19.04.2013 Views

Discurso de Posse - Academia de Letras da Bahia

Discurso de Posse - Academia de Letras da Bahia

Discurso de Posse - Academia de Letras da Bahia

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

popular que atraíam e empolgavam multidões, com peças <strong>de</strong> teatro em parte<br />

censura<strong>da</strong>s, quando não inteiramente proibi<strong>da</strong>s, com poemas e contos<br />

publicados em revistas estu<strong>da</strong>ntis, com novelas e romances que os próprios<br />

autores editavam. Pertenço, Senhores Acadêmicos, à geração que participou<br />

dos últimos anos gloriosos do gran<strong>de</strong> Colégio <strong>da</strong> <strong>Bahia</strong>, forja e celeiro <strong>da</strong> cultura<br />

<strong>da</strong> juventu<strong>de</strong> baiana até o final dos anos sessenta. Sem per<strong>de</strong>r <strong>de</strong> vista os<br />

acontecimentos políticos, sem <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> lutar pelos princípios <strong>de</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong> nos<br />

quais acreditávamos, não esquecíamos, no centenário Colégio, a filosofia, a<br />

história, a música, a literatura. Nos intervalos <strong>da</strong>s aulas, nos corredores, nos<br />

pátios, nos bancos <strong>de</strong> cimento à volta <strong>da</strong>s velhas árvores, discutíamos<br />

Graciliano Ramos, Adonias Filho, Jorge Amado, José Lins do Rego, Érico<br />

Veríssimo, Rachel <strong>de</strong> Queiroz, falava-se, com entusiasmo, em Hemingway,<br />

Huxley, Sartre, Hermann Hesse, os mais eruditos citavam Joyce, Proust e<br />

Kafka.<br />

É neste cenário <strong>de</strong> efervescência <strong>da</strong> juventu<strong>de</strong>, à sombra <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>ssas<br />

árvores e cercado por colegas, que vou encontrar um jovem magrinho, <strong>de</strong><br />

óculos, tão falante quanto os outros, tão seguro <strong>da</strong> sua sabedoria quanto os<br />

outros, e que acreditava ser escritor. Havia razões para isto, na ver<strong>da</strong><strong>de</strong>. A sua<br />

se<strong>de</strong> <strong>de</strong> escrever era tão gran<strong>de</strong> que, na quarta série <strong>de</strong> ginásio, aos quatorze<br />

anos, criara um jornal mural semanal, que ele próprio passara a dirigir, apenas<br />

para ali escrever, semanalmente, crônicas e editoriais, a exemplo do que fazia,<br />

no jornal <strong>de</strong> ver<strong>da</strong><strong>de</strong>, o tio jornalista e cronista diário. E, aos quinze anos <strong>de</strong><br />

i<strong>da</strong><strong>de</strong>, começara a colaborar com aquele mesmo jornal <strong>de</strong> ver<strong>da</strong><strong>de</strong>, A Tar<strong>de</strong>,<br />

publicando, semanalmente, o que fez durante doze anos, histórias infantis, na<br />

Página Infantil que o tio editava, crônicas, contos e poemas na Página Literária.<br />

Vivia embriagado <strong>de</strong> literatura. Então, era escritor aquele jovem, e o fato <strong>de</strong><br />

escrever em A Tar<strong>de</strong> — a po<strong>de</strong>rosa A Tar<strong>de</strong> — conferia-lhe um indiscutível<br />

prestígio literário entre os colegas. Mas era escritor, sobretudo, porque, ain<strong>da</strong><br />

que quisesse — e jamais o quis — não podia <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> escrever, e tinha no<br />

i<strong>de</strong>al literário, o i<strong>de</strong>al <strong>da</strong> sua própria vi<strong>da</strong>.<br />

O sonho maior <strong>da</strong>quele jovem era publicar um livro, na<strong>da</strong> lhe parecia<br />

mais importante do que isto, e sonhava com o seu nome na capa, e sonhava<br />

com o título, o livro, o livro. Reuniu alguns dos contos <strong>da</strong> Página Infantil <strong>de</strong> A<br />

Tar<strong>de</strong>, <strong>de</strong>u-lhes um título, No País <strong>da</strong>s Aventuras, mostrou ao pai, ao tio, por um<br />

tempo viveu em torno <strong>da</strong>quela idéia, mas logo um novo projeto empolgou-o: não<br />

mais a estréia com um livro <strong>de</strong> histórias infantis, porém com um <strong>de</strong> contos para<br />

adultos. Para ele o gênero não importava — e, na ver<strong>da</strong><strong>de</strong>, continuou não<br />

importando. Em literatura, gostava <strong>de</strong> tudo, interessava-se por tudo, e via — e<br />

continuou vendo — no gênero literário apenas a roupagem <strong>da</strong> idéia. Ca<strong>da</strong> idéia,<br />

ca<strong>da</strong> inspiração pe<strong>de</strong> um gênero, cabe vesti-la com a vestimenta a<strong>de</strong>qua<strong>da</strong>. O<br />

romance era um objetivo, mas não se sentia, naquele tempo, preparado para<br />

enfrentá-lo, havia que apren<strong>de</strong>r muito, antes <strong>de</strong> aventurar-se na ficção <strong>de</strong> largo<br />

fôlego. E atirou-se a produzir contos, um após o outro, escrevendo e

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!