a gente montou a loja. A minha mãe<br />
fez então uma compra que seria hoje mais ou menos mil reais <strong>em</strong> tecido. Ela falou que<br />
ficou uma s<strong>em</strong>ana s<strong>em</strong> dormir, porque achava que alguém ia vir e levar <strong>em</strong>bora esses<br />
mil reais que ela tinha de tecido. Nossa! Foi duro esse t<strong>em</strong>po. Mas o amigo do meu pai<br />
tinha razão. A gente ganhou dinheiro rápido. Dessa loja a gente foi para uma loja na<br />
Conselheiro Belisário e depois abriu outra na Rua Miller, de esquina com a Oriente. Eu<br />
l<strong>em</strong>bro que nós chegamos a ter até dez boxes espalhados pelo Brás. E com o t<strong>em</strong>po<br />
eu passei a acompanhar o meu pai, ia para oficina com ele. Ele falava: ‘Anota isso para<br />
mim.’ Tipo o quanto a gente trazia, o que estava sendo entregue. E eu comecei a<br />
pegar gosto. Quando fiz 18 anos, falei para ele: ‘Se você quiser, eu vou lá fazer oficina.’<br />
Tanto é que o primeiro carro que eu ganhei do meu pai foi uma Saveiro, já para colocar<br />
os cortes atrás. Mas tudo b<strong>em</strong>, eu s<strong>em</strong>pre gostei de picape, não me importei muito.”