AEROESPAÇO - DECEA
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e, desse modo, o conceito de proficiência é<br />
monolítico, estável e único e eu ainda acrescentaria,<br />
caro e inatingível em médio prazo. Scaramucci<br />
(Ibidem apud Stern 1983:341) afirma<br />
que “na maioria dos casos, possa ser perda<br />
de tempo e talvez até mesmo não desejável<br />
tentar alcançar” uma proficiência em nível tão<br />
elevado.<br />
Como mudança do paradigma de proficiência,<br />
deveríamos utilizar, como ela mesmo<br />
sugere, a adoção de um conceito “relativo”<br />
de proficiência, que leve em conta a especificidade<br />
da situação de uso da língua. Assim,<br />
ao invés de dizer que o nosso controlador de<br />
tráfego aéreo é proficiente em Inglês, diríamos<br />
o nosso controlador de tráfego aéreo é proficiente<br />
em inglês para trabalhar como controlador<br />
de tráfego aéreo no Brasil.<br />
Acredito que todos nós concordamos que<br />
o conceito de proficiência contido no segundo<br />
exemplo é mais factível, ainda mais se levarmos<br />
em conta que somos nativos do português,<br />
estamos geograficamente muito distantes<br />
dos países falantes da língua inglesa, e que não<br />
temos, à mão, tantos recursos financeiros assim,<br />
mas, que sem dúvida nenhuma, somos muito<br />
criativos.<br />
Outro ponto que merece nossa atenção é<br />
a confusão que fazemos com o inglês durante<br />
o processo de formação e pós-formação do<br />
nosso controlador de tráfego aéreo, doravante<br />
ATCo. Gastamos quase toda a carga horária<br />
dedicada ao ensino do inglês com o General<br />
English (Inglês Geral), mas cobramos do ATCo<br />
o EOP - English for Ocupational Purpose, a<br />
nossa “famosa” fraseologia inglesa.<br />
O processo funciona mais ou menos da<br />
seguinte forma: ensinamos o ATCo a dizer<br />
good morning e good evening, expressões<br />
do General English, mas o proibimos de dizer<br />
isso na “fonia”. Perdemos um tempo precioso<br />
ensinando o simple present (do, does), present<br />
perfect (have, haven’t), past tense (did),<br />
tempos verbais que não são freqüentemente<br />
encontrados na fraseologia inglesa. Aliás, a gramática<br />
da fraseologia é excessivamente diminuta.<br />
A maioria das discussões, bem como as<br />
soluções para o problema, tomadas no âmbito<br />
do Sistema do Controle do Espaço Aéreo<br />
(SISCEAB), são fundamentadas em paradigmas<br />
empíricos, já que não fomos capazes, apesar<br />
da gravidade do tema, de levar a cabo qualquer<br />
estudo profundo sobre o assunto. Continuamos<br />
sim, insistindo com o ALC, American<br />
Language Course, agora rebatizado de NALC,<br />
New American Language Course, um material<br />
obsoleto, que tem alguns méritos, é verdade,<br />
mas que não contempla a maioria das necessidades<br />
lingüísticas da atividade-fim do ATCo,<br />
e com instrutores sem o devido treinamento<br />
e/ou a qualificação adequada. Basta que um<br />
ATCo já tenha feito parte de um curso de línguas,<br />
demonstre algum interesse pela instrução,<br />
e afirme que tem um bom inglês, para que se<br />
torne um “professor”.<br />
Respondendo, agora, a pergunta-título: “Um<br />
controlador de tráfego aéreo brasileiro deve<br />
ser proficiente (fluente) em inglês?” - Não!<br />
Embora eu possa apostar que você, leitor, respondeu<br />
que sim, acertei?<br />
Justificando o meu não, gostaria de dizer<br />
que ninguém é fluente em língua nenhuma, nem<br />
mesmo na sua língua materna. Como não transitamos<br />
em todos os registros de uma determinada<br />
língua, não podemos admitir uma fluência<br />
absoluta. Apesar de sermos falantes do português,<br />
temos uma grande dificuldade de entender<br />
a linguagem de uma bula de remédio,<br />
escrita em nosso próprio idioma, não é verdade?<br />
A razão é muito simples, não estamos<br />
habituados com essa terminologia, e não temos<br />
um trânsito livre nessa porção do português.<br />
No caso da proficiência, o foco deveria ser<br />
somente as necessidades lingüísticas da atividade-fim<br />
do ATCo e nada mais. Este deveria<br />
ser o compromisso do país signatário: - “Meu<br />
ATCo é proficiente em L2 para exercer a atividade<br />
de controle de tráfego aéreo”.<br />
Todos, inclusive a própria ICAO, afirmam que<br />
em uma situação de emergência o piloto não<br />
seguiria a fraseologia, mas ninguém se perguntou<br />
por que não? O fato de se estar em<br />
emergência, seria mais uma razão para que<br />
o jargão aeronáutico previsto fosse rigorosamente<br />
seguido. Os pilotos não são treinados<br />
para executar determinados procedimentos<br />
em situação de emergência? Eles não são<br />
obrigados a seguir determinados scripts? Por<br />
que isso não se aplica ao uso da fraseologia<br />
inglesa?<br />
Vale a pena mencionar que há uma confusão<br />
generalizada, no âmbito do <strong>DECEA</strong>, quando<br />
o assunto é o inglês do controlador de tráfego<br />
aéreo. Muitas das decisões são tomadas<br />
a partir de experiências adquiridas como exalunos<br />
de inglês. Assim sendo, encaramos o<br />
problema de modo empírico, sem examinarmos<br />
todas as nuances que a problemática nos<br />
coloca.<br />
Ainda não conseguimos definir com precisão<br />
que habilidades lingüísticas em L2 são necessárias<br />
ao ATCo, confundimos fluência com proficiência<br />
e não conseguimos distinguir com<br />
clareza que “inglês” queremos que o controlador<br />
seja capaz de entender e produzir. Não<br />
há uma diretriz forte e clara que deva ser obedecida<br />
pelos Regionais quando o assunto é o<br />
treinamento de L2.<br />
Há mais de vinte anos desenvolvendo atividades<br />
relacionadas ao controle de tráfego<br />
aéreo, sou testemunha da falta de criatividade<br />
na adoção de materiais e metodologias inovadoras<br />
que façam frente ao problema. Não<br />
temos investido em pesquisa e nem em pessoal<br />
para que a linguagem radiotelefônica em<br />
L2 seja aprendida e ensinada a contento. Não<br />
propiciamos que estudos sejam realizados,<br />
não nos aproximamos das universidades,<br />
não discutimos o contexto aeronáutico,<br />
não participamos de simpósios<br />
ou seminários sobre o assunto, e não<br />
produzimos conhecimento científico<br />
a respeito. Todos estamos vol-<br />
11<br />
tados para a nossa rotina diária, e não nos<br />
preocuparmos em buscar soluções inovadoras.<br />
Infelizmente não temos a cultura do aprender,<br />
nem a do pesquisar, fortes no SISCEAB. As<br />
poucas iniciativas são pontuais, quando deveriam<br />
ser diretrizes do Departamento do Controle<br />
do Espaço Aéreo (<strong>DECEA</strong>).<br />
Sobre os teste de proficiência, gostaria de<br />
acrescentar que o European Organization For<br />
The Safety of Air Navigation, mais conhecido<br />
como EUROCONTROL, saiu na frente ao estabelecer<br />
em 1999, após a realização de uma<br />
pesquisa séria e consistente, um teste denominado<br />
Proficiency Test in English Language for Air<br />
Traffic Controllers (PELA Test), que já obteve o<br />
reconhecimento da ICAO.<br />
A despeito do seu custo, $ 6.000 (seis mil<br />
dólares, valor obtido por e-mail junto àquela<br />
Entidade), não há como negar que o teste é<br />
excelente. Entretanto, pelo menos uma ressalva<br />
deve ser efetuada: o seu pré-requisito.<br />
O teste pressupõe que os ATCo tenham<br />
atingido um nível de proficiência no Inglês Geral<br />
equivalente aos reconhecidos testes aplicados<br />
pela University of Cambridge (Cambridge First<br />
Certificate) ou ao Test of English as a Foreign<br />
Language (TOEFL - Princeton University) etc. E<br />
não me parece que esse seja o nível da maioria<br />
dos ATCo brasileiros, e nem de diversos países<br />
não nativos do inglês.<br />
Urge que sejam tomadas medidas para o<br />
enfrentamento desse problema, já que a equação<br />
apresenta duas variáveis extremamente<br />
complicadas: a testagem e o treinamento de L2.<br />
E não devemos nos esquecer, que apesar de<br />
termos falado apenas do ATCo, as recomendações<br />
da ICAO sobre a proficiência lingüística,<br />
contidas no Standards and Recommended<br />
Practices (SARPs), e que foram objeto de emendas<br />
recentes nos Anexos 1, 6, 10 e 11 à CACI,<br />
se aplicam em igual intensidade ao piloto e ao<br />
operador de estação aeronáutica.<br />
Estou certo de que a ICAO também tem dificuldades<br />
quando o assunto é o inglês aeronáutico.<br />
Ainda mais, se todas as decisões sobre a<br />
problemática do inglês forem tomadas a partir<br />
de um grupo que, na sua maioria, tenha países<br />
falantes do inglês. Não acreditando em coincidências,<br />
faço aqui um pequeno comentário: -<br />
“Regras mais duras, implicam em soluções mais<br />
caras”. Não vai demorar em aparecer “novos<br />
produtos” e “novas soluções made in ...” para<br />
os controladores não falantes do inglês no<br />
mundo todo, querem apostar?