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<strong>Gláuks</strong><br />
escravos. Não bestas de carga.” (ROA BASTOS, 2005, p. 216).<br />
Infelizmente, a greve articulada pelos campesinos vira um<br />
projeto fracassado por conta da crueldade usada pelos industriais<br />
e seus capangas. Contudo, no ápice do sofrimento, a insurreição<br />
dos trabalhadores v<strong>em</strong> à tona e o engenho é destruído pelo fogo.<br />
Nesse mesmo fogo, o último carrasco abordado na narrativa, o<br />
norte-americano Harry Way, é sacrificado. Antes dele, o<br />
primeiro proprietário tirano do engenho é um morador de<br />
Assunção, comerciante judeu-espanhol de nome Símon Bonaví.<br />
Ambos são brutais com a população local, mas Harry Way é<br />
mais sanguinário e sente prazer com o desespero alheio. Ambos<br />
usam estratégias de domínio e de controle fort<strong>em</strong>ente marcadas:<br />
Bonaví é ardiloso, discurso enganoso, sorriso falso, a verdadeira<br />
lábia; já Way é animalesco, desumano e muito violento.<br />
Os nativos viam crescer o engenho como um enorme quisto<br />
vermelho. Sentiam-no engordar com seu esforço, com seu suor,<br />
com seu t<strong>em</strong>or. Porque um medo surdo e impotente também<br />
começou a se propagar. Suas simples mentes pastoris não<br />
terminavam de compreender o que estava se passando. O<br />
trabalho não era então uma coisa boa e alegre. O trabalho era<br />
uma maldição e havia que suportá-lo como a uma maldição.<br />
(ROA BASTOS, 2005, p. 209, grifo meu).<br />
Os homens, as mulheres e as crianças escuras de Tebikuary-<br />
Costa assombraram-se de que uma coisa tão amarga como seu<br />
suor tivesse se convertido nesses cristaizinhos de orvalho que<br />
pareciam banhados de lua, de escamas trituradas de peixe, de<br />
água de orvalho, de doce saliva de bestas. [...] Sentiam nos<br />
lábios, mas amargo nos olhos onde voltava a ser suco de<br />
lacrimais, areia doce molhada de lágrimas amargas. (ROA<br />
BASTOS, 2005, p. 209).<br />
Seja dito de passag<strong>em</strong> que as mulheres da diegese se<br />
tornam um capítulo à parte, porque <strong>em</strong> toda a história não<br />
passam de meros joguetes, objetos relegados à ord<strong>em</strong><br />
eurocêntrica e patriarcal. As personagens f<strong>em</strong>ininas são tratadas<br />
com respeito e dignidade somente pelos indivíduos locais.