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Jo Nesbø Siri Hustvedt Norberto Lobo Elvis Perkins Fever Ray João ...

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Sexta-feira<br />

5 Junho 2009<br />

www.ipsilon.pt<br />

<strong>Jo</strong> <strong>Nesbø</strong> <strong>Siri</strong> <strong>Hustvedt</strong> <strong>Norberto</strong> <strong>Lobo</strong> <strong>Elvis</strong> <strong>Perkins</strong> <strong>Fever</strong> <strong>Ray</strong> <strong>Jo</strong>ão Lencastre


Flash<br />

Sumário<br />

<strong>Jo</strong>sé Eduardo Agualusa 4<br />

Em “Barroco Tropical” pôs-se<br />

em 2020 para olhar a Luanda<br />

de agora - e sem medo<br />

<strong>Jo</strong> <strong>Nesbø</strong> 10<br />

Ex-futebolista, militar, rocker,<br />

corrector da bolsa: a nova<br />

estrela do policial nórdico<br />

<strong>Siri</strong> <strong>Hustvedt</strong> 12<br />

Na pele de um homem narra<br />

a história de uma família:<br />

“Elegia Para um Americano”<br />

<strong>Norberto</strong> <strong>Lobo</strong> 16<br />

A sua música acolhe-nos a<br />

todos; mas é única<br />

<strong>Elvis</strong> <strong>Perkins</strong> 20<br />

Em “Dearland” reage à<br />

tragédia com tremenda<br />

alegria<br />

<strong>Fever</strong> <strong>Ray</strong> 22<br />

A metade da dupla The Knife<br />

é autora de um dos álbuns<br />

mais entusiasmantes dos<br />

últimos meses<br />

Romeu e Julieta 28<br />

Os Nature Theater of<br />

Oklahoma dão-nos as nossas<br />

próprias expectativas sobre<br />

a maior história de amor de<br />

todos os tempos<br />

Ficha Técnica<br />

Director <strong>Jo</strong>sé Manuel Fernandes<br />

Editor Vasco Câmara, <strong>Jo</strong>ana<br />

Gorjão Henriques (adjunta)<br />

Conselho editorial Isabel<br />

Coutinho, Inês Nadais, Óscar<br />

Faria, Cristina Fernandes, Vítor<br />

Belanciano<br />

Design Mark Porter, Simon<br />

Esterson, Kuchar Swara<br />

Directora de arte Sónia Matos<br />

Designers Ana Carvalho, Carla<br />

Noronha, <strong>Jo</strong>rge Guimarães,<br />

Mariana Soares<br />

Editor de fotografi a Miguel Madeira<br />

E-mail: ipsilon@publico.pt<br />

2 • Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009<br />

Terry Gilliam lançase<br />

outra vez na<br />

aventura de Dom<br />

Quixote<br />

Nada podia ter corrido pior<br />

quando, em 2000, o fundador dos<br />

Monty Python, Terry Gilliam,<br />

tentou pôr em marcha o projecto<br />

de fazer um filme sobre Dom<br />

Quixote, a personagem criada por<br />

Cervantes no século XVII. Mas,<br />

nove anos depois do desastre que<br />

foram os seis dias de filmagens de<br />

“The Man Who Killed Don<br />

Quixote”, Gilliam está pronto para<br />

se lançar de novo contra os<br />

moinhos de vento. Vai filmar em<br />

Espanha na Primavera, confirmou<br />

ao jornalista do “El País” que o<br />

entrevistou em Ibiza. “Dediquei-lhe<br />

dez anos da minha vida [a “The<br />

Man Who Killed Don Quixote”] e<br />

continuei a pensar nele”, explicou.<br />

Por isso, ao fim de sete anos a lutar<br />

contra as companhias de seguros<br />

que entretanto tinham ficado com<br />

os direitos do projecto, está em<br />

condições de avançar. Ainda não<br />

tem o Dom Quixote (“nem sequer<br />

pensei em nomes, mas será<br />

certamente europeu”), nem a<br />

Dulcineia (“preciso de uma<br />

Penélope Cruz com uns vinte anos,<br />

[...] mas se calhar acabo por<br />

contratar uma argentina ou uma<br />

brasileira, apesar de não terem o<br />

que tem uma espanhola: fogo no<br />

olhar”).<br />

Mantém, do projecto inicial, um<br />

actor: <strong>Jo</strong>hnny Depp. O que prova<br />

que Depp também não ficou<br />

traumatizado com a experiência<br />

das primeiras filmagens. Nessa<br />

altura, não só o orçamento inicial<br />

foi substancialmente reduzido,<br />

como Gilliam não teve tempo para<br />

ensaiar previamente com os actores<br />

(que incluíam também Jean<br />

Rochefort, o Dom<br />

Quixote que<br />

desde então<br />

não pode<br />

montar a<br />

cavalo por<br />

causa de uma<br />

hérnia discal,<br />

Vanessa<br />

Paradis e<br />

Uma hérnia discal impede Jean<br />

Rochefort de ser Dom Quixote<br />

para Terry Gilliam<br />

JEAN-PAUL PELISSIER/REUTERS<br />

<strong>Jo</strong>nathan Pryce), e, por fim, o local<br />

das filmagens sofreu uma<br />

inundação. Desses seis dias, o único<br />

filme que saiu foi “Lost in La<br />

Mancha”, de Keith Fulton e Louis<br />

Pepe - um “making of” que acabou<br />

por se transformar num “unmaking<br />

of”.<br />

Desta vez, Gilliam está confiante de<br />

que tudo vai correr bem. “Durante<br />

todos estes anos sabia que tinha um<br />

guião perfeito, nem olhei para ele.<br />

Há uns meses li-o de novo e<br />

reescrevi-o!”, contou, rindo, ao “El<br />

País”. “Nunca quis adaptar o livro<br />

como tal. É grande e perfeito.<br />

Queria, e quero, usar Dom Quixote<br />

e algumas das suas aventuras para<br />

sentir-me livre, provavelmente<br />

como teria feito Cervantes.” Apesar<br />

de reescrita, a linha principal da<br />

história não mudou desde 2000. A<br />

ideia do realizador continua a ser<br />

pôr <strong>Jo</strong>hnny Depp, um executivo de<br />

Londres, a viajar no tempo até à<br />

Espanha do século XVII, a<br />

encontrar Dom Quixote e a<br />

confundi-lo com Sancho Pança.<br />

Em Serpa vai-se<br />

pensar a imagem<br />

política<br />

O maliano Abderramane Sissako,<br />

autor de “Bamako” (2006) e<br />

considerado um dos mais<br />

importantes realizadores africanos<br />

contemporâneos, é um dos<br />

convidados do Doc’s Kingdom, o<br />

encontro de cinema documental<br />

que acontece em Serpa entre 16 e<br />

21 deste mês e que tem como tema<br />

“Reinterrogar a imagem política”.<br />

Além da África de Sissako, vai<br />

passar por Serpa também “a<br />

complexidade identitária e política<br />

da Rússia contemporânea”<br />

(citamos o texto de apresentação<br />

do encontro) com “Uma Revolução<br />

Que Não o Foi”, onde Aliona<br />

Polunina traça “o percurso dos<br />

militantes do partido nacionalista<br />

bolchevique russo antes das<br />

eleições de 2007”, e com o filme da<br />

portuguesa Mónica Baptista,<br />

“Territórios”, uma viagem de<br />

comboio que junta um soldado<br />

russo e um tchetcheno num vagão<br />

de terceira classe. A memória<br />

política será trazida pelos filmes de<br />

Eduardo Escorel, representante do<br />

Novo Cinema Brasileiro e outro dos<br />

convidados do Doc’s Kingdom, e<br />

pelos de Robert Fenz, autor de<br />

“uma série de ‘meditações’,<br />

aproximações sensíveis e variadas à<br />

memória da revolução e da sua<br />

história pessoal na passagem por<br />

países como o Brasil, Cuba,<br />

Polónia, Turquia e Estados Unidos.<br />

À reflexão sobre a memória dos<br />

lugares juntam-se “Ruínas” de<br />

Manuel Mozos e “Califórnia<br />

Company Town” de Lee Anne<br />

Schmitt. Por fim, estará também<br />

em Serpa o francês Sylvain<br />

George, para discutir “as formas<br />

do cinema militante e a acção<br />

política/cinematográfica e o<br />

activismo”.<br />

“Inimigos<br />

Públicos”<br />

na<br />

colecção<br />

de Verão<br />

de Michael<br />

Mann<br />

É um<br />

“blockbuster”? É<br />

um filmeprestígio?<br />

Nem<br />

uma coisa nem<br />

outra, se calhar<br />

um pouco de<br />

ambas. É um<br />

filme de<br />

Michael<br />

Mann. E mais<br />

uma incursão do<br />

realizador de “Miami<br />

Vice” e “Heat” pelos<br />

caminhos do crime,<br />

pelos duelos entre<br />

bons e maus, desta<br />

vez com vista<br />

<strong>Jo</strong>hnny Depp como o “gangster” <strong>Jo</strong>hn<br />

Dillinger e (em cima) Chrstian Bale como<br />

Melvin Purvis, agente do FBI<br />

para<br />

a<br />

Grande<br />

Depressão.<br />

“Inimigos Públicos”<br />

parece um “biopic”, mas<br />

não é bem. É dominado pela<br />

presença de <strong>Jo</strong>hnny Depp<br />

enquanto assaltante de<br />

bancos - <strong>Jo</strong>hn Dillinger para<br />

os amigos. De resto,<br />

também há Baby Face<br />

Nelson, Pretty Boy Floyd e<br />

toda a súcia de criminosos<br />

que marcaram os anos 1930<br />

nos EUA. Vivia-se a era dos<br />

inimigos públicos e <strong>Jo</strong>hn<br />

Dillinger era o número 1.<br />

O Ípsilon já viu o filme que<br />

se estreia em Portugal a 6<br />

de Agosto, data algo<br />

estranha para um<br />

filme de época<br />

carregado por<br />

Depp, Marion<br />

Cotillard ou<br />

Billy<br />

Crudup.<br />

E pela<br />

personagem<br />

secundária de<br />

Christian<br />

Bale,<br />

Melvin


Concerto<br />

Purvis. Bale, o novo <strong>Jo</strong>hn<br />

Connor, o Batman XXI.<br />

Para ele, o Verão tem<br />

destas coisas: tanto se<br />

promove “Terminator:<br />

Salvação”, que esta<br />

semana se estreia em<br />

Portugal, quanto se fala de<br />

“Inimigos Públicos” em<br />

Paris, com a intensidade<br />

que se ouvia dizer que<br />

tinha e que, confirmamos,<br />

tem.<br />

O Verão é um lugar<br />

estranho para o actor, mas<br />

sobre “Inimigos Públicos”<br />

ele não é manso. “Quando<br />

vi o filme, e nem era a<br />

versão final, achei que era<br />

um dos melhores pedaços<br />

de realização de cinema<br />

que vi em muitos anos”,<br />

disse num encontro com a<br />

imprensa internacional em<br />

Paris.<br />

Michael Mann, cuja<br />

primeira escolha para o<br />

papel do agente do FBI<br />

Melvin Purvis foi Bale, é<br />

feito à medida para<br />

trabalhar com Bale,<br />

conhecido pela pesquisa<br />

ferrenha das suas<br />

personagens. “Ele é<br />

incansável”, diz o actor<br />

sobre Mann, “é obsessivo<br />

de uma forma que eu<br />

muito respeito” e “tem<br />

uma capacidade incrível<br />

para as nuances e para a<br />

subtileza, para aquilo que<br />

fica por dizer numa cena”.<br />

O filme é baseado no livro<br />

do historiador e jornalista<br />

do “New York Times” e do<br />

“Wall Street <strong>Jo</strong>urnal”<br />

Bryan Burrough e é<br />

dominado por um olhar<br />

que parece convidar que<br />

se lhe chame realista. Mas<br />

não é bem isso -<br />

“Inimigos Públicos” é<br />

servido pelo digital,<br />

ganhando uma crueza e<br />

uma “verité” que a<br />

fotografia trabalha com<br />

textura. E há espaço<br />

ainda para o toque<br />

estilizado de Mann, o<br />

homem que disse à<br />

“Empire” que este não é<br />

um filme típico de Verão,<br />

nem deixa de o ser. “Este é<br />

um filme grande. O que é<br />

um filme de Verão”?,<br />

pergunta, ontológico.<br />

<strong>Jo</strong>ana Amaral Cardoso,<br />

em Paris<br />

“A Mãe”, o novo álbum de<br />

Rodrigo Leão, será editado<br />

a 22 de Junho. Acompanhado<br />

pelo Cinema<br />

Ensemble, o combo que<br />

o acompanha desde o<br />

marcante “Cinema”, de<br />

2004, o ex-Madredeus e<br />

Sétima Legião apresenta<br />

1<br />

2<br />

Arquitectos<br />

portugueses em<br />

exposição em<br />

Londres...<br />

Generosidade é - por inesperado<br />

que pareça - a palavra que mais<br />

sobressai do texto de apresentação<br />

que o professor e crítico de<br />

arquitectura britânico <strong>Jo</strong>nathan<br />

Sergison escreve para a exposição<br />

“Overlappings: Six Portuguese<br />

Architecture Studios”, esta semana<br />

inaugurada no Royal Institute of<br />

British Architects, em Londres.<br />

São seis ateliers de jovens<br />

arquitectos portugueses - Aires<br />

Mateus, Ricardo Bak Gordon, Inês<br />

<strong>Lobo</strong>, <strong>Jo</strong>ão Favila, Paulo David e<br />

Ricardo Carvalho+<strong>Jo</strong>ana Vilhena -<br />

que mostram os seus trabalhos<br />

durante um mês na capital<br />

britânica (a exposição termina a 2<br />

de Julho). Para Sergison, é um<br />

conjunto que “revela uma<br />

capacidade para ser generoso<br />

enquanto arquitecto, para<br />

colaborar e partilhar ideias”. E isto,<br />

continua, é, “até certo ponto, o<br />

resultado de uma cultura particular<br />

de arquitectura”.<br />

O que parece fascinar Sergison e<br />

constituir uma especificidade<br />

portuguesa é (também) esta<br />

disponibilidade da nova geração de<br />

arquitectos portugueses para<br />

conhecerem o trabalho uns dos<br />

outros, partilharem ideias,<br />

apoiarem-se - é isso que permite o<br />

“overlapping” que dá o título à<br />

exposição. Ele vê nisso uma “forma<br />

preciosa de generosidade que é<br />

rara e especial”.<br />

Razão pela qual, antes de falar de<br />

arquitectura, o texto de<br />

apresentação fala da ausência de<br />

máquinas de café nos ateliers e do<br />

(bom) hábito de as pessoas irem até<br />

ao café da esquina, o que “permite<br />

encontros inevitáveis com amigos e<br />

contemporâneos”. Sergison admite<br />

que isto possa parecer “um<br />

pormenor pitoresco”, mas para ele<br />

ajuda a explicar porque é que uma<br />

exposição de grupo como esta é<br />

como convidados Stuart<br />

Staples, dos Tindersticks,<br />

Neil Hannon, dos Divine<br />

Comedy, e Melingo, o construtor<br />

de pontes entre o<br />

tango e outra linguagens<br />

musicais que recentemente<br />

se apresentou em<br />

Portugal. “A Mãe” será<br />

3<br />

1. Sala do Royal Institute of<br />

British Architects com os<br />

projectos de Ricardo Carvalho+<br />

<strong>Jo</strong>ana Vilhena<br />

2. Projecto de Paulo David<br />

3. Projecto de Ricardo Bak<br />

Gordon<br />

4. Projecto de <strong>Jo</strong>ão Favila<br />

possível. Além disso, nota também<br />

o facto de “todos estes projectos<br />

serem excepcionalmente bem<br />

construídos”, o que acredita ser<br />

consequência “dos elevados níveis<br />

de exigência da indústria da<br />

construção em Portugal”.<br />

Os trabalhos dos seis ateliers - que<br />

incluem muitas casas, mas também<br />

museus, hotéis e a modernização<br />

de uma escola - são apresentados<br />

dentro de arcas, que ficam a 48<br />

centímetros do chão, e cujo interior<br />

foi aproveitado por cada equipa de<br />

arquitectos da forma que mais lhes<br />

interessou para mostrar o<br />

respectivo trabalho. Alexandra<br />

Prado Coelho<br />

... e arquitectos<br />

japoneses em Lisboa<br />

Quais são as diferenças e as<br />

semelhanças na forma de trabalhar<br />

dos arquitectos portugueses e<br />

japoneses? Como é que os<br />

japoneses abordam um projecto? A<br />

exposição “Processo (in)visível”<br />

(até 30 de Junho na sede da Ordem<br />

dos Arquitectos, em Lisboa) mostra<br />

exemplos do trabalho de dez<br />

ateliers japoneses representantes<br />

de duas gerações, ambas jovens. A<br />

ideia do curador - o japonês<br />

Yoshihide Kobanawa, que<br />

trabalhou em colaboração com<br />

Kaoru Fujii, e com os portugueses<br />

Tiago Borges e Francisco Spratley -<br />

foi não apresentar apenas os<br />

projectos acabados, mas o<br />

desenvolvimento de cada um desde<br />

o conceito até à concretização. Os<br />

desafios que enfrentam são<br />

diferentes - se os Mount Fuji<br />

Arquitectos têm que lidar com o<br />

apresentado esta noite,<br />

no Casino Estoril. Em<br />

palco, para além do<br />

Cinema Ensemble, estará<br />

a Sinfonietta de Lisboa.<br />

Stuart Staples e Melingo<br />

são os dois convidados.<br />

4<br />

problema da alta densidade em<br />

Tóquio, o projecto da Casa de Chá<br />

de Jun Igarashi lida com as<br />

condições naturais numa região<br />

rural, e o Museu de Arte de Aomori,<br />

de Jun Aoki, e a Casa N de Sou<br />

Fujimoto relacionam-se sobretudo<br />

com a história e a tradição. A<br />

exposição (que pode ser vista entre<br />

as 10h e as 18h de 2ª a 6ª) é<br />

acompanhada por um programa de<br />

conferências, que termina no dia<br />

29 com a que será proferida pelo<br />

arquitecto Hiroshi Sambuichi.<br />

Galerias Americanas<br />

do Met já podem ser<br />

visitadas<br />

As Galerias Americanas reabriram<br />

no Metropolitan Museum, em Nova<br />

Iorque. A colecção, com peças<br />

desde o final do século XVII (as<br />

mais antigas datam de 1850) até ao<br />

início do século XX (Frank Lloyd<br />

Wright está representado), inclui<br />

mobiliário, estátuas, pratas,<br />

cerâmicas, peças em vidro,<br />

joalharia e tecidos - e, na descrição<br />

feita pelo crítico do “The New York<br />

Times”, “parecem uma Cidade<br />

Bric-a-Brac”. Entenda-se: não é<br />

uma crítica negativa, é uma<br />

constatação sobre uma colecção<br />

que é apresentada em 20 salas,<br />

correspondentes a diferentes<br />

períodos da História americana.<br />

Nas obras de renovação que<br />

decorreram nos dois últimos anos,<br />

doze dessas salas históricas foram<br />

completamente renovadas (e foi<br />

acrescentado uma nova, um<br />

interior colonial holandês) e têm<br />

agora computadores com “touch<br />

screens” que dão informação sobre<br />

os períodos em questão e sobre as<br />

peças que aí se podem ver. O ponto<br />

alto da visita é o Charles Engelhard<br />

Court, com a sua fachada de vidro<br />

que deixa entrar a luz do Central<br />

Park - e o “NYT” é particularmente<br />

elogioso em relação às obras de<br />

recuperação. Quanto à colecção,<br />

interroga-se o crítico Holland<br />

Cotter, será “simplesmente bizarra<br />

ou é realmente bela?”. Seja qual for<br />

a resposta, conclui, é um retrato da<br />

América.<br />

Como é que os japoneses abordam<br />

um projecto? Programa para<br />

conferências e uma exposição<br />

na Ordem dos Arquitectos<br />

O título é enigmático:<br />

infl uência de “1984” de Orwell?<br />

Murakami tem<br />

novo livro que já<br />

é um sucesso<br />

Depois de cinco anos sem<br />

nenhum novo livro, Haruki<br />

Murakami acaba de publicar no<br />

Japão o seu último romance,<br />

“1Q84”. Descrito pela agência AP<br />

como uma “narrativa complexa e<br />

surreal” que “anda para trás e para<br />

a frente com a história de duas<br />

personagens, um homem e uma<br />

mulher, à procura um do outro”,<br />

sucede-se a “After Dark”. É uma<br />

história em dois volumes e o<br />

escritor recusou-se a revelar<br />

detalhes, mas a AP diz ainda que<br />

“explora temas sociais e<br />

emocionais como cultos religiosos,<br />

violência, laços familiares e amor”.<br />

A primeira tiragem teve que subir<br />

dos 380 mil exemplares previstos<br />

para os 480 mil, segundo a editora<br />

Shinchosha à AP. O título, “1Q84”,<br />

é enigmático: uns dizem que foi<br />

influenciado por “1984” de<br />

George Orwell (porque a letra “Q”<br />

em japonês se pronuncia como o<br />

número 9), outros que é um<br />

tributo ao romance de Lu Xun<br />

“The True Story of Ah Q”. O<br />

“Christian Science Monitor”<br />

lembra que o secretismo à volta do<br />

livro resulta da má experiência<br />

com “Kafka on the Shore” (2002) -<br />

foram revelados pormenores a<br />

mais, contestaram os fãs.<br />

Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009 • 3<br />

KAZUHIRO NOGI


MIGUEL MADEIRA<br />

têm interesses em<br />

Angola e não vão<br />

dizer o que pensam<br />

Os escritores têm que vencer o medo. Agualusa espera ler dos mais<br />

velhos o que não viveu. E dá um passo em frente para olhar Luanda<br />

agora, a correr para o desastre. “Barroco Tropical” é talvez o primeiro<br />

livro que retrata o absurdo do pós-guerra. Alexandra Lucas Coelho<br />

Entrar na política? “Deus me livre e sobre o poder e é morta. A partir a compreender que isso é preciso. Há fim da guerra não conduzia rapida- “Barroco<br />

guarde.” <strong>Jo</strong>sé Eduardo Agualusa acha- daqui, é um cortejo de personagens, essa discussão. Mas continuam a ser mente à democratização. Muita gente Tropical”,<br />

se muito bem onde está, a escrever dos céus ao submundo.<br />

construídos grandes prédios no cen- acreditou que seria possível. Para talvez o<br />

sobre o absurdo. Nascido no Huambo<br />

tro.<br />

desenvolver de forma articulada, sau- primeiro livro<br />

há 48 anos, publica romances, contos O livro passa-se em 2020, o que Há mesmo a discussão de mudar dável, justa, é preciso democratizar ao que retrata a<br />

e crónicas há 20. Vive em Luanda e não chega para ser um futuro de a capital.<br />

mesmo tempo, se não primeiro. Isso loucura de<br />

em Lisboa, com idas ao Rio de Janeiro. ficção científica. Estes 10 anos Encontrei o arquitecto Troufa Real em não está a ser feito, com estes erros Luanda pós-<br />

As suas edições têm crescido sistema- de distância permitem o quê? Luanda e ele disse-me que tem projec- todos. Não há uma preocupação com guerra, marca<br />

ticamente em Portugal, está a crescer Pensar Angola de outra maneira, fugir tos para três novas cidades, uma das o bem estar da população.<br />

uma obra que<br />

no Brasil, e desde 2007 - quando a interpretações mais óbvias, imaginar quais deveria ser a nova capital. Faz E depois a explosão económica faz agora<br />

ganhou o prémio do diário britânico um futuro que espero não venha a algum sentido, embora me pareça que leva a que o discurso oficial nas vinte anos<br />

“The Independent” para melhor acontecer. Mas se continuarem a ser seria mais fácil transferir a capital para relações com o Estado angolano<br />

romance estrangeiro - as traduções cometidos erros e distorções... o Huambo, por exemplo. Um pouco à fique refém, não esteja livre<br />

europeias explodiram. Esta populari- Este futuro já é presente em semelhança do que se fez no Brasil, para dizer o que pensa do<br />

dade permitiu-lhe recentemente nego- muito.<br />

com Brasília, mas sem construir uma regime.<br />

ciar bem com a Dom Quixote/Leya, Sim, em muito, mas ainda há muita nova capital, o que implica custos mui- Internacionalmente?<br />

quando a Quetzal lhe fez uma pro- coisa que se pode evitar. Um livro tos grandes. Não tenho a certeza se Internacionalmente e o discurso<br />

posta. Agualusa não se queixa da como este, uma distopia, pode servir neste momento existirá dinheiro para do Estado português.<br />

vida.<br />

para alertar para determinadas políti- isso. Mas faz algum sentido na medida É isso mesmo. Nas primeiras eleições<br />

Mas em Angola é polémico volta e cas e acontecimentos que se podem em que Luanda chegou a um ponto em 1992 era mais fácil para os parti-<br />

meia. Antes das eleições de 2008 ata- complicar se nada for feito.<br />

que não se consegue viver lá. Não se dos independentes, não beligerantes,<br />

caram-no por ter dito que Agostinho Mas há aqui alguma coisa que consegue simplesmente transitar, o conseguirem apoio internacional. Hoje<br />

Neto - primeiro presidente de Angola não esteja a acontecer agora? trânsito é infernal, os carros não avan- é mais difícil. Porque da direita à<br />

- era um “poeta medíocre”. Chega- A acontecer está, mas no princípio. No çam.<br />

esquerda - excepto a extrema-esquerda<br />

ram a pedir que fosse processado livro, já tomou uma dimensão maior. Quantos milhões tem agora? em Portugal, e no resto do mundo nem<br />

por ultraje à moral. Recebeu No livro diz-se que Luanda Alguém sabe?<br />

isso - há interesses em Angola. Todos<br />

ameaças. E teve medo, diz corre a toda a velocidade Ninguém sabe. Fala-se em quatro, os partidos portugueses têm interesses<br />

nesta entrevista feita ao para o desastre, e a grande cinco milhões. Continua a afluir gente, em Angola, portanto há convergência.<br />

princípio da semana no diferença em 2020 é que acabou embora o facto de o resto do país final- Há uma unanimidade em relação ao<br />

seu apartamento de Lis- o petróleo, então o cenário mente se ter começado a desenvolver presidente <strong>Jo</strong>sé Eduardo dos Santos,<br />

boa, que é onde tem a de euforia económica está em vá acabar com esse afluxo, espero. Era como se viu quando visitou Portugal.<br />

biblioteca.<br />

queda, e o prédio em que vive uma coisa que já deveria ter sido Isso é novo, de facto. Escrevi um artigo<br />

No seu novo livro, “Bar- o protagonista - a Termiteira feita.<br />

de opinião no PÚBLICO a chamar a<br />

roco Tropical” - talvez o - é uma metáfora disto. Pode- A capital é só parte do<br />

atenção para isto: se a Europa já não<br />

primeiro que retrata a louse dizer que Luanda já está a problema, depois há o regime. discute os direitos humanos já não discura<br />

de Luanda pós-guerra correr para o desastre agora? Este retrato de Luanda também cute a democracia, então, o que a dife-<br />

- há uma Presidente em vez De certa forma já é um desastre em é um retrato do regime.<br />

rencia da China?<br />

de um Presidente. O pro- execução. É uma cidade quase inviá- Sim, e o livro fala de muitos outros pro- Há famílias portuguesas a viver<br />

tagonista escreve. Tem vel, onde as pessoas têm muita dificulblemas. do que lhes mandam de Angola,<br />

uma amante cantora, a dade em viver. Nesse sentido já é um O livro diz que num regime há zonas desertificadas pela<br />

mulher está a separar-se desastre. Penso que ainda pode ser assim há duas alternativas, emigração para Angola. Isso<br />

dele e ainda lhe aparece possível recuperar a cidade e pensá-la medo ou raiva. Como é que sente-se lá?<br />

uma modelo que o vê de outra forma, mas aparentemente defines este regime?<br />

Que está a entrar gente, está, de todo<br />

como Salvador. Essa isso não está a ser feito.<br />

Para uma parte dos angolanos foi uma o mundo. Mas Angola continua a ter<br />

mulher sabe coisas Não quer dizer que não haja pessoas desilusão quando constatámos que o uma política muito fechada, que não<br />

Capa Portugal e o mundo<br />

Para uma parte dos angolanos foi uma desilusão quando constatámos que o fi m da<br />

4 • Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009


a guerra não conduzia rapidamente à democratização<br />

Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009 • 5<br />

DANIEL ROCHA


facilita a entrada de imigrantes, pelo<br />

contrário. As grandes empresas, as<br />

petrolíferas resolvem isso, mas as<br />

pequenas empresas têm dificuldade<br />

em contratar, porque Angola dá poucos<br />

vistos de trabalho e leva imenso<br />

tempo. As pessoas vão com vistos de<br />

turismo, não podem trabalhar, mas<br />

vão, trabalham um mês ou dois, voltam<br />

a Portugal para renovar o visto.<br />

Tudo isso prejudica o andamento dos<br />

projectos, é um absurdo. Acontece a<br />

todo o tipo de imigrantes, dos mais<br />

pobres, de outros sítios de África. Há<br />

uma perseguição a esses emigrantes.<br />

E eu tenho a impressão - aliás, tenho<br />

quase a certeza - de que é uma política<br />

apoiada pela população. É uma política<br />

popular, infelizmente.<br />

O que é que a Europa, e<br />

concretamente Portugal,<br />

precisava de dizer para que a<br />

oposição angolana não sentisse<br />

dificuldade em ter apoio?<br />

Isso não vai acontecer. Não vai.<br />

Portanto tornou-se impossível<br />

dizer o que se acha sobre<br />

Angola.<br />

É. Estou um pouco pessimista quanto<br />

a isso. Os interesses são de tal forma<br />

vultuosos e intricados, que me custa<br />

a crer que vá mudar nos próximos<br />

anos. A menos que esta crise económica<br />

tome outras proporções e se<br />

reflicta em Angola. A menos que sur-<br />

6 • Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009<br />

“Isso é Angola.<br />

Essa voragem festiva<br />

é África. É tropical.<br />

É América Latina<br />

também. Durante a<br />

tragédia há a festa”<br />

jam divisões no partido do poder, o<br />

que pode acontecer. Se não, não creio<br />

que vá mudar. A nível internacional,<br />

as pessoas preferem manter o actual<br />

estado. Apoiarem as forças que estão<br />

no poder, que lhes dão garantia de que<br />

é possível continuar a fazer dinheiro.<br />

Até porque, não sendo uma democracia,<br />

Angola também não é uma ditadura<br />

sangrenta. Não estão sendo presas<br />

pessoas, não é o Zimbabwe, não<br />

tem aquele gosto feroz. É uma ditadura<br />

amável, vamos dizer assim.<br />

Dentro do MPLA encontraste<br />

gente que te apoiou na polémica<br />

sobre Agostinho Neto ser “um<br />

poeta medíocre”. Vês sinais de<br />

que o MPLA se possa renovar<br />

por dentro, ou de que o poder<br />

se possa renovar por dentro a<br />

partir do MPLA?<br />

Há linhas de fracturas no MPLA, inclusive<br />

correntes que não me agradam<br />

nada. Há muitas linhas, sempre houve.<br />

Algumas estão a expressar-se agora<br />

mais. Por exemplo, há uma corrente<br />

ligada ao 27 de Maio [de 1977, quando<br />

o MPLA reprimiu violentamente uma<br />

tentativa de golpe] que está a tentar<br />

ter expressão, e a reivindicar uma presença<br />

dentro do partido.<br />

O que defende?<br />

Não sei, para falar com franqueza.<br />

Tirando o facto de defender algo que<br />

me parece absolutamente justo, que<br />

Uma instituição que<br />

amarra os doentes a<br />

peças de automóveis<br />

(o escritor visitou-a)<br />

inspirou o hospício<br />

para constestários de<br />

“Barroco Tropical”<br />

é investigar o que aconteceu em<br />

1977.<br />

No sentido de assumir as<br />

próprias responsabilidades?<br />

De assumir responsabilidades, de<br />

saber quantas pessoas morreram, o<br />

que lhes aconteceu. Até agora os familiares<br />

das vítimas não sabem o que<br />

aconteceu. Oficialmente não estão<br />

mortos, vivem numa espécie de limbo.<br />

O que essa corrente começa por defender<br />

é isso. O que defende a seguir, politicamente,<br />

não sei.<br />

Em “Barroco Tropical” há este<br />

momento, durante um jantar:<br />

“A senhora Presidente não mata<br />

ninguém. Não odeia ninguém.<br />

Para odiar faz-se necessário<br />

um coração. Espero que gostes<br />

de arroz de pato.” Estamos em<br />

2020, temos uma Presidente,<br />

um traficante de armas que a<br />

influencia, um ambiente com<br />

orgias, corrupção, cocaína,<br />

a imprensa ao serviço do<br />

poder, um hospício para os<br />

contestários. Tudo isto é futuro<br />

ou presente?<br />

É futuro, assim como está.<br />

Sendo que este hospício<br />

existe.<br />

Não posso dizer dessa maneira.<br />

Existe uma instituição na qual se inspira<br />

esse hospício ficcional.<br />

Uma instituição que amarra os<br />

doentes a peças de automóveis.<br />

Sim, onde os doentes estão presos, ou<br />

estavam. Visitei essa instituição com<br />

um fotógrafo do PÚBLICO, há uns<br />

anos.<br />

O que é que aqui não é presente?<br />

Há uma Presidente e não um<br />

Presidente, mas não é difícil<br />

imaginar a filha do Presidente.<br />

Não pensei nisso. Não acredito... Já não<br />

sei, porque entretanto uma das filhas<br />

do Presidente foi eleita deputada, e a<br />

gente já não sabe o que vai acontecer.<br />

Mas não pensei nisso.<br />

Então o que é que aqui não é<br />

presente?<br />

Eu acho que é o grau.<br />

Portanto, o livro é um<br />

superlativo da realidade.<br />

Sim.<br />

Conheces o Grande Hotel da<br />

Beira? Pensei nele ao ler a<br />

descrição da Termiteira. O<br />

Grande Hotel da Beira, em<br />

Moçambique, ia ser o grande<br />

hotel de África no tempo<br />

colonial e agora está ocupado<br />

com os restos do desastre, da<br />

guerra, que vivem ali no meio<br />

do lixo e dos ratos.<br />

Temos isso em Angola com vários edifícios<br />

que não chegaram a ser conclu-<br />

ídos na era colonial e depois foram<br />

ocupados pela população. Transformaram-se<br />

em musseques [bairros<br />

pobres de Luanda]. São musseques<br />

ainda hoje. Alguns estão em transição<br />

para o capitalismo mas outros são irrecuperáveis.<br />

A Termiteira é um microcosmos.<br />

Os ricos, os mais ou menos<br />

ricos, e, à medida que se desce,<br />

o submundo com crianças a<br />

serem queimadas por feitiçaria.<br />

Na nota final dizes que isto<br />

está mesmo a acontecer em<br />

Angola, portanto também isto é<br />

presente.<br />

Também. Não da maneira que descrevo,<br />

evidentemente, que é um espectáculo,<br />

mas os jornais angolanos dão<br />

notícia de acontecimentos desse tipo.<br />

Não se fala muito disso. Para fora não<br />

passa informação.<br />

É uma coisa nova?<br />

Não, mas está a ser noticiada. Dificilmente<br />

passa um mês sem notícia de<br />

acontecimentos desse tipo. Há uma<br />

violência muito grande. Violência<br />

doméstica, também.<br />

Mas ligas isso à explosão de<br />

religiões e de seitas em Angola,<br />

o que pode ter a ver com o<br />

desamparo, com uma falência<br />

Quando começas a ter receio de falar<br />

escritores angolanos que estiveram po<br />

do Estado?<br />

Não sei até que ponto já acontecia, mas<br />

tem a ver com esse enorme desamparo.<br />

Com o facto de as pessoas estarem<br />

entregues a si próprias, com a<br />

ausência de Estado em grande parte,<br />

com a miséria, com a ignorância, tudo<br />

somado.<br />

A literatura, por ser aquilo a que<br />

se chama ficção, é um bom meio<br />

para fazer este retrato?<br />

Alcançam-se públicos diferentes. Eu<br />

poderia fazer uma reportagem sobre<br />

isto, as crianças que são queimadas. A<br />

sensação que tenho é que o livro dura<br />

mais tempo, portanto pode prolongar<br />

essa discussão, e envolver outro tipo<br />

de pessoas.<br />

Acho que este livro não vai ser muito<br />

lido pelas pessoas no poder em Angola,<br />

porque há poucas pessoas no poder<br />

que realmente lêem. E as que lêem,<br />

porque lêem, têm outra mentalidade,<br />

provavelmente acharão importante<br />

que o livro tenha sido publicado. O<br />

ideal é que consiga provocar algum<br />

debate. Provocar, irritar, eventualmente<br />

apaixonar as pessoas.<br />

E os autores angolanos estão a<br />

olhar para o seu país?<br />

Alguns sim, outros não. Alguns de<br />

forma mais tímida, alguns de forma<br />

mais corajosa.<br />

Este é o livro em que vais mais<br />

longe em relação ao que é


Angola?<br />

Não, é um outro olhar.<br />

Quanto ao presente?<br />

“Estação das Chuvas” tratou de um<br />

certo presente. Tal como “O Ano em<br />

que Zumbi Tomou o Rio”...<br />

Um presente que já tinha<br />

acontecido. Aqui pões-te no<br />

futuro para olhar para o que<br />

está a acontecer agora. É o<br />

primeiro livro com este tempo.<br />

Depois da guerra? Acho que sim.<br />

Há algo na literatura angolana<br />

que se possa aproximar?<br />

O Pepetela fez um pouco isso com os<br />

“Predadores” [Dom Quixote, 2005].<br />

Podia ir mais longe porque tem um<br />

conhecimento íntimo de uma realidade<br />

que eu não tenho. Podia ir buscar<br />

inspiração aos seus abismos mais profundos,<br />

e se o fizesse escreveria um<br />

livro muito mais perturbador do que<br />

qualquer livro que eu poderia escrever.<br />

Porque tem uma experiência que<br />

eu não tenho.<br />

Mas essa experiência ao mesmo<br />

tempo fê-lo refém?<br />

Acho que sim, de certa forma. O Pepetela<br />

tem vindo a soltar-se e acredito<br />

que vá conseguir, mas também não é<br />

fácil. Implica romper com lealdades<br />

antigas, partidárias, e isso ele já fez.<br />

Implica romper com amizades, com<br />

relações familares. É muito complicado<br />

num país como Angola.<br />

Na entrevista à “LER” [Maio]<br />

dizes que Ruy Duarte de<br />

Carvalho é um homem íntegro<br />

que tem medo de ofender.<br />

Que como antropólogo e<br />

escritor podia ir mais longe.<br />

Mas o projecto dele pode ser<br />

simplesmente diferente.<br />

Pode sim. E faz o seu trabalho muito<br />

bem. Não é apenas um grande escritor<br />

angolano, é um grande escritor. É mais<br />

como sociólogo [que podia ir mais<br />

longe]. É uma pessoa que viveu tanto<br />

que às vezes tenho a sensação de que<br />

está a fugir a certas discussões, que<br />

A realidade além de Agualusa<br />

António Tomás, Pepetela, Ondjaki e Ruy Duarte de Carvalho,<br />

quatro angolanos sobre como a literatura olha para Angola agora<br />

Em “Barroco Tropical”, Agualusa<br />

“conseguiu concentrar todos<br />

os males de Luanda”, diz o<br />

antropólogo António Tomás, por<br />

mail, a partir de Nova Iorque<br />

onde faz doutoramento. Já leu<br />

parte do livro e acha que tudo “é<br />

verdade e está lá”, em Luanda.<br />

“Qualquer pessoa que leia<br />

jornais ou fale com pessoas em<br />

Angola sabe que esta loucura<br />

é parte do quotidiano. Pessoas<br />

a serem mortas na rua por<br />

causa de um telemóvel, loucos<br />

a comerem lixo na rua. Mas o<br />

Agualusa não toma isso como a<br />

realidade. É uma projecção. Nem<br />

é o quotidiano dele em Luanda.<br />

Neste sentido, talvez não esteja<br />

muito longe da distopia.” No<br />

presente, crê este antropólogo,<br />

“ainda existe muito espaço para<br />

um futuro que não seja negro”.<br />

O olhar sobre o contemporâneo<br />

está noutros autores? “Está e não<br />

está.” A crítica à corrupção “já se<br />

encontra em vários romances de<br />

Pepetela”, também autor de uma<br />

distopia, “O Desejo de Kianda”,<br />

com “uma Luanda no futuro<br />

em que os prédios da Baixa<br />

começam a ruir”. E Manuel Rui é<br />

um exemplo de crítica ao poder<br />

“em mais de 30 anos de escrita”,<br />

diz Tomás. Mas “grande parte<br />

da literatura angolana, mesmo<br />

quando é crítica é escapista”,<br />

ressalva. Tal como “não existe<br />

um grande jornalismo”, os<br />

escritores angolanos “têm<br />

grandes difi culdades em lidar<br />

com a realidade”. A ponto de<br />

António Tomás achar que não<br />

há grandes romances sobre a<br />

contemporaneidade angolana.<br />

“Nem o Agualusa tem um. Tem<br />

momentos, mas no meio do<br />

seu próprio universo, que tem<br />

mais a ver com as experiências<br />

da diáspora. Os escritores<br />

angolanos, aliás, preferem<br />

colocar as histórias em universos<br />

oníricos, à maneira do realismo<br />

mágico. Ou na infância.”<br />

Há ainda outro ponto: “Muitos<br />

escritores desistiram de<br />

criticar. Como Luandino Vieira,<br />

um dos grandes críticos do<br />

regime colonial.” O que seria da<br />

literatura angolana, pergunta<br />

Tomás, “se Luandino fosse capaz<br />

de tratar Angola pós-colonial<br />

com a mesma ironia, o mesmo<br />

pendor crítico e ainda assim<br />

poético com que tratou o fi m do<br />

colonialismo?”.<br />

Este “escapismo” tem várias<br />

razões, aponta. “Grande parte<br />

dos escritores angolanos,<br />

senão todos, com excepção<br />

de Agualusa, esteve ligada<br />

à política.” E com partido<br />

único. “Portanto, a literatura<br />

angolana contemporânea está<br />

comprometida com o poder, não<br />

na forma actual, mas no período<br />

de afi rmação.”<br />

Na sequência disto, crê Tomás,<br />

os escritores em Angola “são<br />

contadores de histórias, como<br />

Pepetela, com pouca intervenção<br />

social”, ou “se têm intervenção<br />

social, falam pelo poder ou<br />

fazem partes das estruturas<br />

partidárias”, como Costa<br />

Andrade, Arnaldo Santos e <strong>Jo</strong>ão<br />

Melo, diz Tomás. “Em relação<br />

a isso, Agualusa é diferente. É<br />

romancista, logo contador de<br />

histórias, mas tem uma postura<br />

intelectual que ninguém tem em<br />

Angola.”<br />

Respondendo por mail a partir<br />

de Luanda, Pepetela acha que<br />

“já é uma tradição a literatura<br />

angolana relatar a própria<br />

realidade”. E cita autores que<br />

o continuam a fazer: Manuel<br />

Rui, Arnaldo Santos, <strong>Jo</strong>ão Tala,<br />

Jacques dos Santos ou <strong>Jo</strong>ão Melo.<br />

Do Rio de Janeiro, também<br />

por mail, o romancista Ondjaki<br />

começa por salientar que<br />

“quase tudo, historicamente, é<br />

recente na literatura angolana,<br />

mesmo considerando o que<br />

foi produzido desde os anos<br />

50”. Na prosa cita Ruy Duarte<br />

de Carvalho, Pepetela, <strong>Jo</strong>ão de<br />

Melo, Manuel Rui, Boaventura<br />

Cardoso, Arnaldo Santos ou<br />

Luís Fernando. Na poesia, Ana<br />

Paula Tavares e Ruy Duarte de<br />

Carvalho. E ainda <strong>Jo</strong>ão Maimona,<br />

<strong>Jo</strong>sé Luís Mendonça e Adriano B.<br />

De Vasconcelos.<br />

Os livros de Pepetela, diz, são<br />

“uma importante refl exão sobre<br />

o passado mais recente, esta<br />

mancha que vai desde 1975 até<br />

hoje”, enquanto que “Manuel Rui<br />

tem escrito sobre os anos 90 e o<br />

início do século XXI”. E destaca a<br />

prosa de Ruy Duarte de Carvalho.<br />

Porque sendo “dos autores mais<br />

“preparados intelectualmente e<br />

talentosos literariamente”, tem<br />

“dado a conhecer, aos angolanos<br />

e aos estrangeiros, uma visão<br />

analítica da nossa realidade,<br />

conjugando o olhar de autor com<br />

a experiência pessoal, aliando<br />

a estes projectos uma prosa tão<br />

poderosa quanto profunda”, diz<br />

Ondjaki.<br />

Não a partir da Namíbia,<br />

onde agora vive, mas<br />

circunstancialmente de<br />

Barcelona por mail, que pensa o<br />

próprio Ruy Duarte?<br />

Primeiro, “talvez, que muito<br />

daquilo que se vem consumindo<br />

como literatura angolana, ‘agora’,<br />

é uma produção escrita de franco<br />

sentido de oportunidade e muito<br />

fraca qualidade literária que<br />

não dá notícia, na maioria dos<br />

casos, nem da situação nem da<br />

condição angolanas” e “que<br />

não concorre nem convoca para<br />

uma séria, honesta, e sincera<br />

compreensão da situação e da<br />

condição angolanas vividas,<br />

lar não podes ser escritor. Tens que ter a coragem de te expor. Era isso que eu esperava dos<br />

por dentro desses processos históricos, complexos, violentos<br />

podia enfrentar mais.<br />

O que é que gostavas de ler de<br />

alguém como Luandino Vieira?<br />

Conheces Rian Malan? Escreveu “My<br />

Traitor’s Heart.” É da família do Magnus<br />

Malan [general sul-africano do<br />

regime “apartheid”]. O livro é impressionante.<br />

Porque ele enfrenta tudo.<br />

Todos os seus pesadelos, todo o seu<br />

passado, as ligações da família ao<br />

“apartheid”, expõe-se completamente.<br />

Isto é o que um escritor deve fazer.<br />

Quando começas a ter receio de falar<br />

não podes ser escritor. Tens que ter a<br />

coragem de te expor. Era isso que eu<br />

esperava dos escritores angolanos que<br />

estiveram por dentro desses processos<br />

históricos, complexos, violentos, que<br />

sabem coisas que eu não sei, que viveram<br />

emoções que eu não vivi. Que<br />

fossem capazes de se entregar. Estou<br />

a falar de todos.<br />

Ainda vai acontecer?<br />

A alguns sim. O Pepetela vai acabar<br />

por se soltar completamente.<br />

E o Luandino?<br />

Não sei.<br />

Dizes que o escritor não pode<br />

ter receio de falar. Ao mesmo<br />

tempo a tua família está em<br />

Luanda, os teus filhos. Esses<br />

laços não te constrangem?<br />

Constrangem.<br />

A família é um escudo ou um<br />

limite?<br />

Ruy Duarte<br />

De Carvalho<br />

“Dar notícia da<br />

tal ‘realidade’ de<br />

Angola agora,<br />

em 2009, com<br />

tudo o que ela<br />

terá de imediata<br />

e mediaticamenteescabroso,<br />

chocante,<br />

abominável,<br />

criminoso<br />

até, tal como<br />

acontece em<br />

outras partes<br />

do mundo,<br />

será do foro da<br />

reportagem, da<br />

crónica ou da<br />

investigação,<br />

que é urgente e<br />

importante sim<br />

que se façam,<br />

e eu também<br />

tenho feito e se<br />

calhar ainda<br />

tenho para<br />

fazer, mas não<br />

do da literatura”<br />

Ondjaki<br />

Os livros de<br />

Pepetela, diz,<br />

são “uma importante<br />

refl exão<br />

sobre o passado<br />

mais recente,<br />

esta mancha<br />

que vai desde<br />

1975 até hoje”<br />

DAVID CLIFFORD/ARQUIVO NUNO FERREIRA SANTOS<br />

ruminadas e digeridas em<br />

Angola ou fora”.<br />

Depois, que “dar notícia<br />

da tal ‘realidade’ de Angola<br />

agora, em 2009, com tudo<br />

o que ela terá de imediata e<br />

mediaticamente escabroso,<br />

chocante, abominável, criminoso<br />

até, tal como acontece em outras<br />

partes do mundo, será do foro<br />

da reportagem, da crónica ou<br />

da investigação, que é urgente e<br />

importante sim que se façam, e<br />

eu também tenho feito e se calhar<br />

ainda tenho para fazer, mas não<br />

do da literatura”.<br />

O que “talvez diga respeito<br />

a uma literatura angolana<br />

ocupada com o ‘agora’ de Angola”<br />

será “dar a sentir o que terá sido,<br />

estará e virá talvez a ser o ‘tempo’<br />

de uma Angola que é a que nos<br />

diz a todos nós respeito agora”.<br />

Em suma, quanto à literatura<br />

estar ou não a dar a ver a<br />

realidade, “alguma sim, em<br />

certos livros, para quem os lê,<br />

outra não, até mesmo para quem<br />

a lê, porque não é de Angola, é<br />

de outra coisa que só existe no<br />

continente mediático e do senso<br />

comum banalizado, que ela está<br />

a tratar”. A.L.C.<br />

Pepetela<br />

“Já é uma<br />

tradição a literatura<br />

angolana<br />

relatar a própria<br />

realidade”<br />

Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009 • 7


Num país como Angola, todo o tipo<br />

de ligações pode dificultar a tarefa de<br />

um escritor. Pode facilitar, porque são<br />

esses laços que permitem compreender.<br />

Não são um escudo, mas uma<br />

forma de alcançar determinadas histórias,<br />

de chegar ao coração das pessoas.<br />

E ao mesmo tempo são perturbadores<br />

e inibidores.<br />

Já se te colocou essa questão? A<br />

liberdade como escritor fazer-te<br />

sair de Angola?<br />

Mas já estou fora de Angola. Estou dentro<br />

e fora. Se estivesse completamente<br />

mergulhado teria muito mais dificuldade<br />

em escrever. O regime angolano<br />

não tem nenhuma forma de me limitar<br />

do ponto de vista económico. O meu<br />

dinheiro não é ganho em Angola. Vivo<br />

dos meus direitos de autor, dos livros<br />

que vendo no mundo. Nesse sentido<br />

já vivo fora. O que me dá grande liberdade.<br />

Por outro lado, o facto de viajar<br />

muito dá-me distanciamento. De cada<br />

vez que volto sou capaz de ver coisas<br />

que talvez não visse.<br />

O que me interessa é retratar o<br />

absurdo. Quando a gente convive quotidianamente<br />

com o absurdo acaba<br />

por o achar normal. É algo que sinto<br />

quando estou em Luanda sempre. As<br />

pessoas deixaram de ver. Eu vejo porque<br />

venho de fora. Acho que não conseguiria<br />

escrever se não fosse isso.<br />

Quanto tempo passas em<br />

Angola? É a maior parte do<br />

tempo?<br />

Não sei, mas gostaria de passar mais.<br />

Estou a viajar demais.<br />

O protagonista de “Barroco<br />

Tropical” apesar de não ter um<br />

olho, o que lhe dá logo a cara<br />

do [lendário general israelita]<br />

Moshe Dayan...<br />

Pensei nele, pensei.<br />

... e de ser realizador de<br />

documentários além de<br />

romancista, tem muitas<br />

coincidências biográficas<br />

contigo.<br />

Isso agrada-me. Que as pessoas construam<br />

essa imagem. Sobretudo o episódio<br />

do Agostinho Neto [“poeta medíocre”].<br />

Era quase impossível não aproveitar<br />

esse episódio porque é revelador<br />

de como o aburdo se instala na realidade.<br />

Tiveste medo, aí?<br />

Tive, muito. Claro que tive. Eu estava<br />

em Luanda e precisava de sair, já não<br />

sei para onde. E tive aquele medo<br />

óbvio de não conseguir sair.<br />

Tiveste medo de ser morto?<br />

Não.<br />

Medo pelos teus filhos, existe<br />

esse medo?<br />

Um pouco.<br />

Depois desse episódio diluiu-se?<br />

Diluiu. Acho que o episódio se entende<br />

no contexto em que foi produzido,<br />

poucas semanas antes das eleições [em<br />

Setembro de 2008]. Era um período<br />

em que havia intenção do regime de<br />

tentar silenciar todas as vozes críticas.<br />

De uma maneira ou de outra, é claro<br />

que comigo foi um pretexto. Foi uma<br />

campanha desencadeada pelo “<strong>Jo</strong>rnal<br />

de Angola”, presumo que pelo regime,<br />

e depois as mesmas pessoas do regime<br />

que a desencadearam decidiram parar<br />

com ela porque perceberam que<br />

estava a ir longe demais.<br />

Li um texto sobre os teus<br />

comentários às eleições de 2008<br />

insinuando que<br />

te preparavas<br />

para entrar na<br />

8 • Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009<br />

“O que me interessa<br />

é retratar o absurdo.<br />

Quando a gente<br />

convive<br />

quotidianamente<br />

com o absurdo acaba<br />

por o achar normal.<br />

É algo que sinto<br />

quando estou em<br />

Luanda sempre.<br />

As pessoas deixaram<br />

de ver. Eu vejo porque<br />

venho de fora. Acho<br />

que não conseguiria<br />

escrever se não fosse<br />

isso”<br />

oposição. Alguma vez te passou<br />

pela cabeça entrar na política?<br />

Não, Deus me livre e guarde, nem pensar<br />

nisso. Nem de longe nem de perto.<br />

Não tenho o menor talento, não gosto,<br />

não quero.<br />

Outro ponto em que foste<br />

atacado foi por teres dito ao<br />

“<strong>Jo</strong>rnal de Notícias”, em 2007:<br />

“Conheço alguns torturadores<br />

em Angola, pessoas que<br />

interrogaram e torturaram<br />

presos políticos em 1977, que<br />

são recebidos em Portugal como<br />

bons escritores.” Criticaram<br />

o facto de não teres apontado<br />

nomes, permitindo que todos<br />

pudessem ser suspeitos.<br />

Respondeste a isto, na entrevista<br />

à “LER”, dizendo que esses<br />

nomes têm aparecido em livros,<br />

que se sabe quem são, mas<br />

também dizes que há casos<br />

distintos. Se há casos distintos<br />

por que não os distingues?<br />

Não é o meu trabalho. Devia ser constituído<br />

algo semelhante aos tribunais<br />

de reconciliação que existiram na<br />

África do Sul para tratar concretamente<br />

do 27 de Maio [de 1977].<br />

Depois também, talvez, da guerra civil.<br />

Mas do 27 de Maio, que é um processo<br />

que inquieta muita gente. A única<br />

maneira é abrir todos os arquivos e<br />

pôr toda a gente a discutir, a chorar<br />

em conjunto.<br />

Mas quando dizes que há<br />

torturadores que são recebidos<br />

como bons escritores em<br />

Portugal...<br />

Isso foi a citação do Queiroz [no “<strong>Jo</strong>rnal<br />

de Angola”], mas o que está na<br />

entrevista...<br />

Eu tirei esta citação da<br />

entrevista que deste ao “JN”.<br />

Pronto, então não devia ter dito<br />

assim.<br />

Nos livros que foram publicados<br />

[sobre os acontecimentos de 27 de<br />

Maio] há uma série de escritores nomeados,<br />

alguns erradamente [como interrogadores/<br />

torturadores]. Mas isso eu<br />

escrevi no Ípsilon, quando saiu o livro<br />

da Dalila [Mateus, “Purga em Angola”].<br />

“Acho que este livro não vai ser muito lido pelas pessoas no poder em<br />

Angola, porque há poucas pessoas no poder que realmente lêem”<br />

DANIEL ROCHA<br />

Escrevi: este livro é importante mas<br />

entre os acusados sei que alguns não<br />

estiveram presentes nessas comissões<br />

[de interrogatório], concretamente o<br />

Luandino Vieira. Sei, porque pessoas<br />

ligadas ao processo me disseram, mas<br />

não vivi o processo. A Dalila coloca<br />

outros nomes. Não me considero a<br />

pessoa apta para dizer. Na segunda<br />

edição ela corrige, retira o nome do<br />

Luandino, o nome do Ruy Duarte de<br />

Carvalho também tinha sido confundido<br />

com o Rui de Carvalho, que foi<br />

director da televisão em Angola. Havia<br />

pequenos equívocos no livro que lhe<br />

retiravam legitimidade. Mas é um livro<br />

importante, e é preciso discutir abertamente.<br />

São tragédias humanas. Muitos<br />

dos filhos dizem que não querem<br />

vingança, querem saber o que aconteceu<br />

ao pai. Têm esse direito.<br />

Tens dito que “Barroco<br />

Tropical” é o livro em que te<br />

permites uma exuberância de<br />

personagens, e nota-se. Há mil<br />

caminhos que o livro podia<br />

seguir. O que pode ser visto<br />

como um dos excessos do livro.<br />

É um livro de excessos, quis que fosse<br />

assim e tentei construir uma estrutura<br />

para o sustentar. Mas é de longe o livro<br />

mais exuberante.<br />

Mesmo quando é negro há um<br />

movimento festivo, de tudo<br />

aparecer e irromper.<br />

Isso é Angola. Essa voragem festiva é<br />

África. É tropical. É América Latina<br />

também. Durante a tragédia há a<br />

festa.<br />

O protagonista Bartolomeu<br />

Falato diz que tem um imenso<br />

talento para a felicidade. E<br />

ao “JN” disseste que és uma<br />

das pessoas mais felizes que<br />

conheces. Não me lembro de<br />

ouvir um escritor dizer coisa<br />

semelhante. Talvez isso seja<br />

parte do teu prazer. Poder dizer<br />

isso, porque a imagem mais<br />

vulgar de um escritor é mais<br />

atormentada.<br />

Talvez os escritores atormentados<br />

sejam mais dos países do Norte. É mais<br />

difícil imaginar o García Marquéz atormentado<br />

que o Günter Grass. Não consigo<br />

ver o <strong>Jo</strong>rge Amado como um escritor<br />

atormentado.<br />

Mas na literatura brasileira, se<br />

pensarmos em figuras como<br />

Raduan Nassar ou Clarice<br />

Lispector, há ali um turbilhão.<br />

Mesmo o <strong>Jo</strong>ão Cabral...<br />

Por cada uma dessas penso noutras<br />

que são o oposto. A imagem do escritor<br />

atormentado é mais daqui, dos países<br />

frios. O Chico Buarque é um excelente<br />

escritor, joga futebol e canta samba.<br />

Há uma melancolia no Chico.<br />

Também há, mas canta samba e joga<br />

futebol, o que na Europa seria mais<br />

difícil de conseguir.<br />

Portanto achas que não é<br />

uma costela que te falta, a<br />

melancolia.<br />

A minha ex-editora angolana é a única<br />

do mundo que tem um bloco de Carnaval.<br />

Aqui também seria estranho.<br />

Esse talento para a felicidade mesmo<br />

em situações difíceis é algo que encontras<br />

nos países do sul.<br />

Então isso aconteceu-te porque<br />

nasceste em Angola?<br />

Porque também sou uma pessoa com<br />

sorte. Tenho uma vida mais feliz do<br />

que muitas outras.<br />

Ver crítica de livros págs. 42


COMEMORAÇÃO 20 ANOS FUNDAÇÃO DE SERRALVES<br />

10 ANOS MUSEU DE ARTE CONTEMPORÂNEA<br />

MÚSICA<br />

TONY CONRAD &<br />

GENESIS P. ORRIDGE<br />

14 JUN 2009, 22h00, AUDITÓRIO<br />

c/ o convidado Morrison Edley (PTV3/Psychic TV)<br />

APOIO MÚSICA APOIO À DIVULGAÇÃO<br />

COM O APOIO


STIAN ANDERSEN<br />

O norueguês <strong>Jo</strong> <strong>Nesbø</strong> (n. 1960) é a<br />

nova estrela nórdica dos autores de<br />

romances policiais, depois de os suecos<br />

Henning Mankell (com a série do comissário<br />

Wallander) e Stieg Larsson (com<br />

a trilogia “Millennium”), dos islandeses<br />

Arnaldur Indridason e Yrsa Sigurdardóttir,<br />

ou de Anne Holt (antiga ministra<br />

da justiça da Noruega) - para referir<br />

apenas aqueles que estão publicados<br />

em Portugal - terem aberto o caminho<br />

e marcado uma forte presença no<br />

género. Os livros de <strong>Nesbø</strong> têm subido<br />

nos tops ingleses, canadianos e norteamericanos<br />

(nos países nórdicos chega<br />

a ter cinco livros entre os dez mais vendidos),<br />

e jornais como o “The New York<br />

Times”, o “The Guardian” ou o “Daily<br />

Telegraph” não lhe têm poupado elogios.<br />

Os prémios são-lhe atribuídos<br />

com frequência; o último foi o de<br />

melhor romance publicado na Noruega<br />

em 2008. “O Pássaro de Peito Vermelho”,<br />

que agora por cá se publica, é o<br />

terceiro livro da série do detective<br />

Harry Hole. Este, num período de ressaca<br />

da sua dependência do álcool, tem<br />

que resolver um caso de tráfico de<br />

armas em que aparecem envolvidos<br />

nazis e neo-nazis, e ainda um antigo<br />

soldado norueguês que lutou na frente<br />

alemã durante a II Guerra; o romance<br />

decorre em dois tempos narrativos: na<br />

10 • Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009<br />

década de 90 em Oslo, e em 1942-43<br />

nas trincheiras de Leninegrado e num<br />

hospital austríaco.<br />

Sobre o actual “boom” de policiais<br />

nórdicos, e em que é que estes diferem<br />

dos americanos, <strong>Jo</strong> <strong>Nesbø</strong> disse ao Ípsilon,<br />

via correio electrónico desde Oslo:<br />

“São autores que são também bons<br />

escritores, que não se limitam apenas<br />

ao entretenimento, há nos livros também<br />

uma dimensão poética. Mas as<br />

diferenças entre autores nórdicos são<br />

provavelmente maiores do que as que<br />

existem entre as duas culturas [nórdica<br />

e americana]. Eu estou talvez mais<br />

perto daquilo que as pessoas acham<br />

que é uma invenção americana: as histórias<br />

‘noir’ ou ‘hard-boiled’. Mas estas<br />

têm também muito das sagas nórdicas,<br />

com os seus heróis e vilões, personagens<br />

com um grande sentido da tragédia<br />

e um humor tão seco como o do<br />

detective Marlowe, do Chandler.”<br />

Futebol, rock e bolsa<br />

Mas este norueguês que aos 37 anos<br />

escreveu o primeiro livro por enfado<br />

parece ter nascido fadado para o<br />

sucesso. Aos 17 já jogava futebol profissionalmente<br />

num clube da primeira<br />

liga norueguesa e sonhava com uma<br />

brilhante carreira de futebolista. Mas<br />

uma rotura de ligamentos fez com que<br />

todos os sonhos ruíssem. Alistou-se<br />

então no exército e rumou para o<br />

extremo mais gelado da Noruega, por<br />

onde se manteve durante três anos.<br />

Por causa do futebol, as notas na escola<br />

secundária não tinham sido brilhantes.<br />

Decidiu estudar tudo de novo e fazer<br />

exames: nota máxima. Faltava agora<br />

escolher uma carreira. Foi estudar economia<br />

e finanças, porque não? Mas<br />

ainda na universidade, convidaram-no<br />

para ser guitarrista e também vocalista<br />

de uma banda rock. Não gostava das<br />

letras que os outros lhe davam cantar<br />

e decidiu ser ele a escrevê-las. “A diferença<br />

entre escrever letras para canções<br />

ou romances não é grande. São<br />

diferentes espaços, ambos com possibilidades<br />

limitadas para se contar tudo<br />

o que se quer, para criar e definir um<br />

universo. Podemos apenas dar um<br />

pontapé de saída na imaginação do<br />

ouvinte ou do leitor, e depois é ele que<br />

tem que fazer o resto”, diz.<br />

Passados alguns anos, já numa outra<br />

banda musical, ao segundo disco viuse<br />

transformado em estrela rock. Os<br />

concertos sucediam-se e o disco foi o<br />

mais vendido de sempre de um grupo<br />

norueguês. Ao mesmo tempo, a sua<br />

carreira profissional de corrector da<br />

bolsa e de analista financeiro numa das<br />

empresas mais prestigiadas da Noruega<br />

caminhava para o topo. Trabalhava de<br />

dia e tocava de noite. Uma manhã,<br />

cansado e zangado com todos decidiu<br />

parar durante seis meses para pensar.<br />

Informou da sua decisão o patrão e a<br />

banda e partiu para o mais longe possível<br />

de Oslo, a Austrália. Mas levou<br />

um computador portátil pois uma editora<br />

encomendara-lhe um livro sobre<br />

“a vida de um músico na estrada”.<br />

Durante as trintas horas de tédio nas<br />

salas de espera dos aeroportos e nos<br />

voos até chegar a Sydney, arquitectou<br />

a história do seu primeiro romance e<br />

criou o inspector Harry Hole. “Harry<br />

era o nome próprio de um jogador de<br />

futebol da equipa do lugar onde cresci.<br />

Hole era o apelido de um polícia na<br />

aldeia da minha avó. Ela costumava<br />

dizer que se não estivéssemos em casa<br />

às oito, vinha o Hole e levava-nos.<br />

Nunca o vi, só o imaginei. Ainda hoje<br />

tremo ao ouvir o nome.”<br />

Os seis meses na Austrália foram<br />

ocupados com a escrita de um<br />

romance policial. “Queria começar<br />

com alguma coisa que eu soubesse<br />

como acabava. Gostei sempre da lógica<br />

dos policiais ou dos romances de mistério.<br />

O tentar adivinhar e o encontrar,<br />

as personagens que balançam entre<br />

serem protagonistas ou antagonistas.<br />

Não há normas sobre como deve ser<br />

“Eu estou talvez mais<br />

perto daquilo que<br />

as pessoas acham que<br />

é uma invenção<br />

americana:<br />

as histórias ‘noir’<br />

ou ‘hard-boiled’. Mas<br />

estas têm também<br />

muito das sagas<br />

nórdicas, com os seus<br />

heróis e vilões,<br />

personagens com um<br />

grande sentido da<br />

tragédia e um humor<br />

tão seco como o<br />

do detective Marlowe,<br />

do Chandler”<br />

Foi jogador de futebol, militar, vocalista de rock e corrector da bolsa.<br />

a escrever. Autor de “O Pássaro de Peito Verme lho”, é a nova estre<br />

<strong>Jo</strong> <strong>Nesbø</strong><br />

born to b


um policial, que fronteiras ter, que<br />

limites definem o género, pode-se<br />

assim ter um diálogo mais íntimo com<br />

o leitor. Há só um ponto de partida, e<br />

depois joga-se a partilhar expectativas.”<br />

Histórias da guerra<br />

<strong>Nesbø</strong> regressou a Oslo cansado de<br />

escrever. Enviou o livro para uma editora<br />

assinado com um pseudónimo<br />

para que não o publicassem apenas<br />

porque tinha sido escrito por uma<br />

estrela rock. Entretanto, ainda antes<br />

de tornar a ligar o computador na<br />

empresa financeira, pediu a demissão.<br />

Precisava de tempo. O seu pai morrera<br />

poucos meses depois de se ter reformado<br />

e quando se aprontava para,<br />

finalmente, escrever as suas memórias<br />

como soldado nas fileiras alemãs<br />

durante a II Guerra. Mas <strong>Jo</strong> <strong>Nesbø</strong>, em<br />

jeito de homenagem, aproveitou algumas<br />

das histórias que o pai lhe contara,<br />

e que deixou por escrever, para “O<br />

Pássaro de Peito Vermelho”. “Pode-se<br />

dizer que a II Guerra definiu a Noruega<br />

como nação, que é um país jovem,<br />

independente desde 1905. A minha<br />

família esteve nos dois lados da contenda:<br />

a parte da minha mãe, ocupada<br />

com a resistência, o meu pai a lutar ao<br />

lado dos alemães contra Estaline. Eu<br />

cresci com uma versão muito realista<br />

dessa guerra. E usei em ‘O Pássaro do<br />

Peito Vermelho’ a história do meu pai,<br />

que é tão dramática. Os pormenores<br />

mais pesados, que podem parecer<br />

pura ficção, foram vividos pelo meu<br />

pai nas trincheiras de Leninegrado.”<br />

Passadas semanas sobre o envio do<br />

manuscrito para a editora, informaram-no<br />

que o livro que ele escrevera<br />

iria ser publicado. Para seu espanto,<br />

quando na editora revelou o seu verdadeiro<br />

nome, ninguém o reconheceu.<br />

Tentou ainda com o nome da banda,<br />

mas apenas uma pessoa tentou trautear<br />

uma música; e que ainda por cima<br />

fazia parte do reportório de um outro<br />

grupo musical que não o seu.<br />

O primeiro romance de <strong>Jo</strong> <strong>Nesbø</strong> foi<br />

distinguido com o “Glass Key” para o<br />

melhor policial escandinavo. Até hoje<br />

escreveu outros sete. Apenas o mais<br />

recente não pertence à série do inspector<br />

Harry Hole, personagem ensimesmada,<br />

com um certo lado obscuro,<br />

e que tem mais do autor do que aquilo<br />

que ele gostaria de admitir. “Preciso<br />

de gente desesperada nas minhas histórias,<br />

pessoas com conflitos. As pessoas<br />

felizes e contentes não são interessantes.”<br />

Ver crítica de livros págs. 42 e segs<br />

. Cansou-se da vida que levava e começou<br />

e la do policial nórdico. <strong>Jo</strong>sé Riço Direitinho<br />

e a star<br />

Livros<br />

Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009 • 11


Livros<br />

Um título como “Elegia Para um Americano”<br />

(no original, “The Sorrows of<br />

an American”) parece anunciar uma<br />

epopeia americana, até nos lembrarmos<br />

que, por estes dias, as epopeias<br />

americanas - essas narrativas desmesuradas<br />

em que a pequena história se<br />

confunde com o destino de uma nação<br />

- têm títulos (insuspeitos) como “Middlesex”.<br />

E, apesar de o 11 de Setembro<br />

aparecer aqui, muito explicitamente,<br />

como um trauma, ou a guerra do Iraque<br />

pairar sobre a narrativa, as expectativas<br />

de um romance político serão<br />

frustradas. Não, definitivamente, “Elegia”<br />

não é esse tipo de livro, mas (não<br />

tenhamos medo de dizê-lo, mesmo que<br />

soe piroso em tempos de cinismo) um<br />

romance sentimental - escrito com a<br />

cabeça. Outra coisa que também não<br />

nasceu ontem (mas que soa menos<br />

piroso): é um romance de ideias - daí<br />

a sensação ocasional de que as personagens<br />

falam menos entre si do que<br />

para nós; e que estão a tentar dizer-nos<br />

coisas sobre o próprio livro, mais do<br />

que sobre uma suposta “história”.<br />

“Sabes que eu sempre pensei na completude<br />

e na integração como mitos<br />

necessários”, diz uma personagem de<br />

“Elegia Para um Americano” (página<br />

135). Estará a autora a enviar-nos recados<br />

sobre a literatura? A verdade é que<br />

este é um romance esquivo, inapreensível<br />

- um romance de segredos, como<br />

é anunciado na primeira frase, mas em<br />

que a autora parece revelar quase tudo,<br />

muito cedo. No final, o leitor pode não<br />

ter a certeza do que aconteceu. Isto é,<br />

do que acabou de lhe acontecer.<br />

Como uma psicanalista<br />

<strong>Siri</strong> <strong>Hustvedt</strong>, 54 anos, está num hotel<br />

lisboeta a cumprir uma agenda carregada<br />

de entrevistas com a imprensa.<br />

A assessora de imprensa da Asa, a editora<br />

que publica os livros de <strong>Hustvedt</strong><br />

em Portugal, diz que muitos jornalistas<br />

são repetentes - já tinham entrevistado<br />

a autora em 2005, quando saiu o seu<br />

anterior romance, “Aquilo Que eu<br />

Amava”, e fizeram questão em voltar.<br />

Nem sequer é preciso ser um admirador<br />

da sua prosa: os seus livros convidam<br />

naturalmente ao debate, como<br />

se prolongássemos o jogo intelectual<br />

presente nas suas páginas, e <strong>Hustvedt</strong><br />

é uma interlocutora estimulante. Dessas<br />

que tem tudo para dar certo (se<br />

não der, a culpa não é dela).<br />

De certa maneira, as entrevistas<br />

com ela são menos justificações do que<br />

escreveu do que exegeses da sua obra.<br />

Foi por isso que, em 2005, escrevemos<br />

que por vezes ela parece falar como<br />

um psicanalista.<br />

<strong>Hustvedt</strong> revelou então que já estava<br />

a escrever um novo romance, a história<br />

de uma família narrada por um<br />

psicanalista, e é isso “Elegia Para um<br />

Americano”. Dois irmãos, um psica-<br />

<strong>Siri</strong> <strong>Hustvedt</strong><br />

Escrever como um<br />

Segredos no “habitat” que lhes é mais natural: a família. Chama-se “Elegia Para Um Americano” e<br />

É um livro narrado por um homem mas o autor é uma mulher. Encontro em L<br />

12 • Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009


PEDRO CUNHA<br />

nalista e uma escritora, acabam de<br />

perder o pai e a descoberta da carta<br />

de uma desconhecida entre os papéis<br />

do falecido é a prova de que ele lhes<br />

era estranho. Segredos no “habitat”<br />

que lhes é mais natural: a família. O<br />

romance é atravessado pelo tema da<br />

imigração (mas não é, de todo, a sua<br />

versão triunfante, como ficaria bem<br />

na era Obama): a família Davidsen, de<br />

origem norueguesa, chegou à América<br />

há poucas gerações. O que nos leva de<br />

volta ao título do livro. “Posso dizer-lhe<br />

como é que surgiu”, começa <strong>Siri</strong> <strong>Hustvedt</strong>.<br />

“Eu estava a ler o livro de memórias<br />

de Ulysses S. Grant [1822-1885,<br />

um ex-general da Guerra Civil que foi<br />

o 18º presidente dos EUA]. Logo na<br />

primeira página, ele diz qualquer coisa<br />

como: ‘A minha família é americana<br />

há seis gerações’. E eu pensei: ‘Oh, essa<br />

não é a minha história.’ Na verdade,<br />

há ironia no título.” Uma maneira de<br />

perguntar: e o que é um americano?<br />

<strong>Hustvedt</strong> nasceu no Minnesota<br />

(como os irmãos do seu romance),<br />

filha de uma imigrante norueguesa e<br />

de um professor de Literatura Escandinava<br />

cujos pais eram noruegueses.<br />

O norueguês foi a sua primeira língua<br />

(como os irmãos). Os seus romances<br />

parecem denunciar sempre uma ligação<br />

com a sua vida, e isso talvez seja<br />

ainda mais verdade em “Elegia Para<br />

um Americano”: no final, numa nota<br />

de agradecimentos, <strong>Hustvedt</strong> explica<br />

que o seu pai morreu em 2003 e que<br />

as passagens de texto atribuídas ao<br />

ficcional Lars Davidsen no livro são,<br />

na verdade, excertos das memórias<br />

que o seu pai escreveu. “Comecei a<br />

trabalhar neste livro antes da morte<br />

dele. E perguntei-lhe se podia usar<br />

partes do seu livro de memórias - era<br />

um livro de memórias, não um diário,<br />

que ele escreveu especificamente para<br />

a família e para os amigos”, explica.<br />

Perguntamos-lhe se isso fez da escrita<br />

de “Elegia” uma experiência particular,<br />

diferente das anteriores. “Não.<br />

Todos os meus livros foram experiências<br />

muito emocionais para mim. Mas<br />

o facto de ter citado directamente o<br />

meu pai fez parte de um impulso para<br />

salvar uma parte dele. Mas só dei conta<br />

disso muito mais tarde.”<br />

Ser outra pessoa<br />

A voz que escutamos em “Elegia” é a<br />

de um homem. <strong>Hustvedt</strong> já fez isto<br />

antes, em “Aquilo Que eu Amava”, mas<br />

não deixa de ser uma surpresa, quando<br />

se percebe, na segunda página, que o<br />

narrador não é uma mulher. E por que<br />

é que isso havia de ser território exclusivamente<br />

masculino? “Às vezes<br />

parece-me que as pessoas partem do<br />

princípio que somos arrivistas ou coisa<br />

do género por fazer isto.” <strong>Hustvedt</strong><br />

escreveu um ensaio, intitulado “Being<br />

a Man”, sobre “escrever na pele de um<br />

“Quer as mulheres<br />

gostem ou não,<br />

e julgo que muitas<br />

de nós não<br />

gostam nada,<br />

a voz de uma mulher<br />

implica uma certa<br />

marginalidade”<br />

homem”. “Uma das diferenças”, esclarece,<br />

“é que se trata de uma voz com<br />

maior autoridade na nossa cultura.<br />

Mais central. Quer as mulheres gostem<br />

ou não, e julgo que muitas de nós não<br />

gostam nada, a voz de uma mulher<br />

implica uma certa marginalidade. Sim,<br />

é diferente: ouvimos todas as vozes dos<br />

homens que foram importantes para<br />

nós, mas também todos os homens<br />

dos livros que lemos. E aí, qualquer<br />

que seja a contagem, existem mais<br />

vozes masculinas do que femininas na<br />

literatura.”<br />

Aparentemente, há leitores (ou jornalistas?)<br />

que levam tão a sério as coincidências<br />

entre a escritora e as suas<br />

personagens que às vezes ela tem de<br />

explicar que Erik, o narrador e protagonista<br />

do seu quarto romance, não é<br />

ela. “Ninguém consegue realmente<br />

separar, a menos que lhe diga. Inevitavelmente,<br />

existe uma espécie de<br />

curiosidade mórbida sobre o que é que<br />

no livro tem a ver connosco [autores]<br />

e o que é que não tem a ver connosco.<br />

Se um livro tem uma ressonância emocional<br />

e os sentimentos funcionam, as<br />

pessoas partem do princípio que<br />

aquilo tem de ser real.” <strong>Siri</strong> nunca diria<br />

um flaubertiano “Erik c’est moi”, portanto?<br />

“Não, todas as personagens<br />

‘c’est moi’. Não há dúvida de que Erik<br />

tem, em parte, a ver comigo. Mas de<br />

forma a criar alguém assim, precisamos<br />

de sair de nós mesmos, tanto precisamos<br />

de sondar o nosso interior.<br />

Antes de mais, a sexualidade masculina<br />

é diferente da feminina. No livro,<br />

Erik tem imensas fantasias sexuais.<br />

Tenho tido vários leitores homens. Na<br />

Austrália, no final de uma entrevista<br />

para a rádio, o jornalista disse-me: ‘Isto<br />

sou eu. Erik e eu somos iguais’.”<br />

<strong>Hustvedt</strong> refere-se a Erik como “uma<br />

espécie de irmão imaginário” (se repararmos<br />

bem, é com Inga, a irmã dele,<br />

que se parece mais) e diz que, para ela,<br />

“um romance é sempre ocupar outra<br />

posição, ser outra pessoa”. “E sendo<br />

outra pessoa, encontro imensa liberdade:<br />

se ocuparmos outra posição,<br />

ficamos mais livres para explorar certas<br />

verdades emocionais.”<br />

Na montagem paralela, sem um<br />

ponto fixo, que é a construção de “Elegia<br />

Para um Americano”, <strong>Hustvedt</strong><br />

inclui as sessões de Erik com os seus<br />

pacientes, existências acidentadas,<br />

atropeladas por traumas. <strong>Hustvedt</strong><br />

voluntariou-se para dar aulas semanais<br />

de escrita numa clínica psiquiátrica em<br />

Nova Iorque, de forma a pesquisar para<br />

o livro. Nota-se, além do mais, que há<br />

muita erudição sobre assuntos do cérebro<br />

por trás de “Elegia”. Inga, a irmã<br />

do livro, anuncia que está a escrever<br />

um livro de “histórias de filósofos, histórias<br />

de descoberta, histórias que<br />

demonstram como os sentimentos e<br />

as ideias são inseparáveis” (página 57)<br />

e, mais tarde, o neurocientista (das<br />

emoções) português radicado nos EUA,<br />

António Damásio, é referido numa lista<br />

de “expoentes na área”. <strong>Hustvedt</strong> diz<br />

que acabou de o conhecer. “Apenas<br />

apertámos as mãos. Mas temos alguns<br />

amigos em comum.” Acaba de escrever<br />

um ensaio de mais de 200 páginas que<br />

descreve como “uma memória neurológica”,<br />

em que fala das suas enxaquecas<br />

e de uma desordem convulsiva que<br />

começou a ter após a morte do seu pai.<br />

“Desde há cinco anos que faço parte<br />

de um grupo que se reúne todos os<br />

primeiros sábados de cada mês para<br />

discutir neurociência, e leio imensos<br />

estudos científicos, interesso-me<br />

imenso pelo cérebro.”<br />

Há um título de um livro famoso da<br />

escritora americana <strong>Jo</strong>an Didion que<br />

faria sentido aqui: “We tell ourselves<br />

stories in order to live” (contamos histórias<br />

a nós próprios para conseguir<br />

viver). É mais ou menos isso que quer<br />

dizer a personagem que fala na página<br />

135 quando diz: “Sabes que eu sempre<br />

pensei na completude e na integração<br />

como mitos necessários.” Mas em<br />

“Elegia”, <strong>Hustvedt</strong> quer expor, como<br />

ela diz, “a fragmentação da memória<br />

traumática”. De certa forma, sugere,<br />

a dialéctica do livro situa-se entre o<br />

desejo de coesão (Erik e Inga perseguem<br />

um segredo que esperam que<br />

“explique” o seu pai) e a experiência<br />

fragmentária do trauma, que resiste a<br />

essa ordenação - e que, nas mãos de<br />

um escritor, é um expediente para se<br />

furtar às molduras narrativas. <strong>Hustvedt</strong><br />

confessa. “Queria que houvesse<br />

uma espécie de mecanismo anti-narrativo,<br />

daí os fragmentos.”<br />

A entrevista está no fim e a escritora<br />

está a tentar convencer-nos a ler Jane<br />

Austen. “Acabo de reler ‘Persuasão’,<br />

que não lia há anos. É um livro maravilhoso.<br />

Em todos os seus livros, assim<br />

que chegamos à promessa de casamento,<br />

é tudo muito rápido, ela fecha<br />

o livro em duas páginas.” <strong>Hustvedt</strong><br />

anuncia que, depois de “10 anos e<br />

meio” a escrever na pele de um<br />

homem (a expressão é “as a man”) -<br />

“Aquilo Que Eu Amava” demorou seis<br />

anos, “Elegia” demorou quatro e meio<br />

- está pronta para voltar às mulheres.<br />

Já iniciou o seu próximo livro. Chamase<br />

“Summer without Men” (Verão sem<br />

homens).<br />

Ver crítica de livros págs. 42 e segs<br />

m homem<br />

” e é um romance sentimental. Escrito com a cabeça.<br />

m Lisboa com <strong>Siri</strong> <strong>Hustvedt</strong>. Kathleen Gomes<br />

Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009 • 13


Livros<br />

“Aqui está o meu menino”, diz Maria<br />

Melo, colocando-o em cima da mesa.<br />

O “menino”, recém-nascido, é quadrado<br />

e vermelho com letras brancas<br />

- o livro, do arquitecto português<br />

Ricardo Bak Gordon, é a primeira<br />

edição com a chancela A+A. A livraria<br />

especializada em arquitectura, que<br />

funciona há 13 anos no edifício da<br />

Ordem dos Arquitectos em Lisboa,<br />

está - em plena crise económica global<br />

- a expandir-se.<br />

Maria Melo já não sabe para onde<br />

se há-de virar tantos são os projectos<br />

em que se lançou nos últimos meses:<br />

a edição, em parceria com a Guimarães<br />

de Paulo Teixeira Pinto, de livros<br />

de arquitectos portugueses; a nova<br />

loja, especializada em design, no<br />

recém-inaugurado Museu da Moda e<br />

do Design (Mude); e o fornecimento<br />

de conteúdos para a nova livraria da<br />

Guimarães, que inaugurou esta<br />

semana na Rua da Misericórdia, em<br />

Lisboa.<br />

“A edição que existe em Portugal na<br />

área de arquitectura peca por ser<br />

quase toda só em português”, explica.<br />

“Temos que perceber que somos um<br />

país com uma dimensão pequena e<br />

que o mercado editorial não tem capacidade<br />

de escoamento”. E como nestas<br />

coisas “é preciso arriscar”, o livro<br />

de Ricardo Bak Gordon [edição de mil<br />

exemplares] é bilingue. Para começar<br />

a tirar já partido disso, Maria Melo<br />

aproveitou a inauguração da exposição<br />

Overlapping, sobre seis ateliers<br />

de arquitectura portugueses (entre os<br />

quais o de Bak Gordon), esta semana<br />

no Royal Institute of British Architects,<br />

em Londres [ver Flash], para fazer um<br />

primeiro lançamento do livro.<br />

Depois... o Brasil. “Temos que<br />

investir nos países lusófonos. E estou<br />

a pensar muito no Brasil. Quando [o<br />

arquitecto brasileiro] Paulo Mendes<br />

da Rocha esteve cá, foi o primeiro a<br />

dizer-me: ‘não quer abrir uma livraria<br />

destas em São Paulo?’. Já vou ao Brasil<br />

há muitos anos e no que diz respeito<br />

à arquitectura é um mercado<br />

muito carente. Não precisamos de<br />

coisas megalómanas, temos é que<br />

encontrar os canais certos, fazer parcerias,<br />

que é o que funciona neste<br />

momento”.<br />

Produto acabado<br />

Maria sabe do que fala. Foi a parceria<br />

com a Guimarães e com Paulo Teixeira<br />

Pinto que lhe abriu o caminho<br />

para as edições de livros. Foi no aniversário<br />

da A+A, em Dezembro, que<br />

Teixeira Pinto apareceu na livraria<br />

para lhe propor que fornecesse os<br />

conteúdos para a Guimarães que queria<br />

reabrir especializada em arte.<br />

“Fiquei muito interessada, falei-lhe<br />

na edição e ele disse: ‘espere aí, se<br />

calhar estou interessado, não quer<br />

que seja seu parceiro?’”. “Ora aí está,<br />

porque não?”, pensou Maria Melo. E<br />

a parceria avançou.<br />

14 • Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009<br />

A+A, a livraria que<br />

arrisca<br />

editar arquitectura<br />

Editar arquitectura, abrir um espaço dedicado ao design, fornecer livros de<br />

arte para a nova livraria da Guimarães - a A+A lançou-se numa actividade<br />

frenética. Em época de crise a arquitectura vende? Alexandra Prado Coelho<br />

Bak Gordon já lhe tinha falado no<br />

projecto de editar um livro e ela tinha<br />

ficado a pensar nisso. O arquitecto<br />

editara em 2005 uma primeira monografia<br />

do seu trabalho. “Passados<br />

estes anos, eu e as pessoas que trabalham<br />

comigo achámos que tinha<br />

chegado a altura de fazer outro livro”,<br />

explica Bak Gordon ao Ípsilon. “E<br />

decidimos que gostávamos de manter<br />

o modelo do primeiro”.<br />

Quando falou do projecto à proprietária<br />

da A+A, explicou-lhe logo<br />

que o que tinha a propor era um produto<br />

acabado. “São poucos os livros<br />

de autor que se vêem em Portugal na<br />

área da arquitectura. Geralmente o<br />

que há são coisas mais tipificadas”,<br />

diz Bak Gordon, que lamenta este<br />

panorama editorial com “poucos<br />

livros e de fraca qualidade”. Começam<br />

a surgir mais obras de divulgação,<br />

mais comerciais, para um<br />

público mais vasto, mas “ficam a faltar<br />

edições mais cuidadas, mais maturadas,<br />

mais intensas”.<br />

Acredita, por outro lado, que “há<br />

[no estrangeiro] muita curiosidade<br />

pelo trabalho dos arquitectos portugueses”,<br />

e confirmou isso pela forma<br />

como a sua primeira monografia,<br />

também bilingue, se vendeu em<br />

vários países. “Chegaram-me comentários<br />

de todas as parte do mundo”.<br />

Maria Melo gostou da ideia do produto<br />

acabado, e é essa que será a linha<br />

da colecção: “Não quero fazer livros<br />

em série, termos feito este agora não<br />

quer dizer que para o mês que vem<br />

tenhamos que fazer outro”. Cada um<br />

será um objecto personalizado. “O<br />

conteúdo é todo definido pelo arquitecto.<br />

Este foi criado pelo Ricardo Bak<br />

Gordon e pela designer com quem ele<br />

trabalha, a Vera Velez. Outro, de outro<br />

arquitecto, será como ele quiser, até<br />

pode ser triangular”. O que lhe interessa,<br />

acima de tudo, é poder “mostrar<br />

a arquitectura e os arquitectos<br />

portugueses”.<br />

Se há 13 anos foi “por<br />

paixão” que Maria e<br />

os sócios se lançaram<br />

na aventura<br />

da A+A, há dois<br />

anos, quando<br />

RUI GAUDÊNCIO<br />

“A edição em Portugal<br />

na área de<br />

arquitectura peca por<br />

ser só em português.<br />

Somos um país com<br />

uma dimensão<br />

pequena e o mercado<br />

editorial não tem<br />

capacidade de<br />

escoamento”<br />

Maria de Lurdes<br />

Melo<br />

outros sócios saíram,<br />

foi também<br />

“por paixão” que<br />

voltou a pegar na<br />

livraria com vontade<br />

de fazer coisas<br />

diferentes.<br />

“Não abdico da<br />

ideia de livraria A parceria proposta por Paulo Teixeira Pinto abriu<br />

especializada, caminho ao projecto de Maria de Lurdes Melo<br />

porque continuo<br />

a achar<br />

ANA BANHA<br />

que esse tipo de livrarias é fundamental,<br />

sobretudo numa capital europeia<br />

como Lisboa”. Mas, mantendo o projecto<br />

original, era preciso inovar.<br />

“Temos tendência para abrir as coisas<br />

e mantê-las, até entrarem em crise,<br />

e começarem a cair”. Para contrariar<br />

isso só há uma forma: ter sempre<br />

novos desafios.<br />

Convidou arquitectos para conver-<br />

sas na livraria, lançou iniciativas com<br />

editoras estrangeiras, outras a<br />

pensar especificamente nos<br />

estudantes de arquitectura, e,<br />

ao mesmo tempo, manteve-se<br />

atenta às novidades. “Tem<br />

que se manter essa dinâmica.<br />

Se vier cá a uma iniciativa<br />

num mês e no mês<br />

seguinte vier e encontrar<br />

os mesmos livros, se calhar<br />

desinteressa-se”.<br />

Maria Melo quer que esta<br />

seja a livraria com que os<br />

arquitectos sonham, onde<br />

encontram o que procuram<br />

e o que não sabiam que procuravam.<br />

Por isso, nada lhe<br />

dá mais prazer do que “ver o<br />

Siza Vieira e o Souto Moura<br />

virem para aqui e passarem<br />

uma tarde inteira por cima das<br />

mesas, a ver um livro, a olhar<br />

para um risco”.<br />

ANA BANHA


CÂMARA MUNICIPAL DE LISBOA<br />

PRESIDÊNCIA<br />

AVISO<br />

CONCURSO PÚBLICO N.º 3/DA/2009<br />

MERCADO DE SANTA CLARA<br />

LOJAS PARA ADJUDICAÇÃO<br />

Avisam-se todos os interessados que, entre os dias<br />

18 de Maio e 19 de Junho de 2009, se encontra aberto<br />

Concurso Público para adjudicação de 8 lojas<br />

no Mercado Municipal de Santa Clara, preferencialmente<br />

para ramos de actividade com manufacturação<br />

no local (escultura, artesanato, pintura, joalharia,<br />

bijutaria, outros) e/ou lojas de especialidade<br />

(chocolateria, gourmet, produtos regionais, outros).<br />

Caso esteja interessado consulte o Aviso do concurso<br />

na Divisão de Gestão de Mercados e Lojas, sita na<br />

Rua Luís Pastor de Macedo, s/n (das 9h00 às 16h00)<br />

ou aceda ao site www.cm-lisboa.pt (Áreas de Actividade/Comércio/Concursos<br />

Públicos).<br />

Lisboa, 2009/05/07<br />

A Vereadora<br />

Ana Sara Brito


Música<br />

<strong>Norberto</strong> <strong>Lobo</strong> aparece e<br />

hipnotiza<br />

Em “Mudar de Bina” procurámos algo do<br />

que vemos e vivemos aqui. A música de<br />

<strong>Norberto</strong> <strong>Lobo</strong> tem-nos a todos dentro, mas é<br />

integralmente sua. Com “Pata Lenta”, o muito<br />

aguardado segundo álbum, apresentado esta<br />

noite na Casa do Alentejo, em Lisboa, já não há<br />

espaço para duvidar. Mário Lopes<br />

16 • Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009<br />

FRED NS


Há dois anos foi editado “Mudar de<br />

Bina”, o álbum de estreia de <strong>Norberto</strong><br />

<strong>Lobo</strong>, e maravilhámo-nos. Havia a<br />

dedicatória a Carlos Paredes e havia<br />

Paredes lá dentro, mas não reprodução<br />

de uma sonoridade, era coisa de<br />

alma, algo de intangível.<br />

Não podia ser de outra forma, que<br />

<strong>Norberto</strong> <strong>Lobo</strong> toca guitarra clássica,<br />

não portuguesa. Não podia ser de<br />

outra forma porque <strong>Norberto</strong> <strong>Lobo</strong>,<br />

que passa o dia com uma guitarra às<br />

costas, tem a cabeça cheia de música.<br />

Música dali e de ontem, música de<br />

aqui e de agora. <strong>Jo</strong>hn Fahey e as revoluções<br />

do mago da guitarra na Americana.<br />

Os sons da cítara de Ravi<br />

Shankar e do mandolim de Mandolin<br />

U. Shrinivas. E Robert Wyatt e Thelonius<br />

Monk e, acima de toda a gente,<br />

o multifacetado Jim O’Rourke de<br />

quem fala com incontido entusiasmo.<br />

Quando ouvimos “Mudar de Bina”<br />

há dois anos, onde cabia uma versão<br />

de Carlos Paredes, duas do cancioneiro<br />

tradicional português, andámos<br />

a vasculhar nele algo que explicasse<br />

em som isto que vemos e vivemos<br />

aqui. Nada mais natural: estamos<br />

sempre a procurar no outro algo que<br />

nos explique a nós próprios. Nada<br />

mais errado: a música de <strong>Norberto</strong><br />

<strong>Lobo</strong> tem-nos a nós todos dentro,<br />

acolhe-nos a todos, mas é única e<br />

integralmente sua.<br />

Agora que chega “Pata Lenta”, o<br />

muito aguardado segundo álbum,<br />

que tem festa de lançamento marcada<br />

para esta noite, na Casa do Alentejo,<br />

em Lisboa, às 22h, já não há<br />

espaço para duvidar que assim é.<br />

Se encontrarem por aí o cartaz que<br />

anuncia o concerto desta noite, repararão<br />

num pormenor curioso: na<br />

colagem que o ilustra, a cabeça de<br />

<strong>Norberto</strong> é um lâmpada iluminada.<br />

Coisa bem-humorada, efeito com<br />

espírito de BD que lhe denuncia a<br />

actividade constante. E, se tivessem<br />

acompanhado ao vivo a entrevista do<br />

O habitual é vê-lo em palco de<br />

guitarra em punho, homem<br />

de poucas palavras porque a<br />

música diz o necessário. <strong>Jo</strong>ão<br />

Nicolau, realizador de “Rapace”,<br />

conhece mais que isso. E por<br />

conhecer mais, falou com ele,<br />

insistiu com ele e convenceu-o.<br />

“Canção de Amor e Saúde”,<br />

curta-metragem de Nicolau,<br />

exibida na Quinzena dos<br />

Realizadores do último Festival<br />

de Cannes, conta a história de<br />

um empregado numa loja de<br />

chaves, das clientes que por lá<br />

passam, de uma encomenda<br />

especial e da rapariga especial<br />

que entrega tal tarefa às mãos<br />

do rapaz que passa os dias entre<br />

a máquina do ofício e uma outra,<br />

daquelas ruidosas que víamos<br />

há uns anos em cafés analisando<br />

compatibilidades amorosas. Ele<br />

copia-lhe a chave, ela oferecelhe<br />

algo que dispensará os<br />

serviços da malfadada máquina.<br />

Ípsilon, tê-lo-iam visto chegar à Avenida<br />

de Roma, onde conversámos,<br />

onde agora vive, “armado” de t-shirt<br />

improvável.<br />

Eis <strong>Norberto</strong> <strong>Lobo</strong>, autor de música<br />

que dispensa palavras, guitarrista de<br />

uma expressividade tocante. Ei-lo<br />

estendendo a mão para nos cumprimentar<br />

e eis-nos comentando a peça<br />

de roupa que lhe decora o tronco:<br />

“Manowar?!” Sim, <strong>Norberto</strong> acha<br />

piada aos ícones mais icónicos do<br />

heavy-metal americano, a todos os<br />

seus excessos de som e imagem, e<br />

conta-nos que um amigo ganhou<br />

recentemente a possibilidade de os<br />

Ele é interpretado por<br />

<strong>Norberto</strong> <strong>Lobo</strong>. E sim, gostou:<br />

“Foi uma experiência óptima,<br />

completamente fora do meu<br />

ambiente natural. E é um fi lme<br />

muito musical, com uma poética<br />

especial, como têm sempre os<br />

fi lmes do <strong>Jo</strong>ão.” E não, não sabe<br />

a razão da insistência em tê-lo<br />

como protagonista: “Não faço<br />

ideia do que ele viu em mim. Se<br />

há pessoa pouco fotogénica e<br />

menos à vontade, sou eu.” Para o<br />

realizador não havia dúvidas.<br />

Conhecem-se há mais de<br />

dez anos - “muito antes de<br />

ser <strong>Norberto</strong> <strong>Lobo</strong>”, precisa o<br />

acompanhar nos bastidores de um<br />

concerto espanhol (e ele está entusiasmado<br />

porque há espaço para<br />

ele).<br />

Conhecemos o humor de <strong>Norberto</strong><br />

<strong>Lobo</strong>, do seu gosto por Buster Keaton<br />

e por versões do genérico do<br />

MacGyver (tocava-as há dois anos), e<br />

o humor não é certamente alheio à<br />

tal t-shirt. Essa, porém, é mero pormenor.<br />

Aquilo a que queremos chegar é<br />

uma outra coisa. Isto é o que nos dirá<br />

quando a conversa se aproxima do<br />

final. Falávamos das suas viagens, dos<br />

seus concertos Europa fora, daquilo<br />

realizador - e, quando começou<br />

a escrever o argumento o<br />

par central teve logo corpos<br />

defi nidos. Nicolau pensou que o<br />

<strong>Jo</strong>ão teria que ser <strong>Norberto</strong> <strong>Lobo</strong>,<br />

que a Marta seria Marta Sena.<br />

“O fi lme foi pensado ainda antes<br />

do <strong>Norberto</strong> editar o primeiro<br />

álbum, não havia qualquer<br />

vontade de aproveitamento da<br />

fi gura”, explica. Havia, sim, “as<br />

suas características físicas, a<br />

maneira de falar e de andar, o<br />

tom de voz e uma certa gestão<br />

de tempo que achei interessante<br />

trabalhar”. E a questão musical<br />

foi importante. Naturalmente.<br />

“Cada local tem a sua<br />

especificidade, mas<br />

ao mesmo tempo<br />

vê-se que isto é tudo<br />

uma grande aldeia.<br />

Existem fadistas<br />

japoneses, não é?”<br />

... é actor e canta em francês<br />

“Canção de Amor e Saúde”, de <strong>Jo</strong>ão Nicolau, tem como protagonista o músico que nos<br />

habituámos a ver em palco, guitarra em punho e pouco verbo que a música diz o necessário.<br />

Em tela, <strong>Norberto</strong> <strong>Lobo</strong> fala e canta - e joga ténis.<br />

Ele é um<br />

empregado numa<br />

loja de chaves na curta de<br />

<strong>Jo</strong>ão Nicolau<br />

“O <strong>Norberto</strong> toca<br />

guitarra desde que<br />

anda e tem<br />

experiência de ouvir<br />

e de tocar com outras<br />

pessoas. Isso reflectese<br />

na maneira de<br />

estar, na maneira de<br />

dizer as coisas”<br />

<strong>Jo</strong>ão Nicolau é músico. Toca<br />

nos München e ouvimoslhes<br />

uma canção no fi lme.<br />

Adaptada de uma anterior<br />

banda de Nicolau, El Magretto<br />

Bane, chama-se “Colagène”<br />

e é interpretada por <strong>Jo</strong>ão<br />

(<strong>Norberto</strong>), debruçado sobre<br />

um dicionário de “Francês/<br />

Português”. “O <strong>Norberto</strong> toca<br />

guitarra desde que anda e<br />

tem experiência de ouvir e de<br />

tocar com outras pessoas. Isso<br />

refl ecte-se na maneira de estar,<br />

na maneira de dizer as coisas.”<br />

<strong>Jo</strong>ão Nicolau destaca-lhe a<br />

disponibilidade e a dedicação<br />

aos ensaios - “ensaio bastante,<br />

por vezes demasiado, e ele<br />

entrou rapidamente na maneira<br />

de trabalhar” - e, para o<br />

demonstrar, elenca actividades:<br />

“aprendeu a copiar chaves na<br />

Fábrica de Chaves do Areeiro,<br />

aprendeu um pouco de ténis<br />

para uma cena crucial e decorou<br />

em pouquíssimo tempo os<br />

diálogos em francês”. Isto para<br />

concluir: “Estou muito contente<br />

com a performance dele, é a<br />

melhor dos fi lmes que fi z.”<br />

<strong>Norberto</strong> <strong>Lobo</strong>, por seu lado,<br />

confi rmou defi nitivamente<br />

os paralelismos que intuía<br />

que ia descobrindo de único em cada<br />

um desses países e cidades que vai<br />

conhecendo. Diz-nos, então, <strong>Norberto</strong>:<br />

“Cada local tem a sua especificidade,<br />

mas ao mesmo tempo vê-se<br />

que isto é tudo uma grande aldeia.<br />

Existem fadistas japoneses, não é? E<br />

bandas como os Extra Golden [formados<br />

por americanos e quenianos, simbiose<br />

de funk e benga], que são um<br />

óptimo exemplo de como já não faz<br />

sentido falar do que é ou não é de<br />

onde. Não sou a favor da conversa globalização<br />

versus qualquer coisa, até<br />

porque a antropologia já provou que<br />

não existe tal coisa como identidade<br />

existirem entre realizar um fi lme<br />

e gravar um disco: “Vejo um<br />

álbum como uma sucessão de<br />

cenas, em que há um corpo e um<br />

tom geral, em que estás a fazer<br />

algo que só tu vês realmente.<br />

Tive a mesma sensação quando<br />

fi z o fi lme. Parecia-me que só o<br />

<strong>Jo</strong>ão estava a ver o que aquilo ia<br />

dar. É uma ideia que só tu tens<br />

e que não podes traduzir antes<br />

de concretizar. Exactamente<br />

como nas canções”, acentua. “As<br />

dinâmicas, a luz, principalmente<br />

o tempo, que vi que funciona no<br />

cinema como na música: o saber<br />

esperar, o saber entrar.”<br />

Desconhecemos se fi cará por<br />

“Canção de Amor e Saúde” a<br />

incursão de <strong>Norberto</strong> <strong>Lobo</strong> no<br />

cinema como actor. Continuará<br />

a trabalhar em bandas sonoras<br />

- a última foi “Visita Guiada”,<br />

de Tiago Hespanha, exibida no<br />

Indie Lisboa. Mas quer mais:<br />

“Tenho o sonho de um dia fazer<br />

um musical, algo na onda de ‘Os<br />

Guarda-Chuvas do Amor’, do<br />

Jacques Demy.”<br />

Antes ou depois dele, haverá<br />

nova colaboração com <strong>Jo</strong>ão<br />

Nicolau mas numa banda.<br />

Desgraça, assim se chama “o<br />

projecto a concretizar um dia”. O<br />

realizador descreve: “Muito ‘dirt’,<br />

com baixos e programações,<br />

comigo a cantar e a tocar guitarras.”<br />

Nada de depressões, nada<br />

de fado. Chamam-se Desgraça<br />

porque, na altura em que se<br />

lembraram da coisa, moravam<br />

ambos num certo bairro lisboeta.<br />

Esse mesmo, o da Graça. M.L.<br />

Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009 • 17<br />

FRED NS


FRED NS<br />

18 • Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009<br />

“A culpa, portanto,<br />

é toda dele. Culpa<br />

desta música ter uma<br />

limpidez emotiva que<br />

nos trespassa, de ser<br />

um diálogo de si para<br />

si que, generosa,<br />

faz questão de nos<br />

acolher nesse<br />

movimento”<br />

O saltimbanco da guitarra, músico em viagem,<br />

não aprecia regressos: “Quero sentir-me em permanente<br />

desafi o comigo próprio”<br />

cultural. Fala-se disso há 150 anos,<br />

é um tema ultrapassado e a internet<br />

ainda vem suportar mais isso.”<br />

A culpa, portanto, é toda dele.<br />

Culpa, expliquemo-nos, desta música<br />

ter uma limpidez emotiva que nos<br />

trespassa, de ser um diálogo de si<br />

para si que, generosa, faz questão de<br />

nos acolher nesse movimento.<br />

“Mudar de Bina”, como dissemos,<br />

tinha uma versão de Paredes, duas<br />

do cancioneiro português, e isso ajudou-nos<br />

a focar o olhar em determinada<br />

direcção. “Pata Lenta” tem uma<br />

versão de “Unravel”, de Björk, e títulos<br />

como “Ayrton Senna”, “Vento em<br />

polpa” ou “Zumbido azedo”, mas o<br />

olhar não se desvia. <strong>Norberto</strong> <strong>Lobo</strong><br />

prossegue viagem e seguimos com<br />

ele. “Aquilo [a versão de “Mudar de<br />

vida” e do cancioneiro] não eram<br />

âncoras”, explica. “Pelo contrário,<br />

eram desafios, pontos de partida.” E<br />

ele, saltimbanco da guitarra, músico<br />

em viagem, não aprecia regressos:<br />

“Quero sentir-me em permanente<br />

desafio comigo próprio. Caso contrário,<br />

não tem piada.” Mais: “Não acho<br />

que tenha uma linguagem definida.<br />

Sinto que todos os caminhos são<br />

ainda possíveis e sinto que sei cada<br />

vez menos. Quanto mais me debruço<br />

sobre a música, mais vejo o que ainda<br />

tenho para fazer.”<br />

Todos os contrastes<br />

<strong>Norberto</strong> <strong>Lobo</strong> até tinha tudo preparado<br />

para “Pata Lenta”. As canções,<br />

o estúdio, o dia em que o gravaria.<br />

Depois, atravessou-se-lhe a realidade:<br />

“Funcionou quase como um documentário:<br />

quando chegas ao local e<br />

começas a gravar, descobres outra<br />

coisa.”<br />

Em “Pata Lenta”, <strong>Norberto</strong> quis<br />

recriar uma “experiência de concerto”.<br />

Não lhe interessava a perfeição,<br />

interessava-lhe a pureza e intui-<br />

ção da interpretação. “O disco é uma<br />

fotografia à música, naquele dia e<br />

naquele momento.”<br />

Para compreender a sua vitalidade<br />

importa perceber isto que <strong>Norberto</strong><br />

nos diz: “Na música que quero fazer<br />

o erro é tão importante quanto o<br />

resto. Eu não edito, incluo a história<br />

sem cortes. Não quero fazer um ‘take’<br />

perfeito que em concerto não vai<br />

existir.” Mas, como faz questão de<br />

assinalar, “isto não é nada de novo”:<br />

“Tens outros músicos, como por<br />

exemplo o [Thelonius] Monk, em que<br />

a maneira como toca é tão importante<br />

quanto aquilo que toca.” Pormenor<br />

importante, este. Porque <strong>Norberto</strong><br />

é alguém que se diz contra a<br />

ideia de que “já tudo foi feito” - pelo<br />

contrário, “tudo pode ser feito”:<br />

“cada pessoa tem a sua expressão<br />

individual e fará a sua própria fusão”<br />

(di-lo e pede desculpa: “fusão é uma<br />

expressão horrível”).<br />

Porque <strong>Norberto</strong> se lembra daquilo<br />

que, certo dia, afirmou <strong>Jo</strong>hn Fahey<br />

quando lhe perguntaram o que era<br />

aquilo que fazia quando subia a um<br />

palco. Muito simples: “Vou para lá e<br />

hipnotizo as pessoas.” Com um pormenor<br />

adicional: “Acho que o que ele<br />

queria também dizer é que se hipnotizava<br />

a si mesmo. Que se hipnotizava<br />

a si mesmo, logo, hipnotizava os<br />

outros.”<br />

Então, compreendemos perfeitamente<br />

que nos fale do seu fascínio<br />

pela ideia de mantra, de “loop”:<br />

“Gosto muito de descobrir uma linha<br />

que possa ser navegável durante muito<br />

tempo, com diferenças mínimas de<br />

bloco para bloco.” E reconhecemos<br />

que referir “O Caminho Estreito Para<br />

o Longínquo Norte”, do japonês Matsuo<br />

Bashô, e “A Invenção de Morel”,<br />

do argentino Adolfo Bioy Casares,<br />

como importantes para a música que<br />

lhe ouvimos ajuda a explicar a miste-<br />

riosa luminosidade de “Pata Lenta”:<br />

“O universo do realismo fantástico,<br />

na sua expressão mais lata, interessame<br />

na música, no cinema, na literatura,<br />

em qualquer outro lado.”<br />

Aqui chegados, reformulemos.<br />

<strong>Norberto</strong> <strong>Lobo</strong> é um músico curioso<br />

que se apaixonou recentemente pela<br />

tambura, instrumento indiano, ao<br />

ponto de já ter uma banda onde a<br />

toca em exclusivo (chamam-se Tigrala<br />

e partilha-os com Guilherme Canhão,<br />

dos Lobster, e com o percussionista<br />

mexicano Ian Carlo Mendoza).<br />

<strong>Norberto</strong> <strong>Lobo</strong> editará nos próximos<br />

meses o álbum de estreia dos<br />

Norman, banda de rocks e jazzs e<br />

experimentalismos que tem há dez<br />

anos e onde encontramos o irmão<br />

Manuel e o baterista <strong>Jo</strong>ão <strong>Lobo</strong>. <strong>Norberto</strong><br />

fala-nos da pintura de Michael<br />

Biberstein, que ele adora e que ilustra<br />

a capa de “Pata Lenta”, fala-nos da<br />

sua saudável obsessão por xadrez (se<br />

o encontrarem num bar, noite alta, a<br />

jogar uma partida, não estranhem, é<br />

ritual), fala-nos de música e do resto<br />

com igual entusiasmo.<br />

E depois, algures entre isso de que<br />

nos fala, diz isto assim: “Não sei o que<br />

é isso de haver música triste e alegre.<br />

A vida não é feita de preto e branco,<br />

é feita de cinzentos. Ouço Coltrane e<br />

aquilo é de uma pungência... Nem<br />

passa por ser triste ou alegre, está<br />

acima disso. São as emoções toda<br />

numa só canção, como acontece com<br />

o [Carlos] Paredes. Isso é o que eu<br />

vejo neles.” Acto contínuo, acrescenta:<br />

“Mas não sei o que as pessoas<br />

vêem na minha música.”<br />

Pois bem, na música de <strong>Norberto</strong><br />

<strong>Lobo</strong> vemos tudo isso. A ele e a nós<br />

próprios. Isto aqui e aquilo lá fora.<br />

Os contrastes todos.<br />

Ver crítica de discos pág. 39 e segs.<br />

e agenda de concertos pág. 36


Costumava dizer-se que um homem<br />

é a soma das suas acções, mas a contabilidade<br />

está incompleta: um<br />

homem é também a soma de tudo o<br />

que lhe aconteceu mesmo quando<br />

não fez nada por isso. E <strong>Elvis</strong> <strong>Perkins</strong><br />

está aí para o provar.<br />

<strong>Perkins</strong> é o autor de “Dearland”, um<br />

disco trespassado por uma folk<br />

inquieta e trepidante, com metais a<br />

bradarem por cima da voz nasalada<br />

que lembra, a espaços, o Dylan autoconfiante<br />

e sarcástico de “Blonde on<br />

Blonde”. É um disco clássico, belíssimo,<br />

mas possuído por um frémito<br />

tremendo, que o faz parecer urgente<br />

e desesperado na sua alegria. O disco<br />

tem sido bem recebido, mas tudo o<br />

que a imprensa quer falar é da história<br />

de <strong>Perkins</strong>. Ou melhor: da tragédia que<br />

se abateu sobre a família de <strong>Perkins</strong>.<br />

O nome <strong>Perkins</strong> que <strong>Elvis</strong> ostenta<br />

vem de Anthony <strong>Perkins</strong>, o actor que<br />

representou Norman Bates no “Psico”<br />

de Hitchcock. <strong>Perkins</strong>-pai era um<br />

homem atormentado pela sua<br />

homossexualidade: tinha medo de<br />

mulheres e não são poucas as actrizes<br />

de Hollywood que se recordam<br />

de ele tentar evitar a presença<br />

de fêmeas. Já muito depois<br />

Música<br />

20 • Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009<br />

<strong>Elvis</strong> <strong>Perkins</strong><br />

contra<br />

a tragédia<br />

Carrega os símbolos do mal contemporâneo: o pai morreu de sida,<br />

a mãe no 11/9. Em “Dearland” ele reage à tragédia como só os<br />

desesperados conseguem: com tremenda alegria. <strong>Jo</strong>ão Bonifácio<br />

<strong>Elvis</strong> cresceu<br />

a ser chamado<br />

“o filho de<br />

Norman<br />

Bates” -<br />

personagem<br />

que o pai,<br />

Anthony (em<br />

cima, à<br />

direita),<br />

interpretou no<br />

“Psico”, de<br />

Hitchcock


dos trinta, após recusar algumas das<br />

mulheres mais bonitas do planeta e<br />

após terapia, começou a ter sexo com<br />

mulheres. E assim supostamente permaneceu<br />

até ao fim da vida, até morrer<br />

de sida a 12 de Setembro de 1992.<br />

<strong>Perkins</strong> tinha casado com a fotógrafa<br />

Berry Berenson em 1973. Berenson<br />

morreu nos ataques às Torres<br />

Gémeas - não estava no edifício, ia<br />

num dos aviões. Isto a 11 de Setembro<br />

de 2001, uma terça-feira... Agora<br />

repare-se no nome do primeiro disco<br />

de <strong>Elvis</strong> <strong>Perkins</strong>, assim chamado<br />

devido ao amor de Berenson por <strong>Elvis</strong><br />

Presley: “Ash Wednesday”. Na altura<br />

em que o disco saiu <strong>Elvis</strong> disse ao<br />

“Guardian”: “O título refere-se a perder<br />

tudo menos as cinzas numa<br />

quarta-feira - ser deixado com cinzas<br />

a 12 de Setembro. Esse também foi o<br />

dia em que o meu pai faleceu”.<br />

Dois anos depois ele diz ao Ípsilon:<br />

“As canções de ‘Ash Wednesday’<br />

foram escritas ao longo de sete ou<br />

oito anos. Não havia nenhum conceito<br />

a uni-las. O título foi ideia do<br />

produtor”. Isto, claro, é um homem<br />

a tentar desconversar.<br />

Escrever é ordenar a mente<br />

Há muitas razões para um tipo dizer<br />

hoje uma coisa e outra amanhã, e uma<br />

delas é estar farto. Farto de levar com<br />

a sua própria história. <strong>Elvis</strong> cresceu<br />

com as histórias da esquisitice do pai,<br />

já para não falar de ser chamado,<br />

durante uma vida inteira, “o filho do<br />

Norman Bates”. Mas uma coisa é a história<br />

de um homem, outra o que ele<br />

faz dela, como a pensa. E <strong>Elvis</strong>, tipo de<br />

respostas bruscas, rápidas, que num<br />

momento ri à gargalhada, no outro é<br />

seco como o raio, é o tipo de pessoa<br />

que dobra e desdobra um pensamento<br />

como uma empregada obsessiva de<br />

ferro de engomar na mão à cata dos<br />

vincos de uma camisa.<br />

“A minha ascendência tem a importância<br />

que as pessoas lhe dão. Nem<br />

mais nem menos que isso”, começa<br />

por dizer, quando lhe perguntamos se<br />

o repisar da história da sua tragédia<br />

não obnublia a própria música. A conclusão<br />

da ideia é quase óbvia: “É tão<br />

simples quanto isto: enquanto a minha<br />

ascendência for falada, isso continua<br />

a ser um assunto”. Mas depois leva o<br />

pensamento um pouco mais longe:<br />

“Isto é assunto porque é falado e é<br />

falado porque as pessoas querem que<br />

seja um assunto. E enquanto continuar<br />

a ser falado, a música, na percepção<br />

do leitor, é menorizada”.<br />

<strong>Perkins</strong> diz que não tem “qualquer<br />

controlo sobre isso” e que não pode<br />

“obrigar as pessoas a não falar sobre<br />

isso”. Acima de tudo, diz, “isso altera<br />

o processo de escuta de canções, que<br />

devia ser um processo o mais puro<br />

possível”. A constante menção da sua<br />

tragédia “atira lixo para o processo de<br />

escuta dos discos”. Dá um exemplo:<br />

“Quando ouvimos os Wallflowers pensamos<br />

mais no facto de ser a banda do<br />

filho do Dylan do que na música - a<br />

mente faz compulsivamente equações<br />

em vez de ter uma relação pura com<br />

as canções”.<br />

Fala depressa, volta atrás, dá exemplos,<br />

explica o exemplo, dá outro e no<br />

fim pergunta se percebemos. A sua<br />

linguagem está pejada de termos que<br />

derivam da psicanálise, o que nos<br />

deixa a pensar que se <strong>Elvis</strong> não passou<br />

uns valentes anos no divã, então deve<br />

ter visitado muitos amigos na ala da<br />

psiquiatria. Ele é, igualmente, um<br />

homem com teorias curiosas.<br />

“Nos últimos tempos tenho dado<br />

por mim a pensar que perdemos o<br />

controlo da mente”, diz, a dada altura.<br />

“Achamo-la mais importante que o<br />

fígado ou o coração. Colocámo-la num<br />

pedestal”. Isto tudo a propósito da<br />

ideia de ter uma relação pura com as<br />

canções. <strong>Perkins</strong> chegou à conclusão<br />

que da mesma forma que não conseguimos<br />

ouvir um disco de forma pura,<br />

também não conseguimos fazer nada<br />

“A minha<br />

ascendência tem<br />

a importância que<br />

as pessoas lhe dão.<br />

Nem mais nem menos<br />

que isso”<br />

apresenta<br />

KATIE<br />

MELUA<br />

22JUL<br />

CASCAIS<br />

HIPÓDROMO<br />

“sem o cérebro estar constantemente<br />

a escrever equações sobre o que o<br />

rodeia”. Por isso, diz, ele próprio não<br />

está “satisfeito com a [sua] relação<br />

com a [sua] mente e com o [sua] ego”.<br />

Conclusão? “Somos os líderes deste<br />

planeta, mas não sabemos o que estamos<br />

a fazer. É assustador”.<br />

Fazemos a pergunta óbvia: se escrever<br />

é uma forma de ordenar a mente.<br />

Surpreendentemente tem um<br />

momento de alegria, como um miúdo<br />

com um problema de fala que encontra<br />

alguém que percebe o que diz. “É<br />

exactamente isso. Serve para limpar.<br />

Para ver o que importa e como as coisas<br />

se relacionam. Para me colocar<br />

num lugar arrumado”. (Ou, dizemos<br />

nós, para resolver equações.)<br />

Claro que “quando uma tragédia<br />

acontece, isso afecta tudo”, diz,<br />

quando retornamos ao início, isto é a<br />

“Ash Wednesday”. Ao contrário de<br />

“Dearland”, que parece um disco feito<br />

por um tipo que passou vinte anos<br />

preso e saiu directamente da cela para<br />

uma farra interminável nos bares de<br />

prostituição de New Orleans, “Ash<br />

Wednesday” era das coisas mais tristes<br />

compostas à guitarra acústica. Era o<br />

som de um homem esvaziado.<br />

SEAL<br />

31JUL<br />

CASCAIS<br />

HIPÓDROMO<br />

“Uma tragédia afecta a forma como<br />

se lava os dentes, com se conduz,<br />

como se conversa com os outros”, diz,<br />

antes de se entregar a um longo exercício<br />

de enumeração de tudo o que é<br />

afectado aquando de uma tragédia. (A<br />

enumeração envolve, inclusive, a<br />

forma como se aspira a casa.) “Ninguém<br />

pode determinar até que ponto<br />

é afectado ou não por uma tragédia.<br />

Por isso é claro que a minha experiência<br />

dessa tragédia alastra para a minha<br />

vida. Mas isso não significa que eu me<br />

sinta exposto nas canções que<br />

escrevi”.<br />

Talvez então, dizemos-lhe, “Dearland”<br />

seja uma espécie de purga. Se<br />

a tragédia entra em tudo, “Dearland”<br />

parece ir atrás de tudo o que soe a<br />

tragédia e parece eliminar a tragédia<br />

do mapa. Ele é, como sempre, gloriosamente<br />

sobre-analítico.<br />

“Estava a tentar imaginar o que<br />

seria ouvir ‘Dearland’ sem estar<br />

envolvido nele. Às vezes consigo ter<br />

experiências dissociativas e ouvir o<br />

disco de forma limpa, como se nunca<br />

o tivesse ouvido nem o tivesse composto,<br />

mas é uma experiência rara e<br />

difícil, por isso tenho dificuldade em<br />

responder-lhe. Se me diz que é um<br />

www.cooljazzfest.com<br />

JAMES<br />

TAYLOR<br />

29JUL<br />

CASCAIS<br />

HIPÓDROMO<br />

CASCAIS CIDADELA 9JUL<br />

JOSHUA REDMAN 10JUL<br />

JAZZANOVA PARQUE<br />

MARECHAL CARMONA<br />

14JUL ELIANE ELIAS 1ªParte<br />

Bossa Nossa 15JUL ANTÓNIO<br />

ZAMBUJO & IVAN LINS<br />

19JUL BUIKA convida Mariza<br />

21JUL MAFALDA VEIGA<br />

23JUL LISA EKDHAL<br />

MAFRA JARDIM DO CERCO<br />

16JUL VAYA CON DIOS<br />

17JUL VADIOS Camané, Mário<br />

Laginha, Bernardo Sassetti<br />

e convidado Carlos Bica<br />

disco cheio de vida, não podia concordar<br />

mais, porque durante a gravação<br />

senti-me assim, cheio de ideias,<br />

a querer pôr tudo. Claro que algumas<br />

coisas ficaram de fora, porque eram<br />

disparates que nasceram no entusiasmo<br />

do momento”.<br />

Acaba por aceitar que há uma<br />

enorme disparidade emocional entre<br />

o primeiro disco e o segundo. Justifica-se<br />

dizendo que é um tipo “demasiado<br />

inquieto” na música e na vida.<br />

Que tudo o que experimenta é abandonado<br />

a seguir. “Quando estou<br />

muito tempo num sítio ou com uma<br />

pessoa parece que estou ali há demasiado<br />

tempo. Começo a ficar<br />

inquieto”.<br />

<strong>Elvis</strong> <strong>Perkins</strong> é, igualmente, um<br />

homem a quem a tragédia não abalou<br />

o raciocínio. Analisa o que aconteceu<br />

com frieza, ao ponto de descrever<br />

George W. Bush como “um péssimo<br />

presidente, irresponsável e ignorante”.<br />

<strong>Perkins</strong> é também um homem<br />

que tem “demasiada fé no futuro, na<br />

ideia de que o que vem a seguir vai<br />

ser melhor”. Embora para já “Dearland”<br />

seja uma pequena delícia.<br />

Ver crítica de discos págs. 39 e segs<br />

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Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009 • 21


Música<br />

22 • Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009<br />

“If i had a heart i could love you / If i<br />

had a voice i would sing” canta a<br />

sueca Karin Dreijer Andersson em “If<br />

i had a heart”, canção de abertura do<br />

álbum homónimo do seu projecto<br />

solitário <strong>Fever</strong> <strong>Ray</strong>, como se quisesse<br />

reconhecer a condição de alienígena.<br />

Como em “Silent Shout” (2006), o<br />

admirável álbum dos The Knife - o<br />

projecto que divide com o irmão Olof<br />

Dreijer - a sua voz é sobrenatural,<br />

alterada digitalmente.<br />

No entanto, ao telefone, a partir de<br />

Estocolmo, num intervalo da digressão<br />

iniciada em Abril para o lançamento<br />

mundial do seu magnífico<br />

disco, revela-se humana. Ri-se com<br />

frequência, faz perguntas sobre Portugal<br />

e diz que, como na Suécia, reconhece<br />

aqui uma “saudável excentricidade”,<br />

talvez porque “são dois países<br />

pequenos”.<br />

Um dos lugares-comuns mais utilizados<br />

para descrever a música dos<br />

Knife é que são a versão musical dos<br />

filmes de David Lynch. No mesmo<br />

sentido, <strong>Fever</strong> <strong>Ray</strong> é a versão musical<br />

das fotografias de <strong>Jo</strong>el-Peter Witkin,<br />

descobrindo beleza no grotesco. Pop<br />

electrónica glaciar, de sugestões plásticas<br />

abstractas, formas elegantes e<br />

som metalizado numa linha mais<br />

introspectiva do que nos álbuns dos<br />

The Knife. É um daqueles registos<br />

que, num primeiro momento, pode<br />

causar estranheza, tal a singularidade<br />

do seu universo, e agarrar no instante<br />

seguinte.<br />

Há a ideia que os The Knife<br />

preservam uma certa clausura,<br />

dando poucos concertos,<br />

escassas entrevistas e utilizando<br />

máscaras nos concertos. Ao<br />

fazer uma digressão com este<br />

novo projecto e ao expor a sua<br />

face em fotos, quis cortar com<br />

essa imagem?<br />

Alguma imprensa tem essa imagem<br />

dos Knife, mas não é correcta. O facto<br />

de surgirmos ocultos em fotos e nos<br />

concertos pode suscitar essa ideia,<br />

mas nunca quisemos fazer disso um<br />

caso. A música, por si só, é algo de<br />

misterioso. Acreditamos apenas que<br />

a música tem impacto suficiente para<br />

falar por si e que, ao trabalharmos<br />

uma imagem, faz sentido que ela<br />

esteja em ligação com a música porque<br />

é também um trabalho criativo.<br />

<strong>Fever</strong> <strong>Ray</strong> é outra coisa, mas<br />

quando iniciei este projecto não<br />

estava preocupada em fazer diferente.<br />

Estava apenas interessada em<br />

fazer música. Com os concertos, o<br />

mesmo. Tenho quatro músicos<br />

comigo em palco e isso é realmente<br />

uma novidade para mim. A criação<br />

do álbum foi muito solitária, daí que<br />

agora me saiba bem estar<br />

acompanhada por eles.<br />

Previligiou a<br />

personalidade na<br />

escolha desses músicos,<br />

antecipando que iria<br />

estar muito com eles,<br />

ou a competência<br />

técnica?<br />

<strong>Fever</strong> <strong>Ray</strong> é a<br />

versão<br />

musical das<br />

fotografias de<br />

<strong>Jo</strong>el-Peter<br />

Witkin,<br />

descobrindo<br />

beleza no<br />

grotesco<br />

<strong>Fever</strong> <strong>Ray</strong> e as<br />

máscara<br />

A misteriosa Karin Dreijer Andersson, metade da dupla sueca The Knife, e<br />

entusiasmantes dos últimos meses, revela-se numa rara entrevista. Aqui ela c


“O passado,<br />

o presente e uma<br />

ideia possível de<br />

futuro não têm que se<br />

opor. Pelo contrário,<br />

confundem-se imenso<br />

hoje. O mesmo<br />

acontece com as<br />

ideias de verdade<br />

e de realidade.<br />

Quando me pinto,<br />

ou ponho uma<br />

máscara, posso ser<br />

mais verdadeira do<br />

que sem ela”<br />

É mais rápido percebermos que estamos<br />

perante um bom músico do que<br />

perante uma boa pessoa... [risos].<br />

Nunca se sabe o que pode acontecer<br />

quando se viaja durante tanto tempo<br />

com outras pessoas. Até agora não<br />

tenho razões de queixa. Estou rodeada<br />

de bons músicos, profissionalmente,<br />

e de pessoas com quem se<br />

pode ir beber um copo.<br />

Em entrevista ao seu irmão,<br />

há três anos, ele dizia-nos que<br />

davam poucos espectáculos<br />

porque não conviviam bem com<br />

a ansiedade do palco e com os<br />

rituais das digressões. O que<br />

mudou?<br />

Nada...[risos]. Continua a ser difícil<br />

para mim. Mas gosto muito de andar<br />

em digressão, de viajar, dessas coisas.<br />

De qualquer forma, não se trata apenas<br />

de gerir a ansiedade. Trata-se de<br />

perceber se temos um bom espectáculo<br />

para oferecer e se ele é viável.<br />

Com <strong>Fever</strong> <strong>Ray</strong> acontece o mesmo.<br />

Resolvi fazer concertos porque percebi<br />

que existia potencial para o<br />

fazer, depois de ter trabalhado na<br />

concepção com [o artista plástico e<br />

realizador de videoclips] Andreas<br />

Nilsson.<br />

Além da concepção visual dos<br />

concertos dos Knife e agora<br />

de <strong>Fever</strong> <strong>Ray</strong>, Andreas Nilsson<br />

também realizou uma série<br />

de videoclips para ambos os<br />

projectos. O que é que ele tem<br />

de tão especial?<br />

Lá está, é boa pessoa...[risos]. É um<br />

grande amigo, alguém com quem dá<br />

gosto discutir ideias, mas é também,<br />

claro, uma pessoa extremamente<br />

criativa. É muito divertido trabalhar<br />

com ele. Neste caso, pelo facto de a<br />

música ser mais densa do que a dos<br />

Knife, quisemos fazer uma coisa<br />

ainda mais escura, impenetrável,<br />

com máscaras, luzes artificiais, etc,<br />

construindo qualquer coisa de pri-<br />

as<br />

, e autora de um dos álbuns mais<br />

a chama-se <strong>Fever</strong> <strong>Ray</strong>. Vítor Belanciano<br />

mitivo, com todas as percussões, mas<br />

também de projecção futurista. Pelo<br />

menos, é assim que o vislumbro.<br />

Já afirmou que o filme “Dead<br />

Man” de Jim Jarmusch acabou<br />

por funcionar como uma das<br />

influências mais conscientes no<br />

disco. Que aspectos desse filme<br />

em concreto a marcaram?<br />

As cenas longas, o tempo, os detalhes<br />

quase imperceptíveis que acabam<br />

por criar sentido quando se entra no<br />

filme por inteiro. A fotografia tem<br />

qualquer coisa de artesanal mas é<br />

muito bonita. As personagens vejo-as<br />

como personagens mentais, emocionais,<br />

que é qualquer coisa que me<br />

aproxima deles. A profusão de tipos<br />

de voz em <strong>Fever</strong> <strong>Ray</strong> tem a ver com<br />

isso, quase como se cada uma das<br />

canções correspondesse a uma personalidade<br />

mental diferente.<br />

A sua música vive de dualidades.<br />

Tem essa dimensão ritualista,<br />

primitiva, mas os ambientes têm<br />

qualquer coisa de futurista. Tem<br />

voz de mulher, mas quando é<br />

adulterada digitalmente, parece<br />

de homem. As letras parecem<br />

confessionais, mas ao incarnar<br />

uma personagem, envergando<br />

máscaras, etc, promove um<br />

afastamento.<br />

Gosto de experimentar contrastes,<br />

mas não o faço deliberadamente. Não<br />

me agrada a ideia de conceito. Gosto<br />

mais de trabalhar por aproximações<br />

e, sempre que me apetece, alterando<br />

a ideia inicial. Não vejo dualidades.<br />

Vejo coisas que se interligam. Como<br />

a ideia de tempo, que me interessa<br />

muito. O passado, o presente e uma<br />

ideia possível de futuro não têm que<br />

se opor. Pelo contrário, confundemse<br />

imenso hoje em dia. O mesmo<br />

acontece com as ideias de verdade e<br />

de realidade. Quando me pinto, ou<br />

ponho uma máscara, posso ser mais<br />

verdadeira do que sem ela.<br />

A ficção pode ser mais real do<br />

que o real.<br />

Exacto. Acontece o mesmo com os<br />

sonhos não é? Os sonhos são sempre<br />

mais reais, no sentido de serem revelatórios,<br />

do que a realidade. Nos<br />

sonhos não existe espaço para a censura.<br />

Ou para a auto-censura. A<br />

música, parece-me, pode ter esse<br />

poder também, de ser qualquer coisa<br />

que ilumina algo que não tínhamos<br />

consciência que estava lá, mas<br />

estava.<br />

Pelo facto deste disco ter sido<br />

um processo solitário, teve<br />

a consciência que estava a<br />

aclarar coisas de que não tinha<br />

consciência?<br />

Sem dúvida. Quando se trabalha com<br />

outra pessoa existem soluções de<br />

compromisso. Pode ser até mais revelatório<br />

do que estando sozinha, mas<br />

neste caso foi importante lidar com<br />

os meus limites, saber até onde poderia<br />

ir, até na imposição de uma rotina<br />

diária - durante oito meses trabalhei<br />

oito ou nove horas por dia neste<br />

disco. Não foi fácil, mas no fim sintome<br />

satisfeita pela liberdade de trabalhar<br />

fantasias minhas. Não no sentido<br />

de serem coisas relacionadas com a<br />

minha vida pessoal - a música e arte<br />

são sempre pessoais e ficcionais - mas<br />

no sentido de ter-me dado espaço<br />

para as trabalhar a partir de coisas<br />

em que acredito sozinha. Só depois,<br />

na pós-produção final, fui ajudada<br />

por três produtores.<br />

Quando fala das influências<br />

neste disco prefere citar mais<br />

filmes e livros do que música<br />

porque trabalha a partir de<br />

imagens?<br />

Não necessariamente. Não sei porque<br />

acontece, até porque não é inteiramente<br />

verdade. Acontece, talvez,<br />

porque quando falo de “Dead Man”<br />

ou de “Miami Vice” sei o que me toca.<br />

Com música é diferente, é mais abstracto.<br />

E não oiço tanta música assim.<br />

Mas no Verão, quando estava a trabalhar,<br />

ouvi muito “Anonymous”, um<br />

álbum dos Tomahawk, inspirado em<br />

cânticos índios, que foi muito importante,<br />

principalmente ao nível das<br />

percussões. O mesmo aconteceu com<br />

algum metal, como os Ísis, Neurosis<br />

ou High on Fire, de que gosto pelos<br />

ambientes densos.<br />

O facto de ter sido mãe, pela<br />

segunda vez, quando estava<br />

a fazer este disco parece ter<br />

influenciado algumas letras, ou<br />

não?<br />

Talvez, no sentido em que escrevo<br />

mais a partir de mim própria. Mas<br />

tenho sempre dificuldade em perceber<br />

essa fronteira. O que posso dizer<br />

é que a experiência de ser mãe é<br />

forte, provoca mudanças na nossa<br />

vida, e faz-nos pensar sobre coisas<br />

que antes não estariam tão presentes.<br />

Como por exemplo?<br />

A morte. E a vida, claro. É assustador,<br />

mas marcante. Como todas as coisas<br />

importantes que nos acontecem,<br />

afecta o nosso trabalho. É como os<br />

concertos, podem ser desconfortáveis,<br />

às vezes mesmo assustadores,<br />

mas quando se consegue ultrapassar<br />

isso revelam-se momentos incríveis.<br />

Em algumas canções como<br />

“When I grow up” ou “Keep the<br />

streets empty for me” parece<br />

dialogar consigo própria, como<br />

se questionasse a sua identidade<br />

- quem é, o que faz, para onde<br />

vai. É inevitável esse movimento<br />

de interrogação?<br />

Talvez, porque, de alguma forma,<br />

estamos sempre a regressar à nossa<br />

infância. É aí que tudo começa. Os<br />

sonhos, os desejos, os pesadelos também.<br />

Cresci numa pequena localidade,<br />

perto de Gotemburgo. Recordome<br />

de que era tudo muito calmo à<br />

minha volta. Toda a gente jogava<br />

ténis, menos a minha família. Daí essa<br />

sensação de isolamento. Às vezes,<br />

penso que nunca sai de lá, dessa<br />

pequena localidade... [risos]. Talvez<br />

a minha forma de me libertar seja<br />

esta, fazendo música.<br />

Está a trabalhar com o seu<br />

irmão numa Ópera, “Tomorrow,<br />

In A Year”, no contexto das<br />

celebrações dos 150 anos de “A<br />

Origem das Espécies” de Charles<br />

Darwin. Em que fase está o<br />

projecto?<br />

Está a ser ultimada. Olof e eu escrevemos<br />

a música e o libreto, ainda não<br />

está totalmente terminada, mas já<br />

faltou mais. A estreia é em Setembro,<br />

em Copenhaga, e é possível que a<br />

música seja editada depois.<br />

feverray.com<br />

www.myspace.com/feverray<br />

Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009 • 23


Música<br />

24 • Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009<br />

Em 2007 <strong>Jo</strong>ão Lencastre editou o seu<br />

primeiro disco. Chamava-se “One”,<br />

reunia um conjunto de talentos nacionais<br />

e internacionais - que incluía o<br />

brilhante pianista Bill Carrothers - e<br />

mostrava um jazz desempoeirado,<br />

fresco. O disco foi considerado um dos<br />

melhores desse ano para o PÚBLICO.<br />

Quem é então <strong>Jo</strong>ão Lencastre, este<br />

baterista com ideias bem definidas?<br />

Começou a tocar aos 13 anos, passou<br />

pela escola do Hot Clube e foi estudar<br />

para os EUA - passou largas temporadas<br />

em Nova Iorque, onde conheceu<br />

alguns dos músicos com quem agora<br />

trabalha. Essa perspectiva “exterior”<br />

talvez tenha sido importante para definir<br />

a sua música. Ao seu grupo chamou<br />

“Communion”, porque o jazz deverá<br />

funcionar como forma de partilha.<br />

Agora, dois anos passados após o<br />

disco de estreia, o baterista regressa<br />

com “B-Sides”. Volta a reunir um conjunto<br />

de bons músicos ao seu redor<br />

e volta a investir numa música sem<br />

teias de aranha. Mudam alguns músicos,<br />

as ideias continuam originais. O<br />

título poderá levantar dúvidas: estaremos<br />

perante lados B, sobras, restos<br />

de outras gravações? Longe disso. O<br />

título surgiu quando Lencastre foi a<br />

Boston visitar Leo Genovese, o pianista<br />

do disco. “Ele estava a tocar<br />

com o Nat Mugavero, que um dia lhe<br />

diz: ‘let’s forget all the rules and<br />

everything and play our b-side!’<br />

(‘vamos esquecer as regras e isso tudo<br />

e vamos tocar o nosso lado b!’). Então<br />

viro-me para o Leo e digo: ‘é isto que<br />

eu quero para quando formos para o<br />

estúdio, vamos tocar o nosso b-side!’<br />

Esse conceito do “lado B” tem então<br />

a ver com não pensar muito e deixar<br />

a música fluir, arriscar.<br />

Uma das grandes diferenças em<br />

relação ao primeiro disco é que este<br />

foi gravado quando Lencastre estava<br />

a morar em Nova Iorque. Naturalmente,<br />

participam músicos que<br />

moram na Big Apple (ou lá perto),<br />

como foi o caso do contrabaixista Thomas<br />

Morgan: “É dos meus baixistas<br />

favoritos da actualidade, senão mesmo<br />

o favorito. Adoro todo o trabalho que<br />

ele faz, aquela maneira de ele tocar -<br />

ele estava em Nova Iorque, foi fácil de<br />

conciliar.” Dos vários colaboradores<br />

há um que se destaca particularmente:<br />

David Binney, saxofonista extraordinário,<br />

é uma das mais-valias de “B-<br />

Sides”. “Já toco com o David Binney<br />

há vários anos, é um grande amigo e<br />

um músico que eu adoro.”<br />

O facto de tocar com estrangeiros<br />

pode ser um dos motivos para que a<br />

música resulte diferente daquilo que<br />

estamos habituados a ouvir no jazz<br />

português. O baterista não nega essa<br />

possibilidade, mas tem um acrescento<br />

a fazer: “Outro motivo também tem a<br />

ver com a maneira que quero tocar,<br />

com a visão que tenho da música. Sou<br />

bastante influenciado pelas coisas<br />

modernas de Nova Iorque, sou fã dos<br />

grupos dos músicos que tocam no meu<br />

disco, tento encontrar músicos que<br />

tenham a mesma visão que eu.” De<br />

facto, ao ouvirmos “B-Sides” percebese<br />

que a sua visão assenta numa noção<br />

aberta de jazz moderno.<br />

“Se estiver como<br />

‘sideman’, e mesmo<br />

que esteja a adorar<br />

tocar essa música,<br />

estarei sempre<br />

a tocar a música de<br />

outros. Ter o meu<br />

grupo permite-me<br />

tocar à minha<br />

maneira, sem ter de<br />

me ajustar à estética<br />

de outro grupo ou<br />

às ordens do líder...”<br />

Liderança<br />

No disco de estreia optou por servir-se<br />

de alguns temas mais populares -<br />

“Lonely Woman” (Ornette Coleman),<br />

“Summertime” e “New World” (de<br />

Björk, da banda sonora de “Dancer In<br />

the Dark”). No novo álbum essa faceta<br />

pop não é tão clara, mas também<br />

estará presente. “No ‘B-Sides’ alguns<br />

temas também têm um espírito rock,<br />

há os originais do Leo ... E também há<br />

duas peças ‘free’.” Além dos originais,<br />

há covers de Paul Motian e Steve<br />

Swallow, escolhas menos óbvias: “já<br />

O lado B<br />

de <strong>Jo</strong>ão Lencastre<br />

É um jovem baterista e compositor, pratica um jazz original, toca<br />

com os mais brilhantes músicos do mundo e já vai no segundo<br />

disco em nome próprio. Chama-se “B-Sides”. Nuno Catarino<br />

tenho tocado o tema do Paul Motian<br />

há algum tempo, dá-me sempre<br />

imenso gozo tocá-lo ao vivo. O tema<br />

do Steve Swallow é uma balada lindíssima.<br />

E lembrei-me de pôr o Thomas<br />

Morgan a tocar o solo, que ele é um<br />

poeta, especialmente em baladas - fez<br />

um solo inacreditável.”<br />

O disco foi editado na Fresh Sound<br />

New Talent, editora com sede na Catalunha<br />

e boa visibilidade internacional,<br />

que edita Chris Cheek, Ron Horton e<br />

Jesus Santandreu. “Uma das vantagens<br />

de editar na Fresh Sound é que<br />

tem uma boa distribuição. Distribui<br />

para os EUA, para o Japão, para o resto<br />

da Europa...” E já quem em equipa<br />

que ganha não se mexe, a ligação à<br />

editora de <strong>Jo</strong>rdi Pujol deverá continuar<br />

no próximo projecto.<br />

Ao longo da história do jazz não<br />

serão muitos os exemplos de bateristas<br />

que assumem a liderança - vamos<br />

tomar o caso de Art Blakey como a<br />

excepção que confirma a regra (e<br />

esquecer várias outras excepções). No<br />

caso de Lencastre, a necessidade de<br />

liderar o seu próprio grupo surgiu do<br />

facto de querer exprimir a sua visão<br />

pessoal: “Se estiver como ‘sideman’,<br />

e mesmo que esteja a adorar tocar<br />

essa música, estarei sempre a tocar a<br />

música de outros. Ter o meu grupo<br />

permite-me tocar à minha maneira,<br />

sem ter de me ajustar à estética de<br />

outro grupo ou às ordens do líder...”<br />

E este grupo não é fechado, os músicos<br />

não têm lugar fixo, podem mudar,<br />

a mudança faz parte da definição<br />

deste “Communion”.<br />

Além da actividade jazz, tem colaborado<br />

com o projecto Mantha de<br />

Tiago Bettencourt. A diferença de universos<br />

não é problema para o baterista,<br />

que está à vontade no pop-rock.<br />

“Quando estou a tocar não penso se é<br />

rock ou é jazz. Se oiço uma guitarra<br />

com distorção vou tocar forte, com<br />

uma batida contínua; se oiço um piano<br />

calminho se calhar toco com umas<br />

vassouras... Acho que a música que<br />

faço é apenas uma reacção ao que oiço<br />

no momento, não penso muito.” A<br />

influência será, aliás, bidireccional:<br />

“quando estou a tocar jazz podem<br />

ouvir-se algumas influências rock,<br />

quando estou a tocar rock podem<br />

ouvir-se algumas influências jazz.”<br />

Durante o mês de Junho vai andar<br />

ocupado: nos dias 5 e 6 vai ao Hot<br />

Clube, dia 7 ao Out Jazz, dia 10 ao Chapitô,<br />

dia 11 ao CCB (Jazz às Quintas) e<br />

12 e 13 a Coimbra. Em Setembro,<br />

entre 5 e 12, o grupo que gravou o<br />

disco vai andar em tourné. Lencastre<br />

contará com Thomas Morgan, Phil<br />

Grenadier, Benny Lackner (“o Leo não<br />

pode que está com a Esperanza Spalding”)<br />

- quem quiser ver ao vivo uma<br />

interpretação mais fiel da música do<br />

disco não terá de esperar muito.<br />

Ver crítica de discos págs. 39 e segs. e<br />

agenda de concertos págs. 36 e segs


ALCANENA | ter 09 jun 09 | 21h30<br />

Cine-Teatro São Pedro | T. 249 889 010/115<br />

MOITA | qua 10 jun 09 | 16h00<br />

Vale da Amoreira | T. 210 888 900<br />

ALCOBAÇA | qui 11 jun 09 | 22h00<br />

Cine-Teatro | T. 262 580 890/85<br />

SOBRAL DE M. AGRAÇO | sex 12 jun 09 | 21h30<br />

Cine-Teatro | T. 261 948 321<br />

SESIMBRA | sáb 13 jun 09 | 21h30<br />

Cineteatro Municipal <strong>Jo</strong>ão Mota | T. 212 234 034<br />

CARTAXO | dom 14 jun 09 | 17h00<br />

Jardim da Câmara Municipal | T. 243 701 600<br />

...........................................................................................................................................................................<br />

associado<br />

produção<br />

Compagnie Hocus & Pocus<br />

apoio residência<br />

Para mais informações<br />

www.artemrede.pt<br />

UNE VIE<br />

DE SIAMOIS<br />

Compagnie Hocus & Pocus - FRANÇA<br />

maiores de 4 anos | 65 min. s/ intervalo<br />

© invisibledesign.pt<br />

© fotografia rithideth kitis<br />

CLOWN | MALABARISMO<br />

aos sábados, 6 e 20 Junho<br />

aoarlivre<br />

projecto educativo<br />

jardim das estacas<br />

15h às 19h<br />

Gratuito<br />

Oficinas e espectáculos para crianças e famílias<br />

Jardim das Estacas, ao lado do Teatro Maria Matos M/4<br />

Bilhetes à venda:<br />

Teatro Maria Matos 218 438 801<br />

www.ticketline.pt | Fnac<br />

teatro<br />

5, 6, 7 Junho<br />

Purgatório<br />

Auditório Santa <strong>Jo</strong>ana Princesa<br />

Bilhetes à venda:<br />

Teatro Maria Matos 218 438 801<br />

www.ticketline.pt | Fnac<br />

www.teatromariamatos.egeac.pt<br />

Martim Pedroso<br />

Dias das<br />

histórias<br />

(im)<br />

prováveis<br />

10€ / 7,5€ / 5€ M/ 12<br />

www.teatromariamatos.egeac.pt


Cinema<br />

Os sobreviventes do<br />

terramoto Hollywood<br />

Nasceram no mesmo ano, mas há mais em comum entre Dennis Hopper e Dean Stockwell:<br />

ambos sobreviveram às convulsões que mudaram Hollywood. Percursos cruzados na<br />

Cinemateca. <strong>Jo</strong>rge Mourinha<br />

Dennis<br />

Hopper,<br />

“Fúria de<br />

Viver”<br />

A partir do encontro, em “Blue Velvet”, de Dennis Hopper e Dean Stockwell, a Cinemateca desenha, em Junho e Julho, os percursos de<br />

duas figuras que atravessaram as convulsões que levaram da Hollywood do “studio system” ao conglomerado transnacional que hoje<br />

conhecemos<br />

26 • Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009<br />

Dean<br />

Stockwell,<br />

“O Rapaz dos<br />

Cabelos<br />

Verdes”


A culpa, pode-se dizer, é de David<br />

Lynch, esse farol da cinefilia moderna,<br />

ao juntar Dennis Hopper (Dodge City,<br />

1936) e Dean Stockwell (Hollywood,<br />

1936) no “plateau” do filme “Veludo<br />

Azul” (1986), 50 anos depois do nascimento<br />

de ambos. A partir desse<br />

“encontro” casual e da cumplicidade<br />

de uma data de nascimento, a Cinemateca,<br />

em Lisboa, desenha numa<br />

série de filmes a exibir durante Junho<br />

e Julho os percursos de duas figuras<br />

que atravessaram as convulsões que<br />

levaram da Hollywood do “studio system”<br />

dos anos 1940 e 1950 ao conglomerado<br />

transnacional que hoje<br />

conhecemos.<br />

Se tudo tivesse corrido como se previria<br />

(o que não é a mesma coisa que<br />

“corrido bem”...), Hopper nunca se<br />

teria refeito do triunfo de “Easy Rider”<br />

nem do desastre de “The Last Movie”,<br />

e Stockwell nunca teria tido uma carreira<br />

“adulta” depois do final do seu<br />

contrato de actor-criança com a MGM.<br />

Mas nada faria prever que estes dois<br />

amigos de longa data (conhecem-se<br />

desde 1959, trabalharam juntos em<br />

meia-dúzia de filmes) sobrevivessem<br />

a um percurso que “eliminou” sem<br />

piedade outros que estiveram na sua<br />

exacta mesma posição. Não são muitos<br />

os actores-criança que fizeram carreira<br />

de sucesso em adultos, tal como se<br />

contam pelos dedos aqueles que conseguiram<br />

construir carreiras “mainstream”<br />

sólidas depois de serem aclamados<br />

como líderes “underground”.<br />

Hoje, contudo, ambos são “eminências<br />

pardas” que fazem a sua vidinha de<br />

artistas plásticos (Dennis Hopper como<br />

fotógrafo, Dean Stockwell como pintor)<br />

ao mesmo tempo que seguem na<br />

prestigiada linhagem dos actores de<br />

composição que tanto sustentam o<br />

cinema e a televisão americanos.<br />

JEROME BONNET/ REUTERS /LIBERATION<br />

Na rodagem de “Fúria de Viver”<br />

Hopper travou-se de amizade<br />

com Dean e “adoptou” a postura<br />

de “rebelde sem causa que lhe<br />

criaria desde logo problemas<br />

Ascensão e queda<br />

É um ponto de chegada mais surpreendente<br />

para Hopper, que tudo apontava<br />

para uma carreira de fotógrafo<br />

(chegou a ser considerado um artista<br />

com futuro nos anos 1950) do que<br />

para Stockwell, que vinha de uma<br />

família do “show-biz” (pai actor no<br />

teatro, mãe cantora de vaudeville) e<br />

se estreou em palco aos seis anos. Mas<br />

os seus percursos reflectem também<br />

o percurso de Hollywood durante os<br />

últimos 50 anos - a dissolução dos<br />

monopólios que ligavam os grandes<br />

estúdios aos circuitos de exibição após<br />

a II Guerra, a ascensão da TV, a desagregação<br />

do “studio system” e consequente<br />

crise das “majors”, o triunfo<br />

meteórico da “nova Hollywood”, os<br />

“midnight movies”, a ascensão dos<br />

“blockbusters”, a redefinição do<br />

cinema independente, a segunda era<br />

de ouro da televisão...<br />

Stockwell ainda viveu o “studio system”<br />

enquanto actor-criança - esteve<br />

sob contrato com a MGM, de “Paixão<br />

de Marinheiro” (George Sidney, 1945),<br />

ao lado de Gene Kelly e Frank Sinatra,<br />

a “Kim” (Victor Saville, 1950), ao lado<br />

de Errol Flynn. Durante esse período,<br />

foi também “O Rapaz dos Cabelos Verdes”<br />

para <strong>Jo</strong>seph Losey (1948; passa<br />

2ª às 19h) e o filho de Gregory Peck<br />

em “A Luz é para Todos” de Elia Kazan<br />

(1947).<br />

Hopper, que se deixara morder pelo<br />

bichinho da representação no liceu,<br />

já não conheceu essa era - começou<br />

pela televisão em 1955, alinhando<br />

todas as grandes séries da época a par<br />

de papéis secundários no cinema, o<br />

primeiro dos quais “Fúria de Viver”<br />

(Nicholas <strong>Ray</strong>, 1955; 3ª às 19h).<br />

Durante as rodagens, travou-se de<br />

amizade com Dean, com quem contracenaria<br />

em “O Gigante” (George<br />

Stevens, 1956), e “adoptou” uma postura<br />

de “rebelde sem causa” que lhe<br />

criaria desde logo problemas: a sua<br />

guerra surda com o veterano Henry<br />

Hathaway nas rodagens de “O Homem<br />

que Não Queria Matar” (1958), pô-lo<br />

na “lista negra” dos estúdios.<br />

Hopper e Stockwell travaram-se de<br />

amizade por esta altura, enquanto<br />

este último rodava “O Génio do Mal”<br />

(Richard Fleischer, 1959; 6ª, 19, às<br />

19h), primeiro dos seus três grandes<br />

papéis principais (os outros foram<br />

“Filhos e Apaixonados”, Jack Cardiff,<br />

1960, e “Longa <strong>Jo</strong>rnada para a Noite”,<br />

Sidney Lumet, 1961). Mas a TV acabaria<br />

por ser o destino de ambos -<br />

Stockwell apenas rodaria cinema<br />

pontualmente durante os anos 1960<br />

e passaria a década de 1970 a fazer<br />

muito cinema europeu de baixo orçamento,<br />

Hopper ainda conseguia o<br />

ocasional papel principal (“Night<br />

Tide”, Curtis Harrington, 1961; 6ª,<br />

26 às 19h) e alguns papéis secundários,<br />

maioritariamente em westerns<br />

(“Duelo de Fogo”, <strong>Jo</strong>hn Sturges,<br />

1957; “Os Quatro Filhos de Katie<br />

Elder”, Henry Hathaway, 1965 - 2ª,<br />

22, às 19h30; “A Sombra da Forca”,<br />

Ted Post, 1967).<br />

Reabilitação<br />

O que salvou Hopper foi a contra-cultura<br />

psicadélica, pela qual Stockwell<br />

passou mais discretamente mas que<br />

levou o antigo fotógrafo, seduzido<br />

pelo amor livre e pelas drogas psicotrópicas,<br />

a cruzar Peter Fonda e Jack<br />

Nicholson. O que daí saiu, depois de<br />

um “ensaio” chamado “Os Hippies”<br />

(o filme de 1967 de Roger Corman<br />

sobre o LSD escrito por Nicholson e<br />

onde Fonda e Hopper contracenaram<br />

- está programado para Julho), foi a<br />

sua estreia na realização, “Easy<br />

Rider” (1969), um dos filmes-charneira<br />

da “nova Hollywood”. Mas essa<br />

salvação condenou-o igualmente: o<br />

seu prodigioso consumo de álcool e<br />

drogas ajudou ao primeiro prego do<br />

caixão da “nova Hollywood”, o desastre<br />

do seu segundo filme, “The Last<br />

Movie” (1971), a que Stockwell, que<br />

fazia parte do elenco, assistiu em primeira<br />

mão.<br />

A “reabilitação” de ambos, ironicamente,<br />

ocorreria às mãos de dois<br />

“autores”: um europeu fascinado<br />

pela América, um americano de sensibilidade<br />

europeia.<br />

O primeiro, Wim Wenders, foi buscar<br />

Hopper para “O Amigo Americano”<br />

(1976), a adaptação de Patricia<br />

Highsmith que o revelou internacionalmente,<br />

e Stockwell para “Paris,<br />

Texas” (1984), que lhe valeu a Palma<br />

de Ouro em Cannes (os dois filmes<br />

são exibidos em Julho).<br />

O segundo, David Lynch, convidou<br />

Stockwell para um papel secundário<br />

no malfadado “Duna” (1984), e juntou<br />

os dois em “Veludo Azul” (hoje<br />

às 21h30), dando a Hopper o papel<br />

da sua vida com o maníaco Frank<br />

Booth (o actor terá dito, a esse propósito,<br />

“Frank Booth sou eu”).<br />

De então para cá, ambos rodaram<br />

com o velho conhecido Coppola<br />

(Hopper em “Rumble Fish”, 1983 -<br />

passa em Julho; Stockwell em “Jardins<br />

de Pedra”, 1987, e “Tucker”,<br />

Os dois percursos<br />

reflectem Hollywood<br />

durante os últimos<br />

50 anos - ascensão da<br />

TV, a desagregação<br />

do “studio system”,<br />

o triunfo da “nova<br />

Hollywood”,<br />

os “midnight movies”,<br />

a ascensão dos<br />

“blockbusters”,<br />

a redefinição<br />

do cinema<br />

independente, a<br />

segunda era de ouro<br />

da televisão...<br />

Stockwell<br />

ainda<br />

viveu o<br />

“studio<br />

system”,<br />

período<br />

em que foi<br />

“child<br />

actor” e fez<br />

“O Rapaz<br />

dos Cabelos<br />

Verdes”<br />

(à esquerda,<br />

em baixo)<br />

1988), ambos foram nomeados para<br />

o Óscar do melhor secundário<br />

(Hopper por “A Raiva de Vencer”,<br />

David Anspaugh, 1986; Stockwell por<br />

“Viúva... Mas Não Muito”, <strong>Jo</strong>nathan<br />

Demme, 1988). Hopper regressou à<br />

realização com resultados desiguais<br />

e desdobrou-se em vilão de serviço<br />

(“Speed”, Jan de Bont, 1994;<br />

“Waterworld”, Kevin Reynolds, 1995;<br />

“Terra dos Mortos”, George A.<br />

Romero, 2005) e secundário de prestígio<br />

(“Basquiat”, Julian Schnabel,<br />

1996; “Sentiste a Minha Falta?”, Abel<br />

Ferrara, 1997; “Elegy”, 2007, Isabel<br />

Coixet). Stockwell, pelo seu lado,<br />

alterna aparições secundárias (“O<br />

<strong>Jo</strong>gador”, Robert Altman, 1992;<br />

“Força Aérea Um”, Wolfgang Petersen,<br />

1997; “CQ”, Roman Coppola,<br />

2001; “O Candidato da Verdade”,<br />

Demme, 2004) com uma longa carreira<br />

na televisão em séries como<br />

“Quantum Leap”, “JAG” ou a recente<br />

reinvenção de “Battlestar Galactica”.<br />

E as voltas que o mundo dá não deixam<br />

de ser curiosas: de certo modo,<br />

Dennis Hopper e Dean Stockwell<br />

reencontram-se hoje no exacto ponto<br />

em que estavam há 50 anos, a fazer<br />

televisão e pequenos papéis no<br />

cinema, num peculiar fechar de círculo<br />

que mostra como, pelo meio de<br />

todas as convulsões, nada mudou na<br />

Meca do cinema. E, agora, já não<br />

como aspirantes, mas sim como<br />

“veteranos”. Sobreviventes...<br />

Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009 • 27


Teatro<br />

Lembram-se que os Nature Theater of<br />

Oklahoma nos davam sanduíches à<br />

entrada de “No Dice”, espectáculo que<br />

trouxeram ao festival Alkantara, em<br />

Lisboa, no ano passado?<br />

Com medo que tivéssemos fome<br />

durante aquelas quatro horas, era<br />

assim que nos recebia numa noite<br />

quente de Verão este grupo de Nova<br />

Iorque que agora está de regresso a<br />

Lisboa com uma versão muito própria<br />

de “Romeu e Julieta”. É o primeiro<br />

espectáculo do ciclo “Dias das histórias<br />

(im)prováveis”, primeiro programa<br />

cem por cento Mark Deputter desde<br />

que o ex-director do Alkantara assumiu<br />

a direcção do Teatro Municipal<br />

Maria Matos, em Lisboa.<br />

Agora os Nature Theater of<br />

Oklahoma não nos dão comida à<br />

entrada. Dão-nos “as nossas próprias<br />

expectativas de ‘Romeu e Julieta’”,<br />

diz o director Pavol Liska, ao telefone<br />

a partir de Paris, onde o grupo está<br />

em residência artística. O “Romeu e<br />

Julieta” deles é mesmo isso: “As<br />

expectativas das pessoas, a sua versão”<br />

daquela que é a considerada a<br />

maior história de amor de todos os<br />

tempos. É um espectáculo sobre o<br />

público/nós e “a função das histórias<br />

e desta história particular”, “a utilidade<br />

de contar histórias”.<br />

Lembrando: os Nature Theater of<br />

Oklahoma pegaram na lista telefónica<br />

28 • Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009<br />

Isto não é o<br />

“Romeu e Julieta”<br />

Os Nature Theater of Oklahoma<br />

trazem o seu “Romeu e Julieta”,<br />

hoje, amanhã e sábado, ao ciclo<br />

do Maria Matos “Dias das histórias<br />

(im)prováveis”. A história não<br />

foi escrita por Shakespeare.<br />

Foi escrita por todos nós.<br />

<strong>Jo</strong>ana Gorjão Henriques<br />

e pediram a amigos, actores, família,<br />

conhecidos, que lhes contassem, de<br />

cor, “Romeu e Julieta” de Shakespeare<br />

- podemos dizer que o telefone é um<br />

fétiche desta companhia que, em “No<br />

Dice”, fazia um espectáculo a partir<br />

de reprodução de chamadas telefónicas.<br />

Foi a partir daí que trabalharam<br />

para criar o texto que agora podemos<br />

ouvir. Já encenaram peças teatrais, dos<br />

gregos a Tchekov e a Brecht, mas<br />

nunca estiveram interessados em<br />

pegar em Shakespeare senão partindo<br />

deste pressuposto: “A única razão pela<br />

qual nos interessava ‘Romeu e Julieta’<br />

era porque toda a gente conhece a<br />

peça. Tínhamos curiosidade de saber<br />

porque todos nos relacionamos com<br />

aquela história e por diferentes<br />

razões.” Curioso, curioso foi constatar<br />

que cada conto acrescentou um ponto<br />

à versão verdadeira. E que, quando a<br />

memória falhava, as pessoas inventavam<br />

personagens, “plots”, para os<br />

relacionarem com a sua vida.<br />

Oralidade<br />

Depois de terem trabalhado a partir<br />

de conversas telefónicas e agora a<br />

partir da memória, podemos dizer<br />

que os Nature Theater of Oklahoma<br />

estão menos interessados em textos<br />

de teatro e mais em textos orais. “Porque<br />

o teatro é uma forma oral e a<br />

maioria dos textos são criados pelo<br />

dramaturgo num quarto, sozinho” -<br />

mesmo que uma peça tente reproduzir<br />

a oralidade, esta reprodução fica<br />

sempre aquém.<br />

O que tentam levar para o teatro<br />

não é apenas o que dizemos quando<br />

falamos é também a forma como falamos.<br />

“O conteúdo emocional é muito<br />

maior, mais musical e interessante<br />

quando se fala. Quando visto ao<br />

microscópio, o discurso humano é<br />

mais complexo do que um texto de<br />

Shakespeare. Porque num texto de<br />

Shakespeare há uma fórmula e no discurso<br />

humano não há uma fórmula,<br />

somos constantemente criativos.”<br />

Talvez por isso gostem de pôr em<br />

acção o conceito de acaso, inspirado<br />

em <strong>Jo</strong>hn Cage, deixando a imaginação<br />

trabalhar a partir do imprevisto, “uma<br />

forma de descobrir qualquer coisa<br />

nova” - num dos espectáculos, “Poetics”,<br />

usavam mesmo um dado para<br />

desenhar os movimentos<br />

coreográficos. “Romeu e<br />

Julieta” também recorreu<br />

a este método, e é diferente<br />

todos os dias. Em<br />

quê só saberemos se o<br />

virmos mais do que uma<br />

vez já que Pavel Liska<br />

não quer revelar pormenores.<br />

Não vos deve soar<br />

muito americano o<br />

“O conteúdo<br />

emocional é muito<br />

maior, mais musical e<br />

interessante quando<br />

se fala. Quando visto<br />

ao microscópio<br />

o discurso humano é<br />

muito mais complexo<br />

do que um texto de<br />

Shakespeare. Porque<br />

num texto de<br />

Shakespeare há uma<br />

fórmula e no discurso<br />

humano não há<br />

uma fórmula, somos<br />

constantemente<br />

criativos”<br />

nome Pavel Liska - é eslovaco. Trinta<br />

e seis anos, co-director dos Natural<br />

Theater com Kelly Copper, 38, vive<br />

nos EUA há 18 anos e interessa-lhe<br />

saber o que é isso do teatro americano,<br />

uma “questão que está sempre<br />

na cabeça” deles. “Particularmente<br />

em ‘Romeu e Julieta’ pensámos: ‘o que<br />

é que faz deste um espectáculo americano?’<br />

‘Romeu e Julieta’ é um espectáculo<br />

muito americano porque queríamos<br />

que o fosse. Não queríamos<br />

fazer o espectáculo ao estilo britânico.<br />

É mais vulgar, bruto. Tentámos ir o<br />

mais fundo possível, sem ser pretensiosos.<br />

O material que usamos [as versões<br />

das pessoas sobre a peça de<br />

Shakespeare] é cru, ‘incivilizado’, não<br />

digerido, não é considerado bom o<br />

suficiente para ser arte.”<br />

Liska admite que terá sempre o<br />

ponto de vista de um estrangeiro e<br />

sente que há diferenças fortes entre a<br />

cultura europeia e a americana. “Na<br />

Europa há uma cultura com ‘c’ grande,<br />

nos Estados Unidos há culturas individualizadas<br />

e as pessoas não estão<br />

expostas à cultura durante toda a vida<br />

como na Europa.” É que na América<br />

ainda há “muitas coisas por descobrir”.<br />

Como este “Romeu e Julieta”<br />

que não é o “Romeu e Julieta” que<br />

conhecemos.<br />

Ver agenda de teatro pág. 30<br />

KERSTIN JOENSSON


AGENDA CULTURAL FNAC<br />

entrada livre<br />

LANÇAMENTO<br />

HOME<br />

Filme de Yann Arthus-Bertrand<br />

No Dia Mundial do Ambiente, a Fnac dá-lhe a oportunidade de assistir à estreia mundial do filme HOME.<br />

Um hino à protecção do nosso planeta, concebido para ser divulgado gratuitamente no mundo inteiro.<br />

HOME é um incentivo para alterar modos e hábitos de vida e evitar uma catástrofe ecológica planetária.<br />

05.06. 21H30 EM TODAS AS FNAC<br />

APRESENTAÇÃO<br />

MOSTRA-ME<br />

O Outro Lado do Cinema<br />

Uma mostra do cinema português de um ponto de vista original: através dos seus técnicos.<br />

Programação articulada em três eixos: Quem fez, quem faz, quem fará.<br />

Apresentado por Inês de Medeiros, Miguel Honrado (EGEAC) e <strong>Jo</strong>sé Pedro Ribeiro (ICA).<br />

09.06. 15H30 FNAC CHIADO<br />

AO VIVO<br />

SEAN RILEY & THE SLOWRIDERS<br />

Only Time Will Tell<br />

O sucessor de Farewell confirma Sean Riley & The Slowriders como uma das melhores surpresas<br />

dos últimos tempos.<br />

06.06. 22H00 FNAC COIMBRA<br />

14.06.17H00 FNAC NORTESHOPPING<br />

17.06. 17H00 FNAC CHIADO<br />

AO VIVO<br />

SAMUEL ÚRIA<br />

Novo Talento Fnac Música 2009<br />

O cantor e autor canta-se a si próprio, canta o óbvio e o inesperado, canta Deus e canta Tondela,<br />

sua eterna cidade.<br />

12.06. 18H30 FNAC CHIADO<br />

EXPOSIÇÃO<br />

SACRED BIRDS<br />

Fotografias de Janne Lehtinen<br />

Lehtinen, filho de um famoso piloto de planador concebeu modelos extravagantes e surreais que nos<br />

mostram reinvenções inúteis e anacrónicas dos protótipos outrora construídos. Imagens impressionantes<br />

e cómicas em paisagens rudes e solitárias.<br />

05.06. - 01.07.2009 FNAC ALMADA<br />

Consulte a agenda cultural Fnac em http://cultura.fnac.pt/Agenda<br />

Apoio:<br />

19.06. 19H00 FNAC BRAGA<br />

21.06. 17H00 FNAC MAR SHOPPING<br />

APRESENTAÇÃO AO VIVO LANÇAMENTO EXPOSIÇÃO


Teatro<br />

Espaço<br />

Público<br />

Este espaço vai ser seu.<br />

Que fi lme, peça de teatro,<br />

livro, exposição, disco,<br />

álbum, canção, concerto,<br />

DVD viu e gostou tanto<br />

que lhe apeteceu escrever<br />

sobre ele, concordando ou<br />

não concordando com o<br />

que escrevemos? Envienos<br />

uma nota até 500<br />

caracteres para ipsilon@<br />

publico.pt. E nós depois<br />

publicamos.<br />

<br />

30 • Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009<br />

O banho<br />

turco<br />

Sessenta mulheres nuas,<br />

na escuridão. Isto, que<br />

parece um “hammam” em<br />

Istambul, é o ritual que as<br />

espanholas do Teatro en el<br />

Aire trazem ao FITEI a partir<br />

de domingo. Inês Nadais<br />

La Piel del Agua<br />

De Lidia Rodríguez Correa, Ana<br />

Ramos, Javier Sarmiento.<br />

Companhia: Teatro en el Aire.<br />

Encenação: Lidia Rodríguez Correa,<br />

Ana Ramos.<br />

Porto. Mosteiro de São Bento da Vitória. R. S. Bento<br />

da Vitória. De 07/06 a 09/06. 2ª, 3ª e Dom. às 22h.<br />

Tel.: 222007283. €5 a €15<br />

Um ano antes de se despir numa sala<br />

de teatro, à frente de 60 espectadoras<br />

(não há homens neste espectáculo: o<br />

que se passa aqui passa-se porque<br />

“eles não estão”), Lidia Rodríguez<br />

estava a despir-se num “hammam”<br />

em Istambul, à frente de uma quantidade<br />

indeterminada de turcas e<br />

sobretudo de uma turca que a despiu<br />

e a lavou como se fosse mãe dela.<br />

“Tratou-me como uma miúda,<br />

sabes? Saí de lá muito emocionada<br />

porque, apesar de eu não<br />

Internet<br />

Estamos online. Entre em<br />

www.ipsilon.pt. É o mesmo<br />

suplemento, é outro desafi o.<br />

Venha construir este site<br />

connosco.<br />

Em “La Piel del Agua” as mulheres são convidadas a lavarem--se<br />

compreender uma palavra de árabe,<br />

havia ali um desejo fortíssimo de<br />

comunicar e nós comunicámos de<br />

facto, através de uma linguagem nãoverbal”,<br />

explica ao Ípsilon por<br />

telefone, a partir de Madrid.<br />

“La Piel del Agua”, o espectáculo<br />

que a directora do Teatro en el Aire<br />

quis fazer imediatamente a seguir a<br />

“essa experiência excepcional”, abre,<br />

no domingo, a última semana do<br />

FITEI - Festival Internacional de<br />

Teatro de Expressão Ibérica.<br />

É uma ida ao outro lado do<br />

espelho: “A cenografia do<br />

espectáculo tem muito a ver com a<br />

ideia de um espaço mágico.<br />

Queremos que o público seja a Alice e<br />

atravesse o umbral do espelho. Todas<br />

as mulheres são convidadas a<br />

despirem-se e a lavarem-se, como se<br />

estivessem, de facto, num banho<br />

turco. Podia ser embaraçoso mas não<br />

é, porque estamos todas na<br />

escuridão, na penumbra. No fundo,<br />

somos todas sombras, e isso faz com<br />

que nos sintamos seguras.” Seguras<br />

ao ponto de falar de tudo o que é<br />

verdadeiramente importante - “o<br />

amor, a morte, a infidelidade, a<br />

maternidade desejada ou não<br />

desejada, a velhice” - no meio de<br />

estranhas, pele com pele, e às vezes<br />

dentro de água (um elemento,<br />

acrescenta, “que fala muito das<br />

mulheres”).<br />

É aí que as coisas mais importantes<br />

acontecem, garante Lidia Rodríguez:<br />

“O Teatro en el Aire caracteriza-se<br />

¬Mau ☆Medíocre ☆☆Razoável ☆☆☆Bom ☆☆☆☆Muito Bom ☆☆☆☆☆Excelente<br />

por fazer um trabalho sobre os<br />

sentidos. Talvez o menos importante<br />

desta experiência seja aquilo que se<br />

diz e o mais importante seja aquilo<br />

que acontece ao nível do tacto, dos<br />

cheiros - toda a dramaturgia dos<br />

sentidos que nos obriga a tomar<br />

consciência de que estamos vivos e<br />

de que somos corpos.”<br />

Também há texto, construído por<br />

um colaborador, Carlos Javier<br />

Sarmento, a partir de ensaios de<br />

Gaston Bachelard e das séries de<br />

Ingres sobre as banhistas. E o texto é<br />

importante “para que as mulheres se<br />

sintam à vontade e entrem no jogo”.<br />

Não é obrigatório: “Nenhuma<br />

espectadora é obrigada a fazer o que<br />

não quer. Todas participam à sua<br />

medida, definindo os seus próprios<br />

limites, e isso cria uma confiança que<br />

permite que, pouco a pouco, a cebola<br />

se vá descascando.”<br />

Depois de ter ido para a cama com<br />

os espectadores - em “La Cama”, o<br />

espectáculo anterior da companhia,<br />

o público era convidado a deitar-se<br />

com as actrizes -, o Teatro en el Aire<br />

vai agora para o banho turco. Não há<br />

homens porque isso seria outro<br />

espectáculo: “Interessava-me poder<br />

recriar o que se passa nestes banhos<br />

com mulheres e entre mulheres. Não<br />

me interessava fazer um banho misto<br />

porque a nudez aqui é fundamental e<br />

este tipo de nudez não é possível<br />

quando eles estão, só se gera quando<br />

estamos sozinhas, entre nós”. Vamos<br />

ao banho?<br />

Agenda<br />

Teatro<br />

Estreiam<br />

“Wake Up”<br />

Dias das Histórias<br />

(im)prováveis<br />

Purgatório<br />

De Martim Pedroso.<br />

Lisboa. Teatro Municipal Maria Matos. Av. Frei<br />

Miguel Contreiras, 52. De 05/06 a 07/06. 6ª,<br />

Sáb. e Dom. às 19h. Tel.: 218438801. 5€ a 10€.<br />

Romeo and Juliet<br />

Companhia: Nature Theater of<br />

Oklahoma.<br />

Lisboa. Teatro Municipal Maria Matos. Av. Frei<br />

Miguel Contreiras, 52. Até 06/06. 5ª, 6ª e Sáb.<br />

às 21h00. Tel.: 218438801. 5€ a 10€.<br />

Ver texto pág. 28<br />

XXXII FITEI<br />

Que Clase de Sexo<br />

De Dario Fo, Franca Rame,<br />

Jacobo Fo. Companhia: El<br />

Theatron. Encenação: Rodolfo<br />

Molina.<br />

Matosinhos. Cine-Teatro Constantino Nery.<br />

Avenida Serpa Pinto. Dia 07/06. Dom. às 18h30.<br />

Tel.: 229392320.<br />

Coimbra. O Teatrão. Rua Pedro Nunes. Dia<br />

10/06. 4ª às 21h30. Tel.: 239714013.<br />

Baixa da Banheira. Fórum Cultural <strong>Jo</strong>sé Manuel<br />

Figueiredo. Rua <strong>Jo</strong>sé Vicente. Dia 05/06. 6ª às<br />

21h30. Tel.: 210888900.<br />

Asas<br />

De Angélica Zignani.<br />

Companhia: Cª dos Pés.<br />

Encenação: Angélica Zignani.<br />

Porto. Igreja e Torre dos Clérigos. R. S. Filipe<br />

Nery. Dia 05/06. 6ª às 22h. Tel.: 222001729.<br />

Wake Up<br />

Encenação: Carlos Neira.<br />

Porto. Teatro Carlos Alberto. R. Oliveiras, 43. De<br />

06/06 a 07/05. Sáb. às 21h30. Dom. às 16h. Tel.:<br />

223401905.<br />

Baixa da Banheira. Fórum Cultural <strong>Jo</strong>sé Manuel<br />

Figueiredo. Rua <strong>Jo</strong>sé Vicente. Dia 09/06. 3ª às<br />

21h30. Tel.: 210888900.<br />

Animales Artifi ciales<br />

De Ana Vallés. Companhia:<br />

Matarile Teatro. Encenação: Ana<br />

Vallés.<br />

Porto. Teatro Nacional São <strong>Jo</strong>ão. Pç. Batalha. De<br />

08/06 a 09/06. 2ª e 3ª às 21h30. Tel.: 223401910<br />

Estufa Fria<br />

De Regina Guimarães.<br />

Encenação: Igor Gandra.<br />

Porto. Núcleo de Experimentação Coreográfica.<br />

Rua da Fábrica Social. Dia 06/06. Sáb. às 16h.<br />

Tel.: 225188522.<br />

Experiência Variações<br />

Encenação, Cenografia,<br />

Figurinos e Texto. André<br />

Murraças<br />

Lisboa. Fábrica do Braço de Prata. Rua da


“Body Memory”<br />

“Experiência Variações”<br />

Fábrica do Material de Guerra, nº1. Tel. 967354817.<br />

De 09/06 a 14/06, às 21h30 e ás 23h00<br />

Continuam<br />

A Resistível Ascensão<br />

de Arturo Ui<br />

De Bertolt Brecht. Encenação:<br />

<strong>Jo</strong>aquim Horta. Com Carlos Alves,<br />

Duarte Guimarães, Gonçalo<br />

Amorim, <strong>Jo</strong>aquim Horta, Paula<br />

Diogo, Pedro Martinez, Raul<br />

Oliveira, Rúben Tiago, Sílvia Filipe,<br />

Tónan Quito.<br />

Guimarães. Centro Cultural Vila Flor. Avenida D.<br />

Afonso Henriques, 701. Dia 11/06. 5ª às 22h. Tel.:<br />

253424700. 5€ e 7,5€.<br />

Mona Lisa Show<br />

“Mona Lisa Show”<br />

De Pedro Gil. Encenação: Pedro Gil.<br />

Com Ainhoa Vidal, António<br />

Fonseca, David Almeida, Mónica<br />

Garnel, Raquel Castro, Ricardo<br />

Gageiro, Romeu Costa.<br />

Aveiro. Teatro Aveirense. Pç. República. Dia 06/06.<br />

Sáb. às 21h30. Tel.: 234400922. 10€ e 12€.<br />

ÓVNI - Festival Internacional<br />

de Objectos Vivos<br />

Wonderland<br />

De Lewis Carroll. Encenação: <strong>Jo</strong>ão<br />

Paulo Seara Cardoso. Com Edgard<br />

Fernandes, Sara Henriques, Sérgio<br />

Rolo, Shirley Resende.<br />

Guarda. Teatro Municipal da Guarda. Rua Batalha<br />

Reis, 12. Dia 06/06. Sáb. às 21h30. Tel.: 271205241.<br />

5€.<br />

Capuchinho Vermelho XXX<br />

Encenação: <strong>Jo</strong>ão Paulo Seara<br />

Cardoso. Com <strong>Jo</strong>ão Paulo Seara<br />

Cardoso.<br />

Guarda. Teatro Municipal da Guarda. Rua Batalha<br />

Reis, 12. Dia 06/06. Sáb. às 23h. Tel.: 271205241. 5€.<br />

FIMFA LX9<br />

Marionetas Tradicionais<br />

de Taiwan<br />

Com Lai Shi-an, Huang Wushan.<br />

Lisboa. Museu da Marioneta. Rua da Esperança, 146<br />

- Convento das Bernardas. De 05/06 a 07/06. 6ª e<br />

Sáb. às 22h. Dom. às 15h30. Tel.: 213942810.<br />

Circonferências<br />

De Gonçalo M. Tavares (a partir de),<br />

Hélia Correia (a partir de).<br />

Encenação: Pompeu <strong>Jo</strong>sé. Com Ilda<br />

Teixeira, Pompeu <strong>Jo</strong>sé.<br />

Porto. Teatro Helena Sá e Costa (ESMAE). R. Alegria,<br />

503 (entrada pela R. da Escola Normal, 39). De<br />

05/06 a 06/06. 6ª e Sáb. às 22h. Tel.: 225189982.<br />

A Menina Else<br />

De Arthur Schnitzler. Encenação:<br />

Christine Laurent. Com Rita Durão.<br />

JOSÉ FRANCISCO AZEVEDO<br />

“Que Classe”<br />

“Say it With Flowers”<br />

Lisboa. Teatro da Cornucópia - Bairro Alto.<br />

R. Tenente Raúl Cascais 1A. Até 21/06. 3ª,<br />

4ª, 5ª, 6ª e Sáb. às 21h30. Dom. às 16h00.<br />

Tel.: 213961515. 15€<br />

Crucifi cado<br />

De Natália Correia. Encenação:<br />

Miguel Moreira, <strong>Jo</strong>ão Brites. Com<br />

Adelaide <strong>Jo</strong>ão, Miguel Moreira,<br />

Paula Só, Sílvia Almeida, Filipe<br />

Luz.<br />

Palmela. Teatro O Bando. Vale de Barris. Até<br />

21/06. 5ª, 6ª, Sáb. e Dom. às 22h00. Tel.:<br />

212336850. 8€ a 12€ (sujeitos a descontos).<br />

Hedda Gabler<br />

De Henrik Ibsen. Encenação:<br />

Bruno Bravo. Com Anabela<br />

Brígida, David Almeida, Gonçalo<br />

Amorim, Raquel Dias, Sandra<br />

Faleiro, entre outros.<br />

Lisboa. O Negócio. R. do O Século, 9 - Páteo de<br />

Santa Clara Ptª 5. Até 06/06. 4ª, 5ª, 6ª e Sáb. às<br />

21h30. Tel.: 213430205.<br />

Monólogos da Vagina<br />

De Eve Ensler. Encenação: I<br />

sabel Medina. Com Ana Brito<br />

e Cunha, Guida Maria, São <strong>Jo</strong>sé<br />

Correia.<br />

Lisboa. Casino Lisboa. Alameda dos Oceanos Lote<br />

1.03.01 - Parque das Nações. Até 31/12. 3ª, 4ª, 5ª,<br />

6ª e Sáb. às 22h00. Dom. às 17h00. Tel.:<br />

218929070. 18€ a 22€.<br />

Querida Professora Helena<br />

Serguéiévna<br />

De Ludmilla Razoumovskaia.<br />

Encenação: <strong>Jo</strong>ão Mota. Com Hugo<br />

Franco, Marco Paiva, Maria Ana<br />

Filipe, Tânia Alves, Rui Neto.<br />

Lisboa. Teatro da Comuna. Pç. Espanha.<br />

Até 30/06. 4ª, 5ª, 6ª e Sáb. às 21h30.<br />

Dom. às 16h00. Tel.: 217221770. 10€ (sex.<br />

a dom.); 7,5€ (jovens e terceira idade) e 5€<br />

(qua. e qui.).<br />

Say it With Flowers<br />

De Gertrude Stein. Encenação:<br />

António Pires. Com Graciano Dias,<br />

Francisco Tavares, Rita Brütt,<br />

Maya Booth, Miguel Moreira.<br />

Lisboa. Lux Frágil. Av. Infante D. Henrique,<br />

Armazém A. Até 06/06. 4ª, 5ª, 6ª e Sáb. às 22h00.<br />

Tel.: 218820890. 10€ (desconto 25% para -25 anos,<br />

+65 anos e grupos +9 pessoas).<br />

Dança<br />

Estreiam<br />

Ven<br />

Companhia: Entremans.<br />

Coreografia: Alexis Fernández,<br />

Caterina Varela. Bailarino:<br />

Caterina Varela, Alexis<br />

Fernández.<br />

Matosinhos. Cine-Teatro Constantino Nery.<br />

Avenida Serpa Pinto. Dia 10/06. 4ª às 21h30. Tel.:<br />

229392320. 5€.<br />

Bicho Eres un Bicho<br />

Coreografia: Filipa Francisco,<br />

Idoia Zabaleta.<br />

Porto. Teatro Carlos Alberto. R. Oliveiras, 43. Dia<br />

09/06. 3ª às 18h30. Tel.: 223401905.<br />

Íman<br />

Coreografia: Filipa Francisco.<br />

Bailarino:Wonderfull’s Kova M e<br />

convidados.<br />

Viseu. Teatro Viriato. Lg. Mouzinho Albuquerque.<br />

De 06/06 a 07/06. Sáb. às 21h30. Dom. às 18h. Tel.:<br />

232480110. 5€ e 10€ (c/ descontos).<br />

BoxNova: Body Memory<br />

Coreografia: Sylvia Rijmer.<br />

Bailarino:Sylvia Rijmer.<br />

Lisboa. Centro Cultural de Belém. Praça do<br />

Império. Dia 06/06. Sáb. às 19h. Tel.: 213612400.<br />

5€.<br />

PARCEIROS<br />

CÂMARA MUNICIPAL DE SERPA<br />

ESCOLA SECUNDÁRIA DE SERPA<br />

EUROPEAN FOUNDATION JORIS IVENS<br />

ASSOCIAÇÃO O LÍRIO ROXO<br />

ASSOCIAÇÃO OS FILHOS DE LUMIÈRE<br />

Informações e Reservas<br />

reservas@teatro-dmaria.pt<br />

REINTERROGAR A IMAGEM POLÍTICA<br />

16-21 JUNHO<br />

SERPA 2009<br />

com a presença de:<br />

TIAGO AFONSO | MÓNICA BAPTISTA | EDUARDO ESCOREL | ROBERT FENZ<br />

SYLVAIN GEORGE |MÁRIO GOMES | MANUEL MOZOS | ALIONA POLUNINA<br />

LEE ANNE SCHMITT | ABDERRAHMANE SISSAKO | GONÇALO TOCHA<br />

e filmes adicionais de:<br />

BRUCE BAILLIE | RAYMOND DEPARDON | COBRA T e COBRA G | PETER HUTTON | KEN JACOBS<br />

JOHAN VAN DER KEUKEN | MANOEL DE OLIVEIRA | PIER PAOLO PASOLINI | GLAUBER ROCHA<br />

INSCRIÇÕES LIMITADAS: WWW.APORDOC.ORG | DOCSKINGDOM@SAPO.PT | DOCSKINGDOM@GMAIL.COM<br />

FINANCIAMENTO APOIOS<br />

Tel.: 21 325 08 35<br />

www.teatro-dmaria.pt<br />

Meditations on Revolution, Part I: Lonely Planet, 1997; Robert Fenz<br />

Ticketline<br />

www.ticketline .pt | 707 234 234<br />

ORGANIZAÇÃO<br />

Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009 • 31


Cinema<br />

32 • Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009<br />

Estreiam<br />

O factor<br />

humano<br />

Não havia necessidade de<br />

um quarto “Terminator” mas<br />

já que ele existe ainda bem<br />

que honra os pergaminhos<br />

da série. <strong>Jo</strong>rge Mourinha<br />

Exterminador Implacável:<br />

A Salvação<br />

Terminator Salvation<br />

De McG,<br />

com Christian Bale, Sam<br />

Worthington, Bryce Dallas Howard,<br />

Helena Bonham Carter. M/12<br />

MMMnn<br />

Lisboa: Atlântida-Cine: Sala 1: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª<br />

15h30, 21h30 Sábado Domingo 15h30, 18h15,<br />

21h30; Castello Lopes - Cascais Villa: Sala 5: 5ª 2ª<br />

15h50, 18h40, 21h30 6ª 3ª 15h50, 18h40, 21h30,<br />

00h20 Sábado 4ª 13h, 15h50, 18h40, 21h30, 00h20<br />

Domingo 13h, 15h50, 18h40, 21h30; Castello Lopes -<br />

Londres: Sala 1: 5ª Domingo 2ª 14h, 16h30, 19h,<br />

21h45 6ª Sábado 3ª 4ª 14h, 16h30, 19h, 21h45,<br />

00h15; Castello Lopes - Loures Shopping: Sala 6: 5ª<br />

6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h20, 16h, 18h40,<br />

21h10, 23h50; Castello Lopes - Loures Shopping: Sala<br />

5: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 21h40,<br />

00h15; CinemaCity Alegro Alfragide: Cinemax: 5ª<br />

6ª 2ª 3ª 13h40, 15h50, 18h, 21h35, 23h45 Sábado<br />

Domingo 4ª 11h30, 13h40, 15h50, 18h, 21h35,<br />

Uma máquina meticulosamente programada para fazer<br />

bilheteira e impressionar adolescentes<br />

As estrelas do público<br />

23h45; CinemaCity Alegro Alfragide: Sala 8: 5ª 6ª<br />

2ª 3ª 14h, 16h10, 18h20, 21h55, 00h05 Sábado<br />

Domingo 4ª 11h50, 14h, 16h10, 18h20, 21h55,<br />

00h05; CinemaCity Beloura Shopping: Cinemax: 5ª<br />

6ª 2ª 3ª 14h, 16h15, 18h30, 21h50, 00h05 Sábado<br />

Domingo 4ª 11h50, 14h, 16h15, 18h30, 21h50,<br />

00h05; CinemaCity Campo Pequeno Praça de<br />

Touros: Sala 2: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 14h, 16h10, 18h20,<br />

21h35, 00h10 Sábado Domingo 11h45, 14h, 16h10,<br />

18h20, 21h35, 00h10; CinemaCity Classic<br />

Alvalade: Sala 3: 5ª 2ª 13h50, 16h, 18h40, 21h30 6ª<br />

3ª 13h50, 16h, 18h40, 21h30, 24h Sábado 4ª 11h30,<br />

13h50, 16h, 18h40, 21h30, 24h Domingo 11h30,<br />

13h50, 16h, 18h40, 21h30; Medeia Fonte Nova: Sala<br />

1: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h30, 17h,<br />

19h30, 21h45; Medeia Monumental: Sala 4 - Cine<br />

Teatro: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h30,<br />

17h, 19h30, 22h, 00h30; UCI Cinemas - El Corte<br />

Inglés: Sala 9: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

14h15, 16h45, 19h15, 22h, 00h30; UCI Cinemas - El<br />

Corte Inglés: Sala 12: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª<br />

15h30, 18h30, 21h30, 24h Domingo 11h30, 15h30,<br />

18h30, 21h30, 24h; UCI Dolce Vita Tejo: Sala 2: 5ª<br />

6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h20, 16h35, 19h05,<br />

21h25, 24h; ZON Lusomundo Alvaláxia: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h, 15h40, 18h20, 21h,<br />

21h30, 23h40, 00h10; ZON Lusomundo Amoreiras:<br />

5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h40, 16h,<br />

18h30, 21h20, 00h10; ZON Lusomundo<br />

CascaiShopping: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

12h30, 15h50, 18h30, 21h10,00h10; ZON Lusomundo<br />

CascaiShopping: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

21h20, 23h50; ZON Lusomundo Colombo: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h45, 15h20, 18h,<br />

21h15, 24h; ZON Lusomundo Colombo: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 21h45, 00h20; ZON<br />

Lusomundo Dolce Vita Miraflores: 5ª Domingo 2ª<br />

3ª 4ª 15h30, 18h30, 21h30 6ª Sábado 15h30, 18h30,<br />

21h30, 00h30; ZON Lusomundo Odivelas Parque:<br />

5ª 2ª 3ª 4ª 15h30, 18h30, 21h25 6ª 15h30, 18h30,<br />

21h25, 00h15 Sábado 12h50, 15h30, 18h30, 21h25,<br />

00h15 Domingo 12h50, 15h30, 18h30, 21h25; ZON<br />

Lusomundo Oeiras Parque: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 12h45, 15h35, 18h15, 21h10,<br />

24h; ZON Lusomundo Oeiras Parque: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 14h25, 16h55, 19h25, 21h55,<br />

00h30; ZON Lusomundo Torres Vedras: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h15, 15h45, 18h15, 21h,<br />

23h45; ZON Lusomundo Vasco da Gama: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h, 15h30, 18h20,<br />

21h15, 21h40, 23h55, 00h15; Castello Lopes - C. C.<br />

Jumbo: Sala 1: 5ª 2ª 16h, 18h40, 21h30 6ª 3ª 16h,<br />

18h40, 21h30, 00h10 Sábado 4ª 13h10, 16h, 18h40,<br />

21h30, 00h10 Domingo 13h10, 16h, 18h40,<br />

21h30; Castello Lopes - Fórum Barreiro: Sala 4: 5ª<br />

2ª 15h40, 18h40, 21h30 6ª 3ª 15h40, 18h40, 21h30,<br />

00h20 Sábado 4ª 12h45, 15h40, 18h40, 21h30,<br />

00h20 Domingo 12h45, 15h40, 18h40,<br />

21h30; Castello Lopes - Rio Sul Shopping: Sala 4: 5ª<br />

6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 21h50,<br />

00h25; Castello Lopes - Rio Sul Shopping: Sala 1: 5ª<br />

6ª 2ª 3ª 15h40, 18h40, 21h20, 24h Sábado<br />

Domingo 4ª 12h50, 15h40, 18h40, 21h20, 24h; UCI<br />

Freeport: Sala 1: 5ª 2ª 3ª 4ª 16h, 18h25, 21h15 6ª<br />

16h, 18h25, 21h15, 23h45 Sábado 13h15, 16h, 18h25,<br />

21h15, 23h45 Domingo 13h15, 16h, 18h25, 21h15; ZON<br />

Lusomundo Almada Fórum: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 13h20, 16h, 18h40, 21h, 21h35,<br />

23h40, 00h15; ZON Lusomundo Fórum Montijo: 5ª<br />

6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h20, 16h, 18h40,<br />

21h30, 00h10;<br />

Porto: Arrábida 20: Sala 15: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 13h40, 16h20, 18h55, 21h30, 00h05 3ª<br />

4ª 16h20, 18h55, 21h30, 00h05; Arrábida 20: Sala<br />

16: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 14h10, 16h50, 19h25,<br />

22h, 00h35 3ª 4ª 16h50, 19h25, 22h, 00h35; Medeia<br />

Cidade do Porto: Sala 1: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª<br />

3ª 4ª 14h, 16h30, 19h30, 21h50; ZON Lusomundo<br />

Dolce Vita Porto: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

13h10, 15h50, 18h40, 21h30, 00h15 ; ZON<br />

Lusomundo GaiaShopping: 5ª Domingo 2ª 13h40,<br />

15h40, 18h20, 21h20 6ª Sábado 3ª 4ª 13h40,<br />

15h40, 18h20, 21h20, 00h20; ZON Lusomundo<br />

MaiaShopping: 5ª Domingo 2ª 13h20, 16h, 18h40,<br />

21h30 6ª Sábado 3ª 4ª 13h20, 16h, 18h40, 21h30,<br />

00h10; ZON Lusomundo Marshopping: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h20, 15h50, 18h30,<br />

21h30, 00h15; ZON Lusomundo NorteShopping: 5ª<br />

6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h30, 15h30, 18h30,<br />

21h40, 00h50; ZON Lusomundo Parque Nascente:<br />

5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h10, 15h30,<br />

18h10, 21h40, 00h30; ZON Lusomundo Fórum<br />

Aveiro: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h,<br />

15h50, 18h40, 21h30, 00h20; ZON Lusomundo<br />

Glicínias: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 15h,<br />

17h50, 21h, 23h50;<br />

A certa altura de “Exterminador<br />

Implacável: A Salvação”, Christian<br />

Bale, no papel de <strong>Jo</strong>hn Connor, diz a<br />

quem o quiser ouvir que “se este<br />

ataque for para a frente, então a<br />

humanidade está perdida”. E toda<br />

esta quarta aventura dos rebeldes<br />

do futuro em guerra contra as<br />

máquinas que destruiram a<br />

humanidade gira à volta do que<br />

<strong>Jo</strong>rge<br />

Mourinha<br />

significa ser humano, espontâneo,<br />

inconfundível, e que é aquilo que<br />

nos diferencia da máquina.<br />

A ironia é enorme: que, 25 anos<br />

depois do primeiro “Exterminador<br />

Implacável”, a série chegue ao<br />

quarto filme (e a uma série televisiva<br />

entretanto cancelada) é exactamente<br />

sinal que “a humanidade está<br />

perdida” – se usarmos esse<br />

pronunciamento como metáfora<br />

para uma Hollywood que já não sabe<br />

o que fazer para alimentar a<br />

máquina do blockbuster veraneante<br />

e se refugia cada vez mais em<br />

sequelas que existem apenas pela<br />

necessidade de escoar “produto”<br />

para as salas. Depois dos<br />

“Exterminador Implacável” originais<br />

de James Cameron (1984 e 1991), a<br />

verdade é que nem o terceiro filme,<br />

dirigido por <strong>Jo</strong>nathan Mostow (“...<br />

Ascensão das Máquinas”, 2003),<br />

nem este quarto, entregue a McG<br />

(autor dos dois esgrouviadíssimos<br />

filmes dos “Anjos de Charlie”), fazem<br />

falta ao “franchise”.<br />

Mas, já que Hollywood quis que<br />

eles existissem, ainda bem que<br />

foram feitos com um mínimo de<br />

integridade, inscrevendo-se<br />

inteligentemente no contínuo da<br />

série com um respeito que merece<br />

ser saudado. Este quarto filme<br />

preenche um pouco mais a história<br />

de <strong>Jo</strong>hn Connor entre o Dia do<br />

Julgamento e a viagem no tempo<br />

que desencadeia a série no filme<br />

original de Cameron, contando o<br />

encontro entre Connor e aquele<br />

que virá a ser o seu pai, Kyle Reese,<br />

e avança um pouco mais a evolução<br />

tecnológica dos Exterminadores. O<br />

modo como “...A Salvação” (escrito<br />

por <strong>Jo</strong>hn Brancato e Michael Ferris,<br />

argumentistas do “<strong>Jo</strong>go” de David<br />

Fincher, já responsáveis pelo<br />

terceiro filme) se mantém fiel aos<br />

temas e ao espírito da série é<br />

notável, cheio de piscadelas de olho<br />

e pequenos “ovos de Páscoa”<br />

referenciando os filmes anteriores.<br />

Christian Bale traz a intensidade<br />

que lhe conhecemos ao papel de<br />

Connor, mas o australiano Sam<br />

Worthington rouba-lhe o filme no<br />

papel de Marcus Wright, um<br />

criminoso condenado à morte que<br />

assume (ou talvez não...) o papel de<br />

“defensor” que Arnold<br />

Schwarzenegger tinha nos segundo<br />

e terceiro filmes. Apostamos que<br />

“...A Salvação” é filme para fazer de<br />

Worthington – que, ainda por cima,<br />

vai estar no final do ano no “Avatar”<br />

de Cameron... – a estrela que o<br />

original fez de Schwarzenegger.<br />

Ora, o original não queria ser<br />

mais do que uma série B<br />

desempoeirada, na linhagem de<br />

Roger Corman (com quem Cameron<br />

trabalhara), e a sua popularidade<br />

apanhou toda a gente de surpresa.<br />

E tanto “...Ascensão das Máquinas”<br />

como este quarto filme têm a<br />

inteligência de não serem mais do<br />

que o original queria ser no seu<br />

tempo: séries B desempoeiradas,<br />

cumprindo a sua função de modo<br />

honesto. “...A Salvação” não quer<br />

ser mais do que aquilo é e isso é<br />

algo de admirável, sobretudo no seu<br />

respeito teimoso pelas regras e<br />

Luís M.<br />

Oliveira<br />

limites do “franchise” – mesmo que<br />

isso implique faltar-lhe um mínimo<br />

de personalidade.<br />

Ora, isso apenas torna a ironia<br />

maior: aquilo que “salva” este<br />

quarto “Terminator” – a sua<br />

inscrição sem surpresas nem<br />

inovações na série – é também<br />

aquilo que o “condena”. Porque é<br />

precisamente esse o calcanhar de<br />

Aquiles do filme: a ausência de<br />

personalidade e espontaneidade.<br />

Sem o entusiasmo e a vivacidade<br />

que McG soubera colocar nos filmes<br />

dos “Anjos de Charlie”, aqui<br />

substituidos por uma energia<br />

esgotante espalhada por uma série<br />

de sequências de acção pensadas à<br />

medida para atracção de parque de<br />

diversões ou tarefa a cumprir em<br />

video-jogo, e abafados por uma<br />

paleta de cores metálicas, “...A<br />

Salvação” não passa de uma<br />

máquina meticulosamente<br />

programada para fazer bilheteira e<br />

impressionar adolescentes. E que a<br />

melhor interpretação de um filme<br />

que defende o humano contra o<br />

tecnológico pertença a um actor<br />

que representa um homemmáquina<br />

parece ter escapado a<br />

quem o fez...<br />

Star Crossed - Amor em <strong>Jo</strong>go<br />

De Mark Heller,<br />

com Kyle Redmond-<strong>Jo</strong>nes, Teresa<br />

Tavares, Diogo Morgado. M/16<br />

Mnnnn<br />

Mário<br />

J. Torres<br />

Vasco<br />

Câmara<br />

Deixa-nos Entrar mmmmn nnnnn mmmnn mmmnn<br />

Exterminador Implacável- A Salvação mmmnn nnnnn nnnnn nnnnn<br />

À Noite no Museu mmnnn nnnnn nnnnn nnnnn<br />

Cada um o seu Cinema nnnnn mmmnn mmmnn mmmnn<br />

Um Conto de Natal mmmmn mmmnn mmnnn mmnnn<br />

Os Resistentes mmnnn nnnnn nnnnn nnnnn<br />

Star Crossed- Amor em <strong>Jo</strong>go mmnnn nnnnn nnnnn nnnnn<br />

Traidor mmnnn nnnnn mmnnn nnnnn<br />

O Último Condenado à Morte a nnnnn nnnnn nnnnn<br />

Zack e Miri Fazem um Porno mnnnn nnnnn nnnnn nnnnn<br />

Lisboa: Castello Lopes - Loures Shopping: Sala 4: 5ª<br />

6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50, 15h40,<br />

18h50, 21h30, 00h10; CinemaCity Alegro<br />

Alfragide: Sala 7: 5ª 6ª 2ª 3ª 13h35, 15h40, 17h45,<br />

19h45, 21h50, 00h10 Sábado Domingo 4ª 11h30,<br />

13h35, 15h40, 17h45, 19h45, 21h50,<br />

00h10; CinemaCity Beloura Shopping: Sala 1: 5ª 6ª<br />

2ª 3ª 13h45, 15h50, 17h55, 19h55, 22h, 24h Sábado<br />

Domingo 4ª 11h40, 13h45, 15h50, 17h55, 19h55, 22h,<br />

24h; CinemaCity Campo Pequeno Praça de<br />

Touros: Sala 1: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 13h55, 16h, 18h10,<br />

21h40, 23h50 Sábado Domingo 11h50, 13h55, 16h,<br />

18h10, 21h40, 23h50; ZON Lusomundo Alvaláxia: 5ª<br />

6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h05, 15h30, 18h,<br />

21h10, 23h35; ZON Lusomundo CascaiShopping: 5ª<br />

6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h10, 15h30, 18h10,<br />

21h50, 00h15; ZON Lusomundo Colombo: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h15, 15h45, 18h15,<br />

21h05, 23h45; ZON Lusomundo Vasco da Gama: 5ª<br />

6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h10, 15h55, 18h30,<br />

21h10, 24h; Castello Lopes - Rio Sul Shopping: Sala<br />

3: 5ª 6ª 2ª 3ª 15h50, 18h20, 21h15, 23h50 Sábado<br />

Domingo 4ª 13h10, 15h50, 18h20, 21h15, 23h50; ZON<br />

Lusomundo Almada Fórum: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 13h, 15h30, 18h, 21h05,<br />

23h35; ZON Lusomundo Fórum Montijo: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h25, 15h55, 18h20,<br />

21h40, 24h;<br />

Porto: Arrábida 20: Sala 12: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 14h15, 16h40, 19h15, 21h55, 00h35 3ª<br />

4ª 16h40, 19h15, 21h55, 00h35; ZON Lusomundo<br />

Dolce Vita Porto: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

13h50, 16h20, 18h50, 2 1h20, 23h50; ZON<br />

Lusomundo GaiaShopping: 5ª Domingo 2ª 13h05,<br />

15h35, 18h05, 21h10 6ª Sábado 3ª 4ª 13h05, 15h35,<br />

18h05, 21h10, 24h; ZON Lusomundo NorteShopping:<br />

5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h20, 16h,<br />

18h40, 21h50, 00h30; ZON Lusomundo Parque<br />

Nascente: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50,<br />

15h20, 18h30, 21h30, 24h; ZON Lusomundo<br />

Glicínias: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h,<br />

16h40, 19h20, 22h, 00h40;<br />

Romeu e Julieta no mundo do<br />

futebol profissional, em coprodução<br />

anglo-portuguesa rodada<br />

maioritariamente no Porto: Julieta<br />

chama-se Inês e é filha do<br />

presidente de um clube de futebol,<br />

Romeu chama-se Paul e é jogador<br />

no clube rival da cidade. Quem<br />

pudesse eventualmente esperar<br />

daqui um qualquer comentário


¬Mau ☆Medíocre ☆☆Razoável ☆☆☆Bom ☆☆☆☆Muito Bom ☆☆☆☆☆Excelente<br />

Isabel<br />

Coutinho<br />

Os editores lembraram<br />

que é preciso ver o que<br />

se passa depois do<br />

primeiro momento em<br />

que se compra um<br />

Kindle...<br />

The Daily Beast<br />

http://www.<br />

thedailybeast.<br />

com/<br />

Blogue de Tina<br />

Brown<br />

http://www.<br />

thedailybeast.<br />

com/author/tinabrown/<br />

Book Expo<br />

America<br />

http://www.<br />

bookexpoame<br />

rica.com/<br />

Ciberescritas<br />

As amigas de Tina<br />

Brown<br />

TTina Brown, a antiga editora da<br />

“Vanity Fair” e da “The New<br />

Yorker” que desde há oito<br />

meses passou do<br />

jornalismo impresso<br />

para o jornalismo online (é<br />

“editor-in-chief” do “The Daily<br />

Beast” que fundou), tem amigas<br />

que aparecem nas festas com um<br />

Kindle debaixo do braço. Andam<br />

com ele (um aparelho que serve<br />

para ler livros electrónicos,<br />

comercializado pela Amazon) para todo o lado.<br />

Estas amigas de Tina Brown dizem-lhe que compram agora<br />

mais livros do que nunca. Em qualquer lugar dos EUA, e em<br />

menos de um minuto, as amigas de Tina Brown descarregam<br />

para o Kindle livros digitais por 9,99 dólares. Algumas destas<br />

obras até podem ter acabado de chegar às livrarias e se as<br />

amigas de Tina resolvessem comprá-las aí pagariam muito<br />

mais pelo livro impresso: cerca de 25 dólares.<br />

Esta história foi contada pela jornalista durante um<br />

debate que moderou na Book Expo America (BEA),<br />

a segunda maior feira mundial do sector livreiro que<br />

decorreu em Nova Iorque. Enfi ada num vestido justo<br />

cor-de-rosa, Tina tinha como<br />

convidados alguns dos mais<br />

“poderosos” da indústria<br />

editorial, os CEO das mais<br />

importantes editoras norteamericanas:<br />

Brian Murray, da<br />

HarperCollins, Carolyn Reidy,<br />

da Simon & Schuster, <strong>Jo</strong>hn<br />

Sargent, da Macmillan, David<br />

Steinberger, da Perseus.<br />

Os editores, que na sua<br />

maioria estão contra os preços<br />

baixos praticados pela Amazon nos seus livros em formato<br />

electrónico, lembraram a Tina Brown que é preciso ver<br />

o que se passa depois do primeiro momento em que se<br />

compra um Kindle: será que depois desse período de<br />

entusiasmo as pessoas continuam a comprar mais livros do<br />

que antes? A pergunta fi cou no ar, sem resposta...<br />

Brian Murray disse que ao contrário do que acontece<br />

com os leitores dos jornais, que estão habituados a<br />

ler online notícias de graça, os leitores de livros estão<br />

habituados a pagar para ter acesso a conteúdos. “O<br />

livro foi o último conteúdo a ir para a Internet e isso é<br />

uma vantagem para nós”, afi rmou. E David Steinberger<br />

acrescentou que é “tonto” estar alarmado com o Kindle ou<br />

com os preços da Amazon; o “perigo é a tendência para o<br />

monopólio e isso é que seria um problema para todos.”<br />

O colapso dos jornais, o aumento das vendas de livros<br />

em formato electrónico, o aumento dos pagamentos feitos<br />

a autores por livros que ainda não escreveram e os livros<br />

que são publicados e que não vendem nada por mais que<br />

os editores façam foram temas abordados.<br />

Mas o momento mais surpreendente desta discussão<br />

aconteceu quando <strong>Jo</strong>hn Sargent começou a explicar que,<br />

afi nal, o marketing viral não faz vender muito mais livros.<br />

É que em toda a edição desta Book Expo America só se<br />

falou em redes sociais. Sargent deu como exemplo um<br />

vídeo baseado num dos livros da Macmillan que esteve em<br />

número 1 da lista dos mais vistos do You Tube no Reino<br />

Unido durante dois dias mas que, feitas as contas, só serviu<br />

para que se vendessem mais 200 exemplares do livro.<br />

Apesar disto, todos os editores afi rmaram colocar as suas<br />

obras em todas as redes sociais como forma de promoção.<br />

Embora, claro, todos saibam que a maneira mais fácil de<br />

vender livros é aparecer no programa da Oprah.<br />

isabel.coutinho@publico.pt<br />

(Ciberescritas já é um blogue http://blogs.publico.pt/ciberescritas)<br />

“Deixa-me Entrar”: tudo<br />

doseado, cronometrado,<br />

formalizado até à abstracção<br />

metafórica<br />

velado às clubites e rivalidades do<br />

futebol português pode tirar o<br />

cavalinho da chuva – “Amor em<br />

<strong>Jo</strong>go” não passa de um banalíssimo<br />

melodrama em jeito de telenovela<br />

que usa o futebol como simples<br />

pano de fundo para cumprir à risca<br />

as regras da ficção televisiva, sem<br />

sinais particulares nem especial<br />

inspiração (e com uma bandasonora<br />

medonha, já agora). O que é<br />

genuinamente mais preocupante é<br />

que este objecto melhor acabado<br />

(mas só melhor acabado...) do que<br />

muita da ficção nacional corrente<br />

seja assinado por uma equipa<br />

técnica maioritariamente inglesa –<br />

no resto, é filme à medida<br />

das ambições do que se entende<br />

hoje em Portugal como cinema<br />

“comercial”, ou seja, bitola<br />

televisiva em écrã panorâmico.<br />

Já vimos pior, mas isso<br />

não chega. J. M.<br />

Continuam<br />

Deixa-me Entrar<br />

Låt den rätte komma in / Let the<br />

Right One In<br />

De Tomas Alfredson,<br />

com Kåre Hedebrant, Lina<br />

Leandersson, Per Ragnar. M/16<br />

MMMnn<br />

Lisboa: Medeia Monumental: Sala 1: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 14h15, 16h45, 19h15, 21h45,<br />

00h10;<br />

Porto: Arrábida 20: Sala 4: 5ª 6ª Sábado Domingo<br />

2ª 14h15, 16h50, 19h30, 22h10, 00h50 3ª 4ª 16h50,<br />

19h30, 22h10, 00h50;<br />

Chegou uma das boas surpresas da<br />

temporada, “Deixa-me Entrar”, do<br />

sueco Tomas Alfredson,<br />

debruçando-se sobre um perigoso<br />

subgénero, o filme de vampiros,<br />

com todos os seus clichés e<br />

representações icónicas. O que faz<br />

a novidade? Uma encenação<br />

rigorosíssima, um frígido olhar que<br />

recobre o excesso de sentimentos e<br />

de emoções, como se Ingmar<br />

Bergman descesse aos abismos do<br />

género-terror para lhe extrair um<br />

inusitado desespero, um lado<br />

negro que não passa por amores,<br />

ódios ou sangue derramado. O<br />

terror é, sobretudo, interiorizado e<br />

perturbante, mas esbarra na<br />

De 28 de MAIO a 21 de JUNHO<br />

Tradução: <strong>Jo</strong>sé Maria Vieira Mendes; Adaptação e Encenação: Christine Laurent; Cenário<br />

e figurinos: Cristina Reis; Desenho de luz: <strong>Jo</strong>sé Álvaro Correia.<br />

Interpretação: Rita Durão<br />

De 3ª a Sábado às 21.30h. Domingo às 16.00h TEATRO DO BAIRRO ALTO<br />

R.Tenente Raul Cascais, 1A. 1250 Lisboa Telef: 213961515 / Fax 213954508<br />

e-mail: info@teatro-cornucopia.pt http://www.teatro-cornucopia.pt<br />

Bilhetes à venda nas lojas Worten, Fnac, Viagens Abreu, El Corte Ingls e www.ticketline.sapo.pt<br />

Apoio<br />

Estrutura financiada pelo 2009 M/12<br />

www.ipsilon.pt<br />

Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009 • 33


34 • Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009<br />

Cinema<br />

surdina de uma iniciação<br />

complexa aos prazeres do sexo.<br />

Tudo absolutamente doseado,<br />

cronometrado, formalizado até à<br />

abstracção metafórica. Mário<br />

<strong>Jo</strong>rge Torres<br />

Traidor<br />

Traitor<br />

De Jeffrey Nachmanoff,<br />

com Don Cheadle, Guy Pearce, Saïd<br />

Taghmaoui. M/12<br />

MMnnn<br />

Lisboa: CinemaCity Beloura Shopping: Sala 7: 5ª 6ª<br />

2ª 3ª 14h30, 16h50, 19h05, 22h15, 00h25 Sábado<br />

Domingo 4ª 12h15, 14h30, 16h50, 19h05, 22h15,<br />

00h25; Medeia Saldanha Residence: Sala 7: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h10, 16h30, 19h,<br />

21h30, 24h; UCI Dolce Vita Tejo: Sala 4: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h, 16h20, 19h15,<br />

21h35, 24h; ZON Lusomundo Amoreiras: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h50, 16h30, 19h,<br />

21h50, 00h20; ZON Lusomundo Colombo: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h, 15h25, 17h50,<br />

21h25, 23h50; ZON Lusomundo Almada Fórum: 5ª<br />

6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h, 15h45, 18h25,<br />

21h25, 00h20;<br />

Porto: Arrábida 20: Sala 13: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 14h, 16h35, 19h10, 21h45, 00h25 3ª 4ª<br />

16h35, 19h10, 21h45, 00h25; ZON Lusomundo Dolce<br />

Vita Porto: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

13h40, 16h15, 19h10, 21h50, 00h35;<br />

“Traidor” não contém grandes<br />

surpresas. Segue uma receita de<br />

êxito do “thriller” político, com<br />

perseguições a granel, inversões de<br />

expectativas, terrorismos,<br />

palestinianos, agentes dos serviços<br />

secretos, tudo em estado de frenesi<br />

permanente: a câmara não pára, os<br />

locais da acção sucedem-se em<br />

ritmo vertiginoso, transpira energia<br />

e causa, irremediavelmente<br />

cansaço. Filme sobre todas as<br />

manipulações do mundo, do<br />

argumento, do espectador que se<br />

requer como cúmplice, da própria<br />

ideia do cinema moderno (no seu<br />

melhor e no seu pior): não há<br />

tempo, nem espaço, para pensar,<br />

para interrogar, para recusar. Por<br />

isso é perigoso e por isso,<br />

apesar de divertido e<br />

artificioso, recomendase<br />

moderação no<br />

entusiasmo da<br />

recepção. M.J.T.<br />

“Traidor”: a receita<br />

do “thriller” político<br />

¬Mau ☆Medíocre ☆☆Razoável ☆☆☆Bom ☆☆☆☆Muito Bom ☆☆☆☆☆Excelente<br />

Sexta, 05<br />

O Assunto do Dia<br />

The Talk of the Town<br />

De George Stevens. Com Cary Grant,<br />

Jean Arthur, Ronald Colman. 118 min.<br />

15h30 - Sala Félix Ribeiro<br />

Em Busca da Felicidade<br />

The Pursuit of Happyness<br />

De Gabriele Muccino. Com Will Smith,<br />

Jaden Smith, Thandie Newton. 117<br />

min. M12.<br />

19h - Sala Félix Ribeiro<br />

Lights of Old<br />

Broadway<br />

De Monta Bell. Com<br />

Marion Davies,<br />

Conrad Nagel,<br />

Frank Currier. 70<br />

min.<br />

19h30 - Sala Luís de<br />

Pina<br />

Veludo Azul<br />

Blue Velvet<br />

De David Lynch.<br />

Com Dean<br />

Stockwell,<br />

Dennis Hopper,<br />

Hope Lange,<br />

Isabella<br />

Rossellini, Kyle<br />

MacLachlan,<br />

Laura Dern.<br />

120 min.<br />

21h30 - Sala Félix<br />

Ribeiro<br />

A Costureirinha<br />

da Sé<br />

De Manuel Guimarães. Com Maria de<br />

Fátima Bravo, Jacinto Ramos, Alina<br />

Vaz. 100 min.<br />

22h - Sala Luís de Pina<br />

Sábado, 06<br />

“Bob Le Flambeur”,<br />

de Jean-Pierre Melville<br />

Cinemateca Portuguesa R. Barata Salgueiro, 39 Lisboa. Tel. 213596200<br />

“A Marcha Nupcial”,<br />

de Erich<br />

von Stroheim<br />

The Naked Kiss<br />

De Samuel Fuller. Com Anthony<br />

Eisley, Constance Towers, Michael<br />

Dante, Patsy Kelly, Virginia Grey. 93<br />

min. M16.<br />

15h30 - Sala Félix Ribeiro<br />

Os Camisardos<br />

Les Camisards<br />

De René Allio. Com<br />

Philippe Clévenot, Jacques<br />

Debary, Gérard Desarthe.<br />

100 min.<br />

19h - Sala Félix Ribeiro<br />

A Marcha Nupcial<br />

The Wedding March<br />

De Erich von Stroheim.<br />

Com Erich von Stroheim,<br />

Fay Wray, Matthew<br />

Betz. 113 min.<br />

19h30 - Sala Luís de Pina<br />

Bob, Le<br />

Flambeur<br />

De Jean-<br />

Pierre<br />

Melville. Com Daniel Cauchy, Isabelle<br />

Corey, Roger Duchesne. 100 min. M12.<br />

21h30 - Sala Félix Ribeiro<br />

The Big Doll House<br />

De Jack Hill. Com Pam Grier, Pat<br />

Woodel, Brooke Mills. 93 min.<br />

22h - Sala Luís de Pina<br />

Segunda, 08<br />

Quinteto<br />

Quintet<br />

De Robert Altman. Com Paul<br />

Newman, Vittorio Gassman,<br />

Fernando Rey. 110 min.<br />

15h30 - Sala Félix Ribeiro<br />

O Rapaz de Cabelos<br />

Verdes<br />

The Boy with Green<br />

Hair<br />

De <strong>Jo</strong>seph Losey. Com<br />

Pat O’Brien, Robert<br />

Ryan, Barbara Hale. 82<br />

min.<br />

19h - Sala Félix Ribeiro<br />

O Passado e o<br />

Presente<br />

De Manoel de Oliveira.<br />

Com Agostinho Alves,<br />

Bárbara Vieira, Manuela<br />

de Freitas, Maria de<br />

Saisset. 115 min.<br />

19h30 - Sala Luís de Pina<br />

Verão 42<br />

Summer of ‘42<br />

De Robert Mulligan. Com<br />

Jennifer O’Neill, Gary<br />

Grimes, Jerry Houser. 99<br />

min. M12.<br />

21h30 - Sala Félix Ribeiro<br />

A Canção da Lanterna<br />

Uta-andon<br />

De Mikio Naruse. Com Shôtarô<br />

Hanayagi, Eijirô Yanagi, Ichijirô Oya.<br />

93 min.<br />

22h - Sala Luís de Pina<br />

Terça, 09<br />

A Desaparecida (The Searchers)<br />

The Searchers<br />

De <strong>Jo</strong>hn Ford. Com Jeffrey Hunter,<br />

<strong>Jo</strong>hn Wayne, Vera Miles. 120 min.<br />

15h30 - Sala Félix Ribeiro<br />

A Torrente<br />

Torrent<br />

De Monta Bell. Com Ricardo Cortez,<br />

Greta Garbo, Gertrude Olmstead. 88<br />

min.<br />

19h - Sala Félix Ribeiro<br />

Os Arqueiros do Templo<br />

de Sanjusangendo<br />

Sanjuusangen-dou,<br />

Toushiya Monogatari<br />

De Mikio Naruse. Com<br />

Kazuo Hasegawa, Kinuyo<br />

Tanaka, Sensho Ichikawa.<br />

77 min. M12.<br />

19h30 - Sala Luís de Pina<br />

Fúria de Viver<br />

Rebel Without a Cause<br />

De Nicholas <strong>Ray</strong>. Com James<br />

Dean, Natalie Wood, Sal Mineo. 107<br />

min. M16.<br />

21h30 - Sala Félix Ribeiro<br />

A Mãe e a PutaLa Mamam et la<br />

Putain<br />

De Jean Eustache. Com Bernardette<br />

Lafont, Françoise Lebrun, Jean-Pierre<br />

Léaud. 192 min. M18.<br />

22h - Sala Luís de Pina


DVD<br />

Jeanne Moreau em<br />

“Fim-de-Semana” no Ascensor”<br />

A arca do<br />

tesouro<br />

A segunda caixa dedicada à<br />

obra de um cineasta francês<br />

demasiado esquecido é uma<br />

pérola imperdível.<br />

<strong>Jo</strong>rge Mourinha<br />

Colecção Louis Malle - 2<br />

Avalon, exclusivo Fnac<br />

mmmmm<br />

Extras<br />

mmmmn<br />

Há alguns meses,<br />

falámos aqui da<br />

primeira caixa<br />

que o editor<br />

espanhol Avalon<br />

dedicou ao<br />

francês Louis<br />

Malle (1932-1995) -<br />

quatro ficções e<br />

dois<br />

documentários que nos obrigaram a<br />

reavaliar um cineasta generoso e<br />

humanista, fascinado pelas<br />

contradições e pela exploração,<br />

apostado em nunca se repetir. Agora<br />

que surgiu a segunda caixa, com seis<br />

DVDs, descobrimos que essa<br />

primeira edição não passava de um<br />

“aperitivo” para o que aí vinha: uma<br />

dúzia de filmes (seis ficções mais<br />

cinco documentários como extras)<br />

que permitem traçar um quadro<br />

mais definido do cinema de Malle e<br />

sublinham a profunda injustiça do<br />

esquecimento a que foi votado.<br />

A razão do esquecimento é<br />

simples: a aparente ausência de uma<br />

marca de autor que identificasse<br />

Malle, a sua incapacidade marxista<br />

(tendência Groucho) de pertencer a<br />

um qualquer clube que o aceitasse<br />

como membro. Contemporâneo da<br />

Nouvelle Vague, nunca fez parte do<br />

movimento; no entanto, o espírito<br />

de liberdade criativa que animou<br />

Godard, Truffaut ou Chabrol respirase,<br />

intacto, nos seus filmes. Passou à<br />

distância pelo Maio de 1968, mas<br />

não embarcou na intervenção<br />

política; fez carreira nos EUA, mas<br />

recusou a “fórmula” hollywoodiana.<br />

Sempre fez o que quis, quando quis,<br />

como quis - mesmo que isso<br />

implicasse entrar por tópicos<br />

“tabu”, mesmo que isso implicasse<br />

abdicar de uma qualquer coesão<br />

artística. Mas ela está lá, e encontrála-emos<br />

no modo como nunca<br />

condescende para com as<br />

personagens, preferindo um olhar<br />

caloroso, ciente das grandezas e<br />

misérias que todos temos dentro de<br />

nós. O seu papel foi sempre o de ser<br />

“tradutor” desta gente que faz coisas<br />

mais ou menos condenáveis e levarnos<br />

a compreender porque é que se<br />

mata, se morre, se fica, se foge, se<br />

ama, se odeia. Porque é que se<br />

escolhe virar as costas ao mundo<br />

real ou à vida banal - traço comum a<br />

estas seis ficções (das quais quatro<br />

Internet<br />

Estamos online. Entre em<br />

www.ipsilon.pt. É o mesmo<br />

suplemento, é outro desafi o.<br />

Venha construir este site<br />

connosco.<br />

ficaram inéditas em sala entre<br />

nós), que abrangem três fases<br />

diferentes da sua carreira.<br />

Todos eles adaptações<br />

literárias, “Fim-de-Semana no<br />

Ascensor” (1957), “Os<br />

Amantes” (1958), “Zazie no<br />

Metro” (1960) e “Fogo Fátuo”<br />

(1963) equivalem a quatro dos cinco<br />

primeiros filmes de Malle (a<br />

“ausência” é “Vida Privada”, de<br />

1962, veículo para Brigitte Bardot) e<br />

a uma das mais extraordinárias<br />

sequências de abertura de qualquer<br />

carreira. “Fim-de-Semana no<br />

Ascensor” foi a primeira realização<br />

“a solo” de Malle, depois da Palma<br />

de Ouro em Cannes partilhada com<br />

Jacques-Yves Cousteau pelo<br />

documentário “O Mundo do<br />

Silêncio”. “Filme negro” distendido<br />

e kafkiano sobre um crime que corre<br />

mal quando o criminoso fica retido<br />

num elevador durante 36 horas, é<br />

um exercício subversivo na<br />

mecânica de género, cruzando a<br />

angústia hitchcockiana do “falso<br />

culpado” com o monólogo interior<br />

existencialista de uma mulher<br />

apaixonada - uma luminosa Jeanne<br />

Moreau. “Os Amantes” vai de novo<br />

buscar Moreau para o que começa<br />

por parecer uma frívola crónica de<br />

costumes da burguesia, antes de um<br />

interlúdio corrosivo abrir espaço a<br />

um retrato sensualista de uma<br />

mulher aprisionada num casamento<br />

de conveniência que descobre o<br />

amor num adultério inesperado.<br />

Sumptuosamente fotografado por<br />

Henri Decae (já responsável pelo<br />

glorioso contraste de “Fim-de-<br />

Semana no Ascensor”) e sonorizado<br />

pelo hiper-romantismo de Brahms,<br />

estava predestinado ao escândalo<br />

pela naturalidade com que trata o<br />

adultério de Jeanne como a única<br />

saída para a sua felicidade.<br />

Do lirismo (in)decoroso de “Os<br />

Amantes”, Malle saltou para o<br />

burlesco imparável de “Zazie no<br />

Metro”, verdadeiro desenho<br />

animado de imagem real que<br />

antecipou de alguns anos o<br />

“nonsense” dos Monty Python e as<br />

paródias de Mel Brooks. A história<br />

de uma menina de província que<br />

passa dois dias em Paris com o tio é<br />

uma sucessão de gagues visuais que<br />

fazem a ponte entre as comédias<br />

mudas de Chaplin e os “cartoons” da<br />

Warner Bros., num filme que ainda<br />

hoje, 40 anos depois, tem ar de<br />

experiência radical. E o magnífico<br />

“Fogo Fátuo” antecipa de 30 anos<br />

“Morrer em Las Vegas” ao seguir as<br />

últimas 24 horas de um alcoólico<br />

desencantado (extraordinário<br />

Maurice Ronet) que decide suicidarse<br />

mas, antes, visita os velhos<br />

amigos e amantes em busca de uma<br />

razão para continuar a viver - é um<br />

enxutíssimo melodrama<br />

existencialista, pontuado pela<br />

elegância esparsa das composições<br />

melancólicas de Erik Satie.<br />

Em 1969, desencantado com o<br />

arco da sua carreira, Malle passou<br />

seis meses na Índia, e essa viagem<br />

que “recarregou baterias” tornou-se<br />

numa “divisória” entre períodos da<br />

sua carreira; ao olhar compassivo do<br />

realizador vinha agora juntar-se um<br />

Tudo se vende e troca, tudo se mistura,<br />

família, sexo, prostituição: “Serviço”<br />

outro investimento pessoal, um<br />

contágio dos filmes pela sua própria<br />

vida. “Sopro no Coração” (1971) foi a<br />

primeira ficção pós-Índia, seguindo<br />

a iniciação romântica e sexual do<br />

“benjamim” sensível mas confuso de<br />

uma família burguesa de província<br />

nos anos 1950, onde não é difícil ver<br />

uma projecção da adolescência de<br />

Malle. O filme fez escândalo pela<br />

cena de incesto entre Benoit Ferreux<br />

e Léa Massari - o que não deixa de<br />

ser mais uma prova de como as<br />

pessoas se concentram nos<br />

“pormenores” em detrimento do<br />

que interessa.<br />

O sexto e último filme da caixa (e<br />

o menos interessante) pertence à<br />

“fase americana” iniciada com a<br />

mudança de Malle para os EUA em<br />

1978 - “O Meu Jantar com André”<br />

(1981) é uma “performance” quase<br />

teatral construída pelos actores e<br />

argumentistas Wallace Shawn e<br />

Andre Gregory a partir de conversas<br />

reais que tiveram ao longo dos anos<br />

sobre a vida, a arte e a felicidade.<br />

Dois actores, um cenário e a câmara<br />

atenta de Malle chegam para<br />

construir alguns momentos<br />

notáveis, mas o dispositivo não é<br />

sustentável durante quase duas<br />

horas sem causar uma sensação de<br />

repetição.<br />

Como extras, a edição oferece<br />

cinco documentários, que<br />

prolongam a estética de atenção ao<br />

indivíduo e de documentário que se<br />

constrói no próprio processo de<br />

filmagem que Malle iniciou com os<br />

filmes sobre a Índia. À curta de 1971<br />

“Vive le Tour”, vinte minutos sobre<br />

o folclore que rodeia a Volta à<br />

França em Bicicleta, seguem-se<br />

quatro longas nas quais Malle filma<br />

gente normal - os transeuntes<br />

parisienses em “Place de la<br />

République”, operários ao trabalho<br />

em “Humain, Trop Humain” (ambos<br />

1974), os habitantes da “smalltown”<br />

americana de Glencoe em “God’s<br />

Country” e emigrantes para os EUA<br />

em “...And the Pursuit of<br />

Happiness” (ambos 1986,<br />

produzidos para o serviço público<br />

de televisão americano). Nenhum<br />

deles estreou em Portugal, o que<br />

torna esta edição numa “arca do<br />

tesouro”, já que das seis ficções só<br />

“Fim-de-Semana no Ascensor” e “Os<br />

Amantes” viram estreia comercial<br />

entre nós. Se a disponibilização é de<br />

saudar, já é pena que a edição não<br />

tenha corrigido as “pechas” maiores<br />

da edição anterior: as traduções e<br />

legendagens continuam a ser<br />

desiguais, com erros de simpatia<br />

derivados da tradução espanhola ou<br />

legendas incompreensíveis que<br />

sugerem que quem traduziu não<br />

percebeu o que se está a dizer. As<br />

cópias estão em muito bom estado,<br />

mas os DVDs têm pontuais<br />

problemas de codificação e, dos seis<br />

filmes principais, apenas “Zazie no<br />

Metro”, “Os Amantes” e “O Meu<br />

Jantar com André” respeitam os<br />

formatos originais, com os restantes<br />

a levantarem algumas dúvidas. Um<br />

bocadinho mais de cuidado e esta<br />

edição seria exemplar.<br />

Tudo à mostra<br />

Serviço<br />

Serbis<br />

de Brillante Mendoza<br />

Zon Lusomundo<br />

mmmnn<br />

Sem extras<br />

“Serviço” não é<br />

filme para a<br />

família, embora<br />

se passe no<br />

cinema “Family”.<br />

É que Brillante<br />

Mendoza,<br />

cineasta filipino,<br />

mostra tudo.<br />

Chame-se-lhe<br />

“exploitation” (há algo disso),<br />

apontem-se-lhe ingenuidades - uma<br />

coisa não contradiz a outra e estão<br />

aliás juntas no último plano.<br />

Brillante, 49 anos, que se estreou em<br />

2005 com “The Masseur”, é um<br />

nome que se está a impor com essa<br />

desfaçatez. O seu último filme,<br />

“Kinatay” (podemos traduzir<br />

“Chacina”), extremou opiniões em<br />

Cannes mas deixou o festival com<br />

um prémio de realização. “Serviço”,<br />

a obra anterior, foi agora lançada<br />

entre nós directamente em DVD -<br />

não sabendo o que se fazer com um<br />

filme, é isso o que se faz...<br />

Uma família vive num velho<br />

cinema que agora exibe pornografia.<br />

Já não são os filmes, contudo, o<br />

negócio do “Family”. O espaço está<br />

direccionado para “serviços”. Tudo<br />

se vende e troca, tudo se mistura,<br />

família, sexo, prostituição. E já não<br />

há fronteira entre interior e exterior:<br />

intimidade à mostra. Explícito,<br />

derrubando fronteiras, como o<br />

(extraordinário trabalho de...) som<br />

que esventra o edifício familiar. É<br />

uma espécie de geografia da<br />

derrocada aquela que a câmara<br />

percorre, e o edifício é a mais extraordinária<br />

das personagens. Algures<br />

entre a ferocidade de Lino Brocka<br />

(1939-1991) - figura emblemática do<br />

cinema filipino: fez uma<br />

melodramática e política amálgama<br />

de cinema americano e neo-realismo<br />

italiano para falar do seu país - e com<br />

sinais que parecem reenviar ao<br />

trabalho do malaio Tsai Ming-liang<br />

(pela forma como filma a passividade<br />

de um corpo, o do actor Coco Martin,<br />

como Tsai faz com o “seu” Lee Kangsheng;<br />

pelo cenário da sala de<br />

cinema, que pode evocar “Goodbye<br />

Dragon Inn”, mas não existe ponta<br />

de lamento e pose em “Serviço”), já<br />

estamos a contar com ele: Brillante<br />

Mendoza. Vasco Câmara<br />

Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009 • 35


Concertos<br />

36 • Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009<br />

Uma nova geração em diálogo<br />

com Van Dam: Tomoko Taguchi<br />

Clássica<br />

O canto<br />

de duas<br />

gerações<br />

O grande baixo-barítono<br />

belga <strong>Jo</strong>sé van DaM e a<br />

jovem soprano japonesa<br />

Tomoko Taguchi no 17º<br />

aniversário da Orquestra<br />

Metropolitana de Lisboa.<br />

Cristina Fernandes<br />

Orquestra Metropolitana<br />

de Lisboa<br />

Com <strong>Jo</strong>sé Van Dam (barítono),<br />

Tomoko Taguchi (soprano).<br />

Maestro: Christopher Warren-Green.<br />

Lisboa. Centro Cultural de Belém. Praça do Império.<br />

3ª às 21h00. Tel.: 213612400. 10€ a 17,5€.<br />

Depois de ter aberto as portas das<br />

suas instalações no dia 4 para uma<br />

série de concertos de entrada livre, a<br />

Orquestra Metropolitana de Lisboa<br />

prossegue as comemorações do 17º<br />

aniversário na terça-feira no Centro<br />

Cultural de Belém. Para esta ocasião<br />

convidou um veterano do canto (o<br />

grande baixo-barítono belga <strong>Jo</strong>sé van<br />

Dam) e uma representante da nova<br />

geração (a soprano japonesa<br />

Tomoko Taguchi) que irão cantar<br />

obras de Mozart e Mahler sob a<br />

batuta de Christopher Warren-<br />

Green. O programa inclui ainda a<br />

versão orquestral da suite<br />

“Le Tombeau de<br />

Couperin”, refinada<br />

homenagem à<br />

música<br />

francesa do<br />

século<br />

XVIII<br />

Uma das mais brilhantes carreiras<br />

mundiais das últimas décadas:<br />

o barítono <strong>Jo</strong>sé Van Dam<br />

reveladora de uma síntese admirável<br />

entre o antigo e o moderno.<br />

A <strong>Jo</strong>sé van Dam cabe a<br />

interpretação do comovente ciclo<br />

“Kindertotenlieder” (Canções das<br />

Crianças Mortas”), de Mahler, a<br />

partir de poemas de Friederich<br />

Rückert, mas na segunda parte o<br />

carácter do programa será mais leve<br />

e festivo, incluindo alguns “high<br />

lights” da música de Mozart. As<br />

aberturas das óperas “O<br />

Empresário”, “D. Giovanni” e “A<br />

Flauta Mágica” e algumas árias e<br />

duetos das duas últimas obras e do<br />

“Così fan tutte” evocam personagens<br />

tão inesquecíveis como Fiordiligi, D.<br />

Elvira, Zerlina e D. Giovanni,<br />

Papageno e Papagena ou ainda<br />

Leporello com a sua famosa ária do<br />

catálogo das 1003 conquistas de D.<br />

Giovanni. Recorde-se que foi <strong>Jo</strong>sé<br />

van Dam a personificar Leporello no<br />

filme sobre o mítico sedutor dirigido<br />

por <strong>Jo</strong>seph Losey em 1979 ao lado de<br />

Ruggero Raimondi, Edda Moser e<br />

Kiri te Kanawa. Actualmente com 68<br />

anos, o barítono belga tem atrás de<br />

si uma das mais brilhantes carreiras<br />

mundiais das últimas décadas,<br />

testemunhada por uma ampla<br />

discografia e distinguida com<br />

numerosos prémios, entre os quais<br />

dois Grammys: um em 1985 pela sua<br />

interpretação de canções de Ravel<br />

com a Sinfónica da BBC, sob a<br />

direcção de Pierre Boukez, e outro<br />

em 1992, pela melhor gravação da<br />

ópera “A Mulher sem Sombra”, de<br />

Richard Strauss.<br />

Tomoko Taguchi começou por<br />

estudar piano antes de se dedicar ao<br />

canto a partir de 1993. Premiada em<br />

vários concursos internacionais no<br />

Japão e distiguida em 2003 no<br />

programa “<strong>Jo</strong>vens Artistas em<br />

Residência” no Teatro do<br />

Châtelet (Paris) tem<br />

desenvolvido nos<br />

últimos anos um<br />

sólido percurso<br />

internacional.<br />

Vozes ocultas<br />

na Casa da Música<br />

Remix Ensemble<br />

Direcção Musical: Emilio Pomàrico.<br />

Com Alda Caiello (soprano).<br />

Porto. Casa da Música. Pç. Mouzinho de<br />

Albuquerque, sáb., 6, às 21h00. Tel.: 220120220.<br />

10€. Na Sala Suggia.<br />

Vozes Ocultas - obras de Berg,<br />

Pomàrico, Harvey, Wagner e Leeuw.<br />

O Remix Ensemble propõe neste<br />

concerto com a soprano finlandesa<br />

Anu Komsi e o maestro italiano<br />

Emilio Pomarico um dos mais<br />

interessantes programas da<br />

temporada. A voz humana é o ponto<br />

de partida, surgindo quer de forma<br />

explícita quer como foco de<br />

inspiração para partituras<br />

instrumentais. Do britânico<br />

<strong>Jo</strong>nathan Harvey (n. 1939),<br />

compositor em residência na Casa<br />

da Música em 2009, será possível<br />

ouvir “Hidden Voice” (“Canto<br />

Invisível”) - onde os instrumentos de<br />

cordas funcionam como metáfora da<br />

voz humana, escondendo um<br />

lamento que evoca a linguagem da<br />

infância e o divino - e ainda “Song<br />

Offerings”, ciclo com poemas do<br />

Nobel da literatura Rabindranath<br />

Tagore que expressam o amor<br />

secreto de uma mulher. Destaca-se<br />

também a estreia mundial da versão<br />

para ensemble dos “Altenberg<br />

Lieder”, as quatro canções para voz<br />

e orquestra op. 4 que Alban Berg<br />

compôs em 1912 sobre pequenos<br />

textos em prosa escritos por<br />

Peter Altenberg em cartões<br />

postais enviados às suas filhas.<br />

A transcrição, dedicada ao<br />

Remix Ensemble, foi efectuada<br />

por Emilio Pomarico por<br />

solicitação da Casa da<br />

Música. O programa<br />

termina com o famoso<br />

“Prelúdio e Morte de<br />

Isolda”, de Wagner,<br />

numa orquestração<br />

do maestro, pianista<br />

e compositor<br />

holandês Reinbert de<br />

Leeuw (n. 1938). C.F.<br />

Concerto<br />

comentado<br />

pela<br />

Orquestra<br />

do Algarve<br />

Orquestra do Algarve<br />

Cesário Costa (direcção e<br />

comentários)<br />

Patrício da Silva<br />

(comentários)<br />

Obras de <strong>Jo</strong>ly Braga Santos,<br />

Patrício da Silva e<br />

Stravinsky<br />

Lisboa, Grande Auditório da Culturgest,<br />

dom., 7, às 11h.<br />

A série de concertos<br />

comentados que a<br />

Culturgest tem estado a promover<br />

ao domingo de manhã com o<br />

objectivo de aproximar o público da<br />

Cesário Costa dirige a Orquestra<br />

do Algarve no ciclo de concertos<br />

comentados na Culturgest<br />

Agenda<br />

Sexta 5<br />

Xangai<br />

Lisboa. Culturgest. Rua Arco do Cego - Edifício da<br />

CGD, às 21h30. Tel.: 217905155. 18€. -30 anos: 5€. No<br />

Grande Auditório. Brasilerança. M/12.<br />

Sequeira Costa e Orquestra<br />

Nacional do Porto<br />

Direcção Musical: Jean-Pierre Wallez.<br />

Com Sequeira Costa (piano).<br />

Porto. Casa da Música. Pç. Mouzinho de<br />

Albuquerque, às 21h00. Tel.: 220120220. 17€. Na<br />

Sala Suggia.<br />

Obras de Chabrier, Franck, Debussy e<br />

Ravel.<br />

Peter Brötzmann Quartet<br />

Com Peter Brötzmann (palhetas), <strong>Jo</strong>e<br />

McPhee (saxofone tenor), Kent Kessler<br />

(contrabaixo), Michael Zerang<br />

(bateria).<br />

Coimbra. Teatro Académico de Gil Vicente. Pç.<br />

República, às 22h00. Tel.: 239855636. 7€ (sujeito a<br />

descontos).<br />

<strong>Norberto</strong> <strong>Lobo</strong><br />

Lisboa, Casa do Alentejo. Rua Portas de Santo<br />

Antão, 58. 6ª, 5, às 22h. Tel.:213 405 140. 5euros.<br />

Daniel Levin Quartet<br />

Almada. Incrível Club. R. Capitão Leitão, 1, às 23h45.<br />

Tel.: 212742900. 2€. Passe: 15€.<br />

Jazz nos Capuchos - Encontros de Jazz<br />

de Almada. Informações: 212724541.<br />

Rodrigo Leão & Cinema Ensemble<br />

Estoril. Casino. Pç. <strong>Jo</strong>sé Teodoro dos Santos, às<br />

22h00. Tel.: 214667700. 25€ a 35€. No Salão Preto e<br />

Prata. M/18.<br />

Apresentação de “A Mãe”<br />

Festival Metal GDL 2009 - 4ª<br />

Edição<br />

Grândola. Pq. de Feiras e Exposições, 6ª, às 20h30.<br />

Sáb. às 19h00. Tel.: 269750260. 15€. Passe: 25€. Prévenda<br />

Passe: 20€. Informações: 966144800.<br />

Com Sinister, Symbiose, Bizarra<br />

Locomotiva, Haemophogia,<br />

Namek, Thee Orakle, Cryptor<br />

Morbious Family, We Are The<br />

Damned e My Enchantment.<br />

On The Road (Tó Trips +<br />

Tiago Gomes)<br />

Portimão. Teatro<br />

Municipal. Lg. 1.º de<br />

Dezembro, às 22h00. Tel.:<br />

282402475. Entrada livre.<br />

Café-Concerto.<br />

Rodrigo Leão<br />

apresenta o novo<br />

disco, “Mãe”, no<br />

Casino do Estoril<br />

<strong>Jo</strong>ão Paulo toca<br />

Carlos Bica<br />

Faro. Centro de Artes<br />

Performativas do<br />

Algarve (CAPa). R. Frei<br />

Lourenço de Santa<br />

Maria, 4. 6ª às 22h00.<br />

Tel.: 289828784. 6€<br />

(sujeito a descontos).<br />

White Works.<br />

Participação<br />

especial de<br />

Carlos Bica.<br />

Táxi<br />

Porto. Coliseu do Porto.<br />

R. Passos Manuel, 137, às<br />

22h00. Tel.: 223394947. 10€ a 15€.<br />

Apresentação de<br />

“Amanhã”. M/3. Duração:<br />

75m.<br />

Schostakovich Ensemble<br />

Com Filipe Pinto-Ribeiro<br />

(piano), Priya Mitchell<br />

(violino), Pavel Gomziakov<br />

(violoncelo), Pascal Moraguès<br />

(clarinete).<br />

Seixal. Fórum Cultural do Seixal. Qta. dos<br />

Franceses, às 21h30. Tel.: 210976100. 8€.<br />

No Auditório Municipal. M/12.<br />

Sean Riley & The<br />

Slowriders + Say it With<br />

Flowers + James Holden +<br />

Ricardo Tobar + Dexter


Madness no Pavilhão Atlântico<br />

Lisboa. Lux Frágil. Av. Infante D. Henrique, Armazém<br />

A, às 23h00. Tel.: 218820890.<br />

Cacique 97<br />

Lisboa. Galeria Zé dos Bois. Rua da Barroca, 59 -<br />

Bairro Alto, às 23h00. Tel.: 213430205. 6€.<br />

NBC & The Funks<br />

Seia. Largo da Câmara, às 21h30. Entrada livre.<br />

sábado 6<br />

Rui Veloso Nova Data<br />

Espinho. Casino de Espinho. R. 19, 85, às 23h00<br />

(jantar às 20h30). Tel.: 227335500. 75€ (jantarespectáculo).<br />

No Salão Atlântico. M/18.<br />

Mayra Andrade<br />

Portalegre. Centro de Artes do Espectáculo de<br />

Portalegre. Praça da Republica, 39, às 22h00. Tel.:<br />

245307498. 20€. No Grande Auditório. M/4.<br />

Peter Brötzmann Quartet<br />

Monte de Caparica. Convento dos Capuchos. Rç<br />

Lourenço Pires de Távora, 42, às 21h45. Tel.:<br />

212919342. 7€. Passe: 15€.<br />

Jazz nos Capuchos - Encontros de Jazz<br />

de Almada. Informações: 212724541.<br />

Sean Riley & The Slowriders<br />

Coimbra. Fnac (Fórum Coimbra). Quinta de São<br />

Gemil, às 22h00. Tel.: 707313435. Entrada livre.<br />

Dead Kids + Blasfemea + If Lucy<br />

Fell + Mad Professor<br />

Lisboa. MusicBox. R. Nova do Carvalho, 24 - Cais do<br />

Sodré, às 22h00. Tel.: 213430107.<br />

Da Weasel + Gritos Mudos + DJ<br />

Fernando Alvim<br />

Vila de Rei. Parque de Feiras de Vila de<br />

Rei. Pç. Família Matos e Silva Neves, às<br />

23h00. Tel.: 274890012. Entrada livre.<br />

Festival Rock Na Vila. Informações:<br />

241371981.<br />

Divino Sospiro<br />

Com Iskrena Yordanova (violino),<br />

Massimo Mazzeo (viola), Diana Vinagre<br />

(violoncelo).<br />

Sassoeiros. Quinta da Encosta. Largo Vasco d’Orey, 4,<br />

às 21h30. Tel.: 214570056. 25€.<br />

Obras de Bocherini, Giordani, Mozart,<br />

Haydn.<br />

Schostakovich Ensemble<br />

Com Filipe Pinto-Ribeiro (piano),<br />

Tatiana Samouil (violino), Justus<br />

Grimm (violoncelo), <strong>Jo</strong>lente de Maeyer<br />

(violino), Gérard Caussé (viola), Tony<br />

Nys (viola), Tiago Pinto-Ribeiro<br />

(contrabaixo).<br />

Lisboa. Centro Cultural de Belém. Praça do Império,<br />

às 21h00. Tel.: 213612400. 12,5€ a 15€. No Pequeno<br />

Auditório. M/12.<br />

Obras de Haydn e Mendelssohn.<br />

Marta Hugon<br />

Seteais. Palácio de Seteais. Rua Barbosa du Bucage,<br />

10, às 17h00. Tel.: 219233200. 10€. Nos Jardins.<br />

Apresentação de “Story Teller”.<br />

Festival de Sintra 2009.<br />

Maria <strong>Jo</strong>ão e Mário Laginha<br />

Ílhavo. Centro Cultural de Ílhavo. Avenida<br />

25 de Abril, às 21h30. Tel.: 234397260. 10€.<br />

No Auditório.<br />

Apresentação de “Chocolate”.<br />

M/6.<br />

Rita Redshoes<br />

Arraiolos. Praça Lima e Brito, às<br />

22h00. Entrada livre.<br />

O Tapete está na Rua<br />

2009. Informações:<br />

266490240.<br />

JP Simões<br />

Lisboa. Largo da Rosa.<br />

Mouraria, às 22h30. Entrada<br />

livre.<br />

JP Simões<br />

domingo 7<br />

Mayra Andrade<br />

Lisboa. CCB. Praça do Império, às 21h00. Tel.:<br />

213612400. 15€ a 40€. No Grande Auditório. M/12.<br />

Sequeira Costa e Orquestra<br />

Nacional do Porto<br />

Direcção Musical: Jean-Pierre Wallez.<br />

Com Sequeira Costa (piano).<br />

Porto. Casa da Música. Pç. Mouzinho de<br />

Albuquerque, às 18h00. Tel.: 220120220. 17€. Na Sala<br />

Suggia.<br />

terça 9<br />

The Script + Paul Da Silva Nova<br />

Data<br />

Lisboa. Aula Magna. Alam. Universidade, às 21h00<br />

(portas abrem às 20h). Tel.: 217967624. 20€ a 25€.<br />

Lisbon Calling: The Tubes +<br />

Carbon/Silicon + Foreigner +<br />

Madness<br />

Lisboa. Pavilhão Atlântico. Pq. das Nações, às 19h00.<br />

Tel.: 218918409. 25€ a 40€. Na Sala Atlântico. M/3.<br />

Tito Paris + Maria Alice + Calú<br />

Moreira<br />

Lisboa. Maxime. Pç. Alegria, 58, às 22h00. Tel.:<br />

213467090. 10€.<br />

Mayra Andrade<br />

Aveiro. Centro Cultural e de Congressos de Aveiro. R.<br />

Cais da Fonte Nova - Apartado 1520, às 21h00. Tel.:<br />

234406481. 22€ a 25€.<br />

Kun Woo Paik<br />

Sintra. Palácio Nacional de Sintra (Palácio da Vila).<br />

Largo da Rainha Dona Amélia, às 21h30. Tel.:<br />

219106840. 20€.<br />

Festival de Sintra 2009. Obras de<br />

Beethoven.<br />

Orishas + Anjos<br />

Calendário. Estádio Municipal de Vila Nova de<br />

Famalicão. Campo dos Bargos, às 22h00. Tel.:<br />

252315026. 12€. Pré-venda: 10€.<br />

quarta 10<br />

The Weatherman<br />

Coimbra. Fnac (Fórum Coimbra). Quinta de São<br />

Gemil, às 17h00. Tel.: 707313435. Entrada livre.<br />

Mayra Andrade<br />

Coimbra. Teatro Académico de Gil Vicente. Pç.<br />

República, às 21h30. Tel.: 239855636. 20€ a 25€.<br />

Ana Moura<br />

Arraiolos. Praça Lima e Brito, às 22h00. Entrada<br />

livre.<br />

Pedro Abrunhosa<br />

Peniche. Avenida do Mar, às 23h00. 7,5€.<br />

quinta 11<br />

Blasted Mechanism<br />

Aljustrel. Parque de Exposições e Feiras às 22h30.<br />

1,5€. Feira do Campo Alentejano. Informações:<br />

284600070.<br />

RUI PIRES<br />

Mayra Andrade canta pelo país<br />

7 Junho<br />

música<br />

Maria Matos Teatro Municipal<br />

Scanner<br />

Bilhetes à venda:<br />

Teatro Maria Matos 218 438 801<br />

www.ticketline.pt | Fnac<br />

52 Spaces<br />

Dias das<br />

histórias<br />

(im)<br />

prováveis<br />

10€ / 7,5€ / 5€ M/ 12<br />

www.teatromariamatos.egeac.pt<br />

Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009 • 37


PRÉMIO NACIONAL<br />

Poeta<br />

Ruy Belo<br />

oBRA<br />

38 • Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009<br />

VENCEDOR(A) - 2008<br />

“O Silêncio: Lugar habitado”<br />

AUTORA<br />

Graça M. C. Mendes Pires<br />

CERIMÓNIA DE ENTREGA DO PRÉMIO<br />

20 JUNHO 2009<br />

11H30M - BIBLIOTECA MUNICIPAL<br />

Mais informações em<br />

www.cm-rIOmAIOR.pt<br />

Concertos<br />

Orquestra do Algarve<br />

música dos século XX e XXI termina<br />

esta temporada com a visita da<br />

Orquestra do Algarve, dirigida por<br />

Cesário Costa. Além da sua função<br />

pedagógica, a concepção do ciclo<br />

tem revelado a preocupação em<br />

trazer à Culturgest alguns<br />

agrupamentos sediados fora de<br />

Lisboa como já sucedeu com o<br />

Quarteto Remix ou com o<br />

Drumming. O programa proposto<br />

pela Orquestra do Algarve é bastante<br />

apelativo, incluino a suite do bailado<br />

“Pulcinella” de Stravisnky,<br />

e duas obras de autores<br />

portugueses: “Stacatto Brilhante”,<br />

de <strong>Jo</strong>ly Braga Santos (1924-1988), um<br />

dos grandes vultos da música<br />

portuguesa do século XX, conhecido<br />

pela mestria com que dominava a<br />

escrita orquestral, e “The Fact of the<br />

Matter as a Matter of Fact”, de<br />

Patrício da Silva (n. 1973),<br />

compositor que tem desenvolvido<br />

parte da sua carreira nos Estados<br />

Unidos, onde se doutorou em<br />

composição na Universidade da<br />

Califórnia. Actualmente compositor<br />

residente da Sinfónica de Berkeley,<br />

Patrício da Silva irá explicar<br />

pessoalmente a sua peça aos<br />

presentes, sendo as restantes obras<br />

do programa comentadas por<br />

Cesário Costa. C.F.<br />

Laurent<br />

Filipe,<br />

30 anos<br />

de carreira<br />

Jazz<br />

Internet<br />

Laurent Filipe:<br />

de Louis Armstrong<br />

a Carlos do Carmo<br />

Laurent Filipe<br />

Lisboa. Centro Cultural de Belém. Praça do Império,<br />

2ª, 8, às 21h00. Tel.: 213612400. 5€ a 25€. No<br />

Grande Auditório. M/12<br />

Nascido em São Paulo, Laurent Filipe<br />

desenvolveu a sua ligação ao jazz em<br />

Portugal e aos 17 anos já subia ao<br />

palco do Cascais Jazz. Louis<br />

Armstrong e Miles Davis foram os<br />

responsáveis principais pelo fascínio<br />

inicial, com o jazz e com um<br />

instrumento em particular: o<br />

trompete. Laurent Filipe abordou ao<br />

longo da carreira diversas correntes,<br />

trabalhou com músicos muito<br />

distintos, nunca se deixando<br />

engavetar ou ficar colado a um só<br />

estilo - mas sempre revelou um gosto<br />

especial por um certo jazz tradicional.<br />

O seu momento actual é reflexo disso<br />

mesmo e Filipe tem trabalhado em<br />

múltiplas direcções: Duo Iberia,<br />

Homenagem a Chet Baker, The Song<br />

Band, Sexteto Mingus e Mais, Swing<br />

City Orquestra e quarteto Flick Music<br />

(que é também o seu mais recente<br />

disco). No concerto no CCB serão<br />

resumidos 30 anos de carreira - que<br />

estão materializados em dez discos - e<br />

pelo palco vão passar muitos músicos<br />

convidados,<br />

destacando-se<br />

os pianistas<br />

<strong>Jo</strong>ão Paulo<br />

e Pedro<br />

Estamos online. Entre em<br />

www.ipsilon.pt. É o mesmo<br />

suplemento, é outro desafi o.<br />

Venha construir este site<br />

connosco.<br />

Sarmiento e o grande Carlos do<br />

Carmo. Nuno Catarino<br />

Pop<br />

Folk pastoral que<br />

vem de Espanha<br />

Pájaro Sunrise + Vinicius Terra<br />

Lisboa. Music Box, 6ª, 5, às 24h.<br />

Pájaro Sunrise + Jesca Hoop<br />

Coimbra. Via Club, sáb, 6, às 22h.<br />

É um chavão, mas, como tantos outros,<br />

com fundo de verdade: em Portugal<br />

existe desconhecimento profundo<br />

da pop espanhola. Há excepções -<br />

dos Migala a El Guincho - mas só<br />

confirmam a regra. Agora aí está o<br />

projecto Pájaro Sunrise, com concerto<br />

em Portugal e duplo álbum acabado de<br />

editar, “Done / Undone”, sucessor de<br />

um longa-duração de estreia lançado<br />

há três anos. O projecto, que já foi trio,<br />

é agora defendido apenas por Yuri<br />

Méndez, 25 anos. O álbum editado<br />

move-se pela pop-folk, com elementos<br />

electrónicos a conectarem-se com<br />

sons predominantemente acústicos,<br />

numa linha pastoral não muito<br />

distante dos Kings Of Convenience,<br />

embora Yuri prefira citar Silver Jews<br />

como influência.<br />

“Done” aborda as canções mais<br />

melancólicas, enquanto “Undone”,<br />

segundo o autor, olha para o futuro<br />

com optimismo. Ao vivo, há violino,<br />

banjo ou acordeão para expressar<br />

uma pop caleidoscópica, cantada<br />

em inglês, que é capaz de<br />

evocar Nick Drake ou<br />

Simon & Garfunkel,<br />

mas que não fica<br />

prisioneira de nenhum<br />

modelo. Vítor<br />

Belanciano<br />

Pájaro Sunrise: concerto e álbum acabado de editar


Discos<br />

Melhor que tudo é a voz<br />

magnética e possessa de Scot Matthew<br />

Pop<br />

Doce<br />

tormento<br />

<strong>Jo</strong>vem barbudo, ultra<br />

torturado, hiper talentoso.<br />

Scott Matthew vai dar que<br />

falar. Luís Maio<br />

Scott Matthew<br />

There Is An Ocean That Divides<br />

Glitterhouse, distri. Edel<br />

mmmmn<br />

É óbvio que Scott<br />

Matthew vai<br />

causar sensação.<br />

Vem da linha dos<br />

trovadores que<br />

colocam os seus<br />

dilemas mais<br />

íntimas em canção, empregando,<br />

para lhes dar corpo, uma voz ao<br />

mesmo tempo apaixonada,<br />

dramática e visceral.<br />

As canções, sóbrias e elegantes,<br />

têm assento acústico, mas são<br />

revestidas por arranjos<br />

requintadíssimos, que procuram a<br />

estilização e a beleza na miséria<br />

interior. Será o novo Antony? A luz<br />

que guia Scott Matthew é mais<br />

sombria, a sua paleta musical de<br />

matriz mais folk, mas isto dito,<br />

haverá também que reconhecer<br />

afinidades. No romantismo<br />

transbordante em constante rota de<br />

colisão com a realidade, na fantasia<br />

musical que a transcende, mas<br />

também numa certa excentricidade<br />

e culto da anti-imagem.<br />

Um é obeso e usa peruca, o outro<br />

é barbudo e parece saído de um<br />

sanatório para jovens tuberculosos.<br />

Por alguma razão, aliás, Antony terá<br />

escolhido Matthew para abrir<br />

concertos da sua presente<br />

digressão internacional.<br />

Os meios arty<br />

nova-iorquinos<br />

que eles<br />

frequentam<br />

também não<br />

serão muito<br />

diferentes. Scott<br />

Matthew nasceu<br />

em Queensland,<br />

na Austrália, mas<br />

desistiu dos<br />

estudos e foi para<br />

Sidney, onde<br />

montou uma banda<br />

punk que não<br />

resultou. Até que, em<br />

1997, descolou da<br />

capital australiana<br />

com apenas 120<br />

dólares no bolso e a<br />

morada de um<br />

amigo que vivia em<br />

Brooklyn. Em Nova<br />

Iorque conheceu<br />

Spencer Cobrin, que<br />

foi baterista de<br />

Morrissey, e<br />

formaram os Elva<br />

Snow, que chegaram a gravar um<br />

míni álbum de oito temas. Um dos<br />

seus concertos foi visto por uma<br />

produtora japonesa, que empregou<br />

a voz de Scott em bandas sonoras de<br />

filmes de animação japonesa.<br />

A música de filmes foi o ramo em<br />

que passou a trabalhar, sendo a sua<br />

encomenda de maior projecção<br />

“Shortbus” (2006), de Cameron<br />

Mitchell. Foi também o ponto de<br />

partida para a carreira a solo, uma<br />

vez que Scott se estreou em nome<br />

próprio com um disco de novas<br />

versões dos temas que gravou para o<br />

filme.<br />

“There Is An Ocean That Divides”<br />

acaba assim por ser o seu primeiro<br />

disco feito de raiz e o seu primeiro<br />

lançamento internacional. É um<br />

disco que começa com um doce<br />

queixume, pronunciado quase em<br />

surdina, para depois ganhar<br />

tonalidades de pop bucólica, drama<br />

pungente, devaneio romântico, até<br />

acabar numa mistura de canção de<br />

embalar e de oração.<br />

As letras são sobre flores em<br />

altares, luzes interiores, pactos com<br />

o Diabo e crispações com Deus, mas<br />

sobretudo sobre problemas de<br />

identidade, a culpa e outros<br />

suplícios interiores. As canções têm<br />

quase todas base de piano, austero e<br />

sombrio, mas vão introduzindo<br />

bandolim, ukelele, acordeão,<br />

violoncelo e sopros e criando uma<br />

paleta emotiva que invoca<br />

directamente a folk e sinfonismo,<br />

com elementos de jazz de coreto e<br />

pop sixties pelo meio.<br />

Melhor que tudo é a voz<br />

magnética e possessa, entre o<br />

crooning suplicante, a doce<br />

melancolia e as ocasionais explosões<br />

febris. A lembrar Scott Walker e<br />

David Bowie muito explicitamente,<br />

sem nunca perder de vista os<br />

contemporâneos Antony e Devendra<br />

Banhart. E depois destes dois - era<br />

capaz de apostar com quem quiser<br />

um bilhete para o primeiro concerto<br />

que vier dar entre nós - é de Scott<br />

Matthew que se vai falar.<br />

A queda de<br />

um homem<br />

“1”, feito de blues de ritmo<br />

acelerado e harmónica<br />

poderosa, de folk pungente<br />

e suaves desvios jazz, é uma<br />

pérola esquecida.<br />

Mário Lopes<br />

Tim Hardin<br />

1<br />

Water; distri. Mbari<br />

mmmmm<br />

Tim Hardin, que baixou os braços<br />

e abandonou a carreira em 1973,<br />

foi esquecido por todos<br />

Tim Hardin estava<br />

perfeitamente de<br />

acordo com seu<br />

tempo, mas não<br />

propriamente.<br />

Cantor folk em<br />

Greenwich<br />

¬Mau ☆Medíocre ☆☆Razoável ☆☆☆Bom ☆☆☆☆Muito Bom ☆☆☆☆☆Excelente<br />

Village, viajante que trocou Nova<br />

Iorque por Boston e esta por Los<br />

Angeles, antes de regressar à Village,<br />

Hardin foi militar, desejou ser actor<br />

e acabou cantor.<br />

“1”, o seu primeiro álbum, editado<br />

em 1966 e agora reeditado, foi criado<br />

como manta de retalhos onde<br />

couberam maquetas pouco<br />

trabalhadas e canções<br />

laboriosamente elaboradas para a<br />

edição. “1”, feito de blues de ritmo<br />

acelerado e harmónica poderosa, de<br />

folk pungente e suaves desvios jazz,<br />

é uma pérola esquecida.<br />

A sua elegância sonora partilhava<br />

a da época que o viu nascer (ano<br />

1966, recorde-se). Mas depois, Tim<br />

Hardin, na sua voz magnífica,<br />

cantava à humanidade o que a<br />

humanidade não queria ouvir. A sua<br />

voz era a de um romântico<br />

descrente, aquele que avisava “don’t<br />

make promises you can’t keep” (o<br />

“anti-hino” da década de 1960),<br />

aquele que pedia “give me a reason<br />

to believe”, aquele que escreveu<br />

uma das mais belas canções de amor<br />

que conheceremos e lhe chamou<br />

“It’ll never happen again” - dor,<br />

assomo de revolta e resignação, por<br />

fim e sempre, cantada por um<br />

homem de 25 anos cuja imensa<br />

melancolia não parecia advir do<br />

feitio, antes de conhecer demasiado<br />

bem o mundo e os seus habitantes (e<br />

a si próprio em especial).<br />

Tim Hardin, que baixou os braços<br />

e abandonou a carreira em 1973,<br />

esquecido por todos, que morreu no<br />

mesmo ano e mês que <strong>Jo</strong>hn Lennon<br />

(Dezembro de 1980), agarrado à<br />

heroína de que era dependente<br />

desde os tempos do exército,<br />

despedia-se neste “1”, que era a sua<br />

apresentação ao mundo, com uma<br />

pergunta: “How can we hang on to a<br />

dream?” Melodia em queda, aquela<br />

voz que questiona sem amargura e<br />

as profundezas que, noutro<br />

continente e noutro ano,<br />

reconheceríamos depois em Nick<br />

Drake.<br />

“1”, a estreia de Tim Hardin, um<br />

dos vocalistas preferidos de Stuart<br />

Staples, dos Tindersticks - a entrega<br />

vocal e as orquestrações denunciam<br />

claramente a preferência -, é um<br />

disco perfeito. Perfeito na<br />

aceleração r&b de “Smugglin’ man”<br />

e na gentileza de “Misty roses” (com<br />

Rhodes e balanço de bossa dolente).<br />

Perfeito nesses dois momentos de<br />

luz, luminoso de tão desarmante em<br />

tudo o resto.<br />

Ouvimo-lo em “Never too far”:<br />

“Does it ease your heart to say /<br />

Tomorrow brings another way / To<br />

lose you”. O perfeito Tim Hardin a<br />

cantar tudo aquilo que teima,<br />

constantemente, dolorosamente,<br />

em escapar à perfeição.<br />

Entre o medieval<br />

e o urbano<br />

Bat For Lashes<br />

Two Suns<br />

Echo Label, distri. EMI Music<br />

Portugal<br />

mmmmn<br />

Em 2007, quando<br />

saiu o álbum de<br />

estreia “Fur And<br />

Gold”, percebia-se<br />

que Natasha Khan,<br />

mais conhecida<br />

por Bat For Lashes<br />

tinha tudo para dar que falar. Dois<br />

anos depois confirma-se em absoluto.<br />

Agora distribuído em Portugal,<br />

“Two Suns”, mostra aquilo que já era<br />

perceptível no primeiro lançamento<br />

(uma voz aveludada e uma equilibrada<br />

pop de câmara barroca, electrónica<br />

e acústica em simultâneo), mas de<br />

forma mais conseguida.<br />

Ela, britânica de 29 anos de<br />

ascendência paquistanesa, diz que<br />

foi inspirador ter estado nos últimos<br />

tempos em Brooklyn, N.Y. – mais<br />

uma, pois então – convivendo com<br />

grupos como os TV On The Radio,<br />

Gang Gang Dance ou Yeasayer.<br />

Percebe-se onde quer chegar. O seu<br />

álbum não respira, sonicamente,<br />

nenhuma influência directa desses<br />

grupos, mas revela horizontes mais<br />

ricos e inventivos do que no primeiro<br />

disco, sem deixar de lado uma<br />

concepção e sensibilidades pop.<br />

Tal como outros discos, lançados<br />

este ano, por mulheres (Telephate,<br />

School Of Seven Bells ou <strong>Fever</strong> <strong>Ray</strong>)<br />

existe em Bat For Lashes um apetite<br />

por se mover naquele tipo de campo<br />

onde o consciente e o inconsciente<br />

se confrontam, cenário<br />

fantasmagórico de imagens<br />

enigmáticas, rituais tão urbanos<br />

quanto medievais, climas coloridos<br />

e uma sonoridade entre a música de<br />

câmara, a pop barroca e a<br />

electrónica expressionista.<br />

No último tema, “The big sleep”,<br />

oração fúnebre com piano em<br />

fundo, a voz do veterano Scott<br />

Walker faz-se ouvir por breves<br />

momentos, iluminando um disco<br />

que contempla canções inspiradas<br />

por motivos muito diferentes como a<br />

pop electrónica (“Daniel”), o blues<br />

ancestral (“Peasse of mind”), a<br />

dança ritualista (“Sleep alone”) ou<br />

os encantos etéreos (“Siren song”),<br />

sempre unidas pela voz polivalente<br />

de Khan, mulher-orquestra que, ao<br />

segundo álbum, se afirma<br />

definitivamente. Vítor Belanciano<br />

Bat for Fashes, voz polivalente,<br />

ao segundo álbum afi rma-se<br />

defi nitivamente<br />

Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009 • 39


Discos<br />

O muito que não<br />

ouvimos antes<br />

<strong>Norberto</strong> <strong>Lobo</strong><br />

Pata Lenta<br />

Mbari<br />

mmmmn<br />

Impressiona a<br />

dinâmica desta<br />

música. A forma<br />

como se<br />

desenvolve<br />

organicamente,<br />

expandindo-se e contraindo-se ao<br />

sabor do dedilhar de <strong>Norberto</strong> <strong>Lobo</strong>.<br />

Cada tema de “Pata Lenta” é assim.<br />

Começa como a própria capa do<br />

disco, outonal: um prenúncio de<br />

tempestade visto de lugar seguro – o<br />

dedilhar é lento, os harmónicos são<br />

lampejos de luminosidade. Quatro<br />

minutos depois, tudo mudou. A folk<br />

já ganhou ritmo e delicadeza, a folk<br />

há-de tornar-se coisa telúrica que<br />

baila em movimento sincopado, háde<br />

ganhar sol em espaço aberto<br />

antes de se recolher novamente.<br />

Na verdade, de “Mudar de Bina”<br />

para “Pata Lenta”, pouco mudou.<br />

Uma guitarra<br />

acústica e nada<br />

mais. Mas<br />

porque<br />

haveria<br />

de mudar<br />

se, na<br />

realidade,<br />

nada se<br />

repete?<br />

Essa,<br />

de<br />

há um <strong>Norberto</strong> que<br />

já conhecemos<br />

e que não mudou<br />

FRED NS Em “Pata Lenta”<br />

40 • Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009<br />

resto, é a grande virtude de<br />

<strong>Norberto</strong> <strong>Lobo</strong>. A capacidade de<br />

convocar os mesmos sentimentos,<br />

de mostrar o mesmo carinho pela<br />

ideia de melodia; a capacidade de<br />

fazer tudo isso sem que nos<br />

sintamos a repetir os mesmos<br />

passos. Onde antes havia uma versão<br />

de Paredes, “Mudar de vida”, agora<br />

há “Unravel”, de Björk. Onde antes<br />

havia a “Cantiga da ceifa”, agora há a<br />

nostalgia crepuscular de “Sra do<br />

Monte”.<br />

Há momentos, como “Brisa<br />

biónica”, em que se pressente a<br />

tradição dos fingerpickers americanos,<br />

naquela forma de desencantar<br />

mantras das poeiras da folk. Há<br />

momentos em que uma melodia, por<br />

vezes curta, de segundos, nos diz que<br />

quem fez esta música partilha<br />

connosco algo de imensamente<br />

familiar (a magnífica “Ayrton<br />

Senna”). Mas, depois, chegamos a<br />

algo como “Samantra” e não, não é<br />

nada disso. É música cheia, música<br />

de um navegar majestoso e, nela,<br />

cabem Índias e Américas e Portugais.<br />

Nela, cabe <strong>Norberto</strong> <strong>Lobo</strong> inteiro. Um<br />

<strong>Norberto</strong> que já conhecemos e que<br />

não mudou.<br />

Mas, pelo que ouvimos em “Pata<br />

Lenta”, ainda tem muito a dizer que<br />

não ouvimos antes. M.L.<br />

Richard Swift<br />

The Atlantic Ocean<br />

Secretly Canadian; distri.<br />

Popstock<br />

mmmmn<br />

“I got the right<br />

LPs, I got the Lou<br />

Reeds”. Richard<br />

Swift canta-o logo<br />

ao início e não o<br />

ouvimos como<br />

novidade. De<br />

facto, há muito que não<br />

duvidamos. Porque o autor<br />

de “Walking Without<br />

Effort/The Novelist” não<br />

tem apenas os discos<br />

certos.<br />

Aparentemente, tem<br />

os discos todos. É<br />

um verdadeiro<br />

camaleão, mas não<br />

no sentido Bowie<br />

do termo. Swift, ao<br />

contrário de sua<br />

divindade Ziggy,<br />

não sofre<br />

metamorfoses<br />

que lhe<br />

transformem<br />

por<br />

completo a<br />

“persona”<br />

pública.<br />

Swift é<br />

um<br />

compositor multifacetado, íntimo<br />

conhecedor de todo o universo pop<br />

e, disco após disco, qual pósmodernista<br />

infiltrado no Brill<br />

Building, reinventa estéticas e ideias<br />

de som. Já foi garage rocker, homem<br />

do swing e do vaudeville, mestre soul<br />

ou cantautor de Americana. Agora,<br />

com “The Atlantic Ocean”, surge-nos<br />

como verdadeiro monstro da pop.<br />

Tudo no sítio certo.<br />

O tema título é uma pérola de<br />

boogie que põe um “cowbell” nas<br />

mãos de Marc Bolan e, piano bem<br />

percutido, sintetizador disparando<br />

confettis sala fora, delicia-se com o<br />

festim dançante que provoca.<br />

“Ballad of what’s his name” balança<br />

dolente e devidamente ácida, sonha<br />

com “Abbey Road” e põe-nos a<br />

levitar com o trompete do segundo<br />

refrão. “Hallelujah Goodnight”, por<br />

sua vez, é um festim de<br />

sintetizadores a inventar vaudevilles<br />

de que já nos esquecemos - um<br />

piano, uma melodia como esqueleto<br />

e Swift, produtor talentoso, a cobrir<br />

tudo com recheio de fantasia. Para o<br />

fim, “Lady luck”. Pandeiretas, coros<br />

bem metidos, falsetes no sítio certo<br />

e, 50 anos depois, a Motown<br />

homenageada como se “o som da<br />

América jovem” nunca se tivesse ido<br />

embora.<br />

Despedida perfeita para (mais) um<br />

óptimo álbum do mais interessante<br />

ilusionista da pop contemporânea.<br />

M.L.<br />

<strong>Elvis</strong> <strong>Perkins</strong><br />

Dearland<br />

XL Recordings; distri. Popstock<br />

mmmmn<br />

Phoenix: canções pop-rock<br />

simples, com a dose exacta de<br />

acessibilidade melódica e de agitação roqueira<br />

Richard Swift, o mais interessante<br />

ilusionista da pop contemporânea<br />

Quando <strong>Elvis</strong><br />

<strong>Perkins</strong> se estreou,<br />

há dois anos, com<br />

“Ash Wednesday”,<br />

falou-se mais da<br />

sua história<br />

pessoal do que do<br />

disco (ver texto pág. 20 e 21). Era um<br />

disco lento, melancólico e muito<br />

bonito, mas um disco de aprendiz. O<br />

novo “Dearland” centra-se na folk,<br />

claro, mas depois está infectado pelo<br />

som de New Orleans, o som das ruas<br />

pejadas de lojas de bebidas e bares de<br />

strip, uma euforia, por vezes,<br />

“Dearland” centra-se na folk,<br />

mas depois está infectado pelo<br />

som de New Orleans<br />

desmedida, alimentada quase a<br />

desespero, bem longe do tom<br />

fúnebre do disco anterior. O pecado<br />

de New Orleans enche “Dearland”<br />

com os seus pianos gingões, o tom de<br />

fanfarra que atravessa os metais<br />

esfuziantes, as percussões excessivas.<br />

“Dearlands” abre com<br />

“Shampoo”, cantilena folk com<br />

contra-baixo e órgão Hammond,<br />

coro negro, pleno, a encher-nos o<br />

peito, harmónica cheia de vida.<br />

“Hey” é possuída pelo mesmo<br />

frémito que se encontra nas<br />

melhores canções dos The Walkmen.<br />

Em “Hours last stand” encontramos<br />

a melancolia do disco anterior, mas<br />

mais adulta, confiante e funda,<br />

próxima da panache de Richard<br />

Hawley. “I’ll be arriving” é um blues<br />

arrastado, com metais ensandecidos<br />

a trazer prenúncios de morte. A linha<br />

de baixo de “Doomsday” lembra o<br />

melhor dos Violent Femmes, e<br />

depois <strong>Perkins</strong> berra de forma<br />

caricatural, e há metais a fazer de<br />

fogo-de-artifício. É o disco de um<br />

Dylan com uma confiança<br />

desmedida nos seus talentos,<br />

indiferente ao facto de não ser Dylan<br />

e o século XX já ter acabado há<br />

muito. E é um dos melhores discos<br />

reaccionários que vamos ouvir este<br />

ano. <strong>Jo</strong>ão Bonifácio<br />

Phoenix<br />

Wolfgang Amadeus<br />

V2, distri. Nuevos Medios<br />

mmmnn<br />

São franceses, o<br />

que não ajuda<br />

nada. O vocalista<br />

Thomas Mars tem<br />

pinta - e tem um<br />

filho da<br />

realizadora Sofia<br />

Coppola - mas talvez não a<br />

suficiente, o que também não os<br />

favorece.<br />

Percebe-se que os franceses<br />

tenham dificuldades em aceitá-los -<br />

como nos dizia Mars há dois anos<br />

“os snobes franceses adoram dizer<br />

que somos snobes” - mas não se<br />

compreende porque é que o resto do<br />

mundo ainda não adoptou os<br />

Phoenix como banda preferida. Ao<br />

pé deles, os Coldplay e os Killers<br />

deste mundo são coisa baça e vazia.<br />

Nos seus discos há espaço para<br />

baladas, mas não são inchadas. Há<br />

solos de guitarra, mas não são<br />

supérfluos. Ao quarto álbum,<br />

continuam a manter a chama<br />

adolescente de sempre, criando com<br />

uma simplicidade desarmante,<br />

canções rock radiantes, de<br />

sensibilidade melódica, balanço<br />

físico nervoso e incisão a toda a<br />

prova. Quase todas as suas canções<br />

são manuais de produção<br />

requintada e de execução virtuosa,<br />

embora o que daqui saia sejam<br />

canções pop-rock simples, com a<br />

dose exacta de acessibilidade<br />

melódica e de agitação roqueira. É<br />

verdade, não é grupo aventureiro,<br />

capaz de grandes rupturas sonoras.<br />

Não se pode ter tudo. Mas no<br />

primeiro escalão da popularidade<br />

rock, onde mereciam estar, não<br />

existem muitos mais como eles. Será<br />

desta que vão ser ouvidos sem<br />

complexos? Vítor Belanciano<br />

Clássica<br />

Os poderes<br />

encantatórios<br />

de<br />

“Alcina”<br />

Esta bela versão da ópera<br />

de Handel é uma das mais<br />

equilibradas em termos de<br />

estilo. Cristina Fernandes<br />

Alcina de Handel<br />

<strong>Jo</strong>yce DiDonato, Maite Beaumont,<br />

Karina Gauvin, Sonia Prina, Kobie<br />

van Rensburg, Vito Priante<br />

Il Complesso Barocco<br />

Alan Curtis (direcção)<br />

Archiv-DG 477 7374<br />

mmmmn<br />

Estreada em 1735<br />

no Covent Garden<br />

de Londres,<br />

“Alcina” foi um<br />

dos maiores<br />

sucessos<br />

operáticos de


Handel, tendo 18 representações<br />

ainda na década de 30.<br />

À riqueza musical com que são<br />

descritas as emoções das<br />

personagens que rodeiam a lendária<br />

feiticeira Alcina, personagem<br />

inspirada no famoso poema épico de<br />

Ludovico Ariosto “Orlando Furioso”<br />

(1516), unem-se recursos variados<br />

nem sempre presentes na ópera<br />

séria de tradição italiana como é o<br />

caso da série de danças da 2ª cena<br />

do 1º acto e do final, decorrente da<br />

colaboração com a companhia da<br />

célebre bailarina e coreógrafa Maria<br />

Sallé. O coro tem também um papel<br />

importante nalguns momentos<br />

chave e destaca-se o belíssimo<br />

terceto do último acto,<br />

admiravelmente cantado por <strong>Jo</strong>yce<br />

DiDonato, Maite Beaumont e Sonia<br />

Prina.<br />

Depois da gravação da “Alcina”<br />

dirigida por William Christie, com<br />

René Fleming e Susan Graham,<br />

nenhum outro projecto relevante<br />

em torno desta obra tinha ainda<br />

surgido no mercado. Em relação à<br />

anterior, esta proposta de Alan<br />

Curtis e do Complesso Barocco é<br />

mais equilibrada em termos<br />

estilísticos, uma vez que todo o<br />

elenco tem grande familiaridade<br />

com as interpretações<br />

historicamente informadas. Alan<br />

Curtis tem sido acusado de um certo<br />

academismo mas consegue aqui<br />

uma interpretação muito viva, de<br />

grande colorido sem cair em<br />

excessos de teatralidade, o que faz<br />

toda a justiça à obra.<br />

O papel titular, habitualmente<br />

atribuído a um soprano, é assumido<br />

pela meio-soprano <strong>Jo</strong>yce DiDonato,<br />

que se tem revelado como uma das<br />

grandes intérpretes actuais na área<br />

do canto barroco. A sua<br />

desenvoltura técnica e a consciência<br />

do poder retórico da música<br />

revelam-se nas mais brilhantes árias<br />

de bravura (como “Ah! Mio cor,<br />

schernito sei!”) e nas passagens mais<br />

pungentes (“Mi restano le lagrime”).<br />

Outra grande prestação é a da<br />

espanhola Maite Beaumont como<br />

Ruggiero. Merecem ainda destaque<br />

Sonia Prina (Bradamante), com a sua<br />

poderosa voz de contralto, Karina<br />

Gauvin (Morgana) e Kobie van<br />

Rensburg (Oronte) pela clareza e<br />

elegância da linha vocal.<br />

<strong>Jo</strong>yce DiDonato tem-se revelado<br />

como uma das grandes<br />

intérpretes actuais na área<br />

do canto barroco<br />

Jazz<br />

<strong>Jo</strong>ão Lencastre’s Communion<br />

B-Sides<br />

Fresh Sound New Talent<br />

mmmmn<br />

O conceito de<br />

lado B está<br />

associado às<br />

sobras. É a<br />

designação dada<br />

àquelas músicas<br />

que não chegam a<br />

entrar num álbum, mas que<br />

eventualmente são repescadas para<br />

encher um single - isto fazia sentido<br />

quando a música se consumia em<br />

rodelas de vinil.<br />

Ao lermos o título deste novo<br />

disco de <strong>Jo</strong>ão Lencastre, “B-Sides”,<br />

podemos ficar com a ideia que<br />

estariam aqui reunidas “sobras” das<br />

gravações do seu óptimo disco de<br />

estreia “One!”. Mas essa ideia está<br />

errada.<br />

Gravado com uma formação<br />

distinta, este “B-Sides” é um objecto<br />

autónomo, distinto do anterior, mas<br />

que mantém com esse disco uma<br />

fundamental característica: uma<br />

acesa criatividade.<br />

Do grupo que gravou “One!”, um<br />

dos pontos altos do jazz português<br />

dos últimos anos, mantém-se, além<br />

de Lencastre, o trompetista Phil<br />

Grenadier. Desta vez sem Bill<br />

Carrothers (estrela maior no<br />

panorama mundial), entrou para o<br />

piano Leo Genovese, foram chamados<br />

os saxofonistas David Binney e<br />

Jeremy Udden e o contrabaixo ficou<br />

com Thomas Morgan.<br />

Como aconteceu com o anterior,<br />

neste disco são poucos os momentos<br />

para expressões de virtuosismo<br />

individualista. O grupo assenta<br />

numa ideia de partilha e vale pela<br />

unidade colectiva. Felizmente esta<br />

tem sido uma tendência recente dos<br />

novos músicos portugueses que, em<br />

vez de esperarem por uma<br />

oportunidade no fechado circuito<br />

nacional, têm procurado<br />

colaboradores estrangeiros para<br />

explorar projectos aventureiros,<br />

pouco dados à banalidade -<br />

tendência que se confirma também<br />

com o projecto Tetterapadequ de<br />

<strong>Jo</strong>ão <strong>Lobo</strong> e Gonçalo Almeida.<br />

Se no disco de estreia havia várias<br />

versões (Ornette, Hubbard,<br />

“Summertime” e Björk) desta vez o<br />

grupo só se atira a dois temas alheios<br />

(“Fiasco”, de Paul Motian, e “Pete<br />

Best”, de Steve Swallow). Nos temas<br />

restantes a composição é da<br />

responsabilidade de Genovese,<br />

Morgan e Lencastre. E, tal como em<br />

“One!”, há dois momentos<br />

resultantes da exploração colectiva.<br />

“B-Sides” complementa “One!” e,<br />

além de mostrar um bom baterista,<br />

que sabe aplicar com inteligência os<br />

seus variados recursos, temos aqui<br />

um líder com visão estratégica.<br />

Nuno Catarino<br />

M/12<br />

A CEIA<br />

DOS CARDEAIS<br />

DE JÚLIO DANTAS<br />

VIRGÍLIO PEREIRA<br />

JOSÉ ANTÓNIO BARROS<br />

JOÃO CARLOS ABREU<br />

6 de Junho (sábado) às 17h00<br />

7 de Junho (Domingo) às 22h00<br />

<br />

<br />

: 707 234 234<br />

<br />

<br />

www.casino-lisboa.pt<br />

Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009 • 41


Livros<br />

Top Bulhosa<br />

Ficção<br />

1<br />

2<br />

3<br />

4<br />

5<br />

O Planalto e A Estepe<br />

Pepetela<br />

Dom Quixote<br />

O Homem de<br />

Sampetersburgo<br />

Ken Follet<br />

Bertrand<br />

A Vida Em Surdina<br />

David Lodge<br />

Asa<br />

Anjos e Demónios<br />

Dan Brown<br />

Bertrand<br />

Crepúsculo<br />

Stephanie Meyer<br />

Gailivro<br />

Não-Ficção<br />

1<br />

2<br />

3<br />

4<br />

5<br />

Angola, Terra Prometida<br />

Ana Sofia Fonseca<br />

Esfera Dos Livros<br />

Os Meus 30 Anos<br />

Com Amália<br />

Estrela Cravas<br />

Guerra & Paz<br />

Em Busca Da Identidade<br />

O Desnorte<br />

<strong>Jo</strong>sé Gil<br />

Relógio D’água<br />

You - A Sua Beleza<br />

Michael F. Roizen e Mehmet<br />

C. Oz<br />

Lua De Papel<br />

Educar Sem Gritar<br />

Guillermo Ballenato<br />

Esfera Dos Livros<br />

42 • Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009<br />

DANIEL ROCHA<br />

O que interessa a Agualusa é o delírio<br />

humano, aquele ponto a que ele chama<br />

absurdo ou abismo, para o qual basta<br />

abrir uma porta<br />

Ficção<br />

O desastre<br />

de Luanda<br />

A força de “Barroco<br />

Tropical” é uma Luanda<br />

com oito milhões a correr<br />

para o desastre. Agualusa<br />

põe-se em 2020 para olhar<br />

para agora, sem medo.<br />

Alexandra Lucas Coelho<br />

Barroco Tropical<br />

<strong>Jo</strong>sé Eduardo Agualusa<br />

Dom Quixote<br />

mmmmn<br />

Bartolomeu<br />

Falcato, o<br />

protagonista deste<br />

livro, tem “um<br />

imenso talento<br />

para a felicidade.”<br />

É uma das<br />

coincidências<br />

biográficas com<br />

<strong>Jo</strong>sé Eduardo<br />

Agualusa, o autor.<br />

Ambos são romancistas de<br />

sucesso. Ambos passaram um ano<br />

em Berlim com uma bolsa de<br />

criação. Ambos disseram que<br />

Espaço<br />

Público<br />

Agostinho Neto era “um poeta<br />

medíocre” e por essa e por outras há<br />

gente com vontade de lhes “dar uns<br />

tabefes”. Ambos inspiram o desejo<br />

salvífico de beldades pelos<br />

aeroportos do mundo (o que<br />

acontece a Bartolomeu no livro<br />

aconteceu a Agualusa). Se<br />

Bartolomeu diz que tem “um imenso<br />

talento para a felicidade”, Agualusa<br />

disse (em 2007, ao “<strong>Jo</strong>rnal de<br />

Notícias”): “Sou uma das pessoas<br />

mais felizes que já tive oportunidade<br />

de conhecer.”<br />

Isto é ironia e é verdade. Uma não<br />

tira a outra, só a torna inteligente.<br />

Agualusa diverte-se e diverte-nos<br />

com o facto de ter talento para a<br />

felicidade. E não haverá, na língua<br />

portuguesa contemporânea, outro<br />

caso tão flagrante e abrangente. Esse<br />

talento está nos seus livros, escritos<br />

para raptar o leitor à primeira vista,<br />

como acontece uma vez mais em<br />

“Barroco Tropical”.<br />

Não porque o leitor seja levado ao<br />

paraíso, embora também aconteça -<br />

numa crónica de Agualusa que<br />

Amélia Muge musicou vamos ao<br />

paraíso com Borges e o paraíso são<br />

bananeiras porque Deus confundiu<br />

Borges com García Marquéz.<br />

O que interessa a Agualusa é o<br />

delírio humano, aquele ponto a que<br />

ele chama absurdo ou abismo, para<br />

o qual basta abrir uma porta. Está<br />

em toda a gente, e portanto as<br />

cidades inchadas de gente são<br />

concentrações de absurdo, mais<br />

ainda se saíram da guerra com<br />

¬Mau ☆Medíocre ☆☆Razoável ☆☆☆Bom ☆☆☆☆Muito Bom ☆☆☆☆☆Excelente<br />

Este espaço vai ser<br />

seu. Que fi lme, peça de<br />

teatro, livro, exposição,<br />

disco, álbum, canção,<br />

concerto, DVD viu e<br />

gostou tanto que lhe<br />

apeteceu escrever<br />

sobre ele, concordando<br />

ou não concordando<br />

com o que escrevemos?<br />

Envie-nos uma nota até<br />

500 caracteres para<br />

ipsilon@publico.pt. E<br />

nós depois publicamos.<br />

“boom” de petróleo e poder único.<br />

Em “Barroco Tropical”, o ponto é<br />

Luanda, 2020, esgotado o petróleo,<br />

e essa Luanda pode observar-se a<br />

partir da Termiteira, um arranhacéus<br />

que ia ser a soberba de África e<br />

foi apanhado pela crise. É lá que<br />

Bernardo Falcato vive, num 47º<br />

andar: “Hoje, ricos e pobres<br />

partilham o mesmo espaço, como<br />

acontece lá fora, nas ruas da cidade,<br />

com a diferença de que aqui vivemos<br />

literalmente por cima uns dos outros<br />

- quanto mais ricos mais acima.<br />

Muitos dos elevadores não<br />

funcionam. Os que funcionam têm<br />

guardas armados à porta e servem<br />

apenas a alta burguesia. As galerias<br />

subterrâneas, onde deveriam ser<br />

instaladas garagens e oficinas,<br />

ginásios e supermercados, foram<br />

ocupadas por toda a sorte de<br />

marginais e deserdados: junkies,<br />

catorzinhas, pequenos ladrões sem<br />

futuro, mutilados de guerra,<br />

meninos-feiticeiros. Vivem ali, como<br />

ratazanas, em plena escuridão.”<br />

As catorzinhas são as meninas<br />

prostitutas que começam a snifar<br />

coca ao primeiro cliente. Nesta<br />

Luanda há coca, orgias, lutas de<br />

cães, torturas com maçaricos a gás,<br />

gente a crescer no meio do lixo, uma<br />

menina-cão queimada por feitiçaria,<br />

um traficante de armas convertido<br />

em embaixador, grande proprietário<br />

e “conselheiro e amigo íntimo da<br />

Presidente da República”, a ponto<br />

de haver “quem diga que a senhora<br />

Presidente não move um dedo sem<br />

antes [o] consultar”.<br />

Há, pois, uma Presidente<br />

em vez de um Presidente em 2020,<br />

mas de agora até lá não vai grande<br />

distância. Não é como se Agualusa<br />

estivesse a fazer uma ficção<br />

científica ou uma distopia à “1984”<br />

de Orwell. Estes 11 anos parecem ser<br />

só um passo à frente para poder<br />

olhar para trás - a distância que<br />

permite ver Luanda agora.<br />

O petróleo acabou mas há<br />

diamantes e extremo desequilíbrio,<br />

como em 2009: “O Povo, ou Eles, é<br />

como em Angola nós, os ricos, ou os<br />

quase ricos, designamos os que nada<br />

têm. Os que nada têm são a<br />

esmagadora maioria deste país.”<br />

O hospício com “homens<br />

musculosos, completamente nus, a<br />

cabeça rapada, pintada de branco,<br />

presos pelos tornozelos com grossas<br />

cadeias de ferro a motores<br />

ferrugentos e outras pesadas peças<br />

mecânicas” já existe em 2009. No<br />

livro chama-se Centro de Saúde<br />

Mental Tata Ambroise, na realidade<br />

chama-se Centro de Medicina<br />

Tradicional Avô Kitoko (ver<br />

fotografia na página...).<br />

O que o livro faz é projectar a<br />

realidade, pondo no hospício<br />

também os contestários políticos,<br />

porque “o facto de alguém denunciar,<br />

com excessiva veemência, as políticas<br />

governamentais, ou a inexistência de<br />

políticas governamentais” já “indicia,<br />

na opinião dos nossos dirigentes,<br />

certa instabilidade mental”.<br />

Directamente transportado da<br />

realidade, quase “ipsis verbis”, é o<br />

caso Agostinho Neto. Quando disse<br />

que Neto era “um poeta medíocre”,<br />

Agualusa foi considerado “leproso<br />

moral”. O livro apenas acrescenta a<br />

este outros insultos, género “vil<br />

flatulência retardada do colonialfascismo”.<br />

As diferenças entre 2009 e 2020<br />

serão de grau, como diz Agualusa.<br />

2020: “Luanda corre a toda a<br />

velocidade em direcção ao Grande<br />

Desastre. Oito milhões de pessoas<br />

aos uivos, aos choros e às<br />

gargalhadas. Uma festa. Uma<br />

tragédia. Tudo o que pode acontecer<br />

acontece aqui. O que não pode<br />

acontecer, acontece igualmente. (...)<br />

Produzimos metade dos diamantes<br />

vendidos no mundo. Temos ouro,<br />

cobre, minerais raros, florestas por<br />

explorar e água que não acaba mais.<br />

Morremos de fome, de malária, de<br />

cólera, de diarreia, de doença do<br />

sono, de vírus vindos do futuro, uns,<br />

e outros de um passado sem nome.”<br />

Em 2009 ainda não são oito<br />

milhões. No mais, tudo é<br />

reconhecível. E esta Luanda é a<br />

grande força activa, sem medo, de<br />

“Barroco Tropical”, num estilo<br />

raramente barroco, que nos<br />

melhores momentos é exacto e<br />

lírico: “Chovera nesse dia. O capim,<br />

de tão verde, parecia cantar.”<br />

O excesso barroco está nas<br />

personagens. Em entrevistas,<br />

Agualusa tem explicado que<br />

finalmente deu rédea solta ao<br />

cortejo que o assalta quando<br />

escreve. E de facto: Bartolomeu<br />

Falcato, Núbia de Matos, Mouche<br />

Shaba, Malaquias da Palma<br />

Chambão, Bárbara Dulce, Clara<br />

Bruna, Benigno dos Anjos<br />

Negreiros, Mãe Mocinha, Sigmundo<br />

Índio do Brasil, Sangue Frio,<br />

Humberto Chiteculo, Esaú e Jacó,<br />

Lulu Banzo Pombeiro, Frutuoso<br />

Leitão, Ramiro e Myao, Halípio<br />

Honrado, Tata Ambroise, Pascal<br />

Adibe, Azucena Palacios, Maurice<br />

Kabasele, Genuíno Valente, Uriel<br />

Acosta da Fonseca, Luca Ferrarini,<br />

Salomé Monteiro Astrobello<br />

celebrizada como Kianda, Rato<br />

Mickey anteriormente conhecido<br />

como Mestre António Taborda<br />

(nome de uma rua em Lisboa onde<br />

Agualusa passa muito), e já agora,<br />

qual Hitchcock, ele próprio,<br />

Agualusa.<br />

O autor de “Barroco Tropical” é<br />

um grande caçador-recolector, a<br />

começar pelos nomes, mas esta<br />

pulverização - a que se junta o gozo<br />

de jogar com criadores, amigos e<br />

conhecidos - faz o retrato de Luanda<br />

perder nitidez.<br />

Agualusa absorve notícias, livros,<br />

histórias e o seu próprio quotidiano,<br />

e leva-os ao lume como um<br />

demiurgo diabrete, por vezes com<br />

meros efeitos de diversão. Mas a<br />

certa altura há demasiada gente<br />

dentro do caldeirão, a puxar para<br />

demasiados lados. O livro dispersase<br />

e acaba por lhe faltar fundura,<br />

aquilo que pesa a quem já perdeu ou<br />

acredita que pode perder.<br />

O peso raramente coexiste com a<br />

vocação para a felicidade - que é,<br />

nos detalhes, a de “Barroco<br />

Tropical”. E quando a leitura assenta<br />

o que fica é o grande retrato de<br />

Luanda, a Termiteira.


GONÇALO SANTOS<br />

Saídas<br />

Ficção<br />

Roubo: Uma<br />

História de Amor<br />

Peter Carey<br />

(tradução de Ana<br />

Gomes)<br />

Dom Quixote<br />

Duas vezes<br />

vencedor do<br />

Booker, Peter<br />

Carey (n. 1943) é o<br />

mais conhecido escritor australiano<br />

actual. Este novo romance, que<br />

viaja entre a Austrália e Nova Iorque<br />

(onde Carey vive), é a história de<br />

dois gémeos, um artista e outro<br />

disfuncional, com a vida em apuros<br />

à medida que os preços no mercado<br />

da arte baixam e o alcoolismo de<br />

Butcher, o artista, sobe.<br />

A Boa Vida<br />

Jay McInerney<br />

(tradução de Carlos<br />

Lopes)<br />

Teorema<br />

O novo romance<br />

do autor de “As Mil<br />

Luzes de Nova<br />

Iorque” anda à<br />

roda das histórias de dois casais<br />

nova-iorquinos, de “lados” opostos<br />

da cidade, cujas existências serão<br />

marcadas pelo 11 de Setembro. A<br />

“New York Review of Books”<br />

considerou-o “o romance mais<br />

ambicioso e mais conseguido” de<br />

McInerney.<br />

Biografia<br />

Calouste Gulbenkian - O Senhor<br />

Cinco por Cento<br />

Ralph Hewins<br />

(tradução de Isabel Veríssimo)<br />

Bertrand<br />

A biografia de um<br />

dos homens mais<br />

ricos do século<br />

XX, “autorizada”<br />

e apoiada pelo<br />

filho, Nubar Sarkis<br />

Gulbenkian, que<br />

comentou: “O<br />

meu pai não era<br />

um santo, não quero uma biografia<br />

branqueada”. É certo que esta<br />

biografia foi escrita há mais de meio<br />

século, mas, segundo a editora,<br />

“mantém intactas a frescura e<br />

actualidade”.<br />

História<br />

A Mascote<br />

Mark Kurzem<br />

(tradução de Isabel Castro)<br />

Guerra e Paz<br />

Alex Kurzen tinha<br />

cinco anos quando<br />

os nazis invadiram<br />

a Bielorrússia.<br />

Sobreviveu ao<br />

massacre da<br />

família e foi<br />

adoptado como<br />

mascote por um<br />

soldado letão das SS. No final da<br />

guerra foi entregue a uma família<br />

que o levou para a Austrália.<br />

Durante mais de 50 anos, Alex<br />

manteve secreta esta parte da<br />

história da sua vida, até que em<br />

1997 a contou ao seu filho Mark. É<br />

este quem a conta agora neste livro.<br />

A biografi a de um dos homens<br />

mais ricos do século XX:<br />

Calouste Gulbenkian<br />

Crimes<br />

na neve<br />

Um “thriller” nórdico que<br />

nos leva aos meandros<br />

dos grupos neonazis<br />

noruegueses e à Frente<br />

Leste nas trincheiras de<br />

Leninegrado. <strong>Jo</strong>sé Riço<br />

Direitinho<br />

O Pássaro de Peito Vermelho<br />

<strong>Jo</strong> <strong>Nesbø</strong><br />

(traduzido por Maria <strong>Jo</strong>ão Andrade)<br />

Livros d’Hoje, € 17,003<br />

mmmnn<br />

Desde há alguns<br />

anos que os<br />

romances<br />

escandinavos (de<br />

um modo mais<br />

abrangente, os<br />

nórdicos) de<br />

carácter policial<br />

começaram a ter<br />

a atenção dos<br />

editores europeus. Um dos<br />

primeiros, e provavelmente também<br />

responsável pela aceitação de outros<br />

“thrillers” do mesmo género, foi o<br />

do escritor dinamarquês Peter Høeg,<br />

“A Senhora Smila e a Sua Especial<br />

Percepção da Neve”, que em<br />

Portugal foi publicado pela ASA em<br />

1995. Depois desse, seguiram-se - e<br />

referindo-me apenas ao nosso país -<br />

os da série do Comissário Wallander,<br />

de Henning Mankell, mais dois<br />

autores islandeses, e mais<br />

recentemente a norueguesa Anne<br />

Holt (com os magníficos “Castigo” e<br />

“Crepúsculo em Oslo”) e a famosa<br />

trilogia “Millennium”, do malogrado<br />

escritor sueco Stieg Larsson. Em<br />

países como a Alemanha, a Holanda<br />

ou a França, estes autores têm desde<br />

há muito o merecido<br />

reconhecimento, não apenas dos<br />

habituais leitores de romances<br />

policiais, mas também de leitores<br />

mais exigentes, que não procuram<br />

apenas o entretenimento; e<br />

ainda da crítica que<br />

normalmente se<br />

alheava dos<br />

“thrillers” por os<br />

considerar<br />

pertencentes a um<br />

género menor. Os<br />

países anglosaxónicos<br />

começaram<br />

a descobri-los<br />

mais<br />

STIAN ANDERSEN<br />

<strong>Jo</strong> <strong>Nesbø</strong>, um dos nomes do contingente nórdico<br />

de autores de “policiais” que está a ser descoberto<br />

recentemente, e um dos autores que<br />

têm merecido a atenção da crítica de<br />

jornais referência tem sido o<br />

norueguês <strong>Jo</strong> <strong>Nesbø</strong> (n. 1960), de<br />

quem acaba de ser publicado um<br />

livro da série do detective Harry<br />

Hole, “O Pássaro de Peito<br />

Vermelho”.<br />

A acção do romance decorre em<br />

dois tempos narrativos distintos: em<br />

Oslo, durante os anos 90, e nas<br />

trincheiras da Frente Leste nos<br />

arredores de Leninegrado, em 1942 e<br />

43, em plena II Guerra Mundial. Um<br />

soldado norueguês, Daniel Gudeson,<br />

a lutar ao lado dos alemães é atingido<br />

mortalmente e o seu corpo<br />

depositado numa vala comum para<br />

ser queimado. Algum tempo depois,<br />

num hospital militar em Viena, um<br />

soldado ferido diz ser Daniel<br />

Gudeson. Ele e a enfermeira<br />

apaixonam-se um pelo outro. Noutro<br />

momento narrativo, um homem<br />

acaba de saber pelo médico que tem<br />

pouco tempo de vida e deambula<br />

pelas ruas de Oslo recordando-se da II<br />

Grande Guerra e pensando que antes<br />

de morrer ainda tem que cumprir<br />

uma missão. Durante esses dias, o<br />

presidente Clinton está de visita a<br />

Oslo para mais uma cimeira israeloárabe.<br />

O detective Hole fere<br />

acidentalmente um agente secreto<br />

americano. Numa tentativa da polícia<br />

abafar para a imprensa o sucedido,<br />

Hole é promovido a inspector e<br />

transferido de departamento.<br />

Começa então a investigar um caso de<br />

tráfico de armas com possíveis, e<br />

muito prováveis, ligações a grupos de<br />

extrema-direita, a antigos nazis e a<br />

neonazis. Por essa altura, um exsoldado<br />

da Frente Leste aparece<br />

morto em Oslo. Harry Hole, o<br />

detective que luta contra os seus<br />

demónios pessoais - em particular a<br />

sua dependência do álcool - vai-se<br />

embrenhando cada vez mais no<br />

passado.<br />

A “plot” construída<br />

inteligentemente por <strong>Nesbø</strong> é<br />

intrincada, com pormenores<br />

articulados com subtileza numa<br />

escrita escorreita pontuada por<br />

algumas imagens de uma inesperada<br />

melancolia. O ritmo narrativo do<br />

romance, numa sucessão de cenas<br />

vívidas, prende a atenção do leitor ao<br />

mesmo tempo que o transporta<br />

para vários cenários de intriga<br />

política, de dramatismo e de<br />

sofrimento humano (as<br />

trincheiras de Leninegrado), e<br />

de acção policial. Somos ainda<br />

convidados a visitar os recantos<br />

mais escuros da sociedade<br />

norueguesa, a conhecer alguma<br />

hipocrisia mas sobretudo<br />

os seus mitos sobre a<br />

resistência (ou a falta<br />

dela) à ocupação<br />

alemã. Este é o<br />

terceiro romance<br />

da série do<br />

detective Harry<br />

Hole, que é<br />

composta por<br />

sete.<br />

Aguardemos<br />

o próximo.<br />

No seu novo livro, <strong>Siri</strong> <strong>Hustvedt</strong> cita<br />

textos memorialísticos do pai, já<br />

falecido, e dedica-o à fi lha<br />

Aqueles que<br />

partiram<br />

Densamente autobiográfica,<br />

esta é uma ficção quase<br />

ensaística sobre o luto e a<br />

transmissão das gerações.<br />

Pedro Mexia<br />

Elegia para um Americano<br />

<strong>Siri</strong> <strong>Hustvedt</strong><br />

(Tradução de Miguel Castro Caldas)<br />

Asa€ 16<br />

mmmnn<br />

O quarto romance<br />

de <strong>Siri</strong> <strong>Hustvedt</strong>,<br />

“Elegia para um<br />

Americano”, cita<br />

abundantemente<br />

textos<br />

memorialísticos do<br />

seu pai, Lloyd<br />

<strong>Hustvedt</strong>, falecido<br />

em 2003, e é<br />

dedicado à filha de <strong>Siri</strong>, Sophie<br />

26 MAIO - 10 JUNHO<br />

2009<br />

32º FESTIVAL<br />

INTERNACIONAL<br />

DE TEATRO<br />

DE EXPRESSÃO<br />

IBÉRICA<br />

WWW.FITEI.COM<br />

Cª dos Pés (Brasil)<br />

Asas<br />

Sex 05/06 - 22h00<br />

Torre dos Clérigos<br />

Teatro Ferro e<br />

Comédias do Minho<br />

(Portugal)<br />

Estufa Fria<br />

Sáb 06/06 – 16h00<br />

NEC<br />

Ici et Là (França)<br />

Dormir<br />

Accompagné<br />

Sáb 06/06 – 18h30<br />

Biblioteca Muncipal<br />

Almeida Garrett<br />

Nut Teatro (Espanha)<br />

Co-Produção Nut Teatro,<br />

Centro Dramático Galego<br />

e FITEI<br />

Wake Up<br />

Sáb 06/06 – 21h30<br />

Dom 07/06 – 16h00<br />

Teatro Carlos Alberto<br />

El Theatron<br />

(Venezuela)<br />

Que Clase<br />

de Sexo<br />

Dom 07/06 - 18h30<br />

Cine-Teatro<br />

Constantino Nery<br />

Teatro en el Aire<br />

(Espanha)<br />

La Piel del Agua<br />

Dom 07/06 - 22h00<br />

Seg 08/06 - 22h00<br />

Ter 09/06 - 22h00<br />

Mosteiro São Bento<br />

da Vitória<br />

<strong>Hustvedt</strong> Auster, nascida em 1987.<br />

Densamente autobiográfica, esta é<br />

uma ficção quase ensaística sobre o<br />

luto e a transmissão das gerações.<br />

Algumas personagens partilham<br />

vários elementos com os <strong>Hustvedt</strong>,<br />

imigrantes noruegueses que se<br />

instalaram no Minnesota. Os<br />

protagonistas, Erik Davidsen e a sua<br />

irmã Inga, perderam recentemente o<br />

pai, Lars, e Inga perdeu também o<br />

marido, Max. O romance descreve as<br />

tentativas angustiadas de descoberta<br />

dos segredos e lacunas das vidas dos<br />

dois mortos, pois os mortos afectam<br />

os vivos, e a sua memória é<br />

constitutiva da identidade dos vivos.<br />

Erik e Inga vão percebendo que<br />

reconstituir o passado é uma tarefa<br />

árdua e perigosa. Inga, uma<br />

intelectual (como quase todas as<br />

restantes figuras do romance), diz:<br />

“(...) não deixa de ser irónico, pois no<br />

meu livro eu tento falar do modo<br />

como organizamos as percepções<br />

transformando-as em histórias com<br />

princípio, meio e fim, e em como os<br />

fragmentos da nossa memória não<br />

têm nenhuma coerência até serem<br />

reimaginados em palavras. O tempo é<br />

uma propriedade da língua, da<br />

Matarile Teatro<br />

(Espanha)<br />

Animales<br />

Artificiales<br />

Seg 08/06 – 21h30<br />

Ter 09/06 – 21h30<br />

Teatro Nacional São <strong>Jo</strong>ão<br />

Filipa Francisco<br />

e Idoia Zabaleta<br />

(Portugal e Espanha)<br />

Bicho eres<br />

un bicho<br />

Ter 09/06 – 18h30<br />

Sala de Cristal – TeCA<br />

10 de Junho -<br />

Matosinhos<br />

Junto ao Cine-Teatro<br />

Constantino Nery<br />

Último Acto<br />

20h30<br />

St. James<br />

Street Band<br />

21h30<br />

Companhia Entremans<br />

VEN<br />

21h45<br />

Troula Animación<br />

Invasión Pirata<br />

23h15<br />

Companhia Voalá<br />

Voalá<br />

Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009 • 43<br />

PEDRO CUNHA


Livros<br />

sintaxe, do tempo verbal” (pág.<br />

50). Isto significa que as investigações<br />

que se vão sucedendo têm menos<br />

importância pela suposta verdade<br />

que revelam do que pelo modo como<br />

os vivos organizam as suas narrativas<br />

sobre os mortos, mais ou menos<br />

reais, mais ou menos ficcionadas.<br />

Isso manifesta-se de vários modos.<br />

Desde logo, nas profissões das<br />

personagens (psicanalistas,<br />

académicos, biógrafos, fotógrafos,<br />

jornalistas), tudo gente que trabalha<br />

com histórias de vida. Por outro lado,<br />

o texto faz-se de uma teia de sonhos,<br />

desenhos, fotos, cartas e citações<br />

(incluindo as passagens escritas por<br />

Lloyd <strong>Hustvedt</strong>), uma massa de<br />

imagens, palavras e outros modos de<br />

expressão com uma legibilidade<br />

esquiva. Há também, vagamente, a<br />

educação luterana, e especificamente<br />

os escritos de Kierkegaard.<br />

Finalmente, e essa é a dimensão mais<br />

especificamente ensaística do<br />

romance, <strong>Siri</strong> <strong>Hustvedt</strong>, que tem feito<br />

trabalho voluntário numa clínica<br />

psiquiátrica, estudou as doenças<br />

mentais e seus sintomas. Esses casos<br />

vão surgindo nos pacientes que Erik<br />

acompanha e em elucubrações sobre<br />

Winnicott, Dennett ou Damásio. Não<br />

são apenas a psiquiatria e a<br />

psicanálise que estão em causa, mas a<br />

neurociência, e em geral o modo<br />

como a mente funciona.<br />

E por que é que é tão importante o<br />

modo como a mente funciona?<br />

Porque talvez assim se percebam um<br />

pouco melhor os nossos medos e<br />

traumas. Curiosamente, Erik<br />

reconhece que “o trauma não faz<br />

parte de uma história: é outra<br />

história. É aquilo que recusamos que<br />

faça parte da nossa história” (pág. 55).<br />

Todas as personagens tentam<br />

escrever a biografia alheia,<br />

nomeadamente a biografia de Lars e<br />

de Max, das memórias da guerra do<br />

Pacífico aos meandros da imaginação<br />

romanesca, mas também tropeçam<br />

em amantes e filhos secretos. O que<br />

Erik e Inga vão percebendo é que<br />

conhecer uma história é reescrevê-la,<br />

fazer ficções em torno do passado.<br />

Ou, como se confessa noutra<br />

passagem: “o problema aqui não é a<br />

realidade”.<br />

O luto é uma tentativa de consolo,<br />

que passa pela incredulidade, pela<br />

tristeza, pela raiva e pela aceitação.<br />

Mas o luto não é apenas um jogo de<br />

idealizações e de fantasmas. É<br />

também uma transmissão de uma<br />

geração à outra: “(...) enquanto a<br />

imagem se distanciava, pensei para<br />

mim: estão todos a morrer, os nossos<br />

pais, as nossas mães - os imigrantes e<br />

os exilados, os soldados e os<br />

refugiados, os rapazes e a raparigas<br />

do antigamente” (pág. 221). Da<br />

Grande Depressão de há quase um<br />

século até às nossas grandes<br />

depressões de agora, é pelas feridas<br />

que entra a luz, para retomar um<br />

verso do poeta persa Rumi que é a<br />

epígrafe do romance.<br />

“Elegia para um Americano”<br />

chama-se no original “The Sorrows of<br />

an American”. O atentado às Torres<br />

Gémeas é a marca americana do<br />

texto, mas esta mágoa é a mágoa<br />

universal pelos que partiram. E o<br />

44 • Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009<br />

O duelo Chu Enlai/Mao Zedong é o tema principal de<br />

Gao Wenqian na sua admirável biografi a<br />

“Chu Enlai: O último revolucionário perfeito”<br />

romance procura uma maneira de<br />

lidar com essa mágoa, para que ela<br />

nos fortaleça e não nos destrua.<br />

“Elegia para um Americano” é um<br />

testemunho magoado que <strong>Siri</strong><br />

<strong>Hustvedt</strong> passa do seu pai, Lloyd, que<br />

morreu em 2003, para a sua filha,<br />

Sophie, que nasceu em 1987.<br />

História<br />

Chu Enlai<br />

ou como<br />

ser um bom<br />

comunista<br />

O fim trágico de Chu<br />

reforçou a sua imagem de<br />

um moderado que tentou<br />

conter os excessos de Mao. A<br />

realidade foi mais complexa.<br />

Carlos Gaspar<br />

Chu Enlai: O último<br />

revolucionário perfeito<br />

Gao Wenqian<br />

(Trad. Ana Barradas)<br />

Pedra da Lua<br />

mmmmn<br />

A primeira<br />

manifestação<br />

de Tiananmen é<br />

em 5 de Abril<br />

de 1976, a<br />

seguir à morte<br />

de Chu Enlai.<br />

Para protestar<br />

contra Mao<br />

Zedong e o<br />

“Bando dos Quatro”, os estudantes<br />

de Pequim decidem prestar<br />

homenagem ao primeiro-ministro<br />

que tentara conter os piores<br />

excessos do terror maoísta.<br />

Chu Enlai morre meses antes de<br />

Mao. A ordem devia sido inversa,<br />

para evitar os riscos de tomada do<br />

poder pelo “Bando dos Quatros”.<br />

Com efeito, a crise de sucessão<br />

começa logo a seguir à morte de<br />

Chu, com a demissão de Deng<br />

Xiaoping, que consegue sobreviver à<br />

Revolução Cultural e regressar, em<br />

1972, como vice-primeiro-ministro.<br />

Mao escolhe Hua Guofeng para lhe<br />

suceder, mas o chefe dos serviços<br />

secretos, demasiado novo, só<br />

consegue resistir com o apoio da<br />

velha guarda, nomeadamente os<br />

“quatro marechais” do Exército<br />

Popular de Libertação. Dois anos<br />

depois, o “Bando dos Quatro” está<br />

na prisão e Deng assume a sua<br />

posição como principal dirigente do<br />

Partido Comunista e da Comissão<br />

Militar Central. Em Dezembro de<br />

1978, o Partido aprova as “Quatro<br />

Modernizações”, o programa<br />

apresentado por Chu, em Janeiro<br />

de 1974, que se vai tornar o simbolo<br />

das reformas na China nos últimos<br />

trinta anos.<br />

No fim de contas, Chu acaba por<br />

prevalecer no seu longo duelo com<br />

Mao, que começa em 1927, quando<br />

os dois jovens comunistas se<br />

destacam na resposta à “débâcle”<br />

provocada pela ruptura da “Frente<br />

Única” com o Guomindang.<br />

Esse duelo é o tema principal de<br />

Gao Wenqian na sua admirável<br />

biografia “Chu Enlai: O último<br />

revolucionário perfeito”, publicada<br />

pela Pedra da Lua. Como explica<br />

Andrew Nathan [Professor de Ciência<br />

Política na Universidade de<br />

Columbia, e especialista em política<br />

chinesa], Gao trabalhou 14 anos sobre<br />

a “ficha” de Chu nos arquivos<br />

secretos do Partido, onde teve acesso<br />

a documentos únicos sobre a<br />

direcção comunista.<br />

Chu Enlai é o paradigma dos<br />

revolucionários comunistas chineses.<br />

Como estudante, em Tianjin, formase<br />

politicamente no Movimento do 4<br />

de Maio de 1919, a primeira<br />

manifestação do moderno<br />

nacionalismo chinês. Depois, está<br />

quatro anos na Europa, com Deng,<br />

Zhu De e Nie Rongzhen. É recrutado<br />

para o Partido Comunista em 1921 e,<br />

de volta à China, vai tornar-se<br />

comissário politico na Academia<br />

Militar de Whampoa - é o comunista<br />

com o mais alto posto no Exército<br />

nacionalista. Em 1927, consegue<br />

escapar de Xangai e organizar o<br />

levantamento de Nanchang, com<br />

Zhu, Nie, Chen Yi, Ye Jianying e Lin<br />

Biao - os futuros marechais.<br />

Nos dez anos seguintes, Chu é o<br />

principal dirigente do Partido<br />

Comunista. Gao revela os documentos<br />

da Conferência de Zunyi, em 1935,<br />

para demonstrar que Mao tem uma<br />

posição secundária durante a Longa<br />

Marcha, não obstante as suas<br />

qualidades serem reconhecidas por<br />

Chu, que propõe ao dirigente rebelde<br />

ser seu adjunto militar - um erro que<br />

pagará caro no futuro. Segundo Gao, a<br />

doença de Chu, em 1937, acelera a<br />

ascensão de Mao, que se consolida em<br />

Yan’an, depois de Chu partir para<br />

Chongqing, em 1940, onde representa<br />

os comunistas na capital nacionalista.<br />

Em 1943, Chu reconhece<br />

publicamente Mao como o principal<br />

dirigente.<br />

Para ser um bom comunista, Chu<br />

vai ser o melhor aliado de Mao e o seu<br />

parceiro indispensável, como<br />

primeiro-ministro, desde a fundação<br />

da República Popular da China,<br />

garantindo um mínimo de<br />

normalidade no meio das campanhas<br />

de mobilização totalitária.<br />

A aliança entre os dois rivais nunca<br />

é pacífica e vai ser posta à prova na<br />

Revolução Cultural, quando Mao<br />

liberta a fúria dos Guardas Vermelhos<br />

para destruir o Partido Comunista.<br />

Nos momentos críticos, Chu está ao<br />

lado de Mao. O primeiro-ministro<br />

odeia a Revolução Cultural e tenta,<br />

com um sucesso limitado, proteger os<br />

velhos quadros. Mas só intervém<br />

decisivamente quando está em causa<br />

a unidade do Exército e o risco de<br />

guerra civil se torna real.<br />

Gao descreve a resposta de Chu à<br />

tentativa de golpe de Lin Biao,<br />

narrada ao minuto pela primeira vez.<br />

Depois, Mao tenta destruir Chu. O seu<br />

primeiro passo é trazer Deng de volta<br />

Zhao Ziyang quando, a 19 de Maio de 1989, se dirigiu, de megafone na<br />

mão, aos estudantes que exigiam mais liberdade e mais democracia<br />

para substituir o primeiro-ministro,<br />

mas, contra as suas expectativas, Chu<br />

e Deng aliam-se para definir o<br />

programa das “Quatro<br />

Modernizações”. Mao percebe que o<br />

seu legado histórico vai ser destruído<br />

e tenta precipitar a morte de Chu,<br />

proibindo os médicos de o tratar.<br />

O fim trágico de Chu reforçou a sua<br />

imagem como um moderado que<br />

tentou, embora sem sucesso, conter<br />

os excessos brutais de Mao. Gao<br />

mostra uma realidade mais<br />

complexa, quer política, quer<br />

psicologicamente, procurando<br />

explicar a subordinação de Chu a Mao<br />

tanto pela necessidade de impedir a<br />

ruptura do partido, como para<br />

garantir a sua própria sobrevivência.<br />

Os resultados são ambíguos, pois,<br />

segundo Deng, sem Chu a Revolução<br />

Cultural teria sido ainda mais brutal,<br />

mas, com ele, fora mais longa. Gao<br />

contrasta a posição dos dois<br />

sucessores : Chu é incapaz de<br />

confrontar os seus adversários e<br />

prefere sempre recuar, enquanto<br />

Deng nunca retira, nem diante dos<br />

Guardas Vermelhos, nem diante dos<br />

estudantes que defendiam a “Quinta<br />

Democratização” em Tiananmen.<br />

Como dizia Mao, a revolução não é<br />

um jantar de gala.<br />

A sua<br />

verdade<br />

para a<br />

História<br />

O testamento póstumo do<br />

antigo dirigente máximo dos<br />

comunistas chineses: as suas<br />

memórias de Tiananmen<br />

escritas em prisão<br />

domiciliária. <strong>Jo</strong>sé Manuel<br />

Fernandes<br />

Prisoner of the State: The Secret<br />

<strong>Jo</strong>urnal of Zhao Ziyang<br />

Zhao Ziyang<br />

mmmmn<br />

Zhao Ziyang (1919-<br />

2005) era,<br />

quando os<br />

estudantes se<br />

começaram a<br />

concentrar, há 20<br />

anos, na Praça<br />

Tiananmen, o<br />

secretário-geral<br />

do Partido<br />

Comunista Chinês (PCC). Em teoria,<br />

o homem mais poderoso do país.<br />

Mas quando, a 19 de Maio de 1989, se<br />

dirigiu, de megafone na mão, aos<br />

estudantes que exigiam mais<br />

liberdade e mais democracia, já<br />

sabia que tinha perdido a longa luta<br />

que, durante semanas, opôs a linha<br />

moderada e a linha dura na cúpula<br />

do PCC. O seu gesto - que um dos<br />

seus adversários, o primeiroministro<br />

Li Peng, tentou que não<br />

fosse filmado pela televisões - foi<br />

como que uma derradeira tentativa<br />

para evitar o que sucederia duas<br />

semanas mais tarde: um banho de<br />

sangue após a intervenção do<br />

exército.<br />

“Na noite de 3 de Junho, sentado no<br />

pátio com a minha família, ouvi um<br />

violento tiroteio. A tragédia que<br />

haveria de chocar o mundo não tinha<br />

sido impedido, estava a começar”,<br />

ditaria ele para um gravador dez anos<br />

depois dos acontecimentos. Gravou<br />

30 cassetes que conseguiu fazer sair<br />

do país e estão da base do seu<br />

testamento póstumo que acaba de ser<br />

editado em inglês e chinês, “Prisoner<br />

of the State: The Secret <strong>Jo</strong>urnal of<br />

Zhao Ziyang”. Quatro anos depois de<br />

morrer em prisão domiciliária,<br />

situação em que viveu os últimos 16<br />

anos da sua vida, o antigo dirigente<br />

máximo dos comunistas chineses,<br />

mais do que confirmar muito do que<br />

já se sabia sobre a luta no interior da<br />

cúpula do PCC - nomeadamente<br />

graças à publicação, em 2001, de “The<br />

Tiananmen Papers” -, acrescenta-lhe<br />

uma componente humana<br />

fundamental para perceber melhor<br />

como tudo se passa na nova “cidade<br />

proibida” de Pequim, isto é, por trás<br />

das paredes onde vivem, conspiram e<br />

decidem as duas dúzias de dirigentes<br />

máximos que têm sobrevivido a<br />

múltiplas mudanças radicais de<br />

política.<br />

O livro de Zhao não é um ajuste de<br />

contas, mas podia ser. Afinal quem<br />

determinou o seu destino foi alguém<br />

a quem se manteve fiel e que nem<br />

neste seu testamento critica<br />

abertamente: Deng, o comunista<br />

pragmático que resistira às<br />

sucessivas purgas de Mao Zedong<br />

para emergir como o inspirador das<br />

reformas que transformaram a<br />

China nas últimas três décadas. Zhao<br />

reivindica para si o papel de grande<br />

dinamizador da viragem do imenso<br />

país para a economia de mercado e<br />

sugere que gostaria de ter aberto o<br />

país ainda mais, agora na frente<br />

política. Duro com os que então o<br />

derrotaram, hoje já todos longe do<br />

poder mas próximos dos que<br />

continuam a comandar a China<br />

desde que integrem o círculo restrito<br />

dos dirigentes supremos,


surpreende como o antigo<br />

secretário-geral do PCC não utiliza a<br />

mesma acidez para com o homem<br />

que, no dia 18 de Maio de 1999, fez<br />

pender de forma a balança para o<br />

lado dos duros: Deng Xiaoping.<br />

“Não tive outra hipótese senão<br />

pedir para falar, pessoalmente e<br />

face-a-face com Deng. Mas como<br />

pedira um encontro pessoal e recebi<br />

de volta uma convocatória para que<br />

estivesse presente toda Comissão<br />

Executiva, percebi logo que as coisas<br />

estavam a ir na má direcção”, conta<br />

Zhao. E isso mesmo comprovou<br />

quando viu o desinteresse com que<br />

o velho líder, então já com 84 anos,<br />

formalmente sem nenhum cargo no<br />

partido, na prática a sombra que<br />

impedia que Zhao presidisse a uma<br />

reunião formal daquele Comité na<br />

sua qualidade de secretário-geral,<br />

seguiu a sua argumentação. Foi<br />

como se não lhe tivesse dado<br />

ouvidos. No final deliberou: “Como<br />

a situação começa a ficar fora de<br />

controlo, a decisão é trazer tropas<br />

para Pequim e impor a lei marcial”.<br />

No dia seguinte Zhao ainda<br />

tentou desmobilizar os estudantes,<br />

sem êxito. Depois, e ainda antes de<br />

as tropas avançarem para a imensa<br />

praça de Tiananmen, foi substituído<br />

como secretário-geral e colocado<br />

em prisão domiciliária, condição<br />

em que viveria 16 anos até morrer.<br />

Foi nesse período que pode ler e<br />

reflectir, deixando para a<br />

posteridade um testemunho que é<br />

mais do que a recordação daqueles<br />

dias: é também a defesa de que a<br />

China deve permitir mais liberdade<br />

aos seus cidadãos, que o Partido<br />

Comunista devia permitir a<br />

formação de outros partidos e que o<br />

ideal seria evoluir para um regime<br />

democrático e parlamentar.<br />

O Zhao do tempo em que foi<br />

secretário-geral do PCC nunca<br />

expressou tais ideias, e nunca se<br />

saberá se foi por sentir que ainda era<br />

demasiado cedo, se por lhe faltarem<br />

apoios ou se, pura e simplesmente,<br />

AFP<br />

<br />

<br />

<br />

ainda não acreditava que com as<br />

reformas económicas também<br />

deviam vir reformas políticas.<br />

Escreveu, ou falou para o seu<br />

gravador, certamente a pensar na<br />

história - não apenas no seu lugar na<br />

história da China, mas na história<br />

verdadeira do que se passou naquele<br />

momento único de luta pela<br />

liberdade há 20 anos. Ao fazê-lo<br />

deixa um documento histórico, pois<br />

nunca antes um dirigente de topo<br />

dos comunistas chineses conseguiu<br />

escrever secretamente as suas<br />

memórias e lograr que saíssem do<br />

país para um dia serem publicadas.<br />

Talvez por isso já se especule sobre<br />

até que ponto “Prisoner of the State:<br />

The secret <strong>Jo</strong>urnal of Zhao Ziyang”,<br />

memórias de alguém que já morreu,<br />

poderão abalar os equilíbrios<br />

sempre delicados na cúpula de<br />

Pequim, lá onde os herdeiros dos<br />

que condenaram Zhao e esmagaram<br />

o movimento estudantil continuam a<br />

governar um imenso país que, mais<br />

tarde ou mais cedo, conhecerá quem<br />

consiga contestar o seu monopólio<br />

do poder.<br />

Regresso à China<br />

dos anos 30<br />

A Longa Marcha<br />

Ed <strong>Jo</strong>celyn e Andrew McEwen<br />

(Trad. Maria Filomena Duarte)<br />

Quidnovi<br />

mmnnn<br />

Quando Mao<br />

Zedong iniciou a<br />

Longa Marcha, a<br />

sua mulher, He<br />

Zizhen, estava<br />

grávida de cinco<br />

meses. Foi depois<br />

de o Exército<br />

Vermelho ter<br />

atravessado o rio Chishui, em 1935,<br />

que He (uma das únicas 35 mulheres<br />

a terem embarcado na caminhada)<br />

deu à luz uma menina. Como não era<br />

possível levá-la, procuraram alguém<br />

que não os acompanhasse na Longa<br />

Marcha. Uma mulher cega, de 60<br />

anos, foi a escolhida. “Pode criá-la<br />

como se fosse sua filha”, disse a<br />

esposa de Mao, sabendo que na<br />

região precisavam de jovens para<br />

trabalhar.<br />

“Sou demasiado velha”,<br />

respondeu a cega.<br />

“Não faz mal. Pode alimentá-la a<br />

<br />

<br />

papas de arroz”, disse He, e deixou<br />

10 dólares de prata.<br />

O rasto desta filha de Mao perdeuse.<br />

Até que agora os britânicos Ed<br />

<strong>Jo</strong>celyn e Andrew McEwen<br />

encontraram, na aldeia de Zhaxi,<br />

uma mulher cujo nome é Xiong, mas<br />

a quem chamam Maomei. Na região,<br />

que está desesperada por um pouco<br />

de publicidade, todos dizem que ela é<br />

a filha de Mao. As filhas dela<br />

concordam. As provas são<br />

convincentes. Só a própria Maomei<br />

parece ter dúvidas. “Não quero fingir<br />

uma coisa que não sou”, diz ela. “Só<br />

quero os factos. Deve ser simples<br />

fazer uma<br />

análise ao<br />

sangue,<br />

não é<br />

verdade?”<br />

Um dos<br />

genros da<br />

suposta filha<br />

de Mao<br />

solicitou ao<br />

Governo local<br />

que se realizasse<br />

um teste de<br />

ADN. Mas,<br />

para isso, é<br />

necessária a<br />

autorização da<br />

única filha legítima,<br />

sobrevivente e<br />

reconhecida de Mao<br />

Zedong, Li Min, que é hoje<br />

deputada do Congresso Nacional<br />

Popular, em Pequim. O pedido<br />

seguiu os seus trâmites, mas nunca<br />

teve resposta.<br />

A família de Maomei pensa que Li<br />

Min não quer arriscar descobrir que<br />

tem uma irmã camponesa, pobre e<br />

analfabeta numa aldeia dos confins<br />

montanhosos do Sul da China. Por<br />

isso nunca será confirmado que o<br />

Presidente Mao tem outra filha, viva.<br />

A família de Maomei não tem<br />

qualquer poder para fazer<br />

avançar o processo,<br />

porque é totalmente<br />

destituída de<br />

“guanxi”, o<br />

¬Mau ☆Medíocre ☆☆Razoável ☆☆☆Bom ☆☆☆☆Muito Bom ☆☆☆☆☆Excelente<br />

Internet<br />

<br />

<br />

<br />

<br />

<br />

<br />

<br />

<br />

Estamos online. Entre em<br />

www.ipsilon.pt. É o mesmo<br />

suplemento, é outro desafi o.<br />

Venha construir este site<br />

connosco.<br />

termo que, na burocrática China,<br />

designa a teia de relações pessoais<br />

necessária para se ser alguém.<br />

Por outro lado, seria uma fabulosa<br />

fonte de “guanxi” descobrir que<br />

Maomei é filha de Mao. Daí a<br />

demanda dos camponeses de Zhaxi<br />

ser interesseira, e talvez falsa.<br />

<strong>Jo</strong>celyn e McEwen deixaram a<br />

região sem ter a certeza. Aconteceulhes<br />

o mesmo em muitas outras<br />

zonas que percorreram, ao<br />

recapitularem o percurso da Longa<br />

Marcha do Exército Vermelho. O<br />

objectivo era recolher testemunhos<br />

vivos da grande aventura de Mao<br />

Zedong, para além da historiografia<br />

oficial e dos mitos criados, quer na<br />

China, quer no Ocidente. Entre<br />

Outubro de 1934 e Outubro de<br />

1935, quase 100 mil<br />

comunistas fugiram das<br />

forças do Kuomintang,<br />

chefiado por Chiang<br />

Kaichek, e atravessaram a<br />

China, numa caminhada de<br />

quase 10 mil quilómetros.<br />

O objectivo dos dois<br />

historiadores e editores<br />

britânicos era seguir esse<br />

itinerário, para descobrir<br />

o que se passou, e<br />

contá-lo. Mas o que eles acabaram<br />

por descobrir, e contar, no livro “A<br />

Longa Marcha”, editado em Portugal<br />

pela Quidnovi, foi a realidade<br />

desconhecida da China profunda<br />

contemporânea - que não é muito<br />

diferente da dos anos 30.<br />

Um livro de conteúdo fascinante,<br />

ainda que frágil do ponto de vista<br />

formal. A tradução desta edição<br />

portuguesa também não ajuda.<br />

Desde erros básicos de concordância<br />

gramatical até à sistemática<br />

colocação de vírgulas entre o sujeito<br />

e o verbo, o<br />

descuido da<br />

edição<br />

consegue<br />

tornar a<br />

leitura<br />

quase<br />

tão<br />

penosa<br />

como a<br />

própria<br />

Longa<br />

Marcha.<br />

Paulo<br />

Moura<br />

Mao Zedong e a Longa Marcha do Exército Vermelho –<br />

para além da historiografi a ofi cial – são o objecto do livro<br />

de Ed <strong>Jo</strong>celyn e Andrew McEwen<br />

<br />

<br />

<br />

<br />

<br />

<br />

Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009 • 45


Exposições<br />

“Arriscar o Real”<br />

46 • Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009<br />

A colecção<br />

possível<br />

O acervo de Serralves<br />

revisto passados dez anos:<br />

uma exposição com sinais<br />

contraditórios. Óscar Faria<br />

Serralves 2009 - a Colecção<br />

De vários autores.<br />

Porto. Museu de Serralves. Rua Dom <strong>Jo</strong>ão de Castro,<br />

210. Tel.: 226156500. Até 27/09. 3ª a 6ª das 10h às<br />

17h. Sáb., Dom. e Feriados das 10h às 20h.<br />

Pintura, Escultura, Outros.<br />

mmmnn<br />

Entre 1998 e 2008, foram investidos<br />

na colecção de Serralves cerca de 10<br />

milhões de euros, divididos pelo<br />

Estado (5 milhões e 643 mil euros),<br />

pela Câmara Municipal do Porto (2<br />

milhões e 77 mil euros) e pela<br />

própria fundação (3 milhões e 321<br />

mil euros). Quando comparada esta<br />

quantia com o valor gasto em<br />

aquisições pelo Museu Nacional<br />

Centro de Arte Rainha Sofia<br />

(MNCARS), de Madrid - só no último<br />

ano, 20 milhões de euros - dá para<br />

perceber quais os limites com os<br />

quais a instituição portuguesa tem<br />

de confrontar numa época em que,<br />

segundo o director do MNCARS,<br />

Manuel Borja-Villel, os espaços<br />

museológicos atravessam uma crise<br />

profunda, consequência directa do<br />

momento actual do sistema<br />

capitalista. Contudo, essas<br />

dificuldades parecem não atingir<br />

todos e amanhã, em Veneza, será<br />

aberto ao público, na Punta della<br />

Dogana, o segundo espaço da cidade<br />

Agenda<br />

Inauguram<br />

Ombro a Ombro: Retratos<br />

Políticos<br />

Lisboa. MUDE - Museu do Design e da Moda. Rua<br />

Augusta 24. Tel.: 218886117. Até 13/09. 6ª e Sáb.<br />

das 10h às 22h. 3ª a 5ª e Dom. das 10h às 20h.<br />

Design, Outros.<br />

Arriscar o Real<br />

De vários autores.<br />

Lisboa. Museu Colecção Berardo. Praça do<br />

Império - Centro Cultural de Belém. Tel.:<br />

213612878. Até 30/08. 6ª das 10h às 22h (última<br />

admissão às 21h30). 2ª a 5ª, Sáb. e Dom. das 10h<br />

às 19h (última admissão às 18h30). Inaugura 8/6<br />

às 19h30.<br />

Pintura, Outros.<br />

Portulíndia<br />

De Nuno Félix da Costa.<br />

Lisboa. Museu do Oriente. Av. Brasília - Edifício<br />

Pedro Álvares Cabral - Doca de Alcântara Norte.<br />

Tel.: 213585200. Até 05/07. 6ª das 10h às 22h<br />

(última admissão às 21h30). 2ª, 4ª, 5ª, Sáb. e<br />

Dom. das 10h às 18h (última admissão às 17h30).<br />

No Lounge.<br />

Fotografia.<br />

Dan Flavin na Colecção Panza<br />

De Dan Flavin.<br />

Lisboa. Museu Colecção Berardo. Praça do<br />

Império - Centro Cultural de Belém. Tel.:<br />

213612878. De 08/06 a 30/08. 6ª das 10h às 22h<br />

(última admissão às 21h30). 2ª a 5ª, Sáb. e Dom.<br />

das 10h às 19h (última admissão às 18h30).<br />

onde o multimilionário francês<br />

François Pinault revelará o espólio<br />

de arte contemporânea que a sua<br />

fundação tem reunido nos últimos<br />

anos, entretanto mostrado em<br />

exposições no Palazzo Grassi - a peça<br />

de <strong>Jo</strong>ana Vasconcelos, “Coração<br />

Independente Vermelho 1” (2008),<br />

pertence a este acervo com mais de<br />

dois mil trabalhos.<br />

Serralves não possui nenhuma<br />

obra de <strong>Jo</strong>ana Vasconcelos, como<br />

não tem trabalhos de outros artistas<br />

portugueses que, nos últimos anos,<br />

têm tido crescente projecção<br />

internacional - vejam-se os casos,<br />

por exemplo, de Leonor Antunes e<br />

Gil Heitor Cortesão. Há mesmo<br />

outros criadores, como <strong>Jo</strong>rge<br />

Queiroz e Bruno Pacheco, também<br />

com visibilidade crescente fora do<br />

país, que estão ainda escassamente<br />

representados. Tudo isto se explica<br />

pelas opções tomadas pelas<br />

direcções artísticas da instituição,<br />

primeiro Vicente Todolí e <strong>Jo</strong>ão<br />

Fernandes, depois <strong>Jo</strong>ão Fernandes e<br />

Ulrich Loock, que têm como limites<br />

quer o orçamento anual disponível -<br />

este ano é de 1 milhão e 230 mil<br />

euros -, quer a disponibilidade de<br />

obras no mercado. Parte das<br />

escolhas efectuadas nos últimos dez<br />

anos são agora reveladas na mostra<br />

“Serralves 2009: a Colecção”, cocomissariada<br />

por Fernandes e<br />

Loock. E desde logo se percebe que<br />

a mostra se caracteriza mais pela<br />

dispersão de nomes pelas salas do<br />

que pela sua concentração em<br />

determinados núcleos -<br />

cronológicos, temáticos, formais -,<br />

não sendo claro, de facto, quais as<br />

diferenças, e há muitas - como<br />

aquelas que permitem distinguir a<br />

dimensão kitsch do trabalho de<br />

<strong>Jo</strong>ana Vasconcelos do projecto<br />

conceptual de Leonor Antunes -,<br />

“Dan Flavin<br />

na Colecção Panza”<br />

Inaugura 8/6 às 19h30. Inaugura 8/6 às 19h30.<br />

Instalação, Outros.<br />

Lições de Música, Vol. II<br />

De <strong>Jo</strong>ão Paulo Feliciano.<br />

Porto. Galeria Fernando Santos. R. Miguel<br />

Bombarda, 526/536. Tel.: 226061090. Até 30/07. 3ª<br />

a 6ª das 10h às 19h30. 2ª e Sáb. das 15h às 19h30.<br />

Inaugura 6/6 às 16h.<br />

Vídeo, Fotografia, Desenho,<br />

Esculturas, Objectos.<br />

Democracia Entre Tiranos<br />

De Pedro Neves Marques, Ana<br />

Manso, André Romão, Margarida<br />

Mendes.<br />

Lisboa. Galeria Pedro Cera. Rua do Patrocínio, 67E.<br />

¬Mau ☆Medíocre ☆☆Razoável ☆☆☆Bom ☆☆☆☆Muito Bom ☆☆☆☆☆Excelente<br />

entre os artistas agora expostos.<br />

A colecção de Serralves parece, de<br />

facto, ter dois tempos. Um tempo<br />

nacional e outro internacional, este<br />

cada vez mais participado por artistas<br />

portugueses. Contudo, quando<br />

justapostos, postos em confronto,<br />

esses tempos suscitam questões<br />

delicadas, como a de tentar perceber<br />

se cada obra resiste à passagem dos<br />

anos e qual foi também o percurso de<br />

cada artista nessa progressão<br />

temporal, ou seja, se há nomes cuja<br />

obra tem apenas relevância numa<br />

determinada época ou se é possível<br />

existirem criadores de um único<br />

trabalho. Há também que ter em<br />

Tel.: 218162032. Até 24/07. 3ª a Sáb. das 11h às<br />

19h30. Inaugura 6/6 às 18h.<br />

Desenho, Outros.<br />

Colectiva<br />

De Daniela Steele, Kasia Gubernat,<br />

Paula Cruz, Colectivo Unsinn.<br />

Porto. Galeria Por Amor à Arte. R. Miguel<br />

Bombarda, 572. Tel.: 226063699. Até 01/07. 3ª a<br />

Sáb. das 15h às 19h.<br />

Pintura, Desenho.<br />

Continuam<br />

“Ombro a Ombro: Retratos Políticos” no MUDE<br />

Peça de Tatjana Doll exibida na sala central do Museu<br />

de Serralves, o momento mais interessante da exposição<br />

Daniel Buren<br />

Porto. Museu de Serralves. Rua Dom <strong>Jo</strong>ão de Castro,<br />

210. Tel.: 226156500. Até 30/08. 2ª a Sáb. das 10h às<br />

19h. Na Biblioteca.<br />

Objectos, Publicações.<br />

Happy Days<br />

De Vasco Araújo.<br />

Almada. Casa da Cerca - Centro de Arte<br />

Contemporânea. R. Cerca, 2 / Pç. Camões. Tel.:<br />

212724950. Até 13/09. 3ª a 6ª das 10h às 18h. Sáb. e<br />

Dom. das 13h às 18h.<br />

Instalação.<br />

Photoespaña 2009<br />

De Mabel Palacín, Cristóbal Hara.<br />

Lisboa. Museu Colecção Berardo.<br />

Praça do Império - Centro Cultural de Belém.<br />

Tel.: 213612878. Até 26/07. 6ª das 10h às 22h<br />

(última admissão às 21h30). 2ª a 5ª, Sáb.,<br />

Dom. e Feriados das 10h às 19h (última admissão às<br />

18h30).<br />

conta a situação histórica do país,<br />

sobretudo antes da revolução de<br />

Abril e a responsabilidade da<br />

instituição em abarcar esse período,<br />

nomeadamente os anos próximos de<br />

1968, através da produção realizada<br />

por autores portugueses. Essa<br />

condicionante implica uma série de<br />

riscos, como a comparação com o<br />

contexto internacional, sobretudo<br />

daqueles que por cá ficaram - daí a<br />

relevância da obra de Helena<br />

Almeida, Eduardo Batarda, Lourdes<br />

Castro, António Dacosta, Ana<br />

Hatherly, Pedro Morais, Alberto<br />

Carneiro, Ângelo de Sousa, entre<br />

outros, nomes que, de uma forma<br />

Fotografia.<br />

Estrela Brilhante da Manhã<br />

/ Bright Morning Star<br />

De Tamar Guimarães, <strong>Jo</strong>nathan<br />

Meese, Jannis Varelas, <strong>Jo</strong>hn Bock,<br />

Manuel Ocampo, Markus Selg,<br />

Kenneth Anger, <strong>Jo</strong>achim Koester,<br />

António Poppe, Alexandre Estrela,<br />

Brian Butler.<br />

Lisboa. Galeria Zé dos Bois. Rua da Barroca, 59 -<br />

Bairro Alto. Tel.: 213430205. Até 01/08. 4ª a Sáb.<br />

das 15h às 23h. Ciclo Kenneth Anger.<br />

Vídeo, Outros.<br />

Viagens com a Minha Tia<br />

De Daniel Blaufuks.<br />

Vila do Conde. Solar - Galeria de Arte Cinemática.<br />

Solar de S. Roque. Tel.: 252646516. Até 21/06. 3ª a<br />

6ª das 14h30 às 18h. Sáb. das 10h às 00h. Dom.<br />

das 10h às 18h.<br />

Instalação, Vídeo, Fotografia.<br />

Ar.Co Bolseiros<br />

& Finalistas 2008<br />

De Alexandra Rodrigues, Ana<br />

Cálem, Ana Margarida Carvalho,<br />

António Bolota, Eugénia Rufino,<br />

Hugo Madeira, Javier Carrera,<br />

Liene Bosquê, Sérgio Dias, Victor<br />

<strong>Jo</strong>rge, entre outros.<br />

Lisboa. Galeria do Palácio Galveias. Campo<br />

Pequeno, 53 - Edifício do Palácio Galveias. Tel.:<br />

218170534. Até 26/06. 3ª a 6ª das 10h às 19h. Sáb.


extrovertida ou de uma maneira<br />

subtil, fizeram a arte portuguesa sair<br />

de si de modo a ela ter continuado a<br />

ser possível numa situação de asfixia<br />

quer política, quer criativa.<br />

Quando as escolhas incidem não<br />

sobre uma pintura, mas antes por<br />

uma “assemblage” de Júlio Pomar,<br />

realizada em 1977, e se coloca este<br />

trabalho na vizinhança de um<br />

“venetian”, de Rauschenberg, de<br />

1983, abre-se o território à confusão.<br />

É que a “assemblage”, uma prática<br />

dadaísta do início do século XX, foi<br />

reinventada pelo artista norteamericano<br />

em meados dos anos<br />

1950, através dos denominados<br />

e Dom. das 14h às 19h.<br />

Pintura, Escultura, Fotografia,<br />

<strong>Jo</strong>alharia, Outros.<br />

Peso para livro aberto<br />

De Sérgio Taborda.<br />

Lisboa. Instituto Franco-Português. Av. Luís Bívar,<br />

91. T. 213111400. Até 5/6. 2ª a 6ª das 08h30 às 21h.<br />

Sáb. das 08h30 às 13h.<br />

Escultura.<br />

Pancho Guedes - Vitruvius<br />

Mozambicanus<br />

Lisboa. Museu Colecção Berardo. Praça do Império -<br />

Centro Cultural de Belém. Tel.: 213612878. Até 16/08.<br />

6ª das 10h às 22h (última admissão às 21h30). 2ª a<br />

Dom. e Feriados das 10h às 19h (última admissão às<br />

18h30).<br />

Arquitectura, Desenho, Escultura,<br />

Pintura.<br />

Agora Luanda<br />

De Kiluanje Liberdade, Inês<br />

Gonçalves.<br />

Lisboa. Plataforma Revólver. Rua da Boavista, 84 - 3º.<br />

Tel.: 213433259. Até 20/06. 2ª a Sáb. das 14h às 19h30.<br />

Fotografia, Vídeo.<br />

Opções & Futuros: Obras da<br />

Colecção da Fundação PLMJ<br />

De Adriana Molder, Bruno Pacheco,<br />

Carlos Bunga, <strong>Jo</strong>ana Pimentel, <strong>Jo</strong>ão<br />

Maria Gusmão + Pedro Paiva,<br />

Ricardo Jacinto, Ricardo Valentim,<br />

entre outros<br />

“combines”, na qual um único<br />

objecto reunia em si características<br />

da pintura e da escultura - a criação<br />

de Pomar, apesar do valor e<br />

singularidade que tem em termos da<br />

sua própria experiência plástica,<br />

nada acrescenta à problematização<br />

do objecto artístico dessa época,<br />

surgindo, por isso, datada. Este<br />

confronto, que pode ilustrar muitos<br />

outros da exposição - a proximidade<br />

de uma pintura de Gerhard Richter<br />

com uma outra de Noronha da<br />

Costa, ou a da instalação de Thomas<br />

Hirschhorn com as colagens de<br />

Albuquerque Mendes dos anos 1990<br />

-, perturba uma necessária<br />

clarificação histórica. O facto de a<br />

colecção não estar ainda estudada,<br />

uma investigação urgente e que<br />

ajudaria a esclarecer as contradições<br />

visíveis na exposição, é também um<br />

dado essencial para um debate<br />

futuro, isto apesar do esclarecedor<br />

texto de Ulrich Loock, no catálogo<br />

da exposição.<br />

É na sala central do museu que<br />

acontece o momento mais<br />

interessante da exposição, para além<br />

do átrio, com peças de Robert<br />

Grosvenor e George Herold, e do<br />

corredor da entrada, com as obras<br />

de Luc Tuymans, Marlene Dumas e<br />

Bruce Nauman. Naquele espaço,<br />

apelidado de “piscina”, mostram-se<br />

diferentes possibilidades da pintura<br />

na actualidade, um território ainda<br />

em expansão, em termos quer<br />

formais, quer conceptuais. Ali<br />

reúnem-se trabalhos de <strong>Jo</strong>ão<br />

Queiroz, uma das últimas aquisições<br />

da instituição, Hans Haacke, Helmut<br />

Dorner, Tatjana Doll, Eberhard<br />

Havekost e Herbert Brandl, com<br />

uma representação monumental do<br />

sagrado Monte Kailash. Aqui há uma<br />

corrente de ar, vê-se a paisagem;<br />

respira-se.<br />

Lisboa. Museu da Cidade de Lisboa. Campo<br />

Grande, 245. Tel.: 217513200. Até 21/06. 3ª a<br />

Dom. das 10h às 18h. Pavilhão Branco e Pavilhão<br />

Preto.<br />

Desenho, Pintura, Outros.<br />

Nan Goldin<br />

Braga. Galeria Mário Sequeira - Parada de Tibães.<br />

Quinta da Igreja (Parada de Tibães). Tel.:<br />

253602550. Até 18/06. 2ª a 6ª das 10h às 19h. Sáb.<br />

das 15h às 19h.<br />

Fotografia.<br />

Corpo, Densidade e Limite<br />

De Pedro Cabrita Reis, Rosa<br />

Almeida, Adriana Molder, Pedro<br />

Proença, Rui Chafes, Rui Sanches,<br />

entre outros.<br />

Elvas. Museu de Arte Contemporânea de Elvas.<br />

Rua da Cadeia. T. 268637150. Até 30/6. 3ª das<br />

14h30 às 18h. 4ª a Dom. das 10h às 13h e das 14h30<br />

às 18h.<br />

Pintura, Escultura, Fotografia,<br />

Vídeo, Outros.<br />

No Cinema<br />

De Tsai Ming-liang, Matthias<br />

Muller, Christoph Girardet,<br />

Graham Gussin, Sandra Gibson,<br />

Luis Recoder, Ariane Michel,<br />

Cesário Alves.<br />

Vila do Conde. Centro de Memória. Largo de S.<br />

Sebastião. T. 252248400. Até 30/7. 3ª a dom das<br />

10h às 18h.<br />

Instalação, Vídeo.<br />

teatro<br />

Romeo and Juliet<br />

4, 5, 6 Junho<br />

Nature Theater of Oklahoma<br />

Maria Matos Teatro Municipal<br />

Bilhetes à venda:<br />

Teatro Maria Matos 218 438 801<br />

www.ticketline.pt | Fnac<br />

<br />

<br />

<br />

EM CENA<br />

Dias das<br />

histórias<br />

(im)<br />

prováveis<br />

10€ / 7,5€ / 5€<br />

www.teatromariamatos.egeac.pt<br />

ANA BRITO E CUNHA<br />

GUIDA MARIA<br />

SÃO JOSÉ CORREIA<br />

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Ípsilon • Sexta-feira 5 Junho 2009 • 47

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