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A experiência direta e completa com os procedimentos que<br />
envolvem o ato fotográfico e a compreensão de cada etapa<br />
de todo o processo é que poderão dar ao futuro profissional<br />
a dimensão do papel social da fotografia e do fotógrafo como<br />
produtor de realidades. É importante não perder de vista<br />
que o fotojornalismo é um fenômeno que tem historicidade,<br />
e a emergência e decadência de estilos e categorias são<br />
fruto de uma conjunção de fatores socioculturais, técnicos,<br />
econômicos e políticos. (RACY apud BUITONI, 2011, p.131).<br />
Preocupações convergentes<br />
As falas de Fred Ritchin, em 1989, Jorge Pedro Sousa, em<br />
2000, Simonetta Persichetti, em 2006, e Racy (apud BUITO-<br />
NI), em 2011, espelham preocupações com a atual situação<br />
e o futuro do fotojornalismo. Ninguém com mais autoridade<br />
que esses autores para manifestar essa preocupação, afinal<br />
todos eles conheceram – e têm referências – o antigo fotojornalismo,<br />
o de imersão, de investigação, de denúncia, de<br />
credibilidade. Todos foram formalmente educados e profissionalmente<br />
preparados para um formato, segundo eles, mais<br />
autêntico de fotojornalismo, hoje cada vez mais distante dos<br />
jornais e revistas brasileiros. Eles apontaram mudanças no<br />
fotojornalismo porque esta era – e em alguns casos ainda<br />
é – sua área de atuação, ou seja, seus olhos enxergam com<br />
mais profundidade e veemência suas mudanças ao longo das<br />
últimas décadas.<br />
Porém, extrapolando esses autores, é preciso ressaltar que<br />
não foi só o fotojornalismo que mudou. O fotojornalismo<br />
mudou porque o jornalismo mudou. E o jornalismo mudou<br />
porque o mundo também mudou. <strong>Na</strong>s duas últimas décadas,<br />
o mundo viveu um número quase infinito de transformações,<br />
notadamente nas tecnologias de comunicação. Por fim, não<br />
foram só os produtos e formatos que mudaram – aliás, eles<br />
apenas se adequaram –, foram as pessoas e a sociedade que<br />
mudaram assustadoramente nesse período.<br />
A mudança no jornalismo brasileiro<br />
A primeira etapa é clara: o fotojornalismo acompanhou as<br />
mudanças vividas no jornalismo. No Brasil, especificamente,<br />
o jornalismo perdeu a liberdade e o romantismo, pós Golpe<br />
Militar de 1964 e redemocratização de 1985. Paradoxalmente,<br />
quando o jornalismo estava censurado pelas garras<br />
burocráticas e repressivas da ditadura militar, os jornalistas<br />
sentiam necessidade de criar, pensar estratégias para burlar<br />
as amarras da ditadura, de procurar brechas e lacunas para<br />
se comunicar com o leitor, para denunciar os descasos e<br />
falcatruas do governo. Eles eram mais envolvidos, mais<br />
engajados, faziam do jornalismo um “meio” para provocar<br />
transformações na sociedade. E, na esteira do jornalismo<br />
andava, par e passo, o fotojornalismo. Em termos<br />
jornalísticos e fotojornalísticos, segundo o fotógrafo Evandro<br />
Teixeira 2 , um dos mais destacados denunciadores dos<br />
desmandos do governo militar, aquele foi um “período muito<br />
fértil”.<br />
Boa parte dos fotojornalistas e repórteres fotográficos da<br />
velha guarda classifica o período do AI-5 (1968-1978)<br />
como a época de ouro do fotojornalismo brasileiro. <strong>Na</strong> Universidade<br />
Estadual de Londrina, inclusive, temos um projeto<br />
em andamento que prevê a publicação de um livro retratando<br />
o fotojornalismo nesse período.<br />
Porém, o governo militar, para “fugir” do assédio da imprensa<br />
(mesmo com as defesas e ameaças do AI-5) multiplicou<br />
no país as assessorias de comunicação e, claro, os assessores<br />
de imprensa. Com este “porta-voz”, os governantes<br />
ou dirigentes de instituições se esquivavam de conceder<br />
entrevistas ou prestar informações; passaram apenas a mandar<br />
recados ou notas por meio de seus porta-vozes, ou seja,<br />
pelo assessor ou pela assessoria de imprensa. A moda pegou.<br />
Ao longo dos anos, em crescimento gradual, mas constante e<br />
consistente, empresas, organizações, instituições, políticos,<br />
celebridades, artistas e desportistas aderiram à estratégia da<br />
assessoria e passaram a fugir da imprensa quando lhes era<br />
conveniente e a bajulá-la quando esta lhe era imprescindível,<br />
especialmente no caso de políticos e artistas.<br />
Esta estratégia, que começou já a partir de 1964, ano do<br />
golpe militar, se consolidou nos anos 80 e 90. Desde então,<br />
sempre que um político vai visitar determinada cidade, sua<br />
assessoria distribui releases para imprensa informando todos<br />
seus passos e compromissos na cidade. Quando o governador<br />
de Santa Catarina, por exemplo, vai a Joinville para reuniões<br />
políticas e inauguração de obras, todo o roteiro é criteriosamente<br />
fornecido à imprensa, que, claro, se pauta para cobrir<br />
os espaços de tempo do governador com reuniões, visitas,<br />
tapinha nas costas, abraços de adesão e inaugurações. Com<br />
isso, se dez jornais e emissoras de televisão forem cobrir sua<br />
visita, todos falarão exatamente as mesmas coisas e<br />
produzirão as mesmas imagens, pois todos os jornalistas<br />
ficarão nos “currais” preparados e destinados à imprensa.<br />
Ou seja, em razão dessa estratégia – e de tantos outros<br />
fatores –, o jornalismo mudou muito nos últimos quarenta<br />
anos. Hoje ele é igual, pasteurizado, repetitivo, omisso às<br />
vezes, agressivo outras vezes. O fim dos “anos de chumbo”<br />
provocou uma reviravolta no jornalismo: ele saiu da censura<br />
para uma fase de excessos, na qual, aparentemente, todos<br />
queriam recuperar o “tempo perdido” e, em muitos casos,<br />
acabaram metendo os pés pelas mãos. O jornalista Luís<br />
<strong>Na</strong>ssif, em seu livro O jornalismo dos anos 90, fez uma<br />
interessante análise o excesso de liberdade, quase sempre<br />
sem responsabilidade, do jornalismo na última década do<br />
século XX e denunciou que:<br />
2 Evandro Teixeira. Entrevista inédita concedida à revista Discursos <strong>Foto</strong>gráficos, v.8, n12, que circulará em 19 de março de 2012.<br />
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Nos últimos anos, muito por influência da televisão, houve o<br />
predomínio arrasador do chamado ‘jornalismo de marketing’.<br />
A ambição profissional máxima do jovem repórter era exercitar<br />
o senso comum nas matérias, fuzilar reputações para se sentir<br />
poderoso ou exprimir indignação contra tudo e contra nada.<br />
Aprofundar temas, ganhar consistência analítica, perseguir o<br />
rigor técnico, confirmar os boatos antes de sua divulgação,<br />
buscar ângulos complexos da questão, nada disso. As redações<br />
passaram a atuar com excessiva benevolência para com os<br />
erros cometidos pelos jornalistas. (NASSIF, 2003, p.33).