a imagem nas imagens: leituras iconológicas - Jackbran.com.br
a imagem nas imagens: leituras iconológicas - Jackbran.com.br
a imagem nas imagens: leituras iconológicas - Jackbran.com.br
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
14<<strong>br</strong> />
REVISTA LUMEN ET VIRTUS<<strong>br</strong> />
ISSN 2177-2789<<strong>br</strong> />
VOL. I Nº 2 MAIO/2010<<strong>br</strong> />
54) A mesma que aparece diante de nós e nos pergunta: quem sou eu? Que represento para você?<<strong>br</strong> />
Estou no lugar de quem ou de quê? Decifra-me ou devoro-te! 11<<strong>br</strong> />
Ao ultrapassar a mera análise superficial, a iconologia incide <strong>com</strong> a síntese, convertendose<<strong>br</strong> />
em parte integral do estudo da arte, uma vez que não se limita ao mero levantamento<<strong>br</strong> />
estatístico preliminar. Faz-se necessário, portanto, muito mais do que ver e conhecer as<<strong>br</strong> />
iconologias existentes nos séculos XVI, XVII e XVIII, mas buscar sua relação <strong>com</strong> aquele<<strong>br</strong> />
homem e a interferência que aquele sistema teria em nossa <strong>com</strong>preensão de seu mundo, a partir<<strong>br</strong> />
de sua relação estabelecida entre a palavra e a <strong>imagem</strong>; ou conhecer e depreender sua Nachleben,<<strong>br</strong> />
bem <strong>com</strong>o as camadas de que se alimentam o todo cultural humano.<<strong>br</strong> />
Há uma <strong>imagem</strong> (fig. 1) do escultor espanhol Pedro de Mena que nos servirá para<<strong>br</strong> />
iniciarmos esta viagem pelo mundo imagético dos Seiscentos. Assim, sem se ater a seu nome, mas<<strong>br</strong> />
só a sua descrição pré-iconográfica, é possível levantar alguns aspectos da escultura:<<strong>br</strong> />
a) é esculpida na madeira;<<strong>br</strong> />
b) uma mulher, recurvada, cujos olhos estão fixos em direção a um crucifixo;<<strong>br</strong> />
c) seu rosto transmite um aspecto grave, de dor ou sofrimento; possui cabelos longos,<<strong>br</strong> />
desgrenhados;<<strong>br</strong> />
d) sua mão direita está direcionada ao peito;<<strong>br</strong> />
e) sua mão esquerda segura o crucifixo;<<strong>br</strong> />
f) está <strong>com</strong> um vestido reto, longo, cingido <strong>com</strong> uma corda em laço;<<strong>br</strong> />
g) per<strong>nas</strong> separadas, a esquerda na frente, a outra atrás; pés descalços.<<strong>br</strong> />
Além do aspecto da beleza plástica evocada e das características descritas acima, a o<strong>br</strong>a<<strong>br</strong> />
pode não transmitir nada além do exposto, afinal não haveria “nada” nela que poderia chamar a<<strong>br</strong> />
atenção. Talvez a singularidade da cor do vestido (lem<strong>br</strong>a aspectos dourados) que sequer o é, pois<<strong>br</strong> />
pode-se verificar, próximo aos pés, que parece mais uma túnica cingida por uma corda do que,<<strong>br</strong> />
propriamente, um vestido, que seria uma peça única.<<strong>br</strong> />
Ao se passar à análise iconográfica, constata-se que a <strong>imagem</strong> tenha um cunho religioso,<<strong>br</strong> />
devido ao crucifixo na mão esquerda da mulher. Esta o segura firmemente, demonstrando um<<strong>br</strong> />
devoto sentimento. Ao se ler o título da o<strong>br</strong>a, verifica-se que a <strong>imagem</strong> não retrata qualquer<<strong>br</strong> />
mulher, mas uma que, segundo os Evangelhos, seguiu Jesus de perto. Foi, inclusive, uma das que<<strong>br</strong> />
estiveram ao pé da cruz juntamente <strong>com</strong> Maria, mãe de Jesus, e o apóstolo São João (Mt 27, 56;<<strong>br</strong> />
11 A citação refere-se à tragédia de Sófocles, Édipo Rei, quando a esfinge dirige-se a Édipo <strong>com</strong> a seguinte<<strong>br</strong> />
pergunta/enigma: “Qual é o ser que, tendo uma única voz, ora caminha <strong>com</strong> dois pés, ora <strong>com</strong> três, ou ainda <strong>com</strong><<strong>br</strong> />
quatro, e que é tanto mais fraco quantos mais pés tiver?” Prontamente respondida por Édipo: o homem. Para<<strong>br</strong> />
Cesare Ripa, todas as alegorias deveriam ser nomeadas, entretanto ao retirar-lhe o nome, ela se torna um enigma.<<strong>br</strong> />
Antônio Jackson de Souza Brandão