Ciclo comemorativo - Academia Brasileira de Letras
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fácio o governador do Estado cometia a incorreção <strong>de</strong> dar a divulgação<br />
<strong>de</strong>ssas cartas como inéditas, quando há mais <strong>de</strong> vinte anos constaram<br />
da publicação oficial do Ministério das Relações Exteriores.<br />
Domício da Gama <strong>de</strong>screveu o episódio do encontro <strong>de</strong> Eucli<strong>de</strong>s<br />
com o Barão:<br />
Segura e <strong>de</strong>dicada como foi, minha amiza<strong>de</strong> com Eucli<strong>de</strong>s da Cunha não<br />
terá durado mais <strong>de</strong> cinco anos. E não foram as letras, foi o serviço do Brasil<br />
que nos aproximou. José Veríssimo pedira-me que obtivesse do Barão do<br />
Rio Branco para o autor dos Sertões um lugar <strong>de</strong> auxiliar numa das comissões<br />
<strong>de</strong> exploração do Purus e do Juruá, criadas por acordo entre o Brasil e o Peru<br />
em 1904, a fim <strong>de</strong> <strong>de</strong>finir-se honesta e lealmente o litígio territorial entre os<br />
dois países naquela região. Acompanhei Eucli<strong>de</strong>s uma noite, <strong>de</strong>pois do jantar,<br />
à casa do Barão, em Petrópolis. Deixei-os conversando às nove horas, o<br />
Barão sentado à mesa, entre as duas janelas do quartinho que lhe servia <strong>de</strong> escritório,<br />
dando sobre a estrada sossegada da Westfália e o Piabanha rumoroso<br />
em baixo; Eucli<strong>de</strong>s pousado incomodamente sobre uma ca<strong>de</strong>ira pequena,<br />
respeitoso, comovido e tímido, como um estudante em hora <strong>de</strong> exame. Não é<br />
que o Barão o examinasse. O Barão conversava, contente <strong>de</strong> encontrar quem<br />
o enten<strong>de</strong>sse e partilhasse o seu interesse pelos assuntos que lhe eram caros,<br />
<strong>de</strong> fronteiras, <strong>de</strong> relações internacionais e da história diplomática do Brasil,<br />
em que aquele engenheiro militar parecia bacharel senão doutor. Às <strong>de</strong>z horas,<br />
voltando com um papel, encontrei-os na mesma posição discreteando<br />
quietamente; o Barão sempre <strong>de</strong>spretensioso e lhano, <strong>de</strong>spreocupado <strong>de</strong> efeitos,<br />
sem veemência nem gestos, apenas uma pena tomada distraidamente e<br />
logo <strong>de</strong>ixada cair sobre as rumas <strong>de</strong> papéis que lhe atulhavam a mesa, ou o<br />
cuidadoso acen<strong>de</strong>r do cigarro <strong>de</strong> palha, que se lhe apagava freqüentemente.<br />
Eucli<strong>de</strong>s parecendo cada vez mais intimidado e mal à vonta<strong>de</strong>, como se o<br />
oprimisse o respeito que lhe inspirava <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o primeiro momento aquele<br />
gran<strong>de</strong> homem público tão bondoso e simples mas tão pouco familiar. Às<br />
onze horas vim lembrar-lhe que a porta da casa <strong>de</strong> seu primo Urbano <strong>de</strong><br />
Gouveia, on<strong>de</strong> <strong>de</strong>via dormir, fechava-se às <strong>de</strong>z horas, e ofereci-lhe um quarto<br />
para passar a noite na minha casinha ao pé da do Barão.<br />
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Alberto Venancio Filho