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© Alexandre Macedo<br />
A chega<strong>da</strong> de João <strong>da</strong><br />
Angélica nos anos 60<br />
o velho meu pai, velha a minha mãe<br />
que eu nasci em uma <strong>da</strong>ta feliz de 1940 em<br />
“Disse<br />
Barreira do Campo (Pará). 1945 nós mudou<br />
para aqui, beirando Porto Alegre. Naquela época<br />
você caçava lugar, falava assim com os compadre. Eu<br />
arranjei um lugar bom: tem muita agua e muita mata<br />
boa e pasto bom para o gado. Não tinha perturbação<br />
de na<strong>da</strong>. Chegamos no dia de São João. Os índios<br />
mantaram um rapaz, que os índios kayapó eram muito<br />
bravos e nós mudemos para Jatoba Torto. Lá tinha<br />
uns oito vaqueiros e meu pai resolveu tirar um lugar e<br />
botaram o nome de Cedrolândia, (hoje Porto Alegre do<br />
Norte). Ele foi lá botou a roça, tudo queimou. Chegamos<br />
6 de janeiro de 1950. Desde então eu estou lá, Porto<br />
Alegre do Norte. Eu era um homem muito bonito, e as<br />
mulheres cavam arriba de mim e ai resolvi casar. Nesse<br />
casamento arrumei 10 lhos, 1 homem e nove mulher.<br />
Hoje tô bem rodeado de família, os dez lhos, graças a<br />
deus, 24 netos, dois bisnetos. E ain<strong>da</strong> tô querendo ver<br />
se faço dez meninos mais, que 10 tá pouco (risa<strong>da</strong>s).<br />
Quando a gente chegou, naquela época não tinha<br />
perturbação de fazen<strong>da</strong>. Era o tempo melhor que nós<br />
passamos. Um tempo muito muito feliz, muita amizade.<br />
Aquele tempo, companheiro, eu tenho sau<strong>da</strong>de para<br />
esses meus netos ver. Não tinha roubo. O gado era<br />
tudo junto. Você ia no campo e você caçava uma vaca<br />
sua, achava um cara com uma vaca do outro e levava<br />
para o curral, para sarar, era aquela satisfação, ninguém<br />
roubava do outro. O meu pai me ensinou para trabalhar.<br />
A pastagem era natural. Demorei em conhecer as<br />
pastagens que eles plantavam. Primeiramente era o<br />
30 Reali<strong>da</strong>de e História <strong>da</strong> região do Araguaia <strong>Xingu</strong><br />
capim Jaraguá, ai o Colonião, ai o tal de Braquiarão.<br />
Hoje é tanto enxerto que eles plantam que na<strong>da</strong> é<br />
na<strong>da</strong> na<strong>da</strong>. Eu acredito que a pastagem natural. Porque<br />
eu conheço esse lado todo e sei como é que é. Na<br />
pastagem natural <strong>da</strong>va para criar o gado bom e gordo.<br />
Depois que misturou tudo não prestou mais.<br />
Tem tantas lei que eu não combino com isso. Se<br />
pudesse morar longe de tantas lei que só tivesse<br />
o povo, só nós igual que os índios. Foi botar lei<br />
demais. Para acabar com tudo o que Deus deixou<br />
nesse mundo. Primeiramente as matas, eram matas<br />
bonitas. O cara derrubava a roça, sim derrubava. Um<br />
pe<strong>da</strong>cinho, quatro linhas de chão. Cercava aquela<br />
roça, plantava dois, três anos. Eram assim, não era<br />
esse mundão de coisa que os fazendeiro faz. Por<br />
isso, companheiro, que eu tenho sau<strong>da</strong>de <strong>da</strong>quele<br />
tempo. Nós viviam que nem os índios, <strong>da</strong> pesca e<br />
caça, plantava e tinha o gadinho. Ai chegou a fazen<strong>da</strong><br />
Frenova. Dai para cá só foi para pior.<br />
Eu tenho uma historinha, o Pedro (Casaldáliga) sabe<br />
dessa história. O gerente <strong>da</strong> fazen<strong>da</strong> me contratou<br />
para matar o padre, me <strong>da</strong>ndo 7000 naquele<br />
tempo. Nós fazia uma cerca por 30 cruzeiro. O Padre<br />
Enrique. Ele queria man<strong>da</strong>r matar, o padre ia na<br />
casa dos companheiros e falava, vocês não saem<br />
<strong>da</strong>qui, que vocês estão com 10 e 20 anos. Se vocês<br />
sair <strong>da</strong>qui, vai para outra <strong>terra</strong>, vão fazer o que lá.<br />
Não conhece ninguém, não tem apoio. E com esse<br />
povo foi ateando a cabeça. Ai, disse, tem que matar<br />
o padre. Nós tomemos 3500 dele, porque o resto<br />
era de prestação, e não matemos o<br />
padre. Perdemos o resto do dinheiro e<br />
deixemos o padre vivo. Eu falo assim,<br />
oh bicho <strong>da</strong>nado é padre, que nós<br />
perdemos tanto dinheiro hein!! (risa<strong>da</strong>s).<br />
O padre tinha fugido, aí perdemos o<br />
dinheiro e o padre (mais risa<strong>da</strong>s). O<br />
padre era quem mais aju<strong>da</strong>va nós, era<br />
amigo nosso. O tempo bom já passou<br />
e não volta mais porque os home não<br />
faz uma lei para proteger a nação, esse<br />
mundo nosso, não vi essa lei ain<strong>da</strong>. Mas<br />
de acabar sim isso que estou lhe falando.<br />
Papel, todo o mundo pega, agora abraço<br />
que eu tenho que outro tem do meu<br />
jeito é pouco que tem”.<br />
Entrevista realiza<strong>da</strong> por<br />
Carlos García Paret em 2011.