Prosa - Academia Brasileira de Letras
Prosa - Academia Brasileira de Letras
Prosa - Academia Brasileira de Letras
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
Pedro Lyra<br />
O poema é, predominantemente, conceitual: quase nenhum apelo ao sensorial<br />
ou ao imaginativo. A linguagem é, <strong>de</strong>spojadamente, sóbria: maior po<strong>de</strong>r<br />
<strong>de</strong> informação do que <strong>de</strong> comoção. Quase nenhum ornamento <strong>de</strong> estilo. Em<br />
suma: poucos dos recursos formais que conduzem ao lúdico. É uma arte <strong>de</strong><br />
pesquisa do mundo, da vida e do homem: o que temos nela é a representação<br />
<strong>de</strong> uma i<strong>de</strong>ia – a tese camoniana da instabilida<strong>de</strong> do bem e da permanência do<br />
mal – ligada à necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> afirmação pessoal do autor.<br />
Ȅ<br />
Da arte-ludismo<br />
Se há algo que dê valor à vida,<br />
é o espetáculo da beleza eterna.<br />
Platão (Huismann, p. 18)<br />
A socieda<strong>de</strong> renascentista assistiu à acumulação primitiva do capital (cf.<br />
Marx, K. 1971: 828), e uma nova era se abriu para a humanida<strong>de</strong>: a era<br />
capitalista, com sua euforia <strong>de</strong> exploração da natureza. O súbito enriquecimento<br />
da Europa Oci<strong>de</strong>ntal gerou a ambição <strong>de</strong> viver terrenamente, pren<strong>de</strong>u<br />
o homem ao seu mundo social, ao seu chão – e ele procurou ludificar ao<br />
máximo esse mundo, impulsionado pelas primeiras gran<strong>de</strong>s invenções mo<strong>de</strong>rnas<br />
e pelas <strong>de</strong>scobertas científicas que plasmaram o novo homem. Daqui<br />
até à Revolução Francesa, o equilíbrio clássico ce<strong>de</strong>rá à euforia mo<strong>de</strong>rna – e<br />
o Romantismo, fruto literário da Revolução, estimulado pela Democracia<br />
nascente, fruto político, eleva a arte ao seu ponto supremo <strong>de</strong> sedução e<br />
encantamento. É o instante mais belo da arte oci<strong>de</strong>ntal – belo naquele sentido<br />
<strong>de</strong> que o convívio com a obra não conduz propriamente à informação,<br />
mas ao prazer, ao <strong>de</strong>slumbramento, ao êxtase. É a música <strong>de</strong> um Chopin,<br />
a poesia <strong>de</strong> um Musset, a pintura <strong>de</strong> um Delacroix – realizações acabadas<br />
do i<strong>de</strong>al estético <strong>de</strong> beleza e que toca muito mais a sensibilida<strong>de</strong> do que a<br />
inteligência do seu público.<br />
Leiamos também um poema romântico: veremos que o i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> perfeição<br />
se volta, não para aquela sondagem filosófica, mas para um embelezamento<br />
218