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140 Gláuks No cerne desses diálogos culturais, já em 1978, Silviano Santiago (2000, p. 14) clama em defesa do linguajamento, prevendo um provável processo de inversão de valores (que agora se faz real), definindo-o então como bilinguismo, ao afirmar que: Evitar o bilingüismo significa evitar o pluralismo religioso e significa também impor o poder colonialista. Na álgebra do conquistador, a unidade é a única medida que conta. Um só Deus, um só Rei, uma só Língua: o verdadeiro Deus, o verdadeiro Rei, a verdadeira Língua. Como resultado - acerca do linguajamento linguístico e/ou cultural - Santiago (p. 22) pondera sobre o intelectual da zona de contato e afirma que “as leituras do escritor latinoamericano não são nunca inocentes. Não poderiam nunca sê-lo”, porque, na nossa situação, segundo o mesmo autor (p. 17), “falar, escrever, significa: falar contra, escrever contra”. 3 Um gomo da laranja: frutífera América Latina Através das proposições acima defendidas em relação à produção crítica e literária da América Latina por meio da emancipação dos ditames europeus, avigora-se a problemática, portanto, com a tessitura literária representativa desse espaço. Por isso, o escritor paraguaio Augusto Roa Bastos (1917–2005) entra em cena com o conto “O trovão entre as folhas” (2005) 3 . Tal narrativa desponta como um recorte metonímico de digna representação da miríade literária latino-americana para exemplificar, mesmo que sucintamente, a questão do pensamento liminar; o texto é um gomo essencial ao atributo total que lhe é relativo. 3 Primeira publicação em 1953.
Libertação Narrativa em Roa Bastos 141 “O trovão entre as folhas” conta, em primeiro plano, a história da revolta pessoal e social do barqueiro Solano Rojas. A narrativa é tecida em flashback porque ele já está morto no início da mesma e a melodia do acordeom invoca o seu espírito, cuja presença é saudosa aos trabalhadores. Solano é embebido de uma liderança ímpar e igualmente singular convicção ideológica com vistas a combater a opressão gerada pelos industriais europeus que adentraram o Paraguai após a revolução industrial, para estabelecer engenhos de açúcar e, principalmente, lucrar com a mão-de-obra local, subjugada e escravizada. Num segundo plano, a narrativa vai além da expressão tirânica do ser humano para com seus pares, pois delata a chaga da história paraguaia por meio da exploração e do sangue derramado; eventos típicos aos registros dos países latino-americanos outrora colonizados pela Europa e, mais tarde, amargados pelas dolorosas experiências advindas das políticas ditatoriais. Diante dessa perspectiva, Solano Rojas se torna o trovão que estremece e mobiliza as folhas paraguaias. - Não esqueçam kená, che ra’y-kuera, que sempre devemo’nos ajudar um’ao outro, que sempre devemo’tar unido. O único irmão de verdá que tem um pobre ko’ e’ outro pobre. E junto’ todo’nos formamos a mão, o pulso humilde mas forte do trabalhador... Não era um rude elemento subversivo. Era um autêntico e fervoroso revolucionário, como verdadeiro homem do povo que era. Por isso tinham-no amarrado para sempre à noite da cegueira. (ROA BASTOS, 2005, p. 201, grifo do autor). No excerto acima, há uma demonstração de lacuna metonímica, manifestação corriqueira nesse conto por conta do uso da língua Guarani em vários momentos da diegese. Na perspectiva do opressor, a lacuna metonímica – na oralidade ou na escrita – ocasiona um hiato cultural e dificulta o processo de domínio. Todavia, na perspectiva do oprimido, ela se torna uma
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