02.06.2013 Views

Linguagem, Educação e Artes - Vol.1 - 2010 - Unorp

Linguagem, Educação e Artes - Vol.1 - 2010 - Unorp

Linguagem, Educação e Artes - Vol.1 - 2010 - Unorp

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

Chanceler<br />

Dr. Augusto Cezar Casseb<br />

Vice-Chanceler<br />

Luiz Carlos Casseb<br />

Reitor<br />

Dr. Eudes Quintino de Oliveira Junior<br />

Pró-Reitor Acadêmico<br />

José Luiz Falótico Corrêa<br />

Pró-Reitor Comunitário e de Desenvolvimento<br />

Antônio Fábriga Ferreira<br />

Conselho Editorial<br />

Uderlei Donisete Silveira Covizzi (Coordenador)<br />

Célia Regina Cavicchia Vasconcelos<br />

Daniela de Oliveira Rezende<br />

Danilo Elias de Oliveira<br />

Elza Cristina Mazza Torres<br />

Leila Maria Homsi Kerbauy<br />

Márcia Maria Menin<br />

Marcelo Kobelnik<br />

Patrícia Helena Mazucchi Saes<br />

Priscila Belintani<br />

Equipe Técnica<br />

Bibliotecárias<br />

Miriam Queiroz Rocha<br />

Diagramação e Editoração<br />

Ana Mária Filipe Fazendeiro<br />

Enio José Bolognini<br />

Revisão Geral<br />

Ademir Pradela<br />

CAPA<br />

―OST (Óleo Sobre Tela)‖- José Luiz Falótico Corrêa


Apresentação<br />

A reedição da revista UNORP, agora em formato eletrônico, oportuniza<br />

a discussão do método científico, expondo o pensamento crítico e reflexivo da<br />

nossa comunidade acadêmica e o de nossos colaboradores. Proporcionamos um<br />

ambiente criterioso e qualificado para a publicação de artigos resultantes das<br />

atividades acadêmicas em pesquisa, ensino e extensão, revisões de literatura,<br />

relatos de experiências profissionais e de conhecimentos culturais.<br />

Objetivamos que esse periódico torne-se um valioso catalisador na<br />

troca de informações entre a comunidade local e externa e que esse intercâmbio<br />

de idéias colabore para o desenvolvimento técnico, cultural e científico de autores e<br />

leitores. A sensibilização de novos autores para futuras edições da revista UNORP<br />

será facilitada pelo formato eletrônico que possibilita a sua ampla divulgação.<br />

Prof. Dr Uderlei Doniseti Silveira Covizzi<br />

Coordenador Revista UNORP


EDITORIAL DA PRIMEIRA EDIÇÃO ELETRÔNICA<br />

É sempre uma satisfação renovada fazer a apresentação de uma nova<br />

Revista <strong>Unorp</strong>, abrangendo agora os cursos de Letras, Pedagogia, Comunicação<br />

Social, Gastronomia, Arquitetura e Design, intitulada <strong>Linguagem</strong>, <strong>Educação</strong> e <strong>Artes</strong>.<br />

O Centro Universitário do Norte Paulista - <strong>Unorp</strong> -, ao longo de seus<br />

quarenta anos de reconhecidos serviços prestados à comunidade local e regional,<br />

tem como um de seus objetivos oferecer ensino de qualidade e construir estratégias<br />

que venham ao encontro das novas demandas do mercado profissional. Daí que a<br />

evolução do ensino tem que acompanhar a evolução social. Pode-se ainda até<br />

explorar a metodologia grega onde o professor realiza sua exposição, mas agora<br />

com uma participação ativa do destinatário do ensinamento. O envolvimento do<br />

aprendizado compreende a utilização de várias ferramentas que sejam acessíveis e<br />

convenientes.<br />

O dinamismo do ensino exige que sejam galgados novos caminhos para<br />

atingir um novo conceito de aprendizado, com a efetiva participação do aluno e o<br />

comprometimento desmedido do professor. Tal tarefa vem sendo cumprida<br />

rigorosamente pela <strong>Unorp</strong>, que faz da sala de aula um laboratório sensibilizado com<br />

as necessidades do aluno. Não se propõe o afastamento das técnicas acadêmicas<br />

de ensino, que utilizam uma metodologia proveniente de um pensamento científico,<br />

mas sim uma adequação que seja apropriada para o perfil do aluno da nossa<br />

Instituição. É um desafio que se apresenta ano após ano e em todos eles colhendo<br />

resultados altamente positivos.<br />

Atendendo, desta forma, os anseios de professores e alunos, a UNORP<br />

disponibiliza via on-line um espaço de estudos, reflexões, pesquisas e atividades<br />

concentradas em áreas específicas do saber. Daí a presente revista. A sociedade<br />

de informação exige que a produção científica ultrapasse as barreiras interna<br />

corporis e avance extra muros, alcançando toda a comunidade universitária ou não,<br />

servindo como um instrumento divulgador de conhecimento e colaborador da<br />

construção de uma sociedade que também se apresenta como interessada e<br />

sequiosa de cultura.<br />

Assim, como a nau que parte para desbravar vários mares e retorna segura<br />

ao porto, entregamos aos nossos leitores a presente edição com a certeza de que o<br />

trabalho será reconhecido pela sua qualidade e pertinência com os temas atuais. Na<br />

mesma oportunidade, ficam registrados os agradecimentos à equipe responsável<br />

pela Revista <strong>Unorp</strong>, com a certeza de que seremos brindados com outros<br />

exemplares eletrônicos tão bem elaborados.<br />

Parabéns a todos!<br />

Dr. Eudes Quintino de Oliveira Júnior<br />

(Reitor da UNORP)


FICHA CATALOGRÁFICA<br />

REVISTA UNORP / Centro Universitário do Norte Paulista. – Vol. 1, no. 1<br />

(Nov. <strong>2010</strong>)– . São José do Rio Preto, <strong>2010</strong>.<br />

Irregular:<br />

ISSN 2178-3268<br />

1. Poligrafias – Periódicos I. Centro Universitário do Norte Paulista.<br />

CDU 08(05)


ARTIGOS<br />

SUMÁRIO<br />

Poliziano e Botticelli: a representação da Vênus caelestis e outros mitos no<br />

jardim lócus-amoenus mitológico<br />

Maria Celeste Tommasello Ramos<br />

Fernanda Silva Veloso<br />

Leandro Passos ......................................................................................................... 1<br />

A representação espacial no discurso audiovisual<br />

Patrícia Helena Mazucchi-Saes ............................................................................... 12<br />

De Bambu Rachado ao Som Digital: História do Rádio de S.J. Rio Preto<br />

Vera Lúcia Guimarães Rezende...............................................................................27<br />

O papel do cidadão e sua responsabilidade em gerar e gerir informações de<br />

caráter público<br />

Marcos Vicente Coffani Lock .................................................................................... 43<br />

O mito da imparcialidade nas manchetes, títulos e subtítulos dos textos<br />

noticiosos<br />

Marcelo Henrique Martins<br />

Célia Regina Cavícchia Vasconcelos ....................................................................... 55<br />

Tradução, Cultura e Mídia: um enfoque na linguagem<br />

Marcelo Pessoa ........................................................................................................ 66<br />

RESENHA<br />

Uma análise do papel do conhecimento na escola<br />

Maria Aparecida Macedo Pimentel ........................................................................... 87<br />

RESUMOS ................................................................................................................ 92<br />

NORMAS PARA PUBLICAÇÃO ............................................................................ 100


_________________________________________________________<br />

ARTIGO<br />

POLIZIANO E BOTTICELLI:<br />

A REPRESENTAÇÃO DA VÊNUS CAELESTIS<br />

E OUTROS MITOS NO JARDIM LOCUS-AMOENUS MITOLÓGICO 1<br />

*Doutora em Letras – professor-adjunto Unesp/Ibilce (S. J. do Rio Preto)<br />

** Licenciada em Letras – Unesp/Ibilce<br />

*** Licenciado em Letras – Unesp/Ibilce<br />

1<br />

*Maria Celeste Tommasello RAMOS<br />

**Fernanda Silva VELOSO<br />

***Leandro PASSOS<br />

Resumo: O estudo em questão visa analisar as homologias presentes na representação da Vênus e<br />

outros mitos na pintura ―La primavera‖, de Alessandro Botticelli, e na poesia ―Il regno di Venere: il<br />

giardino‖, de Angelo Poliziano, com auxílio da semiótica greimasiana, possibilitando verificar como se<br />

construiu a figurativização dos mitos e do jardim locus-amoenus nas duas obras artísticas e a quais<br />

significados podem conduzir.<br />

Palavras-chave: Renascimento italiano, pintura, poesia, Vênus, Botticelli e Poliziano.<br />

Abstract: The following study aims at analyzing the existing homologies in the representation of Vênus<br />

and other myths Allessandro Botticelli´s painting La primavera and in the poetry II regno di venere: it<br />

giardino, from Angelo Poliziano, helped by the greimasiane semiotcs as to verify how the myths and<br />

the garden locus-amoenus picturing was built in both artistic works and to which meanings they can<br />

conduct us.<br />

Keywords: Italian renascence; painting; poetry; Vênus; Botticelli and Poliziano.<br />

Ao comporem suas obras, diversos poetas e pintores, durante o<br />

Renascimento italiano, empreenderam inovações quando adotaram perspectivas<br />

diferentes para a representação de temas da Mitologia Greco-Romana. Dentre as<br />

principais representações pictóricas e poéticas, temos um grande número daquelas<br />

1 O presente artigo é fruto de parte de pesquisa intitulada ‖Perspectivas da representa<br />

ção da Mitologia Greco-Romana na pintura e na literatura do Renascimento italiano‖<br />

desenvolvido pelos autores junto ao Departamento de Letras Modernas da UNESP/IBILCE com<br />

apoio do CNPq ( Bolsa PIBIC/UNESP concedida aos estagiários Fernanda – 2002-2003 e<br />

Leandro 2004).


que elegeram a Deusa Vênus (para os romanos ou Afrodite para os gregos) para se<br />

referirem ao Amor. Destaca-se entre eles Alessandro Botticelli (1444-1510) e Angelo<br />

Poliziano (1454-94).<br />

Nosso objetivo nesse estudo é o de verificar como é construída a<br />

figurativização da Deusa do Amor inserida no jardim locus-amoenus mitológico na<br />

pintura ―La Primavera‖, do pintor renascentista Botticelli, e na poesia intitulada ―Il<br />

regno di Venere: il giardino‖, de Poliziano, poeta italiano que acrescentou a nova<br />

língua, ou seja, o dialeto florentino ou italiano vulgar, ao âmbito da poesia lírica,<br />

dramática e narrativa e construiu, assim, um instrumento literário que regeu também,<br />

poeticamente, o confronto ou a recuperação dos valores antigos, dos ideais<br />

clássicos iniciada no Renascimento.<br />

Ao inserir ―Il regno di Venere‖ em seu livro de poesias, quis mostrar que a<br />

matéria do amor se torna, de uma forma ou de outra, parte integrante das res<br />

gestae, ou melhor, retomando a mitologia greco-romana, o eu poético resgata a<br />

alegoria do ―amor‖. Desse poema, estudaremos um trecho que é considerado um<br />

longo parêntesis ali visto que apresenta uma digressão interessante em relação ao<br />

desenvolvimento do acontecimento principal, isto é, da caçada. Eis o poema:<br />

Vagheggia Cipri un dilettoso monte<br />

che del gran Nilo i sette corni vede<br />

e 'l primo rosseggiar dell'orizonte,<br />

ove poggiar non lice al mortal piede.<br />

Nel giogo un verde colle alza la fronte;<br />

sott'esso aprico un lieto pratel siede;<br />

u' scherzando tra' fior lascive aurette<br />

fan dolcemente tremolar l'erbette.<br />

Corona un muro d'òr l'estreme sponde<br />

con valle ombrosa di schietti arbustelli,<br />

ove in su' rami tra novelle fronde,<br />

cantan i loro amor soavi augelli.<br />

Sentesi un grato mormorio dell'onde,<br />

che fan due freschi e lucidi ruscelli<br />

versando dolce con amar liquore,<br />

ove arma l'oro de' suoi strali Amore.<br />

Né mai le chiome del giardino eterno<br />

tenera brina o fresca neve imbianca:<br />

ivi non osa entrar ghiacciato verno;<br />

non vento o l'erbe o gli arbustelli stanca<br />

ivi non volgon gli anni il loro quaderno;<br />

ma lieta Primavera maí non manca,<br />

2


ch'è' suoi crin biondi e crespi all'aura spiega<br />

e mille fiori in ghirlandetta lega.<br />

Lungo le rive e' frati di Cupido,<br />

che solo uson ferir la plebe ignota,<br />

con alte voci e fanciullesco grido<br />

aguzzon lor saette a una cota.<br />

Piacer e Insidia posati su 'l lido<br />

volgono il perno alla sanguigna rota;<br />

e 'l fallace Sperar col van Disio<br />

spargon nel sasso l'acqua del bel rio.<br />

Dolce Paura e timido Diletto,<br />

dolci Ire e dolci Paci insieme vanno:<br />

le Lacrime si lavon tutto il petto,<br />

e 'l fiumicello amaro crescer fanno:<br />

Pallore ismorto e paventoso Affetto<br />

con Magrezza si duole e con Affanno:<br />

vigil Sospetto ogni sentiero spia:<br />

Letizia balla in mezzo della via.<br />

Cotal milizia i tuoi figli accompagna,<br />

Venere bella madre degli Amori,<br />

Zefiro il prato di rugiada bagna,<br />

spargendolo di mille vaghi odori:<br />

ovunque vola, veste la campagna<br />

di rose gigli violette e fiori:<br />

l'erba di sue bellezze ha meraviglia<br />

bianca cilestra pallida e vermiglia.<br />

Trema la mammoletta verginella<br />

con gli occhi bassi onesta e vergognosa:<br />

ma vie più lieta più ridente e bella<br />

ardisce aprire il seno al sol la rosa:<br />

questa di verde gemma s'incappella:<br />

quella si mostra allo sportel vezzosa:<br />

l'altra che 'n dolce foco ardea pur ora<br />

languida cade e il bel pratello infiora.<br />

L'alba nutrica d'amoroso nembo<br />

gialle sanguigne e candide viole.<br />

Descritto ha il suo dolor Jacinto in grembo<br />

Narcisso al rio si specchia come suole:<br />

in bianca veste con purpureo lembo<br />

si gira Clizia pallidetta al sole:<br />

Adon rinfresca a Venere il suo pianto:<br />

tre lingue mostra Croco, e ride Acanto.<br />

Mai rivesti di tante gemme l'erba<br />

la novella stagion che 'l mondo avviva.<br />

Sovresso il verde colle alza superba<br />

l'ombrosa chioma u' il sol mai non arriva,<br />

e sotto vel di spessi rami serba<br />

3


fresca e gelata una fontana viva,<br />

con sì pura tranquilla e chiara vena<br />

che gli occhi non offesi al fondo mena.<br />

L'acqua da viva pomice zampilla,<br />

che con suo arco il.bel monte sospende;<br />

e per fiorito solco indi tranquilla<br />

pingendo ogni sua orma al fonte scende:<br />

dalle cui labra un grato umor distilla,<br />

che 'l premio di lor ombre agli arbor rende.<br />

Ciascun si pasce e mensa non avara,<br />

e par che l'un dell'altro cresca a gara.<br />

(POLIZIANO, 1988, p.27-31)<br />

Pode-se perceber o esboço construído pelo eu poemático de um jardim<br />

renascentista ideal e das flores que o ornam. Ele se vale da descrição do jardim<br />

locus amoenus, quer dizer, um lugar aberto, amplo e fresco, cuja origem se encontra<br />

na cultura cortês e nos romances de cavalaria e está inserido em nosso kepos,<br />

entendido como espaço cognitivo interno. O ambiente primaveril conquista um valor<br />

metafórico, e essa estação do ano aí descrita é rica em formas. À contemplação<br />

idílica se associa o tema do hedonismo, isto é, da doutrina que considera o prazer<br />

individual e imediato como o único bem possível, cara à filosofia neoplatônica do<br />

tempo. Como exemplo, podemos notar, no trecho que vai do quarto ao sétimo<br />

versos, a caracterização de tal ambiente: sentesi un grato mormorio dell'onde, / che<br />

fan due freschi e lucidi ruscelli / versando dolce con amar liquore, / ove arma l'oro de'<br />

suoi strali Amore (sente-se um grato murmúrio das ondas, / que fazem dois frescos e<br />

lúcidos riozinhos / versando doce com amargo licor, / onde arma o ouro de suas<br />

flechas o Amor) 2 . Existe, então, a presença dos murmúrios das ondas, dos riozinhos<br />

frescos e lúcidos que correm, misturando o doce e o amargo, como é o próprio<br />

amor, que traz em si o bem e o mal, o bom e o ruim, simbolizado pelo mito de<br />

Vênus.<br />

Percebe-se também que Poliziano utiliza personagens mitológicos para criar o<br />

ambiente mágico do jardim. Como figura central aparece Vênus e seu habitat é<br />

descrito. Já na primeira estrofe, mostra o quão luminoso é esse reino de magia. Ao<br />

longo do poema, aparecem descrições que tornam, cada vez mais, o jardim um local<br />

mítico e, assim, eterno. O primeiro e o segundo versos da terceira estrofe retratam<br />

² As traduções dos versos serão sempre literais e realizadas pelos autores do presente artigo.<br />

4


essa passagem: Né mai le chiome del giardino eterno / tenera brina o fresca neve<br />

imbianca. (Nunca as cabeleiras do jardim eterno / tenra geada ou fresca neve<br />

embranquece).<br />

Encontra-se, entre os figurantes, a Hora da Primavera que colorirá e fará florir<br />

o ambiente: ma lieta Primavera mai non manca, / ch‟è‟suoi crin biondi e crespi<br />

all‟aura spiega / e mille fiori in ghirlandetta lega (mas a alegre Primavera não falta<br />

nunca, / com seus cabelos loiros e crespos à aura estende / e mil flores à coroa ata).<br />

Também os filhos de Vênus, chamados de ―Amori‖, se fazem presentes no poema,<br />

com função secundária visto que só são lembrados ao se fazer referência à Vênus.<br />

Tem-se: Venere bella madre delli Amori. (Vênus bela mãe dos Amores).<br />

Prosseguindo a análise, deparamo-nos com os ―Mitos das Flores‖, que são<br />

inseridos para enriquecer o Jardim de Vênus. Buscaremos exemplicá-los concorde<br />

Kury (2001) e Ovídio (1983). Vejamos: no terceiro verso da oitava estrofe,<br />

encontramos referência ao jovem Jacinto – Descritto ha Jacinto il suo dolor in<br />

grembo (Jacinto tem a sua dor descrita no ventre). Ele foi o jovem amante do deus<br />

Apolo. Zéfiro, o deus dos ventos, por se sentir enciumado com a relação dos dois,<br />

desviou o disco com o qual eles brincavam e o fez bater na testa de Jacinto,<br />

matando-o. Renasceu como uma flor no Jardim de Vênus. O fato de renascer assim<br />

insere-o, e a todos os outros jovens descritos no poema, como personagens eternos<br />

do paraíso da deusa do amor.<br />

Narciso é também lembrado em um dos seus momentos de tensão, ou seja,<br />

quando está se olhando, fixamente, no lago. Jovem de grande beleza, Narciso atraía<br />

muitas jovens donzelas, porém não se envolveu com nenhuma delas. Não se deixou<br />

atrair nem sequer pelo triste caso da ninfa Eco que foi condenada pela deusa Hera a<br />

nunca mais usar a fala, a não ser para repetir o que lhe fosse dito. Quando se<br />

apaixonou por Narciso, passou a segui-lo, mas não conseguia dizer-lhe nenhuma<br />

palavra. Narciso tanto ignorou a pobre ninfa que ela foi viver numa caverna e lá<br />

definhou até a morte. Ele, sempre zombando do amor, foi castigado pela deusa<br />

Nêmesis, que o fez apaixonar-se por si mesmo. E, assim, Narciso passava o dia<br />

todo a olhar a sua imagem refletida no lago. Ao tentar alcançar-se, morreu afogado.<br />

As ninfas, então, resolveram enterrá-lo ali mesmo, próximo ao lago. Nesse local,<br />

desabrochou uma nova e encantadora flor a quem elas deram o nome de Narciso. O<br />

verso no qual Narciso está inserido é o quarto da oitava estrofe: Narcisso al rio si<br />

specchia come suole (Narciso no rio se olha como é costume).<br />

5


A jovem Clícia, um dos personagens do locus amoenus, também foi<br />

convertida em flor, em detrimento do seu amor por um deus. Vejamos: Si gira Clizia<br />

pallidetta al sole (Gira-se Clícia palidinha ao sol). Apesar de se voltar para o deus<br />

sol, ou Hélios, ainda está pálida, amarela. O mito narra que Clícia, uma jovem<br />

apaixonada pelo deus Hélios (o Sol) havia sido desprezada por ele, visto que o<br />

mesmo estava apaixonado por Leucote. Amargurada, Clícia conta ao pai de sua rival<br />

a aventura amorosa de sua filha. Depois disso, Hélios passou a odiá-la e Clícia<br />

definhou até morrer, já que passava todo o seu dia acompanhando com os olhos o<br />

―caminhar do sol‖. Foi transformada na flor girassol que está sempre olhando para o<br />

astro.<br />

Nota-se também o jovem Adônis como personagem tão singular no poema,<br />

uma vez que é um dos amantes da deusa Vênus e também fará parte do jardim:<br />

Adon rinfresca a Venere il suo pianto. (Adônis acalma Vênus em seu pranto). O mito<br />

diz que Mirra, filha do rei da Síria, apaixonou-se pelo próprio pai e, por meio de<br />

estratagemas, conseguiu passar doze noites com ele. Mas o rei descobriu o engodo<br />

e, furioso, perseguiu a filha com a intenção de matá-la. Os deuses, todavia, o<br />

impediram, transformando a princesa em uma árvore odorífera, a mirra. Meses<br />

depois, o tronco da árvore abriu-se e dela saiu um menino de grande beleza que<br />

recebeu o nome de Adônis. A deusa Vênus, impressionada, recolheu-o e pediu que<br />

Perséfone, esposa de Hades, o criasse às escondidas. No entanto, quando ele se<br />

tornou adolescente, Perséfone também se apaixonou e não quis devolvê-lo a Vênus.<br />

O litígio entre as duas deusas teve de ser arbitrado por Zeus. O soberano dos<br />

deuses decidiu que o rapaz passaria um terço do ano com Vênus, um terço com<br />

Perséfone e o outro terço com quem quisesse. Assim, Adônis passava dois terços<br />

do ano em companhia de Vênus. O rapaz adorava caçar, e a deusa,<br />

freqüentemente, o acompanhava em um carro puxado por cisnes. Certo dia, porém,<br />

quando caçava sozinho, um javali feroz feriu-o mortalmente. Algumas versões<br />

relatam que o javali era na verdade o ciumento deus Ares, amante de Vênus; outras,<br />

que havia sido enviado por Ártemis, ou ainda por Apolo, por razões pouco claras.<br />

Vênus acorreu imediatamente, mas era tarde demais para salvar Adônis.<br />

Entristecida, a deusa fez com que a anêmona, belíssima flor vermelha que floresce<br />

brevemente na primavera, brotasse do sangue derramado por ele. Relatos<br />

posteriores afirmam ainda que, ao socorrer o jovem, Vênus feriu-se em um espinho<br />

6


e seu sangue tingiu de vermelho as rosas, que até então eram somente de cor<br />

branca.<br />

O eu poético ainda introduz dois mitos de flores que evidenciam o amor<br />

sensual: Croco, personagem transformado pelos deuses na flor de açafrão,<br />

evidenciando-se, no verso abaixo, as suas três pétalas e Acanto, jovem ninfa que<br />

metamorfoseou-se em flor com seu próprio nome, em recompensa por corresponder<br />

ao amor de Apolo. No poema, Acanto ri, mostrando o lado prazeroso e hedonístico<br />

do sentimento: tre lingue mostra Croco, e ride Acanto (três línguas mostra Croco, e ri<br />

Acanto).<br />

Todos esses personagens mitológicos inseridos no poema fazem parte de<br />

narrativas amorosas, mostrando, assim, que a primeira função do poema é a de<br />

alegorizar o amor neoplatônico, como sentimento idealizado e sublime, quase<br />

celeste e o amor natural, ligado às flores e à eterna forma cíclica vivida por elas: flor<br />

- fruto - semente - planta.<br />

Desta mesma forma, é também a presença de tantos mitos que marca<br />

fortemente a homologia que traçamos com a pintura intitulada ―La primavera‖ de<br />

Botticelli, grande artista do Renascimento Italiano:<br />

Florença, Galeria dos Uffizi. (Albertário, 1993, p. 36)<br />

O jardim de Vênus também é representado pela pintura. Ele compõe uma<br />

espécie de moldura das personagens com suas flores, árvores e cores. Nele a<br />

primavera reina eternamente. Da direita para a esquerda, Zéfiro, o deus dos ventos,<br />

e a ninfa Clóris, que se transforma na deusa Flora, fazem desabrochar as flores,<br />

uma vez que é ela quem as espalha e Zéfiro lhes dá vida com o seu hálito<br />

7


primaveril. Ao centro, diante de uma moita de mirto, encontra-se Vênus e acima seu<br />

filho Cupido, preparando-se para flechar umas das três Graças que dançam, unidas,<br />

diante de Vênus. Fechando tal moldura, aparece Mercúrio que, com seu espadim,<br />

espanta o mal tempo do belo jardim.<br />

Entendemos que as relações que se estabelecem entre textos poético e<br />

pictórico renascentistas são claras visto que alguns autores afirmam que Botticelli e<br />

Poliziano participavam das reuniões promovidas pelo mecenas e poeta Lorenzo dei<br />

Medici, nas quais temas eram discutidos para posteriormente serem retratados ou<br />

figurativizados pelos artistas. Vale ratificar que as obras analisadas mostram que o<br />

tema escolhido pelos autores, além de ser o mesmo, pode ser analisado de acordo<br />

com a sociedade da época ou de acordo com a arte como criação estética.<br />

No texto poético, a natureza primaveril é representada com cores vivas que<br />

remontam às imagens da pintura renascentista. Poliziano descreve uma longa série<br />

de lembranças culturais, como a representação bíblica do paraíso terrestre, o mito<br />

da idade do ouro, etc. As plantas serão detalhadamente descritas. O reino da deusa,<br />

na ilha de Chipre, tem ar doce e ameno; o tempo não passa e o inverno não entra<br />

porque Mercúrio o afasta com o espadim mágico. Segundo Francastel (1982, p.<br />

259), ―as imagens concretas e os versos do poema são frutos de um capricho, já<br />

que estão ligados a atividades da época, entre eles o tema do jardim‖. O sonho do<br />

jardim é a dimensão apolínea na qual se espelha a possibilidade utópica da nossa<br />

vida coletiva, de uma sociedade mais igualitária e amena. O ideal de jardim está no<br />

inconsciente coletivo das sociedades e faz a ligação entre homem e natureza, ou<br />

seja, a ―Grande Mãe‖ ou Natureza recupera esse valor já existente desde os<br />

primórdios. Para Laura Tussi (2002), no plano simbólico, os jardins, possuem uma<br />

parcela significante na história. Assim, é considerado genius loci, visto que nos<br />

educou no senso da beleza, representada, no poema de Poliziano, pela deusa<br />

Vênus.<br />

O jardim pode se transformar em um topos mítico e lendário, pois se enxerta,<br />

como já dito, no imaginário dos indivíduos sem os abandonar e cria ou restabelece<br />

um mundo ideal, utópico, o Paraíso (Jardim do Éden). Seria um lugar secreto,<br />

desconhecido, terra prometida, fecunda e cheia de vida, de renascimento e<br />

ressurreição, lugar de arte e poesia, de fecundidade, matriz da origem do tudo, seio<br />

de vida e antro da morte. Esse movimento cíclico do nascer, crescer e morrer,<br />

presente no jardim, é representado ou alegorizado pela Natureza, que ao mesmo<br />

8


tempo em que doa, toma de volta, é o mito do eterno retorno. Ele não vai<br />

representar barreiras, discriminações, mas será, sim, hospitaleiro.<br />

O jardim locus amoenus foi retratado nas duas obras em análise. Ambos os<br />

artistas conseguem estabelecer a tensão dialética em seus textos. Poliziano, além<br />

de usar o tema do ―amor‖ e provocar o ―confronto com o antigo‖ por meio de seu<br />

poema, faz com que ele seja, igualmente, uma possível representação da estreita<br />

relação entre o homem e a ―Mãe-Natureza‖, que se faz presente no inconsciente<br />

coletivo do ser humano por meio da disposição dos mitos das flores. Botticelli utiliza<br />

o mesmo procedimento que Poliziano, já que, além de representar o jardim ideal e o<br />

―amor‖ na sua forma maior, isto é, a deusa Vênus, faz com que percebamos a<br />

inserção do contexto social ou dos rituais míticos da Florença renascentista em ―La<br />

Primavera”, por meio do ideal de beleza feminina, representado pelas vestes das<br />

personagens e pelo passo de contradança que caracteriza cada representação.<br />

Assim, o jardim aberto, lugar mítico e eterno é utilizado tanto para alegorizar ou<br />

simbolizar o amor como para representar rituais míticos, na obra de Botticelli, e o<br />

genius loci, na obra de Poliziano.<br />

Utilizando os conceitos da teoria semiótica da linha greimasiana (Greimas,<br />

1975), as homologias entre a pintura e poesia analisadas podem ser verificadas nos<br />

seguintes níveis: a) nível fundamental: com as principais oposições semânticas<br />

representadas pelo contraste morte x vida (vida como renascimento - mito do eterno<br />

retorno, mitos das flores) ou por transformação x estaticidade, etc.; b) nível narrativo:<br />

ambas representações sugerem ou inserem em si diversas narrativas, uma principal<br />

(Vênus) e várias satélites (diversos mitos em conjunção com o mito principal, rapto<br />

de Clóris e seu retorno como Flora, na pintura, ou os diversos mitos das flores, na<br />

poesia) e c) nível discursivo: o processo de enunciação resulta na descrição ideal de<br />

um jardim renascentista e das flores que o adornam, o jardim locus-amoenus, além<br />

da presença de diversos seres mitológicos (acompanhantes de Vênus).<br />

No tocante ao plano da expressão, são consonantes as presenças dos<br />

formantes figurativos (jardim, flores, dança, musicalidade, etc.) que nos levam ao<br />

plano do conteúdo de beleza, perfume, harmonia, alegria, etc. Os formantes<br />

plásticos presentes confirmam a homologia entre os textos estudados pois na<br />

categoria topológica vemos Vênus ocupando o centro de ambas representações; na<br />

categoria eidética, várias formas são sugeridas, como a circularidade da vida, por<br />

exemplo, que é representada pelos mitos das flores (morte – ressurreição – vida) ,<br />

9


no poema, e pela dança e diversos movimentos sugeridos na pintura; e, na categoria<br />

cromática, podemos perceber a harmonia e suavidade da representação pictórica a<br />

partir da escolha de cores de tom pastel e da distribuição uniforme da iluminação<br />

que igualmente é sugerida na representação poética pelas figuras de linguagem<br />

regulares, pela sintaxe de composição dos versos e pelo conteúdo semântico dos<br />

mesmos.<br />

Desta forma, na análise homológica que empreendemos entre um texto<br />

poético e um pictórico, pode-se perceber a consonância existente entre as<br />

perspectivas de representação desses mitos nos campos de expressão estudados.<br />

Ao eleger o mito de Vênus como tema, as obras ―La primavera‖ e ―Il regno di<br />

Venere: il giardino‖ expressam uma leitura desse verdadeiro símbolo mitológico que<br />

associa sua representação às idéias de beleza feminina, eroticidade, sexualidade,<br />

amor, inspiração, etc. Em virtude dessas considerações, acreditamos que as<br />

perspectivas propostas e os recursos e estratégias de construção dos textos<br />

(pictórico e poético) demonstram como o olhar do homem renascentista percebia e<br />

representava tal tema de forma harmônica e consonante em vários campos da<br />

expressão.<br />

10


Referências Bibliográficas<br />

ALBERTARIO, M. (org.) Botticelli. Milano: Pockets Electa, 1993.<br />

FRANCASTEL, P. A realidade figurativa. Trad. M. A. L. de Barros. São Paulo:<br />

Perspectiva, 1982.<br />

GREIMAS, A. J. Sobre o sentido – ensaios semióticos. Trad. A. C. C. Cezar e outros.<br />

Petrópolis: Vozes, 1975.<br />

KURY, M. G. Dicionário de Mitologia grega e romana. Rio de Janeiro: Zahar, 2001.<br />

OVIDIO. As metamorfoses. Rio de Janeiro: Ediouro, 1983.<br />

POLIZIANO, A. Stanze per la giostra . In: ORLANDO, S. (org.) Poesie italiane.<br />

Milano: Rizzoli, 1988.<br />

. Acesso em 30 nov. 2002,<br />

01:25:43. TUSSI, L. Il giardino: storia, leggende e mitologie. Conoscersi attraverso<br />

un simbolo.<br />

11


__________________________________________________________<br />

ARTIGO<br />

A REPRESENTAÇÃO ESPACIAL NO DISCURSO AUDIVISUAL<br />

*Graduada em Letras pela UNESP/ S.J. Rio Preto<br />

Mestre e Doutora em Letras pela UNESP/ S.J.Rio Preto<br />

Professora em diversos cursos da UNORP.<br />

12<br />

*Profa. Patrícia Helena MAZUCCHI-SAES<br />

Resumo: Este trabalho tem como objetivo destacar, em comerciais veiculados pela televisão, a<br />

importância dos componentes do espaço fílmico (elementos da encenação, códigos visuais e<br />

gráficos) na construção do sentido da peça publicitária. No mundo representado, fictício, o espaço é<br />

idealizado para receber ações, dentro de uma ilusão de tridimensionalidade capaz de oferecer ao<br />

observador a impressão de realidade.<br />

Palavras-chave: imagem, espaço, publicidade, tridimensionalidade.<br />

Abstract: This work aims to highlight in TV commercials the importance of the filmic space constituent<br />

parts (staging elements, visual and graphic codes) in building up the sense in publicitary plays. In the<br />

represented world, the space is idealized in order to receive actions inside an illusive area of<br />

tridimensionality capable of offering the observer the reality impression.<br />

Keywords: image; space; publicity; tridimensionality


O discurso estrutura-se a partir de três componentes: tempo, espaço e ação<br />

1 . No discurso fílmico, o espaço é o componente mais evidente e, pode-se dizer, o<br />

mais importante deles, pois é depositário de manifestações temporais e atoriais,<br />

sendo priorizado pelos sistemas de significação planares.<br />

No mundo fenomenológico, as ações se desenvolvem num lugar de<br />

existência prévia, ―real‖. O espaço real é anterior às ações realizadas pelo homem.<br />

No mundo representado, fictício, o espaço é idealizado para receber ações, dentro<br />

de uma ilusão de tridimensionalidade capaz de oferecer ao observador a impressão<br />

de realidade.<br />

Em certas situações, essa impressão de realidade pode obliterar o limite entre<br />

as noções de ―real‖ e ―representado‖ e colocar o espectador diante do efeito de<br />

realidade. O cinema e a publicidade exploram sobejamente esta possibilidade de<br />

desvincular o sujeito da ancoragem no mundo fenomenológico, levando-o para a<br />

esfera imaginária do espaço paradisíaco que, em última análise, aproxima-se do<br />

Éden, como se vê nas imagens de comerciais sobre viagens de férias, por exemplo.<br />

Esse efeito de real opera por sedução, que faz com que o observador se emocione<br />

mediante identificação com personagens, normalmente jovens, belos e sedutores,<br />

que freqüentam aquele lugar idealizado ou, simplesmente, pela projeção de um eu<br />

idealizado que retorna às origens do paraíso perdido.<br />

Um filme é projetado em uma tela plana e bidimensional. Neste espaço plano,<br />

pode ocorrer pela ilusão da terceira dimensão, a representação da profundidade que<br />

concorre para o aparecimento do efeito de realidade. O enunciado fílmico propicia o<br />

surgimento de uma terceira dimensão, denominada profundidade de campo, em que<br />

os objetos e pessoas podem ser vistos com maior nitidez. A associação do recurso<br />

tridimensional com os elementos que conferem melhor delineamento às figuras, tais<br />

como configuração plástica, luzes, sombra, cores, movimento e proporção no<br />

tamanho dos objetos, concorre para gerar o efeito de realidade das imagens<br />

projetadas em tela. Tais elementos, atuam como uma espécie de estímulo que guia<br />

o olhar do espectador e estimula sua mente a interagir com o enunciado fílmico,<br />

completando-o e estabelecendo as necessárias adequações entre imagens<br />

1 Este trabalho toma o termo ação como uma alternativa para substituir a noção de personagem<br />

considerando o fato de que, na publicidade televisiva, de curta duração, a função atorial<br />

sobrepõe-se á noção de persona ainda que correborem para a significação os traços<br />

psicológicos dos personagens ou dos seus papéis sociais.<br />

13


epresentadas e noções ou objetos representados, segundo uma direção e um ritmo<br />

impostos pelo filme:<br />

la mirada espectatorial, tando desde el punto de vista del movimiento físico<br />

de los ojos, como desde que se refiere a la atención que prestamos a lo que<br />

sucede en la pantalla, está materialmente forzada a seguir una dirección<br />

estipulada por la interacción existente entre la composición bidimensional y<br />

el efecto representado de tridimensionalidad. (CARMONA, 1991, p. 135)<br />

Tudo o que é mostrado na tela do cinema é pré-organizado e selecionado de<br />

acordo com uma perspectiva. Segundo Aumont (1995, p. 213), a perspectiva<br />

consiste na projeção dentro do espaço bidimensional e plano, de um espaço<br />

tridimensional, obedecendo a certas regras. Essa transformação geométrica visa a<br />

transmissão de informações no espaço projetado, de maneira que se garantam a<br />

reconstituição dos volumes projetados e sua disposição espacial e determina aquilo<br />

que será mostrado, como será mostrado, assim como o que será ocultado.<br />

O espaço imaginário, construído sob uma perspectiva e recortado por um<br />

enquadramento, é composto por elementos que, reunidos e organizados fazem<br />

parte do processo de encenação. Segundo Carmona (1991, p.129-35), são os<br />

seguintes os elementos do processo de encenação: cenário, natural ou artificial, que<br />

funciona como ambiência daquilo que se conta, podendo assumir também o papel<br />

de ator discursivo, como nos documentários; vestimenta, que varia entre<br />

neutralidade, efeito de naturalidade ou estilização; maquiagem, pode ser neutra ou<br />

destinada a provocar algum efeito; iluminação, o componente mais importante da<br />

construção de uma cena, pode funcionar como dispositivo retórico, segundo sua<br />

qualidade, direção, fonte e cor; distribuição e direção de atores, processos<br />

integrados de forma homogênea com os demais componentes da cena.<br />

Pelo fato de o cinema manifestar-se por imagem projetada, o estudo do<br />

discurso fílmico prevê que se abordem tanto questões internas ao enunciado quanto<br />

outras atinentes a própria natureza do meio, que é, por excelência, espacial. Trata-<br />

se, portanto, de um meio de expressão que conjuga a um só tempo, por um lado, a<br />

possibilidade de representar com grande fidelidade espaços pré-existentes ou<br />

imaginários, e, por outro, para que isso ocorra, delimita uma área num plano por via<br />

de um enquadramento de câmera cuja função primeira é definir para o espectador o<br />

14


que faz parte do ―sonho‖ vivido em tela e o que pertence ao universo de realidade<br />

que o abriga enquanto projeção.<br />

Na estruturação do seu enunciado, o cinema combina os códigos<br />

tecnológicos, visuais, gráficos, sonoros e sintáticos. Dentre esses códigos, os que se<br />

destacam imediatamente na definição e delimitação do espaço são os visuais e os<br />

sintáticos. Os visuais envolvem questões relativas à planificação e à iluminação. A<br />

planificação abrange dois aspectos: a) delimitação das bordas e do formato da<br />

imagem; b) tipos de planos, inclinação e angulação da câmera.<br />

Em relação à delimitação das bordas e ao formato da imagem, pode-se dizer<br />

que se referem ao recorte do espaço, indicando as margens do enquadramento. O<br />

formato condiciona a quantidade de elementos a serem exibidos e sua distribuição<br />

no espaço. Carmona (1991, p. 94) afirma que o formato é importante ―por cuanto<br />

implica disponer de una superficie diferente para distribuir los elementos y, en<br />

consecuencia, una diferente disponibilidad del espacio y de la cantidad de objetos<br />

incluibles en él‖.<br />

O espaço enquadrado é isolado do restante pela moldura, que separa<br />

fisicamente o universo da imagem e o que a circunda. De um lado fica o mundo do<br />

observador e de outro o da representação. A moldura pode ser objeto, como nos<br />

quadros pictóricos, dando um acabamento à imagem, ou limite, quando sugere a<br />

interrupção da imagem. No caso do vídeo tem-se a moldura da tela, do aparelho de<br />

TV. Pode existir também a moldura dentro da moldura, muito utilizada na<br />

publicidade, quando há uma tarja preta nas partes inferior e superior na tela,<br />

recortando ainda mais o espaço enquadrado.<br />

O enquadramento, resultante do trabalho da câmera, é um recurso poderoso<br />

de enunciação, porque funciona como uma ferramenta de recorte a serviço da<br />

explicitação de certas decisões sobre o que é importante e deve ser mostrado e o<br />

que deve ser omitido ou rechaçado segundo intenções definidas. A seleção do que<br />

será enquadrado é feita pela manipulação dos eixos responsáveis pela localização<br />

topográfica das figuras da representação, em relação ao destinatário:<br />

a) eixo perspectivo: há inserção da idéia de profundidade em três zonas /aqui, lá, em<br />

outra parte/;<br />

b) eixo de superfície ou angulação: situa o objeto de acordo com o sentido vertical<br />

/alto, médio e baixo/ e horizontal /direita ou esquerda/;<br />

15


c) eixo divisor: divisão em espaço in, o que provoa o campo, e off o que povoa o<br />

fora-de-campo.<br />

Associadas ao enquadramento, encontram-se as noções de campo e fora-de-<br />

campo. Campo é o ―pedaço‖ de espaço imaginário com três dimensões que é<br />

percebido na imagem fílmica. É uma porção do espaço que foi recortado pelo<br />

enunciador, segundo uma razão particular, um ponto de vista, e que é exibido ao<br />

espectador. Essa noção leva à impressão de realidade, provocada pelos efeitos de<br />

profundidade. Assim, o espectador passa a conceber o campo como real e também<br />

a imaginar o fora-de-campo, espaço que não é visto.<br />

A noção de campo evoca a de fora-de-campo, ou seja, o espaço global de<br />

onde o campo foi recortado. Aumont (1995, p. 26) define o fora-de-campo como<br />

―noção também de origem empírica, elaborada na prática da filmagem<br />

cinematográfica, em que é indispensável saber o que, do espaço prófilmico, será e o<br />

que não será visto pela câmera‖. Na imagem em movimento, o fora-de-campo pode<br />

ser visto por meio de um enquadramento móvel ou pelo encadeamento de planos.<br />

O campo, espaço in, e o fora-de-campo, espaço off, relacionam-se de<br />

diversas maneiras, por meio de procedimentos que os aproximam, criando muitas<br />

vezes no espectador a noção de espaço homogêneo e não-fragmentado, como<br />

realmente acontece, e também a impressão de continuidade temporal:<br />

El campo y el fuera de campo se relacionan a través de las entradas y<br />

salidas de personajes u objetos, de las interpelaciones realizadas hacia el<br />

fuera de campo — con el raccord de miradas como forma privilegiada — y<br />

la determinación del espacio off a través de la fragmentación de personajes<br />

y objetos de los que una parte queda excluida del encuadre. (CARMONA,<br />

1991, p. 95)<br />

O espaço off é importante a partir de suas relações com o in e, também, pelas<br />

tensões que possa provocar neste. Agregam-se aos elementos do fora-de-campo<br />

elementos como música, ruído e sons que afetam diretamente tudo aquilo que é<br />

mostrado no campo.<br />

Existe, ainda, distinção entre o fora-de-campo concreto e imaginário. O<br />

concreto é aquele onde ocorre a atualização no campo daquele espaço que era<br />

imaginário. O imaginário é quando o espaço off nunca é atualizado.<br />

16


Pelas relações estabelecidas entre campo e fora de campo, ou seja, entre o<br />

que é efetivamente visto pelo espectador e o que lhe é sugerido pelos dados<br />

bordados apreendidos na tela, a publicidade pode tecer enunciados de grande<br />

riqueza em termos de pressuposições, implicações, sugestões e subentendimento<br />

de sentidos a serem construídos pelo espectador por meio deste recurso. Auxiliam-<br />

nos na exposição desta idéia os conceitos de Landowski (1982, p. 85-101) sobre os<br />

conceitos apresentados em seu esquema de visibilidade.<br />

A visibilidade é um instrumento de transmissão do saber. O esquema ou<br />

regime de visibilidade envolve o ―ver‖ e o ―ser visto‖ e, por meio dele, decide-se o<br />

que deve ou não ser mostrado. A transmissão do saber, a relação escópica, envolve<br />

duas instâncias, um sujeito 1 que tem por objetivo ―fazer ver‖ e um sujeito 2,<br />

modalizado pelo querer, dever, poder e saber ―ver‖, ou seja, um sujeito que vê e<br />

outro que é visto. Entre esses dois sujeitos encontra-se o objeto da visão, a imagem.<br />

O sujeito 1 guia o percurso do sujeito 2, decidindo quais elementos serão<br />

privilegiados na exibição, qual deles terá maior ou menor visibilidade e como serão<br />

combinados entre si. Esses dois sujeitos serão denominados escópicos ou actantes<br />

e entram em relação a partir das modalidades do querer, dever, saber e poder ver.<br />

Para que o esquema de visibilidade se realize, são necessárias competências ou<br />

condições, como a existência de uma fonte de luz para iluminar o objeto, guiando o<br />

espectador. Nesse sentido, o observador tem que saber ver e o observável tem que<br />

querer/saber mostrar-se. Finalmente, pode-se dizer que a modalidade do querer é<br />

uma das mais importantes para que a relação escópica se atualize.<br />

O espaço plástico é, portanto, o local onde se depositam todas as<br />

informações, desde a descrição do ambiente onde se desenvolverão as ações até<br />

informações sobre estados psicológicos dos personagens.<br />

O segundo aspecto abrangido pela planificação diz respeito ao modo pelo<br />

qual o espaço e os elementos que o constitui devem ser vistos. O olhar do<br />

espectador também é guiado pelo tipo de plano adotado, pela angulação e<br />

inclinação da câmera. O enquadramento mostra-nos como a cena foi vista por quem<br />

colheu as imagens. Há, em certo sentido, uma identificação entre o olhar da câmera<br />

e o olhar do espectador, de modo que o segundo vê, a posteriori, exatamente aquilo<br />

que a lente da câmera captou anteriormente. Se, por um lado, esse procedimento<br />

pode resultar um efeito de sentido de dejá vu; por outro confere ao observador a<br />

17


sensação de onisciência em termos de desvendamento completo daquilo que lhe é<br />

mostrado.<br />

Os planos podem ser caracterizados segundo: tamanho (geral, americano,<br />

médio, primeiro plano, primeiríssimo plano, detalhe, conjunto, master); duração<br />

(plano-seqüência); distância (detalhe, conjunto, master) e movimento (fixo ou em<br />

movimento). A escolha dos tipos de planos, como a de qualquer recurso utilizado em<br />

um filme, é uma questão de caráter estilístico, de ponto de vista. A publicidade utiliza<br />

freqüentemente closes, detalhes e primeiríssimo plano para realçar o objeto<br />

anunciado e seus benefícios. Anúncios de dentifícios operam com o close, outros<br />

que procuram evidenciar a amplidão de horizontes atribuída a determinado fator<br />

trabalham com a câmera aberta. Não raramente o efeito de expansão é conseguido<br />

por uso da lente grande angular para associar a amplitude aos espaços internos de<br />

um imóvel ou de um automóvel. Curiosamente, as noções de tempo e espaço<br />

entrelaçam-se nos comerciais de TV que procuram evidenciar os efeitos de um<br />

produto de beleza, como um anti-rugas ou um anti-estrias, jogam com imagens do<br />

antes e depois da utilização do produto. Para isso, no antes fazem uso de closes,<br />

primeiríssimos planos, realçando a pele envelhecida e danificada. Para efeito de<br />

construção do sentido, utilizam-se algumas estratégias relativas à transgressão de<br />

uma previsibilidade imposta pela própria linguagem cinematográfica. Com alguma<br />

freqüência, vemos anúncios usarem o primeiro plano para focalizar imagens com<br />

iluminação difusa e pouca nitidez, relativas à noção de depois, em contrapartida a<br />

absoluta nitidez de um close associado à noção de tempo do antes. Compreende-se<br />

que tal recurso exime a mensagem publicitária de responsabilidade perante o<br />

Código de Defesa do Consumidor, pelo fato de atribuir ao produto capacidades<br />

milagrosas de transformação da realidade. Anúncios sobre os benefícios de um<br />

creme anti-celulite empenham-se em mostrar deformações associadas à noção do<br />

antes e imagens de menor nitidez, associadas à noção de depois do uso do produto.<br />

A noção de plano pressupõe a de campo que, como já dissemos, é a parte do<br />

espaço que está sendo enquadrada. O enquadramento, por sua vez, corresponde<br />

ao limite do campo. Ao estabelecer a relação entre observador e imagem, pode<br />

sugerir ao primeiro a idéia de fragmentação e descontinuidade diferente do espaço<br />

natural e também propor ao enunciador a criação de espaços e imagens surreais.<br />

O recurso da posição da câmera, que envolve angulação e inclinação,<br />

também está a serviço da organização dos elementos no espaço imaginário. Seu<br />

18


uso determina como a imagem será mostrada, estabelecendo posição frente à cena.<br />

Existem três categorias básicas de angulação: câmera normal ou posicionada na<br />

altura dos olhos do espectador, plongé e contre-plongé e, em relação à inclinação, a<br />

posição pode ser normal ou posicionada na direção do espectador, inclinada para a<br />

direita ou para a esquerda.<br />

De toda maneira, não se pode perder de vista a idéia de que qualquer que<br />

seja a angulação, posição ou inclinação da câmera, ela sempre estabelecerá um<br />

ponto de vista de onde se narra a história e de onde ela deve ser vista.<br />

A iluminação é outro código que contribui para a organização do espaço<br />

enquadrado e para a produção de sentidos. Ela pode tornar visíveis ou obscuros os<br />

elementos no espaço, como também favorecer a desreferencialização. A luz pode<br />

ter caráter neutro ou simbólico, sempre relacionados com a questão do ponto de<br />

vista. Além disso, mostra e esconde e nem sempre o mais visível ao observador é o<br />

mais importante ao projeto enunciativo como um todo. O esquema de visibilidade<br />

serve-se de elementos do código da iluminação, em primeira instância, para<br />

ressaltar elementos; entretanto, faz parte do engendramento enunciativo agenciar<br />

procedimentos de simulação e dissimulação, subordinados a um projeto mais<br />

ousado, de intenções freqüentemente ocultas para o observador, pelo qual omitem-<br />

se alguns dados que devem ser encontrados, mediante esforço participativo, e<br />

oferecem-se outros de menor relevância para serem apreendidos sem qualquer<br />

dificuldade. Em outras palavras, nem sempre aquilo que é mostrado em sua<br />

plenitude é o mais importante para a consecução deste projeto de recepção; no<br />

processo de garimpagem dos sentidos mal delineados pelo plástico pode figurar<br />

toda a força persuasiva da mensagem.<br />

A coloração e, principalmente, o contraste causado pelo branco e preto<br />

versus o colorido é outro código organizador do espaço construído. O uso de<br />

determinada cor sugere uma significação particular. Como exemplo, podemos citar<br />

que, atualmente, o uso do colorido é comum e qualquer escolha pela utilização de<br />

branco e preto produz o sentido de um desvio. Na publicidade, tem sido comum o<br />

uso do colorido para destacar o objeto anunciado, permanecendo o restante do<br />

espaço enquadrado em preto e branco. Sabe-se que a sintaxe visual prevê a<br />

contaminação do sentido entre os elementos que compõem a imagem. O diálogo<br />

entre preto e branco, difuso e colorido, realçando o elemento nítido, pode gerar o<br />

sentido mais amplo, que apontaria para categorias como /importante/ versus<br />

19


secundário/, /animado/ versus /inanimado/, /vida/ versus /morte/, /dinamicidade/<br />

versus /estaticidade/ e outros que apareceriam pelo trabalho de uma análise<br />

empenhada em desconstruir, selecionar e articular uma linha isotópica sustentada<br />

por dados fornecidos pelo próprio texto em exame. Uma análise dessa natureza<br />

prevê o estudo do enquadramento relacionado ao uso de outros recursos como<br />

iluminação, coloração, angulação e inclinação da câmera, que se prestam a valorizar<br />

esquemas de visibilidade disseminando informações passíveis de serem recolhidas<br />

pelo observador no processo de articulação do sentido.<br />

Dentre os códigos que se destacam em relação ao espaço estão aqueles<br />

encarregados da ordenação sintática, como a montagem, operação que organiza o<br />

conjunto dos planos que formam um filme, segundo uma ordem pré-fixada<br />

(CARMONA, 1991, p. 109). A montagem é um princípio organizador que realiza uma<br />

operação sintagmática, selecionando e ordenando fragmentos espácio-temporais.<br />

As relações podem ser dadas por continuidade, elipses ou retrocessos, no caso das<br />

temporais, e por continuidade ou distanciamento, no caso das espaciais. Para<br />

efetivar essas relações, a montagem pode ser alternada, paralela ou convergente.<br />

A montagem, entretanto, não é só um recurso técnico de seleção sintática de<br />

elementos. Busca também estabelecer uma relação semântica entre as partes do<br />

filme, tornando-se um recurso utilizado para criar perspectiva e ponto de vista. 2<br />

Essas relações semânticas contribuem para produção do sentido denotado,<br />

na organização dos elementos que compõem a ação, conduzindo a uma relação de<br />

causalidade e/ou temporalidade e sentido conotado, criando, na junção de<br />

elementos distintos, efeitos metafóricos. A montagem tem também a função de<br />

estabelecer funções rítmicas entre os blocos. Há dois tipos de ritmo: a) temporais, na<br />

duração das formas visuais e na trilha sonora e b) plásticos, que determinam a<br />

organização plástica da imagem.<br />

As junções e disjunções no encadeamento dos planos, os procedimentos de<br />

articulação no campo, conduzindo à perspectiva e à profundidade de campo levam<br />

ao estabelecimento de sentidos, confluindo onisciência à câmera.<br />

2 Recurso eficaz para a arquitetura do sentido, o ponto de vista enunciativo responde pelo modo<br />

pelo qual dada história é contada. Sabe-se que a ordem de apresentação das cenas e<br />

seqüências é determinante para a criação de estados de ânimo no espectador. O que ocorre<br />

no cinema não é muito diferente daquilo que acontece nas nossas narrativas triviais, cujas<br />

seqüências de fatos são apresentadas em ordens distintas, segundo as intenções<br />

momentâneas de se colocar o interlocutor a favor ou contra algum ponto de vista ou<br />

acontecimento.<br />

20


A montagem recobre implicitamente uma representação temporal, pois a<br />

organização dos blocos em seqüência estabelece relações temporais entre eles,<br />

apesar de se tratar de um tempo artificial, sintético, pois os blocos de tempo<br />

relacionados não são contíguos na realidade.<br />

Como conclusão, podemos dizer que todos os códigos que atuam no espaço<br />

enquadrado por uma câmera têm uma função específica. Além dos códigos visuais e<br />

sintáticos de que tratamos com mais ênfase, os códigos sonoros e gráficos também<br />

devem ser sempre levados em conta no momento de uma análise. Vozes, músicas,<br />

ruídos e também toda a escrita que é percebida na tela do cinema contribuem para<br />

guiar o espectador na sua leitura e interpretação do discurso.<br />

Como já dissemos, o enunciado publicitário é concebido e organizado<br />

segundo uma perspectiva e, portanto, toda a escolha realizada pelo enunciador é<br />

baseada em um ponto de vista, em uma ideologia, que geralmente tem por meta<br />

seduzir o enunciatário, reavivando seus sonhos.<br />

A seguir ilustraremos algumas questões levantadas até o momento, no<br />

anúncio publicitário dos produtos SBP, Brastemp e Mc Bacon.<br />

A representação espacial na publicidade<br />

O comercial do produto SBP, selecionado entre os melhores de 1994, no 19º<br />

Anuário, inicia-se mostrando o SBP em primeiro plano, enquadramento frontal, com<br />

o fundo um pouco desfocado, onde se percebem objetos de limpeza. A cena<br />

seguinte mostra, em plano detalhe, um close no selo da embalagem do veneno, que<br />

contém a novidade. Uma voz em off diz: ―SBP inovou mais uma vez. SBP nova<br />

fórmula, com princípio ativo Gokilaht mata até baratas, sem dó e sem cheiro‖.<br />

Há um corte e iniciam-se montagens que alternam planos com a câmera<br />

mostrando, a partir da visão da barata, a ação do veneno. As cenas se passam nos<br />

diversos locais da casa, como sala, banheiro, dispensa, cozinha e quarto de criança.<br />

As imagens que vemos são emitidas a partir do ponto-de-vista do inseto,<br />

procedimento que sugere a posição enunciativa da câmera subjetiva. A imagem da<br />

pessoa que aplica o veneno aparece sempre entre dois ou mais objetos, sugerindo<br />

ao espectador que a barata está sempre se escondendo. O efeito de sentido da<br />

inclinação da câmera, sempre de baixo para cima, define a localização do ponto-de-<br />

21


vista e reflete a posição enunciativa, criando identificação do sujeito que observa.<br />

Por este trabalho da câmera o observador é guiado pelo ponto-de-vista do inseto.<br />

O recurso de câmera subjetiva e interiorização, de iluminação difusa quando o<br />

veneno é aplicado, simboliza o poder do produto e, considerando-se o ponto-de-<br />

vista subjetivo da narrativa, o escurecimento da cena sugere a conseqüente morte<br />

do inseto.<br />

Pela utilização em off da música de Adoniran Barbosa, como recurso sonoro,<br />

percebe-se a intertextualidade corroborando para a construção do sentido. Aliados<br />

às imagens, os termos e expressões "bala de carabina", "veneno estricnina",<br />

"peixeira de baiano", "atropelamento de automóver" e "bala de revórver", que<br />

possuem carga semântica de valor altamente ameaçador, dão maior credibilidade ao<br />

produto, reforçando a mensagem de que sua ação é eficaz e definitiva.<br />

A campanha da Brastemp, que obteve premiação bronze no 18º<br />

Anuário/1993, conta com três comerciais construídos da mesma forma e adotando o<br />

mesmo estilo de organização dos elementos no espaço plástico enquadrado,<br />

variando somente a época abordada, de acordo com os modelos dos refrigeradores<br />

anunciados. Para fins de ilustração dos sentidos levantados, este trabalho analisará<br />

somente o primeiro comercial da campanha.<br />

O comercial mostra o interior de uma geladeira, com a câmera em angulação<br />

normal, posicionada dentro dela. O observador tem o ângulo de visão de quem está<br />

supostamente dentro da geladeira, de frente para a porta. Esse recurso da câmera<br />

subjetiva coloca o enunciatário em posição privilegiada, de onde ele pode perceber<br />

claramente a situação.<br />

Em primeiro plano, tem-se a visão do interior da geladeira, que está<br />

congelada com grandes blocos de gelo e, ao fundo, a cozinha e um homem. Em off,<br />

uma música dos anos 70. Uma mulher pega uma jarra de suco e se dá conta de que<br />

ele está congelado. Ela não dá importância ao fato e volta a dançar com o rapaz. A<br />

seguir, tenta colocar um alimento na geladeira, mas não consegue devido à grande<br />

quantidade de gelo. Então, pega um martelo para quebrar o gelo, mas também não<br />

obtém resultado satisfatório, danificando ainda mais o refrigerador, que tem as luzes<br />

apagadas. Uma voz off diz: ―A sua época não tem comparação, mas, não é por isso<br />

que você vai ficar parado no tempo. Troque sua geladeira velha por uma Brastemp<br />

Frost Free que não precisa descongelar nunca‖.<br />

22


Em plano geral, câmera plongé, é mostrada a nova Brastemp, com as portas<br />

abertas, dando idéia do tamanho e do espaço interno. A voz off diz: ―Olha como<br />

você vai se sentir moderna, avançada, à frente do seu tempo‖. Os recursos gráficos<br />

complementam com o slogan: ―Brastemp. Não tem comparação‖.<br />

Os recursos espaciais utilizados para a construção do sentido utilizados nos<br />

três comerciais foram basicamente o enquadramento e a posição subjetiva da<br />

câmera, definindo o ponto de vista de onde deve ser visto o anúncio e também<br />

privilegiando determinadas situações em detrimento de outras. A perspectiva<br />

adotada e o plano de visão que o espectador tem colocam-no entre as grades<br />

superior e inferior de uma das prateleiras. Essas grades funcionam como moldura do<br />

espaço enquadrado, delimitando ainda mais o campo de visão e levando o<br />

observador a um certo efeito de real, como se pudesse sentir a falta de espaço e<br />

demais problemas do refrigerador.<br />

A iluminação contribui para a construção do sentido, pois é muito difusa,<br />

embaçada, devido à grande quantidade de gelo. Na encenação, a vestimenta<br />

adotada em cada um dos anúncios retrata a época abordada, assim como os<br />

elementos do fora de campo, como a música e a voz off.<br />

O comercial do Mac Bacon, que obteve premiação ouro no 19º Anuário/1994,<br />

inicia-se com cenas que retratam uma grande festividade, com fogos de artifício,<br />

bexigas, bandeiras e banda de música. A montagem justapõe cenas onde são<br />

mostradas autoridades em palanques, pessoas saindo às ruas, aviões das forças<br />

armadas, balsas lotadas, trens, carros, enfim, toda a população está indo ao Mac<br />

Donald‘s para provar o novo sabor: o Mac Bacon que acaba de ser lançado.<br />

Concomitantemente, uma voz off faz o seguinte discurso: ―Uma cerimônia simples,<br />

com a presença de autoridades civis, militares, eclesiásticas e da população em<br />

geral. O Mac Donald‘s apresenta o seu mais novo sabor: Mac Bacon. Pessoas saem<br />

de todos os cantos, o sabor de Mac Bacon toma conta da nação‖.<br />

A mídia toda, em seus variados segmentos como jornal, rádio e TV, está<br />

voltada para a cobertura do evento, sendo a notícia transmitida pelas emissoras e<br />

recebendo destaque nas manchetes dos jornais. Mostra-se o Mac Bacon rodeado<br />

por câmeras fotográficas e microfones. Todos comentam que o sabor é formidável, o<br />

preço é bacana e que a fatia de bacon é redonda. A notícia é assunto em todos os<br />

segmentos da sociedade: policiais, pilotos de avião, secretárias, executivos,<br />

23


advogados, políticos 3 . Entre uma cena e outra é mostrado o lanche e também as<br />

manchetes de jornais.<br />

No final, mostra-se um idoso lendo a edição extra de um jornal, cuja<br />

manchete anuncia: ―Fatia redonda de Bacon, boato ou verdade? A voz off finaliza:<br />

―Mac Bacon: fatia redonda e preço bacana‖.<br />

A proposta do enunciado é transformar o lançamento do Mac Bacon em<br />

grande evento, numa notícia inusitada, que abala toda a população, principalmente,<br />

pela novidade de conter uma fatia de bacon redonda. Para isso, os elementos<br />

espaciais foram de decisiva importância na sua construção. As imagens parecem<br />

terem sido retiradas de filmes e, a partir delas, haver sido realizadas dublagens para<br />

encenar a transmissão da novidade. Nos diversos espaços focalizados, houve<br />

minucioso trabalho de caracterização.<br />

A coloração apresenta-se, neste anúncio, como um dos elementos espaciais<br />

que mais colaboraram para a organização dos sentido no espaço plástico<br />

enquadrado. O comercial é todo em preto e branco e o lanche é o único elemento<br />

colorido, favorecendo o esquema de visibilidade, ao destacar o que realmente deve<br />

ser visto com destaque e colocado em segundo plano aquilo que é secundário,<br />

segundo a perspectiva adotada.<br />

A montagem é outro código responsável pelo sucesso do anúncio. Por meio<br />

dela são estabelecidas relações semânticas entre as cenas justapostas, no que se<br />

refere à divulgação do Mac Bacon em diferentes espaços, abrangendo toda a cidade<br />

e também reforçando a notícia com imagens do lanche e das manchetes alternadas<br />

entre as cenas.<br />

Reforçando a idéia de que a notícia atinge toda a população, observa-se,<br />

aliada à montagem, a organização dos elementos dentro do enquadramento, dada<br />

pela encenação. Os diversos segmentos da sociedade que mencionamos acima<br />

estão inseridos em um cenário característico e recebem vestimenta estilizada,<br />

realçando as particularidades de cada um. Podemos citar os políticos e demais<br />

celebridades, como as militares e eclesiásticas em lugares privilegiados em uma<br />

cerimônia, como o palanque; executivos em escritórios, a vestimenta das<br />

apresentadoras de TV e os advogados em tribunais.<br />

3 Esta é uma das situações em que o papel social das personagens serve de âncora para a construção do<br />

sentido, sobrepondo-se à usual prevalência da ação sobre outros traços específicos dos atores discursivos.<br />

24


Em relação à posição da câmera, observamos que a maioria dos planos são<br />

gerais e a angulação é normal, sendo o destaque do primeiro plano dado ao Mac<br />

Bacon e às manchetes de jornais, ficando os demais componentes dessas cenas em<br />

segundo plano.<br />

Os elementos do fora-de-campo, como a música, os ruídos e o comentário<br />

em off do narrador, reforçam as imagens exibidas no campo. Podemos notar, no<br />

discurso do narrador, certa ironia, ao dizer que a cerimônia de lançamento é<br />

―simples‖, pois as imagens nos mostram o oposto. É importante destacar que neste<br />

comercial existem duas figuras: o lanche e a figura retórica da ironia, pois nada no<br />

comercial é simples, desde a sua apresentação até a polêmica criada em torno do<br />

novo lanche. Essa ironia é percebida claramente pela discordância entre o verbal e o<br />

visual. No plano verbal, o narrador anuncia que a cerimônia é simples. No entanto, o<br />

plano visual nos mostra o oposto, nada é simples. Pelo recurso à hipérbole visual,<br />

vemos que o lanche, particularmente a novidade de conter uma fatia de bacon<br />

redonda, atingiu a universalidade, criando uma polêmica que atingiu a sociedade em<br />

todos os seus segmentos.<br />

Os códigos gráficos destacados pelo close nas manchetes também estão a<br />

serviço da composição espacial, uma vez que estão inseridos no enquadramento e<br />

reforçam a mensagem do anúncio.<br />

Pelo exposto, pode-se observar que a maneira como os elementos do espaço<br />

plástico são organizados e selecionados conduzem o espectador a um percurso de<br />

leitura que o auxiliam na construção do sentido.<br />

25


Referências bibliográficas<br />

AUMONT, J. A imagem. 2.ed. Campinas: Papirus, 1995.<br />

CARMONA, R. Cómo se comenta un texto filmico. Madri: Catedra, 1991.<br />

DONDIS, D. Sintaxe da linguagem visual. São Paulo: Martins Fontes, 1991.<br />

GAUTHIER, G. Viente lecciones sobre la imagen y el sentido. Madri: Catedra, Signo<br />

e Imagen, 1992.<br />

GROUPE D‘ENTREVERNES. Analyse sémiotique des textes. Lyon: Presses<br />

Universitaires de Lyon, 1979.<br />

LANDOVISKI, E. A sociedade refletida. Campinas: Pontes, 1982.<br />

MAZUCCHI-SAES, P.H. Procedimentos de arquitetura do sentido no discurso<br />

publicitário. São José do Rio Preto, 2000. 225p. Dissertação (Mestrado em Letras)<br />

— Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas, Campus de São José do Rio<br />

Preto, Universidade Estadual Paulista.<br />

REQUENA, J. G., ZÁRATE, A. O. El espot publicitário: las metamorfosis del deseo.<br />

Madri: Catedra, 1995.<br />

VANOYE, F.,GOLIOT-LÉTÉ, A. Ensaio sobre a análise fílmica. Trad. de Marina<br />

Appenzeller. Campinas: Papirus, 1994.<br />

VESTEGAARD, T., SCHORDER, K. A linguagem da propaganda. Trad. João Alves<br />

dos Santos. São Paulo: Martins Fontes, 1994.<br />

26


__________________________________________________________<br />

ARTIGO<br />

DE BAMBU RACHADO AO SOM DIGITAL:<br />

HISTÓRIA DO RÁDIO DE SÃO JOSÉ DO RIO PRETO<br />

27<br />

* Vera Lúcia Guimarães REZENDE<br />

*Graduada em Jornalismo pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Especialista em<br />

Comunicação e Marketing pela União das Faculdades dos Grandes Lagos de São José do Rio Preto.<br />

Mestre em Mídia e Cultura pela Universidade de Marília-SP.<br />

RESUMO: Este trabalho aborda um pouco da trajetória histórica do rádio de São José do Rio Preto,<br />

no Noroeste Paulista, e o esforço das emissoras locais em acompanhar a evolução do mercado<br />

midiático na transição para o século XXI. O rádio rio-pretense, assim como em outras cidades do<br />

interior do Brasil, vive dificuldades causadas pela falta de anunciantes e a queda na audiência.<br />

Descapitalizado, o setor investe pouco em programação de qualidade e se vê, por isso, vulnerável ao<br />

avanço das igrejas, evangélicas principalmente, cada vez mais interessadas em ocupar espaço na<br />

mídia. Procura-se, ainda, traçar, em linhas gerais, um quadro do mercado de rádio de São José do<br />

Rio Preto e suas estratégias para se manter no ar em tempos de tecnologia digital.<br />

PALAVRAS-CHAVES: rádio; igreja; mídia local; mercado.<br />

ABSTRACT: This work approaches a little of the historica way for the radio in São José do Rio Preto,<br />

Northeast of São Paulo State and the efforts of local transmission companies to catch up with the<br />

mediatic market evolution in the transmission towards the XXI century. The radio in Rio Preto, as well<br />

as in other cities in the interior of Brazil get along with difficulties caused by the lack of advertisers and<br />

the felling of the audience. Decaptalized now the sector invest little in quality programming and is<br />

therefore vulnerable for churches taking over, mainly evangelist ones which are more and more<br />

interested in filling the spaces in the media . We aimby general ways to establish and overal view of<br />

the radio market in São José do Rio Preto and thein strategies in order to keep up on the air in times<br />

of digital technology.<br />

KEYWORDS: radio; church; local mídia; market.


De como surgiu esta terra de São José<br />

A ocupação da última fronteira de sertão no estado de São Paulo teve início<br />

na primeira metade do século 19, quando colonizadores de Minas Gerais se<br />

estabeleceram no Noroeste paulista comprando terras, plantando lavouras,<br />

formando os primeiros rebanhos de gado. O fundador do Arraial de São José do Rio<br />

Preto, João Bernardino de Seixas Ribeiro, chegou à região, vindo de Ouro Preto, em<br />

1840, em companhia da mulher e cinco filhos para tomar posse de uma área. O<br />

lugarejo prosperou e em 1852, Luis Antonio da Silveira doou parte de sua<br />

propriedade à memória de seu santo protetor, São José, próxima a um rio de águas<br />

escuras, onde já havia gente morando. João Bernardino tratou de erguer logo um<br />

cruzeiro e uma capelinha onde o povo pudesse orar. Surgiu assim o patrimônio que<br />

deu origem à cidade de São José do Rio Preto, que 42 anos depois conquistou a<br />

emancipação política tornando-se município.<br />

Os imigrantes árabes, espanhóis, portugueses e italianos aceleraram o<br />

desenvolvimento urbano. Logo surgiram escolas, cartório, fórum, cadeia pública,<br />

serviço de limpeza urbana, a infra-estrutura de uma nova cidade. Em 1912, com a<br />

chegada da Estrada de Ferro Araraquarense, começou a formação do entreposto<br />

comercial em que, mais tarde, se tornaria pólo econômico regional. Através do trem<br />

era despachada a produção agrícola e, ao mesmo tempo, chegavam mercadorias e<br />

materiais da capital. Aos poucos a terra de São José deixava para trás a pecha de<br />

boca do Sertão de Avanhandava. O lugar marcado pela saga dos aventureiros em<br />

busca de riqueza e pela luta dos pioneiros nas novas terras virou referência de<br />

desenvolvimento para todo o estado.<br />

São José do Rio Preto foi uma das primeiras cidades brasileiras a conseguir<br />

autorização para implantar uma emissora de rádio. A concessão saiu para a cidade<br />

em 1927, apenas quatro anos depois da instalação da pioneira Sociedade Rádio Rio<br />

de Janeiro, por Edgard Roquette Pinto, em setembro de 1923. A PRB-8 Sociedade<br />

Rádio Rio Preto surgiu graças ao esforço do dentista Raul Silva que ocupava o<br />

cargo de primeiro-secretário da Associação Comercial. Ele estava encantado com a<br />

novidade tecnológica e convenceu a diretoria da entidade sobre a importância de se<br />

ter o aparelho de rádio-telefônico. Argumentou que através do rádio, comerciantes,<br />

produtores rurais e profissionais liberais, como o próprio Raul Silva, teriam acesso a<br />

informações econômicas em primeira-mão sintonizando as ondas da PRA-E<br />

28


Sociedade Rádio Educadora Paulista, no ar na cidade de São Paulo desde 1923. A<br />

empreitada, no entanto, não seria barata, pelo menos 2:500$000, dois contos e<br />

quinhentos mil réis. Para levantar a quantia, foram sorteadas 45 debêntures entre os<br />

associados dispostos a emprestarem o dinheiro. (ARANTES, 2001, p 253)<br />

Mas entre a mobilização para trazer o rádio para o Noroeste paulista e a<br />

efetiva implantação da emissora houve um intervalo de oito anos. Quando a PRB-8<br />

entrou no ar, em 1935, São José do Rio Preto era servida por uma linha aérea da<br />

Vasp, fazendo a ligação com Ribeirão Preto, Uberaba e São Paulo. Já havia dois<br />

cinemas e dois jornais em circulação, A Notícia e o Diário de Rio Preto. A instalação<br />

da primeira emissora de rádio foi, portanto, mais uma etapa do desenvolvimento<br />

econômico e cultural de São José do Rio Preto.<br />

Taquara rachada<br />

A precariedade e o improviso eram marcas das primeiras emissoras de rádio<br />

brasileiras e, em Rio Preto, não foi diferente. Passado o impacto das transmissões<br />

iniciais da PRB-8, os ouvintes não pouparam críticas à má qualidade do som. A<br />

população logo apelidou a rádio de ―Bambu rachado‖ e ―Taquara rachada‖.<br />

A primeira rádio rio-pretense não chegou a viver o período de vacas magras<br />

em que as emissoras não podiam transmitir anúncios comerciais e por isso<br />

dependiam financeiramente de mensalidades de associados. No início, as rádios no<br />

Brasil não tinham outra fonte de renda senão estas contribuições, porque, além da<br />

propaganda ser proibida, as emissoras eram controladas por clubes e associações.<br />

Sônia Virgínia Moreira explica que os sócios além de ouvintes eram também<br />

programadores e locutores, pois, naquela época, apenas as pessoas com alto poder<br />

aquisitivo tinham acesso ao rádio. A elite da época, que possuía meios para adquirir<br />

um aparelho, gostava de ópera, possuía em casa discos. Esses discos eram cedidos<br />

temporariamente às rádios para que cada uma pudesse programar suas atrações<br />

(MOREIRA, 1991, p 16). O caráter elitista se explica também porque o professor<br />

Edgar Roquette Pinto, considerado o pai do rádio brasileiro, acreditava que um<br />

veículo de comunicação tão poderoso não poderia ser usado comercialmente.<br />

Deveria ser um instrumento para crescimento cultural e educacional do povo.<br />

29


Nós que assistimos à aurora do rádio sentimos o que deveriam ter sentido<br />

alguns dos que conseguiram possuir e ler os primeiros livros. O rádio é o<br />

jornal de quem não sabe ler; é o mestre de quem não pode ir à escola; é o<br />

divertimento gratuito do pobre; é o animador de novas esperanças; o<br />

consolador dos enfermos; o guia dos sãos, desde que o realizem com<br />

espírito altruísta e elevado. (Apud TAVARES, p.8)<br />

As intenções de Roquette Pinto eram as melhores possíveis, mas na medida<br />

em que os aparelhos de rádio ficavam mais acessíveis à população, aumentava<br />

também a exigência por maior diversidade de programação, o que implicava mais<br />

custos. Os próprios associados das emissoras não conseguiram manter o modelo de<br />

gestão por muito mais tempo e começaram a repassá-las para grupos que<br />

identificavam no rádio um bom negócio.<br />

A profissionalização de fato veio em 1932, quando o então presidente Getúlio<br />

Vargas baixou um decreto liberando a veiculação de propaganda. O veículo perdeu<br />

seu caráter educativo oficial, mas, por outro lado, ganhou em qualidade e<br />

popularidade, dando início à chamada Era de Ouro do rádio brasileiro, na década de<br />

40. O maior expoente desta fase foi a Rádio Nacional do Rio de Janeiro, com seus<br />

programas de auditório, humorísticos, radionovelas e o jornalismo do Repórter Esso.<br />

A programação da Nacional influenciou o jeito de fazer rádio em todo o Brasil,<br />

inclusive a PRB-8.<br />

Nas décadas de 40 e 50, a Rádio Rio Preto desenvolveu uma programação<br />

eclética e identificada com a comunidade. Os clubes de futebol locais, América<br />

Futebol Clube e Rio Preto Esporte Clube, eram notícia em A Marcha do Esporte,<br />

programa diário comandado por Rubens Munis 1 e Alexandre Macedo. A cobertura<br />

desportiva era uma das atrações da programação da PRB-8, que fazia transmissão<br />

ao vivo de jogos do campeonato em cidades da região.<br />

As estrelas do cast da emissora cantavam no programa A Tenda do Adib,<br />

apresentado pelo diretor artístico da rádio Adib Muanis. De acordo com o álbum<br />

Astros e Estrelas do Nosso Rádio 2 publicado em 1957, faziam sucesso na época<br />

.<br />

1 Rubens Munis é irmão de Adib Muanis, diretor artístico da PRB-8. Ele explicou, em entrevista<br />

gravada pela autora em maio de 2004, que modificou o sobrenome para se diferenciar do irmão<br />

que também trabalhava na emissora. Somente na década de 70 quando assumiu o controle da<br />

Rádio Independência AM, é que retomou o sobrenome Muanis.<br />

2 O álbum foi publicado graças ao patrocínio de 16 lojas da época em São José do Rio Preto,<br />

entre elas a Casa Armênia, Paraíso do Long-Play, Lojas Singer e Casas Pernambucanas. O<br />

acervo do CONDEPHACT - São José do Rio Preto não conta com nenhum exemplar original do<br />

álbum, mas dispõe para consulta de reproduções das páginas da publicação.<br />

30


cantores como Arnaldo Colturato, prata da casa, que estreou no rádio aos 12 anos<br />

diante do microfone da PRB-8. Como a paraibana Maria Lúcia, cantora com<br />

passagem pelas rádios de Bauru, Marília, Votuporanga e até na Rádio Nacional do<br />

Rio de Janeiro e também Maria Luzia, descoberta no programa de calouros da PRB-<br />

8, Degraus do Sucesso, e presença freqüente em A Tenda do Adib.<br />

O público infantil tinha espaço na programação da Rádio Rio Preto com O<br />

Clube da Cirandinha. Um concurso de talentos mirins no qual os concorrentes<br />

cantavam, dançavam ou declamavam. Havia também a eleição da rainha do<br />

programa que ao final desfilava com coroa, cetro e capa de veludo. As finalistas<br />

ficavam com o título de princesas e ganhavam uma boneca.<br />

Um terceiro irmão Muanis, o caçula César, também atuava na rádio como<br />

locutor de programas musicais. No álbum Astros e Estrelas de Nosso Rádio, ele<br />

aparece fazendo pose de galã, aos 20 anos. A publicação foi organizada pelo<br />

radialista Zacharias Waldomiro do Vale que fazia muito sucesso na rádio<br />

encarnando o caipira Chico Berlamino no programa A Fazendinha do Chico<br />

Berlamino, todas as manhãs. Na apresentação da revista, o público radiouvinte era<br />

convocado a valorizar os artistas locais.<br />

Aqui estão em dados sintéticos as biografias de todos aqueles que, de<br />

algum modo ou de outro, com menor ou maior destaque, emprestam sua<br />

colaboração à radiofonia rio-pretense. São eles, prezado leitor, os astros e<br />

estrelas do nosso rádio, um rádio modesto, mas que é nosso, e como tal<br />

deve sempre ser encarado por você, que precisa continuar como até aqui, a<br />

estimulá-lo com o seu incentivo e a querê-lo como se deve querer tudo<br />

aquilo que nos pertence. (Trecho do texto de apresentação do álbum Astros<br />

e estrelas de nosso rádio, assinado por Wilson Guimarães, p. 5)<br />

A PRB-8 Rádio Rio Preto reinava absoluta junto ao público do Noroeste<br />

Paulista que ao mesmo tempo recebia a influência econômica e cultural irradiada<br />

pela cidade de São José do Rio Preto. Por causa deste prestígio, a emissora era<br />

parada obrigatória dos artistas famosos de passagem pela região, sobretudo<br />

sertanejos como Cascatinha e Inhana, Vieira e Vierinha e as Irmãs Galvão.<br />

Rádio Difusora foi a segunda emissora local<br />

Em 1957, a PRB-8 passou a ter a concorrência de outra emissora, quando<br />

entrou no ar a rádio Difusora, montada por Egydio Lofrano, radialista que iniciou a<br />

31


carreira na Rádio Difusora de Mirassol, cidade distante 15 quilômetros de Rio Preto.<br />

A disputa pela audiência não era tão acirrada já que ambas faziam parte da Rede<br />

Piratininga de Rádio. Eram, portanto co-irmãs, como se dizia nos jornais da época,<br />

cada uma atuando num segmento de programação.<br />

O forte da Difusora de Rio Preto eram as radionovelas, escritas por Luisbino<br />

Pinto da Costa, que faziam muito sucesso na cidade conforme a coluna Rádio &<br />

Discos, publicada diariamente no jornal A Notícia:<br />

Borrasca é o grande sucesso do Teatro do Café Cimo, às segundas,<br />

quartas e sextas feira, pela Difusora, às 19:00. Parabéns a Luisbino Pinto<br />

da Costa por esta magnífica novela, que nos traz uma história violenta e<br />

diferente, tendo por cena o cais do Porto de Santos. (27/01/1962, p.6)<br />

Ben-Hur, uma história dos tempos de Cristo está no momento mais<br />

interessante da novela sob patrocínio do Pastifício Rio Preto, pois atingindo<br />

o capítulo 51, mostra os sofrimentos de Jesus Cristo em direção a cruz e a<br />

terrível ansiedade de Ben-Hur, muito bem vivido por César Muanis,<br />

coadjuvado por todo o elenco da Difusora. Mais uma produção e direção de<br />

Luizbino Pinto da Costa. (17/02/1962, p5)<br />

Em 1960, foi a vez da Rádio Cultura ZYR 242 entrar no ar, mas ela também<br />

fazia parte da Rede Piratininga de Rádio, não abrindo por isso concorrência com as<br />

outras emissoras. No total, a rede era formada por cerca de 30 emissoras de rádio<br />

em várias cidades do interior do estado de São Paulo, controlada pelo médico<br />

Miguel Leuzzi, que chegou a suplente de senador na década de 60. Em Rio Preto,<br />

as três rádios monopolizavam o mercado radiofônico, no entanto, não eram<br />

sinônimos de qualidade técnica, pelo menos é o que deixou claro esta dura nota da<br />

coluna Rádio & Discos, em A Notícia.<br />

Me contaram coisas de arrepiar a respeito da parte técnica das três<br />

emissoras locais. Aparelhagem velha, mesa de sons só com o prato<br />

funcionando; isso, quando funciona; pick-up defeituosa, agulha defeituosa,<br />

microfones enguiçados, transmissores que não mantêm rendimento<br />

necessário. Enfim, uma verdadeira decadência. E o pior é que os coitados<br />

dos operadores é que pagam o pato. Vejam bem: para dar vazão aos<br />

jingles, eles têm que rodar o prato com o dedo. Como não poderia deixar de<br />

ser, a rotação não sai certa e ouvem-se vozes em 33, 45 e 78 rotações num<br />

mesmo jingle. Que isso pessoal... Essa é a melhora que os senhores<br />

prometeram aos ouvintes? Três emissoras, cada uma pior do que a outra?<br />

Será que o superintendente sabe disso? É preciso melhorar mesmo, não só<br />

na conversa e, sim, na ação! 3 (11/04/1962, p. 5)<br />

3 As colunas Rádio & Discos do jornal A Notícia, citadas neste artigo, não traziam nenhuma assinatura<br />

do responsável pelos comentários. Um dia o autor escreveu que preferia ficar incógnito para não<br />

sofrer pressões: ―Há muito radialista curioso por saber quem é o responsável por esta secção de<br />

32


A Rádio Difusora Rio-Pretense e a PRB-8 Rádio Rio Preto funcionaram até<br />

1974. Há controvérsia quanto às razões do fechamento das duas emissoras. Os<br />

antigos funcionários acreditam que foi perseguição do Regime Militar. Há quem diga<br />

que as concessões não foram renovadas por causa de dívidas para com a<br />

Previdência Social. Independente disso, o fato é que as duas rádios pioneiras nunca<br />

mais voltaram a transmitir e nada do que elas produziram foi guardado. A Rádio<br />

Cultura trocou de dono, pertenceu ao empresário Luis Homero que trocou o nome<br />

para Rádio Brasil Novo. Em 2000, a emissora foi vendida para a Rede Jovem Pan,<br />

de São Paulo, que transmite programação via satélite sem espaço para programas<br />

locais.<br />

Independência: modernização do rádio<br />

A hegemonia das emissoras da Rede Piratininga em Rio Preto foi afetada de<br />

fato no ano de 1962, quando surgiu a Independência AM com um projeto novo de<br />

rádio, mais sintonizado com as transformações que a televisão provocara na<br />

audiência desde a sua implantação no Brasil em 1950, por Assis Chateaubriand.<br />

Como se sabe, por causa do novo meio de comunicação, houve quem<br />

apostasse no fim do rádio. Em 1952, diante da concorrência com um veículo que<br />

além de sons transmitia também imagens, o escritor Cassiano Gabus Mendes<br />

decretou: ―O rádio vai sumir dentro de dez anos‖ (Apud Tavares, 1997). A profecia<br />

não se concretizou até porque o rádio se reestruturou a tempo, adotando o perfil<br />

informativo e, ao mesmo tempo, companheiro, reforçado pela invenção do transistor<br />

que tornou o aparelho portátil. O rádio cedeu o espaço da sala para a televisão, mas<br />

tomou conta dos quartos, da cozinha, dos carros, dos passeios ao ar livre. Além<br />

disso, no início da década de 60, a televisão ainda não havia chegado a São Paulo,<br />

e o rádio ainda era o principal meio de comunicação.<br />

A Independência AM implantou em Rio Preto o estilo de rádio que era<br />

praticado em São Paulo. Seu proprietário, o deputado federal pelo PTN (Partido<br />

Trabalhista Nacional) Maurício Goulart, não economizou na contratação de<br />

profissionais da capital para colocar o projeto em prática. Para a direção da<br />

rádio. Acho que vai ser difícil descobrir a minha identidade porque o papai aqui é vivaldino e não<br />

dorme na jogada. O melhor mesmo é você ler a coluna e deixar de ser curioso‖ (24/01/1962, p.3)<br />

33


emissora, trouxe o experiente Júlio Cosi, ex-diretor da Rádio América e fundador da<br />

Rádio Pan-Americana de São Paulo, atual Rádio Jovem Pan.<br />

A cobertura desportiva seria um dos pontos altos da programação e, por isso,<br />

o comando da equipe ficou a cargo do narrador esportivo Nelson Antonio Gonçalves,<br />

que pertencia à Rádio Difusora de São Paulo. Vários profissionais que atuavam na<br />

PRB-8 se transferiram para a nova emissora. Entre eles, o jovem repórter Jota<br />

Hawilla, que atualmente é dono de uma rede regional de televisão afiliada da TV<br />

Globo, a TV TEM. 4<br />

Hawilla começou a carreira profissional no rádio com apenas 15 anos como<br />

locutor da PRB-8 e integrante da equipe esportiva da emissora. Ele comenta as<br />

dificuldades de se fazer rádio na época, lembrando, por exemplo, que havia apenas<br />

duas cadeiras no estúdio da rádio Rio Preto para apresentação do programa A<br />

Marcha do Esporte (já mencionado neste artigo) e que, por isso, tinha que dividir<br />

uma delas com um dos apresentadores, de preferência Alexandre Macedo que era<br />

mais magro.<br />

Na verdade o programa era um pastelão, um improviso só. Na abertura do<br />

programa, o Rubens [Munis] e o Alexandre anunciavam ‗Está no ar a<br />

Marcha do Esporte, um programa...‘, e aí falavam o nome do patrocinador,<br />

quem apresentava, o operador, aquela coisa toda. Aí entrava uma música<br />

de fundo, daquelas de banda, e falavam as manchetes do programa. Estas<br />

manchetes eram escritas à mão pelo Rubens que nem sempre caprichava<br />

na caligrafia. Então era uma complicação.Tinha que chegar sempre antes<br />

para ler e discutir o que estava escrito. 5<br />

A chegada da Independência a Rio Preto obrigou as outras emissoras da<br />

cidade a se profissionalizar um pouco mais. Segundo Jota Hawilla, por ser uma<br />

emissora mais rica, a Independência investiu forte na qualidade.<br />

Ali [na Independência] se começou a fazer alguma coisa mais organizada<br />

em termos de equipe esportiva. Era o Nelson Antonio, tinha um<br />

comentarista que era o Alexandre [Macedo], tinha o plantonista, tinha dois<br />

repórteres, tinha negócio de meta, ficar um atrás de cada gol. Já começou<br />

um negócio assim mais organizadinho. 6<br />

4 Em 2004 a TV TEM possuía emissoras em São José do Rio Preto, Sorocaba, Bauru e<br />

Itapetininga.<br />

5 Depoimento ao Projeto Memória do Rádio do CONDEPHACT – São José do Rio Preto,<br />

gravado em setembro de 1990.<br />

6 Idem<br />

34


Além de forte financeiramente, a Rádio Independência tinha prestígio político<br />

que ficou demonstrado na inauguração da emissora quando o deputado Maurício<br />

Goulart trouxe, para as solenidades, o seu amigo e Presidente da República, João<br />

Goulart, que ocupava o cargo após a renúncia de Jânio Quadros. No dia nove de<br />

dezembro de 1962, o avião da Força Aérea Brasileira pousou no aeroporto de São<br />

José do Rio Preto trazendo a comitiva presidencial que seguiu de carro para o<br />

centro da cidade onde ficavam os estúdios da emissora. A cobertura montada para o<br />

evento previa repórteres posicionados ao longo do percurso e um locutor no estúdio<br />

fazia a passagem entre as entradas ao vivo. Este locutor era um novato, Pedro<br />

Lopes, que se viu surpreendido na época com a missão de ser o primeiro a<br />

entrevistar o presidente da república.<br />

Acontece que quando da chegada do presidente, a caravana foi muito<br />

extensa, os carros que vinham do aeroporto até o centro da cidade eram<br />

muitos. E a equipe de reportagem da rádio Independência acabou ficando<br />

presa no trânsito e não deu tempo deles chegarem ao estúdio da rádio em<br />

que fariam a recepção ao presidente e inaugurariam oficialmente a<br />

emissora. Adivinha pra quem sobrou? Sobrou para mim receber o<br />

presidente. Eu realmente senti uma emoção muito grande me vendo diante<br />

do presidente da república e tendo que saudá-lo, fazendo as vezes de<br />

mestre de cerimônia da rádio Independência. 7<br />

Em 1969, o diretor da Independência AM, Júlio Cosi, decidiu voltar para São<br />

Paulo. Seu sócio, o deputado Maurício Goulart, já não se dedicava tanto ao negócio.<br />

Os dois deram preferência de venda ao diretor artístico da emissora Alexandre<br />

Macedo que chamou o radialista Rubens Muanis e Alberto Cecconi para sócios na<br />

empreitada. O trio manteve-se à frente da Independência durante 15 anos, período<br />

em que a rádio investiu forte na cobertura jornalística com programas como o<br />

noticiário Hora da Verdade, ao meio dia e o policial Hora Fantástica, às quatro da<br />

tarde. Em 1985, a Independência AM foi vendida para o empresário e dirigente do<br />

Palestra Esporte Clube de Rio Preto, José Luis Spotti que manteve a programação<br />

diversificada até o início da década de 90, quando a emissora mudou de dono mais<br />

uma vez. A Igreja Adventista do Sétimo Dia assumiu o controle da emissora que<br />

passou a integrar a Rede Novo Tempo mudando completamente seu perfil: tornou-<br />

se uma emissora evangélica.<br />

7 Depoimento ao Projeto Memória do Rádio – CONDEPHACT – São José do Rio Preto gravado<br />

em 1989.<br />

35


Até o ano de 2002, seus dirigentes mantinham um total de seis horas de<br />

programação local, apesar do caráter religioso dos programas. Foi quando a rádio<br />

interrompeu a transmissão dos programas locais e passou a transmitir direto de<br />

Brasília, sede da rede. Na ocasião, o diretor da rádio Laércio Mazaro explicou que a<br />

ordem veio da Igreja Adventista do Sétimo Dia por razões financeiras. Segundo ele<br />

os custos com a produção local e de rede não estavam sendo cobertos pelo<br />

faturamento publicitário.<br />

Púlpito eletrônico<br />

Não podemos aceitar qualquer tipo de anunciante. Não podemos veicular<br />

propaganda de cigarro, bebidas alcoólicas, shows, festas de rodeio, tudo<br />

que não combine com a doutrina. A questão da audiência não é uma<br />

preocupação. Nossa mensagem é para todos, mas é o público evangélico<br />

que mais nos ouve devido a programação com músicas evangélicas,<br />

estudos bíblicos, testemunhos de fé. 8<br />

A trajetória da Independência AM reflete o processo de mudanças que o<br />

mercado de rádio do país tem passado. Não é de hoje que igrejas, evangélica e<br />

católica, investem no rádio para difundir a religião. Mas partir da década de 90 o<br />

processo de aquisição de emissoras pelas igrejas ganhou força. Além da<br />

Independência AM, outra emissora rio-pretense que também não resistiu ao assédio<br />

das igrejas eletrônicas foi a Studio I FM, implantada pelo empresário João Roberto<br />

Curti em 1990, com uma programação musical sofisticada voltada para o público<br />

adulto. Com o falecimento do fundador no ano de 2001, a família optou por arrendá-<br />

la à Igreja Universal do Reino de Deus. Desde então, a grade da emissora (agora<br />

apenas FM 91,7) é ocupada por pastores e obreiros da igreja que se revezam ao<br />

microfone pregando a Bíblia. Os fiéis participam pelo telefone com testemunhos de<br />

fé e pedindo músicas evangélicas. A emissora integra a Rede Aleluia, o braço<br />

radiofônico da seita religiosa criada pelo bispo Edir Macedo.<br />

O crescimento da participação das igrejas na mídia eletrônica é um fenômeno<br />

que ocorre no Brasil paralelamente ao da globalização. Para Sonia Virgínia Moreira,<br />

católicos e evangélicos travam uma ―guerra santa‖ para conquistar e manter fiéis<br />

sendo que o predomínio no setor radiofônico é da Igreja Católica.<br />

8 Entrevista concedida a autora, por telefone, em 23 de agosto de 2002.<br />

36


Em 1997, 181 rádios eram controladas por grupos católicos; 100 emissoras<br />

seguiam linha da Igreja Batista; 70 rádios (entre próprias e arrendadas)<br />

funcionavam segundo as orientações da Igreja Universal; 21 rádios<br />

pertenciam à Igreja Adventista do 7º Dia; 12 emissoras disseminavam as<br />

pregações da Assembléia de Deus; seis rádios eram da Igreja Renascer em<br />

Cristo e quatro estações pertenciam à igreja Evangelho Quadrangular.<br />

A Igreja Católica não possuía nenhuma emissora comercial em São José do<br />

Rio Preto. A Diocese controlava uma emissora comunitária, a Espaço Aberto FM,<br />

que é administrada pela Associação Comunitária São José, ligada à paróquia<br />

Imaculada Conceição. A rádio entrou no ar no segundo semestre de 2003,<br />

devidamente autorizada pelo Ministério das Comunicações, depois de anos de<br />

burocracia federal e funciona em parceria com cinco paróquias. A jornalista Cecília<br />

Demian, da Pastoral da Comunicação da Diocese de Rio Preto, destacou o caráter<br />

plural da FM Espaço Aberto, em matéria publicada no informativo da Paróquia<br />

Menino Jesus de Praga, que fica na Zona Sul da cidade (10/2003, p. 3):<br />

Estas comunidades vão preencher 20 horas de programação, das seis as<br />

vinte quatro horas, com música popular brasileira, informação e participação<br />

do ouvinte. O fato de estar em parceria com paróquias não significa que terá<br />

só programação religiosa. Nem pode. Os que quiserem momentos de<br />

reflexão e oração vão encaminhar esta solicitação a um só programa de<br />

uma hora que vai constar da programação. Para ser autorizada pelo poder<br />

público, a emissora comunitária não deve ter vínculos políticos e religiosos.<br />

A orientação editorial da rádio comunitária Espaço Aberto era resultado da<br />

posição adotada pelo Bispado de São José do Rio Preto. O bispo Dom Orani<br />

Tempesta tinha consciência da influência dos meios de comunicação sobre as<br />

pessoas e admitia que sempre quis que a diocese tivesse uma emissora de rádio.<br />

Ressaltava, no entanto, que a mídia não podia se prestar ao proselitismo e nem<br />

devia ser usada para levar mais gente para dentro das igrejas.<br />

De um lado, ela [a mídia] nos serve para nos comunicarmos com as<br />

pessoas que são da igreja, até porque hoje com 90% dos católicos que não<br />

vão à missa têm que ter um jeito de comunicar com eles também, não é?<br />

Mas a gente vê [a mídia] muito mais como uma construção de uma<br />

civilização do amor. Uma civilização um pouco mais justa. A gente vê a<br />

utilização disso para uma sociedade melhor. 9<br />

9 Em depoimento gravado pela autora em Julho de 2002 na Diocese de São José do Rio Preto.<br />

37


A disposição com que as igrejas tomaram conta do rádio para difundir suas<br />

idéias é preocupante não apenas pela falta de diversidade no dial que limita as<br />

opções do ouvinte. Para Venício A. de Lima, a situação é preocupante: ―Corremos,<br />

de fato, o risco de estar assistindo a um processo de concentração da propriedade,<br />

(...) que pode se constituir em ameaça concreta, não só para a liberdade de<br />

expressão, mas para a própria democracia no Brasil‖.<br />

Outras emissoras rio-pretenses<br />

Ao todo, estão sediadas em São José do Rio Preto, atualmente, cinco<br />

emissoras de rádio FM e quatro AM. A FM Independência, a primeira a transmitir<br />

em freqüência modulada da cidade, tem no radialista Roberto Toledo a sua<br />

principal atração. Ele comanda um programa diário de manhã, no qual toca<br />

música, lê e comenta notícias dos jornais, conversa com ouvintes e entrevista<br />

personalidades. Toledo ressalta que o assédio das igrejas é muito forte e os<br />

empresários de rádio não conseguem resistir. ―As igrejas acabaram salvando os<br />

donos de emissoras de ondas médias e de algumas FMs. Elas compraram as<br />

rádios de empresários que não ―nasceram para a coisa‖ e apostavam no só lucro<br />

fácil. Diante de propostas irrecusáveis, eles entregaram as emissoras‖.<br />

Trabalhando no rádio rio-pretense há 40 anos, Toledo lamenta o baixo<br />

investimento publicitário no rádio, mas admite que as emissoras têm parcela de<br />

culpa nisso.<br />

Os donos de rádio de Rio Preto querem ganhar dinheiro, mas não investem.<br />

Hoje, fazer rádio com a cara da cidade não é uma tarefa tão árdua em FM;<br />

é uma coisa simples de fazer, só que quem pode fazer não faz. Por<br />

exemplo, a rádio Independência FM teria toda essa condição só que a<br />

direção não abre espaço na gestão do negócio e não contrata um gerente<br />

comercial. Ele quer ter o domínio da emissora tocando só música. É um<br />

conceito de rádio de cidade pequena. 10<br />

Pelo menos duas emissoras FM de Rio Preto têm programação voltada para<br />

o público jovem tocando, essencialmente músicas das paradas de sucesso nacional<br />

e internacional. Elas estão vinculadas às redes de emissoras de rádio Band e Líder<br />

com sede em São Paulo.<br />

10 Em depoimento gravado pela autora em julho de 2002 em seu escritório em São José do Rio<br />

Preto.<br />

38


A FM Onda Nova foi criada em 1981 pelo empresário paulistano Luis Homero<br />

que, três anos, depois revolucionou o mercado programando música caipira em FM.<br />

A Onda Nova foi a primeira emissora do país a tocar música 100% sertaneja, 24<br />

horas por dia. Hoje, a Música Popular Brasileira, em especial o sertanejo urbano,<br />

ainda é o carro chefe da Onda Nova FM, ao lado de comunicadores como Gentil<br />

Rossi pela manhã e Moacir Santos à tarde, que fazem programas com a<br />

participação do ouvinte, boletins jornalísticos, brincadeiras e prestação de serviço. A<br />

rádio mantém uma estrutura de 40 pessoas, entre contatos comerciais,<br />

comunicadores que também são permissionários, pessoal técnico, equipe esportiva<br />

e jornalística.<br />

O empresário Luis Homero era proprietário também da rádio Brasil Novo AM,<br />

já citada anteriormente. Vale acrescentar que no ano de 2001 ele decidiu vendê-la,<br />

para a Rede Jovem Pan de São Paulo, alegando prejuízos. A rádio passou a se<br />

chamar Jovem Pan Rio Preto e, desde então, transmite a programação jornalística<br />

em rede via satélite direto de São Paulo sem horários locais. Assim, ao ouvir a<br />

emissora, o público rio-pretense sabe dos problemas urbanos da capital, e nada do<br />

que acontece na sua cidade e região. Um paradoxo ainda sem solução, pois até a<br />

fase da produção deste artigo ainda não havia projeto de criação de programas<br />

locais na Jovem Pan Rio Preto.<br />

Outra emissora AM ainda não mencionada é a Centro América, nos 810 KHz,<br />

da UNORP, Centro Universitário do Noroeste Paulista que funcionava como rádio-<br />

laboratório do curso de Comunicação Social oferecido pela instituição. No primeiro<br />

semestre de 2004, ela perdeu esta característica ao coligar-se à Rede Canção Nova<br />

de Rádio, ligada à igreja católica.<br />

Por fim, a Rádio Metrópole AM que dedica 13 horas da programação diária à<br />

prestação de serviço e jornalismo informativo e opinativo. A emissora dispõe de uma<br />

equipe de 12 pessoas, entre radialistas, estagiários e técnicos. Não há jornalistas<br />

profissionais contratados. O forte da programação é a participação do ouvinte pelo<br />

telefone, sobretudo nos dois horários do Classificados Metrópole, que funciona como<br />

um balcão de vendas e trocas, no qual as pessoas ligam para emissora e anunciam<br />

de viva voz o que querem vender. Vale tudo: de carrinho de bebê e cadeira de rodas<br />

até carro usado ou estoque de roupas de loja que fechou. Ninguém paga nada e a<br />

grande procura obrigou a rádio Metrópole a fazer duas rodadas de uma hora de<br />

Classificados, de manhã e à tarde.<br />

39


FM Diário: mídia viável<br />

Não há como analisar o mercado radiofônico de São José do Rio Preto sem<br />

mencionar a Rádio FM Diário, pertencente ao Grupo Diário de Comunicação que<br />

controla também uma gráfica, um jornal diário e um portal na Internet. Mesmo<br />

estando instalada em Mirassol, a FM Diário tem como principal foco o público e os<br />

anunciantes de Rio Preto.<br />

Na direção da emissora está o ex-DJ e ex-operador Cacá Rossete, um<br />

apaixonado pelo rádio que não tem dúvida quanto a viabilidade do veículo como<br />

mídia publicitária. Segundo ele, o problema é que os próprios publicitários relutam<br />

em investir. Por trás disso estaria a comissão de 20% que a agência recebe pela<br />

produção e veiculação do anúncio.<br />

Vinte por cento de um anúncio de rádio é ―nada‖. Vinte por cento de uma<br />

produção de TV e de uma veiculação de TV é muita coisa. Então a agência<br />

força TV sim! E com certeza por causa da comissão. Tanto é que a gente<br />

tem muitos clientes diretos que têm agência e a agência nem se preocupa<br />

em atendê-los com o rádio. (...) Se o cliente está disposto a comprar nosso<br />

produto e nós temos uma equipe para vender, se agência não lhe oferecer,<br />

nós temos profissionais gabaritados para isso. Obviamente que a gente<br />

entra em contato com agência, depois, que leva a comissão mesmo sem ter<br />

feito o negócio. Aí, diante do retorno eles percebem que o rádio é viável e<br />

passam a programar mais vezes. 11<br />

Ações como esta fazem parte da estratégia da FM Diário para convencer<br />

anunciantes e agências de que o rádio é o único veículo capaz de dar retorno<br />

imediato, a um custo baixo. Rossete revela que existe fila de empresas esperando<br />

para anunciar nos horários de maior audiência da emissora. A programação é<br />

essencialmente musical com um mínimo de jornalismo exigido por lei. DJs se<br />

revezam ao microfone, ao vivo, conversando com ouvintes pelo telefone, sorteando<br />

brindes e entrevistando artistas que visitam a rádio. Pesquisa do IBOPE, realizada<br />

em julho de 2003, apontou a FM Diário como líder de audiência em São José do Rio<br />

Preto.<br />

Conclusão<br />

Ao analisar o mercado de rádio comercial rio-pretense, verifica-se que o setor<br />

viveu momentos de glória no passado quando ainda não enfrentava a concorrência<br />

11 Em depoimento gravado pela autora, em setembro de 2003, na Rádio FM Diário.<br />

40


com a televisão. O surgimento da rádio Independência AM, no início da década de<br />

60, demonstrou a capacidade de renovação. Mas, na medida em que os meios de<br />

comunicação passaram a evoluir mais rapidamente, graças às novas tecnologias, as<br />

emissoras pioneiras demoraram a reagir e custaram a se adaptar ao novo contexto.<br />

Resultado: perderam espaço entre os anunciantes, ficaram vulneráveis aos<br />

pregadores eletrônicos e aos políticos que vêem o rádio não como um negócio, mas,<br />

sim, como palanque e púlpito.<br />

Apesar de a Jovem Pan Rio Preto ainda não ter implantado horários de<br />

produção local, a expectativa quanto a investimentos na emissora continua.<br />

Enquanto isso, a FM Diário se prepara para entrar na era do rádio digital, devendo<br />

adquirir em breve transmissor novo que vai possibilitar a criação de diferentes canais<br />

de música na mesma emissora.<br />

A Onda Nova FM por sua vez adota ações de marketing criativas para ampliar<br />

a audiência, entre elas a parceria com a empresa concessionária do transporte<br />

urbano da cidade, que garante a sintonia fixa na emissora nos rádios dos 400 ônibus<br />

da frota.<br />

Para se adequar aos novos tempos, as emissoras de rádio da maior cidade<br />

do Noroeste Paulista não têm como fugir destas três alternativas: modernização<br />

tecnológica, identidade local e estratégias de marketing diferenciadas.<br />

41


Referências bibliográficas<br />

ARANTES, L. Dicionário Riopretense, a história de São José do Rio Preto, de A a Z.<br />

São José do Rio Preto: Casa do Livro, 2001.<br />

DIÁRIO DA REGIÃO – Suplemento Especial 151 anos de São José do Rio Preto, 19<br />

de março de 2003.<br />

GOMES, L. Gente que ajudou a fazer uma grande cidade, Rio Preto. São Paulo:<br />

Editora Gráfica São José, 1975.<br />

Informativo da Paróquia Menino Jesus de Praga – Outubro de 2003 . Ano VI, n 62 p.<br />

3 ―Dom Orani preside missa inaugural da Espaço Aberto‖.<br />

LIMA, V.A. Mídia – Teoria e Política. São Paulo: Perseu Abramo, 2001.<br />

MOREIRA. S.V. O Rádio No Brasil. Rio de Janeiro: Rio Fundo, 1991.<br />

_____________. Rádio Palanque. Rio de Janeiro: Mil Palavras, 1998.<br />

TAVARES, R. C. História que o Rádio não contou: do Galena ao Digital,<br />

desvendando a Radiodifusão no Brasil e no Mundo. São Paulo: Negócio, 1997.<br />

42


__________________________________________________________<br />

ARTIGO<br />

O PAPEL DO CIDADÃO E SUA RESPONSABILIDADE EM GERAR E<br />

GERIR INFORMAÇÕES DE CARÁTER PÚBLICO<br />

*Graduado em Jornalismo pela Faculdade de Comunicação Social Cásper Líbero.<br />

Especialista em Gestão de Processos Comunicacionais pela ECA/USP.<br />

Mestre no programa de pós-graduação em Comunicação Midiática daUNESP/Bauru.<br />

Professor do curso de Jorna-lismo da UNORP.<br />

Docente do Pro-Jovem e Faculdade Panamericana de Ji-Paraná (UNIJIPA).<br />

43<br />

*Marcos Vicente Coffani LOCK<br />

Resumo: Este trabalho menciona como a comunicação de interesse público e, em particular, a<br />

fabricação de notícias, está passando por uma reformulação de conceitos. As novas tecnologias, que<br />

dão voz midiática a cidadãos comuns, somam-se às estratégias dos produtores da notícia artificial e à<br />

consciência das fontes em interagir intensamente com as redações movidas por interesses<br />

particulares. Questiona-se, então, se este jogo será benéfico para a democracia e para o exercício do<br />

Jornalismo e para a circulação de informações de caráter público.<br />

Palavras-chave: Fonte; Repórter; Notícia; Liberdade; Mediação; Informação.<br />

ABSTRACT: This work mentions how the public benefit communication and particularly the news are<br />

going through a concept reformulation. The news technologies which attribute mediatic voice to<br />

common citizens are summed up to the artificial news producer´s strategies and to the consciousness<br />

of the sources in interacting intensively with the editorial staff moved by private benefits. So we<br />

question whether this game will be useful for the democracy and for the Journalism practice, besides<br />

the circulation of public trait information.<br />

KEYWORDS: source; reporter; news; freedom; mediation; information.


No campo da Comunicação, acredito, nada é tão relevante quanto à<br />

consciência do valor da informação na sociedade atual. Onde quer que se esteja,<br />

pode-se ser alcançado pela tecnologia que presta ou recolhe material informativo,<br />

seja na calota polar, no meio do Pacífico ou na imensidão do Saara. Constatações<br />

como esta levam a mudanças na esfera política, como, por exemplo, uma que foi<br />

proposta em Brasília, a extinção do cargo de vice-presidente. O argumento é que<br />

hoje em dia, com o arsenal midiático e tecnológico à sua disposição, o presidente<br />

não mais deixa de acompanhar a realidade de seu país onde quer que esteja no<br />

globo terrestre e pode transmitir suas orientações a qualquer instante, on line ou ao<br />

vivo.<br />

A percepção de informação, farta e variada, fator preponderante para uma<br />

existência social dinâmica e engajada, está colocando na ordem do dia, tendo os<br />

meios de comunicação como mediadores, muitos assuntos e intenções que outrora<br />

estavam reservados a determinados grupos. As trancas do acesso à esfera pública<br />

rompem-se umas depois das outras. Editores de jornais e revistas, produtores de<br />

rádio e TV, professores, dirigentes culturais, os próprios Estados e até os grandes<br />

grupos de comunicação não podem mais controlar, nem medir e muito menos<br />

dirigir, as informações e mensagens de todos os tipos que circulam na nova esfera<br />

pública. De acordo com Lévy, esta seria uma visão da situação:<br />

Com a previsível perda da influência dos mediadores culturais tradicionais,<br />

esta nova situação anuncia um salto sem precedentes na liberdade de<br />

expressão. (...) Pois o que se oferece ao consumidor é precisamente a mais<br />

ampla liberdade de expressão e de navegação. De fato, a diversidade<br />

informacional e a libertdade de expressão continuam a aumentar<br />

rapidamente apesar dos movimentos de fusão entre as grandes<br />

corporações da comunicaçã. (LÉVY,2003, p.371-72).<br />

Os cada vez mais freqüentes exemplos de agitação informacional, que por<br />

vezes expressam uma sensação de desorientação coletiva e que têm contribuído<br />

para o excesso de dados circulantes, representam em alguma instância o fim da<br />

era de um modo de intermediação que está sendo ultrapassado. Está-se deixando<br />

para a trás a visão clássica deste processo, ou seja, aquela que baseia sua<br />

organização de informações através de uma prévia seleção institucional por<br />

organismos especializados, tendo como principal representante a mídia. Um caso<br />

notório e recente é do relatório sobre o caso Clinton-Lewinsky, que foi<br />

disponibilizado na internet pela comissão federal que investigava o caso. Milhões<br />

44


de pessoas puderam ter acesso diretamente às informações, uma vez que elas<br />

foram oferecidas não aos jornalistas, mas a todo os internautas através da rede<br />

mundial de computadores. Os órgãos jornalísticos para essas pessoas não<br />

funcionaram como gatekeepers 1 .<br />

O advento das novas linguagens, com destaque para a praticada pela<br />

internet, em paralelo, trazido à tona entre outros questionamentos, a questão da<br />

credibilidade da informação. São temores legítimos. Eles concernem em particular<br />

aos documentos não assinados ou que podem ser atribuídos a uma instituição que<br />

ponha sua credibilidade em jogo nas informações que coloca à disposição do<br />

público. É preciso dizer, no entanto, que a verdade resulta de um processo coletivo<br />

de busca e de produção que, quanto mais livre e múltipla é a palavra, mais eficaz<br />

é. Além do mais, uma ampliação da liberdade de expressão e de acesso à<br />

informação implica necessariamente, com um aumento de riscos, uma<br />

transferência de responsabilidade para os indivíduos e os múltiplos atores sociais.<br />

O fato é que os internautas estão expondo suas idéias em seus websites e a<br />

prática do diálogo nas comunidades virtuais parece que os está habituando à um<br />

tipo de discussão e deliberação pública. Sendo capazes de exprimir-se, eles<br />

esperam agora ser ouvidos. As novas formas de governança, as organizações e<br />

também as universidades deverão encontrar lugar para este novo tipo de cidadão,<br />

conectado, relativamente informado e portador e freqüentador contumaz da grande<br />

rede. Recentes pesquisas norte-americanas mostraram que os internautas são<br />

mais interessados pela atualidade política e votam mais do que os cidadãos não<br />

conectados. Os sites de informação política e de promoção da democracia<br />

eletrônica florescem na web americana e também na Europa. Vários deles,<br />

notadamente nos EUA, dão ao cidadão instrumentos para que se organizem em<br />

defesa de uma idéia e os ajudam a interpelar seus representantes. Porém, a<br />

principal inovação em matéria de deliberação democrática vem das chamadas<br />

ágoras comerciais que propõem instrumentos de organização e ação política,<br />

1 Termo gerado pelo psicólogo David Manning White nos anos 50, com o qual ele concluiu que o<br />

processo de seleção de notícias por parte dos jornalistas é arbitrário e subjetivo. Ele acompanhou<br />

durante uma semana o processo de escolha de notícias de um jornalista de meia-idade de um jornal<br />

médio norte-americano. A cada escolha, o profissional deveria anotar as razões pelas quais aceitava<br />

ou não uma notícia vinda de uma agência. White deixou transparecer que o processo de seleção é<br />

pessoal, baseado em convicções próprias e no conhecimento social particular. Sendo assim, de<br />

acordo com a teoria resultante do estudo, o editor é um gatekeeper, um porteiro, que abre e fecha a<br />

porta para notícias, publicando aquelas que parecem mais interessantes para serem divulgadas,<br />

esquecendo as demais.<br />

45


fóruns de discussão, informações de atualidade estruturadas e bases de dados<br />

políticos de todos os tipos. Elas contribuem igualmente para o desenvolvimento da<br />

cultura do diálogo remoto que, em última instância, fortalece a democracia onde o<br />

ato essencial não é o voto, mas a deliberação, o saber e o exercício da inteligência<br />

coletiva.<br />

Nas ágoras clássicas entre os gregos, a prática da comunicação era na<br />

base de um para todos, ou seja, alguém discursava e a platéia ouvia. Com o<br />

advento de jornais de massa e de outras mídias, inverteu-se o conceito, passando-<br />

se a praticar a comunicação de todos para um, na medida em que o<br />

leitor/espectador, separado do ponto de vista físico, era individualizado em sua<br />

atenção. Hoje vê-se sendo implementada a comunicação de todos para todos,<br />

com uma interatividade inédita e muito interessante para o estímulo do debate<br />

social. Neste sentido Martin-Barbero traz para esta discussão alguns conceitos<br />

igualmente importantes quando o assunto é a comunicação pública, endereçada de<br />

todos para todos.<br />

O que os processos e práticas da comunicação coletiva põem em jogo não<br />

são unicamente os deslocamentos do capital e as inovações tecnológicas,<br />

mas sim profundas transformações na cultura cotidiana das maiorias: nos<br />

modos de se estar junto e tecer laços sociais, nas identidades que plasmam<br />

tais mudanças e nos discursos que socialmente os expressam e legitimam.<br />

(...) A comunicação é percebida como o cenário cotidiano do<br />

reconhecimento social, da constituição e expressão dos imaginários a partir<br />

dos quais as pessoas representam aquilo que temem ou que têm direito de<br />

esperar, seus medos e suas esperanças. (MARTIN-BARBERO, p. 62-85).<br />

Este autor nos diz que a nova ordem comunicacional e seu aparato<br />

tecnológico está redimensionando o dia-a-dia dos cidadãos, colocando-os diante<br />

do desafio de incorporar novos comportamentos, sob o risco de serem excluídos da<br />

agenda global. A comunicação pública de todos com todos deverá ser cada vez<br />

mais exercida pelas pessoas comuns de posse de seus pequenos, mas possantes<br />

aparelhos como celulares, notebooks, palmtops e outros que estão por vir; e,<br />

portanto, poderão contribuir mais com o pensamento coletivo porque<br />

simplesmente têm mais acesso a ele, a um custo relativamente baixo. Da mesma<br />

forma, serão influenciados pelo macro-ambiente remoto que apresenta modelos<br />

comparativos até então inéditos para os seus padrões locais.<br />

46


Há que se observar que jornalistas, por exemplo, estariam com sua<br />

importância diminuída enquanto gestores privilegiados dos fluxos de informação do<br />

tecido social. Ficaria para eles um outro papel, não menos importante, porém mais<br />

especializado, de analistas, seletores e comentaristas do cotidiano ao invés de<br />

geradores de dados. Afinal, os cidadãos, que estão em todos os lugares, que<br />

conhecem como ninguém a realidade à sua volta, têm maior capacidade de evitar o<br />

―crivo‖ jornalístico no que diz respeito à obtenção da informação. O fato é que,<br />

impulsionada pela internet, a geração de notícias está deixando de ser uma<br />

exclusividade dos profissionais dos meios de comunicação e está se configurando<br />

como mais um produto que vem servir à interatividade social. Ainda mais porque<br />

está se tornando um bem oferecido cada vez de forma gratuita. Se pensarmos<br />

sobre a informação de mundo com as quais lidamos ela é aparentemente gratuita.<br />

Na internet, a idéia de pagar pela informação tem dificuldades de vingar e aceita-se<br />

pagamento muito mais pelos serviços agregados ao noticiário do que pelas notícias<br />

propriamente ditas. Torna-se daí possível a inferência de que tudo que é gratuito é<br />

público; e tudo o que é público pertence à comunidade e de forma equânime aos<br />

cidadãos que nela habitam. Portanto, se as notícias são uma mercadoria pela qual<br />

paga-se cada vez menos, ou nada, então ela pertence a todos e por todos poderá<br />

ser gerida.<br />

Este novo conceito já possui tentativas bem sucedidas em curso e se apóia<br />

na participação ativa de grande parcela do público, que até então limitava-se a um<br />

papel nada aconselhável de passividade. O OhmyNews 2 , da Coréia do Sul, é uma<br />

experiência desta nova condição dentro do jornalismo e a primeira tentativa bem<br />

sucedida na internet de revolucionar o processo de garimpagem de notícias. Seu<br />

slogan: ―Cada cidadão é um repórter‖. Ao ser lançado em fevereiro de 2000, 727<br />

cidadãos se apresentaram como repórteres enquanto o staff do site não passava<br />

de quatro jornalistas. Hoje, decorridos quatro anos, a redação conta com 35<br />

profissionais e o corpo de ―cidadãos repórteres‖ já chegou a 35 mil nomes, que<br />

enviam em média 200 notícias diárias para as edições on line, impressas e em<br />

vídeo. O material é revisado e minimamente checado antes de ser posto no ar. A<br />

partir daí tem início um processo de avaliação da informação pelos próprios leitores<br />

cujos comentários, correções e adendos influem diretamente na relevância que o<br />

² O site do jornal é o www.ohmynews.com<br />

47


tema assume na pauta do jornal. Todo o processo é acompanhado pelos jornalistas<br />

da redação, que também são responsáveis pela produção de matérias de agenda<br />

não cobertas pelos ―cidadãos-repórteres‖. O grande desafio é o de manter e<br />

verificar a autenticidade das informações. Esta experiência está chamando a<br />

atenção de especialistas de todo o mundo por conta de seu crescimento rápido e<br />

vigoroso — e por atropelar todos os esquemas convencionais em matéria de<br />

relacionamento entre jornalistas e leitores.<br />

No Brasil, há a figura do ―ouvinte repórter‖ em algumas emissoras AM de<br />

São Paulo, como a Rádio Eldorado, a Bandeirantes e a CBN. Eles são convidados<br />

a entrar em contato com a emissora no horário de pico do trânsito e, pelo celular,<br />

dar um boletim das condições do trânsito por onde estão transitando com seus<br />

veículos.<br />

A tecnologia coloca esta possibilidade de participação social, em particular a<br />

internet, acrescida dos weblogs, que criaram ferramentas que deram ao usuário a<br />

capacidade de publicar suas opiniões e informações de forma fácil e imediata.<br />

Portanto, se parece inevitável que todos teremos um comprometimento<br />

inquestionável e inalienável com o processo de geração das informações, que<br />

podem ser apropriadas pela mídia de massa e de pós-massa (internet), já caberiam<br />

estas questões: quais as dimensões deste envolvimento? Que grau de<br />

complexidade atingirá? Como ele pode servir bem aos propósitos da sociedade e<br />

como ele pode até alavancar carreiras profissionais? Neste sentido, tal qual<br />

expressa Lévy, será preciso preparar as pessoas do mercado de trabalho não<br />

apenas para exercitar o discernimento no momento em que consomem as<br />

informações que chegam pela mídia, mas também para saber relacionar-se com ela<br />

e extrair dividendos positivos deste processo.<br />

A intencionalidade da notícia<br />

No mercado das empresas não-jornalísticas, verifica-se o mesmo movimento<br />

no que tange ao efeito que poderia ser chamado de artificialidade da notícia e que<br />

estaria causando no mercado jornalístico, propriamente dito, um efeito que pode vir<br />

a causar preocupações. Cada vez mais, o noticiário da mídia está sendo invadido<br />

48


pelos chamados acontecimentos programados, em detrimento daqueles<br />

espontâneos. Então,<br />

torna-se essencial compreender que o Jornalismo não é um discurso<br />

autônomo. São muitos, cada vez mais, os sujeitos sociais competentes que<br />

ousam agir e interagir no mundo presente. O Jornalismo teria na sua<br />

natureza, a aptidão de captar, compreender, reorganizar e difundir os<br />

discursos que a sociedade produz, agregando-lhes a credibilidade de uma<br />

mediação crítica (CHAPARRO, 1994, p. 132-154).<br />

Por este entendimento, ele seria um ambiente de macrointerlocuções e com<br />

elas elaboraria significados e construiria sentidos, lidando, como já dito, com dois<br />

tipos básicos de acontecimentos, os imprevistos e os planejados. Estes últimos são<br />

produzidos e controlados por pessoas ou instituições com aptidão para tal, do qual<br />

fazem parte a divulgação de oportunidade, tendo sempre em vista a divulgação de<br />

aspectos positivos em um primeiro momento, sem nenhum caráter de denúncia e<br />

dispensando aspectos de contextualização que levem a reflexões de ordem crítica e<br />

comparativa. Com a instauração de focos de emissão informativo-jornalística fora<br />

das redações em grande escala, fenômeno que está se verificando com grande<br />

freqüência também no Brasil, cada vez mais o espaço das pautas do jornalismo<br />

diário é ocupado pelos acontecimentos programados. Gostem os editores e<br />

pauteiros, ou não, os produtores competentes de acontecimentos exercem<br />

influência crescente e irrecusável nas decisões jornalísticas. Os veículos jornalísticos<br />

investigam, num primeiro momento, o que tem interesse para o bem público até<br />

depararem-se com os interesses próprios dos entrevistados, observados,<br />

pesquisados e envolvidos na pauta jornalística. No momento de elaborar ou atribuir<br />

significados à mensagem, as habilidades mais valiosas são as que acabam por<br />

interferir na escolha daquilo que irá para o ar. Se se fizer uma análise detida do<br />

conteúdo dos jornais de hoje, certamente uma característica se pronunciará com<br />

força: boa parte, senão a maioria, daquilo que é oferecido à opinião pública são<br />

relatos ou análises de acontecimentos planejados e controlados por instituições ou<br />

pessoas que decidiram promovê-los e sabiam como fazê-lo. Dos acontecimentos<br />

não previstos e não programados, só as grandes tragédias e acidentes ainda<br />

ocupam espaço e posições de destaque na imprensa.<br />

As pautas jornalísticas estão contando com a presença dos pauteiros<br />

externos à redação, em cujas aptidões se inclui, hoje, o domínio das habilidades<br />

49


jornalísticas, a consciência do valor da informação, o senso de oportunidade e o<br />

domínio da tecnologia de transmissão de dados remotos.<br />

Este fenômeno ultrapassa nossas fronteiras, como demonstra um artigo<br />

recente de Líriam Spnholz 3 , em que argumenta que mais da metade das notícias<br />

publicadas nos jornais americanos e alemães provêm de assessorias de imprensa<br />

ou foi ―provocada‖ por estratégias de relações públicas. Segundo ela, desde o<br />

começo dos anos 90, nos EUA há mais assessores de relações públicas e de<br />

imprensa do que jornalistas empregados em redações. Estudos das fontes das<br />

notícias contribuiriam para mostrar o quanto a influência externa é forte. Uma<br />

pesquisa americana nos anos 70 já apontava para isso: mesmo em jornais como o<br />

The New York Times ou The Washington Post, 60% do material das redações<br />

tinham origem em assessorias de imprensa.<br />

Neste sentido, alinha-se a perigosa, porém, oportuna argumentação de<br />

Chaparro 4 , de que não existiria fronteira entre jornalismo e propaganda. Frisou na<br />

ocasião que em qualquer entrevista, se faz propaganda O professor, no entanto,<br />

fez uma ressalva: a de que é preciso haver uma ―fronteira de intenções‖, com a<br />

devida identificação do profissional com o conteúdo jornalístico exigido por uma<br />

sociedade em busca de notícias que a transformem.<br />

Max Weber sintetiza muito bem a questão da intencionalidade que precisa<br />

ser depositada no ato da projeção social ao indicar a profunda alteração no modo<br />

de colocação do indivíduo na sociedade:<br />

Já não são mais os laços de sangue ou os valores da tradição que<br />

determinarão a inserção no contexto público, mas trata-se agora de um<br />

problema que cada indivíduo tem diante de si, e que não pode ser resolvido<br />

sem levar em consideração a vontade racional de se inserir na coletividade.<br />

Dito de outro modo, os valores da tradição não garantem mais a colocação<br />

da pessoa no espaço coletivo, pois este ultrapassa o âmbito da simples<br />

comunidade. (...)<br />

Desse modo, o indivíduo não tem seu vínculo coletivo, nem sua identidade<br />

assegurados de antemão pela tradição, mas deve construí-los através de<br />

seu engajamento espontâneo na diversidade das formas coletivas de<br />

agrupamento. O processo comunicativo deixa de ser analisado em sua<br />

generalidade, não sendo mais tratado como o fundamento da consciência<br />

humana (quer em sua forma coletiva ou individual); ele passa a ser investido<br />

³ Jornalista, mestre em História, Cultura e Poder e doutoranda em Comunicação pela Universidade de<br />

Lipsia, na Alemanha<br />

4 Afirmação proferida durante palestra intitulada ―Como estruturar uma estratégia vitoriosa de<br />

relacionamento com a imprensa‖, proferida no 6º Congresso Brasileiro de Jornalismo Empresarial,<br />

Assessoria de Imprensa e Relações Públicas, realizado em abril de 2003, em São Paulo<br />

4<br />

50


como estratégia racional de inserção do indivíduo no meio social. (WEBER,<br />

2002, p. 32-33)<br />

As fontes teriam, diante do exposto neste e no primeiro capítulo, a capacidade<br />

de produzir conteúdos noticiosos, embutidos muitos vezes em ações e falas<br />

recheadas de ingredientes jornalísticos. Incorporaram a notícia aos acontecimentos<br />

que produzem e pela notícia, de forma cada vez mais eficaz, os sujeitos<br />

institucionais exercem o sagrado direito de dizer. Novamente, ousa-se colocar<br />

algumas questões: será isto prejudicial ao ambiente de liberdade próprio das<br />

democracias? Seria preferível uma sociedade em que o poder de dizer pertencesse<br />

somente aos comunicadores institucionalizados?<br />

O que se vê é uma escalada sem precedentes do poder de interferência que<br />

as fontes estão passando a deter e a exercer nos processos de comunicação, em<br />

particular, nos meios jornalísticos. O poder das fontes, entre outros exemplos,<br />

estaria se manifestando na capacidade de gerar e alimentar fatos cujo sucesso<br />

comunicacional interessa ao relato jornalístico por excelência. Os que estariam<br />

cultivando aquela imagem idealizada do jornalista investigativo ou aventureiro, que<br />

procura situações arriscadas e instigantes, guiado pelo poder mítico da procura<br />

pela verdade, baliza maior do repórter, certamente ficarão perplexos diante da nova<br />

realidade. Para Chaparro (2003, p. 2).<br />

as fontes estão fazendo uma revolução nos processos comunicacionais. (...)<br />

o jornalismo vive agora sua quarta grande revolução, cada uma delas<br />

vinculada a um determinado momento tecnológico ou político-cultural da<br />

civilização moderna: a revolução da notícia, que o telégrafo viabilizou; a<br />

revolução das tiragens, na fase da industrialização, com a rotativa, a linotipo<br />

e a zincogravura: a revolução da reportagem literária, nos ventos<br />

democráticos do pós-guerra; e, agora, a revolução das fontes, sob o<br />

impulso das tecnologias de difusão (as tais que criaram a possibilidade da<br />

notícia em tempo real, com instantaneidade universal), e da acelerada<br />

institucionalização da sociedade.<br />

x<br />

Apesar de desprezadas pela cultura arrogante dos manuais de redação, as<br />

fontes se organizaram, adquiriram competência e querer, transformando o<br />

jornalismo no espaço público das suas ações discursivas e incorporaram a notícia<br />

ao acontecimento que estão produzindo.<br />

51


Conclusão<br />

É notório que apesar de todas as desconfianças com que jornalistas tratam<br />

certas fontes, elas são instâncias interdependentes e dentro, da nova ótica que este<br />

trabalho discute, ambos estão interessados mutuamente, ou seja, o jornalista está<br />

tão interessado nas fontes como as fontes, agora, estão interessadas nos<br />

jornalistas. Segundo Sousa, os jornalistas procuram as chamadas fontes abertas,<br />

capazes de providenciar toda a informação crível de que eles necessitam<br />

―desesperadamente‖ para que o produto noticioso possa ser fabricado. Por outro<br />

lado, as fontes estão pretendendo com um caráter intencional cada vez mais<br />

planejado, que os jornalistas aproveitem tudo o que elas pretendem, ou seja, que<br />

toda as informações que disponibilizam passem pelos ―portões‖. A identificação do<br />

jornalista com a fonte ou com o material informativo oferecido por esta pode<br />

propiciar um perigoso efeito para a democracia e para o bom jornalismo, que é o<br />

controle da fonte sobre os conteúdos da informação. E poderá também levar o<br />

jornalista a ser acrítico para com a fonte, deixando-se dominar por sua influência.<br />

Porém, nada parece deter o avanço das fontes, que se organizam, treinam-<br />

se, profissionalizam-se e estão muito disponíveis para, não apenas prestar<br />

informações, como para exercer também o ofício de comunicadores. Vários meios<br />

de comunicação estão se rendendo à nova realidade, posicionando-se com mais<br />

proximidade junto às fontes. A TV Tem, de São José do Rio Preto, vem divulgando,<br />

em alguns de seus noticiários locais, um telefone para que os telespectadores<br />

possam sugerir reportagens, institucionalizando seus canais de contato com elas e,<br />

em alguns casos, como visto neste trabalho, na primeira parte, até delegando a<br />

função de repórter.<br />

A informação tornou-se um dos bens mais conhecidos e aceitos da sociedade<br />

moderna. A notícia consolidou-se como um produto tendente à gratuidade. A<br />

tecnologia encurtou o mundo e fraturou as distâncias. E os cidadãos já não são mais<br />

os mesmos. Uma nova ótica para a transmissão, a geração e a gerência de<br />

informações, e especificamente do jornalismo, se impõe neste cenário. Os<br />

jornalistas estão vendo fugir o seu papel de gatekeeper privilegiado da informação<br />

pública. O que será da notícia? O que será da reportagem e do repórter? Questões<br />

como estas estão bem guardadas no futuro, mas já há fortes indícios do que este vai<br />

acontecer em breve.<br />

52


A consciência de que é possível dosar, dirigir, intensificar, separar, omitir,<br />

manipular a informação a partir das fontes vai se fortalecendo. Cresce também a<br />

demanda por informação e posicionam-se para atendê-la todos aqueles que estão<br />

compreendendo qual revolução está em curso dentro desta esfera comunicacional.<br />

As demais fontes, que ainda não participam deste entendimento, certamente<br />

poderão ser capacitadas para esta missão. Afinal, a informação, um bem<br />

verdadeiramente público, pode ser gerada e gerida por todos.<br />

53


Referências bibliográficas<br />

CASTILHO, C. Cada cidadão é um repórter. São Paulo, 4 maio 2004. Disponível em:<br />

http.observatoriodaimprensa. Acesso em 25 maio 2004.<br />

CHAPARRO, M. Jornalismo Brasileiro: no caminho das transformações. Brasília:<br />

Banco do Brasil, 1994.<br />

_____________. Quarta Revolução, a das fontes. São Paulo, 1 dezembro 2003.<br />

Disponível em: http.observatoriodaimprensa. Acesso em 20 dez 2003.<br />

DINES, A. ; MALIN, M. Jornalismo brasileiro: no caminho das transformações. Rio de<br />

Janeiro: Banco do Brasil. Labjor/Unicamp, 1996.<br />

DUARTE, J. Assessoria de Imprensa: o caso brasileiro. In: Barros, A.; Duarte, J.;<br />

Martinez, R. Comunicação, discursos, práticas e tendências. São Paulo:<br />

Rideel/Uniceub, 2001<br />

DUARTE, M. Y. ; DUARTE, J.A.M. Jornalistas e Relações Públicas em<br />

Organizações Não-Jornalísticas. Brasília, 2002<br />

LÉVY, P. Pela ciberdemocracia. In: MORAES, D. de. Por uma outra comunicação –<br />

mídia, mundialização cultural e poder. Rio de Janeiro: Record, 2003.<br />

MARTIN-BARBERO, J. Globalização comunicacional e transformação cultura. In:<br />

MORAES, D. de. Por uma outra Comunicação – Mídia, mundialização cultural e<br />

poder. Rio de Janeiro: Record, 2003<br />

MORAES, D. de (org). Por Uma outra Comunicação – Mídia, mundialização cultural<br />

e poder. Rio de Janeiro: Record, 2003<br />

SOUSA, J. P. Teorias da Notícia e do Jornalismo. Florianópolis: Argos, 2002<br />

WEBER, M. In: HOHLFELDT, A.; MARTINO, L C.; FRANÇA, V. V. Teorias da<br />

Comunicação – Conceitos, escolas e tendências. Rio de Janeiro: Vozes, 2002<br />

WURMAN, R. S. Ansiedade de Informação – Como transformar informação em<br />

compreensão. São Paulo: Cultura, 1991.<br />

54


__________________________________________________________<br />

ARTIGO<br />

O MITO DA IMPARCIALIDADE NAS MANCHETES, TÍTULOS E<br />

SUBTÍTULOS DOS TEXTOS NOTICIOSOS<br />

55<br />

Marcelo Henrique MARTINS*<br />

Célia Regina Cavícchia VASCONCELOS**<br />

* Graduado em Letras pela FAFICA/Catanduva. Aluno de pós-graduação (strictu sensu) em<br />

Lingüística da UNESP/Araraquara. Professor de Português e Inglês do Ensino Fundamental e Médio<br />

da rede estadual de ensino. Aluno do terceiro ano de jornalismo da UNORP.<br />

** Graduada em Jornalismo-ECA-USP, Letras e Pedagogia – Jales. Mestre em Literatura Brasileira –<br />

Unesp/ S.J. Rio Preto. Professora nos Cursos de Letras e Jornalismo – <strong>Unorp</strong>.<br />

Resumo: O presente trabalho procura identificar, principalmente nas manchetes, títulos e subtítulos<br />

das matérias jornalísticas, outras funções da linguagem, além da referencial. Assim, procura<br />

desmistificar a idéia de que o texto jornalístico é imparcial e objetivo e que, portanto, por trás das<br />

palavras, reside a intencionalidade.<br />

Palavras-Chave: funções; manchetes; títulos; subtítulos; intencionalidade.<br />

Abstract: The present work aims to identify mainly in headlines, titles and subtitles of newspaper news<br />

other language functions besides the referential one. Therefore, it aims to demystify the idea of the<br />

newspapers being impartial and objective and that behind the words it lays the intentionality.<br />

Keywords: functions; headlines; titles; subtitles; intensionality.


Introdução<br />

São seis os fatores que sustentam o modelo de comunicação: emissor,<br />

receptor, canal, código, referente e mensagem.<br />

Segundo McLuhan (apud ARANHA, 1.989, p. 79) ―a mensagem é o meio‖. Já<br />

Jakobson (apud CHALHUB, 2.001, p. 6) enfoca o perfil da mensagem conforme a<br />

meta ou Einstellung (orientação dessa mesma mensagem de acordo com a função<br />

predominante). Para o primeiro, é a própria estrutura da mensagem que permite<br />

uma determinada organização de signos e não outra; para o segundo, a mensagem<br />

estrutura-se em função do fator para o qual está inclinada.<br />

No texto jornalístico noticioso, percebe-se como função predominante para a<br />

verificação da mensagem a função referencial ou denotativa. Aquela com ênfase no<br />

referente, com destaque em o que, ou seja, no acontecido ou no sujeito desse<br />

acontecimento.<br />

Com a função de ―anunciar o acontecimento e resumir a notícia‖, (BAHIA, 1990,<br />

p. 48) isto é, de informar, o título (ou a manchete) também está compromissado com<br />

o fato, com o acontecimento. Privilegia-se, portanto, o referente.<br />

Nos exemplos de manchetes e títulos, a seguir, observamos o uso da<br />

linguagem com a preocupação de informar:<br />

―Aposentado morre em fila no Rio‖ (FOLHA DE SÃO PAULO –<br />

10/01/1992).<br />

―Aposentado morre na fila de espera pelos pagamentos‖(O ESTADO DE<br />

SÃO PAULO – 10/01/1992).<br />

As manchetes da Folha de S.Paulo e do Estadão referem-se à luta dos<br />

aposentados pelo pagamento de um aumento de 147% em suas aposentadorias e<br />

que não estavam sendo pagas pelo governo Collor. Elas são bons exemplos que<br />

demonstram a função referencial ou denotativa. A linguagem jornalística é<br />

referencial por natureza. Tanto a Folha de São Paulo como O Estado de São Paulo<br />

prezaram a objetividade e impessoalidade para a manchete relacionada aos fatos,<br />

preocupando-se em informar. Procuraram responder objetivamente a quem? o quê?<br />

onde? Interessante observar como os dois títulos funcionam até como título-lead,<br />

isto é, anunciam a idéia central específica do próprio lead da notícia.<br />

56


O jornal Folha de S.Paulo, do dia 12/08/03, traz, na primeira página, o título:<br />

―Estudante atira galinha preta viva em Marta‖<br />

Esse título impessoal, objetivo e até descritivo, apresenta como predominante a<br />

função referencial ou informativa. A Folha de São Paulo prezou a informação de<br />

que, quando discursava para estudantes e professores de Direito na comemoração<br />

do Centenário do Centro Acadêmico de Agosto, no largo São Francisco, a prefeita<br />

fora alvo de protestos e do estudante, que é também determinado no título da<br />

página interna – C4 (―Estudante de Direito joga galinha em Marta‖).<br />

O jornal O Estado de São Paulo, do dia 11/08/03, traz na página interna – C3 o<br />

seguinte título: ―Diminui volume de entulho nas margens do Rio Pinheiros‖. E como<br />

intertítulo (olho) ―Projeto Pomar fez campanha para alertar a população sobre o<br />

problema do lixo‖.<br />

Esse título e ―olho‖ de O Estado de São Paulo informam sobre os efeitos da<br />

campanha do Projeto Pomar e seu objetivo por se referirem à situação atual do Rio<br />

Pinheiros. Por conseguinte, é impessoal, sem marcas do emissor, o que confere<br />

neutralidade à informação impressa. Logo, a função referencial se apresenta no<br />

título de forma predominante, o que garante informação definida, clara e<br />

transparente.<br />

Além da função referencial centrada na informatividade, o jornalista ou editor-<br />

chefe podem orientar as manchetes e títulos para outras funções da linguagem<br />

marcantes no discurso jornalístico, como para a emotiva, (com ênfase no emissor)<br />

para a conativa, (com ênfase no receptor) e para a metalingüística, (com ênfase no<br />

código).<br />

O objetivo deste trabalho é analisar, de acordo com Roman Jakobson, algumas<br />

manchetes e títulos dos principais jornais impressos brasileiros, principalmente de O<br />

Estado de S. Paulo e da Folha de S. Paulo, para mostrar que, além da função<br />

referencial ou denotativa predominante na linguagem jornalística, outras funções<br />

dialógicas da linguagem, como as citadas acima, também são utilizadas pelo editor<br />

e/ou jornalista com a finalidade estratégica de conduzir a leitura e atingir uma<br />

intencionalidade.<br />

Perfil emotivo ou expressivo<br />

57


Segundo Jakobson (1999, p.123-4), ―a chamada função emotiva ou<br />

‗expressiva‘, centrada no remetente, visa a uma expressão direta da atitude de quem<br />

fala em relação àquilo sobre o que se está falando. Tende à impressão de certa<br />

emoção‖.<br />

Da mesma forma, Chalhub (2001, p. 17-8) diz que ―a função emotiva tem seu<br />

Einstellung no emissor que deixa transparente as intenções do seu dizer, marcando-<br />

a em 1ª pessoa. A função emotiva implica, sempre, uma marca subjetiva de quem<br />

fala, no modo como fala‖.<br />

Assim, podemos afirmar, repetindo o professor e linguista Lopes (1995, p. 61),<br />

que ―essa função revela o estado emocional do falante perante o objetivo de sua<br />

comunicação. A mensagem com função emotiva não vale pelo conteúdo intelectual,<br />

que veicula, mas sim pela sua carga emocional‖.<br />

Há também manchetes e títulos nos quais percebe-se que o jornalista faz uso<br />

da função emotiva como preponderante. São os chamados títulos expressivos:<br />

―Velhinho morre na fila dos 147%‖ (Folha da Tarde - SP - 10/01/1992).<br />

―INSS mata aposentado na fila‖ (O Dia - RJ – 10/01/92)<br />

As manchetes da Folha da Tarde e de O Dia-RJ referem-se ao mesmo fato<br />

informado pela Folha e pelo Estadão, visto anteriormente. Mas, diferentemente,<br />

apresentam carga emotivo-expressiva. A Folha da Tarde usa a palavra velhinho e,<br />

de acordo com Luís Agostinho Cadore (2000, p. 24), o diminutivo é um recurso<br />

gramatical que pode ser usado para promover a comunicação emotivo-expressiva. O<br />

Dia usa o verbo mata, de forte intensidade expressiva, e chega a ser hiperbólico e<br />

sensacionalista. O conteúdo de sua manchete é altamente ideológico, funciona<br />

como um contraponto ao INSS.<br />

Nas duas manchetes, a função emotiva é predominante. Carregam marcas<br />

expressivas do emissor.<br />

O título „IPI menor de carros é só aspirina‟, diz Furlan, (Folha de S.Paulo, B4,<br />

12/08/03) é construído a partir do discurso direto do ministro. Apresenta o<br />

Einstellung centrado no emissor; tem-se a função emotiva ou expressiva da<br />

linguagem de forma marcante. O título deixa transparente o juízo de autoridade,<br />

ponto de vista do ministro: a redução do IPI para o setor automotivo é qualificada<br />

metaforicamente como comprimido /aspirina, passando a ser configurada como<br />

paliativa.<br />

58


Perfil conativo ou persuasivo<br />

Conativo ―nasceu‖ do termo latino conatum, que significa tentar influenciar<br />

alguém por meio de um esforço. É pela persuasão que percebemos, como disse<br />

Roland Barthes (apud CHALHUB, 2001, p. 12), que o signo não é neutro... nem<br />

inocente. Por isso é mais comum encontrar a função conativa em anúncios<br />

publicitários, como nos exemplos abaixo:<br />

59<br />

Você vai freqüentar tantos lugares legais que é bom mesmo<br />

estar bem-informado. Estadão: é muito mais jornal (O Estado<br />

de São Paulo – C5, 11/08/03).<br />

Além de receber em casa a melhor informação, assinar O<br />

Estado de S. Paulo tem muitas outras vantagens.<br />

Os anúncios publicitários, por natureza, apresentam perfil conativo. O anúncio<br />

de O Estado de S. Paulo procura seduzir o leitor, mostrando a necessidade de estar<br />

bem-informado, já que se vai freqüentar diversos lugares ―legais‖ e O Estadão, que<br />

segundo o anúncio é o jornal de qualidade superlativa e de muitas vantagens,<br />

possibilita aos leitores a boa informação. O anúncio expressa que o jornal é uma<br />

mercadoria de concorrências, comercializável e a ser consumida pelos leitores.<br />

O Estado de São Paulo, do dia 23/03/03, traz no caderno Economia, página B5,<br />

o seguinte anúncio:<br />

Assine Broadcast e faça a diferença você também (A Agência<br />

Estado – solução em informações On-Line).<br />

Há um seleto grupo de executivos financeiros fazendo a<br />

diferença no Brasil. Eles assinam Broadcast, da Agência<br />

Estado.<br />

Broadcast é líder em informações financeiras em tempo real<br />

para negócios e ideal para você, executivo financeiro, que quer<br />

alcançar os melhores resultados para a empresa.<br />

Ligue e solicite uma apresentação sobre como aumentar as<br />

margens de rentabilidade na gestão dos recursos financeiros<br />

de sua empresa e ganhe 15 dias de utilização da Broadcast.<br />

O anúncio da Broadcast, da Agência Estado, apresenta, por natureza<br />

(publicitária), perfil conativo, pois está direcionado para o receptor (você), executivo<br />

financeiro que quer alcançar os melhores resultados para a empresa. Tem a


intenção de convencê-lo a assinar o pacote líder de informações financeiras ideal<br />

para negócios, o Broadcast, e a se tornar um do seleto grupo de executivos<br />

financeiros que ―estão fazendo a diferença‖ no Brasil.<br />

Os usos do imperativo, como assine, faça, e do pronome você, que<br />

discursivamente é de 2º pessoa, são ―marcas registradas‖ que caracterizam o perfil<br />

conativo da comunicação. O desfecho, com a seqüência de imperativos ligue,<br />

solicite, ganhe, torna o anúncio atraente e convidativo para o receptor almejado.<br />

A Folha de S. Paulo, do dia 13/03/03, traz no caderno Ilustrada, página E5, o<br />

seguinte anúncio: ―Todos os dias acontecem 0800 703 8000 coisas. Assine a Folha‖.<br />

―Folha, não dá pra não ler‖.<br />

O seu perfil conativo define-se pelo uso do imperativo assine que se direciona<br />

ao receptor, a fim de convencê-lo.<br />

O perfil conativo além dos anúncios publicitários<br />

Além dos anúncios publicitários, uma manchete ou um título de matéria<br />

jornalística podem apresentar o perfil conativo, ou seja, podem estar marcados<br />

fundamentalmente pela persuasão, pela intenção de seduzir o receptor-alvo.<br />

O suplemento econômico Painel de Negócios, do Estadão, do dia 7/10/03, traz<br />

em sua primeira página, a seguinte manchete: ―Empresas buscam ajuda nas<br />

incubadoras‖.<br />

E, na página interna, p2, tem-se o seguinte título da matéria sobre as<br />

incubadoras: ―As vantagens de estar em uma incubadora‖.<br />

Além da função referencial, que informa uma nova estratégia de<br />

gerenciamento, os títulos se caracterizam também pelo efeito persuasivo, confirmam<br />

o uso de elementos característicos da função persuasiva. Percebe-se que foram<br />

organizados e estruturados com a finalidade de atingir especificamente o pequeno e<br />

médio empresário, como que convidando-o a fazer uso dessa nova estratégia.<br />

As palavras vantagens e incubadora expressam, dentro da sintaxe do título<br />

sobre as incubadoras da página interna, uma relação de pressuposição: possíveis<br />

vantagens se estiver numa incubadora. A relação é lógica, envolve/seduz o receptor-<br />

alvo que fatalmente se interessará pela incubadora como uma alternativa de acesso<br />

à solução ou de crescimento considerável no mercado.<br />

60


O mesmo suplemento econômico, na página interna 4, traz o seguinte título da<br />

matéria sobre flexibilização nas franquias: ―Flexibilização é palavra de ordem nas<br />

franquias‖.<br />

O título é iniciado por um termo específico da economia, que se qualifica<br />

relevante pelo predicado nominal. Apresenta perfil conativo (conação) por promover,<br />

de forma propagandística, a flexibilização como estratégia de sustentação,<br />

expressão comercial e destaque na concorrência em tempos de crise. E, também<br />

apresenta um diferencial (flexibilização) que possibilita uma maior diversificação e<br />

aumento da comercialização de novas franquias como redes menores, Casa do Pão<br />

de Queijo, Nossa Soja (rede de venda de cosméticos), Sol & Sabão Lavanderia. O<br />

título, dentro da página Franquias & Novos Negócios, tem um efeito conativo de<br />

exortação, que leva o receptor a entender a flexibilização como uma forte tendência<br />

atual do mercado de franquias.<br />

O perfil metalingüístico<br />

O lingüista Edward Lopes explica, em sua obra Fundamentos da Lingüística<br />

Contemporânea, que a função metalingüística é a função da mensagem que se<br />

dirige para o código. O homem comunica-se para dois fins básicos: ou para falar<br />

acerca de um referente (função referencial) ou para falar acerca da própria<br />

linguagem (função metalingüística).<br />

61<br />

A função metalingüística pressupõe a existência de uma<br />

língua-objeto (aquela de que eu falo), cujo funcionamento ou<br />

cujo código se quer decifrar. É necessário, para tanto, que se<br />

utilize um outro sistema lingüístico, a meta-língua, com que eu<br />

falo da língua-objeto, meta-língua esta que, por ser melhor<br />

conhecida, vem proposta como um modelo decodificador da<br />

língua-objeto (1995, p. 65).<br />

O jornal O Estado de São Paulo, do dia 9/03/03, traz, no caderno Cidades,<br />

página C3, o seguinte título: ―Polícia é polícia, soldado é soldado‖.<br />

Esse título, tese do coronel da reserva, ex-integrante do Estado-Maior do<br />

Exército, Rubens Tavares, é da notícia referente à presença das Forças Armadas


nas ruas do Rio, agindo como polícia por ―tempos indeterminados‖, como queria a<br />

então governadora Rosinha Matheus Garotinho.<br />

Tal título apresenta perfil metalingüístico, pelo seu retorno aos signos polícia e<br />

soldado, explicitando a distinção entre um e outro pela ênfase dos mesmos. Sua<br />

notícia esclarece que o Exército não está preparado para esse tipo de tarefa, os<br />

soldados reagem pesadamente como se estivessem numa guerra; os policiais,<br />

agentes de segurança pública, treinados para executar operações de controle e<br />

repressão ao crime, usam equipamentos mais adequados às ações armadas na<br />

malha urbana. O título já determina que é importante não confundir os dois papéis.<br />

Toda polícia é soldado, mas nem todo soldado é agente de segurança pública<br />

urbana.<br />

O jornal Folha de São Paulo, do dia 15/06/03 traz, na editoria Cotidiano,<br />

página C1, o seguinte título: ―Poluição por ozônio sufoca Ibirapuera‖. E, como<br />

subtítulo: ―Porque 1,1 milhão de metros quadrados, localizados em S. Paulo ficou<br />

em estado de atenção em 26 dos 351 dias que a CETESB colheu amostras‖.<br />

O título, por ser formado por um termo específico da Química inorgânica, ozônio,<br />

relacionado à ciência, vem acompanhado de ilustração e imagens<br />

predominantemente metalinguísticas, com a finalidade de esclarecer ao receptor o<br />

que é o ozônio (―gás instável formado por três átomos de oxigênio; um agente<br />

oxidante extremamente poderoso‖) e o seu processo físico-químico formador.<br />

A ilustração traz também os efeitos no organismo humano, pauta bastante<br />

comentada por especialistas da USP ao longo da matéria como: ―o ozônio, de fato,<br />

pode atacar o material genético celular. Pode, portanto, formar um tumor‖, diz o<br />

pesquisador Carlos Menck, do Instituto Brasileiro de Ciências Biomédicas da USP‖.<br />

―O ozônio vem acompanhado de uma série de outros oxidantes fotoquímicos. Lesa o<br />

organismo pela capacidade que tem de retirar um elétron de lipídios, das proteínas e<br />

do DNA. Por isso, está relacionado às mutações e, dependendo do lugar onde isso<br />

ocorre, pode gerar um câncer‖ (Folha de S. Paulo. 15/06/03, p1).<br />

Paralelamente à tal ilustração, a Folha traz o subtítulo de classificação feita<br />

por ela mesma; OZÔNIO RUIM, que é esclarecido metalingüísticamente ao leitor:<br />

―sua alta reatividade o torna um elemento tóxico capaz de atacar proteínas, lipídios<br />

(gordura) e, segundo estudos, o DNA. Na troposfera (camada mais baixa da<br />

atmosfera), é capaz de prejudicar o crescimento dos vegetais‖. Observação: neste<br />

contexto, há um processo metalingüístico que traduz lipídios, termo técnico da<br />

62


química orgânica, para gordura, e troposfera, termo técnico de Geografia física, para<br />

camada mais baixa da atmosfera a fim de tornar a matéria editorial inteligível, e<br />

instrucional. Há também o subtítulo OZÔNIO BOM, que é: ―na estratosfera, zona da<br />

atmosfera situada acima da troposfera, caracterizada por um pequeno crescimento<br />

da temperatura, o gás que bloqueia a radiação ultravioleta do sol, formando a<br />

camada de ozônio. A exposição direta aos raios ultravioletas pode causar câncer‖.<br />

Traçados o perfil e a função metalingüística da Folha, concluímos que o jornal<br />

acaba assumindo a função didática, sobretudo quando trata de assuntos das áreas<br />

científica e econômica, marcadas por termos específicos, os chamados termos<br />

técnicos, que acabam levando o jornal a realizar tarefas instrucionais e de infografia<br />

como definição, esquematização, ilustração, exemplificação, artes gráficas, etc.<br />

Quando o jornal decide abordar assuntos da área econômica, principalmente, é<br />

regra cumprir a função didática. É o que acontece com a Folha de São Paulo do dia<br />

26/01/03, editoria Brasil, página A8, na matéria de Clóvis Rossi: ―Superávit será<br />

superior a 4%, diz Meirelles‖. Além das funções referencial e emotiva, o título, pelo<br />

uso da expressão latina superávit, prenuncia a necessidade de um esclarecimento<br />

sobre o significado da própria palavra. O que, de fato, é feito logo no início do lead.<br />

Este funciona como extensão do título: ―O Superávit fiscal primário (receitas menos<br />

despesas do governo, excluídos os juros) será neste ano superior a 4% do PIB<br />

(Produto Interno Bruto) e, portanto, acima da meta de 3,75% acertada pelo governo<br />

de Fernando Henrique Cardoso com o Fundo Monetário Internacional‖. O Lead<br />

orienta-se para a função metalingüística. É o código traduzindo o código econômico.<br />

Conclusão<br />

Os exemplos de manchetes, títulos, subtítulos (intertítulos ou ‗olho‘) e inícios<br />

de ―leads‖ que foram utilizados neste trabalho configuram-se como algumas<br />

modestas expressões dentre as muitas possibilidades no noticiário do nosso<br />

cotidiano. Serviram, porém, para comprovar que a imparcialidade e a<br />

impessoalidade, apesar do propósito do jornalismo, não ocorrem efetivamente.<br />

O texto noticioso jornalístico não é o fato, mas a representação do fato.<br />

(LUSTOSA, 1996, p. 21). E, como representação, está sujeito às intenções da<br />

empresa e de quem o produz. E é essa carga de intencionalidade que, antes de ser<br />

63


um problema no mercado dos meios de comunicação, faz o jornalista e a empresa<br />

ousarem, inovarem e criarem. Para isso, utilizam-se de processos estratégicos na<br />

condução da leitura que incluem não só a intenção de informar, mas também a de<br />

opinar, persuadir e explicar.<br />

Conhecer e principalmente dominar as funções da linguagem em suas<br />

estruturas e dialogismo são tarefas básicas e obrigatórias na vida diária do<br />

profissional do jornalismo. Afinal, por trás da intencionalidade do emissor/jornalista<br />

está não só a informação, mas, e principalmente, a formação e a orientação do<br />

indivíduo para o exercício de sua cidadania. Tarefa que exige um sério compromisso<br />

com o modo como se usa a linguagem.<br />

64


Referências bibliográficas<br />

ARANHA, M. L. de A. Filosofia da <strong>Educação</strong>. 1ª ed. São Paulo: Moderna, 1989.<br />

BAHIA, J. Jornal, história e técnica: as técnicas do jornalismo. São Paulo: Ática,<br />

1990.<br />

BELTRÃO, L.; QUIRINO, N. de O. Subsídios para uma teoria da comunicação de<br />

massa. 3ª ed. São Paulo: Summus Editorial, 1986.<br />

CHALHUB, S. Funções da linguagem. 11ª ed. São Paulo: Ática, 2001.<br />

CADORE, L. A. Curso prático de português. 8ª ed. São Paulo: Ática, 2000.<br />

CITELLI, A. <strong>Linguagem</strong> e persuasão. São Paulo: Ática (série princípios), 2004.<br />

COHN, G. Comunicação e indústria cultural. São Paulo: Companhia Editora<br />

Nacional, 1975.<br />

FARIA, M. A. Como usar o jornal na sala de aula. 3ª ed. São Paulo: Contexto, 1998.<br />

FERREIRA, A. B. de H. Novo Aurélio século XXI: o dicionário da língua portuguesa.<br />

3ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999.<br />

JAKOBSON, R. Lingüística e comunicação. São Paulo: Cultrix, 1999.<br />

LOPES, E. Fundamentos da Lingüística Contemporânea. 14ª ed. São Paulo: Cultrix,<br />

1995.<br />

LAGE, N. Estrutura da notícia. 5ª ed. São Paulo: Ática, 2002. (Série Princípios).<br />

_____. <strong>Linguagem</strong> jornalística. 9ª ed. São Paulo: Brasiliense, 1991. (Coleção<br />

Primeiros Passos, 15).<br />

LUSTOSA, E. O texto da notícia. Brasília: Unb, 1996.<br />

ROSSI, C. O que é jornalismo. 9ª ed. São Paulo: Brasiliense, 1991. (Coleção<br />

Primeiros Passos, 15.).<br />

65


__________________________________________________________<br />

ARTIGO<br />

TRADUÇÃO, CULTURA E MÍDIA:<br />

UM ENFOQUE NA LINGUAGEM<br />

* Graduado em Letras pela UNESP. Mestre em Teoria da<br />

Literatura (UNESP). Doutorando na Universidade de<br />

Londrina (UEL). Docente no Ensino Superior na Uni –<br />

versidade Estadual de Minas Gerais,em Frutal (UEMG)<br />

e no Inst. Mun. De Ensino Superior de Catanduva<br />

(IMES).<br />

*Marcelo PESSOA<br />

Resumo: Nossa proposta é investigar, por meio das teorias pós-coloniais e de elementos da<br />

semiótica peirceana, procedimentos lingüísticos parodísticos e ideológicos que foram adotados na<br />

produção de uma paródia em parte do texto do Hino Nacional Brasileiro difundida pela internet. Essas<br />

teorias são metodologicamente distintas, mas complementares em nossa pesquisa, pois é por meio<br />

delas que acreditamos que nuances da produção de linguagem colonizada serão objetivamente<br />

sustentadas e evidenciadas. Abordando a questão da tradução e da apropriação como auxiliares na<br />

compreensão do problema, esperamos poder identificar, ainda, o percurso que um produto comercial<br />

percorre para se transformar em produto cultural e de consumo de massa dentro da sociedade<br />

capitalista pós-colonial.<br />

Palavras-chave: Publicidade; Pós-colonialismo e Semiótica; Hino Nacional Brasileiro; América Latina;<br />

Internet.<br />

Abstract: Our proposal is to investigate, by means of the theories after-colonials and of elements of<br />

the peirceana semiotics, paroditics and ideological linguistic procedures that had been adopted in the<br />

production of a parody in part of the text of the Brazilian National Hymn spread out by the Internet.<br />

These theories are metodologicaly distinct, but complementary in our research, therefore it is by<br />

means of them that we believe that nuances of the production of colonized language objective will be<br />

supported and evidenced. Approaching the question of the translation and the appropriation as<br />

assistant in the understanding of the problem, we wait to be able to identify, still, the passage that a<br />

commercial product covers to inside changed into cultural product and of consumption of mass of the<br />

capitalist society after-colonial.<br />

Key words: Advertising; After-colonialism and Semiotics; Brazilian National hymn; Latin America;<br />

Internet.<br />

66


1. Introdução<br />

Ao depararmo-nos com a teoria pós-colonial, realizando um trabalho de<br />

pesquisa e análise de texto na esfera da publicidade, o que nos perguntamos,<br />

primeiramente, é do que essa teoria trata, e, depois, como esse assunto se<br />

relacionaria com as estratégias da propaganda e do marketing 1 .<br />

Em linhas gerais, pode-se dizer que essa teoria, dentre outras maneiras, vem<br />

culturalmente à tona por meio das campanhas publicitárias e dos signos da cultura,<br />

os quais desenvolvem uma trama de apropriações sócio-culturais recíprocas que<br />

engendram as dinâmicas de sobrevivência de colonizadores e colonizados.<br />

Contemporaneamente, esta relação assume cunho imperialista por parte do<br />

colonizador e uma identidade consumista por parte do colonizado dentro de um<br />

mesmo paradigma – o mercado. Desse modo, esse lugar cultural subjetivo, ―o<br />

mercado‖, sugere-nos uma intervenção mais bem vista, de um lado, pela ótica da<br />

teoria pós-colonial:<br />

A perspectiva pós-colonial nos força a repensar as profundas limitações de uma<br />

noção ―liberal‖ consensual e conluiada de comunidade cultural. Ela insiste que a<br />

identidade cultural e a identidade política são construídas através de um processo de<br />

alteridade (BHABHA, 2003, p. 244).<br />

E, de outro lado, percebemos que a alteridade (o outro) de que nos fala<br />

Bhabha, se trazida à discussão para análise dentro do universo da mídia, não é um<br />

ente possível, mensurável, pois a alteridade não existe efetivamente, mas consiste<br />

justamente numa ilusão criada pela mídia em torno da cultura capitalista – o<br />

mercado, ou seja, o grande comerciante de felicidades instantâneas e<br />

aparentemente a todos acessível. O consumidor, também, tanto pode ser uma<br />

pessoa determinável, como ninguém em particular, e isso torna a ambos, mercado e<br />

consumidor, entidades de existência efêmera ou meramente casual, de acordo com<br />

as vontades que precisam ser correspondidas no jogo social que os envolve e que<br />

se completa na tríade imperialismo colonizador/mercado/colonizado consumista:<br />

As mercadorias têm um desempenho bem menor daquele que realmente deveriam<br />

ter, até mesmo no sentido imanente ao sistema: se não oferecesse ininterruptamente<br />

1 Termo em inglês que designa todas as atividades de uma empresa associadas com a distribuição e venda<br />

de seus produtos. Ela tem ampla abrangência e cobre atividades como a promoção de vendas,<br />

publicidade e propaganda, pesquisa de mercado, pós vendas e o descobrimento de novas<br />

tendências de mercado e preferências dos consumidores (SANDRONI, 2007, p. 514).<br />

67


aos compradores a ideologia da felicidade, as mercadorias dificilmente suscitariam o<br />

sentimento da felicidade. O conteúdo de realidade torna-se cada vez mais sutil, e vêse<br />

então que o mundo das mercadorias chegou a um ponto no qual simplesmente<br />

precisa romper com a realidade (WILHELM ALFF, 1971, p. 23, apud HAUG, 1997, p.<br />

47).<br />

Portanto, de um lado, apoiando-nos nos pressupostos da teoria pós-colonial,<br />

e, de outro lado, nos parâmetros da estética do consumo, o que nos propomos,<br />

nesse momento, é entender de que maneira nós nos apropriamos dos signos<br />

culturais dispersos na sociedade para compor uma paródia 2 do Hino Nacional<br />

Brasileiro 3 , a qual é, há algum tempo, veiculada pela internet (ver textos da paródia<br />

mais adiante).<br />

Ao lado dessa proposta de análise, antes de irmos diretamente ao texto<br />

parodiado propriamente dito, declinaremos algumas palavras em uso no Brasil<br />

oriundas do idioma inglês (empregadas das mais diversas formas, mas,<br />

principalmente, no ambiente da publicidade), a título ilustrativo, e que nos permitam<br />

antever por meio delas, de um lado, o viés da aceitação cultural passiva e, de outro<br />

lado, o viés da apropriação cultural ativa que se opera pela ação dos usuários da<br />

internet brasileira, contudo, aparentemente orquestrada pela batuta silente do capital<br />

internacional.<br />

A visualização inicial da tríade indústria/mercado/consumo nos permite<br />

perceber uma outra estrutura triádica, aceitação/apropriação/tradução cultural, que<br />

emerge como derivação de alguns vocábulos estrangeiros em uso na língua<br />

cotidiana, a partir dos quais cremos nos será possível depreender e compreender<br />

melhor a maneira pela qual um trecho do texto do Hino Nacional Brasileiro, ora<br />

analisado, ressurge no cenário da cultura brasileira como produto ímpar (uma<br />

mensagem publicitária parodística difundida aleatoriamente pelos sites da internet e<br />

à revelia de qualquer campanha de marketing das empresas cooptadas pela<br />

2 O vocábulo paródia, segundo Massaud Moisés, vem do grego paroidia, e quer dizer canto ao<br />

lado do outro. Continua Moisés, dizendo que o vocábulo também designa a composição<br />

literária que imita, cômica ou satiricamente, o tema ou a forma de uma obra séria. O intuito da<br />

paródia, conclui Moisés, geralmente é o de ridicularizar uma tendência ou um estilo que, por<br />

qualquer motivo, se torna conhecido e dominante (p. 388).<br />

3 A música do Hino Nacional Brasileiro é de Francisco Manuel da Silva, e a letra do poema é de<br />

Joaquim Osório Duque Estrada. O Hino foi instituído oficialmente em 20/01/1890, e ratificado<br />

pelo Decreto 15.671, de 06/09/1922.<br />

68


paródia) e, ao mesmo tempo, plural (a partir do reaproveitamento da mensagem<br />

publicitária parodiada emerge um novo texto revestido de ideologia capitalista).<br />

Por isso, nesse momento, por centrarmos nosso trabalho de análise<br />

predominantemente na palavra escrita, julgamos pertinente nos aproximar de uma<br />

definição de palavra 4 , que pudesse dar conta também das logomarcas 5 impressas<br />

na paródia, e de uma acepção mais ampla de texto 6 , a fim de que, acrescentando-as<br />

ao aporte da teoria pós-colonial e do perfil semiótico 7 da linguagem da sociedade de<br />

consumo, tenhamos uma idéia mais precisa e sintética à qual nos apegar para<br />

empreender a compreensão da natureza do problema da tradução cultural que<br />

estamos estudando, ajudando-nos a entender o universo de informações que se<br />

veicula via mass media.<br />

2. O Merchandising 8 Sócio-cultural na Paródia do Hino Nacional à Luz da<br />

Semiótica<br />

Inúmeras versões de uma paródia do poema do Hino Nacional Brasileiro<br />

circulam em vários sites da internet 9 . Ao contrário do Hino, cuja autoria de letra e<br />

4 Palavra, segundo DUBOIS (1973, p. 449), ―é um elemento lingüístico significativo composto<br />

de um ou mais fonemas, expostos numa transcrição ideogramática, silábica ou alfabética,<br />

compreendida entre dois espaços em branco‖.<br />

5 Marca comercial de uma empresa ou de uma idéia industrial que reúne letras do nome da<br />

empresa ou idéia a elementos formais abstratos, como desenhos, cores, gráficos, etc.<br />

6 Texto, segundo BARROS (1994, p. 7), se define, de um lado, pela estrutura de seus<br />

elementos internos, pela ―organização que faz dele um todo de sentido, como objeto da<br />

comunicação que se estabelece entre um destinador e um destinatário‖, e, de outro lado, pelos<br />

elementos externos que o compõem, tais como o contexto histórico de produção,<br />

conhecimento de mundo dos interlocutores, perfil cultural, etc.<br />

7 Não é demais lembrar que, historicamente, os estudos semióticos são mais antigos do que a<br />

brevidade do nosso texto faz supor. Nöth (1995, p. 18), diz que a semiótica aparece,<br />

inicialmente, no pensamento de John Locke (1632-1704), numa obra denominada Essay on<br />

Human Understanding, de 1690. Nesse seu texto, Locke teria acenado com certa ―doutrina dos<br />

signos‖, à qual dá o nome de Semeiotiké. Há, também, segundo Nöth, o nome de Johann<br />

Heinrich Lambert (1728-1777), que escreveu um dos primeiros tratados específicos sobre o<br />

tema semiótico, intitulado Semiotik. Dentre os pensadores semióticos modernos (Julia Kristeva,<br />

Jacques Derrida, Algirdas Julien Greimas, o próprio Ferdinand Saussure, e, ainda, os<br />

formalistas russos, só para citar alguns), escolhemos nos apoiar, em nossa presente análise,<br />

nos conceitos de Charles Sanders Pierce (1839-1914). Diz-se que esse semioticista tem uma<br />

visão pansemiótica do universo, pois toda as manifestações humanas, incluindo o próprio<br />

homem, para ele, são signos, portanto, cultura, história, ciências, símbolos, manifestações<br />

artísticas, jogos, imagens, textos, mass media, constituem um objeto de estudo passível de ser<br />

analisado. De seu arcabouço, nos apropriaremos indireta e subjetivamente, isto é, sem<br />

explicitações patentes, da categoria legi-signo (da primeira tricotomia), da categoria ícone ou<br />

quali-signo-icônico (da segunda tricotomia), e a categoria argumento (da terceira tricotomia).<br />

8 Conjunto de técnicas de marketing que consiste num esforço adicional à campanha<br />

publicitária normal de um produto, com o objetivo de cristalizar sua imagem de forma subliminar<br />

(SANDRONI, 2007, p. 535).<br />

69


música são publicamente sabidos, a paternidade dessa paródia é apócrifa, senão,<br />

apenas anônima.<br />

Mesmo assim, selecionamos, dentre um rol imenso de ofertas no meio<br />

eletrônico web, uma paródia que nos apareceu em duas versões, porém, com<br />

ligeiras diferenças na recomposição parodística dos representamens 10 . Uma<br />

constando várias substituições no texto original por palavras usadas como<br />

logotipos 11 de grandes empresas:<br />

Num posto da Ipiranga, às margens plácidas,<br />

De um Volvo heróico Br<br />

ahma retumbante,<br />

Skol da liberdade em Rider fúlgido<br />

Brilhou no Shell da pátria nesse instante<br />

Se o Knorr dessa igualdade<br />

Conseguimos conquistar com braço Ford<br />

Em teu Seiko, ó liberdade<br />

Desafia o nosso peito à Microsoft<br />

Ó Parmalat, Mastercard, salve a Sharp<br />

Amil um sonho intenso, um rádio Phillips<br />

De amor e Lufthansa à terra desce<br />

Intel formoso céu risonho Olympicus<br />

A imagem do Bradesco resplandece<br />

Gillette pela própria natureza<br />

És belo Escort impávido colosso<br />

E o teu futuro espelha essa Grendene<br />

Cerpa gelada!<br />

Entre outras mil, és Suvinil, Compaq amada,<br />

Do Philco deste Sollo és mãe Doril<br />

Coca-cola, Bombril!<br />

(Paródia do Hino Nacional Brasileiro, 2004)<br />

9 A idéia de rede está implícita na denominação geral do sistema: www é uma sigla para a<br />

designação world wide web que, ao pé da letra, seria traduzido por ―teia mundial da rede‖, mas<br />

que os usuários conhecem melhor por rede mundial de computadores, ou simplesmente web.<br />

10 Representamen, é o nome peirceano do ―objeto perceptível‖ que serve como signo para o<br />

receptor, é o veículo que traz para a mente algo de fora, é o signo considerado do ponto de<br />

vista ―da sua própria natureza material‖ ou ―como é em si mesmo‖ (NÖTH, 1995, p. 66-67).<br />

11 Grupo de letras que formam uma sigla ou uma palavra reconhecida usualmente como marca<br />

comercial de uma empresa ou idéia industrial.<br />

70


E outra, que se apropria das mesmas idéias presentes na primeira versão,<br />

mas vincula às palavras ou representamens que pretende substituir as logomarcas<br />

das empresas, tornando visualmente mais atraente a subversão parodística que se<br />

operou no excerto do texto oficial:<br />

(Paródia do Hino Nacional Brasileiro, 2004)<br />

O resultado dessas operações textuais parodísticas dá-nos conta inicialmente<br />

de um efeito cômico. Entretanto, ao dedicarmos uma atenção maior aos textos<br />

acima, o que percebemos é que neles ocorreu um interessante jogo de imagens,<br />

palavras e sons, cuja complexidade psico-sócio-cultural coletiva contribuiu para que<br />

se retirasse o texto do Hino Nacional Brasileiro do paradigma da referencialidade<br />

histórica e cultural à qual se prende, recolocando-o num patamar conotativo,<br />

antropológico e metafórico, que se traduz aos olhos do leitor por meio da forma<br />

textual paródia.<br />

71


Nos termos da teoria semiótica de Peirce, o que se conseguiu por meio desse<br />

artifício lingüístico-semântico foi um questionamento do representamen por sua<br />

ausência na letra do Hino Nacional, cuja nova letra deixa de ter o referente histórico<br />

imediato originário, assumindo criativamente os contornos semânticos da conotação<br />

publicitária mediata de legi-signos 12 , materializando-se por meio deles a<br />

mediatização que desencadeia a tradução cultural via mass media.<br />

O caráter metafórico do novo texto transgride o contexto sócio-cultural de<br />

produção do texto oficial do Hino, subvertendo-o via reificação no mass media,<br />

vinculando-o aos objetivos da ideologia de mercado. Embora o texto integral do Hino<br />

Nacional ainda disponha de muitos outros representamens para serem substituídos,<br />

o processo de paródia parcialmente operado em sua letra é suficientemente<br />

conclusivo para que possamos dizer que o que se tem é o que Peirce chama de<br />

semiose, ou seja, uma ―série de sucessivos interpretantes ad infinitum‖ (NÖTH,<br />

1995, p. 107).<br />

O mecanismo difusor (a web) da idéia transgredida (o Hino Nacional<br />

parodiado) é a alegoria da qual se reveste a mensagem publicitária, e que fica<br />

ideologicamente escondida atrás da força do capitalismo (via logomarcas e<br />

logotipos), mas levada adiante pela sutileza da linguagem poemática (elementos<br />

poéticos, como o rimário do texto original do Hino):<br />

Considerado em si mesmo, o representamen que ora discutimos é um quali-signo, um<br />

sin-signo ou um legi-signo. As transformações criativas do representamen aparecem<br />

em todas essas três conformações.<br />

Pela simples inversão ótica das letras impressas, o poema torna-se, à primeira vista,<br />

enigmático; e aí a possibilidade de compreensão se dá apenas do quali-signo. Com a<br />

reversão da imagem refletida num espelho, o quali-signo é transformado em legisigno,<br />

ou seja, em letras e palavras que formam o poema.<br />

Os signos da linguagem na semiose cotidiana funcionam largamente por convenção.<br />

Na medida em que uma palavra está regularmente associada a um dado significado,<br />

ela passa a funcionar como legi-signo (NÖTH, 1995, p. 107-8).<br />

O feedback esperado - compreensão do novo significado do poema Hino<br />

Nacional - é fornecido pelo leitor/consumidor/colonizado, que consome o produto<br />

final – a paródia -, difundindo-o inadvertidamente pela internet. Contudo, o efeito<br />

metafórico não é rapidamente compreendido, não podendo, portanto, ser medido<br />

materialmente (materialmente isso se apresentaria sob a forma do aumento de<br />

consumo dos bens veiculados pelas marcas, por exemplo), pois, implicitamente, o<br />

12 Legi-signo é a palavra, é a lei, é o sentido do dicionário, enquanto que o representamen, é o<br />

que ela quer dizer no contexto em que se aplica.<br />

72


que a paródia revela-nos é que existe um aparato social de aceitação e de<br />

apropriação ideológica da cultura estrangeira, o qual não se deixaria ver facilmente<br />

fora de uma atmosfera virtual como é a web.<br />

A partir desse momento, portanto, deixamos um pouco de lado os<br />

pressupostos pansemióticos de Peirce, e nos reaproximamos aos ditames da<br />

tradução cultural, nos termos da antropofagia Oswaldiana:<br />

Em sucinto resumo das idéias antropofágicas, verificamos que o que assim se<br />

chamou era um conjunto de procedimentos artísticos através dos quais se objetivava<br />

―deglutir‖ o que, para a época do advento do Modernismo no Brasil, era moderno e<br />

desenvolvido ou simplesmente estrangeiro, para depois fazê-lo retornar, revestindo-o<br />

com o nosso subdesenvolvimento tecnológico e com os nossos arcaísmos sócioculturais<br />

impregnados de nossa vivência sob os auspícios do colonialismo (PESSOA,<br />

2003, p. 50).<br />

E também aos procedimentos da domesticação preconizada pelos estudiosos<br />

das teorias da tradução:<br />

The effect of this domestication, as Venuti points out, is that the humour of the piece is<br />

removed, giving priority instead to a familiar and acceptable representantion of the<br />

family – in his view, an undesirable treatment of the foreign text 13 (SCOTT, 1998, p.<br />

05).<br />

Velemo-nos aqui do procedimento antropofágico, uma vez que é importante<br />

coadjuvante à teoria pós-colonial, pois ajuda-nos a entender como se<br />

operacionalizou a tradução cultural por meio da inserção dos logotipos e logomarcas<br />

no texto do Hino Nacional. Esse processo de tradução é também antropofágico<br />

porque parece que contou com certa anuência do leitor/consumidor/colonizado pelas<br />

marcas e, por isso, preferimos lidar em nosso presente texto, com a idéia de<br />

apropriação, conceito mais íntimo da Estética da Recepção 14 e que pressupõe uma<br />

13 Numa tradução livre da citação, temos que; ― a evidência da domesticação, segundo<br />

os apontamentos de Venuti, quando em detrimento da concórdia, prefere-se a<br />

instabilidade familiar e as representações mais adequadas ao contexto do texto<br />

traduzido‖. Ou seja, o tradutor domestica o texto de partida aos moldes da cultura de<br />

chegada quando outros interesses que não os necessariamente do autor estiverem<br />

subjacentes ao momento da tradução. É o que normalmente ocorre nas traduções que<br />

de textos em contextos de lutas étnicas, contexto que exige do tradutor muito mais do<br />

que habilidade na língua de chegada, mas, sobretudo, de muita diplomacia, evitando<br />

contrariar ou interpor-se com seu texto em temas conflitantes.<br />

14 Em português, dentre outros sentidos, o vocábulo recepção quer dizer receber. No entanto,<br />

no sentido como veio do alemão, vinculado aos pressupostos da Estética da Recepção de<br />

73


postura mais ativa por parte do leitor/consumidor/colonizado, e não com a<br />

domesticação, que diz respeito mais ao procedimento empregado pelos tradutores<br />

profissionais, mesmo porque, entendemos que a paródia ora analisada não trata de<br />

uma simples tradução, mas de uma descaracterização jocosa do texto, que pode<br />

representar ou traduzir, ainda, um pouco dos gostos, costumes e comportamentos<br />

culturais e de consumo de certa sociedade num dado momento da história:<br />

As pessoas não se aborrecem lendo. Podem ouvir por educação, num jantar,<br />

jactâncias de personalidades, relatos biográficos, etc. Mas, para ler, escolhem<br />

somente seus convivas, seus próprios assuntos. Querem divertir-se ou lucrar.<br />

Querem economia, beleza, menos trabalho, boas coisas de comer e de usar<br />

(HOPKINS, s/d, p. 45).<br />

Esse procedimento de apropriação cultural ativa permite, por meio da paródia,<br />

que o leitor reconstrua semiologicamente em sua mente uma mensagem que não é<br />

mais a publicitária imperativa – consuma! -, mas a ideológica – você é consumido<br />

pelos produtos e nem percebe. O caráter cômico que a tal mensagem inicialmente<br />

acoplou-se alavanca o efeito multiplicador das idéias de consumo dispersas pelos<br />

ícones do texto e, sem se dar conta, o leitor/consumidor/colonizado, acaba agindo<br />

como agente retransmissor de um conjunto maciço de idéias que não é<br />

necessariamente uma piada, cuja aparência primeira deixa transparecer, mas uma<br />

perpetuação da depauperação colonial de sua própria cultura:<br />

No colonialismo clássico, a população nativa de um país é subjugada por um grupo<br />

de colonizadores. Já no colonialismo interno, os grupos colonizadores são minorias<br />

que vivem sob o controle burocrático dos brancos; conquistados e levados à força<br />

para os Estados Unidos, sua cultura, durante esse processo, foi depreciada ou até<br />

mesmo destruída (CASHMORE, 2000, p. 135).<br />

Equivale dizer-se que, agindo como multiplicador, o leitor/<br />

consumidor/colonizado das mensagens publicitárias contidas na paródia do Hino<br />

Nacional acaba cindindo sua percepção da realidade criando uma marca fictícia que<br />

distingue, de um lado, o contexto do empreendimento colonizador, e, de outro lado,<br />

o contexto do povo colonizado. Ou seja, ―o desenvolvimento é uma viagem com<br />

mais náufragos do que navegantes‖ (GALEANO, 2002, p. 188). O resultado dessa<br />

Jauss, a palavra tem um significado que não é tão usual em língua portuguesa, o de apropriarse<br />

(PEREIRA, 1995, p. 109). Portanto, apropriar-se é o sentido cultural do qual nos valemos<br />

aqui, pois parece ter um valor muito mais ativo por parte do interlocutor, enquanto que o<br />

receber, no sentido como temos a palavra recepção, nos parece ser mais restrito à passividade<br />

e, portanto, pouco útil para o contexto da operação cultural ora estudada.<br />

74


viagem ao mundo do mercado e do consumo é que a depreciação sócio-cultural da<br />

etnia latino-americana não apenas tem nome e sobrenome, mas tem logotipo,<br />

logomarca, e CGC (Cadastro Geral de Contribuinte).<br />

3. A Recepção 15 de Algumas Palavras Estrangeiras no Brasil<br />

Sem esgotar as palavras que aparecem na paródia, e os significados de todos<br />

os vocábulos ingleses ou de outros idiomas em uso na língua portuguesa,<br />

exporemos, agora, alguns dados preliminares de nossa pesquisa. Esse pequeno<br />

número de palavras que, isoladamente, constituem apenas palavras, conforme a<br />

definimos anteriormente, quando vinculadas a grandes empresas multinacionais ou<br />

a determinados bens de consumo, assumem um significado não apenas voltado ao<br />

marketing, mas também ideológico, significado que tende a transcender o nível da<br />

referencialidade na cultura de chegada – a brasileira -, representando nela uma<br />

noção mais conotada, mormente sustentada pelo sistema de idéias do capitalismo e<br />

do lucro da cultura de partida – a política do neo-colonialismo imperialista estados-<br />

unidense.<br />

Essa conotação ideológica entende-mo-la melhor ao olharmos para o<br />

contexto das transformações pós-coloniais do povo latino-americano, empreendidas,<br />

no passado, essencialmente pelos europeus, e, modernamente, a partir dos<br />

acontecimentos dos anos 90, pelos estados-unidenses 16 e pela força do capital das<br />

grandes empresas multinacionais. Se essas transformações ainda não terminaram,<br />

é porque estão em curso, e se estão em curso, nós ainda não somos, estamos<br />

numa condição, num desconfortável entre-lugar, envoltos numa aura de indefinição,<br />

em que um dos signos reveladores dessa circunstância aparece sob o rótulo da<br />

miscigenação latina, que se não serve para justificar nosso subdesenvolvimento,<br />

também não explica nossa dependência ou falta de coragem para dela se apoderar<br />

de forma criativa, inovadora, transcriadora:<br />

15 O vocábulo recepção, aqui, o entendemos nos termos engendrados pela Estética da<br />

Recepção, ou seja, como apropriação, e, ainda, nos termos da Antropofagia, assim sendo,<br />

como deglutição, ingestão e devolução transformada em novidade e genuíno.<br />

16 ―Nesse contexto, os EUA e o Ocidente surgem de modo evidente como os vencedores da<br />

guerra fria‖ (LAMAZIÈRE, 1998, p. 14). E qual esse contexto? ―O desenlace não-militar da<br />

guerra fria deixa de pé por algum tempo as estruturas básicas do Estado soviético – permitindo<br />

prorrogar a ficção de seu status de superpotência [...], inaugurando segundo alguns a era<br />

histórica em que o poder econômico seria mais decisivo do que o militar‖ (Op. Cit, p. 16).<br />

75


Em que formas híbridas, portanto, poderá emergir uma política da afirmativa teórica?<br />

Que tensões e ambivalências marcam esse lugar enigmático de onde fala a teoria?<br />

Falando em nome de alguma contra-autoridade ou do horizonte do verdadeiro [...], o<br />

empreendimento teórico tem de representar a autoridade antagônica (do poder e/ou<br />

do conhecimento) que, em um gesto duplamente inscrito, tenta simultaneamente<br />

subverter e substituir (BHABHA, 2003, p. 47).<br />

Vejamos um pouco da montagem desse quebra-cabeças cultural do qual<br />

somos peças, e que organiza a aceitação e a apropriação, a troca e a subversão,<br />

que se nos mostra no caso da palavra Tang. No idioma inglês, esse vocábulo está<br />

relacionado à idéia de aroma, em português está atrelada à logomarca de um pó<br />

solúvel em água para refrescos de frutas. O que une as acepções em inglês e<br />

português, portanto, pode ser a noção de que o produto preservaria dentro das<br />

embalagens de papel a fragrância natural das frutas que a empresa de sucos<br />

desejaria, assim, vincular à sua marca.<br />

E como proceder quanto à associação da palavra Rider ao conceito original<br />

de cavaleiro? No Brasil, Rider é logomarca de sandálias. As ditas sandálias,<br />

normalmente, são acopladas a momentos de lazer, de descanso, e não a atividades<br />

que exijam algum esforço, como sugere-nos a virilidade associada ao ato de<br />

cavalgar. O que podemos fazer é nos apegar a um sentido menos usual, que vincula<br />

a tradução do vocábulo Rider à idéia de viajante. Aí, sim, o conjunto palavra e<br />

significado fariam algum sentido para o consumidor.<br />

Chop, segundo Carvalho (2004, p. 49), não tem nada a ver com bar, pois quer<br />

dizer cortar, picar. Para que disséssemos em inglês chope, que em português é o<br />

líquido fermentado com cereais, teríamos de usar a palavra draft. Na recepção<br />

dessa palavra houve uma apropriação e não apenas uma aceitação. Isso se deu<br />

devido à semelhança fonética entre chope, em português, e chop, em inglês.<br />

A uma fita adesiva transparente, que serve para fechar pacotes, damos o<br />

nome de durex. Esse nome é usado no país todo, com variações, do tipo ―fita<br />

colante‖ ou ―fita adesiva‖. Entretanto, no inglês, lembra-nos Carvalho ( p. 101), durex<br />

está relacionada, na Inglaterra, a uma marca de preservativos. Nos EUA,<br />

preservativo é condom. O que entendemos como durex (fita colante ou adesiva), por<br />

aqui, deveria ser chamado, se tivéssemos realmente que emprestar um vocábulo da<br />

Inglaterra, esse vocábulo seria sellotape. E se quiséssemos efetivamente continuar<br />

usando um vocábulo estados-unidense, deveríamos usar a expressão scoth tape.<br />

76


O vocábulo citizen já foi até parte de nome de filme. Citizen Kane (Cidadão<br />

Kane, de Orson Welles, 1941). Contudo, o vocábulo citizen tornou-se mais popular<br />

entre nós no Brasil por ser uma marca de relógios. O vínculo entre os dois sentidos<br />

– a idéia de cidadão e o conceito de relógio – provavelmente guarde semelhança na<br />

medida em que o homem moderno, contemporâneo da era industrial, tenha seus<br />

valores e personalidade mensuráveis pela dinâmica do tempo. E mais, ―time is<br />

money‖, dizem os capitalistas; logo, portanto, depreendemos na idéia de que ―tempo<br />

é dinheiro‖ um viés fortemente marcado pela ideologia de mercado nessa marca de<br />

relógio, sentido talvez ignorado pelo homem comum.<br />

Já a palavra Gap, que em inglês relaciona-se ao sema da diferença, da<br />

abertura, aqui virou marca de roupa cara, de grife. Logo, vemos que se preservou,<br />

de algum modo, a idéia original da distinção, da diferenciação que o termo trouxe<br />

consigo, tendo em vista que roupas originais da marca gap são de acesso restrito a<br />

poucos endinheirados no país.<br />

Shell, a seu turno, quer dizer concha. Uma concha é também a logomarca da<br />

empresa multinacional que comercializa petróleo e derivados automotivos pelo<br />

mundo. As conchas vêm do mar. A impressão que nos fica na mente é a de que a<br />

escolha do nome concha para ser associado ao produto deveu-se minimamente por<br />

dois motivos. Primeiro, ao fato de que parte do petróleo é extraído do fundo mar.<br />

Segundo, o de que o que vem do mar é bom, puro, abundante e vivo como a água –<br />

a concha vive na água -, condições que seriam perfeitamente associadas à gasolina<br />

numa campanha publicitária bem feita. Contudo, não temos notícia de que tal<br />

campanha já tenha acontecido.<br />

Dove, por lá, quer dizer pombo, mas, aqui, é marca de sabonete. A ligação<br />

entre os dois conceitos, talvez fique por conta da noção de brancura que alguns<br />

pombos têm, ou também na leveza do vôo das aves, de forma genérica. Porém, no<br />

quesito higiene, se associássemos o nome de dove à idéia dos pombos que<br />

emporcalham nossos carros e praças todos os dias, sem falar nas doenças,<br />

provavelmente o consumo do sabonete sofreria muitas baixas.<br />

Sharp quer dizer agudo, penetrante. No Brasil, Sharp é palavra mais<br />

conhecida como marca de televisor e de alguns aparelhos eletroeletrônicos. No<br />

momento, a idéia que une os dois paradigmas lingüísticos, pode ser a noção de que<br />

o aparelho de tevê penetra, ele entra, enfim, na casa das pessoas. E, segundo<br />

77


nosso presente estudo sócio-cultural, ela, a logomarca e a televisão realmente<br />

adentraram na vida dos brasileiros.<br />

O nome da cantora jovem pop Sandy, da dupla brasileira Sandy e Júnior,<br />

também tem seu segredo. Sand, em inglês, quer dizer areia. Há bem pouco tempo,<br />

muito se alardeou sobre a pureza angelical da donzela Sandy. No entanto, nada foi<br />

dito sobre a associação da brancura da areia (sand, no inglês) ao nome da cantora –<br />

que reserva forte semelhança fonética com a pronúncia do vocábulo /saend/.<br />

Ideologicamente, contudo, temos que à donzela Sandy, nenhum outro nome<br />

provavelmente fosse tão adequado quanto o de sand, ou seja, areia (branca, pura,<br />

limpa, virgem). Não menos importante é a presença ao seu lado de seu fiel<br />

escudeiro, aquele que jamais a irá violar, o irmão Júnior. Júnior é a garantia que o<br />

público adolescente masculino tem, de que qualquer um deles poderá desposar a<br />

jovem Sandy. Daí, a veia ideológica que se sustenta a partir do ―nome arenoso‖ da<br />

jovem, é que a dupla Sandy e Júnior reifica o mito do casal adâmico. Sandy e Júnior<br />

recuperam arquetipicamente a mesma alegoria de Adão e Eva. Eva, portanto, pode<br />

ser qualquer mocinha da platéia dos espetáculos da dupla, todas se comprazem<br />

simbolicamente com a idéia de serem arrebatadas dos perigos pelo redentor Júnior.<br />

Potencialmente, todos os mocinhos da platéia podem ser Júnior, encarnando os<br />

protetores da donzela Sandy, só que eles não têm a competência do dever-fazer de<br />

perpetuar a pureza daquela areia em particular. Com isso o círculo mítico nunca se<br />

fecha e a expectativa feminina de proteção e o desejo masculino de violação se<br />

reavivam ideologicamente a cada show da dupla, retroalimentando o eterno retorno<br />

do mito adâmico da criação da humanidade. Os jovens cantores cresceram, logo, a<br />

dupla não tem mais o gancho simbólico para continuar existindo dessa forma no<br />

imaginário coletivo, o que deixa como alternativa apenas a possibilidade de saída de<br />

cena dos cantores.<br />

Um caso interessante, ainda, é o da palavra hope. Ela quer dizer esperança.<br />

Como ela é usada numa marca de lingerie, a idéia da esperança ganha uma<br />

conotação sensual, pois, ao associarmos a vontade de vestir a roupa que as<br />

mulheres acabam tendo ao ver as propagandas das lingeries daquela marca, à<br />

expectativa masculina de tirá-las, obtém-se um efeito contrário e complementar, no<br />

mínimo bizarro. A convergência semântica dos dois significados institui um paradoxo<br />

que se anula diante de uma mesma mensagem publicitária: enquanto a mulher tem<br />

a esperança de vestir a lingerie hope, o homem tem a esperança de desvestir.<br />

78


Interessante, também, é o caso da palavra Ford. Famosa logomarca dos<br />

carros Ford, sinônimo de qualidade em automóveis no mundo inteiro, vinculada,<br />

historicamente ao pensamento industrial de Henry Ford nos anos 50, ela<br />

simplesmente quer dizer vadear. Ou seja, um dos símbolos do capitalismo industrial<br />

mundial, o fordismo 17 , se traduzido ao pé da letra por nós, seria lido como vadiagem.<br />

Tradução que iria de encontro ao sentido político e econômico que a ela se vincula.<br />

Um laboratório farmacêutico 18 usa o logotipo Ache. Ache quer dizer dor,<br />

sofrimento. A ponte entre os dois significados é mais direta nesse caso, embora o<br />

grande público talvez não tenha noção disso, nem nesse caso e nem nos demais.<br />

Nada mais apropriado ao laboratório farmacêutico, contudo, do que associar-se aos<br />

remédios que produzem, o sema do próprio mal que pretende por meio deles<br />

extirpar.<br />

4. A Operação Pós-colonial dentro da Cultura<br />

79<br />

[...] the experience of colinialism is the problem of<br />

living in the ‗midst of the incomprehensible‘ (BHABHA,<br />

1994)‖ 19 .<br />

Homi Bhabha dá-nos a entender na epígrafe que a raiz do problema colonial<br />

talvez esteja em descobrir-se uma maneira de viver em meio ao ―incompreensível‖.<br />

Perguntamo-nos, então, o que seria essa sua categoria do ―incompreensível‖?<br />

O problema desse olhar sócio-cultural sobre as sociedades pós-coloniais<br />

ganha corpo e necessidade de ser quando o colonizador, ou porque já extraíra os<br />

recursos de que precisava, ou porque simplesmente resolveu voltar para o berço<br />

17 O Fordismo foi um sistema de organização idealizado pelo norte americano Henry Ford, e<br />

que se baseia na transformação da matéria prima, desde as operações mais elementares até o<br />

completo acabamento. Caracteriza-se, essencialmente, por uma forte divisão do trabalho,<br />

trabalho contínuo, trabalho em cadeia, e produção em massa (CALDERELLI, s/d, p. 357).<br />

HOBSBAWM (1995, p. 298), diz mais sobre os efeitos do fordismo: ―A imensa fábrica de<br />

produção em massa construída em torno da correia de transmissão, a cidade ou região<br />

dominada por uma só indústria, no caso de Detroit ou Turim na área automobilística, a classe<br />

operária local unida pela segregação residencial e o local de trabalho numa unidade de muitas<br />

cabeças pareciam ter sido características da era industrial clássica. Era uma imagem irrealista,<br />

mas representava mais que uma verdade simbólica‖.<br />

18 Aché Laboratórios Farmacêuticos Ltda. Via Dutra, Km 222,2 – Guarulhos – SP.<br />

19 No texto traduzido, temos o trecho assim: ―A experiência do colonialismo é o problema de<br />

viver ‗em meio ao incompreensível‖ (BHABHA,2003, p. 213).


natal, deixa o contexto colonizado sem se preocupar em restabelecer, pelo menos<br />

em parte, as desordens que até então operou na alteridade local.<br />

Esse momento é crítico para o contexto da cultura colonizada, porque ela<br />

ficará temporariamente sem um modelo que a identifique sócio-culturalmente. Antes<br />

da chegada do colonizador, ela tinha um modelo de interação com a natureza<br />

pautado pela liberdade plena, e de liderança, pautado pelo primitivo, pelo mágico.<br />

Esse sistema é rudimentar, porém eficiente dentro daquele contexto social, é<br />

fundamentado na ausência de cercas e fronteiras geográficas e na figura central do<br />

cacique e do pajé. Essa comunidade não reconhece na alteridade uma ameaça,<br />

mas uma complementaridade de sua própria existência.<br />

Com a chegada do europeu, os aborígenes foram lançados subitamente para<br />

dentro de um modelo que trazia uma conformação geopolítica e religiosa<br />

hierarquizada que eles não compreendiam, mas que, mesmo assim, foram<br />

obrigados ou educados para aceitar. Eles não viam no Outro uma ameaça, enquanto<br />

que o Outro via neles uma fonte de renda e de satisfação.<br />

Depois, com o final do ciclo exploratório e a subseqüente retirada do<br />

colonizador, o que se viu foi um vácuo, um hiato temporal instransponível num<br />

espaço curto de tempo. Esse vazio se nos apresenta pela falta de um modelo sócio-<br />

político e cultural que pudesse ser adotado pela civilização da ex-colônia,<br />

substituindo a antiga estrutura de organização social que se interpôs entre a<br />

estrutura tribal original e o oco pós-colonial. Ficou no território colonizado um cavo<br />

de poder e de religião, que a cultura, até então entorpecida pela ação colonial não<br />

consegue restabelecer rapidamente. O resultado aparente desse processo é o de<br />

que o povo colonizado nem se reconhece herdeiro de seu próprio sistema cultural<br />

ancestral (degradado no tempo pela duração da ação exploratória colonial), e nem<br />

reúne condições suficientes para continuar exercendo o controle social dentro dos<br />

moldes do colonizador.<br />

Essa é uma face da natureza da transformação do contexto pós-colonial em<br />

termos do ―incompreensível‖ ao qual alude Homi Bhabha. O ―incompreensível‖ é<br />

entendido como sendo os fatos que se passam quando do final da intromissão do<br />

colonizador no contexto da cultura de chegada, e que depois abandona. A categoria<br />

do incompreensível difere da categoria da miscigenação. Enquanto que a<br />

miscigenação é um fato, é uma constatação, é uma definição, ou pelo menos aponta<br />

numa direção cultural, política e genética, é a percepção e aceitação de um espaço<br />

80


híbrido, o incompreensível é o desconforto do ser/estar num entre-lugar, num<br />

espaço desconhecido e familiar. Não à procura de si mesmo, como ocorre no<br />

processo da miscigenação, mas no convívio com a turbulência de tentar descobrir<br />

no que se tornou, e se no que se tornou após a colonização ainda é possível ser o<br />

que era antes dela. O incompreensível não se encaixa no espaço/tempo da cultura<br />

transformada, a miscigenação sim, o que não quer dizer que ambos os processos<br />

não sejam agressivos para todos os atores neles envolvidos.<br />

Em nosso presente estudo, percebemos que esse processo de substituição<br />

se materializou na subversão lingüística do Hino Nacional Brasileiro. As palavras<br />

inglesas em uso no português, apresentadas anteriormente, quando a serviço<br />

apenas da divulgação de suas marcas e da publicidade, agem no sistema cultural<br />

como uma espécie de longa manus do colonizador ou da insaciedade detrativa<br />

capitalista. A teoria pós-colonial, se nos ajuda a perceber esse vazio estrutural<br />

deixado como rastro e ao mesmo tempo dentro do modelo colonial, por outro lado,<br />

suscita-nos questionamentos:<br />

Não passará a linguagem da teoria de mais um estratagema da elite ocidental<br />

culturalmente privilegiada para produzir um discurso do Outro (sic) que reforça sua<br />

própria equação conhecimento-poder? (BHABHA, 2003, p. 45).<br />

Essa operação lingüística pode dar-se, ou por meio de uma aceitação passiva<br />

ou de uma apropriação ativa no meio sócio-cultural.<br />

Por isso é que, quando as palavras inglesas empregadas na publicidade de<br />

conglomerados financeiros são utilizadas para subverter um símbolo nacional<br />

brasileiro, o que notamos é a ocorrência de uma recepção. Essa recepção<br />

pressupõe um ato voluntário dos agentes sócio-culturais que delas se valeram, e<br />

que caminham à contramão do processo de degradação cultural até então vivido<br />

pacificamente por eles mesmos.<br />

É também um processo antropofágico, por meio do qual se revela a<br />

apropriação do elemento estrangeiro e o seu enquadramento dentro de um modelo<br />

nacional. O elemento estrangeiro passa, assim, a ser reconhecido como estranho<br />

dentro do contexto da subversão. Contudo, tanto o modelo nacional (Hino Nacional<br />

Brasileiro), quanto as marcas de certas empresas foram subvertidos, foram<br />

deglutidos antropofagicamente um pelo outro, e devolvidos aos seus respectivos<br />

81


contextos sócio-culturais revestidos de uma de uma aura cultural brasileira que<br />

inverte o rio da história da colonização predatória.<br />

Ou seja, com essa paródia houve uma apropriação cultural, que se deu por<br />

meio das mesmas armas do colonizador: o consumo de massa. O capital<br />

imperialista queria que comêssemos e usássemos seus produtos e bens, mas nós<br />

simplesmente a devoramos, estamos nos apropriando de sua cultura, reelaborando-<br />

a, transformando-a, impregnando-a de brasilidade. Por meio de nossa máquina<br />

eletrônica de publicidade (a internet), popularizamos as prosódias e paródias de um<br />

de nossos maiores símbolos: o Hino Nacional Brasileiro.<br />

Encerramos nossos comentários com a interrogação que nos propõe Galeano<br />

(2002, p.232): ―Qual bandeira tremula sobre as máquinas?‖. Responder essa<br />

questão é necessário, pois é partir do reconhecimento dessa bandeira que o povo<br />

latino-americano romperá com a realidade pós-colonial e criará seu próprio<br />

paradigma. Mas a resposta sugere-nos outra empreitada de investigações.<br />

5. Conclusão<br />

A maior parte de nós não tem a mínima consciência do mecanismo que se<br />

opera na escolha dos nomes dos produtos e das empresas, principalmente se forem<br />

grafados em outra língua. Mas é importante que se depreenda, por intermédio de<br />

nosso presente trabalho, que existe um critério que orienta o mercado na escolha de<br />

determinados nomes de organizações e de alguns produtos à nossa disposição para<br />

mera interação ou para consumo diário.<br />

Um redator de propaganda, para ter uma possibilidade de sucesso, deve obter<br />

informações completas sobre o seu assunto. A biblioteca de uma agência de<br />

propaganda deveria ter livros sobre todos os campos que exigissem pesquisa<br />

(HOPKINS, s/d, p. 77) .<br />

Embora possa parecer em alguns momentos, face ao caráter próximo à sátira<br />

de algumas relações que fizemos, a escolha dos nomes de algumas empresas ou<br />

de certos produtos comerciais não sofrem sempre do efeito parodístico.<br />

Diferentemente do que ocorreu na apropriação lingüística e conseqüente subversão<br />

do trecho do Hino Nacional Brasileiro.<br />

82


A propaganda se assemelha à guerra, salvo na virulência (p. 82). Muitos nomes<br />

inventados, sem nenhum significado, alcançam êxito. Kodak, Karo, Mazda, etc. São<br />

nomes exclusivos. Mas um nome significativo que ajude a realçar uma alegação<br />

preponderante é certamente uma grande vantagem (p.83) (HOPKINS, s/d).<br />

Nesse tocante é importante ressaltarmos o que foi dito na introdução de<br />

nosso trabalho. O mercado aparentemente oferece a todos, via divulgação de<br />

massa, a ilusão do acesso à felicidade que os produtos veiculados nas propagandas<br />

pode proporcionar a quem os consuma. No entanto, nem todo mundo pode adquirir<br />

o bem que deseja – fecha-se o ciclo que começa com a realidade virtual da web,<br />

que passa pela venda de ilusões de propriedade fácil, e desemboca na decepção<br />

pelo desejo não satisfeito.<br />

Se, de um lado, a paródia do Hino Nacional se apresenta como uma<br />

subversão de linguagem, de outro lado, revela-nos também um pouco do grau de<br />

infelicidade que o consumidor experimenta, diante de tantas ofertas captadas pelos<br />

olhos, que se contrapõem à sua realidade financeira. Isto quer dizer que, no caso da<br />

paródia do Hino, o que podemos ter é um preocupante sintoma 20 psíquico de<br />

insatisfação social camuflado por detrás de uma piada.<br />

Os movimentos undergrounds dos anos sessenta espelharam um pouco<br />

dessa rebeldia com relação aos padrões da civilização. Mas o que é<br />

interessante notar é que essa atitude revolucionária é inata no homem, e essa<br />

insurgência é bastante forte nele quando acredita ser através dela o meio<br />

pelo qual vai conseguir ser feliz ou libertar-se daquilo que acredita o estar<br />

oprimindo. Ele deseja a felicidade, a liberdade, e tende a destruir aquilo que<br />

aparentemente se ofereça como um obstáculo à consecução ou livre<br />

execução desses seus propósitos. Mesmo que seja a sociedade ou os pilares<br />

sobre os quais ela se sustenta: a moral, a família, a dignidade, a justiça, etc<br />

(PESSOA, 2004, p. 125).<br />

Não obstante, percebe-se que nesses textos (consideramos as marcas<br />

comerciais como texto) operou-se a paródia, e que o efeito parodístico, precípua e<br />

aparentemente, não foi intencionalmente pretendido pelos detentores das<br />

logomarcas e dos logotipos, mas sofreu, não obstante, um efeito reverso, uma<br />

contaminação da própria paródia operada no Hino Nacional. Assim, conclui-se que,<br />

20 Freud, ao explicitar a natureza do problema sintoma, como material psicossocial acumulado<br />

na mente em distúrbio, assim nos fala: ―O material reprimido luta contra esse destino. Cria para<br />

si próprio, ao longo de caminhos sobre os quais o ego tem poder, uma representação<br />

substitutiva (que impõe ao ego mediante uma conciliação) – o sintoma‖ (FREUD, 1969, p. 190).<br />

A representação substitutiva ou conciliação, cremos que seja a paródia do Hino Nacional.<br />

83


quer no caso do Hino Nacional Brasileiro, quer no caso das logomarcas e dos<br />

logotipos, houve subversão de sentido e todos os textos – no de partida (o texto<br />

original do Hino) e no de chegada, ou seja, o hino nacional parodiado.<br />

Esses mecanismos de escolha, se não se valeram de uma determinada teoria<br />

específica da construção ou da tradução textual, apegaram-se, no mínimo, ao<br />

critério subjetivo da tradução cultural e das ideologias hegemonicamente dominantes<br />

cujo interesse principal é o lucro financeiro e a espoliação da cultura.<br />

À diferença do antigo, este novo imperialismo implicaria uma ação em verdade<br />

civilizadora, uma benção para os países dominados, de modo que pela primeira vez a<br />

letra das declarações de amor da potência dominante de turno coincidiria com suas<br />

intenções reais. Já as consciências culpadas não necessitariam de álibis, senão não<br />

seriam culpadas: o imperialismo atual irradiaria tecnologia e progresso, e até seria de<br />

mau gosto utilizar esta velha e odiosa palavra para defini-lo. Cada vez que o<br />

imperialismo exalta suas próprias virtudes, convém revistar os bolsos (GALEANO,<br />

2002, p. 225).<br />

Se observar esse fenômeno na mídia não nos ajuda a ter uma explicação<br />

sobre o nosso sentido de ser e agir no mundo, pelo menos temos reiterada, por meio<br />

desse olhar parodístico, a consciência de que, ao nos apropriarmos intensamente de<br />

elementos estrangeiros, estamos buscando transformá-los num pouco do que nós<br />

somos, embora ainda não saibamos. Nos termos de Homi Bhabha (1994), isso é<br />

simplesmente o contexto e o desafio de ter de viver em meio ao incompreensível.<br />

84


Referências bibliográficas<br />

AURÉLIO. Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Nova<br />

Fronteira, 1986.<br />

ALVES, J. F. A invasão Cultural Norte-Americana. São Paulo: Moderna, 1988.<br />

AUMONT, J. A Imagem. São Paulo: Papirus, 1985.<br />

BARROS, D. L. P. de. Teoria Semiótica do Texto. São Paulo: Ática, 1995.<br />

BHABHA, H. How newness enters the world. In: _______. The Location of culture.<br />

London: Routledge, 1994, p. 212-275.<br />

____________. O Local da Cultura. Belo Horizonte: UFMG, 2003.<br />

BURKE, P. Hibridismo Cultural. Rio Grande do Sul: Unisinos, 2003.<br />

CALDERELLI, A. Enciclopédia Contábil e Comercial Brasileira. São Paulo: Cetec,<br />

s/d.<br />

CARVALHO, U. W. de. Dicionário das palavras que enganam em inglês. Rio de<br />

Janeiro: Elsevier, 2004.<br />

CASHMORE, E.. Dicionário de Relações Étnicas e Raciais. São Paulo: Summus,<br />

2000.<br />

DORFMAN, A. & MATTELARD, A. Para Leer el Pato Donald: comunicación de masa<br />

y colonialismo. Colombia: Siglo Veintiuno, 1980.<br />

DUBOIS, J. (et alii). Dicionário de Lingüística. São Paulo: Cultrix,1973.<br />

FREUD, S. O Ego e o Id - uma neurose demoníaca. Rio de Janeiro: Imago, 1969.<br />

GALEANO, E. As Veias Abertas da América Latina. Rio de Janeiro: Paz e Terra,<br />

2002.<br />

GOMES, L. L. Novo Dicionário de Expressões Idiomáticas Americanas. São Paulo:<br />

Pioneira Thomson, 2003.<br />

HAUG, W. F. H. Crítica Estética da Mercadoria. São Paulo: Unesp, 1997.<br />

HOBSBAWM, E. Era dos Extremos – O breve século XX. São Paulo: Cia. das<br />

Letras, 1995.<br />

HOPKINS, C. A Ciência da Propaganda. São Paulo: Cultrix, s/d.<br />

KOTHE, F. R. A Alegoria. São Paulo: Ática, 1986.<br />

LAMAZIÈRE, G. Ordem, Hegemonia e Transgressão. Brasília: Instituto Rio Branco,<br />

1998.<br />

MOISÉS, M. Dicionário de Termos Literários. São Paulo: Cultrix, s/d.<br />

85


NÖTH, W. Panorama da Semiótica. São Paulo: AnnaBlume, 1995.<br />

Paródia do Hino Nacional Brasileiro. Disponível em<br />

http://luiz89fre.webblogger.terra.com.br/index. Acesso em 12/05/2004, às11horas.<br />

PEREIRA, M. M. L. Aspectos da Recepção de Clarice Lispector na França. In:<br />

Anuário de Literatura. 3. Florianópolis: UFSC, 1995.<br />

PESSOA, M. Brasil, mostra a tua cara, quero ver quem paga, pra gente ficar assim.<br />

In: _______. A Palavra Cantada pôde Espantar e ao Mesmo Tempo Parecer<br />

Exótica: A Canção de Caetano Veloso. (Dissertação de Mestrado). São José do Rio<br />

Preto: Unesp, 2003, p. 50-54.<br />

______________. O Filme Clube da Luta: um paradoxo triádico à luz do<br />

pensamento de Freud. In Revista <strong>Unorp</strong> – Psicologia e Sociedade. São José do Rio<br />

Preto: UNORP, 2004, ano III, vol. 7, p. 117-129.<br />

SANTAELLA, L. ; NÖTH, W. Imagem – cognição, semiótica, mídia. São Paulo:<br />

Iluminuras, 1999.<br />

SANDRONI, P. Dicionário de Economia do Século XXI. Rio de Janeiro / São Paulo:<br />

Record, 2007.<br />

SCHOLES, J. Ok! – curiosidades divertidas em inglês. Rio de Janeiro: Campus,<br />

2003.<br />

SCOTT, N. Normalisation and reader‟s expectations: a study of literary translation<br />

with reference to Lispector‘s A Hora da Estrela. (Tese de Doutorado em Tradução).<br />

Liverpool: University of Liverpool, 1998.<br />

SODRÉ, M. A Máquina de Narciso – televisão, indivíduo e poder no Brasil. São<br />

Paulo: Cortez, 1994.<br />

86


RESENHA<br />

__________________________________________________________________________<br />

Uma análise do papel do conhecimento na escola<br />

Autor: CORTELLA, Mário Sérgio.<br />

Obra: A escola e o conhecimento: fundamentos epistemológicos e políticos.<br />

0ª edição. São Paulo: Cortez Editora – Instituto Paulo Freire, 2006.<br />

Coleção Prospectiva: 5.<br />

* Docente do Centro Universitário do Norte Paulista (<strong>Unorp</strong>).<br />

Pesquisadora docente na área de <strong>Educação</strong>. Coordenadora<br />

do Núcleo de apoio pedagógico ao docente.<br />

* Maria Aparecida PIMENTEL<br />

87


O livro A escola e o conhecimento: fundamentos epistemológicos e políticos,<br />

de autoria do professor Mário Sérgio Cortella, é resultante da última tese de<br />

doutoramento orientada pelo saudoso professor Paulo Freire. O texto propicia uma<br />

leitura prazerosa e estimulante, obra plena de humanismo, de ‗sedução da<br />

esperança‘ herança freireana e rompe com antigos paradigmas da academia, entre<br />

eles a neutralidade e o racionalismo, defendidos como se ambos fossem possíveis<br />

de convivência harmoniosa.<br />

Os cenários educacionais descritos pelo autor na 1ª edição do livro, em 1999,<br />

estão praticamente ainda conservados no momento da 10ª edição, em 2006, o que<br />

torna atual o objetivo do livro. Cortella localiza a escola e sua eterna "crise"<br />

educacional, em um panorama amplo, marcado, principalmente, pela injustiça social<br />

resultante de um eficaz projeto de dominação, elaborado e executado por uma<br />

minoria gerando, em contraposição, uma massa de excluídos. Diante desse<br />

cenário, apresenta a análise do papel do conhecimento no interior da escola, na<br />

conservação ou transformação da dinâmica social como objetivo central do livro.<br />

Desvenda de modo articulado e claro uma gama enorme de informações sobre<br />

escola e conhecimento em uma análise pertinente que, sem deixar de conter críticas<br />

meticulosas, não cai no desalento e na crítica pessimista. Desconstrói discursos e<br />

jargões cristalizados e, com força ideológica, engendra ações, atribui valores,<br />

determina e impõe o ser humano na realidade, revelando suas fragilidades e,<br />

consequentemente, apontando espaços para transformação daquilo que parece<br />

possuir perenidade.<br />

Adverte também para a repetição, no micro-universo da escola, dos equívocos<br />

cometidos pelos professores ao serem levados pelo drama pessimista e ingênuo<br />

que os envolve: aniquila-se o verdadeiro sentido de trabalho educacional na escola e<br />

despreza-se a capacidade de transformar a situação que nos oprime e exclui.<br />

Na introdução, o autor aponta a urbanização acelerada e desorganizada que<br />

marcou a história social e econômica do Brasil, nos últimos cinquenta anos, como<br />

um dos fatores determinantes dos descalabros observáveis em nosso sistema<br />

educacional. Associado à urbanização (e também por ela responsável), o modelo<br />

econômico desenvolvimentista, que privilegiou a alocação de recursos para criação<br />

de infra-estrutura indispensável à industrialização do país, contribuiu para a falência<br />

do sistema público de ensino. Por outro lado, lembra que esse modelo também teve<br />

88


seu aspecto positivo, pois contribuiu para a ampliação do acesso de um grande<br />

número de pessoas à escolarização.<br />

O capítulo 1 (Humanidade, cultura e conhecimento) retoma a premissa de que<br />

― não há conhecimento sem a ação consciente do ser humano‖ e busca estabelecer<br />

as bases de uma antropologia filosófica explorando pela história civilizatória a<br />

definição do que é ser humano, e como ocorreu essa humanização. Nos dizeres de<br />

Álvaro Vieira Pinto, deixar de ser ―produzido pelo produzido pela natureza” e tornar<br />

um “ produzido produtor do que o produz” . Percorre um "passeio histórico" e vai<br />

coletando e relacionando elementos fundamentais, como as origens e a evolução<br />

biológica das espécies; a cultura do homem produto e produtor; a ação<br />

transformadora do homem sobre a natureza por meio do trabalho, enquanto<br />

atividade humanizadora; o conhecimento e os valores como construção coletiva e<br />

balizadores da existência humana; e, finalmente, a não-neutralidade dos processos<br />

educativos e da ação da escola.<br />

O capítulo 2 (Conhecimento e verdade: a matriz da noção de descoberta)<br />

explora a história da civilização grega, a produção de conhecimento por meio das<br />

indagações da filosofia grega e, mais especificamente, do paradigma que possibilita<br />

a construção da idéia de verdade como "descoberta contemplativa" ou como<br />

―revelação divina‖ originárias da atividade de uma escola dissociada da prática<br />

produtiva, fruto do ócio (tempo livre) e riqueza da aristocracia. Sendo assim, a<br />

vivência e os conhecimentos adquiridos na escola/ócio possibilitavam o domínio da<br />

arte de falar, sensibilizar e argumentar bem, e esse era um fator decisivo para o<br />

domínio e poder nas Ágoras Gregas. Também rejeita o conhecimento apenas como<br />

produto científico, sistemático, metódico e deliberado, apartado paulatinamente da<br />

metafísica aristotélica. Por isso, situa sua concepção de conhecimento,<br />

contrapondo-se à desgastada idéia de verdade. Aborda o conhecimento com suas<br />

múltiplas dimensões, como algo a ser construído pelo sujeito sobre o objeto, com<br />

caráter social-político que se constrói a partir da relação entre o sujeito crítico e o<br />

objeto de estudo, na vivência do coletivo daquele contexto histórico. Cortella afirma<br />

que ―O principal canal de conservação e inovação dos valores e conhecimentos são<br />

as instituições sociais como a família e a igreja, o mercado profissional, a mídia, a<br />

escola etc. ... Desse prisma, a educação é instrumento basilar para nós‖ ( p.49).<br />

O capítulo 3 ( A escola e a construção do conhecimento) trata da mitificação<br />

da ciência e dos cientistas - como mundo e seres fantásticos, respectivamente - na<br />

89


atualidade, lembrando o quanto os professores contribuem, para tanto, quando<br />

deixam de situar as reais condições de produção do conhecimento. Essa mitificação<br />

atinge vários campos do conhecimento, desde a matemática e a física, até a história<br />

e a geografia. Ela interfere na compreensão de conceitos e fatos, mas mais ainda<br />

determina um distanciamento entre o aprendiz e o conhecimento, respaldado pelo<br />

senso comum de que ciência é coisa para "gênios" e alerta contra o pedagocídio, e<br />

reprodução das estórias de descobertas "fantásticas" que nos foram contadas e que,<br />

por considerá-las interessantes, reconta-se aos alunos. O professor CorteIla sugere<br />

revalorizar o prazer de conhecer e desvelar a luta pelo poder que envolve o<br />

conhecimento e finaliza o capítulo com a perspectiva de um conhecimento como<br />

ferramenta da liberdade e de um poder como amálgama da convivência igualitária.<br />

No capítulo 4 ( Conhecimento Escolar: epistemologia e política), para concluir<br />

as reflexões, resgata o tema a partir das concepções sobre a relação entre a escola<br />

e a sociedade. Chama atenção para três delas que alteram doses de otimismo,<br />

pessimismo, ingenuidade e criticidade. Destaca o que denomina otimismo crítico,<br />

como a concepção que considera "a natureza contraditória das instituições sociais"<br />

(p. 135). Nela, apesar de estar contida uma dimensão conservadora, há também o<br />

espaço para inovação. Para que seja possível criar e inovar, é necessário rever a<br />

maneira de avaliar, as concepções prévias sobre a criança, os métodos e tantas<br />

outras questões que se apresentam cristalizadas.<br />

Três idéias são particularmente caras e instigadoras de reflexões fundamentais<br />

para a contemporaneidade. A primeira retoma a importância das mídias na<br />

construção do imaginário social: a propaganda promove nosso consumo de<br />

mercadorias ou ela mesma nos consome? Onde fica a subjetividade em meio ao<br />

duelo e império das marcas que nos invadem pelos ouvidos e olhos, em casa ou<br />

fora dela, com ou sem consentimento?<br />

A segunda (p. 126) e a terceira, distanciadas no texto (p.156), mas<br />

profundamente próximas, tratam da substituição do embate homem versus mundo,<br />

pelo embate homem versus homem e da tão "gasta" e questionada liberdade.<br />

Entretanto, é possível constatar que aceitar, respeitar e conviver com as<br />

diferenças continua sendo um grande desafio. Ao tratar da liberdade e de nossa<br />

capacidade singular de dizer ―não‖, apresenta uma idéia preciosa: ―Ser humano é<br />

ser justo‖ (p. 156). A partir dela, constrói um olhar radical sobre questões como<br />

violência, injustiça e miséria, que ajudará a encontrar soluções para os impasses<br />

90


que afetam desde pequenos grupos até nações e a redefinir o papel da escola, uma<br />

vez que ela continua sendo o espaço legítimo de formação do cidadão.<br />

Só assim é possível vislumbrar o fim do ―vício do circulo vicioso‖, aquela<br />

atitude, pouco edificante, de atribuir o fracasso a tudo que está em volta e que vem<br />

antes de nossa ação, e assumir a perspectiva de um conhecimento como ferramenta<br />

da liberdade e de um poder como amalgama da convivência igualitária.<br />

Com um domínio de conteúdo e de linguagem próprio de quem vive<br />

plenamente os sabores e dissabores da educação, o professor Cortella realizou um<br />

pequeno livro, mas um grande trabalho!<br />

91


RESUMO<br />

___________________________________________________________________<br />

Obra: Rota 66 – A história da polícia que mata<br />

Autor: Cláudio Barcelos de Barcellos (Caco Barcellos)<br />

Editora: Globo S.A<br />

Alunos do 2º ano de Comunicação Social<br />

*Bruno Gonçalves da CRUZ<br />

*Luis Eduardo BERGAMASCHI<br />

* Wilton Vicente Figueiredo HERMES<br />

Na infância, Caco Barcellos, um típico menino pobre da periferia de Porto Alegre,<br />

presencia uma cena de abuso de autoridade por parte do delegado da polícia civil, Dr.<br />

Barriga. Anos mais tarde já exercendo a profissão de jornalista, Caco se depara com uma<br />

situação inusitada. A Rota 66 (uma das viaturas das Rondas Ostensivas Tobias Aguiar)<br />

matara três jovens da classe média/alta de São Paulo alegando troca de tiros. Mesmo sendo<br />

comprovado que os jovens nem armas possuíam, e que foram executados sem clemência,<br />

os PM‘s envolvidos no caso foram absolvidos em um julgamento tendencioso feito pelos<br />

próprios militares, e tendo aval até do governo do estado. Caco começa assim uma<br />

investigação perigosa e reveladora. Com a ajuda de alguns jornalistas e amigos, Barcellos<br />

cria um banco de dados com os nomes dos policiais que se envolveram em tiroteios com<br />

―bandidos‖, traça um perfil dos mortos, e ao final, descobre que a maioria dos assassinados<br />

que os policiais afirmavam serem bandidos perigosos, na verdade nunca tiveram nem<br />

passagem pelos arquivos da polícia, e que as vítimas em potencial eram negros e pardos da<br />

periferia de São Paulo. A frase ―primeiro atiram para depois perguntar‖ é constatada mais de<br />

uma vez pelo jornalista em seus cinco anos de investigação sobre o grupo de extermínio da<br />

polícia militar, a Rota. Um filho de PM, um ator de cinema, estudantes, trabalhadores,<br />

menores de idades, são algumas das vítimas da Polícia Militar de São Paulo, são tachados<br />

de criminosos, porém, sem nada a dever à sociedade.<br />

A investigação termina quando Caco Barcellos consegue imagens de PM‘s<br />

espancando dois jovens, tentando persuadi-los a força a confessarem um crime que não<br />

92


cometeram. As imagens foram divulgadas para todo o Brasil, e depois para o mundo,<br />

causando a expulsão dos envolvidos do corpo da Polícia Militar.<br />

93


RESUMO<br />

___________________________________________________________________<br />

Obra: Jornalismo Investigativo<br />

Autor: Leandro Fortes<br />

Editora: Contexto<br />

*Alunos do 2º ano de Comunicação Social / <strong>2010</strong><br />

94<br />

*Higor RIENTE<br />

*Juliano GOMES<br />

* Lucas CAMACHO<br />

* Renan de ARAÚJO<br />

Um cão foi o centro da primeira investigação jornalística de Leandro Fortes.<br />

Tinha 20 anos e era recém-formado. Na redação era o único estagiário, alvo fácil<br />

das pautas menores. No dia seguinte, a foto do cachorro ficou estampada na<br />

primeira página do Jornal Tribuna, da Bahia.<br />

Ele não sabia, mas, naquele tempo, o termo ―jornalismo investigativo‖ era mais<br />

uma marca do que um conceito. O que caracteriza essa modalidade é o objetivo, o<br />

método de apuração, a forma e o conteúdo final com que a reportagem se<br />

apresenta.<br />

O que diferencia o jornalismo investigativo dos demais são as circunstâncias.<br />

Dividindo em fases, temos: pesquisa minuciosa, paciência e concentração,<br />

insistência e perseverança, frieza e objetividade, dentre outras citadas pelo autor.<br />

O autor faz referência às vinte e três dicas citadas pelo jornalista americano<br />

Jonh Hatcher para se fazer um bom jornalismo investigativo. A principal é ―Leia,<br />

primeiro, o parágrafo de um artigo. Agora, pergunte a si mesmo se essa frase o<br />

incentiva a ler a próxima frase e o restante do texto‖.<br />

Cita como exemplo de matéria investigativa o caso LBA, envolvendo Rosane<br />

Collor com desvios de verbas para empresas de fachada, em 1991. Alerta sobre a<br />

polêmica que envolve o jornalismo investigativo: até onde é permitido ao repórter<br />

dissimular atitudes, usar câmeras e gravadores escondidos, mentir e omitir. Diz que<br />

é por isso que constantemente se fala na também polêmica criação de um Conselho<br />

Federal de Jornalismo, para orientar e fiscalizar a imprensa brasileira.


Como exemplo, lembra-nos de dois casos: Cayman; o dossiê do medo, em<br />

2002, e o OFF partido, que fala sobre o grande jornalista Luis Cláudio Cunha, que<br />

um dia abriu uma informação em off, em 2003, ambos envolvendo o senador<br />

Antonio Carlos Magalhães.<br />

Finaliza lembrando que a busca enlouquecida pela verdade, por mais digna<br />

que seja, não pode tomar o lugar da responsabilidade profissional, muito menos<br />

expor um repórter à sandice de criminosos, como aconteceu com o jornalista Tim<br />

Lopes.<br />

95


RESUMO<br />

___________________________________________________________________<br />

Obra: Jornalismo na era da publicidade<br />

Autor: Leandro Marshall<br />

Editora: Summus<br />

* Alunas do 2º ano de Comunicação Social / <strong>2010</strong><br />

*Fabiana Mingoni RODRIGUES<br />

*Karichele Lauana MARTINS<br />

O livro O jornalismo na era da publicidade, de Leandro Marshall, é o volume<br />

70 da coleção ―Novas buscas de comunicação‖ e sua primeira edição foi em 2003.<br />

Publicado pela editora Summus, o livro tem 172 páginas.<br />

O autor faz uma análise sobre a influência da publicidade no jornalismo. O<br />

livro mostra que os fatores publicitários conquistaram um espaço tão grande na<br />

imprensa que hoje chegam a ter mais força do que a própria informação. E faz com<br />

que uma empresa jornalística raramente fale sozinha. Faz referência às mudanças<br />

sofridas no jornalismo, na informação, no jornalista, no jornal, e mostra, por<br />

pesquisa, que isso fez com que algumas pessoas se tornassem extremamente<br />

céticas quanto à imprensa.<br />

O segundo capítulo conta a história da imprensa, desde a pré-história, quando<br />

aconteceram as primeiras manifestações do que se pode considerar o embrião da<br />

imprensa. Já o capítulo seguinte conta a história da publicidade, que obteve um<br />

crescimento grande e rápido tal que considera-se a atual era como a da<br />

publicidade.<br />

No mundo contemporâneo, a empresa jornalística vende o corpo da notícia e<br />

coloca no lugar uma publicidade disfarçada, é o que chamam de ―Publicidade paga,<br />

que aparece disfarçada de notícia‖. As notícias hoje têm caráter publicitário, usando<br />

de recursos que motivam o leitor ao consumo. São características do chamado<br />

―jornalismo cor-de-rosa‖, termo que apareceu com ―a queda do muro‖ que separava<br />

o jornalismo da publicidade.<br />

96


O livro de Leandro Marshall traz ainda, em cada capítulo, uma frase de<br />

grandes comunicadores, como esta de Ciro Marcondes Filho: ―O leitor torna-se um<br />

objeto de mercado que paga até mesmo pelo papel no qual ele é embrulhado‖.<br />

97


RESUMO<br />

___________________________________________________________________<br />

Obra: Jornalismo de Revista<br />

Autor: Marília Scalzo<br />

Editora: Contexto<br />

* Alunas do 2º ano de Comunicação Social / <strong>2010</strong><br />

98<br />

* Janaína Ap. Pereira da SILVA<br />

* Gabriela da Silva ALVES<br />

* Daniela Cristina da SILVA<br />

A jornalista Marília Scalzo, em Jornalismo de Revista, da editora Contexto,<br />

conta tudo ―o que as revistas não contaram em seus bastidores‖, ou seja, a arte de<br />

escrever jornalismo em revistas e os segredos de como a linguagem visual e textual<br />

dos periódicos atrai os leitores.<br />

Mostra por que a revista ganhou espaço na comunicação editorial. Segundo a<br />

autora, ―é quase uma relação passional dos leitores para com suas revistas<br />

favoritas, são vínculos e laços de empatia bem visíveis, principalmente, quando o<br />

leitor se vê com o periódico debaixo do braço, acompanhando-o para todos os<br />

lados‖. Aborda os problemas financeiros das publicações que não conseguiram<br />

sobreviver no mercado editorial. Cita o curioso exemplo das revistas Realidade e<br />

Life, que, mesmo com grande número de tiragem e não apresentando problemas<br />

financeiros, tiveram que deixar de ser editadas.<br />

Depois de fazer um breve histórico da trajetória das revistas no mundo e no<br />

Brasil, mostra como passaram por transformações e como com a chegada da<br />

tecnologia ganharam um novo conceito. Se antes os textos vendiam o produto<br />

midiático, com o aperfeiçoamento das artes gráficas, as imagens passaram a dar<br />

mais informações e lucros.<br />

Marília relata curiosidades das revistas que mais fizeram sucesso no passado,<br />

no presente, no Brasil e no mundo. Jornalismo de Revista também fala de O<br />

Cruzeiro, um fenômeno editorial do passado. Idealizada pelo jornalista Assis


Chateaubriand, a revista estabeleceu uma nova linguagem na Imprensa Nacional<br />

por meio da publicação de grandes reportagens, através do fotojornalismo. No<br />

apogeu, chegou a vender, na década de 50, a marca de 700 mil exemplares<br />

semanais. No livro, a escritora apresenta a importância do jornalista em mídias<br />

impressas, oferecendo uma espécie de manual com princípios básicos sobre<br />

responsabilidade social, credibilidade e ética. A autora salienta a importância da<br />

apuração e da quantidade de informações qualificadas para produzir um bom texto<br />

que venda a ideia, a notícia ou a ideologia. De acordo com a autora, não adianta<br />

querer ficar ―bordando um texto vazio de informação‖, pois jornalismo não é<br />

literatura.<br />

Portanto, Marília Scalzo desvenda os segredos do jornalismo de revista,<br />

discute as técnicas de construção de um texto mais arejado, específico ao gênero, e<br />

chama atenção para os elementos básicos da esmerada linguagem visual, tão<br />

característica do produto.<br />

99


NORMAS PARA PUBLICAÇÃO – REVISTA UNORP<br />

_________________________________________________________________<br />

1. TIPOS DE TRABALHOS CIENTÍFICOS ACEITOS<br />

Artigos inéditos no Brasil. Em caso de divulgação prévia sob forma de<br />

palestra, comunicações, informar em nota à parte;<br />

Comunicações ou notas, contendo uma ou várias informações científicas<br />

novas, detalhadas ou não, com a finalidade de comunicar pesquisa em<br />

andamento;<br />

Revisões de Literatura;<br />

Resumos de trabalhos publicados (livros, dissertações, teses, etc.);<br />

Relatos de casos (casos clínicos);<br />

Resenhas;<br />

Entrevistas.<br />

2. FORMATAÇÃO<br />

Artigos com no mínimo 06 e no máximo 20 páginas.<br />

Fonte: Arial; tamanho 12; espaçamento 1,5; alinhamento justificado; margens<br />

esquerda e superior 3cm, direita e inferior 2cm.<br />

Exceções: Resumos e abstracts dos artigos devem ser digitados com<br />

espaçamento simples. Notas de rodapé e citações com mais de três linhas<br />

devem ser digitadas em tamanho 10, espaçamento simples.<br />

Idiomas: Português ou Inglês;<br />

Os artigos devem estar de acordo com a norma culta e obedecer as novas<br />

regras ortográficas.<br />

3. ESTRUTURA DOS TRABALHOS<br />

Título – em caixa alta, negritado e centralizado – deverá ser claro e objetivo,<br />

expressando o conteúdo do texto. Pode ser acompanhado de um subtítulo.<br />

Deve-se evitar título extenso, abreviações, parênteses e fórmulas que<br />

dificultem a compreensão;<br />

100


Nomes do(s) autor(es) deve vir abaixo do título, alinhado à direita, com o<br />

último sobrenome em caixa alta. Em caso de mais de um autor, a ordem<br />

deverá ser direta;<br />

Indicar, em nota de rodapé, as credenciais dos autores, constando: cargo que<br />

ocupa; instituição a que pertence e/ou formação acadêmica.<br />

O resumo e o abstract, ambos devem conter no máximo 10 (dez) linhas cada,<br />

em espaço simples (alinhamento justificado). Abaixo do resumo deverão estar<br />

as palavras-chave, e do abstract, keywords – 3 a 5 palavras representativas<br />

do assunto tratado no trabalho, separadas entre si por ponto e vírgula(;);<br />

O texto deve ter introdução, desenvolvimento e conclusão, podendo ou não conter<br />

subtítulos, de acordo com o tamanho do texto. Os textos pequenos não precisam,<br />

necessariamente, conter subdivisões. Os casos especiais deverão ser esclarecidos<br />

diretamente com o Conselho da Revista. Em caso de pesquisas de campo, que<br />

exijam esta especificidade, o artigo científico deve seguir a ordem: introdução,<br />

material e método, resultados, discussão e conclusão.<br />

O uso de aspas deve ser restrito aos casos de citações com menos de 3 (três)<br />

linhas.<br />

Destaque e diferenciações de palavras. Os nomes científicos de espécies, as<br />

palavras em outros idiomas, o termo que se quer enfatizar, etc., devem ser grafados<br />

em itálico, sem aspas.<br />

Notas de rodapé: chama-se notas apenas as informações explicativas (comentários /<br />

observações complementares). Devem ser colocadas ao final do texto, em<br />

espaçamento simples, tamanho 10. Para separar as notas entre si, usa-se 01 espaço<br />

simples.<br />

Pós-texto: Anexos (materiais complementares, não produzidos pelo autor) ou<br />

apêndices (materiais complementares, produzidos pelo autor) devem ser incluídos<br />

apenas quando imprescindíveis à compreensão do texto, e deverão estar localizados<br />

imediatamente após as referências.<br />

3. REGRAS PARA CITAÇÕES<br />

3.1. Citações com menos de 3 (três) linhas<br />

As citações com menos de 3 (três) linhas deverão ser feitas no corpo do próprio texto,<br />

101


destacadas por aspas em caso de citações diretas, seguidas da referência bibliográfica<br />

simplificada (sistema autor/data). Citações diretas são transcrições literais que devem<br />

especificar a página. Ex: Numa outra definição, violência é a ―qualidade de violento; ato<br />

violento; constrangimento; emprego de força; ato de violentar‖ (BUENO, 1980, p. 498).<br />

Obs: As citações em língua estrangeira devem ser traduzidas como notas.<br />

3.2. Citações com mais de 3 (três) linhas<br />

As citações com mais de 3 (três) linhas deverão ser feitas de modo especial: parágrafo<br />

isolado, recuo de 4 cm da margem esquerda, margem direita acompanhando o texto, sem<br />

aspas, tamanho 10.<br />

Ex:<br />

4. REFERÊNCIAS<br />

102<br />

Os assassinatos, torturas e maus-tratos a que estes [crianças e<br />

adolescentes] são violentamente submetidos têm-se apresentado com um<br />

certo caráter de normalidade [...] tais ações [contudo] não são cometidas<br />

de forma individual, mas são conseqüências de um imaginário construído<br />

historicamente que concebe a violência como elemento estruturador e<br />

organizador das relações sociais. (ROURE, 1996, p. 23)<br />

Apenas obras / documentos citados no trabalho devem ser referenciados. As referências, ao<br />

final do texto, deverão ser feitas de forma completa, contendo todos os elementos exigidos<br />

pela ABNT, conforme exemplos a seguir:<br />

Citação de livro com apenas um autor<br />

FALCON, F. J. C. Mercantilismo e transição. 14. ed. São Paulo: Brasiliense, 1994.<br />

Citação de livro com dois autores<br />

MARCONI, M. A.; PRESOTTO, Z. M. N. Antropologia: uma introdução. 4. ed. São Paulo:<br />

Atlas, 1998.


Citação de livro com mais de dois autores<br />

OLIVEIRA, A. S., et al. Introdução ao pensamento filosófico. 6. ed. São Paulo: Loyola, 1998.<br />

Citação de capítulo de livro<br />

PEREIRA, T. S. A convenção e o estatuto. In: MARCONI, M. A (org.). Estatuto da criança e<br />

do adolescente: lei 8.069/90: estudos sócio-jurídicos. Rio de Janeiro: Renovar, 1992, p. 64-<br />

115.<br />

Citação de artigo de jornal<br />

ESCÓSSIA. F. 40% das crianças do país são pobres. Folha de São Paulo, São Paulo, 18<br />

nov. 1997. Cotidiano, p. 1.<br />

Citação de artigo de Revista<br />

JOHNSON, P. O islã na mira. Veja, São Paulo, ano 34, nº 38, p. 9-13, 26 set. 2001.<br />

Citação de artigo de jornal na Internet<br />

MOREIRA, E. C. Hipocondria por procuração em crianças: relato de dois casos. Jornal de<br />

Pediatria, [S.l.], 1999. Disponível em: http://www.sbp.com.br/jornal/99-09.10/relcas3.html.<br />

Acesso em: 24 jun. 2001.<br />

5. FORMAS DE ENVIO<br />

Os trabalhos devem ser submetidos via email (revista@unorp.br), no formato Word (.doc).<br />

6. DIREITOS AUTORAIS<br />

Os direitos autorais dos artigos publicados pertencem ao autor, com direito de 1ª publicação<br />

para a Revista <strong>Unorp</strong>. A reprodução total dos artigos da Revista em outras publicações ou<br />

para qualquer outra utilidade, está condicionada à autorização, por escrito (carta de<br />

encaminhamento da Revista).<br />

OBS: Especificidades em relação à formatação e envio dos artigos deverão ser esclarecidos<br />

diretamente com o Conselho da Revista.<br />

103

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!