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Um passado para justifi car o presente: memória coletiva, representação histórica e dominação política...<br />
um intermediário – pois poucos proprietários de terras e escravos<br />
tinham acesso a Salvador. Então, esses proprietários, que já eram<br />
os maiores donos de terras, os maiores produtores de cacau,<br />
assim como de açúcar, café, madeira e produtos alimentícios,<br />
também monopolizavam o comércio entre Ilhéus e Salvador<br />
e, conseqüentemente, a distribuição do crédito agrícola local 11 .<br />
Vê-se, assim, que antes da abolição, os cultivadores de cacau de<br />
Ilhéus foram submetidos a um sistema comercial e fi nanceiro<br />
hierárquico muito parecido com o encontrado no Recôncavo<br />
Baiano, ainda que em menores dimensões.<br />
A invenção do chocolate ao leite na década de 1870, a<br />
abolição da escravidão e a reforma da legislação sobre dívidas<br />
agrícolas na década de 1880 trouxeram grandes mudanças<br />
para a região cacaueira. Em Ilhéus, as novas leis quebraram o<br />
monopólio dos grandes proprietários sobre o crédito agrícola<br />
e sobre o comércio com Salvador, além, é claro, de libertar os<br />
escravos do município, muitos dos quais passaram a reivindicar<br />
terras para plantar cacau. Nos anos seguintes, comerciantes de<br />
Salvador começaram a investir diretamente no novo produto,<br />
não mais limitando seus negócios aos antigos proprietários<br />
de escravos. Foi também nesse momento que milhares de nordestinos<br />
dirigiram-se para a fronteira agrícola do sul da Bahia,<br />
onde buscavam trabalho junto a fazendeiros já estabelecidos<br />
ou ocupavam terras públicas para que eles mesmos pudessem<br />
plantar cacau. A combinação de investimento do novo capital e<br />
de crescimento da população junto com a elevação dos preços<br />
do cacau permitiram uma extraordinária expansão da lavoura<br />
cacaueira e da exportação do produto. Em 1880, a comarca de<br />
Ilhéus era um território de mata ocupado por cerca de cem índios<br />
independentes e cerca de quinhentas propriedades agrícolas de<br />
vários tamanhos, cujas plantações variadas eram trabalhadas por<br />
aproximadamente 10.000 habitantes, entre escravos e livres. Nos<br />
quarenta anos seguintes, isto foi modifi cado, tanto que, em 1920,<br />
Cadernos de Ciências Humanas - Especiaria.<br />
v. 10, n.18, jul. - dez. 2007, p. 737-793.<br />
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