1 “Terror”, “Horror” e “Repulsa”: Stephen King e o cálculo da ...
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premissa poeana 3 : a de que a obra literária é uma máquina de produção de efeitos.<br />
“Novels are engines” 4 (ibidem, p. 79), diz ele, e escrever seria, fun<strong>da</strong>mentalmente,<br />
operar a máquina de modo a controlar os efeitos que se deseja produzir no leitor. Assim<br />
como Allan Poe, <strong>King</strong> descarta que a criação literária seja um processo “inspirado” ou<br />
uma conseqüência direta do talento espontâneo. A capaci<strong>da</strong>de criativa não é algo inato,<br />
mas o fruto de uma vontade consciente e de um planejamento calculado.<br />
<strong>King</strong> renega também qualquer tipo de explicação que busque em traumas e<br />
fobias do escritor as motivações profun<strong>da</strong>s <strong>da</strong>s narrativas de horror. A escrita é, para<br />
ele, uma prática que nasce <strong>da</strong> disciplina e do trabalho constante e que tem como meta<br />
clara e consciente a produção do medo em seu leitor, através <strong>da</strong> descoberta de seus<br />
“phobic pressure points”:<br />
The business of creating horror is much the same as the business of<br />
paralyzing an opponent with the martial arts – it is the business of<br />
finding vulnerable points and then applying pressure then. The most<br />
obvious psychological pressure point is the fact of our own mortality 5<br />
(ibidem, p. 68).<br />
Para <strong>King</strong>, as narrativas de horror funcionam em três níveis de refinamento, em<br />
função do caráter mais implícito ou explícito dos elementos que utilizam para produzir<br />
o medo. Essa distinção corresponde aos três possíveis efeitos a serem buscados pelo<br />
ficcionista de horror em seu leitor: <strong>“Terror”</strong>, <strong>“Horror”</strong> e “Revulsion”.<br />
O Terror é para <strong>King</strong> a mais apura<strong>da</strong> <strong>da</strong>s sensações produzi<strong>da</strong>s pelas narrativas<br />
sobrenaturais. Estaria relacionado com as crenças mais primárias e instintivas do ser<br />
humano – as que se situariam além e aquém <strong>da</strong>s convenções sociais. Trata-se de uma<br />
emoção gera<strong>da</strong> por um processo de imaginação deflagrado pelo medo <strong>da</strong>quilo que é<br />
apenas sugerido pela narrativa, isto é, por aquelas especulações desconfortáveis que o<br />
leitor precisa fazer diante do que a narrativa não diz – ou <strong>da</strong>s coisas que não<br />
aconteceram e poderiam ter acontecido (KING: 1983, p. 21-2).<br />
3 Para as concepções de Edgar Allan POE (1977) relativas às técnicas de produção de<br />
efeitos de recepção na criação literária, consulte-se o seu conhecido ensaio “The<br />
Philosophy of Composition” [1846].<br />
4 “Romances são máquinas (...)” (KING: 2007, p. 73).<br />
5 “A tarefa de se criar horror é bem semelhante à de paralisar um oponente nas artes<br />
marciais – é questão de encontrar pontos vulneráveis e aí aplicar a força. O ponto de<br />
pressão psicológica mais óbvio é a certeza na nossa própria mortali<strong>da</strong>de” (KING: 2007,<br />
p. 64).<br />
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