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a personagem feminina idosa nos contos de clarice lispector e flávia ...

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convívio com a família <strong>de</strong> sua filha, Severina já se encontra num espaço <strong>de</strong> transição: o<br />

trem.<br />

Dessa maneira, em momento algum Severina mostrou ter um espaço que seja<br />

totalmente seu e que só ela tem acesso. Isso po<strong>de</strong> ser atestado pelo fato <strong>de</strong> ela estar<br />

sempre dividindo espaços cercados <strong>de</strong> pessoas como o apartamento, o táxi e o trem. E<br />

ainda vale ressaltar que não há nenhuma referência no texto à casa <strong>de</strong> Severina. Aliás, o<br />

único <strong>de</strong>talhe mencionado a respeito da vida <strong>de</strong> Severina fora da vida <strong>de</strong> Catarina é<br />

quando esta diz: “ - Dê lembranças a titia!” (LISPECTOR, 1976, p. 114), o que <strong>de</strong>ixa<br />

livre a interpretação para o leitor se essa tia mora junto ou não da velha.<br />

Além disso, vale ressaltar que Severina <strong>de</strong>veria ser viúva, pois seu marido<br />

sempre é citado como alguém do passado: “.... Catarina teve subitamente vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

lhe perguntar se fora feliz com seu pai:” (LISPECTOR, 1976, p. 113). Assim, a vida<br />

pessoal <strong>de</strong> Severina é uma incógnita. Não é possível ter certeza se ela mora sozinha ou<br />

não, a única certeza é <strong>de</strong> que na casa <strong>de</strong> sua filha é ela não é bem aceita.<br />

Tal fato vai ao encontro da teoria da zona selvagem, pois o que se po<strong>de</strong> constatar<br />

é que Severina ainda não encontrou seu próprio espaço. Isso fica claro ao resgatar todos<br />

os aspectos <strong>de</strong> sua vida citados, como a frase que ela sempre repete, a qual expressa<br />

uma entonação <strong>de</strong> um vazio, algo que lhe falta e que talvez no convívio com a filha<br />

Severina po<strong>de</strong>ria ter encontrado, o que não aconteceu <strong>de</strong> fato.<br />

Outro fator a ser relembrado é a falta <strong>de</strong> referências à vida <strong>de</strong> Severina fora da<br />

casa <strong>de</strong> Catarina, o que reafirma a interpretação <strong>de</strong> que esta <strong>idosa</strong> realmente não tem um<br />

espaço só seu. E, por último, o fato <strong>de</strong> no conto ser <strong>de</strong>scrita a presença <strong>de</strong> Severina<br />

sempre ligada à imagens <strong>de</strong> transição: como a <strong>de</strong>spedida do genro, o táxi, a <strong>de</strong>spedida<br />

da filha e o trem.<br />

Sem <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> falar que a única referência à casa <strong>de</strong> Severina ocorre num flash<br />

back à infância <strong>de</strong> Catarina. Trata-se <strong>de</strong> uma cena entre esta última, seu pai e sua mãe,<br />

em que há uma comunicação, por meio do olhar, entre os dois primeiros sem a<br />

participação e a percepção <strong>de</strong> Severina. Isso só reforça o <strong>de</strong>sprezo a ela atribuído e a<br />

necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ela <strong>de</strong>senvolver uma zona selvagem, mas que até o momento não foi<br />

atingida.<br />

Aliás, no que toca essa questão <strong>de</strong> laços afetivos entre mãe e filha, po<strong>de</strong>-se<br />

perceber que ela está intrinsecamente ligada ao momento epifânico do conto. Este, por<br />

sua vez, ocorre na freada repentina do táxi, mais exatamente <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>le. Quando<br />

Severina e Catarina acabam se esbarrando uma na outra como o <strong>de</strong>scrito em : “(...)<br />

numa intimida<strong>de</strong> <strong>de</strong> corpo há muito esquecida, vinda do tempo em que se tem pai e<br />

mãe.” (LISPECTOR, 1976, p. 111)<br />

Se por um lado Severina ainda não encontrou sua zona selvagem, por outro ela<br />

foi responsável por uma gran<strong>de</strong> revelação a sua filha. Porque Catarina, após ser lançada<br />

contra a mãe, mudou seu modo <strong>de</strong> ver a vida. Isso se atesta já na forma como ela passa<br />

a ver Severina durante a <strong>de</strong>spedida na estação. Tanto que <strong>de</strong>pois seus olhos passam a<br />

encher-se <strong>de</strong> lágrimas.<br />

Outro sinal <strong>de</strong> mudança é o fato <strong>de</strong> Catarina, assim que chegou a seu<br />

apartamento, ter ido ao quarto <strong>de</strong> seu filho. Lá recebeu uma espécie <strong>de</strong> confirmação <strong>de</strong><br />

que <strong>de</strong>veria reconquistar ou até por que não dizer criar laços verda<strong>de</strong>iros entre ela e seu<br />

filho. A confirmação nada mais é do que o seu filho ter dito “mamãe”, <strong>de</strong> uma forma<br />

totalmente involuntária, sem querer nada em troca.<br />

Assim, é possível afirmar que <strong>de</strong> certa forma os laços foram revividos, ainda que<br />

<strong>de</strong> maneira sutil, entre Severina e Catarina por meio do contato físico, que há muito já<br />

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