Cartas entre amigos
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Irmão querido, não é possível agir sem antes sentir. Aqui<br />
falo da vitória do sentimento sobre a insensibilidade. Da canção<br />
de liberdade que carece de intérpretes.<br />
Ainda criança, em uma excursão para um parque de diversões,<br />
experimentei a dor preenchendo o meu tal fluxo de vivências.<br />
A história se deu mais ou menos assim. Éramos um ônibus<br />
de crianças conduzidas por dois ou três professores. Chegamos<br />
ao parque. Os brinquedos nos deixavam alucinados. Era<br />
emocionante para nós, meninos interioranos, explorar o grande<br />
parque de diversões da capital. A adrenalina misturava-se à<br />
alegria e à molecagem. Assim, furávamos fila. Discretamente.<br />
Tínhamos a desculpa da pouca idade. E tudo era festa. Até que,<br />
quase no horário do retorno, furamos mais uma vez a fila de um<br />
brinquedo chamado Montanha Encantada. Eu e mais uns quatro.<br />
Quietinhos, entramos; e quietinhos, ficamos. Uma mulher,<br />
<strong>entre</strong>tanto, não se conformou com nossa audácia e começou a<br />
dizer as piores ofensas. Ela tinha razão, então nos fizemos de<br />
distraídos. Foi quando um homem resolveu nos defender. Alegou<br />
que éramos crianças nos divertindo. A mulher ficou ainda<br />
mais irritada dizendo que exatamente por sermos crianças é que<br />
deveríamos ser corrigidos. Ele tentou dizer alguma coisa e ela<br />
soltou um sonoro “cala a boca”. Ele retrucou e ela avançou sobre<br />
o homem. Deu um tapa em sua cara. Ele retribuiu. E nisso<br />
chegou o marido dela. E uma confusão tomou conta daquela<br />
fila. Vieram os seguranças e nós saímos correndo em direção ao<br />
ônibus. Chegamos ofegantes. Cheguei entristecido. Eu sabia<br />
que não devia furar fila. E o que mais doía é que o homem que<br />
tinha me defendido estava agora em uma situação ruim. Contei<br />
a história meio choramingando a um dos professores e ele,<br />
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