A hora da estrela - Roteiro Brasília
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luzcâmeraação<br />
A ficção em<br />
Mostra no CCBB vai exibir filmes nacionais sobre<br />
acontecimentos que calaram fundo na alma popular<br />
Por SérGio Moriconi<br />
Com filmes compreendidos num<br />
período que vai dos anos 50 até<br />
os dias de hoje, a mostra Baseado<br />
em caso real, no CCBB a partir do dia 21,<br />
possibilita compreender a reali<strong>da</strong>de brasileira<br />
<strong>da</strong>s últimas seis déca<strong>da</strong>s, ao mesmo<br />
tempo em que dá ao espectador a oportuni<strong>da</strong>de<br />
de ver como o cinema nacional se<br />
apropriou dessa mesma reali<strong>da</strong>de em diferentes<br />
circunstâncias históricas. A programação<br />
inclui clássicos inquestionáveis do<br />
cinema novo brasileiro dos anos 60, como<br />
Assalto ao trem pagador (1962), de Roberto<br />
Farias, e o muito raro O caso dos irmãos<br />
Naves (1967), de Luís Sérgio Person,<br />
assim como uma obra-prima do chamado<br />
“cinema marginal”, O bandido <strong>da</strong> luz vermelha<br />
(1968), de Rogério Sganzerla, além<br />
de obras muito mais recentes e de grande<br />
apelo popular, casos de O que é isso companheiro<br />
(1997), de Bruno Barreto, e Ônibus<br />
174 (2002), de José Padilha.<br />
Assim como as ver<strong>da</strong>des são historica-<br />
30<br />
busca do real Batismo<br />
mente determina<strong>da</strong>s, as representações<br />
que os filmes fazem <strong>da</strong> reali<strong>da</strong>de também<br />
são condiciona<strong>da</strong>s pelo contexto a que estão<br />
submeti<strong>da</strong>s. Baseado em caso real é<br />
uma ótima oportuni<strong>da</strong>de para compreender<br />
como o Brasil era lido através do seu<br />
cinema. No seu conjunto, os filmes programados<br />
produzem um ver<strong>da</strong>deiro painel<br />
sociológico do país. Na politizadíssima<br />
época do Cinema Novo, por exemplo,<br />
os fatos reais muitas vezes serviam de pretexto<br />
para um segundo discurso, em que o<br />
diretor aproveitava para fazer críticas vela<strong>da</strong>s<br />
ao governo militar que se instalara por<br />
aqui após o golpe de 1964. Para bom entendedor,<br />
meia palavra bastava. Nesse aspecto,<br />
O caso dos irmãos Naves não deixa<br />
de ser um ótimo exemplo. O diretor Luís<br />
Sérgio Person se utiliza de uma notícia de<br />
jornal sobre um erro judiciário dos anos<br />
30, em plena ditadura de Getúlio Vargas,<br />
para fazer uma analogia com as injustiças,<br />
as iniqui<strong>da</strong>des e a ilegitimi<strong>da</strong>de do Estado<br />
brasileiro de sua época.<br />
O episódio envolvendo o irmão Na-<br />
de sangue<br />
ves de Minas Gerais havia chocado brutalmente<br />
a opinião pública dos anos 30, especialmente<br />
porque tinha sido ela própria,<br />
a opinião pública, a primeira a condenar<br />
os Naves pelo assassinato de um<br />
dos sócios do negócio deles. Como o indivíduo<br />
havia desaparecido levando uma<br />
quanti<strong>da</strong>de significativa de dinheiro, julgava-se<br />
que os dois irmãos o tinham caçado<br />
e morto, à mo<strong>da</strong> de um faroeste caboclo.<br />
Capturados pelas autori<strong>da</strong>des, os Naves<br />
sofreram todo tipo de tortura e humilhação,<br />
apesar de nem cadáver nem dinheiro<br />
jamais terem sido encontrados. O<br />
desfecho dos acontecimentos seria impressionante,<br />
mas a intenção do realizador<br />
foi apenas denunciar a arbitrarie<strong>da</strong>de<br />
do poder constituído (leia-se, os militares)<br />
e a pusilanimi<strong>da</strong>de dos indivíduos face às<br />
ignomínias <strong>da</strong>s autori<strong>da</strong>des.<br />
Outros filmes <strong>da</strong> época do Cinema<br />
Novo presentes na mostra, O bandido <strong>da</strong><br />
luz vermelha e o ultra-raro Ci<strong>da</strong>de ameaça<strong>da</strong>,<br />
de Roberto Farias, se valem <strong>da</strong>s situações<br />
reais para denunciar a marginali<strong>da</strong>de