Politica Indigena - Faculdade de Direito da UNL
Politica Indigena - Faculdade de Direito da UNL
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(1UEfTOES COLONIAES<br />
IJORTO<br />
1 I - Largo dos L oyos - I4<br />
1910<br />
8 , 5, I,cdr - b:diior.era
POLITICA INDIGENA
IPO VAZ DE SAMPAYd E MELLO<br />
- a -<br />
-- - - - -<br />
--<br />
v -- -- - ---<br />
QUESTOES COLONIAES<br />
<strong>Politica</strong> <strong>Indigena</strong><br />
indigena: Noqõej geraes. -- Educaqão moral<br />
e religiosa dos indigenas. - Instrucqão dos indigenas. -<br />
I Condiqão juridica e pnliticl dos indigenis: - Trabalho<br />
iiidigcna, regimen <strong>da</strong> mão d'obra. - Regima <strong>da</strong> pro-<br />
pric,ln<strong>de</strong> iridigena. -1inp9sto indigena -Credito e mu-<br />
tuali<strong>da</strong>die indigena; assistencia publica.- Utilisação dos<br />
indigenas na dcfeza e policia <strong>da</strong>s coloni3.s. - Organisa-<br />
ção <strong>da</strong>s iiistituiqões administrativas.<br />
I'ORTO<br />
\I.-\G.\I.~~.~ES MOSI%, L.<strong>da</strong>- Editore~<br />
11 - Largo dos Loyos - 14<br />
1910
T-1). a vapór <strong>da</strong> Eiiiprka Lítteraris e Typogi-r.phica<br />
178, Iiua <strong>de</strong> D. Pedro, 184 -- I'orto
CtlPITUI,O I<br />
NOÇOES GERAES<br />
1 <strong>Politica</strong> indigena : significado e nsencia; mo<strong>de</strong>rnismo<br />
/ <strong>da</strong> i<strong>de</strong>ia. - Coriservaqâo e restricções dos usos, insti-<br />
tuições e religiões. - Foro indigena, sua necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
- Mcios civilisadores e utili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s missões. - Possi-<br />
bili<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> civilisação <strong>da</strong> raça negra. - Theoria do<br />
I<br />
iiicio. -- Dados anthropologicos, physiologicos c psy-<br />
cliologicos <strong>da</strong>s diversas varie<strong>da</strong><strong>de</strong>s ethnicas - Equiva-<br />
leiicia <strong>da</strong>s raças humanas.- Conclusóes geraes.
CAPITULO I<br />
<strong>Politica</strong> indigena: mo<strong>de</strong>rnismo <strong>da</strong> i<strong>de</strong>ia, significado, essencia<br />
Sobre o vasto campo sciehtifico dos estudos coloniaes, surgiu ha bem<br />
poiico tempo com o brillio radiante e a magnitu<strong>de</strong> avassalladora d'uni<br />
astro <strong>de</strong> primeira gran<strong>de</strong>za, a doutrina importantissima <strong>da</strong> sociologia colo-<br />
nial, ciljo preluzimeiito veio offuscar e relegar para segiindo plano outras<br />
questóes <strong>de</strong> somenos valia, conserva<strong>da</strong>s atE esse momento na téla <strong>da</strong> dis-<br />
cussão <strong>da</strong>s associaçóes, congressos, revistas e jornaes <strong>de</strong> technica colonial.<br />
Ijurante seculos o empirismo <strong>da</strong> pratica colonisadora, orientado pela norma<br />
fixa d'uma uniformi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> processos, tiio impossivel como irracional, im-<br />
perou incondicionalmente na politica <strong>de</strong> expansáo <strong>de</strong> quasi to<strong>da</strong>s as naçúes<br />
que buscaram um augmento <strong>de</strong> valor economico e <strong>de</strong> importancia politica,<br />
no alastramento do seu dominio colonial. Qualquer que fosse, porbm,<br />
o systema <strong>de</strong> colonisaçáo adoptado, o conjuncto <strong>da</strong>s regras politicas e dos<br />
proce~sos econoniicos e adminiitrativos que o acompanhavam, estava, na<br />
gran<strong>de</strong> maioria dos casos, basilarniente falseado pelo <strong>de</strong>sconhecimento abso-<br />
luto cios factores sociologicos em qiie se <strong>de</strong>via fuii<strong>da</strong>mcntar, e pelo <strong>de</strong>sprezo<br />
total <strong>da</strong>s condiçúes naturaes, que tanto podiam influir na siia mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
Se a irnportancia <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as qnestóes <strong>de</strong> politica indigena e sociologitt<br />
colonial, actualmente evi<strong>de</strong>nte para to<strong>da</strong>s as nações colonisadoras, m6r-<br />
mente para aqiiellas, como Portugal, cujos dominios ultramarinos são hoje
1 0 POLITICA INDIGENA<br />
.- -- -<br />
constituidos (liiasi exclusivamente por colonias <strong>de</strong> exploraçáo e mixtas,<br />
vinha cle longa <strong>da</strong>ta sendo reconheci<strong>da</strong>, é ccrto tambem, que só muito mo<strong>de</strong>rnamente,<br />
<strong>de</strong>pois do Congresso <strong>de</strong> Sociologia Colonial <strong>de</strong> Paris em 1900,<br />
ella se avolumon bastante, na parte intelligente <strong>da</strong> opiniáo que versa colonias.<br />
Até essa <strong>da</strong>ta, salvo opinióes isola<strong>da</strong>s d'iim o11 outro sociologo, esse<br />
con,jiiricto <strong>de</strong> preceitos tão diversos e <strong>de</strong> medi<strong>da</strong>s táo variaveis, que <strong>de</strong>rem<br />
presidir ás relaçóes <strong>de</strong> convivi0 e intercommunicnçáo entre as raças colonisante<br />
e nativa, e A trai~sformaçáo gradual e lenta <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> morlil,<br />
politica e economica d'esta iiltima, achava-se, por assim dizer, latente no<br />
espirito <strong>de</strong> muitos coloniaes distinctos, sem cointado constituir essencialmente<br />
uin corpo <strong>de</strong>firiido <strong>de</strong> doiitriria.<br />
No <strong>de</strong>correr <strong>de</strong> largo tempo, to<strong>da</strong>s as nacóes coloiiisadoras praticaram<br />
diversos systemas cle politica iridigeiia, por lima fórma absoliitamente<br />
iiiconsciente, mais por opportiinismo iilstincti\~o, clo que por imposição racional,<br />
systemas quc raras vezes attingiram os iins a qiie se propunham, pela<br />
<strong>de</strong>feitiiosi<strong>da</strong><strong>de</strong> que os caracterisava e absoluta carencia <strong>de</strong> ftindo scientifico.<br />
Mais tar<strong>de</strong>, com o progresso estonteante <strong>da</strong> sciericia mo<strong>de</strong>rna, impoz-se em<br />
todos os centros <strong>de</strong> estiido, o methodo scientifico como a i~nica maneira <strong>de</strong><br />
caminhar seguramente no clcscobrimento <strong>da</strong> ver<strong>da</strong>tle, c na ccienci:~ <strong>da</strong> colonisaçiio<br />
começaram a inserir-se as correlaçóes aproveitareis dti. nntliropologia,<br />
<strong>da</strong> ethnologia e <strong>da</strong>s recentes tlieorias biologicas. Infelizmente, para o<br />
<strong>de</strong>senvol\limento <strong>da</strong> sociologia colonial, as doiitrinas polygenistas qiie hoje<br />
<strong>de</strong>vem, segiindo varios ~balisadox publicist,as, caracterisar inicialmente o<br />
estudo evoliitivo <strong>da</strong>s socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s coloniaes, 1150 encontraram n'aquella epoclia<br />
um echo bastante sonoro na opiniáo clos qiie no campo colonial, hn mnitos<br />
secillos, Eiaviani indolentemente adormecido A sombra biblica do monogerlisnio,<br />
tlieoricamente miiito provavel, ma.: inadmissivel como base 1initari:l<br />
<strong>de</strong> politica colonial.<br />
Nesse ponto, como em tantos ontroe, (Jiiatrefiiges triiimphava <strong>de</strong><br />
Tjarwin e Lamarck, e a i<strong>de</strong>ia mo<strong>de</strong>rna a cuqto penetrava a formi<strong>da</strong>vel<br />
ve<strong>da</strong>çáo levanta<strong>da</strong> pelo conservantiamo scientifico, tão perigoso como o<br />
mais medieval dos ob. ciirantismos religiosos. Como coilseqiiencia <strong>da</strong>s mais<br />
<strong>de</strong>sastrosas, entre as .t,siiltantês d'uma falsa applicaçáo <strong>da</strong> doiitrina mono-
genista e siil)scliientc iinidã<strong>de</strong> <strong>da</strong>s rtiçns Iiiimanas, perdiiroii I~ngament.~,<br />
na pratica coloiiial, o crnpiri~~mo inctliodic~o <strong>da</strong> IPX: 1111.n, fiin<strong>da</strong>mcntalmente<br />
viciado pela pliir~tliclatle e tlircrgencia dos cnriictcres etlinologicos, aritiiropologicos<br />
c aiitliropo~is~~cliologico~ ilas racas indigenas, e ain<strong>da</strong> pela diversi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
<strong>da</strong>s coridiçóes natiiraes c mesologicas proprias a ca<strong>da</strong> regiáo.<br />
Na ;ictualicl~<strong>de</strong>, cliixiido todos esses factorcs cst;ío sendo ciii<strong>da</strong>dosamente<br />
pontlcrados, e em qiic :L iiliiis appnreiiternente insignificante regra<br />
nova a estal)clecer, para o triitamcnto dos iiidigenas, requer uma elaboraçao<br />
absolutamerite liarmonica com os <strong>da</strong>dos obtidos, o principal caracteristico<br />
d'iima atilti<strong>da</strong> politica indigena, <strong>de</strong>ve resiilir, scnipre qiie as circiinistancias<br />
<strong>de</strong> meio. convicç«cs religiosas <strong>da</strong> rara c i;~ltn (Ic culicsr?o naciond assim<br />
o perinittam, no enraiznmento, rio espirito indigenn, cl'iimn. sincera crença<br />
nas benifeitorias dit civilis:ic%o colonisadorii. Este resultado serR quasi<br />
scrripre attiiigivc~1 tlcs<strong>de</strong> clnc, iistindo cIe processos siiavcs e lentamente progrc~ssivoi..,<br />
st: provoqiic.rii iiit sociediicle indigciia to<strong>da</strong>s as modificações tendcrltcxs<br />
a implicar rnellioria <strong>da</strong>s contliçóes nioraes, aiigmerito do conforto<br />
geral e accrescimo nas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s indivitliiaes.<br />
O problema do t,ratamciito <strong>da</strong>s raças indigenas, cuja importancia vimos<br />
accentuaiiclo, e ci!j;is casuali(1;i<strong>de</strong>s cssenciaes aqui serao tleti<strong>da</strong>inente<br />
examina<strong>da</strong>s, pó<strong>de</strong> str cnc:ir;iclo sob trea aspectos priricipues. Em primeiro<br />
logar occorrc a nccessi<strong>da</strong><strong>de</strong> iinmnncntc: <strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rar as condiçóes moraes<br />
e intcllectnacs dos indigenas, baseiiildo totla :L iiistriicv,:5u c ediicaçilo civilisadora<br />
a ministrar-llies, no estutlo consciencioso e n1irofiin<strong>da</strong>do dos CXracteres<br />
nntliropologicos i1os indiviclaos, <strong>da</strong>s mo<strong>da</strong>litlii<strong>de</strong>~ ethnicas <strong>da</strong> raça<br />
e finalmente na investigayiio tlit psychologia e nivel <strong>de</strong> mentali<strong>da</strong><strong>de</strong> que<br />
Ihes forem proprios, o1)servando continiiainente tis niiiiiinns exteriorisações<br />
ol~jcctivlis, que possaiii rcdiindxr erii rrinis perfeito conliccimento <strong>da</strong> personali<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
moral.<br />
Scgiii<strong>da</strong>rnciitc vc~ciii 03 preceitos ccoiiornicos o11 regiilamentadores,<br />
com cliie se preten<strong>de</strong> iiielhorar ns condiç~es matcriaea dos indigenas, todos<br />
indispcnsavelmente fiin<strong>de</strong>meiitados i10 previo e completo conhecimento d:i~<br />
institiiic;ijes, costiimcs, necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s e acliantamento ecoiiomico <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
indigenri.
12 POLITICA INDIGENA<br />
-<br />
Em terceiro e ultimo logar apparece-nos o problema sob a feição nao<br />
menos interessante, nem <strong>de</strong> menos importancia, <strong>da</strong> <strong>de</strong>terminaçáo do condi-<br />
cionalismo dos factores quc liáo-dc reger o processo evolutivo a adoptar,<br />
para se obter o establecimento <strong>de</strong>finitivo <strong>da</strong>s condiçóes juridicas e politi-<br />
cas do indigena, ou como ci<strong>da</strong>dão colonial, no caso do systema politico<br />
ten<strong>de</strong>r para a antonorniii, ou como snbdito nacional, na Iiypotliese mais<br />
complica<strong>da</strong> <strong>da</strong> assimilaçáo.<br />
Ao espirito essencialmente interesseiro que caracterisou a colonisaçáo<br />
dos poros europeus anterior ao seculo XVII:, em que o mobil ganancioso<br />
do lucro era <strong>de</strong>sacompanliado <strong>de</strong> qualquer oiitro intuito <strong>de</strong> morali<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
mais clcra<strong>da</strong> ou <strong>de</strong> possivcl alcance :iltruista, c em que as condiçóes ma-<br />
teriaes c dircitos politicos dos indigenas eram incognita in<strong>de</strong>termina<strong>da</strong> ou<br />
fact,or niillo, veio a jiint,ar-sc, no meiado do seciilo srs, o principio errado<br />
<strong>da</strong> creaqáo <strong>de</strong> Icis coloniaes i<strong>de</strong>nticas as <strong>da</strong> mctropole, e promulga<strong>da</strong>s no<br />
sentido dc se obtcr a chama<strong>da</strong> assimilação indigena.<br />
Producto <strong>de</strong>generado d'uma philantropia morbi<strong>da</strong>, e conseqiiencia<br />
Iiyperbolica <strong>da</strong> in*jiistifica<strong>da</strong> c inintelligcntc genera1isac;ao dos principias<br />
<strong>de</strong> 89, o conjiincto <strong>de</strong> tentativas para a assimilaçiio dos indigenas nos di-<br />
versos estabelecimentos coloniaes, marca, entretanto, a feiçgo dominante<br />
<strong>da</strong> primeira phase <strong>da</strong> colonisãç~o mo<strong>de</strong>rna, tendo-se tornado indispen-<br />
savel o <strong>de</strong>senvolvimento qiie nos nossos dias tem attingido a sciencia<br />
colonial, para recanibiar dc novo essa ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira titopia, para o campo<br />
cliimerico d'ori<strong>de</strong> mellior fira nunca lisver sahido.<br />
Varios pnblici..;tas <strong>da</strong> catliegoria scientifica. <strong>de</strong> I'iolet, Vnn Z
--<br />
NOÇ~ES GERAES<br />
- - 13<br />
mente posta <strong>de</strong> parte, pois são mais que evi<strong>de</strong>ntes os entrares, por e]]a<br />
suscitados á evolução progressiva <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena, e os prejnizos<br />
cansados aos interesses economicos <strong>da</strong>s colonias, e consequentemente, <strong>da</strong>s<br />
metropoles. O regimen <strong>da</strong> cvol~içilo social nas socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s nascentes, ou nas<br />
socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s indigeiias clas colonias mo<strong>de</strong>rnas, sobre cujo <strong>de</strong>senvolvimento<br />
actuam factores <strong>de</strong> enormc complexi<strong>da</strong><strong>de</strong> e ate hoje por consi<strong>de</strong>rar nos<br />
estndos sociologicos, embora possa ter grad:ições diversas, é, em qiialqiler<br />
caso, accentua<strong>da</strong>mcntc lento, e em hypothese algiima se pó<strong>de</strong> admittir a possibili<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
d'iim progresso briisco d'essas socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s, sob o mero influxo <strong>de</strong><br />
simples <strong>de</strong>cretos, FX crõr~q~to legislados pela mge patria longinqua.<br />
Jlamnosa e execrarel foi to<strong>da</strong> a politicn iiidigena adopta<strong>da</strong> pelos Es.<br />
tados eiiropeiis no inicio <strong>da</strong> si~a expansHo culonial: quando direitos alguns,<br />
mesmo os mais sagrados, se reconheciam aos indigenas siibjugados. Os<br />
processos politicos eram integralmente inspirados pelo exclusivismo do<br />
interesse, e pela intolerancia. dos reprcscntantes <strong>de</strong> Christo. A ganancia do<br />
111vro. Iiypocritamente fun<strong>da</strong><strong>da</strong> na siipposta inferiori<strong>da</strong><strong>de</strong> humana <strong>da</strong>s gentes<br />
pagn~, aprovcitoii essa abomina<strong>da</strong> institiiiç50 politica, a escravidáo, cyjo <strong>de</strong>s-<br />
~pparecimento posterior táo formi<strong>da</strong>vciu commoçócs economicas occasionou.<br />
Por seu lado a iiitolerancia religiosa ren<strong>de</strong>u, nas colonias catholicas,<br />
as pavorosas fogiiciras cujo espectro ain<strong>da</strong> hoje horrorisa, e na America<br />
do Norte, essa diversáo t5o grata aos instinctos sportivos <strong>da</strong> raça anglosaxonica,<br />
<strong>da</strong>s montarias qiic, aos mais rigoristas dos pnritanos escocezes<br />
emigrados, nunca repiignoii fazer, simultaneamcntc. ao grizzly <strong>da</strong>s Montanlias<br />
Rochosas e ao pobre Pclle-Vermelha que náo cornrnnngava no scii<br />
credo religioso, revelando ain<strong>da</strong> por maior <strong>de</strong>splantc, a mais entranha<strong>da</strong><br />
adoraçáo pela mais completa <strong>da</strong>s liherd'
14 POLITICA INDIQENA<br />
- - - - - --<br />
angmento <strong>da</strong> riqueza <strong>da</strong> nnçáo colonisadorit, e ninguem podia imaginar a<br />
enorme importancia, mesmo sob o ponto <strong>de</strong> vista restricto do interesse<br />
economico <strong>da</strong> metrvpole, que, para o progresso do domiiiio colonial, adviria<br />
<strong>da</strong> resolug50 <strong>da</strong>s questócs d'or<strong>de</strong>m moral que llie estáo intimamente associa<strong>da</strong>s,<br />
e qiie sc con<strong>de</strong>nsam, objectiva<strong>da</strong>s, no modulo orientador <strong>da</strong> politica<br />
indigena mo<strong>de</strong>rna. Piira as caractcristicas doq 1)roccssos a adoptar<br />
no tratamento clos intligciiii~, iiSo pc;tle 1i:ivcr regras fixas pre-estabeleci<strong>da</strong>s,<br />
e to<strong>da</strong> a generalisac20 ti alisur<strong>da</strong>. O mais lato dos opportunismo~, intelligen-<br />
temente orientado pelo estrrtlo minucioso do meio, <strong>da</strong> raça e clos costames,<br />
cyja variabili<strong>da</strong><strong>de</strong> E irnmensa, mesmo para as naçúes tle mais insignificante<br />
patrimonio colonial, t1et.c ser a base principal <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a politica indigena.<br />
Conservação e restricçbes dos us93 e instituições indigenas<br />
h conferencia <strong>de</strong> Berlim <strong>de</strong> 1885, e a conferencia <strong>de</strong> 1888 promovi<strong>da</strong><br />
em Lausaiine pelo Instituto <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Internacional, conteem nas suas<br />
actas a primeira consagrayáo doc~imental <strong>da</strong>s mo<strong>de</strong>rnas praticas <strong>de</strong> politica<br />
indigena, referentes 6s conternplaçóes t! processos tolerantes a adoptar,<br />
com respeito ti man~itenç50, mais oii meno3 rd3tri~ta OU aperfeivoa<strong>da</strong>l <strong>da</strong>s<br />
instituiçóes e usos dos indigcna~. EviJentemente, n con~ervaçáo e aper-<br />
feiçoamento por graus inseiisiveis dos seiis organismos adn~inistrativos e<br />
políticos, e dos costumes que náo sejam abertitmente immoraes ou criminosos,<br />
fazem acceitar aoa indigenas, com maior facili<strong>da</strong><strong>de</strong>, a ingerencia<br />
civilisadora <strong>da</strong> raça colonisantc.<br />
Muito variareis e discuticlas teem sido as formulas que, nos diversos<br />
Congressos Coloniaes, se tem procurado estabelecer para fixar os limites,<br />
entre os quaes se <strong>de</strong>verti exercer a referi<strong>da</strong> politica <strong>de</strong> conservação. Como<br />
sempre que se vae recorrer a uma forma dogmatica para regular procedimentos,<br />
ciija unica directriz poasivel tem <strong>de</strong> ser a orientação <strong>da</strong><strong>da</strong> ao criterio<br />
administrador, pelas circuinstancias naturaes, economicas e politicas, e<br />
pelos factores <strong>de</strong> r.iça qiie, mesmo idcntico~, po<strong>de</strong>m eventualmente provocar
esultados contraaictoriu~, não se tem logrado obter a formula conclu-<br />
<strong>de</strong>nte a que se pretendia chegar.<br />
As re<strong>da</strong>cçóes proposbas ao voto dos Congressos sáo bastante differen-<br />
tes na summulit, mas po<strong>de</strong>m entretanto consi<strong>de</strong>rar-se to<strong>da</strong>s comprehendi<strong>da</strong>s<br />
entre as duas seguintes:<br />
A primeira que constituiu objecto d'um voto do Congresso <strong>de</strong> Socio-<br />
logia Colonial <strong>de</strong> 1900, establece que se <strong>de</strong>vem conservar os usos e in-ti-<br />
tuiçóes indigenas, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que não sejam incompativeis com o respeito pela<br />
vi<strong>da</strong> e liber<strong>da</strong><strong>de</strong> Iinmana.<br />
A segun<strong>da</strong>, que foi vota<strong>da</strong> no Congresso Colonial <strong>de</strong> Lisboa <strong>de</strong> 1001,<br />
estatue a manutençáo <strong>da</strong>s instituiçóes e costumes dos indigenas, sempre que<br />
aquellas ou estes náo venham contrariar os preceitos <strong>da</strong> moral e <strong>da</strong> justiça.<br />
Qualqner d'estas formulas nem mesmo theoricamente, (e só sob esse<br />
aspecto consi<strong>de</strong>raremos a questíio) pó<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>fensavel como enunciado<br />
<strong>de</strong>finitivo; apexnr <strong>da</strong> latitu<strong>de</strong> elastica <strong>da</strong> sua fúrma prosodica permittir e<br />
ate: provocar multiplas interpretaçóes, o seu significado não resiste ao<br />
priineiro e leve embate <strong>da</strong> critica mais superficial. Consi<strong>de</strong>rando a primeira<br />
<strong>da</strong>8 regras supracita<strong>da</strong>s, reconhece-se ao primeiro golpe <strong>de</strong> vista a insuf-<br />
ficlencia que a caracterisa. Com effeito, to<strong>da</strong> a, naçáo colonisadora que a<br />
seguisse corno norma, <strong>de</strong> politica indigena, sanccionaria, ipso facto, a anthro-<br />
pophagia que se limitasse a, <strong>de</strong>vorar os inimigos ou parentes acci<strong>de</strong>ntal-<br />
mente mortos, n'aquellas <strong>da</strong>s suas colonias em que essa pratica repellente<br />
subsistisse, e, d'esta maneira, os banquetes <strong>de</strong> carne humana que náo ti-<br />
vesse sido morta n'esse proposito, <strong>de</strong> maneira alguma iriam contra as<br />
restricc,óes <strong>da</strong> formula.<br />
Na mesma or<strong>de</strong>m <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias niÍo po<strong>de</strong>ria a França reprimir as razzias<br />
dos Tuaregues e a pirataris dos Pavilhóes Negros, ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iras instituiçóes<br />
indigenas, e não po<strong>de</strong>riamos n6s, por exemplo, extinguir qualquer socie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
secreta que em Blacau surgisse, com intuitos politicos hostis a Portugal.<br />
Evi<strong>de</strong>ntemente, o mesmo é dizer que a adopção <strong>de</strong> tal formula implicaria<br />
a consagração official, nos eatablecimentos coloniaes, do direito ao roubo,<br />
á rebelliiio e & anthropophagia.<br />
A regra adopta<strong>da</strong> pelo Congresso <strong>de</strong> Lisboa, mais completa que a an-
terior, parece-nos entretanto egualmente imperfeita, pelas diffici~l<strong>da</strong>d~s interpretativas<br />
que offerece a siia sophismatica re<strong>da</strong>cção. O argumento mais<br />
geralmente opposto a esta formiila, cujo enunciado o faz na reali<strong>da</strong><strong>de</strong> suggerir,<br />
baseia-se na variabili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> lei moral e <strong>da</strong>s i<strong>de</strong>ias <strong>de</strong> jiistiça, consoante<br />
as condiçáes mesologicas, etlinicas e a phase <strong>da</strong> evoliição social. O<br />
que B justo, o que B moral para os povos indigenas, pó<strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> o ser<br />
para a raca colonisadora. Com este argiimento cujo valor abertamente reconhecemos,<br />
niio B facil conitado concor<strong>da</strong>r quando establecido na forma<br />
absoluta e impeditira pela qual atravez d'elle alguns publicistas mo<strong>de</strong>rnos<br />
traduzem a sua maneira <strong>de</strong> pensar sobre este assumpto.<br />
Seria obvia a sua justificaçiio se se applicasse a uma socie<strong>da</strong><strong>de</strong> em<br />
formaçáo, entregue apenas á lenta inf iiencia dos eens factores auto-evolutivos,<br />
nias carece em absoluto tle ser limitado quando se refere ás socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
indigenas <strong>da</strong>s coionias contemporaneae, <strong>de</strong> evolução milito mais complexa,<br />
e na qual nunca poclerenios abstrahir <strong>da</strong> influencia obrigatoria,<br />
civilisadora por interesse proprio e altruismo geral, que sobre ella exerce<br />
a naçiio dominadora. E' reconheci<strong>da</strong>mente um gran<strong>de</strong> erro, ir buscar á sociologia<br />
geral illações applicaveis ás questóes coloniaes, sem previamente<br />
ter pon<strong>de</strong>rado todos os coefficientes <strong>de</strong> correcçáo, que constituem lima <strong>da</strong>s<br />
fontes naturaes mais interessantes nos estudos <strong>de</strong> sociologia colonial.<br />
A titulo <strong>de</strong> merfi ciiriosi<strong>da</strong><strong>de</strong>, pois, como já dissemo,a, c': inatlmissivel R<br />
possibili<strong>da</strong><strong>de</strong> do dogmati~mo escolastico em questóes d'esta natureza, citarenios<br />
rim enunciado que, embora incorrecto. d talvez mais consentaneo com<br />
as exigencias do problema, c a cuja formula fomos levado pela pon<strong>de</strong>ração<br />
cui<strong>da</strong>dosa dos argumentos acabados <strong>de</strong> expor. (< As iiistituiçóes c costumes<br />
dos indigenas <strong>de</strong>rem ser co~iservados, quando niio sejam incompativeis com<br />
os preceitos do <strong>Direito</strong> Natural ou com a seguranya politica <strong>da</strong> colonia, e<br />
ain<strong>da</strong> quando n8o representem praticas dc intoleravel selvageria 2.<br />
4 claro, que qiianclo se examinar <strong>de</strong>ti<strong>da</strong>mente esta formiila, pnrecerb<br />
erronea e eiva<strong>da</strong> <strong>da</strong>s faltas impiita<strong>da</strong>s ás anteriores a indicaçáo <strong>de</strong> pre-<br />
ceitos do <strong>Direito</strong> Natiiral, pois a todo o direito correspon<strong>de</strong> tima snncção<br />
que, na hypothese consi,lcrn<strong>da</strong>, 6 a lei moral <strong>de</strong> ciija immiitabili<strong>da</strong><strong>de</strong>,já <strong>de</strong>s-<br />
dissemos. E certo, por, lii, qne os principias geraes <strong>da</strong> lei siio communs a
to<strong>da</strong> a humani<strong>da</strong><strong>de</strong>, servindo-lhe até <strong>de</strong> traço differenciador dos restantes<br />
animaes, e, quanto ás facetas restrictas que localmente possa assumir, ellas<br />
não affectam a sua mais pura essencial e em breve ser50 modifica<strong>da</strong>s pelo<br />
resultado indirecto <strong>da</strong> influencia <strong>da</strong> civilisaqáo no campo educativo. D'essa<br />
infliiencia indirecta sobre os lisos e institiii~óes indigenas, exerci<strong>da</strong> pela<br />
raqa colonisadora, por intermedio <strong>da</strong> instriicçáo e <strong>da</strong> educaqáo, em caso<br />
algum se <strong>de</strong>verá prescindir.<br />
O abstencionismo completo, aconselliado injustifica<strong>da</strong>mente por alguns<br />
sociologos, seria <strong>de</strong> tão nocivos effeitos para os interesses economicos <strong>da</strong> colonisaçáo<br />
e para a rapi<strong>de</strong>z <strong>da</strong> evo1uc;So social, que <strong>de</strong> fórma algnma ó consi<strong>de</strong>rado<br />
como norma acceitavel <strong>de</strong> politica indigena. Ha casos em que, <strong>de</strong>ntro<br />
<strong>de</strong> certos limites, 8 aconselha<strong>da</strong> a politica (te abstençáo relativa. Assim,<br />
por exemplo, quando a raça indigena tiver uma arreiga<strong>da</strong> crença espiritualista<br />
differente <strong>da</strong> religião dos colonisadores, e to<strong>da</strong>s, ou quasi to<strong>da</strong>s as<br />
suas instituivóes e costumes, consubstancia<strong>da</strong>s com os clictames d'essa religiáo,<br />
a mais elementar prii<strong>de</strong>ncia politica e tacto administrativo imporão<br />
Q re-peito absoliito pelo estal)elecido, e uma propagan<strong>da</strong> ediicativa tanto<br />
mais mo<strong>de</strong>ra<strong>da</strong>, quanto o numero <strong>da</strong>s conversfies religiosas costuma ser,<br />
nlesta hypothese, menos que diminuto.<br />
Entre xs instituiç6es indigenas por cii,ja transformaçáo lenta, mais<br />
suave e <strong>de</strong>svela<strong>da</strong>mente se <strong>de</strong>ve empenhar a ediicaçáo civilisadora, avultam<br />
as <strong>de</strong> caracter religioso. Sabi<strong>da</strong> como 8, cZe to<strong>da</strong> a gente, a primordial<br />
importancia <strong>da</strong> uni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> credo como factor <strong>de</strong> nacionalisacáo, compre-<br />
hcn<strong>de</strong>-se e justifica-se plenamente, n'este caso, a propagan<strong>da</strong> tenaz dc assi-<br />
milação religiosa. O processo assimilativc? não visa B iitopica iiniformisaçáo<br />
<strong>da</strong>s ra(jas mas a assentar urna <strong>da</strong>s escoras <strong>da</strong> plataforma, em que o Estado<br />
colonisailor prepara a edificaçáo <strong>da</strong> futura assimilay&o politica. Em mate-<br />
ria tle catcchisação, o gran<strong>de</strong> inimigo e qiiasi inamovivel estorvo ti expan-<br />
350 religiosa do christianismo 6 a doutrina islamita, cuja intensificação<br />
propagandista e especial feição politica provocam, nos povos poiico civilisa-<br />
dos. effeitos para receiar. I?, pois, <strong>de</strong> todo o ponto acceitavel, a opinião <strong>de</strong><br />
Leroy Beaulieii, mostrando as vantagens que se obteriam com a christia-<br />
nisação immediata dos povos africanos ain<strong>da</strong> pagáos, quando mais não<br />
P
18 POLITICA INDIGENA<br />
fosse, para os subtrahir ao intlnxo provavel, em futuro mais ou menos<br />
afastado, do sectarismo mahometano.<br />
No caso proposto, <strong>da</strong> obra colonisadora <strong>de</strong>parar com as difficul<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
inherentes ás instituiyúes e costiim~s dos indigenas imbuidos <strong>da</strong> i<strong>de</strong>ia islamica,<br />
<strong>de</strong> todos os processos a adoptar, o menos efficaz será por certo a<br />
propagan<strong>da</strong> do cliristianismo. Po<strong>de</strong>ndo esses povos encontrar-se em diversos<br />
graus <strong>de</strong> adiantamento social, que correspon<strong>de</strong>rso a outras tantas soluç6es<br />
a <strong>de</strong>scobrir 11itra o problema indjcado, não é facil a prefixaçao <strong>da</strong><br />
politica, mais rapi<strong>da</strong>mente conducente ao escopo a attingir, que <strong>de</strong>ve ser a<br />
penetraçzo intima <strong>da</strong>s raças, <strong>de</strong> forma que, conservando intactos os respectivos<br />
caracteres etlinicos, se logre obter uma ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira associaçjio politica<br />
e econoniica. Na liypotliese <strong>da</strong> raça indigena islamita se achar n'um<br />
e~tado <strong>de</strong> inferioridsdc social fdra he to<strong>da</strong> a proporcionali<strong>da</strong><strong>de</strong>, <strong>de</strong>vem as<br />
principacu jorna<strong>da</strong>s que ria orclem moral a separam dos colonisadores, ser<br />
transpostas pclo ensino leigo tanto doutrinario como pratico. N'este caso,<br />
ou ain<strong>da</strong> qiittndo a raça indigeiia já tenha attingido importante organisaçáo<br />
economica e soc,ial, é eg~ialmente vantajoso, e <strong>de</strong> incalculavel alcance para<br />
a soli<strong>de</strong>z e efficacia tla obra <strong>da</strong> colonisaçáo, o estudo reciproco <strong>da</strong>s linguas<br />
que facilitara o intercambio intellcctiictl e economico, e a~ilanará muitos empenos<br />
fdtalmente nascidos <strong>da</strong> sobreposiyáo <strong>de</strong> duas civilisaçóes differentes.<br />
Mr. <strong>de</strong> Dianoiis, n'uma serie <strong>de</strong> lucidos e bem urdidos relatorios sobre<br />
a politica indiçciia segiii<strong>da</strong> pela Franqa na Tunisia, apresentados ao<br />
congresso colonial <strong>de</strong> Narselha <strong>de</strong> 1906, termina por enunciar as segiiintes<br />
propostas, to<strong>da</strong>s attinentes á assdciaçáo <strong>da</strong> raça fellali com os colonisadores,<br />
sob o ponto <strong>de</strong> viata dos empreliendimentos economicos e progressos<br />
politicos.<br />
Dar a iiiaior cxtensáo pos;ivel ao ensino reciproco do francez e<br />
1.O<br />
do araljc.<br />
2." Dar ao elemento indigena nma participayáo mais activa na vi<strong>da</strong><br />
social dos europeii;.<br />
3." Suppriiiiir as causas cle antagonismo entre colonos e indigenas,<br />
pelo establecimeiií o d'iima legislaç30 rural apropria<strong>da</strong>, e pela creação d'uma<br />
policia rural raiaic~iialinente organisa<strong>da</strong>.
SOGOES GERAES<br />
-- . - - - -- - .-<br />
4.' Fomentar nas duas socie<strong>da</strong>dcs uma cle accordo e associt~~áo,<br />
com o auxilio <strong>de</strong> p~iLlicações <strong>de</strong> propagan<strong>da</strong> em francez e em arabe,<br />
siiggerindo a uns e outros uma compreliensiio mais niti<strong>da</strong> dos seus direitos,<br />
<strong>de</strong>veres e ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros interesses econoniicos.<br />
5.0 Prtzgai-, nas escolas francezas, i<strong>de</strong>ias <strong>de</strong> mntua tolerancia e <strong>de</strong><br />
aproximaçáo.<br />
6.0 Facilitar aos indigenas o accesso dos esta1)lecimentos escolares<br />
frtincezes, primarios c sec~in<strong>da</strong>rios, para que convivam intimamente, <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />
muito novos, com o elemento protector.<br />
7.0 Aproveitar to<strong>da</strong>s as opportuni<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> multiplicar as associaçOes<br />
<strong>de</strong> interesses moraes ou economicos.<br />
8.' Utilisar em mais larga escala, do que até aqui se tem feito, a<br />
cama<strong>da</strong> niiisulmana <strong>de</strong> mais alto nivel intellectnal, que se offerece para<br />
servir <strong>de</strong> travo <strong>de</strong> uniáo entre as iliias socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />
O conjiincto d'estas regras <strong>de</strong> tratamento dos indigenas, perfeitamente<br />
a<strong>da</strong>ptado á sitiiaçáo particular d'aqiielle protectorado francez, representa<br />
nm aqpecto interessante e dos mais complicados que @<strong>de</strong> assumir a politica<br />
indigena, que, n'este caso mais que em qualquer outro, requer um tacto<br />
extraordinarib e uma persereran(;a intelligente e incançavel, para po<strong>de</strong>r<br />
sobrelevar tis dificul<strong>da</strong><strong>de</strong>s quasi invenciveis, que constantemente surgirá0<br />
a entravar a marcha do progresso. Nas nossas colonias <strong>de</strong> mais importante<br />
futuro economico, como Angola e l~oçambique, não tem o nosso<br />
esforço colonisador a luctar, contra a irreductirel corrente <strong>da</strong> i<strong>de</strong>ia e <strong>da</strong><br />
organisação mahometana. As institui~fies po1itica.s e administrativas encontram-se<br />
alli erri estado rudimentar e as tradiqóes sáo em regra apaga<strong>da</strong>s<br />
ou quasi niillas, o que tudo singularmente favorece o processo <strong>da</strong> colonisa-<br />
$0, eliminando muitos dos mais traic;ociros recifes <strong>da</strong> politica indigena, e<br />
zplananclo o carninlio d'uma assimila(;zio politica principalmente <strong>de</strong>fensavel<br />
pra a primeira d'aquellas colonias.<br />
Como j& tivemos occasiáo <strong>de</strong> dizer, as qaestóes <strong>de</strong> politica indigena,<br />
hoje na tela <strong>da</strong> discussáo em todos os paizes coloniaes, adquirem para nds<br />
uma importancia capital. Effectivamente, a composição do dominio colonial<br />
iortuguez, constituido na siia quasi totali<strong>da</strong><strong>de</strong> por colonias <strong>de</strong> exploraç- ao OU
mixtas, attribue aos indigenas que as habitam, com tão gran<strong>de</strong> predorninio<br />
niimerico sobre o elemento europeu, um papel evitlentissimo no <strong>de</strong>senrolar<br />
<strong>da</strong>s respectivas evoluq6es sociaes e economicas. Aproveitando um<br />
raciocinio i<strong>de</strong>ntico <strong>de</strong> Leroy Beaulieu, po<strong>de</strong>riamos imaginar que com o<br />
successo <strong>da</strong> nossa politica indigena, náo sú se erguia o nivrl moral dos indigenas,<br />
e se melhoravam consi<strong>de</strong>ravelmente as suas coiidi(;út~~ materiaes,<br />
mas tambem correlativamente, e por medi<strong>da</strong>s a<strong>de</strong>qua<strong>da</strong>s, a popiilação negra,<br />
miiltiplicando-se rapi<strong>da</strong>mente, se elevava ao triplo do computo actual;<br />
n'essa hypothese to<strong>da</strong>s as qiiestóes orçamentaes, <strong>de</strong> máo d'obra c <strong>de</strong> rneios<br />
<strong>de</strong> communicayáo, que hqje tanto asso1)erl~airi a nossa administrauáo colonial,<br />
ter-se-liiam resolvido por si mesmas. IJrria <strong>da</strong>s condiçóes essenciaes <strong>da</strong> proliferi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
<strong>da</strong>s especies 4, sem contest:i(;90, a idonei<strong>da</strong><strong>de</strong> do meio, e para a<br />
rava liiimana, nm dos factores essenciaea d'essa idonei<strong>da</strong><strong>de</strong>, cifra-se no bem<br />
estar ccoiiomico.<br />
N'estas circumstancias, te<strong>da</strong>s as lei3 e melhoramentos <strong>de</strong> qualquer or<strong>de</strong>m<br />
que, obe<strong>de</strong>cendo a este modulo politico, se forem successivamente introduzindo<br />
nas colonias <strong>de</strong> Portugal, buscando acima <strong>de</strong> tiido o enriquecimento<br />
e eivilisa(;Fio nacionalisadora <strong>da</strong> raça indigena. e provocando o seu rapido<br />
aiigmento, acabar50 por resolver o problema colonial portuguez em to<strong>da</strong><br />
a sua magnitii<strong>de</strong>.<br />
Do que fica exposto para todos os typos <strong>de</strong> institiiic;óes, resalta a<br />
conveniencia <strong>de</strong>, na maioria dos caso., serem conserva<strong>da</strong>s as organisações<br />
administrativas e politicas <strong>da</strong>s socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s indigenas, conservando estas os<br />
seus 1)rimitivos administradores que continuam :i exercer as suas funcções,<br />
sob a vigilancia fiscal <strong>da</strong> administraçko europeia qiie si, intervem para reprimir<br />
abusos graves, regulando os limites <strong>da</strong> siin iritervençáo, sempre pa-<br />
ternal, pelo criterio que a pratica local aconselhar.<br />
Nas colonias <strong>de</strong> populações riutochtones quasi civilisacl:is, oii on<strong>de</strong><br />
tenlia influencia oiitra raça differente, mas tambeni civilisadit em grau<br />
apreciavel, o systema <strong>de</strong> administraqao <strong>de</strong> que se po<strong>de</strong>m colher mais uteis<br />
resiiltados, para R efficacia <strong>da</strong> mo<strong>de</strong>rna politica indigena, 6, indubitavel-<br />
mente, o do protc.1 r orado. Governando na sombra, por <strong>de</strong>traz <strong>da</strong> cortina<br />
ou entre bastidorei.. a acçao orientadora do elemento protector, movendo-se
livre dos attrictos creados pela su~ceptibili<strong>da</strong>dc nacional quc no systema<br />
proposto poilco attingi<strong>da</strong> é, nem por menos ostensiva, <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> infl~iir<br />
intensamente nos resiiltados proficuos qiie, por vezes, se alcançam com<br />
maravilliosa rapi<strong>de</strong>z. O progresso <strong>da</strong> colonisaçáo franceza na Tiinisia, e os<br />
assombrosos resultados <strong>da</strong> politica l~ritannica no Eggpto e na India, são<br />
provas conclu<strong>de</strong>ntes <strong>da</strong>s immensas vantagens d'essc syytema administrativo,<br />
sempre preferivel, quando se realizam as menciona<strong>da</strong>s circumstancias <strong>da</strong><br />
sobreposição <strong>de</strong> civilisaqóes distinctas.<br />
Uma <strong>da</strong>s institui(;i~es indigenas merecedoras <strong>de</strong> estiido mais attento,<br />
e a qiie n'este trabalho se consagrara iim capitulo especial, é a do regimen<br />
<strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>, cuja transformaçáo pG<strong>de</strong> apresentar sérias difficultla<strong>de</strong>s<br />
quando assuma o cnracter collectivo. Dever-se-ha respeitar integralmente,<br />
creando a seli lado a nova proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> individual, e obrigando a proprie-<br />
Ia<strong>de</strong> collectiva, quando muito, a simples regras ten<strong>de</strong>ntes á formação d'um<br />
x<strong>da</strong>stro ou registro especial que a garanta. A evoliiçáo gradual e lenta<br />
!m todos os ramos d'administraçáo <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena firA o resto,<br />
inifori~iis:inclo o typo <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
Como cor~llario<br />
logico e racional <strong>da</strong> doutrina exposta, evi<strong>de</strong>nceia-se<br />
i necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> creaçáo <strong>de</strong> leis especiaes, a<strong>da</strong>ptaveis aos usos e costu-<br />
nes (10s indigenas, formando-se assim um foro propriamente local que, na<br />
hypotliese d'aqiielles nHo possuirem civilisaçáo anterior A obra colonial,<br />
ficar8 caracterisando a epocha <strong>de</strong> transição marca<strong>da</strong> pela conserva~ão<br />
<strong>da</strong>s<br />
nstituiçóes indigenas, que nas differentes phases <strong>da</strong> evoliiçáo social ir50<br />
sendo pouco a pouco modifica<strong>da</strong>s pela organisaqáo europeia.<br />
Pondo absolutamente <strong>de</strong> parte a mania <strong>da</strong> uniformi<strong>da</strong><strong>de</strong> que tantos<br />
:stragos causou em numerosas colonias, <strong>de</strong>ve-se procurar obter iiovos codi-<br />
50s civis, penacs, e <strong>de</strong> processo, 5ol)re a base segura d'iima minuciosa con-<br />
)ilagáo dos iisos e costiimes <strong>da</strong>s popn1:iç~es indigerias, tarefa melindrosa e<br />
lifficilima.<br />
O codigo penal indigena e a respectiva organisaçáo judiciaria e penal<br />
oiistitiiem assumptos summrimente importantes <strong>de</strong> politica indiçena, e por<br />
sso, no <strong>de</strong>correr d'este tr,il~allio,<br />
nos <strong>de</strong>teremos tlemora<strong>da</strong>mente no seu exa-<br />
ae e Istiido comparativo.
22<br />
--<br />
POLITICA IR'DIGEPlA<br />
Meios civilisadores. Utili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s missaes<br />
Afirma<strong>da</strong>s jS as principaes razúes que se opp5c.m ar) regimen <strong>de</strong><br />
abstencionismo piiro ; e adinitti<strong>da</strong> assim, a utili<strong>da</strong><strong>de</strong> iminediata e constante,<br />
para o progresso <strong>da</strong> obra colonial, cla irrupçáo do fluxo civilisatlor no dyna-<br />
mismo latente <strong>da</strong>s socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s indigenas, torna-se necsessario proce<strong>de</strong>r ao<br />
inquerito e pon<strong>de</strong>ração apreciativd dos instrnmentos <strong>de</strong> civilisaqáo <strong>de</strong> qiie<br />
o Estado dominaclor pcÍ<strong>de</strong> iisar, n$ sua alta inissiio <strong>de</strong> aperfeiçoamento <strong>da</strong><br />
organisaçko social dos indigenas, jlue é a parte ~ocio1ogicamei:te mais iin-<br />
portante <strong>da</strong> colonisaçáo mo<strong>de</strong>rna.<br />
O mechanismo complicado dos processos cit~ilisadores.<br />
tlcstinando-se a<br />
impulsionar o avanço (Ias popiilaçfien indigenns nas varia<strong>da</strong>s iiiod:ili<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
do seu estado moral, t~conomico e politico, requer uma gran<strong>de</strong> multiplici-<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> engrenagens iiitliienciailoras, to<strong>da</strong>s aliiis intimamente correlaciona-<br />
<strong>da</strong>s. As micioóes rcligiosris e as escolas primarias, secun<strong>da</strong>rias, agricolas e<br />
industri:~es, exercem a sna acçgo c:ivili~adora, no campo educativo e pe<strong>da</strong>-<br />
gogico; as leis r r~giilamentos npropriados, os mel1ior:inientos matcriaes <strong>de</strong><br />
qualquer natureza, n faci1id:tdc <strong>de</strong> c~ommiinica~6es,<br />
a creaçáo <strong>da</strong> assistencia<br />
publica e <strong>de</strong> mutiiali<strong>da</strong><strong>de</strong>s, a distri1)iiic;Lo equitativa do imposto, a orga-<br />
nisa~ko do credito agricola e <strong>de</strong> trihiinacs para indigenaa, influem no<br />
campo material, politiro e econnmic~o, fomentando a evoliição social; final-<br />
mente a hospitxli-:i(:>% ns~istenci~t<br />
metlica, sanramrnto geral, irnposiçáo<br />
<strong>de</strong> praticas 11'-girnicnq e fisrrtlisaç&o rigorosa (10 trabalho indigena, eri-<br />
tando o tlrpanperamcnto <strong>da</strong> raca, esten<strong>de</strong>m no campo physiologico a siia<br />
benefica acçRo.<br />
De entrt. os agentes <strong>de</strong> progresso colonial acima eniimerados, assiimem<br />
algiins proporl:Í~cs <strong>de</strong> tal importailcia, como factores <strong>da</strong> politica <strong>de</strong> trata-<br />
mento (10s iii~ligenas. cliie, por s17n natiireza, estso indicados com merito<br />
para c~stiitlo ('I, dctalhe e comparaç20, inccmportavel com a norma <strong>de</strong> cri-<br />
tica gcncrali- ''orn adopta<strong>da</strong> no presente capitulo.
~ogbss GERAES 23<br />
Por esse motivo serão estu<strong>da</strong>dos separa<strong>da</strong>mente, com o <strong>de</strong>senvolvimento<br />
que reclamam a sua innegavcl importancia e gran<strong>de</strong> actiiali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
interesse, formando o assiimpto dos succecsiros capitiilos componentes d'este<br />
trabalho.<br />
A acçúo civilisadora <strong>da</strong> metropole ten<strong>de</strong> a encurtar enormemente o<br />
caminho evolutivo que separa as populaçóes indigenas sclvagens oii barbaras,<br />
<strong>da</strong> phase social correspon<strong>de</strong>nte A civilis~çáo dominante. Se se ~dmittir<br />
o criterio <strong>de</strong> Leroy Beaulieu, que envolve a i<strong>de</strong>ia, hqje por completo posta<br />
<strong>de</strong> parte, <strong>da</strong> caracterisaqáo dos estadios selvagem e barbaro, respectivnmente<br />
pelo regimen <strong>da</strong> caça e pesca, e pela occupaçáo pastoril, ou ngricola<br />
inicial, &-se levado á conclnsão <strong>da</strong> ignalcladc iic efficiencia dos diversos<br />
agentes <strong>da</strong> civilisaçáo.<br />
Como hoje est$ completamente abandona<strong>da</strong> esta classificaçHo, irremissivelmente<br />
con<strong>de</strong>mna<strong>da</strong> pelos <strong>da</strong>dos ctlinograpliicos, pouca confiança se<br />
po<strong>de</strong>ria ficar <strong>de</strong>positando em consequencias dcdnzi<strong>da</strong>s <strong>da</strong>, admiss50 d'essa<br />
hypothese.<br />
O distincto puhlicista americano I'anl Reinscli, fiin<strong>da</strong>ndo-se n'uma<br />
<strong>da</strong>s ver<strong>da</strong><strong>de</strong>s mais evi<strong>de</strong>ntes <strong>da</strong> sociologia geral, a importancia <strong>da</strong> organisaqilo<br />
economica como base <strong>de</strong> todos os phcnomenos socines, establece como<br />
unica caracteristica scientifica, plausivelmente applica\~cl ás socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s nascentes,<br />
o adiantamento economico. Sendo assin~, apparecc-nos singularrnente<br />
engran<strong>de</strong>ci<strong>da</strong>, em extens;Tto e effieacia, n iriflucncia exerci<strong>da</strong> por aqii(.lles<br />
instrnmentos <strong>de</strong> civilisaçáo que indici'tmos como actiiando directamente SObre<br />
a melhoria e progresso <strong>da</strong> organisaçúo economica <strong>da</strong>s socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s indigcnas.<br />
Convem no emtanto náo levar o exagero d'ess:i logica efficiencia, até<br />
ao ponto <strong>de</strong> sacrificar os restantes meios <strong>de</strong> civilisa$lo.<br />
Os factores ecoiiomicos po<strong>de</strong>m consi<strong>de</strong>rar-se como o com1)iistirel <strong>da</strong><br />
evolução social, mas a acção progressiva exerci<strong>da</strong> no campo moral e physiologico<br />
pelos restantes factores evoliitivos, directamente sobre os individnos,<br />
cellulas activas do snperorganisriio evolucioriantc, cm caso algum<br />
<strong>de</strong>ver6 ser <strong>de</strong>spreza<strong>da</strong>. Se o combustivel economico é siifficicntemente po<strong>de</strong>roso<br />
para <strong>da</strong>r movimento ri machina social, ain<strong>da</strong> assim não scrh dispenoa-<br />
vel a influencia suavisadora, exerci<strong>da</strong> no movimerito <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as engrena-
24 POLITICA IR'DIGENA<br />
---<br />
gens, pelo incomparavel lubrificante representado pelo progresso moral <strong>da</strong><br />
alma indigena, e at6 mesmo por lima possivel effectivaçáo <strong>de</strong> transforniismo<br />
anthropologico <strong>da</strong> raça, como se tem verificado com os negros <strong>da</strong> smerica<br />
do Korte. Eiitrc os agentes <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m moral, cujos resiiltados e necessi<strong>da</strong>-<br />
<strong>de</strong> na obra <strong>da</strong> civilisaqáo teem sido alvos <strong>de</strong> maior controversia, <strong>de</strong>sem-<br />
penham papel liegemonico as missóes religiosas, cuja utili<strong>da</strong><strong>de</strong> nas primei-<br />
ras phases <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> colonial nos parece indisciitivel.<br />
As missóes religiosas, como instrumento <strong>de</strong> colonisaçáo, nno po<strong>de</strong>m<br />
limitar o exercicio <strong>da</strong> sua activi<strong>da</strong><strong>de</strong> a um mero proselytismo religioso<br />
mais o11 menos ar<strong>de</strong>nte, pois, sendo lima admiravel fdrma politica, po<strong>de</strong>m e<br />
cleverii esten<strong>de</strong>r a siia acçáo ao campo temporal, orienta<strong>da</strong>s sempre pelo<br />
mobil <strong>da</strong> expansáo territorial e nacionalisatlora do estado colonisador s que<br />
pertencem, ou que as siibsidia. A influencia <strong>da</strong>s missóes tem <strong>de</strong> ser simul-<br />
taneamente politica e eclucativa, e quando ellas náo realisem este fim, qiie<br />
t3 a propria justificayáo <strong>da</strong> sua existencial são inteiramente dispensaveis.<br />
A este proposito, no seu bello livro <strong>de</strong> administração colonial, diz<br />
Eduardo Costa o seguinte : a A infliicncia <strong>da</strong> missáo entre os povos selva-<br />
gens, náo é unicamente uma obra <strong>da</strong> rntechesc religiosa, muito difficil <strong>de</strong><br />
exercer sobre cerebros primitivos quando seja <strong>de</strong>sacompanha<strong>da</strong> cle outras<br />
manifestaçóes <strong>de</strong> superiori<strong>da</strong><strong>de</strong> material. h por isso que se costuma dizer<br />
e com justi
NOÇ~ES GEBAES 25 -<br />
<strong>de</strong>vem ser favoreci<strong>da</strong>s e anima<strong>da</strong>s pelos governos coloniaes, sempre qiie<br />
ellas queiram ter um caraeter politico e commercial, que lhes falta quando<br />
se limitam ii simples catechese. )> Nos periodos prece<strong>de</strong>ntes acha-se per-<br />
feitamente coi~cretisado o ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro papel <strong>da</strong>s missóes religiosas, tal como<br />
elle hoje é comprehendido pela opinião esclareci<strong>da</strong> e dociimentci<strong>da</strong> dos pii-<br />
blicistas coloniaes mais eminentes, com quem concor<strong>da</strong>mos plenamente<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> qiie se eutãbeleqa. o caracter transitorio d'essas instituiqóes. Quando<br />
ellas tiverem precisamente attingido o fim que alvejam, <strong>de</strong>vem <strong>de</strong>sappare-<br />
cer. Leroy Beaulieii aconsellia, mesmo nles.sa Iiypothese, a sua conservaç~o,<br />
atten<strong>de</strong>ndo aos serviços prestados á obra colonial. Ntio concor<strong>da</strong>mos com<br />
esta maneira <strong>de</strong> ver do distineto escriptor. Tudo o que 6 iniitil <strong>de</strong>vc ser<br />
siipprimido, e a presen(;a suma instituiçilo inutil, funccionando como corpo<br />
morto no organismo sozial, só po<strong>de</strong>rá trazer entraves ao aperfeiçoamento<br />
completo <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> colonial. A religiosi<strong>da</strong><strong>de</strong> dos proselytos encontrará<br />
plena satisftiçáo <strong>da</strong>s suas justas aspiraçóes <strong>de</strong> culto externo na organisa-<br />
($0 c~cclcsiastica regular, estabeleci<strong>da</strong> na colonia.<br />
As escolas leigas crea<strong>da</strong>s parallelamente tis missóes, bastartio para<br />
garantir, <strong>de</strong>pois do <strong>de</strong>sapparecimento d'estas, a continui<strong>da</strong><strong>de</strong> do esforço<br />
ediicativo. A evolução psychologica <strong>da</strong> alma indigena, a elevação <strong>da</strong> mo-<br />
rali<strong>da</strong><strong>de</strong> e <strong>da</strong>. mentali<strong>da</strong><strong>de</strong>, e d)i~puramento <strong>da</strong>s eonsciencias, obtidos em<br />
gran<strong>de</strong> parte pelo contagio social <strong>da</strong> civilisnçáo dominante, justificam a<br />
dispensabili<strong>da</strong><strong>de</strong> que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>mos.<br />
Possibili<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> civilisação <strong>da</strong> raça negra<br />
Educar, icstruir, moralisar e eiiriqiiccer, eis o fim <strong>da</strong> politica iiidi-<br />
gena; tolerancia, a sua divisa; opportunismo intelli~ente, a sua norma.<br />
Exercendo-se a siia acçáo nas raças indigenas, por intermedio dos agentes<br />
civilisadores que enumerhmos, convem presentemente estu<strong>da</strong>r as gra<strong>da</strong>çúes,<br />
<strong>de</strong> capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> receptiva <strong>de</strong> civilisaçko d'aquellas raças, ou, por outras pa-
26 POLITICA INDIGENA<br />
--<br />
lavras, investigar o grau <strong>de</strong> probabili<strong>da</strong><strong>de</strong>: que os indigenas teem, <strong>de</strong> assi-<br />
milarem a civilisaçáo que Ihes 4 imposta.<br />
O problema attinge o maximo <strong>da</strong> sua importancia nas colonias em<br />
que o elemento ethnico anterior á colonisaçáo não possuia civilisação propria.<br />
Esse elemento é constituido na sua immensa maioria por populaçóes<br />
<strong>de</strong> raça negra, <strong>da</strong> qual, portanto, em especial nos occuparemos, sendo facil<br />
<strong>de</strong>pois a generalisaçáo doiitrinaria dos phenomeiios sociaes, coja existencia<br />
se averiguar. Demonstrando, como vamos tentar, a possi1,ili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
transformayilo <strong>da</strong> raça negra actual, em futuros nucleos táo civilisados<br />
como actualmente os brancos se o~gulham <strong>de</strong> ser, e sendo essa riiça habitualmente<br />
colloca<strong>da</strong> em <strong>de</strong>rra<strong>de</strong>irg iogar nas ficticias e artificniacs escalas<br />
anthropologicas, ficará a mesma th'ese prova<strong>da</strong> a fortiori para os restantes<br />
agrupamen:os indigcnas <strong>de</strong> raças 'diversas.<br />
Os parti<strong>da</strong>rios <strong>da</strong> <strong>de</strong>segual<strong>da</strong>dc ailthropologica irreductivel, entre as<br />
varie<strong>da</strong><strong>de</strong>s existentes <strong>da</strong> espccaic linmana, scrvem-se usualmente rla raça<br />
negra, como termo infimo <strong>de</strong> cornliaraçiio, nas suas erra<strong>da</strong>s <strong>de</strong>d~icqóes, por<br />
se lhes afigurar esse agriipamento liiimano a prova mais <strong>de</strong>cisi~a <strong>da</strong>s theorias<br />
qiie <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m. S'essa orientaçuo, háo lia tara <strong>de</strong> inferioritla<strong>de</strong> moral<br />
ou phy~ica, <strong>de</strong>feito, crime, excessos ou tibiezas que caliimniosamcnte lhe<br />
não attrihiiam. Tndo llies serve, clesnatu?am-se os factos, sopliisma-se a<br />
propria evi<strong>de</strong>ncia, escon<strong>de</strong>-se a ver<strong>da</strong>tle, <strong>de</strong>turpam-.e as intençóes e inventam-se<br />
erroneas e ten<strong>de</strong>nciosas tlicorius evoliitivas, 1)nicnilas na falsa inter-<br />
pretíi~No dos d~clos, aliás exactos, mas insignific>~tivos, fornecidos pelos<br />
diversos ramo8 <strong>da</strong> aiitliropometria.<br />
Arrastados pelo orgulho, irnbnidos do dogma <strong>da</strong> <strong>de</strong>segnal<strong>da</strong>dc <strong>da</strong>s<br />
raças, váo freqnentes vezes, á falta dc melhores argumentos, até ao recurso<br />
extremo, aos versiculos biblicos, para justificar a sua opinião, esquecendo-se<br />
que essas maximas que com tanta emphase invocam, sí, servem para <strong>de</strong>-<br />
monstrar que afinal o preconceito que os cega E mais ~elho,<br />
do qiie a pro-<br />
pria rcligigo que os moralisoii.<br />
Nos Estatlos T:nidos on<strong>de</strong>, como 6 geralmente conhecido, o odio e O<br />
<strong>de</strong>sprexo pela r:i(;a ricgra ultrapassam os pro~)rios<br />
limites do inverosimil, a<br />
colitrorerizi:i siilirc este nssnmpto B vivissima, encontrando echo conqtante
KOÇOES GERAES<br />
I<br />
27<br />
- - - - - - - - -<br />
na opiniáo piiblica apaixona<strong>da</strong>. Kos lioteis, nos compartimentos dou cumboios,<br />
nos tramu~ays, nas casas <strong>de</strong> espectaciilo, e em regra nos recintos<br />
on<strong>de</strong> se possam produzir aggloiiiera(;úes, a raça negra E inflexivelmente<br />
escorra~a<strong>da</strong> para divisorias distinctas, como iim rebanho <strong>de</strong> pestiferos, oii<br />
como Lima leva <strong>de</strong> pcneionistas <strong>de</strong> gafaria. Para combater as iniciativas<br />
generosas do negropliilismo, a campanlia <strong>de</strong> propagan<strong>da</strong> negrophoba entra<br />
voluntariamente no caminlio <strong>da</strong> riolencia e <strong>de</strong>scamba mesmo acci<strong>de</strong>ntalmente<br />
no exagero ridiciilo.<br />
Assim Charles Carro11 n'um livro com o titiilo suggestivo, a O Negro 6<br />
um Animal Irracional», <strong>de</strong>clara muito formalrneiite qiie, pelo texto bihlico, se<br />
<strong>de</strong>iiionstra que os negros ~ á animaes o irracionnes, crtados com máos e lingu:igem<br />
articiila<strong>da</strong>, para potlerrm ~ervir os brancos seus donos; e como<br />
argumento corroborativo, o auctor accrcsccnta o seguinte inacreditavel ayl-<br />
logismo : a: Os Iiomens foram creados á imagem <strong>de</strong> Deus, ora Deiis nFio é<br />
preto, ninguem o ignora, mas entgo o negro náo 6 a imagem <strong>de</strong> Deiis, logo<br />
n5rl é llomem!. . .D<br />
Os argiimentos pseiido-scientificos que riilgarmente se encontram<br />
attestando a inferiori<strong>da</strong><strong>de</strong> negra sáo <strong>de</strong> mol<strong>de</strong> a i~gnalar, na balança <strong>de</strong>monstrativa,<br />
o pcso d'esse pyramiclal argiimento religioso que acima trnriscrevemog.<br />
Um dos iactoq, commiimmcnte citados, por comprovativos <strong>da</strong> inferiori<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
pliysio1ogic;l e intcllcctual dos negros, E a precoci<strong>da</strong><strong>de</strong> nntavel <strong>da</strong><br />
consoli<strong>da</strong>q~o <strong>da</strong>s siitiiras craiicnnas. Tambem E instantemente invoca<strong>da</strong> a<br />
circurnstancia (10 <strong>de</strong>senvolvimento normal, e por vezes brilhante. <strong>da</strong> ihtelligcncia<br />
dos pretos, soffrer uma interrupção briisca e <strong>de</strong>finitiva, qiinndo estes,<br />
:ittingicla a lmber<strong>da</strong><strong>de</strong>, se entregani ao exercicio <strong>da</strong>s siias furicçúes sexuaes.<br />
Este facto cliie, durante :I nossa permancncin em Africa, tivemos<br />
muitas occaeiões <strong>de</strong> observar nos nossos miileqiits e machileiros particulares,<br />
e no pessoal contractado a bordo dos navios <strong>de</strong> guerra, B absolutamente<br />
incontestavel, mas não constitue prova, a náo ser contra a influencia<br />
<strong>de</strong>leteria (10 meio tclliirico, ecoilomico e social em qiie aquelles vivem e a<br />
qiie se nzo po<strong>de</strong>m siihtraliir. Essa influencia E t5o <strong>de</strong>terminante para a,<br />
intellectualidn<strong>de</strong> Iiui~iana, que, mesmo sob o restricto aspecto climaterico,
asta nas regiões inter-tropicaes, para rediizir espantosamente o rendimento<br />
intellectual dos individiios brancos que Ilie estáo siijeitos. Consi<strong>de</strong>rando<br />
os milhões <strong>de</strong> germens ~:ivilisadores. <strong>de</strong> taras ile intellectiiali<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
e <strong>de</strong> vincos hereditarios quc ciiracterisam o espirito do Iiomem civilisado,<br />
e forcosamente lhe criam uma gran<strong>de</strong> forg:t <strong>de</strong> resisteiicia intellectual,<br />
assim tombados (te chofre a um nivel inferior pela radiaiáo tellnrica, acceita-se<br />
bem mais facilmente o caracter irresistivel <strong>da</strong> sna acção sobre o<br />
encephalo <strong>da</strong> raça negra que lhe oppõe uma resistcncin qii:~si niilla.<br />
De resto, se n'rima unica geraçgo, o branco internado na sertgo, longe<br />
do convivi0 <strong>da</strong> sua socie<strong>da</strong><strong>de</strong>, per<strong>de</strong> em pouco tempo tocli~ a sua <strong>de</strong>canta<strong>da</strong><br />
siiperiori<strong>de</strong>i<strong>de</strong>, cahindo n'uma especie <strong>de</strong> marasmo niornl c intellectual, que<br />
absolutameiitc o nivela aos indigenas v~zinlios, porqiic rzisz5o niio admittir<br />
qiie a inversa tambem é ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira e qve os pretos suo susceptiveis d'um<br />
grau <strong>de</strong> cultura i<strong>de</strong>ntico ao nosso ?<br />
A cafrealisaçao do branco é um phenomeno muito mais viilgar do<br />
que geralmente se iicredita; varios exemplos nos foi <strong>da</strong>do observar no<br />
interior <strong>da</strong> nossa provincia do Moçambiqne, mórmentc no districto <strong>da</strong> Zambezia,<br />
on<strong>de</strong> surpreheii<strong>de</strong>mos alguns casos typicamentc flagrantes pela rapi<strong>de</strong>z<br />
<strong>da</strong> effectivaçáo, nas pessoas <strong>de</strong> alguns empregados <strong>de</strong> companliias, ou<br />
<strong>de</strong> sargentos comman<strong>da</strong>ntes <strong>de</strong> insignificantes postos militares perdidos no<br />
interior.<br />
Da mu<strong>da</strong>nça dc meio resiilta incontestavclinciite a altera~áo dos caracteres<br />
pliysicos e moraes <strong>da</strong> raya, c a circ~imstancia contracita<strong>da</strong> do<br />
phenomeno <strong>da</strong> rctrogra<strong>da</strong>(;áo ao estado primitivo, pelo rciritegramento no<br />
seu meio inicial, <strong>de</strong> negros que receberam uma ediica(;;io brilliante, apenas<br />
constjtne mais uma inilludivel prova. <strong>da</strong> infliieric*ia mesologica. Antes<br />
<strong>de</strong> entrar propriamente na analyse iiul~urcial <strong>da</strong> physiologia, morali<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />
c mentali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> raya negra, que nos pcrmittirá refutar victoriosamente o<br />
supposto dogma <strong>da</strong> ini;brioritla<strong>de</strong> relativa, convem estu<strong>da</strong>r os fun<strong>da</strong>mentos<br />
scientificos <strong>da</strong> influencia do meio.
Theoria do meio<br />
A influencia do meio nos seres organisados, quanto á sua duração,<br />
<strong>de</strong>ve abranger as existencias consi<strong>de</strong>ra<strong>da</strong>s, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o periodo embryonario<br />
em to<strong>da</strong>s as suas mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong><strong>de</strong>s, até ao limite creado pelo termo <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> or-<br />
ganica; quanto ás forças activas que a <strong>de</strong>finem e formam, exerce a sua<br />
ac(;&o pelo conjuncto <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as condjy~es <strong>de</strong> ambiente, climatericas, <strong>de</strong><br />
cor posi(;ao geologica, bem estar material, e to<strong>da</strong>s as innnmeraveis que se<br />
re,iiisaiii no intercambio pliysico e chimico, complicado e permanente, que<br />
importa a evoluyHo <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> vegetal oii animal. l'ara o homem angmenta<br />
ain<strong>da</strong> mais esse numero. com a rieceshi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rar as circumstancias<br />
ou meios sociaes, politicos, cconomicos e intellectiiaecl. X complicação <strong>da</strong><br />
influencia mesologica cresce parallelameiite ao aperfeiçoamento <strong>da</strong> vi<strong>da</strong><br />
I ;;iiii(.:i, n'uinn ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira prcigre~sáo geometrica ascen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> razão<br />
(lesmcsura<strong>da</strong>. 110 entozoario, cujo meio c! coristituido pelo proprio corpo, ao<br />
ser humano <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte, ii'um meio milliúes <strong>de</strong> rezes mais complexo, a<br />
differenqa t! prodigiosa. So emtanto, quer um, quer outro, ambos estão<br />
i<strong>de</strong>nticamente sujeitos a essa infliie~icia cober~ina, apenas contrabalança<strong>da</strong><br />
em parte, pela acçáo ccntripeta. <strong>da</strong> lieretlitariedn<strong>de</strong> que ten<strong>de</strong> a perpe-<br />
tuar, nas geraçóes successiv:~.;, os caracteres adquiridos pelo individiio.<br />
Na coniiigaç50, e jnsto eqiiilibrio d'cstas (luas foryas, se 1);iseia to<strong>da</strong> a hy-<br />
pothese transformista. O neo-<strong>da</strong>rminismo <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>, é ver<strong>da</strong>tle, o plienomeno<br />
<strong>da</strong> variação brusca, motira<strong>da</strong> por forcas <strong>de</strong>sconheci<strong>da</strong>s, mas é preciso con-<br />
si<strong>de</strong>rar que a biologia liumana. nem um sU <strong>da</strong>do nos fornece qiie possa, para<br />
a humani<strong>da</strong><strong>de</strong>, corroborar a generalisayáo <strong>da</strong> tlieorin.<br />
Ain<strong>da</strong> porém quando se admitta como exacta essa nova hypothese<br />
*evolucionista, nem por esse motivo a varie<strong>da</strong><strong>de</strong> bruscamente transforma<strong>da</strong>,<br />
se tornarti-in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>da</strong> iniliiencia do meio em que viver. A bactcrio-<br />
logia fornece hoje provas bem indisciitiveis <strong>da</strong> infliiencia mesologica ; é um<br />
pihenomeno quasi banal a modificaç30 physica essencial do microbio ou <strong>da</strong>
30 POLITICA INDIGCEN.4<br />
-<br />
sua virulencia com simples alteraçóes culturaes, chegando mesmo a conseguir-se<br />
a multiplicaçáo <strong>da</strong> varie<strong>da</strong><strong>de</strong> assim obti<strong>da</strong>, com to<strong>da</strong>s as suas caracteristicas.<br />
pos seres organisados pertencentes ao reino vegetal, essa influencia<br />
manifesta-se a todo o momento e por mil maneiras diversas. Assim<br />
Nr. Laurent, nos iln~tnles <strong>de</strong> .!'li-zstitzit Pastezir» <strong>de</strong> 1888, <strong>de</strong>monstra que<br />
uma especie <strong>de</strong> coguniello liyphomiceta, o Cludos1~orzi1rz herbarum, pó<strong>de</strong><br />
apresentar sete estados distinctos, pela simples modificação <strong>da</strong>s condiçóes<br />
<strong>de</strong> ciiltivo. As diffcrcnyas niitliropologicas observa<strong>da</strong>s nos diversos typos<br />
liiimanos, sáo ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iras formnqoes nlluvionaes obti<strong>da</strong>s pela stratificaçáo<br />
lenta dos epeitos sobrepostos do meio ambiente e social; e o seu apparecimento,<br />
<strong>de</strong>sapparecimeiito e variabili<strong>da</strong><strong>de</strong>, sWo resultado quasi exclusivo<br />
d'este factor essencial. A fim <strong>de</strong> fiin<strong>da</strong>mentar scientificamentc esta importantissima<br />
lei <strong>da</strong> prepon<strong>de</strong>rancia do meio sobre a vi<strong>da</strong>. dos seres organisados,<br />
vamos indicar alguns dos resiiltatlos mais significativos a que. pelo<br />
rigoroso processo <strong>da</strong> observaçáo directa, foram condiiziclos naturalistas e<br />
anthropologistas (lu cathegoria scientifica <strong>de</strong> Darwin, Quatrefages, Liebig,<br />
Wallnce, bIarcha1, Beaton, T\'aitz, Virclio~~~, Hteplien M'ard e muitos outros.<br />
Considcrando, em primeiro lognr, :I infiiiencia mesologica no mundo<br />
vegetal, <strong>de</strong>scobrem-se t~ ca<strong>da</strong> pnsso co~ise~iiencias ciiriu~;is tla sua acçáo,<br />
progressiva oii regressiva no organismo <strong>da</strong>s plantas. O Hypericunz Crispum,<br />
especie veiieriosa dos paiies <strong>da</strong> Sicilia, per<strong>de</strong> por completo a toxici<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
quando tran~~laiitado para terreno <strong>de</strong> differente composiçáo. A raiz do<br />
dco~titzim nnpellus, torna-se inotf'cnsiva nos climas muito frios. O Rlzodo<strong>de</strong>ndro)i<br />
ciliatutr~, niesiiio livre <strong>de</strong> selecç&o artificial, <strong>de</strong>senvolve, nos arredores<br />
<strong>de</strong> Londres, flores dc dimeiisfies duplas <strong>da</strong>s que produz na regiáo do Hymalaia,<br />
<strong>de</strong> on<strong>de</strong> é originario. Com as gramineas os plienomenos <strong>de</strong> a<strong>da</strong>pta-<br />
(,>áio ao meio tornam-se particn1:irmente accentuados e rapidos.<br />
Uma varie<strong>da</strong>tle <strong>de</strong> rnillio exotico, Zea altiusima, (Breit Korniger ~liuys),<br />
originaria d'iima regi50 qiiente ds America, e semeia<strong>da</strong> na Allemanha por<br />
lietzger, (I) <strong>de</strong>u os segiiintw ciiriosos rwnltados. No ~rimeiro anno as plan-<br />
(') I)ar\\.in - De IB Vu~.intio~t (leu dni~~tqux et <strong>de</strong>s P;cit~teu.
tas attingiram 4 metros <strong>de</strong> altura e produziram um pequeno numero <strong>de</strong><br />
grãos maduros; os gráos inferiores <strong>da</strong> espiga conservaram a sua fúrma<br />
propria, mas os superiores apresentaram algrimas mu<strong>da</strong>nças. Sa segun<strong>da</strong><br />
geraçfio augmentou a quanti<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> gráos maduros, mas diminuiu a altura<br />
para cerca <strong>de</strong> 2m.60; a <strong>de</strong>pressão caracteristica <strong>da</strong> parte exterior dos gráos<br />
tinha <strong>de</strong>sapparecido, e a cor, primitivamente branco puro, apresentava-se<br />
baça; alguns gráos mesmo, eram já amsrellos e aproximavam-se do milho<br />
europeu na fórma. A transformação continuou rapi<strong>da</strong>mente, e á sexta geraçHo<br />
a planta e os griios tinham-se completamente i<strong>de</strong>ntificado a uma <strong>da</strong>s<br />
sub-variecla<strong>de</strong>s do milho europeu.<br />
As differentes varie<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> morangueiro estáo n'uma tal <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m<br />
ci:~ <strong>da</strong> oomposiçáo do solo e do clima que é quasi impossivel evitar a <strong>de</strong>g-enc>rebcencia<br />
rapi<strong>da</strong> provoca<strong>da</strong> pela mu<strong>da</strong>nça <strong>de</strong> locali<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
O pollen <strong>da</strong>s petunias, recolliido antes <strong>da</strong> maturaçáo, e submettido á<br />
insolaçáo oii a um sobreaquecimento, e aproveitado <strong>de</strong>pois na fecun<strong>da</strong>çáo<br />
artificial, dá origem a novas plantas que produzem flores <strong>de</strong> colorido di-<br />
\-ci.-i, (Ias dos individuos que as geraram. Ain<strong>da</strong> se po<strong>de</strong>ria alongar in<strong>de</strong>fi-<br />
niilaniente a enumeracáo dos phenomenos <strong>de</strong> biologia vegetal, analogos aos<br />
anteriores, que <strong>de</strong>monstram ti evi<strong>de</strong>ncia a acçgo dominadora do meio na<br />
evoluçáo .<strong>da</strong> vi<strong>da</strong> organica vegetal, mas os exemplos citados envolvem já<br />
sufficientemente essa <strong>de</strong>monstraçáo.<br />
Para o reino animal augmenta a complexi<strong>da</strong><strong>de</strong> e diversi<strong>da</strong><strong>de</strong> dos<br />
phenomenos observados.<br />
Segundo Darwin, as causas que provocam a variabili<strong>da</strong><strong>de</strong> dos seres<br />
vi~~os, actuam sobre o organismo adulto, sobre o embryáo, c provavelmente<br />
tambem sobre os elementos sexiiaes antes <strong>da</strong>, feciin<strong>da</strong>çáo. A femea do rato<br />
vulgar, eminentemente prolifera, torna-se completamente esteril quando sustenta<strong>da</strong><br />
exclusivamente com alimentos <strong>de</strong>sprovidos <strong>de</strong> magnesio. Com os<br />
cães dão-se algumas transformaçóes interessantes, que scí po<strong>de</strong>m ser attribui<strong>da</strong>s<br />
aos effeitos <strong>da</strong> mu<strong>da</strong>nça, para um meio differentc do que primitiva-<br />
mente lhes era proprio.<br />
Os cães tornados selvagens na ilha <strong>de</strong> João Fernan<strong>de</strong>s per<strong>de</strong>ram o<br />
habito <strong>de</strong> ladrar n'um periodo <strong>de</strong> cerca <strong>de</strong> 30 annos, e alguns individuos,
' 32 POLITICA INDIGEX~I<br />
-- - --<br />
<strong>de</strong> lá trazidos por Ulloa foram poiico a pouco recuperando o latido. Os<br />
cães do rio Mackensie, do typo Canis latransn, trazidos para Inglaterra,<br />
nunca conseguiram ladrar, mas os cachorros, filhos d'esses, nascidos no<br />
Jardim Zoologico, ladravam semelliantemente aos seiis congenercs enro-<br />
pus. M. G. Clarlie diz, a este proposito, ter observado na ?lha Joao <strong>da</strong><br />
Nova, no Oceano Indico, alguns cáes tornados selvagens, que tambem ha-<br />
viam perdido o habito <strong>de</strong> latir. Em quaoi todos os casos se observa a alte-<br />
rapo <strong>da</strong> cor, mas sem orientação facii <strong>de</strong> <strong>de</strong>scobrir. Na opinião <strong>de</strong> Darwin,<br />
o clima tem uma influencia <strong>de</strong>cisiva sobre os caracteres pliysicos do cão.<br />
Gran<strong>de</strong> numero <strong>de</strong> raças inglezas introduzi<strong>da</strong>s na India teem, em poucas<br />
geraçúes, <strong>de</strong>generado nas suas facul<strong>da</strong>dcs, ou transformado as suas fdrmas.<br />
Falconer observou que os bull-dogilcs <strong>de</strong> sangue puro, que h chega<strong>da</strong> A Iiidia<br />
dominavam pela dôr um clephante, suspen<strong>de</strong>ndo-se-lhe na tromba, perdiam,<br />
no espaço <strong>de</strong> duas ou tres gerayGes, a maior parte do vigor e <strong>da</strong> feroci<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />
bem como o <strong>de</strong>senvolvimento caracteriutico do maxillar inferior. O focinho<br />
a<strong>de</strong>lgaça-se e o corpo torna-se mais leve <strong>de</strong> fdrmas.<br />
O gato domestico tem voltado ao estado selvagem em ~arios<br />
paizes,<br />
e em to<strong>da</strong> a parte, consoante as <strong>de</strong>scripçúes feitas, readquiriu um c~racter<br />
uniforme. Na Kova Islandia, segundo Dieffenbacli, os gatos tornados selva-<br />
gens retomam a côr cinzenta tigra<strong>da</strong>, caractcristica dos gatos selvagens<br />
propriamente ditos, e dos gatos semi-selvagens <strong>da</strong>s I-Iiglilands <strong>da</strong> Escossia.<br />
Um resultado physiologico importante <strong>da</strong> (1omci.tici<strong>da</strong><strong>de</strong> no gato, Q O au-<br />
ginciito tlo comprimento dos intestinos, <strong>de</strong>vido naturalmente a um regimen<br />
menos escliisivitmente carnivoro. Sol~rc<br />
a raça c:tvallar, tambem as condi-<br />
ções exteriores parecem ter uma prepon<strong>de</strong>rante influencia modificadora.<br />
Forbes, que comparou <strong>de</strong>moraclamente os cavallos Iiespanhocs aos <strong>da</strong><br />
America do Sul, assegura que os carallos do Chili, encontrando :illi aproxi-<br />
ma<strong>da</strong>mente as mesmas circumstancias exteriores <strong>da</strong> An<strong>da</strong>luzia, mantiveram<br />
inalteravel o seu typo primitivo, ao passo que os cavallos dos Pampas e os<br />
poneys punos tem a sua estractnra physica profiin<strong>da</strong>mente modifica<strong>da</strong>. Pa-<br />
rece fóra <strong>de</strong> duviil,~<br />
que os cavallos diminuem sensivelmente dc proporçúes<br />
e mu<strong>da</strong>m <strong>de</strong> fórni,i, vivenclo nas montanhas ou nas ilhas. Ningiiem ignora<br />
como os cavallos i tornam pequenos e grosseiros nas ilhas do Norte e nas
~006E8 GEBAES b5<br />
montanhas <strong>da</strong> Europa. A Corsega e a Sar<strong>de</strong>nha teem a sua varie<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
poneys indigenas, e n'algumas illias <strong>da</strong> costa <strong>da</strong> Virginia, vive [lina raça<br />
<strong>de</strong> poneys, analogos aos <strong>da</strong>s ilhas Shetlancl, cujã origem se attribnc As<br />
circumstancias <strong>de</strong>sfavorareis em que evolucionoii a raça cavallar, para alli<br />
transporta<strong>da</strong>.<br />
Os poneys ptcitos quc habitam as regiões eleva<strong>da</strong>s <strong>da</strong> Cordilheira dos<br />
An<strong>de</strong>s, sáo d'uma peqiiencz e originali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> ftirmas <strong>de</strong> todo o ponto notaveis;<br />
mais ao Stil, nas illias Falklai~d, os <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes (10s carallos importados<br />
em 176-1, teem <strong>de</strong>generado eni proporqóes e vigor, a ponto <strong>de</strong> se<br />
terem tornado iinproprios para a cava ao laço, que 110,je só alli se po<strong>de</strong> effecatlinr<br />
com cavallos importados <strong>da</strong> Argentina, on<strong>de</strong> a selecção artificial e<br />
os cr~izamentos intelligentcmente feitos teem mantido optimos exemplares<br />
<strong>da</strong> r;iya cavallar.<br />
O excesso <strong>de</strong> humi<strong>da</strong><strong>de</strong> parece ser nocivo ao <strong>de</strong>sen\~olviinento <strong>da</strong>s<br />
proporções pliysicas dos cavallos; Java, Peg~i, Siáo, parte <strong>da</strong> China, Timoi.<br />
o archipclwgo maliiio, possucm apenas poneys ou cavallos muito pequencl3<br />
: caiiiinhando-se mais para leste até ao Japão, vemos o cava110 retomar<br />
o seu <strong>de</strong>senvolvimento completo.<br />
Nas raças <strong>de</strong> porcos domesticos mais intensamente selecciona<strong>da</strong>s, as<br />
modificaçócs craneologicas cáo pasmosas. A este respeito Nathusiiis, no seu<br />
livro, c Die Racen <strong>de</strong>s Scli\\-eiiles » , refere o seguinte.<br />
«O exterior do craneo foi tiltcrado em to<strong>da</strong>s as suas partes. A face<br />
posterior em vcz <strong>de</strong> se inclinar para traz, dirige-se para a frente, O qnc<br />
implica diversas alterações em oiitras partes. A frcnte <strong>da</strong> cabeya 6 accen-<br />
tiia<strong>da</strong>mente conrava ; as orbitas tcem uma fórma differentc, o meato aiidi-<br />
tive oiitra dirccr;ão e oiitro aspecto, os incisivos oppostos clos inaxillares<br />
sllpcrior e inferior nYo se encontram e ficam em ca<strong>da</strong> maxillar acima do<br />
plano 90s molares ; os caninos superiores ficam na mesma linha dos infe-<br />
riores, o qiie constitue uma anomalia notavel; as faces articulares dos con-<br />
d';los occipitaes soffrerain lima tfio total t,rnnsformap5o morpliologica que,<br />
examina<strong>da</strong>s em separado, sc torna qiiasi impossivel attrilwi-Ias ao geiicro<br />
Szts. O conjuncto <strong>da</strong> cabeça 6 notavelmente encurtado. Effcctivamente,<br />
a relaçgo do comprimento <strong>da</strong> cabeça para o do corpo, que B nas raças com-<br />
3
muns <strong>de</strong> 1 para 6, torna-se n'estas raças melhora<strong>da</strong>s, <strong>de</strong> 1 para 11. Estas<br />
modificn
formados por esse e para esse meio especial. Marshall conta, que n'um<br />
rebanho composto <strong>de</strong> pesados carneiros <strong>de</strong> Lincolnshire, e <strong>de</strong> leves incli-<br />
viduos <strong>da</strong> raça <strong>de</strong> Norfolk, todos creados simiiltaneamente n'iima rastissi-<br />
ma pastagem com uma parte htiixa, liumi<strong>da</strong> e rica, e outra parte alta e<br />
secca, os animaes separavam-se diariamente com a maxima regulari<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />
ficando os Lincolnshire na parte baixa, e indo os Norfollc para a parte<br />
alta.<br />
Segundo Erman, o carneiro kirghiz, caracterisado pela intiimescencia<br />
gordurosa <strong>da</strong> cau<strong>da</strong>, transportado para a Riissia, <strong>de</strong>genera rapi<strong>da</strong>mente,<br />
<strong>de</strong>snpparecendo em pcncas geraçííes a referi<strong>da</strong> particiilari<strong>da</strong>cle. A elevação<br />
<strong>da</strong> tcmperatiira parece actuar directamente sobre a lá; os carneiros trans-<br />
portados para os climas quentes <strong>da</strong> Africa e <strong>da</strong> India per<strong>de</strong>m em pouco<br />
tempo a lá, que é substitui<strong>da</strong> por uma especie <strong>de</strong> pello curto semelhante ao<br />
<strong>da</strong> cabra.<br />
Os coelhos domesticos <strong>de</strong>ixados por Gon(;alves Zarco na ilha do Porto<br />
Santo, em 1419, <strong>de</strong>senvolveram-se no estado selvagem com incrivel rapi<strong>de</strong>z,<br />
e, sob o dorninio <strong>da</strong>s influencias locaes, soffreram transformaçóes taes, nas<br />
dimensóes e cor, que, durante muito tempo, foram julgados pelos naturalistas<br />
como constituindo uma varie<strong>da</strong><strong>de</strong> á parte. N'alguns exemplares d'essa raya,<br />
que viveram bastante tempo no Jardim %oologico <strong>de</strong> Londres, observou<br />
Darwin, que foram per<strong>de</strong>ndo pouco a pouco, durante o captiveiro, o seu<br />
colorido especial, a ponto <strong>de</strong>, quando morreram, ser difficil distingui-los do<br />
coelho vulgar.<br />
Com respeito 6s aves as condiçúes exteriores exercem pela mesma<br />
fdrma a sua influencia. Dar~viii assegura que os dom-fafes e alguns outros<br />
passaros alimentados exclusivamente com gráos dc canliamo, se tornam<br />
pretos. Nos insectos 6 conhecido o phenomeno <strong>da</strong> obtenção dc borboletas,<br />
<strong>de</strong> cores inteiramente differentes, pelas alimentaçúes diversas <strong>da</strong><strong>da</strong>s ás<br />
larvas <strong>da</strong> mesma especie lepidopterica.<br />
No reino vegetal e no reino animal, do mais simples ao mais com-<br />
plexo, todos os seres organisados nos revelam pois, o traqo inconfundivel<br />
<strong>da</strong> acç5o do meio. E com o homeni o que se passara? E' o que se torna<br />
facil <strong>de</strong> averiguar, compulsando e passando rapi<strong>da</strong>mente em revista os do-<br />
*
36 POLITICA INDIGENA<br />
- - - -- - - - -<br />
crimentos scientificos, intclligentemcnte acciimiilados sobre esse assumpto,<br />
pclu obscrraqíio directa e pela critica imparcial.<br />
Sobre a Iinmani<strong>da</strong><strong>de</strong> exerce o mundo exterior a sua acção modificador8<br />
por intermcdio <strong>de</strong> innumeros factores <strong>de</strong> masima complexi<strong>da</strong><strong>de</strong>, cujo<br />
cffeito isolado B absolutaniente impossivel dc avaliar, o que, <strong>de</strong> resto, pouco<br />
importa a qncm, como ncís, s6 tem <strong>de</strong> se preoccupar com o rcsiiltado final<br />
do conjuncto A variabili<strong>da</strong><strong>de</strong> (Ia morpliologin, do colorido e <strong>da</strong> mentali<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />
na espccie humana, abstraliindo <strong>da</strong> re1:itiva fixação hereditaria e <strong>da</strong><br />
mestiçngcm, E f~incçáo qiiasi cxclnsira cla po<strong>de</strong>rosa influencia <strong>da</strong>s condiqúes<br />
externas ao individiio. Assim, consi<strong>de</strong>rando essa acçáo, sob os aspectos<br />
gcracs cla niitri(;áo, do solo, <strong>da</strong> altitiidc, do clima, do bem estar economico<br />
c do coiitagio social, teem-se colligido obscrvayóes do mais elevado interesse<br />
e <strong>da</strong> mais pcrcmptoria conclu<strong>de</strong>ncia.<br />
A observaçúo tem rnostrado que os habitantcs <strong>da</strong>s terras em que<br />
os silicntos predominam, são, em rcgr:i, dc pequena estatura, fórmas poiico<br />
robustas e maus <strong>de</strong>ntes; emquanto que, para as populaçóes <strong>de</strong> terrenos<br />
calcareos, se verifica o plicnomcno inverso.<br />
Nos paizcs graniticos em que escasseiam os pliospliatos, é raro o hoincm<br />
attingir a sua estatura normal. A influencia do meio mineral é muito<br />
importante no organismo Iiumaiio, mineralisado ellc mesmo, n'iima percentagem<br />
avalia<strong>da</strong> por (iaubet, ein 3 O/,. Assim sc explica a necersi<strong>da</strong><strong>de</strong>, impreterivel<br />
para o liomcm, dit absorp~;,Fo do sodio, tão iitil A economia geral, do<br />
pOtassio, indispciisavel á renovação <strong>da</strong> liemoglobina c ;í claboraçáo d'alguns<br />
fcrincntos como a pancreatina e outros; do ferro, ee+ l~orleroso regenerador<br />
do sangue c finalmente do enxofre, inaiiganez, etc. Ilestle que varie, e<br />
isso succe<strong>de</strong> constaiitcmcnte, a proporcionalidz<strong>de</strong> d'cstes elcinrntos constitilitivos<br />
d'alguiir agentes do meio, o organismo Iiuinano reaeiitir-se-ha imrncdiatamente,<br />
rcagindo pela traiirform:tyiío. O regimcn c dosagcm <strong>da</strong> nutri~"<br />
é por v, ícs 11ast:inte para, Iior si sU, Ilrovocar eft'citos notavcis.<br />
,Is differenyas t nti.c$ o\ racliiticqo, Liihhmen c oh Iiuttciitotes, em parte<br />
motiva<strong>da</strong>s pela çoilili~, i),,, iiiteirtimentc diffcrcntcd (10 meio propriamente<br />
dito, s5o tambc i cni gran<strong>de</strong> parte <strong>de</strong>vi<strong>da</strong>s á dcficieiiciit <strong>de</strong> alimentaçáo dos<br />
primeiros; a pr iva 1,cin incontestavel cstli no facto dos biislimen levados
NOÇOES GERAES<br />
-<br />
para Capetown c ali fixados se tornarem mais robiistos, aiigmentilndo <strong>de</strong><br />
estatura, e parecendo atd apresentar SJ-inptoinas d'uma incipiente alteraVho<br />
pigmentar, qiic os aproxima <strong>da</strong> media do typo liottentote. Com os lapóes,<br />
que habitiialmente rivem no seio <strong>de</strong> priv:ivúes <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a natureza, em lucta<br />
11cr111ancntc contra R careneia <strong>de</strong> alimentos, passam-se os factos seniclliaiitcinentc.<br />
Biishmen c Iapócs 550 consi<strong>de</strong>rados por Virclio~v, como vcr<strong>da</strong>rlciros<br />
csemplos (lc pat1iolog.i:~ collcctiva, absoliitamente ciiraveis coni n mclliori:i,<br />
rlas condiçócs geracs <strong>de</strong> cxistencia c 1i18rmente <strong>da</strong>. aliincntação. Sa opini%o<br />
rle Darwin, o excesso <strong>de</strong> aliiiientos seria o excitarite mais podcroso <strong>da</strong> vnriaç5o<br />
<strong>da</strong>s cspecies. Mas, 1150
tentam ain<strong>da</strong> terminantemente qiie a tez dos negros importados para a<br />
Europa ten<strong>de</strong> a aclarar.<br />
Lewis diz ter notado que os pretos livres, ricos e educados, mesmo vivendo<br />
no meio africano em qiie nasceram, ten<strong>de</strong>m a assumir varios aspectos<br />
caraeteristicos dos europeus.<br />
Hancock, Day e I~yell, corroboram esse facto com as suas conscienciosas<br />
observaçóes.<br />
No magnifico livro c The Natural History of Mankind n, Steplien<br />
Ward, transcreve numerosos documentos scieiltificos em que se prova que,<br />
com a mu<strong>da</strong>nça <strong>de</strong> sitiiaçáo material e moral, os iiegros dos Estados Unidos<br />
tem soffrido varias modificaçóes anthropologicas muito notaveis, como<br />
por exemplo a diminiiiçZo do prognatismo e <strong>da</strong> espessura dos labios.<br />
Citar todos os factos observados que attestam a cfficacia <strong>da</strong> influencia<br />
do meio nas varie<strong>da</strong><strong>de</strong>s liurnanas, seria alongar fastidiosamente este<br />
capitiilo scm colher vantagem algiimrt rcconlieci\~el. Os que acima ficam<br />
expostos, s5o bastante conviricentes na sua simplici<strong>da</strong><strong>de</strong>, c significativos<br />
na sua essencin, para dispensarem qiiaesquer outros. A influencia terminante<br />
e irresistivel, sobre s evo1iic;áo <strong>da</strong>s raças liumanas, <strong>da</strong>s circumstancias<br />
mesologicas conjuga<strong>da</strong>s, tanto telliiricas como <strong>de</strong> contagio social, não<br />
pó<strong>de</strong> realmente soffrer séria contestagão. A fdllibili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s generalisaçúes<br />
dogrnaticas, erra<strong>da</strong>mente estableci<strong>da</strong>s sobre os <strong>da</strong>dos anthropornetricos tão<br />
frequentemente contradictorios, faz tombar <strong>de</strong> repelláo, todo o edificio<br />
pseudo-scientifico que cuidãdosarnentc liavia architectado, sobre a plataforma<br />
do <strong>de</strong>sequilibrio absoluto e eterno <strong>da</strong>s varie<strong>da</strong><strong>de</strong>s anthropologicas.<br />
A doutrina do <strong>de</strong>berminismo tellurico puro e simples, pecca por exagera<strong>da</strong>,<br />
mas, se lhe addicionarmos, como causa simultanea, o influxo do contagio<br />
social, teremos achado talvez, a theoria mais satisfactoriamente explicativa<br />
<strong>da</strong> modificaçáo <strong>da</strong> personali<strong>da</strong><strong>de</strong> moral e <strong>da</strong> propria estructura physiea,<br />
observa<strong>da</strong> lios ncgros dos Estados Unidos e nos RIaoris <strong>da</strong> Nova Zelandia.<br />
E' um phenorneno cliimico dos mais communs a particulari<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
dois corpos, com gran<strong>de</strong> affini<strong>da</strong>dc electiva, carecerem indispensavelmente<br />
d'uma circumstancia especial, ou <strong>da</strong> presença d'um terceiro corpo, para<br />
po<strong>de</strong>rem effectivar a sua combinac;áo. Na<strong>da</strong> mais logico, pois, do que sup-
pôr que a barbarie dos negros, siibmetti<strong>da</strong> ao contagio <strong>da</strong> civilisaqão <strong>da</strong><br />
raça branca, preciza tambcm cventnalrncntc <strong>da</strong>. influencia tellurica como<br />
auxiliar <strong>da</strong> assimilação social.<br />
O meio pliysico infliiindo sobre a constituiç50 <strong>da</strong> raça, e o contagio<br />
civilisador sobre n evoloç80 social, <strong>de</strong>vcm no limite prodiizir, não a iinifor-<br />
I,I ? ,i(lc1 total dos typos etlinicos, mas tima completa equivalencia <strong>de</strong> va-<br />
lor moral, pliysiologico, economico e social cntre os differentes nricleos<br />
humanos.<br />
Caracteres anthropologicos, physiologicos e psychologicos <strong>da</strong>s raças humanas<br />
Fica assim <strong>de</strong>monstra<strong>da</strong> em to<strong>da</strong> a sua generali<strong>da</strong><strong>de</strong> a influencia do<br />
mcio, e vamos agora. cxnminar alguns <strong>da</strong>dos rclatiros ás raças humanas<br />
sob os pontos <strong>de</strong> vista anatomico, pliysiologico, moral e mental, <strong>de</strong>finitiva-<br />
mente comprovativos <strong>da</strong> eqriivalcncia dos differentes agrupamentos. Os<br />
principaes argiimentos dos <strong>de</strong>fensores <strong>da</strong> inferiori<strong>da</strong><strong>de</strong> pliysica dos negros<br />
baseiam-se na conformaçáo <strong>da</strong> caixa crancann, indice ceplialico, prognatis-<br />
mo, natiireea do cabe110 e na cor <strong>da</strong> pelle.<br />
Examinemos, successivamente e em <strong>de</strong>tallie, ca<strong>da</strong> um d'estes argiimcntos,<br />
o o3 factos que <strong>de</strong>monstram a sua completa vacui<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> significa~"~.<br />
Para esse fim passaremos succcssivamente em revista todos os caracteres<br />
exteriores, nnntomicos e psycliologicos <strong>da</strong>s varie<strong>da</strong><strong>de</strong>s humanas<br />
qiic, mais ou mcnos injustifica<strong>da</strong>meiite, teem servido <strong>de</strong> base ás cltissificaç~cs<br />
anthropologicas.
Caracteres exteriores<br />
Estatura. - .J;i tivemos occasiáo dc indicar a iiifliicncin, <strong>de</strong>cisiva qiie<br />
x aliinentaçáo e a c~onstitiii(;ão do solo exerceni sobre a estatura humana;<br />
1150 s50, porem, :lpenas estcs, os factores cxtcrnos qiic originam <strong>de</strong>ntro do<br />
mesmo povo, <strong>da</strong> mesma socie<strong>da</strong><strong>de</strong> e at8 <strong>da</strong> mesma farnilia, a extrema<br />
variabili<strong>da</strong><strong>de</strong> d'esta dimensão táo inipropriamerite toma<strong>da</strong> por alguns antliropologistas<br />
como caracteristica racial. A e<strong>da</strong><strong>de</strong>, o sexo, a profissáo e as<br />
eoncliçóes <strong>de</strong> existencia são motivo dc constante alteraçilo na estatiira do<br />
individuo humano. A differenciaçlto sexual sob o ponto <strong>de</strong> vista <strong>da</strong> alt~ira,<br />
tHo importante n'algumas raqas, B profun<strong>da</strong>mente modifica<strong>da</strong>. pelo moilu (lê<br />
vi<strong>da</strong>; assim, nos Estados 1Jnidos n estatiira <strong>da</strong> mullier tcm aiigmcntaclo<br />
bastante, cliegnndo milito freqoentcmente. ein niimerosas familias ricas, a<br />
exce<strong>de</strong>r a do3 var9es. A vi<strong>da</strong> perfeitamente livre, inclepen<strong>de</strong>ntc, Iiygienica<br />
e sportivn <strong>da</strong> ,flz!fy girl, passando ao ar livre o rnellior <strong>da</strong> siia existcncia,<br />
entregue aos salutares exercicios do lrrirtn tcwllis, i.otc1iay, ~.idiiiy, rlr.ir;i~ty, etc.,<br />
proporciona-lhe rima activi<strong>da</strong><strong>de</strong> physica, superior á dos homens, qiie, mesmo<br />
nas classes mais abasta<strong>da</strong>s, nunca rleixam <strong>de</strong> reservar muitas horas ao<br />
trabalho extennrinte e aos ncgocios absorventcs, escravisados como estáo<br />
perante as exigencias <strong>da</strong> intensi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> americana. A influencia <strong>da</strong><br />
profissáo d importantissima. No Japgo, <strong>de</strong>scle o inicio d'essc cxtraordinario<br />
plienomeno cla acsimilayiío <strong>da</strong> ciyilisação occi<strong>de</strong>ntal, as classes nobres e<br />
siiperiores, entregaram-se com tal afiaco ás profissócs ~oliticas e ao estudo<br />
<strong>da</strong>s sciencias es~)ci~iilativas, qiie, entre outros symptomas <strong>de</strong> <strong>de</strong>generescencia<br />
occasionad,~ por abiiso <strong>de</strong> trabalho intellectnal, apresentam uma<br />
notavel diminniçHo (te estatura.<br />
Examinando o quadro <strong>da</strong>s estatiiras humanas organisado por Weisbach,<br />
<strong>de</strong>para-se-no- urna mistura inverosiinil e grotesca <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as<br />
raças humanas qiic, sem nexo nem correlaçáo possivel, se acotovelam
pittorescamente, n'iima barafun<strong>da</strong> in<strong>de</strong>scriptivel. Assim se encontram<br />
os cafres seguidos dos scandinavos, os inglezes e escossezes <strong>de</strong> braço<br />
<strong>da</strong>do corn os csqiiimaiis, os irlaii<strong>de</strong>zcs corn os Va<strong>da</strong>gas <strong>da</strong> India, e os<br />
francezes fazendo figura ao lado dos natnraes do Caucaso e dos negros<br />
argelinos !<br />
A comica iiicolicrcncia d'esta classificação (: aproveita<strong>da</strong> por alguns<br />
anctores como Qiiatrefages, para argumento <strong>de</strong>monstratiro <strong>da</strong> intima mis-<br />
tura e remota mestiy~igern geral <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as raças, que, na opiniáo d'aqiielle<br />
illiistre dcferisor (10 credo monogcnista, <strong>de</strong>vem ter <strong>da</strong>do origem aos actuaes<br />
agriipaiiicntos cthnicos. Nsta Iiypothcse C <strong>de</strong> todo o ponto inacceitavel, se<br />
ntlcn<strong>de</strong>rmos qiic <strong>de</strong>ntro dn mesma raça ha, na estatiira dc classes corres-<br />
por~luntes a estado sorinl e profissóes iliversaii, differenças que iiltrapassam<br />
scri-iielinente as tlns medias <strong>de</strong> povos afastadissimos na alliidi<strong>da</strong> escallli <strong>de</strong><br />
Mrc~isbacli. Para aquellcs que admittnin a elevaçgo <strong>da</strong> estatura como sym-<br />
ptoma <strong>de</strong> siil~eriori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> raça, <strong>de</strong>ve ser triste <strong>de</strong>silltisfio a gran<strong>de</strong> pre-<br />
ccdcncia qiic sob esse ponto dc vista, (': forçoso conce<strong>de</strong>r aos patagijes e aos<br />
11, ,~~ii,i.; d~i Polynesia, em liariiionia com o referido quadro estatistico.<br />
.ltin;il, n iiriica concliisão logica qiic d'estes factos se pd<strong>de</strong> <strong>de</strong>diizir, Q a<br />
rieiiliuma significaqúo d'estc c:iracter physico sobre a diffcrenciação <strong>da</strong>s<br />
raps hiimaiias, e o seu valor ;ibsolutamcnte nullo como 1);ise (te classificaçáo<br />
anthropulogica e <strong>de</strong> hiernrcliia racial.<br />
Propoiçõus do corpo e dos membros. - Sáo por tal foram variaveis<br />
as proporçóes plii-sicas <strong>da</strong>s differentcs partes do corpo humano, que,<br />
até para, o campo restricto d'uma raça oii d'um povo, se torna itnpossivel<br />
organisnr uni criterio nrtistico permanente. Por scrcm differentissimas<br />
entre si as propor(;Ves diis figaras que Itnpliael pintou nas suas loggie, ou<br />
que l\Iigtiel Angelo, o gran<strong>de</strong> rcroltndo artistico, <strong>de</strong>ixoii nos frescos immortaes<br />
<strong>da</strong> capella Sixtina, ncin por esse motivo <strong>de</strong>ixam <strong>de</strong> ser egiialmente<br />
admira<strong>da</strong>s essas tfio celebres obras primas.<br />
(knanto ao pretendido exagero do comprimento dos membros anteriores<br />
<strong>da</strong> ra(;a negra, como caractcristicn dc maior proximi<strong>da</strong><strong>de</strong> simicsca, as rigo-<br />
rosas olservaçócs e medi<strong>da</strong>s comparativas obti<strong>da</strong>3 por Qiietelet vieram<br />
invali<strong>da</strong>r a hypothese, <strong>de</strong>sfazendo cm na<strong>da</strong> mais essa len<strong>da</strong> anxiliar do
42 POLITICA IXnIGERA<br />
.--- - -- - - - - -- - - -- -- - ---<br />
preconceito <strong>de</strong> raça. Antes pelo contrario, os mais bellos exemplares <strong>de</strong><br />
proporcionali<strong>da</strong><strong>de</strong> physica rigorosameate esthetica (segundo a nossa visiia-<br />
li<strong>da</strong><strong>de</strong> artistica), encontram-se nas populaçúes indigenas, náo sujeitas aos<br />
mil constrangimentos <strong>da</strong> mo<strong>da</strong> e it acçáo dcbilitante e <strong>de</strong>formadora <strong>da</strong><br />
facili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> existencial qiie tanto coucorre, segundo Qiiatrefriges e Max<br />
Nor<strong>da</strong>n, para introduzir na raça serios elenientos <strong>de</strong> <strong>de</strong>gra<strong>da</strong>ção.<br />
Cor <strong>da</strong> pelle -A differença <strong>de</strong> colorido <strong>da</strong> pelle liiimana, cujas<br />
hypotheses causaes ta0 controverti<strong>da</strong>s teem sido, forncceu em to<strong>da</strong>s as<br />
epochas, na opiniáo dos apostolos <strong>da</strong> <strong>de</strong>segual<strong>da</strong><strong>de</strong> humana, o stygma mais<br />
inconfiindivel <strong>da</strong> inferiori<strong>da</strong><strong>de</strong> negra. Scientificamente, esta asserçáo é <strong>de</strong>s-<br />
pi<strong>da</strong> do minimo fiin<strong>da</strong>niento. Ninguem ignora que branco, amarello, ou negro,<br />
nenhum homem possue differenciaçáo essencial na constituição organica <strong>da</strong><br />
pelle. A <strong>de</strong>r~ne E sempre branca, a eyi<strong>de</strong>rme incolor e variando <strong>de</strong> transparencia<br />
nos individuos <strong>da</strong> mesma raça, e a parte intermedia, o corpo mucoso,<br />
que contem a substancia corante ou pigl~zenfo, 6 que infl~ie na variaçso do<br />
colorido <strong>da</strong> pellc, pela dosagem quantitativa e proporcional <strong>da</strong>s diversas<br />
cathegorias <strong>de</strong> celliilas pigmentarcs. ,IA tivemos occasiáo <strong>de</strong> mostrar (L<br />
enorme influencia do tellorismo na co1oraç;io animal e vegetal, parecendonos<br />
ser o meio, o mais evi<strong>de</strong>nte factor na differenciaçáo primordial dos<br />
coloridos, fixados <strong>de</strong>pois pela liereclitnrie<strong>da</strong><strong>de</strong>, pelas circnmstancias geographicas,<br />
e multiplicados constantemente pelo effeito <strong>da</strong> mestiçagem.<br />
A mu<strong>da</strong>nça <strong>de</strong> coloricio <strong>da</strong> pelle humana, mesmo sob a acçEio energica<br />
e do meio, B um l)hcnomei~o naturalmente lento, em que se torna<br />
preciso contar por geraçúcs c niio por annoo. Entretanto, a tez dos negros<br />
dos Estados Unidos tem aclarado immenso e, segundo Elisbe Rccliio, sob<br />
este aspecto, já cllcs triinspozerain n cl~iarta parte <strong>da</strong> distancia que os separa<br />
dos brancos. E tambem facto averiguado e bastante notavel, a mu<strong>da</strong>nça<br />
<strong>de</strong> tez dos japonczes resi<strong>de</strong>ntes na E~iropa, n'um espaço inferior a<br />
20 annos, e a per<strong>da</strong> <strong>da</strong> forma caracteristica dos olhos que se iiltíma totalmente<br />
it segun<strong>da</strong> gcraçno.<br />
De resto, c iniiito embora isso custe ao aricitocratico orgiillio <strong>da</strong> raqa<br />
branca, producto actual d'uma seric infin<strong>da</strong> <strong>de</strong> criizamentos immemo-<br />
riaes, a hypothese <strong>de</strong> Sergi qiie colloca a siia origem nos poros Euro-
- ~006~8 GERAES 43<br />
--<br />
africanos que, em tempos preliistoricos, passaram <strong>da</strong> Africa á Europa,<br />
está sendo diariamente reforça<strong>da</strong> com as successivas <strong>de</strong>scobertas <strong>de</strong> esqueletos<br />
sd attribuiveis a negroi<strong>de</strong>s, feitas na Europa por Verneau Hervé, Pittard,<br />
Brinton e varios outros.<br />
Nesmo abstrahiiido <strong>da</strong> influencia evolutiva do meio, e consi<strong>de</strong>rando<br />
sbmente as circumstancias actuaes, observa-se haver povos que, apresentando<br />
todos os caracteristicos <strong>da</strong> raça branca, sáo <strong>de</strong> ci,r negra bem retinta<br />
como os abyssinios, ao passo que os buslimen ostentam um colorido<br />
amarello torrado, que não justificaria <strong>de</strong> per si a inclusão d'este povo<br />
na chama<strong>da</strong> raga negra. É o caso <strong>de</strong> dizer como Linneu: a nimiurn nc<br />
cre<strong>de</strong> colori D .<br />
Cabello -k bastante variavel nos differentes agrupamentos humanos o<br />
aspecto <strong>da</strong>s villosi<strong>da</strong><strong>de</strong>s cujo conjuncto constitue o systema piloso do homem.<br />
Entretanto, abstracçiio feita <strong>da</strong>s anomalias ruivas que se dão em to<strong>da</strong>s as<br />
mais oppostas varie<strong>da</strong><strong>de</strong>s anthropologicas, e d'um certo numero <strong>de</strong> excepções,<br />
apreciiivel em algumas raças; a coloração dos cabellos parece estar intimaiiiprit<br />
e relaciona<strong>da</strong> com o colorido <strong>da</strong> pclle. Existem diversas classificações<br />
huriianas basea<strong>da</strong>s n'este caracter physico. Huxley e Bory <strong>de</strong> S. Vincent<br />
admittem apenas duas especies <strong>de</strong> cabellos, os lisos e os encarapinhados,<br />
repartindo a humani<strong>da</strong><strong>de</strong> em dois grupos, respectivamente <strong>de</strong>nominados<br />
leiottico e ziletrico.<br />
Brown, estu<strong>da</strong>ndo a secçáo transversal dos cabellos, distingue tres<br />
cathegorias distinctas : ctcbellos <strong>de</strong> sec~ao circt11ui., caracterisando os mono<br />
goes, malaios, autoclitones americanos e, <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> certos limites, os vasconsos<br />
(brancos allopliylos); cctbellos tle segdo ellyptica, nas raças negra e hottentote<br />
; cabellos <strong>de</strong> sec~iio oval, na raça branca. Pruner Bey chega a i<strong>de</strong>ntica<br />
repartivá0 <strong>da</strong> liumani<strong>da</strong><strong>de</strong> baseiando-se na espessura do cabello que é minima<br />
para o negro, niaxima para o chinez e para o indio americano, e<br />
media para o branco. Topinard escolliendo para traço differenciador a forma<br />
<strong>de</strong> enrolamento ou <strong>de</strong> torsáo <strong>da</strong> espiral capillar chega ao estabelecimcnto <strong>de</strong><br />
quatro typos differentes <strong>de</strong> cabello, lisos, aar~elados, frisados ou encarapinltados,<br />
e lanuyi~~osos. O primeiro serviria <strong>de</strong> caracter distinctivo á raça<br />
pmarella e aos autocbtones <strong>da</strong> America; o segundo aos povos europeus,
semitas e berberes ; o terceiro aos indigenas <strong>da</strong> Aiidralia e aos mestiços,<br />
mulatos ou zamhos; finalmente o quarto e ultimo caracterisaria as popnlaçóes<br />
negras.<br />
O aspecto capillar, qiie na raça negra se apresenta muito variavel,<br />
4 profun<strong>da</strong>mente alterado pela mesticageni <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a primeira geraçáo,<br />
ten<strong>de</strong>ndo invariavelmente para a fórma superior (1) salvo iim oii outro<br />
atavismo sporadico. Os propiignadores <strong>da</strong> inferiori<strong>da</strong><strong>de</strong> negra cost~imam<br />
ordinariamente orientar a siia ten<strong>de</strong>nciosa argnmentaçáo, no sentido <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>monstrar a sua maior approximaçáo do typo ilos nntliropoi<strong>de</strong>s siiperiorcs.<br />
Admittindo esse hypotlietico grau dc approximaq,'lo, como circumstancia <strong>de</strong><br />
inferiori<strong>da</strong><strong>de</strong> real, cliega-sc á conclusáo qiie sáo precisamente os negros, os<br />
mais afastados do parentesco simiano. Dc todos os typos <strong>de</strong> villosi<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
humanas, a carapinha negra B sem diivi<strong>da</strong> o mais differente do peilo liso<br />
dos gorilhas e orangos.<br />
Steatopygia, comprimento dos seios, avental vulvar - Steatopygia, é<br />
o phenomeno <strong>da</strong> accumulaçáo <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> quanti<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> gordura sobre as<br />
na<strong>de</strong>gas formando enormes protubertincias. Ilnr~inte muito tempo soppoz-se<br />
constituir uma feiçáo social <strong>da</strong>s m~ilheres hottentotes e <strong>da</strong>s biishwomen.<br />
Livingstone afirma ter encontrado algnmas mulheres boers, apresentando<br />
i<strong>de</strong>ntica particulari<strong>da</strong><strong>de</strong>, mas o facto não está ain<strong>da</strong> absoliitamente averiguado.<br />
O qiie parece po<strong>de</strong>r afirmar-se, 6 qiic se trata tl'lim caso pathologico,<br />
convertido em ta ri^ hereditsria, pela sclecçáo resiiltaiitc <strong>da</strong> especial<br />
comprehensáo cstlictica d'aquellas popiiloqóes.<br />
0 comprimento dcsmcsiirado dos scios, observado lias miillicrcs <strong>de</strong><br />
varias pop~ilaçóes <strong>de</strong> raça negra, é fr~icto <strong>da</strong> gymnastica especial a que se<br />
sujeitam para se cmbelleear segundo o partic~ilarismo <strong>da</strong> respectiva visuali<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
esthetica.<br />
Quer tini quer outro d'estes tr,iios ilcsappareceria cvidcntemcntc com<br />
a civilisaçZo, oii com a iniiilun~,i <strong>de</strong> mcio. Oiitra anomaliii. pliysica, qiic<br />
muitos negrophobos tem qiiericlo aprcsciitar sy~il~tomntisando inferioriclriclc<br />
<strong>de</strong> raça, 6 a freqnenciix nas Iiottentotea e bii~liwomcn do acott~l vlllc~r<br />
formado pelo alongamento anormal (10s pequelios labios, que attinge acci-<br />
<strong>de</strong>ntalmente gran<strong>de</strong>s dimeiisóes, como, por escmplo, na conlicci<strong>da</strong> cstatiia
<strong>da</strong> Venus hottentote. Está hoje absolatrtmente provado pelo rcgistro <strong>de</strong><br />
centenares <strong>de</strong> casos observados em mulheres eiiropeias, que, por fórma<br />
alguma, esse <strong>de</strong>svio anatomico p6<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>rado como exclusivo d'uma<br />
<strong>de</strong>termina<strong>da</strong> raça.<br />
Caracteres anatomicos<br />
Craneo - A analyse <strong>da</strong> conformaçáo osteologica do crgneo tem<br />
<strong>da</strong>do origem a successivas classificaçóes <strong>da</strong>s raças humanas que, pela flua<br />
incoherencia, apenas servem para evi<strong>de</strong>nciar a manifesta impossibili<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
<strong>da</strong> generalisação dos <strong>da</strong>dos antliropometricos, crescentemente mais compli-<br />
cados na medi<strong>da</strong> do <strong>de</strong>scnvolvimento <strong>da</strong> cephalometria e <strong>da</strong> craneometria.<br />
Des<strong>de</strong> tempos remotos tem sido geralmente acceite cí p1-iori que a gran<strong>de</strong><br />
rrnnco <strong>de</strong>ve correspon<strong>de</strong>r gran<strong>de</strong> intelligencia; e esta tem sido tambem a<br />
ten<strong>de</strong>ncia <strong>da</strong> opinião <strong>de</strong> alguns anthropologos. Ora os factos <strong>de</strong> observação<br />
diaria <strong>de</strong>monstram-nos, conviiiccntemente, a falsi<strong>da</strong><strong>de</strong> d'esta hypothese, e<br />
adiante veremos que, sc a instrucção, como exercicio intellcctual a que<br />
correspon<strong>de</strong> uma funcçáo <strong>de</strong> physiologia cerebral, concorre para o <strong>de</strong>s-<br />
envolvimento do enceplialo e correlativo aiigmento <strong>da</strong>s dimensóes crn-<br />
neanas, náo nos <strong>de</strong>vcmos <strong>de</strong>ixar arrastar iitd ao ponto <strong>de</strong> suppor a<br />
conformaçáo ossea do craneo Iiiimaiio, apenas <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte do factor intel-<br />
1e:tual. Se admittissemos que o grau <strong>de</strong> intelligencia é fi~ncçáo unica <strong>da</strong>s<br />
dimensóes do craneo, seriamos levados a concluir que um cão perdigueiro<br />
6 duas vezes menos intelligente do que um Terra Nova, o que é<br />
totalmente inexacto. Se segiiindo outra corrente <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias, tambem outr'ora<br />
<strong>de</strong>fendi<strong>da</strong>, cstabelecesscmos que a mentali<strong>da</strong><strong>de</strong> animal é apenas <strong>de</strong>pen-<br />
<strong>de</strong>nte do grau <strong>de</strong> relativi<strong>da</strong><strong>de</strong> entre os pesos do cerebro e do corpo,<br />
teriamos entáo <strong>de</strong> acreditar que o gato domestico para quem essa relação<br />
é quintupla <strong>da</strong> do leão, seria cinco vezes mais intelligente do que este, o<br />
que, sendo impossivel <strong>de</strong> verificar, é aliás absolutamente improvavel. Ambas
as hypotheses prece<strong>de</strong>ntes são egualmente falsas e inadmissiveis ; mas se<br />
o volume do craneo não pd<strong>de</strong> servir <strong>de</strong> iinico indicador para <strong>de</strong>terminar<br />
o nivel <strong>da</strong> intellectuali<strong>da</strong><strong>de</strong>, B innegavel que os estudos <strong>de</strong> Parchappe,<br />
Virchow, Broca e outros, acerca <strong>da</strong> influencia hypertrophiante exer-<br />
ci<strong>da</strong> pela assimilação scientifica na configuração do craneo humano,<br />
estudos que incidiram sobre um avultado numero <strong>de</strong> individuos, provam<br />
<strong>de</strong>finitivamente a importancia excepcional que a instrucção tem para o<br />
<strong>de</strong>senvolvimento d'este orgão. Parcliappe e Broca operaram milhares <strong>de</strong><br />
mensuraçóes craneometricas, simultaneamente nas classes snperiores pela<br />
illiistraç80 scientifica e em individiios complctnmente illetrados. As dimen-<br />
sóes medias mantiveram-se sempre muito mais eleva<strong>da</strong>s para os homens<br />
instruidos e, <strong>de</strong>ntro <strong>da</strong> sua propria classc, para aquelles cujas profissóea<br />
exigiam maior bagagem scientifica e um mais constante esforço <strong>de</strong> assimil-<br />
I-ação inteilectual. Admittido este facto, Virchow conclue que, <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong><br />
certos limites, o craneo humano ten<strong>de</strong> sempre a crescer para facilitar a<br />
armazenagem dos novos conhecimentos e conscqiientes modificagúes ence-<br />
phalicas.<br />
As casacteristicas <strong>da</strong> fórma craneana teem, como dissemos, servido<br />
<strong>de</strong> base a numerosas classificaçóes e constituido motivo para se <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>-<br />
rem suppostas inferiori<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> raça. Um dos principaes caracteres pro-<br />
porcionaes a que mais importancia anthropologica se attribiiiu, foi sem<br />
duvi<strong>da</strong> o indice cephalico horisontal, proposto por Retzius e que consiste na<br />
relação entre os diametros longitudinal e transversal do craneo.<br />
Mais tar<strong>de</strong> alguns aiithropologos, entre os quaes Pruner Bey, estu-<br />
<strong>da</strong>ram tambem o indice cephalico certical, ou seja a relaçáo entre os dia-<br />
metros longitudinal e vertical. Consi<strong>de</strong>raremos apenas o primeiro como<br />
mais importante e directamente conducente á <strong>de</strong>monstração <strong>da</strong> these que<br />
nos occupa. A variação do indice cephalico conduz á divisão <strong>da</strong>s raças em<br />
dolychocephalas ou <strong>de</strong> cabeça compri<strong>da</strong>, e brachycepltalas ou <strong>de</strong> cabeça<br />
curta. Foi esta a classificação <strong>de</strong> Retzius, ho,je substitui<strong>da</strong> pela <strong>de</strong> Broca,<br />
que lhe introduziu as divisões intermediarias <strong>da</strong> s~bb-dolychocephalia, ~nesati-<br />
cephalia e sub-brachycephalia. Para se fazer i<strong>de</strong>ia <strong>da</strong> incapaci<strong>da</strong><strong>de</strong> d'este<br />
caracter pliysico como differenciador <strong>da</strong>s raças e como argumento <strong>de</strong> <strong>de</strong>-
feza <strong>da</strong> irrediictibili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> <strong>de</strong>segixal<strong>da</strong><strong>de</strong> humana. <strong>da</strong>mos a seguir o qiia-<br />
aro <strong>de</strong> agrupamento <strong>da</strong>s raças. obtido por Broca. na serie <strong>de</strong>crescente dos<br />
respectivos indices ceplialicos horisontaes .<br />
...... .<br />
1 ndices<br />
I Raças Indices Raças<br />
b . . 1 -. I .- .<br />
I<br />
krachycephalos ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros<br />
Sub-dolychocephalos<br />
America, craneos <strong>de</strong>formados . 1, 03 Vasconsos hespanhoes ..... 0. 77<br />
Syrios, levemente <strong>de</strong>forinados . . 0. 85 Gaulezes <strong>da</strong> e<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> ferro . . 0. 77<br />
Lapões ................ 0. 85 hlalgaches ............ .I O. 76<br />
Ilaviera e Suavia .......... 0. 84 Chinezes .............. O. 76<br />
Arivergnczes <strong>de</strong> S . Nectaire ... 0. 84 Coptas ............... 0. 76<br />
Fiiilan<strong>de</strong>zes ............. 1 0. 83 Francezes merovingios ..... 0.76<br />
1nùo.chinezes ........... 1 0. 83 Slavos do Ilanubio ........ 0. 76<br />
I<br />
Sub-brachycephalos<br />
Tasmanienses ........... 0. $6<br />
. ilsacia e Lorcna .......... 0. 82 Polynesios ............. 0. 76<br />
iliissia d'Europa .......... 0, 82 Egppcios antigos ......... 0. 75<br />
Hretões do Norte .......... 0. 82 Gilallclles .............. 0. 75<br />
Javanezes .............. 0. 81 Corsos do seculo x\riir ...... 0. 75<br />
Turcos ............... ' 0. 81 Bohemios <strong>da</strong> Rumenia ..... 0.75<br />
Mongoes diversos ........ 1' 0.81 Papris ................ 0.75<br />
Bretões (Brelonnants) ....... 0. 81 França do Norte (neolithicos) . 0. 75<br />
Estonios ............... O. 80 Dolychocephalos ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros<br />
Vasconsos frnncezes ........ 0. 80 Kabylas ............... 0. 74<br />
Mesaticephalos<br />
Arabes ............... 0. 7.1<br />
I hmerica septentrional ...... 0.79 Niihins d'Elephnntina ....... 0.73<br />
' hrnerica meridional ........ 0. 79 França do Si11 (neolithicos) ... 0. 73<br />
I 1<br />
I hfalaios nãwjavanezes ..... França (paleolithicos) ...... 0.73<br />
I I<br />
; França do norte (c<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> bronze) . 0. 79 Kegros dlAfrica Occi<strong>de</strong>ntal ... 0. 73<br />
I<br />
ji>arisienses do seculo xvr .... 0. 79 llengalinos ............. 0. 73<br />
Parisienses do seculo XII .... 0. 79 (hfres ................ 0. 72<br />
Parisienses do seculo xix .... O. 79 líottentotes e bushmen ..... 0. 72<br />
, Gallo-romanos .......... 0. 78 Australianos ............<br />
Neo-Caledonios ..........<br />
-<br />
0. 71<br />
1 Rurnenos .............<br />
0. 71<br />
Mexicanos .............. 0. 78 Esquimaus ............. 0. 71
4 8 POLITICA INDIGENA<br />
Este quadro vem mais uma vez <strong>de</strong>monstrar a absoluta inani<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
<strong>da</strong>s generalisações anthropologicas, por mais scientificamente ex~ctos que<br />
sejam os <strong>da</strong>dos anthropometricos obtidos. D'esta estranha e informc mistura<br />
<strong>de</strong> povos e raças resulta, para aquelles antliropologistas que tiiiliam<br />
a dolycliocephalia como i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> perfeição, <strong>de</strong>pararem imprevistamente<br />
com os negros siiperiorcs a todos os brancos, e com os esquimaus & testa<br />
<strong>da</strong> humani<strong>da</strong><strong>de</strong>; pelo contrario, para os que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m a superiori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong><br />
brachycephalia surge a amarga <strong>de</strong>sillusão do sceptro <strong>da</strong> realeza hiiinana<br />
ficar pertencendo aos lapóes, seguidos immecliatnmente pelos bararos e<br />
aiivergnezes ! Quatrefages, na siia <strong>de</strong>fesa idiosj-ncrasica <strong>da</strong> uni<strong>da</strong><strong>de</strong> especifica<br />
<strong>da</strong>s ryas liumanas, aproveita tambcin esta classificaq5o incolierentc<br />
para dcmonstrar a intima mistura <strong>de</strong> tod:is as raric<strong>da</strong>iles antliropologicas,<br />
esquecendo a po<strong>de</strong>rosa influencia do iiicio c atd clix l)rofissão, que t5o iinportantcs<br />
alteraçóes craneologicas pb<strong>de</strong> produzir. Ranke e Virchow attribiiem<br />
ao meio excessivamente montanhoso a l~racliyceplialia dos b:irnros e<br />
outros povos serranos. Warren mostroii; com ol~qervaçóes indiscntireis, cliic<br />
a capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> craneana dos negros ctos E,t;-itlos Unidos é sensivelinente<br />
superior dos escravos, seus proximos asceiidciites. Ihirand obscrvou o seguinte<br />
curiosissimo phenomeno. Nas Iornli<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> Espalion, Ro<strong>de</strong>z e >lilliau,<br />
a popnlac;&o <strong>da</strong>s ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s perteiice na sua quasi totali<strong>da</strong><strong>de</strong> ao tyl)o<br />
dol~choceplialo, frontal muito pronlinciado, ao passo qiie na pop~~laçáo<br />
rural a bracliycephalia é geral. Este facto 6 tanto mais notavcl qiianto 6<br />
certo a observação ter egualineiite <strong>de</strong>inonstrado qiie, á segun<strong>da</strong> geraçáo <strong>de</strong><br />
vi<strong>da</strong> urbana, o camponez bracliyccphalo est8 jli transformado n'um dolyclioceplialo<br />
puro. (')<br />
Perante a veraci<strong>da</strong><strong>de</strong> incoiitestavel c dcrnonstradissiina dos factos<br />
prece<strong>de</strong>ntes, o que fica valcndo a theoria <strong>da</strong> inferiori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> certas raças<br />
basea<strong>da</strong> no indicc ceplialico? O mais que logicamente se pó<strong>de</strong> concluir E<br />
a extrema vnriabili<strong>da</strong>iic cl'csta medi<strong>da</strong>, <strong>de</strong>pencientc <strong>de</strong> mil fnctorcs occasio-<br />
(1) J. Finot - I;c PrQtrg-es Rnces.<br />
-
~ 0 ~ GERAEY 6 ~ s<br />
49<br />
-<br />
naes, e atd mesmo possivel <strong>de</strong> obter-se por processos artificiaes, visto se-<br />
rem geralmente conheci<strong>da</strong>s as <strong>de</strong>formaçóes craneologicas provoca<strong>da</strong>s pelos<br />
Hiinos, Galatas, Volscos, e alguns autochtones americanos. A propria ali-<br />
mentação B susceptivel <strong>de</strong> modificar a fórma craneana, como já tivemos<br />
occasiáo <strong>de</strong> <strong>de</strong>monstrar quando citamos as observaçóes <strong>de</strong> Nathusius sobre<br />
as raças minas. O sexo é tambem importante como differenciador dos indi-<br />
ces cephalicos, quer vertical, quer horisontal. Posto isto, se mais algum a+<br />
C<br />
gumento fosse ain<strong>da</strong> necessario, para mostrar bem claramente a impossi-<br />
bili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> attribuir ao indice cephalico o minimo valor, como elemento<br />
snsceptivel <strong>de</strong> caracterisar uma raça, bastaria lembrar que a differença<br />
maxiina na escala <strong>de</strong> Broca, entre os povos <strong>de</strong> morphologia craneana mais<br />
afasta<strong>da</strong>, é <strong>de</strong> 0,14 (<strong>de</strong>sprezando os craneos <strong>de</strong>formados), ao passo que,<br />
operiindo apenas com individuos <strong>de</strong> raça mongol, Huxley conseguiu achar<br />
urna differenva <strong>de</strong> 0,348.<br />
A dolychocephalia po<strong>de</strong> ser occipif(tb, teinporal e frontal, consoante o<br />
alongamento ossto que a produz se limita mais essencialmente ao occipi-<br />
tal, aos temporaes ou ao frontal. Na raça negra, observou Gratiolet, rea-<br />
lisa-se quasi sempre o phenomeno <strong>da</strong> dolychocephalia occipital, o que <strong>de</strong>ti<br />
em resultado que esta forma craneana immediatamente foi consi<strong>de</strong>ra<strong>da</strong><br />
pelos <strong>de</strong>fensores <strong>da</strong> <strong>de</strong>segual<strong>da</strong><strong>de</strong> humana como signal inconfundivel <strong>da</strong> in-<br />
feriori<strong>da</strong><strong>de</strong> negra. Náo tardou, porbm, que Broca, estu<strong>da</strong>ndo a craneologia<br />
dos vasconsos francezes, chegasse á constataçáo <strong>da</strong> riolychocephalia occipital<br />
na maioria dos individuos observados, <strong>de</strong>struindo assim mais essa tabua <strong>de</strong><br />
salvayáo do periclitante preconceito <strong>de</strong> raça. Variou aritlropologistas <strong>de</strong>s-<br />
cobriram por diversas mensuraçóes, fun<strong>da</strong>mentalmente vicia<strong>da</strong>s, que o ori-<br />
ficio occipital estava collocado muito mais para traz nos individuos <strong>de</strong> raça<br />
negra. Ora o9mo d'hubenton mostriira que, nos animaes comparados ao<br />
homem, essa differenpa anatomica se realisava, d'ahi a consi<strong>de</strong>rar-se esse<br />
facto como mais um testemunho do proximo parentesco entre negros e an-<br />
thropoi<strong>de</strong>s, nálo me<strong>de</strong>iou um passo. As mensuraçóes obti<strong>da</strong>s referiam-se ao<br />
comprimento total <strong>da</strong> cabeça incluindo a cara, e como Scemrnering, por<br />
exemplo, apenas operou sobre prognatas accentuados, esse resultado em<br />
4
50 POLITICA INDIGENA<br />
I<br />
- -. --<br />
<strong>de</strong> prever, visto que, <strong>de</strong>senvolvendo-se a face para a frente, C natural que<br />
o orificio occipital pareça recuar.<br />
De resto, como mais para diante mostraremos, o prognatismo não<br />
p6<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>rado como symptoma <strong>de</strong> inferiori<strong>da</strong><strong>de</strong> racial.<br />
Muitas ontras mensiiraçóes principaes, além do indice cephalico,<br />
tcem sido siiccessivamente estii<strong>da</strong><strong>da</strong>s pelos anthropologistas, e aconselha<strong>da</strong>s<br />
como traços differenciadores <strong>da</strong>s raças. Assim a cirnc~nferencia total do cra-<br />
neo, os din~netros<br />
frowtaes. a czirva antero-posterior, as projegóes crnneanns<br />
tle Broca e o niigulo e.zl~h~noidnl<br />
<strong>de</strong> Virchow estii<strong>da</strong>do por Welker, teem<br />
fornecido assiimpto vasto para um enorme amontuado <strong>de</strong> obuervaçóes craneo-<br />
metricaa, muito frequentemente contradictorias, pela falta <strong>da</strong> longa pratica,<br />
i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> processos e perfeito conhecimento dos instrumentos proprios e<br />
necessarios aos estndos anthropometricos. Procurar obter duas observaçúes<br />
concor<strong>da</strong>ntes n'csse labyrinto pseudo-scientifico, é mais difficil do que<br />
fixar Lima incognita nnica n'iim caso <strong>de</strong> in<strong>de</strong>terminação. Esse chiios <strong>de</strong><br />
classificaçóes e agrupamentos <strong>de</strong> raças, em regra grotescos e <strong>de</strong> significa-<br />
ç.;to nulla, tem sido o resultado <strong>da</strong> falsa interpretação presta<strong>da</strong> ás medi<strong>da</strong>s<br />
forneci<strong>da</strong>s ela sciencia anthropometrica que, aliás, t5o bons serviços p6<strong>de</strong><br />
prestar, como processo meramente <strong>de</strong>scriptivo. Pondo <strong>de</strong> parte as medi-<br />
<strong>da</strong>s menos importantes e cujo estudo <strong>de</strong>talhado é incomportavel com a natu-<br />
reza d'este livro, occupar-nos-hemos agora d'outro caracter aiiatoinico, a<br />
capncitia<strong>de</strong> crarteana, a qile tanta importancia tem ligado a maioria dos<br />
anthropologos. A mediçfio d'e~sa capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> tem-se effectuado, ou pelo pro-<br />
cesso <strong>da</strong> arqzcençao, ou pelo <strong>da</strong> cubagei,t. O primeiro dá-nos indirectamente<br />
o voliime pela mediçko do peso <strong>de</strong> siibstancias taes como agua, mercurio,<br />
chiimbo mioclo, areia, ctc., com qiie se enche o craneo; o segundo, menos<br />
pratico, avalia directamente o volume por uma serie <strong>de</strong> mensuraçóes com-<br />
plica<strong>da</strong>s, diffict2i.i <strong>de</strong> effectuar e siisceptiveis <strong>de</strong> erros consi<strong>de</strong>raveis.<br />
Para clei~~onstrar<br />
a nenhuma influencia exerci<strong>da</strong> pelas dimensóes <strong>da</strong><br />
capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> craiic1an;i, sobre a siiperiori<strong>da</strong><strong>de</strong> intellectiial d'uma <strong>de</strong>termi-<br />
ria<strong>da</strong> raça, parcc,rl-nos bastante transcrever o seguinte qiiadro <strong>da</strong>s observa-<br />
ç5es <strong>de</strong> Broca.
--<br />
Raças<br />
I I<br />
C.averna <strong>de</strong> ZJHontme Mort (neolithicos) . ......<br />
Bretões (Grtllois) . ..............<br />
Auvergnezes ................<br />
...........<br />
.I<br />
. . . . . . . . . . . . . . .<br />
Da simples inspecção d'este quadro resulta a superiori<strong>da</strong><strong>de</strong> picaresca<br />
dos selvagens troglodytas <strong>da</strong> pedra poli<strong>da</strong> sobre to<strong>da</strong> a humani<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
actual, e a gran<strong>de</strong> prece<strong>de</strong>ncia dos pacatos moços <strong>de</strong> fretes do Auvergne<br />
sobre todos os povos mo<strong>de</strong>rnos !... Consultando os quadros similares, obtidos<br />
por diversos anthropologos, obteem-se resultados não menos irrisorios. Assim:<br />
Morton achou para os chinezes uma media <strong>de</strong> capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> craneana que os<br />
colloca em plano inferior aos negros, aos polynesios e aos selvagens ame-<br />
ricanos, o que não passa <strong>de</strong> mais um contrasenso a juntar aos que aqui<br />
temos vindo patenteando, no intuito <strong>de</strong> provar a sem razão e o <strong>de</strong>scabido<br />
pretenciosismo scientifico, dos argumentos oppostos á eqnivalencia incon-<br />
testavel <strong>da</strong>s diversas varie<strong>da</strong><strong>de</strong>s anthropologicas. A capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> craneana<br />
tem necessariamente <strong>de</strong> receber as influencias po<strong>de</strong>rosas do meio, <strong>da</strong> diffe-<br />
renciação sexual, e, em obediencia logica á lei <strong>da</strong> coor<strong>de</strong>nação organica, <strong>de</strong>ve<br />
*<br />
-<br />
1616<br />
1599<br />
1598<br />
I<br />
I Vasconsos hespanhoes. 1574<br />
1507 ' 109<br />
1426 173<br />
1445 153<br />
1356 218<br />
13% 198<br />
1337 221<br />
1353 204<br />
Baiuos bretões 1564<br />
Parisienses contemporaneos . . . . . . . . . 1558<br />
(,uanches . . . . . . . . . . . . . . . 1557<br />
C:orsos . . . . . . . . . . . . . . . . 1552 .I<br />
I~.squirnaus . . . . . . . . . . . . . . . . I 1539<br />
1367 1<br />
1428 /<br />
185<br />
111<br />
. . . . . . . . . . . . . . . . .<br />
hlerovingios. . . . . . . . . . . . . . . .<br />
R'eo Caledonios . . . . . . . . . . . . . . .<br />
Segroç d'hfrica Occi<strong>de</strong>ntal . . . . . . . . . . .<br />
Tasrnanienses . . . . . . . . . . . . . . . .<br />
Aiistralianos. . . . . . . . . . . . . . . . .<br />
Nubios. . . . . . . . . . . . . . . . . . 1329<br />
-- --<br />
e I<br />
1504<br />
1460<br />
1430<br />
1452<br />
1347<br />
1361 I 143<br />
1330 1 130<br />
1231 i 179<br />
1201 1 251<br />
1181 / 156<br />
1293 I 31<br />
-
52 POLITICA INDIGENA -- . -- - - - - --<br />
<strong>de</strong>senvolver-se proporcionalmente á estatura. A precoci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> consoli<strong>da</strong>-<br />
ção <strong>da</strong>s suturas craneanas, observa<strong>da</strong> por Gratiolet nas raças negrae, cons-<br />
titue uma simples paragem do processo evolutivo, ou persistencia d'um<br />
estado fetal ou infantil, <strong>de</strong> que em to<strong>da</strong>s as raças se encontram exemplos<br />
n'iirna ou n'outra parte do organismo, e que 4 quasi sempre <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte<br />
<strong>da</strong> acção mesologica. Quanto a exercer qualquer influencia sobre a intel-<br />
lectuali<strong>da</strong><strong>de</strong>, o numero enorme dos negros civilisados e a proficiencia diaria-<br />
mente reconheci<strong>da</strong> <strong>de</strong> tanto scientista <strong>de</strong> cor negra, <strong>de</strong>monstram sobejamente<br />
a gratuiti<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> tal hypotliese.<br />
Passemos agora ao estudo dos caracteres anthropologicos tirados <strong>da</strong><br />
face humana.<br />
Face - 11zdic.e facial, é a relação estu<strong>da</strong><strong>da</strong> por Broca <strong>da</strong>s dimensóes<br />
longitudinal e transversal <strong>da</strong> face; obtem-se multiplicando por 100 a distancia<br />
que vae do ponto supra-nasal, ao bordo alveolar <strong>da</strong> maxilla superior,<br />
e dividindo o producto pela largura facial medi<strong>da</strong> sobre as arca<strong>da</strong>s zygomaticas.<br />
A variação d'este indice reparte as faces humanas nas duas cathegorias<br />
eziryopse, faces largas, e dolyrliops~, faces compri<strong>da</strong>s, e serviu <strong>de</strong> base<br />
a mais tima classificação humana táo eitraordinaria como as anteriores.<br />
lnrlice uasnl B a relação entre a largura do nariz toma<strong>da</strong> na abertura<br />
<strong>da</strong>s fossas nasaes e multiplica<strong>da</strong> por 100, e o comprimento contado <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />
a articulação naso-frontal. Baseado n'esta relação, dividiu Broca a huma-<br />
ni<strong>da</strong><strong>de</strong> em tres gran<strong>de</strong>s grupos.<br />
Leptorhinios, nariz comprido e estreito, comprehen<strong>de</strong> os povos <strong>de</strong> raça<br />
branca ; platyr hinios, nariz curto e achatado, al)range as popiilaçóes negras ;<br />
mesorhinios, grupo intermedio que C constituiclo pelas raças amarellas. Esta<br />
classificação pral e as series <strong>de</strong>talha<strong>da</strong>s que julgamos dispensavel transcrever<br />
aqui, sendo na apparencia menos disparata<strong>da</strong>s do que as que prece<strong>de</strong>ntemente<br />
t~xaminámos, sao entretanto fun<strong>da</strong>mentalmente erroneas, pois,<br />
não sd Broca náo indica a e<strong>da</strong><strong>de</strong> dos individuos mensiirados, que tanto influe<br />
no indice nasal, como ain<strong>da</strong> n'este caracter anatomico as variaçóes raciaes<br />
são quasi <strong>de</strong>spreziveis, quando compara<strong>da</strong>s ás differenças individuaes.<br />
Indice o).hitario 6 a relaqão, egualmente proposta e estu<strong>da</strong><strong>da</strong> por<br />
Broca, que existe entre o diarnet~o vertical <strong>da</strong> orbita multiplicado por 100,
~ 0 ~ GERAES 6 ~ s<br />
-- --v v - --- - - 53<br />
e o diametro horisontal. Este caracter anthropologico cujo estudo ain<strong>da</strong><br />
hoje tem bastantes cultores, permitte repartir as raças humanas em tres<br />
classes : megasernos, aquellas cujo indice orbitario medio B <strong>de</strong> 89 ou superior;<br />
~nedsemos, quando o indice varia entre 83 e 89, e vjzicroseinos, to<strong>da</strong>s<br />
as que apresentem valores medios inferiores a 83. Como muito bem faz<br />
notar Jean Finot, o capricho e o arbitrio continuam a ser as unicas resultantes<br />
d'estas distribuiçóes insensatas. Parisienses misturados com negros<br />
e hottentotes, e aiivergnezes <strong>de</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> com os negros africanos, 8 o<br />
que se observa n'essa serie incomprehensivel <strong>de</strong> raças, que sd serve afinal<br />
para tiemonstrar náo existir nenhuma caracteristica anthropologica, que<br />
possa servir para distinguir essencialmente as varie<strong>da</strong><strong>de</strong>s humanas.<br />
Finalmente, vamos occupar-nos do prognatiai,zo, caracter facial dos<br />
mais importantes, e que tem sido objecto <strong>de</strong> longas series <strong>de</strong> immensas<br />
ol)scrvaçóes, perfeito dé<strong>da</strong>lo em que absolutamente se per<strong>de</strong> quem preten<strong>de</strong><br />
fazer um estudo critico do valor d'essa circumstancia anatomica, sob o<br />
.ponto <strong>de</strong> vista <strong>da</strong>s distincçóes anthropologicas. Começa a difficul<strong>da</strong><strong>de</strong> por<br />
se tornar impossivel <strong>de</strong>finir cabalmente o prognatismo, essa projecção <strong>da</strong><br />
face para a frente, que, para ca<strong>da</strong> anthropologo, motiva uma interpreta-<br />
Ç ~ O diversa, consoante a parte <strong>da</strong> face que consi<strong>de</strong>ram, e as mensuraçóes<br />
que escolhein.<br />
Com a variabili<strong>da</strong><strong>de</strong> do processo anthropometrico surgem a ca<strong>da</strong> momento<br />
resultados ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iramente contradictorios, e torna-se impossivel<br />
comparar os resultados do prognatismo total, do vnaxillar sfiperior, ou do<br />
mnxillar inferior, frequentemente confundidos. O systema <strong>de</strong> mensuração<br />
ho,je geralmente adoptado é o que foi preconisado por Broca e Topinard, e<br />
refere-se á observação do proynrrtistno alveolo-sub-nasal ou do ?)zaxillar superior,<br />
consi<strong>de</strong>rado pelo segundo d'aquelles anthropologos, como o ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro<br />
prognatismo. Topinard trabalhando com um gran<strong>de</strong> numero <strong>de</strong> craneos,<br />
organisou um quadro em que as raças humanas estáo dispostas na escala<br />
ascendcnte do prognatismo, e em que se effectua essa contra<strong>da</strong>nça grotesca,<br />
que por varias vezes observámos, dos povos mais naturalmente afastados<br />
se acotovelarem indifferentemente com o pormenor macabro dos craneos<br />
prehistoricos. Na escala <strong>de</strong> Topinard, os inventores <strong>da</strong> pedra poli<strong>da</strong>, como
54 POLITICA INDIQENA<br />
-- . .<br />
lhes chama Finot, foram os europeus <strong>de</strong> menor prognatismo, e superiores<br />
a to<strong>da</strong>s as raças humanas veem-se os Guanches e os corsos!<br />
O prognatismo é um caracter quasi geral a to<strong>da</strong> a humani<strong>da</strong><strong>de</strong>, e as<br />
suas diversas gra<strong>da</strong>çóes são muito variaveis com o meio, conforme veri-<br />
ficou Stephen Ward com os negros dos Estados Unidos, em quem esse traço<br />
anatomico tem diminuido sensivelmente. Em to<strong>da</strong> a humani<strong>da</strong><strong>de</strong> a creança<br />
Q mais orthognata que o adulto, d'on<strong>de</strong> se conclue que o prognatismo,<br />
em vez <strong>de</strong> ser uma paragem, é pelo contrario um excesso <strong>de</strong> evolução.<br />
Sendo os negros pronuncia<strong>da</strong>mente prognatas, esta circumstancia in-<br />
vali<strong>da</strong> a theoria <strong>de</strong> Serres que sustentava soffrer o organismo dos negros<br />
d'uma paragem geral <strong>da</strong> evoluçáo. Na reali<strong>da</strong><strong>de</strong>, como diz Quatrefages,<br />
a raça negra, na sua evoluçáo organica, ora se atraza ora se adianta<br />
relativamente á raça branca. Uma paragem oii um excesso <strong>de</strong> evoluçáo,<br />
significando respectivamente a persistencia, ou o <strong>de</strong>senvolvimento exce-<br />
pcional d'um <strong>de</strong>terminado caracter embryonario, fetal, ou infantil, nunca<br />
po<strong>de</strong>rão ser consi<strong>de</strong>rados como symptomas <strong>de</strong> inferiori<strong>da</strong><strong>de</strong> racial ou in-<br />
dividual.<br />
Se em vez <strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rar separa<strong>da</strong>mente os caracteres anatomicos<br />
proprios ao craneo e á face, estu<strong>da</strong>rmos o seii conjunto que constitiie a ca-<br />
beça, encontraremos ain<strong>da</strong> em todos os livros <strong>de</strong> anthropologia, numerosas<br />
rnensuraç6es, que teem servido para formular distribuiçúes ficticias <strong>da</strong>s<br />
raças humanas.<br />
Cabeça - Os caracteres mais estu<strong>da</strong>dos, e os iinicos <strong>de</strong> que nos occu-<br />
paremos, são o celebre angulo facial <strong>de</strong> Camper, e os angulos parietal ante-<br />
rior e parietal posterior. O angulo facial, para cuja mensiiraçáo teem sido<br />
propostas <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> processos craneometricos, obtem-se, segundo Camper,<br />
traçando n'uma projecção vertical do mo<strong>de</strong>lo, iima linha passando pela en-<br />
tra<strong>da</strong> do canal aiiditivo e pela base do nariz, e outra linha duplamente<br />
tangente ao osso do nariz e á fronte; pelo encontro d'estas duas linhas<br />
forma-se o angnlo facial. Segundo as observaç6es <strong>de</strong> Camper publica<strong>da</strong>s<br />
por Qnatrefages, as variaçóes do angiilo facial dão origem á seguinte<br />
escala.
-<br />
NOÇ~ES GEHAES<br />
- - -- -<br />
Estatuas gregas. . . . . . . . . . .<br />
Estatuas romanas . . . . . . .<br />
Raça branca. . . . . . . . . . .<br />
Raça amarella . . . . . .<br />
Raça negra . . . . . . . . .<br />
1W<br />
950<br />
W<br />
750<br />
700<br />
-Jovens anthropoi<strong>de</strong>s . . 650<br />
Claro está, influenciados pela graduaç50 <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>nte d'esta escala,<br />
varios anthropologistas seguindo as pisa<strong>da</strong>s do proprio Camper, não <strong>de</strong>moraram<br />
em ver, na diminuição do angulo facial, um ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro symptoma <strong>de</strong><br />
inferiori<strong>da</strong><strong>de</strong> e <strong>de</strong> animali<strong>da</strong><strong>de</strong> proxima. Os tral~allios tle Choquet, Geoffroy<br />
Saint-Hilaire, Ciivier e principalmente Jacquart, que sd na população branca<br />
e iiitclligente <strong>de</strong> Paris encontrou uma differeiiça angular maxima <strong>de</strong> 16O,<br />
vieram provar indisciitivelmente quanto 4 insignificativa a classificação<br />
acima transcripta.<br />
Os clngulos pnrietnes ou <strong>de</strong> Q~iatrefages, que foram conscienciosamente<br />
estu<strong>da</strong>dos por este naturalista, po<strong>de</strong>m ser anterior ou postprior. O primeiro<br />
Q formado por duas linhas tangentes, uma <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> lado <strong>da</strong> cabeça, ao ponto<br />
mais saliente <strong>da</strong> arca<strong>da</strong> zygomatica e á sutura fronto-parietal. No segundo,<br />
os primeiros pontos <strong>de</strong> tangencia são i<strong>de</strong>nticos, e as suturas fronto-parietaes<br />
são substitui<strong>da</strong>s pelos pontos mais salientes <strong>da</strong>s bossas parietaes.<br />
Este ang~ilo, cuja direcçlio facilmente se inverte, pó<strong>de</strong> ser, pois, positivo,<br />
niillo, ou negativo; rt este ultimo caso oorrespon<strong>de</strong>m as cabeças, <strong>de</strong>nomina<strong>da</strong>s<br />
por Pritchard, pyratnidues. Não se dcve consi<strong>de</strong>rar esta configuração<br />
<strong>da</strong> cabeça como <strong>de</strong>primente <strong>da</strong> intellectiialids<strong>de</strong>. Quatrefages, que a<br />
observou no craneo do proprio Cuvier, e <strong>de</strong> outras pessoas reconheci<strong>da</strong>mente<br />
intelligentes, sustenta tratar-se apenas d'iim exemplo <strong>de</strong> paragem<br />
<strong>de</strong> evolução representando a persistencia d'um caracter fetal. Effectivamente,<br />
nos fetos e nas creanças <strong>de</strong> muito pouca i<strong>da</strong>dc, o angulo parietal<br />
B sempre negativo.<br />
Além <strong>de</strong> todos os caracteres craneologicos que temos <strong>de</strong>scripto, ain<strong>da</strong><br />
muitos outros importantes po<strong>de</strong>riamos estu<strong>da</strong>r, como o angulo craneo-facial<br />
<strong>de</strong> Huxley, metafncial <strong>de</strong> Serres, naso-basiltrr <strong>de</strong> Virchow e Welker, o<br />
angulo dos condylos, ete., etc. No emtanto, com esse estudo alongariamos<br />
55
56 POLITICA INDIGENA<br />
inutil e <strong>de</strong>masia<strong>da</strong>mente esta parte do nosso trabalho que apenas visa A<br />
<strong>de</strong>monstraçáo <strong>da</strong> equivalencia anthropologica <strong>da</strong>s differentes raças. Não<br />
nos <strong>de</strong>teremos tambem no exame dos caracteres anatomicos, proprios ao<br />
esqueleto em geral, e ao esqueleto dos membros em especial.<br />
Na ver<strong>da</strong><strong>de</strong>, todos os <strong>de</strong>svios anatomicos que acci<strong>de</strong>ntalmente se observam<br />
na ostcologia geral dos individuos <strong>de</strong> raças diversas, encontram-se<br />
sempre, ou quasi sempre, com ninior ambito oscillatorio entre individuos <strong>da</strong><br />
mesma raça. Não constituem, essenci:tlmente, mais do que simples atrazos<br />
ou excessos <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento do organismo fetal, nunca po<strong>de</strong>m symbolisar<br />
uma inferiori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> qiialquer ntttiireza, e são inevitavelmente escravos<br />
<strong>da</strong> variasáo, <strong>de</strong>vi<strong>da</strong> ás inflnencias soberanas do meio, <strong>da</strong> coor<strong>de</strong>naçiío<br />
organica, e <strong>da</strong> fixação hereditaria.<br />
Antes, porém, <strong>de</strong> i11)ordttr o exame dos caracteres physiologicos absolutamente<br />
communs a to<strong>da</strong> a hnmani<strong>da</strong><strong>de</strong>, é ain<strong>da</strong> conveniente, não <strong>de</strong>ixar<br />
em esquecimento esse caracter physico, o pêso do cerebro, que tanta atten-<br />
\<br />
ção tem merecido aos mais distinctos anthropologistas.<br />
Cerebro - O pêso do encephalo, com as suas gran<strong>de</strong>s variaçúes, tambem<br />
serviu aos propugnadores <strong>da</strong> c1eseguald;~<strong>de</strong> humana, como mais um<br />
motivo <strong>de</strong>. . . pêso, para o seu thema favorito.<br />
O cerebro pren<strong>de</strong>, antes <strong>de</strong> tutlo, a sua evolução ao crescimento geral<br />
e á e<strong>da</strong>dc. +<br />
A medi<strong>da</strong> que a creariça SP vae <strong>de</strong>senvolvendo, o cerebro vae adquirindo<br />
pêso que attinge a sua expressáo maxima entre os 30 e os 40 annos;<br />
em segiiicla, com o envelhecer, soffre uma diminiiiç50 mo<strong>de</strong>ra<strong>da</strong> mas constante.<br />
O pêso cerebral B funcçáo <strong>da</strong> estatura, e cresce parallela e quasi<br />
proporcionalmente a essa dimensão. O cerebro feminino é mais leve do que O<br />
masculino. Os trabalhos <strong>de</strong> Wagner, Broca, Manouvrier, Matiegka e outros,<br />
<strong>de</strong>monstraram irrefutavelmente que o pêso do ence~halo augmenta com O<br />
grau <strong>de</strong> intelligencia e com o exercicio intellectual. D'aqui ntio se <strong>de</strong>ve<br />
<strong>de</strong>duzir que um homem, excepcionalmente intelligente, <strong>de</strong>va ter um cerebro<br />
extraordinariamente pesado. Se os legen<strong>da</strong>rios cerebros <strong>de</strong> Cromwell, BJTron<br />
e Ciivier, tanto ultrapassaram, n'este sentido, a normali<strong>da</strong><strong>de</strong>, convem ter<br />
sempre em vista que, na rigorosa eacala <strong>de</strong> Broca, immediatamente <strong>de</strong>pois
do <strong>de</strong> Byron e .muito antes do <strong>de</strong> Gauss, está <strong>de</strong>scripto o cerebro d'um<br />
pensionista <strong>de</strong> manicomio.. . . . .<br />
O pêso cerebral iia raça branca, segundo afirmações <strong>de</strong> varios an-<br />
thropologistas, Q superior ao que se observa na raça negra. A difierença,<br />
porém, está milito longe <strong>de</strong> attingir a importancia que lhe attribuem, e<br />
<strong>de</strong>ve estar vicia<strong>da</strong> pelo numero, relativamente pequeno, dos craneos negros<br />
est-u<strong>da</strong>dos. Entretanto, não nos repugna admittir qtie assim aconteça, com-<br />
tanto que o iinico corollario a <strong>de</strong>duzir, seja a menor estatura <strong>da</strong> raça, ou<br />
mais provavelmente a falta cle exercicio intellectual comparavel ao dos<br />
brancos. Des<strong>de</strong> o momento em que os trabalhos <strong>de</strong> tantos anthropologos dis-<br />
tinctoe, evi<strong>de</strong>nciaram tão claramente a influencia <strong>da</strong> profisu5o e do traba-<br />
lho intellectual, sobre a evoluçgo do cerebro, <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> ter qualquer fun<strong>da</strong>-<br />
nlento a erra<strong>da</strong> noção <strong>da</strong> incapaci<strong>da</strong><strong>de</strong> craneologica <strong>da</strong> raça negra. E era<br />
esta a conclustio final que precisamente <strong>de</strong>sejavamos attingir.<br />
Caracteres physiologicos<br />
Tornar-se-hia risivel quem preten<strong>de</strong>sse <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r unia differenciacáo<br />
racial na physiologia liumann. Ninguem ignora a ;tbsoluta i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong>, para<br />
to<strong>da</strong>s as i~arie<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
anthropologicas, dos phenomenos <strong>de</strong> gestação, respira-<br />
(:,AO, ~ir~~~laçã~,<br />
digestão, crescimento, sensoriaes, etc., etc. N'esse ponto as<br />
raças humanas <strong>de</strong>stacam-se atB, pela sua uniformi<strong>da</strong><strong>de</strong>, <strong>da</strong>s varie<strong>da</strong><strong>de</strong>s per-<br />
tencentes & mesma especie aiiimal.<br />
Assim, nas raças ovinas e bovinas o ~eriodo<br />
<strong>de</strong> gestaçgo B muito va-<br />
riavel, como mostram ;is observaçóes <strong>de</strong> Nathusius, Lefour e Tenier. A<br />
fecundidtt<strong>de</strong> animal é tambem muito differente nas diversas varie<strong>da</strong><strong>de</strong>s; ao<br />
passo que a femea do porco domestico pó<strong>de</strong> ter filhos duas ou tres vezes<br />
no anno, produzindo ca<strong>da</strong> ventre at6 <strong>de</strong>z individuos, a javalina tem<br />
apenas dois ventres annualmente, com cerca <strong>de</strong> 4 a 8 filhos em ca<strong>da</strong> um.
58 YOLITICA INDIGEJU<br />
--- -<br />
I<br />
---- -<br />
A fecundi<strong>da</strong><strong>de</strong> humana parece ser auxilia<strong>da</strong> pelos cruzamentos, mas o<br />
periodo <strong>de</strong> vi<strong>da</strong> fetal Q constante, e o numero <strong>de</strong> nascimentos Q sempre<br />
<strong>de</strong> 1 ou 2 por ca<strong>da</strong> ventre. O periodo <strong>de</strong> aleitamento varia apciras como<br />
consequencia dos usos, costumes e estado social doa idividuos consi<strong>de</strong>ra-<br />
dos. Do embryão ao feto, d'este á cremp, e d'esta ao ancião e ao ca<strong>da</strong>-<br />
ver, to<strong>da</strong>s as phases <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> pbysiologica são absolutamente indistinctae<br />
nas d8epeat.m raças humanas.<br />
Os casos pathologicos sáo egualmente extensiveis a to<strong>da</strong> a hiimani-<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong> sem excepções. To<strong>da</strong>s as doenças, antigas ou mo<strong>de</strong>rnas, em i<strong>de</strong>nticas<br />
circumstancias, náo poupam mais um branco do que um preto, e um chinez<br />
do que um pelle-vermelha. As differenças <strong>de</strong> mortali<strong>da</strong><strong>de</strong>, que algumas ve-<br />
zes se teem notado em occasiáo <strong>de</strong> epi<strong>de</strong>mias, atd ao ponto <strong>de</strong> parecerem<br />
representar quasi completa immuni<strong>da</strong><strong>de</strong> para uma <strong>de</strong>termina<strong>da</strong> raca, ou<br />
são consequencia natural <strong>de</strong> melhor acclimataçáo e a<strong>da</strong>ptação ao meio tellurico,<br />
do que resnlta para o organismo uma especie <strong>de</strong> vaccina ou fundo<br />
especial <strong>de</strong> resistencia, ou sáo meramente resultados <strong>da</strong>s condiçóes geraes<br />
<strong>de</strong> existencia, hygiene e alimentação que, por mais favoraveis ao organismo<br />
e hostis ao germen pathogenico, evitam a propagação <strong>da</strong> doença.<br />
As oscillaçóes, dos numeros que indicam as natali<strong>da</strong><strong>de</strong>s medias nos clifferentes<br />
povos, estão na absoluta <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ncia dos factores economicos e<br />
sociologicos que n'elles influem directa ou indirectamente, e, <strong>de</strong> fórma<br />
alguma, po<strong>de</strong>m servir <strong>de</strong> caracteristica a um <strong>de</strong>terminado agrupamento.<br />
A puber<strong>da</strong><strong>de</strong> e longevi<strong>da</strong><strong>de</strong> são, 6 ver<strong>da</strong><strong>de</strong>, bastante variaveis, mas<br />
são-no em com 8 m para to<strong>da</strong>s as raças humanas, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ndo a segun<strong>da</strong><br />
apenas do vigor individual, que se alcança em circumstancias favoraveis<br />
<strong>de</strong> meio tellurico e social. A e<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> puber<strong>da</strong><strong>de</strong> parece variar, não por<br />
differenciação physiologica, mas sob a influencia pura e simples do clima,<br />
sendo <strong>de</strong> observação vulgar o facto <strong>da</strong>s raparigas do norte <strong>da</strong> Europa,<br />
leva<strong>da</strong>s para a Africa. inter-tropical, verem singularmente avanp;i<strong>da</strong> a<br />
epocha provavel <strong>da</strong> sua menstruação.<br />
A physiologia humana, em to<strong>da</strong> a sua mysteriosa evolucão! conser-<br />
va-se sempre egual a si mesma, não distinguindo particularmente nem os<br />
jndividuos nem as raças. Se o fuiiccionamento intimo <strong>de</strong> todo o organismo
humano é tgo completamente egual para todos os homens, que importancia<br />
pb<strong>de</strong> ter a maior ou menor obtusi<strong>da</strong><strong>de</strong> d'um ou outro angulo anatomico, e<br />
a regular ou irregular proporção <strong>de</strong> certo caracter osteologico?<br />
Physicamente, não pd<strong>de</strong> a raça negra ser consi<strong>de</strong>ra<strong>da</strong> como inferior<br />
á raça branca; physiologicamente, acabamos <strong>de</strong> constatar uma absoluta<br />
i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> phenomenos, em todos os agrupamentos humanos.<br />
Resta.nos, pois, averiguar se, sob os pontos <strong>de</strong> ~ista intellectual e<br />
moral, a gente negra justifica egualniente a theae <strong>da</strong> equivalencia integral<br />
<strong>da</strong>s raças humanas que aqui temos <strong>de</strong>fendido.<br />
Comtudo, antes <strong>de</strong> encetar propriamente esse estudo, vamos citar<br />
alg~ins factos que veeni <strong>de</strong>struir qualquer duvi<strong>da</strong> que porventura po<strong>de</strong>sse<br />
aiiicla subsistir, acêrca <strong>da</strong> influencia terminante do meio tellurico e do contapio<br />
social sobre n propria estrnctura physica do corpo humano. É que elles<br />
sáo <strong>de</strong> natureza a convencer os mais <strong>de</strong>screntes <strong>da</strong> possibili<strong>da</strong><strong>de</strong> e reali<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
<strong>da</strong> transformação <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as particulari<strong>da</strong><strong>de</strong>s anatomicas, que o<br />
enthusiasmo classificador dos anthropologistas buscou tornar caracteristicas<br />
<strong>da</strong> raça negra. Segundo Bancroft a introducçáo dos escravos africanos na<br />
America do Norte, começou em 1672 e foi principalmente impulsiona<strong>da</strong><br />
pela Africaw Royal Society que tanto incremento <strong>de</strong>u ao odioso trafico <strong>da</strong><br />
escravatura. Em 1794 o numero dos negros americanos excedia 700.000 e,<br />
no momento <strong>da</strong> abolição <strong>da</strong> escravaturti, passava já <strong>de</strong> quatro milhúes.<br />
D'ahi por diante, apesar <strong>da</strong> suppressáo do trafico humano ter evitado<br />
novas entra<strong>da</strong>s, a população negra continuoii a multiplicar-se com tal<br />
rapi<strong>de</strong>z, que, <strong>de</strong> 1860 a 1900, passou <strong>de</strong> quatro milhúes e meio a qiiasi<br />
nove milhúes, isto é, duplicou o seu effectivo. E: preciso conhecer estes numeros<br />
e estas <strong>da</strong>tas, que nos niostram que a permanencia global <strong>da</strong> populayão<br />
negra nos Estados Unidos, não vae além <strong>de</strong> cento e trinta annoe.<br />
Por outro lado, é indispensavel lembrarmo-nos que, em vez d'uma<br />
origem ethnica commum, os escravos pertenciam indiutinctamente a todos<br />
os povos africanos. Recrutados ora no interior, ora no littoral, no norte,<br />
no centro e no sul do continente negro; na bacia do Zaire como na do<br />
Zambeze, e no golpho <strong>da</strong> Guiné como no interior Zanzibarita, os escra-<br />
vos qiie os negreiros <strong>de</strong> Portland, Boston e Kew Yark vendiam aos
Estados do Sul, eram representantes <strong>de</strong> rentenares <strong>de</strong> raças diversas,<br />
com linguagens e aspectos physicos diversissimos, e apresentando to<strong>da</strong> a<br />
gamma dos <strong>de</strong>svios aiiatomicds estu<strong>da</strong>dos. Um ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro museu viro <strong>de</strong><br />
anthropologia africana.<br />
Pois bem;' cento e trinta annoa <strong>de</strong> influencia physica local, e menos<br />
<strong>de</strong> cincoenta <strong>de</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong> e <strong>de</strong> instrucção, foram suficientes para produ-<br />
zir a amalgama quasi completa <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s essas varie<strong>da</strong><strong>de</strong>s anthropologicas,<br />
n'uma resultante geral que se assemelha estranhamente, e ca<strong>da</strong> vez mais,<br />
ao branco americano.<br />
Essa semelhanrti, tem sido muito explora<strong>da</strong> pelas romancistas norte-<br />
americanas, como effeito sensacional e passionante <strong>da</strong> urdidura <strong>da</strong>s suas<br />
novellas, on<strong>de</strong> apresentam os negros perfectio~zntetE a introduzir-se su-<br />
brepticiamente na ciocie<strong>da</strong><strong>de</strong> branca, como se fossem seus membros natos.<br />
O aclaramento <strong>da</strong> tez, a modificação do cabello, e a diminuição do progna-<br />
tismo alterando o perfil, accentiiam-se tanto em algiins typos crazados,<br />
que se torna muito difficil, senFio impossirel, differença-10s dos ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros<br />
brancos. O conliecido piiblicista e pe<strong>da</strong>gogo negro, Hooker Washington,<br />
<strong>de</strong>screve espirituosamente, a afflicta inctecisão dos empregados <strong>de</strong> caminho<br />
<strong>de</strong> ferro, na presença <strong>de</strong> individiios <strong>de</strong> aspecto marca<strong>da</strong>mente meridional,<br />
hesitando em lhes permittir a entra<strong>da</strong> nos compartimentos reservados aos<br />
brancos, e simiiltaneamcnte receiando relegh-10s ])ara o meio dos negros,<br />
o que, na hypothese do viajante ser branco e americano, representaria<br />
para este um insulto maximo, c envolveria certamente o pag:tmento d'nma<br />
forte in<strong>de</strong>mnis:\(;áo.<br />
Pearce Kintzing é <strong>de</strong> opiniao que, em muitissirnos mulatos authenti-<br />
cos, se tornou ahsolutamentc irnpossivcl reconhecer o menor indicio <strong>de</strong> san-<br />
gue negro. O gran<strong>de</strong> recurso ;~doptn(lo<br />
n'estes casos pelas novellistas ameri-<br />
canas, era o exame attento <strong>da</strong>s unhas que, segundo ellas, trnhem sempre a<br />
origem mestiça. Durante :I annos Pearce liintzing, segundo diz Jean Finot,<br />
submetteu succe~sivamente aos seus discipnlos, alguns centenares <strong>de</strong> doen-<br />
tes pretos, brancos nii mulatos, completamente cobertos, <strong>de</strong> fdrma n mos-<br />
trarem apenas tis unhas, e prociirou qiie os alnmnos se pronunciassem sobre<br />
a origem <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> doente, ;\penas bareiitdos no :tspecto ungiilar. Foram táe
NOÇbEs GERAES<br />
- - -<br />
frequentes os erros e tão manifestas as confusóes, que parece ter-se pro-<br />
vado que esse pretendido travo caracteristico, náo passa d'um mero producto<br />
<strong>de</strong> imaginação romantica. Verifica-se pois, que os negros, durante tanto<br />
tempo injustamente acctisados <strong>de</strong> constituirem uma especie inferior, qixtndo<br />
submettidos ao mesmo meio exterior e social que a raça branca, evolucio-<br />
nam physicamente no sentido <strong>de</strong> se aproximí~rem d'ella. É agora occasiáo<br />
<strong>de</strong> mostrarmos como essa evoliição se effectiva i<strong>de</strong>nticamente no campo<br />
mental e moral.<br />
Intellectuali<strong>da</strong><strong>de</strong> negra<br />
Em todos os tempos foi. attribuido aos negros um nivel mental infe-<br />
i lr :\o dos brttncos, e constitiiiu doutrina geralmente ;~cceite, ;t impossibi-<br />
Iitl
i ' 62 YOLITICA INDIGIENA -- --<br />
accrescimo do conforto geral, teem concorrido para uma modificação profun<strong>da</strong>,<br />
e civilisaçáo quasi perfeita dos natiiraes d'aquella admiravel colonia<br />
ingleza. Finalmente, os nltimos seríio os primeiros, vamos lançar um<br />
rapido golpe <strong>de</strong> vista sobre o nivel <strong>da</strong> mentali<strong>da</strong><strong>de</strong> hodierna dos negros <strong>da</strong><br />
livre America, t5.o proximos <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes d'esses pobres escravos, d'essa<br />
sordi<strong>da</strong> escoria dos poróes negreiros, que ha cincoenti~ itnnos apenas, ain<strong>da</strong><br />
labutava arduamente sob o latego dos capatazes, nas plantaçóes <strong>de</strong> assuctir,<br />
<strong>de</strong> algodão e <strong>de</strong> tabaco. Em 1899, em ca<strong>da</strong> niil pretos havia 8<br />
indigentes, e em cadi~ mil brr~ncos egnal proporçáo <strong>de</strong> mendigos. Por<br />
ca<strong>da</strong> 64 branco^, ricos, encontri~va-se um preto rico; em ca<strong>da</strong> cem<br />
proprietarios havia 25 negros e 75 brancos. Em ca<strong>da</strong> 100 casas negras, S7<br />
por cento eram livres <strong>de</strong> hypotheca; em ca<strong>da</strong> cem casas <strong>de</strong> brancos, essa<br />
percentagem <strong>de</strong>scia i1 71. O d o r <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> rustica dos negros representa<strong>da</strong><br />
por 130.OOO quintits, era iivitliado em cêrcit <strong>de</strong> 360.000 contos<br />
<strong>de</strong> reis; o diis suas egrqjas em 34 mil contos; o <strong>de</strong> 150.00!) predios urbanos,<br />
ou sitiiatlos f6ra tlíts q~iint:t~ ngricolas, em 31,5.000 contos; n proprie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
mobiliaria itvnlii~va-se em cêrcit <strong>de</strong> 144 mil contos e, finalmente, as<br />
quatro quintas partes do tr~halho nos Estacios do Snl eram prodiicto <strong>da</strong><br />
má0 d'obra negra. O commercio negro jti importantissimo, tinha fbrmado a<br />
Natiorznl Neyro Bwsiness Lecryrie, com millinres e milhares <strong>de</strong> membros. Estes<br />
niimcxros todos, que, sem commentarios saperfluos e ociosos, são <strong>de</strong> per si<br />
assaz significativos, revelitm a orgtnisaçáo economica já <strong>de</strong>senvolvidissima<br />
<strong>da</strong>s populaqóes negras ; e sabendo-se que o traço economico é o mais seguro<br />
indicador <strong>da</strong> perfeiçáo social, fica-se ahsolutamente attonito perante a rit-<br />
pi<strong>de</strong>z evolutiva com que os neto3 dos escravos, em (luas ainargiira<strong>da</strong>s<br />
geraçóes, assimilaram a quintessencin dt civilisação mo<strong>de</strong>rna. No campo<br />
scientifico, o progresso 6 tiimbem vertiginoso. As primeiras escolas, tolera-<br />
<strong>da</strong>s para ministritr o ensino a0.i negros, absolutamente prohibido, sob pena<br />
<strong>de</strong> castigo gravissimo, :~t6<br />
á guerra <strong>da</strong> Successáo, <strong>de</strong>vem ter sido as no-<br />
venta e cinco que, <strong>de</strong> 1563 a 1864, o general Banks conseguiu crear na<br />
Luisiania. Em 1861i o numero <strong>da</strong>s escolas para os negros, nos Estados do<br />
Sul, era já <strong>de</strong> 740, com mais <strong>de</strong> noventa mil alumnos. De então para cá,<br />
o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>da</strong> instrucção tem sido assombroso, e tanto mais para,
salientar, quanto é certo n6o terem faltado mil entraves, propagan<strong>da</strong> con-<br />
traria, opposiçáo tenaz, e at6 mesmo ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iras violencias contra o ensino<br />
indigena, por parte: do elemento branco d'aquelles Estados. Todos os meios<br />
serviam ; á socie<strong>da</strong><strong>de</strong> secreta Ku-Klux-Klan, <strong>de</strong> tão triste memoria, B im-<br />
puta<strong>da</strong> a responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong> dos inniimeros incendios <strong>de</strong> escolas negras, que<br />
t&o frequentes se chegaram a tornar em Winston, na Georgia e no Mis-<br />
sissipi. (')<br />
A repulsáo pelo elemento negro ain<strong>da</strong> crescia e se tornava ostensi-<br />
v:imente mais odienta, quando se referia aos indigenas instruidos. Apezar<br />
<strong>da</strong>s vergonhas, humilbaçóes, impedimentos, e difficiil<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a natu-<br />
reza c:rea<strong>da</strong>s á instrucção <strong>da</strong> raça indigena, iiem por isso os negros <strong>de</strong>ixa-<br />
ram <strong>de</strong> progredir incessantemente, e <strong>de</strong> elevar atd ao alto nivel actual, a<br />
iiientali<strong>da</strong><strong>de</strong> que lhes era propria.<br />
B mesma adversi<strong>da</strong><strong>de</strong>, essa forja sublime do caracter humano, lhes<br />
<strong>de</strong>u o animo e a coragem indispensaveis para arrostarem victoriosamente<br />
contra to<strong>da</strong>s as <strong>de</strong>sgraças e perseguiçóes, origina<strong>da</strong>s pelo ardor apaixo-<br />
nado e cego do preconceito <strong>de</strong> raça. Hoje, alem <strong>de</strong> muitos milhares <strong>de</strong> es-<br />
colas primarias e secun<strong>da</strong>rias, existem trinta e oito universi<strong>da</strong><strong>de</strong>s negras,<br />
entre as quaes Howard e Fisk se po<strong>de</strong>m absolutamente comparar ás uni-<br />
versi<strong>da</strong><strong>de</strong>s brancas mais adianta<strong>da</strong>s. O numero <strong>de</strong> diplomados, rnedicos, en-<br />
genheiros, juristas, predicantes etc., tem crescido enormemente, e como o<br />
preconceito <strong>de</strong> raça continua a exercer a sua nefasta influencia, f'echando-<br />
Ihes to<strong>da</strong>s as portas e ve<strong>da</strong>ndo-lhes innumeros cargos, a crise <strong>de</strong> <strong>de</strong>sanimo<br />
ia-se tornando geral. Felizmente Booker Washington, e outros pe<strong>da</strong>gogos<br />
e administradores, <strong>de</strong>ram mo<strong>de</strong>rnamente ao ensino, uma orientaçáo pratica<br />
que tem surtido o melhor resiiltado. Estáo n'esse caso as escolas geraes e<br />
profissionaes do legado Slater, e principalmente o grantle estabelecimento<br />
<strong>de</strong> instriicçáo profissional <strong>de</strong> Tuskegee, on<strong>de</strong> o ensino <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as indiis-<br />
trias está primorosamente organisado, sendo objecto <strong>de</strong> admiraçáo univer-<br />
(1) J. Finot - Le Pr2jugk <strong>de</strong>s Races ; Andrews - Laat Quartcr of Century in the<br />
ZrnitLd States; G. W. Williams - History of the Negro Race in America.
sal os resultados brilhantes que alli se teem conseguido. Jules Huret, o<br />
distincto jornalista l~arisiense, no seu livro <strong>de</strong> irnpressúes <strong>da</strong> America, não<br />
se cança <strong>de</strong> tecer elogios a esta escola mo<strong>de</strong>lar, consi<strong>de</strong>rando-a absoluta-<br />
mente sem rival em qualquer naçiio europeia. A população negra dos E%<br />
tados Unidos tem fornecido homens eminentes nas sciencias, nos estudos<br />
historicos e sociaes, na litteratnra e na administração publica. O mathe-<br />
matico Kelly Miller o philologo Bly<strong>de</strong>n, o historiador D11 Bois, o poeta<br />
Dunbar, e o gran<strong>de</strong> Booker Washington, são outras tantas provas evi<strong>de</strong>n-<br />
tes <strong>da</strong> firtcul<strong>da</strong><strong>de</strong> cre:tdor~ <strong>da</strong> mo<strong>de</strong>rna intellectiiali<strong>da</strong><strong>de</strong> negra. E to<strong>da</strong> esta<br />
po<strong>de</strong>rosa evolti
do bem e do mal, do justo e do injusto, são geraes no homem, seja qual for<br />
a cor <strong>da</strong> pelle ou o estado social. Se ha sentimentos como a honra, o pudor,<br />
etc., que variam com a latitii<strong>de</strong>, convem não esquecer, que elles náo<br />
sáo traço essencial do espirito humano mas simples alluviáo ethnico,<br />
amontoado pelos usos e costumes, e fixado pela tr:tdiçáo e pela hereditarie<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
Mesmo <strong>de</strong>ntro <strong>da</strong> mesma raça e atd <strong>da</strong> mesma naçáo, essas noções<br />
evoliicionam rapi<strong>da</strong>mente. Assim o guerreiro valeroso e fi<strong>da</strong>lgo, respeitado<br />
e temido, que se fazia sustentar, vestir e equipar pela <strong>da</strong>ma dos seus pensamentos,<br />
náo passaria na socie<strong>da</strong><strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rna d'um reles e abjecto soutewur.<br />
As senhoras mo<strong>de</strong>rnas que náo receiam arregaçar a, saia, ou vestir<br />
mo<strong>da</strong>s que revelam as linhas mais reconditas e as curvas mais provocantes<br />
e suggestivas do corpo feminino, <strong>de</strong> certo recuariam assustnil;is, ante a<br />
perspectiva do <strong>de</strong>cote total dos seios, tarito em voga entre as castellás<br />
medievaes, que morreriam <strong>de</strong> pe,jo se algum pagem ousado conseguisse entrever<br />
o laço dos borzeguins ou algum torneado começo <strong>de</strong> perna.<br />
Se as coisas se passam d'este modo com um iinico povo, como admirarmo-nos<br />
<strong>da</strong>s mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong><strong>de</strong>s diversissimas que a exterioris,zçáo d'estes sentimentos<br />
assume em to<strong>da</strong>s as populações do globo? O respeito pela vi<strong>da</strong><br />
humana, ou melhor, a falta d'esse respeito, é tambem commum a to<strong>da</strong>s as<br />
raças, e n'este caso não po<strong>de</strong> ct raça brancti, tii!vez a mais criminosa dos<br />
tempos historicos, arrogar-se nenhuma pretensa siiperiori<strong>da</strong><strong>de</strong>. O que é um<br />
ou outro acto <strong>de</strong> cannibalismo, ou <strong>de</strong> combate entre tribns, comparado com<br />
os assassinatos em massa, organisados pela raça brttnca nas gran<strong>de</strong>s guerrag<br />
internacionaes e civis, esses ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros m:itailoiiros hiimanos? De resto,<br />
em to<strong>da</strong> :t parte o assassinato i. punido, e se as leis l~arbaras po<strong>de</strong>m acci<strong>de</strong>ntnlmente<br />
ser mais elasticas do que as civilixa<strong>da</strong>s, convem 1embr:tr que,<br />
entre nds, quem mata o adversario n'nm diiello, 11Ho commette um <strong>de</strong>licto<br />
(pelo menos no consenso unanime), e quem n'uma batalha campal concorrer<br />
para uma pavorosa mortan<strong>da</strong><strong>de</strong> nas fileiras inimigas, P um heroe consagrado.<br />
Tem-se fallado e escripto muito sobre a immorali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> costumes<br />
e <strong>de</strong>vaseidko ignobil d'algumas populaçóes negras o11 amarellas, mas, em<br />
geral1 <strong>de</strong>ixam-se no esquecimento os fastos inolvi<strong>da</strong>veis <strong>da</strong> orgia latina ou<br />
<strong>da</strong> iinpndicicia grega. Não se sabe o que seja mais repugnante, se os <strong>de</strong>can-<br />
5
66 POLITICA INDIGENA<br />
tados <strong>de</strong>boches dos Areohis polynesios, <strong>de</strong>sciilpaveis na sua selvageria, se<br />
as scenas iminuiitlas dos rnbnrets <strong>da</strong> bnuliezce parisiense, e do homosexua-<br />
lismo do exerc,ito allemZo. NKo, sob o ponto <strong>de</strong> vista <strong>da</strong> morali<strong>da</strong><strong>de</strong>, nTio<br />
po(1~rn os britnco; que fizeram o trafico infame dn escravatura, e que, em<br />
regra, reclieiarn tle vicios as popiilaçúes indigenas com quem convivem,<br />
reclamar para si qiialquer ditt;:renciaçáo favoravel. Mesmo no ataque á<br />
qiic se diz ser t5o frequente em algumas raças mais selvagens,<br />
faltam abeoliitamentu os terinos <strong>de</strong> compsraçáo. Attribnia-se o vicio do<br />
roubo, como accentiiadissirnn, :i algumas popiilaçóes polynesicas, dizendo-se<br />
que os indigenas iam até ao ponto <strong>de</strong> rotibar os proprios pregos do costa-<br />
do dos navios. A este prvposito, pcrgiinta acerta<strong>da</strong>meiite Qiiat,refilges, o<br />
que siicce<strong>de</strong>ria se nos portos eiiropeus til0 civilisados, entrasse nos nossos<br />
dias iim navio d'oiiro crave,jado <strong>de</strong> pedras preciosas. . .<br />
Tiido é reliitivo. t' n'wcliiclles paizes <strong>de</strong>sprovidos <strong>de</strong> metaes, um sim-<br />
ples prego tinlin iiin valor incalciilavel, mcírmentc na epocha em que se<br />
ohserroii o facto apontado.<br />
Com a morali<strong>da</strong>tlc peciiliar ao seu atrazado estado social, os negros<br />
mais selvagens nso se nioitram pois sensivelmente inferiores aos europeus<br />
l~upercivilisados. R,esta saber se a rnca negra colloca<strong>da</strong> em circumstancias<br />
<strong>de</strong> meio ljliJ~~ico e intcllei:tiial, i<strong>de</strong>riticas As <strong>da</strong> raça branca, e tendo attingiclc)<br />
iim griiii aprcciavel tle civilisac50, accusa nas siias inclinações moracs,<br />
cc,mpitr;idit* As dos briincos, um progresyo ou tim retrocesso. Para<br />
is-;o, basta-nos olliar o exemplo que nos offcrecem os negros norte-americanos.<br />
Como rcsiiltwdo tla giierra <strong>de</strong> Suocessáo, os Estados Uniclos do Norte,<br />
<strong>de</strong>sqjosos <strong>de</strong> fazer sriitir iios ilo Si11 o peso <strong>da</strong> siia <strong>de</strong>rrota, conce<strong>de</strong>ram aos<br />
negros, <strong>de</strong> cllofrc (: tl'iiiii:~ sU vez! os direitos politicos mais illimitados. A<br />
gr;iii<strong>de</strong> mns3;i. (10s libitrtos, coiripleti~meiit~e<br />
illetrzd:~, <strong>de</strong>ixoii-se levar apenas<br />
pregiiiça e pela vaitia<strong>de</strong>. Como milito bem diz Finot,, serido a escra-<br />
vid&o para elles sinoiiymo tle trabalho, consi<strong>de</strong>raram a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> como in-<br />
coinpativel com cjiialrlucr occiip;içgo, e bem <strong>de</strong>pressa esquecêram a pouca<br />
moriil chriptk qiie Ilics Iiiiviiim ensinado na escrtlvidáo.<br />
(1 <strong>de</strong>sprezo (: as rcprth;:iliaa (10s brancos, ciosos <strong>da</strong>s prerogativas per-
di<strong>da</strong>s, acabaram por <strong>de</strong>sorienta-los completamente, augmentando bastante<br />
o numero dos criminosos.<br />
Hoje, porem, a situação 6 já muito diversa e melhora<strong>da</strong> sob varios as-<br />
pectos. A criminali<strong>da</strong><strong>de</strong> diminue <strong>de</strong> anno para anno muito sensivelmente, e<br />
a constituição <strong>da</strong> familia e moral domestica apresentam symptomas <strong>de</strong> pro-<br />
fun<strong>da</strong> melhoria. Se os negros não apreseptam ain<strong>da</strong> o nivel moral que se-<br />
ria para <strong>de</strong>sejar, e tudo faz siippor que esse i<strong>de</strong>al ser& brevemente attin-<br />
gido, aos brancos e aos seus inconcebiveis preconceitos e procedimento se<br />
<strong>de</strong>ve attribuir a culpa principal. Assim, a violação <strong>da</strong>s mulheres brancas,<br />
esse triste e frequente crime, não 6 sC a satisfação feroz d'um <strong>de</strong>sejo<br />
brutal, é principalmente uma represalia contra essa pratica selvagem e<br />
exasperante <strong>da</strong> lei <strong>de</strong> Lynch. Os brancos, que são muito pouco propensos<br />
a respeitar as mulheres <strong>de</strong> cor, <strong>de</strong>ixam-se completamente cegar pelo feroz<br />
orgulho <strong>de</strong> raça quando vêem as mulheres <strong>da</strong> sua raqa serem alvo d'esses<br />
attentados. E, francamente, é difficil <strong>de</strong>scriminar qual seja o crime mais<br />
repeilente: se o do negro commettendo um estupro, com a consciencia<br />
niti<strong>da</strong> <strong>da</strong> responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong> individual em que incorre ; se o <strong>da</strong> estupi<strong>da</strong> e<br />
ferocissima multidão dos brancos, que, conscia e segura <strong>da</strong> impuni<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />
esquarteja barbaramente o culpado na praça publica. As lynchagens teem<br />
concorrido tanto para o exacerbamento <strong>da</strong>s paix6es negras e para o au-<br />
gmento <strong>da</strong> criminali<strong>da</strong>dc, que actualmente os legisladores norte-americanos<br />
estão adoptando severas medi<strong>da</strong>s para as prevenir, evitar e punir. Demais,<br />
cotejando os registros criminaes dos Estados do Sul, reconhece-se que os<br />
negros ngo ultrapassam sensivelmente a media <strong>da</strong> criminali<strong>da</strong><strong>de</strong> dos bran-<br />
cos, sendo para notar que nem um só crime Q commettido pelos negros<br />
cultos e educados. O ensino profissional tem operado ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iras maravi-<br />
lhas n'estes ultimos annos, diminuindo consi<strong>de</strong>ravelmente os <strong>de</strong>lictos dos<br />
homens, e moralisando efficazmente as mulheres e as familias negras. (I)<br />
É preciso atten<strong>de</strong>r que o inicio <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> social dos negros remonta a<br />
uma epocha bem proxima <strong>da</strong> actual, e que, mesmo <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a sua libertação,<br />
em vez <strong>de</strong> pemios, exemplos, consellios e brandura por parte dos brancos,
68 POLITICA INDIGENA<br />
- - - - - --<br />
apenas teem recebido ultrages, violencias, <strong>de</strong>smandos e provocações. A<br />
raça negra tem, apezar <strong>de</strong> tiido, progredido admiravelmente e todos os in-<br />
dicios que hoje se observam n'ella, concorrem para fazer acreditar que<br />
a era <strong>da</strong> completa re<strong>de</strong>mpçáo moral se avizinha rapi<strong>da</strong>mente.<br />
Conclusões geraes<br />
Estamos assim chegados ao fim <strong>da</strong> longa exposição <strong>de</strong> factos com que<br />
<strong>de</strong>monstrar, e julgamos ter <strong>de</strong>monstrado claramente a com-<br />
pleta equivalencia <strong>da</strong>s raças humanas. Se a anatomia accusa qualquer<br />
tara prejudicial, vimos já bem <strong>de</strong>ti<strong>da</strong>mente, como o meio physico e n'alguns<br />
casos, a propria complicação <strong>da</strong> physiologia cerebral resultante <strong>da</strong> educa-<br />
ção, occasionam a modificação anthropologica porventura necessaria ao<br />
progresso <strong>da</strong> rapa. Se a mentali<strong>da</strong><strong>de</strong> e morali<strong>da</strong><strong>de</strong> dos indigenas a civili-<br />
sar forem inicialmente rudimentares, vimos tambem, como a evoluqão pro-<br />
gressiva se obtem infallivelmente pela melhoria (10 meio economico e pela<br />
acção do contagio social. Raças superiores e raças inferiores, não passam<br />
pois <strong>de</strong> termos occos e banalmente insignificativos <strong>da</strong> phraseologia orgu-<br />
lhosa d'esse ins~istentavel e odioso preconceito <strong>de</strong> raqa que, diga-se <strong>de</strong><br />
passagem, para honra dos colonisadores do Hrazil, nunca creoii raizes<br />
fun<strong>da</strong>s em terra portiigueza.<br />
Bccentiiiimos na primeira parte d'este capitiilo que aos indigenas<br />
coloniaes assistia o direito <strong>de</strong> serem civilisados. Depois, no intuito <strong>de</strong> es-<br />
tabelecer a reali<strong>da</strong><strong>de</strong> effectiva para a navão colonisadora do <strong>de</strong>ver corres-<br />
pon<strong>de</strong>nte, produzimos a longa argumentação que provou to<strong>da</strong>s as possibili-<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> civi1isac;áo <strong>da</strong> raça negra. Reconhecido agora esse <strong>de</strong>ver, é inutil<br />
encarecer a importancia maxima que, no estudo <strong>da</strong> colonisação, assumem<br />
to<strong>da</strong>s as questóes respeitantes ao tratamento dos indigenas. Iilas, como nas<br />
colonias não ha apenas o elemento indigena, e muitas vezes os cruzamen-<br />
tos dão origem n rima raça intermeditt mais ou menos numerosa, não po<strong>de</strong>-<br />
mos <strong>de</strong>ixar ficar no olvido esse táo importante factor sociologico <strong>da</strong>s socie-
<strong>da</strong><strong>de</strong>s coloniaes, a mestiçagem. Phenomeno t5o velho como a humani<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />
presidiu essencialmente á formaçáo <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as uni<strong>da</strong><strong>de</strong>s ethnicas actuaes.<br />
Não havendo instincto nenhum especial que impeça o cruzamento mutuo<br />
<strong>da</strong>s diversas varie<strong>da</strong><strong>de</strong>s humanas, e prestando-se, hoje como sempre, os or-<br />
gãos sexuaes a essa serie multipla <strong>de</strong> cruzamentos, pela i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong><br />
conformação anatomica, comprehen<strong>de</strong>-se bem n influencia capital que esse<br />
factor <strong>de</strong>ve ter exercido, na <strong>de</strong>limitação dos agrupamentos actuaes.<br />
Se não ha raças fun<strong>da</strong>mentalmente superiores o11 inferiores, ain<strong>da</strong><br />
menos ha raças puras e impuras. Todos os povos mo<strong>de</strong>rnos são resultado<br />
<strong>de</strong> milhares <strong>de</strong> mestiçagens successivas, e nas veias dos brancos europeus<br />
correm ain<strong>da</strong> gottas do sangue negro dos Euro-Africanos que, vindos <strong>da</strong><br />
Africa Septentrional, povoaram a Europa no comeyo do periodo quaterna-<br />
rio. Os cruzamentos humanos parecem influir po<strong>de</strong>rosamente na feciindi-<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong>, e os productos mestiços teem-se mantido geralmente fecundos e proli-<br />
feros. A mestiçagem tem uma influencia gran<strong>de</strong> na resolii$io do problema<br />
colonial, principalmente para aquellas colonias em que o europeu ciifficilmente<br />
se acclimate. Como teriamos nds conseguido imprimir um cunho tBo portu-<br />
guez aos vastissimos territorios brazileiros e á sua população e linguagem,<br />
se náo tivessemos táo habilmente sabido crear essa raqa mestiça interme-<br />
dia, que afinal representa uma parte tão importante <strong>da</strong> população? O que<br />
são as populaç6es do Mexico, Períl, Bolivia, Venezuela, etc., mais do que o<br />
producto dos cruzamentos entre hespanhoes e indios? Aos criizíimentos<br />
constantes com os indigenas, que a portuguezes e hespanhoes nunca repu-<br />
gnou manter, e que táo bem souberam <strong>de</strong>pois aproveitar, <strong>de</strong>vem estes dois<br />
povos colonisadores gran<strong>de</strong> parte <strong>da</strong> prosperi<strong>da</strong><strong>de</strong> e gran<strong>de</strong>za dos mo<strong>de</strong>r-<br />
nos emporioci <strong>da</strong> America latina, que lhes perpetuarão na historia futura<br />
o reflexo <strong>da</strong>s gloritts passa<strong>da</strong>s e o registo in<strong>de</strong>level <strong>da</strong>s suas brilhantes<br />
apticlóes colonisadoras. Com relação 5 politicn <strong>de</strong> tratamento a adoptar<br />
nas colonias, re1ativ:tmente aos mestiços, divi<strong>de</strong>m-se as opiniúes. Publicis-<br />
tas coloniaes tem havido, que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>ram n ciiiii eqiiiparaçáo aos indigenas ;<br />
outros sustentam, e essa tem sido pratica frequentemente segui<strong>da</strong>, que se<br />
lhes <strong>de</strong>ve reconhecer uma personali<strong>da</strong><strong>de</strong> juridica e uma situação politica,<br />
intermedias entre o indigena e o europeu. Finalmente, a doutrina mo<strong>de</strong>r-
namente mais preconis:~<strong>da</strong>, e com que abertamente concor<strong>da</strong>mos, exige<br />
para os mestiços um estado social e privilegios politicos em tudo i<strong>de</strong>nticos<br />
aos do elemento colonis~ [L d or.<br />
Para Portugal, o problema <strong>da</strong> mestiçagem nas suas colonias inter-tropicaes,<br />
não pt<strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> ser assignalado como tendo importancia e<br />
actuali<strong>da</strong><strong>de</strong> maximas, mormente se o systema colonial que adoptarmos fdr<br />
o <strong>de</strong> assimilação politica, talvez mais consentaneo com a indole geral <strong>da</strong><br />
colonisaç&o portugueza. Em todos os casos, porém, a mestiçagem 6 o mais<br />
po<strong>de</strong>roso factor <strong>de</strong> nacionalisação colonial. Equiparados juridicamente aos<br />
europeus e admittidos nos cargos administrativos, religiosos, politicos e<br />
militares, os mestigos terminam por adoptar exclusivamente os costumes e<br />
a lingua <strong>da</strong> naçáo dominadora, e constituem o mais proficuo e apropriado<br />
instrumento <strong>de</strong> vulgarisação d'esses caracteres ethnicos na socie<strong>da</strong><strong>de</strong> indi-<br />
gena que comprehen<strong>de</strong>m melhor que os europeus, e <strong>de</strong> quem estão mais<br />
proximos por afini<strong>da</strong><strong>de</strong> hereditaria. O mestiço, recebendo por herança<br />
paterna um intellecto já apto para a assimilação scientifica, representa<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> a primeira geração um elemento intellectual utilissimo para a admi-<br />
nistração colonial. Entre os negros americanos ha numerosissimos mulatos<br />
que não pouco concorreram, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a abolição <strong>da</strong> escravatura, para a prodi-<br />
giosa evolução social d'aquelle povo.<br />
Importa, to<strong>da</strong>via, lembrar que estes phenomenos <strong>de</strong> maxima rapi<strong>de</strong>z<br />
evolutiva, observados na vertiginosa civilisação dos negros americanos e<br />
Maoris neo-zelan<strong>de</strong>zes, s6 po<strong>de</strong>rão ter logar em colonias <strong>de</strong> povoamento,<br />
on<strong>de</strong> o exemplo do numerosissimo niicleo civilisado <strong>de</strong>ve exercer to<strong>da</strong> a<br />
sua influencia <strong>de</strong> contagio social, sobre a massa <strong>da</strong>s populaçóes indigenas.<br />
Nas colonias mixtas, e principalmente nas <strong>de</strong> exploração, todo o phenomeno<br />
social se <strong>de</strong>ve necessariamente <strong>de</strong>senrolar na sen<strong>da</strong> do progresso, com uma<br />
lentidáo tanto maior, quanto menor fôr o numero dos elementos brancos ou<br />
civilisados resi<strong>de</strong>ntes na colonial e quanto mais primitivo tiver sido o estado<br />
<strong>de</strong> barbarie inicial dos indigenas alli resi<strong>de</strong>ntes ou para alli transportados.<br />
N'esta hypothesrh a politica indigena, pru<strong>de</strong>nte e intelligentemente orienta<strong>da</strong>,<br />
pó<strong>de</strong> ter uma iiiil~iencia absolutamente <strong>de</strong>cisiva no futuro dos estabeleci-<br />
mentos coloniaeu.
Comtudo, e n'este caso mais do que nunca, B recommen<strong>da</strong>vel a con-<br />
servação dos usos e instituiyóes incligenae, ate ao momento em que a nossa<br />
socie<strong>da</strong><strong>de</strong> tenha adquirido um elevado grau <strong>de</strong> eivilisaçáo, que naturalmente<br />
venha a fazer prescrever esses usos <strong>de</strong>snetos e formas elementares e ar-<br />
chiticas <strong>de</strong> administração. Civilisado o indigena, as instituicóes barbaras,<br />
salvo uma outra inevitavel sobrerivencia, <strong>de</strong>sapparecerão por si proprias<br />
sem o minimo abalo ou convulsão social.<br />
Ao mesmo tempo que se <strong>de</strong>ve fazer luz a jorros nos cerehros in-<br />
digenas, procurando educa-los, instrui-los e civiiisa-10s quanto possivel,<br />
semeando as cololiias <strong>de</strong> missóes, e <strong>de</strong> escolas priniarias e profissionaes,<br />
não se poupando nenhum sacrificio pecuniario por mais oneroso que pa-<br />
reça, <strong>de</strong>ve-se por outro lado proce<strong>de</strong>r com a maxima mo<strong>de</strong>ração e prn<strong>de</strong>n-<br />
cia na fixapão <strong>da</strong> personali<strong>da</strong><strong>de</strong> juridica dos indigenas. l? preciso primeiro<br />
fazer OS ci<strong>da</strong>dãos e <strong>de</strong>pois outhorgar-lhes, com a plenitu<strong>de</strong> (10s seus<br />
direitos politicos, a sua ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira carta <strong>de</strong> alforria social. O processo<br />
inverso é bastante perigoso, e po<strong>de</strong> at8 ser contrnprodricente. A historia<br />
<strong>da</strong>s republicas negras <strong>de</strong> Liberia e do Haiti é exemplo mais frisante,<br />
que todos os argumentos theoricos que accumulassemos, para <strong>de</strong>monstrar<br />
as lastimosas consequencias d'esse erro politico. N'uma e n'outra se intentou<br />
estabelecer o fiinccionamento complicado, cheio <strong>de</strong> subtilezas e <strong>de</strong> attrictos,<br />
<strong>da</strong> machina constitucional representativa, com o numeroso e indispensavel<br />
funccionalismo civil e militar, e com to<strong>da</strong> a rnnltiplici<strong>da</strong><strong>de</strong> dos processos<br />
administrativos inherentes a essa forma governtitiva.<br />
Sem cui<strong>da</strong>r primeiramente <strong>de</strong> educar, instruir e civilisar, outhorga-<br />
ram d'um jacto todos os direitos civis e politicos, a queni momentos antes<br />
quebrara os grilhóes <strong>da</strong> escravidão e jazia ain<strong>da</strong> n'um profundo marasmo<br />
moral e atrazo intellectual. Os quatro po<strong>de</strong>res do Estado entregues a quem<br />
nem conhecia as quatro operaçóes.. . Os pobres negros ficaram cegos com<br />
o brilho repentino d'essa organisaçáo que os offuscava, sem que a compre-<br />
hen<strong>de</strong>ssem. Depois <strong>de</strong> tantos annos <strong>de</strong> infame trafico humano, os exageros<br />
reactivos do humanitarismo anti-esclavagista, mimoseiaram os que apenas<br />
acabavam <strong>de</strong> ser escravos com um ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro banquete <strong>de</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong>.. .<br />
Aqueliea estomagos barbaros, faltava porém ain<strong>da</strong> o fermento civilisador
72 POLITICA INDIGENA<br />
que lhes evitaria a farta indigestão <strong>de</strong> sagrados principias, que os <strong>de</strong>ixou<br />
tão pouco civilisados como anteriormente se encontravam.<br />
Se nos Estados Unidos o resultado foi inteiramente outro, 15 porque<br />
alli a população branca era numerosissima e exercia uma po<strong>de</strong>rosa acção<br />
<strong>de</strong> contagio social, sendo, além d'isso as circumstancias do meio physico<br />
absolutamente favoraveis á assimilação do fluxo civilisador, e á transfor-<br />
macão <strong>da</strong>s taras anatomicas nocivas.<br />
O <strong>de</strong>rramamento <strong>da</strong> civilisaç50 i! o mais elementar <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> quem<br />
colonisa, mas é preciso náo esquecer que, por muito prospera que seja uma<br />
colonia, por tonela<strong>da</strong>s d'ouro que a administração <strong>da</strong>s suas riquezas faça<br />
entrar nos cofrcs locaes ou nos rnttropolitanos. essa situação invejavel refe-<br />
rir-se-lia apenas a um <strong>de</strong>terminado momento historico. Nunca po<strong>de</strong>rá ser<br />
in<strong>de</strong>fini<strong>da</strong>mente duradoura, nas successivas e futuras phases historicas <strong>da</strong><br />
humani<strong>da</strong><strong>de</strong>, se o processo colonisador que enriqueceu a colonia, náo tiver<br />
sido acompanliado <strong>da</strong> politica indigena ten<strong>de</strong>nte
possivel equivalencia <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as uni<strong>da</strong><strong>de</strong>s ethnicas, dos<strong>de</strong> que ao processo<br />
evolutivo, anthropologico e social, presi<strong>da</strong>m favoraveis condições <strong>de</strong> meio<br />
physico e economico, e a acção benefica do influxo educativo e civilisador,<br />
torna-se evi<strong>de</strong>nte, para quem colonisa, a obrigação moral <strong>de</strong> empregar todos<br />
os meios attinentes á consecução d'esse i<strong>de</strong>al civilisador.<br />
O interesse economico que, para a metropole, provem d'essa civili-<br />
saçgo, cresce parallelainente á <strong>de</strong>sproporção dos numeros representativos<br />
<strong>da</strong>s populaçóes indigenas e colonisante, sendo maximo nas colonias em que<br />
o elemento colonisador é relativamente insignificante.<br />
N'este caso, o augmento <strong>da</strong> riqueza publica <strong>da</strong> colonia, e to<strong>da</strong>s as<br />
consequencias que d'ahi naturalmente resultam para o <strong>de</strong>senvolvimento do<br />
commercio, <strong>da</strong>s industrias <strong>da</strong> mãe patria, e, até mesmo, na hypothese do<br />
pacto colonial, para o augmento directo <strong>da</strong>s receitas financeiras <strong>da</strong> metro-<br />
pole, estão na <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ncia immediata <strong>da</strong> importancia <strong>da</strong> orgaiiisação eco-<br />
nomica <strong>da</strong>s massas indigenas.<br />
Pertencendo os estabelecimentos coloniaes portuguezes mais im-<br />
portantes á cathegoria <strong>de</strong> coloniau mixtas, parece-nos que será seinpre<br />
pouca a attençáo que nos nossos meios coloniaes, e no nosso centralisador<br />
Terreiro do Paço, se fôr prestando a to<strong>da</strong>s as quest6es que se pren<strong>de</strong>m<br />
com o tratamento dos indigenas. Quer o systema colonial ten<strong>da</strong> por incli-<br />
naçáo autonomista á formaçHo <strong>de</strong> ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iras patrias differentes, quer,<br />
pelo contrario, vise a a,ssimilação politica e a integraçá.0 <strong>de</strong>finitiva <strong>da</strong>s co-<br />
lonias no patrimonio nacional, nunca se <strong>de</strong>ve per<strong>de</strong>r <strong>de</strong> vista que, se o<br />
lado ecoiiomico <strong>da</strong> colonisação tem por mira essencial o obter novos compra-<br />
dores, o seu lado altruista e anico pretexto moral é transformar em ci<strong>da</strong>dãos<br />
civilisados, esses mesmos clientes que lhe veem recheiar o mealheiro. (I)<br />
( Em to<strong>da</strong> a longa argumeritação expendi<strong>da</strong> para <strong>de</strong>monstrar a equivalencia<br />
<strong>da</strong>s raças não está envolvido o iiiinimo intuito <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa <strong>da</strong> doutrina monogenista.<br />
É preciso não confundir a egual<strong>da</strong><strong>de</strong> possivel <strong>da</strong>s raças, com a uni<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
hypothetica <strong>da</strong> especie. O que, na medi<strong>da</strong> <strong>da</strong>s nossas forças, busc&mos trazer B evi-<br />
<strong>de</strong>ncia, foi apenas a completa equivalencia do valor intrinseco <strong>da</strong>s diversas uni<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
ethnicas, e resultante equiparação <strong>da</strong>s facul<strong>da</strong><strong>de</strong>s assimilativas do progresso civili-<br />
sador.
CAPITULO 11<br />
EDUCAÇAO MORAL E RELIGIOSA<br />
DOS INDIGENAS<br />
Morali<strong>da</strong><strong>de</strong> e caracter humano.<br />
Plieiiomenos educativos.<br />
Necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s missões.<br />
I'olitica religiosa e educativa nas colonias.<br />
Propagan<strong>da</strong> missionaria nas colonias portuguezas.<br />
Conclusões geraes.
CAPITULO I1<br />
Caracter humano<br />
. . . A sooiety iu iiot benefited bnt injnred<br />
by artifioially inoreasing intelligenoe witlioiit<br />
regard to oharaoter.,<br />
HERBERT SPENCER - Facts and Commetata.<br />
.A base <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a educação, individual ou collectiva, <strong>de</strong>ve residir no<br />
<strong>de</strong>senvolvimento parallelo <strong>da</strong>s differentes facul<strong>da</strong><strong>de</strong>s intellectuaes. Todo o<br />
<strong>de</strong>seqiiilibrio B prejudicial, como <strong>de</strong> sobra o <strong>de</strong>monstraram os processos<br />
educativos antigos, eni que o raciocinio era escravisado a uma ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira<br />
hypertrophia <strong>da</strong> memoria, ou como diariamente o estão mostrando as normas<br />
pe<strong>da</strong>gogicas geralmente adopta<strong>da</strong>s pelos povos latinos, as quaes,<br />
exagerando o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>da</strong> intelligencia em relaçSto <strong>de</strong>sproporciona<strong>da</strong><br />
ás restantes facul<strong>da</strong><strong>de</strong>s, n60 pouco teem concorrido para essa <strong>de</strong>soladora<br />
<strong>de</strong>generescencia <strong>da</strong> vonta<strong>de</strong> e do caracter que constitue actualmente<br />
o mais grave <strong>de</strong> todos os males sociologicos em algumas naçóes occi<strong>de</strong>ntaes.<br />
O caracter humano, que Kant <strong>de</strong>finiu, Numa maneira <strong>de</strong> ser consequente,<br />
e estabeleci<strong>da</strong> em maximas immutaveis~, tem por principal origem<br />
a cultura moral. N'elle ha a distinguir o temperatnento, parte physiologica<br />
commum a todos os animaes; e o natural, ten<strong>de</strong>ncia psychologica
78 POLITICA INDIGENA<br />
privativa do homem. O femnperamento evoluciona segundo a lei <strong>de</strong> subordi-<br />
nação ao meio physico, em harmonia com as circumstancias circzcmfusa,<br />
ilzgesta etc., e ten<strong>de</strong> a fixar rapi<strong>da</strong>mente a respectiva mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong><strong>de</strong> por in-<br />
fluencia hereditaria. O naturnl, na sua quali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> elemento psychico,<br />
siibtrahe-se mais facilmente á influencia mesologica, e constitue a ver<strong>da</strong>-<br />
<strong>de</strong>ira argilla, em que a ediicaç#o moral esculpe e mol<strong>da</strong> o caracter humano.<br />
O ensino scientifico, bem ministrado e assimilado, comquanto seja <strong>de</strong> capi-<br />
tal importancia para erguer o nivel <strong>da</strong> mentali<strong>da</strong><strong>de</strong> individual e collectiva,<br />
não pó<strong>de</strong> <strong>de</strong> fórma alguma formar, <strong>de</strong> per si, uma ediicaçáo completa. Se<br />
n'um individuo isolado, o resultado nocivo ain<strong>da</strong> po<strong>de</strong>ria eventualmente<br />
n5o ser muito sensivel, collectivamente o prejuizo será sempre gran<strong>de</strong>.<br />
O caracter humano B a base <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a activi<strong>da</strong><strong>de</strong> externa, e se elle<br />
fallece nas cellulas sociaes, o superorganismo entra immediatamente na<br />
regressão lanientavel do <strong>de</strong>pauperamento e <strong>da</strong> <strong>de</strong>generescencia.<br />
O scepticismo moral e intcllectnal, o dilettantismo critico, o horror<br />
pelo esfor(*o e o abatencionismo <strong>de</strong> exteriorisaçóes activas, em gran<strong>de</strong> parte<br />
friictos d'iima educaç#o falseia<strong>da</strong>, dão hoje as variaçóes mais frequentes no<br />
kaleidoscopio social cla civilisaçíio europeia. Casos pathologicos meramente<br />
individnaes, fazem reverter os seus effeitos. c com maior virulencia, na<br />
psychologia <strong>da</strong>s collectivi<strong>da</strong><strong>de</strong>s, eml~otando o patriotismo, quebrando a<br />
energia nacional, relaxando a organisaçgo <strong>da</strong> familia, e inutilisando to<strong>da</strong>s<br />
as forças vivas <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> que adoentam.<br />
A superiori<strong>da</strong><strong>de</strong> liistorica d'iim povo 011 d'uma raça, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> bem<br />
mais <strong>da</strong> energia e morali<strong>da</strong><strong>de</strong> dos caracteres, do que <strong>da</strong>s facul<strong>da</strong><strong>de</strong>s intel-<br />
lectuaes dos individuos que a compôem. No seu livro .Les UniversitQs<br />
Nouvelles D , diz Izoiilet o seguinte: A energia espiritiial origina a energia<br />
material. . . Ver<strong>da</strong><strong>de</strong> e virtu<strong>de</strong> sao força. Erro e vicio são fraqueza. Para<br />
nos fortificarmos Q necessario purificarmo-nos. Os <strong>de</strong>stinos dos povos cum-<br />
prem-se invisivchlmente; e a sorte <strong>da</strong>s batalhas B apenas uma constatação<br />
<strong>da</strong>s <strong>de</strong>rrotas. . . Antigamente as raças do sul <strong>da</strong> Europa subiam. . . Hoje<br />
parecem <strong>de</strong>scer. Porque razão? L)iqamo-10 ousa<strong>da</strong>mente: as raças do sul<br />
per<strong>de</strong>ram terreno exterior e materialmente, porque se <strong>de</strong>ixaram distanciar<br />
sob o ponto <strong>de</strong> vista interior e espiritual .
Ora a energia espiritual, essencia pura do csracter humano, não<br />
se obtem com a instrucçáo scientifica, mas com a sedimentação <strong>de</strong> princi-<br />
pios <strong>de</strong> resistencia moral que só se adquirem pela educação <strong>da</strong> vonta<strong>de</strong>.<br />
Por isso, to<strong>da</strong> a mo<strong>de</strong>rna pe<strong>da</strong>gogia orienta os seus esforços <strong>de</strong> ensino e<br />
<strong>de</strong> propagan<strong>da</strong>, no sentido <strong>de</strong> obter uma educação que concorra, ao mes-<br />
mo tempo, para o <strong>de</strong>senvolvimento perfeito do organismo physico, e para a<br />
cultura equilibra<strong>da</strong> <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as facul<strong>da</strong><strong>de</strong>s. Sd alcançado esse <strong>de</strong>si<strong>de</strong>ratiim,<br />
a cultura moral po<strong>de</strong>rá usnfriiir <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a efficiencia <strong>de</strong> que Q susceptivel,<br />
na ino<strong>de</strong>1ac;uo ediicativa do caracter humano.<br />
Phenomenos educativos<br />
Desmoalins <strong>de</strong>monstrou bem claramente a primordiali<strong>da</strong><strong>de</strong> dos fa-<br />
ctores educativos lia genese d'essa supposta superiori<strong>da</strong><strong>de</strong> britannica. (')<br />
Sendo a udiicaçáo, pelo aperfeiçoamento do individuo e <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong>, um<br />
dos factores sociologicos <strong>de</strong> mais pori<strong>de</strong>ração, B logico imaginar, que a essa<br />
superior forma educativa que lhes moldou o caracter, <strong>de</strong>vem em gran<strong>de</strong><br />
parte os inglezes, o exito grandioso <strong>da</strong> sua obra colonial.<br />
, Os phenomenos educativos, como diz Duproix, (') sendo principalmente<br />
um8 questáo <strong>de</strong> auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>, isto é, <strong>de</strong> influencia pessoal e <strong>de</strong> subordinação<br />
moral, pertencerão tambem inevitavelmente á mesma indole t feiç&o <strong>da</strong> au-<br />
ctori<strong>da</strong><strong>de</strong> exercidà. h educaçáo é sempre a photographia do educador.<br />
Esta ver<strong>da</strong><strong>de</strong> quasi axiomatica, leva-nos a presuppôr as vantagens<br />
que adviriam para a obra <strong>da</strong> politica indigena nas coionias <strong>de</strong> Portugttl, se<br />
os educadores cui<strong>da</strong>ssem intelligentemente <strong>da</strong> propria educaçáo prévia, tão<br />
abandona<strong>da</strong> na nossa rnetropole.<br />
) E. Desmoulins - A puoi tirnt ln supérioritLZ <strong>de</strong>8 Anglo-Sacona.<br />
(e) Diiprois - K ~zt b'ichte et le Pvohlkme <strong>de</strong> 1'Ediication.
80 POLITICA INDIG~A<br />
A <strong>de</strong>ficiencia <strong>da</strong> instrucção geral, & pessima orientação do ensino<br />
superior e á falta <strong>de</strong> sequencia na educaçáo moral, <strong>de</strong>ve a actual socie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
portugueza, innegavelmente enfraqueci<strong>da</strong>, algumas <strong>da</strong>s mais profun<strong>da</strong>s taras<br />
<strong>de</strong>generescentes que a afligem. Não transportemos, pois, para as colonias<br />
o que <strong>de</strong> errado e <strong>de</strong>ficiente temos entre nós, e organisemos alli o ensino<br />
no mais rigoroso accordo com as praticas scientificas <strong>da</strong> mo<strong>de</strong>rna pe<strong>da</strong>go-<br />
gia. Será isso, por certo, muito mais facil do que a modificação, fatalmente<br />
lenta, do ensino e <strong>da</strong> educaçáo metropolitana. Nas socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s velhas, qual-<br />
quer evolução <strong>de</strong> organismo social ou administrativo é sempre muito<br />
<strong>de</strong>mora<strong>da</strong>. Des<strong>de</strong> que to<strong>da</strong> a evoluçáo é simultaneamente progressiva e<br />
regressiva, é claro que a complexi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s existencias anteriores ao pro-<br />
cesso evolutivo, concorrerá para que a regressão se effectue vagarosa-<br />
mente, e sempre abandonando uma oii outra sobrevivencia.<br />
Nas socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s novas o phenomeno é muito mais simples, os organis-<br />
mos existentes são fracos, e a evoluçáo realisa-se promptamente.<br />
Nas socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s indigenas <strong>da</strong>s colonias portuguezas <strong>de</strong> Africa, a orga-<br />
nisaçáo do ensino e a educaçáo <strong>da</strong> morali<strong>da</strong><strong>de</strong>, sáo tanto mais faceis <strong>de</strong> es-<br />
tabelecer, quanto, pela quasi completa ausencia <strong>de</strong> importantes nucleos<br />
mahometanos, (') as escolas e missões não sáo <strong>de</strong>stina<strong>da</strong>s a contrapor-se ás<br />
<strong>de</strong> outro culto antagonico, mas, pelo contrario, encontram-se quasi sós em<br />
campo limpo <strong>de</strong> adversarios. Se os problemas <strong>da</strong> politica portugueza se<br />
pren<strong>de</strong>m tão indissoluvelmente á reorganisaçáo do ensino e á ediicaçáo<br />
moral do povo, que somos quasi levados a suppor que a crise nacional nem<br />
é politica nem economica, mas unicamente educativa, tambem a solução do<br />
nosso problema colonial está na <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ncia completa d'estas qiiestóes <strong>de</strong><br />
instrucç80 intellectual e <strong>de</strong> educação moral, que tão abandona<strong>da</strong>s teem sido<br />
pelos nossos admiiiistradores.<br />
(I) Com excepção <strong>da</strong> Gilirii. e do norte <strong>de</strong> .Iloc.iiiiiliique on<strong>de</strong> a ~~i'ol)agan<strong>da</strong><br />
do Islam tem creado riiimei'osos prosél!-tos. Sobre politica islamica no Kyassa 6<br />
muito interessante o i *,latorio do Sr. Yrncsto <strong>de</strong> Vilhena, antigo govei.nàdor d'acliielle<br />
territorio.<br />
--
82 POLITICA JNDIGENA<br />
- *<br />
Ora sobre a espessura d'esse envolucro influem essencialmente a fixa-<br />
çáo <strong>da</strong>s taras lieretiitarias <strong>de</strong> geraçóes successivas, e a acçgo directa<br />
<strong>da</strong> influencia educativa.<br />
Sohrt! a proporcionalidtx<strong>de</strong> dos effeitos d'estas duas causas distinctas,<br />
divergem bastante as escolas pliilosophicas, e os psychologos mo<strong>de</strong>rnos.<br />
Locke, aposto10 <strong>da</strong> escola sensiialista, affirma que em ca<strong>da</strong> cem<br />
homens, ha mais <strong>de</strong> rioventa que se tornaram bons oii maus, iiteis ou nocivos<br />
á socie<strong>da</strong><strong>de</strong>, unicamente pela educação que receberam. Helvetins, exagerando<br />
ain<strong>da</strong> esta opiniiio, sustenta que todos os homens nascem eguaes,<br />
com aptid~es eguaes, sendo as diflerenças sempre <strong>de</strong>vi<strong>da</strong>s 6 educaçáo.<br />
Coritrapondo-se a estas i<strong>de</strong>ias, encontra-se no extremo opposto a doutrina<br />
egnalmente exagera<strong>da</strong> do <strong>de</strong>terminisiiio hereditario, negando to<strong>da</strong> a efficacia<br />
á ediictigáo dos individuos náo predispostos por uma lon81 hereditarie<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
A esperiencia, porém, encarrega-se <strong>de</strong> fornecer diariamente os mais<br />
formaes <strong>de</strong>smentidos a estas arroja<strong>da</strong>s hypotheses. Ribot, o eminente<br />
escriptor e psychologo, no seu livro a: L'Heredité Psychologique w , escreve<br />
a este respeito o seguinte: c A educação nunca 15 absoluta, e só exerce uma<br />
acção total~nent~e efficaz nas naturezas medias. Snpponhamo~ que os diversos<br />
graus <strong>de</strong> intelligencia humana estHo escallonados <strong>de</strong> maneira a formar<br />
uma serie linear ciijos dois extremos serão o idiotismo e o genio. Y I A nossa<br />
opiniiio a influencia ediicativa nos dois extremos <strong>da</strong> serie é minima. Sobre<br />
o idiota náo exerce rlii:i,si infliiencia algiima : esforqos inauditos, prodigios<br />
<strong>de</strong> paciencia e <strong>de</strong> habili<strong>da</strong><strong>de</strong> só logram em regra resultados insignificantes<br />
oii ephemeros. Mas á medi<strong>da</strong> que nos encaminhamos para as grít<strong>da</strong>ções<br />
inferiores, essa intlitei-icia augmenta attingintlo o seu maximo n'aquellas natnrezas<br />
medias qiie nNo ven(lo nem boas nem más, veem cliiasi sempre a<br />
ser O qiie o acaso as faz.. Esta ci cliie é a ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira e sR doutrina. O idiotismo<br />
e o genio sgo porém (:asos pathologicos ciija rari<strong>da</strong><strong>de</strong> os faz necessariamente<br />
por (te p:irt,e nas theorias educativns. Qilnnto ás naturezas medias,<br />
e a essa classe, pert,ence a quasi totali<strong>da</strong><strong>de</strong> (Ias populaçóes indigeiias <strong>da</strong>s<br />
colonias, a inf iieiicia, d ;~ educitqHo, como meio <strong>de</strong> fortalecimento psychico é<br />
inteiramente <strong>de</strong>cisiva.
Sob os pontos <strong>de</strong> vista pliysiologico e anthropologico, já mais d'uma<br />
vez citamos os trabalhos scientificos <strong>de</strong> Wagner e tantos outros, que <strong>de</strong>-<br />
monstrarani a efficacia <strong>da</strong>. acçzo educativa, como meio <strong>de</strong> aperfeiçoamento<br />
physico, iiGo sO <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> humana, o que seria logico admittir como ef-<br />
feito cie cstratificapão hcreditaria, mas tambem directamente do individuo,<br />
c~ijit capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> craneana e peso encephttlico augmentam com a acqiii~ição<br />
<strong>de</strong> novos c~onhecimentos scientificos, <strong>de</strong> novos <strong>de</strong>veres moraes e <strong>da</strong> conse-<br />
quente complicaçáo <strong>da</strong> physiologia cerebral e <strong>da</strong> dynamica nervosa.<br />
Necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s rnissbes. <strong>Politica</strong> religiosa e educativa nas colonias<br />
Salienta<strong>da</strong>, assim, convenientemente, a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> ao mesmo tempo<br />
instrnir e moralisar as populaçúes indigenas, a fim <strong>de</strong> obter nucleos sociaes<br />
civilisados, energicos, economicamente importantes e apresentando todos os<br />
caracteres etlinicos <strong>da</strong> nação colonisadora, que tiver sido facil communicar-<br />
Ihes insensivelmente, sem coacção nem violencia, resta-nos averiguar quaes<br />
os meios educativos <strong>de</strong> que as naçóes coloniaes se <strong>de</strong>vem servir para obter<br />
esse resultado.<br />
Os que se referem B, instrucção propriamente dita, scientifica e profissional,<br />
serão tratados em capitulo especial. Por agora, referir-nos-hemos<br />
mais <strong>de</strong> espaço á questão <strong>da</strong>s missões religiosas, a qiie já alludimos na<br />
primeira parte d'este trabalho, e que não pó<strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> ser examina<strong>da</strong><br />
com to<strong>da</strong> a attenç80, pela importancia que assume na resolução do problema<br />
<strong>da</strong> educação moral dos indigenas, a que são innegavelmente indispensaveis.<br />
Com effeito, nas socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s indigenas mais atraza<strong>da</strong>s, e sd para essas<br />
<strong>de</strong>fen<strong>de</strong>mos a sua necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>, as missúes religiosas teem <strong>de</strong> preencher a<br />
lacuna importante <strong>da</strong> educação familiar.<br />
Nas nossas colonias africanas, on<strong>de</strong> a familia indigena 6, em<br />
regra, rudimentar conio organisaçxo e como morali<strong>da</strong>dc, essa necessi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
*
torna-se impreterivel. E preciso até, n'estes casos, a çoexistencia <strong>de</strong> missóes<br />
<strong>de</strong> ambos os sexos, para mais rapi<strong>da</strong>mente se po<strong>de</strong>r levar a effeito a<br />
meritoria tarefa <strong>da</strong> rnoralisaçáo <strong>da</strong> familia indigena.<br />
Não basta formar o caracter <strong>da</strong>s creanças, é nccessario, tambem,<br />
moralisar a mulher, preparando mZes que possam e saibam insuflar aos<br />
filhos os primeiros rndirnentos <strong>da</strong> lei moral. O alvo do n~issionarism~ <strong>de</strong>ve<br />
pois, ser qiiintupl~ : politica dos interesses nacionaes, proselytismo religioso,<br />
moralisaçáo <strong>da</strong> familia, educaçgo dos caracteres, e ensino primario e profissional<br />
dos individuos <strong>de</strong> ambos os sexos.<br />
Quanto á religiGo apostola<strong>da</strong>, teem-se escripto <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> livros, geralmente<br />
apaixonatios, uns favoraveis ás missóes catholicas, e outros As<br />
protestantes. O mais natural parece ser, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que haja religião do Estado,<br />
que este protqja <strong>de</strong> preferencia as missóes do seu c~ilto, como factores<br />
mais po<strong>de</strong>rosos <strong>de</strong> nacionalisaçáo. No enitanto, a nosso ver, ambas po<strong>de</strong>m<br />
fazer obra iitil e proficua perante o seli inimigo commum o Islam, cuja influencia<br />
<strong>de</strong> ntrazo anti-civilisador carece <strong>de</strong> ser <strong>de</strong>strui<strong>da</strong>, por eminentemente<br />
nociva para os interesses futuros <strong>da</strong> colonia, e principalmente para<br />
o fLitiiro do dominio politico <strong>da</strong> naqHo colonisaclora.<br />
N'aqnellas colonias em que a socie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena attingir um certo<br />
grali <strong>de</strong> civilisaçHo, e em que as institiiiçóes religiosas forem espiritualis-<br />
tas e, <strong>de</strong> longa <strong>da</strong>ta, profun<strong>da</strong>mente enraiza<strong>da</strong>s na alma nacional, as mis-<br />
sóes religiosas tornam-se politicamente inuteis.<br />
Se é sempre louvavel qiialqiier tentativa que no campo persrxasivo se<br />
empregue para evange1isac;áo dos indigenas, <strong>de</strong>veni n'este caso per<strong>de</strong>r<br />
todo o caracter official, limitando-se o Estado colonisador a conce<strong>de</strong>r-lhes<br />
a protecc;áo indiutinctamente dispensa<strong>da</strong> ;i todos os seus nacionaes.<br />
N7esta hypothese, a responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> educaçáo, <strong>de</strong>ve recahir in-<br />
tegralmente sobrc! as escolas leigas que náo ferem as susceptibili<strong>da</strong><strong>de</strong>s re-<br />
ligiosas dos indigcnas, e que já recebem alumnos com um começo <strong>de</strong> educaç6.o<br />
moral, resultantes (13 superior constitaiçíio <strong>da</strong> fiamilia.<br />
Sempre, portanto, que as instituiqóes religiosas <strong>da</strong> colonia pertence-<br />
rem a alguma <strong>da</strong>s gran<strong>de</strong>s religi6es humanas, e constitiiirem, por assim di-<br />
zer, uma <strong>da</strong>s caracteristicas <strong>da</strong> nacionali<strong>da</strong><strong>de</strong> indigeila, a unica ~olitiea
eligiosa aconselhavel, <strong>de</strong>ve ser o reconhecimento sincero d'uma crenpa, e<br />
o maior acatamento pelo respectivo cuito.<br />
Para dominar náo é evi<strong>de</strong>ntemente neoesario impôr urna <strong>de</strong>terrnina<strong>da</strong><br />
rcligiiio. Pelo contrario, a Inglaterra na India e a Rossia no Turquestzo,<br />
basei~irri a siia infliiencia politica no niais abuoluto respeito pelas<br />
instituiçóes religiosas dos indisenas. Isto, porém, não quer dizer, que para<br />
se firmar e assegnrãr intlefiiii<strong>da</strong>mente esse doininio, a propagan<strong>da</strong> religiosa<br />
n8o represente rim efficacissirno processo <strong>de</strong> nacionalis~2~io. Ain<strong>da</strong> hoje al-<br />
g111is (10s mais experimentadoa fiinccionarios do irnperio indo-britannico,<br />
apontam ao seli governo a utili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> adoptar certas norrniw qiie caracterisnrnm<br />
o assombroso apostolado <strong>de</strong> S. Fritiiriac~o Savii~r.<br />
O respeito pelo eutabelecido e a bencvola tolerancia que <strong>de</strong>vcm ser<br />
a bussola orientadora <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a politica indigena, aconselliam qiie o esforço<br />
<strong>de</strong> propagan<strong>da</strong> religiosa, n'est,a especie <strong>de</strong> colonias. seja abandonado<br />
á iniciativa particular ou congregacionista, sem interveii@.o protectora do<br />
Estado colonisador, pelo menos ostensivamente.<br />
Outro tanto não acontece nos estabelecimentos coloniaes, cu,jos indigenas<br />
apresentam um atrazado <strong>de</strong>senvolvimento social e uma rudimentar<br />
religifío.<br />
N'esta hypothese, as missóes religiosas niio sti sBo uteis, mas até<br />
mesmo indispensaveis. Sendo estas colonias geralmente situa<strong>da</strong>s no continente<br />
africano, on<strong>de</strong> a influencia musulmana, esse irreductivel inimigo <strong>da</strong><br />
civilisaçáo eiiropeia, ten<strong>de</strong> a alastrar como urna gota <strong>de</strong> azeite sobre<br />
uma siiperficie aquosa, to<strong>da</strong> a propagan<strong>da</strong> christá que preveja ou reme<strong>de</strong>ie<br />
esse mal, tem <strong>de</strong> ser acceite <strong>de</strong> braços abertos pelas navóes colonisadoras.<br />
Simplesmentel o que convém accentuar por Lima fórma bem clara, é<br />
qiie, se é indiflerente que essas missóes scjiim catholicas oii protestantes, é<br />
imprescindivel que tenham um caracter profun<strong>da</strong>mente vincado<br />
pela ethnica nacional, e se componliam, sempre que seja possivel, <strong>de</strong><br />
rnissionarios nacionaes ou civilmente na cio na lisa do^. Se quizermos <strong>da</strong>r aos<br />
indigenas Lima educação nticionalisadora, 6 indispensavel que para isso<br />
dispLlnhamos tfe miss6es nacionaes na mais caompleta significação <strong>da</strong> pa-<br />
lavra.
86 POLITICA INDIGEXA<br />
P - - -<br />
Não tem sido esta, infelizmente, a pratica adopta<strong>da</strong> nas nossas colonias,<br />
cheias <strong>de</strong> missionarios estrangeiros, ain<strong>da</strong> mesmo nas proprias missões<br />
nacionaes. E a bem dizer, a menos <strong>de</strong> interromper temporariamente to<strong>da</strong><br />
a Propagan<strong>da</strong> missionaria, teremos <strong>de</strong> continuar recorrendo ao estrangeiro,<br />
emc~uanto se não reorganisar sériamente, em liarmonia com as necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
existentes, o Collegio <strong>da</strong>s Missúes Ultramariiia~, que actiialmente está muito<br />
longe <strong>de</strong> satisfazer ao fim a que se propúe. Se 6 preciso crear missóes,<br />
muitas mais missóes tão iridispeiisaveis á civilisaçáo dos indigenas; se 6<br />
absolutamente necessario conce(1t.r-lhes dotayves que Ilies perrnittam vi<strong>da</strong><br />
<strong>de</strong>safoga<strong>da</strong>, torna-se tamliem egiialmente imprescindivel que o elemento<br />
missionario se eleve em quali<strong>da</strong><strong>de</strong>, organisando-se racionalmerite o ensino<br />
em Sernache (10 Honi Jardim e creando-se ar1,jancta a ca<strong>da</strong> prelazia colonial<br />
uma escola-<strong>de</strong>posito <strong>de</strong> padres, on<strong>de</strong> estes entrem B cliega<strong>da</strong> á colonia<br />
a fim <strong>de</strong> apren<strong>de</strong>r a lingua indigena, e os niethodos pacientes e tolerantes<br />
<strong>de</strong> evangelisação, táo nteis na christianisação dos negros. Egualmente lhes<br />
<strong>de</strong>via alli ser ensiiia<strong>da</strong> a ethnologia <strong>da</strong> popiilação <strong>da</strong> locali<strong>da</strong><strong>de</strong> para on<strong>de</strong><br />
fossem niissionar. Esta preparação local seria sempre exigi<strong>da</strong>, fosse qual<br />
fosse a proveniencia do sscerdote, a sua virtu<strong>de</strong> religiosa, e os conhecimentos<br />
scientificos uii profissionaes que <strong>de</strong>monstrasse ter.<br />
O que actualmente existe, nas nossas coloniíts, preciso é dizê-lo no<br />
interesse <strong>de</strong> to(lo~, salvo Iionrosas excepçóes, B pouco e muito <strong>de</strong>ficiente<br />
como meio educatiro e civilisador. Alguma coisa se tem feito, B certo,<br />
n'estes ultimos annos, e a missão <strong>de</strong> Boroma em Tete, (Missóes do Espirito<br />
Santo), qiie tivemos varios ensejos <strong>de</strong> visitar, e cujo ensino profissional indigena<br />
tem <strong>da</strong>do bons resultados, 6 um exemplo bem flagrante do que<br />
po<strong>de</strong> a vonta<strong>de</strong> humana quando guia<strong>da</strong> por um i<strong>de</strong>al nobre, mesmo quando<br />
lhe escasseiem to<strong>da</strong>s as facili<strong>da</strong><strong>de</strong>s. To<strong>da</strong>via é immenso o qiie ha ain<strong>da</strong><br />
a fazer nas nossas colonias, sob o ponto <strong>de</strong> vista <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong> missioaaria.<br />
Temos <strong>de</strong> educar com o maximo cui<strong>da</strong>do os nossos missionarios, multiplicar<br />
as missóes, dota-las com todos os instrumentos e meios <strong>de</strong> po<strong>de</strong>rem<br />
ministrar convenientemente o ensino primsrio, o ensino <strong>da</strong> lingua portugueza<br />
e o ensino profissional, táo util para inculcar os habitos <strong>de</strong> trabalho,<br />
tão difficeis <strong>de</strong> radicar na <strong>de</strong>spreoccupa<strong>da</strong> indolencia dos negros. B par
d'isto, <strong>de</strong>ve tambem o Estado subvencioiiar a* suas rnisa~~s,<br />
<strong>de</strong> forn1a a<br />
permittir-lhes vencer por competencia quaesqiier missóes estrangeiras do<br />
mesmo ou <strong>de</strong> diverso culto que existam estabeleci<strong>da</strong>s no territorio <strong>da</strong> Co-<br />
lonia. Como existe na nossa Africa a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> propagan<strong>da</strong> religiosa,<br />
teremos <strong>de</strong> proteger exclusivamente as missóes nacionaes, para evitar essa<br />
causa importante <strong>de</strong> <strong>de</strong>snacionalisaçáo indigcna. Acerca <strong>da</strong> utili<strong>da</strong><strong>de</strong> do<br />
ensino missionario, e <strong>da</strong> forma especial que <strong>de</strong>ve revestir para se tornar<br />
mais facilmente assimilavcl e proveitoso, vamos transcrever segui<strong>da</strong>mente<br />
as opinióes auctorisadtis <strong>de</strong> alguns homens illiistres qiie se occuparam<br />
d'este assumpto, e que, como veremos, são todos concortles, <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> <strong>de</strong>ter-<br />
mina<strong>da</strong>s restricçóes, em Ilie attribuir gran<strong>de</strong> importancia como meio civili-<br />
sador do indigena. E certo que os mais po<strong>de</strong>rosos regeneradores sociaes<br />
sgo o trabalho e o cornmercio ; mas corno alcançar que o negro trabalhe e<br />
como crear-lhe necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s economicas, senáo cui<strong>da</strong>ndo antes <strong>de</strong> mais<br />
na<strong>da</strong> <strong>de</strong> o educar e moralisar?<br />
William R2ad escreveu que a os negros não nos merecem o nome <strong>de</strong><br />
irmãos, mas antes ou <strong>de</strong>veremos consi<strong>de</strong>rar como filhos menores. Eduque-<br />
mo-los cui<strong>da</strong>dosamente e com o tempo se elevarão .. Andra<strong>de</strong> Corvo nos<br />
a Estudos sobre as Yrovincias Ultramarinas B , disse o seguinte : c.. . E pordm<br />
preciso não ter illusóes. São os africanos evi<strong>de</strong>ntemente capazes <strong>de</strong> melho-<br />
rar as suas condiçóes physica e moral, pela acção lenta e segura <strong>da</strong> civi-<br />
lisaçáo. O seu futuro não nos parece duvidoso. Mas hoje o grau incompleto<br />
<strong>de</strong> evoluyão em que se acham, as suas disposiçóes para a emo~ão,<br />
a <strong>de</strong>bi-<br />
li<strong>da</strong><strong>de</strong> infantil <strong>da</strong>s suas facul<strong>da</strong><strong>de</strong>s mentaes faciimente os arrastam ao vicio<br />
e á <strong>de</strong>pravação ...................................................<br />
. . . . . . . . . . . . Não se julgue <strong>de</strong> quanto fica dito, que <strong>de</strong>sconhecemos a im-<br />
portancia <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong> religiosa na Africs. Julgamos, ao contrario, que<br />
a benefica influencia <strong>da</strong> moral christã <strong>de</strong>ve exercer a mais pura e a mais<br />
civilisadora acção no espirito d'aquelles povos, que u que<strong>da</strong> <strong>da</strong> idolatria e<br />
o <strong>de</strong>sapparecimento do fanatismo e <strong>da</strong>s suas praticas barbaras, ferozes<br />
muitas vezes, necessariamente hão <strong>de</strong> prece<strong>de</strong>r a completa transformação<br />
social dos negros. O que, porhm, não julgamos possivel B qiie no cerebro,<br />
por assim dizer incompleto do africano, possam sem preparação, sem um
88 POLITICA INDIGENA<br />
--<br />
longo e previ~ trabalho <strong>de</strong> educação moral e physics, entrar outras/<br />
i<strong>de</strong>ias, para receber as qiiacs o selvagem náo est6 preparado, e que necesi<br />
sariamerit,~ rcpugnani 6 siia indole brutal ». Moiisinlio d'illbuquerque, no<br />
seu livro Mocambique n , escreve o segiiint,e : « Quanto a mim o que melhor<br />
temos a fazer para ediicar e civilisar o indigena é <strong>de</strong>senvolver-lhe prati-'<br />
camente as siias aptidões <strong>de</strong> traballio maniittl e aproveita-lo para a exploraçáo<br />
<strong>da</strong> Provincia. I? pelo trabalho manual, pelos habitos <strong>de</strong> activi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
regulamenta<strong>da</strong> qiie elle traz como conseqiicncia, pelas necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s que<br />
cria em contacto com os branco.^, que o intiigena ha.<strong>de</strong> ir passando por<br />
uma evolii(;áo leilta, do estado sclvagem para uma civilisação rudimentar,<br />
iinica tle que, por agora, aqiiella raça ine parece susceptivel. E, cob este<br />
ponto <strong>de</strong> vista, na<strong>da</strong> pcícte prestar serviços egiiacs á organisayáo dos Prazos<br />
applica<strong>da</strong> a gran<strong>de</strong> parte rla Provincia, as inissúes catholicas, quando entregues<br />
a or<strong>de</strong>ns regulares e, para o sexo feminino, aos estabelecimentos<br />
<strong>de</strong> ensino e ediicciyáo dirigidos por religiosas <strong>da</strong>s or<strong>de</strong>ns institui<strong>da</strong>s com<br />
esse fim ».<br />
No seu liicido relatorio sobre a prclazia <strong>de</strong> Mo(;ambique, publicado<br />
em 18\15 no Boletim <strong>da</strong> Soí:ictla<strong>de</strong> <strong>de</strong> (+eograpliia, o Ex.mo Sr. L). Antonio<br />
Barroso refere-sc niiiiiici».jamcnte a este :issiimpto. D'elle transcrevemos<br />
os seguintes periodos.<br />
Hoje é o(:ioso tlisciitir a conveniencia <strong>da</strong>s missóes entre povos selvagens;<br />
uma larga experiencia veio coiifirmar o que aliás a rasâo ensinava.<br />
O Estado aufeiie d'ellas os maiores lieneficios, t,ornando-as, já instrumentos<br />
<strong>da</strong> civilisação qne tem 01)rigac;Ro tle promover entre os povos sujeitos ao<br />
seli doniinio, j& clocuinent~os <strong>de</strong> occupac;iio efectiva qiie o direito internacional<br />
exige, QOmO a iinicit legitima para a affirmaçgo <strong>de</strong> soberania; bem<br />
oii mal os direitos historicos c as gran<strong>de</strong>s linhas traça<strong>da</strong>s na costa d'hfrica<br />
com tanto esforyo, foram postas <strong>de</strong> parte. Mas, para qiie essas missóes<br />
existam e possam produzir os beneficias que d'ellas temos direito <strong>de</strong> exigir,<br />
6 preciso, 6 indisl ,tisave1 que o Estado as auxilie d'uin modo efficaz, ain<strong>da</strong><br />
que o mais econoiii ic:amente possivel .................................<br />
....................... l'ortiigal, em theoria, approva e applau<strong>de</strong> as<br />
vantagens <strong>da</strong> instriicçáo, e provavelmente tambern enten<strong>de</strong> que o missiona-
io será o melhor e talvez, ao menos por emquanto, o unico professor que<br />
possa instrnir os povos <strong>da</strong> nossa Africa; na pratica, pordm, tem <strong>de</strong>scurado<br />
muito este assiimpto, e qiilindo o nHo tem <strong>de</strong>scurado, tem-lhe imprimido<br />
uma direcçáo que, no meu enten<strong>de</strong>r, náo é a mais proficiia nem a que me-<br />
lhores resultados possa <strong>da</strong>r.. ....................................<br />
....................... l? muito fàcil affirmar (111~ o preto rebel<strong>de</strong> á<br />
inr.triicçáo e rio trat~itlho; é iim c~tribilho banal qiic # força cle repetido<br />
parc3csr: iirn axioma c tl: uma falsidntlc., rrias é iirn pouco mais dificil crear-<br />
lhe c~scolns que justifiquem rncrccer tal nome, e inutit~iiç6es <strong>de</strong> ensino<br />
a<strong>de</strong>clua(l;is ao sei1 (leserivolvirnento e iiiodo <strong>de</strong> ser actual. Emqiianto a experic~iiciii<br />
se náo fizer, eu, pela minha parte, continuarei a acreditar que o<br />
preto é iriiiito siisceptivel <strong>de</strong> apren<strong>de</strong>r e trabalhar! comtaiito qiic lhe fàcilltem<br />
meios efficazes e que se nHo queira exigir d'elle o que se exige d'uma<br />
raça adianta<strong>da</strong> e culta. ... .» O distincto colonial, conselheiro Jaynie Porjaz<br />
<strong>de</strong> Serpa Pimentel, no seu livro (( Um Snno no Congo . , dcfen<strong>de</strong>ndo a<br />
necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> ampliar e tornar mais malleavel o r~gimen educativo <strong>da</strong>s<br />
missóe.~, escreve o seguinte : a. .. D'esta fiirmii, as iiuss;is missiies teriam<br />
itm caracter nienos excliisiva (: inflrxirclmentc religioso, c niai~ praticamente<br />
civilisador; em vez rlch ~c exercer rima acçRo poiioo intensa sobre<br />
meia d~izi:~ <strong>de</strong> indivitliiod, c.xt.rccr-$o-liia, o qric B preferi\.c.l, lima ac~ão<br />
extensa sobre as multidóes, scmc?iando asuim campos <strong>de</strong> maior prodriccáo,<br />
comquanto <strong>de</strong> inferior quali<strong>da</strong><strong>de</strong>, crn vez dc apenas grzos tlc 1)oiii trigo,<br />
a<strong>de</strong>lgaçando as ignorancias tla selvageria, abran<strong>da</strong>ndo as feroci<strong>da</strong><strong>de</strong>s e<br />
attenuando as <strong>de</strong>pravaqúes, em vez cle se querer <strong>de</strong>s<strong>de</strong> logo, o que é impossivel,<br />
obter christítos convictos, almas converti<strong>da</strong>s.. Finalmentc, para<br />
encerrar com chave <strong>de</strong> ouro estas cit,:ivóes, táo utcis # c1emonstrac;áo <strong>da</strong><br />
neccssitla<strong>de</strong> <strong>da</strong>s missóes religiosas nas colonias <strong>de</strong> popiilaç6es fetichistas,<br />
vamos transcrever alguns primorosos ~eriodo* <strong>de</strong>vidos ti penna inconfundivel<br />
<strong>de</strong> Antonio Ennes.<br />
«Mas porqiie se cliffun<strong>de</strong> assim o mahometanismo, emquanto a propagan<strong>da</strong><br />
christã só avança a passos tardos e incertos? Sem dovi<strong>da</strong> porque<br />
é mais a<strong>da</strong>ptado á organisaqiio psychica e yhysiologica <strong>da</strong>s raças negras,<br />
mas tambem porque os meios d'acçáo e os processos educativos empregados
90 POLITICA INDIGENA<br />
pelos agentes do christianismo nunca foram, nem agora são, os rnais pra-<br />
ticos e efficazes. Parece-me que esses agentes teem incorrido sempre, na<br />
sancçáo penal com que um a<strong>da</strong>gio <strong>da</strong> sabedoria popular ameaça os que<br />
tudo querem.<br />
Querem quasi abruptamente converter um selvagem n'urn santo,<br />
uma féra n'iim martyr. Imaginam qiie basta a educaçao para obliterar<br />
caracteres <strong>de</strong> rava e neutralisar influxos climatericos e <strong>de</strong> meio social;<br />
que um preto <strong>de</strong>s<strong>de</strong> *que o s~ijeitam a <strong>de</strong>termina<strong>da</strong>s laboraçóes, fica sendo<br />
egual a iim branco, com a mesmn capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> do que elle para comprehen-<br />
<strong>de</strong>r metaphysicas religiusas, e domar-se a clisciplinas virtuosas. Ntio dispen-<br />
sam nenhuma perfeiváo ao bronco neophyto. Ha-<strong>de</strong> saber to<strong>da</strong> a doutrina<br />
que os padres e os concilios <strong>de</strong>finiram, para satisfazer o espirito <strong>de</strong> exame<br />
dos povos philosophantes, e praticar to<strong>da</strong> a moral que a Egreja oppóe ás<br />
corriipçfies do rriiindo civilisado. Para lhe fazerem acceitar aquella dou-<br />
trina, atacam pr-rconceitos entranhados como se fossem i<strong>de</strong>ias innatas ; para<br />
prevenirem revoltas contra os preceitos d'esta moral, negam satisfaçóes legitimas<br />
a instinctos naturaes.. .....................................<br />
.......................... A empreza misericordiosa <strong>de</strong> salvar almas<br />
para Deus tem <strong>de</strong> se conciliar com a <strong>de</strong> educar corpos para o trabalho;<br />
o ensino religioso precisa <strong>de</strong> abster-se <strong>de</strong> semeiar doutrinas, embora ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iras,<br />
que eni espiritos ru<strong>de</strong>s e maus possam produzir revoltas contra<br />
as leis sociaes : :i propagan<strong>da</strong> christg, em summa, (leve restringir se aopossitvl<br />
em relaçã:, '~s ciipaci<strong>da</strong><strong>de</strong>s e hcnl<strong>da</strong><strong>de</strong>s dos catrrhisandos, e não per<strong>de</strong>r<br />
<strong>de</strong> vista o 11i!. cwmo o enten<strong>de</strong>m os legitimos interesses humanos.<br />
Se alguem <strong>de</strong>h~zir d'estas doutrinas que as missóes religiosas em<br />
Africa são inuteis e atd ~nrigosas,<br />
serei eu o primeiro a repellir a <strong>de</strong>du-<br />
cçáo. Q~iero-as,<br />
julgo-as indispwaveis. Ae soberanias eiiropeias teem <strong>de</strong>ve-<br />
res tutelares para com os povos selvagens que lhes obe<strong>de</strong>cem, o primeiro<br />
d'esses <strong>de</strong>veres Q educa-los, e as religiõrs possuem uma acção educativa e<br />
disciplinar que nenhuma sciencia e nenhuns p~ocessos<br />
pe<strong>da</strong>gogicos po<strong>de</strong>m<br />
egualar. Não- se melhoram e nem sequer se governam massas humanas<br />
sem i<strong>de</strong>ias moraes, e o Estado, que na propria metro~ole<br />
incumbiu á Egreja<br />
a representação activa d'essas i<strong>de</strong>ias, náo lh'a po<strong>de</strong> tirar nas colonias para
a entregar aos seus sol<strong>da</strong>dos e ás suas auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s, personificaçóes <strong>da</strong><br />
força e <strong>da</strong> lei, que vencem c impõem sem convencer, aos seus jiiizes que<br />
castigam o mal sem incitarem ao bem, ou aos seus professores que ensi-<br />
nam a lettra sem o eapiritu. Quando, poréiii, fosse possirel substituir os<br />
padres por moralistas oii por mestre-escolas leigos, per<strong>de</strong>r-se-hiam na sub-<br />
stituiçáo os esl)cc:iaes mcios dlac~:ão scibre o:: indigenas, <strong>de</strong> que sci dispúe<br />
quem lhes fala ern nome <strong>de</strong> po<strong>de</strong>res sobrenat,uraes. Se os negros são impenetraveis<br />
a subtilezas tlieologicas, basta serem supersticioso^ e credulos<br />
para se tornarem facilmente accessiveis á doutrinação religiosa que se accoiiio(l(.<br />
;is suas facul<strong>da</strong><strong>de</strong>s e saiba aproveitar-lhes as proprias i<strong>de</strong>ias grosseir:ts<br />
1)anl lhes miniat,rar noções dè ver<strong>da</strong><strong>de</strong>. . . »<br />
Xunca ningiiem, com tanto transluzimeiito <strong>de</strong> ver<strong>da</strong><strong>de</strong> e alevanta-<br />
mento <strong>de</strong> palavra. se referiii com mais precisáo oii coin melhor conheci-<br />
mento <strong>de</strong> causa, do que Antonio Ennes o fez, ao ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro papel <strong>da</strong>s<br />
missóes religiosas em Africa, e á nornialisaçfio <strong>da</strong> sua maneira <strong>de</strong> proce<strong>de</strong>r<br />
mais fertil em resiiltados proficiios, e mais consentanea com os vitaes inte-<br />
resses tla colonia e do elemento nativo.<br />
,4 necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s missóes religiosas, que apontamos para aquel-<br />
Ias colonias em que a familia indigena se encontra quasi no inicio <strong>da</strong> es-<br />
cala sociologica, náo po<strong>de</strong>ndo utilmente concorrer para a rnoralisa@o ge-<br />
ral, e carecendo ella propria <strong>da</strong> acçáo directa do infliixo moralisatlor, fica<br />
sobe,jaainente comprova<strong>da</strong> pelas abalisa<strong>da</strong>s opinióes que acabamos <strong>de</strong> trans-<br />
crever.<br />
O principal fim colonisador <strong>da</strong>s missóes é a moralisação do indigena,<br />
e a sua preparaçlto para o trabalho por intermedio do ensino profissional.<br />
Entretanto, a doutrinação religiosa, alem do avigoramento psychologico<br />
que necessariamente provoca ria factura e <strong>de</strong>terminação do caracter do<br />
neophs-to, é uma excellente medi<strong>da</strong> preventiva contra o alastramento <strong>da</strong><br />
lei koranica que, como um ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro escalracho, miiltiplica constante-<br />
mente as suas raizes tenazes na area immensa do continente africano e<br />
mórmente nas regiúes equatoriaes.<br />
Os numerosos tentaculos do gran<strong>de</strong> polvo mahometano ameaçam<br />
pen<strong>de</strong>r n'um abraço indissoluvel a gran<strong>de</strong> maioria <strong>da</strong>s populações africa-
92 POLITICA IXDIGENA<br />
- -. - , - -<br />
nas. NO nortc <strong>da</strong> nossa provincia <strong>de</strong> iVloça,mbique, embora d'uma fórma atteniia<strong>da</strong>,<br />
e corn to<strong>da</strong> a pu,jança na GuinB, a intensa propagan<strong>da</strong> do credo<br />
mnsiilmano, tem prodiizitlo effeitos <strong>de</strong> todo o ponto <strong>de</strong>sastrosos. Nas colonias<br />
estrangeiras as conqiiistas dos sectarios ife Mahomet S ~ i<strong>de</strong>nticas. O No<br />
Soltlao, por exemplo, o snussismo, que 8, fórmx mais int,ratavel do &natismo<br />
mns~ilmano, t.em alcançado, entre os indigerias fetic!liistas, tima ala <strong>de</strong><br />
prose1,vtos muito niiri1cros:i. (. rapi<strong>da</strong>inerite crescente.<br />
O principal dos pcti.ijic)x islamicos, que se avoliima sensivelmente nas<br />
fórmas inferiores <strong>da</strong> doutrina mahometaiia, em regra professa<strong>da</strong>s pelas populaçfies<br />
iiidigcnas <strong>de</strong> baixa i:iiltiira iiitellcct,ii~l, 6, scm duvi<strong>da</strong>, o irreconlieciinent,~<br />
<strong>de</strong> quaesquttr fronteiras l)olitic;is, (liit: ini1)lica naturalmente a<br />
insiibori1inac;fío do espirito indigenii aos po<strong>de</strong>res e~t~abelecidos na colonia.<br />
E urna diffic~iltlxtlc grave p:ir;t ;i effeçtivagáo <strong>da</strong> obra colonisadora a<br />
precxistencia d'essas inst,itiii\:Ges religiosas, e é uma necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> imperat,iva<br />
evitar que ellas alli se estabele\;am, qiiando n%o tenham antecedido o<br />
emprehendimento colonial. Para obviar a este e outros inconvenientes similares,<br />
aconsellia, Ileroy Hcaulieii ks niissóes francezas, que modifiquem<br />
quanto antes os seus itineritrios, dirigiiltlo-se ile preft3rencia aos pontoa <strong>de</strong><br />
Africa on<strong>de</strong> se torna necessario coiiverter numerosas populaçóes fetichistas,<br />
a fim <strong>de</strong> evitar que venliaiii a ser prs~as i10 proselytismo islamico.<br />
O mesmo pub1ii:ista Iamerita, com raziio e com jiistic;a, que na mo<strong>de</strong>rna<br />
colonisação africana to<strong>da</strong>s as na(:óes coloniaes tivessem <strong>de</strong>monstrado ta0<br />
imperdoavel indiffereriqit. pela christl;.tnisac;áo dos indigenas, a que, portuguezes<br />
e hespanhoes <strong>de</strong>veram itlg~in$ tlos mais brilhantes resultados <strong>da</strong><br />
sua colonisaçáo americana.<br />
Quando as popiilaqfies indigenas, a par <strong>de</strong> um pronunciado sectarismo<br />
religioso, gozarri tl'iima organiaaçiio econoinica e social que as eleva,<br />
sensivelmente a iim graii <strong>de</strong> civilisaçio approximado do europeu, como<br />
acontece para Po-t iigal na India e em Nacaii, e para a Franc;~, por exemplo,<br />
na Argelia, Tunisi;i, Indo-Cliina, Annam, etc., torna-se qiiasi impossivel OU<br />
improfici~a a propagan<strong>da</strong> christá, e a politica indigena <strong>de</strong>ve procurar principalmente<br />
fun<strong>da</strong>r-se no estreitamento associativo dos interesses economicos<br />
e politicos, encarregando as escolas leigas <strong>de</strong> lhe <strong>de</strong>sbravar o terreno pelo
ensino <strong>da</strong> lingiia colonisadora e pela instriiccão geral e scientifica. Nas colonias,<br />
porém, em que essas circumstancias se náo realisam, a politica religiosa<br />
e educativa <strong>de</strong>ve ser lima <strong>da</strong>s principaes preoccupa~.óes <strong>da</strong> adminis-<br />
tração local, e para ella <strong>de</strong>vem ser orçamenta<strong>da</strong>s verbas que permittam a<br />
mais completa e latitudinaria expansko <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong> moral e reli,' mlosa<br />
no seio <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena, a fim <strong>de</strong> illuminar mais rapi<strong>da</strong> e proficua-<br />
mente, e com mais intensa e duradoura clari<strong>da</strong><strong>de</strong>, as trevas nefastas <strong>da</strong><br />
ignorancia negra.<br />
Propagan<strong>da</strong> missionaria nas colonias portuguezas<br />
A este respeito, a politica indigena (?) <strong>de</strong> Portugal, on<strong>de</strong> por certo<br />
se reconliece niti<strong>da</strong>mente a utili<strong>da</strong><strong>de</strong> d'esta fdrma educativa para as po-<br />
piilayc?es indigenas mais atraza<strong>da</strong>s, tem sido caracteri*atl;t pela mais abso-<br />
luta inconseqnencia. TAançando um rapido olhar sobre ;i organiuação actual<br />
<strong>da</strong> nossa propagan<strong>da</strong> religiosa nas colonias, e comparaiido os <strong>da</strong>dos orça-<br />
mentaes que se lhe referem, chega-se a resiiltados tao inesperados como<br />
lamenta\.eis.<br />
Consi<strong>de</strong>remos rnais especialmente RS colonias ilp Angola, Moqambique,<br />
Giiiní. e l'imor, por >(.rem as iinicas para que julg~mos,<br />
náo só indispensavel,<br />
mas a1t;iinente aconselhavel Lima perfeita organisaçáo missionaria. Na India<br />
e em Macaii, além <strong>de</strong> haver numerosos christfios, a maior perfeiçso social<br />
dos indigenas liindnistas, musiilmanos, budhistas ou confucionistas, e a te-<br />
naci<strong>da</strong><strong>de</strong> com que se apegam ás respectivas crenças e fórmas lithurgicas,<br />
fazem aconselhar uma politica religiosa <strong>de</strong> absoluta tolerancia e respeito<br />
pelos cultos estabelecidos.<br />
Em Cabo Ver<strong>de</strong>, a wgani.iac;áo ecclesiastica não comporta missões<br />
propriamente ditas, e as verhas orqamenta<strong>da</strong>s (1!107-1908) para <strong>de</strong>spezas<br />
do aulto, montam s 14:934$166 reis.<br />
O serviço parochial exerce-se por intermedio <strong>de</strong> trinta freguezias, re-
94 POLITICA INUIGENS<br />
parti<strong>da</strong>s pelas differentes illias do archipelago, satisfazendo as necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
do culto. A cliristia~~isaçilo 110 indigena p6<strong>de</strong> dizer-se geral, e esta colonia,<br />
pela indole actiial ds yua evoluçáo, pó<strong>de</strong> reputar-se percorrendo au <strong>de</strong>rra<strong>de</strong>iras<br />
jorna<strong>da</strong>s evolutivas que a separam tla completa assimilnç&o politica.<br />
Ve,jamos como se passam aq coisas na rica, vxstissima e populosa<br />
Angola. No tlistricto <strong>de</strong> Tloilntlti, ;c tlespeza com 8 missionarios e uma dotação<br />
& missa0 <strong>de</strong> Libollo tr tle G:!j41$666 reis; no districto <strong>de</strong> Bengiiella, com<br />
as missóes í1c Cacondii, Bihé, Railundo, Lsssaca, Cassingo c Catoco,<br />
16:500$000 rcis; no districto [\o Cong.~, com as missúcs <strong>de</strong> Santo Antonio do<br />
Zaire, Luniiaiiyo. S. Salvador 110 Congo, S. JosQ <strong>de</strong> Belern na Madimba,<br />
lian<strong>da</strong>na, Cal~iii(l;i, I~ritile c Liicale, a <strong>de</strong>speza entre pessoal e dotaçóes 6<br />
tle 14:200$!,)') reis: no districto <strong>da</strong> Liin<strong>da</strong>, com as inissóes <strong>de</strong> Mditnge e<br />
Xiissiico, a d~-.~,ez,r c'. cle 10:700$000 reis; finalmente, no districto <strong>da</strong> Huilla,<br />
com as missúes <strong>de</strong> Huilla, Jau. Tyvinguin7 Kibita, Gambos, Typolongo e<br />
Cuanhama, i) tlespezii sobe a 24:000$000 reis. Para a provincia prefaz-se a<br />
totali<strong>da</strong><strong>de</strong> d<br />
1<br />
72::311$16B rcid, cxclosivsmentc clestina<strong>da</strong>, ao rnissionarismo.<br />
Em M çambiqiic, no tlistrict,~ <strong>de</strong> L»ureiiço llarqnes e Gaza, existem<br />
as missóes e Santo Antonio <strong>de</strong> hlacasaenc corn as filiiies tle S. Roque cle<br />
Matutoine, SantlAnn;t cle S;~I:~manga e S. JosLI <strong>de</strong> l~'Hsnguene, e3t:tçào<br />
missionaria dr Ite.ssaiio (irirria, e tnissúeu <strong>de</strong> Gaza e c10 Chai-Chai, dis-<br />
pondo em conjuncto tla verba cle 24:130$000 reis; no districto <strong>de</strong> Inhambane<br />
lia duas iniss~es, S. ,losé tlo lfongue e Inharrime, dota<strong>da</strong>s com<br />
7:100$000 reis; no tlistrict,o tlc: (Jiirlimane temos a missáo dos Santos Anjos<br />
<strong>de</strong> Coalanc c nina tlespczi~ total cle 7:732$000 reis; no districto <strong>de</strong><br />
Tete lia as missózs dfs I),,r~,rn;i c Ziimbo com a dotaçilo globitl tle 4:030$003<br />
reis; no districto (li? Jtoc;itril)i~~iie encontritrn.se apvnas as missúes do Lurio,<br />
anxiliiitl:ts (-oiii iirnít vc:rba tle 3:100$00!) rcbis.<br />
PHTIL :2 tdl~~';i~íit moral c religiosa dos intligenas do sexo feminino<br />
existem crn totla a I~.i,vincia apenas os seguintes estabelecimentos especiaeu:<br />
Tnstit,uto 1). .'i iielitt, em Lourenço Jlarques, on<strong>de</strong> o ensino e Catechese<br />
estso ;i cargo (1,. s~~t,e irmiis tle S. .JosB <strong>de</strong> Cliiriy, e que dispóe no<br />
orçamento <strong>da</strong> vt.rha <strong>da</strong> :I:s(iO$000 rcis ; orplianato <strong>de</strong> Santa Joanna, em Qaelimane,<br />
servido por tlt i- irnius hos~)itnleiras <strong>da</strong> mesma or<strong>de</strong>m religiosa, e<br />
- -
dotado com 1:600$000 reis; missão <strong>de</strong> Boroma, on<strong>de</strong> seis irmãs se <strong>de</strong>dicam<br />
ao ensino moral e religioso, com 1:800$000 reis.<br />
Finalmente, existe ain<strong>da</strong> orçamenta<strong>da</strong> uma verba <strong>de</strong> 3:000$000 reis<br />
<strong>de</strong>stina<strong>da</strong> a missóes, e cuja administraçáo incumbe á prelazia. Addicionando<br />
as diversas dotavóes conclue-se que a <strong>de</strong>speza total feita na provinoia <strong>de</strong><br />
Moçamhicpe com a educação moral e relipiolia é <strong>de</strong> 56:323$000 reis.<br />
- O orçamento provincial inclue verbas para mais 26 irmfis <strong>de</strong> S. José<br />
<strong>de</strong> Cluny, que actualmente estão espalha<strong>da</strong>s pelas escolas primarias e pe-<br />
los hospitaes <strong>de</strong> Moçambique, Quelimane, Inhambane e Lourenyo Xarques,<br />
e que embora prestando valiosos serviços, estão, pela natureza dos cargos<br />
quch <strong>de</strong>sempeiiham, afasta<strong>da</strong>s <strong>da</strong> missgo meramente educativa cle que nos<br />
r+t:iinos occupando.<br />
Em Timor, o serviço missionario importa ao Estado 8:948$83,5 reis: e<br />
na (iuiné, on<strong>de</strong> não ha missfies, mas apenas seis parochos rnissionarios, a<br />
quem simultaneamente compete o serviço parochial e o <strong>de</strong> propagan<strong>da</strong> mis-<br />
sionaria, a <strong>de</strong>speza é <strong>de</strong> 2:800$000 reis annuaes.<br />
Abstrahindo, portanto, (la verba <strong>de</strong> 13:000$000 reis dispendi<strong>da</strong> na<br />
metropole, com o Collegio <strong>da</strong>s Miwóes Ultramarinas, seminario <strong>da</strong> Formiga,<br />
e Instituto <strong>de</strong> Catechistas Xestres e Enfermeiros coloniaes, por representar<br />
<strong>de</strong>speza, cujo beneficio reverte em geral para todo o Ultramar, teremos que<br />
a importancia total dispendi<strong>da</strong> com a evangelisaçáo e moralisaqáo directa<br />
dos indigenas, nas colonias em qne mais indispensavel se antolha a propa-<br />
gan<strong>da</strong> missionaria, é <strong>de</strong> cento e quarenta contos <strong>de</strong> reis em numeroa re-<br />
dondos. Se investigarmos agora o que se passa na India e em Macau, che-<br />
garemos, pela simpl~s<br />
inspecçh do orçamento, 6 inai:reditavel constataç~o,<br />
<strong>de</strong> que, n'estas colonias, on<strong>de</strong> a politica indigena <strong>de</strong> I'or.tii=al, pelas razóes<br />
já produzi<strong>da</strong>s, nunca precisaria riem <strong>de</strong>veria assurnir um ci~r~i:tor<br />
reli~ioso,<br />
o custo total <strong>da</strong> complica<strong>da</strong> organisaçào ecclesia.it,ioit, importa em, lia<strong>da</strong><br />
menos, <strong>de</strong> cem contos em numeros redondos. Inconsequentes como sempre,<br />
e como sempre sacrificando ao passado e á historia, sem olliar serenamente<br />
para a pratica do presente e para os <strong>de</strong>si<strong>de</strong>rata do ftituro, compritz-nos es-<br />
banjar com vistosos bispados, inuteis conesias, innrimeroa seminarios, im-<br />
ponentes festivi<strong>da</strong><strong>de</strong>s em vetnstas cathedraes, cariwimos paramentos e va-
96 POLYYICA INDIOENA<br />
--<br />
riados guisamentos, o que bem melhor fora empregar na moralisaçáo e na<br />
civilisa~áo do indigena africano, por intermedio <strong>da</strong> efficacissima propagan<strong>da</strong><br />
missiunaria. E que se riáo diga que o padroado <strong>da</strong>s Indias, e as clausiilas<br />
concor<strong>da</strong>tarias que se lhe referem, importam para Portugal o stricto <strong>de</strong>-<br />
ver, pelo menos moral, senso diplomatico, <strong>da</strong> conservação ostentosa d'esuas<br />
inuteis e custosas reliquias <strong>de</strong> tempos que não voltarfio. Mesmo admittindo<br />
que assim fosse, n inconsequencia subsistiria, pois, mais forte, mais nobre<br />
e alevanta<strong>da</strong>, e mais imperiosa 6 ain<strong>da</strong> n obrigação moral que sobre a<br />
nossa colonisa@o inipen<strong>de</strong>, <strong>de</strong> moralisar e civilisar as populaçúes barbams<br />
do perta0 africano.<br />
Conclusbes geraes<br />
Assim enten<strong>de</strong>mos que o serviço missionario carece <strong>de</strong> ser, nas colo-<br />
mias <strong>de</strong> Africa, completamente reorganisado, <strong>de</strong>senvolvido e protegido po-<br />
litica e financeiramente, para que possa contribuir por uma fórma valiosa<br />
para a cirilisação do indigena, tfio necessaria ;i prosperi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> obra colo-<br />
nial nas regiões tropicaes.<br />
As missões seriio, como disse Eduardo <strong>da</strong> Costa, egrejas, escolas, of-<br />
fichas e hospitaes; todo o esforqo <strong>de</strong> proselytismo religioso <strong>de</strong>ve ser pro-<br />
porcionado e harnioilico com a capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> assimilativa do indigena, e<br />
nunca <strong>de</strong>sacompan1:ndo (1% indispensavel aprendizagem profissional e do<br />
ensino <strong>da</strong> lingua colonis;itior;i, que tanto fdcilita a assimilação inconsciente<br />
d'um certo cunho nacional e patriotico.<br />
As nações coloniaes qne se lancem abertamente n'uma pulitica <strong>de</strong><br />
missionarismo religiow, <strong>de</strong>vem diligenciar obter, para essa politica, o favor<br />
<strong>da</strong> populari<strong>da</strong>tlc geral, procurando imbuir as massas populares menos<br />
credulas oii irreligii,-as, <strong>da</strong> ~ompr~hensáo exacta do alcance que, para a<br />
acção edncativa na- n.olonias e correlativa prosperi<strong>da</strong><strong>de</strong>, <strong>de</strong>ve resultar <strong>da</strong><br />
influencia civilisad, ilas missóes.<br />
E preciso (lt i iLtJr :i <strong>de</strong>scunfiatiça perenne e as supposiçõe:: vrroneas
que adveem do <strong>de</strong>sconhecimento <strong>da</strong> questão, e que procuram sempre filiar a<br />
protecçáo ás missóes religiosas, n'uma manobra occulta do ultramontanismo.<br />
Felicien <strong>de</strong> Challaye, eminente funccionario francez, espirito liberal e<br />
totalmente <strong>de</strong>sembaraçado <strong>de</strong> preconceitos religiosos, n'um importante relatorio<br />
citado por Leroy Beaulieu, não se esquiva a <strong>de</strong>monstrar a admiração<br />
que o possuiu ao visitar algumas missóes religiosas do Congo francez,<br />
que apo<strong>da</strong> <strong>de</strong> ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros oasiu <strong>de</strong> moral e trabalho civilisador no inferno<br />
!<br />
~ngolense. Defen<strong>de</strong>r a instituiçáo <strong>da</strong>s missóes religiosas como meio educavo<br />
nas colonias africanas, náo é fazer obra <strong>de</strong> reaccionarismo disfarçado,<br />
atten<strong>de</strong>r a um dos mais valiosos factores <strong>da</strong> civilisação e moralisação indigona,<br />
qne náo é possivel pôr <strong>de</strong> parte em qiialqner plano completo <strong>de</strong><br />
boa administração colonial.<br />
De resto, vem agora a proposito accentuar mais uma vez, que o papel<br />
do rnissionarismo, pela propria essenoia do fim que o exige e justifica,<br />
<strong>de</strong>verá restringir-se ao periodo <strong>de</strong> transição mais ou menos longo, <strong>de</strong> que a<br />
socie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena careça para evoliicionar, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a barbarie em que jaz<br />
até ao nivel <strong>da</strong> civilisação. Com eflcito, a propria fórma emotiva e psychica<br />
<strong>da</strong> alma indigena, obriga o Estado colonisador a conce<strong>de</strong>r ás missóes,<br />
temporali<strong>da</strong><strong>de</strong>s hoje indispensaveis, como meio <strong>de</strong> imposição <strong>de</strong> respeito aos<br />
catechisandos, mas incompativeis mais tar<strong>de</strong>, com a organisaçáo mo<strong>de</strong>rna,<br />
administrativa e politica que a colonia tiver attingido.<br />
Civilisa<strong>da</strong> completamente a socie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena, não serão já indis-<br />
peneaveis os educadores <strong>da</strong> inf'ancia e os moralisadores <strong>da</strong> familia; a or-<br />
ganisaçáo ecclesiastica regular, na hypothese do Estado religioso, satisfará<br />
as exigeiicias do culto, a iniciativa particular ou quaesquer typos <strong>de</strong> as-<br />
sociaçóes cultuaes, proverão a essas exigencias em todos os outros casos.<br />
Esse dominio temporal que, ás vezes, <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> certas restricçóes, 6<br />
indispensavel para affirmar o prestigio <strong>da</strong>s missóes entre os indigenas, não<br />
<strong>de</strong>ve ser concedido sem que, como diz Eduardo Costa, lhes façamos com-<br />
prehen<strong>de</strong>r, que a nenhuma é licito sahir do seu campo <strong>de</strong> acção puramente<br />
espiritutll, senão sob a condiçgo <strong>de</strong> favorecerem e auxiliarem o nosso do-<br />
rninio, e que 6 necessario consentirem que o governo lhes oriente e esti-<br />
mule o seu systema <strong>de</strong> ensino.<br />
'i
98 POLITICA INDIGENA<br />
Se a obra missionaria se limitasse ao proselytismo christiio, á evan-<br />
gelisação dos indigenas, sem procurar obter a energia psychica e a mora-<br />
li<strong>da</strong><strong>de</strong> dos caracteres, e sem Ihes incutir o habito do trabalho, a habili<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
profissional e a i<strong>de</strong>ia patriotica, se não mal, pelo menos, pouco bem iria 6s<br />
naç6es coloniaes que, ain<strong>da</strong> n'esta hypothese, as protegessem como enti<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
official <strong>de</strong> propagan<strong>da</strong> civilisadora.<br />
Na ver<strong>da</strong><strong>de</strong>, a civilisação do indigena, em to<strong>da</strong> a complexi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong><br />
evoliição que a <strong>de</strong>ve produzir, não <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> apenas <strong>da</strong> christianisação, aliás<br />
qempre util.<br />
A regressão psychologica que correspon<strong>de</strong> á obliteração <strong>da</strong>s taras<br />
nocivas, e a fixação hereditaria <strong>da</strong> melhoria progressiva, para se effectiva-<br />
rem com1)leta e clefinitivamente, nunca po<strong>de</strong>r50 prescindir <strong>da</strong> idonei<strong>da</strong><strong>de</strong> do<br />
meio physico, social e economico.<br />
Entre as bemfeitorias <strong>da</strong> civilisaçZo, o traballio physico e moral, o<br />
traballio consolador, o trabalho redcmptor, será aquella que, pela acção <strong>de</strong><br />
tonici<strong>da</strong><strong>de</strong> geral organica e psychica, mais rapi<strong>da</strong> e efficazmente concor-<br />
rerá para insuflar na alma apathica e amollenta<strong>da</strong> <strong>da</strong>s populaçóes indige-<br />
nas, as necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s que acorrentam a riqueza, a sociabili<strong>da</strong><strong>de</strong> que aper-<br />
feiçoa a rap, a energia que salva o caracter, e a activi<strong>da</strong><strong>de</strong> que engran<strong>de</strong>ce<br />
e justifica o direito á existencia.<br />
As missóes religiosas, que constituem um dos mais importantes ramos<br />
<strong>da</strong> administraqáo <strong>da</strong>s colonias <strong>de</strong> populaçóes fetichistas, nunca <strong>de</strong>verão<br />
<strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> satisfazer a esse i<strong>de</strong>al educativo.<br />
Ninguem, melhor que Antonio Ennes, o disse « . . . &4 empreza mise-<br />
ricordiosa <strong>de</strong> salvar almas para Deus, tem <strong>de</strong> se conciliar com a <strong>de</strong> educar<br />
corpos para o trabalho)).
CAPITULO 111<br />
INSTRUCÇÃO DOS INDIGENAS<br />
Importaricia <strong>da</strong> instrucção conio elemetito <strong>de</strong> politica<br />
iiidigena.<br />
Ensiiio itidigena tias colonias portuguezas.<br />
Ensitio itidigena rias colotiias francezas.<br />
Geiierali<strong>da</strong><strong>de</strong>s sobre o ensino indigena em outras colo-<br />
riias estrangeiras.<br />
Conclusões geraes.<br />
I
CAPITULO I11<br />
=. . . Any crarefnl analysis i>f tlie rnpaning<br />
of eduaation wili reveal t~iat or-a of ite pdn-<br />
oipal elemeuta is adiiptntioii to aooial euviroument.<br />
*<br />
PAUL %INSCE - L'olmt~al ~d,ninwtralton.<br />
.<br />
Importancia <strong>da</strong> instrucção como elemento <strong>de</strong> politica indigena<br />
Se a educação do caracter constitue o mais po<strong>de</strong>roso factor <strong>da</strong> robus-<br />
tez e sani<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s energias sociaes, a instrucção scientifica pelo seu predo-<br />
minio no <strong>de</strong>senvolvimento <strong>da</strong> intellectuali<strong>da</strong><strong>de</strong> geral, não vale sensivelmente<br />
menos como pilastra supporte do edificio social. Nem só a energia resume<br />
a superiori<strong>da</strong><strong>de</strong>; a hegemonia intellectual d'um povo ou d'uma raça, como<br />
meio <strong>de</strong> civilisaç?io, é com frequencia historica <strong>de</strong> effeitos sobrepujantes ao<br />
po<strong>de</strong>rio militar, á, energia moral e physica e á, vaga alterosa e suffocante<br />
do numero.<br />
Que admiravel exemplo o <strong>da</strong> pequena Grecia, lethargica e anemia<strong>da</strong><br />
por uma quintessencia <strong>de</strong> sublimação intellectual, <strong>de</strong>ixando-se acorrentar<br />
ao carro imperial <strong>de</strong> Roma, incapaz <strong>de</strong> resistir ao esforço <strong>de</strong> alguns cente-<br />
nares <strong>de</strong> aguerridos legionarios, mas continuando a influir avassaladora-<br />
mente no mundo latino, e espalhando a luz intensa <strong>da</strong> philosophia e <strong>da</strong><br />
civilisaçáo grega no superorganismo romano, energico e dominador, mas<br />
tosco, intolerante e pretoriano.<br />
N'este caso bem frisante <strong>da</strong> imposição civilisadora dos vencidos, O
phenomeno social torna-se notavel pela gran<strong>de</strong> superiori<strong>da</strong><strong>de</strong> numerica dos<br />
vencedores. Pela tradição do seu iriromparavel passado artistico, pelo<br />
requinte <strong>da</strong>s facul<strong>da</strong>tles intellcctnaes e pelos primores <strong>de</strong> civili<strong>da</strong><strong>de</strong> na<br />
convivencia social, que tinham afinado e polido a socie<strong>da</strong><strong>de</strong> grega, já n'esse<br />
rnomerito n'uiti estado <strong>de</strong> hypercivilisayko <strong>de</strong>generescente, conseguiu esta<br />
dominar os vencedores, cobrindo as on<strong>da</strong>s revoltas do imperio romano,<br />
com n phosphorescencia radiante <strong>da</strong> arte e <strong>da</strong> intellectuali<strong>da</strong><strong>de</strong> grega.<br />
Engran<strong>de</strong>cer economicamente um povo oii lima raça, sem a educar e<br />
instruir, rasgar <strong>de</strong> canaes, estra<strong>da</strong>s e vias ferreas o solo adusto dos ser-<br />
tões, construir portos, navios, fabricas e ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s, crear as industrias,<br />
fomentar a agricultura, <strong>de</strong>senvolver o commercio e adoptar superiores fdr-<br />
mas <strong>de</strong> administra(;á,o publica, sem, primeiramente, ter provido pelos inten-<br />
sivos processos educativos e pe<strong>da</strong>gogicos ii consoli<strong>da</strong>qáo dos alicerces sociaes,<br />
morali<strong>da</strong><strong>de</strong> e instrucção, é edificar-um tcmplo grandioso sobre a vasa ou<br />
areia movediya <strong>da</strong> boçali<strong>da</strong><strong>de</strong> e <strong>da</strong> ignorancia. Muito antes do edificio social<br />
ter attingido o corucheu <strong>da</strong> perfeiçko, to<strong>da</strong> a obra ruiria por falta <strong>da</strong> base<br />
indispensavel, sepultando n'um tumulo <strong>de</strong> escombros todo o progresso civi-<br />
lisador que uma estulta politica colonial não appoiára na previa educaçáo<br />
<strong>da</strong>s populações indigenas.<br />
Evi<strong>de</strong>ntemente a educação, instrucção, melhoria economica e pro-<br />
gresso politico, todos uteis, separa<strong>da</strong>mente sO valem com efficiencia <strong>de</strong>ter-<br />
minante, como meios <strong>de</strong> civilisaçHo, quando empregados conjuncta e simul-<br />
taneamente.<br />
Por termos <strong>de</strong>cicurado o enriquecimento social <strong>da</strong> antiga Zambezia,<br />
por intermedio <strong>da</strong> agriciiltiira, <strong>da</strong>s indnstrias e do ensino profissional, pro-<br />
curando apenas obter christáos mais ou menos convictos, to<strong>da</strong> a obra mis-<br />
sionaria se inutilisou rapi<strong>da</strong>mente dnrante o pcriodo historico do <strong>de</strong>scalabro<br />
do imperio colonial portuguez. Todos estes agentes <strong>de</strong> civilisação teem<br />
i<strong>de</strong>ntica importancia, e se por vezes, apparentemente, a ediicaçáo e instruc-<br />
ção aperfeicoa<strong>da</strong> dos indigenas se antolham nocivas ao modulo economico<br />
<strong>da</strong> colonisação, é porque se encara o problema sob o ponto <strong>de</strong> vista res-<br />
tricto <strong>da</strong> situaçáo momentanea.<br />
' Ora quem colonisa, alem do interesse economico que procura, tem a
esponsabili<strong>da</strong><strong>de</strong> effectiva dos factores sociologicos, excliisivamente proprios<br />
ás colonias, aos qiiaes chamaremos artificines, e que resultam <strong>da</strong> sobreposiç8o<br />
<strong>da</strong>s socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s colonisante e nativa. X'este caso o proprio fim moral<br />
<strong>da</strong> existencia humana, viver na socie<strong>da</strong><strong>de</strong> e aperfeiyoa-la, que caracterisa<br />
a eminente sociabili<strong>da</strong><strong>de</strong> do homem, n%o e6 se manifesta como alhures por<br />
um automatismo inconscieiitc no individuo e á collectivi<strong>da</strong><strong>de</strong>, mas tambem<br />
se <strong>de</strong>ve accentuar por uma exteriorisação <strong>de</strong> processos o~jectivos, que<br />
perniittam tornar extensivas á socie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena as faciilila<strong>de</strong>s proprias<br />
do elemento colonisador.<br />
r 3<br />
1 odo o processo colonial que náo implicar a civilisayiio e o progresso<br />
sociologico <strong>da</strong>s massas indigenas, nRo passa <strong>de</strong> lima mera exploraçuo commercial,<br />
sem futuro moral e sem gran<strong>de</strong>za historica. Mesmo nas caolonias<br />
dc oaniento, que não fossem primitivamente <strong>de</strong>sertas, a civilisaydo do<br />
incti~oii;~ 1: um <strong>de</strong>ver tanto mais imperioso, qiianto n'esta hypothese a finali<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
liistorica <strong>de</strong>ve representar a integração ethnica dos nativos na raça<br />
colonisante.<br />
Os processos coloniaes adoptados pelos inglezes nos Estados Unidos<br />
e na Australia, conducentes ao rapido exterrninio dos indigenas, não são<br />
normas aconselhaveis <strong>da</strong> colonisação, não passam <strong>de</strong> ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros crimes<br />
collectivos que o preconceito <strong>de</strong> raça, táo arreigado no espirito inglez,<br />
inspirou, e que a consciencia <strong>da</strong> superiori<strong>da</strong><strong>de</strong> social e numerica consentiu.<br />
Inteiramente outra tem sido a politica iiirligena <strong>da</strong> Inglaterra, não s6<br />
ho gran<strong>de</strong> iinperio <strong>da</strong>s Indias, on<strong>de</strong> as circumstancias a isso a ol)rigam, pela<br />
difficul<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> acclimataqÁo <strong>da</strong> raça ingleza, mas tambem na Nova Zelandia,<br />
colonia <strong>de</strong> povoamento on<strong>de</strong> o elemento indigena, hoje <strong>de</strong>crescente com<br />
os estragou <strong>da</strong> tuberculose e successivameiite siibstituido pela raça mestiça,<br />
tem sido aliás respeitado, usando-se mo<strong>de</strong>rnamente <strong>de</strong> todos os meios susccptireis<br />
<strong>de</strong> produzir a rapi<strong>da</strong> civilisação dos Maoris.<br />
As conseqnencias <strong>da</strong> ignorancia absoluta oii relativa dos indigenas<br />
náo se dcvem apenas consi<strong>de</strong>rar sob ti. visuali<strong>da</strong><strong>de</strong> mesquinha d'um sordido<br />
interesse cconomico actual, ou d'uma siipposta vantagem politica <strong>de</strong> momento.<br />
preciso alargar mais a vista até ;i concepçáo possivel do futuro
104 POLITICA INDIGENA<br />
-. -<br />
historico <strong>da</strong> colonia, e abafar um pouco as ten<strong>de</strong>ncias puramente utilitarias<br />
<strong>da</strong> nação ou <strong>da</strong> raça colonisante, em homenagem á integri<strong>da</strong><strong>de</strong> dos interes-<br />
ses coinmuns a todos os homens.<br />
Ha alguns publicistas coloniaes que reprovam o alastramento <strong>da</strong> ins-<br />
trucyão indigena, uns com receio <strong>de</strong> pertiirbaçúes politicas nas colonias, e<br />
outros apenas dominados pelo preconceito <strong>de</strong> raça qiie lhes faz ter como<br />
inacceitaveis as consequenciau que, para a socie<strong>da</strong><strong>de</strong> colonial, se <strong>de</strong>ddzem<br />
d'essa elevação <strong>da</strong> intellectuali<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena. Chailley, n'uma communica-<br />
ção ao Congresso Colonial <strong>de</strong> Marselha <strong>de</strong> 1906, critica a politica educativa<br />
adopta<strong>da</strong> pelos inglezes na India <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a celebre administração <strong>de</strong> lord<br />
Macaulay, com o pretexto <strong>de</strong> que alguns inconvenientes teem surgido para<br />
a politica dominadora, d'essa educaçzo scientifica <strong>de</strong> algumas centenas <strong>de</strong><br />
milhares <strong>de</strong> indios. -<br />
Como se hoiivesse processo administrativo 011 regimen politico que<br />
não apresente simultaneamente vantagens e inconvenientes !<br />
h preciso capacitarmo-nos <strong>de</strong> que a popnlaçáo indiana é <strong>de</strong> muitas<br />
<strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> milhóes <strong>de</strong> habitantes, on<strong>de</strong> o actual nucleo instruido, apesar<br />
<strong>de</strong> numeroso, se per<strong>de</strong> na multidão dos illetrados, como um sol<strong>da</strong>do na<br />
massa imponente d'um corpo <strong>de</strong> exercito. A critica a fazer á instrucçáo<br />
ingleza dos indios <strong>de</strong>ve talvez com justiça recahir na fórma <strong>de</strong>feitaosa por-<br />
que essa instrucciio d ministra<strong>da</strong>, nas cloutrinas que a compúem, mas nunca<br />
no facto em si. Chailley diz que os inglezes sáo os primeiros a reconhecer<br />
esses erros pela penna auctorisa<strong>da</strong> <strong>de</strong> ~roficientes<br />
indianistas, mas occulta<br />
que o que geralmente elles aconselham, não é o abandono <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong><br />
instructiva, mas sim a remo<strong>de</strong>lação dos organismos escolares e a reforma<br />
dos programmae doutrinarios. Tornoii-se necessario obter mais homens uteis<br />
a si proprios e ;i socie<strong>da</strong><strong>de</strong>, na esphera <strong>de</strong> acção agricola e industrial, sem<br />
<strong>de</strong>trimento do or(;amento colonial, hoje sobrecarregado pelo grave cancro<br />
do fiinccionalisnio indigena, qiie é quasi a unica carreira possivel com O<br />
actual regimen (10 ensino, e pela qual os indios teem revelado uma pre-<br />
dilecção sG com1)aravel it <strong>da</strong>s raças latinas.<br />
Acerca <strong>da</strong> instrucção dos indigenas na nossa colonia <strong>de</strong> Moçambique<br />
e na fe<strong>de</strong>raçgo stil-africana, é muito interessante a opinião do governador
Conselheiro Freire d'Andra<strong>de</strong>, qire vamos transcrever do seu magnifico<br />
trabalho a Relatorios sobre Moçambique n , fazenfio acompanhar essa transcripção<br />
dos commentarios que ella naturalmente suggere em qualquer<br />
espirito totalmente liberto <strong>de</strong> preconceitos.<br />
Discutindo as vantagens e inconvenientes <strong>da</strong> instrucção indigena,<br />
diz aquelle illustre colonial o seguinte: aTemos na Provincia uma população<br />
numerosa no meio <strong>da</strong> qual vivemos; população essa qiie vive feliz nos<br />
seus costumes, nos seus usos, composta <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s creanças a quem qualquer<br />
coisa alimenta e qualquer coisa satisfaz; como a creança é o preto<br />
cruel, se cruel o <strong>de</strong>ixam ser, e como ella 15 rebel<strong>de</strong> ao trabalho, mas como<br />
oll~ estA satisfeita sempre que a tratam com justiça e equi<strong>da</strong><strong>de</strong>, e como<br />
ell~<br />
tambem pG<strong>de</strong> ser compelli<strong>da</strong> ao trabalho por meios siiasorios e gra-<br />
duaes.<br />
E o systema que adoptamos na 13rovincia, on<strong>de</strong> centos <strong>de</strong> milhares<br />
<strong>de</strong> pretos se encontram dominados e submettidos aos chefes dos seus dis-<br />
trictos, sem para isso ser necessario um unico sol<strong>da</strong>do, quer branco quer<br />
preto.<br />
As difficul<strong>da</strong><strong>de</strong>s começam <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que ao indigena se querem incutir os<br />
habitos europeus, que nem elle estk preparado para receber, nem a popula-<br />
ção branca para acceitar. Dias lia que fui procurado por nm preto educado<br />
nas missfies e qiie pedia um logar que não lhe <strong>de</strong>i: reclamon elle, dizendo,<br />
que mal ia ;&OS brancos que man<strong>da</strong>vam buscar Ar suas al<strong>de</strong>ias os indigenas,<br />
para lhes incutir habitos que os separavam dos seiis, e que <strong>de</strong>pois não lhes<br />
<strong>da</strong>vam meios <strong>de</strong> ganhar a vi<strong>da</strong> pelos iinicos processos que a educação rece-<br />
bi<strong>da</strong> lhes permittia usar, e os repelliam <strong>de</strong> si por causa <strong>de</strong> preconceitos <strong>de</strong><br />
cor: - .Antes, dizia elle, me <strong>de</strong>ixassem sempre ficar com os <strong>da</strong> minha<br />
raça, vivendo como elles, do que educarem-me para me lançarem na situa-<br />
ção actual, repellido pelos brancos que me vêem preto, e repellindo eu os<br />
<strong>da</strong> minha côr com os qiiaes não posso habituar-me a viver por ter contra-<br />
hido, por educação, os habitos dos brancos.. - E tinha, na reali<strong>da</strong><strong>de</strong>, razão<br />
o preto que assim fallava. . .*<br />
Tinha razão o preto nas suas i<strong>de</strong>ias, sobrava-lhe razh no que recla-<br />
mava, mas tambem tinham raziio e eram merecedores <strong>de</strong> elogio as missões
que O edncaram e O Estado que siibvencionon ossn eiiucaçáo Razão sd náo<br />
a teem os que cegos por iim preconceito <strong>de</strong> raya, que repugna ti pura essencia<br />
<strong>da</strong> alma portugueza, e aperias por tima tenilcncitt iinitativa <strong>da</strong> proxima<br />
colonisação ingleza, teem procurado ~clrit~i.i\lisilr ri'atluella colonia, as<br />
conseqnencias perigosas e irritantes cl'c~sscs prec'oiic~c.itos cujas exteriorisaçóes<br />
se não observam em nenhuma outra colonia portugueza. (I) Em to<strong>da</strong> a<br />
parte o portiigiiez admitte a inferiori<strong>da</strong>dr: do incligena selvagem e <strong>de</strong>sprovido<br />
cle educaçZio, mas em parte algiima tem <strong>de</strong>ixado <strong>de</strong> tratar em pé <strong>de</strong><br />
absolnta egnal<strong>da</strong><strong>de</strong> com o indigena civilieado e iiistriiido.<br />
Na India Portugueza, antigamente, para o provimento dos cargos locaes,<br />
:it6 era condição <strong>de</strong> preferencia o indigenato.<br />
Na propria metropole, nos bancos dos lyceiis e <strong>da</strong>s csi,ol:i* siiperiore*,<br />
o estu<strong>da</strong>nte portuguez consi<strong>de</strong>ra sei1 egual o condiscipnlo <strong>de</strong> cor, e se<br />
a orieiitac;%o <strong>da</strong> siia carreira o impelle para as colonias, ain<strong>da</strong> alli conserva<br />
essa quali<strong>da</strong><strong>de</strong> moral <strong>de</strong> não negar justiça a quem lh'a mereya.<br />
Se, porkm, crentualmente residir vizinho a Lourenço Marqnes, já o<br />
caso mu<strong>da</strong> e$sencialmente <strong>de</strong> figura, e copiando servilmente o figurino inglez<br />
com receio tle passar por menos civilisado, corara <strong>de</strong> apertar a mão<br />
a qualquer funccionario <strong>de</strong> cor, e reputari todos os restantes indigenas<br />
como indignos e incapazes <strong>de</strong> assimilar a civilisit(;ão europeia, s6 po<strong>de</strong>ndo<br />
ser utilisados como animaes <strong>de</strong> trabalho.<br />
'l1od:is estas i<strong>de</strong>ias sso, pordni, fiin<strong>da</strong>mentalmente ficticias, siiperficiaes,<br />
e para i~tglm V C ~ producto , nnttiral <strong>da</strong>. ten<strong>de</strong>ncia imitativa e vai<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
pomposa que habitualmente encobrem a generosi<strong>da</strong><strong>de</strong> tão prova<strong>da</strong> <strong>da</strong><br />
nossa raça. I<br />
Se o indigena a que p.c refere a'transcripçiio supra se via forçado a<br />
repellir a socie<strong>da</strong><strong>de</strong> dos inclividuos (ta siia raca, isso não <strong>de</strong>monstra <strong>de</strong> forma<br />
alguma que a +Lia ~duc.ação tivesse sido iim erro, mas antes faz resaltar<br />
a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> iiistriiir quanto antes to<strong>da</strong> a collectivi<strong>da</strong>(1e indi~ena.<br />
(1) Estas pal:i\.r;i\ ii5n \i.s;iiii :i lit~ssoa<br />
do actiial poverriador, que é um dos<br />
mais distinctos fiinccioiiai~ios porliiguezes. í!iiei.emos referir-nos a uma ten<strong>de</strong>ncia<br />
local bastante lameii tavel.
Se os brancos o repelliam pretenciosamente, ain<strong>da</strong> não é o excesso<br />
<strong>de</strong> educaçáo scientifica. do preto que se <strong>de</strong>ve la.rtirnar, mas sim a falha na<br />
educacão moral dos brancos que os inhibe <strong>de</strong> romper com preconceitos in-<br />
justificaveis. Finalmente, quanto utili<strong>da</strong><strong>de</strong> d'essa educacao, não vemos<br />
porque sc cont~ste, cles<strong>de</strong> que, parti o 1)rovimento <strong>de</strong> cargos administrativos,<br />
a legislaç&o portiigiieza ignora as differenças <strong>de</strong> cor. Pouco nos <strong>de</strong>ve<br />
preoccupar o que os iiiglezes fa~am ou projectem fiiz~r a wte respeito nas<br />
colonias africanas. Movambique, por emquanto, e assimaac~ont~vn G7rnpre,<br />
faz parte integral do dominio colonial portuguez, <strong>de</strong>vendo por cuii-cvliiencia<br />
guiar-se a PIIR colonisaçáo, não sob a mania <strong>da</strong> uniformi<strong>da</strong><strong>de</strong> em irititeria<br />
legislativa, mas eril liarmonia com a indole gcral <strong>da</strong> colonisaçko portug~ieza<br />
que, por muito ditt'erente <strong>da</strong> ingleza, não <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> lhe ser reconheci<strong>da</strong>ineiite<br />
~uperior em muitos pontos.<br />
O estabelecimento cio governo provincial em Lourenço Narques, que<br />
tanto <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> economicamente do commercio d ~ colonias s inglezas, não<br />
tem concorrido poiico para a relativa <strong>de</strong>snacionaliuaçilo d'aquella provincia.<br />
Oopie-se <strong>da</strong> colonisaçáo ingleza tudo o que ella tem <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>, <strong>de</strong><br />
habil e <strong>de</strong> proficuo, mas fiquemos por ahi, assimilando, se possivel for, essas<br />
quali<strong>da</strong><strong>de</strong>s, c repudiando abertamente as siias formas <strong>de</strong>feitiiosas e os seus<br />
inconcebiveis preconceitos.<br />
Continuando a transcripçEo do livro « Relatorios sobre Moçambique p ,<br />
temos o seguinte: c Durante seciilos niio l)o<strong>de</strong>rú <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> <strong>da</strong>r-se em<br />
Africa com maior intensi<strong>da</strong><strong>de</strong> aindii, o que na America se produz, e náo<br />
haverli possibili<strong>da</strong><strong>de</strong>. nem a menor vantagem, eni misturar as duas raças.<br />
E o que succe<strong>de</strong>rlí se a esta reunirmos a india e a chineza? Ser& eiltáo<br />
impossivel o fazer <strong>da</strong> africa o paiz on<strong>de</strong> prospere a ra(;a branca,<br />
e on<strong>de</strong> se reunani os prodigios que teem feito as duas gran<strong>de</strong>s hmericas.<br />
E temos n escolher, e preciso 4 que o façamos, encarando os problemas a<br />
resolver, e segiiirido no caminho que para isso s(. nos antolhe razoavel. E<br />
tem por isso a Neview (I) razáo, quando diz a pag. 9, que se <strong>de</strong>ve procurar<br />
(I) Esta Reviero 15 o í~ternwandunz <strong>de</strong> lord Selborne.
108 POLITICA INDIGENA<br />
-<br />
fazer em Africa uma gran<strong>de</strong> populaç%o branca. mas nzo se comprehen<strong>de</strong><br />
bem como essa população possa medrar ao lado do homem <strong>de</strong> cor que,<br />
segundo diz a pag. 12, sente qiie tem direito para obter um logar que lhe<br />
não é conceclido, e que não é outro senao o <strong>da</strong> perfeita egual<strong>da</strong><strong>de</strong> com o<br />
branco .........................................................<br />
........................................... .Portanto haja coragem<br />
<strong>de</strong> dizer alto e firmemente: a Africa. tlo Sul é actualmente para os bran-<br />
cos, e para os pretos que se não quizerem submetter a estes, que sigam<br />
para essas regióes dos tropicos on<strong>de</strong> a vi<strong>da</strong> em socie<strong>da</strong><strong>de</strong> s6 d possivel<br />
para elles.<br />
E se assim se niio quizer fazer, então ponha-se <strong>de</strong> parte to<strong>da</strong> a i<strong>de</strong>ia<br />
<strong>de</strong> occupa(!ão e <strong>de</strong>ixe-sc a Africa para os africanos pretos, visto que não<br />
é possivel misturar as cores: o que a natureza fez não serti <strong>da</strong>do ao homem<br />
<strong>de</strong>sfazer senão por meios violentos ; e náo é proclamando-se a fraterni<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> elementos oppostos, cfifficeis <strong>de</strong> ligar entre si, que se cliegarA a esse re-<br />
sultado ..........................................................<br />
................................................................<br />
Será, porém, possivel que a historia do futuro tenha a marcar nas<br />
suas paginas esse exemplo dos dois povos branco e preto, marchando <strong>de</strong><br />
máos <strong>da</strong><strong>da</strong>s com o mulato, producto <strong>de</strong> ambos, pela sen<strong>da</strong> <strong>da</strong> civilisaçáo e<br />
do christianismo, mas a historia do passado mostra-nos bem claramente que<br />
tal união não tem sido possivel ciimprir até hoje, e muito receio que o<br />
mesmo tenha <strong>de</strong> dizer a historia cio futuro B.<br />
Isto é, escorracemos os pretos indoceis oii mais intelligentea, em re-<br />
gra os mais aptos para se transformarem em ci<strong>da</strong><strong>da</strong>os energicos e civilisados,<br />
para as florestas equatoriaes on<strong>de</strong> o branco jti hoje domina, e d'on<strong>de</strong> mais<br />
tar<strong>de</strong>, na mesma or<strong>de</strong>m <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias, logo que o saneamento geral alli permit-<br />
tisse a vi<strong>da</strong> á raça branca, esta os <strong>de</strong>spacharia para os polos a povoarem<br />
as zonas glaciaes. ..<br />
O que se faz na America !? Mas alli ninguem pensa em expulsar para<br />
os Guyanas e para o Equador, o importantissimo elemento negro dos Es-<br />
tados do Sul ; e homens cia envergadura politica <strong>de</strong> Roosevelt não se enver-<br />
gonham <strong>de</strong> sentar á sua meza negros puros como Booker Washington.
O que se faz nas duas Americas ! ? Na America do Norte a raça fran-<br />
ceza misturando-se com os autochtones produziu um nucleo intelligente, civi-<br />
lisado e laboriosissimo <strong>de</strong> tres milhóes <strong>de</strong> franco-canadianos. No Mexico,<br />
na America Central e na do Sul, as duas gran<strong>de</strong>s naçóes coloniaes Por-<br />
tugal e Hespanha que n'csw tempo ain<strong>da</strong> não <strong>de</strong>calcavam as fôrmas ingle-<br />
zas, crearam um vastissimo imperio colonial, <strong>de</strong>stinado certamente a <strong>de</strong>sem-<br />
penhar um papel importantissimo na historia <strong>da</strong> humani<strong>da</strong><strong>de</strong>, e que é hoje<br />
povoado, excepção feita <strong>da</strong>s mo<strong>de</strong>rnas correntes migratorias, por <strong>de</strong>scen-<br />
<strong>de</strong>ntes directos dos brancos, e pelo producto dos multiplos cruzamentos<br />
entre as raças colonisantes, os indios autochtones e os negros transportados.<br />
A colorayáo pigmentar percorre n'aquellas naqóes to<strong>da</strong> a gamma dos<br />
coloridos humanos, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o branco mais rosado ao preto mais retinto. E<br />
to<strong>da</strong>s estas raças vivem alli em absoluta egual<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> direitos sociaes,<br />
admittindo, apenas, a hierarchia respeitavel do valor jndividual, e coexis-<br />
tindo harmonicamente sem attrictos irreductiveis que provem o epitheto<br />
<strong>de</strong> utopia lançado sobre a fraterni<strong>da</strong><strong>de</strong> humana.<br />
O que acontece na America ! ?<br />
O que alli diariamente se observa é precisamente o effeito assombroso<br />
<strong>da</strong> instrucção nos negros norte-americanos, e o augmento ca<strong>da</strong> dia mais<br />
sensivel <strong>da</strong> opinião negrophila e egualitaria. Se realmente ain<strong>da</strong> hqje nos<br />
Estados do Sul as raças branca e negra vivem a par sem comprehensão<br />
nem penetraçtto reciproca, é isso principalmente <strong>de</strong>vido a que 0s brancos<br />
<strong>de</strong> hoje são ain<strong>da</strong> apenas os netos dos plantadores que, como coisa sua,<br />
possiiiam os proximos avós <strong>da</strong> geraçiio negra actual. E <strong>de</strong> poucas <strong>de</strong>ca<strong>da</strong>s<br />
o periodo <strong>de</strong> coexistencia egualitaria <strong>da</strong>s duas raças, e os phenomenos <strong>de</strong><br />
evolução social são sempre caracterisa<strong>da</strong>mente lentos. Esperemos, pois, que<br />
o tempo venha a produzir, se não a amalgama completa, pelo menos a con-<br />
correncia leal e intercomm~~nicação<br />
amigavel d'esses dois elementos ethnicos.<br />
Todos os prece<strong>de</strong>ntes <strong>da</strong> politica colonial portugueza, e na philosophia<br />
<strong>da</strong> Historia se <strong>de</strong>vem baseiar todos os processos politicos, são concor<strong>de</strong>s em<br />
<strong>de</strong>monstrar a utili<strong>da</strong><strong>de</strong> recolhi<strong>da</strong> <strong>da</strong> nossa maneira <strong>de</strong> tratar os indigenw<br />
Sejamos, pois, coherentes com o nosso passado, com a nossa indole e<br />
afinal até com as ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iras necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s do presente, e tratemos <strong>de</strong> edu-
car e instruir os indigenas, <strong>de</strong> maneira a oivilisa-10s e a po<strong>de</strong>-los elevar<br />
até nús, não lhes recusando enttio e YÓ entáo todos os direitos civis e garan-<br />
tias politicas inherentes ti quali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> ci<strong>da</strong>dão port~iguez.<br />
De fúrma alguma <strong>de</strong>sejamos que se comece por <strong>da</strong>r geralmente aos<br />
indigenas uma instriicçáo scientifica, que o seu cerebro ain<strong>da</strong> não pó<strong>de</strong><br />
comportar.<br />
Um ou outro indiviiiiio excepcioiialmente intelligente po<strong>de</strong>rá ser<br />
admittido aos cursos superiores, mas as gran<strong>de</strong>3 miiltidóes precisam, prin-<br />
cipalmente, <strong>de</strong> receber uma soli<strong>da</strong> indtriicqko primdria e iiin pratico e com-<br />
pleto ensino agricola e profissional qiie, vhlorisando o solo e fomentando o<br />
trabalho, lhe9 permitta melhorar as suas condiçóes economicas e concorrer<br />
po<strong>de</strong>rosaracnfe para o progresso <strong>da</strong> economia colonial.<br />
No livfio do Snr. Conselheiro Freire dlAndradc leem-se mais para<br />
adiante as seguintes palavras: $<br />
a A ec1ncaçZo a <strong>da</strong>r ;LO indigena <strong>de</strong>verA ser, sobretudo. no sentido <strong>de</strong><br />
o tornar um tral~itlliador iitil e que concorra para a progressiva riqueza<br />
do paiz ; e n'esse caminho, julgo eu, <strong>de</strong>via dirigir-se principalrilente a pro-<br />
pagan<strong>da</strong> missionaria e não para lhe enraizar no espirito a falsa i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong><br />
que 6 egnal ao branco e t1.m 07 mesmos direitos que este. Não <strong>de</strong>vemos<br />
procurar animar a que se pnlia cm pratica a fabula <strong>da</strong> rã e do boi, em<br />
que aquella quercntfo ser egual a este tanto inchou que rebentou; e isto<br />
notando-se que ao rebentar esta não fez mal ao boi, o que no nosso caso<br />
po<strong>de</strong>ria não succe<strong>de</strong>r. A mito <strong>de</strong> obra para a agricultura, minas e outras<br />
industrias pd<strong>de</strong> e <strong>de</strong>ve ser fbrneci<strong>da</strong> pelo indigena. Blas como impedir que<br />
elle <strong>de</strong> trabalhador pdsse a patrao, engenheiro, contramestre ou, n'uma<br />
palavra, se torne elemento dirigente em vez <strong>de</strong> dirigido? Tal resultado sd<br />
pó<strong>de</strong> ser obtido por unia lei <strong>de</strong> trabalho que, mal interpreta<strong>da</strong>, facilmente<br />
será chama<strong>da</strong> <strong>de</strong> escravatura. E se fizermos O indigena engenheiro, advo-<br />
gado ou patrto <strong>de</strong> qualquer especie <strong>de</strong> industria, on<strong>de</strong> se empregarão os<br />
brancos <strong>de</strong> egual mister? Ou terão <strong>de</strong> ser pagos do mesmo modo e <strong>de</strong> se<br />
visturar com os individuos <strong>de</strong> cor differente?. . .<br />
Como se vê, o illnstre auctor do livro citado concor<strong>da</strong> em principio<br />
que se <strong>de</strong>vetn instruir os indigenas segundo as normas que aponthmos.
Com relação & propagan<strong>da</strong> missionaria, se julgamos tambem impru<strong>de</strong>nte<br />
que ella ensine ao preto que é eglial ao branco, náo po<strong>de</strong>m03 <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong><br />
accentuar que a sua principal rnissáo resi<strong>de</strong> justamente na effectivxçáo<br />
real d'esse ensinamento. E quanto & egual<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> direito.; civi-: e politicos,<br />
ser& um gran<strong>de</strong> erro, mas o que é facto é que constitue uma ver<strong>da</strong><strong>de</strong> legal.<br />
As circumstancias <strong>da</strong> ascensáo dos indigenas aos cargos dirigentes e<br />
<strong>da</strong> correlativa equiparaçáo aos brancos, não as consi<strong>de</strong>ramos inconvenientes,<br />
visto que sempre até hoje assim se tem procedido em terra3 portuquezas,<br />
sem que tenhamos motivos <strong>de</strong> nos arrepen<strong>de</strong>r d'essa politica feita <strong>de</strong><br />
tolerancia e <strong>de</strong> generosi<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
Que os inglezes se affrontem com e3sa melhoria social do3 indigenas<br />
e que a qnestão indigena tl;t Africa do Sul assuma uma gran<strong>de</strong> importancia<br />
no celebre memorantlu~n <strong>de</strong> lord Selborne, a ninguem que conheça o<br />
<strong>de</strong>sprezo inglez pelo coloureti peopl~, causará a minima surpreza.<br />
Nós, porém, que não Som03 itiglezes, por gran<strong>de</strong> que seja a <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ncia<br />
economica <strong>de</strong> Lourenço Marques, não nos po<strong>de</strong>mos <strong>de</strong>ixar levar por<br />
imitação ou por coacção a adoptar o systema <strong>de</strong> tratamento indigena que<br />
alcançou predominio na fe<strong>de</strong>ração sul-africana.<br />
Alarguemos ao contrario o serviço missionario e a propagan<strong>da</strong> <strong>da</strong><br />
instrucçáo, procurando sempre obter mais a;ricultores, industriaes, commerciantes<br />
e operarios, do que medicos, advogados ou funccionarios publico~,<br />
mas nunca repellindo os que, por ten<strong>de</strong>ncia propria ou circumstancias<br />
especiaes, tenham seguido estas ultimas carreiras.<br />
Os brancos po<strong>de</strong>m estar <strong>de</strong>scançsdos que haverk logar para todos.<br />
Os nossos extensos dominios africanos, em regra <strong>de</strong> população tão<br />
pouco <strong>de</strong>nsa, dáo margem a to<strong>da</strong>s as activi<strong>da</strong><strong>de</strong>s e consentem numerosissima<br />
cooperação social.<br />
De resto, seria loucura pensar em colonisar, mesmo n'um futuro mnito<br />
afqstado, apenas com portuguezes <strong>da</strong> metropole, toclo~ os territorios <strong>da</strong><br />
Afiica em que exercemos dorninio politico, e a não ser os pretos, com que<br />
po<strong>de</strong>riamos contar? Com inglbzes? Com allernães? Quer uns, quer outros<br />
teriam, a breve trecho, consumnado a <strong>de</strong>snacionalisaçáo completa <strong>de</strong> to<strong>da</strong>
112 POLITICA INDIGENA<br />
--- -.---<br />
a colonia, on<strong>de</strong> seria inutil pensar em ~nanter perd~ravelrnent~ o glorioso<br />
pendgo nacional.<br />
Essa <strong>de</strong>snacionalisayáo, que 6 conveniente evitar na socie<strong>da</strong><strong>de</strong> co-<br />
lonisadora, é indigpensavel que se impeça por todos os meios nas popula-<br />
çóes indigenas. Precisamente em Moçambique, a emigração para o Rand<br />
e a conseqiiente aprendizagem <strong>da</strong> lingua ingleza em <strong>de</strong>trimento <strong>da</strong> portu-<br />
gueza, estáo-nos diariamente causando enormes prejuizos, pela per<strong>da</strong> do<br />
cunho portilgiiez que os indigenas, porventura, tivessem anteriormente<br />
adquirido.<br />
E frequentissirno, d'uma frequencia aterradora, encontrar nos districtos<br />
c10 sul <strong>de</strong> Moçambique, indigenas que só comprehen<strong>de</strong>m o inglez. A<br />
isto scí se pcí<strong>de</strong> respon<strong>de</strong>r, com iimtt intensissima propagan<strong>da</strong> <strong>de</strong> ensino <strong>da</strong><br />
lingua portugueza. Em França, apesar <strong>da</strong> opinião em contrario <strong>de</strong> alguns<br />
coloniaes que apontam o ensino do francez na Tunisia, como tendo apenas<br />
servido para crear rebel<strong>de</strong>s, insubmissos e <strong>de</strong>scontentes. o ensino <strong>da</strong> lingua<br />
nacional é inteneamente feito em to<strong>da</strong>s as suas colonias.<br />
A pn)~)ria iniciativa particular tem-se <strong>de</strong>dicado com o maximo interesse<br />
á irradiação <strong>da</strong> lingiia frnnceza como instrumento <strong>de</strong> nacionalisaçáo.<br />
A Alliance ETangai..~, fun<strong>da</strong><strong>da</strong> em Junho <strong>de</strong> 1883, possue hoje mais<br />
<strong>de</strong> 50:000 adherentes em França, e no estrangeiro, e foi officialmente reconheci<strong>da</strong><br />
em 1886 como estabelecimento <strong>de</strong> utili<strong>da</strong><strong>de</strong> pnblica. C) fim a que<br />
se propõe esta importante associaçác, é o <strong>de</strong> propagar o ensino do francez<br />
no estrangeiro e principalmente nas colonii~s; para isso tem po<strong>de</strong>rosos<br />
meios <strong>de</strong> acção, taes como escolas proprias para creanças ou adultos, subvenção<br />
a escol,is estranhas, particulares ou officiaes. em que se ensine o<br />
francez, e o ciiyteio dos cursos <strong>de</strong> fr~ailcez introduzidos nas escolas indigenas,<br />
on<strong>de</strong> primitivamente não fossem professados.<br />
Esta obr:t eminentemente patriotira alcança crescentes e ~aliosos resultados<br />
do seli esforço inspirado e constante <strong>de</strong> propagan<strong>da</strong> instriictiva e<br />
nacionalisadora. A questão do ensino <strong>da</strong> lingua nacional tem sido larg*<br />
mente <strong>de</strong>bati<strong>da</strong> em todos os centros e publiaaçóes coloniaes, havendo quem<br />
pregue o abstencionismo completo, fazendo-se to<strong>da</strong> a 1nstrucc;áo dos indigenas<br />
na sua propria lingua; e quem, pelo contrario, apresente o ensino <strong>da</strong>
lingua, como <strong>de</strong>vendo sobrelevar a to<strong>da</strong> a outra instrucçáo primaria, profissional<br />
e agricola.<br />
O abstcncionicmo puro 6 um exagero qiie po<strong>de</strong> ser prejudicial 4<br />
colonisaçTio; assiiri Leroy Beaulieii, aporitando a <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncia <strong>da</strong>s escolas<br />
arabes na Argcli:~, tlesaconsellia a siia reorgariisaqáo, pois a França e a sua<br />
obra coloni~il tccm tiitlo a lucrar coin as dcficicncitis do estiido rtrabe do<br />
hllior;io, qiic dia :i tliti se accentiiixrn ri'~i~iie1la colonia. Por oiitro l;ido,<br />
q~itn(10 as populaçúcs indigenas :~prcsentem Lima ciiltiiri~ gcrnl :.niiito rtidimentar,<br />
este ensino s6 pó<strong>de</strong> ter ~iiiitiig~ns, e importniitis-iiii:i
114 POLITICA INDIGENA<br />
3.0 Que o conliecimento <strong>da</strong>s ling~ias indigerins seja rigorosamente<br />
exigido aos fiinccionarios c magistrados coloniaes.<br />
4.O Que sejam concedi<strong>da</strong>s f.acilidndcs aos indigenas siiperiormente<br />
intclligcntes, para segiiir nas iiniversi<strong>da</strong><strong>de</strong>s cla mctropole os cursos <strong>de</strong><br />
ensino siipcrior. D<br />
Como resalta d'eates votos, a utili<strong>da</strong><strong>de</strong> pratica inilliidivcl <strong>da</strong> instriic-<br />
@o indigena, levoii este importante congresso, :t qiic concorreram os vultos<br />
mais eminentes do meio colonial francez, a consagrar <strong>de</strong>finitivamente nos<br />
processos <strong>da</strong> colonisação franceza esse factor imprescindivel do civilisação<br />
geral e <strong>de</strong> aperfeiçoamento social. Vamos agora ver como se encontra organisado<br />
nas nossas colonias o ensino indigena, ciija importancia temos prw<br />
ciirado cvidciic.iar.<br />
Ensino indigena nas colonias portuguezas<br />
Na phasc inicial <strong>da</strong> colonisaç&o portugueza, a feipão educativa era<br />
caracterisa<strong>da</strong> qiiasi exclusivamente pelo proposito evangelisador, e qiiasi<br />
sempre benefivia<strong>da</strong> com o ensino <strong>da</strong> lingiia portiigiieza para facilitaqão <strong>da</strong><br />
catechese. 0s ini~sionarios portu~~i~z~s, qiic sempre acompanharam todos<br />
os emprehendiiricntos coloniaes, fi)ram os mais ar<strong>de</strong>ntes e corajosos pioneiros<br />
<strong>da</strong> doutriiiri, ;to christá a <strong>da</strong> infliiencia portng~icza. Os resiiltados alcançados<br />
na India. em todo o Extremo Oriente, no sertão <strong>de</strong> Angola, na Zambezia,<br />
no Congo ctc., foram tão importantes que ain<strong>da</strong> 1i0,je siirprehen<strong>de</strong>m.<br />
O conhec* iiiento do portiiguez perdiirou tão longamente nas successivas<br />
geraçó,.: indigenas que, ain<strong>da</strong> em 1854, Livingstone admirava o<br />
gran<strong>de</strong> niimero ilc indigenas d'Ambaca que fallavam e escrcviarn o portugiiez,<br />
e que era milito superior ao dos alumnos <strong>da</strong>s missões, ain<strong>da</strong> n'essa<br />
epocha alli exi*tcbntes. Os nossos missionarios não se limitaram, porem, &<br />
catechisação do. indigenas nos nossos dominios; impellidos pela loiicura<br />
febril do proselytismo religioso, aspirando eterna bemaventurancia como
premio do seu esforço qiiasi sobrehumano <strong>de</strong> christianisação, n8o quizeram<br />
reconhecer as fronteiras politicas e moraes, nem os perigos e obstaculos<br />
<strong>de</strong> to<strong>da</strong> a natiircza antepostos A sua empreza, e avancaram sempre até<br />
aos reconditos mysterios do solo nipponico e cliinez, até ás neves eternas<br />
do <strong>de</strong>sconliecido Thibct, cujo territorio foi pizado, alguns secalos antes <strong>de</strong><br />
Edin e <strong>de</strong> Ollone, pelo jesuita portngiiez Antonio <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>.<br />
11uito mais importantes, sob o ponto <strong>de</strong> vista dn colonisação podiam<br />
ser os resultados actuaes d'essa afinca<strong>da</strong> propagan<strong>da</strong> <strong>da</strong> palavra suave <strong>de</strong><br />
Christo, ensina<strong>da</strong> na toa<strong>da</strong> melodiosa do dialecto portuguez, se a ella tivesse<br />
presidido a continui<strong>da</strong><strong>de</strong> do esforço.<br />
Aqnellas mesmas cansas que motivaram a pavorosa <strong>de</strong>rroca<strong>da</strong> do<br />
ephemero po<strong>de</strong>rio mundial <strong>da</strong> naçáo portngueza, bastaram para iniitilisar<br />
na sua qiiasi totali<strong>da</strong><strong>de</strong> os resultados <strong>de</strong> principio alcançados, consummando-se<br />
mais tar<strong>de</strong> esse retrocesso <strong>da</strong> civilisaqSto indigena, com o <strong>de</strong>creto,<br />
benefico na metropole, mas <strong>de</strong>ploravel nas colonias, <strong>da</strong> extinc~áo <strong>da</strong>s or<strong>de</strong>ns<br />
religiosas. A leicisação do ensino indigena, que se lhe seguiu, na<strong>da</strong> reme<strong>de</strong>iou<br />
por erros <strong>de</strong> organisaçfio e <strong>de</strong>ficiencias pecuniarias.<br />
Hoje, exceptuando Cabo Ver<strong>de</strong> o a India, p0<strong>de</strong> dizer-se que tudo estti<br />
por fazer, apezar <strong>da</strong> terrirel aralanche <strong>de</strong> portarias, <strong>de</strong>cretos, alvarzis,<br />
etc., sobre o ensina indigena colonial, que, geralmente <strong>de</strong>sacompanhados<br />
<strong>da</strong>s indispensareis verljas orc;amentaes qrie permittiriam a siia execuçáo,<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> longa <strong>da</strong>ta teem avoliiinacio a nossa complica<strong>da</strong> legislaçáo colo-<br />
nial.<br />
N'iim excellenae traballio, qiie o distincto escriptor e propagandista<br />
colonial o Snr. Almadn Negreiros apreseritou ultimamente ao Instituto Co-<br />
lonial <strong>de</strong> Bruxellas, encontram-se compilados todos esses documentos, <strong>de</strong><br />
entre os qiiaes iremos siiccessivamente extractando os que se nos afiguram<br />
mais importantes, modificando os mo<strong>de</strong>rnos <strong>da</strong>dos estatisticos, quando não<br />
condigam com as outras fontes <strong>de</strong>mographicas consulta<strong>da</strong>s. (I)<br />
(1) Anuuario Eatntis1ii.o dtrs I>rovinoias Ultraainriuas em 19VV; Or Compleln <strong>de</strong> l~rgisln(;Ro I:llrnmarinn.<br />
9
116<br />
--<br />
POLITICA ISDIC;E?rTAi<br />
___i_-__-_<br />
I<br />
Em 1J3G fun<strong>da</strong>ram os portiigiiczes li111 seminario-lyceu no archipelago <strong>da</strong>s<br />
Moliicas.<br />
Krii 1574, por alvari <strong>de</strong> 25 <strong>de</strong> Fevereiro (I(? I5ik fiiiitliivciin no Japiio iim collegio<br />
subvencionado pelas receilas aduaneiras (ir l\l:ilnc~ca, e .já ern lti07 havia outro<br />
collt~gio portuguez em Nagasaki. Eiii IF.L;l ;i (:;irta rbgia <strong>de</strong> I. d'i\posto cbstabeleciii<br />
varias medi<strong>da</strong>s teri<strong>de</strong>ntes a conseguir qiie Sosse niiiiistrala aos indigeiias <strong>de</strong> Angolii,<br />
(;iiiiié, S. TIiom6 e Cabo Ver<strong>de</strong>, unia iiistriicç5o apiopriii<strong>da</strong>. A maior paitcb<br />
(Ias 1iiiss5es religiosas rec~bia aiiiiurilmeiitc tio governo ~)ortugurz um subsidio<br />
chainado or.rii~zario, com a c:oritliçKo tle se <strong>de</strong>dicar no ensino dos iridigenas.<br />
As or<strong>de</strong>ns religiosas csliiictas em 23 <strong>de</strong> Rliiio <strong>de</strong> 1832, só furam s~ibslitui<strong>da</strong>s<br />
pelas cscolas leigas na tarefa do ensino indigclrin, por tlccrelo publicado em 183s.<br />
l'aia auxiliar a nova fórma <strong>de</strong> crisitio drs<strong>de</strong> 1838 a 1859 foratn publicados varios<br />
<strong>de</strong>cretos crcaiido museus locaes em Mncnii, Illoçaiiibiquc, Luan<strong>da</strong> e Cabo Ver<strong>de</strong>,<br />
os cdificios coiiveiituaths forain aproveilíidos para escolas.<br />
Os serniiiarios iiltramarinos foram creados por <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 1.3 d'8gosto <strong>de</strong><br />
1656, seguido poiiro dttpois do <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 18 <strong>de</strong> Novciiihro do mesmo atino que<br />
contém taml~tsiii viiricis rncdi<strong>da</strong>s ou iiistriic(;óes <strong>de</strong>stina<strong>da</strong>s a orientar a instrucção<br />
dos indigenas no canipo agricola e profissioiiw.1.<br />
Por <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 26 <strong>de</strong> Junho <strong>de</strong> I858 foram adinittidos nas imprensas ultramarinas<br />
aprcmdizes iridigenas. No mesino aiirio foraiii crea<strong>da</strong>s varias escolas regimeiitaes,<br />
rias iiiii<strong>da</strong>tl(is coloniaes
sioiiarios iiidigenas, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> quc <strong>de</strong>pois se dcstiiiassc~iii li. propagan<strong>da</strong> religiosa rias<br />
suas respectivas diocesrs.<br />
So<strong>da</strong> a orgiiriisnyCo <strong>da</strong>s inissòes do I
Por porlaria regia <strong>de</strong> 13 <strong>de</strong> Outubro <strong>de</strong> 1857 f~indoii-se uma escola para raparigas<br />
iiitliaiias clm I)ainiio, c por portaria <strong>de</strong> 6 dr Marco <strong>de</strong> 185s creou-se uma<br />
(~scolil rnixl;~ (>til l)iii.<br />
l'or <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 4 tle O~itiibro <strong>de</strong> 1853 crc?íirciin-se escolas <strong>de</strong> latim (mais!) em<br />
Uar<strong>de</strong>z e Salsete.<br />
Em Margáo havia em lMif, escolas particulares <strong>de</strong> theologia e philosophia.<br />
Em 1858 e em 1868 fun<strong>da</strong>ram-se, respectivamente, os seininorios <strong>de</strong> Vaipicota<br />
e Cochim.<br />
Por <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 19 <strong>de</strong> .4bril <strong>de</strong> 1869 instituiu-se na Itidia um quadro <strong>de</strong><br />
pharmaceuticos indigenas que alli fazem o respectivo curso.<br />
Bin 11 <strong>de</strong> Novenibro <strong>de</strong> 1871 foi crendíi ein Goa, por <strong>de</strong>creto, uma escola <strong>de</strong><br />
pilotageiii.<br />
Por <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 14 <strong>de</strong> 1)ezeinbro <strong>de</strong> 1880 foram i:rea<strong>da</strong>s nas ~ovas Concluistas,<br />
varias escolas elenienttires para os dois sexos.<br />
Em 31 <strong>de</strong> Agosto <strong>de</strong> 1881 foram creados. por <strong>de</strong>creto, dois seminarios-lyceiis<br />
para wrviqo privativo <strong>da</strong>s missões religiosiis iiuriierosas escolas primarias.<br />
Kin 1890 foi <strong>da</strong><strong>da</strong> or<strong>de</strong>m para se imprimirem os livros escolares ein Concsiii.<br />
Pelo <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 3 <strong>de</strong> Oiitiibro <strong>de</strong> 18Y"Loram crea<strong>da</strong>s varias escolas <strong>de</strong> ensitio<br />
seciitidiirio e foi aiinexatla ao Igceii <strong>de</strong> Nova (;fia iiiua Escola Normal <strong>de</strong>stiii:itlu<br />
u f0rin:ir professores para as escolas priinarias.<br />
Por dpcrcto <strong>de</strong> 31 <strong>de</strong> Outubro <strong>de</strong> 18!a foi c:rc:atla tiriia Escola esperitneutal<br />
<strong>de</strong> agricultura, e eni 21 <strong>de</strong> Janeiro <strong>de</strong> 18113 fundou-se a escola <strong>de</strong> Combarjiia.<br />
I'or <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 2 <strong>de</strong> Maio <strong>de</strong> 18!)3 foram crea<strong>da</strong>s escolas <strong>de</strong> lingua inahratta<br />
em Caiiacona, Bicholim e Pondá.<br />
A instriicçiio primaria ain<strong>da</strong> hoje se rege pela letra do <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 5 <strong>de</strong><br />
Agosto <strong>de</strong> 181)) que a rcorganisou. A instrucçáo secun<strong>da</strong>ria tbi reforma<strong>da</strong> por<br />
portaria <strong>de</strong> 04 <strong>de</strong> .lulho <strong>de</strong> 1892.<br />
ICm 83 <strong>de</strong> Julho <strong>de</strong> 1891. foi crea<strong>da</strong> por <strong>de</strong>creto a Escola d'Artes e Officios.<br />
l'or portaria <strong>de</strong> 97 <strong>de</strong> Dezembro <strong>de</strong> 189t crearam-se escolas <strong>de</strong> ensino primario<br />
cornplemeiitar em Pon<strong>da</strong>, Neurá, etc., etc.<br />
Em 1898 crearam-se uma escola <strong>de</strong> portiiguoz, e outra <strong>de</strong> mahratta em<br />
voll>oy.<br />
I'or portai.ia provincial <strong>de</strong> 1') <strong>de</strong> Novembro <strong>de</strong> 1901 foi creado em Goa um<br />
curso <strong>de</strong> allem;io, e rm 1903 fiindou-se mais uma escola para o sexo masculino<br />
em Hivona.<br />
k'inalmentc:, por portaria <strong>de</strong> 6 <strong>de</strong> Agosto <strong>de</strong> 1907, foram fun<strong>da</strong>dos em Taleigão<br />
iiin parque florc*stal e tim jardim d'agricultiirn. para ensaios <strong>de</strong> accliinataqlio <strong>da</strong>s<br />
plaiitas uteis. A(:tualniente existem lia Iridia portugueza 99 escolas <strong>de</strong> erisino<br />
priinario <strong>da</strong>s qli:rc.s: (;'i regias, 14 inuiiicipues e '21 particulares, tendo sido a frequencia,<br />
registad;~ tia Estatistica <strong>da</strong>s l'ossessões Ultramarinas em 1'303, <strong>de</strong> 4:133<br />
alumnos do sexo iiinsciilino e 1.9!)4 do sexo feminino.<br />
Existem os seininarios <strong>de</strong> Daniiio frequentado em 1300 por 1% alumnos ; e<br />
o <strong>de</strong> Hachol (semiiiario patriarchal) que n'esse anno acciisou a frequencia <strong>de</strong> 1:092<br />
alumnos.
NO lyceu <strong>de</strong> Nova Goa, equiparado aos lyceus nacionaes do reino, havia no<br />
anno lectivo <strong>de</strong> 1900-IWi, 518 alumnos matriculados entre internos o externos. Na<br />
Escola Normal <strong>de</strong> Goa n'esse anno a frequeiicia era <strong>de</strong> 83 alumnos. Nas duas<br />
escolas miinicipaes seciin<strong>da</strong>rias <strong>de</strong> Margjo e <strong>de</strong> illap~iqi a freqiiencia foi <strong>de</strong> 3.3<br />
alumnos.<br />
Finalmente, para completarmos a lista dos actoues estabelecimentos <strong>de</strong> ensino<br />
<strong>da</strong> India Portugueza, falta-110s apenas mencionar ti Escola Medico-Ciriirgica<br />
<strong>de</strong> Nova Goa, que é o unico estabelccirnento <strong>de</strong> ensino superior que possuimos<br />
nos colonias.<br />
No anrio escolar <strong>de</strong> 1900-1901 a frequencia ao curso medico-cirurgico foi <strong>de</strong><br />
176, e ao curso pharmaceiitico <strong>de</strong> li alumnos. Pelos <strong>da</strong>dos estatisticos <strong>de</strong> t!HX), o<br />
recenseamento <strong>da</strong> popiilaçáo accusou unia totali<strong>da</strong><strong>de</strong> dr t>91:599 habitantes, dos<br />
quaes 559-3 sabendo ler e escrever. Quanto aos effeitos <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong> religiosa,<br />
os <strong>da</strong>dos estatisticos diio a massa <strong>da</strong> população dividi<strong>da</strong> em 263:618 catholicos,<br />
P60:144 hindus, 8:431 mahometanos, e 575 parses,jains e diversos.<br />
Moçambique<br />
Ea primitiva phasc <strong>da</strong> occupaç50 to<strong>da</strong> a instrucção se limitou ao ensino <strong>da</strong><br />
doutrina e inoral christá, e <strong>da</strong> lingiia porlugucza, feito por missioiiarios.<br />
KO começo do seculo xvi os ,jcsiiitas fun<strong>da</strong>ram em Moçambique um impor-<br />
tan te collegio.<br />
Em 1'799 creoii-se em Moçambiqiie lima escola primaria, e em I818 crearam-<br />
se novas escolas primarias em Qiielimant! e nas ilhas do Cabo Drlgado; em 1856<br />
fun<strong>da</strong>-se uma escola elementar em Iiihambane. Em harnionia com o <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 14<br />
<strong>de</strong> Novembro <strong>de</strong> 1857 crearum-se em Moçambique tres cscolas hilinguas <strong>de</strong> por-<br />
tuguez e arabe.<br />
A portaria regia <strong>de</strong> 29 <strong>de</strong> Maio <strong>de</strong> 1863 poz rm execução n'esta colonia, um<br />
plano <strong>de</strong> iiistrucçáo primaria, secun<strong>da</strong>ria, industrial e rhetorica (i), com a faciil-<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong> parii os indigenas <strong>de</strong> terminarem os seus estudos no seminario patriarchal<br />
<strong>de</strong> Goa.<br />
Em 1863 havia em Moçambiqiie, no convento <strong>de</strong> S. Domingos, uma escola<br />
para raparigas indigenas. A portaria <strong>de</strong> 26 d'Agosto <strong>de</strong> thi9 crrou tambem rm<br />
Moçarnbicllie uma escola d'artes c. oflicios. Eni 1893 iiiaiiguroii-se em Loiircnço<br />
Marques o liistitiito D. Amclia para educa(;Ro <strong>de</strong> raparigas iiidigenas, o qual tem<br />
prestado muito bons serviyos. Tamb(1iii ii'esse atino foi iiiicia<strong>da</strong> a construcqiio<br />
ua Cabaceira-Gran<strong>de</strong> jciii freiite <strong>da</strong> ilha dc Moçambiq~ie) d'iirn edificio, <strong>de</strong>stinado a<br />
escola para indigrnas do sexo femiiiiiio.<br />
Em 1895 foi fun<strong>da</strong><strong>da</strong> em Mopcbia uma escola <strong>de</strong> riisiiio primario.<br />
A escola <strong>de</strong> artes e oflicios foi reorganisa<strong>da</strong> pelo prelado <strong>da</strong> diocese ein 1896 ;<br />
e <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1!KYJ os aliimiios d'csta escola sRo adrnittidos nas oflicinas navaes <strong>da</strong><br />
Catembe (Loiireiiqo Marques).<br />
A missão <strong>de</strong> L'Haiigiiene fundou uma escola agricola perto <strong>de</strong> Lourenço<br />
Marques em harmonia com o <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 14 <strong>de</strong> Janeiro <strong>de</strong> lc305.<br />
sa escola districtal profissional <strong>de</strong> Lourenqo blarqiies instituiu-se, por por-
120 I'OLITI('A INDIGENA<br />
- - -<br />
tarin tlt: I. <strong>de</strong> Dezcmliro dc 1!)OT, iiiii c,iii.ro (~sprcial dr liiigiin portugueza para os<br />
aliirririos rllic se <strong>de</strong>stiiinssem ao prol'c~ssoi-titlo [iroviricicil. Ein Rloçaiiibique exisleiii<br />
actualiiiciilc, alérn <strong>da</strong>s já mencioiiados vrcoli~s do cirlcs e ullicio~, <strong>de</strong> agricultura, I,<br />
liistiltito D. Anielia, 48 escolas priir:iirias para o soxo iiiiisciilino, c 18 para o sexo<br />
f'iiiiiiiiio, ciii gran<strong>de</strong> parte inissionnrins. Assiiii, em to<strong>da</strong> a proriiiciil Iiavia jíí eiii<br />
l!K)li., 16 cscolas mixlas <strong>de</strong> missionarios cnlliolicos no districlo <strong>de</strong> %ainbt:zia, 4 nii<br />
rc%qi;ío dcl (jaza e 8 rio districlo dc 1,oureiiço b1:irques. A niissco Horiiaii<strong>de</strong> possiicJ<br />
4. estoyi~cbs tle propagan<strong>da</strong> e <strong>de</strong> eiisiiio tio distrirto <strong>de</strong> 1.oureriyo Blarcliics, unia n:i<br />
citladc e os rc?slniilcs 1:in Aiitiol:n, 'i'c,iiilie 1li~lii:iiit~; a riiissào <strong>de</strong> Lourtlriqo Alarqucs<br />
mantem succursacs na hhacnii;~, I~il,nllii. bla~niub, Manliuùiie, Zililaki i,<br />
Macheba, ca<strong>da</strong> uiiia <strong>da</strong>s quaes adiiiiiiistra I I rsc.ol;is frrqiieiita<strong>da</strong>s por mais cl(b to')<br />
aliiinnos. As coinp;iriliiiis <strong>de</strong> &ioqniiil~it~iir, %nnil)czin c Kyassa s~islc~iitniii nos seus<br />
imnieiisos tcrritoiios iurins csc.olns ~)r.iiiiarins nii;tlopas ás tlo Estado. Assiiii n<br />
primeira tem c:itico escul;is p;ir:~ o sexo iiint-c.iiliiio na Ileira, ciii Kot'iiln, Sciia,<br />
Chiloanc! e illncccliircc, ts tliins 11iwa o sexo l'tniriino tici Ileira e rrii Sofala. A niis-<br />
siio religiosa dr C1iiiliai:g:i (11'ri.itoiio <strong>da</strong> Coiiiliaiitiia dt! hloçarnbic~iit~), teni urna<br />
escola ii'aquc.lln I~;c~tilidirtl~~, c iinia ~iiccursal ein ?Ilotiindo. proxiiiio <strong>da</strong> Beira.<br />
Em It;!ll)-1900 ;i I'rc~t~iiriiciir íís cscolas tla proviiici;~ <strong>de</strong> b1oy;iiiil~ic~iie foi <strong>de</strong><br />
1215 iiitlijicii;~~ rep;ii,tidos cla ~e~iiiiitc foiirici: oscoI;is rrgias tl(i, iiiiiiiicipacs 412,<br />
~~arliriil~irt~s ::O, c iiiissioii;irias (i()!). 15' tle stippoi. cliic nc~liinlrnciile esse iiumero s(>,jii<br />
iiiiiis elevado. iiias I'iiltani-nos os dridos cslntislicc~s (;iic\ o pocl(.riorii iiiostrar.<br />
Angola<br />
Coirio ciii Moçaini~ique (! coiiio cliii totias as oiili,:is rolotiias, diiraiite longo<br />
tempo, o ensiiio foi exi~l~isi\~amciitc riiiiii~lrntlo ~)c>liis iiiissi,t~s religiosas. A carta<br />
regia <strong>de</strong> 11 tlc Sctcnibro <strong>de</strong> 1618 a~ic:torisoii a fiiiitliiyGo cin 1,onn<strong>da</strong> d'um collegio<br />
<strong>de</strong> ,jesiiitiis, (li sliiiiiclo a rnsiiiar nos iiidigcnas :L Icil~ira, escripla, grrirnmalica r<br />
analyse <strong>da</strong> liiigiiil porttigueza. Em 16'74 fiindou-se eiii Angola ~iii:a aula <strong>de</strong> geome-<br />
tria e <strong>de</strong> stratcbgia, qiie foi muito freqmueiita<strong>da</strong>, e que durava ain<strong>da</strong> em 181.3.<br />
Em ISiY crcoii-se iiiiin escolti pratica <strong>de</strong> francez e inglez em 1,oan<strong>da</strong>.<br />
Por portaria rrgin do 17 d';ibril <strong>de</strong> 185'2 foi crearla eiii Rlossanic<strong>de</strong>s usa<br />
escola para rtil~:ii.ipas iiitligc~ria~i. Erri ISQli-1849 existiam já cscolas primarias mtiilo<br />
frccl~~etilatl;~~ riii F:iicopr: Jl~ixima, (:;iliiinbo etc.<br />
Por <strong>de</strong>crtato <strong>de</strong> 2:: tlc .lulho tlc. 1S:):J creou-se um scminario cin Idoan<strong>da</strong>.<br />
Em 1858 f~irido~i-se<br />
ii'essa citl;ltlt, iiiii iiiternnto para ensiiio do latim. i!)<br />
I:iii ti <strong>de</strong> Oiitiibro dc 1868 foi c:reti
graptios) ; tio scmiriario (cursos commercial e <strong>de</strong> iiiterpretes) ; na escola eleinentar<br />
agricola do Alto Dati<strong>de</strong> e iia escola <strong>de</strong> aprendizagem <strong>de</strong> Benguella.<br />
Por portaria <strong>de</strong> 13 <strong>de</strong> Novembro <strong>de</strong> 1907, estabeleceu-se um jardim agricola<br />
<strong>de</strong> ensaios cru Cazengo.<br />
A 20 <strong>de</strong> Dezcmbro <strong>de</strong> 1908 o governador geral I'aiva Couceiro, <strong>de</strong>terminou<br />
c1i1e se estabeiecessem ofliciiias na fortaleza <strong>de</strong> S. Sebastião <strong>de</strong> Loan<strong>da</strong>, a fim <strong>de</strong><br />
ensinar aos indigenas <strong>de</strong> ambos os sexos, as profissões mais uteis ás necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
<strong>da</strong> sua condicão social.<br />
A organisação escolar aclual comprehen<strong>de</strong>: 52 escolas <strong>de</strong> ensino primario<br />
para O sexo niasculirio, 10 para o sexo feminino, e iim seminario.<br />
Estas escolas í'oiain frrqut~iita<strong>da</strong>s (.i11 15!l8-3b!;9 por 1:84õ pretos ou mestiços<br />
c em 1S08 por 1:Et:íJ alunnos, d'oti<strong>de</strong> se YC que se tem conservado estacionaria a<br />
I'rc:quericia escolar que tanto conviria tázer crescer rapi<strong>da</strong>men te.<br />
As cscolas cita<strong>da</strong>s não siío (~nclusivamente leigas, pois taiito as Missóes do<br />
Espiriio Fanto como as do Real Padroado, possiiem muitas escolas na provincia,<br />
siib~encioria<strong>da</strong>s pclo Estado. Ás priuieiras pertencem as escolas <strong>de</strong> Lan<strong>da</strong>na,<br />
Luale, Cabin<strong>da</strong> e Liiriilla, e mais tres escolas servi<strong>da</strong>s por irmãos <strong>da</strong> Missão.<br />
Teern lambem as escolas volantes <strong>de</strong> Massabi, N'guvo, Kukzrbii-Liambi, Barão <strong>de</strong><br />
p~ir~a, Povo Gran<strong>de</strong>, Bl'pclla, Kyinonibé e Kui<strong>de</strong>n<strong>de</strong>. 1; no annexo <strong>de</strong> Luale que aio<br />
preparados cs mestres e ciitt~cliistas indigeiias, recr~itados entre os melhores<br />
alumnos <strong>da</strong>s outras escolas. Ko Conpo Portuguez temos as escolas do Real Padroodo,<br />
em S. Salvador, Ma<strong>de</strong>ciibe e Santo Sntonio do Laire. No interior em Malaagc<br />
ha missócs-escolas para ambos os sexos nas locali<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> Ginga e Cuango.<br />
No asylo D. l'eclro V em I,onn<strong>da</strong>, lia 40 alumnos indigeiias. No districto <strong>de</strong> Hengiiclla<br />
ha sete missões-escolas: missão central em Cacon<strong>da</strong> com duas escolas, e<br />
uma escola em ca<strong>da</strong> iim dos seguintes pontos: Bihé, Ilailiiiido, Catoco, Cassinga<br />
e Maiiaca, frequeritatias ao todo por 530 alumnos. Wo districto <strong>de</strong> Mossame<strong>de</strong>s<br />
alktn <strong>da</strong>s escolas <strong>da</strong> missáo central na I-luillii e do scminaric-rollegio, existe uma<br />
caea <strong>de</strong> educação para o sexo ferniriirio, e rni~sões-t~~c01as em lau, Chicongura,<br />
Kihita, Mulolo dos Gainbos, hloriiriho e Ciianhama.<br />
Cabo Ver<strong>de</strong><br />
O ensino começou a ser miiiistrado aos indígenas cm 1466 pelos fra<strong>de</strong>s<br />
franciscanos que alli manlivrram por dilatado periodo o exclusivo d'esse crisirio<br />
meramentr relik' 'IOSO.<br />
O alvarii <strong>de</strong> Ih<strong>de</strong> Março <strong>de</strong> 1555, ereou uma escola <strong>de</strong> grammatica latina.<br />
Eiii Ribeira Gran<strong>de</strong>, que foi <strong>de</strong> 1560 a 1751 a capital do archipelago, existiu<br />
uin irnportaiitr seiiiit-iario diocesaiio, ciijns ruinas ain<strong>da</strong> hoje alli se po<strong>de</strong>m<br />
observar.<br />
Lni 1740 jk ;l,sibt i,i u~ii importante collegio dos jesuitas.<br />
Por portaria ic5gi;i <strong>de</strong> 10 d(3 Janeiro <strong>de</strong> 1839 foram crea<strong>da</strong>s duas quintas-es-<br />
I<br />
colas em S. \'ic~riite e Santo Antão.<br />
I<br />
Em 184s foi especialmente regulamenta<strong>da</strong> a escola principal crea<strong>da</strong> pelo <strong>de</strong>creto<br />
geral <strong>de</strong> 1815.
123 POLITICA INDIGENA<br />
Por portaria regia <strong>de</strong> 95 <strong>de</strong> Junho <strong>de</strong> 1833, procurou-se provocar a diffusão<br />
do ensino c? educação dos indigenas, e por portaria regia <strong>de</strong> 3 <strong>de</strong> Julho <strong>de</strong> 1828<br />
foram reorganisados os serviços <strong>de</strong> iiistrucção primaria.<br />
O prelado <strong>de</strong> Cabo Ver<strong>de</strong> L). Patricio <strong>de</strong> Moura, fundou a expensas suas, em<br />
1832, na Ilha do Fogo, escolas <strong>de</strong> instruccão primaria, <strong>de</strong> theologia moral e <strong>de</strong><br />
latim.<br />
Por portaria regia <strong>de</strong> 16 <strong>de</strong> Dezembro <strong>de</strong> 1857, creou-se na Praia uma escola<br />
para raparigas indigenas.<br />
Em 15 <strong>de</strong> Dezembro <strong>de</strong> 186ü, creou.se um lyceu na Ci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> Praia.<br />
A portaria regia <strong>de</strong> 16 d'Abril <strong>de</strong> 1866, creou na Ilha <strong>de</strong> Santo Antão duas<br />
escolas para o sexo feminino, e por <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 3 dc Setembro do mesmo aniio,<br />
creou-se em S. Nicolau o seminario-lyceu que ain<strong>da</strong> hoje alli existe. Na ci<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
<strong>da</strong> Praia, em 1872, já havia aulas nocturnas para os indigenas que a tarefa do dia<br />
impedisse <strong>de</strong> concorrer aos cursos diurnos.<br />
Por <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 19 <strong>de</strong> Novembro <strong>de</strong> 1873, crearam-se na Praia e na Ilha <strong>de</strong><br />
Santa Catharina, duas escolas para o sexo feminino.<br />
Em 1889, aliim do lyceu-seminario <strong>de</strong> S. Nicolau, e d'uina escola principal,<br />
havia trinta escolas primarias para rapazes e nove para raparigas.<br />
Por <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 15 <strong>de</strong> Julho <strong>de</strong> 1886, foram crea<strong>da</strong>s tres escolas primarias<br />
em Santo Antão.<br />
Por <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 24 <strong>de</strong> Dezembro <strong>de</strong> 1899, foi reformado todo o cnsino.<br />
Pelo <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 5 <strong>de</strong> Selembro <strong>de</strong> 18!)5, fundou-se mais unia escola primaria<br />
em Ribeira <strong>da</strong> Cruz (Santo Antão), e por <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> i0 <strong>de</strong> Fevereiro <strong>de</strong> 1898,<br />
creou-sc uma escola para o sexo feminino em S. Vicente.<br />
Em 19 <strong>de</strong> I'cvereiro <strong>de</strong> 1902 foram crea<strong>da</strong>s mais tres escolas primarias, e<br />
1~10 Alvará provincial <strong>de</strong> "L dd'Abril <strong>de</strong> 1903. ficou auctorisa<strong>da</strong> a fun<strong>da</strong>çáo na ci<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
<strong>da</strong> Praia d'uiiia associação <strong>de</strong>stina<strong>da</strong> á propagan<strong>da</strong> educativa dos indigenas.<br />
Actiialmente (Estatistica <strong>de</strong> 1900) existem em todo o archipelago, além do seminario<br />
<strong>de</strong> S. Nicolau, 69 escolas primarias assim reparti<strong>da</strong>s: regias para o sexo<br />
masculino 37 ; regias para o sexo feminino 10; municipaes para o sexo masculino<br />
10 ; municipaes para o sexo ferniiiino 5 ; particulares para o sexo masculino 5 ;<br />
particulares para o sexo feminino 2. Como escolas profissionaes existem, uma escola<br />
<strong>de</strong> serralheiros, uma <strong>de</strong> pilolageiii elementar. uma cie alfaiates e sspateiros e<br />
duas escolas <strong>de</strong> opvrarios <strong>de</strong> construcyijc.~. A populiiyáo recensca<strong>da</strong> cm l(W0 foi<br />
<strong>de</strong> 147:i24 habitantes, dos qiiaes sabiaiii ler e escrevtlr 15:h8Z, sabiam só ler 2:007,<br />
e freyuentaram as escolas primarias e o seminario-lyceu 4:6I2 alumnos, 3:931 do<br />
sexo masculino (i83 do sexo feminino. A religiáo professa<strong>da</strong> é a catholica roinana,<br />
a cujo crrtlo se acham convertidos todos os iiidigeiias.<br />
Pelo exanitb iiitento <strong>da</strong>s estatisticas prorinciaes reconhece-sr o progressivo<br />
arigineiito <strong>da</strong> ra(
Guiné<br />
Priiiiilivameiite o eiisiiio era quasi euclusivainenle religicass e a cargo dos<br />
missionarios. Em 1859 uma companhia colonial fundou um seminario, approvado<br />
por <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 1'7 <strong>de</strong> Maio d'esse anno e que, sr chegou a ter alguma existeiicia,<br />
<strong>de</strong>ve ter sido tlpheinero.<br />
O ensino primario foi regulado ein 1845, e successivarrictilc rcorganisado<br />
em 1869 e ein 18902. Actualinente (Estatistica geri11 <strong>da</strong>s Possc~ssórs Ultramarinas<br />
para 1900), existem alli sete escolas primarias para O sexo masculino e tres para<br />
o sexo feminino, que cm 1!l(K) foram frequenta<strong>da</strong>s por 2%) indigenas pretos e ines-<br />
tiços : 315 rapazes e 84 raparigas E' <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as nossas coloiiias aquella em que<br />
os serviços <strong>de</strong> instrucqiio mais <strong>de</strong>scurados teem sido, e que hoje mais ru<strong>de</strong>mente<br />
patenteia os resultados lamentaveis d'essa criminosa negligencia.<br />
S. Thomé e Principe<br />
O ensino religioso e <strong>da</strong>s linguas portiigueza e latina, foi <strong>de</strong> principio ministrado<br />
pelos eremitões <strong>de</strong> Santo Agostinho que se estabeleceram nas duas ilhas<br />
em 1200, edificando escolas indigenas junto <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> templo.<br />
Ein 28 <strong>de</strong> Maio <strong>de</strong> 1822, fundou-se na provincia uma escola <strong>de</strong> geometria,<br />
arilhmetica, <strong>de</strong>senho e lingua fraiicrza.<br />
Segui<strong>da</strong>inente os <strong>de</strong>cretos que já tivemos occasi5o <strong>de</strong> citar, <strong>de</strong> 14 d'dgosto<br />
<strong>de</strong> 1&5,<br />
14 <strong>de</strong> Setembro <strong>de</strong> 1855, modificaram o regimen <strong>de</strong> ensino em S. Thomé.<br />
Por portaria regia <strong>de</strong> 15 d'Outubro <strong>de</strong> 1855, foi crea<strong>da</strong> em S. Thomé uma<br />
escola leiga para o sexo feminino.<br />
Em 20 <strong>de</strong> Seteinbro <strong>de</strong> 18ti5, foram crea<strong>da</strong>s escolas primarias em Sant'Anna<br />
e Santo Amaro (S. Shomé~, e a portaria <strong>de</strong> 5 <strong>de</strong> Noveinbro <strong>de</strong> 1878, creou escolas<br />
especiaes para os angolntes. O <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 17 d'Agosto <strong>de</strong> 1880, <strong>de</strong>terminou que as<br />
municipali<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> S. Thome e Principe çreasseni escolas primarias para instrucção<br />
dos serviçaes <strong>de</strong>stinados B exploração agricola <strong>da</strong>s roças.<br />
Por <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 23 <strong>de</strong> Junho <strong>de</strong> 1880 forani crca<strong>da</strong>s mais duas escolas primarias,<br />
e por portarias <strong>de</strong> 15 <strong>de</strong> Seteiribro <strong>de</strong> 1880 e <strong>de</strong> 81 <strong>de</strong> Julho <strong>de</strong> 1881, outras<br />
duas escolas na Mag<strong>da</strong>lena e em Anna <strong>de</strong> Chaves. Por portaria <strong>de</strong> 16 d'Abril <strong>de</strong><br />
lm5, foi crea<strong>da</strong> uma escola para o sexo feminino em S. João Baptista dlAjudá.<br />
I'or <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 97 <strong>de</strong> Sbril <strong>de</strong> 1889 creou-se uma escola para rapazes na al<strong>de</strong>ia<br />
<strong>de</strong> Trin<strong>da</strong><strong>de</strong>, na ilha <strong>de</strong> S. ThoniP.<br />
Em 1W3 constituiu-se ri'aquella ilha a associaqno « Pro patria », essencialnieiite<br />
<strong>de</strong>stina<strong>da</strong> á propagan<strong>da</strong> <strong>da</strong> iiistrucçiio c <strong>da</strong> moral iia socie<strong>da</strong><strong>de</strong> iodigena.<br />
Pelo <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 18 <strong>de</strong> Janeiro dc IitOCi (Ensino profissional nas colouias) foi<br />
crpa<strong>da</strong> em S. Thomé uma escola <strong>de</strong> artes e ofiicios.<br />
A estatistica <strong>de</strong> 190 nfio accusa a exislencia <strong>de</strong> escolas na ilha do Priiicipe,<br />
talvez por 1150 terem sido enviados os respectivos <strong>da</strong>dos estatisticos, e registou<br />
na ilha <strong>de</strong> S. Thomé 6 escolas primarias para o sexo masculino e 3 para o sexo<br />
feminino, frequenta<strong>da</strong>s n'aquelle antio por 0'86 indigenas, dos rjuaes 525 rapazes e<br />
57 raparigas.
Lim subsidio especial, como remuneraç80 do servico <strong>de</strong> propagan<strong>da</strong> instructiva <strong>de</strong><br />
qiie os encarregava.<br />
Pelos <strong>de</strong>cretos <strong>de</strong> 27 <strong>de</strong> Dezembro <strong>de</strong> 1856, e <strong>de</strong> 23 <strong>de</strong> Jlarço <strong>de</strong> 1838, foi<br />
<strong>de</strong>terminado que se traduzissem o catechismo e doutrina christfi, nas linguas<br />
Teto e Vaqueno falla<strong>da</strong>s n'aquella ilha.<br />
Eni 1863 havia unia escola elementar para o s ~so masculiiio em Batiigadé, e,<br />
por essa cpocha, creoli-se em Tiinor uma escola especialmente <strong>de</strong>stina<strong>da</strong> aos filhos<br />
dos chefes indigenas. Em 28 <strong>de</strong> Junho <strong>de</strong> 1861 foram crea<strong>da</strong>s 4 escolas primarias<br />
na ilha <strong>de</strong> l'imor, r\istiiido já n'esse anno duas escolas primarias em Maiiatato.<br />
O <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> reorgaiiis;ty;io do ensino profissional (I8 <strong>de</strong> Janeiro <strong>de</strong> 1906) tambem<br />
creoii em Timor urna escola d'artes e officios.<br />
Incluitido esta existem nlli actualmente 6 escolas primarias para o sexo<br />
masculirio e 3 para o sexo feiniiiino. A frequencia escolar em 1900 foi <strong>de</strong> 338 alumnos<br />
dc ainbos os sexos e assim repartidos : escolas regias 877; municipaes 48 ;<br />
missioiiaiias 15. Não se fez ain<strong>da</strong> o recenseameiito geral <strong>da</strong> popu1ac;Zo <strong>da</strong> ilha.<br />
Estamos assim cliegarlos ao termo d'esta longa citaçáo <strong>de</strong> leis e <strong>de</strong><br />
<strong>da</strong>dos estatisticos que repiitlimos iiidispensavel para se avaliar <strong>de</strong>vi<strong>da</strong>mente<br />
o atrazo <strong>da</strong> nossa obra civilisadora nas colonias. Excepção feita <strong>da</strong> GiiinB<br />
que habitualmente tão <strong>de</strong>spreza<strong>da</strong> tem sido pelos po<strong>de</strong>res publicas, to<strong>da</strong>s<br />
as oiitr:~s colonias receberam iiin ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro diluvio legislativo sobre ma-<br />
teria <strong>de</strong> instriic.(;ão tão avantajado cm documentos como estcril <strong>de</strong> resulta-<br />
dos praticos.<br />
E' <strong>de</strong> iirgencia inadiavel qiie todos os orc;amentos ultramarinos<br />
<strong>de</strong>dicliiem ao serviço <strong>da</strong> instriicçáo dos indigenas, verbas importantes qiie,<br />
não sendo absolntamente incompativeis com os recursos financeiros do paiz,<br />
contribiiurn cfficazmente para a rcalisaçáo pratica d'um ensino primario c<br />
profissional, táo generulisado qiianto possivel. Para civilisar é preciso edu-<br />
car e instruir, e se 1163 moralmente temos o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> civilisar os indigenas,<br />
tnmbem cconomicamerite retiraremos iim beneficio maximo d'essa civilisaçáo.<br />
Entre todos os paizcs coloniaes talvez sqja a França, aquelle que<br />
nos itltimos tempos com m;~is interesse se tcrn <strong>de</strong>dicado á diffusao do ensino<br />
indigenn, c m:iis sacrificios pccuniarios se tem imposto para consegiiir cs-
126 POLITICA INDIGENA<br />
tabelecê-10 em to<strong>da</strong>s as colonias sob formas praticas, efficazes e em accordo<br />
com as condiçóes locaes.<br />
Julgamos por isso interessante examinar <strong>de</strong>ti<strong>da</strong>mente os processos<br />
adoptndos pela França <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a leicisaçiio do ensino leva<strong>da</strong> a effeito nas<br />
suas colonias em 1903, e observar qriaes os resiiltados qtie a instrucçáo,<br />
essa po<strong>de</strong>rosa arma <strong>de</strong> politicn incligcna, tem <strong>da</strong>do nos diversos cstabele-<br />
cimentos coloniaes <strong>da</strong> Franc,:a.<br />
Ensino indigena nas colonias francezas<br />
Senegal<br />
Começaremos pelo Senegal qiie 6 uma <strong>da</strong>s mais antigas colonias<br />
francezas e ci!ja organisação escolar se po<strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rar como typo do sys-<br />
tema educatiro segiiido em to<strong>da</strong> a Africa Occi<strong>de</strong>ntal franceza, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que<br />
se leicisoii o ensino em to<strong>da</strong>s as colonias. Como E sabido, no Senegal ha<br />
inniimeras rnc;as african;~s physicamente distinctas e professando religióes<br />
diversas ; como, porém, o fctichismo <strong>de</strong> longa <strong>da</strong>ta tem cedido o passo ao<br />
proselytismo islamico, e <strong>de</strong> ha milito tempo qiie a gran<strong>de</strong> maioria <strong>da</strong> populaçíio<br />
negra professa a doiitrina alkoranica, todo o ensino official até<br />
1903, quasi exclusivamente congreganista, mais afugentava do que atkrahia<br />
os miistitman(~s, receiosos <strong>da</strong>s tentativas <strong>de</strong> convcrs5o.<br />
Com a neutrali<strong>da</strong><strong>de</strong> religiosa que, a partir d'essa <strong>da</strong>ta, caracterisa<br />
todo o ensino leigo official e particular, tcm aiigmentado immenso, como<br />
<strong>de</strong>pois veremos, a frequencia escolar. No Senegal po<strong>de</strong>m distinguir-se duas<br />
especies <strong>de</strong> estabelecimentos dc instriicçTio: escolas arabe-nlkoranicas e<br />
escolas franco-indigenas ou francezas. Nas primeiras, organisa<strong>da</strong>s atè<br />
mesmo ao ar livre, nas ruas ou em pateos iiiteriores, ensina-se a lingaa<br />
arabe, fallscia ou escripta, e recitam-se versicnlos do Alkorão. São dirigi<strong>da</strong>s
por marabus, lettrados musulmanos que propagam a lingua e a doutrina<br />
islamica.<br />
Em 1906 existiam 118 d'essas escolas com 3:020 alumnos nos terri-<br />
torios <strong>de</strong> posse directa, e 1:290 com 8:906 alumnos na região do protecto-<br />
rado, oii seja para todo o Senegal 1:413 escolas com ll:!)26 alumnos.<br />
Mr. AndrB Metin, professor <strong>da</strong> Escola Colonial <strong>de</strong> Paris, propóe que,<br />
á semelhança do que se fez no Egypto, se procure introduzir poiico a<br />
pouco n'estas escolas o ensino <strong>da</strong> lingua franceza, subsidiando para esse<br />
effeito os respectivos marabus.<br />
Parece-nos pouco realisavel esta i<strong>de</strong>ia, ate certo ponto incompativel<br />
com o odio ao infiel, que caracterisa todo o musulmano fanatico <strong>da</strong>s raças<br />
mai.: atraza<strong>da</strong>s.<br />
htr. Risson, director <strong>da</strong> instriicçáo publica no Senegal, reconhecendo<br />
essas difficiil<strong>da</strong><strong>de</strong>s actuacs, espera qiie alguma coisa se conseguirá com a<br />
proxima creaçáo, em S. Tiuiz, <strong>de</strong> lima me<strong>de</strong>rsn ou escola superior <strong>de</strong> ensino<br />
arabe, em cujo programma será contido o ensino do francez. As escolas<br />
franco-indigenas, que tambem se po<strong>de</strong>riam cliamar franco-arabes, porque os<br />
outros dialectos indigenas taes como uolof, tuculor, barnbara, não se prestam<br />
ao ensino, viram augmentar extraordinariamente a frequencia <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que a<br />
leicisação tranquillisou os escrupulos religiosos dos indigenas musiilmanos,<br />
que agora pcrmittcm livremente aos filhos a concorrencia áqiielles estabe-<br />
lec~iiiicntos <strong>de</strong> ensino, principalmente na mira <strong>da</strong> habilitação possivel para<br />
os cinpregos pnblicos. Teem-se envi<strong>da</strong>do muitos esforços para conseguir que<br />
um iifroiixameiito <strong>da</strong> clausura gyneccal 6dcnlte ao sexo feminino o accesso<br />
ás escolas, e, embora ain<strong>da</strong> hoje o numero <strong>de</strong> alumnas seja pequeno, os<br />
resiiltados começam a ser mais animadores. O ensino elementar ou do 1.0<br />
graii é ministrado nas al<strong>de</strong>ias, em escolas dirigi<strong>da</strong>s por iim professor indi-<br />
gena que ensina o arabe e o francez fallado; em todo o Senegal existem<br />
19 d'essas escolas com 815 aluninos do sexo masculino.<br />
A instriicc,ão primaria complcmcntar professa-se nas escolas regionaes<br />
,u iirbanas. Actualmente existem dixas escolas regionaes profissionaes,<br />
Lima <strong>da</strong>s quaes mixta e sita em Tlii6s; sete escolas urbanas para o sexo<br />
masciilino e quatro para o sexo feminino em S. Liiiz, Dakar, gore^
128 POLITICA IXDIGENA<br />
e Rufisque, frequenta<strong>da</strong>s em 1906 por 2:039 rapazes e :I96 raparigas.<br />
Estáo em projecto mais 7 escolas d'esta cathegoria nas 7 restantes se<strong>de</strong>s<br />
<strong>de</strong> cireumscripçúes administrativas.<br />
A ca<strong>da</strong> escola regional estk annexa uma secção agricola e, sempre<br />
que os rcciirsos locaes o permittem, uma sec(;;io regional dc traballio me-<br />
chanico e manual.<br />
Nas escolas para rdparigas, essa secção comprehen<strong>de</strong> pratica <strong>de</strong><br />
costura, córte, cosinha, Iiygienc e economia dorncstica, e 6 dirigi<strong>da</strong> por<br />
uma professora eiiropeia.<br />
Em Daliar existe uma escola profis~ional <strong>de</strong> citthcgoria superior, a<br />
escola Pinet-Lapradc, que fornece o mestrado <strong>da</strong>s offlcinas. Em S. Lniz<br />
lia uma escola com duas divisúes. Na primeira o5tcm-se a carta <strong>de</strong> pro-<br />
fessor dc instriicçáo primaria, váli<strong>da</strong> para to<strong>da</strong> a Africa Occi<strong>de</strong>ntal fcan-<br />
ceza; na segun<strong>da</strong> ha um curso <strong>de</strong> interpretes; um curso que prepara os<br />
kai<strong>de</strong>s, ou juizes musulmanos, e on<strong>de</strong> se ensina o direito miisiilmsno do rito<br />
malekita e noçúes geraes <strong>de</strong> direito francez ; e, finalmente, um curso para<br />
os filhos dos chefes indigenas que <strong>de</strong>vem her<strong>da</strong>r as suas funcçóes, e qiie<br />
alli apren<strong>de</strong>m varias noçúes <strong>de</strong> adrninistraç50 publica e contabili<strong>da</strong><strong>de</strong>. Em<br />
S. Luiz ha tambcm a escola Faidhcrbc com secr;ócs <strong>de</strong> iriatrucçii*j primaria<br />
especial, commercial e administrativa, que prepara para os corpos inferiores<br />
<strong>da</strong>s obras publicas, alfan<strong>de</strong>gas e correios.<br />
Em 1902, existindo ain<strong>da</strong> o ensino congreganistii, a totali<strong>da</strong><strong>de</strong> dos<br />
alumnos em to<strong>da</strong>s as escolas senegalezas (franco-indigenas) foi <strong>de</strong> 2:702,<br />
correspon<strong>de</strong>ndo A <strong>de</strong>speza orqamental <strong>de</strong> 66:2013$3340 ré is. Em 1!)06, <strong>de</strong>pois<br />
<strong>de</strong> leicisa<strong>da</strong> to<strong>da</strong> a educapão indigena, as eetatisticas accnsaram tima fre-<br />
quencia escolar <strong>de</strong> 5:222 alumnos, montando as <strong>de</strong>spczas <strong>da</strong> instrncyáo a<br />
74:72'7$180 réis. Isto mostra-nos que no periodo <strong>de</strong> quatro annos qiiasi<br />
que duplicoii a concorrencia ás escolas officiaes, tendo a respectiva verba<br />
oryamental crescido apenas urna oitava parte. esta urna prova heni fri-<br />
sante <strong>da</strong>s vantagens <strong>da</strong> politica indigena <strong>de</strong> a1)stencionismo religioso, nas<br />
colonias em que já seja muito tar<strong>de</strong> para estabelecer com proveito a pro-<br />
pagan<strong>da</strong> <strong>da</strong> evangelisação.
Argelia<br />
Na organização <strong>da</strong> instrucç80 piiblica n'esta colonia, teem-se prejiidiciiilmente<br />
reflectido as oscillaçúes constantes e variação permanente dos systemas<br />
<strong>de</strong> politica indigena, successivamente preconisados e seguidos. Assim,<br />
iima <strong>da</strong>s mais <strong>de</strong>sastrosas consequencias d'essa falta <strong>de</strong> perseverança administrativa,<br />
B a recente siippressão <strong>da</strong>s escolas bilinguas, que táo esplcndidos<br />
serviços teem prestado na Africn Occidciital e na Tiinisia á politica colonial<br />
<strong>da</strong> nação dominadora. O ensino arabe pó<strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rar-se apresentando<br />
duas catliegorias principaes. -L instrucçáo do primeiro grau é ministra<strong>da</strong><br />
nas ca.;cnlas :~ll
130 POLITICA INDIGENA<br />
-<br />
xando o primeiro ao 1yc.e~<br />
dlAlger e siipprimindo o segundo, quando tudo,<br />
ao contrario, iiconselliara a iirgencia <strong>da</strong> creaçáo immediata <strong>de</strong> um estabe-<br />
lccimcnto d'esses em ca<strong>da</strong> ci<strong>da</strong><strong>de</strong> argelina. Este crro administrativo con-<br />
siimoii-se clefinitivamcntc, com a cxtincçáo ulterior <strong>da</strong>s escolas bilingiias<br />
elcinentirres. Assim a Argelia que, sob o ponto <strong>de</strong> vista <strong>da</strong> frequencia es-<br />
colar do elemento <strong>de</strong> origem eiiropeia, forma actualmente na vanguar<strong>da</strong><br />
<strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as naçócs cirilisa<strong>da</strong>s, iriiiito puiico tcm feito para promover a in-<br />
striicçiio dos indigenao, sendo as verbas orçamentaes qiie a esse ensino se<br />
referem, ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iramente irrisorias e incomparaveis com a <strong>de</strong>nsi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong><br />
popiilação e a prosperi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> colonia. Actualmente a instrucção primaria é<br />
alli ensina<strong>da</strong> em 1377 escolas primarias e 1:423 escolas maternaes, <strong>da</strong>s<br />
quacs 245 escolas publicas para os kabylao. Segundo Leroy Beaulieu, a<br />
frequencia em 1901 foi <strong>de</strong> 147:G26 ~tlumnos, entre os quaes os musulmanos<br />
figuram com a percentagem rediizi<strong>da</strong> <strong>de</strong> 28:078, <strong>de</strong>composta em 25912 do<br />
kexo masculino e 2166 do sexo feminino, numeros estes cliie, comparados<br />
aos resultados do recenseamento geral, dão apenas iim alumno para ca<strong>da</strong><br />
170 indigenas.<br />
A instr~icção secun<strong>da</strong>ria é ministra<strong>da</strong> em <strong>de</strong>z estabelecimentos: tres<br />
lyceiis em Alger, Constantina e Oran ; e sete collegios communaes. Alem<br />
d'estes ha ain<strong>da</strong> tres estabelecimentos <strong>de</strong> ensino livre. To<strong>da</strong>s estas escolas<br />
são milito pouco concorri<strong>da</strong>s pelo elemento milsulmano que d'ellas não au-<br />
fere vantagens apreciaveis, pois a gran<strong>de</strong> maioria dos cargos publicos é<br />
ciumentamente reserva<strong>da</strong> pela administração colonial, como feudo proprio<br />
;i popiilação eiiropeia. D'estc modo, tendo sido em 1901 a concorrencia es-<br />
colar a esses estabelecinientos <strong>de</strong> ensino, <strong>de</strong> 4'270 alumnos, os musulma-<br />
nos fizeram-se represent:rr apenau por 101, o que é extraordinariamente<br />
pouco. A este proposito Tleroy Reanlicu exprcssa-se nos termos seguintes :<br />
C Digamo-lo $em ro<strong>de</strong>ios : A França n,?o tem cumprido o seu <strong>de</strong>ver para<br />
com a pop~ila?$o :trabe. Pitssa <strong>de</strong> 76 :rnnoj quc ;L domina e lhe nega a ali-<br />
tonomia governi~tiva, e ain<strong>da</strong> na<strong>da</strong> fez <strong>de</strong> realmente serio a favor <strong>da</strong> sua<br />
educação e do seu progresso. Seria neccssario qiie existissem escolas nor-<br />
maes para professores indigeiiaa, lima <strong>de</strong>zena <strong>de</strong> collegios franco-arabes<br />
ro<strong>de</strong>iados por riomerosas escolas primarias bilinguas, um certo numero dc
escolas d'artes e officios, e milhares <strong>de</strong> escolas indigenas puras e simples.<br />
Seria necessario tambem tratar <strong>de</strong> espalhar entre os indigenas uma in-<br />
strucçáo technica, agricola e industrial muito elementar, mas muito posi-<br />
tiva, sobre n alternativa intelligente <strong>da</strong>s colheitas, o emprego dos adubos,<br />
do gra<strong>da</strong>dor, do trabalho do fcrro e <strong>da</strong> ma<strong>de</strong>ira ; só assim se conseguirá ao<br />
fim <strong>de</strong> largo tempo dttr um impulso <strong>de</strong>finitivo á expansáo <strong>da</strong> Argelia. D<br />
Embora nos ultimos tempos o governo francez tenha inserido no orçamento<br />
<strong>da</strong> Argelia verbas in:~is importantes, <strong>de</strong>stina<strong>da</strong>s & instriicçHo indigena, Q<br />
provavcl que na<strong>da</strong> <strong>de</strong> ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iramente util r: efficaz se obteiilia, sem o in-<br />
dispensnvel regresso ao ensino primario bilingna, e sem uma reorganisac;ao<br />
pratica c completa do ensino agricoIa e profissional.<br />
*<br />
Tunisia<br />
. N'esta colonia <strong>de</strong> prOt~~t0rad0, o elemento indigena, ao invez do que<br />
acontece na Argelia, tem <strong>de</strong>monstrado uma gran<strong>de</strong> ten<strong>de</strong>ncia para frequentar<br />
os estabelecimentos <strong>de</strong> ensino, mostrando-se geralmente sequioso<br />
<strong>de</strong> cultura occi<strong>de</strong>ntal. O ensino primario é feito nas escolas alkoranicas ou<br />
kuttabes, nas escolas primarias francezas, e nas escolas bilinguas que n'esta<br />
colonia se teem <strong>de</strong>senvolvido com excellentes resultados.<br />
O ensino feito nos kuttnbes é meramente religioso e, em regra, mesmo<br />
<strong>de</strong>pois <strong>de</strong> longa frequencia, é raro que os seus alumnos adquiram conhecimentos<br />
aproveitavcis <strong>da</strong> lingua arabe. Os tiinisinos cultos e educados resol-<br />
veram ultimamente reorganisar este ensino, melhorando-o sob os pontos <strong>de</strong><br />
vista <strong>da</strong> instrucção e <strong>da</strong>s condiçóes hygienicas dos alumnos. Assim os novos<br />
programmas incliiiráo: leitura, escripta e grammatica arabe, recitação e<br />
commentario do AlkorRo e dos mais celebres escriptores arabes, e noçóes<br />
<strong>de</strong> moral e ttieologia musulmana. Os kuttnbes qiie se forem successivamente<br />
reorganisando <strong>de</strong>verão estabelecer-se nos locaes e edificios <strong>da</strong>s escolas bilingiias,<br />
fi~nccionando coino annexos d'essas escolas. Os musulmanos qiie regerem<br />
os kuttabes <strong>de</strong>verão fazer previamente o curso <strong>da</strong> escola normal indigena<br />
<strong>de</strong> Tunis, Et/~c?ibin, on<strong>de</strong> lhe3 serno conferidos os certificados (ettatwiri) <strong>de</strong><br />
*
132 POLITICA INDIGEXA<br />
licen~a <strong>de</strong> ensino. Nas localidu<strong>de</strong>s em que não liouver escolas franc'.o-arabes,<br />
o programma dos klcttabes, comprehen<strong>de</strong> tainbcm noçúes <strong>de</strong> arithmetica,<br />
ilc liistoria e <strong>de</strong> geograpliia. Nas escolas fi*anco-arabes, tambem a adminis-<br />
tra~" do Protectorado pcnsa cm alterar o programma do ensino, introdiizinclo-llie<br />
rudimentos <strong>de</strong> historia ardbe, e noçócs agricolas, iridnstriaes oo<br />
commerciaes, consoante as condiç6cs <strong>da</strong> locdi<strong>da</strong><strong>de</strong> oncic funccioiiarem. Os<br />
cstabelccimentos <strong>de</strong> cnsino secun<strong>da</strong>rio c superior arabes, sáo a Universi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
<strong>da</strong> Gran<strong>de</strong> Mesqiiita, e recentemente a l
<strong>de</strong>termina<strong>da</strong>s profissócs, c a limitaçzo d:~ coiiccssCo <strong>de</strong> 1~olsas <strong>de</strong> esti1do a<br />
pe~l~io~listas europeus. Ultimamente foram feitas
134 POLITICA INDIGENA<br />
questão do cnco~wõrement <strong>da</strong>s carreiras que em França preoccupa tão viva-<br />
mente a opinião, não surgirá tão cedo na Tunisia ».<br />
Os estudos agricolas na Tunisia, além <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong> ambulante <strong>de</strong><br />
professores <strong>de</strong> agricultiira, são professados na colonia-agricola <strong>de</strong> Lansa-<br />
rine que, revestindo uma feição milito pratica, tem <strong>da</strong>do optimos resultados,<br />
c na Escola Superior Colonial dc Agriciiltiira, estabeleci<strong>da</strong> em Tunis a que<br />
jit teein concorrido alguns indigeilas, <strong>de</strong>pois utilisados como professores,<br />
no estabelecimento <strong>de</strong> Lansarine.<br />
India franceza<br />
O ensino franco-indigcna faz-se púr intermcdio <strong>de</strong> escolas primarias<br />
elementares, complementares c superiores, em Pondicliery, Karikal, Mahé,<br />
Yitnaon e Chan<strong>de</strong>rnagor. Existcm alEm d'isso em Z'ondichery o collegio<br />
Calrtl! e lima escola <strong>de</strong> direito on<strong>de</strong> além d'iim programma aiialogo ao <strong>da</strong>s<br />
escolas similares <strong>da</strong> metropole, ha cursos especiaes <strong>de</strong> direito liindu e di-<br />
reito musiilmano. O collcgio Calvk foi leicisado em 190'3, juntamente com<br />
todos os restantes estabelecimentos <strong>de</strong> ensino <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes do Estado. O<br />
numero total dos aliimnos B <strong>de</strong> 12481 rapazes e 4:797 raparigas. Compa-<br />
rando estes numeros com o dos habitantes recenseados reconliece-se que<br />
62 O/, dos rapazes a 23 por cento <strong>da</strong>s raparigas frequentam as escolas.<br />
Como em to<strong>da</strong> a Indin, as trcs gran<strong>de</strong>s religiúes que se disputam a primazia<br />
siio o christinnismo, o m:thometanismo, e o liindoismo nas suas diffcrentes<br />
formas.<br />
Ilepois <strong>da</strong> leicisaçiio do ensino, niiginentoii coiisi<strong>de</strong>rarclmente a fre-<br />
queiicia escolar dc mrisiilrnanos <strong>de</strong> :iinbos os sexos, aiignientou tambem<br />
sensivelmente o numero dos hinduistas, e diminuiii o numero dos indios<br />
cliristilos <strong>de</strong> castas superiores qiie freqiicntam excliisivamcnte as institui-<br />
çúes congreganiatas.<br />
Parece haver mo<strong>de</strong>rnamente uma ten<strong>de</strong>ncia <strong>de</strong> diminuicáo <strong>da</strong> intole-<br />
rancia <strong>da</strong>s castas, que impedia as creanças <strong>de</strong> nascimento diverso <strong>de</strong> con-<br />
correrem Q. mesnia escola.
Em todo o caso, as differenças <strong>de</strong> religião e <strong>de</strong> casta, a mistiira <strong>da</strong>s<br />
linguas ensina<strong>da</strong>s, francez, inglez, arabe, sanscrito, latim, liindustani e 4<br />
dialectos locaes, são oiitros tantos factores que complicam a organisaçgo<br />
escolar, e prejudicam os seus resiiltados. Comtudo o ensino leigo consegiiiu<br />
importantes vantagens, visto <strong>de</strong> 1902 a 1005 os alumnos do sexo masrulino<br />
terem augmentado <strong>de</strong> 20 O/,, e os do sexo feminino <strong>de</strong> 21 O/,, o que mais<br />
uma vez justifica o emprego <strong>da</strong>s formas tolerantes ou religiosamente neii-<br />
traes <strong>de</strong> politica indigena.<br />
Indo-China<br />
O ensino indigena 6 suberiormente organisado c dirigido por um<br />
conselho coniposto <strong>de</strong> 15 membros francczes, 10 indigenas representando<br />
as colonias e protectorados, e cujo presi<strong>de</strong>nte nato A o director <strong>da</strong> ~Ecole<br />
Française <strong>de</strong> l'Extrême Orient* .<br />
Nos paizes que constituem esta gran<strong>de</strong> colonia franceza, alem do<br />
ensino indigena elementar erd que a administraçáo tem ingerencia, e do<br />
ensino franco-annamita proprianiente dito, náo pU<strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> se mencionar<br />
o ensino chinez-annaniita que, embora em <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncia manifesta, tem sido<br />
respeitado pelos francezes.<br />
Segundo os meios <strong>de</strong> fortuna dos paes, as creanyas do sexo masciilino,<br />
unicas a receber esta instrucção, começam por ter em casa um preceptor,<br />
ou por frequentar a escola <strong>de</strong> al<strong>de</strong>ia, apren<strong>de</strong>ndo os caracteres chinezes<br />
mais vulgares e recebendo varias noções <strong>de</strong> moral chineza religiosa e domestica<br />
; <strong>de</strong>pois frequentam os cursos dos tu-tai (bachareis) ou dos ctc-tlhan<br />
(licenciailos) que llies ensinam e commcntain o Irítzh, cspecie <strong>de</strong> tratado<br />
moral e philosopliico, e fazem apren<strong>de</strong>r, sem coor<strong>de</strong>na~.áo nem nexo, varios<br />
episodios historicos tirados dos Annaes do impcrio Annamita..<br />
Durante este periodo ediicati~o os aliimnos proseguem no estudo dos<br />
caracteres i<strong>de</strong>ographicos e vão apresentando dissertaçócs successivumente<br />
mais difficeis. Aos 17 ou 20 annos começa a terceira phase <strong>da</strong> educação<br />
nas escolas officiaes kua~t-clao, giuo-tliu e d6c-hoc, on<strong>de</strong> se preparam para o<br />
concurso triennal em que os primeiros classificados, cu-nhata, sáo forçados
136 1'0 r,ITicA INDIGENA<br />
a frequentar a escola superior (exame na Corte) que lhe~ confere o grau<br />
<strong>de</strong> pho-bany (doutor), e os que sc lhe segnem em merito ficam sendo <strong>de</strong>nominados<br />
tzi-tni (bachareis) que po<strong>de</strong>m, querendo, concorrer <strong>de</strong> novo na<br />
prova seguinte ao grau <strong>de</strong> (.?1-11/1(in. NO seu conjancto recebem o nome <strong>de</strong><br />
lettrados, e (I entre elles que sHo escolliidos os man<strong>da</strong>rins para os cargos<br />
administratiuo.ci. O ensino official na Cochincliina tem iiltimamcntc tomado<br />
gran<strong>de</strong> incremento, e actualmente, está-se tratando <strong>de</strong> organisar os serviços<br />
<strong>de</strong> instrucçáo em todo o Annam, Tonliin, Cambodge e Laos, segundo<br />
os mol<strong>de</strong>s adoptados para aquella colonia. A organisaçáo escolar é a seguinte<br />
:<br />
1.' Cerca <strong>de</strong> cem escolas <strong>de</strong> al<strong>de</strong>ia, custeia<strong>da</strong>s pelas respectivas<br />
communi<strong>da</strong><strong>de</strong>s e ministrando o ensino a 3:000 creanças.<br />
2.0 Dnzentas escolas cantonaes ensinando cerca dc 12:000 creanças<br />
e on<strong>de</strong> sc começa a apren<strong>de</strong>r o francez ; os professores sáo todos indigenas<br />
e em gran<strong>de</strong> parte formados pcla Escola Normal <strong>da</strong> Cocliinchina com se<strong>de</strong><br />
em Gia-Dinh.<br />
3.0 Dezenove escolas provinciaes primarias dirigi<strong>da</strong>s por professores<br />
francczes e ensinando 4;000 alumnos que, na gran<strong>de</strong> maioria, são rapazes,<br />
apesar <strong>de</strong> já haver cscolas para o sexo feminino em Saigon, Cholon, e em<br />
outras 6 provinciao.<br />
As escolas <strong>de</strong> ensino complementar silo: collegio <strong>de</strong> Mytlio, collegio<br />
<strong>de</strong> Saigon, e escola normal <strong>de</strong> Gia-Dinli, cujo programma é o <strong>da</strong>s escolas<br />
primarias superiores <strong>da</strong> metropolc.<br />
O conselho superior <strong>de</strong> ensino indigena a que fizemos referencia, resolveu<br />
muito recentemente crear ein ca<strong>da</strong> escola provincial, um curso <strong>de</strong><br />
mestres escola <strong>de</strong> al<strong>de</strong>ia, e uma officiila <strong>de</strong> trabalho manual.<br />
O ensino <strong>da</strong>s diversas doutrinas é geralmente feito em qziBc-ftgtt, isto<br />
6, na lingua indigena stenographa<strong>da</strong> em caracteres latinos consoante a<br />
phonologia franceza; todos os livros escolares existem tradiizidos em qz<strong>de</strong>lzyu,<br />
e o ensiiio dos caracteres i<strong>de</strong>ograpliicos chinezes está sendo lentamente<br />
posto <strong>de</strong> parte, apesar <strong>da</strong> opinião <strong>de</strong> dguns ~e<strong>da</strong>gogos coloniaes que<br />
<strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m aindti a titili<strong>da</strong><strong>de</strong> d'esse estudo.<br />
No Annain existem em ca<strong>da</strong> provincia cscolas comparaveis ás escolas<br />
--
cantonaes <strong>da</strong> Cochinchina, e em QuGc-Hoc urna escola provincial e lima<br />
escola complementar reuni<strong>da</strong>s.<br />
No Tunkin cremam-se escolas franco-annamitas nas capitaes <strong>da</strong>s<br />
proviricias, mas o seu nivel scieiitifico 6 miiito inferior ao <strong>da</strong>s escolas provinciaes<br />
<strong>da</strong> Cocliiric~liina, scndo os programmas <strong>de</strong> ensino muito restrictos e<br />
os professores, salvo diins exccl~çócs, todos indigenas; não lia escolas cnntonaes<br />
franco-annamitas.<br />
No Cambodge e no I~aos, paizcs que, como o Siáo e n Birmania, não<br />
receberam a influencia <strong>da</strong> educação chineza, a instrucção nacional limita.se<br />
;iu escolas dos pago<strong>de</strong>s, on<strong>de</strong> os bonzos budhistas ensinam as creanvas a<br />
escrever e R lêr os livros sagrados redigidos n'uma escripta liieratica chama<strong>da</strong><br />
111111.<br />
Tendo o reino <strong>de</strong> Siam, sob o infliixo <strong>da</strong> influencia ingleza, reorgani-<br />
sado as escolas dos pago<strong>de</strong>s, <strong>de</strong> maneira a <strong>de</strong>senvolver e tornar proficuo o<br />
seu ensino, a administrãqko francezn <strong>da</strong> Indo-China mandou ultiniainente<br />
alli tima comrniss80 <strong>de</strong> fiinccionarios estu<strong>da</strong>r as bases d'essa reforma, a fim<br />
<strong>de</strong> procurar obter i<strong>de</strong>ntica remo<strong>de</strong>laçáo no Cambodge e no IAUOS.<br />
O ensino Isiling~ia frailco-cambodgiciise, creado por portaria <strong>de</strong> 20 <strong>de</strong><br />
Jullro <strong>de</strong> 1903, conta j& 7 escolas prin1:irias cantonaes, uma em ca<strong>da</strong> resi-<br />
<strong>de</strong>ncia administrativa, uma escola complemeritar <strong>de</strong> interpretes, uma escola<br />
provincial em Yhnom-Peilli analoga ás <strong>da</strong> Cochinchina, e uma secção <strong>de</strong><br />
ensino profissional.<br />
No Laos está-se proce<strong>de</strong>ndo á reorganisaçáo do ensino bilingiia, se-<br />
giinclo o systema <strong>da</strong>,Cochinchina, e actiialmente, além d'uma escola primaria<br />
em Vientiane, miiito bem organisa<strong>da</strong> com professores francezes, existem<br />
esI)alhados em ca<strong>da</strong> commiãsnriatlo cursos para indigenas, regidos por in-<br />
terpretes. Estk iambcm em via <strong>de</strong> organisaçáo, oii talvez mesnio j& inau-<br />
gura<strong>da</strong>s, duas escolas proficsionaes em Vientiane e em Liiang-Prabang.<br />
Pelo que <strong>de</strong>ixamos <strong>de</strong>scripto se pócle avaliar como n'estes iiltimos<br />
annos a administraçáo franccza. tem tenazmente pugnado pela diffiisgo do<br />
ensino indigena nas suas colonias do Extremo Oriente, servindo-se princi-<br />
palmente d'esse util instrnmento edncativo, a escola l~ilingiia.<br />
Como fecho <strong>da</strong> organisação do ensino indigena, está-se trabalhando
138<br />
POLITICA INDIGENA<br />
-- -<br />
para fun<strong>da</strong>r em Saigon ou em Hanoi uma Universi<strong>da</strong><strong>de</strong> indo-cliineza, em<br />
que se professem cursos <strong>de</strong> direito e administração ; sciencias mathemati-<br />
cas, pliysicas e natiiraeu ; medicina, pharmacia e veterinaria ; engenberia<br />
civil ; agronomia e sylvicult,ura ; lett,ras e philologia. Todo o ensino scienti-<br />
fico, cxceptuando o estudo do direito annamita, <strong>de</strong>verá ser feito por inter-<br />
medio <strong>da</strong> lingua franceza. Esta Universi<strong>da</strong><strong>de</strong> attraliiria numerosos estu<strong>da</strong>ntcs<br />
siamezes e chinezes, e evitaria os inconvenientes que resultam <strong>da</strong>s sahi<strong>da</strong>s<br />
actuaes para o estrangeiro, dos annamitas que se <strong>de</strong>stinam aos estudos<br />
superiores.<br />
Terminaremos aqui este rapido bosquejo dos principaes typos <strong>de</strong> ins-<br />
trucção indigena adoptados pela França nas suas colonias, no qual procu-<br />
rámos fazer sobresahir a importanci~t que hoje se liga ao aproveitamento<br />
e transformaç80 gradual <strong>da</strong>s escolas indigcnas, c o empenho com que por<br />
to<strong>da</strong> a parte se busca implantar um ensino profissional, agricola e indus-<br />
trial que, creando habitos <strong>de</strong> trabalho, concorra para o fortalecimento do<br />
caracter individual e <strong>da</strong> energia collectiva, no sentido <strong>de</strong> se melhorarem a<br />
organisa~,ão social e as condiçóes economicas.<br />
Generali<strong>da</strong><strong>de</strong>s sobre o ensino i'ndigena em outras colonias estrangeiras<br />
O systerii:~ <strong>de</strong> ensino ndopt:ido no impcrio anglo-indiano, que recebeu<br />
o primeiro imIlulso valioso com a iniciativa táo controverti<strong>da</strong> <strong>de</strong> lord Ma-<br />
caulay, assumi. uma feiçao quasi excl~isivamente litteraria c philosophica<br />
que muito terii concorrido para os pessimos resultados que os inglczcs<br />
d'elle teem rc~icolliido, a ponto cle se reconhecer hoje que a educação dos<br />
indios completiimente falseia<strong>da</strong> por essa mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong><strong>de</strong> pe<strong>da</strong>gogica, incompn-<br />
tire1 com a c ivilistiçáo hindU, com as suas condiqóes sociaes e economicas<br />
e com o caracter nacional, carece dc ser fiin<strong>da</strong>mcntalmente rcmodcladrt<br />
n'uma orienta,;%o niti<strong>da</strong>mente scicntifica, industrial e titilitaria.<br />
Pensou-se que a instrucçáo bastaria para modificar a propria csscn-
cia <strong>da</strong> civilisaçáo oriental, europeanisando os indios e conquistando-os á<br />
ethnica dos seus dominadorcs no curto espaço <strong>de</strong> tres geraçfies.<br />
Os factos teem-se encarregado <strong>de</strong> <strong>de</strong>monstrar quanto esta supposic;ão<br />
era erronea, pois os resultados mais evi<strong>de</strong>ntes d'esse systema educativo<br />
resumiram-se na <strong>de</strong>struiçilo <strong>da</strong> moral 11iiid~Pi c na formação #rim ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro<br />
proletariado intellectiial avi<strong>da</strong>mcntc ciumcnto tlns prerogativas dos colonisadores,<br />
e cuja nnica aspiraçáo se circumscreve ao <strong>de</strong>sempenho dos cargos<br />
piiblicos correspon<strong>de</strong>ntes i4 organisação administrativa e jiidiciaria <strong>de</strong> imperio<br />
indiano.<br />
A instrucção superior na India B representa<strong>da</strong> por cinco Universi<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
<strong>de</strong> que <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m 121 collegios filiaes. Nas Universi<strong>da</strong><strong>de</strong>s não se ensina<br />
directamente ; fazem-se alli os exames <strong>de</strong> admissão aos referidos collegios,<br />
e os exames dos graus successivos <strong>da</strong> instrucção que n'elles recebem os<br />
aliimnos. A prcparaçáo para a entra<strong>da</strong> n'estes collegios correspon<strong>de</strong> B inatrucçáo<br />
secun<strong>da</strong>ria e (5 feita nas high scltoolu em numero <strong>de</strong> 5:493, com<br />
558:000 estu<strong>da</strong>ntes.<br />
A instrucçáo primaria correspondcm muitos milhares <strong>de</strong> escolas, on<strong>de</strong><br />
geralmente se adopta como vehiculo scientifico o dialecto local, existindo<br />
egualmente innumeros cursos <strong>de</strong> lingiirt ingleza que facilitam a inicia
gran<strong>de</strong> parte, n'uma instrucçáo agricola e industrial em accordo com as<br />
exigencias do meio.<br />
Nas colonias africanas, salvo uma oii outra excepção, tanto o ensino<br />
official como o missionario teem sido escolasticos e especulativos em <strong>de</strong>masia,<br />
náo correspon<strong>de</strong>ndo {L condicionali<strong>da</strong><strong>de</strong> mesologica, c não se ajustando á<br />
capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> e forma <strong>da</strong> mentali<strong>da</strong><strong>de</strong> negra.<br />
Só nos iiltimos tempos se chegou ao convencimento <strong>da</strong> vantagcm do<br />
ensino profissional e agricola para o progresso rapido <strong>da</strong> situaçiio economica<br />
e <strong>da</strong> morali<strong>da</strong><strong>de</strong> do3 indigenas, e para base <strong>da</strong>s necerasarias estratificaçóes<br />
intellectuaes que, pela sobrcposiçiio hereditaria, permittirão um dia o nivelamento<br />
<strong>da</strong>s cerebraçócs indigena e curopeia. A commias80 <strong>de</strong> instrucçso<br />
l~il,lica tla Soiitli Africa <strong>de</strong>cidiii em 1000 que apenas fossem concedidos<br />
sril)-idios ás escolas e As missóes em que, pelo menos incta<strong>de</strong> do tempo, se<br />
<strong>de</strong>votasse excl~isivarnente ao ensino manual e agricola.<br />
Na Nova Zelandia tem-se olhacio com acrisolado intcresse, e trabalhado<br />
com luci<strong>da</strong> intclligencia pela causa <strong>da</strong> instriieção dos Maoris. Entre<br />
primarias, primarias complcmeiltares e profissionaes, existiam aI1i cm 190:?,<br />
(Senr Zealand Year Boolí), 101 cscolas para indigenas, freqiieiita<strong>da</strong>s por<br />
3693 alumnos, em qne os brancos apenas entram na escassa percentagem<br />
<strong>de</strong> pouco mais <strong>de</strong> 8 por cento; estes numeros não representam porém a<br />
vcriladcira concorrencia escolar dos indigenas, porque nas locali<strong>da</strong><strong>de</strong>s on<strong>de</strong><br />
náo tecrri escolas especiaes, são estes admittidos á frequencia <strong>da</strong>s escolas<br />
<strong>de</strong>stina<strong>da</strong>s aos eiiropeiis, e a cllas concorrem em iiumero avultado.<br />
Nas Pliilippinas o governo americano está proce<strong>de</strong>ndo ;i realisagão<br />
<strong>de</strong> um vasto prqjecto, ten<strong>de</strong>nte a generalisar vertiginosamente os beneficio3<br />
<strong>da</strong> instrucção poblica a todos os incligenas do arcliipelago ; durante o ciirto<br />
periodo <strong>de</strong> um anno foram para alli transportados 3500 mestres-escola<br />
qiie adoptam o ensino <strong>da</strong> lingiia ingleza, para base <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a instrlieção<br />
primaria.<br />
Nas Indias Orientaes Neerlan<strong>de</strong>zas só <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> 1865 se começou a<br />
tratar seriamei~te <strong>da</strong> rlnestiio do ensino indigena. Na actuali<strong>da</strong><strong>de</strong>, alÁm <strong>da</strong>s<br />
cscolas miisulinanau, existeni alli numerosas escolas do governo com dois<br />
trios principaes ; em limas ensina-se aritlimetica e o dialecto local, n'outrag
142 POLITICA INDIGENA<br />
esse mesmo dialecto, lingua malaia, arithmetica, geographia, historia do<br />
Jara, historia natural, <strong>de</strong>senho e elementos <strong>de</strong> agrimensura.<br />
Quanto ao ensino <strong>da</strong> linçiin dos colonisadores, nas colonias Iiollan<strong>de</strong>-<br />
zas, o seu tratamento é i<strong>de</strong>ntico ao <strong>de</strong> qualquer outra lingua estrangeira,<br />
facilitando-se a sua aprendizagem mas nunca se impondo o seu conheci-<br />
mento.<br />
Nas colonias allemás, <strong>de</strong> fun<strong>da</strong>ção tão recente, alguma coisa <strong>de</strong> util<br />
se tem feito no campo educativo, e hoje como durante dilatado porvir o<br />
papel principal na tarefa civilisadora parece <strong>de</strong>ver pertencer ás missóes<br />
religiosas, tis mais proprias para o inicial cepilhamento <strong>da</strong>s barbaras rn<strong>de</strong>-<br />
zas do feticliismo, tão espalliado n'aquellcs vastos territorios que formam<br />
o patrimonio germanico na Africa.<br />
Conclus<strong>de</strong>s geraes<br />
A educação moral e scientifica consiste essencialmente na utilisação<br />
e <strong>de</strong>senvolvimento <strong>da</strong>s facul<strong>da</strong><strong>de</strong>s innatas ou hereditarias, em harmonia<br />
com a forma futura do seu funccionamento no meio especial a que se <strong>de</strong>s-<br />
tinam. E por isso que, em vez <strong>de</strong> se isolarem os educandos do meio social<br />
que lhes é proprio, se <strong>de</strong>vem pelo contrario provocar e multiplicar to<strong>da</strong>s as<br />
occasiócs <strong>de</strong> contacto com esse meio, fornecendo-se-lhes natural e artifi-<br />
cialmente to<strong>da</strong>s as circiimstancias qiie possam motivar lima objectivação<br />
<strong>da</strong>s energias physicas ou moraes, c <strong>da</strong>s quali<strong>da</strong><strong>de</strong>s intellectuaes e senti-<br />
mentaes que resumem e <strong>de</strong>finem o caractcr liiimano. D'esta maneira, para<br />
aproximar por infliienc.ias externas, os patrimonios hereditarios <strong>de</strong> duas<br />
raças ou eivilisaçócs differentes, urge lembrar que a differenciação dos<br />
substracta moral c intellectual, e as divergencias <strong>da</strong> acção mesologica,<br />
irnpóem terminantemente normas educativas especiaes, apropria<strong>da</strong>s aos res-<br />
pectivos typos <strong>de</strong> civilisação ou graus <strong>de</strong> barbarie, e 6 particulari<strong>da</strong><strong>de</strong> do<br />
condicionalismo mental que os caracterisar.<br />
--
A ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira edocagão, <strong>de</strong>satremando escolaticimos inateis e prose-<br />
lytismos exagerados, <strong>de</strong>ve procurar obter uma comprehensão niti<strong>da</strong> dos<br />
phenomenos natnraes e sociaes proprios á especialisação do meio, suggcs-<br />
tionando maneiras dc ver e activi<strong>da</strong><strong>de</strong>s exteriores, condizentes com a<br />
ethnica <strong>da</strong> raça e com as necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s locaes, e evitando assim a creação<br />
<strong>de</strong> energias que possam collidír com os ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros interesses fluctuantes<br />
na corrente <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> contemporanea.<br />
Anteriormente vimos os inconvenientes <strong>da</strong> ina<strong>da</strong>ptaçfio dos systemas<br />
educativos ao meio social, ethnologico e economico.<br />
Portanto B evi<strong>de</strong>nte que, para fixar programmas scientificos e Mrmas<br />
escolares que atten<strong>da</strong>m simultaneamente ao nivel do legado horeditario<br />
<strong>da</strong> raça, e ao conjuncto <strong>da</strong>s circumstancias sociaes em que, mais ou<br />
menos, sempre resumbram as reflorescencias naturaes <strong>da</strong> civilisaçáo an-<br />
cestral, E sempre indispensnvel o mais integral conhecimento <strong>da</strong> moral,<br />
<strong>da</strong> Iiistoria, <strong>da</strong>s instituipes sociaes, politicas e religiosas, e <strong>da</strong> psycholo-<br />
gia nacional.<br />
A educação d'uma população indigena B o impulso <strong>de</strong> acceleração<br />
artificial com que se intenta alcançar uma melhoria economica, social, e<br />
moral, baseia<strong>da</strong> no fundo scientifico e não no figurino civilisado <strong>da</strong> cul-<br />
tura. europeia, apressando a marcha do progresso evolutivo com o influxo<br />
benefico do avigoramento do caracter e do intellecto.<br />
Abandonados a si mesmos, os individuos ou as raças evolucionam sob<br />
as influencias telluricas, religiosas e economicas.<br />
O processo educativo, <strong>de</strong>stinando-se a modificar essa evoluçáo ha-<strong>de</strong><br />
ncccssariamente esqiiitar todos esses factores, ajustando a sua fórma As<br />
mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong><strong>de</strong>s que elles localmente assumirem.<br />
Como as conquistas <strong>da</strong> civilisaçáo occi<strong>de</strong>ntal permittem relegar para<br />
segundo plano as influencias physicas, hoje quasi totalmente superaveis<br />
pelos meios artificiaes que a scieiicia e tis industrias <strong>de</strong>scobriram e crea-<br />
ram, considcremos unicamente as circumstancias economicas e o effeito <strong>da</strong><br />
religiosi<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
Da philosophia <strong>da</strong> evolução historica não se pó<strong>de</strong> apartar a respe-<br />
ctiva concepção materialista; to<strong>da</strong>s as chronicas <strong>de</strong>monstram a importari.
144<br />
- POLITICA INDIGENA -- - - .- --<br />
tia essencial do augmento <strong>da</strong>s forças prodiictoras no <strong>de</strong>senvolvimento <strong>da</strong>s<br />
relaçúes sociaes.<br />
A maneira <strong>de</strong> viver e a cspacidrt~le prodiictiva são a base <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a<br />
evolução individual e sociologica.<br />
É a lei economica um dos principaes hctores do nivel intellectual, e<br />
<strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as transformaçíies individuaeo, politicas, soiiaes e juridicas. O /<br />
exame <strong>da</strong> liistoria revela claramente que R cvolnçáo dos meios <strong>de</strong> prodiicçáo<br />
e o consequente accrescimo <strong>de</strong> necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s alteram sempre irremissivelmente<br />
a mentali<strong>da</strong><strong>de</strong> humana, as leis, os costumes e a organisaçáo do<br />
trabalho.<br />
Sendo portanto o trabalho nm dos mais influentes agentcs <strong>de</strong> civilisaçRo,<br />
todo o rcgimen educatiro necessita tcn<strong>de</strong>r ao <strong>de</strong>senvolvimento cla<br />
sua organisrição, e á formaçáo dc caracteres energicos a qiicm não rcpiignc<br />
qualquer esforço objectivo.<br />
Primo vicere <strong>de</strong>in<strong>de</strong> pl~iloso~~linri.<br />
As miasóes religiosas na Africa ou no Oriente qiic melliores progressos<br />
<strong>de</strong> disriplina, morali<strong>da</strong>ilc e civilisação tecm logrado introduzir nas<br />
socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s indigenas, sao aquellii~ quc souberam implanttir, <strong>de</strong> parceria com<br />
o seu credo religioso, os mais importantes melhoramentos materiaes com<br />
qnc afugentaram a doença e a miseria, e com que attrahiram a riqueza e<br />
o bem estar.<br />
To<strong>da</strong> a doutrinação religiosa que, embevecidos na poeira <strong>de</strong> ouro <strong>da</strong>s<br />
visões mysticas, os missionarios náo qnizerem fortificar no <strong>de</strong>senvolvimento<br />
economico, farA escorregar clc novo a socie<strong>da</strong><strong>de</strong> em qualquer solução <strong>de</strong><br />
continui<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong> religiosa, pela rampa traiçoeira e retrogra-<br />
<strong>da</strong>ntc <strong>da</strong>s taras ancestraes at8 ;i primitivi<strong>da</strong>dc dominante <strong>da</strong> sua ethnica.<br />
Tanto os parti<strong>da</strong>rios cl'iima radical lcicisaçáo pe<strong>da</strong>gogica, como os<br />
mais ferventes a<strong>de</strong>ptos do ensino religioso, nas suas controversias theoricas<br />
e nos seus processos praticas, teem freqiientemcnte commettido o erro<br />
<strong>de</strong> meiiosprczai. a capital im~ortancia do factor economico.<br />
Missionarios qiic proclama~ii a siiperiori<strong>da</strong><strong>de</strong> do sei1 catliecismo, po<strong>da</strong>gogos<br />
qiie dcfendcm a primorcliali<strong>da</strong>clc (10s sei~~ syatemau educativos, e<br />
admiiiistradores qiic invocam a influencia civilisadora <strong>da</strong>s instituições civis
e judiciarias, todos necessitam comprehen<strong>de</strong>r que a reali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>,<br />
attribue ao <strong>de</strong>senrolvimento <strong>da</strong>s forgas productoras a fertilisação do campo<br />
moral e physico, indispensavel para tornar viavel e proficua a acção d'esses<br />
agentes civilisadores.<br />
Os factores economico e juridico concorrem, embora como circumstan-<br />
ciau <strong>de</strong> meio ou causas segun<strong>da</strong>s, para o aperfeiçoamento intellectual e<br />
moral <strong>da</strong>s populaçijes indigenas. Representam elles a acção indirecta, não<br />
menos imprescindivel do que a acção directa exerci<strong>da</strong> pela propagan<strong>da</strong> re-<br />
ligiosa e pe<strong>da</strong>gogica.<br />
Por si sómente, os melhoramentos materiaes não são bastante effica-<br />
zes para alcançar os resultados directos <strong>da</strong> educação ; o armamento eco-<br />
nomico, o fomento industrial, as exploraçúes agricolas e a organisaçáo do<br />
trabalho, se por uma forma visivel nRo contribuem directamente para a<br />
elevaqáo <strong>da</strong> intellectuali<strong>da</strong><strong>de</strong> c <strong>da</strong> morali<strong>da</strong><strong>de</strong>, representam entretanto as<br />
mais seguras garantias <strong>da</strong> proficui<strong>da</strong><strong>de</strong> do esforço ediicativo.<br />
k cntfio logicamciite indispcnsavel que o cnsino profissional, que 1x0-<br />
cura melliorar o rcndiincnto do trabalho maniial concorrciiclo para o pro-<br />
grcsso economico e correlatira complica(;áo <strong>da</strong>s necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s liiimanas, tem<br />
dc ser acompanhido <strong>da</strong> educaqáo moral neoessaria á forma(;iio do caracter,<br />
e d'uma politica religiosa variando, segundo as condiyóes locaes, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a<br />
prupagaii<strong>da</strong> mais activa atr5 á neutrali<strong>da</strong><strong>de</strong> mais absoluta.<br />
Sempre pe, pela ausencia <strong>de</strong> uma crença religiosa <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m supe-<br />
rior, seja possivel a doutrinação cliristá, t! indubitavcl que d'ella se <strong>de</strong>ve<br />
lançar mão como meio mais apropriado para melhorar as condi(;óes moraes,<br />
intellectuaes, e at6 porventura materiaes dos indigenas. To<strong>da</strong>s as crenças<br />
são egualmente respeitavcis, mas ncm <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong> <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s se recolhem<br />
indistinctamente os mesmos beneficios. Assim, com o livre pensamento com-<br />
prehensirel dcntro <strong>da</strong>s normas <strong>da</strong> nossa civilisação, seria ridiciilo e inutil<br />
imaginar-se que elle po<strong>de</strong> influenciar o caracter e a morali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s popu- 9<br />
lações indigenas.<br />
Bepeti<strong>da</strong>s vezes temos accentuado que todo o ensino <strong>de</strong>ve ser pro-<br />
porcionado, isto é, apropriado aos paizes, aos tempos, ás raças, e ás cir-<br />
ciimstancias ; para a cducti(;io religiosa requcr-se i<strong>de</strong>ntica apropriação.<br />
10
146 POLITICA INDIGENA<br />
--<br />
Ora o christianismo é uma admiravel força civilisadora eminente-<br />
mente a<strong>da</strong>ptavel, como a Historia tem <strong>de</strong>monstrado, ás raças e ás socie-<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong>s mais afasta<strong>da</strong>s e differentes. Quando a obra colonisadora <strong>de</strong>frontar<br />
a siia civilisayTio com a ci<strong>da</strong>dclln incxpiignavcl do fanatismo islamico, en-<br />
tZo <strong>de</strong>vcm scr postas <strong>de</strong> parte qiiacsquer tentativas <strong>de</strong> conversilo, o ensino<br />
tem <strong>de</strong> ser caracterisa<strong>da</strong>mcntc iitilitario c scientifico, e o Estado domina-<br />
dor siibsidiando as escolas primarias indigenas, <strong>de</strong>ve apenas ter em vista<br />
uma mais corrccta interpretaçáo <strong>da</strong> moral mosulmana e uma fiscalisa(;ão<br />
e protecção effectivas <strong>da</strong> ediicação iiidigena alli ministra<strong>da</strong>.<br />
N'este caso, como em oiitros sc~inclhantc3, em vez <strong>de</strong> se vasar essa<br />
ediicação nos mol<strong>de</strong>s eiiropeus, é preciso fazer a tentativa opposta, quc<br />
correspon<strong>de</strong> a uma especie <strong>de</strong> islamisação <strong>da</strong> instrucpáo europeia, que a<br />
torna mais facilniente tolerãvel ao espiritu nacional, e mais propria para<br />
ser rapi<strong>da</strong> e eficazmente assimila<strong>da</strong>.<br />
Se do typo do systema educativo adoptado n'uma colonia <strong>de</strong>pen<strong>de</strong><br />
consi<strong>de</strong>ravelmentc o exito <strong>da</strong> tarefa civilisadora, nunca se <strong>de</strong>ve esquecer<br />
que, sendo :L ediicação a imagem simillima dos educadores, é imp~rt~antissimo<br />
que quem colonisa saiba previamente ediicar e pru<strong>de</strong>ntemente escolher<br />
os seus professores e missionarios. A este respeito carece Portugal <strong>de</strong> uma<br />
reforma completa do programma <strong>de</strong> ensino do 1E~d Collegio <strong>da</strong>s Missóes<br />
Ultramarinas. O actiiitl 6 incompleto, improprio, e incapaz <strong>de</strong> produzir<br />
missionarios que possaiii rivalisar ein nivcl scientifico e preparaçzo especial<br />
com os do Espirito Santo ou <strong>de</strong> qlialqiier outra congreg:~çáo estrangeira.<br />
Todo o professor colonial, inissionario ou leigo, para produzir obra<br />
iitil e duradoura, <strong>de</strong>ve possuir o cspirito mi~ionariu qiie significa lima táo<br />
gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>dicação, e um tal amontuado <strong>de</strong> sacrificios, que náo i: fiicil compensa-los<br />
com simples remuneraçócs pecuniarias.<br />
Os ecl~icadores dos indigenas <strong>de</strong>vcm trabalhar contiriuamente ao seu<br />
ludo, ensinando com paciencia e carinlio, e <strong>de</strong>monstrando com o exemplo <strong>da</strong><br />
propria existencia a supcrioridndc <strong>da</strong>s suas doutrinas.<br />
Nem os melhores rcgulãmentos escolares, nem os mais completos programmas<br />
tloiitrinarios, po<strong>de</strong>riio surtir cffcito civilisador comparavel ao<br />
contacto diiiriu eiitre os indigu~as e os seus <strong>de</strong>clicadus educadores. O dis-
&Ao publicista americano Paul Reinsch commenta esta opinião $eguinte<br />
periodo mo<strong>de</strong>lar :<br />
011a principie wenzs clear enough, nnmely, fhat our moral ciuilisation,<br />
caaltot {'e pj.opugated by lnws, perhaps not evoz hy exhortntion,, but that the<br />
otaly trile ciuilising fnflitmce is e.rajnple freely Jolloz~~etl. n<br />
A geiieralisaçRo <strong>da</strong> cirilisação occi<strong>de</strong>ntal ao imperio nipponico I! iim<br />
testemunho bem convincente <strong>da</strong> ver<strong>da</strong>dc d'esta asserç5o. Nas co1oni:ts dc<br />
povoamento ou mixtas em que a acçRo do contagio social d muito importante,<br />
o exemplo dos colonisadores e as suas virtu<strong>de</strong>s domestictts ou sociaes,<br />
contribuem consi<strong>de</strong>ravelmente para o mellioramcnto intellectnal e moral<br />
<strong>da</strong>s massas indigenas.<br />
N'nm discurso proniinciado no Congresso <strong>de</strong> Sociologia Colonial <strong>de</strong><br />
1!)00, Mr. Mnrchal, <strong>de</strong>putado pela Argelia, disse o seguinte a proposito <strong>da</strong><br />
edurayáo indigena n'aqnellas colonias : Os nossos colonos não se contentam<br />
em <strong>da</strong>r o seu salario no operario indigena. Se este adoece, a mulher do<br />
dono <strong>da</strong> quinta rne levar-lhe medicamentos. Á mulher indigena escondi<strong>da</strong><br />
alli perto sob uma ten<strong>da</strong> ou n'um
148 POLITICA IXDIGENA<br />
effeitos momentaneamente distinctos, sempre afinal orientam a sua conver-<br />
gencia para iim mesmo confluente.<br />
O mcllioramento <strong>da</strong>s condi(:óes matcriaes <strong>da</strong> existencia dos indigena:<br />
1150 se obtem apenas pelo ensino profissional, organisayáo c10 trabalho,<br />
rcgii1amentac;áo <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> c r10 imposto; to<strong>da</strong>s as exploraç6es agri-<br />
colas, indiistriacs e commcrciaes, os caminlios dc ferro, as minas, os porto5<br />
e os canaes, que valorisam e as5egiirarn a pro.qperitla<strong>de</strong> economica <strong>da</strong> co-<br />
lonia, <strong>de</strong>senvolvendo e esta<strong>de</strong>ando as suas riquezas natiiraes, fazem con-<br />
correntemente incidir a sua intlucncia sobre a mentali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s populayóes<br />
indigenas.<br />
O saneamento dos esteiros bor<strong>da</strong>dos <strong>de</strong> manga1 febril, a dissecaçác<br />
dos estagnos paliistres perfi<strong>da</strong>mente perfamosos c apestados <strong>de</strong> miasmae.<br />
a imposiçáo <strong>de</strong> praticas sau<strong>da</strong>veis e contrarias á inociilaçáo pestilencial<br />
dos multiplos viriis que florejam sob a tr:insparencia setinosa do ceii tro-<br />
pical, são outras talitas formas <strong>de</strong> tornar prodiictivo o campo, em que se<br />
cxcrcc a influencia <strong>da</strong> ediicayáo, melliorando a pliysiologia <strong>da</strong> ra'a e ro-<br />
biisteccndo a sua constituição. Preparado o terreno por intermedio dos<br />
mellioramentos cconomicos, c do exemplo (10s colonisadores, E evi<strong>de</strong>nte que<br />
o papcl <strong>de</strong>cisivo no progresso intcllectrial c moral dos indigenas, pertence<br />
A c.diicac;ão Ieiga oii religiosa, niaj semprc cui<strong>da</strong>dosamente aprol)ri,iil,i ao<br />
meio e As condic;úcs intellcct,iiiics 110s cdiicandos. Iiiiitilmcnte se 1)ii.cari<br />
sii1)stituir lima civi1isac;Fio por outra com o aiixilio <strong>da</strong> instriicc;Xo ; ain<strong>da</strong><br />
mesmo qiiando a ci\.ilieayáo indigena atravesse um periodo <strong>de</strong> <strong>de</strong>smedra-<br />
mento, será loncura pensar em esmaiar briiscanieiite os seus topicos cara-<br />
cteristicos no sentido <strong>de</strong> obter a <strong>de</strong>seja<strong>da</strong> unific-n(;?to.<br />
As rayas Iiiimanas distingiirm-se, não pela insignificante variabili-<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong> antliroI~ologica, mas pela dircrgencin dos siibtracta moral e intelle-<br />
ctual, profiin<strong>da</strong>mente diflcrenciridos sob a influencia <strong>de</strong> atavismos seculares,<br />
corrcsponclcntcs a liistorias divcrh~is, e processos <strong>de</strong> cvoli~c;áo social a1)so-<br />
liitamente diflbrcnte~.<br />
Valcndo ori podcnclo valcr intrinsecamente o mesmo.<br />
as maneiras intellectuaes peculiares a ca<strong>da</strong> raya e a ca<strong>da</strong> civilisaç5o exi-<br />
gem processos educativos que perfcitnmeiite se lhes a<strong>da</strong>ptem. O typo <strong>da</strong><br />
ci\.ilisa~áo b:iseia.se rnais na forriia (li1 scntimeiitali<strong>da</strong>iie, do que rio graii
<strong>de</strong> cultura e aciii<strong>da</strong><strong>de</strong> do intellecto ; e como os sentimentos humanos são<br />
mais difficilmente transinutativos que as facul<strong>da</strong><strong>de</strong>s iiitellectuaes, compre-<br />
hen<strong>de</strong>-se bem a inutili<strong>da</strong><strong>de</strong> perigosa <strong>da</strong> adopção <strong>de</strong> normas unitarias no<br />
campo pe<strong>da</strong>gogico e educativo.<br />
Entre a fraqueza collectiva <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> hindíi, por exemplo, sobre<br />
a qual pesam successivos seculos <strong>de</strong> sujeição, e a altaneria in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte e<br />
açambarcadora, <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> europeirt, ain<strong>da</strong> sob a influencia atavica <strong>da</strong><br />
brilhante pleia<strong>de</strong> dos cavalleiros an<strong>da</strong>ntes e dos cytharistas <strong>da</strong>s cruza<strong>da</strong>s,<br />
cujos vultos illiiminain as 1)rumas <strong>da</strong> epopeia lieroica, e cujos nomcs pejam<br />
as costaneiras gencalogicas, existe lima ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira fossa abyssal que a<br />
educaçáo nunca po<strong>de</strong>rá encher.<br />
Os seus beneficios positivos são, porem, extensiveis a to<strong>da</strong> a humani-<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong>, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que se aproprie o ensino ao fim racional <strong>de</strong> generalisar as<br />
sciencias sem assimilar as civilisaçóes.<br />
E assim, que todo o systernn educativo, digno <strong>de</strong> tiil nome e merece-<br />
dor <strong>de</strong> applicayáo effectiva, tem necessariamente <strong>de</strong> se consubstanciar com<br />
as forças vivas e as impassibiliilatles mortas <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> a que se <strong>de</strong>stina.
CONOIÇÃO JURIDICA E POLITICA<br />
DOS INDlGENAS<br />
Justiça indigena : noções geraes.<br />
<strong>Direito</strong> privado - Colonias portuguezas.<br />
<strong>Direito</strong> penal - Colonias portuguezas.<br />
Condiçfio jiiridica dos inestiqos.<br />
<strong>Direito</strong>s politicos dos indigenas e mestiços.
CAPITULO IV<br />
Justiça indigena: noçóes geraes<br />
B ,jtistiqa como i<strong>de</strong>ia niti<strong>da</strong> e clara, é elemento constituinte <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s<br />
as mcntali<strong>da</strong>dcs intligcnas ; a siia essencia é o ancoio constante <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s<br />
as raças humanas; e a sua stricta applicação um reqnisito fun<strong>da</strong>mental<br />
<strong>de</strong> to<strong>da</strong> a socie<strong>da</strong><strong>de</strong> organisa<strong>da</strong>.<br />
Comprehen<strong>de</strong>-se a importancia que, na pratica colonial, assumem as<br />
formulas juridicas a<strong>da</strong>pta<strong>da</strong>s, e a organisação <strong>de</strong> todo o serviço judiciario<br />
em materia civel ou criminal, pois nenhum Estado colonisador pd<strong>de</strong> prescindir<br />
d'esses seguros meios <strong>de</strong> propagan<strong>da</strong> civilisadora e <strong>de</strong> manutenção<br />
<strong>da</strong> or<strong>de</strong>m.<br />
Al6m <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as conveniencias <strong>de</strong> natureza politica, que concorrem<br />
para aconselhar um regimen repressivo que traga comsigo as plenas garantias<br />
<strong>de</strong> or<strong>de</strong>m e segurança, indispensaveis ti prosperi<strong>da</strong><strong>de</strong> dos estabelecimentos<br />
coloniaes e á evolnçiio progressiva <strong>da</strong>s socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s n'elles estabeleci<strong>da</strong>s;<br />
Q tambem elementar <strong>de</strong>ver imposto á tutoria civilisadora, a<br />
conservação e melhoria progressiva <strong>da</strong> ~rirnitiva justiça indigena e respectiva<br />
organisação judiciaria.<br />
Como diz Girault, (I) o homem é tanto mais maguado pelo espectaculo<br />
<strong>da</strong> iniqui<strong>da</strong><strong>de</strong>, quanto mais proximo estiver <strong>da</strong> natureza. Quantas vezes<br />
no nosso scepticismo perante a indignaçáo snscitadn no animo<br />
(1)<br />
A. Girault - P~.incipas <strong>de</strong> CoZonisntion et rle Lrgislrction CoZoninle.
154 POLITICA INDIGENA<br />
<strong>da</strong>s creanças ou dos adolescentes por certas injustiças, a que pratica <strong>da</strong><br />
vi<strong>da</strong> acaba por nos tornar inditt'crentcs. . . . . .<br />
Com os indigenas pouco civilisados, comparaveis ás creanças na sna<br />
impulsivi<strong>da</strong><strong>de</strong> psychologica, clii-se geralmente o mesmo plieriomeno moral;<br />
a barbari<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> pena inflingi<strong>da</strong> não os preoccupa, o espectacnlo <strong>da</strong> injustiça,<br />
pelo rontrario, revolta-os e indigntt-os. To<strong>da</strong>s as naçõcs coloniaes <strong>de</strong>vem,<br />
pois, prover cui<strong>da</strong>dosamente n esta necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> moral c material, fiscalisando<br />
ou chamando a si as funcçõcs judiciarias, <strong>de</strong> fórma a garantir a<br />
integri<strong>da</strong><strong>de</strong> do ciimprimento dos preceitos <strong>da</strong> justiça.<br />
A este respeito torna-se indispensavel distinguir e apreciar especialmente<br />
a organisaçzo <strong>da</strong> j~istiqa civil e <strong>da</strong> ,justiça repressiva, porque se,<br />
para a primeira, o respeito pelas institniyóes naturtes dos indigenas aconselha<br />
apenas processos lentos <strong>de</strong> melhoria c conservac;ão actual <strong>da</strong>s jurisdicqóes<br />
existentes, para a segun<strong>da</strong>, a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> politica e os interesses<br />
pririiordiaes <strong>da</strong> coloniua(;50 impõem a immetliata organisação <strong>de</strong> tribanaes<br />
europeus que representem garantia sufficiente <strong>de</strong> hegemonia politica e <strong>de</strong><br />
repressão efficaz.<br />
O direito <strong>de</strong> pnnir <strong>de</strong>ve ser apanagio essencial <strong>da</strong> naqão dominadora,<br />
é a salvaguar<strong>da</strong> do seu prestigio e um dos melliores meios <strong>de</strong> impor a sua<br />
autori<strong>da</strong><strong>de</strong> As populaçóes indigenas.<br />
Quanto ao direito privado indigena, náo advern para o Estado COlonisador<br />
vantagem alguma, <strong>da</strong> sua snbstitiiiç50 pelo direito europeu, em<br />
geral absolutamente ina<strong>da</strong>ptavel As instituições indigenas <strong>da</strong> familia, <strong>da</strong><br />
proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>, (10 regimen <strong>de</strong> success6es etc., que tanto convem conservar.<br />
Qualquer tentativa <strong>de</strong> modificação brusca do direito civil indigena, ou<br />
qualquer ingerencia inintelligente na siia applicaç~o, repercutir-se-ha, dolorosamente<br />
e com prejuizos incalculaveis, na exiutencia diaria <strong>da</strong>s differentes<br />
classes sociaes, e provavelmente levantar;^ entre os indigenas resistencias<br />
tanto mais tenazes, quanto mais relativamente civilisado fôr O seu<br />
direito privado consuetudinario ou expresso.<br />
Nas civilisaçóes orientaes e na islamica, o caracter do direito 6<br />
essencialmente religioso ou mystico, <strong>de</strong>sconhecendo quasi sempre o inte-<br />
resse pnblico, como nós o consi<strong>de</strong>rapos, e estabelecendo as garantias indi-
vichlaes ou familiares em normas a qiia aariipre oo~roapon<strong>de</strong> a .orincçã~<br />
divina.<br />
E' facil ajuizar quanto, n'esta hypothese, se difficnlta qualquer alte-<br />
ração que se lhe procure introduzir por via <strong>da</strong> auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> humana. Do<br />
mesmo modo resalta logicamente a <strong>de</strong>clara<strong>da</strong> repugnancia que todos os<br />
orientaes manifestam pelo nosso direito secularisado e emanando sempre<br />
d'uma auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> liumana individ~ial ou collectiva. (I)<br />
Arrancados 6 convicção fanatica <strong>da</strong> intangibili<strong>da</strong><strong>de</strong> do seu tradicio-<br />
nalismo religioso, os indigenas revoltar-se-hác fatalmente, contra essa im-<br />
posiçáo estrangeira que intentou alterar ou modificar as instituiçúes natu-<br />
rnes, ou os preceitos <strong>de</strong> justiça, que elles crGem immutaveis sob a garantia<br />
<strong>da</strong> sancyão divina. Com estes protestos e r6voltas sur<strong>da</strong>s ou ostensivas, o<br />
Estado colonisador na<strong>da</strong> tem a lucrar, e pó<strong>de</strong> atC! levantar uma barreira<br />
irrediictivel ao progresso ulterior <strong>da</strong> sua civilisaçBo e dos seus interesses<br />
economicos e politicos. I? evi<strong>de</strong>nte que instituiçúes taes como a escravatura,<br />
a anthropophagia e os sacrificios humanos <strong>de</strong>vem ser radicalmente siippri-<br />
midos, mas ain<strong>da</strong> n'este caso 6 preferivel recorrer a meios suasorios, pondo<br />
<strong>de</strong> parte, tanto quanto possivel, a violencia na repressão.<br />
Nas populaçúes indigenas <strong>de</strong> credo fetichista, o alliivião ethnico em<br />
que se fun<strong>da</strong>menta o direito consuetudinario, B mais facilmente <strong>de</strong>sagrega-<br />
vel, e a evoluçGo <strong>da</strong>s formulas juridicas mais susceptivel <strong>de</strong> relativa cele-<br />
ri<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
Entretanto, essa evolução progressiva tambem se pó<strong>de</strong> alcançar no<br />
direito privado musulmano, hinduista, buddhista ou confucionista, <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />
que, em vez <strong>de</strong> se attribuir á auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> europeia competencia para inno-<br />
vaçbes oii alteraçúes antipaticas, se procilre attrahir por uma politica<br />
habil as aristocracias religiosas, castas ou classes sociaes a quem entre os<br />
indigenas incumbe a missáo do sacerdocio religioso ou <strong>da</strong> administração<br />
<strong>da</strong> justiça.<br />
Convém obter que estas classes, sem sahir do seu papel e sem trahir
156 POLITICA INDIGENA<br />
R sua f4, vão lentamente incorporando nas velhas doiitrinas, os aperfei-<br />
çoamentos necessarios, afinal qiiasi sempre compativeis com a elastici<strong>da</strong>cle<br />
do formulario do direito consuetiidinario e religioso.<br />
Como regra geral, 6 pois impossivel a importaçáo em massa d'um direito<br />
civil estrangeiro que se náo a<strong>da</strong>pte aos costumes e circumstancias<br />
locaes.<br />
()ziid leyes siwe ~izoribtis ?<br />
A reforma do direito indigena, a fazer-se, tem <strong>de</strong> ser caracterisa<strong>da</strong>mente<br />
lenta e nunca por influencia directa <strong>da</strong> auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> europeia, utilisando-se<br />
para esse fim, as classes indigenas a quem pertencer o exercicio<br />
<strong>da</strong>s funcçóes judiciaes, e a quem uma politica intelligente <strong>de</strong> attracçáo<br />
<strong>de</strong>ve sempre ro<strong>de</strong>iar do prestigio moral e <strong>da</strong> recompensa material, necessarias<br />
ti consoli<strong>da</strong>ção <strong>da</strong> sua influencia sobrc as massas popiilares.<br />
Xáo se <strong>de</strong>ve ir, comtudo, muito longe n'este caminho, para evitar a<br />
crea(;ao <strong>de</strong> prcpon<strong>de</strong>rancias politicas possivelmente avessas aos ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros<br />
interesses <strong>da</strong> metropole.<br />
A conservaqão do direito social iniligcna 6 indispensavel fazer uma<br />
rcstricçáo importante. Queremos referir-nos ao direito <strong>da</strong>s obrigaçóes.<br />
Com eff'cito, se a intangibili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> familia, <strong>da</strong> siiccessão e <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
indigena, <strong>de</strong>vem constituir um dogma <strong>de</strong> politica colonial, já<br />
outro tanto não siicce<strong>de</strong> com a legislaçáo dos contractos que, pela propria<br />
natureza cosmopolita do seu objecto, é quasi in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>da</strong>s instituiyóes<br />
politicas oii sociaes <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> nacionali<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
A nação dominadora tem o masimo interesse em adoptar preceitos<br />
legaes e jurisdicçóes apropria<strong>da</strong>s que garantam o cumprimento <strong>da</strong>s obrigaçóes<br />
contractuacs entre os indigerias, uii entre estes e os colonos, e ponham<br />
ambas as partes caontractantes ao abrigo <strong>da</strong> mA f6 e dos abusos reciprocas<br />
E simultaneamente iiecessario assegurar as condiyões <strong>de</strong> existencia<br />
do proletariado iridigena, ootn uma cautelosa regulamentaçáo <strong>da</strong> mão d'obra,<br />
e esten<strong>de</strong>r aos indigenas commerciantes as responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong>s effectivas dos<br />
seus contractos, s~ijeitando-os ás clausulas e penali<strong>da</strong><strong>de</strong>s do direito com-<br />
mercial metropolitano, para que a concorrencia entre indigenas e colonos<br />
se exerça bem legal. egualmente <strong>de</strong> muita conveniencia, o estabelecimento
I<br />
CONDIÇk0 JURIDICA<br />
--<br />
167<br />
-<br />
<strong>de</strong> reg~ilamentos especiacs <strong>de</strong>stinados a combater, quanto possive], o flagello<br />
<strong>da</strong> tisiira quc tantos estragos costuma fazer entre as popula~ões indigenas<br />
puerilmente imprevi<strong>de</strong>ntcs.<br />
Nos litigios commerciaea é, em regra, imprescindivcl a a<strong>da</strong>ptaçgo do<br />
systema <strong>de</strong> provas juridicas ao estado social e grau <strong>de</strong> instriic(;áo dos indigenas.<br />
Estabeleci<strong>da</strong> csta excepçiio clija necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> se impóe, vamos successivamente<br />
estu<strong>da</strong>r os processos politicos que <strong>de</strong>vem presidir A organisaçáo<br />
<strong>da</strong> justiça civil e repressiva nos cstabelecimentos coloniaes.<br />
<strong>Direito</strong> privado<br />
(i~ialqucr que seja a politica indigena segui<strong>da</strong>, csti natoralmentc indica<strong>da</strong><br />
a extrema convcnicncia do estudo prcvio, completo e aprofunclndo<br />
dos costumes indigenas, interessantissima fonte <strong>de</strong> sociologia compara<strong>da</strong><br />
quc <strong>de</strong>monstra a insani<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> generalisaçáo <strong>de</strong> <strong>de</strong>termina<strong>da</strong>s formulas<br />
jiirillic1,ii iri~iiscc~ptireis <strong>de</strong> esportíição, e que constitne a mais segura indicayáo<br />
Accrca do carticter e <strong>da</strong> morali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s raças indigenas.<br />
To<strong>da</strong>s as nações coloniaes tiram, d'cste estudo consciencioso, o duplo<br />
interesse do progresso geral <strong>da</strong>s sciencias sociaes, e <strong>da</strong>s vantagens polititas<br />
que naturalmente resultam do conhecimeiito exacto dos costumes locaes<br />
e do espirito nacional e religioso.<br />
Quantos erros funestos recheiam a pratica colonial, que se po<strong>de</strong>riam<br />
ter cvitairu fhdmente se fossem conhecidos ou melhor interpretados pelo<br />
elemento colonisador, os regimens locaes <strong>da</strong> f~milia, <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> e do<br />
culto !. . . Qiiantas revoltas indigenas <strong>de</strong>isaria <strong>de</strong> haver, se ao <strong>de</strong>sacato<br />
tantas vezcs inconscicnte <strong>da</strong>s institiiic;ões naoionacs, sc sii1)stituisse uma<br />
tolerancin intclligente baseia<strong>da</strong> na compreliensão clara <strong>da</strong> essencia e <strong>da</strong><br />
indolc d'essas institrxicóes. . .<br />
Vulliez, no soii trcibiillio .De la Justice anx Colonies)> clisse o seguinte :
158 POTJITICA INDIGENA<br />
- -- -<br />
aHa uma coisa <strong>de</strong> que só a muito custo nos convencemos; 6 que<br />
muitas i<strong>de</strong>ias, por nds consi<strong>de</strong>ra<strong>da</strong>s como as mais preciosas conquistas do<br />
tempo presente, e ciija applicaç30 nos prece <strong>de</strong> interesse primordial, <strong>de</strong>ixam<br />
um I-iomem <strong>de</strong> rayn estrangeira perfeitamente indifferente. Contrariamcntc<br />
e por idcntico motivo, "cdos os estrangeiros e particularmente os<br />
orientaes, teem a soflrer nas suas relaçóes comnosco um sem numero <strong>de</strong><br />
feri<strong>da</strong>s que todos os dias Ilies fazemos nos costumes, amor proprio e crenças,<br />
e cujo alcance nunca siispeitamos. D<br />
Todos estes estudos requerem, porém, uma <strong>de</strong>mora<strong>da</strong> observaçáo e<br />
investigaç50, e, pela difficiil<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> estabelecer o ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro conceito juridico<br />
a attribuir aos costumes locaes, exigem que as commissóes nomea<strong>da</strong>s<br />
para os levar a cffeito, contenham on sc componham <strong>de</strong> jurisconsiiltos a<br />
quem a especialisaçáo <strong>da</strong> bagagem scientifica e a orientação do espirito facilitam<br />
gran<strong>de</strong>mente a tarefa.<br />
Seria bem util e justifica<strong>da</strong> a nomeiaçáo para ca<strong>da</strong> colonia <strong>de</strong> uma<br />
commissão central <strong>de</strong>stina<strong>da</strong> a estc fim, e alixilia<strong>da</strong> por rclatorios especiaes<br />
enviados pelo5 comman<strong>da</strong>ntes militares ou pelos chefes <strong>da</strong>s circumscripqóes<br />
administrativa., sobre o mo<strong>de</strong>lo d'am questionario uniforme respeitante aos<br />
lisos e costuiiies indigenas, que seria previamente distribuido a todos os<br />
funccionarios c3iiropeus, julgados em condi~áo <strong>de</strong> po<strong>de</strong>rem fornecer informaqócs<br />
veridicas c intcressantes.<br />
Realisado c s estiido, ~ se não se verificar a existencia <strong>de</strong> instituiçóes<br />
contrarias aos 11rt~c.c.ito3 fun<strong>da</strong>mciitacs <strong>da</strong> lei moral e B segurança politica<br />
<strong>da</strong> colonia, <strong>de</strong>1 ,,-se pôr <strong>de</strong> parte uma assimilação juridica que na<strong>da</strong> justifica<br />
e a ningirciii contenta.<br />
As institiriçóes dos indigenas correspondcm e servem <strong>de</strong> espelho fi<strong>de</strong>lissimo<br />
ao sei1 estado economico e social e á sua mentali<strong>da</strong><strong>de</strong> e morali<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
As nossas leis transporta<strong>da</strong>s Bquelle meio, seriam como diz Girault,<br />
oii Icttra morta I,or náo encontrarem objectivo, ou origem <strong>de</strong> pertiirl)ay6es<br />
extranhas e iiic-pera<strong>da</strong>s que se teriam <strong>de</strong> remediar urgentemente; finalmente<br />
gran<strong>de</strong> niimero <strong>de</strong> rela(;óes jiiriciicas privativas <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> indi-
-<br />
CONDJC.?0 JTTXIDICA<br />
1.59<br />
-- -- - -<br />
gena, e imprevistas na nossa legislaçáo, ficariam <strong>de</strong>sabriga<strong>da</strong>s <strong>de</strong><br />
sancçáo legal.<br />
Para to<strong>da</strong>s as raças liiimanas, a mcllior legislaçáo c' a qiie se fun<strong>da</strong><br />
nos seiis costumes e no seu <strong>de</strong>senvolvimento economico.<br />
Assim os regimens eiiropeiis <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> immobiliaria iiicliridiial,<br />
sii1)stitiiidos inopina<strong>da</strong>mente A proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> collectiva <strong>da</strong> tribii ou <strong>da</strong> com-<br />
muna, irnportiiriam provavelinente urna ruina economica quasi fulminante.<br />
Mesmo nas colonias em que j;i existisse a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> individual, bas-<br />
taria a adopçáo d'um systcma qiialqiier <strong>de</strong> expropriação <strong>de</strong> terras contra<br />
in<strong>de</strong>mnisa(ões pecuniarias, para que a natural e logica imprevi<strong>de</strong>ncia indi-<br />
gena, esgotasse n'um Bpice todo o numerario recebido e fi~osso<br />
<strong>de</strong>scer a<br />
socie<strong>da</strong><strong>de</strong> nativa alguns graus na escala do adiantamento economico.<br />
O direito civil é essencialmente relativo, e em to<strong>da</strong>s as organisriçúes<br />
sociaes <strong>de</strong>ve-se a<strong>da</strong>ptar perfeitamente aos naos e tradiçúes <strong>de</strong> qiie é o co-<br />
rollario logico.<br />
Ao respeito pelos costumes locaes, não se oppõem as medi<strong>da</strong>s suaves<br />
toma<strong>da</strong>s no sentido <strong>de</strong> se tornar possivel o recenseamento <strong>da</strong>s populaçúes<br />
e o ca<strong>da</strong>stro <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
E' inconveniente compellir os indigenas ao regiàtro dos matrimonios,<br />
que para tantas raças náo passam <strong>de</strong> puras cerimonias <strong>de</strong> ritual religioso,<br />
mas na<strong>da</strong> impe<strong>de</strong> e tudo justifica que se comece a organisar o estado civil<br />
dos indigeiias pelo registro obrigatorio dos nascimentos e dos obitos, que<br />
em natlti briga com as institiiiyóes sociaes ou com as crenças religiosas.<br />
h provavel que, a principio, haja uina certa reluctancia em fazer as<br />
respectivas <strong>de</strong>claraqóes, mas estas viráo a generalisar-se completamente,<br />
logo que os indigenas se conren(;am <strong>de</strong> que nenlium prcxjnizo llies resulta<br />
do camprimento d'essa obrigação.<br />
Estu<strong>da</strong>dos os usos e o direito consuetudinario <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena,<br />
e admitti<strong>da</strong> a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> serem mantidos os seus dictames, surge o<br />
problema <strong>da</strong> codificaçso d'esses preceitos que alguns publicistas consi<strong>de</strong>ram<br />
vantajosa, e outros reputam inconrenientc, por immobilisar to<strong>da</strong>s as sobre-<br />
vivencias jiiridicas que a politica indigena tolera momentaneamente, mw<br />
que <strong>de</strong>seja fazer cvoliicionar progressivamente.
160 POLITICA INDIGENA<br />
Lembram a malleabili<strong>da</strong><strong>de</strong> siiperior, e a maior facili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> a<strong>da</strong>pta-<br />
ção ao meio social <strong>da</strong>s formulas consuetndinarias, e allegam at6 que, em<br />
geral, os costumes indigenas ficam coinpletamente <strong>de</strong>snatiirados nas tenta-<br />
tivas <strong>de</strong> codificação leva<strong>da</strong>s a effeito.<br />
Este ultimo argumento sU po<strong>de</strong> colher contra 03 codigos mal elabo-<br />
rados e nunca contra a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> real <strong>de</strong> codificar os costtimes.<br />
Estes trabalhos <strong>de</strong>rem traduzir exactamente os costumes indigenau<br />
sem os alterar, e dividir-se em liarmonia <strong>de</strong> forma e objectivo com o seu<br />
contheudo, sem procurar esta1)elccer compara~ócs ou divisúes equivalentes<br />
ás dos codigos europeus.<br />
Quando se estu<strong>da</strong> uma legislaçao indigena é preciso seguir rigorosa-<br />
mente o plano original, fugindo a uniformisaçúes absur<strong>da</strong>s.<br />
Feita a codificação, resta saber se esse documento <strong>de</strong>ve representar<br />
legislaçfio imperativa, ou mero repositario doutrinario e coiisultivo.<br />
Giraiilt, no Congresso dc Sociologia Colonial <strong>de</strong> 1!)00, <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>u esta<br />
ultima i<strong>de</strong>ia, addiizindo em seu favor a conveniencia <strong>de</strong> evitar a immobili-<br />
çncáo <strong>da</strong>s instituiçúes jnridicas, c a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar actuar a Ici cle<br />
imitayáo quc táo soberailameiitc. influe nas transforiiiaçócu do ilircito.<br />
Concor<strong>da</strong>mos plenainente com esta opiniáo mais do que justifica<strong>da</strong>,<br />
porque nas colonias a evolução social 6 accentua<strong>da</strong>mente rapi<strong>da</strong>, e o direito<br />
civil, para se amcl<strong>da</strong>r ao progresso vcloz do estado social e <strong>da</strong>s condiçóes<br />
economicas, precisa <strong>de</strong> possuir lima ductili<strong>da</strong><strong>de</strong> que se não coaduna com a<br />
petrificação formalista dos codigos.<br />
De resto, lia colonias eni que esses incoiivciiientes se nao salieiittim<br />
pela maior perfeição, enraizamento e antigui<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s suas formulas jiiridi-<br />
cas.<br />
*4ssim na India, os inglezes teem-se <strong>de</strong>dicado com o maior interesse<br />
& coor<strong>de</strong>nação <strong>da</strong> legislnçtio indigena em documentos imperativos que fixam<br />
<strong>de</strong>finitivamente o direito. Essa tarefa, começa<strong>da</strong> pelos celebres jurisconsiil-<br />
tos Macaiilay e Siimmer Blaine, abrange nzo SU os regnlamentos cle policia<br />
e o codigo penal, como todo o direito civil Iiindiiista e mahometano.<br />
Nas lndias Orientaes Neerlan<strong>de</strong>zes o direito applicavel aos indigenas<br />
e assimilados 1150 está completamente cudificado. Parte dos codigos civil e
CONDIÇÃO JURIDICA '161<br />
-<br />
- commercial applicados aos europeus é tambem extensivel aos indigenas ;<br />
existem diversos regulamentos civis exclusivos aos indigenas ou aos orien-<br />
taes extrangeiros, e em todo o litigio, para que não ha
162 POLITICA INDIGENA<br />
- - - -<br />
dos seus conterraneos, que vive entre elles, communga no mesmo credo reli-<br />
gioso, cujos preceitos se repercutem constantemente nas leis civis, e que B o<br />
unico apto para comprehen<strong>de</strong>r o seu espirito, as suas ten<strong>de</strong>ncias, e todos<br />
os lados intimos <strong>da</strong> sua existencia?<br />
Sem duvi<strong>da</strong> que os magistrados europeus são mais instruidos, mas<br />
resta averiguar se essa instrucção superior lhes proporcionará meios <strong>de</strong><br />
administrar a justiça civil em condicóes <strong>de</strong> superiori<strong>da</strong><strong>de</strong> sobre os indigenas.<br />
A pratica colonial tem, at8 hoje, evi<strong>de</strong>nciado a enorme vantagem <strong>de</strong><br />
conservar aos indigenas os seus jiilgadores em materia civel, e tem mostrado<br />
claramente os <strong>de</strong>feitos resultantes <strong>da</strong> falta <strong>de</strong> a<strong>da</strong>ptação ao meio indigena,<br />
<strong>de</strong> todos os magistrados europeus que successivas experiencias teem expor-<br />
tado para as colonias.<br />
Mas, ain<strong>da</strong> que a incapaci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> magistratura indigena seja flagrante,<br />
não 8 a sua substituiçCio que se impóe, mas sim a adopcáo <strong>de</strong> normas edu-<br />
cativas e systemas <strong>de</strong> recrutamento que concorram para crear uma corpo-<br />
ração judicial As alturas <strong>da</strong>s exigencias <strong>da</strong> colonia.<br />
Quanto ao labeu <strong>de</strong> corriipçáo geral lançado sobre os indigenas é, em<br />
geral, levado aos extremos limites <strong>da</strong> exageração, e pouco correspon<strong>de</strong>nte<br />
4 pura ver<strong>da</strong><strong>de</strong> dos factos. Mas, <strong>de</strong> qualquer modo, ain<strong>da</strong> os inconvenientes<br />
#essa fallencia moral seriam muito menos graves e rilinosos do que os re-<br />
sultantes do funccionamento dos tribunaes europeus.<br />
Ao passo que o processo civil indigena é expedito e gratuito, o by-<br />
zantinismo complicado e dispendioso <strong>da</strong>s formali<strong>da</strong><strong>de</strong>s europeias, termina<br />
por arruinar os litigantes. Esta situação ain<strong>da</strong> peiora, com a venali<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
dos intermediarios, officiaes <strong>de</strong> diligencias, interpretes, etc., que, sendo in-<br />
dispensaveis á instrucção do processo por magistrados europeus, exploram<br />
directa e torpemente os indigenas, que acabam por vêr n'elles associados<br />
dos juizes.<br />
D'este modo, a incomparavel superiori<strong>da</strong><strong>de</strong> moral <strong>da</strong> nossa magistra-<br />
tura, não <strong>da</strong>r4 praticamente resultados politicos favoraveis, porque os in-<br />
digerias arruinados pela legião dos sequazes <strong>da</strong> justiça, suppóem os magis-<br />
trados cumplices d'essa exploração, nunca reconhecendo a sua integri<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> caracter.
A conservação <strong>da</strong>s jurisdicçóes indigenas é, ao mesmo tempo, uma<br />
vantagem para a justiça e uma boa medi<strong>da</strong> politica.<br />
To<strong>da</strong>s as eaçúes coloniaes teem interesse em chamar a si as classes<br />
medias indigenm mais illnstra<strong>da</strong>s e probas, e o exercicio <strong>da</strong>s funcqóes judi-<br />
ciaes é uma <strong>da</strong>s melhores formas <strong>de</strong> as educar, civilisar e ut,ilisar.<br />
Principalmente nas colonias <strong>de</strong> população muito <strong>de</strong>nsa não se p6<strong>de</strong><br />
in<strong>de</strong>fini<strong>da</strong>mente administrar os indigenas senão por intermedio d'elles pro-<br />
prios, e por isso 6 absolutamente necessario orientar a politica indigena, <strong>de</strong><br />
maneira a crear na socie<strong>da</strong><strong>de</strong> nativa, uma classe superior <strong>de</strong> funccionarios,<br />
professores e magistrados capazes <strong>de</strong> influenciar eficazmente as massas po-<br />
pulares, e <strong>de</strong>dicados por interesse proprio á politica e administraçiio <strong>da</strong><br />
nacáo dominadora.<br />
I)emais, a manutençrio <strong>da</strong>s jurisdicçúes indigenas, além <strong>da</strong>s suas<br />
vantagens politicas, e <strong>da</strong> economia que perrnitte fazer nos orçamentos colo-<br />
niaes, redun<strong>da</strong> em proveito indiscutivel dos principaes interessados, que<br />
assim teem a justiça <strong>de</strong> que carecem e que melhor comprehen<strong>de</strong>m, <strong>de</strong>cal-<br />
ca<strong>da</strong> nos coatumes locaes e apropria<strong>da</strong> &s suas necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />
As naçúes coloniaes, principalmente as latinas, não se teem habitual-<br />
mente compenetrado <strong>da</strong> ver<strong>da</strong><strong>de</strong> d'estas consi<strong>de</strong>raçóes. Mais ou menos so-<br />
nhadores, todos os nossos gongoricos <strong>de</strong>clamadores, a quem tão frequente-<br />
mente incumbe legislar para as colonias, antepôem á evi<strong>de</strong>ncia brutal <strong>da</strong>s<br />
exigencias praticas, os floreados rhetoricos do velho thema : fraterni<strong>da</strong><strong>de</strong> e<br />
egual<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
Esquecem que, para n'um futuro mais ou menos remoto a exportação<br />
$0<br />
dlessas formulas po<strong>de</strong>r significar alguma coisa, é preciso a<strong>da</strong>ptar to<strong>da</strong> a<br />
administração indigena 4s necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s actuaes, e, antes <strong>de</strong> tudo, proce<strong>de</strong>r<br />
sempre com benevolencia e equi<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
Os inconvenientes <strong>da</strong> utilisaçáo <strong>de</strong> tribunaes europeus na <strong>de</strong>rimencia<br />
dos litigios civis, i$ estão <strong>de</strong> longa <strong>da</strong>ta bem provados. No tempo em<br />
que o imperio indiano era ain<strong>da</strong> dominio exclusivo <strong>da</strong> Companhia <strong>da</strong>s<br />
Indias, foram alli estabelecidos tribunaes civis i<strong>de</strong>nticos aos <strong>da</strong> metropole,<br />
com magiutrados europeus e as formulas inglezas <strong>de</strong> processo.<br />
*
164 POLITICA INDIGENA<br />
O resultado d'essa organisaçáo, eloquentemente <strong>de</strong>scripto por John<br />
Strachey, foi o seguinte.<br />
a Alguns annos foram sufficientes aos auxiliares <strong>da</strong> justiça para su-<br />
garem aos litigantes arruinados to<strong>da</strong> a polpa, e para accumularem fortunas<br />
superiores ás que os mais velhos e distinctos servidores <strong>da</strong> Cor6a po<strong>de</strong>ram<br />
accumular em trinta ou quarenta annos tle relevantes serviços.<br />
Fallo <strong>da</strong> região <strong>de</strong> Bengala, on<strong>de</strong> esse systema <strong>de</strong>sabrochou em to<strong>da</strong><br />
a, sua belleza.<br />
Em Madrasta os tribunaes civis, segundo creio, <strong>de</strong>sempenharam ca-<br />
balmente a sua missáo.. . Completaram a sua obra até ao fim reduzindo<br />
á mendici<strong>da</strong><strong>de</strong>, até ao ultimo, os indigenas ricos <strong>da</strong> circnmscripçáo. Terminou<br />
por não ter na<strong>da</strong> que fazer quando j& não tinha ninguem a quem arruinar.<br />
Os inglezes quando avaliaram to<strong>da</strong> a extensáo d'estas <strong>de</strong>sastrosas<br />
.consequencias, não se furtaram á reconsi<strong>de</strong>raçáo, annullaram to<strong>da</strong> essa<br />
organisaçáo judiciaria, e com a <strong>de</strong>cisão e perseverança caracteristicas <strong>da</strong><br />
sua raça, trataram <strong>de</strong> restaurar completamente as jurisdicções indigenas, e<br />
<strong>de</strong> crear uma illustra<strong>da</strong> magistratura, recruta<strong>da</strong> geralmente nas castas<br />
superiores.<br />
Hoje to<strong>da</strong> a materia civel 1': julga<strong>da</strong> por magistrados indios, e as au-<br />
ctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s inglezas <strong>da</strong> India mais altamente colloca<strong>da</strong>s, são as primeiras a<br />
testemunhar a superiori<strong>da</strong><strong>de</strong> dos jiiizes indios, a quem o conhecimento<br />
perfeito <strong>da</strong> lingua e dos costumes, confere manifesta vantagem sobre os<br />
magistrados inglezes.<br />
Isto 6 tanto assim, que até mo<strong>de</strong>rnamente nos tribunaes civis do im-<br />
perio, <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> se fazer a distincçáo <strong>da</strong> nacionali<strong>da</strong><strong>de</strong> dos pleiteantes.<br />
<strong>Indigena</strong>s ou europeus, todos estão sujeitos ii jurisdicçáo dos juizes<br />
hindús e ain<strong>da</strong> at8 hoje não surgiu a mais insignificante reclt~mação.<br />
Evi<strong>de</strong>ntemente o caso consi<strong>de</strong>rado é uma excepção, e <strong>de</strong>ixando a um<br />
futuro afastado a realisação <strong>de</strong> i<strong>de</strong>aes semelhantes, occupemo-nos no pre-<br />
sente em conservar aos indigenas o goso <strong>da</strong>s instituiçóes juridicas que lhes<br />
sáo proprias, e que concorrendo para o bem <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> nativa, sd po<strong>de</strong>m<br />
representar garantia <strong>de</strong> exito do emprehendimento colonial.<br />
Nas India. Orientaes Neerlan<strong>de</strong>zas foram manti<strong>da</strong>s as jurisdicções
- CONDIQBO JURIDICA<br />
- -.-<br />
185<br />
-<br />
indigenas em tudo o que se refere ao estatuto pessoal ou ao regimen <strong>de</strong><br />
successóes; para as questóes relativas ao direito <strong>da</strong>s obrigações existem<br />
tribunaes mixtos constituidos por indigenas e presididos por magistrados<br />
hollan<strong>de</strong>aes.<br />
Esses funccionarios náo pertencem aos quadros metropo1itan.o~<br />
; alem<br />
do curso geral <strong>de</strong> direito, teem um curso complementar on<strong>de</strong> estu<strong>da</strong>m<br />
conscienciosamente as linguas e instituiçóes indigenas, e o direito maho-<br />
metano.<br />
Fazem to<strong>da</strong> a sua carreira n'aquellas colonias, e como percorrem todos<br />
os graus hierarchicos comepando pelos mais mo<strong>de</strong>stos, acabam por se fami-<br />
liarisar plenamente com os usos e as instituiyiies indigenas.<br />
Sempre que sejam conserva<strong>da</strong>s as jurisdicçóes civis indigenas, enten-<br />
dc--e que ellas se exercem por man<strong>da</strong>to expresso <strong>da</strong> administraçtEo europeia<br />
qiie nomeia e tlemitte os juizes. I? preciso que as auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s constitui<strong>da</strong>s<br />
nas colonias tenham meios <strong>de</strong> impor aos tribunaes indigenas a justa obser-<br />
vancia dos preceitos legaes, e possam fiscalisar <strong>de</strong>vi<strong>da</strong>mente os abusos ou<br />
w<br />
irregulari<strong>da</strong><strong>de</strong>s sempre possiveis.<br />
Varios coloniaes aconuelliam como unico processo efficitz <strong>de</strong> fiscalisação<br />
effectiva, a creaçáo <strong>de</strong> tribunaes europeiis on<strong>de</strong> possam subir em appellaçáo<br />
os recursos vindos <strong>da</strong> primeira instancia. Mas, evi<strong>de</strong>ntemente as<br />
razóes produzi<strong>da</strong>s contra a installaçáo <strong>da</strong>s jurisdicçóes europeias na administração<br />
em primeira iiistancia <strong>da</strong> justiça indigena, subsistem pelos mes-.<br />
mos motivos contra o estabelecimento <strong>de</strong> estaçóes juridicas superiores.<br />
O Congresso <strong>de</strong> Sociologia Colonial <strong>de</strong> 1900 emittiu um voto referente<br />
á conveniencia <strong>de</strong>, sempre que haja necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> crear novas jurisdicçóes<br />
civis, ellas serem compostas <strong>de</strong> magistrados europeus e assessores<br />
indigenas, ou <strong>de</strong> magistrados indigenas presididos por um europeu.<br />
h creaçáo d'estas novas jurisdicçóes tanto pU<strong>de</strong> resultar <strong>da</strong> fuga <strong>da</strong>s<br />
auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s indigenas, que ordinariamente se segue á conquista pela força<br />
do territorio colonial, como pó<strong>de</strong> dimanar <strong>da</strong> necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> do estabeleci-<br />
mento d'uma instancia superior em que o elemento europeu, estaindo repre-<br />
sentado, possa fiscalisar proficuamente os julgamentos indigenas.<br />
Giraiilt rtccentua a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> creaçáo d'estes assessores sempre
166 POLITICA INDIGENA<br />
que os magistrados europeus sejam chamados a estatuir sobre assumptos<br />
<strong>de</strong> direito civil indigena.<br />
Em regra a sentença que termina o pleito indispóe a parte litigante<br />
que o per<strong>de</strong>u contra o julgador que a proferiu. Este facto que representa<br />
mais um motivo para serem manti<strong>da</strong>s as jurisdicçóes indigenas, a fim <strong>de</strong><br />
evitar esse pretexto <strong>de</strong> animosi<strong>da</strong><strong>de</strong> contra os dominadores, patenteia tam-<br />
bem a vantagem politica que resulta <strong>da</strong> responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> sentença ficar<br />
reparti<strong>da</strong> entre o magistrado europeu e os assessores indigenas, muito<br />
embora estes ultimos apenas tenham voto consultivo.<br />
As jurisdicçóes indigenas <strong>de</strong>vem pois ser integralmente manti<strong>da</strong>s,<br />
sempre que isso seja possivel, ou em qualquer outra hypothese, substitui-<br />
<strong>da</strong>s por uma organisação judicinria em que se dC larga representação ao<br />
elemento indigena.<br />
Quer umas, quer outras, sáo susceptiveis <strong>de</strong> melhoramento progres-<br />
sivo que se pó<strong>de</strong> obter pela moralisaçáo do meio social, pela severi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
<strong>da</strong>s condiçóes <strong>de</strong> recrutamento, pela competente fiscalisaçáo europeia, e<br />
pela repressão' rigorosa <strong>da</strong> concussão e <strong>da</strong> venali<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
Já vimos como <strong>de</strong>vem ser conserva<strong>da</strong>s as instituiçóes <strong>da</strong> familia,<br />
successão e proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>, garantindo-se assim aos indigenas um estatuto<br />
juridico differente do dos europeus ; é preciso entretanto contar com a evo-<br />
luç8o natural que po<strong>de</strong> levar os indigenas á adopção <strong>da</strong>s nossas institui-<br />
ções.<br />
Jvíesmo na actuali<strong>da</strong><strong>de</strong> são frequentes em muitas colonias a renuncia ao<br />
estatuto indigena e a opção voluntaria pela assimilação juridica.<br />
Este procedimento que, a nosso ver impropriamente, Girault <strong>de</strong>no-<br />
mina ~zaturaliaaç&o,<br />
po<strong>de</strong> admittir diversas gra<strong>da</strong>ções.<br />
Assim po<strong>de</strong> limitar-se ao facto <strong>de</strong> dois indigenas que pleiteiam ou<br />
contractam se dirigirem <strong>de</strong> preferencia aos tribunties europeus, em cuja<br />
e illiistração <strong>de</strong>positam mais confiança, fazendo previamente <strong>de</strong>-<br />
clamçáo publica <strong>de</strong> que <strong>de</strong>se+jam ser julgados pelas leis europeias.<br />
Absolutamente nenhum inconveniente po<strong>de</strong>rá resultat d'esse procedi-<br />
mento, e s6 vantagens moraes para prestigio <strong>da</strong> civilisação dos colonisridores.<br />
Quanto 5 renuncia completa ao estatuto indigena e coticomitante
CONDIÇBO JURIDICA 1<br />
assimilação juridica, publicistas ha, que a consi<strong>de</strong>ram como um perigo<br />
grave para os interesses <strong>da</strong> nação dominadora.<br />
A nosso vêr laboram n'um puro equivoco que é consequencia <strong>de</strong> se<br />
adoptar impensa<strong>da</strong>mente o termo nati~ralisaçdo usado por Girault. Este<br />
distinctissimo professor, no seu lucido rclatorio apresentado no Congresso<br />
<strong>de</strong> 1900, tratando d'esta questão, começa por dizer que geralmente nunca<br />
aão os melhores elementos <strong>da</strong>s populaçúes indigenas que procuram a convivencia<br />
dos europeus e sollicitam a sua naturalisaç80, e que a circumstancia<br />
d'esse <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> assimilação, não é uma garantia <strong>da</strong>s suas quali<strong>da</strong><strong>de</strong>s ou <strong>da</strong><br />
sua boa f6, mas apenas a indicação d'um mobil reservado que muitas vezes<br />
p6<strong>de</strong> ser contrario aos interesses <strong>da</strong> colonisaçáo.<br />
Depois, citando o facto <strong>da</strong>s medi<strong>da</strong>s restrictivas adopta<strong>da</strong>s por Gallieni<br />
em Ma<strong>da</strong>gascar, para limitar as renuncias <strong>de</strong> estatuto que entre OS<br />
Hovas se generalisavam vertiginosamente, conclue pela affirmaçiio <strong>de</strong> que,<br />
se todos os indigenas argelinos pedissem e obtivessem a sua naturalisação,<br />
os colonos francezes nao teriam outra coisa a fazer senão abandonar a<br />
colonia e atravessar o Mediterraneo.<br />
Discor<strong>da</strong>mos absolutamente d'esta maneira <strong>de</strong> ver, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que, por<br />
naturalisaç~o se enten<strong>da</strong> apenas assimilação juridica, que nas condiç6es <strong>de</strong><br />
evolução ou <strong>de</strong> opção, não pó<strong>de</strong> ser recuzavel, nem ter consequencias nefastas<br />
<strong>de</strong> qualquer natureza.<br />
Se Girault se quer referir tambem á acquisição dos direitos politicos,<br />
então sim, é indispensavel a mais cautelosa pru<strong>de</strong>ncia na concessão dos<br />
direitos <strong>de</strong> ci<strong>da</strong>dão aos subditos indigenas, conferindo-os lentamente, e<br />
apenas ás mentali<strong>da</strong><strong>de</strong>s indigenas mais eleva<strong>da</strong>s, e mais naturalmente interessa<strong>da</strong>s<br />
na continuação <strong>da</strong> or<strong>de</strong>m <strong>de</strong> coisas eutabeleoi<strong>da</strong> na colonia pela<br />
naçáo dominadora.<br />
É preciso, portanto, <strong>de</strong>sfazer to<strong>da</strong> a confusão entre as consequencias<br />
<strong>da</strong> renuncia ao estatuto civil que, embora inferior a uma lenta aproximaç80<br />
juridica, em na<strong>da</strong> po<strong>de</strong> alterar a segurança publica <strong>da</strong> colonia e os seus<br />
interessaes materiaes, e as consequencias <strong>da</strong> extensão <strong>de</strong> todos os direitos<br />
politicos aos indigenas, que evi<strong>de</strong>ntemente po<strong>de</strong>m suscitar diffioul<strong>da</strong><strong>de</strong>s inaapraveie<br />
á. politica dominadora.
168 POLITICA INDIGENA<br />
-- - --<br />
Até agora temo-nos limitado a suppor, quanto á constituiçáo dos tri-<br />
bunaes civis, que elles serão chamados sómente a julgar questões entre<br />
indigenas; as questões entre europeus, está naturalmente indicado, que<br />
sejam <strong>de</strong>feri<strong>da</strong>s aos seus tribunaes 'privativos; s6 falta averiguar a quem<br />
<strong>de</strong>ve ser outhorga<strong>da</strong> a missão <strong>de</strong> <strong>de</strong>rimir os pleitos entre europeus e indi-<br />
genas. Alguns publicistas qiierem que seja preferi<strong>da</strong> a jurisdicção c10 reu,<br />
mas como no caso do auctor ser europeu, este se veria obrigado a recorrer<br />
aos tribunaes indigenas, o que geralmente se tem feito 6 submetter aos tri-<br />
bunaes europeus to<strong>da</strong>s as questóes em que um europeu seja parte.<br />
Girault propóe a creaçáo <strong>de</strong> tribunaes mixtos compostos <strong>de</strong> magistra-<br />
dos indigenas e europeus e presididos por um funccionario administrativo.<br />
O Congresso <strong>de</strong> 1900 consagrou esta proposta, modificando-a e reduzindo-a<br />
ao seguinte enunciado :<br />
u Os processos entre individuos <strong>de</strong> raças differentes <strong>de</strong>vem ser jul-<br />
gados, não pelos tribunaes europeus, mas por tribunaes mixtos on<strong>de</strong> em<br />
todos os casos o elemento europeu estará representado S.<br />
O Congresso não tratou <strong>de</strong> fixar a legislação que n'este caso se <strong>de</strong>verá<br />
appliear; a nós parece-nos conveniente, fazer prevalecer exclusivamente o<br />
direito europeu.<br />
<strong>Direito</strong> privado indigena nas colonias portuguezas<br />
Vamos agora estu<strong>da</strong>r a condição juridica dos indigenas que povoam<br />
as colonias portuguezas, sob os pontos <strong>de</strong> vista <strong>da</strong> legislação civil e <strong>da</strong><br />
administraç80 <strong>da</strong> justiça. Para esse fim soccorrer-nos-hemos <strong>de</strong> successivas<br />
transcripçúes <strong>da</strong>s importantes memorias envia<strong>da</strong>s pelo Governo portuguez<br />
ao Congresso <strong>de</strong> Sociologia Colonial, por nos parecer bastante util e interessante<br />
esse estudo <strong>de</strong> compilaçáo e critica. A legisla~áo civil em vigor é<br />
a seguinte : L<br />
Codigo civil <strong>de</strong> 1 <strong>de</strong> julho <strong>de</strong> 1867, applicado As coloriias portuguezas
por <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 19 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1869 ; a fórma do processo civil é a do<br />
Codigo do processo <strong>de</strong> 8 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1876, applica<strong>da</strong> ás colonias por<br />
<strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 14 <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong> 1881 ; para os actos commerciaes existe o Co-<br />
digo commercial approvado para o territorio continental e ilhas adjacentes<br />
pela carta <strong>de</strong> lei <strong>de</strong> 28 <strong>de</strong> junho <strong>de</strong> 1888, e generalisado ás colonias por<br />
<strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 20 tle fevereiro <strong>de</strong> 1894, e o Codigo do processo commercial <strong>de</strong><br />
24 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 1895. applicado ás colonias por portaria ministerial <strong>de</strong> 31<br />
<strong>de</strong> maio do mesmo anno.<br />
O <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 18 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1869, que poz em vigor nas possessóes<br />
portuguezae o Codigo civil <strong>de</strong> 1867, estabelece as seguintes excepçóes.<br />
5 1 .O - Exceptuam-se :<br />
«a) Na Tndia os usos e costumes <strong>da</strong>s Novas Conquistas, e os <strong>de</strong><br />
Damáo e Diu, reunidos nos respectivos codigos, quando não sejam contrarios<br />
á moral e á or<strong>de</strong>m publica.<br />
b) Em Macau os usos e costumes dos chinas nas questóes <strong>da</strong> competencia<br />
do procurador dos negocios sinicos.<br />
a c) Em Timor os usos e costumes dos indigenas nas quest6es siiscita<strong>da</strong>s<br />
entre elles.<br />
d) Na, Guiné ou casos e costumes dos indigenas <strong>de</strong>nominados grumetes<br />
nas qiiestóes entre elles.<br />
e) Em Moçambique os usos e coetumes dos baneanes, bathiás, parses,<br />
monh&s, gentios e outros indigenas nas questóes suscita<strong>da</strong>s entre<br />
elles.<br />
R C) 2.0 -Nos casos em que ambas as partes a que se applicam as excepçóes<br />
do 5 1.O, optarem <strong>de</strong> commum accordo pela applicnçáo do Codigo<br />
civil, applicar-se-ha - este.<br />
u &j 3.O Os governadores <strong>da</strong>s provincias ultramarinas farão organisar<br />
immediatamente a codificação dos usos e costumes mencionados no 5 1.0<br />
e que ain<strong>da</strong> na0 foram codificados, submettendo os respectivos ~rojectos á<br />
approvaçáo do governo.<br />
Na India, como para <strong>de</strong>ante veremos, os usos e costumes estavam ha<br />
muito tempo colligidos e coor<strong>de</strong>nados, e foram-no recentemente para os,
170 POLITICA INDIGENA -<br />
-<br />
habitantes não christãos <strong>de</strong> Damáo e <strong>de</strong> Diu nas portarias do governo ge-<br />
ral <strong>da</strong> India <strong>de</strong> 16 <strong>de</strong> janeiro 6 <strong>de</strong> 30 <strong>de</strong> julho <strong>de</strong> 1895.<br />
Em Moçambique, o primeiro governador geral que intentou codificar<br />
,os usos e costumes foi o Sr. Conselheiro Francisco Maria <strong>da</strong> Cunha, que<br />
para esse fim nomeiou commissóes em to<strong>da</strong>s as se<strong>de</strong>s dos districtos. Em to-<br />
dos os tribunaes, sempre constituidos por magistrados europeus, applica-se<br />
o direito mahometano, para o que existem peritos indigenas que indicam<br />
a lei.<br />
O Sr. Dr. Marnoco no seu livro a Administraçáo Coloniiil. diz a pa-<br />
ginas 443 o seguinte:<br />
a O <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 1869 resalvou os usos e costumes indigenas, mas es-<br />
queceu-se <strong>de</strong> que o Codigo civil não podia soffrer esta a<strong>da</strong>ptação sem pre-<br />
juizo <strong>da</strong> sua uni<strong>da</strong><strong>de</strong> e homogenei<strong>da</strong><strong>de</strong>. Os usos e costumes indigenas con-<br />
sagram principios inteiramente oppostos ás bases <strong>da</strong> organisaçáo juridica e<br />
social estabeleci<strong>da</strong> pelo Codigo civil. O codigo civil não pó<strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> ter,<br />
em taes condiçóes, uma vi<strong>da</strong> <strong>de</strong> excepção, sendo por isso, mais rasoavel que<br />
se <strong>de</strong>cretassem os usos e costumes indigenas, <strong>de</strong>vi<strong>da</strong>mente compilados, como<br />
lei civil.<br />
D'aqui se vê que admittimos os usos e costumes indigenas timi<strong>da</strong>mente.<br />
O contrario tem feito a Inglaterra que leva o seu respeito pelos usos e<br />
costumes indigenas ate ao ponto <strong>de</strong> formular, em harmonia com elles, as<br />
suas leis coloniaes. A Inglaterra tem em to<strong>da</strong>s as partes do seu gigantesco<br />
imperio colonial as native laws D .<br />
As tentativas <strong>de</strong> codificaçáo dos usos e costumes, salvo as excepções<br />
menciona<strong>da</strong>s, nao teem sido leva<strong>da</strong>s a effeito. Não só o <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 18 <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1869, como recentemente as portarias ministeriaes <strong>de</strong> 9 <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1896 e <strong>de</strong> 30 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1905, se teem preoccupado com<br />
o assumpto recommen<strong>da</strong>ndo <strong>de</strong>bal<strong>de</strong> esses trabalhos que ain<strong>da</strong> estão por<br />
fazer.<br />
Na GuinB, segundo se <strong>de</strong>prehen<strong>de</strong> do relatorio enviado ao Congresso<br />
<strong>de</strong> 1900 e <strong>de</strong>vilo acr Sr. Gonçalves Guimarães, nem mesmo se pb<strong>de</strong> appli-<br />
car o <strong>de</strong>creto r!,: 1869, por náo haver fontes <strong>de</strong> consulta sobre os men-<br />
cionados usos e c,ostumes dos grumetes.
Com relaqbo á India, segundo diz o Sr. Ghristovam Pinto na sua<br />
memoria c Leu IndiyBncs <strong>de</strong> l'ln<strong>de</strong> Portugaiue s, (') a applicação do <strong>de</strong>creto <strong>de</strong><br />
1869 apresentou serias dificul<strong>da</strong><strong>de</strong>s, porque, se do relatorio que prece<strong>de</strong> o<br />
<strong>de</strong>creto se conclue que o legislador pretendia exceptuar todos os costumes<br />
indigenas, a lettra <strong>da</strong>s dikposiç6es legaes consagrava apenas os <strong>da</strong>s Novas<br />
Conquistas. Ha apenas 29 annos que tanto as Novas como as Velhas Con-<br />
quistas gozam <strong>da</strong> mesma situação perante a lei, garanti<strong>da</strong> pelo <strong>de</strong>creto <strong>de</strong><br />
16 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1880, que approvou e <strong>de</strong>u força <strong>de</strong> lei ao codigo hindú<br />
<strong>da</strong>s Velhas Conquistas.<br />
Os usos e costumes (Ias Xovas Conquistas foram compilados em<br />
1824 e alterados em 1855. O:, <strong>de</strong> Damão e <strong>de</strong> Diii foram approvados por<br />
portaria <strong>de</strong> 31 <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong> 1861, confirmados por portaria <strong>de</strong> 4 <strong>de</strong> <strong>de</strong>-<br />
zembro <strong>de</strong> 1865, e modificados pelo <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 16 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1680.<br />
Hoje estiio substituidos pelos codigos a que já nos referimos, appro-<br />
vados em 1895.<br />
Em Cabo Ver<strong>de</strong> e em Angola não ha excepqfio alguma á applicação<br />
do Codigo civil, e não nos consta que se tenha realisado qualquer compila-<br />
ção dos respectivos usos e costumes rlos indigenas. Em Moçambique, apesar<br />
<strong>de</strong> diversas vezes os governadores terem procurado obter codificaçóes dos<br />
usos e costumes, ain<strong>da</strong> ha inuito pouco feito. Diz o Sr. Dr. Marnoco (livro<br />
citado) que houve uma commissiio para esse fim nomeia<strong>da</strong> que teve a ousa-<br />
dia <strong>de</strong> <strong>de</strong>clarar. que não era necessario estu<strong>da</strong>r os costumes dos indigenas,<br />
visto elles se conformarem com as nossas leis ! I. . . . . Em 1882 e 1889 foram<br />
approvadoa dois codigos para a resoluçfio <strong>de</strong> ~nilnfzdos; aquelle que já<br />
tivemos occasião <strong>de</strong> compulsar refere-se quasi exclusivamente aos costumes<br />
<strong>da</strong>s populaçóes zambezianrts.<br />
Actualmente o Sr. Conselheiro Freire d'Andra<strong>de</strong>, governador geral <strong>de</strong><br />
Moçambique, bastante empenhado em conseguir finalmente um codigo indigena,<br />
nomeiou uma commissão que está tratando do assumpto. Esperemos<br />
que d'esta vez seja levado ao fim esse util em~rehendimento.<br />
(I) Excellentc trabalho apresentado ao Congresso <strong>de</strong> Sociologia Colonial<br />
<strong>de</strong> 1900.
172 POLITICA INDIGENA<br />
-- P<br />
Deixemos pois as colonias africanas, on<strong>de</strong> ain<strong>da</strong> tiido está por fazer,<br />
e indiquemos separa<strong>da</strong>mente para a India e para blacau os topicos chsen-<br />
ciaes <strong>da</strong> situaçgo dos seus indigenas sob o ponto <strong>de</strong> vista do direito pri-<br />
vado. Já vimos que a legislaçáo portug~ieza se applica sempre aos indige-<br />
nas christãos <strong>da</strong> India; as instituiqóes juridicas dos não christáos, estão<br />
como dissemos, compila<strong>da</strong>s, mas exigem certas modificaçóes e 6 <strong>de</strong> esperar<br />
que o governo portuguez promova e estimule o estudo <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as suas<br />
particulari<strong>da</strong><strong>de</strong>s. Se to<strong>da</strong>s tivessem sido bem examina<strong>da</strong>s ter-se-hiam evi-<br />
tado muitas <strong>de</strong>sor<strong>de</strong>ns n:is Sovas Conquistas, principalmente em Satary.<br />
No que respeita á orgrtnisaqko <strong>da</strong> familia e <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>, o benefi-<br />
cio dos costumes intligenas foi em geral conservado, mas sopprimiram-se<br />
certas in,justiqas flagrantes e algumas praticas immoraes ou <strong>de</strong>shumanas. E<br />
urgente que o governo man<strong>de</strong> proce<strong>de</strong>r, nos codigos approvados, A modifica-<br />
ção <strong>de</strong> certos preceitos que estão muito longe <strong>de</strong> traduzir fielmente a in-<br />
terpretação juridica a attribuir nos costumes a que se referem.<br />
Na India não parece haver necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> ou vantagem em restabelecer<br />
as antigas jurisdicçóes hindiis ha seculos <strong>de</strong>sappareci<strong>da</strong>s. Com relaçáo ao di-<br />
reito <strong>da</strong>s obrigaçóes e ao direito commercial não são precisas novas alte-<br />
raçóes. Est& em vigor a legislação metropolitana; o trabalho dos indigenas<br />
6 livre; o systema <strong>de</strong> provas B O mesmo dos nossos codigos e existem re-<br />
gulamentos especi;les para assegurar o cumprimento <strong>da</strong>s obrigagóes toma-<br />
<strong>da</strong>s pelos guar<strong>da</strong>s <strong>da</strong>s proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>s ruraes - mufidcares - para com os<br />
proprietarios.<br />
Os tribunites mixtos. sáo dispenuaveis na India, on<strong>de</strong> os tribunaes<br />
portuguezes que alli funccinnam resolvem tcdos os pleitos entre individuos<br />
<strong>de</strong> raças differentes. Caminhou-se muito, e durante muito tempo, na sen<strong>da</strong><br />
<strong>da</strong> assimilação politica, para que se possa aconselhar hoje qualquer extem-<br />
poraneo retrocesso.<br />
A <strong>de</strong>claração dos nascimentos e obitos está alli em vigor ha muito<br />
tempo. O estado civil dos indigenas esta organisado com o registro paro-<br />
chia1 e civil <strong>de</strong> longa <strong>da</strong>ta estabelecido por lei.<br />
Vejamos agora qual B a legislaçko civil e commercial a que em Macai<br />
estão sujeitos os indigenas. As attribuiçóes judiciarias que segundo a lei d
1881 pertenciam á Procuratura Administrativa nas causas civis e commer-<br />
ciaes e nos pkocessos <strong>de</strong> inventario <strong>de</strong> valor egual ou inferior a cem pata-<br />
cas, que julgava em unica insttincia, foram-lhe conserva<strong>da</strong>s pelo artigo 5<br />
do <strong>de</strong>creto com força <strong>de</strong> lei <strong>de</strong> 20 <strong>de</strong> fevereiro <strong>de</strong> 1894.<br />
Pela lei <strong>de</strong> 17 <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong> 1899 fizeram-se passar ao juiz <strong>de</strong> pri-<br />
meira instancia estas mesmas attribuiçóes, com a fdrma <strong>de</strong> processo pre-<br />
scripta pela lei <strong>de</strong> 22 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1881.<br />
Assim, para os indigenas, a SO~IIÇ~O<br />
<strong>da</strong>s suas questóes civis at4 ao<br />
valor <strong>de</strong> 100 patacas, e os seus inventarios e causas commerciaes, são jul-<br />
gados verbalmente, ao passo que os outros habitantes <strong>da</strong>s colonias luctam<br />
com maiores difficul<strong>da</strong><strong>de</strong>s, porque a jurisdicçáo dos juizes populares limi-<br />
ta-se a 36000 reis, e não vale a pena, a não ser por capricho, recorrer ao<br />
tribunal pelo processo ordinario, taes são as <strong>de</strong>spezas a realisar em sellos,<br />
custas, emolumentos, e honorarios dos advogados.<br />
E', pois, <strong>de</strong> maxima utili<strong>da</strong><strong>de</strong> alargar a esphera d'acçáo dos processos<br />
summarios para QS Chinas, <strong>de</strong> 100 a 200 patacas, <strong>da</strong>ndo ain<strong>da</strong> ás partes a<br />
facul<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> renunciar ao recurso, e <strong>de</strong>ixando ao juiz a <strong>de</strong>cisão <strong>da</strong>s causas<br />
superiores, att? 6 importancia <strong>de</strong> 1:000 patacas.<br />
Em materia civel, a maneira especial por que estão organisados os<br />
inventarios chinezes é digna <strong>de</strong> menção. Este assumpto attrahiu a attençáo<br />
do governo <strong>da</strong> metropole que por <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 26 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1862,<br />
<strong>de</strong>terminou que as heranças dos chinezes naturalisados ci<strong>da</strong>dãos portugue-<br />
zes, fossem regula<strong>da</strong>s segundo os usos e costumes <strong>da</strong> China, sempre que os<br />
chinezes supramencionados sollicitassem essa regalia quando requeressem<br />
a respectiva nacionalisação.<br />
Depois do <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 18 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1869, ciija <strong>de</strong>terminac;ão<br />
relativa a Macau j& referimos, veio o <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> i <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong> 1880 que<br />
no seu primeiro artigo, estabelece o seguinte:<br />
.As Iierançau dos Chinas estabelecidos em Macau e ahi naturalisados<br />
ci<strong>da</strong>dãos portuguezes, serão regula<strong>da</strong>s segundo os usos e costumes dos chi-<br />
nezes, excepto quando estes sollicitem a applicação <strong>da</strong> legislação portugueza<br />
-ti transmissão <strong>da</strong>s suas heranças B. Sobre este ponto applica-se ain<strong>da</strong> hoje
I@% YOLITIOA INDIGIENA<br />
a Or<strong>de</strong>nança <strong>da</strong> Procuratura Admini~trativa, approva<strong>da</strong> por <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 22<br />
<strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1881, que no seu artigo 40.0 diz o seguinte:<br />
* S6 se fará inventario ou partilha quando os interessados o requererem,,<br />
e n'este caso <strong>de</strong>ve-se observar, tanto quanto fôr possivel, a fórma<br />
do processo estaheleci<strong>da</strong> na legislação em vigor.<br />
8 unico - Comtiido, quando haja her<strong>de</strong>iros menores, ausentes ou interdictos,<br />
<strong>de</strong>ve fazer-se officio~cameiite a <strong>de</strong>.;cripçáo <strong>de</strong> todos os bens <strong>de</strong> que se<br />
compúe a herança e a ava1iai;ão dos moveis, sendo obrigado, aquelle que,<br />
segundo os usos e costumes chinezes fica <strong>de</strong> posse <strong>da</strong> herança e encarregado<br />
<strong>da</strong> sua administra~ão, a fornecer .uma caução sufficiente durante o<br />
espaço <strong>de</strong> um anno, como garantia <strong>da</strong>s verbas, po<strong>de</strong>ndo pertencer aos menores,<br />
ansentes o11 interdictos. ,4 <strong>de</strong>scripçáo e a avaliação (levem realisar-se<br />
n'um praso <strong>de</strong> 60 dias, e H partilha, feita sem intervenção <strong>da</strong> auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />
e segundo os usos e costumes chinezes, <strong>de</strong>ve estar inclui<strong>da</strong> no fim d'um<br />
anno contado a partir <strong>da</strong> cl~ta do obito do auctor <strong>da</strong> herança, e no mesmo<br />
praso se levarão as respectivas contas á Procuratura n . Hoje a Procuratura<br />
que foi pela lei <strong>de</strong> 17 d'agosto <strong>de</strong> 1900 esbulha<strong>da</strong> <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as attribuiçúes<br />
judiciarias, B substitui<strong>da</strong> pelo juiz <strong>da</strong> primeira instancia, que continha entretanto<br />
a applicar a legisla950 cita<strong>da</strong>.<br />
a A condição juridica dos inrligenas, sob o ponto <strong>de</strong> vista <strong>da</strong> legislação<br />
commercial, exceptuando os litigioa <strong>de</strong> valor inferior a 180 patacas que<br />
são julgados siimmariamente, é perfeitamente i<strong>de</strong>ntica dos restantes habi-<br />
tantes <strong>da</strong> colonia.<br />
O Regiilamento <strong>da</strong> Administração <strong>da</strong> Justiça nas provincias ultrama-<br />
rinas, na 3.6 secç%o, occupando-se <strong>de</strong> julgamentos commerciaes, organisa o<br />
jury composto <strong>de</strong> 4 jurados e 2 siipplentes, e fixo para ca<strong>da</strong> anno; esta<br />
forma complica<strong>da</strong> e ina<strong>da</strong>ptavel ao meio complica-se ain<strong>da</strong> mais com a<br />
recuza dos jiirados nos C~ROS<br />
previstos pelo codigo commercial, pois não<br />
havendo lista, difficulta-st: a norneaçko <strong>de</strong> outros. No que respeita ao pro-<br />
gresso e <strong>de</strong>senvolvimento dos indigenas, parece-nos que se lhes confiou<br />
<strong>de</strong>masia<strong>da</strong>mente cedo a missão difficilima que correspon<strong>de</strong> á instituição do<br />
jnry, que na pratica colonial está bem longe <strong>de</strong> ter <strong>da</strong>do resultados satis-<br />
fatorios. Sem a snpprimir completamente podia <strong>de</strong>terminar-se, em analogia
com o estabelecido ao artigo 401 do codigo do processo civil, que a inter-<br />
venção dos jurados commcrciaes s6 se effectuasse mediante requerimento<br />
escripto em que as partes concor<strong>da</strong>ssem em solicitá-la, e que seria entregue<br />
antes <strong>de</strong> se fixar o dia para a audiencia <strong>da</strong>s testemunhas. D (I)<br />
Dias Ferreira affirma no seu commentario ao codigo civil que em<br />
Portugal ninguem <strong>de</strong>seja jurados em causas civis e que por isso os artigos<br />
que se lhe referem ficam lettra morta, visto a intervenção do jury <strong>de</strong>pen-<br />
<strong>de</strong>r do accordo e requerimento previo <strong>de</strong> ambas as partes. No relatorio<br />
sobre Maca11 enviado ao Congresso <strong>de</strong> Sociologia Colonial, afirma-se egual-<br />
mente que se alli <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>sse <strong>da</strong>s partes litigantes a intervenção do jury<br />
nas cansas commerciaes, nunca ou rarissimas vezes os ,jurados seriam cha-<br />
mados a pronunciar o seu veredictum.<br />
O que se <strong>de</strong>ve modificar quanto antes é a forma do processo nas<br />
quest8es civis e commerciaes, pois as nossas formali<strong>da</strong><strong>de</strong>s juridicas não são<br />
comprehendi<strong>da</strong>s pela gran<strong>de</strong> maioria dos habitantes <strong>de</strong> Mscau que acima<br />
<strong>de</strong> tudo <strong>de</strong>se,jariam ver as suas questóes resolver-se por processos simples<br />
e expeditos.<br />
E' urgente que se simplifiquem os processos, <strong>de</strong> maneira que os chi-<br />
nas se habituem a reoorrer aos nossos tribunaes, sem receio justificado <strong>de</strong><br />
gran<strong>de</strong> dispendio e maior per<strong>da</strong> <strong>de</strong> tempo.<br />
A proposta apresenta<strong>da</strong> em 1898 ao Parlamento, para estabelecer<br />
um processo commercial summario nas questóes <strong>de</strong> pouca importancia, Q<br />
perfeitamente razoavel e concor<strong>da</strong>nte com as necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> colonia.<br />
N'um bem elaborado projecto <strong>de</strong> regulamento <strong>da</strong> administração <strong>da</strong><br />
justiça na provincia <strong>de</strong> Macau, apresentado em 20 <strong>de</strong> outubro <strong>de</strong> 1893 pelo<br />
dr. Albano <strong>de</strong> Magalhães, juiz n'aquella ci<strong>da</strong><strong>de</strong>, propõe-se no artigo 36:<br />
1176 POLITICA INDIGENA<br />
Teu não sollicite antes <strong>da</strong> audiencia do julgamento, que o processo seja pela<br />
via ordinaria. 3 No artigo 107 do referido projecto accrescenta-se:<br />
Que as partes con<strong>de</strong>mna<strong>da</strong>s n'estes processos pagarão alem dos sel-<br />
10s a percentagem <strong>de</strong> 7 O/, do valor <strong>da</strong> causa, po<strong>de</strong>ndo ain<strong>da</strong> o juiz, extraor-<br />
dinariamente, e segundo requerimento <strong>de</strong>vi<strong>da</strong>mente instruido, quando os<br />
bens dos <strong>de</strong>vedor não cheguem para satisfazer a sollicitação, reduzir essa<br />
percentagem a uma somma inferior, proporciona<strong>da</strong> á importancia total a<br />
receber, e utilisando para pagamento <strong>da</strong>s custas dos inci<strong>de</strong>ntes e actos pre-<br />
paratorios do processo, a percentagem <strong>de</strong> 4 O/, <strong>de</strong>duzi<strong>da</strong> <strong>da</strong> importancia do<br />
litigio a que esses actos se referem. n<br />
A necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> simplificação <strong>da</strong>s formali<strong>da</strong><strong>de</strong>s juridicas accentua-se<br />
ain<strong>da</strong> com maior caracter <strong>de</strong> urgencia, na formaçáo dos processos civis e<br />
commerciacs nas questóes <strong>de</strong> importancia quasi insignificante.<br />
Se náo se adoptarem medi<strong>da</strong>s ten<strong>de</strong>ntes á substituiçáo <strong>da</strong>s nossas<br />
byzantinas e custosas formali<strong>da</strong><strong>de</strong>s que por vezes parecem até ter caracter<br />
impeditivo, to<strong>da</strong>s essas questóes <strong>de</strong>ixarão <strong>de</strong> ser submetti<strong>da</strong>s aos tribunaes<br />
judiciarios, para se confiar n sua discussão e <strong>de</strong>cisão 6s associaçóes <strong>de</strong><br />
classe ou mesmo a simples indiriduos, o que importará a creaçáo d'uma es-<br />
pecie <strong>de</strong> tribunaes irregulares, que sd po<strong>de</strong>m concorrer para prejudicar a<br />
applicação <strong>da</strong> justiça e para tirar o prestigio indispensavel aos tribunaes<br />
judiciarios estabelecidos na colonia.<br />
<strong>Direito</strong> penal<br />
Se a administraçáo <strong>da</strong> justiça civil nos indigenas <strong>de</strong>ve pertencer,<br />
como procuramos mostrar, ás jurisdicçóes já compostas excliisivamente <strong>de</strong><br />
indigenas, j4 <strong>da</strong>ndo representaçfio tio elemento europeu, seria pelo contrario<br />
extraordinariamente nocivo que a justiça repressiva não fosse directamente<br />
exerci<strong>da</strong> pela naçáo dominadora por intermedio <strong>de</strong> funccionarios ou magis-<br />
I<br />
trados europeus. .
Com effeito, é indispensavel que o goveriio colonisador tenha na sua<br />
mão todos os meios eficazes <strong>de</strong> reprimir a <strong>de</strong>sor<strong>de</strong>m, o roubo, os attentados<br />
contra a vi<strong>da</strong> humana e as agitaçúes politicas, a fim <strong>de</strong> assegurar a<br />
niais completa or<strong>de</strong>m, sem ti. qual a obra civilisadora náo po<strong>de</strong>rá progredir,<br />
e o interesse econoniico <strong>da</strong> colonisação será profun<strong>da</strong>mente prejudicado<br />
com a falta <strong>da</strong> mão d'obra e com o retrahimento dos capitaes e <strong>da</strong>s iniciativas.<br />
Em paiz conquistado, as questóes <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m e segurança publica sobrelevairi<br />
{is <strong>de</strong>mais ; a organisaçáo <strong>da</strong> justiça repressiva correspon<strong>de</strong>, ao<br />
mesmo tempo, ao <strong>de</strong>ver moral e a um interesse essencialmente politico cuja<br />
importnncia nunca se <strong>de</strong>ve per<strong>de</strong>r <strong>de</strong> vista. (I)<br />
Os pov~sl~nrbaros são geralmente caracterisados, sob o ponto <strong>de</strong><br />
vista <strong>da</strong> criminologia, pela pouca importancia liga<strong>da</strong> á vi<strong>da</strong> humana, pelo<br />
mediocre respeito pela proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> alheia, pela substitiiiçáo <strong>da</strong> vingança<br />
particular á repressáo publica, e pela ausencia d'uma energica opinião publica<br />
con<strong>de</strong>mnatoria do crime.<br />
Esta ultima feição não é mais que a consequencia logica e natural<br />
<strong>da</strong> multiplici<strong>da</strong><strong>de</strong> dos crimes e <strong>de</strong>lictos, e <strong>da</strong> falta <strong>de</strong> repressão energica do<br />
banditismo inveterado, que chega mesmo a impôr-se pelo respeito <strong>da</strong> força,<br />
cobardia dos timidos e á admiração dos energicos.<br />
A na750 colonisadora precisa reprimir, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> principio, todos os crimes,<br />
com a maior rapi<strong>de</strong>z e severi<strong>da</strong><strong>de</strong>, evitando por todos os modos ao seu<br />
alcance que campeie infrene a impuni<strong>da</strong><strong>de</strong>, que aos olhos <strong>da</strong>s populaçóes<br />
indigenas é mero synonymo <strong>de</strong> fraqueza e <strong>de</strong> impotencia dos dominadores.<br />
A justiça exerci<strong>da</strong> pelos europeus <strong>de</strong>ve buscar impôr-se no animo<br />
dos indigenas pela equi<strong>da</strong><strong>de</strong>, segundo o significado d'esta i<strong>de</strong>ia na menta-<br />
li<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena; <strong>de</strong>ve ser rigorosa e expedita porque se as penas forem<br />
muito suaves ou a fórma do processo comportar inconcebiveis <strong>de</strong>longas, as<br />
vinganças e represalias particulares subsistir50 por muito tempo augmen-<br />
tando a criminali<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
(i) Billiard - O. C.cum
178 YOLITICA INDIGENA<br />
-<br />
Nos paizes civilisados, em que o crime e o <strong>de</strong>licto são excepções 4<br />
regra, é logico que a legislação procure garantir todos os direitos do accusado<br />
contra possiveis abusos do po<strong>de</strong>r; nos paizes barbaros, pelo contrario,<br />
o interesse <strong>da</strong> or<strong>de</strong>m e <strong>da</strong> segurança publica <strong>de</strong>ve prevalecer aos interesses<br />
individuaes, estabelecendo-se, B certo, normas que evitem os erros<br />
judiciarios, mas supprimindo to<strong>da</strong>s as formali<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong>snecessarias que alongam<br />
inutilmente a instrucção ou o julgamento, <strong>de</strong> forma a obter uma repressáo<br />
energica, rapi<strong>da</strong> e até, em <strong>de</strong>terminados casos, summaria.<br />
Entre povos selvagens ou barbaros, os inconvenientes <strong>de</strong> con<strong>de</strong>mnar<br />
um innocente são bem inferiores, em prejuizo momentaneo e em <strong>de</strong>sastrosas<br />
conscquencias fiituras, aos que resultariam <strong>da</strong> absolviçáo d'um culpado.<br />
Se bem que isto possa parecer quasi in<strong>de</strong>fensavel, sob o ponto <strong>de</strong><br />
vista moral, é comtudo perfeitamente exacto na pratica do tratamento dos<br />
indigenas coloniaes. Não é com theorias mais ou menos discutiveis nem<br />
com phrases bombasticas e empola<strong>da</strong>s que se colonisa o <strong>de</strong>serto ou se civilisa<br />
a barbarie.<br />
Sob o aspecto politico e pratico, unico que nos interejsa, <strong>da</strong> con<strong>de</strong>mnação<br />
d'um indigena irinocente, resultava o odioso que recahia sobre os<br />
membros do tribunal que 'a preferisse, e o prejuizo individual do innocente;<br />
<strong>da</strong> absolviçáo d'um culpado, além do inevitavel <strong>de</strong>sprezo pela nossa<br />
magistratura, nesultaria incitamento á multiplicação <strong>de</strong> crimes que lesariam<br />
gran<strong>de</strong> numero <strong>de</strong> innocentes. (')<br />
Tudo concorre para reprovar a concessáo <strong>da</strong> competencia criminal As<br />
jurisdicçúes indigenas. Colonias haveria em que as a~ictori<strong>da</strong><strong>de</strong>s indigenas<br />
sur<strong>da</strong>mente hostis aos europeus, utilisariam parcialmente essa po<strong>de</strong>rosa<br />
arma politica qiie é a repressão penal, castigando abusivameute os indigenas<br />
favoraveis á admiraçáo europeia, e innocentando <strong>de</strong>libera<strong>da</strong>mente todos<br />
os inimigos <strong>da</strong> auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> estabeleci<strong>da</strong>. De resto, a responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong><br />
or<strong>de</strong>m e <strong>da</strong> segurança pertence exclusivamente 4 nação dominadora que,<br />
por isso, carece <strong>de</strong> adoptar e administrar directamente to<strong>da</strong> a organisação<br />
(I) Girault - O. C.Lu11L
epressiva, que enten<strong>de</strong>r mais conveniente e necessaria ao cumprimento<br />
d'essa missáo.<br />
O qlie entre os indigenas fun<strong>da</strong>menta em bases soli<strong>da</strong>s o prestigio<br />
politico E <strong>de</strong>monstra<strong>da</strong>mente o direito <strong>de</strong> punir. E por isso que os chefes<br />
indigenas tanto apreciam possuir qualquer competencia repressiva ain<strong>da</strong><br />
que tenue, e que os europeus teem o maximo interesse em chamar a si to-<br />
<strong>da</strong>s as attribuiçóes penties, ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iras garantias <strong>de</strong> po<strong>de</strong>rio na adminis-<br />
tração <strong>da</strong>s populaçóes barbaras.<br />
Durante o primeiro periodo <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> colonial, o cui<strong>da</strong>do inicial <strong>de</strong><br />
quem colonisa é entregar aos seus administradores europeus, funccionarios<br />
civis ou militares, a administraçáo <strong>da</strong> justiça repressiva nas espheras<br />
d'acçáo territoriaes em que se exercer a sua acção administrativa.<br />
Salvo rnriesimas excepçóes, é forçoso que os europeus sejam os uni-<br />
cos a castigar, para mostrarem que são tambem os unicos a po<strong>de</strong>r man<strong>da</strong>r.<br />
É uma imperiosa necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> politica perante a qual <strong>de</strong>vem ce<strong>de</strong>r to<strong>da</strong>s as<br />
outras consi<strong>de</strong>raçóes. Mas, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>da</strong> importancia politica que<br />
resulta do exclusivo <strong>da</strong> competencia penal incumbir á jurisdicção europeia<br />
não se po<strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar no olvido a sua influencia no progresso <strong>da</strong> civilisa~áo.<br />
Devem-se respeitar as instituiçóes dos indigenas, mas ao mesmo tempo<br />
temos <strong>de</strong> procurar eleva-los at6 nós pela educação. Ora não ha ninguem<br />
que <strong>de</strong>sconheça o caracter excepcionalmente educativo <strong>da</strong> justiça crimi-<br />
nal, que tanto po<strong>de</strong> concorrer para o levantamento do nivel moral <strong>da</strong> so-<br />
cie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena, e que é mais um argumento que milita a favor <strong>da</strong> these<br />
proposta.<br />
O Congresso <strong>de</strong> Sociologia Colonial <strong>de</strong> 1900 consagrou esta doutrina<br />
no seguinte voto.<br />
a A administraçáo <strong>da</strong> justiça aos indigenas em materia repressiva<br />
<strong>de</strong>ve ser confia<strong>da</strong> ás auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> potencia colonisadora, mesmo quando<br />
a victima <strong>da</strong>s infracçóes for indigena, tendo-se sempre em conta as restri-<br />
cções que po<strong>de</strong>m trazer a este principio as necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s Iocaes ou as condi-<br />
çbes em que se estabeleceu o governo <strong>da</strong> coloniaD.<br />
Para evitar que as auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s europeias encarrega<strong>da</strong>s <strong>da</strong> justiça<br />
repressiva exorbitem censuravelmente, e para que possam emittir as suas<br />
*
180 Y OLITICA INDIGENA<br />
-- I<br />
sentenças com rectidão e integri<strong>da</strong><strong>de</strong>, 6 indispensavel a organisação <strong>da</strong><br />
lista <strong>da</strong>s infracçóes c <strong>da</strong>s penas, isto é, a promn1gac;áo d'um codigo penal.<br />
Mas qual <strong>de</strong>verá ser? O <strong>da</strong> metropole? Evi<strong>de</strong>ntemente não ; em legislação<br />
penal po<strong>de</strong>m distinguir-se quatro ansnrnlitos principaes ; a lista <strong>da</strong>s<br />
i~lfracgóes, n ,j(írnia do processo, cc orgci~ristrrrio (1ct.s ~jurisdic~ões repressivas e o<br />
regimnz penit~ncinrio. Ora vamos ver que ca<strong>da</strong> uma d'estas regulamentaçóes,<br />
que forçosamente se tem <strong>de</strong> a<strong>da</strong>ptar ao seu ol!jectivo especial, para<br />
ser harmonica com as necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s e circumstancias locaes, differe essen-<br />
cialmente <strong>da</strong> legislação correspon<strong>de</strong>nte, em vigor lia metropole.<br />
J? necessitrio elaborar codigos penaes indigenas perfeitamente a<strong>da</strong>pta-<br />
veis a ca<strong>da</strong> colonia ou a ca<strong>da</strong> raça ; não bastam os <strong>de</strong>feituosos remendos e<br />
exoticas transformayúes por que, por vezes, sc teem feito passar os nossos<br />
codigos, para os po<strong>de</strong>r applicar aos indigenas.<br />
E preciso fazer mais e melhor. Comeqa pela lista <strong>da</strong>s infracçóes, que<br />
é variavel com as civilisa~:0es, com as raças e até com a indole <strong>da</strong>s naçóes.<br />
Ha crimes, taes como a anthropophagia, a escravatura etc., que os<br />
nossos codigos não prevêem; ha outros como a polygamia, por exemplo,<br />
que a nossa legislação pune com severi<strong>da</strong><strong>de</strong>, e que nem sequer po<strong>de</strong>m ser<br />
consi<strong>de</strong>rados crimes em quasi to<strong>da</strong>s as populaçóes indigenas.<br />
Se na cathegorin criminal <strong>de</strong>scermos do crime ao <strong>de</strong>licto, e d'este 4<br />
simples co$travençáo, reconhece-se que as differenças são tão radicaes que<br />
absolutamente na<strong>da</strong> se po<strong>de</strong> aproveitar do que existe legislado para as<br />
metropoles.<br />
AlBin d'isto a gravi<strong>da</strong><strong>de</strong> relativa <strong>de</strong> crimes e <strong>de</strong>lictos communs a in-<br />
digenas e a colonos po<strong>de</strong> em numerosos casos ser differente para as duas<br />
raças.<br />
Ha vicios ou crimes que entre os colonos são rarissimos, e que entre<br />
os indigenas se tornam, As vezes, táo frequentes que 6 rasoavel applicar<br />
a estes penas excepcionalmente severas, e ten<strong>de</strong>ntes a extirpar o mal ela<br />
radz.<br />
Por outro lado, ha faltas bem <strong>de</strong>sculpaveis B boçali<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena, e<br />
qae se não po<strong>de</strong>m perdoar ao elemento europeu, cuja morali<strong>da</strong><strong>de</strong> e civilisa-<br />
vão superiores lhí. impóem mais eleva<strong>da</strong> responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong>.
1: náo se diga que estas distinccões brigam com a egrial<strong>da</strong><strong>de</strong> humana<br />
perantcl a applicaçáo <strong>da</strong> justiça. Entre portugiiezes e inglezes não existe,<br />
por certo, a differenca mcntal e moral que em qualqiier colonia separa os<br />
colonos dos indigenas. E, entretanto, ao passo que pelo nosso codigo o marido<br />
que mata a mullier surprehendi<strong>da</strong> em flagrante <strong>de</strong>licto <strong>de</strong> adulterio<br />
não 6 reii <strong>de</strong> crime algum, pela legislação ingleza 6 eqiiiI)arado a iim assassino<br />
vulgar e como tal punido.<br />
A conveniencia politica tanibem po<strong>de</strong> levar, ria rl;~l~oraçáo do codigo<br />
penal, indigena ao estabelecimento <strong>de</strong> circumstancias :igymvantes, quando<br />
os crimes commettidos sqjam em <strong>de</strong>trimento do elemento eiiropeu.<br />
*4s mais essenciaes quali<strong>da</strong><strong>de</strong>s d'este codigo <strong>de</strong>vem ser clareza e<br />
simplici<strong>da</strong><strong>de</strong>, a fim <strong>de</strong> que os indigenas saibam sempre se a acção commetti<strong>da</strong><br />
é <strong>de</strong>lictiiosa e qual a penali<strong>da</strong><strong>de</strong> em que incorrem.<br />
Organisado~ em harmonia com as religiões, os costumes e o espirito<br />
nacional, repellindo <strong>da</strong> materia penal primitivamente exi.stente apenas as<br />
praticas barbaras ou impoliticas, po<strong>de</strong>m rste:: codigos prestar optimos serviços<br />
á obra <strong>da</strong> colonisac;áo, quando interpretados por eiiropeiis convenientemente<br />
preparados e conscienciosamente justos.<br />
A applicaçáo <strong>da</strong>s leis penaes <strong>da</strong> metropole, aos indigenas <strong>da</strong>s colonias,<br />
tem <strong>da</strong>do sempre resiiltados disparatados e por vezes prejudicialissimos.<br />
Basta dizer que com a introducção do codigo penal francez na Argelia,<br />
chegaram a ser con<strong>de</strong>mnados alguns indigenas importantes pelo crime<br />
<strong>de</strong> estupro na pessoa <strong>de</strong> suas proprias mulheres !. . . Tratava-se <strong>de</strong> applicar<br />
a lei franceza <strong>de</strong> protecção ás menores. e como o casamelito mi~sultnano,<br />
não legalisado na rnairie > , só se podia ter na conta <strong>de</strong> conciil~inato, iam-se<br />
pren<strong>de</strong>ndo os maridos que tinham a <strong>de</strong>sventura <strong>de</strong> casar com raparigas<br />
menores. e que nunca chegaram a perceber niuito bem as razões que moti-<br />
vavam O SPII encarceramento. Como e.jte, centenares <strong>de</strong> exemplos se po<strong>de</strong>m<br />
citar, qiie provam a impossitili<strong>da</strong><strong>de</strong> d'esta assimilação juridica.<br />
Principalmente com os indigenas musulmanos a variabili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> ma-<br />
teria penal impe<strong>de</strong> totalmente a applicapio dos nossos codigos.<br />
A influencia secular <strong>da</strong> religião mahometana, formou-lhes um espirito
182 POLITICA IXDIGENA<br />
- -- .- -<br />
incapaz <strong>de</strong> conceber a i<strong>de</strong>ia do <strong>de</strong>ver social ; os interesses e responsabili-<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong>s publicas e to<strong>da</strong>s as concepçóes collectivas <strong>da</strong> mentali<strong>da</strong><strong>de</strong> europeia,<br />
constituem i<strong>de</strong>alisaçóes incomportaveis com a estreiteza do seu fanatismo.<br />
Para os musulmanos, os crimes entre particulares não envolvem a<br />
minima responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong> social, mas unicamente responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong>s indivi-<br />
duaes.<br />
O principio geral em materia <strong>de</strong> penali<strong>da</strong><strong>de</strong> miisulmana é que o crime<br />
contra um individuo apenas importa compensaçóes, a que a victima tem di-<br />
reito e que po<strong>de</strong>m tambem, em cbaso <strong>de</strong> morte, ser reclama<strong>da</strong>s pelos seus<br />
her<strong>de</strong>iros.<br />
Estes po<strong>de</strong>m reclamar vingança, exigir a pena <strong>de</strong> taligo, que po<strong>de</strong><br />
ser suhstitui<strong>da</strong> pelo preço do sangue, in<strong>de</strong>mnisaçiio pecuniaria que as par-<br />
tes disciitem e negoceiam, como se se tratasse d'urna questão commercial. (')<br />
O papel <strong>da</strong> justiça limita-se a executar a vonta<strong>de</strong> <strong>da</strong> victima ou dos<br />
seus her<strong>de</strong>iros. Um assassinato nAo interessa a or<strong>de</strong>m <strong>da</strong> soc~ie<strong>da</strong><strong>de</strong> musulmana,<br />
mesmo porque or<strong>de</strong>m social é um conceito que nao faz parte <strong>da</strong> sua<br />
i<strong>de</strong>ologia.<br />
Os crimes religiosos sco os unicos susceptiveis <strong>de</strong> sacudir a consciencia<br />
collectiva e <strong>de</strong> impor ;i auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> procedimentos fun<strong>da</strong>dos no interesse<br />
geral.<br />
Ora se este conceito do int~rrsse social, que é a i<strong>de</strong>ia abstracta mas<br />
fun<strong>da</strong>mental em que se baseia o nosso direito penal, nem por sombras B<br />
concebivel pela mentali<strong>da</strong><strong>de</strong> musulmana, é facil avaliar como os negros<br />
fetichistas <strong>da</strong> Africa estarão com mais forte razáo, bem longe <strong>de</strong> po<strong>de</strong>rem<br />
attingir a comprehensáo <strong>da</strong> base essencial dou nossos codigos.<br />
T)e resto, ha naçóes civilisadissimas, como a Inglaterra e os Estados<br />
Unidos, on<strong>de</strong> o ministerio publico tem uma importancia muito inferior á<br />
que entre nós gosa. havendo até casos em que a sua intervençáo sd se dá<br />
a requerimento <strong>da</strong>s partes interessa<strong>da</strong>s.<br />
Uma parte <strong>da</strong> legislaçáo penal que carece <strong>de</strong> se amol<strong>da</strong>r perfeita-<br />
() Congrkr <strong>de</strong> Sociologie Coloniale. I'ccvis, 1900 - Vol. I.
mente ás exigencias locaes tS o processo penal; instrucção, systemas <strong>de</strong><br />
provas etc., tudo precisa ser modificado e apropriado ás circumstancias,<br />
O Congresso <strong>de</strong> 1900 emittiu a este respeito o seguinte voto.<br />
c E para <strong>de</strong>sejar que se organise um codigo <strong>de</strong> processo criminal<br />
para indigenas. O processo <strong>da</strong>ndo aos accusados as necessarias garantias,<br />
<strong>de</strong>verá estabelecer-se em condiçóes <strong>de</strong> rapi<strong>de</strong>z sufficientes para que a re-<br />
pressão se succe<strong>da</strong> o mais rapi<strong>da</strong>mente possivel á falta coinmetti<strong>da</strong>. O em-<br />
prego <strong>de</strong> meios violentos para obter a confissão <strong>de</strong>ve ser expressamente<br />
interdicto n .<br />
Nas colonias, os inconvenientes <strong>da</strong> impuni<strong>da</strong><strong>de</strong> são tão gran<strong>de</strong>s e <strong>de</strong><br />
' t&o perigosas consec-juencias, que urge a todo o transe simplificar a re<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
formulas <strong>da</strong> instrucy5o eiiropeia, por cujas malhas se po<strong>de</strong>rão escapar os<br />
calpados.<br />
Mas, para o effeito do castigo ser salutarmente exemplar, a penali-<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong> tem <strong>de</strong> se seguir rapi<strong>da</strong>mente ao crime por meio d'um processo muito<br />
simpl~ficaclo, senáo summario. Quando o castigo 6 tardio, já os seus effeitos<br />
não calam no espirito publico indigena, singularmente propenso ao esque-<br />
cimento.<br />
Girault inclina-se mesmo a que sejam <strong>de</strong>ixa<strong>da</strong>s ao arbitrio do jul-<br />
gador to<strong>da</strong> a investigação para o auto <strong>de</strong> corpo <strong>de</strong> <strong>de</strong>licto, a forma <strong>da</strong><br />
instrucção do processo, e as proprias formali<strong>da</strong><strong>de</strong>s do julgamento.<br />
Para <strong>de</strong>monstrar a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> d'este procedimento, allega princi-<br />
palmente que o juiz precisa <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r fazer uso <strong>de</strong> todos os meios efficazes<br />
para <strong>de</strong>scobrir o culpado, meios que, em regra, se não conteriam, ou se-<br />
riam oppostos ás formali<strong>da</strong><strong>de</strong>s expressas do nosso codigo.<br />
Parece-nos ousa<strong>da</strong>, e at6 mesmo arroja<strong>da</strong> em <strong>de</strong>masia a theoria <strong>de</strong><br />
Girault, que po<strong>de</strong>ria conduzir aos mais serios abusos e prepotencias.<br />
O voto do Congresso é que fixa a ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira doutrina; <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que se<br />
elabora um codigo <strong>de</strong> processo <strong>de</strong> accordo com o meio especial a que se<br />
<strong>de</strong>stina, torna-se <strong>de</strong>snecessario <strong>da</strong>r tão latitndinarias attribuiçóes aos jul-<br />
gadores, e <strong>de</strong>sapparecem os argumentos supracitados que s6 colhem contra<br />
o exotismo e a ronceirice <strong>da</strong> nossa instrucção criminal.<br />
Quanto ao systema <strong>de</strong> provas que, nos codigos europeus <strong>de</strong> instrucção
184<br />
--<br />
POLITICA WDIGENA<br />
-- -- -<br />
criminal elaborados para raças em que o culto <strong>da</strong> horira e a fd cios jura-<br />
mentos conservaram gran<strong>de</strong> importancia, se baseiam sobre o testemunho<br />
humano como a mais segura probabili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> certeza, caarccc.m <strong>de</strong> ser fun-<br />
<strong>da</strong>mentalmente transformados para as raças indigenas em qiie, nem a con-<br />
sciencia individual, nem a opiniáo collectiva con<strong>de</strong>mnam o recurso á mentira.<br />
Muitas vezes a culpabili<strong>da</strong><strong>de</strong> do accusado é moral e quasi material-<br />
mente evi<strong>de</strong>nte, mas, não se estabeleaendo a prova ,jiiridica, as nossas leis<br />
imp0em que seja immediatamente posto em liber<strong>da</strong><strong>de</strong>. Ora isto, sob o ponto<br />
<strong>de</strong> vista <strong>da</strong> pratica colonial, apresenta os mais serios inconvenientes.<br />
Concor<strong>da</strong>mos plenamente com a opiniáo <strong>de</strong> C*ir,iiilt expreasa pelas<br />
seguintes palavras.<br />
Quando o juiz tem a certeza moral <strong>da</strong> culpa do ac(:iisacio, malfeitor<br />
<strong>de</strong> profissáo, <strong>de</strong>ve po<strong>de</strong>r con<strong>de</strong>mnar, ain<strong>da</strong> quando as provas materiaes não<br />
sejam perfeitamente <strong>de</strong>cisivas. E, em siimma, uma occasiáo que se não p6<strong>de</strong><br />
per<strong>de</strong>r, <strong>de</strong> expurgar a colonia. E conveniente col1ocarmi;-nos sob o ponto<br />
<strong>de</strong> vista subjectivo <strong>de</strong> preferencia a consi<strong>de</strong>rar a questko sob o ponto <strong>de</strong><br />
vista objectivo n .<br />
Girault tem razão, e vejamos porquê. A prova principal cuja dispen-<br />
sabili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> 15 naturalmente a prova testemunhal. Na reali<strong>da</strong><strong>de</strong> esta<br />
pretendi<strong>da</strong> prova niio passa <strong>de</strong> mera presriinpçáo baseia<strong>da</strong> na confiança que<br />
merece a veraci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s testemiinlias; ora como os <strong>de</strong>poentes indigenas,<br />
quasi sem excepção venaes e mentiroso$, níio po<strong>de</strong>m merecer a mais tenue<br />
sombra <strong>de</strong> confiança, segue-se que esta prnva, ain<strong>da</strong> quando se estabeleça,<br />
representará effectivamente uma presumpçáo, bem menos fun<strong>da</strong><strong>da</strong> do que<br />
a que resulta <strong>da</strong> convicçáo moral cio jiilgador. No emtanto é necessario, por<br />
outro lado, crear um freio que possa prevenir abusos por parte <strong>da</strong> aiicto-<br />
ri<strong>da</strong><strong>de</strong> eiiropeia, e proporcionar aos indigenas garantias suficientes para<br />
provarem a sua innocencia, ou recorrerem do excesso ou injustiça <strong>da</strong> pena-<br />
li<strong>da</strong><strong>de</strong> imposta.<br />
Funccionarios administrativos ou magistrados <strong>de</strong> toga, só ~o<strong>de</strong>m<br />
con-<br />
<strong>de</strong>mnar quando1 se reiinam todos os elementos que provem a infracção, e<br />
apenas <strong>de</strong>vem applicar a pena correspon<strong>de</strong>nte expressa no respectivo codigo<br />
indigena.
Muito se tem escripto Acerca <strong>da</strong> instituição do jur.y no julgamento<br />
criminal dos indigenas, e a opiniáo hoje mais geralmente segui<strong>da</strong> é que <strong>de</strong>ve<br />
ser absolutamente posta <strong>de</strong> parte. Um jury <strong>de</strong> colonos, adversarios natos<br />
dos indigenas, seria uma monstruosi<strong>da</strong><strong>de</strong> que acarretaria as maiores e mais<br />
revoltantes injustiças; um jiiry <strong>de</strong> indigenas, mesmo admittindo que estes<br />
estavam aptos piira o <strong>de</strong>sempenho <strong>da</strong>s funrçócs <strong>de</strong> jiirados, o que na pra-<br />
tica quasi nunca se dá, seria lima abdiuaqiio <strong>de</strong> auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> que não tar-<br />
<strong>da</strong>ria. em salientar as suas <strong>de</strong>svantagens.<br />
As siinples coritravençóes ou tlelictos <strong>de</strong> somenos importa neia, basta qiie<br />
sejam julgados n'umft sd instancin e por um s6 individiio; o3 dclictos mais<br />
graves e os orlmes <strong>de</strong>vem ser subinettidos a tribunac..; collectivou, em que<br />
se po<strong>de</strong> <strong>da</strong>r x minoria ao elemento int\igen;t representado pelos principaes<br />
<strong>da</strong> commrina ou <strong>da</strong> circumscripçáo. Este5 nssessores indigenas que jri exis-<br />
tiram na Argeliu com voto consiiltivo, e que hoje existem em i\la<strong>da</strong>gascar<br />
com voto <strong>de</strong>liberativo, po<strong>de</strong>m facilitar muito o julgamento, concorrendo<br />
para esclarecer to<strong>da</strong>s as duvi<strong>da</strong>s suscitii<strong>da</strong>s, e para <strong>de</strong>sfazer to<strong>da</strong>s as con-<br />
fusóes susceptiveis <strong>de</strong> arrastar consequeneias lastimaveis.<br />
Por outro lado, a sua presença e a parte que <strong>de</strong>vem tomar na disciis-<br />
são fazem-nos ficar partilhando <strong>da</strong> responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong>finitiva <strong>da</strong> scnteil(,::i.<br />
Assente a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>, para o governo colonisador, <strong>de</strong> administrar di-<br />
rectamente a justiça repressiva, e estabelecitlos os lineamentos <strong>da</strong>s mo-<br />
<strong>da</strong>li<strong>da</strong><strong>de</strong>s principaes <strong>da</strong> lei penal a<strong>da</strong>ptavei As colonias, surge o problema<br />
<strong>de</strong> <strong>de</strong>terminar quaes sRo as auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s que, com mais vantagem politica<br />
e geral, po<strong>de</strong>rão exercer o direito <strong>de</strong> punir.<br />
Magistrados <strong>de</strong> carreira oii funceionarios administrativos?<br />
Eis a questáo que tanto apaixonou o Congresso <strong>de</strong> Sociologia Colo-<br />
nial, e sobre a qual todos os mo<strong>de</strong>rnos escriptores coloniaer discorrem ao<br />
sabor <strong>da</strong>s suas ten<strong>de</strong>ncias proprias, ou sob a influencia articula ris ta <strong>da</strong> vi-<br />
suali<strong>da</strong><strong>de</strong> restricta & colonia qiie acci<strong>de</strong>ritslmente conhecem, ou mais apro-<br />
fun<strong>da</strong><strong>da</strong>mente estu<strong>da</strong>ram.<br />
Sobre este assumpto, como geralmente em to<strong>da</strong>s as questóes coloniaes,<br />
é ocioso entrar <strong>de</strong>clara<strong>da</strong>mente no campo <strong>da</strong>s generalisaçóes que, quasi sem-<br />
pre, terminam por nos levar a conclusóes <strong>de</strong> todo o ponto inadmissiveis.
186<br />
! ![<br />
POLITICA INDIGENB. 11<br />
Havendo colonias em to<strong>da</strong>s as latitu<strong>de</strong>s, sob todos os olirnas, nas mais<br />
varia<strong>da</strong>s circumstancias geographicas, povoa<strong>da</strong>s <strong>de</strong> indigenas em que o grau<br />
<strong>de</strong> cultura e civilisação varia tanto como a côr <strong>da</strong> pelle, e as linguas tanto<br />
como os costumes, as religióes e as instituiçóes sociaes, como será possivel<br />
aconselhar processos i<strong>de</strong>nticos <strong>de</strong> pblitica ou <strong>de</strong> administrac;ão, sem cahir<br />
no absurdo inevitavel ?<br />
D'este modo, torna-se muito difficil resolver n'um sentido ou n'oiitro<br />
a qnestão cla separaçáo dos po<strong>de</strong>res administrativo e judicial nas colonias,<br />
pois as circumstancias locaes po<strong>de</strong>ni indifferentemente aconselhar um ou<br />
outro dos systeimas propostos. Convem, comtiido, accentunr que, na gran<strong>de</strong><br />
maioria dos casos, a substituição dos administrat1ores;jiiiaes por magistrados<br />
<strong>de</strong> carreira tetn trazido innumeras difficul<strong>da</strong><strong>de</strong>s politicas e inconvenientes<br />
aclministrativos, entre os quaes avulta a sobrecarga orçamental, corres-<br />
pon<strong>de</strong>nte á organisação <strong>de</strong> tribunaes europeus equivalentes aos <strong>da</strong> me-<br />
tropole.<br />
Na primeira phase <strong>da</strong> administração colonial é indispensavel que se<br />
realise, ain<strong>da</strong> que a tit,i~lo provisorio, a confusão dos po<strong>de</strong>res ; os administradores<br />
civis ou iiiilitares arvoram-se em juizes, naturalmente, pela força<br />
<strong>da</strong>s circumstancian que não permittem que se <strong>de</strong>ixem impunes os <strong>de</strong>lictos<br />
e os crimes commchttidos pelos indigenas.<br />
Des<strong>de</strong> que iis auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s administrativas tenham, nos primeiros<br />
tempos, como 6 regra geral, competencia repressiva, o estabelecimento dos<br />
tribunaes com magistrados <strong>de</strong> toga torna-se portanto uma questão mais <strong>de</strong><br />
opportuni<strong>da</strong><strong>de</strong>, do que <strong>de</strong> ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>. Fazer sahir esses juizes<br />
dos quadros metropolitanos sem preparação previa, é uma inepcia administrativa<br />
; crear magistrados especialmente conhecedores <strong>da</strong> legislação penal<br />
indigena e <strong>da</strong>s linguas e circumstancias <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> colonia, alem <strong>de</strong> essencialmente<br />
difficil e dispendioso, apenas serve para obter que os juizes venham<br />
a possuir iima forma <strong>de</strong> competencia profissional que nos funccionarios<br />
administrativos qiiasi sempre existe, como consequencia natural do meio em<br />
que vivem e <strong>da</strong> ilatiireza <strong>da</strong>s funcçóes que exercem. Girault, que propoz<br />
ao Congresso <strong>de</strong> 1900 um voto <strong>de</strong>clarando não se <strong>de</strong>ver crear, para admi-<br />
nistrar a justi(;a tios indigenas em materia penal, uma auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> jndicb<br />
':
ia distincta <strong>da</strong> ~dministrativa, <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>u essa proposta nos seguintes termos<br />
eloquentes e ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros.<br />
G.. .Por outro lado, a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> pacificar o paiz e <strong>de</strong> firmar a<br />
auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> europeia é, ao começo, o ponto <strong>de</strong> vista dominante. Ora to<strong>da</strong> a<br />
con<strong>de</strong>mnaçáo pronuncia<strong>da</strong> por europeus contra um indigena, tem conse-<br />
quencias politicas <strong>de</strong> que se não po<strong>de</strong> abstrtihir. Umas vezes é necessario<br />
reprimir rigorosamente os <strong>de</strong>lictos commettidos pelos indigenas contra os<br />
colonos, para salvagnar<strong>da</strong>r o prestigio do europeu. Uma repressão insiiffi-<br />
ciente po<strong>de</strong> augmentar a aii<strong>da</strong>cia dos malfeitores, e ter como epilogo scenas<br />
<strong>de</strong> massacre ou <strong>de</strong> pilhagem. Outras vezes, pelo contrario, é preciso não<br />
ferir no seu interesse oii amor proprio um indigena influente, a cuja voz<br />
uma al<strong>de</strong>ia ou uma regiáo se po<strong>de</strong>m revoltar. Segundo as circiimstancias é<br />
necessario proce<strong>de</strong>r rapi<strong>da</strong>mente, oii usar <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as contemplaçóes. Km<br />
administrador;juiz estar6 ao corrente <strong>da</strong> situaqgo politictt ; preoccupar-se-<br />
ha com as conseqiiencias indirectas do julgamento, porque se houver <strong>de</strong>sor-<br />
<strong>de</strong>ns é a elle que pertence reprimi-las. Um magistrado não admitte - e<br />
n'isso julga cumprir o seu <strong>de</strong>ver - esta or<strong>de</strong>m <strong>de</strong> consi<strong>de</strong>raçóes. Profere a<br />
sentenqa, sem se preoccupar com as consequencias politicas que o adminis-<br />
trador terá <strong>de</strong> reparar. Por vezes mesmo, náo <strong>de</strong>sagra<strong>da</strong> ao magistrado,<br />
crear difficul<strong>da</strong><strong>de</strong>s ao administrador <strong>de</strong> quem é rival natural. Estas rivali-<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong>s entre funccionarios. sempre prejiidiciaee, são particularmente nocivas<br />
nas colonias. Os indigenas que as presenceiam riem-se d'ellas e lucram fre-<br />
quentemente a impuni<strong>da</strong><strong>de</strong>. Deixa <strong>de</strong> liarcr uni<strong>da</strong><strong>de</strong> na conducta segui<strong>da</strong><br />
a seu respeito. Ora é intoleravel que a segiiranqa d'uma colonia possa ser<br />
comprometti<strong>da</strong> por funccionarios que não são responsaveis pela manutenção<br />
<strong>da</strong> soberania <strong>da</strong> metropole. Ain<strong>da</strong> se os indigenas apreciassem esta sepa-<br />
ração <strong>da</strong>s auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s administrativas e judiciarias !. . . Mas, aos seus<br />
olhos é uma chinezice pura este <strong>de</strong>sdolriramento dos po<strong>de</strong>res. O indigena 6<br />
simplista. Não comprehen<strong>de</strong> que quem man<strong>da</strong> e dirige náo possa punir. Este<br />
<strong>de</strong>sdobramento <strong>de</strong> attribuiçóes diminue, sem o minimo proveito, o prestigio<br />
do administrador. E que importa ao indigena ser jiilgado por um adminis-<br />
trador o11 por um magistrado? Não pertencem ambos egualmente á raça<br />
dominadora? Até melhor! os indigenas, na maior parte dos casos, teem tido
188 POLITICA INDIGENA<br />
- - ----.-p-p-<br />
sau<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> justiça summaria, mas rapi<strong>da</strong>, administra~l~ pelos officiacs e<br />
pelos funcccionarios atlminist,ràtiv«s. Os testemunhou sobre este ponto sko<br />
d'uma concorJancia notavel. NAS colonias francezas a introdncção prk3inatura<br />
<strong>de</strong> um complicado apparellio jiidiciario nKo fez senáo mal na Argelia,<br />
na Cochirichina e em &Iiitlagascãr, o que parece mostrar que a experiencia<br />
é jti hoje <strong>de</strong>cisiva.))<br />
Apesar <strong>da</strong> importancix tlos :~rgumentos adduzidos, o Congresso, <strong>de</strong>pois<br />
<strong>de</strong> longa e acalora<strong>da</strong> discilss,;io, adoptou uma formula diarnetralmente<br />
opposta á qw (+irttiilt propuxera. O gran<strong>de</strong> argumento que <strong>de</strong>cidiii tlil votação<br />
foi quc a int,romirisão <strong>da</strong> politica na justiça era a propria i~ega(,Go<br />
<strong>da</strong> justiça.. . Sempre ss phrases occas e <strong>de</strong>clamatorias a anteporem-se á<br />
evi<strong>de</strong>ncia dos factos.<br />
certo que a reso111c;Ho do Congresso foi <strong>de</strong>termina<strong>da</strong> por consi<strong>de</strong>raçóes<br />
jiist.as, mas inopportiinas por significarem apenas s maneira <strong>de</strong> sentir<br />
europeia, e não correspon<strong>de</strong>rem em na<strong>da</strong> aos sentimentos e As ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iras<br />
necessidit<strong>de</strong>s dos indigcnas.<br />
A affirin;i,yc~o <strong>de</strong> Montesquieu - paTa miiitos dogma - <strong>de</strong> que a reunião<br />
nas mesmas mãos (10s po<strong>de</strong>res administrativo t: ,jiitliaial I! contraria it<br />
liber<strong>da</strong><strong>de</strong>, baseia-se no est,iido e observaçáo d'um conjuncto (te factos hisricos,<br />
relativamente restricto, e que, em todo o caso, nzo entra em linha<br />
<strong>de</strong> conta com as variadissimas situaçííes anormaes e excepcionaes que geralmente<br />
se realisam nas coloniaii.<br />
Logo, as I ( b i t : geraes para o governo dos povos, <strong>de</strong>duzi<strong>da</strong>s por aquelle<br />
eminente pensatlor, nÃo po<strong>de</strong>m applicar-se integralmente ás colonias.<br />
A nação colonisador,z tem qiiasi sempre gran<strong>de</strong> vantagem em conce<strong>de</strong>r<br />
aos administradores competencia judiciaria, e quanto aos indigenas o<br />
contrario (5 que os espanta, ngo comprelien<strong>de</strong>ndo a necessi<strong>da</strong>tfe <strong>da</strong> separação<br />
dos po<strong>de</strong>res.<br />
B repiigri:+ncia em estabelecer o exercicio cumulativo <strong>da</strong>s funcçóes<br />
jiidiciarias e adirrini~trativaa, sd po<strong>de</strong> partir dos nossos preconceitos <strong>de</strong> liberaes<br />
civilisados, sempre dispostos a assegilrar as garantias individuaes<br />
contra o po<strong>de</strong>r social.<br />
Nas, ha casos em que esta preocciipaqáo tem <strong>de</strong> ce<strong>de</strong>r perante outra
7<br />
mais imperiosa e urgente; B o que acontece quando uma infima minoria<br />
estrangeira preten<strong>de</strong> impor o seu dominio a uma numerosa raça autochtone.<br />
N'esta hypothese é a minoria dominadora que tem principalmente<br />
necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> garantias contra a coalisFio siir<strong>da</strong> <strong>da</strong>s más vonta<strong>de</strong>s indivi-<br />
duacs, e que para os conseguir, carece <strong>de</strong> unificar e concentrar o exercicio<br />
dos seus po<strong>de</strong>res.<br />
Contra os administradores-juizes allegam-se numerosos argumentos.<br />
O funccionario administrativo não é livre, o seu primeiro <strong>de</strong>ver é obe<strong>de</strong>cer<br />
&S or<strong>de</strong>ns expressas ou até mesmo tncitas e ás ten<strong>de</strong>ncias dos seus chefes;<br />
n8o po<strong>de</strong> estar imbuido do principio <strong>de</strong> que se <strong>de</strong>vem compenetrar todos<br />
os juizes, <strong>de</strong> que o seu <strong>de</strong>ver e honra profissional se confun<strong>de</strong>m com a in-<br />
<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ncia do caracter e com a mais completa imparciali<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
Um bom juiz
I<br />
190 POLITICA INDIGENA<br />
As naçóes coloniaes teem procedido por maneiras muito differentes<br />
na organisaçáo <strong>da</strong> justiça repredsiva nas suas colonias.<br />
Xos estabelecimentos hollan<strong>de</strong>zes existiu sempre a separação dos<br />
po<strong>de</strong>res para todos os crimes ou infracçóes graves commetti<strong>da</strong>s pelos indipbnas.<br />
e, ha quarenta anilos, que as infracçóes menos graves, <strong>de</strong>lictos ou contt<br />
~vençúes importantes são tambem submetti<strong>da</strong>s aos tribunaes judiciarios.<br />
S'algümas <strong>da</strong>s ilhas mais isola<strong>da</strong>s B o resi<strong>de</strong>nte administrativo que<br />
presi<strong>de</strong> ao tribiinal indigena quem os julga, mas sob reserva <strong>da</strong> revisão <strong>de</strong><br />
tt )<strong>da</strong>s as sentenças pelo tribunal superior <strong>de</strong> Batavia.<br />
Actualmente s6 as contravençóes policiaes, e algumas outras contra-<br />
\ ençOes <strong>de</strong> muito ponca importctncin c': que continuam R ser jiilga<strong>da</strong>s pelos<br />
t~inccionarios administrativos.<br />
Na India, os inglezw nko hesitaram em conferir aos seus administradores<br />
<strong>de</strong> todos os graus Iiierarchicos o po<strong>de</strong>r judicial.<br />
Abaixo do vice-rei governador, e dos vice-governadores que correspondcm<br />
aos nossos governadores geraes, veem os Commissioners, simultaneamente<br />
administradores <strong>da</strong>s provincias e juizes do crime; <strong>de</strong>pois seguem-se<br />
os Deputy-Commissioners, ao mesmo tempo governadorez dos districtos e<br />
juizes <strong>de</strong> primeira instancia criminal ; emfim veem os ils.~cstant. Comrnissioners,<br />
administradores <strong>da</strong>s subdivis~es dos districtos, juizes <strong>de</strong> paz e juizes<br />
correccionae-.<br />
Os poiieres judiciarios dos administradores <strong>da</strong> India ingleza são realmente<br />
extraordinarios, mas a instituição funcciona admiravelmente sem<br />
attrictos nem abusos <strong>de</strong> especie alguma, sob a fiscalisação severa dos tribunaes<br />
superiiores <strong>de</strong> appellaçgo e dos Lieutntznt-Governors.<br />
A unifiqaçáo dos po<strong>de</strong>res judicial e administrativo foi sempre preconisa<strong>da</strong><br />
pelo distincto colonial Eduardo Costa que, no seu conhecido livro,<br />
apresenta a seguinte <strong>de</strong>feza <strong>da</strong> sua opinião.<br />
.Em relatorio por mim apresentado ao governador geral <strong>de</strong> Moçam-<br />
bique em 8 <strong>de</strong> Março <strong>de</strong> 1898, disse eu, referindo-me ao assumpto, o se-<br />
guinte: A divisão e a in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ncia dos po<strong>de</strong>res do Estado, que fazem o<br />
i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> tanta civilisaçâo mo<strong>de</strong>rna, são absolutamente contrarias ao espirito<br />
<strong>da</strong>s socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s primitivas e at8 <strong>de</strong> muito organismo social mais a<strong>de</strong>antado.<br />
' I
CONDIQAO JURIDICA<br />
-<br />
Sobretudo para o barbaro ou para o selvagem é absolutamente incompre-<br />
hensivel que o homem que o administra o não possa julgar, que o encarre-<br />
gado <strong>de</strong> policiar o territorio não seja, ao mesmo tempo, o que recebe os<br />
seus impostos e as sua queixas.. ...................... A auctori<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
para os negros <strong>de</strong>ve, pois, ser ao mesmo tempo administrativa, judicial e<br />
militar. -Isto Q, o caracteristico principal do governo <strong>da</strong>s tribus selva-<br />
gens ou barbaras Q o <strong>de</strong> ser unitario. Não basta porQm esta uni<strong>da</strong><strong>de</strong> ou<br />
concentração <strong>de</strong> man<strong>da</strong>r, e torna-se preciso que esse man<strong>da</strong>r seja energico.<br />
Não se trata, pois, <strong>de</strong> um regimen <strong>de</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong> politica ou civil in-<br />
compativel com o grau <strong>de</strong> civilisação <strong>da</strong>s tribus africanas, mas sim <strong>de</strong> um<br />
governo <strong>de</strong> forte e expansiva tutela.. ...............................<br />
....................... Oliveira Martins no seu luminoso modo <strong>de</strong><br />
expor as doutrinas scientificas e as illaçóes do seu privilegiado pensamento,<br />
mostra-nos, d'uma maneira irrefutavel, o erro grosseiro e perigoso <strong>de</strong> con-<br />
si<strong>de</strong>rar eguaes, perante a lei, o civilisado europeu e o selvagem habitante<br />
do sertgo africano.. ................ Que esta tutela tem <strong>de</strong> ser justa,<br />
humanitaria e civilisadora, eis uma conclusão que nem Q licito discutir<br />
nem necessario <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r.<br />
........... De facto o que eu conheço <strong>de</strong> visu, e por intermedio<br />
dos mais reputados piiblicistas e viajantes, mostra-me que em to<strong>da</strong> a Africa<br />
os regulos exercem um po<strong>de</strong>r absoluto, sendo ao mesmo tempo os supre-<br />
mos juizes, as primeiras auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s politicas e os chefes militares incon-<br />
testados <strong>da</strong>s suas tribus.<br />
Estas consi<strong>de</strong>raçóea teem levado outras naçóes colonisadoras a orga-<br />
nisar a sua administração indigena, concentrando 03 po<strong>de</strong>res <strong>de</strong> julgar e<br />
, administrar na mesma auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>. Isto, Q claro, com excepçóes, nem sem-<br />
pre jiistificaveis, e com temperamentos exigidos pelo feitio muito mais<br />
humanitario <strong>da</strong> civilisqão mo<strong>de</strong>rna. ...................... Os collectors<br />
<strong>da</strong> British Central Africa, segundo o dizer do proprio fun<strong>da</strong>dor do prote-<br />
ctorado, superinten<strong>de</strong>m na cobrança dos direitos aduaneiros, como na dis-<br />
tribuição e cobranqa dos impostos indigenas; dirigem a politica civil do<br />
seu districto ; administram a justiça aos europeus e entre europeus e indi-<br />
191
192 POLI'PICA INDIGENA<br />
--<br />
genas ; superinten<strong>de</strong>m na admini~tra~iio <strong>da</strong> justiça indigena ; e actuam<br />
geralmente como funccionarios politicos e tribunos do povo.<br />
Em todos os casos civis sáo supremos no seu districto e apenas subordinados<br />
ao Commissario geral.<br />
Os district comnrissioners <strong>da</strong> Costa do Ouro, Lagos e Serra Leôa, além<br />
<strong>de</strong> administradores civis são tambem magistrados jndiciaes. 0s assistnnt<br />
commisslon~rs <strong>da</strong> Bechuana e do Basiito tecm egualmente funcçóes jndiciaes,<br />
e para elles po<strong>de</strong>m appellar os indigenas, <strong>da</strong>s sentenças dos seus chefes.<br />
O mesmo succe<strong>de</strong> na Colonia do Cabo, apesar <strong>da</strong> popiilaçáo ser, em<br />
gran<strong>de</strong> parte, cirilisa<strong>da</strong>, e na Rho<strong>de</strong>sia on<strong>de</strong> só ba excepçóes para as duas<br />
capitaes : Salisbury e Bulowayo.<br />
Deve-se notar que n'esta ultima colonia lia uma auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> especial,<br />
os native commi.ssio?le~.s, que, exercendo m~iltipla aiictori<strong>da</strong><strong>de</strong> sobre os indigenas,<br />
como cobradores tle impostos, recenseadores e até conciliadores nas<br />
suas disputas, nRo sáo, comtiido, magistrados judiciaes.<br />
Não sei bem em que se baseia a excepçáo, mas conheço a opinião importante<br />
do chid' native commissioner <strong>da</strong> Machona, o Sr. Taberer, que sobre<br />
este assumpto diz as seguintes palavras:<br />
Como regra, os indigenas promptamente se conformam com as <strong>de</strong>cisóes<br />
do ~lntiv~ commissio~zurs, mas ha casos em que não.<br />
Quando isto acontece, ~refcrem abandonar a questão a levri-Ia perante<br />
um magistrado. Na maior parte dos casos não objectariam a appellar para<br />
o chief commi.s>ioner que elles conhecem e em quem, em regra, teem confiança.<br />
. .<br />
Todos os indigenas se habituam a consi<strong>de</strong>ra-lo (o commissario chefe)<br />
como seu chefe e torna-se muito necessario que elle seja investido do po<strong>de</strong>r<br />
judicial a fim <strong>de</strong> tornar obrigatorias as suas <strong>de</strong>cisóes. . .<br />
Po<strong>de</strong>res semelhantes <strong>de</strong>viam ser entregues aos commissarios que fossem<br />
idoneos.<br />
Vêss portanto, que esta excepç80 & regra ingleza, <strong>de</strong> confiar ao<br />
mesmo individuo a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> civil e judicitrl sobre indigenas, não Q feliz,<br />
e dá origem a reclamaçóes justifica<strong>da</strong>s.. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
CONDIÇ~~O JURIDICA 193<br />
. . . . . . . .I? claro que a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> do chefe <strong>da</strong> administração indigena<br />
tem <strong>de</strong> ser sujeita á appellação para outro po<strong>de</strong>r superior, quer em materia<br />
politica OU administrativa, quer ep materia judiciaria.<br />
No primeiro caso, recorrer-se-ha para o governador do districto ou <strong>da</strong><br />
provincial suprema auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> no assumpto, e no segundo, para os tribunaes<br />
superiores.<br />
Sem embargo <strong>da</strong> preconisa<strong>da</strong> concentração <strong>de</strong> po<strong>de</strong>res, é já, possivel,<br />
n'este grau superior <strong>de</strong> hierarchia, fazer a separação dos dois, judiciario e<br />
administrativo, visto que eila se faz longe dos olhos dos indigenas que a<br />
,elles recorrem, o que attenua os inconvenientes apontados.<br />
Convem tambem notar que a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> judicial do chefe d'uma circumscripçáo<br />
indigena não <strong>de</strong>ve, na maioria dos casos, annullar a dos chefes<br />
indigcnas sob n 9na jiirisdicção ».<br />
N'esta transcripqitct tiremos principalmente em vista mostrar como<br />
,gt& mesnio entre nej.4, on<strong>de</strong> to<strong>da</strong> a politica colonial 15 assola<strong>da</strong> pela terrivel<br />
.mania assiniiladora, os administr:idores coloniaes ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iramente eminentes<br />
'%<br />
como foi JCdiiardo Costa, se inclinam pela ftirmit imitaria e ciimulativa do<br />
exercicio dos po<strong>de</strong>res administrativo e jiidiciitrio.<br />
Por certo que náo é norma inf:lillivelmente aconselhavel para to<strong>da</strong>s<br />
as colonitia sem excepçgo, entrt:tanto pd<strong>de</strong> affirmar-se que, quasi sempre,<br />
correspon<strong>de</strong> ás ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iras ric~c:c~,~siciadcs locae~.<br />
Mesmo no Oriente, com rapas cioilisa<strong>da</strong>s, é preferivel esta fdrma á <strong>da</strong><br />
separação dos po<strong>de</strong>res. Na Coc!liinchina, por exemplo, a snhstituiçáo dos<br />
administradorchs-juizes pelos trihynaes Jiidiciarios, até concorreu para um<br />
augmento .notavel <strong>da</strong> crirninali<strong>da</strong>dc indigena. De facto, no regimen do<br />
rnan<strong>da</strong>rinato, a que os annamitau estavam sii.jeitos, realisa-se, qnasi integralmentt>,<br />
a confiisGo dos po<strong>de</strong>res.<br />
Na India Ingleea, já vimos com que excellente resultado se pôz em<br />
pratica o regimen <strong>de</strong> adrriinistraçáo <strong>da</strong> justiça penal pelos funccionarios<br />
administrativos. Perante todos estes convincentes exemplos, não se pó<strong>de</strong><br />
hesitar em reconhecer a grandissima vantagem que, para a pratica colonial,<br />
resulta <strong>da</strong> concentração no mesmo funccioiiario <strong>da</strong>s competencias administrativa<br />
e judicial'.<br />
i 4
194 POLITICA INDIGENA<br />
-- -<br />
Já examinámos, sob o ponto <strong>de</strong> vista colonial, tres partes importan-<br />
tes <strong>da</strong> legislaçáo penal: a lista <strong>da</strong>s infracçóes, a forma do processo, e a<br />
organisação <strong>da</strong>s jurisdicçóes repressivas.<br />
Resta-nos apenas dizer algumas palavras acerca do regimen peniten-<br />
ciario que <strong>de</strong>ve ser adoptado nas colonias.<br />
A primeira vista se reconhece quanto é forçoso differenciar-se do que<br />
aos europeus se applica. A pena <strong>de</strong> prisão simples, para o cafre <strong>de</strong>sprovido<br />
<strong>de</strong> to<strong>da</strong> a noção <strong>de</strong> conforto, em vez <strong>de</strong> castigo é uma recompensa ; a pena<br />
<strong>de</strong> morte B <strong>de</strong> pouco effeito moral no fatalismo indifferente dos orientaes ;<br />
finalmente, as penas corporaes inapplicaveis aos europeiis, não pela razão<br />
physica, mas pelo seu caracter <strong>de</strong>gra<strong>da</strong>nte, dão em geral os melhores re-<br />
sultados na repressão <strong>da</strong> criminali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s populaçóes mais atraza<strong>da</strong>s.<br />
A pena <strong>de</strong> morte, consi<strong>de</strong>ramo-la indispensavel na gran<strong>de</strong> maioria<br />
<strong>da</strong>s hypotheses coloniaes, e as penas physicas, paltnatoa<strong>da</strong>s ou vara<strong>da</strong>s,<br />
cujo <strong>de</strong>sapparecimento futuro serA sempre <strong>de</strong>sejavel, A preciso convencer-<br />
mo-nos - e ninguem que conheça as colonias o ignora - que actualmente<br />
se não po<strong>de</strong>m dispensar.<br />
Girault propóe, para evitar que magistrados europeus insiram nas<br />
suas sentenças estes castigos <strong>de</strong>gra<strong>da</strong>ntes, que aos indigenas con<strong>de</strong>mnados<br />
a pequenos encarceramentos ou trabalhos forçados, seja permitti<strong>da</strong> a opção<br />
por um certo numero <strong>de</strong> chibata<strong>da</strong>e.<br />
Não vemos em que isto possa servir 4 morali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> justiça, e quanto<br />
á moralisaçÁo <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena, não é precisamente por intermedio<br />
dos seus criminosos que ella será obti<strong>da</strong>.<br />
As penas <strong>de</strong> <strong>de</strong>gredo que geralmente não assustam sobrema-<br />
neira os europeus, são <strong>de</strong> effeito exemplar para os povos orientaes que aci-<br />
ma <strong>de</strong> tudo receiam morrer em terra estrangeira, principalmente quando<br />
não tenham a garantia <strong>de</strong> que os seus ossos sejam <strong>de</strong>pois transportados ao<br />
solo <strong>da</strong> patria.<br />
Quanto ás penas corporaes inutilmente crueis, que importem uma mu-<br />
tilação, fractura, ou lesão <strong>de</strong> qualquer natureza, <strong>de</strong>vem ser exclui<strong>da</strong>s dos<br />
codigos coloniaes, e absolutamente prohibi<strong>da</strong>s aos juizes indigenas que por-<br />
ventura subsistam.
CONDIÇÃO JURIDICA 195<br />
As multas e confiscações arruinam os indigenas e não os moralisam;<br />
6 preferivel substituir-lhes os trabalhos forçados, quando não fosse por ou-<br />
tra razão, pela escassez ou carestia cla mão d'obra que, em regra, assober-<br />
ba a administração <strong>da</strong>s obras publicas nas colonias.<br />
Deve-se <strong>da</strong>r, n'este caso, preferencia aos trabalhos ao ar livre, agri-<br />
colas ou mechanicos, que concorram para <strong>da</strong>r uma certa aptidão profissio-<br />
nal aos con<strong>de</strong>mnados.<br />
<strong>Direito</strong> penal indigena nas colonias portuguezas<br />
Vejamos agora qual é a condição juridica dos indigenas <strong>da</strong>s colonias<br />
portuguezas sob o ponto <strong>de</strong> vista <strong>da</strong> legislação penal, e como se encontra<br />
organisa<strong>da</strong> a respectiva justiça repressiva. Aos citados documentos enviados<br />
pelo Governo portuguez ao Congresso <strong>de</strong> 1900 recorreremos <strong>de</strong> novo, visto<br />
representarem fonte auctorisa<strong>da</strong> e interessante.<br />
A legislação penal adopta<strong>da</strong> nas colonias portuguezas - salvo exce-<br />
pçóes que serão referi<strong>da</strong>s -é o Codigo Penal approvado para a metropole<br />
pela lei <strong>de</strong> 14 <strong>de</strong> julho <strong>de</strong> 1884 e generalisado ás colonias por <strong>de</strong>creto <strong>de</strong><br />
16 <strong>de</strong> setembro <strong>de</strong> 1886. Estão egualmente em vigor nas colonias e são<br />
applicaveis aos indigenas o codigo penal e disciplinar <strong>da</strong> marinha mercante<br />
<strong>de</strong> 1864, e o codigo <strong>de</strong> justiça militar <strong>de</strong> 13 <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 1896.<br />
A insiifficiencia d'esta legislação não <strong>de</strong>morou a <strong>de</strong>monstrar-se ; a ap-<br />
plicação <strong>da</strong>s penas, tendo por fim a repressão e intimi<strong>da</strong>ção, e a emen<strong>da</strong><br />
do <strong>de</strong>linquente, para attingir os seus fins não potle, como já vimos, ser<br />
i<strong>de</strong>ntica para indigenas e europeus.<br />
Se para o homem civilisado a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> 6 inestimavel, e a prisão uma<br />
vergonha e uma <strong>de</strong>shgnra, para os indigenas barbaros <strong>da</strong> nossa Africa pó<strong>de</strong><br />
quasi consi<strong>de</strong>rar-se a ireclusáo como um i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> bem-estar.<br />
Reconhecendo-se esta ver<strong>da</strong><strong>de</strong> e a inefficacia archi<strong>de</strong>monstra<strong>da</strong> <strong>da</strong><br />
pena <strong>de</strong> prisão simples para reprimir os crimes dos indigenas, publicou-se<br />
*
196 POLITICA INDIGENA<br />
o <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 20 <strong>de</strong> fevereiro <strong>de</strong> 1894 que regulamenta a administração <strong>da</strong><br />
justiça nas provincias ultramarinas. Esse <strong>de</strong>creto estabelece as seguintes<br />
excepçóes :<br />
«Artigo 3.0- N~L con<strong>de</strong>mnaçáo dos indigenas <strong>de</strong> Timor, <strong>de</strong> S. Thom6<br />
e Principe, e <strong>da</strong>s costas oriental e occi<strong>de</strong>ntal d'bfrica, para os <strong>de</strong>lictos a<br />
que correspon<strong>de</strong> a pena <strong>de</strong> prisão, os tribunaes po<strong>de</strong>rão substituir esta<br />
penali<strong>da</strong><strong>de</strong>, pela pena temporaria <strong>de</strong> trabalhos publicos convenientemente<br />
remunerados, applicando-a segundo as regras estabeleci<strong>da</strong>s no codigo<br />
penal.<br />
# 1.O - O governo ticti ,tiictori~ado a estabelecer para os mesmos<br />
indigenas, al4m <strong>da</strong>s 1,unic:õeq intlica<strong>da</strong>q no cotliqo penal e ri'este mesmo<br />
artigo, a <strong>de</strong> trabalho correccional tl~ tliiinze dias H iim aniio, iios casos e<br />
condiçóes <strong>de</strong>terminatlas pelo rrgiilamento, e que consistirA ri i ol)riqayáo <strong>de</strong><br />
trabalhar sob a vigilancia c1a policia r mediante iim salario lixo. tio serviço<br />
do Estado oix em qualquer outro xervi(o.<br />
c 2."- O governo 1-ar6 tambeiri o.; i~cgolaiiicnto~ nrce*snrios para que<br />
todos os indigenas, emqnanto rl~titlos nas prisóes public3as A or<strong>de</strong>m <strong>da</strong> justiça<br />
e á espera <strong>de</strong> serem julgados, se,jam obrigados a iitn trabalho <strong>de</strong>vi<strong>da</strong>mente<br />
remiiiierado, na propria prisão. ou fdra d'ella, sob a vi~il~ncia <strong>da</strong><br />
policia. ))<br />
Para o cnmprimcnto cl'estas disposiçócs, o gox7rrno piiblicnii o <strong>de</strong>creto<br />
<strong>de</strong> 20 <strong>de</strong> setembro <strong>de</strong> 1894, <strong>de</strong>cidindo no artigo 1." qiie o, iridigenas con<strong>de</strong>mnacto.;<br />
yor .rnten(::i judicial it boflrer :i p~1i;i temporaria <strong>de</strong> tr:ihalhos<br />
publicos, seri,iiii 11obto- :i tliqmhiqBo <strong>da</strong> t1ireci;áo <strong>da</strong>s obres pnlilic,ii tle ca<strong>da</strong><br />
colonia, afiiii (Ir serem empregados nos serviços <strong>da</strong>s 0l)ras Piiblicas<br />
ou <strong>da</strong>s municil)alitladcs. mediante um salario. e nas c,ontliqõ~x (1%. hcrviço<br />
dos empregado. do Estado. No artigo 2.O estabelece-se :i piinic;Ao <strong>de</strong> trahalho<br />
tmorret3i ~n,il cle 1.5 dias a nm anno para os intligenns, e nos artigos<br />
3." e 4.O <strong>de</strong>3igiiniii--c o- casos em que a prisáo pó<strong>de</strong> tlurar <strong>de</strong> quinze a noventa<br />
dias oii iiiais <strong>de</strong> noventa. No artigo 5.' estabelece-se a forma do<br />
processo; nos artigos (i.', 7.O, 8.O e 9.O conteem-se diversas disposiçóes<br />
regulamentartb- : finalmente no art. 10." <strong>de</strong>clara-se que, para a applicaçáo<br />
<strong>da</strong>s regras e+tabeleci<strong>da</strong>s por este <strong>de</strong>creto, se <strong>de</strong>\-em consi<strong>de</strong>rar como indi-
genas, os indigenas nascidos nas colonias que nem pela instrucção nem<br />
pelos costumes se distinguem <strong>da</strong> generali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> sua raça.<br />
Em Angola, para a execução d'este <strong>de</strong>creto, fixou-se, por portaria <strong>de</strong><br />
19 <strong>de</strong> fevereiro <strong>de</strong> 1895, o salario dos indigenas em 200 reis para os pro-<br />
fission:ii:s <strong>de</strong> qualquer especiali<strong>da</strong><strong>de</strong>, e em 120 reis para todos os restantes.<br />
O <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 20 <strong>de</strong> setembro <strong>de</strong> 1894 não é muito pratico; em pri-<br />
meiro logar as direcçoes d'obras publicas não tem frequentemente - bem<br />
triste B dizê-lo -trabalhos em que empreguem os con<strong>de</strong>mnados <strong>de</strong> ambos<br />
os sexos, e qiiando os teem sáo As vezes <strong>de</strong> natureza a náo po<strong>de</strong>rem uti-<br />
lisar a mão d'obra penitenciaria. AlBm d'isto a 0rganisac;ão complica<strong>da</strong> dos<br />
serviços <strong>de</strong> fazen<strong>da</strong> difficulta a regulari<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> pagamento dos salarios.<br />
ll'isto resulta que em Angola, ealvo uma oii outra excepçáo, o <strong>de</strong>creto<br />
ficon lettra morta. O processo bastante summario cio artigo .5.O, que simplifica<br />
immenso a instrucção <strong>da</strong>s causas, origina algumas vezes abusos por parte<br />
<strong>da</strong> policia - qiiasi sempre indigena - que é geralmente chama<strong>da</strong> a servir<br />
<strong>de</strong> testemiinlia.<br />
Em 3Ioçambiqiie puzeram-se logo em vigor as prescripçóes do <strong>de</strong>creto,<br />
visto as municipali<strong>da</strong><strong>de</strong>s se terem compromettido a arranjar trabalho para<br />
os con<strong>de</strong>mnados e a pagar-lhes os salarios. Anteriormente á publicaç80<br />
d'esta lei, já alli havia o uso <strong>de</strong> substituir as multas em que por contra-<br />
venções policiaes ou municipaes incorriam os indigenas, por trabalhos<br />
publicos com que lucrava a municipali<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
Assim, ain<strong>da</strong> ho,je em Quelimane, Cbin<strong>de</strong>, Not;ambique, etc., o serviço<br />
<strong>de</strong> limpeza <strong>da</strong>s ruas - capinar -- é gratuitamente feito pelo trabalho for-<br />
çado dos indigenas, reus <strong>de</strong> pequenos <strong>de</strong>lictos oii sim~les<br />
contravençóes.<br />
Na India a condição juridica dos indigenas 6 i<strong>de</strong>ntica & dos portu-<br />
guezes, e fiinccionam tribunaes judiciarios eqiiivalentes aos <strong>da</strong> metropole,<br />
<strong>de</strong> primeira. instancia, e <strong>de</strong> appellaçiio (Relaçáo <strong>de</strong> Gôa). Em to<strong>da</strong>s as nos-<br />
sas colonias, os <strong>de</strong>lictos e contravençóes são punidos pelos agentes <strong>da</strong> au-<br />
ctori<strong>da</strong><strong>de</strong> administrativa, que muitas vezes são tambcm juizes dos leitos<br />
civis entre os indigenas, como, por exemplo, acontece na Zambezia com o<br />
julgamento dos inilandos.<br />
Nos territorios em que na reali<strong>da</strong><strong>de</strong> não se realisa uma occupação
198 POLITICA INDIGEXA -<br />
effectiva e administrap%o directa, são OS chefes indigenas oa responsaveis<br />
pela or<strong>de</strong>m e segurança publica, com attribuiçiies repressivas sobre os habitantes<br />
<strong>da</strong> sua jiirisdicçáo territorial.<br />
Quanto & organisaçáo dos tribunaes para indigenas nas nossas colonias,<br />
é interessante transcrever a auctorisa<strong>da</strong> opinigo <strong>de</strong> Ediiardo Costa,<br />
exara<strong>da</strong> a paginas 162 do seu livro G AdministraçAo civil (Iat\ ?iossas possessões<br />
africanas » :<br />
«. . . . . . A primeira modificaçáo e a mais importante E a <strong>de</strong>, por lei,<br />
fazer cios chefes <strong>da</strong>s circiimscripçóes, pelo menos do interior, a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
judicial para os indigenas. l? o que cstá em vigor em graii<strong>de</strong> parte <strong>da</strong>s<br />
colonias francezas e em quasi to<strong>da</strong>s as ile Inglaterra. O que ficou dito<br />
quando se tratou <strong>da</strong>s circiimscripqóes indigenas dispensa a renovaqão <strong>de</strong><br />
outros argumentos.<br />
A 0rganisac;áo por mim proposta e approva<strong>da</strong> pelo Governo Geral<br />
<strong>de</strong> Moçambique, para o districto do mesmo nome, tinha em vista esta ne-<br />
cessi<strong>da</strong><strong>de</strong>, e o ar*. Coilsellieiro Reis e Lima, a cilja competencia j6 tive<br />
occasiáo <strong>de</strong> prestar homenagcin, mais <strong>de</strong> uma vez me disse estar <strong>de</strong> inteiro<br />
accordo com o 111-incipio geral aqui exarado. A alça<strong>da</strong> d'estes juizes terri-<br />
toriaes precise - r sufficientemente gran<strong>de</strong>, para que a sua acçáo possa ser<br />
sensivel e o seti i restigio mantido.<br />
Esta cosi:, rencia judicial do chefe <strong>da</strong> circumscripçáo não implica a<br />
annullação cori J t ta do po<strong>de</strong>r dos chefes indigenas, em materia <strong>de</strong> puni-<br />
ção. A maior parte <strong>da</strong>s vezes por politica c por facili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> administra-<br />
ção, convem eixar os regulos continuar a julgar os milandos sobrevindos<br />
entre os seu 4 subditos, reservando para os chefes <strong>de</strong> circiimscripçáo as<br />
causas entre habitantes <strong>de</strong> trihus differentes, os crimes contra os regulos,<br />
todos os crimex politicos relativos á nossa soberania, etc., e ás appellaçóes<br />
contra as sentpri(. as d'estes iiltimos.<br />
Se os cheft.s administrativos ficam magistrados judiciaes dos indige-<br />
nas, a elles competirá egualmente, como consequencia, o julgamento <strong>da</strong>s<br />
questóes sobrevin<strong>da</strong>s entre indigenas e europeus.<br />
Deve-se tambem modificar a organisaçáo dos tribunaes <strong>de</strong> appellação,<br />
em materia indigena, dos juizes territoriaes. Hoje essa appellação vae para
o juiz <strong>da</strong> comarca e d'este para a Relação. Ora, em regra, por causa <strong>da</strong><br />
distancia e <strong>da</strong> difficui<strong>da</strong><strong>de</strong> em fazer julgar essas causas em appellaçáo, os<br />
indigenas <strong>de</strong>sistem <strong>de</strong> recorrer á segun<strong>da</strong> instancia, com manifesto prejuizo<br />
<strong>de</strong> muitos e <strong>de</strong>sprestigio <strong>da</strong> justiça. Por outro lado, o magistrado <strong>da</strong> co-<br />
marca não tem, muitas vezes, pelo seu pouco tempo <strong>de</strong> carreira e pela sua<br />
vi<strong>da</strong> se<strong>de</strong>ntaria n'uma terra <strong>de</strong> relativa civilisaçáo, a experiencia sufficiente<br />
para temperar, pelo bom senso do seu arbitrio, o que a nossa lei tem <strong>de</strong><br />
esdruxiilo e <strong>de</strong> disparatado para os costumes indigenas. A organisação <strong>de</strong><br />
um tribunal superior indigena como o do ?\Tatal - hTutiva Hiyh Court - Q<br />
recommen<strong>da</strong>vel. Este é composto <strong>de</strong> um magistrado nomeiado pelo gover-<br />
nador e <strong>de</strong> um oii mais adwinistrrrtors in Zuw - chefes <strong>de</strong> circumscripções<br />
indigenas -.<br />
Para as nossas colonias africanas podia haver um tribunal superior<br />
indigena em ca<strong>da</strong> provincia indivisa ou districto subalterno, composto <strong>de</strong><br />
um juiz togado, indicado pela Relação Judicial, e <strong>de</strong> um ou <strong>de</strong> dois chefes<br />
<strong>de</strong> circumscripçáo, nomeiados directamente pelo governo provincial, sob<br />
proposta do governador do districto no segundo caso. Este tribunal per-<br />
correria em correigco, uma ou duas vezes no anno, to<strong>da</strong>s as circumscripções<br />
do seu districto, julgando as causas em appellaçáo. D'estas sentenças have-<br />
ria ain<strong>da</strong> recurso, em casos <strong>de</strong>terminados, para um tribunal supremo indi-<br />
gena, constituido pelo governador <strong>da</strong> provincia, presi<strong>de</strong>nte, e dois juizes<br />
togados - <strong>da</strong> Relaçáo, havendo-a na colonia, ou <strong>da</strong> primeira instancia no<br />
caso contrario --.B<br />
Com o seu espirito eminentemente perspicaz e documentado por uma<br />
longa pratica colonial, Eduardo Costa, nas consi<strong>de</strong>raçóes que prece<strong>de</strong>m,<br />
chega a uma solução realmente elegante <strong>da</strong> questão <strong>da</strong> justiya indigena,<br />
com o merito principal <strong>da</strong>s instituiçóes preconisa<strong>da</strong>s serem facilmente es-<br />
tabeleciveis em qiialquer <strong>da</strong>s nossas colonias africanas.<br />
Em Macau a condição juridica dos indigenas, sob o ponto <strong>de</strong> vista<br />
criminal, differe <strong>da</strong> dos nacionaes, em que para elles existe a pena <strong>de</strong> pri-<br />
são por divi<strong>da</strong>s, e no facto <strong>de</strong> po<strong>de</strong>rem ser postos á disposição do governo<br />
para serem empregados em trabalhos publicos, quando tenham sido con-<br />
<strong>de</strong>mnados a prisão correccional e não queiram ou não possam alimentar-se
U)O YOLITICA INDIGENA<br />
A sua custa na prisão. Alem d'isto, po<strong>de</strong>m ser julgados e con<strong>de</strong>mnados emv<br />
processo summario em to<strong>da</strong>s as causas comprehendi<strong>da</strong>s no artigo 1.O <strong>da</strong> lei<br />
<strong>de</strong> 18 <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong> 1857, ás quaes correspon<strong>de</strong>m, segundo o codigo penal. a<br />
pena <strong>de</strong> prisão ou <strong>de</strong> proscripção até seis mezes, uma multa até um mez, a"<br />
reprehensão e a censura.<br />
Os outros habitantes <strong>da</strong> colonia 36 po<strong>de</strong>m ser postos B disposição do<br />
governo ou julgados <strong>da</strong> maneira supracita<strong>da</strong>, qnando se,jam preFos em fla-<br />
grante <strong>de</strong>lito <strong>de</strong> infracção aos artigos 177, 180, 185, 188, 256, 1-44 e se-<br />
guintes do codigo penal, como foi <strong>de</strong>terminado pelo artigo 1." do <strong>de</strong>creto<br />
<strong>de</strong> 29 <strong>de</strong> março <strong>de</strong> 1890.<br />
Ao invez do que succe<strong>de</strong> na metropole os indigenas <strong>de</strong> Macau, quan-<br />
do con<strong>de</strong>mnados por sentença e intimados ao pagamento <strong>da</strong> divi<strong>da</strong>, po<strong>de</strong>m,<br />
quando se receie que não paguem a divi<strong>da</strong>, ser conservados na prisão, <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />
que o auctor assim o requeira, e se promptifiqrre a custeiar a alimentação<br />
do preso.<br />
S6 po<strong>de</strong>m ser isentos <strong>da</strong> prisgo quando apresentem lima cauçgo egual<br />
ao montante <strong>de</strong> con<strong>de</strong>mnação. A duração <strong>da</strong> prisgo será <strong>de</strong> tree mezes para<br />
as divi<strong>da</strong>s ate 200 patacas, seis meees até 500 patacas e um anno para to-<br />
<strong>da</strong>s as divi<strong>da</strong>s superiores. A divi<strong>da</strong> náo fica resgata<strong>da</strong> pela pena <strong>de</strong> prisgo<br />
soffri<strong>da</strong>, mas nunca mais, seja em que hypothese fôr, se po<strong>de</strong>rá exigir pela<br />
mesma divi<strong>da</strong> um novo encarceramento. Po<strong>de</strong>-se sempre recorrer <strong>da</strong>s sen-<br />
tenças <strong>de</strong> prisao, sem que comtudo a acceitação do recurso teilha effeito<br />
suspensivo <strong>da</strong> pena. I<br />
Os indigciias <strong>de</strong> Maoau, ploartigo 114 <strong>da</strong> Or<strong>de</strong>nanoa <strong>da</strong> Procura-<br />
tura - < Procurcrturn ndn~inistrativa dos negocios sinicos , - quando eram con-<br />
<strong>de</strong>mnados ás pcnas <strong>de</strong> prisão com trabalho, <strong>de</strong> prisão correccional, OU <strong>de</strong><br />
prisão rigorosa sem trabalho, eram, nas duas primeiras hypotheses, postos<br />
á disposição do governo, sempre que se não pu<strong>de</strong>ssem sustentar ti sua custa<br />
na prisão.<br />
A portaria ministerial <strong>de</strong> 2 do julho <strong>de</strong> 1894, provoca<strong>da</strong> por um tele-<br />
gramma em que o governador <strong>de</strong> Macau perguntava se, pelo artigo 12 do<br />
<strong>de</strong>creto com força <strong>de</strong> lei <strong>de</strong> 20 <strong>de</strong> fevereiro <strong>de</strong> 1894 que regulamentou a<br />
administração <strong>da</strong> justiqa ultramarina, se <strong>de</strong>via consi<strong>de</strong>rar revoga<strong>da</strong> a legis-
lação especial que em Macau <strong>de</strong>termina que sejam postos á disposiç80 do<br />
governo os accusados con<strong>de</strong>mnados pela Yrocuratura & pena <strong>de</strong> prisão com<br />
trabalho, <strong>de</strong>clarou que o referido <strong>de</strong>creto em na<strong>da</strong> alterava as leis e proces-<br />
sos penaes <strong>da</strong>s colonias, salvo ou casos expressamente <strong>de</strong>terminados, e que<br />
o seu artigo 3.0 creando a pena temporaria <strong>de</strong> trabalhos publicas em Ango-<br />
la, Noçambique, Timor, Guiné e S. ThomB e Principe, não queria signifi-<br />
car que eguaes penas se não applicassem em Macau, on<strong>de</strong> já estavam ante-<br />
riormente regulamenta<strong>da</strong>s.<br />
Em Macau póem-se á disposição do governo os indigenas con<strong>de</strong>mna-<br />
dos a prisão correccional pelos <strong>de</strong>lictos ~orn~rehendidos<br />
no artigo 1.' ds<br />
lei <strong>de</strong> 1853, forçando-os a trabalhar ao serviço do Estado quando se não<br />
queiram alimentar á sua custa, mas nunca são con<strong>de</strong>mnadoa á pena <strong>de</strong> pri-<br />
são com trabalho.<br />
De resto, se, sob o aspecto meramente especulativo e doutrinario, as<br />
penas <strong>de</strong> trabalhos forçados não passam <strong>de</strong> uma ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira escravatura<br />
legal, náo se pó<strong>de</strong> per<strong>de</strong>r <strong>de</strong> vista que o trabalho obrigatorio, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que se<br />
procure tirar-lhe to<strong>da</strong>s as exteriorisaçóes <strong>de</strong>gra<strong>da</strong>ntes, 6 um dos mais effi-<br />
cazes meios <strong>de</strong> regeneraçgo moral. Já em 1872 o gran<strong>de</strong> estadista Barjona<br />
<strong>de</strong> Freitas se expressava nos seguintes termos.<br />
R O trabalho é essencialmente moralisador e não <strong>de</strong>ve ser consi<strong>de</strong>rado<br />
como um aggravamento <strong>da</strong> pena, mas sim como um ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro beneficio,<br />
atten<strong>de</strong>ndo a que favorece d'uma maneira po<strong>de</strong>rosa a regeneração dos cri-<br />
minosos, e torna varios d'elles que a ociosi<strong>da</strong><strong>de</strong> arrastou ao crime, susce-<br />
ptiveis <strong>de</strong> ain<strong>da</strong> virem a ser na futuro uteis ti si proprios e á socie<strong>da</strong><strong>de</strong> *.<br />
Em Macau era muito facil e <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> conveniencia, estabelecer<br />
officinas profissionaes adstrictas á prisáo, e utilisar a gran<strong>de</strong> e ~roverbial<br />
aptidáo manual dos con<strong>de</strong>mnados chinas, no fabrico remunerador <strong>de</strong> artigos<br />
iiteis.<br />
Em Timor tambem se impóe o estabelecimento d'um presidi0 em que<br />
o trabalho obrigatorio obe<strong>de</strong>ça ás normas adopta<strong>da</strong>s nas mais mo<strong>de</strong>rnas e<br />
aperfeiçoa<strong>da</strong>s colonias penaes. Que bella escola para crear trabalhadores<br />
agricolas seria um estabelecimento d'estes na regiáo fertil e salubre do in-<br />
terior <strong>de</strong> Timor !
202 POLITICA INDIGENA<br />
Quanto á organisação judiciaria, hoje resume-se a um tribunal <strong>de</strong><br />
primeira instancia <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>da</strong> Relação <strong>de</strong> Gôa, o que occasiona não<br />
pequenas <strong>de</strong>moras, embaraços e difficul<strong>da</strong><strong>de</strong>s na instrucçáo e julgamento<br />
dos recursos interpostos.<br />
E' assim que os jornaes <strong>de</strong> Lisboa se teem ultimamente referido ao<br />
espantoso prejuizo e transtorno soffrido pelos litigantes commerciaes nas<br />
causas julga<strong>da</strong>s em Macau no anno <strong>de</strong> 1908, e que, to<strong>da</strong>s sem excepçúes,<br />
teem sido successivamente annulla<strong>da</strong>s pela Relação <strong>de</strong> Gi,a, sob um especioso<br />
pretexto juridico relativo a uma supposta irregulari<strong>da</strong><strong>de</strong> na constituiçáo do<br />
jury commercial que todos, indistinctamente, em Macau, <strong>de</strong>sqjam ver sup-<br />
primido.<br />
Antigamente a Procuratura tinha a competencia criminal estabeleci<strong>da</strong><br />
no artigo 1.' <strong>da</strong> lei <strong>de</strong> 1H d'agosto <strong>de</strong> 1833, e nos limites <strong>da</strong> sua jiirisdicção,<br />
julgava os crimes a que, segundo o Codigo Penal, correspondia uma <strong>da</strong>s<br />
penas seguintes: proscripçáo até seis mezes, <strong>de</strong>tenção :rté seis mezes, mul-<br />
tas até um mez ou até 20$000 reis, reprehensáo, e censura.<br />
Todos estes crimes eram julgados pela I'rocuratura sem recurso ; e,<br />
nas causas que ultrapassavam os limites <strong>da</strong> sua jurisdicçáo, nas quaes a<br />
penali<strong>da</strong><strong>de</strong> não ia alem <strong>da</strong>s gran<strong>de</strong>s penas temporarias, havia um recurso<br />
facultativo á Junta Superior <strong>de</strong> Justiça, qual, aliás, o processo <strong>de</strong>via ser<br />
presente, sem <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ncia <strong>de</strong> recurso, sempre que as penas a impor fossem<br />
<strong>de</strong> trabalhos piiblicos, <strong>de</strong> <strong>de</strong>tenyáo ou <strong>de</strong> <strong>de</strong>sterro perpetuo.<br />
Pela lei <strong>de</strong> 17 <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong> 1899 foi supprimi<strong>da</strong> a competencia judi-<br />
ciaria <strong>da</strong> Procuratura no julgamento <strong>da</strong>s causas criminaes, ficando ao cargo<br />
do juiz <strong>da</strong> primeira instancia to<strong>da</strong>s as attribuiçóes judiciarias confirma<strong>da</strong>s<br />
ao Procurador dos negocios sinicos pelo 3 3.0 do artigo 5.O do <strong>de</strong>creto com<br />
força <strong>da</strong> lei <strong>de</strong> 20 <strong>de</strong> fevereiro <strong>de</strong> 1894. Quanto á forma do processo cri-<br />
minal, está bast:irite simplifica<strong>da</strong> em Macau pela Or<strong>de</strong>nança <strong>da</strong> Procura-<br />
tura <strong>de</strong> 1881, que se continuou a executar quando as attribuiçóes judiciarias<br />
d'aquella instit~i~iio foram confia<strong>da</strong>s ao juiz <strong>da</strong> primeira instancia.<br />
Acerca <strong>da</strong> instit,uição do jury, em materia criminal, nas colonias por-<br />
tuguezas, o Sr. (ionçalres Guimarães, no relatorio sobre a Guiné enviado<br />
ao Congresso <strong>de</strong> Sociologia Colonial, diz o seguinte.
a Na metropole ha tres especies <strong>de</strong> processo criminal : policia correccional,<br />
processo correccicnal, e processo ordiiiario. h s6 n'este ~~ltirn~ que<br />
o jury intervem.<br />
Nas colonias (exceptuando Cabo Ver<strong>de</strong>) ha o processo ordinario e o<br />
processo <strong>de</strong> policia, não ha comtiido jury criminal em colonia alguma a nüo<br />
ser na Guine.<br />
Temos o maior respeito pelo principio que presidiu á c3rca
204 POLITICA INDIGENA<br />
- -- - .- - -<br />
E indispensavel que se aproprie quanto antes o Codigo Penal 4s cir-<br />
cumstaiicias especiaes a ca<strong>da</strong> colonia, e que, principalmente em Angola e<br />
Moçambique se organise a justiça indigena sobre as bases tiio simples, tão<br />
praticas e provavelmente tão efficazes que Eduardo Costa indicou.<br />
Condição juridica dos mestiços<br />
Na nossa opinião, as razóes que justificam e até mesmo impôem o<br />
estabelecimento para os indigenas, d'um estatuto civil differente do dos<br />
europeus, e d'uma legislação penal apropria<strong>da</strong>, não subsistem nem se po<strong>de</strong>m<br />
applicar aos mestiços.<br />
Em primeiro logar, consi<strong>de</strong>rando a questão pelo lado moral, Q justo<br />
que á raça mestiça proveniente <strong>da</strong> culpa, ou antes, <strong>da</strong> responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
quasi exclusiva, <strong>da</strong> raça colonisadora, seja garanti<strong>da</strong> uma situação moral,<br />
material e legal i<strong>de</strong>ntica B dos europeus. Assimilar os mestiços aos indige-<br />
nas, a16m <strong>da</strong> injustiça do procedimento, Q pessima norma administrativa,<br />
principalmente nas colonias mixtas em que o seu concurso, em pQ <strong>de</strong> egual-<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong> com os europeus, <strong>de</strong> tanta utili<strong>da</strong><strong>de</strong> pó<strong>de</strong> ser. Crear-lhes uma situa-<br />
ção intermedia tLntre os elementos indigena e colonisador, só pó<strong>de</strong> servir,<br />
para <strong>de</strong>senvolvt~r uma classe irrequieta e <strong>de</strong>scontente, cheia <strong>de</strong> odios e <strong>de</strong><br />
aspiraçóes, capaz <strong>de</strong> revolta e <strong>de</strong> violencia, con<strong>de</strong>mna<strong>da</strong> a ser eternamente<br />
<strong>de</strong>spreza<strong>da</strong> por iins e a <strong>de</strong>sprezar os outros, elemento activo <strong>de</strong> perturba-<br />
ções e foco <strong>de</strong> l)o.;siveis <strong>de</strong>sor<strong>de</strong>ns e rebellióes.<br />
Com as populaçóes mestiças são aconselhaveis os processos que ten-<br />
<strong>de</strong>m a obter a siia completa assimilaçáo juridica aos europeus, tanto sob O<br />
ponto <strong>de</strong> vista do estatuto civil como em materin criminal.<br />
Foi esta a doutrina que mereceu a consagraçáo <strong>de</strong>finitiva do Congresso<br />
<strong>de</strong> Sociologia Colonial <strong>de</strong> 1900, e actualmente E <strong>de</strong> maxima conveniencia<br />
que as naçóes coloniaes a ponham em pratica, salvo algnma excepçáo que<br />
as circumstancias locaes impozerem.
<strong>Direito</strong>s politicos<br />
Com os indigenas coloniaes po<strong>de</strong>m seguir-se dois systemas inteira-<br />
mente oppostos; ou sujeita-los a um regimen politico <strong>de</strong> excepção a<strong>da</strong>pta-<br />
do 6s circumstancias do meio, aos costumes e ao seu estado social, ou assi-<br />
mila-10s politicamente aos ci<strong>da</strong><strong>da</strong>os <strong>da</strong> metropole, conce<strong>de</strong>ndo-lhes todos os<br />
direitos e garantias consignados na respectiva constituição nacional. Os<br />
nrgnmentos contra o segiintln syst.tbrna ~ I I P correspon<strong>de</strong> A assimilaçSio geral,<br />
táo grato ao rspirito, <strong>de</strong> cssc~ricia gvoiiict ricii, <strong>da</strong>s raqas colonisadoras latinas,<br />
rednzem-se a tres 01)jecções principaes.<br />
A primeira refere-se ;i dosvantagem d:t prepon<strong>de</strong>rancia numerica dos<br />
indigenas rio eleitoriitlo colonial. N1este caso as consequcncias immediatas<br />
do systenia atloptwtlo serno: o innegavel direito <strong>de</strong> representaçáo dos indigentis<br />
no parlainento iiacioiiwl, t: o provavel açiimharcamento <strong>de</strong> todos os<br />
cargos electirns <strong>da</strong> atfministrav%o tio1oiii:il. A representaçiio <strong>da</strong>s colonias no<br />
parlamento nacional B urri coiitra-seiii~i ciiic nitdit justifica.<br />
Entre nós vigora es<strong>da</strong> ~)r.:itica ai)snr<strong>da</strong>, fazendo-se nas colonias uma<br />
pwudo.elei~Wo cujos laclos coiiiic:os (. iinmoraes sao o corollario logico dtt<br />
concessáo <strong>de</strong> direito <strong>de</strong> voto :i iniiit,os ii~ilhares <strong>de</strong> int1igc:rilts. absolutamente<br />
incapazes <strong>de</strong> formar a menor i<strong>de</strong>ia do HC~O que pr~ticilm e do direito que<br />
lhes assiste. . . . . . . . E' vt.rdii~lc que, geriilmeiitt.. nem a cerimonia picareca<br />
rla votaçáo dos indigenas se chega a rcalisar; faz-se theoricamente a<br />
<strong>de</strong>scarga 110s ca<strong>de</strong>rnos eleitoraes - cqiiando estes existem ! -, e a eleiyáo<br />
1irr:ita-sc ;i r-t~l;ic~$o<br />
ti'iinia acta freqiientemt~iite prepara<strong>da</strong> com antece<strong>de</strong>n-<br />
cia, e eni qiitl se dcixoi~ 1.m branco o espaço H cncher com o nome do can-<br />
di<strong>da</strong>to, que, muitas vezes, só á ultima hora é conhecido, por telegramma<br />
ministerial.<br />
Se 6 o <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> conce<strong>de</strong>r aos indigenas a facul<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> fazerem ouvir<br />
as suas reclamaçóes e a sua vonta<strong>de</strong>, em egual<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> direitos com os ci-<br />
d2dãr2s <strong>da</strong> metropole, que presidiu á concessko do direito <strong>de</strong> voto, basta o
I (<br />
206<br />
- i<br />
POLITICA INDIGENA<br />
seu atrazadissimo estado social e a forma porque se realisa a pseudo-elei-<br />
ção, para que esse generoso intuito seja totalmente falseiado.<br />
Se, pelo contrario, a eleição <strong>de</strong> <strong>de</strong>putados pelas colonias, obe<strong>de</strong>ce ao<br />
plano <strong>de</strong> ter no parlamento nacional, quem conheça bem as questóes que<br />
se lhe relacionam, <strong>de</strong> forma a justificar a acção parlameiitnr na legislação<br />
colonial, ain<strong>da</strong> n'este caso, não se attinge o fim proposto. Pondo <strong>de</strong> parte<br />
Portugal, on<strong>de</strong> os <strong>de</strong>putados ultramarinos raras vezes chegam a conhecer<br />
mais que os nomes geographicos <strong>da</strong>s colonias que os elegeram, e tomando<br />
para exemplo a França, reconhece-se que a infliiencia parlamentar em as-<br />
sumptos <strong>de</strong> administrayáo colonial é tudo quanto po<strong>de</strong> haver <strong>de</strong> mais per-<br />
nicioso. De resto, essa inflnencia apenas alli se exerce sobre a Argelia as-<br />
simila<strong>da</strong> (?) e <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte do ministerio do interior e sobre as velhas<br />
colonias Gran<strong>de</strong>s Antilhas e Reunião. Para to<strong>da</strong>s as outras, são lei os <strong>de</strong>-<br />
cretos presi<strong>de</strong>nciaes e o5 simples <strong>de</strong>cretos emanados do po<strong>de</strong>r executivo por<br />
<strong>de</strong>legação do legislativo. Entre nós, para temperar um pouco os excessos e<br />
<strong>de</strong>longas <strong>da</strong>s disc~nssóes parlamentares, existe a facul<strong>da</strong><strong>de</strong> concedi<strong>da</strong> tio mi-<br />
nistro do ultramar, pelo Acto Adiccional, <strong>de</strong> <strong>de</strong>cretar para as colonias nos<br />
interregnos parlamentares as medi<strong>da</strong>s julga<strong>da</strong>s <strong>de</strong> interesse urgente.<br />
Eduardo Costa escreveu.<br />
ulembrêmo-nos que ha trinta a quarenta formas <strong>de</strong> governo para<br />
as possessóes e colonias britanicas, e isso nos basta para certamente con-<br />
cluir, que ellas não po<strong>de</strong>riam sal-iir d'umn numerosa assembleia legisla-<br />
tiva composta, ncc sua maioricc, <strong>de</strong> pessoas, que não conhecem e náo po<strong>de</strong>m<br />
conhecer as caus:ts e as necessi<strong>da</strong>cles d'uma tal diversi<strong>da</strong><strong>de</strong>. w<br />
Effectivam,bnte é um gran<strong>de</strong> inconveniente a ingerencia dos parla-<br />
mentos na administração colonial, mas é preciso concor<strong>da</strong>r que ella i! a<br />
consequencia natiiral <strong>da</strong> rcpresenta(;áo arl lamentar <strong>da</strong>s colonias. Por isso,<br />
para as colonias mixtas, em que a população indigena predomine gran<strong>de</strong>-<br />
mente, não <strong>de</strong>ve Iiaver direito & representação parlamentar. Nas colonias<br />
<strong>de</strong> povoamento ri io se po<strong>de</strong> reciisar o direito <strong>de</strong> voto aos ci<strong>da</strong>dãos <strong>da</strong> raça<br />
colonisadora, ma-. n'este caso, para a eleição <strong>de</strong> parlamentos locaes e não<br />
para enviar <strong>de</strong>legados Ct representação nacional.<br />
Quanto ao voto para os cargos administrativos secun<strong>da</strong>rios, po<strong>de</strong> e<br />
I
DIREITOS POLITICOS<br />
<strong>de</strong>ve, <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> certos limites, ser concedido aos indigenas. E sempre facil,<br />
quando haja gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>sproporção numerica entre estes e os colonos, orga-<br />
nisar varias listas parallelas <strong>da</strong>ndo representação prefixa<strong>da</strong> ás duas raças.<br />
A segun<strong>da</strong> obiecçã:, importante opposta ao systema generalisador<br />
dos direitos politicos B a que se refere á ignorancia, boçali<strong>da</strong><strong>de</strong> e incon-<br />
sciencia dos indigenas que, reflectindo-se no resultado <strong>da</strong>s eleiçóes, repre-<br />
sentarão, como diz Girault, mais a caricatura do que a expressáo lidima<br />
<strong>da</strong> vonta<strong>de</strong> popular.<br />
A razão mais importante, a que scientificamente mostra a impossibi-<br />
li<strong>da</strong><strong>de</strong> dos nossos direitos politicos serem comprehendidos e interpretados<br />
pelos indigenas, é que, na mentali<strong>da</strong><strong>de</strong> d'estes, producto dos seus costumes<br />
e <strong>da</strong> condição politice e social, não cabe o conceito <strong>da</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong> politica,<br />
tal como existe no espirito educado dos europeus. Billiard refere-se a este<br />
assumpto, nos seguintes termos. (I)<br />
a As instituiçóes politicas do3 povos nHo são combinaçóe~ arbitrarias<br />
emanando <strong>da</strong> phantaaia individual ou collectiva dos chefes do Estado hereditarios,<br />
ou <strong>da</strong>s assembleias electiras. Essas instituiçóes vivem e actuam<br />
<strong>de</strong>ntro <strong>da</strong> medi<strong>da</strong> em que correspon<strong>de</strong>m á consciencia intima dos povos, e<br />
esta propria consciencia B o residuo concentrado do esforço intellectual e<br />
moral <strong>da</strong>s raças no <strong>de</strong>curso <strong>da</strong> sua historia.<br />
Assim, para que as naçóes europeias tenham conseguido obter as<br />
suas constituições politicas actuaes, foi preeiso qiie a Grecia e Roma <strong>de</strong>senvolvessem<br />
no espirito <strong>da</strong>s tribus aryanas o sentimento <strong>de</strong> <strong>de</strong>dicação pela<br />
cidn<strong>de</strong>, que engren<strong>de</strong>ci<strong>da</strong> se converteu na patria; que o christianismo<br />
n'ellas estabelecesse a nobreza e egual<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> todos os homens sem distincção<br />
<strong>de</strong> origem nem <strong>de</strong> condição ; que a reforma <strong>de</strong> Luthero emancipasse o<br />
pensamento individual; que Voltaire e Rousseau applicando ao governo<br />
<strong>da</strong>s nações, os principias estabelecidos pelos seus precursores, submettessem<br />
it sua inexoravel analyse to<strong>da</strong>s as velhas instituições sociaes ; que final-<br />
mente o seculo XIX, leicisando a antiga fraterni<strong>da</strong><strong>de</strong> evangelica, a fizesse<br />
(1) Billiard - O. CetUrn
208 POLITICA INDIOENA<br />
transitar do dogma para a lei, e d'ella extrahisse a nova religiáo do soffrimento<br />
humano.<br />
On<strong>de</strong> encontrar entre as populaçóes autochtones <strong>da</strong>s colonias mo<strong>de</strong>rnas,<br />
to<strong>da</strong>s estas gran<strong>de</strong>s i<strong>de</strong>ias fun<strong>da</strong>mentaes que formam a substructura<br />
.<strong>da</strong>s nossas in~t~ituiçóes politicas ? ....................................<br />
................................... Para dotar um povo com um<br />
systerna baseado ,na eleiçáo 6 primeiramente preciso que esse povo seja<br />
capaz <strong>de</strong> lhe comprehen<strong>de</strong>r o funccionamento e o alcance; em segui<strong>da</strong> 6<br />
necessario que consinta em servir-se d'elle; finalmente, é necessario que<br />
reuna as condições iudispensaveis para o fazer com proveito. Ora todo o<br />
homem experiente se vê forçado a reconhecer que, entre as populaç6es<br />
barl~:iras, Irem raras $50 as 1)erronnli<strong>da</strong>drs que pnsaiiem as condiçóes requeri<strong>da</strong>,^.<br />
... J .............................................<br />
.......... !. .. l3'cstcs fiictc,s clc\.e po<strong>de</strong>r coiicliiir-se qiic, apesar <strong>de</strong><br />
to<strong>da</strong>s as teiitiitivas tle etliiciiçáo. iis nnssws mo<strong>de</strong>rnas institiiic;~es politioas,<br />
a(lwpt,a<strong>da</strong>s it rttqa-: d'iim:~ meiitaii(1a<strong>de</strong> fiin<strong>da</strong>meiitalmente <strong>de</strong>rsc~inclliantc,<br />
nAo seráo niinca, iiiqa-sc o que se fizer, senFio OS lettreiros erigiini~tlorccl <strong>de</strong><br />
coicas prc~fiiri<strong>da</strong>iiic~iit-r clifferentc.~, anima<strong>da</strong>s <strong>de</strong> um rspirito coriip1et;imente<br />
divewn, r incap~i, s (1~ con\,ergir. para iim esforqo conimum ..<br />
E\~i(l,.iitenic~iit(? :i* li1)er<strong>da</strong>iIcts pulit,ic~iis í ~ ~ ~ m::i~ra<strong>da</strong>m i ~ i s ao cspirito<br />
dos indigeriai, qtltb (.11ei; mcllior c,c,mlirrl-ien<strong>de</strong>m, e cii,ja garantia mais apii<br />
<strong>de</strong>criri, náo s50 tiilti~~ll;is<br />
lielas c; iiwes tr liberalismo dos colonic-i~dores mais<br />
pngnnu nas riias iriet,rol)olr~, m:is sirn as que dizem directanic'nte respeito<br />
& sua organis;ic;Ho soci:tl 1)oliticii. Deixemos lios indigenas a aiitonomia<br />
admiiiistrativa <strong>da</strong>s suas comniiini<strong>da</strong>dcs, quando syja 1)ossirel conservemos<br />
as alictorid~<strong>de</strong>s pcir ellrs t~scolliitl;i?, rpspeitenios os setis costnriic~s e liiemr-<br />
chia social e.religiosa. nias paremos ahi r c>t;cliirí;amos as utopias generosas<br />
que iiáo rclircserit;im, riem iitilitla<strong>de</strong> para a cólonia: ncni bene-<br />
ficio para os indigrna~. As institiii(;cíes 1.1ulIticas. proprias a uiri cer.to meio<br />
social, sáo eecravas <strong>da</strong>s condi~óes meecllogicas e historicas quc :i5 motivfi-<br />
ram, e não se FC(!( H' trgn~~~o~tar<br />
Indifi'crcntemente a oiitras raqas c :i oiitros<br />
paizes seni que sts <strong>de</strong>unaturem oii <strong>de</strong>generem ; como os aniniaes e como as<br />
plantas, sáo flinc,:Wo rssoncial c10 meio em que se <strong>de</strong>senvolveram, e, fóra
DIREITOS POLITICOS<br />
-<br />
d'elle, s6 po<strong>de</strong>m ter a vi<strong>da</strong> artificial e anormal <strong>da</strong> p?Imeira do <strong>de</strong>lterto<br />
n'uma estufa sobre-aqueci<strong>da</strong> <strong>de</strong> S. Petersburgo.<br />
Implantar entre os barbaros do sertão, ou entre os civilisados do<br />
Oriente, as instituições politicas <strong>da</strong> Europa e <strong>da</strong> hmerica, eqiiivale a arremeçar<br />
um diamante a um cliarco lodoso; a agiia do charco não se tornará<br />
cryatallina, e o diamante escon<strong>de</strong>rá o brillio sob uma cama<strong>da</strong> <strong>de</strong><br />
lama.. . .<br />
A assimilaqáo politica dos indigenas B um icteal táo longinquo e talvez<br />
t5o irrenlisuvel que, na pratica colonial, <strong>de</strong>vem, por emcliianto, scr postas<br />
completamente <strong>de</strong> parte as normas unitarias que na<strong>da</strong> significam, acarretando<br />
quasi sempre complicações e difficul<strong>da</strong><strong>de</strong>s, quando não ficam lettra<br />
morta por não encontrarem no meio indigcna os objectivos a que correspoii<strong>de</strong>m.<br />
Assim como aos indigenas, com n. manutenção dos seus regimens<br />
<strong>de</strong> familia, <strong>de</strong> successáo, <strong>de</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> etc., ú garantido um estatuto civil<br />
A parte, assim se lhe <strong>de</strong>vem tambem conce<strong>de</strong>r apenas os direitos politicos<br />
que condisserem com as suas aspiraçócs e necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />
, Nas colonias, impóe-se o estabelecimento d'iim regimen <strong>de</strong> excepyáo,<br />
que, aliás, correspon<strong>de</strong> perfeitamente ao ensinamento <strong>da</strong> Historia, quanto<br />
ao procedimento havido em todos os tempos para com os liabitantes <strong>da</strong>s<br />
terras conquista<strong>da</strong>s.<br />
É um meio termo entre o liberalismo <strong>da</strong>s instituiçóes metropolitanas,<br />
e a situação correspon<strong>de</strong>nte ao estado <strong>de</strong> sitio.<br />
Os indigenas carecem evi<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> certas garantias, mas não<br />
precisam, nem sequer co~n~relicn<strong>de</strong>m as que, em geral, mais promptos somos<br />
em conce<strong>de</strong>r-lhes. Todo o regimen politico applicavel aos indigenas,<br />
<strong>de</strong>ve assegurar <strong>de</strong> direito e <strong>de</strong> facto, a liegemonia <strong>da</strong> metropole, e a pmtica<br />
tem <strong>de</strong>monstrado que, em materia <strong>de</strong> direitos politicos, o melhor que se pd<strong>de</strong><br />
faxcr 6 conservar apen:is os que j& existirem, introdnzintlo lentamente os<br />
aptrfei(;oanicntos e as libercla<strong>de</strong>s necessarias, para ir provocando a evolução<br />
<strong>da</strong> melhoria progressiva <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a organisaçáo politica indigena.<br />
As experiencias d'este sy~tema, feitas pela França na Tunisia, pela<br />
Inglaterra na Iritlia c pcla Hollan<strong>da</strong> nas Indias Orientaes, não <strong>de</strong>ixam<br />
duvi<strong>da</strong>s sobre a sna efficacia. Por otitro lado, a concess5o briisca <strong>de</strong> todos os<br />
14
POLITICA MDIGENA<br />
direitos politicos As popiilaçóes <strong>de</strong> côr <strong>da</strong>s Antilhas, <strong>de</strong>li como resultados<br />
principaes a anarchia e as guerras civis.<br />
Como, pordm, as populações indigeiias po<strong>de</strong>m soffrer com abusos <strong>de</strong><br />
caracter individual ou geral, é necessario fornecer-lhes meios <strong>de</strong> apresenta-<br />
rem as suas reclamações e fazerem valcr os seus direitos. Os abusos indivi-<br />
duaes, como o nome o indica, são praticados por lima auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> domina-<br />
dora contra os direitos ou as regalias d'iim membro <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena ;<br />
os abusos geraes são os que lesam uma collectivi<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena ou a massa<br />
<strong>da</strong> população, e proveem d'am acto do governo metropolitano oii co-<br />
lonial.<br />
Dos primeiros são quasi sempre culpados os fiinccionarios indigenas,<br />
c as suas causas c ctfeitos são facilmente rernediaveis. Os segiindos é que<br />
tcem maior importanci;~. Muitas vezes, lia mellior <strong>da</strong>s intcnçóes, as metro-<br />
poles legislam para as colonias ver<strong>da</strong><strong>de</strong>irds enormi<strong>da</strong><strong>de</strong>s, <strong>de</strong> applicação dif-<br />
ficil e <strong>de</strong> consequencias ruinosas para os indigenas. Estes abiisos - que<br />
outro nome não teem - são muito mais graves do que os primeiros ; sd<br />
muito tar<strong>de</strong>, é que os governantes se apercebem do erro proprio, e que os<br />
indigenas avaliam 1,em o alcance do prejiiizo que soffrcram. E' difficil, en-<br />
tHo, reparar o mal já feito, e <strong>de</strong>svanecer a animosi<strong>da</strong><strong>de</strong> justamente sus-<br />
cita<strong>da</strong>.<br />
Para evitar os abiisos <strong>de</strong> caracter individual, parece-nos sufficiente<br />
a fiscalisação hierarchica. O indigena lesado vae queixar-se ao siiperior<br />
hierarchico <strong>de</strong> quem o lesou, e este, <strong>de</strong>pois dc inquerito, procc<strong>de</strong> como fôr<br />
<strong>de</strong> justiça.<br />
Para evitar os abiisos <strong>de</strong> cara~tcr<br />
geral, é necessririo rr~c.onliecer aos<br />
indigenas: o direito ahsoliito tle peticxo; o (lireito <strong>de</strong> reuni50 com algiimas<br />
restricções indispensaveis ; uma limita<strong>da</strong>'liber<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> imprensa nn'lgomas<br />
colonias mais avança<strong>da</strong>s; e finalmente promover a creaçáo <strong>de</strong> assembleias<br />
indigenas <strong>de</strong> caracter consnltivo, <strong>de</strong>stina<strong>da</strong>s a representar e fazer ouvir<br />
a opinião publica dos indigenas em todos os nssumptos <strong>de</strong> administração<br />
que se lhes refiram.<br />
Estas ausembleias, sem embaraçar a acçRo do governo metropolitano,<br />
off'erecem aos indigenas um:L seria garantia <strong>de</strong> que os seiis ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros in-
- DIREITOS POLITICOS 211<br />
teresses se tornar50 conhecidos e seriio attendidos, em to<strong>da</strong>s as mcdi<strong>da</strong>s<br />
administrativas que se adoptarem.<br />
A imprensa, essa admirarei forma <strong>de</strong> se patentearem as necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
rcaes e as aspirações legitimas dos individuos e dos poros, tem <strong>de</strong> ver o seu<br />
exercicio nas colonias regulado por tima lei severa em que se atten<strong>da</strong>, antes<br />
dc tiido, A3 eonvenienci~ts politicas <strong>da</strong> n:iç8o dominadora. A propria<br />
França tem estabelecido, nas suas colonias, diversas rcstricçóes á liberal<br />
lei <strong>de</strong> imprensa alli introduzid:t em 1581, a fim <strong>de</strong> evitar c reprimir certas<br />
pertiirbaçóes ameaçadoras tla or<strong>de</strong>m publica.<br />
A liber<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> reuni60 ain<strong>da</strong> carece <strong>de</strong> restricçóes mais formaes (10<br />
que a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> imprensa. Com effeito, em Africa e no Oriente o papel<br />
<strong>da</strong> opinigo eseripta é muito inferior á influencia <strong>da</strong> palavra nas reunióes<br />
publicas ou secretas. Quanto ás liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> ensino e <strong>de</strong> associaçáo, são<br />
direitos politicos correspon<strong>de</strong>iites a iiina organisaçwo social mais eleva<strong>da</strong>, e<br />
cuja outhorga o governo colonisador po<strong>de</strong>rti regular, segundo o adiantamento<br />
<strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena e as condiçóes <strong>de</strong> segurança politica <strong>da</strong> coloniit.<br />
Exceptuamos, 6 claro, as associaçóes <strong>de</strong> soccorros mutuos, <strong>de</strong> assistcncia<br />
priva<strong>da</strong> e <strong>de</strong> credito indigena que o Estado <strong>de</strong>ve procurar <strong>de</strong>scri\-01ver<br />
e proteger por todos os meios ao seu alcance.<br />
C) congresso <strong>de</strong> Sociologia Colonial dc 1900, reconlicccnilo que se riHo<br />
po<strong>de</strong> fazer unia bôa administragHo dos indigenas, se estes náo tiverem riieio<br />
<strong>de</strong> fazer saber as suas necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s Hs auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s locaes ; e consi<strong>de</strong>rando<br />
que é importante para a segurança <strong>da</strong> prosperi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s colonias, que as<br />
populaçóes indigenas encontrem, no funccionamento <strong>de</strong> constitriiçóes regulares,<br />
o meio <strong>de</strong> apresentar as suas queixas c reclainaq6es1 relativas a medi<strong>da</strong>s<br />
<strong>da</strong> it(lministraç50 local, oii a qiiaesquer medi<strong>da</strong>s legislativas, foi tlc<br />
opinião :<br />
u 1.0 -- Que as potencias colonisadoraj se <strong>de</strong>vem preoccupar em fornecer<br />
aos seus subditos indigenas os meios <strong>de</strong> <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r os seus direitos, e <strong>de</strong><br />
fazer valer as suas reclamavóes junto ás auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s locaes.<br />
2.0 -Entre estes meios, que <strong>de</strong>vem ser apropriados ao grau <strong>de</strong> civilisaçáo<br />
indigena, o Congresso recommen<strong>da</strong> o livre exercicio do direito <strong>de</strong> petição,<br />
que <strong>de</strong>ve estar reduzido ao minimo <strong>de</strong> formali<strong>da</strong><strong>de</strong>s e <strong>de</strong> custas, a<br />
*
212 POLITICA INDIGENA<br />
--<br />
fim <strong>de</strong> qiic os ignorantes e os mais pobres d'elle se possam aproveitar sem<br />
difficiil<strong>da</strong>cle.<br />
a .?.O - Reconhecendo qiie a concessfio <strong>de</strong> institniçúes representativas<br />
pcí<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>ra<strong>da</strong> como o mais seguro meio <strong>de</strong> habilitar as populações<br />
indigenw a <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r os seus direitos c a fazer valer os seus direitos junto<br />
As auctori<strong>da</strong>dcs locaes, o Congresso enten<strong>de</strong> qiic esse regimen suppõe o<br />
conciirso <strong>de</strong> condiçóes moraes, intellectiiaes e politicas cuja realisaçáo só B<br />
concehivel n'nm futiiro mais ou menos afastado, e que, no estado actual <strong>da</strong><br />
maior parte <strong>da</strong>s popiilaçóes indigenas! a soln(*:?io se <strong>de</strong>ve procurar, segundo<br />
os cilsos, 011 pela adjiincp5o cle principars iniligenas ao3 conselhos governativos<br />
ou atliriinistrativos <strong>da</strong> locali<strong>da</strong><strong>de</strong>, oii licla creaçáo <strong>de</strong> assembleias indincnns<br />
invcstitlas <strong>de</strong> attrihiiiçúes piirainente consiiltivaci. O recrutamento<br />
d'essas asseml~lcias <strong>de</strong>verá, variar com as condiqóes locaes. E para <strong>de</strong>sejar,<br />
entretanto, qiie cstas asscml)leia~, q~iandn as circiim~tancias o permittam,<br />
sejam nomeiíitl:ls, cni parte pelo menos, por clcir%o, po<strong>de</strong>ndo o respectivo<br />
siiffragio ser rc,stric.to oii em variou graus.<br />
Nas co1orii:is (.i11 qiic as condiçfic:s locaes se náo prestam ao estabelccimento<br />
<strong>de</strong> ;ti;-l.mbleiris semclhantcs, seria d~syjnvel qiie iim <strong>de</strong>legado do<br />
governador ;l;l--i: constituido tutor dos iridigeiias com competencia para receber<br />
as suas: 14x2s D . I<br />
Uma <strong>da</strong>- !,rimeiras assemhleias d'este gcnero, foi a que Paiil Bert,<br />
o graridc adAi, -tr:iilor ila Tndo-Ciiina, ~st,al~
DIREITOS POLITICOS 213<br />
. -<br />
to<strong>da</strong>s as administrações locaes e municipali<strong>da</strong><strong>de</strong>s, haver cargos electivos<br />
para que os indigenas s&o eleitores e eleçiveis, foi permittido que o sllffragio<br />
reatricto elegesse o Coiigrcsso indio. Este Congresso, pela iillportitncia<br />
tlas reivinc1ii:ayúcs qrie tlefenileii, e pela calorosa pro1)agaiitla <strong>de</strong> ar, tonomia<br />
politica e emancipaygo social, qiie tem sido o modulo essencial d:is siias dis-<br />
ciissóes, tem <strong>da</strong>do ultimamentc origem aos mais variados commeiltarios.<br />
Sa Colonia do Cabo, on<strong>de</strong> ha intligenas bastante civilisatlo~, c,tcs<br />
sáo eleitores <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> certas restricções c~zi<strong>da</strong>dosamente estatuidãs ; jli liO,je<br />
alli existem cinco ou seis collegios eleitornes em qiie or indig-cnas exercem<br />
gran<strong>de</strong> influencia.<br />
Na maior parte <strong>da</strong>s coloiiias que ain<strong>da</strong> não estno sob o regimen <strong>da</strong><br />
autonomia (Crown Colonies), nas Tndias Occi<strong>de</strong>ntnes e na Africa Occi<strong>de</strong>n-<br />
tal, em Ceylgo, na peninsiila <strong>de</strong> Nalacca, em Hong-Kong ctc., os consellios<br />
governativos conteem uma minoria <strong>de</strong> membros nHo officiaes, eleitos iins<br />
pelos coloiios e outros pelos indiganas. Estas institiiiç6es1 apesar do voto<br />
dos membros electivos ser meramente consultivo, fiinccionam atiiniravpl-<br />
mente em Ceylgo e em Hong-Kong, mas, em todo o caso, a orgaiiisa~íto <strong>da</strong><br />
assembleia indigena consilltira. (: milito preferivel. Os indigenas <strong>de</strong>liberam<br />
alli livres do constrnngimcnto qiie sempre, inais oii menos, Ihes impúe a<br />
presença dos europeiis.<br />
Este suffragio limitado, concedido pouco a pouco aos indigenas, consentaneo<br />
com o seti grau <strong>de</strong> civilisaçãn, e ten<strong>de</strong>nte a interes~a-10s directainente<br />
na qaestáo (10s negocios qiie llic dizem respeito, é uma coisa intciramente<br />
differente <strong>de</strong> conce<strong>de</strong>r-llie~ o direito <strong>de</strong> eleger <strong>de</strong>piitados á<br />
representaçáo nacional, uii administradores coloniaes ile catliegoria siiperior<br />
ciljas funcçóes sejam, por acaso, electivas.<br />
Dos direitos politicos a qiie nos temos vindo a referir 6 preciso dis-<br />
t irigiiir, como diz Girai~lt, os direitos individuaea que se resumem nas diias<br />
formulas : ep~uldn<strong>de</strong> perulite a lei, e 1iber.dntle indiaidunl.<br />
Estes <strong>de</strong>vem ser communs a todos os nncionaes, sem diotincçáo <strong>de</strong><br />
&<strong>de</strong>, <strong>de</strong> sexo, oii <strong>de</strong> raça, aos ci<strong>da</strong>dãos <strong>da</strong> metropole como aos subditos<br />
indigenas. Em em to<strong>da</strong>s as colonias lia certas restricqóes a estes<br />
direitos, impostas imperiosi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s locacs, economieas e
214 POLITICA INDIGENA<br />
politicas. As mais importantes são as que dizem respeito á regiilamentaçáo<br />
<strong>da</strong> emigração. c do traballio indigena, e a que estabelece, para os indige-<br />
nas, a siijeiyão a iim regimen disciplinar ditfercnte do que é applicavel<br />
aos colonos, e qiie geralmente Q coiiliecido por regiv~en do iildiylet~ato.<br />
I
TKABALIIO INDIGENA<br />
Generali<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />
(Methodns directrr.. obrigatori to rio<br />
Mão d'obra loca11 I Educação<br />
Cesenvolvimento<br />
profissional<br />
<strong>da</strong>s nelMethodos<br />
indirectos I cessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
Expropriação <strong>da</strong>s terras<br />
I Repressão <strong>da</strong> vadiagem<br />
Regulamentação dos con-<br />
1 tractos <strong>de</strong> trabalho<br />
Regimen <strong>da</strong> mão d'obra local nas colonias portuguezas.<br />
( Irnmigração<br />
Trabalho importado Regulamentação dos contractos <strong>de</strong> immi-<br />
1 gra~ão<br />
Trabalho importado nas colonias portiigiiezas - Mão<br />
d'obra em S. Thomé e Priiicipe.
CAPITULO V<br />
Generali<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
O exito economico <strong>da</strong> empreza colonisadora <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> tres factores<br />
essenciaes : riqueza e fertili<strong>da</strong><strong>de</strong> do solo colonial, capitaes sufficientes para<br />
siia valorisaçáo e trabalho indispensavel para a explorac;áo agricola e<br />
industrial. Sem a coexistencia <strong>de</strong> estes elementos fiin<strong>da</strong>mentaes é impossi-<br />
vel qualquer tentativa <strong>de</strong> colonisaçáo.<br />
Como seria illogico supp6r que as naçóes <strong>de</strong> politica colonial fossem<br />
escolher, para campo <strong>de</strong> expansáo do seu esforço colonisador, terrenos inha-<br />
bitaveis ou sem nenhum valor agricoln ou mineiro, <strong>de</strong>vemos concluir que a<br />
abun<strong>da</strong>ncia e a loôa quali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s terras nunca faltam nas colonias propria-<br />
mente ditas.<br />
A proporcionali<strong>da</strong><strong>de</strong> em que o capital e o trabalho teem <strong>de</strong> entrar,<br />
quando se busque valoristi-las, é necessariamente variavel com o typo <strong>da</strong><br />
colonia e subsequente condicionalismo economico. Para recolher resultados<br />
proficuos e estaveis e para manter o eqiiilibrio economico Q preciso regnlar<br />
harmonicamente a intervençáo dos elementos valorisadores. PlatÁo dizia<br />
que a harmonia dos movimentos no mundo si<strong>de</strong>ral era <strong>de</strong>vi<strong>da</strong> ú proporção<br />
no numero dos astros e nas distancias que os separam; no mundo econo-<br />
mico o gran<strong>de</strong> regulador <strong>de</strong> equilibrio é, sem duvi<strong>da</strong>, a harmonia <strong>da</strong>s proporções<br />
entre as forças que actuam na siia evolu~áo. (I)<br />
(1) Dr. Laranjo - k'heovin tltt Etnigvn,cGo.
218 POLITICA INDIGENA<br />
--- - --- . - - - -- - - -- - - .<br />
Sob este ponto <strong>de</strong> vista ha urna gran<strong>de</strong> differença entre as colonias<br />
<strong>de</strong> povoamento e as fazen<strong>da</strong>s propriamente ditas. Nas primeiras, a propria<br />
natureza <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> parcella<strong>da</strong> e, em regra, explora<strong>da</strong> directamente<br />
pelos pequenos proprietarios agricolas, exige uma emigraçao <strong>de</strong> capital<br />
muito inferior & que requerem as segun<strong>da</strong>s. Nas colonias <strong>de</strong> exploraçáo,<br />
para que a producç80 e machinofactura dos generos ricos como o assucar,<br />
o ccifd, it borracha, o cacau etc., possam ser remuneradoras, e para se obter<br />
facil collocaçáo dos prodiictos exportados nos gran<strong>de</strong>s mercados mundiaes,<br />
6 indispensavel a existencia <strong>da</strong> gran<strong>de</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>, produzindo em larga<br />
escala e absorvendo avultados capitaes.<br />
k uma illusáo imaginar que a simples miragem do maior rendimento<br />
do capital e superior productivi<strong>da</strong><strong>de</strong> do trabalho nos paizes novos, basta<br />
para estabelecer uma corrente efficaz <strong>de</strong> iniciativas capitalistas ou snla-<br />
ria<strong>da</strong>s.<br />
Muitas vezes, como diz TAeroy Beaulieu, quando as colonias attingem<br />
a e<strong>da</strong><strong>de</strong> adulta, essa corrente existe com caracter <strong>de</strong> cstabili<strong>da</strong><strong>de</strong>, levando<br />
para alli parte do capital e dos braços <strong>da</strong>s velhas socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s. Ttfas, para<br />
que isso se dê, Q necessario primeiramente fazer evolucionar a colonia até<br />
áquella phase, procurando e instigando ao mesmo tempo artificialmente a<br />
<strong>de</strong>rivaçáo do capital e do traballio, nem sempre facil <strong>de</strong> obter.<br />
Seja qual for o systema econornico <strong>da</strong> exploração colonial, a influen-<br />
cia <strong>da</strong> maior ou menor abun<strong>da</strong>ncia <strong>de</strong> máo d'obra na prosperi<strong>da</strong><strong>de</strong> do em-<br />
prehendimento t! táo evi<strong>de</strong>nte, que dispensa qualquer <strong>de</strong>monstraçáo.<br />
Na Europa, a <strong>de</strong>nsi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> população e a facili<strong>da</strong><strong>de</strong> e rapi<strong>de</strong>z dos<br />
meios <strong>de</strong> transporte, permittem geralmente obter todos os braços neccssa-<br />
rios. A1Qm d'isso, as exploraçíies agricolas correspon<strong>de</strong>m principalmente As<br />
necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s privativas aos habitantes <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> região, e esses habitantes<br />
teem numerosas e complica<strong>da</strong>s necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s que sd o trabalho lhes pó<strong>de</strong><br />
satisfazer. A lei <strong>da</strong> offerta e procura origina por evolução natural a subor-<br />
dinação do trabalho ao capital, multiplicando e harateiando a miio d'obra,<br />
facilmente recrutavel e siibstituivel. Nas colonias as circnmstancias são<br />
outras ; as populaçúes indigenas, excepto n'algnmas regifies congestiona<strong>da</strong>s<br />
como a China oii a India, são poiico numerosas e estão dispersas pcjr ter-
TRABALHO INDIGENA 219.<br />
- -<br />
ritorios immensos, on<strong>de</strong> escasseiam, ou faltam por completo, as vias <strong>de</strong> communicaçáo<br />
e os meios <strong>de</strong> transporte.<br />
Nas regiões <strong>de</strong>lticas <strong>da</strong> Cochinchina e do Baixo Tonkin, por exemplo,<br />
existem agglomeraçóes humanas <strong>de</strong>nsissimas, mas ahi a colonisaçGo<br />
agricola não tem razão <strong>de</strong> ser, porque o solo está todo partilhado e arroteado,<br />
e sd seria possirel realisar-sc espoliando violentamente os indigenas<br />
<strong>de</strong> to<strong>da</strong> a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> immobiliaria rustica que possuem individual ou collectivamente.<br />
Estes casos, por8ml são isoladosT e po<strong>de</strong>-se affoutamente afirmar que<br />
o problema, <strong>da</strong> mão d'obra 6 uma <strong>da</strong>s mais importantes qiiestóes, sen8o a<br />
mais grave, que se propõem á administração <strong>da</strong> gran<strong>de</strong> maioria <strong>da</strong>s colonias.<br />
O trabalho valorisador <strong>da</strong>s terras e creador <strong>da</strong>s industrias, po<strong>de</strong> ser<br />
executado pela mão d'obra indigena ou, quando esta falleça, pela emigraçfio<br />
estrangeira. As vantagens do emprego exclusivo <strong>da</strong> mão d'obra local<br />
são muitas e importantes. Sempre que exista um numero sufficiente <strong>de</strong> trabalhadores<br />
indigenas, e seja possivel utilisa-10s in loco nos trabalhos a effcctuar:<br />
a mão d'obra será melhor e mais barata ; evit8m-se os inconvenientes<br />
por vezcs <strong>de</strong>soladores <strong>da</strong> acclimatação dos indigenas, e poupam-se as<br />
<strong>de</strong>spezas <strong>de</strong> recrutamento, transporte, repatriação, sustento e assistencia<br />
medica que sobremaneira encarecem o trabalho importado.<br />
Quando estu<strong>da</strong>rmos os contratos <strong>de</strong> emigraçáo teremos occasião <strong>de</strong><br />
verificar que uma <strong>da</strong>s suas peiores consequencias P a gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>srnoralisaçáo<br />
que, proveniente <strong>da</strong> <strong>de</strong>sproporção numerica nos sexos dos emigrantes,<br />
não tar<strong>da</strong> geralmente em propagar-se ás populaçóes indigenas.<br />
Por outro lado, o seu caracter ordinariamente temporario inhibe a<br />
socie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena <strong>de</strong> attingir uma certa l~omo~enei<strong>da</strong><strong>de</strong> indicativa <strong>de</strong> progresso<br />
social, e apenas origina agriipamentos ephemeros caracterisados<br />
por uma ficticia anormali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> constituição social.<br />
Nas colonias-fazen<strong>da</strong>s, on<strong>de</strong> se torna indispensavel a introducçáo <strong>da</strong><br />
mão d'obra estrangeira, é conveniente reduzir aos limites do razoavel, O<br />
direito á, repatriação, fazendo a diligencia por fixar <strong>de</strong>finitivamente os emigrados,<br />
cujos <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes eduoados no habito do trabalho remunerado
%?o POLITICA INDIGENA<br />
mas constante, virão a constituir um elemento trabalhado^, livre e labo-<br />
rioso com que as colonias teem diiplamente a lucrar, <strong>de</strong>baixo dos pontos <strong>de</strong><br />
vista economico c social.<br />
Para o progresso (ta obra <strong>da</strong> colonisaqZo 4, pois, ronvenientissimo qiie<br />
as popiilaçúes indigcnas sejam numerosas c concentra<strong>da</strong>s. Mas náo é tiitlo;<br />
se os indigenas se não quizerem entregar a iim trabalho regular e perti-<br />
naz, fornecendo to<strong>da</strong> a mão d'obra necessaria á agricultura, ás obras piibli-<br />
cas e ás industrias, o problema do trabalho subsistirá insoluvel e a colo-<br />
nisação permanecerá estacionaria.<br />
As nações coloniaes teem <strong>de</strong> encarar attentamentc esta questão, pro-<br />
curando aproveitar e <strong>de</strong>senvolver as aptid6es para o trabalho <strong>da</strong>s raças<br />
indigenas.<br />
Occorre, portanto, examinar primeiramente a natureza d'essas apti-<br />
dões, isto 8, o grau <strong>de</strong> activi<strong>da</strong><strong>de</strong> laboriosa <strong>da</strong>s differentes raças que for-<br />
necem a miio d'obra local ou immigra<strong>da</strong>.<br />
Nas popiilaçúes europeias, o habito do trabalho existe inveterado por<br />
uma longa hereditarie<strong>da</strong><strong>de</strong>, c n%o ci mais que a consequencia fatal <strong>da</strong>s miil-<br />
tiplas necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s que acorrentam o homem civilisado.<br />
Nos habitantes <strong>da</strong> Asia, salvo as restricçóes impostas pela indolen-<br />
cia oriental ou pelo regimen <strong>da</strong>s castas, B incontestavel que o tra1)alho<br />
constitue tima pratica constante e generalisa<strong>da</strong>. De resto, as civiliaações<br />
asiaticas, por differentes <strong>da</strong> nossa, não <strong>de</strong>ixam <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolver correlativa-<br />
mente as forças productoras e as necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s humanas.<br />
A raça, ciijas facul<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> trabalho e capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> prodiictora mais<br />
discuti<strong>da</strong>s e contesta<strong>da</strong>s teem sido eni todos os tenipos, é, sem diivi<strong>da</strong>, a<br />
raqa negra<br />
O preto trabalha voliintariamente ou não? E trabalhando vplunta-<br />
riamente ffi-10 pela forma efficaz e permanente que o interesse <strong>da</strong> colonisa-<br />
qáo requer ?<br />
Eis as questóes que teem <strong>da</strong>do motivo a t5o acres controversias e a<br />
tão <strong>de</strong>sencontrados alvitres, que ain<strong>da</strong> lioje a opinião dos publicistas e dos<br />
administradores coloniaes se divi<strong>de</strong> constantemente a seu respeito.<br />
Geralmente as opiniões cahem nos exageros oppostos. Para uns,
TRABALHO INDIGENA 221<br />
o preto livre nunca trabalha, senão impellido pela mais imperiosa necessi-<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong>, e como as necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s dos africanos são em todo o sentido rudimen-<br />
tares, a somma do trabalho produzido para as satisfazer é, na maioria dos<br />
casos, irrisoria.<br />
Alem d'isso, a estabili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> mão d'ol~ra, que é condição imprescin-<br />
divel <strong>da</strong>s exploraç8es coloniaes, torna-se qiiasi impossivel <strong>de</strong> obter com o<br />
regimen do contracto livre que o preto táo facilmente acceita como trans-<br />
gri<strong>de</strong>.<br />
Por outro lado, a fertili<strong>da</strong><strong>de</strong> exuberante <strong>da</strong>s zonas tropicaes, com um<br />
esforço manual qiiasi insignificante, permitte-lhes alcançar com a maior fn-<br />
cili<strong>da</strong><strong>de</strong> o cacho <strong>de</strong> bananas e as paftjna dc amendoim, mapira e mandioca,<br />
necessarias ao sustento, e a d6ae <strong>de</strong> szcrn indispensavel aos batiiques e á<br />
embriagiicz.<br />
Realisado assim o sei1 i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> conforto, para que iria o preto tra-<br />
balhar sem necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>, no3 campos, nas minas, nas fabricas e nos trans-<br />
portes que os brancos exploram 3<br />
1 Negar em absoluto que os pretos trabalham livremente 6 tiio falso,<br />
que os mais acintosos <strong>de</strong>tractores <strong>da</strong>s quali<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> raça negra são força-<br />
dos a reconhecer o contrario, allegando entretanto a nenhuma confiança<br />
que esse trabalho merece, pela sua instabili<strong>da</strong><strong>de</strong>, intermittencias e fraqueza<br />
<strong>de</strong> rendimento.<br />
Oliveira Martins, parti<strong>da</strong>rio <strong>de</strong>clarado do regimen do trabalho indi-<br />
gena obrigatorio nas colonias-fazen<strong>da</strong>s, escreveu o seguinte : a Evi<strong>de</strong>nte-<br />
mente o negro trabalha sem ser necessario cscravisá-10. São marinheiros<br />
o cabin<strong>da</strong> e o kriimano a bordo dos navios <strong>da</strong> carreira <strong>de</strong> Africa; são tra-<br />
balhadores ruraes os milhares <strong>de</strong> cafres que os colonos do Natal empre-<br />
gam nas suas lavouras. Não basta porém affirmar isto C necessario estu-<br />
<strong>da</strong>r as condições em que o negro trabalha. Oa kramanos e os cabin<strong>da</strong>s<br />
servem <strong>de</strong> grumetes, <strong>de</strong> cosinheiros e marinlieiros, o tempo que hasta para<br />
comprarem o numcro <strong>de</strong> peças a que, na irzucan<strong>da</strong> <strong>da</strong>s suas terras, corres-<br />
pon<strong>de</strong>m tres ou quatro mulheres. Regalado ao sol, inaccessivel á febre,<br />
chupando o scii cacliimI,o, o negco consolidoii o seu trabalho. Tem um ca-
222 POLITICA INDIGENA<br />
pital-mulheres que lhe dit o juro sufficiente para viver como gosta, resta-<br />
belecido na patria, indifferente aos esplendores <strong>de</strong> LíverpooI que visitou.<br />
O cafre do Natal vae as lavouras inglezas trabalhar <strong>de</strong> passagem,<br />
para comprar com o trabalho tabaco ou aguar<strong>de</strong>nte ; e regressa ao sertáo<br />
a pastorear os seus rebanhos. Noma<strong>da</strong>, não se fixa nem se domestica. Trn-<br />
balha sim, mas iião por habito, por instincto, com o fito d'lima capitalisa-<br />
cão illimita<strong>da</strong> como o europeu. Trabalha sim, mas aguilhoado pela neces-<br />
si<strong>da</strong><strong>de</strong> immediata: e as necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s do negro são curtas e satisfazem-se<br />
com pouco. Não abandona a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> e a ociosi<strong>da</strong><strong>de</strong>, para elle felizes con-<br />
diçóes <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> selvagem, pelo trabalho fixo, ordinario e constante que é a<br />
dura condição <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> civilisadn.. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .<br />
Depois, se isto não é assim; se o negro trabalha por instincto e habito; se<br />
o negro Q capaz <strong>de</strong> passar <strong>da</strong> condivão <strong>de</strong> pastor B <strong>de</strong> agricoltor, <strong>de</strong> se fixar<br />
na terra; <strong>de</strong> capitalisar in<strong>de</strong>fini<strong>da</strong>mente como o europeu; se o negro Q ci-<br />
<strong>da</strong>dão, é livre, Q portiigiiez - c tudo isto exige o trabalho assalariado -<br />
como os terrenos não teem dono nem limite porque iria o preto enri-<br />
quecer e servir um colono, quando elle em pessoa po<strong>de</strong> plantar, colher e<br />
ven<strong>de</strong>r o seu cafd? A i<strong>de</strong>ia <strong>da</strong> creaqáo <strong>de</strong> fazen<strong>da</strong>s com o trabalho indi-<br />
gena livre e salariado fica embaraça<strong>da</strong> entre as duas pontas d'este dilem-<br />
ma. Ou o preto ~6 trabalha excepcionalmente e não abandona o estado<br />
selvagem, ou B susceptivel <strong>de</strong> se fixar no trabalho agricola. No primeiro<br />
caso, a intermittencia arruinará as plantaçóes; no segundo o negro traba-<br />
lharb para si e não para o fazen<strong>de</strong>iro. )> Este curioso sophisma <strong>de</strong>sfaz-se<br />
facilmente. Em primeiro logar a regiilamentaçáo <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> colonial<br />
incluindo a indigena, invali<strong>da</strong> a hypothese consi<strong>de</strong>ra<strong>da</strong> <strong>da</strong> apropriaçgo<br />
livre e illimita<strong>da</strong>.<br />
Em segundo logar, a elevavão progressiva <strong>da</strong> taxa do imposto é um<br />
meio seguro <strong>de</strong> obrigar indirectamente o indigena, ain<strong>da</strong> quando proprie-<br />
tario, ao trabalho salariado. Por outro lado, civilisados os indigenas, <strong>de</strong>ve<br />
augmentar a proliferi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> raça, cujas geraçóes futuras muito mais nu-<br />
merosas encontrarão os baldios ca<strong>da</strong> vez mais reduzidos, tendo <strong>de</strong> se sujei-<br />
tar á condição economica do salario.<br />
Se o trabalho (: um grilhko inqiiebravel sol<strong>da</strong>do á existencia humana
TRABALHO INDIGENA<br />
pela condição civilisa<strong>da</strong>; se o trabalho E um habito que a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> gera<br />
e a civilisação confirma; se finalmente como caiisa oii como effeito está in-<br />
dissoluvelmente ligado & perfeiqáo do estado social, como se po<strong>de</strong>r& razoa-<br />
velmente exigir que o negro selvagem trabalhe á semelhança do branco<br />
civilisado ?<br />
Não queiramos impôr abruptamente habitos que elles <strong>de</strong>sconhecem,<br />
e procuremos <strong>de</strong>senvolver com vagar e firmeza as facul<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> trabalho<br />
que Ihcs são proprias, sem fazer iiso <strong>de</strong> violencias contraproducente^, e sem<br />
resvalar em fraquezas ou em hesitaçóes imperdoaveis.<br />
A <strong>de</strong>nomina<strong>da</strong> incurnt~~l<br />
pr~guiçn do negro, não .passa d'umrl genera-<br />
lisaçáo falsa e sem fun<strong>da</strong>mento. Os factos todos os dias <strong>de</strong>monstram a labo-<br />
riosi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> nomerosas popiil~çúes africanas.<br />
O explorador francez Emile Gentil compraz-se em elogiar as aptidões<br />
bellicas e trabalhadoras <strong>da</strong>s popiilaç6es do Soldko e do Tchad, citando<br />
especialmente os Ban<strong>da</strong>s e os Man4jias que, <strong>de</strong>pois que a occupação eiiro-<br />
peia garantiu a segurança publica e individual, se teem fixado ao solo,<br />
constituindo optimos e laboriosos agriciiltores.<br />
Ninguem ptjrle alcunhar <strong>de</strong> preguiçosas ou indolentes as tribus que<br />
voluntariamente se <strong>de</strong>dicam ao transporte <strong>de</strong> cargas. Indolentes não são<br />
por certo os lrrumanos, cabin<strong>da</strong>s, <strong>da</strong>homés, etc., que em gran<strong>de</strong> numero<br />
concorrem para o fornecimento <strong>da</strong> mão d'obra necessarirt á colonisciçáo eu-<br />
ropeia. E geralmente conheci<strong>da</strong> a relativa perfeição agricola dos mandin-<br />
gos <strong>da</strong> Senegambia, e dos tuculores do Alto Niger. Os indigenas <strong>da</strong> Costa<br />
do Ouro affluem niimerosamente a to<strong>da</strong>s AS exploraçúes, on<strong>de</strong> seja preciso<br />
o trabalho indigena, e os achantis teem provado excellentemente como<br />
operarios, c como machinistas e empregados do caminho <strong>de</strong> ferro <strong>de</strong><br />
Lagos.<br />
N'uma gran<strong>de</strong> parte <strong>da</strong> Africa, mormente na vastissima bacia hydro-<br />
graphica do Zaire, os negros manifestam pelo trabalho uma reluctancia<br />
accentua<strong>da</strong> quel em gran<strong>de</strong> parte, <strong>de</strong>ve ser consequencia d'aquella regiáo<br />
ter sido o theatro secular <strong>da</strong>s incursóes dos rtrabes e europeus, caçando<br />
escravos e <strong>de</strong>vastando as populaçóes, c resiiltado tambem <strong>da</strong>s mo<strong>de</strong>rnas<br />
praticas <strong>de</strong>shomanas <strong>da</strong>s requisigóes <strong>de</strong> çsrregadores, parca ou nullamente<br />
-.<br />
223
224 POLITICA INDIUENA<br />
retribuidos e alimentados, duraritc o interminavel jorna<strong>de</strong>amento que ]hes<br />
irnpóem.<br />
Na Africa do Sul, os indigenas do Cabo, do Trans~vaal, Natal e Orange<br />
concorrem na sua qiiasi totali<strong>da</strong><strong>de</strong> aos traballios mineiros e agricolas.<br />
Nos districtos <strong>de</strong> Lourenço Marqiics e Goza, e <strong>de</strong> Inliambane é <strong>de</strong><br />
todos conheci<strong>da</strong> a intensa emigração indigena para as minas do Rand.<br />
Vatuas e landins consi<strong>de</strong>ram, porém, o traballio agricola propriamente<br />
dito como <strong>de</strong>sprezivel e só proprio <strong>de</strong> mulheres.<br />
Anteriormente á colonisação europeia apenas as mulheres cultiva-<br />
vam o solo, os homens <strong>de</strong>dicavam-sc principalmente á guerra e á creaqáo<br />
<strong>de</strong> gado que alli 15 muito importante. Paul Reinsch diz que, com a intro-<br />
diicçáo <strong>de</strong> machinas agricolaci e atC com a simples charrua, se consegiiirti<br />
pren<strong>de</strong>r os indigenas á exploraçáo do solo, que <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> representar um<br />
traballio simplesmente msniial para consistir essencialmente na condiicçáo<br />
do gado ou clas machinas.<br />
Os indigenas do centro <strong>de</strong> Moçambiqac - zambezianos - que mais<br />
<strong>de</strong>ti<strong>da</strong>mente conhecemos por longamente havermos permanecido entre elles,<br />
asaim como as popiilàçóes indigenas <strong>da</strong> B. C. A., sáo naturalmente laborio-<br />
sos c n<strong>da</strong>ptaveis ás mais differentes fórmas ile tralallio. l'agaia(lores in-<br />
cançaveis no Zambeze, remadores em todos os portos <strong>de</strong> mar <strong>da</strong> provincia,<br />
marinheiros, chegadores, fogueiras a bordo dos navios <strong>de</strong> guerra e dos<br />
mercantes, operarios <strong>de</strong> officinas navaes <strong>de</strong> ferro e ma<strong>de</strong>ira, carregadores,<br />
macbileiros imcomparaveis, pilotos fiuviaes, serriçaes intelligentes e cni<strong>da</strong>-<br />
dosos, e trabalhadores doceis e voluntarios, os zambezianos constituem<br />
uma <strong>da</strong>s melhores partes <strong>da</strong> populaçáo moçanibiqiiensc.<br />
On<strong>de</strong> quer, porém, que o preto se encontre, e seja qual for a reluctan-<br />
cia pelo traballio que inicialmente <strong>de</strong>monstre, o que parece indiscotivel e<br />
i~veriguado positivamente é que, sendo levado bran<strong>da</strong>mente n um traballio<br />
mo<strong>de</strong>rado e conscienciosamente retribuido, e sendo salvaguar<strong>da</strong><strong>da</strong>s to<strong>da</strong>s as<br />
siias justas aspiraçóes <strong>de</strong> in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ncia e <strong>de</strong> repouso necessario, clle con-<br />
tinuará a forneoer voluntariamente a páo d'obra livre <strong>de</strong> que carecem as<br />
exploraçóes coloniaes.<br />
Ha piibliciptas e administradorerii coloniaes que, conhecendo <strong>da</strong> Africa
TXABALHO INDIGENA 225<br />
apenas as suas populacóes mais laboriosas, são <strong>de</strong>masiatlo promptos em<br />
reclamar parit os pretos um regimen <strong>de</strong> trabalho absolutamente i<strong>de</strong>ntico<br />
ao quc vigora na Europa, náo avaliando sequer o <strong>de</strong>scalabro economico e<br />
o atrazo <strong>de</strong> civilisaçáo que essa medi<strong>da</strong> representaria em muitas colonias.<br />
Certamente a escravidíto, mesmo na reforma attenua<strong>da</strong> <strong>da</strong> servidiio<br />
africana, náo po<strong>de</strong> ser, por forma algiima, restabeleci<strong>da</strong> pelas nações coloniaes,<br />
ciijo primordial titulo <strong>de</strong> gloria é precisamente a libertaçúo dos escravos<br />
e a prohibição do trafico infame <strong>da</strong> escravatura.<br />
O trabalho obrigatorio cujos inconvenientcs estu<strong>da</strong>remos, é tambem<br />
uma violencia escusa<strong>da</strong> que, po<strong>de</strong>ndo offerecer vantagem momentanea para<br />
o progresso rapido <strong>da</strong> expans80 colonial, se reflecte quasi sempre perniciosamente<br />
no futuro <strong>da</strong>s colonias e no adiantamento social <strong>da</strong>s suas populaç6es.<br />
Sendo, porbm, os negros geralmente indolentes, e apenas propensos ao<br />
trabalho indispensnvel á satisfação <strong>da</strong>s suas limita<strong>da</strong>s necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s, 6 necessario<br />
que os colonisadores tenham meios <strong>de</strong> os incitar a trabalhar mais<br />
regular e intensivamente. Es~es processos <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolver a m8o d'obra indigena<br />
po<strong>de</strong>m con<strong>de</strong>nsar-se em dois methodos principaes: directo e indirecto.<br />
No methodo directo estão comprehendidos : o restnbelecime~tto <strong>da</strong> escravi-<br />
&O e o trabnlho obrigatorio; no ~nethodo indirecto : a educaçdo projssional,<br />
o <strong>de</strong>senvolvir~ieizto <strong>da</strong>s necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s, a elevnçflo <strong>da</strong> taxa dos impostos, a exproyriaçdo<br />
<strong>da</strong>s terras, a proRibiç80 <strong>da</strong> vadiagejn e o contracto <strong>de</strong> trabalho livre-<br />
,,lente consentido. Finalmente, quando por quaesquer motivos escasseie<br />
ain<strong>da</strong> a mão d'obra local, torna-se preciso recorrer it importação <strong>de</strong> traba-<br />
lhadores estrangeiros. Estiidnremos siiccessivamente ca<strong>da</strong> um d'estes pro-<br />
cessos, salientando as suas quali<strong>da</strong><strong>de</strong>s c <strong>de</strong>feitos, e investigando os resul-<br />
tados e a forma <strong>da</strong> siia applicaçáo em differentes colonias.
226<br />
- POLITICA INDIGFENA<br />
Mão d'obra local<br />
Methodos directos<br />
Escravidão. - B escravidiio estabeleceu.se no mundo quando as ar-<br />
tes <strong>da</strong> producçSio se <strong>de</strong>senvolveram, começando a offerecer á humani<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
mais do que o stricto necessario á existencia. Emquanto o exce<strong>de</strong>nte <strong>da</strong><br />
superflui<strong>da</strong><strong>de</strong> não existiu, ou se conservou muito fraco, a escravidão náo<br />
appareceu nem teve razão <strong>de</strong> ser, visto não correspon<strong>de</strong>r a nenhum inte-<br />
resse economico.<br />
Para escravisar o seu semelhante, foi preciso e bastou que o homem<br />
primitivo reconhecesse o interesse retirado do apropriamento dos lucros do<br />
trabalho alheio. Na sua essencia moral, a escravidiio é um attentado revol-<br />
tante contra a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> humana, na sua essencia juridica, não passa d'uma<br />
espoliação e roubo permanentes.<br />
Esta iniqua violaçáo do direito <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> que o homem exerce<br />
sobre si proprio e sobre o rendimento do seu trabalho, não foi, comtudo,<br />
aem uniforme, nem universal. Se se analysar o seu <strong>de</strong>senvolvirnento entre<br />
os povos antigos, reconhece-se que a siia importancia era tanto maior quanto<br />
mais meridional fosse a sitnação geographica dos povos consi<strong>de</strong>rados. Nas<br />
naçóes mais septentrionaes ti escravidão ou não existia, ou apresentava-se<br />
reduzi<strong>da</strong> e sob uma fcirma tittenua<strong>da</strong>. A causa d'este phenomeno social era<br />
principalmente economica.<br />
Quanto mais para o sul, menores eram as <strong>de</strong>spczas <strong>de</strong> sustento, ves-<br />
tiiario e abrigo dos escravos e, em geral, maior era a fertili<strong>da</strong><strong>de</strong> do solo, o<br />
que tudo concorria para augmentar sensivelmente o rendimento do traha-<br />
lho escravo. Por outro lado, as raqas do Norte mais vigorosas e aguerri<strong>da</strong>s<br />
subrnettiam-se menos commo<strong>da</strong>mente ao jugo <strong>da</strong> escravidiio.
REGIMEN DA MÃO D'OHRB LOCAL<br />
--<br />
Assim, na epoclia em que a escravidão campeiava em to<strong>da</strong> a bacia<br />
mediterranea e em nnmeroeas naç6es do sul, constitnia um facto excepcio-<br />
nal na Germania e em outras regióes (10 norte <strong>da</strong> Europa.<br />
A escravidáo ngo teve i<strong>de</strong>ntica origem em todos os povos <strong>da</strong> anti-<br />
gui<strong>da</strong><strong>de</strong> ; milito frequentemente resultava <strong>da</strong> sobreposição violenta <strong>de</strong> duas<br />
raças. Os Ilotas <strong>da</strong> Lace<strong>de</strong>mvnia e os P1x1nestas <strong>da</strong> Thessalia eram popii-<br />
laçGeu autochtones que a conquista reduziu á escravidáo.<br />
Em Roma só começou a clesenvolver-se quatro ou cinco seculos <strong>de</strong>pois<br />
<strong>da</strong> fi~n<strong>da</strong>çao <strong>da</strong> ci<strong>da</strong><strong>de</strong>, mas attingiu um incremento extraordinario com as<br />
gran<strong>de</strong>s guerras, em que se fizeram centenas <strong>de</strong> milhares <strong>de</strong> prisioneiros que<br />
nunca podiam ser trocados o17 resgatados, e qne eram sempre reduzidos Q<br />
condiçgo <strong>de</strong> escravos. Em to<strong>da</strong> a Grecia a escravidáo <strong>de</strong>senvolveu-se tam-<br />
bem d'uma maneira extraordiiiaria. Diz Hoeck que em Athenas nem o mais<br />
pobre ci<strong>da</strong>dbo <strong>da</strong> republica <strong>de</strong>ixava <strong>de</strong> possuir pelo menos um escravo.<br />
Os paizes que principalmente forneceram <strong>de</strong> escravos a Grecia e Roma,<br />
até á conquista <strong>da</strong>s Gallias por Julio Cexar, foram a Thracia, a Scythia,<br />
a Dacia, a Getia, R Phrygia, o Ponto, isto 6, o sul <strong>da</strong> Europa Occi<strong>de</strong>ntal<br />
e uma parte <strong>da</strong> Asia Menor. Os gran<strong>de</strong>s mercados eram o emporium <strong>de</strong><br />
Tanais, Epheso, Sidé, Samos, Athenas e Delos. A condição dos escravos<br />
na antigui<strong>da</strong><strong>de</strong>, E geralmente conheci<strong>da</strong> ; pobres parias tratados peior que<br />
animaes <strong>de</strong> carga, e ciija vi<strong>da</strong>, á discreção dos seus proprietarios, era um<br />
tormento constante.<br />
Ninguem era forçado a cumprir um contracto celebrado com um es-<br />
cravo; a lei romana consi<strong>de</strong>rava este, como parte contractante, non tam<br />
ailis qzinm ~zullzis.<br />
S6 com o imperio í: que se crearam algumas leis <strong>de</strong> protecção tão<br />
limita<strong>da</strong>s e elasticas, que se po<strong>de</strong>m comparar ás medi<strong>da</strong>s hoje adopta<strong>da</strong>s<br />
pelas socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s protectoras dos animaes.<br />
A escravidgo subsistira em to<strong>da</strong> a Europa durante o E<strong>da</strong><strong>de</strong> Media e<br />
uma parte dos tempos mo<strong>de</strong>rnos. As causas do seu <strong>de</strong>sapparecimento fo-<br />
ram economicas e religiosas, mas mais economicas do que religiosas. O<br />
empobrecimento do solo esgotado pelo trabalho intensivo dos escravos,<br />
a insegurança <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> e portanto do capital-escravo, a enor-<br />
Y<br />
227
2213 POLITICA INDIGELVII<br />
me concorrencia <strong>de</strong> trabalho livre foram os factores economicos que mais<br />
provocaram a <strong>de</strong>generescencia <strong>da</strong> instituição.<br />
Quanto á justiça e fraterni<strong>da</strong><strong>de</strong> liuniana, prCga<strong>da</strong>s pela mais pura<br />
moral christã, não tiveram, <strong>de</strong> começo, influencia notavel ria diminuiçfio do<br />
trabalho escravo, apesar do reconhecido fanatismo religioso d'aquellas eras.<br />
E' que a egreja tambem niio foi muito lesta em con<strong>de</strong>mnar a insti-<br />
tuição, foi necessario que a lei econornica lavrasse irrefragavelmente o seli<br />
<strong>de</strong>scredito, para que o papa Alexandre Iir pnblicasse no seculo XII a bnlla<br />
<strong>da</strong> emancipa@.o geral dos escravos qne, segundo diz A<strong>da</strong>m Smith, mais pa-<br />
rece ter sido lima simples exhortaçáo do que uma lei, cujo stricto cumprimento<br />
se exigisse a todos os christãos, pois em Inglaterra e França, por<br />
exemplo, ain<strong>da</strong> nos secolos XV~I e xvrrr se encontriivam bastantes vestigios<br />
<strong>de</strong> escravidão.<br />
Com os <strong>de</strong>scobrimentos e conquistas em Africa e na America, viramse<br />
as nações coloniaes a braços com o problema do aprovisionamento <strong>da</strong><br />
mão d'obra necessaria á valorisação do solo colonial.<br />
A difficul<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> aeclirnatar a raça eiiropeia entre os tropicos, a rari<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
<strong>da</strong> m&o d'obra na America, cujos aborigenes se revelavam menos<br />
doceis, submissos e resistentes ao trabalho que os negros, fizeram nascer a<br />
tentação <strong>de</strong> ascravisar os autochtoncs, e <strong>de</strong> transportar para as roças ame-<br />
ricanas escravos africanos. (')<br />
A immensi<strong>da</strong><strong>de</strong> dos jazigos mineiros <strong>de</strong>scobertos e dos thesouros agri-<br />
colas por explorar, e a escassez e incerteza <strong>da</strong> mão d'obra local, imprimi-<br />
ram ao trafico humano o enorme <strong>de</strong>senvolvimento que todos conhecem.<br />
A escravidRo nas colonias assumiu um caracter diverso do que tivera<br />
na antigui<strong>da</strong><strong>de</strong> ; os escravos ain<strong>da</strong> estavam - se B possivel - mais affasta-<br />
dos <strong>da</strong> normali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> condição social do homem, não chegavam a ser uma<br />
classe social sem garantias reconheci<strong>da</strong>s, i150 passavam <strong>de</strong> machinas <strong>de</strong><br />
(1) O trafico <strong>da</strong> escravatiira foi um dos processos <strong>de</strong> obler trabalho importa-<br />
do, mas 4 estu<strong>da</strong>do n'esta parte do iiosso trabalho referente 5 mão d'obra local,<br />
porque a sua Iiistoria pren<strong>de</strong>-se intimamente 6 critica <strong>da</strong> escravidão.
trabalhar, adquiri<strong>da</strong>s e utilisa<strong>da</strong>s como quaesquer outras machinas ou utensilios<br />
agricolas e induertriaes.<br />
Se o estado <strong>da</strong> escravidão era em muitas colonias lenimentado pela<br />
benevolencia dos plantadores e pela relativa facili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> existencial tudo<br />
quanto se escreva sobre os Iiorrores do trafico será ins~ifficiente para <strong>da</strong>r<br />
uma palli<strong>da</strong> i<strong>de</strong>ia <strong>da</strong> cruel<strong>da</strong><strong>de</strong> inaudita dos negreiros, e do martyrio cruciante<br />
dos escravos. Emqtianto a escravatura foi livre, ain<strong>da</strong> o transporte<br />
maritimo era supportavcl, se bem que reveuticlo <strong>de</strong> durezas escusa<strong>da</strong>s e, por<br />
vezes, <strong>de</strong> ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iras selvngcrias. O peior, porí.m, foi qiiando os fardos <strong>de</strong><br />
ebano passaram ri cathegoria <strong>de</strong> contrabando. Durante o seculo xv~i foi<br />
aos pliilosoplios c economistas, como Tiirgot, Montesqiiieu, Reynal e Conclorcet,<br />
que coul)e a honra <strong>de</strong> levantar a apinigo publica contra a pratica<br />
<strong>de</strong>shumana e anti-economica <strong>da</strong> escravatura.<br />
Em Inglaterrn a campanha foi mais religiosa do que scientifiea, dirigi<strong>da</strong><br />
por varias seitas protestantes di~si<strong>de</strong>ntes, como a dos qrcakers. E'<br />
<strong>de</strong> justiça accentnar qne, sendo nas colonias americanas <strong>da</strong> Inglaterra que<br />
mais barbaramente se tratavam os negros, 6 tambem Hquella naçlo que<br />
pertence a priori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> campanha humanitaria do anti-esclavagismo.<br />
Na prohibiçáo do trafico a chronologia foi a seguinte.<br />
O Estado <strong>de</strong> Virginiu proliihia a escravatura em 1776, e d'esta <strong>da</strong>ta<br />
at8 1782, mais onze Estados americanos o imitaram. Esta prohibição foi<br />
revoga<strong>da</strong> para a Carolina do Sul, que <strong>de</strong> 1803 a 1808, ain<strong>da</strong> importoti<br />
cerca <strong>de</strong> 20:000 escravos. A França aboliu o trafico durante a primeira<br />
revoluçSio, o impcrio restabeleceu-o, para vir a ser completamente abolido<br />
alguns annos <strong>de</strong>poi:. Em Inglaterra o trafico foi prohibido em 1807, graças<br />
aos esforços philantropicos <strong>de</strong> %'ilberforcc, Clarkson, Grenville Sharp e<br />
Charles Fox, e á imperiosa corrente <strong>da</strong> opiniiio publica abolicionista.<br />
Em 19 <strong>de</strong> fevereiro <strong>de</strong> 1810 foi assignado no Rio <strong>de</strong> Janeiro um<br />
tratado luso-britaiinico em que se reconhecia a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> extinguir o<br />
trafico Iiumano. A escraridiio tinha sido aboli<strong>da</strong> em Portugal pelos alvarhs<br />
<strong>de</strong> 19 <strong>de</strong> setembro <strong>de</strong> 1761, e <strong>de</strong> 16 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 1773. A aboliçtio do<br />
trafico e a sua repressáo foram <strong>de</strong>finitivamente estabeleci<strong>da</strong>s nos accordos<br />
dc 22 <strong>de</strong> janeiro e dc 8 <strong>de</strong> junho <strong>de</strong> 1815, e <strong>de</strong> 28 <strong>de</strong> J'ullio <strong>de</strong> 1817, cele-
630<br />
I'<br />
~OLITICA INDIGENA (I<br />
brados entre Portugal e a Inglaterra, e em varios outros tratados que se<br />
Ilies seguiram, negociados entre a Inglaterra e as naçóes europeias mais<br />
importantes.<br />
Nos cruteiros maritimos para captura dos navios negreiros inaugurados<br />
em 1819 - a Inglaterra insistiu sempre porque estes fossem assimilados<br />
aos piratas e submettidos ao direito <strong>de</strong> visita, ain<strong>da</strong> quando arvorassem<br />
ban<strong>de</strong>ira estrangeira. Esta disposiçáo que, por pouco, náo originou<br />
alguns conliictos intcrnacionaes, náo foi :~bsoliit,arnente reconheci<strong>da</strong> na respectiva<br />
convançáo franco-ingleza. Os resultados <strong>da</strong> proliibiçáo do trafico<br />
náo ter sido precedi<strong>da</strong> <strong>da</strong> aboliçiio <strong>da</strong> escravidáo em todos os paizes <strong>de</strong> <strong>de</strong>stino,<br />
foram ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iramente lastimosos. Em primeiro logar, continuando<br />
a procura do assucar nos mercados europeus, <strong>de</strong>u-se uma alta enorme no<br />
assucar <strong>da</strong>s colonias em qiie se abolira a escravidáo, e consequentemente<br />
um <strong>de</strong>senvolvimento assombroso <strong>da</strong> industria assucareira em Cuba e no<br />
Brazil, on<strong>de</strong> se continuava a utilisar o trabalho escravo.<br />
Isto veio a produzir indirectamente a <strong>de</strong>rivar,áo <strong>de</strong> todo o commercio<br />
<strong>de</strong> carne humana para os portos d'aquellas duas colonias, com a aggravante<br />
dos cruzeiros <strong>de</strong> repressão terem estabelecido para os negreiros uma ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira<br />
loteria em que se ganharam quantias fabulosas.<br />
Como os riscos corridos eram gran<strong>de</strong>s, e sempre havia uma importante<br />
quebra na mercadoria, o preço dos escravos augmentou prodigiosamente.<br />
Mau não é tudo, não sómente a prohibiçáo do trafico e as medi<strong>da</strong>s<br />
toma<strong>da</strong>s para o impedir náo surtiram o <strong>de</strong>sejado effeito, mas ain<strong>da</strong> por<br />
cima, tiveram como resultado essencial o aggravatnento <strong>da</strong>s torturas dos<br />
pobres escravos transportados. Antes <strong>da</strong> prohibiçáo o principal interesse<br />
dos negreiros era que to<strong>da</strong> a mercadoria chegasse em bom estado ao seu<br />
<strong>de</strong>stino.<br />
Mas, apenas as leis repressivas foram postas em vigor, <strong>de</strong>sappareceram,<br />
como por encanto, to<strong>da</strong>s as precauçóes que anteriormente se tomavam<br />
para proporcionar um certo bem estar aos transportados.<br />
Os negreiros só tinham uma preoccupaçáo : escapar aos cruzeiros.<br />
N'esse intuito reduziam ao minimo os espaços <strong>de</strong>stinados a comportarem<br />
a carregaçáo humana, e e~lilarcavam apenas as quanti<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> viveres e
<strong>de</strong> agua, strictamente necessarias para impedir que os negros morressem <strong>de</strong><br />
fome ou <strong>de</strong> se<strong>de</strong>. Oliveira Martins, na sua prosa colori<strong>da</strong>, <strong>de</strong>screve as<br />
barbari<strong>da</strong><strong>de</strong>s qiie se commettiam nos segiiintes termos. NOS cegos instin-<br />
ctos do lucro apagavam to<strong>da</strong>s as noyócs <strong>da</strong> Iiiim~ni<strong>da</strong><strong>de</strong> mais elementar, e<br />
fazia-se nos negros o que não B licito fazer-se a nenhuma especie <strong>de</strong> gado.<br />
O negreiro tornou-se o typo por excellencia, feroz, bravo, em que<br />
parecia ter-se apagado a noqáo dos instinctos mais inherentes & natureza<br />
do homem culto. Um navio <strong>de</strong> escravos era um espectaculo asqueroso e<br />
lancinante.<br />
Amontoa<strong>da</strong> no poráo, quando o navio jogava batido pelo temporal, a<br />
massa <strong>de</strong> corpos negros agitava-se como iim formigueiro <strong>de</strong> homens, para<br />
beber avi<strong>da</strong>mente um pouco d'essc ar lugubre, que se escoava pela escoti-<br />
lha gra<strong>de</strong>a<strong>da</strong> <strong>de</strong> ferro. Havia lá no seio do navio balouçado pelo mar, luctas<br />
ferozes, gritos vivos <strong>de</strong> colera e <strong>de</strong>sespero. Os que a sorte favorecia n'esse<br />
on<strong>de</strong>ar <strong>de</strong> c:trne viva e negra, aferravam-se á luz e rolhavam a estreita<br />
nesga do ceu.<br />
Na obscuri<strong>da</strong><strong>de</strong> do antro, os infelizes promiscuamente arrimados a<br />
monte, ou cahiarn inanimes n'um torpor lethal, ou mordiam-se <strong>de</strong>sespera-<br />
dos e cheios <strong>de</strong> furias. Estrangulavam-se, esmagavam-se: a um sahiam-lhe<br />
do ventre as entranhas, a outro quebravam-se-lhe os membros nos choques<br />
d'essas obscuras batalhas. E a massa humana, cujo rumor selvagem sahia<br />
pela escotilha aberta, revolvia-se no seu antro afoga<strong>da</strong> em lagri'mas e em<br />
immundicie.<br />
Quando o navio chegavn ao porto do <strong>de</strong>stino - uma praia <strong>de</strong>serta e<br />
afasta<strong>da</strong> - o carregamento <strong>de</strong>sembarcava ; e á liiz clara do sol dos tropi-<br />
cos apparecin uma coliimna <strong>de</strong> esqueletos cheios <strong>de</strong> pustulas, com o ventre<br />
protuberante, as rotulas chaga<strong>da</strong>s, n pelle rasga<strong>da</strong>, comidos dos I)ichos, com<br />
o ar parvo e esgazeiado dos idiotas.<br />
Muitos náo se tinham cle pE ; tropecararn, cahiam C eram levactos aos<br />
hombros como fardos.<br />
Despeja<strong>da</strong> a carga na praia, entregues os conhecinlentos <strong>da</strong>s peças-<strong>da</strong>-<br />
índio ao caixciro do negreiro, a fiinebre proci~siio partia a internar-se nas<br />
moitas <strong>da</strong> costa, para d'ahi começarem as percgrinaçóes sertanejas ; e o
ZíIu<br />
--<br />
POLITICA INDIGENA<br />
capitão voltando a bordo, a limpar o porão achava os restos, a quebra, <strong>da</strong><br />
clarga que trouxera: havia por vezes cincoenta e mais ca<strong>da</strong>veres sobre<br />
escravos. * Se o estado <strong>de</strong> escravidão não repugnasse, por si<br />
sbl B mo<strong>de</strong>rna consciencia occi<strong>de</strong>ntal, bastaria a recor<strong>da</strong>ção dos barbaros<br />
Iiorrores <strong>da</strong> escravatura, para immediatamente con<strong>de</strong>mnar to<strong>da</strong> e qualqiier<br />
tentativa, inais ou menos disfarça<strong>da</strong>, para o seu restabelecimento.<br />
Alguns colonos, por meio <strong>de</strong> circumloquios habcis, chegam ao extre-<br />
mo <strong>de</strong> qurtsi <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>rem a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> escravisar o trabalho indigena<br />
para salvar algumas industrias coloniaes.<br />
Aspe-Fleurimont, citado por T,eroy Beaulieu e por Paul Reinsch, na<br />
sua apologia do trabalho indigcna obrigatorio, <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> a i<strong>de</strong>ia d'um estado<br />
social intermediario para os indigenas, que <strong>de</strong>ve prece<strong>de</strong>r a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
trabalho, e que correspon<strong>de</strong> afinal a tima escravidão mascara<strong>da</strong>.<br />
De resto, a escravidão domestica, tal como ella é pratica<strong>da</strong> em Africa<br />
nas socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s indigenas on<strong>de</strong> perdura, B singularmente mais suave do que<br />
a que outr'dfa impunham os plantadores brancos, e a sua conserraç50 tem-<br />
poraria 6 mesmo <strong>de</strong>fensavel <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> certos limites.<br />
A eschvidáo domest.ica em que o escravo faz parte, por assim dizer,<br />
<strong>da</strong> familia, collabora nos trabalhos domesticos, e apenas está separado dos<br />
homens livres por certas differenças <strong>de</strong> casta ou <strong>de</strong> hierarchia social, tem<br />
encontrado muitos <strong>de</strong>fensores em diversos meios coloniaes. Na Africa Oc-<br />
ci<strong>de</strong>ntal a escravidão domestica differe essencialmente <strong>da</strong> i<strong>de</strong>ia que em ge-<br />
ral na Europa se forma d'essa instituição.<br />
O escravo, longe <strong>de</strong> ser um <strong>de</strong>~classificado, não passa d'um membro<br />
<strong>da</strong> communi<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena, a que alguns direitos foram cerceados. Po<strong>de</strong><br />
at8 enriquecer, ser proprietario <strong>de</strong> outros escravos, e chegar a ser regulo,<br />
a cuja auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> se submettcm todos os homens livres, incluindo porven-<br />
tura o seu proprio dono. As vezes a servidlio africana limita-se ao paga-<br />
mento d'uma certa quantia, ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro foro humano. Outras vezes, como<br />
acontece em Zanzibar, os escravos negros qiiasi se não aproveitam <strong>da</strong> li-<br />
ber<strong>da</strong><strong>de</strong> que lhes 6 faculta<strong>da</strong>, preferindo continuar na servidão mo<strong>de</strong>ra<strong>da</strong><br />
a que se habituaram. Por <strong>de</strong>creto do sultanato <strong>de</strong> Zanzibar, todo o escra-
~o po<strong>de</strong> sollicitar a libertação, dirigindo-se por simples pedido ao tribunal<br />
dos escravos - aurt of slavery -. (I)<br />
0s escravos vivem em Zanzibar alojados gratuitamente em torno <strong>da</strong><br />
habitaçuo do proprietario que os sustenta, trata benevolamente, e apenas<br />
exige tres ou qiiatro dias <strong>de</strong> trabalho por semana. Muitos dos que recla-<br />
mam a liber<strong>da</strong><strong>de</strong>, ou se convertem em vndios ou, ce<strong>de</strong>ndo, ao <strong>de</strong>saponta-<br />
mento <strong>de</strong> terem <strong>de</strong> trabalhar muito mais arduamente para satisfazerem as<br />
suas necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s, recorrem novamente ao tribunal, irnpetrando a graça<br />
<strong>de</strong> serem reintegrados na sua condiçáo anterior. A completa abolição d'esta<br />
especie <strong>de</strong> escravidáo <strong>de</strong>ve ser lentamente obti<strong>da</strong>, com a modificação <strong>da</strong>s<br />
condiçúes economicas <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena.<br />
Na costa oriental do continente africano, diz Paul Reinscb, que a<br />
<strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncia <strong>da</strong>s plantaq6es arabes, motiva<strong>da</strong> pela concentração dos indige-<br />
nas nas ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s, e pelo parcellamento <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> rustica, <strong>de</strong>ve concor-<br />
rer para a <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncia <strong>da</strong> escravidh; na Africa Central e Occi<strong>de</strong>ntal, o au-<br />
gmento <strong>da</strong>s opportuni<strong>da</strong><strong>de</strong>s, para os indigenas, <strong>de</strong> ganharem e capitalisarem<br />
riqueza, está egualmente ten<strong>de</strong>ndo para extinguir o trabalho escravo na<br />
socie<strong>da</strong><strong>de</strong> nativa.<br />
A necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> operar lentamente esta evoluçáo é; reconheci<strong>da</strong> pe-<br />
los proprios inglezes qiie, alias, t%o promptos sáo em alcunhar <strong>de</strong> escrava-<br />
turistas as colonisaçúes que invrjam. Ain<strong>da</strong> náo ha muitos mezee o Titnes<br />
publicava um artigo do bispo <strong>de</strong> Ugands, reverendo A. Tucker, do qual<br />
extractamos os seguintes periodos. aNo momento em que se discute apai-<br />
xona<strong>da</strong>mente em Inglaterra a questão <strong>de</strong> saber, se a condiçáo dos trabalba-<br />
dores chinezes <strong>da</strong> Africa do sul constitiie, ou não, estado <strong>de</strong> escravidão,<br />
po<strong>de</strong> ser iitil indicar aos interessados que: se o que procuram, são exem-<br />
plos <strong>de</strong> escravidão medra<strong>da</strong> á sombra do pavilhão britannico, encontra-los-<br />
hão, sob uma forma caracteristica e indiscutivel, na Africa Oriental Ingleza.<br />
Em Iüombaça, Lamu e Melin<strong>de</strong>, e n'um raio <strong>de</strong> <strong>de</strong>z milhas em redor<br />
d'estas ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s, a escravidgo é ain<strong>da</strong> uma instituição legal. Supponho que,<br />
(1) Paiil Reinsch - O. C.tam
234 POLITICA INDIGENA<br />
por muito dura que seja a condição dos trabalhadores chinezes do Rand, B<br />
impossivel a um patrão dizer <strong>de</strong> um ciili qualquer - « Este homem é proprie<strong>da</strong>dc<br />
minha » -Na Africa Oriental Ingleza é isso uma coisa corrente. Níio<br />
sómente milhares <strong>de</strong> indigenas cle ambos os sexos são proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> exclusiva<br />
dos seus donos, arabes ou suayles, nas esta proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> é reconheci<strong>da</strong><br />
e stclvaguartladn pelo gooerno l~ritnn,nico. n Perante um testemunlio tão sin-<br />
cero e auctorisado, seria interessante investigar se as Ahorigenes Pro-<br />
tection Societies e os seus apanignados Nevinson e Companhia, terão <strong>de</strong>cre-<br />
tado alguma intempes tiva boycottagc dos productos coloniaes <strong>da</strong> Ugan<strong>da</strong> . . . . . .<br />
Duvi<strong>da</strong>mos sinceramente, o humanitarismo d'esses pseiido-philantropos B<br />
geralmente aconsclhado para zcso externo e só se move por interesse proprio.<br />
De resto, o procedimento citado em na<strong>da</strong> <strong>de</strong>slustra os sentimentos<br />
nobres <strong>da</strong> nação ingleza, e apenas symptomatisa um fito intelligente <strong>de</strong> po-<br />
litica e administragáo indigena. Comtudo, nunca é bom esquecer que essa<br />
instituição, por muito suavisa<strong>da</strong> que seja, <strong>de</strong>ixa sempre ao dono o direito<br />
<strong>de</strong> dispor a seu bel-prazer dos escravos, fornecendo aos colonos a maravi-<br />
lhosa tentação <strong>de</strong> contractar a máo d'obra <strong>de</strong> que carecem, não directa-<br />
mente com os trabalhadores, mas com os seus proprietarios, que n'elles<br />
man<strong>da</strong>m e por elles respon<strong>de</strong>m.<br />
E' por isso que ha sempre conveniencia etn provocar, mesmo artifi-<br />
cialmente, o <strong>de</strong>sapparecimento d'essa instituiçáo que repugna á conscieiicia<br />
geral. Uma coisa, pordm, E tolerar a limita<strong>da</strong> servidão domestica na socie-<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena, e outra seria restabclccer a escravatura.<br />
Se moralmente a escravatura é uma monstruosi<strong>da</strong><strong>de</strong> que <strong>de</strong>shonra-<br />
ria a nação mo<strong>de</strong>rna que a adoptasse nas suas colonias, economicamente Q<br />
sempre um erro, ain<strong>da</strong> quando acarrete um bem momentaneo e um pro-<br />
gresso rapido.<br />
Examinemos qnaes foram, em todos os tempos, os inconvenientes <strong>da</strong><br />
escravisaçáo do trabalho. Em primeiro logar o rendimento do trabalho livre<br />
é sempre superior ao trabalho forçado, mesmo quando este importa remu-<br />
neraçáo. Evi<strong>de</strong>iitemente a esperança do lucro siiccessivamente superior d um<br />
iiicentivo muito iiinis podcroso <strong>de</strong> que o medo ao c;istigo, ou O oclio H hiimi-<br />
lhaqão. A escraviiliio, sob o ponto <strong>de</strong> vista cconomico, trouxe as mais <strong>de</strong>le-
REGIKFIN DA MKO D'ORRA LOCAL 235<br />
terias conseqiiencias 6s velhas socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s. Em Roma, a concorrencia dlestas<br />
macliinas vivas ac:il)oii por arriiiriar os pequenos agricultores e operarios<br />
livres. A guerra dizimava a plebe livre sujeita ao serviço militar, e pou-<br />
pava os escravos que se mnltiplicuvam tranquillamente, isentos do tributo<br />
<strong>de</strong> sangue.<br />
AlCm d'isso, o patriciado tililia ain<strong>da</strong> por si a vantagem do capital que<br />
lhe permittia as exploruc;6es agricolas e indiistriaes em larga escala, em<br />
que o trabalho escravo podia competir victoriosrtmente com o trabalho livre<br />
conuummando a siia completa riiina. Se a concorrencia economica dos es-<br />
cravos foi funesta aos tra1)alhadores livres, as proprias necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s d'essa<br />
lucta contribuirarn, em coinpensaçáo, para melliorar a condiçiio dos escra-<br />
vos. h experiencia. ~risinou aos proprietarios que a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> d'um pecu-<br />
lio e a esperanya <strong>da</strong> libertaçáo eram cstimulos bem mais energicos, do que<br />
as bastona<strong>da</strong>s e os maus tratos.<br />
O escravo que se libertava, pagava com o preço do resgate a maior<br />
parte <strong>da</strong>s <strong>de</strong>spezas que fizera <strong>de</strong>sembolsar, e trabalhando com mais afinco<br />
e boa vonta<strong>de</strong> emqiianto escravo, ficava ain<strong>da</strong> <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> liberto n'uma certa<br />
<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ncia que pouco o molestava e que, por vezes, era <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> utili<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
para os proprietarios.<br />
Nos campos, as intensivas exploraçóes agricolas - lat$tindia - acaba-<br />
ram por esgotar o solo, o que mais tar<strong>de</strong> impôz a sua divisão pela pequena<br />
proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
Em geral preten<strong>de</strong>-se justificar economicamente a escravidáo, alle-<br />
!gando que a insufficiencia inicial dos meios <strong>de</strong> producçáo a tornou indispen-<br />
savel ás socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s primitivas. Esta maneira <strong>de</strong> vêr é evi<strong>de</strong>ntemente erra<strong>da</strong>,<br />
porque a escravidáo foi consequencia e náo causa, dos primeiros progressos<br />
<strong>da</strong>s artes productoras. Que interesse podia haver em possuir escravos,<br />
quando o traballio individual apenas supprisse á subsistencid indispensavel,<br />
náo produzindo superflui<strong>da</strong><strong>de</strong>s a outrem aproveitaveis ?<br />
A escritvidáo, longe <strong>de</strong> antece<strong>de</strong>r o progresso <strong>da</strong> producçáo, é simul-<br />
taneamente uma conaequencia economica d'esse progresso e uma consequen-<br />
historica <strong>da</strong> expansuo militar <strong>de</strong> certas nacionali<strong>da</strong><strong>de</strong>s. Por outro lado,<br />
Historia <strong>de</strong>monstra-nos que a escriividáo fez Sempre estacionar as for-
23'3 POLITICA INDIGENA<br />
mas <strong>de</strong> producçáo, que só comepram a progredir com o ~leli <strong>de</strong>sappareci-<br />
mento.<br />
A historia <strong>da</strong> Europa mo<strong>de</strong>rna fornece-nos <strong>da</strong>dos precisos para se<br />
po<strong>de</strong>r ajuizar do rendimento <strong>da</strong>s culturas, qnrindo exerci<strong>da</strong>s por escravos ou<br />
por homens livres. Storcli, n'iim commcntario A<strong>da</strong>m Srnith, cita alguns<br />
casos interessantes. O con<strong>de</strong> <strong>de</strong> Bernsdorf, quando libertou os seus servos,<br />
elaborou tabellas do rendimento <strong>da</strong>s suas terras antes e <strong>de</strong>pois <strong>da</strong> cmancipayão,<br />
obtendo o seguinte resiiltaclo. Antcs <strong>da</strong> libertapgo dos escravos :L<br />
colheita <strong>de</strong>ra: para o centeio 3 grãos, para a ceva<strong>da</strong> i, e para n aveia 2 e<br />
P/,. Depois d'essa epocha a terra passou a ren<strong>de</strong>r: em centeio 8 grãos e '/,,<br />
em ceva<strong>da</strong> 9 griios e '1, e em aveia 8 grGos. O rendimento aiinnal <strong>da</strong> pro-<br />
prie<strong>da</strong><strong>de</strong> augmentoii <strong>de</strong> 17:6398 rix<strong>da</strong>lers.<br />
Em 1765, os dominios do rei <strong>da</strong> Dinamarca em Holstein foram divi-<br />
didos em pequenas proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>s e vendidos, ou aos servos libertos, ou a<br />
outros particulares. No espaço <strong>de</strong> vinte e dois annos at6 1787, tinham-se<br />
por esta forma vendido cincoenta e dois dominios, on<strong>de</strong> a servidão fôra<br />
aboli<strong>da</strong>; essa ven<strong>da</strong> ren<strong>de</strong>ra á coroa um capital <strong>de</strong> 596:253 rix<strong>da</strong>lers e<br />
esta somma empresta<strong>da</strong> sobre as terras dos pequenos proprietarios <strong>da</strong>va<br />
um juro <strong>de</strong> 5 "1,. O rendimento que o rei primitivamente tirava d'esses do-<br />
minios era <strong>de</strong> 87346 rix<strong>da</strong>lers, e em 1787 os seus novos proprietarios re-<br />
colhiam o rendimento liquido <strong>de</strong> 106.039 rix<strong>da</strong>lers, aos quaes era precizo<br />
ain<strong>da</strong> juntar os juros e amortisaçáo dos preços porque haviam comprado<br />
as terras, que montavam annualmente a 12.619 rix<strong>da</strong>lers. Estes exemplos<br />
$ao bem frisantes para mostrar que a agricultura não se aperfeiçoa quando<br />
n'ella se empregam escravos ou servos. Se a escravidão é um obstaculo<br />
para o progresso <strong>da</strong> agricultura, com mais forte razão o <strong>de</strong>ve ser para o<br />
adiantamento <strong>da</strong>s maniifacturas, pois, como se sabe, as artes mechanicas<br />
nascem insensivelmente a par dos traberlhos riisticos, e separam-se d'elles<br />
quando attingem um certo grau <strong>de</strong> aperfeiçoamento.<br />
Ora a escrnvidão que amarra eternamente o escravo á gleba, e im-<br />
pe<strong>de</strong> a divisáo do trabalho, con<strong>de</strong>mna semprc as artes manufactiireiras a<br />
estanciarem in<strong>de</strong>fini<strong>da</strong>mente na sua phasc primitiva.<br />
Resta finalmente averiguar se a escravatiira <strong>de</strong> algum modo coiicor-
eu para o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>da</strong> riqueza <strong>da</strong>s colonias mo<strong>de</strong>rnas, Se olhar-<br />
mos a questão sob o aspecto restricto do interesse economico do momento,<br />
é incontestavel que sem a escravatura, teria sido impossivel <strong>da</strong>r 4 indus-<br />
tria assiicareira <strong>da</strong> America, o gran<strong>de</strong> inipulso que fez attingir n'aquelles<br />
estabelecimentos coloniaes, um grau <strong>de</strong> prosperi<strong>da</strong><strong>de</strong> e uma acciimulação<br />
<strong>de</strong> riqueza tão importante como epliemera e ficticia.<br />
Roscher, economista allemão citado por Leroy Beaiilieu, disse o se-<br />
guinte : a A escravatura tem um brilhante lado economico.. . . . . . . . . A in-<br />
justiça social <strong>da</strong> escravatura fez per<strong>de</strong>r <strong>de</strong> vista as suas vantagens econo-<br />
micas. D<br />
Quaes são essas vantagens?<br />
Oliveira Martins <strong>de</strong>fine-as nos seguintes periodos. c A escravidão tinha<br />
pois um papel positivo e econoinicamente efficaz, sob o ponto <strong>de</strong> vista <strong>da</strong><br />
prosperi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s plantaçúes. Não basta dizer que o trabalho escravo é mais<br />
oaro, e que o preto livre trabalha -factos aliás exactos em si -porque é<br />
mister accrescentar que o preto livre sd trabalha intermittentemente ou<br />
excepcionalmente; e que o mais elevado preço do trabalho escravo era com-<br />
pensado pela constancja e permanencia do funccionar d'esse instrumento<br />
<strong>de</strong> producção. As ciiltiiras exoticas - caf4, algodão, assucar, etc., - mais<br />
que nenhumas oiitrns, exigem em <strong>da</strong>dos inomentos a certeza absoluta dos<br />
braços trabalhadores ; e era isso o que a escravidão <strong>da</strong>va e o trabalho li-<br />
vre não po<strong>de</strong> garantir. r Uma <strong>da</strong>s peiores consequencias economicas <strong>da</strong> e3-<br />
cravidão é que o monopolio cultural <strong>de</strong> producto exportado impe<strong>de</strong> a alter-<br />
nação <strong>da</strong>s culturas, esgota a terra e precipita a <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncia <strong>da</strong> colonia tão<br />
rapi<strong>da</strong>mente quanto, <strong>de</strong> começo, a fez prosperar.<br />
Leroy Beaulieu accentua esta opinião nos seguinteu termos. cA es-<br />
cravatura foi util aos primeiros colonos, B puerili<strong>da</strong><strong>de</strong> negá-lo, mas essa<br />
utili<strong>da</strong><strong>de</strong> foi momentanca, durou cem ou cento e cincoenta annos talvez e<br />
trouxe por fim o empobrecimento. E' esta a razão porqiie a escravatura G<br />
nociva e porque, afinal, mesmo sob o ponto <strong>de</strong> vista economico, digam Ros-<br />
cher e Merivale o que disserem, <strong>de</strong>ve ser con<strong>de</strong>mnadn, não porque não te-<br />
nha singularmente contribuido no passado para o rapido progresso <strong>da</strong>s<br />
colonias e <strong>de</strong>senvolvimento <strong>da</strong> producção dos generos coloniaes, nãlo porqiie
238 POLITICA INDIGENA<br />
--<br />
não possa mesmo presentemente offerecer a quem d'ella se utilisar vanta-<br />
gene positivas e immedistas; mas, porque essa instituição forma socie<strong>da</strong>-<br />
<strong>de</strong>s anormaes, não eG sob o ponto <strong>de</strong> vista moral, como sob o ponto <strong>de</strong> vista<br />
economico, socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong>sprovi<strong>da</strong>s <strong>de</strong> todos os elementos <strong>de</strong> estabili<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
industrial, entregues inteiramente á prodiicç50 <strong>de</strong> generos <strong>de</strong> luxo <strong>de</strong>sti-<br />
nados h exportac;áo, isto 6, a um commercio cheio <strong>de</strong> riscos e <strong>de</strong> sobresal-<br />
tos, porque arrasta comsigo a exploração abusiva e, em ultima analyse, o<br />
esgotamento do solo. w Detendo-nos a consi<strong>de</strong>rar um <strong>de</strong>terminado momento<br />
historico B frequente observar que a escravidgo apressou o <strong>de</strong>senvolvimento<br />
<strong>da</strong> riqueza material <strong>de</strong> alguns poros; mas, se nos não ativermos ao exame<br />
<strong>da</strong>s circumstancias momentaneas, e estu<strong>da</strong>rmos um longo periodo historico,<br />
reconheceremos que essa institiiiyão immoral apenas serviu para atrazar a<br />
marcha do progresso economico e civilisador.<br />
Para os interesses geraes e permanentes <strong>da</strong> hiimani<strong>da</strong><strong>de</strong>, a escravisa-<br />
são do trabalho é pois nociva e iniqua, e tanto a economia politica como a<br />
philosophia e a moral concor<strong>da</strong>m em <strong>de</strong>monstrar que ella <strong>de</strong>ve ser <strong>de</strong>fini-<br />
tivamente repudia<strong>da</strong>, como institiiiçáo nacional, e como pratica colonial.<br />
Trabalho obrigatorio.-l'osta <strong>de</strong> parte a escravidáo con<strong>de</strong>mna<strong>da</strong><br />
pela reprovação universal, o outro processo <strong>de</strong> obter directamente a mão<br />
d'obra indigena, necessaria ás obras publicas e ás exploraçóes particulares,<br />
é o regimen do trabalho obrigatorio, remunerado ou gratuito, a que quasi<br />
infallivelmente se 6 forçado a recorrer no inicio <strong>da</strong> colonisaçáo. O trabalho<br />
obrigatorio, que po<strong>de</strong> assumir os tres typos principaes : corve'es, prestnç6e.s tZe<br />
trabalho, e requisi~ões,<br />
distanceia-se j& bastante <strong>da</strong> escravidáo, mesmo atte-<br />
nua<strong>da</strong>, e, muito embora seja con<strong>de</strong>mnavel pela forma e pelos resiiltados, é<br />
talvez indispensavel na primeira phase <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> <strong>da</strong>s colonias.<br />
A corvte existia, anteriorniente 4 colonisaç~o, na gran<strong>de</strong> maioria <strong>da</strong>s<br />
colonias asiaticas, e consistia na obrigaçáo <strong>de</strong> todos os individuos inscriptos<br />
nas communi<strong>da</strong><strong>de</strong>s, fornecerem annnalmente ao Estado um certo numero <strong>de</strong><br />
semanas <strong>de</strong> trabalho que era uti1is:~do em obras cle interesse geral.<br />
Esta forma <strong>de</strong> trabalho forçado, tal como primitivamente alli se ap-<br />
plicava, não passa afinal d'um simples imposto pago em trabalho e absolu-
- VGFIMEN DA a 0<br />
D'OBBA LOCAL<br />
-<br />
tamente <strong>de</strong>fensavel. A corvée tornou-se insuppor6avol aoa annam;&aci, prin-<br />
cipalmente pela maneira abusiva porque os francezes se aproveitavam d'esse<br />
commodo processo <strong>de</strong> obter trabalhadores para os seus canaes e caminhos<br />
<strong>de</strong> ferro, e levantou immensas reclamações na Cochinchina quando se tor-<br />
nou resgatavel por dinheiro. No Annam, no Cambodge e no Laos ain<strong>da</strong> hoje<br />
existe.<br />
Na Cochinchina foi supprimi<strong>da</strong> em 1881, pelo governador Myre <strong>de</strong><br />
Villers. As naçúes coloniaes não se teem, to<strong>da</strong>via, contentado em manter<br />
o regimen do trabalho obrigatorio nas colonias on<strong>de</strong> elle já existia, e<br />
teem-no introduzido em to<strong>da</strong>s as suas colonias africanas, impelli<strong>da</strong>s pela<br />
necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> obter braços para a constriicção dos portos, caminhos <strong>de</strong><br />
ferro, estra<strong>da</strong>s, canaes, etc., e para serviço <strong>de</strong> transportes, on<strong>de</strong> faltam<br />
as mo<strong>de</strong>rnas vias <strong>de</strong> comrnunicação.<br />
Muitas vezes 6 impossivel importar mão d'obra estrangeira, e B indis-<br />
pensavel recorrer temporariamente á coacção, visto a offerta <strong>de</strong> trabalho<br />
livre ser muito diminuta em relação ás necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> colonia.<br />
Isto não quer dizer que, & sombra d'essa necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>, se não tenham<br />
commettido gravissimos abusos, promovendo-se a construcc;áo <strong>de</strong> obras iniiteis<br />
para os indigenas e até para os colonos, e obrigando os primeiros a traba-<br />
lhos extenuantes, ma1 remunerados e at6 mesmo gratuitos. As requisições<br />
<strong>de</strong> carregadores, por exemplo, são uin dos peiores flagellos mo<strong>de</strong>rnos, aquelle<br />
que em mais larga escala concorre para dizimar e afugentar as popula-<br />
çóes indigenas.<br />
Os carregadores são frequentemente constrangidos a afastarem-se<br />
centenas <strong>de</strong> kilometros <strong>da</strong>s suas palhotas, recebendo má paga e pouco<br />
alimento, <strong>de</strong>ixando ao abandono as mulheres e os filhos, e soffrendo incle-<br />
mencias durante as jorna<strong>da</strong>s. Em Ma<strong>da</strong>gascar, quando o general Gallieni<br />
estabeleceu as prestações <strong>de</strong> trabalho para po<strong>de</strong>r impulsionar as obras do<br />
caminho <strong>de</strong> ferro, os indigenas eram trazidos dc enormes distancias, compel-<br />
lindo-se a trabalhar os proprios adolescentes, a ponto dos trabalhos agrico-<br />
ias terem passado n'algumas al<strong>de</strong>ias a serem feitos exclusivamente por<br />
mulheres, visto que homens não tinham ficado em muitas povoaçóes.<br />
Ninguem ignora os abusos commettidos na nossa Africa, wo~~ente
240 POLITICA INDIBENA<br />
em Angola, com o exhaustivo scrviço <strong>de</strong> carregadores, que necessita quanto<br />
antes uma severa regulamentaçGo que o torne mais supportavel e impeça<br />
os excessos. As req~cisições <strong>de</strong> carregadores suo commiiiis a quasi to<strong>da</strong>s, se<br />
n8o a to<strong>da</strong>s, as colonias africanas, e só po<strong>de</strong>rão naturalmente acabar quando<br />
o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>da</strong>s rias ferreas e outros meios dc transporte u permit-<br />
tam. Em Ma<strong>da</strong>gascar as prestações <strong>de</strong> trabalho foram crea<strong>da</strong>s, como dissemos,<br />
por Gallieni em 1896.<br />
Um anno <strong>de</strong>pois, como os colonos se queixassem que o trabalho pu-<br />
blico obrigatorio extenuava os indigenas, e fazia rarear a mão d'obra dispo-<br />
nivel para as emprezas particulares, o mesmo governador <strong>de</strong>cretou que os<br />
prestatarios ficassem isentos <strong>da</strong>s respectivas prestações, quando <strong>de</strong>mons-<br />
trassem estar ao serviço d'um colono.<br />
Esta medi<strong>da</strong> que, por assim dizer, impunha o trabalho obrigatorio<br />
para satisfação <strong>de</strong> interesses particulares, <strong>de</strong>u resultados ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iramente<br />
escan<strong>da</strong>losos, porqiie alguns colonos chegaram a receber dinheiro dos indi-<br />
genas em troca doa attestados em que <strong>de</strong>claravam que estes eram seus em-<br />
pregados.<br />
Teve <strong>de</strong> ser revoga<strong>da</strong> em 1895, e mais tar<strong>de</strong> em 1'300, foram <strong>de</strong>fini-<br />
tivamente aboli<strong>da</strong>s as prestaçúes <strong>de</strong> trabalho, em attençáo aos revoltantes<br />
abusos a que <strong>de</strong>ram origem. Nas Indias Orientaes Neerlan<strong>de</strong>zas o trabalho<br />
obrigatorio, era por assim dizer a base do Kultur-system que consistia na<br />
exploração directa pelo Estado <strong>de</strong> quasi todos os productos coloniaes, e na<br />
imposição força<strong>da</strong> <strong>de</strong> certas culturas.<br />
Hoje o regimen <strong>de</strong> trabalho egtá bastante modificado, mau o governo<br />
hollan<strong>de</strong>z ain<strong>da</strong> pó<strong>de</strong> exigir uma prestação annual <strong>de</strong> trabalho, entre 12 e<br />
42 dias por anno que sáo integralmente titilisados na construcção e conser-<br />
va~" <strong>da</strong>s obras publicas, constitiiindo portanto um mero imposto bem mais<br />
a<strong>da</strong>ptavel aos costumes d'aquelles indigcnas do que o imposto em dblieiro.<br />
Os maiores abusos, quer nas requisi(;óes <strong>de</strong> oarrcgaclorcs, quer no em-<br />
prego illimitado <strong>da</strong>s prestayóes <strong>de</strong> tralialho, teem sido cominettidos pela<br />
administraçiio do Congo belga. Além dos meios violentos para compellir o<br />
indigena ao trabalho do governo ou dos l)articiilares, meios esses que teem<br />
ido <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os mais crueis castigos corporaes e dos mais pesados impostos
BEGIMEN DA MÃO D'OBRA LOCAL ---<br />
- ---<br />
em borracha ou e,m dinheiro, at8 ao proprio sequestro <strong>da</strong>s mulheres i&genas,<br />
a organisaçáo <strong>da</strong> celebre force publique náo passa d'um processo<br />
abusivo, uma ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira escravatnra temporaria <strong>de</strong>stina<strong>da</strong> a obter braços<br />
para as obras publicas, para a colheita <strong>da</strong> borracha c para o transporte<br />
<strong>da</strong>s cargas. Os suppostos sol<strong>da</strong>dos são carregadores, trabalhadores agricolas,<br />
creados dos colonos,. etc. ; tudo menos o que o seu nome indica.<br />
Esta qnestáo do imposto directo ein trabalho, tem sido muito discuti<strong>da</strong><br />
e, em regra, tem sido <strong>de</strong>fendi<strong>da</strong>, pelo menos para os indigenas<br />
que, não concorrendo ao trabalho livre, e não tendo meios <strong>de</strong> fortuna<br />
que permittam equipara-10s aos colonos nos impostos vulgares, se entregam<br />
a uma vadiagem miseravel e <strong>de</strong>senfrea<strong>da</strong>, nociva ti raça e ruinosa para a<br />
colonia.<br />
Alguns escriptores coloniaes dizem qiie o imposto em trabalho, longe<br />
<strong>de</strong> ser abolido, <strong>de</strong>ve ao contrario ser regulamentado e tornado obrigatorio,<br />
a fim <strong>de</strong> que os indigenas contribuam d'este modo, e por o não fazerem em<br />
dinheiro, para as receitas <strong>da</strong> colonia cuja applicaqão representa um beneficio<br />
para todos, brancos e negros. É: vulgar dizer-se que nHo é <strong>de</strong>mais applicar-se<br />
aos indigenas um imposto <strong>de</strong> trabalho obrigatorio, rjuando os europeus<br />
são, pelo tributo <strong>de</strong> sangue, compellidos a varios annos <strong>de</strong> serviço<br />
militar, e, aldm d'isso, sáo sempre moralmente constrangidos a trabalhar<br />
quando não possuem fortuna su5ciente.<br />
Tratando <strong>da</strong> questáo do trabalho indigena na Africa do Sul, o Sr.<br />
Conselheiro Freire d'Aridra<strong>de</strong> escreve o segiiinte. (')
242 POLITICA WDIQENA<br />
talmente improdnctivos no meio <strong>da</strong>s rica3 regióeg africanas, que o sul <strong>da</strong><br />
Africa precisa <strong>de</strong> trabalhadores ?<br />
Ao comliarar o salario d'um trabalhador europeu, homem ou mullier,<br />
que labuta o (lia inteiro para ganhar 200 a 500 reis, quem po<strong>de</strong> julgar<br />
justo que ao indigena se dê um salario duplo ou triplo para fazer mal um<br />
simples trabalho I)raçàl?. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . E' evi-<br />
<strong>de</strong>nte qrie ningtiern uristlria, no secnlo em que vamos entrando, renovar esse<br />
systema <strong>de</strong> trãl~allio ii.iado em seciilos pas~ados, e em que o homem branco<br />
ou preto era veiitlido (liia1 iinimal <strong>de</strong> outra especie: escrttvidáo ou traba-<br />
lho forvado silo palitvràs qne sôitm terrivelmente ao2 oiividos do nosso se-<br />
culo, e serA talvez por isso que com ellxs se ameaípm os que querem tirar<br />
o preto <strong>da</strong> ociosi<strong>da</strong><strong>de</strong> qrie llic é t&o queri<strong>da</strong>.<br />
I'or isso t': qne t,xml>em náo quero escravatura, se,ja qual fôr a forma<br />
oii o aspecto coni qiie se apresente, mas <strong>de</strong>sejo o <strong>de</strong>ver do trabalho imposto<br />
por essa gran<strong>de</strong> lei natural que se trasladou nos nossos codigos, e a que,<br />
entendo, se náo (leve subtrahir o preto pela facili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s leis e pela imposiçiio<br />
cl'esaa ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira e.witvidáo a que elle hoje sujeita a mulher que<br />
lhe <strong>de</strong>veria ser coinpsnheira e amiga. )> Em to<strong>da</strong> a Africa do Sul as gran<strong>de</strong>s<br />
companhias mineiras, pela voz do3 seus jornaes teem <strong>de</strong> longa <strong>da</strong>ta<br />
promovido lima iiiteiisa campanha a favor do estabelecimento <strong>de</strong> um regimen<br />
<strong>de</strong> trabalho indigena obrigatorio que barateie o prec,o <strong>da</strong> máo d'obra<br />
hqje successivam~~rite elevado, e que evite a emigraçáo asiatica. A nós<br />
parece-nos que, SI, o imposto em tralritllio para obras <strong>de</strong> utili<strong>da</strong><strong>de</strong> geral Q<br />
<strong>de</strong>fensavel em dctl.rininadss circiimstanctias, o trabalho ohrigatorio para ser-<br />
\rir interesses 1): i~ricrilarr~. <strong>de</strong>ve ser absolutamente con<strong>de</strong>mnado como im-<br />
moral, e como ca~i-ailor provavel <strong>de</strong> abusos e <strong>de</strong> revoltas.<br />
Os meios iiidir~ct~os <strong>de</strong> ohrigar o indigena a trabalhar, taes como o<br />
imposto em dinlieiro, x prnliihi(;%o <strong>da</strong> vadiagem, a sencçno ~ enal do contracto<br />
<strong>de</strong> trabalho livre, etc., são geralmente siifficientes para furtar o preto á<br />
inactivi<strong>da</strong><strong>de</strong>; e sc ;lin<strong>da</strong> ausi~n a m8o a'obra náo supprir a to<strong>da</strong>s as exigentias<br />
<strong>da</strong> colonia, n:i<strong>da</strong> impe<strong>de</strong> que, n'eite caso, se recorra á emigracão contracta<strong>da</strong>,<br />
quer x~i;itica, quer d'outra colonia africana on<strong>de</strong> exista um superavit<br />
<strong>de</strong> traballiacl ores.
REGIMEN DA 'a80 U'OBRA LOCAL<br />
-<br />
0 reg;men do trabalho obrigatorio, que Leroy Beaiilieu combate vi-<br />
gorosamente, tem comtudo encontrado muitos <strong>de</strong>fensores entre alguns colo-<br />
niaes eminentes ; Aspe-Fleiirimont, DucIic:ne, Aiiguste Bernard justificam<br />
essa <strong>de</strong>feza pela necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> crear aos indigenas um estado intermedio<br />
entre a ociosi<strong>da</strong>rle ferrenha a que estes se entregam, e o regimen <strong>de</strong> tra-<br />
balho livre adoptado na Europa.<br />
' Mr. Cliaml)erlain, n'um discurso pronunciado em 189s na House of<br />
Cornmons a proposito <strong>da</strong> imposição do trabalho mineiro aos matebeles,<br />
mostrando a importnncia civilisadora do trabalho, e a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> levar<br />
os indigenas ao fornecimento <strong>da</strong> mão d'obra local, terminou com as seguin-<br />
tes palavras.<br />
«Mas, com uma raça d'estas, duvido muito que isso possa ser obtido<br />
simplesmente por exliortaçáo. Creio que alguns meios taes como, uma forte<br />
persuas50, estimulos diversos e, att: mesmo, coacção se tornam absoluta-<br />
mente necessarios, se se quizer assegurar o resiiltado que 6 para <strong>de</strong>sejar<br />
no interesse <strong>da</strong> humani<strong>da</strong><strong>de</strong> e <strong>da</strong> civilisacáo.» Todo o resultado momen-<br />
taneo obtido pelo emprego <strong>da</strong> força importara. necessariamente <strong>de</strong>svanta-<br />
gens futuras.<br />
Para o negro compellido violentamente ao trabalho, este ficará sem-<br />
pre associado no seu espirito limitado e impressionavel & i<strong>de</strong>ia d'um fardo<br />
e odioso, e a Jima imposiqáo injusta dos dominadores.<br />
N5o é por intermedio do trabalho obrigatorio que se tem <strong>de</strong> fazer a<br />
educaçiio laboriosa do negro. Antes, pelo contrario, o seu emprego serve<br />
apenas, oii para provocar revoltas cuja previsão e repressão exigem uma<br />
dispendiosa policia, ou para radicar mais fun<strong>da</strong>mente na alma indigena a<br />
i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que o trabalho t! um castigo e a ociosi<strong>da</strong><strong>de</strong> um premio.<br />
Para cepilhar as protuberancias moraes do caracter indigena, taes como<br />
a indolencia innsta e o rotineirismo improgres.;ivo, é mister usar methodos<br />
lentos e graduaes, trilhando sempre o caminho <strong>da</strong> ino<strong>de</strong>raçko, e nunca fa-<br />
zendo exigencias incoinpativeis com a mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong><strong>de</strong> actual do caracter indi-<br />
gena. Estas exigencias, embora sejam afita<strong>da</strong>mente reclama<strong>da</strong>s e agra<strong>de</strong>ci-<br />
<strong>da</strong>e pelos colonos, po<strong>de</strong>m provocar estragos irremediaveis nas populaçúes
244 POLITICA INDIGENA<br />
indigenas, e induzi-las ao <strong>de</strong>sanimo ou a rebelliões, tanto mais lastimaveis<br />
quanto mais justifica<strong>da</strong>s fGrem.<br />
O trabalho obrigatorio não P sí, nefasto como <strong>de</strong>sorientador <strong>da</strong> morali<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
indigena; em muitos casos a rlegenerescencia physica <strong>da</strong> raça B a<br />
sua consequencia immediata. Quando se requisitam carregadores aos chefes<br />
indigenas, é natural que sejam fornecidos os homens mais robustos, e<br />
o <strong>de</strong>pauperamento organico causado por esse violentissimo serviço 6 <strong>de</strong> tal<br />
or<strong>de</strong>m, que os individuos mais fortemente constituidos, quando lhe resistem,<br />
ficam estropiados e inaptos para procrear filhos sáos c vigorosos.<br />
Alem d'isso, este genero <strong>de</strong> trabalho, que repugna a iminensas populaçóes,<br />
dá origem ao <strong>de</strong>spovoamento <strong>da</strong>s terras e 6 dispersáo pelo matto dos<br />
habitantes <strong>da</strong>s povoaçóes, que assim procuram livrar-se d'essa pesa<strong>da</strong><br />
tarefa.<br />
E <strong>de</strong>pois, quantos carregadores não morrem victimas, ou do excesso<br />
do peso transportado, ou do exagero <strong>da</strong>s marchas, ou até mesmo <strong>da</strong> influencia<br />
perniciosa d'um clima differente? Algumas <strong>da</strong>s mo<strong>de</strong>rnas campanhas<br />
coloniaes teem cnstado em vi<strong>da</strong>s <strong>de</strong> carregadores, o dobro e o triplo dos<br />
inimigos mortos em combate.<br />
Ka campanha do BaruB, por exemplo, a mortali<strong>da</strong><strong>de</strong> dos Makangas<br />
empregados como carregadores foi elevadissima; as pneumonias e as ulceras<br />
<strong>de</strong> mau caracter encarregavam-se <strong>de</strong> produzir nos pacificos e protegidos<br />
carregadoi-
REGIMES DA MÃO D'ORRA LOCAL 245<br />
regimen do contracto livre, instigando indirectamente a offerta <strong>de</strong> traba-<br />
lho pelos regulameritos e estimulos que náo <strong>de</strong>gra<strong>de</strong>m no sentimento indi-<br />
gena essa nobilissima condiçáo humana, reduzindo-a á cathegoria aviltante<br />
d'iima imposi(;áo appoia<strong>da</strong> no direito do mais forte.<br />
Methodox indirectos<br />
Educação profissional. - Quando estudAmou a condiçZo moral e<br />
intellectiial dos indigenas, e <strong>de</strong>senvolvemos largamente o thema impor-<br />
tante <strong>da</strong> sua educaçáo, tivemos ensqjo <strong>de</strong> realçar a importnncia primor-<br />
dial do ensino profissional, consi<strong>de</strong>rando-o uma <strong>da</strong>s mais soli<strong>da</strong>s bases em<br />
que <strong>de</strong>ve assentar a futura estructiira sociologica <strong>da</strong>s populaçóes inclinenas.<br />
Sob o aspecto eco~iomico, n5o iremos adduzir novamente as razóes já<br />
exposta:, que evi<strong>de</strong>nce~am as melliorias materiaes resultantes <strong>da</strong> educaçáo<br />
profissional, que í! o unico meio seguro e <strong>de</strong>finitivo <strong>de</strong> generalisar na socie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
indigena o habito <strong>de</strong> trabalhar, esse capital factor <strong>de</strong> riqueza e <strong>de</strong><br />
regeneraçáo social. Pensêmos bem. Sem trabalho não ha colonias, c sem educac;áo<br />
profissional nko ha trabalho proficilo e p;:trantido.<br />
Nko nos limitemos a supprir ás exigencias do momento actual sem<br />
preparar so1id:rmeiite as garantias fiitiiras. Em to<strong>da</strong>s as epochas e em to<strong>da</strong>s<br />
as coisas foi bempre preferivel camiiiliar lentamente iiin-; com segurança,<br />
a progredir r'lpi<strong>da</strong>rnente sem appoio seguro. O que se 1)fbr(!(s t'ni 'eloci<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />
ganha-se em resistencia, em soli<strong>de</strong>z e em estal)ili<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
Na historia <strong>da</strong> colonisaçáo ha exemplos bem frisaiites. X h colonias <strong>de</strong><br />
escravos nionopolisadoras do assucar foram ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros pur-sang, fornecendo<br />
uma corri<strong>da</strong> brilliante e um lucro avultado aos proprietarios, mas per<strong>de</strong>ndo<br />
rapi<strong>da</strong>mente o folcgo e cahindo breve no marasmo econoniico em qiie teem<br />
jazido.<br />
Na trrt)ectorifi sinusoi<strong>da</strong>l <strong>da</strong> evol~iyao<br />
economica <strong>da</strong>s colonias a varia-<br />
ção <strong>da</strong> or<strong>de</strong>na<strong>da</strong> 4 tanto menor, quanto mais lento e firme tiver sido O <strong>de</strong>s-
246 POLITICA INDIGENA<br />
envolvimento <strong>da</strong> riqueza ; um exagerado impulso inicial pd<strong>de</strong> romperi o<br />
eqiiilibrio <strong>da</strong> curva e aniiiillar as cotas positivas.<br />
Coiistrangendo violentamente a trabalhar todos os indigenas que ha-<br />
bitam as coloniau, obter-se-ha, com a valorisaçáo dos immencos jazigos rni-<br />
neiros, e com a intensificaqáo <strong>da</strong>s cultiiras ricas, um formi<strong>da</strong>vel booln <strong>de</strong><br />
capitaes e <strong>de</strong> trabslho e um progresso material vertiginoso. Esse <strong>de</strong>sen-<br />
volvimento estonteante a que faltam os esteios imprescindiveis <strong>da</strong> homo-<br />
genei<strong>da</strong><strong>de</strong> social, <strong>da</strong> equitativa repartição <strong>da</strong>s riquezas e <strong>da</strong> stratificaçáo<br />
lenta que origina as ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iras forças economicas, está fatalmente con-<br />
<strong>de</strong>mnado, seniio a um X-rtrcli monumental, pelo menos a uma rapi<strong>da</strong> <strong>de</strong>ca-<br />
<strong>de</strong>ncia ecoiiomica.<br />
St o trabalho livre e abun<strong>da</strong>nte pó<strong>de</strong> assegurar a estabili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong><br />
economia colonial, e esse traliallio, nas fazen<strong>da</strong>s ou nas colonias mixtas, <strong>de</strong>ve<br />
principalmente recahir sobre os indigenas. Corrio estes, em geral, nRo estão<br />
actualmente, nem estarao táo cedo, aptos para o <strong>de</strong>sempenho d'essa rnissáo,<br />
é indispensavel educa-los pacientemente no habito do trabalho. Impor o tra-<br />
balho pela força a quem ain<strong>da</strong> náo tem a comprehensáo niti<strong>da</strong> dc que tra-<br />
balhar significa, B promover fatalmente a confusão perigosa entre iim <strong>de</strong>ver<br />
nobre e um castigo injusto.<br />
Se o trabalho livre é sempre incomparavelmente superior ao trabalho<br />
foryado, sci attinge, comtudo, o seu maximo rendimento, quando quem traba-<br />
lha tem a consciencia clara <strong>de</strong>, ao mesmo tempo, prover & necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> phy-<br />
sica e cumprir um <strong>de</strong>ver moral.<br />
Nas socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s europeiali, ain<strong>da</strong> quando se oblitere o sentimento indi-<br />
vidiial, existe a consciencia publica que con<strong>de</strong>mna sempre os ociosos, quer<br />
sejam vadios sem morali<strong>da</strong><strong>de</strong>, quer sejam capitalistas sem necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> phy-<br />
sica <strong>de</strong> trabalhar. Nas su~aie<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
indigenas B necessario lanqar pela educa-<br />
os germens d'essb sentimento, e aguar<strong>da</strong>r pacientemente<br />
que a hereditarie<strong>da</strong><strong>de</strong> generalise e confirme esse benefico influxo. No intuito<br />
<strong>de</strong> promover :t generalisaçáo effican <strong>da</strong> educação profissional entre os indi-<br />
genas <strong>da</strong>s colonias portiiguezas, foi mo<strong>de</strong>rnamente promulgado o <strong>de</strong>creto <strong>de</strong><br />
18 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 1906, que se <strong>de</strong>ve á intelligente iniciativa do Sr. Conse-<br />
lheiro 31oreir i .Tunior: e que, se náo resolve ain<strong>da</strong> <strong>de</strong>finitivamente a ques-
RE~IMEN DA MBO D'OBRA LOCAL<br />
- --<br />
ti40 do ensino, representa comtndo uin progresso sensivel sobre a situaçiio<br />
anterior.<br />
Desenvolvimento <strong>da</strong>s necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s. - A educação visa principal-<br />
mente a melhorar o rendimento do trabalho indigena, creando profissionaes<br />
habeis e incutindo-lhes a i<strong>de</strong>ia do trabalho como <strong>de</strong>ver moral. Mas, ninguem<br />
ignora que o motivo principal que leva o homem a trabalhar é a satisfação<br />
<strong>da</strong>s suas necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s physicas, e que, justamente por os indigenas se con-<br />
tentarem com táo pouco, é que mais indolentes e refractarios ao trabalho<br />
nos parecem ser.<br />
Sendo assim, B evi<strong>de</strong>nte a gran<strong>de</strong> vantagem que ha em promover afin-<br />
ca<strong>da</strong>mente a complicação <strong>da</strong>s necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s indigenas. Como, porCm, essas<br />
necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s são a consequencia natural <strong>da</strong> civilisaç&o obti<strong>da</strong> com o pro-<br />
gresso <strong>da</strong> obra colonisadora, e corno para este progresso 6 que é indispen-<br />
savel o concurso do trabalho indigena, recahe-se, como diz o Sr. Dr. Mar-<br />
noco, (*) n'iim circulo vicioso.<br />
A convivencia com os brancos e uma habil e activa propagan<strong>da</strong> com-<br />
mercial são as melhores formas <strong>de</strong> crear novas necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s aos indigenas.<br />
Assim, se consi<strong>de</strong>rarmos especialmente a nossa colonia <strong>de</strong> Moçambique,<br />
vêmos que os indigenas <strong>da</strong> Zambezia sáo os mais laboriosos <strong>da</strong> provincial<br />
e que se assim acontece é porque o contacto com os brancos <strong>da</strong>ta <strong>de</strong> uma<br />
epocha já remota, e tanbem porque o commercio europeu e monhé alli se<br />
estaheleceii e creou razes ha muito mais tempo que nos outros districtos.<br />
A frivoli<strong>da</strong><strong>de</strong> do chibztats e o apreço pelo 111x0 do traje são n'elles muito<br />
mais accentiiados que entre os macúas ou os landins.<br />
O Sr. Conselheiro Freire d'Andra<strong>de</strong>, no seu livro já citado, escreve o<br />
seguinte:
248 POLITIC.~ INDIGENA<br />
tar com um punhado <strong>de</strong> milho que a mulher cultiva n'um pedsço <strong>de</strong> terra<br />
<strong>de</strong> que nálo tem que pagar nem o prec;o nem a ren<strong>da</strong>, nzo teremos missio-<br />
narios nem raciocinios que convençam o indigenn a abandonar habitos que<br />
adquiriu pela força <strong>da</strong> pratica <strong>de</strong> remotos seculos, e que não po<strong>de</strong> per<strong>de</strong>r<br />
n'um dia, nem haverá forças que lhe modifiquem as circ~imvoluçóes do ce-<br />
rehro <strong>de</strong> modo a leva-lo a pensar clifferentenlente do que pensa..<br />
Effectivamente sSio aconselhaveis todos o:: regiilamentos <strong>de</strong> cu*ja exe-<br />
cuç" resultem para os indigenaq necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s novas. Poucos avaliam o<br />
benefico influxo que duplamente resi~ltoii, para a expansão <strong>da</strong>s transacçúes<br />
commerciaes e para o augmento tla m&o d'obra, dos regulamentos que em<br />
algumas locali<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong>s colonias inglezas obrigaram os indigenas a trajar<br />
por fúrma semelhante aos europeus.<br />
O principal papel no <strong>de</strong>senvolvimento <strong>da</strong>* necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s indigenas <strong>de</strong>ve<br />
<strong>de</strong> direito pertencer ao commercio, mas não a um commercio ganancioso e<br />
<strong>de</strong>shonesto que vá incutir vicios dcleterios, ven<strong>de</strong>ndo mercadorias que aca-<br />
bam por matar os freguezes.<br />
Não 6 envenenando os indigenas com alcooes mais ou menos fulmi-<br />
nantes que se crearáo novas necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s. X embriaguez é sempre barata<br />
e muitas vezes um diit <strong>de</strong> labuta po<strong>de</strong> ren(11.r lima semana <strong>de</strong> orgia. A pro-<br />
pagan<strong>da</strong> commercial, náo se po<strong>de</strong> limitar apenas a procurar lucros avul-<br />
tados; é esse por certo o sei1 mobil essencial, mas, sem o per<strong>de</strong>r <strong>de</strong> vista,<br />
os agentes commercities po<strong>de</strong>m exercer nos sertóes uma missáo altamente<br />
civilisadorn. É preciso estu<strong>da</strong>r, previamente e com cui<strong>da</strong>do, qiiai <strong>de</strong>ve ser a<br />
natureza do contlieudo <strong>da</strong>s malas do caixeiro viajante que vae ven<strong>de</strong>r aos<br />
indigenas os proc' iiotos enropcviu. Nem to<strong>da</strong>s as mercadorias conveem egual-<br />
mente, e alguns ?ii.tigos ha, ap1)arenterncnte iniiteis aos indigenas, que aca-<br />
bam por ter imriiencin acceitação e ven<strong>da</strong> remuneradora. O exame previo<br />
ás circumstancias do mercado, a ediicaçáo especial dor agentes commerciaes,<br />
e a a<strong>da</strong>ptação <strong>da</strong>s mercadorias ao gosto dou indigenas sáo condiçóes indis-<br />
pensaveis para assentar soliclamente o progresso commercial, <strong>de</strong> qiie princi-<br />
palmente <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> a complicaçiIo <strong>da</strong>s iieceasicla<strong>de</strong>s.<br />
O <strong>de</strong>senvolvimento <strong>da</strong>s tran~xc(;úes commerciaes com os indigenas, é<br />
o complemento necessarin <strong>da</strong> obra <strong>da</strong> educaçáo profissional. A evolução
-- - - -<br />
REGIMEN DA MXO D'OBRA LOCAL<br />
- - - -- - -<br />
economica <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena alterando os costumes e as necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
conduzi-la-ha lentamente, para garantir as subsistencias, á offerta abun-<br />
<strong>da</strong>nte <strong>de</strong> trabalho livre e salariado.<br />
Comtiido, como o processo evolutivo é necessariamente vagaroso, niio<br />
po<strong>de</strong>ndo acornpanhar a rapi<strong>de</strong>z do progresso material <strong>da</strong>s colonias, 6<br />
preciso adoptar medi<strong>da</strong>s que ten<strong>da</strong>m a garantir logo uma offerta <strong>de</strong> traba-<br />
lho intligrna, que correspon<strong>da</strong>, quanto possivel, ás exigencias <strong>da</strong> agricultura<br />
e <strong>da</strong>s industrias coloniaes. N'este sentido pd<strong>de</strong>-se lançar mão <strong>da</strong> elevaçgo<br />
do imposto em dinheiro, <strong>da</strong> expropriaçáo <strong>da</strong>s terras, <strong>da</strong> prohibiçáo <strong>da</strong> va-<br />
diagcm e <strong>da</strong> regulamentaçZo dos contractos <strong>de</strong> trabalho.<br />
Elevação do imposto. - Este procwo <strong>de</strong> levar indirectamente os<br />
indigenns á necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> trabalhar tern sido adoptado, com exito variavel,<br />
em qilasi tci<strong>da</strong>s as colonias sul-africanas. Como se sabe, aquelles impostos<br />
indigerias, qiic sáo differctntes dos que aos colonos se applicam, ou não passam<br />
d'uma mera capitação como o ~nussoco xambeziano, ou constituem uma<br />
especie <strong>de</strong> contribuiçáo predial como o imposto <strong>de</strong> palhota e <strong>de</strong> cubata.<br />
Para se evitar o impoqto em tral~alho, principalmente injusto quando se<br />
trata <strong>de</strong> servir interesses partiaiili~res, tccm as administraçóes <strong>de</strong> diversas<br />
colonias augmentado ~uccessivamente os iiupostoci em dinlieiro, <strong>de</strong> maneira<br />
a qiie o indigena se veja litteralrnente obrigado a procurar trabalho para<br />
os po<strong>de</strong>r 1):igar.<br />
Geralmente a tributaçáo -que no Transwaal é <strong>de</strong> duas libras por<br />
adulto c mais duas libras por ca<strong>da</strong> mulher alem <strong>de</strong> uma - é pela sua exagcr:idic<br />
c1cv:iqáo inteiramente <strong>de</strong>sproporciona<strong>da</strong> á capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> tributtivel do<br />
indigciia, o que conseqnentemente o forc;ii a, trabalhar nas minar como se<br />
<strong>de</strong>seja.<br />
Eni lIa<strong>da</strong>gascar, <strong>de</strong>pois que em 1905 se tlecretoii x completa liber<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> trabalho e se aboliram as leis repressivas <strong>da</strong> vadiagem, eiitroii-se tambem<br />
no caminho do augmento <strong>da</strong>s taxas indigenaa; no Congo belga é este<br />
tambem o unico meio confessavel <strong>de</strong> obrigar indirectamente os indigenas<br />
a trabalhar.<br />
De resto, a elevaçHo do imposto em dinheiro é muito mais facilmente<br />
249
230<br />
--<br />
POLITICA INDIGENA<br />
acceite pelos indigenas africanos do que as prestaçóes <strong>de</strong> trabalho. I)e 1900<br />
a 1904 a população indigena dos territorios <strong>da</strong> Companhia <strong>de</strong> Moçambique<br />
augmentou <strong>de</strong> 8-1 O/, sendo este prodigioso accrescimo <strong>de</strong>vido á emigração<br />
dos indigenas que abandonam em gran<strong>de</strong> numero os territorios <strong>da</strong> Companhia<br />
<strong>da</strong> Zambezia indo habitar a margem direita do Zambezr. E isto<br />
acontece porque a Companhia <strong>de</strong> Moçambique tem procurado approximar<br />
pouco a pouco o mussoco do imposto <strong>de</strong> palhota, não exigindo já aos pretos<br />
a parte do mussoco paga em trabalho.<br />
Estes, satisfeitos por serem apenas obrigados no pagamento em generos<br />
ou em dinheiro, n5o sd povoaram os territorios <strong>da</strong> Companhia, mas<br />
até mesmo teem facilmente recebido os aiigmentos successivos do imposto.<br />
Esta emigração para os territorios <strong>da</strong> Companhia <strong>de</strong> Moçambiqiie é um dos<br />
mais brilhantes resultados <strong>da</strong> habilissima politica indigena e siiperior tacto<br />
administrativo do antigo chefe <strong>da</strong> circumscripção <strong>de</strong> Sena e hoje governador<br />
<strong>da</strong> Companhia, capitão-tenente Pinto Basto.<br />
Nas colonias inglezas <strong>da</strong> Africa do Sul perdurou algiim tempo o regimen<br />
do Glen (irey A(,t <strong>de</strong> 18'31 que estabelecia uma capitação <strong>de</strong> 10<br />
sliillings, <strong>de</strong> que eram isentos os indigenas proprietarios <strong>de</strong> terras, e os que<br />
<strong>de</strong>monstrassem ter trabalhado pelo menos tres mezes do anno anterior, em<br />
qiiaIquer emprego ou serviço fora <strong>da</strong> respectiva reserva territorial. A isenção<br />
passava a ser <strong>de</strong>finitiva quando o indigena po<strong>de</strong>sse provar ter pelo menos<br />
tres annos tie trabaliio regular. Este systema <strong>da</strong>va origem a varios<br />
inconvenientes, e por isso acabaram-se as excepçóes e elevou-se progressivamente<br />
a taxa do imposto.<br />
Em todo o territorio <strong>da</strong> provincia <strong>de</strong> Moçambique sitiiado a sul e a<br />
oeste do rio Iin~l~opo, foi em 1907 elevado ao dobro o impobto tle palhota<br />
que actualmentcn ,: tlt. uma libra. Esta operação financeira foi mais uma<br />
substituição do yiie um aiigmento. Embora, o <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 1) <strong>de</strong> Setembro <strong>de</strong><br />
1904 reg~lamrnt~indo o assalariamento dos indigenas d'esta colonia para<br />
trabalho, não o jlc.rmittisse, estava entretanto em vigor o chihnlo. que era<br />
um trabalho 01,riq:ttorio sub-locavel, remunerado a cerca <strong>de</strong> 300 reis diarios,<br />
que <strong>de</strong>u origem :i immensos abusos. O governador geral Conselheiro Freire<br />
dlAndra<strong>de</strong> acahoii com essa ~ratica escan<strong>da</strong>losa, ficando os indigenas ape-
REUIMEW DA NA0 D'OBRA LOCAL<br />
I<br />
25 1<br />
nas obrigados a fornecer em ca<strong>da</strong> anno sete dias <strong>de</strong> trabalho gratuito na<br />
limpeza e conserraçáo <strong>da</strong>s estra<strong>da</strong>s, e pacisando em compensaçáo a pagar o<br />
dob~o do imposto <strong>da</strong> palhota. A elevaqáo tlo imposto indigena tem <strong>de</strong> ser<br />
feita com to<strong>da</strong> a pru<strong>de</strong>ncia, evitando exageros que possam occasionar perturbaçúes<br />
ou revoltas por parte <strong>da</strong>s populaçóes indigenas <strong>de</strong>masia<strong>da</strong>mente<br />
sobrecarrega<strong>da</strong>s. Este processo <strong>de</strong> elevaçáo <strong>da</strong>s taxas, embora augmente a<br />
offerta <strong>da</strong> máo d'ohra indigena, nRo basta para a regularisar <strong>de</strong>finitivamente,<br />
e para innumeras ind~istrias e culturas A regtilari<strong>da</strong><strong>de</strong> do trabalho,<br />
e a certeza <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r contar com os trabalhadores, são condiçúes indispen-<br />
saveis para garantir o exito <strong>da</strong> empreza.<br />
Expropriação <strong>da</strong>s terras.-h expropriaqão dos terrenos cultivados<br />
pelos indigenaa, ou que, por qualquer outra razko, elles consi<strong>de</strong>ram como<br />
proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> tribci ou <strong>da</strong> al<strong>de</strong>ia, tem por consequencia immediata obrigar<br />
o indigena a procnrar no trabalho os meios <strong>de</strong> existencia.<br />
E comtudo um processo abusivo, violento e injusto que só pó<strong>de</strong> com-<br />
prehen<strong>de</strong>r-se como castigo d'uma rebelliáo. Foi o que os francezes fizeram<br />
na Argelia <strong>de</strong>pois <strong>da</strong> revolta indigena <strong>de</strong> 1871, confiscando todos os bens<br />
immoveis dos rebel<strong>de</strong>s, e obtendo assim um numeroso proletariado agricola.<br />
O exemplo mais conhecido <strong>de</strong> expropriaçrio injustifica<strong>da</strong> <strong>da</strong>s terras perten-<br />
centes aos indigenas é o do Congo belga on<strong>de</strong>, sob n <strong>de</strong>signaçáo <strong>de</strong> terri-<br />
torios <strong>de</strong>soccupados, se chamaram á posse e exploraçrio directa do Estado<br />
immensas arens territoriaes que os indigenas sempre tinham explorado por<br />
sua conta, e <strong>de</strong> que se julgavam legitimas proprietarios.<br />
Actiialmente, os indigenas que ahi habitam são compellidos aos traba-<br />
lhos <strong>de</strong> cultura e H colheita <strong>da</strong> borracha, em troca d'um minguado salario<br />
frequentemente nominal. A expropriaçáo violenta b, pois, iim con<strong>de</strong>mnavel<br />
e revoltante abuso <strong>de</strong> força que, <strong>de</strong> f6rma alguma, pó<strong>de</strong> ser aconselhavel<br />
como pratica colonial.<br />
Quando hoiivessc vantagem economica em substituir uma classe <strong>de</strong> pe-<br />
' quenos proprietarios indigenas, duplamente inuteis á colonia por represen-<br />
tarem braços qliasi inactivos, e serem fracamente tributaveis, po<strong>de</strong>r-se-hia
talvez recorrer a lima expropriação por utili<strong>da</strong><strong>de</strong> geral, embolsando os in-<br />
digenas em numentrio <strong>da</strong> importancia <strong>da</strong>s proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />
YO<strong>de</strong>-se ter a certeza <strong>de</strong> que elles n5o iriam empregar esse dinheiro na<br />
compra <strong>de</strong> outra proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>. Com a imprevi<strong>de</strong>ncia que caracterisa o ne-<br />
gro: em pouco tempo o peculio estaria totalmente dissipado, e o ex-proprie-<br />
tario reduzido á qoiidiçào <strong>de</strong> trahalliador salariado.<br />
Repressao <strong>da</strong> vadiagem. - Náo é justo que a vadiagem prohibi<strong>da</strong><br />
na Europa seja abertamente tolera<strong>da</strong> aos indigenas <strong>da</strong>s colonias. Pela applicayáo<br />
<strong>da</strong>s leis metropolitanas, modifica<strong>da</strong>s em accordo com as circiimstancias<br />
tlo meio colonial, tem-se indirectamente procurado alcançar que trabalhe<br />
a gran<strong>de</strong> massa <strong>da</strong>s indigenas que permanece completamente ociosa, vivendo<br />
d'um cacho <strong>de</strong> bananas, ou d'um punhado <strong>de</strong> milho muitas vezes roubado.<br />
Nas Antilhas francezas <strong>de</strong>pois <strong>da</strong> a1)oliçáo <strong>da</strong> escravatura, e em Ma<strong>da</strong>gascar<br />
em 1896, foram <strong>de</strong>creta<strong>da</strong>s medi<strong>da</strong>s repressivas contra a vadiagem, em<br />
que a pena do enoarceramento era sempre remivel por trabalho remunerado.<br />
Eram consi<strong>de</strong>rados vadios todos os indigenas que não fossem proprietarios,<br />
ou profissionaes exercendo um offioio qnalquer, oii que não possuissem<br />
uni livrete em que a inscripçáo <strong>de</strong>monstra~se qnth os seus portadores<br />
se entregavam a um trabalho regular e continuo.<br />
A gran<strong>de</strong> maioria dou escravos libertos <strong>da</strong>s Antilhas escapava á<br />
applicaçáo <strong>da</strong> lei adquirindo pequenas nesgas <strong>de</strong> terreno on<strong>de</strong> medrassem<br />
duas ou tres bananeiras, sufficientes para o seu sustento. Este regresso<br />
a urna h , a - t i cioilis«tion, como pittoreãcamente lhe chama Paul<br />
Reiriscli, evitou-se até certo ponto na Guyana hollan<strong>de</strong>za on<strong>de</strong>, não sd os<br />
lii~ertos foram pro111111dos <strong>de</strong> cultivar bananeiras, como até se <strong>de</strong>struiu<br />
grandiwima quanti<strong>da</strong><strong>de</strong> tl'estas arvores. Em Ma<strong>da</strong>gascar foi esta legislação<br />
aboli<strong>da</strong>, como tlissemos, em 1905.<br />
Na Africa Oric.nta1 Allemn. a fim <strong>de</strong> se evitar a vag,ibnn<strong>da</strong>gem em<br />
que ordinariamente vivem os carregiidores indigenas, lançou-se o imposto<br />
<strong>de</strong> uma riipia por viagem e por carregador. Este syãtema tem, segundo<br />
Reinsch, ar vantagens tlc geiieralisar o emprego <strong>de</strong> aniinaes <strong>de</strong> carga, <strong>de</strong><br />
fornecer um fundo especial para construcqáo <strong>de</strong> estra<strong>da</strong>s, e finalmente, <strong>de</strong>
1<br />
REGIWEN DA MAO D'OBRA LOCAL<br />
-<br />
prejudicar bastante os carregadores, obrigando-os a <strong>de</strong>dicar-se aos trabalhos<br />
agricolas.<br />
Para a provincia <strong>de</strong> S. Thomé e Principe foram em tempo <strong>de</strong>creta-<br />
<strong>da</strong>s, pelo Sr. Consrlheiro Ferreira do Amaral, leis espeeiaes para a repres-<br />
são <strong>da</strong> vadiagem. No Congresso Colonial <strong>de</strong> Lisboa, <strong>de</strong> 1901, o Sr. Francisco<br />
Mantero advogou a urgencia <strong>de</strong> se <strong>da</strong>r cumprimento integral a esstls leis<br />
e a conveniencia que haverib em torna-las extensivas á provincia <strong>de</strong> Angola.<br />
Na sua tliese <strong>de</strong>fendia-se a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> creaçzio <strong>de</strong> policia urllana e rural,<br />
applica<strong>da</strong> especialmente á perseguição dos vadios, e a instituiç~o <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>positos lienaes em ca<strong>da</strong> concelho para vadios incorrigiveis, aproveitando-se<br />
o tra1)allio d'elles em obras <strong>de</strong> estra<strong>da</strong>s e saneamento, sob a vigilancia<br />
e guar<strong>da</strong> <strong>da</strong>s respectivas auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s locaes administrativas oii rnili-<br />
tares.<br />
h'a these xv111 apresenta<strong>da</strong> rio referido Congresso pelo Con<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
Villa Ver<strong>de</strong>, e na qual se reclama para a Zamhezia em i<strong>de</strong>ntieos termos a<br />
repressão <strong>da</strong> vadiagem, estabelece-se a seguinte <strong>de</strong>finição : a: Serão consi<strong>de</strong>-<br />
rados vadios todos os pretos que não tiverem varzeas suficientes para a<br />
sua alimentação e <strong>da</strong>s suas familias, \)em como riquelles que forem apanha-<br />
dos em~flagrante <strong>de</strong>licto <strong>de</strong> roubo ás plantaçóes, o11 a cortar palmeiras, em-<br />
bora essas Ihes pertençam ».<br />
Quanto ri vadiagem no sul <strong>da</strong> provincia <strong>de</strong> Moçambiqiie, refere-se a<br />
ella o Sr. Conselheiro Freire d7Andra<strong>de</strong>, nos wgiiintes termos:<br />
«. . . Mas, tatnbem 6 preciso que se não consinta ao preto o viver sem<br />
trabalho e que a escravatura x que niio <strong>de</strong>ve ser submettido a imponha<br />
aos entes mais fracos <strong>da</strong> familia, para trabalharem para elle, como<br />
actualmente siici~~Zc, pois que a miilher B entre os indigenas o unico ente<br />
que trabalha e prodiiz tudo que ao consumo do homem se torne necessario.<br />
Se nas commilni<strong>da</strong><strong>de</strong>s civilisa<strong>da</strong>s a vadiagem & <strong>de</strong>licto, que n'aqiiella<br />
formar, não seja ella ri regalia do preto, e qiie uma senque<br />
sibili<strong>da</strong><strong>de</strong> entendi<strong>da</strong> náo siipponha ser escravatura a imposição do trabalho<br />
ao homem <strong>de</strong> cor, quando as circ~imstancias e a lei na0 permittem a<br />
ociosi<strong>da</strong><strong>de</strong> ao branco. As necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> civilisa~áo nas gran<strong>de</strong>s ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s,<br />
obrigam a duro e terrivel trabalho o homem, a mulher e até a CreanÇa
254 POLITICA INDIGENA<br />
branca do que aquelle que hoje B implorado e pago por elevado salario ao<br />
preto africano. Entre a escravatura e ti vadiagem ha um meio termo e to-<br />
dos 0s meios para acabar com esta, tomam para os que <strong>de</strong> longe vêem as<br />
coisa+ <strong>de</strong> Africit, o aspecto d'arliiella >. E~tas palavras sGo bastante expressivas<br />
e eloquentes para dispensarem todos os commentarios.<br />
Entretarito, convem accentuar que o omprego (te leis severas sobre<br />
a vadiagem po<strong>de</strong> trazer os mais serios inconvenientes. E realmente, se<br />
se <strong>de</strong>vem tolcrar religiosamente todos os costumes indigenas cjue nHo<br />
colli<strong>da</strong>m com os preceitos fiin<strong>da</strong>mentaes (1s lei moral, qiie nao sejam praticas<br />
tle cruel selv;tjeria, e <strong>de</strong> qiie n&o resultem perigos para a segurança<br />
polica dn colonia, mal se comprehentle que se vá interferir violentamente<br />
na intimi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>. fãmilia indigena, prohibindo abruptamente habitos ra-<br />
dicados por uma licreditarie<strong>da</strong><strong>de</strong> seculbr.<br />
Entre nds pune-se a vadiagem porque d uma excepçáo e pó<strong>de</strong> consi-<br />
<strong>de</strong>rar-se um <strong>de</strong>licto. Nas socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s indigenas que se entregam em gran<strong>de</strong><br />
ma9sa h. vadiagem, esta <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser acção <strong>de</strong>lict~iosa, para paasar a ser<br />
um costume, lamentavel 6 certo, mas apenas um costume que s6 se <strong>de</strong>ve<br />
fazer <strong>de</strong>sapparecer por processos lentos e suaves.<br />
Já, quando estudhmos o direito penal indigena, recoilhecemos que era<br />
indispensavel organisar uma lista especial <strong>de</strong> infraccúes, visto liaver <strong>de</strong>lictos<br />
dos brancos que o ii.&o s5o para os negros, e vim-versa.<br />
A app]icaç~o severa e integral d'uma lei d'esta natureza, ha-<strong>de</strong> fatal-<br />
mente occasionar injustiças flagrantes, como at6 na Enropa t8o frequente-<br />
rnent,e succe<strong>de</strong>, e po<strong>de</strong> <strong>da</strong>r origem A emigriiçáo em massa <strong>da</strong>s populaçúes<br />
indigenas para outrii.; colonias on<strong>de</strong> as <strong>de</strong>ixem viver tranqiiillas.<br />
Regulamentação dos contractos <strong>de</strong> trabalho. - To<strong>da</strong>s as medi-<br />
<strong>da</strong>s anteriormente tlescriptas, mais ou menos indirectamente coercivas,<br />
embora ten<strong>da</strong>m a facilitar o recrutamento <strong>da</strong> mgo d'olira, nno s&o sufficien-<br />
tes para aasrbgurar O trxbxllio continuo e estavel dos indigenas que é in-<br />
dispenàavel &ii explorli(;óes coloniaes.<br />
Para garantir permanentemente o numero <strong>de</strong> trabalhadores, tem <strong>de</strong>
REGIMEN DA -W&O D'OBRA LOCAL<br />
- -- 255<br />
- - -<br />
$e recorrer aos contractos <strong>de</strong> trabalho, validos por periodos relativamente<br />
longos, e que po<strong>de</strong>m ser individuaes ou collectivos.<br />
Aos colonos e á administracão é mais fàcil tratar directamente com<br />
bs chefes indigenas, e colonias ha em que os indigenas ou sO consentem<br />
em assalariar-se com auctorisaçáo do seu chefe, ou, como no Tonkin, s6<br />
reconhecem todo o valor e força dos contràctos quando estes tenham sido<br />
negociados e assignados em nome <strong>da</strong> collectivi<strong>da</strong><strong>de</strong> ajusta<strong>da</strong>, pelo chefe<br />
eleito ou nomeado (ia respectiva communa. N'estes casos é preferivel<br />
respeitar os costumes dos indigenas, conservando-lhes pelos contractos<br />
collectivos negociados com os seus chefes, as garantias em qiie elles <strong>de</strong>po-<br />
sitam mais confiança. (I)<br />
Mesmo na Europa, segundo mo<strong>de</strong>rnas i<strong>de</strong>ias socialistas, os contractos<br />
<strong>de</strong> trabalho collectivo celebrados por syndicatos profissionaes ou por<br />
associaçóes <strong>de</strong> producção, seriam consi<strong>de</strong>radoa como um progresso impor-<br />
tante sobre o contracto individual. To<strong>da</strong>via, nas colonias, o contracto colle-<br />
ctivo d& margem a injusticas e prepotencias, porque os chefes indigenas<br />
nSo se pren<strong>de</strong>m muito em substituir o livre consentimento dos interessados,<br />
pela propria irnposiçao auctoritaria.<br />
E' por isso que to<strong>da</strong>s as nações coloniaes teem procurado augmentar<br />
as garantias dos salariados, reconhecendo nas suas legislaçúes sbmente os<br />
contractos individuaes.<br />
A regulamentação d'estes contractos não po<strong>de</strong> ser uniforme, tem <strong>de</strong><br />
variar para ca<strong>da</strong> colonia, e mesmo em ca<strong>da</strong> colonia muitas vezes não po<strong>de</strong><br />
ser i<strong>de</strong>ntica para to<strong>da</strong>s as regiões. Seja quem fòr que <strong>de</strong>crete a lei, 6 con-<br />
veniente que ella seja elabora<strong>da</strong> localmente pelas auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s e pelos<br />
colonos que conhecem bem as condições locaes, e submetti<strong>da</strong> <strong>de</strong>pois á<br />
approvayáo clss instancias superiores.<br />
Todos estes regulamentos teem <strong>de</strong> conter claramente e especificar<br />
com rnini1ciosi<strong>da</strong>tte t1.j garantias que os contractantes mutuarnente se<br />
<strong>de</strong>vem oiithorgar, creando ao mesmo tempo em ca<strong>da</strong> colonia enti<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
I<br />
(1) Girault - O.<br />
-
256<br />
-<br />
POLITICA INDIGENA<br />
administrativas especiaes, a quem incumba a fiscalisaçiio rigorosa <strong>da</strong> letra<br />
dos contractos, c a averiguapão <strong>da</strong>s faltas que importem represslto disci-<br />
plinar ou acção juridica.<br />
E' indispensavel qiie os regiilarnentos estabeleçam com precisão a im-<br />
portancia e fdrina <strong>de</strong> pagamento dou salarios, o modo e a dura
REGI31ES l)d M ~ »'OBRA O LOCAL<br />
257<br />
-. - - -<br />
A viagem paga pelos donos (10s seringaes é-lhes lança<strong>da</strong> em divi<strong>da</strong>,<br />
e os assalariados eí, recuperam a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> trabalho quando satisfaçam<br />
essa importancia relativamente eleva<strong>da</strong>. Depois, tudo o que é necessario<br />
para viver e trabalhar, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a farinha <strong>de</strong> mandioca até aos proprios uten-<br />
silios <strong>de</strong> trabalho, 8-lhes fornecido pela administraçáo do seringal por<br />
preqos arbitrarios e, em regra, exhorbitante~. O resultado é que a divi<strong>da</strong><br />
cresce incessantemente, e a condiçáo dos paroaras assemelha-se notavel-<br />
mente á servidão perl~etua.<br />
Este systema está tambem em vigor em Java, on<strong>de</strong> os hollan<strong>de</strong>zes<br />
já o encontraram e on<strong>de</strong> tem sido successivamente modificado, e nas Pliilip-<br />
pinas, on<strong>de</strong> existia sob a dominação hespanliola, e on<strong>de</strong> os americanos o<br />
teem conservado.<br />
Na Africa Oriental Allemá o regulamento dos contractos <strong>de</strong> trabalho<br />
insere unia disposição preventiva, em que se estabelece que o assalariador<br />
não (leve adiantar em generos ou em dinheiro uma quantia superior ao<br />
vencimento d'um mez.<br />
Tudo quanto o indigena contractado receber além d'esta somma, não<br />
6 em caso algum consi<strong>de</strong>rado divi<strong>da</strong> sua, e o colono que o emprega não<br />
tem direito a exigir a menor in<strong>de</strong>mnisac,áo.<br />
A regulamentação dos coi~tractos <strong>de</strong>ve procurar crear uma Caixa<br />
<strong>de</strong> itssistencio Jnc!igenn», cujos fundos seráo em parte constituidos pelas<br />
multas disciplinares impostas aos contraventores, e pelos salarios em divi<strong>da</strong><br />
aos indigenas que <strong>de</strong>sertem, <strong>de</strong>signando-se claramente na letra <strong>da</strong> lei as<br />
condiçóes necessnrias para que a ausencia illegal possa ser classifica<strong>da</strong><br />
como <strong>de</strong>serçáo.<br />
O limite minimo <strong>da</strong> e<strong>da</strong><strong>de</strong> dos trabalhadores <strong>de</strong>ve ser previamente<br />
fixado em harmonia com o serviço a que se <strong>de</strong>stinam, evitando que os<br />
adolescentes sejam empregados em trabalhos violentos, incompativeis com<br />
as suas forças e prejiidiciaes ao seu <strong>de</strong>senvolvimento physico. E' indispensavel<br />
que a minuciosi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> regulamentação impeça to<strong>da</strong>s as frau<strong>de</strong>s dos<br />
angariadores e todos os abusos dos patróes, ~rocurando <strong>da</strong>r aos indigenas<br />
o conhecimento completo dos direitos que o contracto lhes reconhece, e<br />
garantindo-lhes o exacto cumprimento <strong>da</strong>s clausulas que se lhe referem.<br />
17
25s<br />
-.<br />
POLITICA INDIGENA -<br />
Sd assim o indigena e especialmente o negro adquirirá pei~ trabalho, o<br />
amor que, a todo o transe, E mister incutir-lhe. Charles Morisseaux escreveu<br />
a este respeito o seguinte : (,I) «Sem duvi<strong>da</strong> ao principio o indigena<br />
tinha repugnancia pelo trabalho. O negro que conserva to<strong>da</strong> sua vi<strong>da</strong> lima<br />
mentali<strong>da</strong><strong>de</strong> infantil c'! naturalmente preguiçoso como o sko muitas creanças.<br />
.Habituado a consi<strong>de</strong>rar o trabalho que fornecia ao branco, como uma<br />
maça<strong>da</strong> ou como iim imposto, nã.o imaginou <strong>de</strong> começo, que os seus serviços<br />
po<strong>de</strong>ssem ser leal e equitntivamente rernunerad.0~.<br />
-V<br />
RE(:I:~IEN DA IIÀO D'ORRA LOCAL 259<br />
contractantes que náio cumprem as clausulas dos seus contractos. Nas le-<br />
gislaçóes europeias, ás infracç6es aos contractos correspon<strong>de</strong>m apenas acçúes<br />
civis <strong>de</strong> per<strong>da</strong>s e <strong>da</strong>mnos - Ad fcrctum nelnn l)rcecise cogi potept. - Nas<br />
colonias a inefficacia <strong>da</strong> repressão <strong>da</strong>s infracçóes ao contracto <strong>de</strong> mão<br />
d'obra, por meio do processo civil, é <strong>de</strong> tal fúrma accentua<strong>da</strong>, qne as garan-<br />
tias reserva<strong>da</strong>s aos colonos sko, n'este caso, meramente theoricas. Por esta<br />
razáo, <strong>de</strong> ha muito tempo que, em todos os meios coloniaes, se tem apaixo-<br />
na<strong>da</strong>mente discutido se o náo cumprimento do contracto <strong>de</strong> mão d'obra por<br />
parte dos indigenas po<strong>de</strong>, ou não, ser consi<strong>de</strong>rado um <strong>de</strong>licto, e como tal<br />
importar sancçáo penal.<br />
No Instituto Colonial Internacional <strong>de</strong> Bruxellas foi esta questão<br />
longamente <strong>de</strong>bati<strong>da</strong> logo nas primeiras sessúes d'aqnella importante asso-<br />
ciação.<br />
Actualmente, quasi to<strong>da</strong>s as legislaçóes coloniaes admittem que a<br />
ruptura do contracto pelo indigena B um <strong>de</strong>licto penal. X'iim relatorio<br />
apresentado ao Congresso Colonial <strong>de</strong> Marselha <strong>de</strong> lC)O(i por Mr. Marcaggi,<br />
diz-se a este respeito o seguinte.<br />
a Pela nossa parte enten<strong>de</strong>mos, partindo do principio que náo existe<br />
o direito absoluto mas sómente o direito social, isto é, relativo e <strong>de</strong>pen-<br />
<strong>de</strong>nte do meio a que se applica, que o recurso á jurisdicção repressiva jus-<br />
tifica-se e impce-se o recurso ao juiz civil se prova ser inefficaz, e<br />
a contravenção á letra do contracto compromette a or<strong>de</strong>m geral e o inte-<br />
resse pblico. h preciso náo per<strong>de</strong>r <strong>de</strong> vista que a differença, niti<strong>da</strong> para<br />
nós, entre o direito civil e o direito penal, é milito menos sensivel para as<br />
socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s indigenas. Comprehenclemos perfeitamente que se <strong>de</strong>seje repellir<br />
a intervençko do Estado na regulamentação do trabalho, e collocar os<br />
contractos <strong>de</strong> máo d'obra sob o regimen do direito commum, conservando-<br />
]hes apenas o caracter <strong>de</strong> simples obrigaçóes civis, livres <strong>da</strong> tutella admi-<br />
nistrativa e <strong>de</strong>stitui<strong>da</strong>s <strong>de</strong> sancqóe-; coercivas. E o que actualmente<br />
acontece em Ma<strong>da</strong>gascar.<br />
260 POLITICA INDIGENA<br />
1<br />
se estas obrigaçóe~ forem estipuIa<strong>da</strong>s n'um contracto, E inadmissivel que<br />
o contracto s(; tenliã forya <strong>de</strong> lei para o assalariador e possa ser impunemente<br />
violado pelo salariado.<br />
«JIcm entendido, a possibili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s sancçóes penaes 6 mais um motivo<br />
para que a administraçáo local fiscalise vigilantemente a execução dos contractos<br />
<strong>de</strong> trabalho. Os agentes do Estado <strong>de</strong>vem certificar-se que, yllando<br />
um indigena sei ajusta, o faz no gozo <strong>da</strong> mais inteira liber<strong>da</strong><strong>de</strong>, e com a<br />
noção plena doa seus direitos e do alcance <strong>da</strong>s obrigaçóes que contrahe.<br />
Mas, sob estas reservas, uma vez celebrado o contracto <strong>de</strong>ve ser plenamente<br />
executado. Entretanto, as sancçóes penacs seriam ineficazes e náo<br />
conseguiriam o seu fim - que é servir <strong>de</strong> exemplo - se não fossem rapi<strong>da</strong>mente<br />
applicadb. Não B neces~ario, na nossa opinigo, que as sancçóes sejam<br />
severas, o essencial é que sejam inimediatas e sem tlispendio para a parte<br />
lesa<strong>da</strong> )) .<br />
Estes periodos con<strong>de</strong>nsam habilmente a doutrina dos que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m<br />
-- e são em gran<strong>de</strong> maioria - a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rar <strong>de</strong>licto penal, a<br />
ruptura do contracto pelo indigena e <strong>de</strong> estabelecer processos rapidos que<br />
tornem efficiente a repressão.<br />
Mas, admitticla a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> d'esta sancçiio, resta saber como e por<br />
quem terá <strong>de</strong> >('r applica<strong>da</strong> aos <strong>de</strong>linquentes. Um dos principaes inconvenientes<br />
do processo civil B a lentidáo <strong>da</strong> justiça. Ora, se nas colonias os<br />
po<strong>de</strong>res administrativo e judicial estiverem separados, o processo criminal,<br />
nem ser6 mais rapido, nem <strong>da</strong>r& melhores resultados praticos. As complicaçóes<br />
<strong>da</strong> instriicç50 judiciaris, os systemas <strong>de</strong>feituosos <strong>de</strong> informação, a<br />
difficul<strong>da</strong><strong>de</strong> em I,rt~ncler o <strong>de</strong>linquente quando fiigitivo, agora accresci<strong>da</strong><br />
com o resultado [Ia intimi(lação produzi<strong>da</strong> ela penali<strong>da</strong><strong>de</strong> incorri<strong>da</strong>, são<br />
motivos <strong>de</strong> sobra para tornar quasi nulla a acção <strong>da</strong> justiça, e, por assim<br />
dizer, !garantir a impuni<strong>da</strong><strong>de</strong> do infractor.<br />
0 i<strong>de</strong>al seria a concentração <strong>da</strong>s jurisdicçóes administrativa e judi-<br />
ciaria na alça<strong>da</strong> do mesmo funccionario ; mas, quando assim não aconteça,<br />
6 iirgente simplificar bastante as formali<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> instrucção, <strong>da</strong>ndo ao co-<br />
lono ou a quem quer que seja que conheça o <strong>de</strong>linquente, o direito <strong>de</strong> o<br />
pren<strong>de</strong>r on<strong>de</strong> o encontrar, entregando-o á justiça.
1- ,7<br />
REGIMEN DA MA0 D'OBRA LOCAL<br />
- -- - --<br />
S i India Ingleza, se um trabalhador contractado <strong>de</strong>serta, o patrao ou<br />
qualquer outra pessoa em seu nome pó<strong>de</strong> pren<strong>de</strong>r o <strong>de</strong>sertor em qualquer<br />
parte on<strong>de</strong> o encontre sem prece<strong>de</strong>ncia <strong>de</strong> man<strong>da</strong>to <strong>de</strong> prisão o11 11e intervenção<br />
directa <strong>da</strong> auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>. Para effectuar e manter a prisáo, os agentes<br />
<strong>da</strong> auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong>vem prestar todo o auxilio que lhe fòr solicitado pelo patrão<br />
do <strong>de</strong>linquente que, em segui<strong>da</strong> á captura, <strong>de</strong>ve ser entregue ao magistrado<br />
mais proximo. Quando iim patráo se queixa d'iim indigena á auctori<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
competente, esta. sem ouvir o queixoso, pó<strong>de</strong> citar a comparecer,<br />
ou mesmo encarcerar preventivaniente o infractor, marcando immediatamente<br />
o dia para o julgamento.<br />
Esta disposiçáo sobre a prisáo preventiva, evitando que o indigena se<br />
escon<strong>da</strong> ou fuja antes do jiilgamento, e facilitando a sua captura quando<br />
se tenha evadido, concorre evi<strong>de</strong>ntemente para contrabalançar os vagares<br />
<strong>da</strong> justiça on<strong>de</strong> elles existam, o que n5o acontece na Indin Ingleza on<strong>de</strong>,<br />
como dissdmos, as aiictori<strong>da</strong><strong>de</strong>s administrativas tem competencia repressiva<br />
e a fórma do processo é bastante simples.<br />
To<strong>da</strong>via, corno a fuga do indigena contractado pó<strong>de</strong> ser causa<strong>da</strong> por<br />
qualquer abuso <strong>de</strong> qiicm o emprega, é necessario garantir cui<strong>da</strong>closaniente<br />
os direitos dos assalariados. -4 referi<strong>da</strong> legislaqáo anglo-indiana, estatue que<br />
quando no julgamento d'um indigena preso por <strong>de</strong>sertor, o juiz se convencer<br />
<strong>de</strong> que essa prig&o náo foi sufficientemente motiva<strong>da</strong>, pó<strong>de</strong> inflingir uma<br />
multa ao patrao ou a quem em seu nome capturoli o fugitivo.<br />
Tem-se <strong>de</strong>fendido a creação d'um tribunal especial <strong>de</strong> arbitragem,<br />
composto d'iim f~inccion~rio superior e <strong>de</strong> assesjores europç.ii3 e iiicligena*.<br />
on<strong>de</strong> a fórma cio processo se,ja simplificadissima, e que se <strong>de</strong>stine exclusivamente<br />
á <strong>de</strong>rimencia <strong>da</strong>s qnestBes relativas ao cumprimento tios contractos<br />
tle ma0 d'obra. Em Pula<strong>da</strong>gascar foram inetitiiidos em 22 d'oiit~ibro <strong>de</strong><br />
1906 tribunaes d'este genero, chamados consellto.; (Ir, nrbitrrly~irz. on<strong>de</strong> a fórma<br />
do processo t': snmmaria e as acçqes são gratuitas. Compóe-se ca<strong>da</strong><br />
conselho, segundo Girault, <strong>de</strong> tres membros : G chefe <strong>da</strong> provincia ou districto,<br />
presi<strong>de</strong>nte ; um a.;.;essor francez eleito pela Camara Consultivc~ ; e um<br />
assessor indigena nomeiado pelo governador geral.<br />
As funcçúeic (10s assessores sao gratuitas. A náo execução pelo indi-<br />
261
262 POLITICX ISDIGEKA<br />
-- - - - - .-<br />
gena <strong>da</strong>s obrigaçóes peciiniarias oii em generos, a que tiver sido con<strong>de</strong>mnado<br />
pelo conselho <strong>de</strong> trrln'trtrgcitz, torna-o passivel <strong>de</strong> prisko por divi<strong>da</strong>s,<br />
cuja (liiracão ser& previamente fixa<strong>da</strong> em ca<strong>da</strong> sentença. iiiinca po<strong>de</strong>ndo<br />
esce<strong>de</strong>r um mez <strong>de</strong> ctircere.<br />
Examinemos agora rapi<strong>da</strong>mente a natureza <strong>da</strong>s penali<strong>da</strong><strong>de</strong>s impostas<br />
aos indigenas que não cumprem as clansulas do contracto <strong>de</strong> trabalho.<br />
Nas colonias inglezas <strong>da</strong> Africa do Sul, on<strong>de</strong> vigora o systema do<br />
contracto penal, são muito variaveis as penali<strong>da</strong><strong>de</strong>s e as medi<strong>da</strong>s preventivas.<br />
Nas minas <strong>de</strong> diamantes <strong>de</strong> Kimberley, para evitar o roubo <strong>da</strong>s<br />
gemmas, sáo os indigenas, to<strong>da</strong>s as noites, <strong>de</strong>pois do trabalho, encerrados em<br />
gran<strong>de</strong>s <strong>de</strong>positos-prisóes. No Congo belga a riiptiira do contracto é puni<strong>da</strong><br />
com miilta até 500 francos e com prisão até seis mezes.<br />
Nas colonias allemás <strong>da</strong> Africa, segundo Reiriscli e Leo, as penali<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
impostas aos indigenas contractados, culpados <strong>de</strong> preguiça, insiibordinaçiio,<br />
ausencia ou <strong>de</strong>serqiio, consistem em multas muito variaveis, prisáo<br />
isola<strong>da</strong> e castigos corporaes. O infractor é julgado por iim official com<br />
competencia disciplinar. A fiistigacko, que pó<strong>de</strong> ir atd vinte e ciiico chibata<strong>da</strong>s,<br />
<strong>de</strong>ve ser applica<strong>da</strong> em presença d'um official, oii d'nm colono europeu<br />
expressamente nomeiado para esse fim.<br />
Em quasi to<strong>da</strong>s as colonias que estabelecem sancyáo penal para as<br />
infracçóes ao contracto <strong>de</strong> t,rabalho, não se exige para consi<strong>de</strong>rar <strong>de</strong>lictuosa<br />
a infraccáo, qiie sc prove ter o indigena acceitado o contracto com intençáo<br />
fraudulenta.<br />
Nas Indias Orientaes Neerlan<strong>de</strong>zas, on<strong>de</strong> até 1879 to<strong>da</strong>s as infracqóes<br />
eram puni<strong>da</strong>s com penas pecuniarias ou com prisáo, substituiram-se, <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />
essa <strong>da</strong>t~, essas penali<strong>da</strong><strong>de</strong>s pela <strong>de</strong> trabalho forçado at6 seis mezes, mas<br />
sb no caso em que se <strong>de</strong>monstre ter o indigena celebrado o respectivo<br />
contracto, com a intenc;áo previa <strong>de</strong> <strong>de</strong>frau<strong>da</strong>r os interesses do patráo.<br />
Em to<strong>da</strong>s as outras hypotheses a acção limita-se, n'aqiiellas colonias,<br />
a fixar uma in<strong>de</strong>mnisayáo <strong>de</strong> per<strong>da</strong>s e <strong>da</strong>mnos. As acçóes criminaes intenta<strong>da</strong>s<br />
contra os indigenas contractados <strong>de</strong>vem ser leva<strong>da</strong>s aos tribiinaes<br />
regulares.
Sejam por4m quaes foreili as regulameritaçúes do contracto <strong>de</strong> traba-<br />
lho, ellas náo <strong>de</strong>vem por fdrma alguma impedir que, a par do trabalho<br />
regulamentado, subsista o regimen puro do trabalho livre, livremente con-<br />
tractado entre as partes interessa<strong>da</strong>s, segundo os costuines locaeu e o di-<br />
reito commum.<br />
A ver<strong>da</strong><strong>de</strong> 6 que se obtem bem mais do trabalhador indigena pela<br />
peraiiasáo do que pelas ameaças. E freqiientissimo <strong>de</strong>pararem-se-nos nas<br />
colonias emprezas collectivas, ou exploraqóes individuaes, a que nunca fal-<br />
tam brayos laboriosos, ao passo que outras, apparentemente em egual<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> circumstancias, liictam com as maiores difficiil<strong>da</strong><strong>de</strong>s para obter a mão<br />
d'obra <strong>de</strong> que carecem. É que o conhecimento profundo <strong>da</strong> psycliologia in-<br />
digena é uma arma muito mais vantajosa que qiiantas clausulas coercivas<br />
se inventem.<br />
O regimeii do contracto livre tem Lima influencia ediicativn muito<br />
superior á do coritracto regulamentado. O contracto regulamentado não<br />
<strong>de</strong>ve ser impc,si(:5o geral em to<strong>da</strong> a colonia. & conveniente permittir que<br />
os colonos que meltior <strong>de</strong>monstrem conhecer e saber li<strong>da</strong>r coni os indigenas,<br />
possam effectuar livremente os seus contractos que result,aráo, em regra,<br />
muito mais vantajosos para ambas as partes contractantes. Qiiantas vezes<br />
não tem acontecido, fixarem-se in<strong>de</strong>fini<strong>da</strong>mente os indigenas, como emprega-<br />
dos d'uma certa empreza colonial que llies p6z ao alcance os artigos que<br />
elles mais usam e os divertimentos que mais apreciam? (I)<br />
O coronel Tliys, n'iima communicac;áo ao Instituto Colonial Jnterna-<br />
cional <strong>de</strong> Bruxellas, disse o seguinte :<br />
E preciso persuadirmo-nos que tratamos com seres humanos em que<br />
se não pó<strong>de</strong> <strong>de</strong>slocar um gozo oii uma satisfayão sem se substituir por outra<br />
satisfaqáo. O que E preciso é substituir o gozo <strong>da</strong> preguiça por qualquer<br />
outro gozo maior ..<br />
Isto que niio 6 mais do que um enunciado feliz <strong>da</strong> lei <strong>de</strong> substituição<br />
<strong>da</strong>s necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s, <strong>de</strong>monstra o conhecimento nitido <strong>da</strong> fhrma psycliica dos<br />
indigenas.<br />
(I) Congris Colonial <strong>de</strong> iWarseille. 1906. (Relatorio <strong>de</strong> hIr. Marcagpi).
POLITICA INDIGES.4<br />
No Chin<strong>de</strong> tivemos em 1907 occasião <strong>de</strong> verificar que um dos effeitos<br />
<strong>de</strong> um ccrrroussel gigantesco que alli permaneceu dois mezes e enthusiasmou<br />
os indigenas, foi a maior regulari<strong>da</strong><strong>de</strong> com que passou a trabalhar o pessoal<br />
indigena <strong>da</strong>s Officinas Navaes <strong>da</strong> Esquadrilha <strong>da</strong> Zambezia. Desejosos <strong>de</strong><br />
obter dinheiro para gastar no refcrido divertimento, os operarios indigenas<br />
buscavam não per<strong>de</strong>r um sd dia <strong>de</strong> salario.<br />
O systema do trabalho regulamentado pcí<strong>de</strong> e <strong>de</strong>ve ser tolerado pro-<br />
visoriamente, mas o i<strong>de</strong>al para que <strong>de</strong>vem convergir todos os esforços, é o<br />
do ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro regimen <strong>de</strong> trabalho livre, unico <strong>de</strong> que no futuro se p6<strong>de</strong><br />
. esperar uma collaboraçáo friictiiosa e duractonra entre o elemento coloni-<br />
zador e os indigenas.<br />
Regimen <strong>da</strong> mão d'obra local nas colonias portuguezas<br />
Nas colonias portuguezas, contrariamente ao que acontece na gran<strong>de</strong><br />
maioria dos estabelecimcntos coloniacs pertencentes a outras naçóes, a mão<br />
d'obra indigena raras vcze* fR1t;i. Ain<strong>da</strong> que a sua <strong>de</strong>nsi<strong>da</strong><strong>de</strong> seja inferior<br />
& <strong>da</strong>s populaçBes <strong>da</strong> Europa, os indigenas <strong>da</strong> nossa Afiica são bastante<br />
numerosos para proverem amplarilente ás esigencias actuaes do trabalho, e<br />
naturalmente SI:-10-háo ain<strong>da</strong>, quando o progresso material <strong>da</strong>s nossas pos-<br />
sessóes ultramtirinas attingir um grau mais elevado. O problema do tra-<br />
balho indigena, \e nko tem, pois, para Portugal as caracteristicas irritantes<br />
e <strong>de</strong>sanima dor:^, qiie a
- --___C<br />
REGIMEN DA MÃO D'oR~~A LOCAL<br />
_.I-- _<br />
ganisaçáo social, ter& por effeito principal garantir o exito <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as<br />
exploraçiws coloniaeu.<br />
1)es<strong>de</strong> a lei lihcrtatlora <strong>de</strong> 29 d'abril <strong>de</strong> 1875, codifica<strong>da</strong> no <strong>de</strong>creto<br />
<strong>de</strong> 20 (I(* <strong>de</strong>zembro do mesmo iinno, pelo qual se assegurou e garantiu a<br />
liher<strong>da</strong><strong>de</strong> dos indigenas, diversas teem sido as medi<strong>da</strong>s adopta<strong>da</strong>s pelo<br />
governo portuguez para permittir e facilitar nas colonias o recrutamento<br />
<strong>da</strong> máo d'obra necessaria ás obras publicas e ás emprezas agricolas e industriaes,<br />
salvaguar<strong>da</strong>ndo cui<strong>da</strong>dosamente os direitos dos indigenas e garantindo-lhes<br />
uma protecção eficaz. C) <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 20 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1875<br />
foi seguido dos diplomas iriterpretativos <strong>de</strong> 26 <strong>de</strong> jullio <strong>de</strong> 1876 ; <strong>de</strong> 28 <strong>de</strong><br />
ft>vrrcbiro, 1 e 20 <strong>de</strong> março, 12 <strong>de</strong> junho, 7 <strong>de</strong> julho, 17 <strong>de</strong> novembro e 11<br />
<strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1877. Em 21 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1878 promulgou-se o regulamento<br />
geral para o rccrntamento <strong>da</strong> m&o d'obra indigena, a quc se seguiram<br />
os regulamentos <strong>de</strong> 17 d'agosto tle ISSO para S. Thomé, e <strong>de</strong> 25<br />
tle maio <strong>de</strong> 1881 para SIoçanibiqiie, clel)c,i* ;~riil)liaclos e explicados pelos<br />
<strong>de</strong>cretos <strong>de</strong> 29 <strong>de</strong> janeiro e 5 <strong>de</strong>jullio <strong>de</strong> 18X:3, clr 26 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1889,<br />
e <strong>de</strong> 10 d'agosto <strong>de</strong> lS!):l. Em 26 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1899, sendo ministro do<br />
Ultramar o Sr. Cons~lheiro Eduardo Villaça publicou-se um importante<br />
diploma regiilamentaiido o trabalho indigena, e estabelecendo o trabalho<br />
obrigatorio. N'esse <strong>de</strong>creto se reconhece qiie clestle muito tempo, havia<br />
necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> regular <strong>de</strong>tinitivamente, no interesse <strong>da</strong> civilisaqao e do<br />
progresso <strong>da</strong>s colonias, as condiçúes <strong>de</strong> trabalho dos indigenas, <strong>de</strong> modo a<br />
assegurar-lhes com fficaz protecçáo e tutella, um proporcional e<br />
<strong>de</strong>senvolvimento mo a1 e intellectual que os torne cooperadores uteis d'uma<br />
1<br />
exploração mais ampla e intensa <strong>da</strong> terra, <strong>de</strong> que essencialmente <strong>de</strong>pen<strong>de</strong><br />
o augmento <strong>da</strong> nossa riqiieza colonial. w<br />
É conveniente estu<strong>da</strong>r, nas suas linhas geraes, esse importante di-<br />
ploma.<br />
*<br />
O <strong>de</strong>creto comera por <strong>de</strong>clarar que todua o, iiidigcrias <strong>da</strong>s colonias portuguezas são su-<br />
jeitos á obrigação moral e legal <strong>de</strong> prociirar adquirir pelo trabalho os meios que lhe faltem <strong>de</strong><br />
subsistir e melhorar a propria condiçXo social. Teem plena liber<strong>da</strong><strong>de</strong> para escolher o modo <strong>de</strong><br />
265
POLITICA INDIGENA<br />
cumprir essa obrigaçiío; mas se a não cumprem <strong>de</strong> nenhum modo, a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> publica p6<strong>de</strong><br />
impor-lhes o seu cumprimento Esta ohrigaçüo julga-se cumprid;i :<br />
r .o Pelos indigcnas iliie possuaii capital ou proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> cujos rendimentos Ihes asseprem<br />
meios <strong>de</strong> subsisteiici:~, ou que exercerii habitualmente commercio, industria, profissão liberal,<br />
arte, officio ou mi.ter <strong>de</strong> cujos proventos po<strong>de</strong>m tirar eisa siibsistencia.<br />
2.0 Pelo\ que ])ersistentriiic~ntr ciiltivnm por conta propria parcellas
Ob contractos <strong>de</strong> ~.>rest:i@o (Ic ser\ili,s dos iiidigenas po<strong>de</strong>ni scr feitos sein interveriçáo <strong>da</strong> auctori<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
publica ou coni iiitervenyao d'ella. So primeiro caso, se algum dos coiitractantes <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong><br />
cumprir as condiçóei njiiitnrlas, o outro sh terá acc5o contra clle nos termos <strong>da</strong> legislaç50 geral.<br />
Quanclo porkin os coniriictos tiverem sido cele1)r:ido~ coni a iiitervenção e a sancfio .<strong>da</strong> auctori<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
comperente, essa auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> iiiter\iri taml~eni. 1rni.n assegiirar o cumpriiiieiito, oii para<br />
punir o náo cumprimento <strong>da</strong>s siias clausulas.<br />
As unicas auctori<br />
intervirão em contractos dr prestações <strong>de</strong> serviço, a pedido <strong>da</strong>s diias partes, e <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> se terem<br />
certificado <strong>de</strong> que ambas elltis consentem livremeiite ein to<strong>da</strong>s as clausulas a que ficam obriga<strong>da</strong>s.<br />
Recuzar-se-hão a fazer lavrar e a sanccioiiar todos aqiielles em que houver causa <strong>de</strong> nulli<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
e us que n%o contiverem estipulaqões claras e expressas regulando: o periodo nunca superior<br />
a 5 annos durante o qual a prestaçso <strong>de</strong> serviço e otrrigatoria; a natureza do serviço; a retribiiiy?o<br />
riii diiilieiro; o local ou locaes em que o serviço <strong>de</strong>ve ser prestado.<br />
Além d'estas clausiilas, todos os contractos <strong>de</strong> tral>a:ho ein que intervenha a aiictori<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />
<strong>de</strong>veni conter outras que obriguem os patrões: a soccorrer oii n man<strong>da</strong>r tratar o serviçal; a<br />
prover L subsisteiicia do serviçal :i custa <strong>da</strong> sua sol<strong>da</strong><strong>da</strong>, iio caio cle crise alimenticia no local<br />
on<strong>de</strong> ellc servir: a <strong>da</strong>r-lhe alojamento hygienico e alimentação caii<strong>da</strong>vel e abun<strong>da</strong>nte se estiver<br />
estipulado aloja-lo e sustenta-lo; a abster-se esciupulosamente <strong>de</strong> coriipelli-lo por meios directos<br />
OU indirectos, a comprar-lhe, ou a coniprar n agentes seu.lica, si1 terão sobre elles e contra elles os direitos e a acção que<br />
lhe conferirem as disposiçges do Codigo Civil.<br />
Os curadores dos serviçaes e colonos, terão competencia para julgar e punir niediante<br />
processo siimmario, ciijos termos seráo regulados, rs segiiintes faltas <strong>de</strong> cumprimento por parte<br />
dos patrões e dos serviçaes <strong>da</strong>s ol>rigações dos seus contrnctos celebrados com intervenção <strong>da</strong><br />
auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> pub!ica.
268<br />
?-m"<br />
POLITICA INDIGCENA<br />
- --<br />
I o por parte dos patrões :<br />
a) Falta <strong>de</strong> pagamento <strong>da</strong>s retribiiições <strong>de</strong>vi<strong>da</strong>s aos serviçaes.<br />
b) Deteiiqão força<strong>da</strong> dos serviyaen, quando haja fin<strong>da</strong>do o seu tempo obrigatorio <strong>de</strong><br />
serviço ou elles tedhain causa justa par;i >e <strong>de</strong>spedireiii.<br />
C) Quandd n8o prcii<strong>da</strong>iii c iiiiiiiediatamente entreguem i :iilctori<strong>da</strong><strong>de</strong> administrativa os<br />
indigenas reiis <strong>de</strong> <strong>de</strong>lictos periaes.<br />
dj Maiis tratos inflingiclos aui serviçaes quando não tenham prodiizido impossibili<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> trabalho.<br />
e) Qiian(1o ol~rigiiciii o> indi~enas a serviços <strong>de</strong> natureza differente <strong>da</strong> prevista do<br />
contracto.<br />
2.0 Por parte dos serviy:it.s:<br />
n) Evasão nâo legitiiiia<strong>da</strong> por causa justa <strong>de</strong> <strong>de</strong>spedimento.<br />
6) Kecusa <strong>da</strong> prestaçàc~ <strong>de</strong> trabalho.<br />
c) 1)esobadiencia contuni;ia oii insubordinaç80 não ncomparih:i~las clc aggressões pessoaes<br />
ou <strong>da</strong>inno cniis;i
REGIMEN DA MAO D'OBRA LOCAL<br />
-<br />
0s indigenas que <strong>de</strong>sobe<strong>de</strong>cem d intimação e resistem i ncqgo compills,>rin tornando-as<br />
inefficazes, os que se eva<strong>da</strong>m do Jogar on<strong>de</strong> trabalham compellidos, ou a carriinho para esses<br />
logares, os que apresentados aos patrões se recusarem d prestação <strong>de</strong> trabalho, serão eiitregues<br />
ao czrrador rios servi'crcs e colonos <strong>da</strong> comarca, oii 3 alguni do, seus <strong>de</strong>legados, para serem con<strong>de</strong>m-<br />
nados a trabalho correccioiial. Para proporcioii:ir tr:ilnlho aos iiidigenas que o l:ão I,rocliram, os<br />
funccionarios dirigindo obras publicas, os iiiuiiicipios, e os particulares I > ~ > < i.eqliisitar I ~ ~ ~ ~ auctori<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
administrativa que ponha 3 sua diq)osiyão um certo numero <strong>de</strong> iiitligenas intimados e<br />
compellido5 a ciiiiil,rireiii a obrigação <strong>de</strong> trabalho. To<strong>da</strong>s as requisir;ões <strong>de</strong> serviçaes, quer para<br />
$erviço ~x~blico ~ i riiilriicipal, i quer, para serviço particular, serao feitas por escripto e conterão as<br />
seguintes iiidicn$Sc>:<br />
I .o Numero <strong>de</strong> serviçses a fornecer.<br />
2.0 Logar ou logares em que serão empregados.<br />
3.0 Natureza do scrviço a exigir d'elles.<br />
4.0 Tempo durante o qual o requisitante se obriga a emprega-10s.<br />
As requisições para serviço particular só po<strong>de</strong>m ser feitas por proprietarios oii ;irreii<strong>da</strong>ta.<br />
rios <strong>de</strong> terrenos, <strong>de</strong>stina<strong>da</strong>s a cultura <strong>de</strong> não menos <strong>de</strong> 10 hectares <strong>de</strong> extensão, por industriaes<br />
ou commerciantes estabelecidos, ou pelos seus gerentes e feitores.<br />
A seguir, o <strong>de</strong>creto estabelece claramente quem não po<strong>de</strong> requisitar serviçaes para trabalho<br />
compellido e quaes os casos em que essas requisições não po<strong>de</strong>m ser satisfeitas.<br />
As :iuctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s administrativas <strong>de</strong>verão, quanto possivel, servir-se <strong>da</strong> intervenr;ão <strong>da</strong>s<br />
auctori<strong>da</strong>dcs iiidigcnas - regulos, sobas, cabos, etc. - tanto para reconhecer os indigenas que<br />
n%o cumprem a obrigapo rle trabalho, como para os intimar e compellir a cumprirem-na.<br />
Antes <strong>de</strong> apresentar os serviçaes ao reqiiisitarite a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> que satisfizer a requisiçk<br />
fa-10 assignar um termo, lavrado perante testemunhas, erii que elle se obriga expressamente :<br />
1.0 A pagar aos serviçaes a sol<strong>da</strong><strong>da</strong> que fOr previniiieiite fixa<strong>da</strong> e que <strong>de</strong>ve ser em media<br />
equivalente i que n'essa locali<strong>da</strong><strong>de</strong> se pagar nos scrvierviço<br />
f6r particular não serA <strong>de</strong> menos <strong>de</strong> 3 mezes nem mais <strong>de</strong> 5 annos.<br />
6.0 A apresenta- 1 os, pagando as <strong>de</strong>spezas <strong>de</strong> transporte, a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> que os tiver fornecido,<br />
qvando elles tiverem acabado o tempo <strong>de</strong> serviço ou no caso <strong>de</strong> inhabilitarem.<br />
7.* A não >e os serviços tiverem <strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar a sua habitual resi<strong>de</strong>ncia, a que as<br />
familias os acompanheiii e vi\.a~ii com elles.<br />
8.0 Caso elles <strong>de</strong>tiiii~ saliir <strong>da</strong> sua resi<strong>de</strong>ncia e não queiram ou não possam fazer-se<br />
:icompanh:ir ~>el:is faiiiilias, :i adiantar-lhes, por conta <strong>da</strong>s sol<strong>da</strong><strong>da</strong>s, unia quantia que os regulamentos<br />
locaes finarão.<br />
9.O A ciimprir<br />
1<br />
preceitos dos contr;ictos <strong>de</strong> trabalho que estabelecem a prohibiqão <strong>de</strong><br />
reter os salarios sob qua quer pretexto, e <strong>de</strong> compellir os indigenas a comprar aos patrões os<br />
artigos <strong>de</strong> que <strong>de</strong>sejam fo necer-se.<br />
10.0 A não ced r a outrem, gratuita ou kmunera<strong>da</strong>mente, o trabalho dos serviçaes<br />
compellidos, sem previa aiictorisação <strong>da</strong> auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> administrativa.<br />
Os patrões a quem fugirem os serviyaes compellidos <strong>de</strong>verao participar irninediatamente a<br />
sua fuga i auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> administrativa que tiver jurisdicçiio na locali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> on<strong>de</strong> elles tiverem fu-<br />
269
270 POLITICA INDIGENA<br />
- -<br />
gido; fakando essa participaçLo sem motivo justificado. o serviçal que fOr encontrado a trabalhar<br />
para qunlqiier individuo qùe não seja o qiie o tiver requisitado, será consi<strong>de</strong>rado coino cedido.<br />
E, se a referi<strong>da</strong> pnrtici1)ni;ão f«r t1olos:i e <strong>de</strong>stina<strong>da</strong> a encobrir a ce<strong>de</strong>ticia, o cessionario será castigado<br />
com o iii.isiiiio <strong>da</strong> pena applic;ivel a e*i:i ce<strong>de</strong>i1c:i.i.<br />
Oi curadurei dos serviçaes e coluiioj tccni iiina coriipetencia jiiridica, para julgar as faltas<br />
do5 patrões e dos serviçaes conipellidos, an;iloga R qiie rcferiiiios no caso dos trabalhadores contractados,<br />
as pennli<strong>da</strong>ilei appIicnveis aos patr0cs sLo i<strong>de</strong>nticas, e as que se applicam aos indigenas<br />
po<strong>de</strong>in ir até 300 dias <strong>de</strong> trabnllio correccioiial.<br />
A pena ds trabnlho correcciirnal i: seiiipre inaiid:i<strong>da</strong> applicar por urn certo numero <strong>de</strong> dias<br />
r'<br />
iiteis <strong>de</strong> trabalho, não se consi<strong>de</strong>rará ciinipritla emquanto o con<strong>de</strong>mnado não tiver, seja por que<br />
motivo iOr, trabal ado effectivamente n'esies dias todos.<br />
Os iiidigen s coii<strong>de</strong>mnados a trabalho correccional serão siisteiitatlos ou alojados pelo Estado,<br />
ou pelo niuqicipio que os empregar, e receber50 salario em dinheiro correspon<strong>de</strong>nte á terça<br />
parte <strong>da</strong> retrihuiçqo que se :ihon.ir aoi serviçaes coinpellidos. Quando o Estado e os municipios<br />
não pu<strong>de</strong>rem empilegar os iiiiligeriiis coii<strong>de</strong>mnad/os a trabalho correccional, po<strong>de</strong>r50 elles ser obri-<br />
gados a servir partlciilares qiie os reqiiisitarem $ara servipes.<br />
0s particulares quc enipreprem indigenns coii<strong>de</strong>iiinados :i trabalho correccional, obrigarçe-hao<br />
para com a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> qiie Ih'os fornecer, a :ipre>entbr-lli'os no fini do tetnpo <strong>de</strong> serviço,<br />
ou qiiando elln exigir, sob pena <strong>de</strong> pagar cem mil rei5 t 1 iniilta ~ por ca<strong>da</strong> um que nLo tenha mor-<br />
A curat-lla dos indigerins iriciirnbe no (.t/t-
--<br />
IREGIMEN DA a0 ~.)'OBRA LOCAL 871'<br />
trahnllzo obrigatorio por contructo liure; trabalho obri,qntorio por contracto<br />
regzclamentado; trabalho compellido; e trnballw corr~ccionul. Isto 6, o tra-<br />
balho para o indigena começa por ser unia obriga@.o exagera<strong>da</strong>, passa a<br />
ser lima coaccáo cii*ja justificação elles nunca po<strong>de</strong>m vir a comprehen<strong>de</strong>r,<br />
e termina por constituir uma penali<strong>da</strong><strong>de</strong> qiie vae atB ao <strong>de</strong>spropositado<br />
aastigo ds trexentgs dias <strong>de</strong> trabalho correccional. aggravado ain<strong>da</strong> com<br />
a disposiyko iniqua que man<strong>da</strong> apenas contar os dias uteis <strong>de</strong> trabalho, o<br />
que pO<strong>de</strong> representar para o indigena alguns annos <strong>de</strong> captiveiro. Parece-<br />
nos que náo será por esta f~írma, que se rddicarC na alma indigena o<br />
ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro conhecimento do que representa <strong>de</strong> nobre e <strong>de</strong> alevantado o<br />
<strong>de</strong>ver do trabalho. Uma <strong>da</strong>s disposiçóes do <strong>de</strong>creto que mais con<strong>de</strong>mnavel<br />
se nos antolha, 6 a que permitte a utilisaçÃo tlo trabalho obrigatorio,<br />
compellido e correccional no serviço <strong>de</strong> particulares.<br />
E' geralmente sabido que, nem ha verbas <strong>de</strong> obras publicas, nem<br />
cofres <strong>de</strong> muniçipios coloniaes que permittam remunerar <strong>de</strong>vi<strong>da</strong>mente<br />
todos os indigenss passiveis <strong>de</strong> trabalho obrigatorio, mas isso c! apenas<br />
uma razáo para os <strong>de</strong>ixar tranquillos, e não para facultar aos particulares<br />
a utilis;i(;,%o clas prestaçóes <strong>de</strong> trabalho que, só po<strong>de</strong>ndo tolerar-se como<br />
imposto publico, B immoral que vão beneficiar simples pa.rticulares. De<br />
resto, os abusos por estes commettidos, e <strong>de</strong> que, nem o legislador, nem<br />
militas vezes as auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s locaes, teem a minima responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong>, são.<br />
siisceptiveis <strong>de</strong> nos <strong>de</strong>sacreditar aos olhos do mando civilisado, sempre<br />
prornpto n imputar á nação o que B só crime ganancioso ou vileza <strong>de</strong><br />
instincto, d'iim ou d'oatro ru<strong>de</strong> mercante ou plantador sertanejo. E' indis-<br />
pensavel que os patrões não possam punir os seus serviçaes contractados.<br />
Longe <strong>de</strong> nós repellir a pratica dos castigos corporaes mo<strong>de</strong>rados que, por.<br />
emquanto, reputamos necessarios e condizentes com o nivel moral dos indi-<br />
genas africanos, mas esses, oii outros qiiaesquer castigos, só <strong>de</strong>vem po<strong>de</strong>r<br />
ser applicar pelos curadores ou pelas auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s administra-<br />
tivas. B dioposição que estabelece que os indigenas quando terminem o<br />
ciimprimento <strong>da</strong> pena correspon<strong>de</strong>nte ao <strong>de</strong>licto <strong>de</strong> evasão, seráo man<strong>da</strong>dos<br />
novamente entregar ao respectivo patráo, não se limita aos casos em que<br />
o ser\+$ jb trabalhava compellido ou por imposição correccional, e vae
272 POLITZCA INDIGENA I<br />
---- --<br />
i<br />
atC ao contra-senso <strong>de</strong> se applicar ao indigena que trabalhava por simples<br />
contracto. Parece que n'este caso a sancção penal do <strong>de</strong>licto <strong>de</strong> evasão<br />
<strong>de</strong>ve liqui<strong>da</strong>r as obrigaçóes; O indigena que contractou, inflingiil o c»n-<br />
tracto e foi punido, <strong>de</strong>ve ficar quite com a socie<strong>da</strong><strong>de</strong>. Se tiepoi, t~ntregar<br />
á vadiagem, isso srrli outro <strong>de</strong>licto inteiramente differente. Ehtn tli.I>osiyao<br />
pó<strong>de</strong> ter as seguintes conseqiiencias. Urri patriio contracta um serviçal e<br />
procura abusivamente, por processos que E escu ado esplanar inas qiie lhe<br />
3<br />
garantem a impunicla<strong>de</strong>, que o indigena lhe fuja. Preso este, é julgado e<br />
con<strong>de</strong>mnado a trabalho compellido ao serviço do mesmo patrko que já lucra<br />
Lima provavel diminuiy5u <strong>de</strong> salario. Ilepetem-se as pressfies e abusos que,<br />
pela organisaçso <strong>de</strong>feituosa <strong>da</strong> curatella, o inrligeri:~ nunca consegue pro-<br />
var, e este, farto <strong>de</strong> soflrer. eva<strong>de</strong>-se novamente. Capturado promptamente<br />
ate 1,elo proprio amo que jA previa s evasáo, C eritregue A ailctori<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
competente que, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> o con<strong>de</strong>mnar a trabalho correccional, o <strong>de</strong>volve<br />
ao patrão que agora obtern o mesmo servi90 pela tertia parte do preço.<br />
Findo o trabalho correccional o indigena terá naturalmente ain<strong>da</strong> <strong>de</strong> cumprir<br />
a prestação <strong>de</strong> trahalho compellido primitivamente reqiiisitn<strong>da</strong>, e o que<br />
faltar para terminar o periodo do contracto inicial. Se se itonsi<strong>de</strong>rar a<br />
duração exagerntlissima (10s contractos reconht~ce-\r* estar em presença<br />
d'iima ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira servidáo penal, cruel e injnstifica<strong>da</strong>. Diz a lei que os<br />
patróes <strong>de</strong> serviçars cnn<strong>de</strong>innados a traf)alho correccionlil, os <strong>de</strong>rem <strong>de</strong>volver<br />
á auctori<strong>da</strong>do aclniinistrativa, quando elies terminem o tcinpo <strong>de</strong> serviço,<br />
sob pena dc c-tlm mil reis <strong>de</strong> multa por ca<strong>da</strong> um yue rlíio trt111u lnorrido.<br />
Com a ausencia :il)soluta tle estado civil dos indigenaa, inteiramente por<br />
organisar nas no-,tis colonias africanas, é <strong>de</strong> prever a facili<strong>da</strong><strong>de</strong> e o interesse<br />
qixe ca<strong>da</strong> pitrHo terci em <strong>da</strong>r por mortos, offici:tlmente, os referidos<br />
indigenas, o1)tentIo nsbiin serviçaes perpetrios H. pret;os rediizidos.<br />
íduanto ás torregões nod <strong>de</strong>ra <strong>da</strong>s que a lei faciilta aos patrúes teem<br />
ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros tyranetes cujo sceptro, ora chicote <strong>de</strong> cava110 ma-<br />
rinho, ora ferula <strong>de</strong> agiganta<strong>da</strong>s dimensóes, é o terror do sertiio, e uma<br />
causa <strong>de</strong> <strong>de</strong>slustre para a nossa colonisação e influencia civilisadora. Por<br />
certo que nos referimos a casos isolados e que nem <strong>de</strong> longe se comparam<br />
ás atroci<strong>da</strong><strong>de</strong>s commetti<strong>da</strong>s no Congo belga, mas em todo o caso são abusos
REG-IMEN DA MÃ0 D'OBRA LOCAL<br />
--- - - --- - - --<br />
673<br />
--<br />
que é preciso a todo o transe reprimir não s6 pela iniqui<strong>da</strong><strong>de</strong> propria, como<br />
pelas perniciosas conseguencias que acarretam para a nossa humana poli-<br />
tica indigena, e para o nosso bom nome como colonisadores.<br />
Estes excessos teem principalmente tido logar em Angola. Em Mo-<br />
r;:tmbicliie, no districto do mesmo nome, to<strong>da</strong>s as leis são inapplicaveis pelo<br />
estado <strong>de</strong> insilbinissáo em que se encontra a maioria dos indigenas; no<br />
districto <strong>da</strong> %ainbezia, as unicas prestações <strong>de</strong> trahalho exigi<strong>da</strong>s teem sido<br />
as qiie o 1~221~~0r0 envolve e que, já radica<strong>da</strong>s 110s habitou indigenas <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a<br />
epoclia <strong>da</strong> dominação arabe, náo levantam difficul<strong>da</strong><strong>de</strong>s nem reclamaçóes.<br />
Kos tc.rritorios do Nyãssa a occupaçáo do interior ain<strong>da</strong> não se eflectuou<br />
e portanto não (! facil applicar qualqiier regimen tle trabalho indigena. Nos<br />
territorios <strong>da</strong>, Coiiipanliia <strong>de</strong> Moçambique foram siipprimi<strong>da</strong>s, como dissemo?.<br />
:is prest:içóes <strong>de</strong> trabalho, e existe máo cl'ubra livrc c abun<strong>da</strong>nte,<br />
principalmente na ciroumscripçRo <strong>da</strong> Gorongoza, on<strong>de</strong> 6 facil obter todos<br />
os bravos <strong>de</strong> qiie se careça, mediante o modico salario <strong>de</strong> cem reis diarios.<br />
Nos districtos do Si11 o atrazo <strong>da</strong> agriciiltiira e <strong>da</strong>s indiistrias dispensa<br />
a exintencia <strong>de</strong> numerosos hraços, concorrendo os indigenaa em larga escala<br />
aos trabalhos mineiros do Rand. O <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> !I <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1899, foi<br />
interpretado e reg~ilan~entado pdrn Angola pelo minucioso <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 16<br />
<strong>de</strong> julho <strong>de</strong> 190.2, <strong>de</strong>vido ao Sr. Conselheiro Teixeira <strong>de</strong> Souza; para Cabo<br />
Ver<strong>de</strong>, pelo <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 28 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1903: e para o districto <strong>de</strong><br />
Lo~~rcnço Marques pelo <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> !) <strong>de</strong> sc.tembro <strong>de</strong> 1904, levemente modificado<br />
pelo <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 4 <strong>de</strong> julho dt 1905. Embora o regulamento do<br />
trabalho indigena no districto <strong>de</strong> 1~oureiic;o Marques náo permittisse o<br />
chihalo, ou ce<strong>de</strong>ncia por 1ocac;ão dos indigenas coercivamente contractados<br />
e postos disposiçáo d'um particular, este costume subsistiu at8 1907,<br />
<strong>da</strong>ndo origem a immorali<strong>da</strong><strong>de</strong>s revoltantes. No seu livro llelrrtorio,~ sobre<br />
Moça~rrbiyl~e o Sr. Conselheiro Freire d'Andracle cita alguns casos edifi-<br />
cantes que o levaram a prohibir <strong>de</strong>finitivameirte o chibalo, e termina por<br />
estas consi<strong>de</strong>raçóes exactissimas: Dos muitos abusos praticados, e sobre-<br />
tudo <strong>da</strong> pratica do clzihalo, resultoii a reliictancia que já <strong>de</strong> longe <strong>da</strong>ta e<br />
por analogos motivos o indigena tem em vir trabalhar para Lourenço<br />
Milarques, d'on<strong>de</strong> resulta a escassez clrr trabalhadores e os preços relativa-<br />
18
274 POLITICA INDIGENA<br />
-- --<br />
mente elevados dos salarios. Certo 6, porém, que logo que, por uma legis-<br />
lação a<strong>de</strong>qua<strong>da</strong>, se possa compellir os patrões aos pagamentos em divi<strong>da</strong> aos<br />
serviçaes, e se castiguem estes, o qae é bem mais facil, por fugirem ao<br />
cumprimento dos contractos que tenham feito relativamente á duraçRo do<br />
tempo <strong>de</strong> serviço, o recrutamento se tornará facil, quer para trabalhos na<br />
ci<strong>da</strong><strong>de</strong>, quer no campo . Corno ,jfi referimos, o Sr. Conselheiro Freire dlAndra<strong>de</strong><br />
abolindo o chibrilo terminoli, por assitn dizer, com o trabalho obrigatorio,<br />
resalvando sómente iitna, petliiena prestaçjo anniial <strong>de</strong> 7 dias <strong>de</strong><br />
trabalho, iitilisavel na l~mp,:z;t e coilserva(;Ro dos caminhou piiblicos. Como<br />
a esta abolição correspon<strong>de</strong>li a elevay;io (10 irnpoato <strong>de</strong> palliota, o preto fica<br />
i~iilirect~arneiite constrangido a tral~i~lliar, sem que tenha <strong>de</strong> soffrer coação<br />
dirc+rtti., ou ser victirna tle inc~nft:dsitveis mane,joj d'alguns europeus manos<br />
escriipulosos.<br />
Em Angola, on<strong>de</strong> o imposto tle palhota existia sómente no Congo -<br />
imposto <strong>de</strong> obhutn - foi a sua imposic,áo generalisa<strong>da</strong> por intelligente e habil<br />
(1eterminac;áo do governador Eduardo Clo4ta.<br />
Além dits vantagem que d'alii (levem resultar para o melhoramento<br />
<strong>da</strong> crise economica que aquella colonia actualmente atravessa, 6 indubitavel<br />
que o angmento succeesivo d'e~se imposto tem <strong>de</strong> ser no futuro LL<br />
iinica medi<strong>da</strong> inilirectarnentt: coerciva, <strong>de</strong>stina<strong>da</strong> a provocar offerta sufficiente<br />
<strong>de</strong> trabtllio intliqenil. E,li111iie-~e profissionalmente o indigena <strong>de</strong>senvolvendo-se-lhes<br />
as ncce$$itl:~<strong>de</strong>s com uma intensiva propagan<strong>da</strong> commercial,<br />
criem-se e a~igmentem-se os impostaos eniqnanto essas necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
não apparecerem, inas acabe-.se com o trabalho obrigntorio. Se praticament,e<br />
for inrlicipensavel conserva-lo para serviços <strong>de</strong> interesse geral,<br />
limite-se a prt.staçko dt: tra1)alho exclusivamente ao Estado e aos municipios,<br />
e reduza-se ao minimo necessario a duraçáo do periodo <strong>de</strong> trabalho<br />
obrigatorio. E' preciso hzer <strong>de</strong>sapparecer <strong>da</strong> nossa legislação o traballio<br />
compellido :to serviço 11,: l)i~rtii:iil;iras, e consi<strong>de</strong>rar o trabalho correccional<br />
como pena meramente applicavel aos <strong>de</strong>lictos penaes, e só forçosamente<br />
cumprivel, quantlo o E~tado ou os munioipios tenham obras on<strong>de</strong> empregar<br />
os indigenas e dinheiro com que os remunerar.
TRABALHO IMPORTADO<br />
Trabalho importado<br />
Immigração. --A immigraçáo dos traballiadores é, nas coludias <strong>de</strong><br />
povoamento, a propria base essencial <strong>da</strong> colonisaçáo, e nas colonias <strong>de</strong> ex-<br />
ploração e mixtas, representa frequentemente a unica soluçáo acceitavel<br />
para resolver o problema <strong>da</strong> carencia <strong>de</strong> mão d'obra. Conforme o paiz <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>stino dos immigrantes é uma colonia fazen<strong>da</strong> ou uma colonia <strong>de</strong> povoa-<br />
mento. assim variam a forma <strong>da</strong> irnmigraqáo e os paizes <strong>de</strong> proveniencia.<br />
Em qualquer <strong>da</strong>s duas hypotheses a immigraçáo, emquanto á fórma, pó<strong>de</strong><br />
dividir-se em : i?niniyra$do <strong>de</strong> esoacos, voluntaritc cojttrcl~ t~rtlc~, volioztaria<br />
proz~oca<strong>da</strong> mas liore, ~~.;l)ontaneu voluntariu, e irn?t~iyrc&çfio ,t»q~crl,~ oir penal.<br />
Consi<strong>de</strong>rando primeiramente as colonias <strong>de</strong> povoamento, e excluindo<br />
as hypothcscs <strong>da</strong> escravatura já estu<strong>da</strong><strong>da</strong>, e <strong>da</strong> mão d'obra penitenciaria<br />
por sua natureza exclui<strong>da</strong> do assumpto d'este trabalho, vamos examinar<br />
os trcs typos principaes <strong>de</strong> immigraçáo voluntaria. Como, para as colonias<br />
<strong>de</strong> povoamento, as correntes migratorias proveem geralmente, ou <strong>da</strong> propria<br />
metropole, on <strong>da</strong>s outras naçíie~ europeias, referiremos apenas os seus<br />
traqos principaes, visto o nosso estudo visar sómente as condições <strong>de</strong> trabalho<br />
dos indigenas immigrados, africanos ou asiaticos.<br />
As primeiras irnmigraçóes mo<strong>de</strong>rnas ou foram directamente estipendia<strong>da</strong>s<br />
pelos governos - Portugal e Hespanha por exemplo, - ou por<br />
particulares e Companhias dispondo <strong>de</strong> aviiltados capitaes, ou ain<strong>da</strong> por<br />
impulso espontaneo, como aconteceu em to<strong>da</strong>s as naçúes coloniaes, mórmente<br />
na Inglaterra. (I) Se nus primitivas colonias <strong>de</strong> povoamento, como o Ca-<br />
nadA e a Nova Inglaterra, se não <strong>de</strong>senvolveu a importação dos escravos,<br />
foi principalmente porque essa instituição não condiz, nem se coaduna, com a<br />
condiçáo economica d'este typo <strong>de</strong> colonias, em que a divisáo <strong>da</strong> proprie-<br />
(I) Dr. Laranjo - Theorin <strong>da</strong> Emigraçao.<br />
-<br />
275
276 POLITIGA INDIGENS<br />
-. - - -- -. - -. -<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong> e c10 capital, e a, natureza <strong>da</strong>s culturas não exigem, nem permittem<br />
a iiti1isac;áo do trabalho ewravo.<br />
Vcnci<strong>da</strong>s as primeiras difficul<strong>da</strong><strong>de</strong>s, como a immigraqiio espontanea<br />
náo fosse bastante para ou trabalhos (Ia colonisação, preconisou-se e expe-<br />
rimentoii-se um outro processo <strong>de</strong> angariar tral)all~adores cilropeus, a ins-<br />
tituição dos ind~ntrd ser~in~~ts,<br />
que attingiii graiitle clesenvolvimento nas<br />
colonias inglezas <strong>de</strong> Virgina c Slaryiand e nas colonias francezas <strong>da</strong> &lar-<br />
tinica e (;iia<strong>de</strong>lupe, e que essencialmente niio ditfere do regimen <strong>de</strong> cr~~lit<br />
bondng~, <strong>de</strong> que tratámos na regiilamentaçáo dos contractos <strong>de</strong> trabalho<br />
indigena.<br />
OS assalariadores americanos sectiiziam com enganosas promessas <strong>de</strong><br />
gran<strong>de</strong>s lucros 03 tliiropeiis, em geral allemáes ou irlan<strong>de</strong>ze~,<br />
levando-os a<br />
immigrar e adiantando-lhes to<strong>da</strong>s as <strong>de</strong>spezas <strong>de</strong> transporte, mediante um<br />
contracto em que se estabelecia que essas <strong>de</strong>spezas seriam integralmente<br />
pagas pelos immigrantes qiie só reaclquiririam a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> trabalho,<br />
<strong>de</strong>pois <strong>da</strong> divi<strong>da</strong> completamente satisfeita. Estes contractos eram princi-<br />
palmente prejndiciiic*~ nos allemges que, falando outra lingua e n5o com-<br />
prehen<strong>de</strong>ndo o inglez, ficavam absolutamente ;i merc6 dos patróes que<br />
punham e dispuiiliam d'elies, commettendo bit~tas<br />
violencias e abusos. Os<br />
irlan<strong>de</strong>zes f~igiam freqiientemente, escapando-se ])ara a immensi<strong>da</strong><strong>de</strong> dos<br />
terrenos <strong>de</strong>ãocup;idos, e passando n cultivar o solo por conta propria.<br />
O trafico tlos iv<strong>de</strong>ntad servnnts assumiu proporçóes ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iramente<br />
escan<strong>da</strong>losas qiir Leroy Beaulieu refere nos seguintes ternios :<br />
O trafico dou alleiriHes nas provincias inglexas do continente ameri-<br />
cano, acabou por tomar vastas proporvóes : constitiiia iima indiistria mon-<br />
ta<strong>da</strong> em larga escala e <strong>de</strong>i1 origem a excessos <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a natiireza. Nos<br />
principaes ponto. <strong>da</strong> Europa havia agentes <strong>de</strong> emigrayao qiie tanto se<br />
serviam <strong>de</strong> manliti como <strong>de</strong> forpa para recrutar os vagabiindos; lima vez<br />
senhores d'estes infelizes, os capitges dos navios diupiinliam (l'elles A sua<br />
vonta<strong>de</strong>, e transportavam-nos para as locali<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> Ainerica on<strong>de</strong> a pro-<br />
cura <strong>de</strong> serviçaes era maior, e on<strong>de</strong> chegou a haver uma espccie <strong>de</strong> mer-<br />
cado para este escan<strong>da</strong>loso trafico,.<br />
A immigraçáo assalaria<strong>da</strong> tem-$e sempre prestado a excessos e prepo-
------ -.---<br />
TRABALHO IMPORTADO<br />
tencias inevitaveis, e 8, <strong>de</strong> todos os typos <strong>de</strong> immigraçgo voluntaria, o menos<br />
util 4 colonisaçáo propriamente dita e á consoli<strong>da</strong>çáo ethnica <strong>da</strong> nova socie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
co1oni;il.<br />
E:' por esse motivo que se tem successivamente proposto diversos<br />
systemas <strong>de</strong>stinados a incitar correntes niigratorias libertas <strong>de</strong> peias contractuaes,<br />
mas estipendia<strong>da</strong>s pelos governos colonisadores que em gran<strong>de</strong><br />
niimero tle casos fornecem o transporte gratuito, e que portanto precisam<br />
crear um fundo especial para custear as <strong>de</strong>spezas <strong>da</strong> immigraçáo. Poulett-<br />
Scrop propos que se creasse em ca<strong>da</strong> colonia uma reparti@ on<strong>de</strong> os immigrantes<br />
á chega<strong>da</strong> se fossem inscrever, e on<strong>de</strong> se lhe fixaria a quantia<br />
semanal ou mensal que, á custa dos seus salarios, elles <strong>de</strong>viam cntregar B<br />
administraçko conio reembolso <strong>da</strong>s <strong>de</strong>spezas <strong>de</strong> transporte. (')<br />
Este SJ-stein~i, qiie foi experimentado repeti<strong>da</strong>s vezes, nunca <strong>de</strong>ti resultados<br />
praticas.<br />
Se se conscr\.nva inteira liber<strong>da</strong><strong>de</strong> aos immigrados, estes esquivavamse<br />
com a maxiiiia fileili<strong>da</strong><strong>de</strong> ao pagament,~ <strong>da</strong> divi<strong>da</strong>; se se lhes coarctava<br />
a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> e se sii1,mettiam a uma vigilancia activa, recahia-se n'iima<br />
servidRo vexatoria, com as aggravantes trazi<strong>da</strong>s pelo policiamento dos immigrantes<br />
e pela cobran(;n tlas taxas.<br />
O niesmo economista propoz <strong>de</strong>pois, qiie as taxas ti~ssc~rn pagas pelos<br />
c~pitnlistas que empregassem os imniigrant,es, o qiie as f'ti~iit ain<strong>da</strong> n'este<br />
caso reflectir nos salarios, pois que, seririndo o seti prodiicto para subsidiar<br />
uma immigraçáo al,iinclantt?., c3r;i iiatriral qiie se (lCsse uma haixa dos salarios.<br />
0 procesw, t: ;~in(la <strong>de</strong>feit,iinso, porque é impossivel obrigar os immigrantes<br />
a conservar-se ao serri\:o (10s capitalistas em paizes iio~~os, on<strong>de</strong> a<br />
tent;ic,;io vulgar <strong>de</strong> ser proprietario com tanta facili<strong>da</strong><strong>de</strong> se satisfaz. Além<br />
dtisso é provavel que, realisando-se a baixa geral dos salarios, a corrente<br />
rnigratoria fosse snc~cessivamentc mais escassa.<br />
IJniacko, cit-aclo por Leroy Beaulieu, propoz que se constitiiissem<br />
ceservas com terrenos livres, proposita<strong>da</strong>mente conservados entre as prol<br />
I --<br />
(i) Lerny Beaiilie~i - De Lu Colonisntion Chez Les 1'ecrlile.s dIotlet.nes. Vol. '2."<br />
277
278 POLITICA INDIGENA<br />
pie<strong>da</strong><strong>de</strong>s particulares, e que, qiiando os progressos <strong>da</strong> agricultura valorisassem<br />
suficientemente o solo, se ven<strong>de</strong>ssem essas reservas, attribuindo o<br />
producto <strong>da</strong> ven<strong>da</strong> ao subsidio <strong>da</strong> immigraçáo.<br />
Nas, como exact:imente para rrielhorar a agricultura e para valorisiw<br />
o ho107 é que é indispeneavel o tral~alho dos immigrantes, este systema<br />
náo pU<strong>de</strong> ter execução pr a t' ica.<br />
Finalmente, o conhecido cconornista inglez TVakefield propoz o systema<br />
que tem o seu nome, e que consiste na ven<strong>da</strong> <strong>da</strong>s terras coloniaes,<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o inicio <strong>da</strong> colonisac;áo, por preTos relativamente elevados, e no emprego<br />
do fundo assim creado em subvençóes & immigração. Este spstema<br />
<strong>de</strong>u bom resultado na Australia, oii<strong>de</strong> l~arateou bastante os salarios, e com<br />
elle se evita que os patróes ou os assalariados tenham <strong>de</strong> concorrer directamente<br />
para o cofre <strong>da</strong> immigraçao. (')<br />
Actualmente, a quasi totali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s colonias pertence aos typos <strong>de</strong><br />
exploração e mixto, on<strong>de</strong> a mão d'obra indigeaa tem importancia maxima,<br />
visto a maioria d7essas colonias estar situa<strong>da</strong> na zona intcrtropical, on<strong>de</strong><br />
o trabalho manual dos europeus s6 se pó<strong>de</strong> iitilisar em circumstancias excepcionaes.<br />
N'estas colonias, com raras excepçóes, tem sido sempre indispensavel<br />
a immigraçRo contracta<strong>da</strong>, porque Q difficil, senáo impossivel, crear<br />
um fluxo permanente <strong>de</strong> immigração livre e espontanea. Depois <strong>da</strong> abolição<br />
<strong>da</strong> escravidão, qiiasi to<strong>da</strong>s as colonias <strong>de</strong> exploração tiveram <strong>de</strong> recorrer<br />
aos contractos <strong>de</strong> emigrantes africanos ou asiaticos.<br />
O recrutaniento dos negros, que muito se assemelhava á escravatura,<br />
não lançou nas c~olonias, segundo Duval, mais do que 8 a 10:000 serviçaes<br />
por anno, emquanto que a escravatiira fazia annualmente sahir <strong>da</strong> Africa<br />
perto <strong>de</strong> 200:000 negros. l'rohibidtt a immigração negra pelos abusos a<br />
que <strong>da</strong>va logar, voltaram-se os olhos para a Asia, e começou a irrupçgo<br />
em qnasi to<strong>da</strong>s a- colonias <strong>da</strong> on<strong>da</strong> amarella dos culis hindus e chinezes.<br />
Para as t~oloniau inglezas foi a immigraçáo africana limita<strong>da</strong>, por<br />
<strong>de</strong>creto <strong>de</strong> Ci <strong>de</strong> fevereiro <strong>de</strong> 1843, a tres pontos <strong>de</strong> proct<strong>de</strong>ncia : Serra<br />
(1)<br />
Leroy Heaulieii - O. C.t"""
TRABALHO IR1 POB'i'ADO<br />
-- - ---<br />
27 9<br />
-<br />
Leôa, Bôa-Vista, e Loan<strong>da</strong>; e como a immigrayáo fiscaliça<strong>da</strong> não fornecesse<br />
o numero <strong>de</strong> negros naessarios &s plantaçóes, começoii-se a importação<br />
dos culis.<br />
Já em 1815, segundo Leroy Beaulieu, os criminosos <strong>de</strong> Calcuttá eram<br />
transportados para a Mauricia, prece<strong>de</strong>ndo alli o seu trabalho a abolição <strong>da</strong><br />
escr:~\.id.;io. Em 1837 existiam na Maiiricia 30:000 indianos ; eni 1838 foi<br />
prohibi<strong>da</strong> a immigraçáo asiatica, que no~ameritt~ st rebtabeleceu em 1842.<br />
De 183'7 a 1847 entraram naquella ilha 94:000 culis, <strong>de</strong>senvolvendo-se<br />
prodigiosamente a producçáo do assucar. Nas Antilhas Inglezas a imrnigra-<br />
çáo africana forneceu <strong>de</strong> 1842 a 1847 cerca <strong>de</strong> 8:000 immigrantes. Em<br />
1846 emigraram para alli perto <strong>de</strong> 14:000 ma<strong>de</strong>irenses, e já anteriormente,<br />
em 1844 começara o transporte <strong>de</strong> culis Iiindlis.<br />
Segundo Augiiatin Cochin, a totali<strong>da</strong><strong>de</strong> dos immigrãntes contractados<br />
para as c~olonias inglezas ate 1855, foi <strong>de</strong> 2:>5:999, repartidos <strong>da</strong> seguinte<br />
fdrma: africanos 27:OOt3; ma<strong>de</strong>iren~es 26:533; chinezes 2107; indios 151:191.<br />
Nas colonias liespanholas começou a immigraçáo asiatica em 1549.<br />
Em 1862 já em Cuba havia mais <strong>de</strong> 60:000 chinezes, numerosos yucatekes<br />
mexicanos, e proceqa-se ao cipzcrn~tie~lto, por assim dizer, <strong>da</strong> raça negra,<br />
estabelecendo-se ve <strong>da</strong><strong>de</strong>iros pr~mios aos melhores creadores <strong>de</strong> gente<br />
preta. B'essa epochui 1 attingia Cuba o maximo <strong>da</strong> sua insolente prosperi<strong>da</strong>dc,<br />
fc~ri-iecendo á metropole rendimentos fabulosos, que em parte foram<br />
tambem <strong>de</strong>vidos :i terem, tanto a Franqa como a Inglaterra, rompido o<br />
pacto colonial, admittindo os assucares estrangeiros sem differenciaes prohibitivos.<br />
I '<br />
As Antilhas Ftancezas importaram tamliem trabalhadores africanos e<br />
asiaticos, embora cm proporçóes menoreb. Sa lieunifio a importação dos<br />
culis, comeya<strong>da</strong> em 1826, prece<strong>de</strong>u a aboli(;áo (1;i cscravidRo. Reconhecendo-<br />
se os sciis inconvenientes foi prohibi<strong>da</strong>, nias logo dois annos <strong>de</strong>pois <strong>da</strong><br />
emancipayáo dos escravos, terminado o prazo em que estes haviam consen-<br />
tido em continuar g trabalhar como salariados livres, foi indispensavel<br />
recomeçar a importaç80 dos açiaticos. -40 mesmo tempo os colonos <strong>da</strong> Re-<br />
i~nião,<br />
sob a protecção tacita <strong>da</strong>s auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s francezas, entregavam-se na<br />
costa <strong>de</strong> Movambique a um pseudo-recrutamento <strong>de</strong> immigrantes negros,
280 YOL ITICB INDIGENA<br />
. ~ -<br />
que náo era mais do qiic uina escravatura mal encoberta. Quando os portuguezes<br />
aprisionaram o negreiro francez R Charles-(;rorgi1 >), o que nos ren<strong>de</strong>u<br />
um vexame internacional, terminou finalmente a fnciil<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> assãlariar<br />
immigraiites nas costas do continente africano.<br />
Em 1858, diz J)iival, liavia na Reuniáo 58:000 immigrantes indios<br />
que um tratado com :L Tnglaterra permittira obter na India lngleza. Como<br />
mais tar<strong>de</strong> o governo inglez proliibin a emigra1:ão india para aqiiella<br />
ilha, voltou o governo francez ;i procurar obter traballiadores africanos.<br />
Em 1581, 1SH2, lXH:I, 1884 e 1887 foram celebrados varios accordos com<br />
o goverrio portuguez, permittinclo ern <strong>de</strong>termina<strong>da</strong>s condi(:ncq ri <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong><br />
certos limites o recriitaineiito dos indigenas inoçambiquenses para Nayotte,<br />
Nossi-B6 e Rcuniáo. Essa immigraráo foi +t,iiipre milito diminuta porque<br />
os contractos garantiam plena liber<strong>da</strong><strong>de</strong> clc contractar aos iiidigenris, e estes<br />
raras vezes consentiam em se expatriar para as colonias francezas, preferindo<br />
ir trabalhar na Africa do Sol ingleza.<br />
Em Ma<strong>da</strong>gascar introduziram-se 5:000 culis chineze* em 1896 e 18!)7,<br />
mas a sua mortali<strong>da</strong><strong>de</strong> foi táo gruri<strong>de</strong> que em 1898 se tornou necessario<br />
repatriar os sobreviventes.<br />
Em 189'3 tentou-se scni rrsaltado contractar indigenas <strong>de</strong> Moçambique,<br />
e em 1901 vuitou-se ci imrr1igrar;áo a~iatica, importando-se cerca <strong>de</strong><br />
1:000 chinezes t1 tfe outros tantos liindiis. Em 1906, segundo Girault. havia<br />
em Ma<strong>da</strong>gascar :3:135 indios e 41X3 chinezes. Nas colonias cln Oceania tem<br />
tambem sido fi. tcliieiites os recursos á máo ctlobr:i imniigr~tla, constitiii<strong>da</strong><br />
por indios, chir L?.;, japonezes, etc. A immiqrayáo inclia é principalmente<br />
aproveita<strong>da</strong> na -rqiiintes colonias : AIaiiricia, Jamaicn, (;iiyaiiit iiigleza,<br />
Guyana hollant xa, 'l'rinclacle, Natal, Fidgi, Africa do Sul ingleza, e varias<br />
pequenas Antilli i*. X iriirriigraç%o contracta<strong>da</strong> dos chiiias tem sido <strong>de</strong> preferencia<br />
iiti1is:i l , ~ rios Straits Settlements, Snmatra, Giiyana ingleza e<br />
mo<strong>de</strong>rnaniente no Transwasl.<br />
Tanto em Siiniatra como em Singapiira, os chinezes estão-se tornando<br />
o elemento mais prepon<strong>de</strong>rante <strong>da</strong> população. Depois <strong>de</strong> <strong>de</strong>mora<strong>da</strong> e aze<strong>da</strong><br />
discusuáo, o governo inglez consentiu em 1903 a importação <strong>de</strong> ciilis chinezes<br />
para as minas do Eand, oil<strong>de</strong> hoje fornecem tima parte importan-
THABAI~HU IMPORTADO<br />
-- -- - - - -<br />
281<br />
-<br />
tissima (Ia mão d'obra, mas on<strong>de</strong>, com os <strong>de</strong>feitos peculinrcs ri sua raqa, sáo<br />
um pessimo elemento perturl~ador <strong>da</strong> or<strong>de</strong>m e economia public:~ e do equilibrio<br />
po1itic:o.<br />
A qnestáo chinc.za tfa Africn do Siil, ultimamente táo commenta<strong>da</strong>,<br />
está milito longe (le ser o qiie alguns philantropos iiiglt~zes <strong>da</strong> metropole<br />
teem qlierido qiie elltt scja. Nau se trata <strong>de</strong> escravatiira disfurçadii, nein<br />
B o mellior tratamento o11 o repatriamento dos culis, o problema qiie assoberba<br />
a administraqRo d'aquellas colonias inglezas. Os trabalhadores chinas<br />
contractado~, se, pelas condições do traballio, <strong>de</strong> alojaniento, <strong>de</strong> alimentaçáo<br />
e <strong>de</strong> assiqtencia, estão bem menos favorecidos do qne os serviçaes <strong>de</strong> S. Tliomé,<br />
nem por isso <strong>de</strong>ixam <strong>de</strong> ter, como estes, nos seus contractos, as garantias<br />
plenas que separam o trabalho livre <strong>da</strong> escravidáo. A qnestxo não 6 essa.<br />
Embora as leis reservem os trabalhos r empregos <strong>de</strong> <strong>de</strong>xtreza e intel-<br />
1ectii:ies aos eilropeus, (leixando aos cliinas o trabalho braçal, o qiie i. certo,<br />
6 que o intimo preço do trabalho tl'estes. e a diffi(~a1<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> estabelrcer<br />
precisamente on<strong>de</strong> comc(;am on<strong>de</strong> i~cabam as protissc)es skillutl, fazem com<br />
que os chinezes vão pouco a pouco ganhando terreno e ac;ambaroando todos<br />
os logarrs c profiesóes em que os europeus n5o po<strong>de</strong>m competir com elles.<br />
,\R 1)cqucnas ii~cessirlndcs dos cliinas, a siia <strong>de</strong>dicação ao traballio, a sua<br />
sortli<strong>da</strong> gaiiarri*ia, c o scii instincto illimita<strong>da</strong>mente capitalisacior. permittemlhes<br />
concorrc3r vant.josai.riente com trnbalhatlores <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as nacionali-<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />
Drpoicr. 11%~<br />
I I H só a consi<strong>de</strong>rar os immigrantes qiie ficam em Africa<br />
qilando finclii o coiztracto; toctos os annos se vae para alli accentiiando iima<br />
corrente <strong>de</strong> iinmigra(:Ho chincea livre que p6<strong>de</strong> ter a momentanea vanta-<br />
gem econornicn <strong>de</strong> 1);iratear os salarios, mas pó<strong>de</strong> tambem ser origem <strong>de</strong><br />
futuras e 11erip;osas pclrtiirbações economicas.<br />
Por oiitro lado, diz Reinsch, que é conveniente que se nko ex~:lorem<br />
to<strong>da</strong>s as lriinas cle ouro H urn tempo, esgotando rapi<strong>da</strong>mente os fil?,es, antes<br />
que a mnltiplicagão e varie<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s cultnrns e <strong>da</strong>s industrias tc~iiliam<br />
<strong>da</strong>do siifficiente estabili<strong>da</strong><strong>de</strong> economica ás novas socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> origem<br />
europeia que alli estgo constitui<strong>da</strong>s.<br />
A unica fórma <strong>de</strong> impedir os inconvenientes <strong>de</strong> uma exagera<strong>da</strong>
282 POLITICA INDIGENA -<br />
immigraçáo chineza seria [iecretar a eapuIaáo gornl doa ~h;,iezes, OU pelo<br />
menos a prohibiçáo formal <strong>de</strong> novas entra<strong>da</strong>s <strong>de</strong> immigrantes livres ou contractados.<br />
Mas, uma medi<strong>da</strong> d'este genero ia forçosamente crear attritos<br />
que a politica ingleza no Extremo Oriente tem gran<strong>de</strong> interesse em evitar.<br />
S. ThomB e Principe B a unica <strong>da</strong>s colonias portuguezas qiie por<br />
emquanto se tem visto força<strong>da</strong> a recorrer ao processo artificial <strong>da</strong> immigraçáo<br />
assalaria<strong>da</strong>. Salvo iim ensaio isolado <strong>de</strong> introducção <strong>de</strong> culis <strong>de</strong> Macau,<br />
os immigrantes são negros africanos quasi todos recrutados em Angola e<br />
ultimamente em Moçambique, havendo tambem alguns cahovcr<strong>de</strong>anos, cabin<strong>da</strong>s,<br />
kriimanos e ajudás em muito pequeno numero. Adiante estu<strong>da</strong>remos<br />
<strong>de</strong>talha<strong>da</strong>mente a organisaqão do trabalho importado na prroln tio ccccriu.<br />
Pelo que <strong>de</strong>ixamos exposto v?-se que, do recurso á inimigra\- 'it0 assalaria<strong>da</strong>,<br />
teem usado to<strong>da</strong>s as naçóes coloniaes, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que a t.mancipac.5o<br />
dos escravos fez terminar a escravisaçáo do trabalho. No seu inicio o recrutamento<br />
dos immigrantes não differia essencialmente do trafico dos<br />
escravos. Com o assalariamento e transporte maritimo dos ciilis chinezes,<br />
que em gran<strong>de</strong> quanti<strong>da</strong><strong>de</strong> foram tambem exportados pelo porto <strong>de</strong> Macau,<br />
<strong>de</strong>ram-se abiisoq r violencias inqualificaveis que por vezes redun<strong>da</strong>vam em<br />
terriveis revoltas a l~ordo dos navios.<br />
Os culip, (liiasi sempre perfi<strong>da</strong>mente enganados, e muitas vezes constrangidos<br />
pela fi)rpa ou pelos narcoticos a aságnar os contracto~, eram<br />
<strong>de</strong>pois lanqados :tos montes para os poróes dos traficantes, e ahi acamados<br />
a esmo, como fiirdos d'algodáo ou saccas <strong>de</strong> cereaes. Privados <strong>de</strong> luz e <strong>de</strong><br />
ar, sujeitos ás 111,t~ores privaçóes <strong>de</strong> alimento, com os corpos rasgados pelas<br />
algemas, gri1lic.t as, gargalheiras e forqiiilhas, em que barbaramente Ihes<br />
encerravam o p(>bcoço e os membros, para prevenir evasóes e evitar revoltas,<br />
os <strong>de</strong>sgrayiitlos cnlis 1150 soffriain menos torturas do que os escravos<br />
negros <strong>de</strong>pois <strong>da</strong> prohibiçáo do t,rafico. As vezes aquella carga Iiiimana,<br />
nas suas contorsóes raivosas, conseguia <strong>de</strong>spe<strong>da</strong>çar as correntes que a trit~ravam<br />
c fazer voar em estilhaços os eecotilhóes que a abafavam, e precipitava-se<br />
em todo o navio, como alcateia <strong>de</strong> feras, louca <strong>de</strong> odio, fremente<br />
<strong>de</strong> vingança, se<strong>de</strong>nta <strong>de</strong> sangue e <strong>de</strong> victimas, matando! piihaiido, incendiando<br />
n'urna <strong>de</strong>mencia cruel e <strong>de</strong>struidora. Aos morticinios seguiam-se os
I I<br />
I / TRABALHO IMPORTADO<br />
+<br />
incenclios: e os lividos claróes (ias cliarnmns <strong>de</strong>vorando os navios, lambenclo<br />
a mastre;ic;.'io e chamuscando ca<strong>da</strong>veres ile victiriias e algozes, eram pharors<br />
phantasticos que, com freqiiencia aterradora, fliictnavam errantes nos ma-<br />
res do nascente, <strong>de</strong>rramando a luz sinistra do crime no mysterio calmo<br />
<strong>da</strong>s noites orientaes. Os massacres (Ias popiilaçóes s~iccediam-se amiu<strong>de</strong>,<br />
mas nem assim diminnia o trafico que tão qiiantiosos proventos rendia aos<br />
agentes <strong>da</strong> emigraçáo e aos corruptos man<strong>da</strong>rins que forneciam a matcria<br />
prima <strong>da</strong> exportação.<br />
Estes dramas horriveis levantaram na Europa, tima furte corrente<br />
<strong>de</strong> opinigo contra essa nova escravatura, e to<strong>da</strong>s as nacóes foram snccessi-<br />
vamente aperfeiçoando a legislaçáo relativa ao ;issaIariamento e transporte<br />
dos culis, <strong>de</strong> forma a garantir absolutamente a libercta<strong>de</strong> do coiitracto, a<br />
relativa commodi<strong>da</strong><strong>de</strong> do transporte maritimo, e a protec(;áo eficaz dos<br />
immigrantes nos seus paizes <strong>de</strong> <strong>de</strong>stino.<br />
Em 1874 o governo portuguez prohibiu o recrutamento dos culis em<br />
&Iacau, on<strong>de</strong> esse escuro negocio fizera alcanqar gran<strong>de</strong>s fortunas aos cor-<br />
retores <strong>da</strong> emigraqão.<br />
A immigraçáo assalaria<strong>da</strong> tem siclo combati<strong>da</strong> por muitos coloniaes<br />
distinctos, entre os quaes Leroy Beaulieu, que a consi<strong>de</strong>ra anti-politica e<br />
anti-economica.<br />
Definindo claramente os ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros inconvenientes <strong>da</strong> immigração<br />
asiatica escreveu Oliveira Martins, com o brilhantismo habitual cio seu es-<br />
tylo, os seguintes periodos:<br />
Substiti~ir<br />
ao escravo negro o trabalho do chinez, 4 carcar indirecta-<br />
mente os problemas contra que lio.je se <strong>de</strong>bate a California. Sáo exemplos<br />
actuaes, e não meras opiniões nem docnmentos mais ou menos discntiveis<br />
arrancados ao passado. Esmaga<strong>da</strong> pela concorrencia pertinaz como a <strong>de</strong><br />
um viveiro <strong>de</strong> formigas, pela concorrencia dos chinezts pabsivos, hiimil<strong>de</strong>s,<br />
calados, mas infatigaveis, a California náo hesita em rasgar a constituição,<br />
negar a liber<strong>da</strong><strong>de</strong>, <strong>de</strong>cretar a expulsáo inteira d'uma gente que lhe pesa e<br />
a absorve e a domina. A lei <strong>da</strong> salvação p~iblica, a fatal e dura lei <strong>da</strong> Ra-<br />
zão dlEstado impondo-se cruelmente, obriga zt suspen<strong>de</strong>r a norma <strong>da</strong>s ga-<br />
rantias liberaes. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Substituir ao escravo negro<br />
283
284 POLITICA INL)IGENA<br />
-- - . -<br />
o chincz livre é prolongar ;i concli(;áo colonial e embaraçar o <strong>de</strong>senvolvimento<br />
dos orgboa n:ttiiraes nacionaes. Só lima populaçáo homogenea fixa,<br />
mais oii menos prodiictora, tlc todo o qiit? é essencial á vi<strong>da</strong>, pó<strong>de</strong> constituir<br />
ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iramente uma nação. Uin aggregaclo <strong>de</strong> gent,e sem cui<strong>da</strong>do, urna<br />
minoria <strong>de</strong> lavraílores opnlentor explorando o trabalho <strong>de</strong> lima popiilaçáo<br />
exotica e inferior, e iima prodiicgiao exclnsiva por ciija troca se obteem as<br />
commodi<strong>da</strong><strong>de</strong>s necessarias á existencia, foi sempre o c~trticter proprio <strong>de</strong><br />
uma colniiia.. . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Além <strong>de</strong> todos<br />
estes graves, embora remotos perigo^, náo <strong>de</strong>vem esquecer-se as consequencias<br />
immediatas <strong>de</strong> iima immigra(;fio chiiicza. A corrupçáo caduca <strong>da</strong> velha<br />
Asia lavra n'essas raças para as quaes x i<strong>da</strong>ia <strong>de</strong> um progresso moral e<br />
mat,erial parece j& estranha. Esti~gna<strong>da</strong>s como as agiias d'iiina lagoa apodrecem.<br />
E os ciilis (iii(l emigram sáo ain<strong>da</strong> a escoria d'uma populaçáo avaria<strong>da</strong><br />
em todo o seli xLvst,ein;i. E, parti al8m d'estau notfoas qiie a immigravão<br />
piiriilent:~ lancaria contra tis popiilaçóes eiiropeias, estáo consi<strong>de</strong>r;1ç6es <strong>de</strong><br />
oiitrn or<strong>de</strong>m. O oliiiiez ri50 emigra, vilja. Ntlo mu<strong>da</strong> os pcnates, aluga<br />
ternporari:~n~(!i~t,c~ o braqo. Nao é uma popiilncao qiie se fixa, é a maré em<br />
prrmanentc finso c refluxo. As contfiqões <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m etlinica ou moral S ~ U<br />
portanto as mttsrn;is, sem o serem porém as <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m economica. A on<strong>da</strong><br />
qiie vem, chega nua c faminta; :% on<strong>da</strong> que vne, regressa cheia e vesti<strong>da</strong>.<br />
AP economias tlo tr;~l)alho nRo se consoli<strong>da</strong>m n'nma terra que para o chinez<br />
nHo é pat,ria ttdol)tiva, mas sim estaçko temporaria apenas: e os metaes<br />
c.spec:ic em y ti,, I(>r;l c:omsigo as suas economias, rscasseiain <strong>de</strong>s<strong>de</strong> logo, provoc:intlo<br />
:is criqchii tlo iiriniernrio S .<br />
.I imrni(,rr:tyao (]o-: ciili.; chinezes ou indiiinos é iim processo bastante<br />
caro <strong>de</strong> ol~ter tral,,illi;itlor ; :is gr;tri<strong>de</strong>~ <strong>de</strong>jpezas cle transporte e repa-<br />
triimento, o arroz e ou ouiitliincntos especiaos que 6 indispenuavel fome-<br />
ccr-lbes, e qiie Lu ! czcs sc teern <strong>de</strong> man<strong>da</strong>r vir <strong>da</strong> China ou <strong>da</strong> India por<br />
elevado preyo, são oiitros tanto'r motivos <strong>de</strong> encarecimento <strong>da</strong> mão d'obra<br />
asintica. As suas lingii;is, civilisa(;ões e mentali<strong>da</strong><strong>de</strong>s manteem sempre, em<br />
todos os meios, iiina persisterioia notavel qne impe<strong>de</strong> a fiisão dos immigran-<br />
tes na massa cla popnla~Zo colonial.<br />
Os irnmigrantes asiaticos juxtapúem-se sem se misturar aos habitan-
--<br />
TRABALHO IMPORTADO 285<br />
-- -<br />
tes <strong>da</strong>s colonias, europeus ou negros, forrriaildo-sc izm conjiinrtn het,~~rogrlie~<br />
facilmente dissociavel, <strong>de</strong> interesses economicos oppostos e cohesáo social<br />
nulla.<br />
Por outro lado, a immigraçáo assalaria<strong>da</strong>, cnja utilisayáo sti pti<strong>de</strong> ser-<br />
vir os graii<strong>de</strong>s capitaes, ten<strong>de</strong> a manter nas colonias o exclusivismo <strong>da</strong><br />
cultura intensiva dos generos ricos <strong>de</strong> exporta$áo, em <strong>de</strong>trimento tlris cul-<br />
turas e (Ias inctiistrias <strong>de</strong> primeira necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>, conservando assim k colo-<br />
nia a anormali<strong>da</strong><strong>de</strong> social e rconomica que a escravatura geroii Leroy<br />
Weaulicii aponta tambem corno effeito anti-economico d'esta immigrac;áo o<br />
atrazo dos meios <strong>de</strong> producçáo.<br />
No erntanto, o rnesmo escriptor não <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> <strong>de</strong>screver os extraordi-<br />
narios melhoram~ntoq que na Mauricia se introdiiziram no ciiltivo <strong>da</strong> canna<br />
e na inanipulaçáo do assucar, 8ob o regimen <strong>da</strong> immigração indiana.<br />
A este ultimo argnmrnto contra a immigraq&o n-*alaria<strong>da</strong> pd<strong>de</strong> tam-<br />
bem respon<strong>de</strong>r-se com o exemplo <strong>da</strong> Guyaiia inglcza, alimenta<strong>da</strong> pelo tra-<br />
balho dos culis rtsiaticos, e cujo apetrechamento economico, tanto sob o<br />
ponto <strong>de</strong> viqta agricola como industrial é perfeitissimo Os colonos <strong>de</strong> Deme-<br />
rara concentraram os seus esforços na ciiltiira <strong>da</strong> canna, no fabrico do<br />
assucar e no dos seus dierivados, melaço e rliurn. Tanto no cultivo <strong>da</strong> canna<br />
como na elaboraç~o dos seus productos empregam se todos os processos e<br />
macliinas mais aperfkiçoatlas, obtendo-se o maximo rendimento com o mi-<br />
nimo <strong>da</strong> dvspeza.<br />
Pl evi<strong>de</strong>nte que a iinmigrayiio coiitracta<strong>da</strong> traz muitos incoiivenierites<br />
e at6 perigos serios, mas absi~rdo fazer-se a sua con<strong>de</strong>mnrt(;Ro at,-oliita.<br />
E: c~rti~rneiite um mal, mas em muitos casos iiin ma1 necessario c cle qiie<br />
não é facil prescindir.<br />
Consi<strong>de</strong>remos por exemplo as tres Guyanas, colonias mnitissimo se-<br />
melhantes nH composiyão do solo, na natureza <strong>da</strong> vegetaçáo e no regimen<br />
climaterico. Em to<strong>da</strong>s ellas faltou sempre a mão d'nhra local. A Guyana<br />
ingleza accusava pelo necenseamento <strong>de</strong> I891 uma populaçáo <strong>de</strong> 278:328<br />
habitantes ; o orçamento para o exercicio <strong>de</strong> 1903- 1904 clava uma receita<br />
tokl <strong>de</strong> 2:520 contos <strong>de</strong> reis; e o seu commercio total, na sua maior parte<br />
em assncar, melaço e rhum, montava a 16:200 contos.
286 I'OLITI(:h INDIGENA<br />
--.--<br />
A Guyana hollan<strong>de</strong>za tinha em 1902, 72:295 llabitantes ; as receitas<br />
orçameiitacs 1):ira 1903-1904 eram <strong>de</strong> 1.6
TRABALHO IMPORTADO 287<br />
--<br />
cativos e pe<strong>da</strong>gogicos com o nivel mental e com o typo <strong>da</strong> civilisação, a<br />
orgsnisaçáo juridica e administrativa com o adiantamento social: e os pro-<br />
cessos economicos com rt natureza <strong>da</strong> prod~icçiio, assim na pratica colonial,<br />
a proporção naturalmente obti<strong>da</strong> entre o capital e o trabalho, é que tem<br />
<strong>de</strong> aconselhar a forma que este <strong>de</strong>ve <strong>de</strong> preferencia assumir.<br />
Theoricamente é con<strong>de</strong>mnavel o systema <strong>de</strong> Wakefield, preten<strong>de</strong>ndo<br />
implantar artificialmente nas colonias a subordinxç5o (10 trabalho ao capi-<br />
tal, que na Europa é uma consequencia natural <strong>da</strong> evoluçáo lenta <strong>da</strong> lei<br />
<strong>da</strong> offerta e procura.<br />
Assim se conseguiu crear na parte tla Australia on<strong>de</strong> esse systema<br />
se applicon, uma especie <strong>de</strong> feu<strong>da</strong>lisnio agricola, <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s proprietarios<br />
explorando legióei: tle proletarios, absolutamente contrario ao typo <strong>de</strong> colo-<br />
nislação que alli se impunha, e que era a divisão <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> e a explo-<br />
raqão pelos pequenos capitaes.<br />
Os contractos <strong>de</strong> immigraçáo exotica para as colonias fazen<strong>da</strong>s são<br />
tambem um processo artificial, mas, longe <strong>de</strong> serem facilmente substitui-<br />
veis como o systema <strong>de</strong> Wakefield na Austmlis, s%o pelo contrario quasi<br />
sempre a unica maneira <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolver a riqueza d'aquellas colonias.<br />
E nko sí, ás plantaçóeci é indispensavel o concurso dos immigrantes. Quando,<br />
para a realisttç%o <strong>da</strong>s gran<strong>de</strong>s obras <strong>de</strong> interesse geral, falte a máo d'obra<br />
local, por escassez ou indolencia, 15 preferivel contractar culis asiaticos, ou<br />
negros <strong>de</strong> outras colonias, a estabelecer a imposição do trabalho obrigatorio<br />
sempre t8o nociva e contraprodixcent~b. Xa construc~áo<br />
do trãnscontinental<br />
<strong>de</strong> Nova-York a S. Francisco meta<strong>de</strong> (1119 opernrio-r eram ciilis chinezes ; e,<br />
para levarem a effeito a linha ferrea <strong>da</strong> Ugan<strong>da</strong>, os inglezes empregaram<br />
20?000 culis indios.<br />
Reconheci<strong>da</strong>, portanto, a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> trabalhadores exoticos,<br />
apesar dos inconvenientes que a immigraçáo acarreta, é indispensavel que<br />
se fixem as regras e preceitos a que <strong>de</strong>ve ser su,jeito o seu recratamento,<br />
transporte, tratamento e repatriamento; que se <strong>de</strong>fina a condiçso juridica,<br />
dos immigrttntes durante o periodo em que vigora o respectivo contracto ;<br />
e que, finalmente, se estabeleçam garantias seguras do comprimento dos<br />
contractos.
288 POLITICA INDIGENA<br />
--- -- -<br />
Regulamentação dos contractos <strong>de</strong> Iinmigração. -Na India Tu-<br />
gleza, on<strong>de</strong> -tl tocam os dois problemas, <strong>da</strong> emigraçiio para outras colonias,<br />
e tfa emigr,icC~o interior para os lnbour diqtricts, o primeiro doriimento<br />
legislativo iiiiportante que reqiiloii estas qiiestóes foi a K C:Ort\oli~lfrf~d<br />
Irnrniyr afiou Orr!l?l(i7zr~ n <strong>de</strong> lSti4. Esta or<strong>de</strong>nan?:~ regulamentava o tra-<br />
1)alho proveniente <strong>da</strong> eiiiigrac;%o interior, e as cond1(;6es geraea dos contrato^<br />
tie emie;rantes para oiitras colonins ingiez;ir oii <strong>de</strong> oiitraii naç6cs.<br />
Obrigavam-qe os patróes a fornecer ao3 c~ilis moraciia h;ibitavel, assistencia<br />
mrtlica t1 IiospitalisaçWo gratuita. Esta1)eleciani-se regras relativas aos sa-<br />
Iarios, A iliirnçáo do trabalho diario, numero <strong>de</strong> dias tle tr;il):illio por >eniilii;t.<br />
ifiirayáo minima e maxiina dos contractos, condi(;6~.: do repatri,irnerito<br />
etc. $>\ta ortlenança foi modifica<strong>da</strong> pelas leis <strong>de</strong> 1871, 1872, I+?. 1Çs3,<br />
1S(i!) tl lX!) I, tendo esta iiltima, c1atlo origem aos inniimeros regii1,irnt~iitos<br />
loci~cs qiie d~s(lr t-sa (lata se teem piiblicado. Todos estes diplonia-i >iil.c.t,ssivainente<br />
mais perfeitos e mais ininiiciosos, regulamentam ciiitladosarnente<br />
to<strong>da</strong>s as phases <strong>da</strong> emigração assalaria<strong>da</strong> <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a fi.c;tlisaçGo do rt3crlita-<br />
mciito at6 no regresso 110s repatritidos. As leis <strong>de</strong> lS82 e 1889 referem-se<br />
m:li~ I):wticiilarmcnte ;i condiçiXo dos immigrantes nos t(tr-qczrtiuru tlo Assam.<br />
A lei <strong>de</strong> 1891 vae att: :IO 11onto <strong>de</strong> prescrever to<strong>da</strong>s as attr1biiic;óes que<br />
<strong>de</strong>rem ter os ciiradorrs dos iinmigrantes nas colonias estrarigeiraci. Na<br />
Costa do Ouro a legisla(:~lo orclriianças<br />
dc 1H!30, 1891 c pela <strong>de</strong> 30 <strong>de</strong> junho <strong>de</strong> 1893 a que se srgiiirum diversos<br />
regulamentos :iiiidii Iioje em vigor. K:i Gambia ingleza a ernigraç80 assa-<br />
laria<strong>da</strong> dos indigenas I)arit outras coloiiias estA regulameritatla pela 8 The<br />
h'r,ri!jr.nnt,s Protection O, ditia~rce <strong>de</strong> 1892, e a immigraçáo clon nienores<br />
africanos n'aquella coloni;~ i. rc~gi<strong>da</strong> pela a I'he Krgistrtrtion qf Alien A,trim?z<br />
í'lliltlren Ordr?lulrce <strong>de</strong> 1884, qiic substitiiiii e revoqou 'l'lfll . Ipp~tt~(~ Orrlinnnce )> <strong>de</strong> 1863.<br />
Na Seiara Leôa o recrutamento <strong>de</strong> emigraiites foi regiiliztlo pelas<br />
or<strong>de</strong>nanças <strong>de</strong> .-) <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 18(iO e <strong>de</strong> 27 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 1875 qiie teem<br />
sido amplia<strong>da</strong>s t. interpreta<strong>da</strong>s por diversos regulamentos. A immigraçáo
CONTRACTOS DE IM,IIIGRAÇBO<br />
- - - - -<br />
dos indigenas polynesicos na Queensland foi regula<strong>da</strong> pelo c YoZy,~r~ia~t<br />
Labozirers Art ?J' 18fi82, revogado c siibstitiiido pela lei <strong>de</strong> 18 <strong>de</strong> novembro<br />
<strong>de</strong> 1880 e siibscquentes regulamentos.<br />
A emigraqão dos culis chinezes pelos portos <strong>da</strong> China é superiormente<br />
fiscalisa<strong>da</strong> pelas auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s consulares <strong>da</strong>s diversas potencias. Pelo porto<br />
<strong>de</strong> Hong-Kong tem sido succe~sivamente si!jeita no c .lrt for flze R~gulation<br />
of the Clii?zese fissengers Sl~ips » <strong>de</strong> 14 <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong> 1855, e á « Tlre Clzinese<br />
Evtzigr.ation Con.*olidnted Orclinontu fi <strong>de</strong> 18 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 1889 niodifica<strong>da</strong><br />
em (i <strong>de</strong> julho do mesmo anno.<br />
Embora quasi to<strong>da</strong>s as colonias que carecem <strong>de</strong> ináo d'obra exotica<br />
tenliam experimentado a importaçiio <strong>de</strong> culis chinezes, estes sáo principalmente<br />
numerosos, como já dissemos, nos Straits Settlements, Sumatra,<br />
Guyana ingleza e Transwaal. Em to<strong>da</strong>s estas colonias a administraçilo<br />
fiscalisa o ciimprimento dos contractos <strong>de</strong> trabalho. Os immigrantes h<br />
chega<strong>da</strong> ao seti <strong>de</strong>stino sáo encerrados em <strong>de</strong>positos <strong>de</strong> on<strong>de</strong> 96 sahem <strong>de</strong>pois<br />
<strong>de</strong> effectua<strong>da</strong> a locação dos seus serviços.<br />
Od contractos não são geralniente superiores a :i annos, e os castigos<br />
impostos aos cnlis por transgrcssáo dos contractos resumem-se, na maioria<br />
dos casos, a multas que elles <strong>de</strong>vem pagar com trabalho. Nas colonias inglezas<br />
<strong>da</strong> Africa do Sul e ~rincipalmente na região inineirit do Itand, tem<br />
sempre escasseiado a mão d'obra local. A par dos chinezes comcqados a<br />
importar eni l!f03, e <strong>da</strong> popiilaçáo indigena local, trabalham alli, em gran<strong>de</strong><br />
numero, indigenas <strong>da</strong> nossa colonia <strong>de</strong> Moçambirpe, cujo recriitamento e<br />
emigra~á~ temporaria foram concedidos e regulamentados pelo t)iotl~.s<br />
vivelzdi <strong>de</strong> 18 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1001, modificado em 15 <strong>de</strong> junlio <strong>de</strong> 1904, e<br />
substituido pelo accordo intercolonial cele1,rado em Pretoria em 1 tle abril<br />
<strong>de</strong> 1909.<br />
28 9<br />
Em virtu<strong>de</strong> d'esta cotivenç20, o governo <strong>da</strong> provincia <strong>de</strong> Moçambique permittiri o recru-<br />
tamento nos territorios sob a sua directa administração, <strong>de</strong> trabalhadores indigenas, para as<br />
industrias mineiras do Transwaal, comtanto que tal permissco n8o seja effectiva nas areas cujos<br />
19
290 POLITICA INDIGENA<br />
-.- -<br />
indigenas estejam sujeitos a obrigações resultantes <strong>de</strong> leis locaes, actualmente em vigor, ou <strong>de</strong><br />
contractos legaes .~ctualniente existentes cnni o governo <strong>da</strong> provincia, se taes obrigaç0es forem<br />
prejudica<strong>da</strong>s por qiiaesquer opera~õci <strong>de</strong> recriitainento.<br />
Com excepção do que possa estar ein conflicto com esta convençfo, as operações <strong>de</strong> recrutamento<br />
<strong>de</strong>vqin ser condiiaiJas <strong>de</strong> accordk com os regulamentos actualmente eni vigor na provincia,<br />
mas o goveriio dl provincia po<strong>de</strong> alterar estes regulamentas sob condição, comtudo, <strong>de</strong><br />
previ0 accordo entre os dois xoveriios quando ' aea alterações sffectem as operações <strong>de</strong> recrutamento.<br />
I .-.<br />
O goveino <strong>da</strong> provincia reservaqsr oidireito <strong>de</strong> prohibir o recrutamento ou a distribuição<br />
por qiialquer patráo do Tranrwaal que, em rirtu<strong>de</strong> <strong>de</strong> investigação simultanea por representantes<br />
dos dois glvernoi, se reco:i!ie;a te: transgredido, mesiiio <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> avisado, as ol>rigações impostas<br />
por esta coiivenqào, oii por quaiqiier regulamento em vigor na provincia, ndo incoiiipativel coin<br />
esta convenção; no uso dos representantes kle ambos os governos não chegarem a aceordo noniearào<br />
~ ~ arbitro i i ciijas <strong>de</strong>cisões serão <strong>de</strong>finitivas.<br />
Ca<strong>da</strong> liaenp para recrutar trabalhadores iiidigenas <strong>de</strong>ve ser concedi<strong>da</strong> pelo governo <strong>da</strong><br />
1)rovincia; ca<strong>da</strong>; pedido <strong>de</strong> licença para recriitamento <strong>de</strong>ve ser feito por intermedio do inten<strong>de</strong>nte<br />
(Ia einigraçiío din Louren~o hilirques, e nenhum pedido po<strong>de</strong> ser satisfeito seiii que seja acompaiiliatlo<br />
d'uni c$rtificado do secretario dos negocios iiidigeiias do Transwaal, pelo qual se mostre<br />
~qí.(?e n governo bo rr;inswaal appoin o pedido, e que este é feito em nome d'um patrão ru patrões<br />
tliie se occlipeb nas iiiiliistrias mineiras do Transwaal. As licenças para recrctamento po<strong>de</strong>m em<br />
qudqiier occ:is/ão ser ~~~~~~~lla.las pelo goveriio <strong>da</strong> provincia em harmonia com os regiilamentos<br />
<strong>de</strong> emigraçiio. Se cni qiinlrlucr te~npo <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> concedi<strong>da</strong> uma licença, o governo do Transwaal<br />
levantar algiiqa ol~jecs.io contra o seu possuidor, o governo <strong>da</strong> provincia concor<strong>da</strong> em retirar<br />
essa licença. i<br />
Antes pe <strong>de</strong>ixar a })rorincia ca<strong>da</strong> trabalhador <strong>de</strong>ve receber um paisaporte valido por iiiii<br />
anno, pelo qull o emoliiniento <strong>de</strong> r3 shillings serb pago ao governo <strong>da</strong> provincia pelo patrzo. Nenhum<br />
trabalhador <strong>de</strong>ve ser coiitr:ictado pela primeira vez por periodo superior a iini anno. intis<br />
110 finr do prikeiro ~ieriodo po<strong>de</strong>-se renovar o contracto por mais algum tempo, conitaiito qiie o<br />
teiiil>o total dp serviço 1150 esiei1.1 dois aiiiioj. O ciirador portuguez dos indigenas as5alariados<br />
po<strong>de</strong> auctorisdr a proropnyzo (10s pcriodos dos contractos alem dos limites acima citados.<br />
Qualqi er trnl>nlli.iilor (1"- <strong>de</strong>ixe <strong>de</strong> regressar á provincia <strong>de</strong> Moçambiqtie qiiando expirar<br />
o periodo <strong>de</strong> servip iiicluin(1o qiiaesquor renovações do contracto, <strong>de</strong>verti (a não ser que tenha<br />
I obtido perinis Ao<br />
e,i>ecial do curador) ser consi<strong>de</strong>rado emigrante clan<strong>de</strong>stino para todos os effeitoi<br />
d'estx convenç5u<br />
O governo CIO Trniir\vn:il garante que os indigenas serfo <strong>de</strong>spedidos qiinnrlo terminar o pe-<br />
riodo do contracto e qiic iienliiimn preísào seri exerci<strong>da</strong> para obter renovações dos contractos.<br />
Um funccionario l>uii,i,?i cliie lhe s.io <strong>da</strong>~las pelos regiilnmentos actualmente ein vigor, competem.!he<br />
inais as segiiiiite, ;ittril>iii;C>ej e <strong>de</strong>veres:<br />
(r)<br />
Enten<strong>de</strong>r.sc coin ;is nuctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s do Transmaal sobre os assumptos que digam res-<br />
11cito aos iiidigenas portuguezes coiitractados.<br />
L) Cobrar todos 03 cino:iimentoi qiic <strong>de</strong>vem ser pagos ao curador, em virtu<strong>de</strong> d'esta<br />
convenç.?~, por actos refeientes aos iiidigenas portuguezes.<br />
Dar ou recu~ar passes portiigiiezes ;aos immigrantes clan<strong>de</strong>stinos.<br />
c)<br />
d) Conce<strong>de</strong>r oii reciisnr a<br />
e) Pronioter 1 , todos ~ os registro dos indigenas portuguezes.
292 POLITICA INDIQENA<br />
6) Facilitando a cobrança dos emolumentos pagaveis ao ciirador.<br />
c) Recusando tanto quanto o permittarii as leis do Transwaal a concess3o ou renovação<br />
<strong>de</strong> passes do Traris\va31 aos indigcnas portiiguezes que não apresentem uni passaporte portuguez<br />
qiie seja valido.<br />
d) Promovendo que todos os casos <strong>de</strong> morte, acci<strong>de</strong>ntes e <strong>de</strong>serções <strong>de</strong> indigenas portuguezes<br />
Ilie sejqni com~nunicados.<br />
1.) Dando instrucções n todos os fiinccionarios a quem compete conce<strong>de</strong>r passes para que<br />
o niiinero dou passaportes portiigiiezes seja sempre mencionado distinctaniente nos passes do<br />
Transwaal.<br />
f) Daiido instrucções a todos os fuoccionarios a quetii compete conce<strong>de</strong>r passes, para<br />
todos os indigenas portuguezes se apresentarçm na ciiradoria antes do regresso ao seu paiz. Nos<br />
districtos on<strong>de</strong> o ciirndor não tenha representante, os passes dos indigenas portuguezes que <strong>de</strong>sejem<br />
regressar ao seu paiz <strong>de</strong>vem-lhe ser enviados para endosso.<br />
) Prpmovendo o regresso dos trabalhadores qiie tenliam terminado os setis contractos<br />
por via Ressapo Garcia ou por qualquer outra locali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> fronteira em que os dois governos<br />
tenliam coiicor ado. P<br />
O govekno do Transwaal <strong>de</strong>ve, taiito qiianto o periiiittam as leis do Transwaal, auxiliar o<br />
curador portugiiez, impedindo a resi<strong>de</strong>ncia no Trans\vaal <strong>de</strong> indigenas portiiguezes sem passe portuguez,<br />
ou com passe cujo prazo já expirou, e ain<strong>da</strong> contrariando e impedindo a entra<strong>da</strong> no<br />
Transwaal <strong>de</strong> immigrantes clan<strong>de</strong>stinos.<br />
Sáo estas as disposiçóes principaes <strong>da</strong> convenqáo que veio assegurar<br />
por mais 10 annos um estado <strong>de</strong> coisas que muito conviria fazer terminar.<br />
As vantagens financeiras que, para a administração cla provincia <strong>de</strong> Mo-<br />
çambique, resultam d'esta emigração, nFio são <strong>de</strong> mol<strong>de</strong> a fazer esqnecêr<br />
os grave8 inconvenientes que ella importa, e entre os quaes avulta a <strong>de</strong>s-<br />
nacionalisaçáo do indigena. I'or outro Iacio, a abiin<strong>da</strong>ncia <strong>de</strong> numerario<br />
nunca foi synonymo <strong>de</strong> riqueza. A condiçáo economica <strong>da</strong> colonia não me-<br />
lhora com o ouro dos emigrantes, e a agricaltilra e industrias locaes, que<br />
são a unica fonte segura <strong>de</strong> riqueza, ficam priva<strong>da</strong>s dos braqos indis-<br />
pensaveis, e arrisca<strong>da</strong>s a ter, n'nm fiituro pouco afastado, <strong>de</strong> importar tam-<br />
bem a sordi<strong>da</strong> praga oriental.<br />
As vantagens peciiniarias <strong>de</strong> momento 350 mais apparentes do que<br />
reaes, e os perigos imtninentes no futuro são mais graves do que apparen-<br />
tam. Em vez <strong>de</strong> levar o indigena a fixar-se em povoaçúes, a cultivar o<br />
proprio solo, a fornecer a mão d'obra para os empreliendimentos nacionaes,
CONTBBCTOS DE fMMIGRAC)~O<br />
- -- -.<br />
lisongeiam-se-lhe os instinctos vagabiindos, e cria-se-lhe o habito nocivo <strong>de</strong><br />
salarios exagerados. Além d'isso a emigrãçáo, no caso particular <strong>da</strong>s po-<br />
piilaçóes africanas e nas condiçóes do trabalho mineiro, 6 uma causa <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>spovoamento que ain<strong>da</strong> mais se aggrava com a fixação <strong>de</strong> innumeros<br />
indigenas nas colonias inglezas.<br />
Na opiniáo do Snr. Conselheiro Freire dlAndra<strong>de</strong>, a emigração para<br />
o Rand é indispensavel ao eqnilibrio financeiro <strong>da</strong> colonia, e, n'esta or<strong>de</strong>m<br />
<strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias, o actual governador <strong>de</strong> Moçambique <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> (I) mesmo a impor-<br />
tação <strong>de</strong> culis asiaticos, caso o <strong>de</strong>senvolvimento agricola e industrial exija<br />
máo d'obra abiin<strong>da</strong>nte, e não convenha, pela razão aponta<strong>da</strong>, suspen<strong>de</strong>r a<br />
emigração para as colonias inglezas.<br />
Se actualmente a producção ain<strong>da</strong> rudimentar <strong>da</strong> colonia náo impóe<br />
a immediata prohibiçrio do assalariamento estrangeiro dos indigenas, pare-<br />
ce-nos fdra <strong>de</strong> duvi<strong>da</strong> qne pouco acertado seria, <strong>de</strong> futuro, sacrificar a uma<br />
organisação artificial <strong>de</strong> interessse passageiro as proprias bases <strong>da</strong>, estali-<br />
li<strong>da</strong><strong>de</strong> c progresso economico <strong>da</strong> provincia.<br />
Na Zambezia a emigraçáo auctorisa<strong>da</strong> tem causado os maiores pre-<br />
juizos ao commercio (10 interior, e quasi já <strong>de</strong>spovoou a Maganja <strong>da</strong> Cost,a<br />
anteriormente tão rica em braços. Ter braços sãos e vigorosos aos milha-<br />
res para os exportar em troca d'alguns sliillings, e <strong>de</strong>pois importar a pêso<br />
<strong>de</strong> ouro a escoria amarella e <strong>de</strong>prava<strong>da</strong> <strong>da</strong>s alfurjas chinezas, não passa<br />
d'nm erro administrativo e d'um contra-senso economico. O Ggre do f~inccio-<br />
nalismo civil e militar, e os outros cancros <strong>da</strong> nossa administração colonial<br />
em breve se encarregam <strong>de</strong> <strong>de</strong>vorar os sliillings dos emigrantes. A impor-<br />
taçáo dos culis drenaria para o estrangeiro o numerario ila colonial e one-<br />
raria pesa<strong>da</strong>mente os capitaes reunidos para as exploraçóes agricolas o11<br />
industriaes. O futuro <strong>de</strong> Jloçambiqiie está <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte do <strong>de</strong>senvolvimento<br />
<strong>da</strong> producçáo agricola e industrial, e tudo aconselha que se vão preparando<br />
as popiilaçúes indigenas para o fornecimento futuro <strong>da</strong> mão d'obrn necessaria.<br />
llesmo in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>iitemente dc razóes politicas, ninguem ignora a<br />
(i) Rclntorios sobre Lllõç«.~tíbiylte.<br />
293
294 L'OLITICA INDIUEKA<br />
- - - - - - - - - - -<br />
incontestavel siiperiori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> máo d'obra local sobre o trabalho importado<br />
que <strong>de</strong>ve ser apenas o nltimo recurso, a tabua <strong>de</strong> salvaç50, qiianrlo os indigenas<br />
náo exi~t~rin oii iiáo sejam em numero sufficiente.<br />
Ve*jainos agora como est& regulamenta<strong>da</strong> a immigraçáo nas colonias<br />
liollan<strong>de</strong>zas. Tara Surinam a emigração (10s ciilis iiidi:tnos foi aiictorisa<strong>da</strong><br />
pela coiivençáo celebraila na ITiiya. entre os governos liollan<strong>de</strong>z e iiiglez<br />
em 8 <strong>de</strong> setembro <strong>de</strong> 1870. Em 3 <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 1572ffoi promiilgado o regulaniento<br />
geral <strong>da</strong> immigraçáo, modificado por <strong>de</strong>cretos <strong>de</strong> 13 cle jiinlio d'esse<br />
anno e <strong>de</strong> 28 tlc maio <strong>de</strong> 1Xl)i. N'csta colonia piiblicaram-se successivos<br />
<strong>de</strong>cretos e reg~ilamentos creando iim fiindo <strong>de</strong>stinado a sustentar a immigraçáo,<br />
do3 quaes o3 mais importantes S ~ O : a or<strong>de</strong>nança <strong>de</strong> 21 <strong>de</strong> agosto<br />
<strong>de</strong> 1878 e o <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 30 <strong>de</strong> julho <strong>de</strong> 1895 que approva a emissão d'iim<br />
emprestimo a favor do fiindo dn irnmigraçáo creado pela referi<strong>da</strong> or<strong>de</strong>nança.<br />
Sobre o resgate cio preço <strong>da</strong> passagem (10s repatriados, publicou-se a or<strong>de</strong>nança<br />
<strong>de</strong> 4 <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 1888, e o serviqo sanitario foi regiilaincntado pela<br />
or<strong>de</strong>nança <strong>de</strong> 21 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> I879 interpteta<strong>da</strong>, amplia<strong>da</strong> e modifica<strong>da</strong><br />
por successivos <strong>de</strong>cretou C portarias. As penrtli<strong>da</strong>ct-,; applicaveis aos immigrantcs<br />
sáo regi<strong>da</strong>s pela or<strong>de</strong>nança penal <strong>de</strong> 1874, m~~lifica<strong>da</strong> em 26 <strong>de</strong><br />
outubro <strong>de</strong> 1595.<br />
Nas Indias Orientaes Neerlan<strong>de</strong>zas a immigraçáo dos cnlis cl~inezes<br />
para os trabalhos agricolas estri <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>da</strong> segninte legislaçáú.<br />
Para a costa leste <strong>de</strong> Sumatra existia primitivamente a or<strong>de</strong>nanca<br />
<strong>de</strong> 1880, substitiii<strong>da</strong> <strong>de</strong>pois pela <strong>de</strong> 1FiS9, que tem sido modifica<strong>da</strong> pelas<br />
or<strong>de</strong>nanças <strong>de</strong> 11 tle iiisryo <strong>de</strong> 1891, e <strong>de</strong> 24 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1894.<br />
Jhtre as orílenanças <strong>de</strong> 1:I cle julho <strong>de</strong> 1850, e <strong>de</strong> 13 <strong>de</strong> julho <strong>de</strong><br />
1889 modifica<strong>da</strong> pela legislaçáo iilterior, existem algiimas differenqas esseii-<br />
ciaes. O artigo prirrieiro d'uma segue um systerna differente do artigo pri-<br />
meiro <strong>da</strong> outra. Ao passo que o regulamento <strong>de</strong> :H80 era ipso jure appli-<br />
cave1 a todos os trabalhadores estranhos resitle~tcia, incluindo os que<br />
proviessem <strong>de</strong> outros territorios ou colonias indo-neerlan<strong>de</strong>zas, o cle i889<br />
sú se applica ipso jure aos iinmigrantes vindos <strong>de</strong> colonias ou riaçijes estran-<br />
geiras, mas po<strong>de</strong>-se tambem applicar aos restantes trabalhadores immigra-<br />
dos mediante accordo previo entre o patrão e os salariados.
-<br />
CONTBACTOS DE lSlMltiK~~+~u<br />
-<br />
O regulamento <strong>de</strong> 1880 virava principalmente as emprezas agriçolas<br />
e industriaes, o tle 1889 visa em especial a- i3iiiprezas ;tgricoIiis e inineiras.<br />
Emfim o regulamento <strong>de</strong> 1889-1891 garante urna protccqi~o rniiito mais<br />
efficaz aos iminigrantes. O numero dos culis chinezes n'esta parte cl:i ilha<br />
era em I900 <strong>de</strong> Y6:500, e, segundo affirma Reinscli, em gran<strong>de</strong> qiianticta<strong>de</strong><br />
sujeitos ao crrdit bo?tdclge, que o3 fazia permanecer in<strong>de</strong>tiiiidxineritc :to ser-<br />
viço dos patróer qiif: protegiam propos~titilarnente os jogos <strong>de</strong> :i/.,ir, para<br />
empobrecer os scrviqaes e inhibi-10s <strong>de</strong> pagar a divi<strong>da</strong>.<br />
.A ordcnanya <strong>de</strong> 18)S!J-1891 foi gener.alirad,i, com alteraFes insigni-<br />
ficantes, As ecguiiites r-egióes: reuidcnciii ile Bencoiilcn; districtos Lam-<br />
pongs; secções sul e leste <strong>de</strong> Bornéo; governo <strong>da</strong>3 Ccldbcs e siias <strong>de</strong>pen-<br />
<strong>de</strong>ncias ; re*itl(.iit1iit tle Menado; e resi<strong>de</strong>ncia Rioiiw e suas dcpen<strong>de</strong>ncias.<br />
I'arit algiiinas <strong>da</strong>s outras regióes dii-; c~oloiiiits neerlanilezi~s, a or<strong>de</strong>-<br />
nança foi =eii~ivi~lmrnte<br />
modifica<strong>da</strong>. No Governo <strong>da</strong> Costa. Oe~tc<br />
<strong>de</strong> Siiinatra<br />
4 a itnmigra(;?ío reg~iludn pela or<strong>de</strong>naiiç~ <strong>de</strong> :$O clc novembro <strong>de</strong> 1S86, que<br />
apresenta ic particulari<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s suas disposições serem spplicaveis a todos<br />
os traballiadores qae náo sejam natiiraes dos territorios tle terra firme<br />
d'esse Gocwtio. D'este modo os habitantes dns illiit~ c illiotas, que fazem<br />
parte do Gooer~io, sí, pó<strong>de</strong>m tral~alhar ein terra firme, sol, o rcgimen do<br />
contracto <strong>de</strong> imrnigraçRo. Esta ortlenançi~<br />
permitte que iini inimigrante se<br />
afaste do local do tral)allio, ao passo qus, a qne se applica A costa leste, sd<br />
o consente, quando com o fim <strong>de</strong> apresentar Q auctoridii<strong>de</strong> alguma queixa<br />
por maus tratos recebidos. A duraçiio maxima do contrãcto para os immi-<br />
grantes vindos ctas ilhas do Governo é cle dois annos. Esta or<strong>de</strong>nança, com<br />
pequenas mu<strong>da</strong>nças, foi man<strong>da</strong><strong>da</strong> applicar 6s resi<strong>de</strong>ncias <strong>de</strong> Palembang,<br />
Ternate, Amboine e secção oeste <strong>de</strong> Bornéo.<br />
Para Java e para as outras possessões hollan<strong>de</strong>zaj não existein regu-<br />
lamentos sobre immigrãçáo. Isso provém <strong>de</strong> que em algumas d'ellas os tra-<br />
balhos agricolas estão muito pouco tlesenvolvidos, e n'outraa como Java,<br />
a população <strong>de</strong>nsissima fornece to<strong>da</strong> a mão d'obra que apenas occiipa um<br />
numero insignificante <strong>de</strong> trabalhadores estrangeiros.<br />
Nas colonias allemás a legislação sobre trabalho importado é a se-<br />
guinte. No protectorado <strong>da</strong> Nova (iuind, no Pacifico, on<strong>de</strong> se iitilisa a<br />
I'<br />
-<br />
Y""
296<br />
- - - . - .. - -<br />
POLITICA INDIGENA<br />
-- - - - - - - -<br />
immigraçáo interior e javaneza, vigora a or<strong>de</strong>nança <strong>de</strong> 15 d'agosto <strong>de</strong> 1888<br />
regiiliimenta<strong>da</strong>, qiianto no tratamento dos indigenas no local do trabalho,<br />
pelas or<strong>de</strong>nanças tle Iíi d'agosto <strong>de</strong> 1888, 19 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1891 e 18<br />
<strong>de</strong> outubro <strong>de</strong> 1804. A saiicçáo penal dos contractos <strong>de</strong> trabalho immigrado<br />
est& <strong>de</strong>fini<strong>da</strong> pela or<strong>de</strong>nança <strong>de</strong> 22 <strong>de</strong> outubro <strong>de</strong> 1888 on<strong>de</strong> se estabele-<br />
cem as seguintes penali<strong>da</strong><strong>de</strong>s applicaveis aos indigenas: privaçiio parcial<br />
<strong>de</strong> alimentoe, proloiigaçílo do trabalho diario aldni <strong>da</strong> duração regulamen-<br />
t3r1 reclusáo isola<strong>da</strong> simples ou a ferros, e castigos corporaes. Aos javane-<br />
zes iminigrados po<strong>de</strong>m-se tambem applicar multas pecuniarias até 30 marcos.<br />
No Togo o recrutamento dos immigrantes só se p6<strong>de</strong> fazer mediante<br />
licença concedi<strong>da</strong> pelo Commissario Imperial, e as contliçóes <strong>da</strong> immigração<br />
silo regula<strong>da</strong>s pela or<strong>de</strong>nança <strong>de</strong> 21 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1891 e diversos regu-<br />
lamentos posteriores.<br />
Na Africa Oriental Allemá começou o importar-se máo d'obrn. asiatica<br />
em 1892, publicando-se ein 21 tle março cl'esse anno i1m <strong>de</strong>creto regula-<br />
mentando : a introctiieçáo e chega<strong>da</strong> dos immigrantes; o transporte do logar<br />
do <strong>de</strong>sembarque at4 ao ponto do <strong>de</strong>stino; a installaçáo e tratamento no lo-<br />
cal do trabalho ; as modificaçúes aos contrãctos <strong>de</strong> trabalho ; e varias dispo-<br />
siçóes geraes <strong>de</strong> policia e fiscalisaçáo.<br />
Em 1 <strong>de</strong> jullio <strong>de</strong> 1893 publicou-se outro <strong>de</strong>creto sobre o mesmo<br />
assiimpto completando o anterior.<br />
No Congo I~clg;~<br />
foi regulamentado o recrutamento <strong>de</strong> serviçaes pelos<br />
<strong>de</strong>cretos <strong>de</strong> 1 ,jiineiro <strong>de</strong> 1890, <strong>de</strong> 28 <strong>de</strong> março do mesmo anno relativo<br />
á, verificaçáo do- contractos, <strong>de</strong> 1 <strong>de</strong> abril do mesmo anno, e <strong>de</strong> 12 <strong>de</strong> junho<br />
<strong>de</strong> 18!)2, relati\ o li Iiygiene e repatriainento dos contr;ictados.<br />
Nas coloni;\~<br />
frnnceztis a base <strong>de</strong> todos os servic;ou <strong>de</strong> iminigraçáo B O<br />
extensissimo <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 27 <strong>de</strong> março <strong>de</strong> I852 que, sobretudo, regulamenta<br />
cui<strong>da</strong>dosamente o transporte dos immigrantes. Quanto no tratamento local,<br />
repiitriamento, etc.., este diploma cra bastante resumido e attribuia aos<br />
governadores <strong>da</strong>s colonias :L fliciil<strong>da</strong>tle <strong>de</strong> elaborar e promulgar to<strong>da</strong>s as<br />
regiilamentaçúes necessaria?. D'este modo, não se fez esperar muito uma<br />
avalanche <strong>de</strong> or<strong>de</strong>nanças, <strong>de</strong>creto$, portarias e reguiamentos que principal-<br />
mente na Martinice, G~ia<strong>de</strong>lupe e Reiiniko assumiram as proporçóes d'um
ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro diluvio IegisIativo. Não nos referiremos em <strong>de</strong>talhe a esses di-<br />
plomas, visto terem sido revogados c substituidos por uma sdrie <strong>de</strong> <strong>de</strong>ore-<br />
tos confeccionados na inetropolc, e que hoje constituem a legislação em<br />
vigor. Estas leis que formam ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros codigos <strong>de</strong> immigraçso pelo <strong>de</strong>sen-<br />
volvimento e perfeic;Ro qne attingem, foram prorniilga<strong>da</strong>s, mais no intuito<br />
<strong>de</strong> alcançar que o governo inglez permitta a emigriiç50 contractadii para<br />
as coloiiias francezas, dos culis indianos, c10 que no Iiiimanitario ob,jectivo <strong>de</strong><br />
assegurar x estcs iiltimos as garantias contr,ictiiaeu e n melhoriii <strong>de</strong> trata-<br />
mento. Em 2 <strong>de</strong> outubro <strong>de</strong> 1885 publicou-se o <strong>de</strong>creto regulamentando a<br />
immigração em Mayotte e Nossi-Be ; em 13 <strong>de</strong> jnnho <strong>de</strong> 1SS7 o qnc se refere<br />
á Guyana ; em 27 <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong> 1887 para a Reiinião, sendo iiltimamente<br />
modihcado pelo <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 30 <strong>de</strong> março <strong>de</strong> 1881: em 30 <strong>de</strong> junho <strong>de</strong> 1890<br />
sobre a immigração na Gua<strong>de</strong>lupe ; em 6 <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 1903 sobre a immigra-<br />
çBo em Wa<strong>da</strong>gascar. Nas colonias francezns do norte d18frica nHo existe o<br />
problema <strong>da</strong> immigra(;ão exotica, e nas colonias e protectoradcs asiaticos a<br />
mão d'ohra local Q ahiin<strong>da</strong>ntissima e dispensa totalmente o regimen ile tra-<br />
balho importado. Na Nartinica nSo hii actiialmente nenhuma legislação em<br />
vigor sobre immigraçãio, visto a <strong>de</strong>nsi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> população <strong>de</strong> car, e a sua re-<br />
gular concorrencia ao trabalho terem <strong>de</strong>cidido o governo francea a prohibir<br />
a immigraçáo contracta<strong>da</strong>, por <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> I7 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 188.5. Nos esta-<br />
belecimentos francezes <strong>da</strong> Oceania em Tahiti e Moorea a immigrac;áo contra-<br />
cta<strong>da</strong> foi auctorisa<strong>da</strong> por portaria colonial <strong>de</strong> 23 <strong>de</strong> marco <strong>de</strong> 1857, e tem<br />
sido ulteriormente regulamen ta<strong>da</strong> pelas seguintes portarias : 30 <strong>de</strong> março<br />
<strong>de</strong> 1864, 26 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 1878, 24 <strong>de</strong> fevereiro <strong>de</strong> 1883, 2 <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 1883,<br />
25 <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong> 1883 e 14 <strong>de</strong> fevereiro <strong>de</strong> 1837. Na Nova Caledoilia foi<br />
regulamenta<strong>da</strong> a irnmigraçáo nko-hebri<strong>de</strong>nse por portaria <strong>de</strong> 10 <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong><br />
1868, siispensa pela portaria <strong>de</strong> 23 <strong>de</strong> março <strong>de</strong> 1883 qut? proliibia a en-<br />
tra<strong>da</strong> n'aqiiella colonia <strong>de</strong> immigrantes <strong>de</strong> proveniencia oceaniana, e resta-<br />
belecidn pela portaria <strong>de</strong> 20 <strong>de</strong> março <strong>de</strong> iS9O. Por portaria <strong>de</strong> 26 <strong>de</strong><br />
março cle 1874 foram regula<strong>da</strong>s as condiçúes <strong>de</strong> iiitroducçáo <strong>de</strong> trabalha-<br />
dores auiaticos, africanos e oceanianos, e o regimen <strong>de</strong> protecc;Zo durante<br />
a sua permanencia na Nova Caledonia. Por portaria <strong>de</strong> 20 <strong>de</strong> junho cle<br />
1895 foram regulamenta<strong>da</strong>s as condiçóes especiaes <strong>de</strong> assalariamento <strong>de</strong>
298 I'OLITICA INDIGESA<br />
- - - -- - - - - - . . - - - - - - - -<br />
immigrantes indo-cl~riicze~; e, ponco tempo <strong>de</strong>pois. siispensa ten~porariament~<br />
no Tonlíin a rinigrac;Tto contracta<strong>da</strong>. foi negociado com o governo tltis Indi:is<br />
Orieiitae. Sec.rlaiitlczas um accordo auctorisando t~ ernigra,;Ao para :i So\.a<br />
Caletlonilt tle ciilis javanezes, exclusivamente <strong>de</strong>stinados a trab,+llios agricolas<br />
e á domestici<strong>da</strong><strong>de</strong>, e c~ijas condiqúes <strong>de</strong> imniigrapilo eraiii tleterrntri;iclas<br />
pelo regulamento <strong>de</strong>cretado em Numêa em 19 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> lS!)B.<br />
Os codigos <strong>da</strong> immigração para a Guyana, (tiia<strong>de</strong>liipe, Jlayotte, Reunião<br />
e Ría<strong>da</strong>gascar 850 tgo extensos que B difficil clescrever re~nmid:imeiite<br />
as siias disposi(;óes principaes. A cnratella dos indigenas irnmigrac!os iilcumbe<br />
a um cliefe chamado i~rotcctor tlos i~n~niyiaritcr na (fiiyaiia e Rc~nriiZ~l.<br />
e ('oI))~)I~~s(~P io du immiq).cxçrio em Ma<strong>da</strong>gascar. Abaixo dleste fnnc+cioiiar~o<br />
varia tias diii'erentes colonias a organisaqão do pessoal <strong>da</strong> inimigraváo. 0-<br />
<strong>de</strong>legados do chefe nas diferentes locali<strong>da</strong><strong>de</strong>s teem o nome <strong>de</strong> syntltcos.<br />
Quando os navios <strong>de</strong> immigrantes chegam ao porto, sáo estes ao <strong>de</strong>sembarcar<br />
iiispeccionados por uma commissão especial que verifica e fiscalisa se,<br />
até Aquelle momento, se cumpriram os preceitos legaes, e recelje as queixas<br />
ou reclamaçúes dos immigrantes.<br />
Estes são em segui<strong>da</strong> encerrados em <strong>de</strong>positas at6 & sua distriboiyác~<br />
pelos respectivos patróes, que se leva a effeito por forma a náo separar os<br />
individuos <strong>da</strong> mesma familia.<br />
O trabalho coiitractado ao serviço dos colonos 6 obrigatorio para<br />
todos os immigrantes durante a permanencia na colonia. Os contrbctos náo<br />
po<strong>de</strong>m ser celebrados por periodo superior a 5 annos. As rcgras que regulam<br />
o recrut,iiiicnto e assignatnra dos contractos procuram garantir qiir<br />
os assalariados comprehenclam claramente as obrigaç6es a que se siijeitani.<br />
c tenham to<strong>da</strong> a liberd~<strong>de</strong> para as acceitar ou reciizar. As inst:illaqOei,<br />
alimentaqáo. salarios, vestuario, duraçso do trtiballio, dias <strong>de</strong> folga. assistencia<br />
medica e hospitalisaç~o, está tudo miniiciosamente regiilin~eiitado.<br />
O commissario <strong>da</strong> immigraqão e os ~yndicos, seus <strong>de</strong>legados, teem O<br />
<strong>de</strong>ver e FI facul<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> entrar nas plantações visitando os immigrantes,<br />
ouvindo as suas reclamaçóes, ou as dos patróes contra elles, piinin<strong>da</strong>-os<br />
disciplinarmente, ou promovendo contra os patróes, e vigiando se no trata-<br />
mento dos contractados e no trabalho se cumprem integralmente a lettra dos
CONTHACTOS DE IMIIIGRA(;AO<br />
- - . - - - - - -- - - - -- - - - - - - - --<br />
contractos c os preceitos d'esta lei. Em relaçgo aos patríjcs (~Lle reiilci<strong>da</strong>m<br />
em transgrcdir OS coiitritctos oii os regiilniiieiitos <strong>de</strong> immigraçáo, o governador<br />
<strong>da</strong> culoiiia tem o direito <strong>de</strong>, in<strong>de</strong>l~ciiclenteniente <strong>de</strong> qualquer ac(;&o<br />
judicial que contra elles corra, proliibir que celebrem novor contractos <strong>de</strong><br />
immigração c até mesmo cassar-llies os existentes, fazendo sahir os immigrantcs<br />
ao scn serviço.<br />
Na tr:liisgre\sáo (10 contracto lloia <br />
necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> fallar ao syndico ou ao respectivo consiil.<br />
Esta falta no serviço s6 pó<strong>de</strong> trazer comsigo a per<strong>da</strong>. do salario oii<br />
<strong>da</strong> raça0 dinria <strong>de</strong> alimentos.<br />
Quando se náo d? nenhum (10s casos <strong>de</strong>scriptos e a ansencia se verifique<br />
(liirante tres dias <strong>da</strong>-se a ~~ziseizcici ilieycil que. alem <strong>de</strong> fazer per<strong>de</strong>r<br />
os salarios correspon<strong>de</strong>ntes, importa :i obrigação <strong>de</strong> prolongar o periodo do<br />
serviço contractado por rim tempo egiial no <strong>da</strong> ausencia. Passados tres dias<br />
a aiisencia converte-se em drsergflo, punivel como contrarenqão policial ; no<br />
fim d'um mez. a <strong>de</strong>~eryão passa a cliamar-se rrr,qnl)tlndcrgei~? e é piinivel como<br />
<strong>de</strong>licto.<br />
Quando termina o seu tempo <strong>de</strong> serviqo cad;i immigraiite teni a facul<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> optar por qualquer <strong>da</strong>s segnintes <strong>de</strong>cisócs: reclamar o relntriamento<br />
gratuito que os contractos lhe garantam ; renovar o contracto. recebendo<br />
n'esse caso uma gratificação em regra egiial á <strong>de</strong>spezn provavel do<br />
repatriamento ; sollicitar uma licença <strong>de</strong> resi<strong>de</strong>ncia na colonia. (I)<br />
Temos at8 aqui examinado as lcgislaçúes relativas ao contriicto dos<br />
immigrantcs nas colonias que carecem tle triibalho importaclo, mas convdm<br />
tambem n5o esquecer que a sahi<strong>da</strong> dos emigrantes pre,jiiilica com frequencia<br />
os paizes <strong>de</strong> proreniencia, que se vêem forqados a limitar e até a prollibir<br />
o recriitamento e exportação dos indigenas <strong>da</strong>s suas colonias.<br />
Nas colonias inglezas <strong>da</strong> Afriea Occi<strong>de</strong>ntal, Costa (10 Oiiro, G :vnbia,<br />
(1) Ln niaitt d'mricre ntrx colonies. Institiito Colonial Internacional.
300<br />
-<br />
POLITIC.4 INDIGENA<br />
-- - .<br />
Serra Leôa, Nigeria e Lagos teem-se adoptado siiccessivas medi<strong>da</strong>s para<br />
restringir a sahi<strong>da</strong> <strong>de</strong> trabalhadores contractados, e para dificultar o seu<br />
recrutamento.<br />
A regnlamentaçáo e taxas <strong>de</strong> emigraçiio qiie, provenientes d'estas<br />
leis, entravaram o recriitamento <strong>da</strong> infio d'obra indigena nas possessóes<br />
inglezas do golplio <strong>da</strong> Giiiné, faziam <strong>de</strong>rivar <strong>de</strong> tal modo a procura <strong>de</strong><br />
emigrantes pnra a Costa <strong>de</strong> Marfim, que o governatlor d'esta colonia fran-<br />
ceza <strong>de</strong>cretou em 11 <strong>de</strong> janeiro tle 1894 qiie o recrutamento dos emigrantes<br />
só se po<strong>de</strong>ria fazer com auctorisaçáo especial do governador ou do seu<br />
representante, e lançou uma taxa <strong>de</strong> 25 francos sobre ca<strong>da</strong> emigrante, a qual<br />
<strong>de</strong>via ser paga pelo agente assalariador antes do embarqiie. Mais tar<strong>de</strong><br />
celebrou-se entre esta colonia e a Costa do Ouro um 9)todits viu~ndi,<br />
redil-<br />
zindo a taxa <strong>da</strong> emigraçíio a dois francos.<br />
Xo Senegal tambem foram adopta<strong>da</strong>s rigorosas medi<strong>da</strong>s restrictivas<br />
<strong>da</strong> exportaçiio <strong>de</strong> traballiatlores pelo <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 17 <strong>de</strong> junho tle 1895.<br />
Nas 1ndi:ts 0rieiitiií.s Xeerlan<strong>de</strong>zau, jB pela or<strong>de</strong>nança <strong>de</strong> 13 <strong>de</strong> outii-<br />
bro <strong>de</strong> 1872, o governo :~cloptára medi<strong>da</strong>s para fiscalisar e reprimir o trans<br />
porte dos indigenas para o estrangeiro, sobretiido com o fiin <strong>da</strong>s peregri-<br />
naçóes a Mecca. Essa or<strong>de</strong>nança passoii a applicar-se ao transporte dos<br />
immigrantes estrangeiros por <strong>de</strong>terminação legal <strong>de</strong> 9 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 1887;<br />
e, em 39 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 1887, em segui<strong>da</strong> a uma numerosa emigração java-<br />
neza para Suriiiarn o governo prohibiu expressamente o recrutamento dos<br />
indigenas para -t\rfw eml)regados fora <strong>da</strong>s ilhas neerlan<strong>de</strong>zas, sanccionando<br />
esta <strong>de</strong>terminai, io com penas severissimas<br />
O mesmo <strong>de</strong>creto reserva, porém, ao governador geral a facul<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> levantar esta interdicqáo, excepcionalme~~te,<br />
por um periodo limitado,<br />
quando as circnmstancias reconheci<strong>da</strong>mente o aconselhem.<br />
Em novembro <strong>de</strong> 1876 a Inglaterra prohibiu o recrutamento <strong>de</strong> culis<br />
indianos para a Guyana franceza, allegando a insal~ibri<strong>da</strong>dc d'aquella colo-<br />
nia; e em 1SK2 estendia essa medi<strong>da</strong> 6, sahi<strong>da</strong> <strong>de</strong> emigrantes para a Re-<br />
unino cujas aiictori<strong>da</strong><strong>de</strong>s se nao tinham querido siibmetter tí forma <strong>de</strong> pro-<br />
tecçHo aos irnrnigrantes que :i Inglaterra (pieria impor aos paizes <strong>de</strong> <strong>de</strong>stino,<br />
como coiidição sine qicn n»,z pHr& tolerar o recriitamento dos culis hindús.
Em 1885 foi tambem prohibi<strong>da</strong> a immigraçáo indiana para as Antiliias<br />
francezas.<br />
No Congo belga o recrutamento dos indigenas s6 é permittido aos<br />
portadores d'lima licença especial, concedi<strong>da</strong> pelo governador, vali<strong>da</strong> por<br />
um anno e que custa 100 francos.<br />
No Congo francez para impedir a emigraçáo assalaria<strong>da</strong> lançou-se<br />
uma taxa <strong>de</strong> 100 francos sobre ca<strong>da</strong> passaporte <strong>de</strong> emigrante.<br />
Em varias colonias allemás teem sido adopta<strong>da</strong>s diversas medi<strong>da</strong>s<br />
repressivas <strong>da</strong> emigração indigena. Na Uamaralandia foram expressamente<br />
prohibidos, por <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 17 <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 1891, o recrutamento e a expor-<br />
tação dos indigenas Berg-Damaras, em todo o territorio <strong>da</strong> Africa Occi<strong>de</strong>n-<br />
tal Allemá.<br />
Por <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 1 <strong>de</strong> setembro <strong>de</strong> 1893 foi prohibi<strong>da</strong> a exportayáo<br />
<strong>de</strong> indigenas do protectorado <strong>da</strong>s ilhas l\larschall para fora do territorio<br />
do protectorado.<br />
No protectorado <strong>da</strong> Companhia <strong>da</strong> Nova Guiné foi <strong>de</strong> longa <strong>da</strong>ta<br />
prohibi<strong>da</strong> a emigração indigena, a náo ser para as outras colonias allemils<br />
do Pacifico. Por <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 14 <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong> 1883 o commissario imperial<br />
limitou ain<strong>da</strong> a proveniencia <strong>da</strong> emigraçáo circumscrevendo-a ao archipe-<br />
lago <strong>de</strong> I
(10s inconvenientes do triibnllio importado é a intromissão qiiasi quotidiana<br />
tlo elemento official na administraçáo <strong>da</strong>s exploraçóes particulares. Essas<br />
clansiilas, mais oii menos iiiconimod;is e indiscretas para os colonos, são com-<br />
t,iitlo indispensaveis para que o contracto cle immigraçáo possa ser uma coisa<br />
moralmente clefensavel.<br />
A par (Ia iinmigriiçiío assalaria<strong>da</strong>, acontece cis wzes formarem-se nu-<br />
clcos <strong>de</strong> iiilinigrnç:to cxotica, livre clc contriicto prcvio, como está, por<br />
exemplo, suc.cedcndo na hfrica c10 Sol.<br />
Importa n5o confiindir estas tliins immigrayGes, cliier sob o ponto <strong>de</strong><br />
vista <strong>da</strong> ccnili(:3o jiiridicn 1103 immigrantes, quer sob o ponto <strong>de</strong> vista <strong>da</strong>s<br />
rwpectiva'.; conseqiii!ncias politicas c economieas.<br />
No Transwaal, ao passo que a inimigraçáo chineza assalaria<strong>da</strong> é lima<br />
ro<strong>da</strong>gem intlis~icnaavcl &i exploraçõcs anriferas, iirn accelerador teinporario<br />
cln protliicçilo cxigiclo pelo capital, a permanencin. (10s chinezes como trahalliadorcs<br />
livres t: iirn perigo economico serio para a socie<strong>da</strong>cle branca,<br />
vcncidn. pelas mo<strong>de</strong>stas exigcncii~s dos trabalhadores orientaes que insensivelmento<br />
se vzo sii1)~titiiindo aos eiiropeiis.<br />
A immigrac;Ho livre 6 iirn phenomciio social c~pontaneo. Emigram volirntnriamente<br />
os ecipiritos avcntnreiros, as victimas <strong>de</strong> perturbações politicits<br />
on <strong>de</strong> pcrscgiiiçóc*~ religiosag, e os necessitarlos que <strong>de</strong>sejam melhornr as<br />
condiç6es d:i euiitc.ncia. Totlos vko geralmente <strong>de</strong>dicar-se á profissão OU<br />
á incliistri;~ qiic n-ielhor conlieccm, que ,i& exerceram, oii para que mais<br />
propeiiclc a oricntnc;5o tl:t resprctivn etliicaçáo ou condição social. Sáo novos<br />
coloiios CI!J~L prcsençn só B nociv~, quando a accentriaçFio do typo etllnico<br />
impe<strong>de</strong> :i siia fiiGi,o, ou mesmo a associaç~o intima com a socie<strong>da</strong><strong>de</strong> colonial.<br />
A immigraçFto contracbtatla, pelo contrario, 6 essencialmente artificial,<br />
produzid:~ por infliicncias estranhas aos indivicluos qiie :I compõem, e SU-<br />
jcitn a iirn serviço publico tlc recriitamento, policia reprcsgira c fiscalisa-<br />
(;Zo do trnl):ilho, qiie nnormnlisa a condiçao j~iridica d'esses immigrantes<br />
coiivcrtenc1o.o~ transitoriamente, por assim dizer, em fiinccionarios do go-<br />
verno cliie o.; rccriita.<br />
A neccssicliirle (I'CSSH<br />
int~:rven~;o<br />
(10 Estado foi reconheci<strong>da</strong> no regu-<br />
lamento geral para ;L utilisaçiio (Ia mão d'obra exotica, elaborado pelo
Instituto Colonial Internacional <strong>de</strong> Bruxellas na sua sessão <strong>de</strong> 1899, <strong>de</strong>pois<br />
<strong>de</strong> longas, interessantes, e documenta<strong>da</strong>s discussúes. Isto não quer, porém,<br />
dizer que não <strong>de</strong>va ser reservado aos particulares o direito <strong>de</strong> assalariarem<br />
directamente trabalhadores exoticos sob a fiscalisaçiio, e <strong>de</strong>ntro <strong>da</strong>s normas<br />
fixa<strong>da</strong>s pelo Estado. Para nRo tornar difficil e <strong>de</strong>feituosa a distribiiiçáo<br />
dos traballiadores contractados directamente pela colonia, pelos patrões<br />
que d'elles carecem cm numero e quali<strong>da</strong><strong>de</strong> variaveis com a importancia e<br />
a natureza <strong>da</strong>s exploraçries agricolas o11 indiistriaes que dirigem, torna-se<br />
necessario, ou que os colonos recrutem directamente a 11180 d'obra nos<br />
paiees <strong>de</strong> proveniencia, ou que a requisitem com antecerlencia ao governa<br />
<strong>da</strong> SIM colonia eiicarregado d'esse recrutamento, indicando o numero <strong>de</strong><br />
serviçaes que <strong>de</strong>sc,jatn empregar, e a natureza do servivo que preten<strong>de</strong>m<br />
exigir d'ellea.<br />
Trabalho importado nas colonias portuguezas- Mão d'obra em S. ThornS e Principu<br />
Em qnasi toclas as colonias portuguezas, a relativa <strong>de</strong>nsi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s po-<br />
piilaqóes indigenas tem bastado para satisfazer a procura <strong>da</strong> mão d'obra<br />
agricola e industrial, sem que tenha sido necessario recorrer aos contractos<br />
<strong>de</strong> iinmigração. O atraeo <strong>da</strong> agricultura e o pequeno <strong>de</strong>senvolvimento <strong>da</strong>s<br />
industrias coloniaes ngo exigem, na ver<strong>da</strong><strong>de</strong>, um pessoal trabalhador muito<br />
numeroso. Faz excepc;;lo a esta regra a prorincia <strong>de</strong> S. Thomé e Principe,<br />
cujo incompttravel grau <strong>de</strong> valorisaçáo agricola é conhecido em todo o mun-<br />
do, t..que, nAo po<strong>de</strong>ndo contar com a populaçáo local, indolentissima, <strong>de</strong>pra-<br />
va<strong>da</strong> e pouco numerosa, carece <strong>da</strong> importação d'um forte contingente <strong>de</strong><br />
trabalhadores exoticos.<br />
Em todos os periodos successivos <strong>da</strong> colonisaçáo portugueza em S. Tho-<br />
mé, a importação <strong>da</strong> mão d'obra foi sempre indispensavel A exploraçãs<br />
agricolw do fertilissimo solo d'aquella privilegia<strong>da</strong> regiiio. Des<strong>de</strong> 1181, anno<br />
em que a ilha foi doa<strong>da</strong> a João <strong>de</strong> Paiva e sua filha Maria <strong>de</strong> Paiva, ou
304 PULITICA IKDIGENA<br />
- - - - - - -<br />
mesmo anteriormente, começou a importação 40s escravos. Durante a administração<br />
d'estes donatarios, e dos que se lhe seguiram-João Pereira, A1varo<br />
<strong>de</strong> Camintia e Feriiam <strong>de</strong> hIello-a mHo d'obra agricola era cxcliisivaniente<br />
fornec'i<strong>da</strong> pelos escravos trazidos <strong>da</strong> Giiiné e <strong>de</strong> Angolzi, e pelos<br />
<strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> ju<strong>de</strong>us expulsos <strong>da</strong> metropole.<br />
Quando, com o regresso á adrninistrayáo directa em 1,522, começaram<br />
a afflliir a S. Shomé numerosos colonos ma<strong>de</strong>irenses que implantaram na<br />
ilha o cultivo <strong>da</strong> canna <strong>de</strong> assucar, tlescilvolveii-se bastante a agricultura<br />
que, contando seguramente coni o fornecimento illimitado <strong>de</strong> escravos,<br />
attingiu em nieiados do seciilo xill urna adrniravel prohperi<strong>da</strong><strong>de</strong>. A per<strong>da</strong><br />
<strong>da</strong> in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ncia nacional, e o <strong>de</strong>smoronarncnto geral do imperio colonial<br />
portuguez, fizeram-se sentir dcsastrosanientc em S. Tlioiné, ~rrninanclo a<br />
indiistria assucareira, e obrigando os coloilos a emigrar para o Hraxil, abandonando<br />
as plantaçóes, e <strong>de</strong>ixando 03 escravos que entregues a si proprios se<br />
lançaram na niai~ assulcidora anarchia, disper3ando-se pela ilha c recahindo<br />
em plena selvagc~ria.<br />
N'esae e~t~rtlo <strong>de</strong> qiiitui completo abantlono se oonservoii a colonia até<br />
ao principio do seculo XIX, introduzindo-se entko as ciiltiiras do café em<br />
1800, segundo o Snr. Alma<strong>da</strong> Negreiros, ou em 17'35 segundo o Snr. Xugusto<br />
Ribeiro, c do cacaii em 1822, <strong>da</strong>ta em qiic começou o resurgirncnto<br />
<strong>da</strong> obra colonisadora qiic actiialmente enthiisiasma e assomlra tanto naciorinee<br />
como estrangeiros. Ao <strong>de</strong>senvolvimento <strong>da</strong>s plantay6es <strong>de</strong> caf6 e <strong>de</strong><br />
cacau correspontl~~ii urna nova era tlc importaqso <strong>de</strong> esrravos. Entilo, como<br />
no primeiro per tlo liistorico, como ain<strong>da</strong> rios noqsos dias, a insiifficiencia<br />
e incapaci<strong>da</strong><strong>de</strong> ('. i inAo d'obra local irnpiinham o recurso á immigraçgo, como<br />
iinico iiieio <strong>de</strong> e r3rancar tio exhuberantissimo solo <strong>da</strong> ilha, as inexgotaveis<br />
riquezas agrico1.1- qiir elle p6<strong>de</strong> produzir. Estava, conltiido, ain<strong>da</strong> reserva<strong>da</strong><br />
A acci<strong>de</strong>nta<strong>da</strong> existencia d'estã colonia mais uma terrivel prooaçáo, a aboliçáo<br />
<strong>da</strong> escravatura. Este golpe profundo, e que podia ter sido mortal, se<br />
os opiilentos restou <strong>de</strong> terra africana que Portugal conserva não fossem<br />
provi<strong>de</strong>ncialmente táo populosos, influiu, to<strong>da</strong>via, no progresso agricola, atrazando<br />
consi<strong>de</strong>ravelmente a valorisação do solo e o movimento cominercial<br />
que d'ella resulta. A escravidão foi aboli<strong>da</strong> nas colonias portuguezas por
<strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 29 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 1858 que fixava iim periodo <strong>de</strong> 20 annos para a<br />
emancipaç80 progressiva dos escravos qiie, se ain<strong>da</strong> algiins lioilvesse em<br />
lS78, passariam á condiçáo transitoria <strong>de</strong> libertos.<br />
A lei <strong>de</strong> 25 <strong>de</strong> fevcreiro <strong>de</strong> 1869, referen<strong>da</strong><strong>da</strong> por Sri <strong>da</strong> Ban<strong>de</strong>ira,<br />
impunha a transformaçáo immediata dos escravos cm libcrtos e reforçava<br />
s anterior, abolindo tambcm para 1878 a referi<strong>da</strong> condiçrio intermedia do<br />
trabalho obrigatorio dos libertos. Pela lci <strong>de</strong> 29 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 1875 foi antecipa<strong>da</strong><br />
para 1876 a emancipaçilo gcral dos escravos em to<strong>da</strong>s as colonias<br />
portiiguezas, terminando <strong>de</strong>finitivamente o trabalho obrigatorio dos libertos.<br />
Em S. ThomB ntio se esperou qiie <strong>de</strong>corresse o praso <strong>de</strong> um anno disposto<br />
na lei. 0s libertos, nas vesperas <strong>da</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong> coinpleta, niillamente preparados<br />
para a comprehendcrem e ~gra<strong>de</strong>cerem, e segiiiiido os perniciosos<br />
. ~cmplos e conselhos <strong>da</strong> parte livre <strong>da</strong> população, escoria abjecta e viciosa<br />
qne tem sido sempre um embaraço serio para a exploração agricola <strong>da</strong><br />
ilha, começaram a revoltar-se contra os patróes e a entregar-se a excessos<br />
<strong>de</strong> to<strong>da</strong> a or<strong>de</strong>m. Creoii-se assim um estado <strong>de</strong> coisas anormal e uma angustiosa<br />
incerteza a que era ilecessario prover <strong>de</strong> prompto, com uma solnçZo<br />
-6ca;z que procurasse conciliar os interesses #uns com a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> dos outros.<br />
O governador (1% ilha, Gregorio José Ribeiro, enten<strong>de</strong>u <strong>de</strong>ver anteci-<br />
par a execiiçáo <strong>da</strong> lei <strong>de</strong> 1875 e aboliu o tralnlho obrigatorio dos libertos,<br />
-endo esta medi<strong>da</strong> confirma<strong>da</strong> pelo governo <strong>da</strong> metropole no <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 3<br />
<strong>de</strong> fevereiro <strong>de</strong> 1876.<br />
O remedio fez peior que a molestia. Oa libertos gregorianos associa-<br />
ram-se á população local, abandonaram cm massa as plantaçóes, e recuza-<br />
ram absolutamente retomar o trabalho, preferindo-lhe a ociosi<strong>da</strong><strong>de</strong> tão cara<br />
aos <strong>da</strong> sua raça, e passando a viver do prodiicto dos roubos e <strong>de</strong>pre<strong>da</strong>~órs<br />
que llies rendia a siia feliz condição <strong>de</strong> vadios em tão iiberrimo solo.<br />
N'cstas circiimstancias, muitos dos roceiros, completamente <strong>de</strong>sanima-<br />
dos, vcndo itnirjiiillado o frncto do scii ardiio labiitar, e prociiranclo evitar<br />
a riiina complctn qiie ,julgccvarn inf,tllivc.l, cleixaram a, colonia, ce<strong>de</strong>ndo as<br />
suas rotas por preyos irrisorios.<br />
Outros mais aiiimosos, oii mais previ<strong>de</strong>ntes, resistiram energicamente<br />
ao <strong>de</strong>sanimo que diff~indiam nos espiritos, os gran<strong>de</strong>s prejuizos e as enor-<br />
80
306 I'OLITICA INDIGENA<br />
mes diíücnld~t<strong>de</strong>s do momento, e encontrando na propria adversi<strong>da</strong><strong>de</strong> alento<br />
e coragem, proseguiram intrepi<strong>da</strong>mente a siia tarefa coloniuadora, prociirando<br />
conciliar os interesses <strong>da</strong> exploraçáo agricola com o novo regimen<br />
<strong>de</strong> traballio livre, e iniciando em larga escalla o rccriitamento <strong>de</strong> immigrantes<br />
contractados na provincia <strong>de</strong> Angola. A este niicleo <strong>de</strong> colonos intelligentes<br />
c emprelien<strong>de</strong>clores, refcrc-se o Sr. Con<strong>de</strong> dc Soiisa e Faro na siia<br />
interessante monographia u A Ilha tle S. 'i'l~olrle' e u li'op Agna Izé R , nos<br />
scgiiintca termos exactos e jiistos :<br />
.Em l~icta com os <strong>de</strong>smandos d'uma popiilaçao <strong>de</strong>smoralisa<strong>da</strong> que<br />
fizera cansa commum com o3 <strong>de</strong>svairados ex-libertos, <strong>de</strong>ram estes benemeritos<br />
agriciiltores, em tão diffieil conjiinct~ira, e no mais agudo <strong>da</strong> crise,<br />
provas exhuberantcs <strong>da</strong> maior sensatez e eircumspecç&o. L'romovendo a<br />
ac:tlmação dos animos irrequieto^, e transigindo com a gr6vc at6 on<strong>de</strong> a<br />
digni<strong>da</strong><strong>de</strong> pessoal o perniittia, por meio d'iima larga e generosa retribiiição<br />
do trabalho, applicaram-se a auxiliar o governo na difficil sitiiação em<br />
qiie sa encontrava, facilitando-llic a missão <strong>de</strong> implantar na provincia o<br />
novo regimen do traballio livre e remunerado.<br />
Longc <strong>de</strong> esmorcccr em táo nrdua tarefa, as contrnrie<strong>da</strong><strong>de</strong>s tinham o<br />
raro condão <strong>de</strong> llies avigorar as forças c dc os prcdispGr a siipportar com<br />
resignaçáo c coragem todos os revezes <strong>da</strong> sorte. E, poi~, a estes traballiadores<br />
infatigaveis que a provincia <strong>de</strong>ve, <strong>de</strong>certo, tnnis do que aos po<strong>de</strong>res<br />
piiblicos, a solução d'aq~ieila temerosa crise do traballio.~ Sáo bem mereci<strong>da</strong>s<br />
estas palavras elogiosas, p:irtindo <strong>de</strong> mais a mais d'uin co1;nial distincto,<br />
auctorisado, e especialmente conhecedor dos assumptos que se pren<strong>de</strong>m<br />
administravão e explorayáo agricola d'aquelle valiosissiino torrao.<br />
Com effeito, o Sr. Francisco Mantero e os agricultores qiie o acompanliar:lm<br />
no seu tenacissimo esforço colonisador, bem-mereceram <strong>da</strong> patria para<br />
cu,ia riqueza colonial em tgo subido grau concorreram.<br />
Os administradores <strong>da</strong>s avaria<strong>da</strong>s finanças <strong>da</strong> metropole, e o paiz<br />
inteiro, que agra<strong>de</strong>çam a esse piinliado dc homens corajosos e activos, os<br />
seis mil contos em ouro com que S. Tliomé annualmente concorre para<br />
melliorar o eqiiilibrio instavel dos nossos cambios. Da arroja<strong>da</strong> iniciativa e<br />
do perseverante esforço d'esscs benemeritos portiig~iczes resultou a pros-
peri<strong>da</strong>dc cresccnte <strong>da</strong>s plaiitaçúes e a immigraçáo <strong>de</strong> novos colonos e capitacs,<br />
qiic foram irnpiil3ionar <strong>de</strong> vcz aa cxploraçócs agricolas, levando-as ao<br />
dcscnrolvimcnto, aperfeiqoamcnto e prospcri<strong>da</strong>ilc quc Iiojc maravilliam todos<br />
os que conlicccin n opiilenta e forniosissimn 11~roEa do cncail. Se os colonos<br />
ma<strong>de</strong>irenses cultivavam a cannn e mxnipiilnvnm o assiicar á custa do trnbnllio<br />
escrilvo, se aos mesmos escravos fòra indispensavel recorrer qiiando,<br />
no começo e mciado do seculo xix, se prociirára fazer renascer a antiga<br />
prosperi<strong>da</strong><strong>de</strong>, aos plantadores <strong>de</strong> 1876 faltava absoliitamente a possibili<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
d'essc recurso.<br />
Diversas foram as tentativas pnr:l a ~itilisn(iHo <strong>da</strong> inão d'obrn locnl,<br />
mas niinca sc collien resultado algum nprovcitavel. Em ilczembro <strong>de</strong> 1876<br />
entravam em S. TbomB os priinciros serriqaes contractatlos em Angola,<br />
conforme o regulamento dc 20 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zcnibro <strong>de</strong> 1875, e, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> essa <strong>da</strong>ta, a<br />
luasi totali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> mão d'obra para os trabiillios ngricolas tem sido confia<strong>da</strong><br />
a immigrantes d'cssa proveniencia. Ern lS'3.5 foi importacln <strong>de</strong> Nacau<br />
uma leva <strong>de</strong> culis chinezes que dcu mediocres rcsiiltados ; e iiltimamente<br />
foi auctorisarla pelo ministro do ultramar, Conscllieiro Aiigiisto <strong>de</strong> Castilho,<br />
a emigra~ao dos indigcnas dc PiIoqanibiqiic pnrii S. Tliomc:, qiic p:trccc dcver<br />
ser coroa<strong>da</strong> do mcllior cxito. Ptslo niciios, o cliic conlieccmos do caracter<br />
c costiimes clas popnlaqóes d:t costa oricntal faz-nos acreditar que,<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> quc seja religiosamente acatado o seu direito ao rrpatriamento, os<br />
immigrantcs d'essa proveniencia viráo a constituir o elemento mais iitil,<br />
intelligente, laborioso e civilisavel <strong>da</strong> popiilaçáo roceira. Nem só angolas<br />
se contractam para S. Tliomb; caboverdcanos, ajudá~, anagos, kriimanos,<br />
çuin4s e cabin<strong>da</strong>s fornecem tambem em pcqiiena quanti<strong>da</strong><strong>de</strong> uma parte <strong>da</strong><br />
mko d'obra. Os cabiii<strong>da</strong>s sio sobretudo titilisados nos serviços maritiiiios<br />
cm que srio bastante peritos, e pelos qiiaes <strong>de</strong>monstram ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira predi-<br />
lecção. Todos estes serviçaes s5o regnlarmeiite repatriados quando termi-<br />
Iam os seus contractos, preferindo voltar ,2 patria, para usufriiirem as Unas<br />
:conomias na sua palhota e cntrc as sii:is miillicrcs.<br />
Outro tanto não acontccc com os Angolas qiie emigram conjuncta-<br />
mente com as mulheres e para quem a vi<strong>da</strong> tranqiiilla <strong>da</strong>s roças, o trabalho<br />
mo<strong>de</strong>rado <strong>da</strong>s cnlturas, a a1imcntac;áo abiin<strong>da</strong>nte e a benevolente equi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
:I:
308 POLITICA INDIGENA<br />
dos patróes, transformam o exilio n'iim ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro paraizo <strong>de</strong> que por f6rma<br />
alguma elles se <strong>de</strong>syjhm apartar, para volver :i primitiva e miscravel con-<br />
dição <strong>de</strong> victiinas e martyres, <strong>da</strong>s criicl<strong>da</strong><strong>de</strong>s e riolencias dos sobas serta-<br />
nejos. Porque, B preciso qiie se saiba que os angolenses immigrados em<br />
S. Thomé proveem riiramente <strong>da</strong> zona littoral, oii <strong>da</strong>s faclias territoriaes cm<br />
que o Estado portugiiez exercc administraçiio directa e effcctioa. Em gran<strong>de</strong> '<br />
maioria são recrntados no interior do sertno, nos sobados c rrgiilatos em<br />
que o nosso domiriio, muito attcniiado, se limita a exigir obediencia e vassa-<br />
lagcm aos chefes indigcnas, qiic continiiam a governar c a dispor dos seiis<br />
siibditoe, segiindo o mobil gttnancioso do seli interesse, e segundo o selvagem<br />
arbitrio <strong>da</strong> siia cri~cliladc. As pjarras d'cstes embriitecidos e ferozes poten-<br />
tados v50 os agente3 rccriitadotes arrancxr anniialmcntc os ccntenares <strong>de</strong><br />
infelizes, maltratados, escravisnilos e torturados negros a quem, ao cabo<br />
<strong>de</strong> cnnceirosa jorna<strong>da</strong>, sc abrem as portas d'um ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro E<strong>de</strong>n. A bôa<br />
habitaçzo e alimcntaçb qiie recebsm nas roçaq, os tons berrantes dos novos<br />
e garrido3 psnnos, R remiineração equitativa do seti trabalho, o nsufructo<br />
dos tractos <strong>de</strong> terrenr, (pli~tfér) que lhes s5.o concedidos para cilltivarem<br />
feijóes, milho, canna d'assiicar etc., a const:iencin d:i. segurança individual,<br />
e a certeza <strong>da</strong> tranqiiilli<strong>da</strong><strong>de</strong> presente e fiitiira, tudo sáo motivos para<br />
pren<strong>de</strong>r <strong>de</strong>finitivamente ao solo <strong>da</strong> ilha os miissorongos angolenses qiie<br />
recor<strong>da</strong>m com liorror a i<strong>de</strong>ia dos soffrimentos passados na terra <strong>de</strong> origem.<br />
Uhi be~re i!,; pntricr. fi assim qila com gran<strong>de</strong> freqiiencia se cncontrnm n:ts<br />
roça3, vellio-: serviçacs ciija avançcl<strong>da</strong> e<strong>da</strong>rle os impe<strong>de</strong> <strong>de</strong> collaborar acti-<br />
vamcntc nos traballio~ ~tjricolas,<br />
e que dcsempcnham leves serviços aiixi-<br />
liares, n'tima especie <strong>de</strong> reforma.<br />
A alegria e boa dispo3içáo com que os serviçaes se entregam ao<br />
trabalho e a faciliclatle com qiie elles constantemente reniinciain no repa-<br />
Iriamento preferindo fixar-se na colonia, s5o as provas mais convincentesi<br />
<strong>da</strong> benevolcncia e gcnerosicladc com que os plantadores os tratam, e <strong>da</strong><br />
efficacia e iitili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s leis e regiilamentos portngiiezes que regulam o<br />
recriitamento <strong>da</strong> m5o d'obra c o traballio dos immigrantes.<br />
Da popiilação actiial <strong>de</strong> S. Tliomé que o Sr. Con<strong>de</strong> <strong>de</strong> Sonsa c Faro,<br />
iio seu citado livro, compiita cstiinativamente um C10:000 Iiabitantes, fazem
parte 'A500 europeus e 40:UOO serviqaes <strong>de</strong> diversas proveniencias, <strong>de</strong>com-<br />
pondo-se os restantes 17:500 nas proporçóeu provaveis <strong>de</strong> 13:500 filhos <strong>de</strong><br />
3. Thomé que habitam principalmente as ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s c as villas, <strong>de</strong> 2500 an-<br />
;alares <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> cscravos naiifragados ein 1540 nas Sete Pedras,<br />
3 que povoain a costa sul <strong>da</strong> ilha, e <strong>de</strong> 1:500 gregorianos <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes dos<br />
:scravos libertos em 1876 pelo governador Gregorio Ribeiro.<br />
Exceptuando os angolares que trabalham voluntariamente, e que exer-<br />
)em com activi<strong>da</strong><strong>de</strong> o mister <strong>de</strong> pescadores, todos os restantes indigcrias<br />
la illia jazem na niais con<strong>de</strong>mnavel ociosidit<strong>de</strong>. É loiiciira pensar no apro-<br />
reitainento (?estes pessirnos elementos <strong>da</strong> popiilaçáo, pelo menos cinqnarito<br />
ima intensa campanha ccliicatlora e severas leis repressivas náo piizerem<br />
ermo i vadiagem dcscnfrca<strong>da</strong> em tluc vivem. O fiitnro <strong>de</strong> S. Thom6, typo<br />
)uro <strong>da</strong> colonia fazen<strong>da</strong>, estii em absoluto <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte do fornecimento<br />
onstante <strong>de</strong> trabalhadores inimigrados. No dia em que essa immigraçáo fal-<br />
ar, S. ThomB morrers, annullar-se-lia economicamente, retroce<strong>de</strong>ndo e<br />
issclvajando-se mais uma vez os negros que lh ficarem e as ri<strong>de</strong>ntes e<br />
)rosperas plantaqúes actuaes. A' luxiiriante vegetaçHo tropical que em<br />
3. ThomE attinge o auge <strong>da</strong> varie<strong>da</strong><strong>de</strong> e <strong>da</strong> força vegetativa n'uma ver<strong>da</strong>-<br />
Ieira apotlieose <strong>de</strong> seiva, bastaria um ciirto lapso para aspliyxiar e sepul-<br />
ar orgulliosamente n'um cemiterio <strong>de</strong> flores e verdura, a fertili<strong>da</strong><strong>de</strong> mo-<br />
lesta dos cacoaes e dos cafézaes, enre<strong>da</strong>ndo-os no abraço siiffocante <strong>da</strong>s<br />
ianas, e esmagando-os na escuri<strong>da</strong><strong>de</strong> ver<strong>de</strong>, sob um ceii <strong>de</strong> folhagem estrel-<br />
ado <strong>de</strong> orclii<strong>de</strong>ae. E' por este motivo que a importantissimn questáo <strong>da</strong><br />
não d'obra tem sempre merccitlo a, maior attençiio, aos plantadores que a<br />
,mpregam e ao governo qne a regulamenta e auxilia o seu recrutamento.<br />
1 i1nportaçá.o regular e continua dos serviqaes contractados, as iniciativas<br />
,iisa<strong>da</strong>s dos colonisadores, os capitses ca<strong>da</strong> vez mais importantes, e a,<br />
~ssoiribrosa riqueza. e fertili<strong>da</strong><strong>de</strong> do solo, transformaram em trinta annos<br />
.q~iello<br />
formosissimo jardim do Equador, n'uma <strong>da</strong>s mais prosperas e mo-<br />
elares colonias fazen<strong>da</strong>s <strong>da</strong> act~iali<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
E se assim s~icce<strong>de</strong>u é preciso nunca esquecer que ao trabalho impor-<br />
ado se <strong>de</strong>ve.<br />
Se os inglezes, apenas com o regimen do salariado li\.re por coniracto
ciirto ou por jornal, conscgiiiram obter cm Ceyláo nm táo elevado grau<br />
<strong>de</strong> prosperi<strong>da</strong><strong>de</strong> economica c iim systcma ciiltiiral tgo modclnr, B porqiic,<br />
perto c a bom caminlio, tiiilinm ao seli dispor cssc inexgotavel viveiro dc<br />
traballiadorcs qiie c': to<strong>da</strong> n peninsiiln íiidicn.<br />
h innravilliosa riqiiczn ilr S. Tlioni6, o niigincnto vertiginoso <strong>da</strong> pro-<br />
diict;%o do cac:iii c n siin conscqiieiitc prrpoiidcrnncia nn 1)nlan:n. ccoiioiiiicn<br />
dos mcrcados coinpradore., comcqaram por produzir em certos elexcnto::<br />
inlliicntes do commcrcio ciiropcii iiina siirpreza cresccnte. e n5o tar<strong>da</strong>ram<br />
em crcar invejas Inccraiitcq que clcgencrnrain a breve trcclio ciii cnmpanlia<br />
difftimatoria contra o3 nossos prorescoç dc co1oilisac;iln.<br />
Esta campanha tcildcnciosa teve origem n'iima cama<strong>da</strong> cspccial <strong>da</strong><br />
socie<strong>da</strong><strong>de</strong> ingleza qiic sc <strong>de</strong>ixoii iiifluciicinr pela adjectivaçiio ciltcrneccdorn<br />
<strong>de</strong> algiins aveiltiireiros <strong>de</strong> conscicilcia mnllcavel c bolsa nvicla, a qncm<br />
niiiito sorria cspicaçar o scntiincn1nliuino doentio <strong>da</strong>s socic<strong>da</strong>dcs pliilaiitro-<br />
picas, mediante a. esportiila bcjii<strong>da</strong> qiic llics era offerecicla pelos prodiictorcs<br />
<strong>de</strong> cacau prqjiidicados pelo progresso rapido dn prodiicçZo c10 cacau em<br />
S. TliomB. 'L'evc clln di~as plinscs e~scnciacs; n dos piiilantropos e a<br />
dos cliocol~teiros. h'a prin:eirn entraram na lip as ~lborigeltes l'rotect~o~~<br />
Socicties e a, Atlti-S1are1.y Sorictics, acciisando dc negreiros os agricultores<br />
portugoczes <strong>de</strong> S. Tliom6, e dc cscrnvattiristn o govcrno qiie siipcrintcndin<br />
e fiscalisava s iinmigraçáo.<br />
Com c i forma irritante ~l'i11113 caliimnia insistente, bascadn em affirmaç6es<br />
meiitirosas c cm rcr<strong>da</strong>dciras ftilsi<strong>da</strong><strong>de</strong>s, a insidiosa gocrrn. a S.<br />
Thomd dcc1:~rou-sc intransigentcmentc em artigos <strong>de</strong> jornacs e revistas,<br />
cm conferencias publicas, no livro do fainigcriido Ne~inson, c at6 nicsmo<br />
em interpcllaçúcs parlamcntarcs. Os comboios <strong>de</strong> immigrantcs eram rebanlios<br />
dc carneiros lcvados ao niatadoiiro, a ilha dc S. Tliom6 o cciniterio dos<br />
negros, os aclniinistrnrlores <strong>da</strong>s roças os seus tyraiinos.<br />
N'iim palavreado 6cco que s(, rcvclavn ignorancia oii perrcrseio, con- ,<br />
segr',Ia-se commover as \~ellias beatas anglicariaci, liirtas no scu piiritanismo<br />
iiidifferente ti iniserin liorrivcl <strong>de</strong> Imndres, c sJ promptas a cui<strong>da</strong>r dos<br />
seus pet (loys 011 a com~)n<strong>de</strong>ccr-sc tlicoricaiiiciitc <strong>da</strong> sorte dos ncgros afri-<br />
cano8.
Estas <strong>da</strong>mas ~restantes e outros eqiiivalentes siistcntaci~l~~ <strong>da</strong><br />
espcctaciilosa philantropia official <strong>da</strong> (( Sociedn<strong>de</strong> D <strong>de</strong> Fox Boiirne e <strong>da</strong>s<br />
siias congeneres, reuniam-se freqnentemente para, no meio <strong>de</strong> sandices<br />
que 6 inutil esmitiçar, continuarem a bor<strong>da</strong>r o thema favorito <strong>da</strong> nlotler~t<br />
sknvery.<br />
Esta foi a phnse pliilantropica que ain<strong>da</strong> hoje <strong>de</strong> quando em qiiando<br />
busca interessar a opiniiio ingleza com os sciis arrancos hydrophobos oon-<br />
tra o regimen <strong>de</strong> trabalho em S. Thom6. Seguiu-se-lhe a pliase c1.ocola-<br />
tcira. A qnestáo complicou-se mais porque entraram em jogo interesses<br />
po<strong>de</strong>rosos; ao passo que anteriormente apenas havia o facto d'uma pequena<br />
parte <strong>da</strong> opiniáo, ignorante e mnl orienta<strong>da</strong>, estar sendo torpe e intencio-<br />
nalmente explora<strong>da</strong> por alguns aventureiros fallios <strong>de</strong> escriipuloil, agora,<br />
com a boycoltctge do sluve cocon, generalisa<strong>da</strong> intensamente por uma propa-<br />
gan<strong>da</strong> tenaz e continiia, começavam-se a inover os gran<strong>de</strong>s indnstriaes do<br />
cliocolatc que se viam pre,judicaclos nos seus intcrcsscs.<br />
A campanha contra S. Tliomé, tlesistiiido dc ferir directame: te o alvo<br />
por intermcdio dos explorados pliilantropos, c vendo qiic o governo inglez,<br />
mantendo uma attitii<strong>de</strong> digna, se náo resolvia a interferir na administra-<br />
çzo d'nma colonia estrangeira pertencente a uma naçáo livre que tcm o<br />
maximo direito a ser re eita<strong>da</strong>, resolveu utilisar a corrente <strong>de</strong> opinião jii<br />
BP<br />
crea<strong>da</strong> para <strong>de</strong>cretar ai boycotfage geral dos cliocolates fabricados com o<br />
cacau escravo oriundo <strong>de</strong>i S. Thomé. N'cstas circumstancias, os cliocolnteiros<br />
inglezes que, <strong>de</strong> lia. niuibos annos, assistiam pliilosopliicamente á campanha<br />
pseudo-humanitarista, sem p;lrecerem muito convencidos do seu fun<strong>da</strong>men-<br />
to, e que, em qualquer caso, continuavam a comprar, como se na<strong>da</strong> !;o~ivesse,<br />
o cacau <strong>de</strong> S. Thom4, logo que se viram lesados pela diminuiçao <strong>da</strong>s com-<br />
pras, entraram tambem a baraf~istar<br />
em coro, concor<strong>da</strong>ndo logo em que o<br />
seu cliocolãte seria uma ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira abjecção se sc provasse que o cacau <strong>de</strong><br />
S. Tllomé era obtido b custa do trabalho escravo. Para averiguar <strong>de</strong> visii as<br />
condiyões do trabalho n'aqiiclla colonial nomearam seu testa <strong>de</strong> ferro e em-<br />
I,aixndor crn terra cstrangcirn, Cadbiiry, o conliecido fabricante qiic, cm<br />
I,isboal na conferencia celebra<strong>da</strong> com os agricultores <strong>de</strong> S. Tliornd, e i10 int<br />
crivei inqncrito qiie alli Ilic <strong>de</strong>ixaram ir fdzer, tlcmonstroii a ignorancia
mais extraordinaria <strong>de</strong> tudo qnarito <strong>de</strong> longe ou <strong>de</strong> perto tocava com as<br />
qucsttóes que pomposamente sc propunlia aclarar.<br />
Esta intcrvcnçno dos cliocoliitciros parece taml~em ter tido origcm<br />
no receio iiif~~ndido pelo gronclc dcscnvolvirncnto que a indiistris allemã<br />
do chocolate tem iiltimamcntc tomatlo.<br />
Como é s:il)ido, o porto clc klaml)iirgo 6 o mcllior mercado para ou<br />
nossos cacaus, e se se consegiiisse inntilisar S. TliomG, impondo \~iolentamente<br />
ao governo portuguez a suspensão <strong>da</strong> iminigraçao, ter-se-hia d'iim -0<br />
golpe attingido dois al~os. A indiistria allcmã priva<strong>da</strong> <strong>da</strong> matcria prima,<br />
ficaria durante muitos annou periclitanlc na espectativa que as fazen<strong>da</strong>s<br />
dos Camaróes viessem a provê-la dc todo o cacau necessario ; e os indiistriaes<br />
inglezes, muitas vezes, agricnltorcs <strong>de</strong> cacaii por conta propria, oii<br />
societarios <strong>de</strong> trztsts agricolas, (I) \+r-sc-liinm livres <strong>da</strong> baixa <strong>de</strong> preqos que<br />
~nfallivelmcnte sc virA a produzir, com o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>da</strong> proclucçáo do<br />
cacaii. Como sc vE, é impossivel discernir coin tenuc laivo <strong>de</strong> sinceri<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
em to<strong>da</strong> esta ignobil campanha. A ganancia do interesse privado dictoii-a,<br />
a calumnin e a diffamac;i.o serviram-na, e a ignorancia d'nma parte <strong>da</strong><br />
opinião publica acceitou-a inconscientementc.<br />
Nas suas injustas investiclas, ou <strong>de</strong>rrancados pliilantropos e os ricos<br />
cliocolateiros, visando sempre a rilina cle S. Thomé, ci~ja admiravel prodiicçáo<br />
a uns agoniava o formalismo suppostamente liiimanitario, e a outros<br />
ensombrava o horisonte dos lucros futiiros, ora exigiam ferozmciitc a pro-<br />
(1) A industiia alleinã serfa força<strong>da</strong> a comprar o cacaii inglez <strong>da</strong> Costa do<br />
Ouro que j6 este anno supplantoii no mercado <strong>de</strong> Ila!iihurgo o cacau portiigiiez. Isso<br />
serviria excellentemente os interesses <strong>de</strong> Cadbury e outros iiidustriaes iiiglezes que,<br />
iiingucrn o ignora, teein parte do seu cnpital einpregado na prodiiccão agricola do<br />
cacau. Tanto sssim qiie Cadbiiry não <strong>de</strong>siste <strong>de</strong> nos difflimar. O celel)re processo por<br />
diffamação ullimaincnte riiovido e gantio em IIiriningliutn contra o S/n>ldor(l, foi uma<br />
maneira disfarca<strong>da</strong> <strong>de</strong> levar os trihunaes inglczes a aiilhenticar a calumnia levan-<br />
ta<strong>da</strong> contra o regimeri do trabalho indigena em S. 'l'bomé. As condições e conse-<br />
qiiencias d'esse jiilgamento foram primorosamente commerita<strong>da</strong>s pelo Sr. Augusto<br />
1:ibeii.o na Chroaicn Colonial do a Dhrio <strong>de</strong> Noticias ».
hibiçiio immediata <strong>da</strong> immigração contracta<strong>da</strong>, ora se limitavam a reclamar<br />
com insistencia a repatrinção ol~rigatoria dos serviçaes assalariados. Note-<br />
se bem ; não <strong>de</strong>sejavam aquellas boas almas qiie se assegurasse o direito ri<br />
repatriação ; queriam mais e melhor. Só os satisfazia que impuzéssemos<br />
coercivamente aos negros que se recontractam voliintariamente, e a quem<br />
repugna a i<strong>de</strong>ia do regresso ao jugo criiel e arbitrario dos regiilos serta-<br />
nrjos, iima repatriaçiio <strong>de</strong> que elles se arreceiarn e que representaria um<br />
iiiclualificavel attentado, nrio só contra a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> do traballio, como coritra<br />
os mais sagrados direitos indivitliiaes. Elles, os humanitarios paladinos <strong>da</strong>s<br />
socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s anti-escravaturistas, vendo que l'ortugal, na <strong>de</strong>feza do seu bom<br />
nome e dos seus interesses, <strong>de</strong>monstrára cabalmente ao mundo, a legali-<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong> dos contractos <strong>de</strong> scrviçaes, a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> d'cstes, e o mo<strong>de</strong>lar regimen<br />
<strong>de</strong> traballio e ile trataiiicnto seguido nas roças, acolhiam-se, n'um ultimo<br />
refiigio, 6 extrnortlinaria exigciicia clo repatriamciito obrigatorio, suppondo<br />
intpensa<strong>da</strong>incnte que talvez cssa medi<strong>da</strong> arruinasse os agricultores.<br />
Santos vnróes, beiiemeritos philantropos ! . . .<br />
Se a siiperiori<strong>da</strong><strong>de</strong> do trabalho livre fornecido pela mão d'ubra local,<br />
sobre o trabnllio immigrado, n5o fosse t&o rcconlieci<strong>da</strong>, talvez mesmo que o<br />
governo portagiiez tivesse praticamente vantagens em adoptar essa medi<strong>da</strong><br />
immoral e abnsiva qiie a <strong>de</strong>stempera<strong>da</strong> campanha contra o cacau escrat.0<br />
incessanteiilcnte lhe reclamava. Os negros qiie fin<strong>da</strong>ssem os contractos,<br />
expulsos á força <strong>de</strong> S. Tliom6, levariam pura Angola a hma <strong>de</strong> bom trata-<br />
mento recebido, e concorreriam, náo sú para facilitar enormemente a tarefa<br />
do recrutamento, como até talvez para promover lima corrente dc immi-<br />
graçáo livre.<br />
De resto, n totlos qiic teem querido iitilisar-se <strong>da</strong> facul<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> sc<br />
rel~atriarem, iiiincri foi cred<strong>da</strong> a menor clifficul<strong>da</strong><strong>de</strong>, ciimprindo-se religiosamente<br />
os contrnctos e a 1egisla~Bo em vigor, e regressando os serviçaes a<br />
Angola, a espalharem no sertáo, entre os seus conterraneos, a excellencia<br />
<strong>da</strong> vi<strong>da</strong> e do traballio nas roças <strong>de</strong> S. Thomé.<br />
Muitas vczes se tem querido attxibnir excliisivamentc a origem <strong>da</strong><br />
movi<strong>da</strong> contra o regimen <strong>de</strong> traballio em S. '~liomé, ao <strong>de</strong>svaira-<br />
mento produzido ril~ima parte <strong>da</strong> opiniáo publica ingleza pelas inverosimeis
31 2<br />
-<br />
POLITICA INDIUENA<br />
- - .-<br />
atoar<strong>da</strong>s lança<strong>da</strong>s aos quatro ventos por meia duzia <strong>de</strong> espsculadores. Ora,<br />
se at6 certo ponto isto é realmente ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro, convem entretanto não<br />
esquecer que a mesma opiniáo publica é singularmente con<strong>de</strong>scen<strong>de</strong>nte e<br />
<strong>de</strong>sprecari<strong>da</strong>, quando os abusos reaes ou inventados se praticam em terri-<br />
torio britannico. Estamos mesmo em suppor que se amanliá os gran<strong>de</strong>s<br />
agricultores <strong>de</strong> S. Tliomd ce(1essem ao trzcst (10s cliocolnteiros inglezes a<br />
proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s suas royas, a campnnlia <strong>de</strong>sappareceria como por encanto,<br />
os serviçaes passariam a scr liberrimos trabalhadores, e o cacau d'aqiiella<br />
colonia seria o mais <strong>de</strong>licioso do mundo.<br />
As justas criticas que, <strong>de</strong> vez em quaiido, surgem nas colnmnas dos<br />
periodicos londrinos, ao barbaro tratamento applicado aos culis chinezes do<br />
Rand, e á escravidtio entre ii?digenas, regulamenta<strong>da</strong> no protectarado <strong>de</strong><br />
Zanzibar e na Ugan<strong>da</strong>, n;ío encontram eclio sufficiente na opiniáo piiblica,<br />
como tambem em tempo3 passados o nao encontraram, tanto o exterminio<br />
implacavel dos pelles-vermellias, como as gran<strong>de</strong>s Itutztiizg ynrties em que os<br />
sqziatters perseguiam e capram como animaes ferozes os pobres aborigenes<br />
<strong>da</strong> Australia. Se actualmente nenliiima naçtio colonial utilisa directamente,<br />
ou consente que os seus nacionaes iitilisem o traballio oscravisado, é certo<br />
que variam gran<strong>de</strong>mente com as colonias e com os colonisadorcs, o regi-<br />
mcn do tratamento dos assalariados e as condiçúes do trabalho. Sob o<br />
ponto <strong>de</strong> vista do tratamento dispensado aos indigenns, os factos proclamam<br />
bem alto a excclleiicia dos iiossos metliodos e a bon<strong>da</strong><strong>de</strong> dos nossos colonos<br />
e funccionarios.<br />
Sempre que ha <strong>de</strong>limitaç6es <strong>de</strong> fronteiras coloniaes (I) os indigenas<br />
preferem acollier-.e A egi<strong>de</strong> <strong>da</strong> ban<strong>de</strong>ira portngueza emigrando para os<br />
nossos territori,,>. Os timorenscs preferem-nos aos liollaii<strong>de</strong>zes; oa zambe-<br />
zianos do Bar~zt:, do Cliirc e do Nyassa prefercin-nos aos inglezes; os<br />
angolas prefereni-nos aos belgas ; e os congolenses abandonam o territorio<br />
francez para imniigrar no enclave <strong>de</strong> Cabin<strong>da</strong>.<br />
E' para lastimar que a ti11 fracqao <strong>de</strong>svaira<strong>da</strong> (Ia opinigo publica iii-
$ma, que pretcildc dictar leis em cma alheia, não qneira ver e misericordiosnmcntc<br />
evitar os <strong>de</strong>srnandos e excessos commettidos nas colonias inglezas,<br />
ctija rcspons:ibili<strong>da</strong><strong>de</strong> ningiiem em Portiigal pensaria em imputar ao<br />
governo oii á nwçHo ingleza. Que as <strong>da</strong>mas que resolveram náo envenenar<br />
mnis o cstomago com o cncau escrnco lanceiii ao mar os seus brilliantcs,<br />
nrr:inc:idos ao solo dc I
316 POLITICA INDIGENA<br />
nar geralmente conhecido que, se a maioria dos pretos náo valta a Moçam-<br />
bique, não 1.5 porque o náo <strong>de</strong>sejem fazer, mas simplesmente porque lhes<br />
tolhem o regresso, ou porque em gran<strong>de</strong> numero perccem victimas do trabalho<br />
improbo <strong>da</strong>s minas, ou <strong>da</strong>s bruscas transiqúes <strong>de</strong> temperatura do clima<br />
transwaliense.<br />
Hit gran<strong>de</strong> conveniencia em averiguar, <strong>da</strong>ndo-lhes larga publici<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
em Portugal e em Inglaterra, as condiqões em que vivem e tralialliam no<br />
Band os culis cliinezcs e os indigenas <strong>de</strong> Mo~ambique.<br />
Seria interessante comparar os co~rq~ozi~rds (dcpositos dc iinmigrantes)<br />
com as areja<strong>da</strong>s e hygienicas habitações dos serviçaes <strong>de</strong> S. Tliom4, e estabelecer<br />
o confronto entre os regimeils alimentares, medicos, hospitalares,<br />
disciplinares e <strong>de</strong> traballio, a que estáo respectivamente sujeitos os serviçaes<br />
<strong>da</strong>s rosas portuguczas c os iinmigrantes <strong>da</strong>s minas inglezas do Rand.<br />
Era o meio mais seguro <strong>de</strong> mostrar quem sáo os ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros liiimanitarios<br />
e quaes sáo os contractos que mais garantias offerecem aos indigenas assalariados,<br />
<strong>de</strong>smascarando-se <strong>de</strong> vez os manejos ten<strong>de</strong>nciosos <strong>da</strong> turpc campanha<br />
movi<strong>da</strong> contra o regiinen <strong>de</strong> traballio em S. Thomé. Entretanto,<br />
muito tem já feito em Portugal a iniciativa official e priva<strong>da</strong>, na benemerita<br />
tarefa <strong>de</strong> contraminar os eEeitos <strong>de</strong>leterios d'esta absur<strong>da</strong> campanha.<br />
A activa e util propagan<strong>da</strong>, movi<strong>da</strong> na imprensa estrangeira, ein <strong>de</strong>feza<br />
dos nossos interesses coloniaes e processos <strong>de</strong> colonisaqiio, pelo distincto<br />
escriptor colonial o Snr. Alina<strong>da</strong> Negreiros, tem concorrido não sú<br />
para <strong>de</strong>smascarar e confundir os nossos <strong>de</strong>tractores, como para divulgar O<br />
conhecimento <strong>da</strong>i inestimaveis riquezas do nosso doininio ultramarino. Em<br />
geral, náo apparece ataque algnm i nossa administraçgo colonial nas gazetas<br />
estrangeirtir, que nio seja pouco <strong>de</strong>pois contradictado victoriosamente<br />
por aquell
particular, porém, nfio bastava, Apezar dos successivos <strong>de</strong>smentidos e <strong>de</strong>fezas<br />
man<strong>da</strong><strong>da</strong>s publicar nos jornacs estrangeiros e apezar dos relatorios<br />
e conferencias interessantes e insuspeitos d'alguns illustres viajantes estrangeiros<br />
que visitaram S. Thom6 concorrerem valiosamente para eluci<strong>da</strong>r<br />
a opinião publica geral e as chailccllarias europeias, acerca do infun<strong>da</strong>do<br />
<strong>da</strong> campanha <strong>de</strong> <strong>de</strong>scredito movi<strong>da</strong> contra Portiigral, impunha-se evi<strong>de</strong>nten~cnte<br />
a intervenção directa do governo portuguez, reivindicando altivamente<br />
a perfeiçao <strong>da</strong>s nossas leis sobre o trabalho immigrado, e refutando<br />
coinplctnmcnte as falsi<strong>da</strong><strong>de</strong>s intencionaes que diariamente se piiblicavam a<br />
respeito do triibalho indigena em S. l'liom4 e do recrutamento dos serviçaes<br />
em Angola. Foi assim que o comprehcndcii o Snr. Conselheiro Noreira Junior,<br />
então ministro do ultramar, man<strong>da</strong>ndo elaborar um correcto e documentado<br />
~nenlorn~zdi~r~r cliie, traduzido em diversas linguas, foi transcripto e<br />
commeiitado por to<strong>da</strong>s :is imprensas estrangeiras, concorrendo para firmar<br />
<strong>de</strong> novo os nossos crctlitos <strong>de</strong> colonisadores, abalados pela continua diffamação<br />
que <strong>de</strong> longe vinha cavanclo a ruina do mais precioso florão colonial<br />
<strong>da</strong> coroa portugueza. Essa correcta e convincente <strong>de</strong>feza, que táo boa impressão<br />
prodiiziii nos differentes centros coloniaes, termina pelas seguintes<br />
palavras :<br />
B h por esta forma, com a forte consciencia do <strong>de</strong>ver em todo o tempo<br />
ciiiiiprido, que o Governo Portngnez enten<strong>de</strong> <strong>de</strong>ver respon<strong>de</strong>r á propagan<strong>da</strong><br />
agora renova<strong>da</strong>, com certa insistencia, contra as condições do trabalho<br />
indigena nas snas colonia~i, cojas causas <strong>de</strong>terminantes nem procura inves-<br />
tigar para não aclarar iiina intencional insidia ou iima malerola ignoran-<br />
cia. A inflacncia <strong>da</strong>s institniçóes e <strong>da</strong>s leis ii&o 4 uma cliimera. Da aucto-<br />
ri<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> umas resulta o prestigio <strong>da</strong>s ontras, e o mntuo accordo <strong>de</strong> ambas<br />
cohre a responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong> dos Governos. A estes cabe particularmente o<br />
<strong>de</strong>ver cle vigiar pela escriipulosa observancia <strong>da</strong>s leis e, no que respeita á<br />
questão do recriitamentp e engajameiito dos trdbalhadores indisenas, sobram<br />
os dociimentos <strong>de</strong> que o Governo Portugaez nem a esse <strong>de</strong>ver tem faltado,<br />
1150 súmentc para os qnc trabalham nas siias colonias, nas <strong>de</strong> origem c nas<br />
oiitras, mas tamlem para os que, por iim aocordo <strong>de</strong> leal entendimento,<br />
v50 servir nas colonias estranseiras. E to<strong>da</strong>s as vezes que tem sido neceq-
318 POLITICA INDIGEXA<br />
sario corrigir abusos ou castigar contravencóes <strong>da</strong>s leis protectoras, as<br />
auctoricla<strong>de</strong>s e os tribiinaes teem, por egual, ciimprido o scii <strong>de</strong>ver ». Para<br />
<strong>de</strong>monstrar a completa falsi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s asserções phnntasistas em qiie os cs-<br />
liimniadores baseiam as siias infun<strong>da</strong><strong>da</strong>s acciisaçúes, e convencer aiilrla os<br />
mais crediilos nas invenções dos pliilnntropos, basta dcscrcver as condi-<br />
çóes <strong>de</strong> existeiicia e o regimen cie trabalho dos serviçncs <strong>de</strong> S. Tlionii., e<br />
transcrever as linlias essenciacs e as dieposiçóes mais importantes dos di-<br />
plomas legislativos quc regulamentam o trabalho immigrado <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o recru-<br />
tamento até B ultima jorna<strong>da</strong> do repatriamento. Com relaczo ás condiçúes<br />
locaes dos trabalhadores 4 interessante tr2nscrever as consi<strong>de</strong>rações insiis-<br />
peitas com que algiins illustrcs viajantes estrangeiros se teem referido ao<br />
assumpto.<br />
Como se sabe, a ilha <strong>de</strong> S. Tliomh tem sicio expressamente visitatlti<br />
por viajantes <strong>de</strong> diversas nacionali<strong>da</strong><strong>de</strong>s, inciimbirlos <strong>de</strong> estu<strong>da</strong>r e avcri-<br />
, -<br />
giiar <strong>de</strong> visn a organisayáo <strong>da</strong>s cnltiiras e do tr:ibalho indigena. 0s inglc-<br />
zcs Jolinston, Uriffiths, Holland, Nightingale e milito rccentementc O coro-<br />
nel Wyllie; os francezes Clievalicr, Gravicr, Cottier e RIontct; os allemiies<br />
Schulte e Strunlí; e o belga Dilasni, sáo, entre miiitos oiitros, as indiridiia-<br />
li<strong>da</strong><strong>de</strong>s mais cm <strong>de</strong>staqiie que, dcpois <strong>de</strong> permanecerem algnm tcrnpo<br />
n'aquella colonin, se não teem fiirtado a testemunhar em conferencias oii<br />
em cornmiinicac;ijes escriptas ri. siia admiraqáo pelos nossos processos <strong>de</strong> co-<br />
lonisação e pelo tratamento applicado aos eerviçaes negros.<br />
Mr. Johnston, o celebre Harry Joliiiston, que táo <strong>de</strong>sagra<strong>da</strong>ve: nos<br />
foi sempre na costa oriental <strong>da</strong> Africa, levado <strong>de</strong> enthiisiasmo, dcv1:ira qiie<br />
a S. Thomd (leve ser o i<strong>de</strong>al do paraizo dos pretos, e que os <strong>de</strong> S. Thom6<br />
são os negros inais felizes do miirido. »<br />
Mr. Tlieo Masui que, por mal inforinntlo, 6 por trczcs injiisto, escreve<br />
comtado as scgointes consola dor:^^ palavras Acerca <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> dos serviçacs :<br />
.Logo qiie os novos scrviçaes começam a tratktr <strong>da</strong>s siias obrigaç~es,<br />
casam-nos e dáo-llies casa e lima pequcntt horta parti ciiltivarem; abnn<strong>da</strong>ntemente<br />
alimentados, <strong>de</strong> sCccos c mk apparericia que tcilham, engor<strong>da</strong>m,<br />
tornam-se reluzentes e esquecem a siia ingrata terra natal, c tanto (Pie,<br />
po cabo <strong>de</strong> cinco annos, expirado o contracto, q~ianilo o ciirador vem intcr-
oga-10s sobre as suas intençces, respon<strong>de</strong>m qiiasi todos que querem contractar-se<br />
para sempre. Os portiiguezes conhecem bem o preto, sabem <strong>da</strong><br />
maneira como <strong>de</strong>vem trata-lo, não se entregam sobre elle a brutali<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
reprehensiveis, mas não teem excessos <strong>de</strong> sensibili<strong>da</strong><strong>de</strong> ; infun<strong>de</strong>m-lhe i<strong>de</strong>ias<br />
<strong>de</strong> respeito e <strong>de</strong> disciplina indispensaveis para manter uma organisação<br />
regular do trabalho.. ................................. Os filhos são<br />
tratados com carinho ; as creanças são mctti<strong>da</strong>s em creches, crea<strong>da</strong>s mesmo<br />
nas proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>s ; mais tar<strong>de</strong>, trabalhar50 por siia vez e, instrui<strong>da</strong>s pelo<br />
exemplo, não <strong>de</strong>ixarão <strong>de</strong> ser bons agriciiltores. Oa serviçaes teem uma<br />
vi<strong>da</strong> <strong>de</strong> trabalho, mas livres d'uma fiitrira vi<strong>da</strong> <strong>de</strong> aventura, teem familia,<br />
concliego e s5o objecto <strong>de</strong> ciii<strong>da</strong>dos constnntcs. Que differenças náo ha entre<br />
e.hs homens e os que ficam na aldcin riatal conclemnados ao celibato,<br />
tratados corno ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros animaes, mal alimentados e explorados por um<br />
chefe cruel e egoista ? ................................ Collocando-se<br />
a questHo <strong>de</strong>baixo do ponto cle vista moral, é uma ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira missão philantropica<br />
a. que <strong>de</strong>sempenliii o governo portnguez favorecendo o resgate<br />
d'estes escravos <strong>da</strong>s milos dos seu-, carrascos; nao é o trabalho regtilar e<br />
reniiincrado o priinciro <strong>de</strong>grau para a regeneração d'csta raça <strong>de</strong>sher<strong>da</strong><strong>da</strong>,<br />
o iinico, na minha opiniáo, que pd<strong>de</strong> pru<strong>de</strong>ntemente fazê-la vencer?. . ..<br />
O via,jltntc allemão Dr. Strunk, que visitou <strong>de</strong>ti<strong>da</strong>mente a ilha em<br />
1904, refcriiido-se ao pessoal indigena <strong>da</strong>s roças, escreveu o seguinte:<br />
u ELI estava maravilhado <strong>de</strong> vêr uma installação tíio completa, (') e o<br />
que vi iiltrap:issoii, sobremodo, a minha expectativa. 13speciabne~tte O trntnq~letzto<br />
e nrn)tu,te~z~cZo dos trubulhudores fez-me boa impressáo. 03 tralalhadores<br />
cstao aqaartelados em oito extensos edificios. Ca<strong>da</strong> familia tem tima<br />
casa <strong>de</strong> habitação <strong>de</strong> 4 metros dc comprido e 4 <strong>de</strong> largo, que aquella gente,<br />
<strong>de</strong> ordinario, divi<strong>de</strong> em dois compartimentos, por meio d'tima pare<strong>de</strong> ou tabique<br />
<strong>de</strong> tela ou r<strong>de</strong>. As casas são feitas cle tiqj610 e assentam sobre um<br />
terrapleno <strong>de</strong> cerca <strong>de</strong> um metro d'altura. ...........................<br />
(1) O auctor citado refere-se a roça <strong>da</strong> a Doa Eiilradn 9, proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> do Snr,<br />
llenriquo <strong>de</strong> Mendonça, que prima por uma organisa~ão mo<strong>de</strong>lar.
320 POLITICA INDIGENA<br />
.............. A composi~ão <strong>da</strong> ração alimentar 8, sob o ponto <strong>de</strong> vist;i<br />
hygienico, tão bem escolhi<strong>da</strong> quanto possivel. Precisamente o tempêro tle<br />
oleo <strong>de</strong>ve merecer especial menção. Se se pilzesse em pratica nos Cama-<br />
róes, seria uma disposição salutar para to<strong>da</strong>s as roças, plantaçúcs ou fei-<br />
torias que teem <strong>de</strong> sustentar traballiadores. .........................<br />
............... O governo tem, para appoiar os interesses dos traba-<br />
lhadores contractados, um empregado especial (ciirador) qiie tem <strong>de</strong> occii-<br />
par-se em harmonisar os interesses d'uns e d'outros, e os direitos dos plan-<br />
tadores e vice-versa. São dignas <strong>de</strong> mençÉio as disposiçóes sanitarias. Se<br />
n'este modo <strong>de</strong> proce<strong>de</strong>r ha <strong>da</strong> parte do governo propositos <strong>de</strong> praticar RI-<br />
guma oppressZo, pelo menos eii não o soube. Ca<strong>da</strong> feitoria ou plantaçgo<br />
tem um hospital bem installado e espaçoso, on<strong>de</strong> iim europeu dirige os ser-<br />
viços <strong>de</strong> saii<strong>de</strong>. Lavram-se contractos com os medicos <strong>da</strong> ci<strong>da</strong><strong>de</strong> quc por<br />
elles ficam obrigados a visitar as roças, duas, tres e quatro vezes por mez,<br />
para tratarem tanto dos brancos como dos homens <strong>de</strong> cor. No <strong>de</strong>correr <strong>da</strong><br />
minha visita chegnei á cosinlia, gran<strong>de</strong> e espaçosa, on<strong>de</strong> se estava cosi-<br />
nhando para todo o pessoal <strong>de</strong> cor. L& estavam installa<strong>da</strong>s, sobre forna-<br />
lhas <strong>de</strong> alvenaria, gran<strong>de</strong>s cal<strong>de</strong>iras para cozer o arroz e o feijáo, e for-<br />
mi<strong>da</strong>veis tachos <strong>de</strong> cobre para preparação do azeite <strong>de</strong> palma, em plena<br />
activi<strong>da</strong><strong>de</strong>. A comi<strong>da</strong> era feita com asseio e esmero. Adquiri a convicyiio<br />
<strong>de</strong> que Izn Allailrawl~n o szistento dos frnòalhadores nns gran<strong>de</strong>s 11r'ol)rietlrrtlt~s<br />
vzrraes ~zão<br />
pd<strong>de</strong> ser melhor. »<br />
Nr. Augiibte Chevalier termina o relato <strong>da</strong> sua viagem a S. Thomú<br />
pela seguinte plirase bem expressiva <strong>da</strong> siia admiraqáo : c Em nenliiima<br />
parte do mundo, talvez, no nosso tempo, se tem trabalhado tanto, em tão<br />
curto espaço <strong>de</strong> tempo, com tão poucos braços e com t%o minguados meios. a<br />
Mr. A. Nightingalc, n'uma carta dirigi<strong>da</strong> ao Sr. Con<strong>de</strong> <strong>de</strong> Sousa e<br />
Faro, que vem transcripta na já cita<strong>da</strong> monugrapliia sobre S. Tliomé, ex-<br />
prime a sua admirapáo pela fórma como cstão org:iriisados o alqjamcnto<br />
dos serviçaes e os scrviyos hospitalartbs. O coronel \\ryllic, quc Ira poiicos<br />
dias regressou d'iima visita officiosa a S. ThomC, sendo entrevistado du-<br />
rante a sua esta<strong>da</strong> om l~isboa<br />
por divcrsos reprcscntulitcs <strong>da</strong> imprensa, a<br />
todos commiinicou a impressáo colhi<strong>da</strong> <strong>de</strong> que os serviçaes <strong>de</strong> S. Tlioint:<br />
. -
estavam siijeitos a um perfeitissimo regimen <strong>de</strong> trabaIIis e tratamento, e<br />
accentuoii mesmo que, nem a situação em que se encontram os immigrantes<br />
interiores <strong>da</strong> India Ingleza, se pó<strong>de</strong> talvez equiparar ao regimen adoptado<br />
nas rocas. Estas mesmas i<strong>de</strong>ias tecm sido <strong>de</strong>senvolvi<strong>da</strong>s em diversos artigos<br />
piiblicados na imprensa ingleza por aqiielle illustre viajante. To<strong>da</strong>s<br />
estas opiniões aiictorisa<strong>da</strong>s, que não po<strong>de</strong>m ser malsina<strong>da</strong>s <strong>de</strong> preconceito<br />
pntriotico ou <strong>de</strong> interesse proprio, sáo lima bati respcsta a lançar em rosto<br />
aos dcstemperos ridiciilos dos liumanitaristas do cacau-escravo e dos cliocolatciros<br />
Iiypocritas.<br />
O outro caminlio a segiiir 6 <strong>de</strong>monstrar a perfeiçgo <strong>da</strong>s leis com cliie<br />
o governo se propoz assegurar as garantias dos negros e os interesses dos<br />
colonos.<br />
O primeiro rcgulament,~ geral para o recrutamento <strong>da</strong> mão d'obra<br />
indigena nas coloniss portuguezas foi <strong>de</strong>cretado em 21 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong><br />
1878, sendo inteiramente vasado nos mol<strong>de</strong>s do a The Emigrants India~z<br />
Act » <strong>de</strong> 1871.<br />
Seguiram-se-lhe os regulamentos especiaes <strong>de</strong> 17 <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong> 1880<br />
para S. Thomé, e <strong>de</strong> 25 <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 1881 para Moçambique. Estes diplomas<br />
foram <strong>de</strong>pois modificaclos ou ampliados na generali<strong>da</strong><strong>de</strong>, pelos <strong>de</strong>cretos <strong>de</strong><br />
29 <strong>de</strong> janeiro e 5 <strong>de</strong> julho <strong>de</strong> 1883, 26 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1889, 10 <strong>de</strong> agosto<br />
<strong>de</strong> 1893, 9 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1899, 16 <strong>de</strong> jullio <strong>de</strong> 1902, 18 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong><br />
1903, 9 <strong>de</strong> setembro <strong>de</strong> 1904, 4 <strong>de</strong> julho <strong>de</strong> 1905, e na parte que diz respeito<br />
á emigração para S. ThomC! pelos <strong>de</strong>cretos <strong>de</strong> 26 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong><br />
1902, 29 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 1903, 31 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1909, e 19 <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 1909.<br />
Como este ultimo constitue ti parte essencial <strong>da</strong> legislação em vigor,<br />
ramos transcrever as suas disposiçóes mais importantes para evi<strong>de</strong>nciar<br />
claramente a perfeição <strong>da</strong> lei, e o cui<strong>da</strong>do que ao Governo Portuguez tem<br />
merecido a regiilamentaçiio efficaz dos contractos <strong>de</strong> serviçaes para S. Thomé.<br />
No relatorio que prece<strong>de</strong> o <strong>de</strong>creto salientam.se as caracteristicas principaes dos aperfei-<br />
çoarneDtos i;itrodu~iùos e que slo : a <strong>de</strong>tçrmiiiaçXo <strong>da</strong>s zonas on<strong>de</strong> o recrutamento e coiitracto dc<br />
31
322 POLITICA INDIGEXA ---<br />
indigenas C nuctorisado ; a liniitação do numero <strong>de</strong> írabalhlidoreç qiie em ca<strong>da</strong> anno e zona po<strong>de</strong>m<br />
ser recrutados, a fixação <strong>de</strong> itinerarios com pontos certos <strong>de</strong> <strong>de</strong>scanço que perniittam uma tisalisação<br />
effectiva ; o limite <strong>de</strong> zonas e <strong>de</strong> prazos <strong>da</strong>s liceiiças a conce<strong>de</strong>r aos agentes recrutadores ;<br />
a garantia <strong>de</strong> que a fiscalisação oficial nHo al~andonari os indigenas <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o seu recrutamento e<br />
contracto até ao embarque, durante a viagem, na sua resi<strong>de</strong>ncia em S. ThomC e no regresso at6<br />
ao ponto <strong>de</strong> origem ; a reducção do liiiiite do prazo <strong>de</strong> duração dos contractos, durante um certo<br />
periodo ; o augmento e nivelamerito previsto dos salarios; o rcpatritimento beiii garantido seriipre<br />
que os indigenas o <strong>de</strong>sejem ; a publici<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> todcs os c:-inentos concernentes á entra<strong>da</strong> e<br />
sahi<strong>da</strong> dos indigenas ou que possam interessar a estudos dcmographicos ; e ain<strong>da</strong> a facul<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
suspen<strong>de</strong>r temporariamente a emigração. O recrutamento para a provincia <strong>de</strong> Angola 6 regulado<br />
em normas i<strong>de</strong>nticas. Os agentes <strong>da</strong> emigração não são fiinccioiiarios do Estado, teem responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
directas e cxcliisivas sob uma activa e acautela<strong>da</strong> fiscalisação <strong>da</strong>s auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s. A repatriaqão<br />
não 6 obrigatoria, mas unia facul<strong>da</strong><strong>de</strong> inlierente ao direito, que i: dcixndo livre ao indigena,<br />
<strong>de</strong> se recrutar oti não.<br />
Por este <strong>de</strong>creto C auctorisa<strong>da</strong> a einigraçgo para S. l'lioiiii: e I'riiicipe <strong>de</strong> indigenas contractados<br />
eni Aiigola, Guiné, India, Mo~siiibique c Cabo Verclc, qiiaiido provenham <strong>de</strong> circuinscripção<br />
on<strong>de</strong> Iiaja zgencias <strong>de</strong> cmijiração uii suas <strong>de</strong>lega$õe~ Icg:iliiic~ite cstabcleci<strong>da</strong>s, e quando<br />
as vantagens concedi<strong>da</strong>s a esses tral~alhaclores iildigcnas não sejaiii infericrcs 8s prescriptas pelo<br />
<strong>de</strong>creto. Taiiibem i: pcrtnitti<strong>da</strong> a iinportaç50 <strong>de</strong> culis cliiiiezes pelo porto <strong>de</strong> Macau e pelos porlos<br />
<strong>de</strong> tratado <strong>da</strong> China logo que alli sejam crca<strong>da</strong>s ageqcias <strong>de</strong> emigração e resliectivas <strong>de</strong>legações,<br />
segundo os preceitos d'este regulamento.<br />
O governo po<strong>de</strong> <strong>de</strong>stinar a trabalho em S. ThomC e Principe os iiidigepas d'Angola consi<strong>de</strong>rados<br />
pelo regiilamento <strong>de</strong> trabalho indigena d'csta colonia como compellidos, e regulanientos<br />
senielhantes ao d'11ngola <strong>de</strong>verão ser estabelecidos em Moçarnbique, Iridia, Cabo Ver<strong>de</strong> e Guiiii:,<br />
para o effeito d:i eiiiigração para S. Thomé e Principe.<br />
Os pedldos <strong>de</strong> trabalhadores são apresentados por escripto entre os dias I a 15 dos mezes<br />
<strong>de</strong> maio e riovenil>ro ao ciirador geral dos serviçaes em S. ThomC e ao seu <strong>de</strong>legado no Principe.<br />
As necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> trabalhadores njiricolas s!io regula<strong>da</strong>s por fijrina que a ca<strong>da</strong> hectare <strong>de</strong> terreno<br />
correspon<strong>da</strong> iim Iiomem adiilto oii uma iniilher. I
propria ; nomeará tres vogaes effectivos e tres substitutos para a junta Iõ~ftl d& trnbnllie irnmigraçiío<br />
em S. ThomC ; pertence-lhe nomear e <strong>de</strong>iiiittir os agentes <strong>de</strong> emigração e seus <strong>de</strong>legados,<br />
e propor ao governo a creação <strong>de</strong> novas agencias <strong>de</strong> einigração.<br />
Na ci<strong>da</strong>dc <strong>de</strong> S. ThoinB funcciona uiiia junta local <strong>de</strong> trabalho e emigrnçzo clue se compce<br />
do ciirador geral presi<strong>de</strong>nte, do chefe do serviço <strong>de</strong> saii<strong>de</strong>, <strong>de</strong> um engenheiro ou condiletor <strong>de</strong><br />
classe, <strong>de</strong> um dos gerentes <strong>da</strong> caixa filial do Banco Ultramarino eni S. Thomé, e dos tres<br />
vogaes nomeados pela commiss50 central <strong>de</strong> Lisbo:~, e que <strong>de</strong>vem ser escolliidos entre os proprietarios,<br />
administradores ou feitores <strong>da</strong>s proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>s rusticas, resi<strong>de</strong>ntes em S. Thomb. Ha na<br />
ci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> Santo Antonio <strong>da</strong> ilha do Principe uma jiinta distrietal <strong>de</strong> trabalho e <strong>de</strong> emigraçso composta<br />
do governador do districto presi<strong>de</strong>nte, do <strong>de</strong>legado do ciirador geral, e <strong>de</strong> um vogal eKectivo<br />
e outro substitiito nomeados entre os administradores agricol:~~ d'aquella ilha, pcla commiss8o<br />
central <strong>de</strong> 1,isboa. As attribuiçóes geracs <strong>da</strong> jiinta local, que po<strong>de</strong>rão ser <strong>de</strong>lega<strong>da</strong>s na juiita districtal<br />
e qiie serão exerci<strong>da</strong>s serii prejuizo <strong>da</strong>s attribuiçóes do curador, são as segiiintes:<br />
Deve siiperinten<strong>de</strong>r em tiido o que diga respeito ao regimen <strong>de</strong> trabalho em S. Thomé<br />
e l'riiicipe, elaborando projectos <strong>de</strong> regulamentos e consiiltniido ou dirigindo reprr.scntnç8es directaniente<br />
ao govcrno <strong>da</strong> proviiicia, oii por iotcrmedio <strong>da</strong> commissão central ao goveriio <strong>da</strong> nietropole.<br />
Além d'isto compete-lhe especialinente : fiscalisar, sein prejiiizo <strong>da</strong>s attril>iiiyõcs do inspector<br />
<strong>de</strong> fazen<strong>da</strong>, a arreca<strong>da</strong>çno e gercncia dos fundos do cofre <strong>de</strong> trabalho c repatrinç50 <strong>de</strong>i>ositados na<br />
filial do Banco Ultramarino; enviar as prociiraçnes aos agentes <strong>da</strong> emigraçLo, quando estes as<br />
nHo rccebam directamente dos reqiiisitaiites <strong>de</strong> serviçaes, para que possam legalmente outliorgar<br />
nos contractos do trabalho e nos mais que se relacionarein com o serviço <strong>da</strong> emigraç8o ; as procuraçúes<br />
para gosarem <strong>de</strong> effeito legal <strong>de</strong>vem ser sempre regista<strong>da</strong>s na curadoria geral e passa<strong>da</strong>s<br />
directamente aos agentes <strong>da</strong> emigraçko que <strong>de</strong>verão estar habilitados pelos requisitantes <strong>de</strong> serviçaes<br />
com os creditos necessarios para os contractos ; proce<strong>de</strong>r i distribuiçiio dos trabalhadores coinpellidos,<br />
que lhe sejam apresentados pelo governo <strong>da</strong> provincia, pelas roças <strong>de</strong> S. Thomé e do Prin-<br />
cipe ; vigiar sem prejuizo <strong>da</strong>s attribuições do curador, O ciimprimento <strong>da</strong>s clausulas dos contractos,<br />
~~~cialmeiite no que diga respeito a nI(~jairiento, siibsistciicia, tratamento em doenças, repatriação<br />
c renovaçzo dos contractos ; fixar os abonos <strong>de</strong>vidos aos agentes <strong>da</strong> emigração, <strong>de</strong>spezas dos contractos<br />
e outras legaes e necessarias para os serviçaes chegarem ao seu <strong>de</strong>stino. A forma <strong>de</strong> distritiiiç%o<br />
dos iinniigraiites é cui<strong>da</strong>dosamente regu1:imenta<strong>da</strong> <strong>de</strong> Kmia a satisfazerem-se equitativamente<br />
to<strong>da</strong>s as rcqiiisições <strong>de</strong> serviiaes ; cstabelecein-se tres catliegorias siiccessivas <strong>de</strong> requisitantes :<br />
dr, preferencin, ordinnr-ia e r..r/r-a, sendo a distribuição do recenseamento dos serviçaes distribuido<br />
pelos requisitantes <strong>de</strong> cathegoria ordinaria segundo uma especie <strong>de</strong> rateio, e effectuando-se os<br />
embarques siiccessivos <strong>de</strong> emigrantes, por f0rma que os requisitantes v30 recebendo serviçaes em<br />
numero proporcioiial 6s respectivas requisições. Na distribiiiçâo dos indigenas provcnicntcs <strong>de</strong><br />
h!gaiiibiqiie não se proce<strong>de</strong>rá ao rcfcrido rateio.<br />
As agencias <strong>de</strong> emigfação para S. Thomé e Principe são crea<strong>da</strong>s com auctorisavão do<br />
governo nos portos <strong>da</strong> provincia <strong>de</strong> Angola, hloçarnbiguc, Cabo Ver<strong>de</strong>, Guine, Indis, Macau e<br />
portos cllinezcs <strong>de</strong> tratado, sempre que n'esses pontos esteja legalmente estabeleci<strong>da</strong> curadoria <strong>de</strong><br />
serviçaes, suas <strong>de</strong>legações, ou auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s judiciaes ou administrativas que as substituam. As<br />
agencias <strong>de</strong> Angola, Cabo Ver<strong>de</strong>, Illoçanibiqiie, Guine e India são tambem encarrega<strong>da</strong>s <strong>de</strong> contriictar<br />
sCrviçacs para traballios agricolas, iiidustricies e doincsiicos <strong>de</strong>iitro <strong>da</strong> respectiva provincia.<br />
As agencias, com aiirtorisa$ío do governo, c sob iiiteira rcsl>onsal>ili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> comiiiissão central<br />
po<strong>de</strong>rZo ter <strong>de</strong>legações nas locali<strong>da</strong><strong>de</strong>s on<strong>de</strong> cxistam ciiradores ou sciis <strong>de</strong>legados, ou ain<strong>da</strong> ern<br />
outros pontos, comtanto que os contractos dc trabalho e o eiiibnrqne <strong>de</strong> scrviçaes s6 se façam no<<br />
locaes e portos on<strong>de</strong> as ciiradorias existam. O <strong>de</strong>creto estabelece <strong>de</strong>s<strong>de</strong> já as scgiiintes agencias<br />
+
324 POLITICA INDIGEXA --<br />
Loan<strong>da</strong> com <strong>de</strong>legaçaes em Ambriz e no Dondo ; Benguella ; Novo Redondo ; Cabin<strong>da</strong> ; Ambaca<br />
com <strong>de</strong>legação em Malange ; Moçambique com <strong>de</strong>legações em Memba e Lurio ; Quelimane coin<br />
<strong>de</strong>legaç80 em Angoche ; Tete com <strong>de</strong>legaqão no Chiii<strong>de</strong> ; Inhambane ; Loiirenço Marques ; Bolama<br />
com <strong>de</strong>legações em Bissau e Cacheu; S. Thiago <strong>de</strong> Cabo Ver<strong>de</strong> com <strong>de</strong>legações em to<strong>da</strong>s as ilhas<br />
<strong>de</strong> sotavento ; S. Vicente com <strong>de</strong>legações em to<strong>da</strong>s as ilh;~s <strong>de</strong> barlavento ; Macau ; e Nova Gôa<br />
com <strong>de</strong>legações em Salsête, Bar<strong>de</strong>z e Novas Conquistas. Os agentes, que são em numero variavel<br />
consoante as agencias, alem <strong>da</strong> nomeapo precisam <strong>de</strong> licença do governador <strong>da</strong> provincia para<br />
po<strong>de</strong>r exercer o seu cargo, prestando cauy8o <strong>de</strong> 5oo$ooo reis ou apresentando fiador idoneo. Ca<strong>da</strong><br />
agente pagará um iinposto <strong>de</strong> 500 reis por ca<strong>da</strong> trabalhador importado, 1180 po<strong>de</strong>ndo nunca annualmente<br />
pagar merios <strong>de</strong> 5o$ooo reis ; alem d'isso ca<strong>da</strong> licença paga ~$000 reis <strong>de</strong> imposto <strong>de</strong><br />
sello. Em compensaçno os agentes ficam isentos do pnb.niiieiito <strong>de</strong> contribuiç?ío industrial. Para<br />
po<strong>de</strong>rem obter as licenças os agentes obrigar-se-h80 por escril)to: a absterem-se por completo <strong>de</strong><br />
iiigerencia dirccta oii indirecta nas relações <strong>da</strong>s auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s coiii os indigenas e em geral em<br />
todos os assumptos <strong>de</strong> politica indigena, salvo quando sejam arren<strong>da</strong>tarios <strong>de</strong> prazos na Zambezia<br />
e em relaçzo aos respectivos prazos ; ;i siijeitarem-se a ser-lhes cassa<strong>da</strong> a licença pelo governador<br />
<strong>da</strong> provincia quando este o jiilgue iieccssario, po<strong>de</strong>ndo o agentc recorrer d'csta dccisao, com<br />
effeito suspcnsivo, para o governo central, sendo ouvi<strong>da</strong> previamente a commiss80 central e reniin-<br />
ciando ao direito a qualquer oiitra reclamação por esse motivo ; a empregarem todos os meios ao<br />
seu alcance para evitar a emigraç8o clan<strong>de</strong>stina, informando a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> tudo quanto a esse<br />
respeito lhes constar ; a einpregarem o maior cui<strong>da</strong>do e vigilancia na i<strong>de</strong>ntifica60 dos indigenas<br />
contractados, pelo que respeita aos seus nomes, commandos, regulatos ou sobados a qiie perten-<br />
çam, e a evitar que os indigenas consigam emigrar com <strong>de</strong>clarações falsas; a absterem-se <strong>de</strong> eni-<br />
pregar por si ou interposta pessoa iiieios violentos oii fraudulentos para obter engajaniento <strong>de</strong><br />
trabalhadores ; a siijeitareni-se a todos os regiilamentos presentes c futuros acerca dos serviços <strong>de</strong><br />
emigração, contractos e transporte <strong>de</strong> trabalhadores.<br />
As agencias licam sujeitas ;í fiscalisação dos governos <strong>da</strong>s provincias e á dos curadores<br />
dos itidigcnas, que ~)o<strong>de</strong>iii interlir cin todcs os actos coutrarios a lei, praticados pelos agentes no<br />
<strong>de</strong>sempenho dos seiiu logares. As condições do regulamento do recrutamento em Angola sã0 ciii<strong>da</strong>dosamente<br />
regiilaiiienta<strong>da</strong>s por este <strong>de</strong>creto. Devem <strong>de</strong>limitar-se zonns <strong>de</strong> r.ezrutnnzcnio nas regiões<br />
<strong>de</strong> I.ibollo, (tiriga <strong>de</strong> Ambaca, Amboiria, Selles, Bailundo, Hambo, Sambo, Cacon<strong>da</strong> e<br />
Qiiillengiies, e niais tar<strong>de</strong> no Ciiniiiato, <strong>de</strong>ventlo o governador geral man<strong>da</strong>r proce<strong>de</strong>r á <strong>de</strong>finição<br />
dos niais curtos trajt*rtos entre estas localita, as linhas dos carninhos <strong>de</strong> ferro. Deve ser egiialinente fixado com urgencia<br />
o liinite n~axinio <strong>de</strong> emigrantes que ca<strong>da</strong> zona po<strong>de</strong>rb fornecer annualtuente. São creados<br />
por este regulamento os logares <strong>de</strong> recrutadores nomeados pelos goveriiadores dos districtos sob<br />
proposta dos agentes cuntractadores, e que 580 as utiicas enti<strong>da</strong><strong>de</strong>s que po<strong>de</strong>m recrutar trabalhadores<br />
indigenas para os fins consi<strong>de</strong>rados por este regiilamento.<br />
Estes logares si] po<strong>de</strong>rão ser <strong>de</strong>sempenhudos por ci<strong>da</strong>dãos portiiguezcs, pessoas idoneas<br />
que conheçam bem os dialectos locaes e que possuam todos os requisitos necessarios para <strong>de</strong>sempenharem<br />
bem o seu cargo.<br />
O recrutamento <strong>de</strong> trabalhadores <strong>de</strong>ve sempre fazer-se com assistencia e aiiiiiiencia do soba<br />
ou regulo <strong>de</strong> alguma <strong>da</strong>s regiões <strong>de</strong>scriptas, e sob a fiscalisaç80 directa <strong>da</strong> auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> adniinistrativa<br />
mais proxima. Feito o recrutamento <strong>de</strong>ve o assalariador sollicitar uma guia <strong>de</strong> transito ;i<br />
auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> administrativa para mostrar a i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong> dos trabalhadores recrutados perante as auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
qiie tios poptos do littoral tcctii <strong>de</strong> contracta.10~. O agciitc rccrutador C obrigaclu a
conduzir os trabalhadores para contractar, pelos caminhos <strong>de</strong> antemão <strong>de</strong>terminados e que ligam<br />
as diversas zonas <strong>de</strong> recrutamento <strong>da</strong> provincia com o littoral. As licenças <strong>de</strong> recrutamento pessoaes<br />
e intransmissiveis são concedi<strong>da</strong>s para ca<strong>da</strong> zona em especial, mediante previa caução <strong>de</strong><br />
3oo$coo reis, são vali<strong>da</strong>s por dois annos, paga ca<strong>da</strong> uma 15$ooo reis <strong>de</strong> einoliimentos e são<br />
sollicita<strong>da</strong>s pelos agentes contractadores a favor dos recrutadores que <strong>de</strong>sejam empregar.<br />
O recriitador q~iando chegar a locali<strong>da</strong><strong>de</strong> on<strong>de</strong> tiver <strong>de</strong> proce<strong>de</strong>r ,i operaçáo do recrutamento,<br />
<strong>de</strong>ve previaiiieiite apresentar-se a aiictori<strong>da</strong><strong>de</strong> administrativa mais proxima, niostrar-llie a<br />
sua nomeaqáo c liccn~a, e si; tlerois 6 que po<strong>de</strong> dirigir-se aos chefes indigeiias a iini <strong>de</strong> obter os<br />
tral>alliadores.<br />
As liccnvas <strong>de</strong>vem ser visa<strong>da</strong>s pela auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> administrativa que superinten<strong>de</strong>r no recrutamento.<br />
Os recrutadores sáo obrigados: a acompanharem os indigenas rccrutados durante a<br />
marcha para o littoral ; n tomar to<strong>da</strong>s as precaiivões para que Ihes nHo falte alinienta~ão, qiicr durante<br />
a marcha em caminhos gentilicos quer em camiiihos <strong>de</strong> ferro ; a apresentar ao agente contractador<br />
todos os indigenas que tiver recrutado na zona para que tiver licença, bem como a participar<br />
to<strong>da</strong>s as eventuali<strong>da</strong><strong>de</strong>s que se tiverem <strong>da</strong>do durante a marcha; salvo caso excepcional <strong>de</strong>vi<strong>da</strong>mente<br />
coinprovado, <strong>de</strong>ve apreserilar as certidões d'obito dos iiidigerias fallecidos e111 viagem, passa<strong>da</strong>s<br />
pelas auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s admiiiistrativas.<br />
I expressamente prolii1)ido aos recriitadores : assalariar iiivalidos, velhos ou pessoas que<br />
manifestamente aprescntani uma coinpleiyáo fraca e que nlo po<strong>de</strong>m trabalhar na agricultura ; trazer<br />
para o littoral indigenas que não tenliam sido recrutados segundo os preceitos d'este regulamento,<br />
sobretudo sem o accordo c presença do sol~a <strong>da</strong> locali<strong>da</strong><strong>de</strong>, e sem a liscalisaçZo <strong>da</strong>s auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
ndniiriistrativas ; conduzir para o littoral indigenas recrutados quando saiba que esses indigenas<br />
sXo forçados pelos seus chefes a coiitractarcm-se ; empregar no recrutamento eiiropeus oii indigenas<br />
qiie não tenham nomeaçlio e licença para recrutar trabalhadores; a <strong>de</strong>sviar os indigenas do<br />
fim para que foram recrutados, bem como obriga-los a pegar em cargas suas ou alheias; perturbar<br />
ou tentar perturbar a or<strong>de</strong>m publica, e commetter violencias nu frau<strong>de</strong>s <strong>de</strong> que resultem prejiiizos<br />
para o Estado ou para os indigenas ; <strong>de</strong>dicarem-se ao commercio <strong>de</strong> permuta <strong>de</strong> generos<br />
emqua~ito exercem funcções <strong>de</strong> recrutadores; obrigar os indigenas recriitados a carregar com qiialquer<br />
objecto qiie não seja roupa <strong>de</strong> uso ou alimentos para uso proprio.<br />
To<strong>da</strong>s as dcspczas com a alimentnçZo do indigena diirante a marcha para o littoral são h<br />
ciista do recriitador, <strong>de</strong>vendo essas <strong>de</strong>spezas sahir dos einoliimentos que recebe por ca<strong>da</strong> trabalhador<br />
recrutado. Os recriitadores que transgri<strong>da</strong>m as pre\cripçries d'este regulamento e 1130 observarem<br />
os preceitos a que se obrigaram, per<strong>de</strong>m a cauqão cin favor do Estado, alem <strong>da</strong>s penali<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
que Ilics possam ser iinpostas pelas leis coiiiniuns, ficando <strong>de</strong>s<strong>de</strong> logo privados <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r<br />
recrutar trabalhadores. O indigena que tiver sido recrutado nos termos d'este regulamento tem<br />
ohrigaçlo <strong>de</strong> acompanhar o recrutador ate <strong>da</strong>r entra<strong>da</strong> no <strong>de</strong>posito on<strong>de</strong> serh registado, e, se a<br />
inspecyAo sanitaria a que alli 6 subinettido o <strong>de</strong>clarar apto para o trabalho, contractado segundo<br />
as praxes d'este regulamento a prestar serviços nas fazen<strong>da</strong>s agricolas <strong>da</strong>s provincias <strong>de</strong> Angola e<br />
<strong>de</strong> S. TlioiiiF c I'rincipe. Qiiando algiiin indigcna recrutado se aiisentar durante a marcha, sem<br />
niotivo jiist~íica
926 POLITICA INDIGENA<br />
- - -. . ---- - .<br />
Logo gw O t~~bdbdW il~18~~P~~<br />
C e,~tr~gi'@<br />
BG' agmte te &iv ~~trd'S ílu^ <strong>de</strong>posito, acaba .a<br />
responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong> do recrutador. O agente contractador <strong>de</strong>vera estabelecer e manter a siia custa lios<br />
logiires do trajecto indicados pelo governo gcral, <strong>de</strong>positos ciii condiçõcs hygienicas para receberem<br />
coinmo<strong>da</strong>mente os trabalhadores rccrut:i
contractos originaes são enviados pelas agencias :o curador geral <strong>de</strong> S. TholnC pelo mesmo transporte<br />
em que os emigrantes são embarcados; ao <strong>de</strong>legado do Principe será siibmetti<strong>da</strong> pelas mesmas<br />
agencias unia relação nominativa dos trabalhadores cmbarcados para aqitclla ilha e os nomes<br />
dos respectivos agri(uliores. O registo d'cstcs contractos será feito na ciiradoria <strong>de</strong> S. Thomh,<br />
<strong>de</strong>ntro do praso <strong>de</strong> 30 dias, e os ccntractos são immediataniente enviados á <strong>de</strong>legação para serem<br />
em segui<strong>da</strong> entregues aos respectivos agricultores.<br />
Teem direito a obter traballiadores contractados : o proprietario, ren<strong>de</strong>iro ou foreiro, pelo<br />
menos <strong>de</strong> 5 hectares ; o coiiimerciante oii iiidiistrial estabelecido ; o proprictario <strong>de</strong> eriil)arcaçi>es <strong>de</strong><br />
mais <strong>de</strong> 4 tonela<strong>da</strong>s <strong>de</strong> arqiiençilo ca<strong>da</strong> lima; os lunccioiiarios piiblicos c qiialqiier particular. Todos<br />
estes individuos, para tereni o referido direito, precisam pagar <strong>de</strong> impostos directos ou indirectos<br />
na proviilcia <strong>de</strong> S. Thomé e Principe pelo menos 15$0oo reis por anno e exercer elfectivamente<br />
a sua profisslo ou industria. No acto do contracto ca<strong>da</strong> emigrante po<strong>de</strong>i-li receber do agente<br />
<strong>da</strong> emigração um adiantamentc~ riao siiperior ao salario <strong>de</strong> dois mezes, fazendo-se d'isso nienpo<br />
no respectivo contracto. O patrso .(.ri embolsn(lo d'essa quantia pelo encontro nas primeiras presta~ões<br />
com qiie tiver <strong>de</strong> eiitrat no respectivo cofre para os abonos <strong>de</strong> repatria~ão. E&ctuado o<br />
contracto, o trabalhador fica, dcdc 1og«, sob a vigilancia e responsnbili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> respectiva agencia<br />
<strong>de</strong> etiiigração oii siia <strong>de</strong>legaçã0 ati eiiiharcar para o seu <strong>de</strong>dtino. Os contractos são feitos pelo<br />
raso onaxlnio <strong>de</strong> 5 anuos complet~,, contados do dia em qiie os trabalhadores forem registados<br />
iio porto <strong>de</strong> <strong>de</strong>stino. Os contractos ri~lcl~ratlos eili to<strong>da</strong> a proviiicia <strong>de</strong> Aiigola, qucr para tral>altio<br />
<strong>de</strong>ntro <strong>da</strong> propria provincia, quer ]>ara a <strong>de</strong> S. TliomC e Principc, nos priiiieiros cinco annos <strong>da</strong><br />
vigencia d'estc regulainento npo po<strong>de</strong>rão ser por iiin praso superior a trcs aiinos. Se na vigcncia<br />
dos coiitractos a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> agricolu, indiistrial ou commercial, oii os barcos, mu<strong>da</strong>reiii <strong>de</strong> dono,<br />
o novo proprietario assumirá to<strong>da</strong>s as responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong>s que para com os itninigrantes pertenciam<br />
ao seu antecessor, e os contratos vigorarão ate final.<br />
Logo que algum navio conduzindo imriiigrantes contractados chegue a S. Thomk ou ao<br />
Principe, o respectivo coniniandnnte iiian<strong>da</strong>-los.1ia :ipresentar ao curador geral ou ao seli <strong>de</strong>legado<br />
que, verifica<strong>da</strong> a sua i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong>, avisará os patrõ-s a quem sejam <strong>de</strong>stinados para tomarem immediata<br />
conta d'elles. Por conta dos mesmos patrões correr&o to<strong>da</strong>s as <strong>de</strong>spezas feitas com os immigrantes<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o seu <strong>de</strong>sembarque.<br />
As agencias <strong>de</strong> emigração e as <strong>de</strong>legações que funccionarem junto a portos <strong>de</strong> escalla dos<br />
navios encarregados do transporte einbarcarão os trabalhadores directamente para os seus <strong>de</strong>stinos;<br />
as restantes servir-se-hZ@ dos portos <strong>de</strong> mais facil accesso on<strong>de</strong> haja agencias ou <strong>de</strong>legações.<br />
Em todos os navios que transporteni tr;il>alli:idores repatriados irá iim commissario do governo<br />
nomeado nd hoc pelo govern:idor <strong>de</strong> S. 'l'liomk, portador dos bonus <strong>de</strong> repatriacão e incumbido<br />
<strong>de</strong> verificar que os immigrarites sii <strong>de</strong>sernb:irqiiem no porto do seu ile5tin0, et~tregando-lhes perante<br />
o curador os respectivos borius, do que se lavrari acta em triplicado, assigna<strong>da</strong> pelos funccioiiarios<br />
incumbidos <strong>da</strong> execução e por duas testemunhas.<br />
O trans1,orte dos immigrantes sb po<strong>de</strong>rá ser feito nos navios portuguezes para esse fim<br />
registados <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> presta<strong>da</strong> ii;inça o~i <strong>de</strong>posito; ou por navios estrangeiros para isso tlcvi<strong>da</strong>ineiitc<br />
auctorisados pio govcr~iador (Ia provincia <strong>de</strong> S. Tho~iC, sujcitando-se os capitães por<br />
dcrl*irrição niitlientica As rcsl~cctivas prsscriptões d'este regulamento. As aitctorisações para<br />
trqosporte <strong>de</strong> scr-viç:ies po<strong>de</strong>m tambeni ser concedi<strong>da</strong>s pelos governadores <strong>da</strong>s provincicis <strong>de</strong> on<strong>de</strong><br />
snhcnl os eniigratite5. 0 i~avio
POLITIC.1 IKDIG ENA<br />
Os emigratites são separados por sexos em compartimentos completamente isolados,<br />
sendo prohibido dormirem sobre o convez, e regressarem á coberta antes <strong>da</strong> completa bal<strong>de</strong>açuo<br />
do navio. A Bua alinientaçiío consistiri priiicipalmcnte em arroz e farinhas e pequenas qitanti<strong>da</strong>dcs<br />
<strong>de</strong> bacalhaii, carne salga<strong>da</strong> ou frcsc:i c legiiiiics frescos. E' proliil)ido o contracto e emh:irque <strong>de</strong><br />
in~lig~iias velhos, r:icliiticos, atacados <strong>de</strong> alienasão inciitnl, dc ninciil,~, tle docriça tlo soinno, tlc<br />
qiiaesqiicr incilr.stins oii <strong>de</strong>forinitladcs que os tornem inaptos para o tral):illio. E' expressaiiiente<br />
,prohil>iilo ~ciidcr quxesqiicr artigos oii I>cbiclas aos traballiadorcs, tanto na viagem para S. ThoinB<br />
e Priiicipe coiiio no regresso terras <strong>da</strong> siia natiirali<strong>da</strong><strong>de</strong>. Ao fin<strong>da</strong>r a \i:igciii c vcriíica
i<br />
Nos casos <strong>de</strong> ausencia illegal ou doença, o trabalhador per<strong>de</strong> o direito ao salario total dos<br />
dias que ella durar. Expirado o tempo legal do seu contracto o serviçal po<strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> ser repa-<br />
:riado se fizer novo contracto a sei1 pedido. A renovação dos contractos seri perhitti<strong>da</strong> <strong>de</strong>pois<br />
<strong>de</strong> verificado pelo cucidor que essa f a voiita<strong>de</strong> expressa do serviçal qiie oiitl~or~a livre <strong>de</strong> qualquer<br />
1)rc5$Bo e observando-se, aléin <strong>da</strong>s outras prescripções regolanientares os preceitos segilintes:<br />
O agriciiltor, industrial, coinmerciante, fiinccionario ou particiilar que tenha tral>alhadores<br />
: prcti~ii~la rcnovar os contractos po<strong>de</strong>ri reqiierer ao governador <strong>da</strong> provincia em S, I'liornf, e ao<br />
;ovrt-ii:idix do districto <strong>da</strong> ilha do l'riiicipe, permissão para a referi<strong>da</strong> renovaçZo ; 03 governadores<br />
11iiir3o sobre ca<strong>da</strong> requerinicnto o curador geral se fi,r em S. ThomC ou o seu <strong>de</strong>legado se fôr na<br />
Ilia <strong>de</strong> Principe, qiie informari por escripto se o requerente foi ja con<strong>de</strong>mnado por attentado<br />
:ontra a lil~er<strong>da</strong><strong>de</strong> dos serviçaes ; csta iiifracçUo irihibira o con<strong>de</strong>mnado pelo espaço <strong>de</strong> seis mczes,<br />
:, coni caso <strong>de</strong> reinci<strong>de</strong>ncin, pelo dobro d'este praso, contados <strong>da</strong> expiaeo <strong>da</strong> penali<strong>da</strong><strong>de</strong>, <strong>de</strong><br />
recontractar scrviçaes.<br />
Sendo publico o acto <strong>de</strong> renovação dos contractos nem os curadores quando esses actos 4e<br />
celebrem na curatloria, nem os agricultores quando se celebrem nas suas proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>s, po<strong>de</strong>rão<br />
negar a entra<strong>da</strong> ás pessoas que se apresentarem para presenciarem o referido acto, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que essas<br />
11c3s'ms nk intervenham n'csk nem o pertiirbein. A renovaçao dos contrrctos <strong>de</strong> trabalho s8<br />
po<strong>de</strong>ri realisar-se perante o curndor geral ein S. Thomé e perante o seu <strong>de</strong>legado na ilha do Prin.<br />
cipe, aisistidos por uni empregado <strong>da</strong> curadoria, duas tcstemiinhas e um interprete ajuramentado<br />
qiie nunca serl escolhido cntrc os individiios ao serviço do patrão <strong>de</strong> que se tratar, e achando-se<br />
presentes os outlior~aiites traballiadores. Na renovação dos coiitractos teriio preferencia em egual<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> condltiões os patrões com quem os serviçaes cstiverem servinclo.<br />
Celebrado o novo contracto, o serviçal receber5 <strong>de</strong>s<strong>de</strong> então o seu salario por inteiro continuando<br />
os boiiiis anteriormente (idqiiiridos, <strong>de</strong>positados no cofre do trabalho e repatriação at6 que<br />
csta se verifique. Quando estiverem nivelados sobre a base minima fixa<strong>da</strong> n'este regulamento, os<br />
salarios <strong>de</strong> todos os serviçaes em scrvito na provincia <strong>de</strong> S. Thomé e Principe, a renovaçno <strong>de</strong><br />
contracto s0 po<strong>de</strong>ra ser feita mediante augmento <strong>de</strong> io o/o no salario.<br />
Por este regulamento ficam tntnhein cui<strong>da</strong>dosninente regulamentados os serviços do colre <strong>de</strong><br />
trnl>:illio e repatriaçáo <strong>de</strong>stinado ii arreca<strong>da</strong>çBo dos boniis pertencentes aos serviçaes e do producto<br />
<strong>da</strong>s multas commiiia<strong>da</strong>s por este regulamento.<br />
Ca<strong>da</strong> patrlio ile mais <strong>de</strong> 50 serviçaes C obrigado a manter erlfermarias separ<strong>da</strong>s para os<br />
dois sexos, pPra os tratar gratuitamente, servi<strong>da</strong>s por enfermeiros habilitados e com a preciza<br />
aml)ulancia. Ccsi:i cs\:i obrignçBo, se a menos <strong>de</strong> cinco kilometroi do logar <strong>da</strong> resi<strong>de</strong>ncia ou occupaçso<br />
habitual dos serviyaes, houver hospital em que os doentes possam ser recebidos e tratados<br />
a expeiisas do patr8o.<br />
Os facuitativos (1ere:n visitar diariamente as proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>s que tenham mil oii mais trabalhadores,<br />
diias vezes por semana as que tiverem seisc-ntos ou iilais, e to<strong>da</strong>s as outras uma rez<br />
sein:irin pelo nicnos, assinl como <strong>de</strong>vem fazer visitas extraordinarias a qualquer roça <strong>da</strong> sua<br />
circumscripç~o, quando sejam ichani~dos em casos graves e urgentts. O facultativo po<strong>de</strong>rb prescrever<br />
quaesquer reitricções e .ate comp!eta dispensa <strong>de</strong> trabalho. A prescripção terP força obrigatoria.<br />
As mulheres contracta<strong>da</strong>s szo, sem prejiiizo dos scus salarios, dispensa<strong>da</strong>s <strong>de</strong> qualquer<br />
trabalho rios 30 ultimos dias prol-aveis do pcriodo <strong>de</strong> gestação e nos 30 dias immedialos ao parto.<br />
.Diirante os primeiros seis mezcs <strong>da</strong> amatiieiitação dos seus filhos s6 po<strong>de</strong>r80 scr emprega<strong>da</strong>s em<br />
trabalhos mo<strong>de</strong>rn
330 POLITICA INDIGENA<br />
linha <strong>de</strong> agua haja pontes oii caes <strong>de</strong> embarque ou <strong>de</strong>sembarque oii pontes <strong>de</strong> passagem. E:ii ca<strong>da</strong><br />
fazen<strong>da</strong> ou estabelecimento em que haja creanças, filhas dos serviçnes, inferiores a sete annos, haverB,<br />
seja qual fôr o numero, uma creche nas condiçõas indica<strong>da</strong>s no regulamcnto provincial. Os<br />
mcnorcs do sexo masciilino <strong>de</strong> 14 a r6 anrios sZo obrigados para com os patrões a fazer todo o<br />
serviço dos adultos excepto <strong>de</strong>rrubar arvores e pilar cafk, e os <strong>da</strong> mesma e<strong>da</strong><strong>de</strong> do sexo feniiiiino<br />
a fazer todo o traballio exigido is niulheres pelo regulamento provincial. Os menores <strong>de</strong> i t a 14<br />
annos, s6inente serão empregados em apanhar friictos, guar<strong>da</strong>r sementeiras e creações e a fazer<br />
os trabalhos domesticas tendo-se sempre em atteneo as siias diminutas forças e pouca e<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
Pelo governador em conselho, e ouvi<strong>da</strong> a junta local <strong>de</strong> trabalho e emigração, serão <strong>de</strong>termina<strong>da</strong>s<br />
as condições a que <strong>de</strong>vem satisfazer as creches, casas ou alojamentos commuas para habitaçzo<br />
dos serviçaes, e enfermarias ou haspitaes, suas condições Iiygienicas, systema <strong>de</strong> limpeza e tudo<br />
o mais que fôr conducente ao bem estar dos trabalhadores.<br />
A ilha <strong>de</strong> S. Thomk será dividi<strong>da</strong> em r4 circumscripções sanitarias, tendo ca<strong>da</strong> circumscripção<br />
um facultativo n'ella resi<strong>de</strong>nte, o qual não po<strong>de</strong>rá exercer clinica n'outra circuniscripção,<br />
salvo caso <strong>de</strong> força maior. A ilha do Principe serL dividi<strong>da</strong> em duas circumscripçiies medicas. Os<br />
medicos teem resi<strong>de</strong>ncia obrigatoria nas suas respectivas circiiinscripções. Os individiios naturaes<br />
.<strong>de</strong> Afiica que, nas coiidições do artigo 256 do Codigo Penal, foreni julgados vadios, po<strong>de</strong>rão ser<br />
compellidos a contractarem-se para o serviço <strong>da</strong> agricultura dc S. ThoinC e Principe nos termos<br />
d'cste regulamento. Para a captura dos trabalhadores fugitivo? e (10s vadios, ser3o ordcnadns<br />
ndniinistrativanicnte as biijcas domiciliarias ou no matto qiie sej;iiii indispensaveis, quando haja<br />
pedido individual ou collectivo rclativo a fuga <strong>de</strong> scrviçaes, ou eni virtu<strong>de</strong> <strong>de</strong> requisição do curador<br />
ou sei1 <strong>de</strong>legado. Os serviçaes fugitivos e os vadios capturados nas buscas serào entregues ao<br />
ciirador geral ; aquclles são restituidos aos seus respectivos patrões e estes sHo man<strong>da</strong>dos trabn-<br />
Ihar nas obras do Estado, ate que se contractem para serviços agricolns ou sejam reclamados pelo<br />
governo para serviço militar. A pena <strong>de</strong> pritáo disciplinar ou correccional que, em vista <strong>da</strong> lqis-<br />
Iação geral, tenhh <strong>de</strong> ser imposta ao servical, ser8 substitiii<strong>da</strong> em S. Tho~iiC. e Principe por egtial<br />
tempo <strong>de</strong> trabalho nas obras piiblicas, recolheiido elle <strong>de</strong> noite 6 prisão. As sobras <strong>da</strong>s receitas do<br />
cofre <strong>de</strong> trabalho e repatriação, além <strong>da</strong>s <strong>de</strong>spezas e encargos a que fica obrigado por este regulamento,<br />
serão applicn<strong>da</strong>s á creação e custeio <strong>de</strong> escolas agricolas e industriaes na provincia <strong>de</strong> S.<br />
I'homb e Principe.<br />
Fica prohibi<strong>da</strong> a emigravão <strong>de</strong> trabalhadores indigenas <strong>da</strong>s provincias ultramarinas para<br />
colonias estrangeiAs, salvo convenção <strong>de</strong>vi<strong>da</strong>niente aiictorisa<strong>da</strong>. In<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente dos <strong>de</strong>veres<br />
inlierentes ao car (le presi<strong>de</strong>nte <strong>da</strong> junta local, o ciirador geral vigiará pclo bom tratamento dos<br />
i<br />
setis curatellados e pelo fiel cumprimento dos contractos, tanto <strong>da</strong> parte dos agricu:tores como dos<br />
trabalhadores. Se o ciirador, para proce<strong>de</strong>r a averigiiaçõcs oii para iiiçzo conipete na ilha do Principe ao <strong>de</strong>legado do ci~rador<br />
com relação a estes crimes qiiaiiilo cotiirncttido$ <strong>de</strong>ntro <strong>da</strong> nrea <strong>da</strong> siia jiirisdicção.<br />
Das <strong>de</strong>cisiics tlo ciirador oii scli <strong>de</strong>!cg do, caberii recurso coiii efeito suspcnsivo para o<br />
i<br />
governador em consellio. Nos processos correccioiiaes por crimes coiiiii;ettidos Imra coiii o3 scrviçaes,<br />
as funcções no Mitiisterio Puliilco seráo <strong>de</strong>sempeiiha<strong>da</strong>s at6 ;i [~roiiiincia pelo curador geral<br />
em S. Thome e pelo seu <strong>de</strong>lega
O <strong>de</strong>creto iiian<strong>da</strong> nrgaiiisar com a possivel iirgencia n'a curadoria geral <strong>de</strong> S. ThomC iim<br />
serviço <strong>de</strong> estatistica que <strong>de</strong>ve abranger tiido que diga respeito ao trabalho indigena, natali<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />
mortali<strong>da</strong><strong>de</strong>, morl)ili<strong>da</strong><strong>de</strong>, movimento geral <strong>da</strong> população trabalhadora, bem conio todos os ele-<br />
mentos que possafn interessar nos estiidos <strong>de</strong>mographicos. Sob proposta <strong>da</strong> commissko central <strong>de</strong><br />
Lisboa, o serviço <strong>de</strong> recrutamento <strong>de</strong> serviçaes na provincia <strong>de</strong> Moçamhique po<strong>de</strong>ri ser organi-<br />
sado em condições analogas Bs adopta<strong>da</strong>s para os indigenas qiie vão para o Traiiswaal. As pres-<br />
aipçaes d'este regiilamcnto são cni tudo applicavcis aos contriictos entre os traballiadores africa-<br />
nos e o Estado, ou corpornç6es administrativas e inuiiicipaes. Este rcgiilainento entrar& em vigor<br />
ires niezes <strong>de</strong>pois <strong>da</strong> siia piiblicaçZo.<br />
Taes sáo as disposiçóes mais importantes do actual regulamento do<br />
trabalho immigrado em S. Thomé, que pó<strong>de</strong> ser vantajosamente confrontado<br />
com to<strong>da</strong> a legislaçgo estrangeira referente a contractos <strong>de</strong> trabalho indi-<br />
gena. Comparando com as leis actualmente em vigor nas colonias estran-<br />
geiras, n5.o só o diploma no seu conjuncto e indole geral, mas ain<strong>da</strong> to<strong>da</strong>s<br />
as suas diriposiçúes iim;t por uma, chega-se & concliisáo que nenhuma outra<br />
naçgo colonial assegura aos indigenas assalariados mais firmes garantias<br />
para a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> dos coiitractos, mais respeito pelos seus direitos e mais<br />
perfeitas normas <strong>de</strong> liumani<strong>da</strong><strong>de</strong>, civilisaçáo e justiça. O trabalho immi-<br />
grado em S. TliomB, longe <strong>de</strong> ser uma immorali<strong>da</strong><strong>de</strong> como apregoam os<br />
mantenedores <strong>da</strong> campanlia diffamatoria, E um mcio altamente humanitario<br />
e civilisador dc iniciar a regeneração social e moral dos indigenas contra-<br />
ctados.<br />
O trabalho livre E uma <strong>da</strong>s melliores fórmas <strong>de</strong> civilisar o selvagem,<br />
mas o regimen do tra1,aliio tem necessariamente <strong>de</strong> ser apropriado ao ca-<br />
ractcr e ao grau <strong>de</strong> adiantamento social e economico dos traballiadores.<br />
Desdc qiie o preto acceita livremente o seu contracto, e para isso o regu-<br />
mcnto portugiicz tstabelccc as niais seguras garantias, B t5o livre o seu<br />
traballio como o <strong>de</strong> qiialqiier opcrario ou trabalhador ogricola eiiropeii, con-<br />
tractarlo para <strong>de</strong>gcinpenlio teniporario do seu mister.<br />
Se a dnraçuo dos contractos <strong>de</strong> trabalho indigena tS siiperior á dos<br />
que geralmente se celebram na Europa, e se & ruptura dos rime ir os cor-
332 POLITICA INDIGENA<br />
---<br />
respon<strong>de</strong> ~ancção penal, Q porque as leis tecm forçosamente <strong>de</strong> se adoptar<br />
aos costiimes e ao adiantamento social dos contractados. Tão livres são uns<br />
como os outros, e a unica differença resume-se afinal na especialisaç50 in-<br />
diepensa~cl <strong>da</strong> condição jiiridica dos immigrados indigenas. Os contractos<br />
duram mais tempo, porque o feitio indolente e dcspreocupado dos indigenas<br />
e as suas ten<strong>de</strong>ncias irregulares e crraticas n5o garantem sufficientemcnte<br />
a oflerta livre e abun<strong>da</strong>nte <strong>da</strong> máo d'obra jornaleira. -4 sancçáo penal do<br />
contracto <strong>de</strong> immigraçáo e o regimen disciplinar dos immigrantes náo pas-<br />
sam <strong>de</strong> simples artigos do regimcn do indigenato ciija necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>, to<strong>da</strong>s<br />
as nações coloniaes, mórmente a Inglaterra, teem sempre reconhccido, esta-<br />
belecendo-o nas suas colonia~.<br />
Qaando estudAmos o regirnen <strong>de</strong> trabalho obrigatorio nas colonias<br />
portuguezas, combatemos energicamente n sua utiliaaçáo por emprezas<br />
particulares, consi<strong>de</strong>rando apenas transitoriamente <strong>de</strong>fensavel o seu em-<br />
prego pelo Estado, quando para obras <strong>de</strong> interesse geral não haja outra<br />
maneira <strong>de</strong> obter trabalhadores, oii quando se tornc forqaso reprimir os<br />
<strong>de</strong>smandos e inconvenientcs d'iima vadiagem <strong>de</strong>senfrea<strong>da</strong>.<br />
Com o trabalho dos serviçaes <strong>de</strong> S. Thomd contractados em condiçóes<br />
<strong>de</strong> absoluta liber<strong>da</strong><strong>de</strong>, as circumstancias são inteiramente diversas: se os<br />
contractos sáo livres o trabalho não é forçado.<br />
Esta mesma opiriiáo accentua-a o distincto escriptor colonial o Sr.<br />
Augusto Ribeiro nos segiiintcs periodos extraliidos <strong>da</strong> monographia .A<br />
Roça <strong>da</strong> Boa. Entra<strong>da</strong> x .<br />
c 0 contracto dos trabalhadores indigcnas i: apenas a formula ado-<br />
pta<strong>da</strong> em harmonia com a indole, o temperamento e as disposiçóes dos<br />
indigenas par:L os incitar ao trabalho, pour les an1n2er au t~.nt:cxil,<br />
applicando<br />
a plirase <strong>de</strong> 11. Cattier; formula qiic sem contestação, nGo offen<strong>de</strong>ndo os<br />
principias <strong>da</strong> humani<strong>da</strong><strong>de</strong>, exerce na sua applicaçiio uma gran<strong>de</strong> influencia<br />
nos interesses economicos <strong>da</strong>s colonias e correspon<strong>de</strong> á tlieoria do trabalho<br />
livre, preconisa<strong>da</strong> por M. Cattier, isto 4, que se <strong>de</strong>ve constranger o indi-<br />
gena ao trabalho, mas ao traballio livre, ao traballio por elle escolliido,<br />
excciitado em compatil,ili<strong>da</strong><strong>de</strong> com as exigcncias <strong>da</strong> siia vi<strong>da</strong> familiar, com<br />
as condições climatericas politicas, e economictis <strong>da</strong> região on<strong>de</strong> cllc ri\.(,
Correspon<strong>de</strong> ain<strong>da</strong> a formula do contracto dos indigenas nas colonias<br />
portuguezas á thcoria <strong>de</strong> M. Alleyne Ireland, um dos theoricos mais em<br />
evi<strong>de</strong>ncia <strong>da</strong> mo<strong>de</strong>rna politica colonial, não sómente nos Estados Unidos<br />
mas ain<strong>da</strong> na Inglaterra, reconheci<strong>da</strong> a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> se procurar a mgo<br />
d'obra para os paizes tropicaes, <strong>da</strong><strong>da</strong> a insufficiencia <strong>da</strong> população local<br />
nas colonias que, pelas condiçíies do seu clima, pela <strong>de</strong>nsi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> sua popiilação,<br />
os possam fornecer com as aptidões necessarias aos traballios<br />
agricolas. Mgr. Angoiiarcl, bispo do Alto Congo Francez, ain<strong>da</strong> ha poucos<br />
mczes, n'um livro sobre o Congo, <strong>de</strong>fendia o trabalho obrigatorio para os<br />
pretos, e sustentava que elle <strong>de</strong>ve ser mantido com gran<strong>de</strong> firmeza, embora<br />
com gran<strong>de</strong> prudcncia, accrescentando que a exploração do trabalho indigenn<br />
em Africa, longe <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r-se classificar <strong>de</strong> escravatiira, representava<br />
um estado social bem mais favoravel do que o dos brancos <strong>da</strong> metropole,<br />
ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros escravos sob o jugo dos impostos, do serviço militar, e <strong>da</strong>s ru<strong>de</strong>s<br />
exigencias do trabalho rural.<br />
O preto, accrescenta o illiistre prelado, não tendo necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>, vivendo<br />
o dia <strong>de</strong> ho,je sem se preoccupar com o <strong>de</strong> amanhá, ndo trabalhará se<br />
a isso nflo for obrigado, e não se civilisará senão contra a sua vonta<strong>de</strong>. Ora<br />
cntre a theoria do trabalho constrangido Inas livre <strong>de</strong> &I. Cattier, e a do<br />
traballio obrigatorio <strong>de</strong> Mgr. Angonard, é manifesto que a forma adopta<strong>da</strong><br />
para o contracto <strong>de</strong> trabalhadores indigenas nas colonias portuguezas, B a<br />
que mais se coaduna c0111 os principios <strong>da</strong> civilisação e <strong>da</strong> humani<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />
porque não sbmente o indigena se contracta livremente, e com relação á<br />
provincia <strong>de</strong> S. Thom6 e Principe, segue uma corrente <strong>de</strong> emigração, que<br />
se ~Ole dizer secular, qiie tem tradiçóes, mas ain<strong>da</strong> tem a segurança <strong>de</strong><br />
que alli encontrar&, al4m d'uma protecçáo sollicita, commodi<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> conforto<br />
e <strong>de</strong> bem estar, incomparavelmente superiores ás qiie realmento<br />
encontram, nos centros operarios do mundo civilisado, as classes trabalhadoras<br />
S.<br />
Os contractos <strong>de</strong> immigraçáo em S. ThomB s5o realmente mais perfeitos<br />
e mais liberaes do que todos os que iio presente vigoram em colonias<br />
estrangeiras. E' esta uma ver<strong>da</strong><strong>de</strong> indiscutivel que ninguem <strong>de</strong> boa fd contestar&.<br />
Entretanto nem por isso o trabalho immigrado por contracto <strong>de</strong>ixq
334 POLITICA INDIGENA<br />
<strong>de</strong> ter os inconvenientes que em to<strong>da</strong> a parte o fazem consi<strong>de</strong>rar como<br />
mero recurso <strong>de</strong>stinado a prover á falta <strong>da</strong> offerta livre <strong>de</strong> mão d'obra<br />
local, que <strong>de</strong>ve ser a base essencial <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a organisaçáo <strong>de</strong> traballio<br />
estare1 e duradoura. Os elementos principaee iia prosperi<strong>da</strong><strong>de</strong> actual <strong>de</strong><br />
S. Thom6 -- trabalho contractado e cultura exclusiva d'iim genero rico <strong>de</strong><br />
exportaçTio - po<strong>de</strong>m Amanhã ser as causas predominantes <strong>da</strong> sua riiina<br />
fulminante. Uma <strong>de</strong>mora<strong>da</strong> crise do cacau, ou a suspensão <strong>da</strong> immigraçáo<br />
dos serviçaes, po<strong>de</strong>m momentaneamente <strong>de</strong>rruir a obra grandiosa que tRo<br />
intelligente e laboriosamente se conseguiu edificar.<br />
O remedio para evitar o primeiro d'estes males está nas máos doe<br />
agriciiltores, que <strong>de</strong>vem, como garantia <strong>de</strong> segurança dos seus proprios<br />
interessee, multiplicar as culturas <strong>de</strong> exportação taes como caff.5, borraclia,<br />
quinas, agaves, etc., precavendo-se antecipa<strong>da</strong>mente contra qualquer plian-<br />
tasia <strong>da</strong> evolução economica nos mercados mundiaes.<br />
Quanto á substituiç%o successiva e milito lenta do trabalho immi-<br />
grado pela mão cl'obra local, pertence essencialmente ao Estado a funcçáo<br />
<strong>de</strong> a promover, normalisando por leis repressivas a vadiagem dos filhos tle<br />
S. Tli~mé, e principalmente provocando e protegendo por todos os mcios<br />
ao seu alcance, a fixaçúo na colonia dos immigrãntes angolenses.<br />
Um dos motivos que tem feito espalhar uma certa <strong>de</strong>scrença no cxito<br />
do povoamento <strong>de</strong>nso <strong>da</strong> ilha por traballiadores angolaa livres e activos, é<br />
a mortali<strong>da</strong><strong>de</strong> relativamente eleva<strong>da</strong>, dos serviçaes, apezar do incompararel<br />
<strong>de</strong>svelo com que são medicados e h~s~italisados nas roças.<br />
Uma <strong>da</strong>s principaes causas do <strong>de</strong>~auperamento physico dos indige-<br />
nas, a que mais facilita a invasão dos agentes patliogenicos e enfraquece<br />
a resistencia organica, 6, sem duvi<strong>da</strong>, o alcoolismo, cssc flagello assolador<br />
<strong>de</strong> to<strong>da</strong> a raga negra, qae representa para os indigenas a mais perigosa<br />
<strong>da</strong>s en<strong>de</strong>mias africanas.<br />
Os plantadores <strong>de</strong>vem abster-se por completo dc fornecer aos indige-<br />
nas to<strong>da</strong>s as bebi<strong>da</strong>s alcoolicas, á C X C C ~ ~ ~ O<br />
<strong>de</strong> vinlio cm quanti<strong>da</strong><strong>de</strong> mo<strong>de</strong>ra<strong>da</strong>,<br />
e o governo <strong>de</strong>ve proce<strong>de</strong>r quanto antes a uma regii1amentac;Zo severa c<br />
efficaz que difficulte e torne praticamente impossivel o consumo immo<strong>de</strong>-<br />
rado <strong>de</strong> alcooesi a que os indigenas geralmente se entregam. Em S. Thornt:
a condição insular e a pouca extensão do territorio colonial facilitariam<br />
sing~ilarmente a fiscalisaçiio.<br />
A supervalorisaçáo dos inebriantes talvez não seja o melhor processo<br />
<strong>de</strong> obter a extincção do respectivo commercio. E' sem duvi<strong>da</strong> necessaria e<br />
conveniente, mas não dispcnsa uma tributaqão onerosa especialmente applica<strong>da</strong><br />
aos forros, n'essas pequenas ten<strong>da</strong>s tabernas que, espalha<strong>da</strong>s como sangue-sugas<br />
em torno <strong>da</strong>s roças, envenenam quotidianamente os indigenas<br />
em troca do salario ganlio e dos gcncros que os incitaram a roiibar. O<br />
Sr. Con<strong>de</strong> <strong>de</strong> Souza e li'tiro, no seu cit:iclo livro, diz a cstc respeito o segiiinte.<br />
. Esses rcccptadores emeritos <strong>de</strong> todos os roubos, l~ossuindo lojas e<br />
tnberiins, on<strong>de</strong>, a troco <strong>de</strong> alguns dccilitros <strong>de</strong> aguar<strong>de</strong>nte, os serviçacs<br />
<strong>da</strong>s roqas vão entregar os gencros <strong>de</strong> prodiicção, snbtrahidos a seus patróe~,<br />
náo sc pejam <strong>de</strong> exercer a mais torpe explora(;Ho sobre o serviçal,<br />
que ren<strong>de</strong> o que lhe não pertence, não Ilie admittindo sequer o direito <strong>de</strong><br />
discutir o vil preço <strong>da</strong> compra, sob a terrivel e esmagadora ameaça <strong>de</strong> o<br />
<strong>de</strong>nunciar ao patrão oii ás auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s ! . . . » E' indispensavel extinguir<br />
quanto antes este commercio no que respeita a ven<strong>da</strong> <strong>de</strong> bebi<strong>da</strong>s alcooli-<br />
CHS, se se quizer livrar o serviçal <strong>de</strong> hoje e colono <strong>de</strong> Brnanhá, do vicio<br />
terrivel que entrava a sua acclimatação regular e é a causa indirecta mas<br />
principal <strong>da</strong> gran<strong>de</strong> mortali<strong>da</strong><strong>de</strong> infantil.<br />
Ao governo portiigiiez, que tão admiravelmente tem sabido orientar<br />
e fiscalisar o mo<strong>de</strong>lar regimen <strong>de</strong> trabalho contractado em S. Thom6, cum-<br />
pre tambem preparar á colonia uma futiira mão d'obra local abun<strong>da</strong>nte e<br />
roluntaria que possa suhstitiiir, ain<strong>da</strong> com vantagem, o regimen actiial.<br />
Para isso, antes <strong>de</strong> mais na<strong>da</strong>, 6 indispensavcl reprimir severamente a<br />
vadiagem e ociosi<strong>da</strong><strong>de</strong> dos naturaes <strong>da</strong> ilha, lançar sobre os filhos <strong>de</strong> S.<br />
Tliom6 uma eleva<strong>da</strong> capitação ou imposto <strong>de</strong> palhota em dinheiro que os<br />
obrigue a trabalhar, estabelecer numerosas e bem apetrecha<strong>da</strong>s escolas<br />
agricolas e profissionaes a<strong>da</strong>pta<strong>da</strong>s As condiçóes e natiireza do trabalho<br />
local, e combater tenazmente elos processos mais convenientes a praga do<br />
alcoolismo. Estribilisanclo e formando lentamente um regimen <strong>de</strong> trabalho<br />
<strong>de</strong> offerta livre que satisfaça to<strong>da</strong>s as exigencias <strong>da</strong> admiravel exploração<br />
agricola <strong>da</strong> colonia, pondo-a ao abrigo <strong>da</strong> carencia brusca <strong>de</strong> braços trabtt-
POLITICA INDIGENA<br />
Ihadores, ter8 o governo portiiguez coroado brilhantemente a grandiosa<br />
obra colonial que é hoje um dos melhores titulos <strong>de</strong> gloria para o genio 1<br />
colonisador <strong>da</strong> raça portiigueza. (I),<br />
(I) J,i <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> conclui<strong>da</strong> a impressão do presente capitiilo foram piiblica<strong>da</strong>s<br />
em <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 9 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1909, diversas aclarações ao Iiegulameiito <strong>de</strong> 1'1<br />
<strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 1909. Ficou expressamente prohibido o assalariamento <strong>de</strong> menores <strong>da</strong><br />
15 annos; as creanças at6 7 annos acompanharão as mães. O transporte dos iiiiriii<br />
grados s6 pdie ser feito em navios porluguezes, excepto ern poiitos on<strong>de</strong> iião I~:il I<br />
navegação regular portugueza. O governo pó<strong>de</strong> <strong>de</strong>clarar insubsistenles os coi~ti~~<br />
-11<br />
quando tenha havido illegali<strong>da</strong><strong>de</strong>s, ou quando qualquer <strong>da</strong>s partes contraclnrii ,<br />
recuzar a cumprir as respeclivas clausiilas. O novo diploma Rxa, n'esta hh1)oi .+<br />
quem são os responsaveis e como po<strong>de</strong>rão ser exigi<strong>da</strong>s as responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong>s. 12 (.ali<br />
cgo resta<strong>da</strong> elos agentes <strong>da</strong> emigração 6 eleva<strong>da</strong> a 2.000$000 reis.
CAPITULO \'I<br />
KEGIMEN DA PROPRIEDADE INDIGENA<br />
Generali<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />
India Ingleza.<br />
Indias Orientaes Neerlan<strong>de</strong>zas.<br />
Argelia.<br />
Tunisia.<br />
I ~ypo <strong>da</strong> occupação.<br />
Colonias britannicas.<br />
Coloiiiqç <strong>da</strong> Africa Occi<strong>de</strong>ntal { Colonias francezas.<br />
Colonias allemãs.<br />
Congo belga.<br />
Colonia do Cabo.<br />
Colonias <strong>da</strong> Africa Oriental.<br />
Colonias do Oriente.<br />
Colonias portuguezas.. . . . . . . . { Possessões africanas.<br />
Estado <strong>da</strong> India.<br />
Conclusões geraes.<br />
I
Generali<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
TJma <strong>da</strong>s mais importantes questúes <strong>de</strong> politica indigena é, sem du-<br />
vi<strong>da</strong>, a que se refere ao regimen applicavel á proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> individual ou<br />
collectiva, dos indigenas que habitam as colonias. Já vae bem longe o tempo<br />
em que campeavn livre a, usurpaçáo arbitraria e immoral dos bens immo-<br />
veis <strong>da</strong>s popu1ac;úeu aiitochtone~, sem sombra <strong>de</strong> respeito pela legitimi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
dos direitos dos primitivos possuiciores. Actualmente, seja qual fôr a fórma<br />
<strong>de</strong> acquisiçáo do dominio colonial, to<strong>da</strong>s as naçúes qiie colonisam, reconhe-<br />
cem ostensivamente - pelo menos em theoria - a obrigaqáo <strong>de</strong> respeitar<br />
a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena, legislando largamente sobre os respectivos proces-<br />
30s <strong>de</strong> acquisic;Lu, <strong>de</strong>marcaçáo, ca<strong>da</strong>stro, alienaçtlo, transmissáo legitimaria,<br />
e procurando estabelecer, por vezes, um registro legal que <strong>de</strong>finitivamente<br />
pranta a po+stl effi.cht,iva.<br />
De quatro processos se pG<strong>de</strong>m servir as naçúes colonisadoras para<br />
mnstitoir e alargar o dominio colonial : conquista, cessão amigavel, expro-<br />
priaçáo por utili<strong>da</strong><strong>de</strong> publica e occiipaçáo <strong>da</strong>s terras <strong>de</strong>soccupa<strong>da</strong>s. Na<br />
hypotliese <strong>da</strong> conquista o dominio territorial privativo <strong>da</strong> soberania <strong>de</strong>pos-<br />
ta, passa integralmente R posse dos novos dominadores. Foi o que, por<br />
3xempl0, aconteceu em 1830 na hrgelia, on<strong>de</strong> os dominios do beylicato<br />
passaram a ser proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> do Estado francez, e na India Franceza on<strong>de</strong><br />
i posse do solo era apanagio exclusivo <strong>da</strong> soberania musulmana, tendo os<br />
ndigenas s6mente o usufructo do solo que cultivavam. Na India este estado<br />
le coisas terminou com o <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 16 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 1854, que reorgani-<br />
*
340 POLITICA INDIGENA<br />
SOU f~n<strong>da</strong>ment~almente O regimnn <strong>da</strong> propriedntle immnl~itiaria intligena<br />
n'aquella colotiia franceza, <strong>de</strong>clarando legitimas proprietarios do solo os<br />
seus <strong>de</strong>tentores, fosse qual fosse a ftirma por que satisfizessem os impostos<br />
regulamentares.<br />
l'ambem em Mailagascar, quando 1897 o general Gallieni <strong>de</strong>poz a<br />
monarchia hova, hram <strong>de</strong>clarados proprietlarle clou conqiiiatadorea os territorioa<br />
pertencerites ao extincto dorriinio real. Pelo codigo <strong>de</strong> Hrihaspati<br />
<strong>de</strong>cretado por L4drianimpoinirneri~~it, oelehre antecessor tle Ranavalo, <strong>de</strong>clarava-se<br />
que n posse total <strong>de</strong> todo o territorio <strong>de</strong> &l:i<strong>da</strong>gaxcar pertencia<br />
exclusivamente ao soberano que a divi(1iri;~ entro os seus snbditos como<br />
melhor Ilie parecesse.<br />
P;irtintlo tl'e3tc principiq, comtiiettttritin 0.4 colonisadores varios abusos<br />
quando a ilha passou admibiistragáo directa <strong>da</strong> França. Confiscaram-se<br />
in<strong>de</strong>vihmente muitos terrends pertencentes a tribus que, segundo a lei<br />
malgache, os possuiam legalmente, visto que, com o xcto <strong>da</strong> doaçáo real,<br />
transitava para os donatarios o direito ri posse effectiva dos territorios<br />
doados.<br />
A r~ssflo arnignoel baseia-se em contractos celebrados com os chefes<br />
indigenas, principalmente nos paizes <strong>de</strong> protectorado, garantindo-se, n'esses<br />
actos, aos colonisadores, a posse <strong>de</strong> <strong>de</strong>termina<strong>da</strong>s zonas territoriaes, mais<br />
ou menos niti<strong>da</strong>mente <strong>de</strong>limita<strong>da</strong>s, que se <strong>de</strong>stinam, ou a constituir dominio<br />
alienave] á proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> priva<strong>da</strong>, ou n servir para a c~onstriicçAo <strong>de</strong><br />
obras piiblicas <strong>de</strong> int,eresse geral.<br />
A ~.rprolwiayio p01' ~rfilidn<strong>de</strong> geral exerce-se em quasi to<strong>da</strong>s as colonias<br />
sol, iimn fórma legal semelhante ou i<strong>de</strong>ntica á que vigora nas respectivas<br />
metropoles, e justifica-se quando a razáo que a impóe 6 strictamente<br />
o interesse publico, empregitndo-se os terrenos expropriados em obras publicas<br />
nrcessarias á colonia.<br />
Finalmente, a fórma mais vulgarmente segui<strong>da</strong> na constituição do<br />
dominio do Estado colonisador é a occs~pa~ão pura e simples <strong>da</strong>s terras<br />
<strong>de</strong>soccupa<strong>da</strong>s, fun<strong>da</strong><strong>da</strong> no lemma juridico res nzcllius primo occupanti S.<br />
N'esta hypothese o governo colonial <strong>de</strong>ixa aos indigenas a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> do<br />
solo que cultivam, e ain<strong>da</strong> o usufructo <strong>de</strong> reservas territoriaes, eupecial-
REGIUEN DA PROPRIEDADE<br />
--- - -<br />
nente <strong>de</strong>marca<strong>da</strong>s, quando se julguem necessilrias á sua subaiatencia, e<br />
ipropria-se todo o restante territorio que não é utilisado pelos indigenas,<br />
3 que fica pertencendo segundo legislações diversas, ou ao proprio Egtado<br />
dominador, ou A pessoa rnoral <strong>da</strong> respectiva colonia. (')<br />
Em qualquer <strong>da</strong>s hypotheses <strong>de</strong>scriptas, a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> garantir<br />
ms iridigenas a posse plena, ou pelo menos o livre iisufructo <strong>da</strong>s terras<br />
Iue owi:Lipam, impóe-se simultaneamente como <strong>de</strong>ver moral e como conveniencitt<br />
politicii. Não se pd<strong>de</strong> licitamente ve<strong>da</strong>r aos indigenns o direito a<br />
)oss~~ir't:m terras, nem se <strong>de</strong>ve expropria-lo3 violentamente dos bens que<br />
á pos3iiam. Esae proceilimerito que, no inicio <strong>da</strong> expansao colonial dos molernos<br />
povos europeus, foi norma commum a todos os typos <strong>de</strong> colonisaç8o,<br />
5 uma eapoliaç%o iinmoral e incompativel com as mais rudimentares noçúes<br />
ie jnstiça humana. Além d'isso, as justas revoltss do3 indigzna~ rebellados<br />
:ontrrt e33e nttentado ao3 seu3 legitimo3 direitos, occasionam graves perturbit(;i,es<br />
politicas, exigem (liependio3aa repressóen, e provocam até repreaalias<br />
sangrentas que scí cnncorrem para dizimar as populaçúes indigenas<br />
que, na hypothese <strong>da</strong>9 colonias t;*opicaea, tão indispen~aveia sáo ao exito<br />
do emprehendimento colonijador. Só nos principioa do seculo XIX 6 que as<br />
iiaçóes coloniilcs começaram a ter uma intuição mais justa dos <strong>de</strong>rerea civilistir\ores<br />
que a siia misszo Ihes confere, e <strong>da</strong> propria natureza do: -J seus<br />
intcr~~s~es coloniaes. Até entíio, salvo ca.iou isolados e excepcionaes, poiicos<br />
01, I,, ~iiiiiins direitos eram recontiecidos aos indigenas, e a repreusáo dos<br />
pr~tcst,os por estes le~ant~ittlos conduzia á pratica <strong>de</strong> innnmeras atroci<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />
Especialmente nas colonias iiiglezas, as campanhas contra os indigenas<br />
espoliados e rnaltrat,iicloa assumiam o caracter <strong>de</strong> ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iras guerras<br />
<strong>de</strong> exterminio, e, até lima <strong>da</strong>ta muito recente, os inglezes que orgnlhosamente<br />
se intitulam tlie o1~l!j e.ctirl):cti~ig race ., conservaram na Australia<br />
os barl)xros processos <strong>de</strong> tratamento clos indigenas que tHo tristemente celebrijaram<br />
os convictos <strong>de</strong> Botany Kay. Nos E~tados Unidos <strong>da</strong> America<br />
do Norte a reacçáo começou ti operar-se em 1802, constituindo-sc no terri-<br />
(I) Girault - O. C.tU1"<br />
341
312 YOLITICA INDIGENA<br />
torio <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> Estado reservas e.;peciaes exclusivamente <strong>de</strong>stina<strong>da</strong>s aos<br />
indigenas, <strong>de</strong>ntro <strong>da</strong>s quaes o governo se compromettia a assegurar-llies<br />
protecção efficaz. Esta especie <strong>de</strong> tratado foi <strong>de</strong>nunciado em 1830, quando<br />
a gran<strong>de</strong> affluencia <strong>de</strong> immigrantes e os progressos <strong>da</strong> colonisação impuzeram<br />
um gran<strong>de</strong> alargamento <strong>da</strong> área territorial a distribuir pelos colonos.<br />
Foi entáo ípe, pela pers~iasáo e pelo emprego tla forca contra as tribu;r<br />
recalcitrantes, se obrigaram os indior a emigrar em massa para os<br />
vastos campos incultos <strong>da</strong> margem oeste do IIishi~sipi. Eni 1834 foram<br />
unifica<strong>da</strong>s as reservas indianas n'um só territorio continuo, o Iq~tlialr Terri-<br />
tory, on<strong>de</strong> se promoveu a concentraçáo <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as tribus. Ern 1890 sepa-<br />
rou-se <strong>da</strong> reserva o territorio <strong>de</strong> Ocklahoma, e em 1!)00 a s~iperíicie<br />
terri-<br />
torial <strong>da</strong> reserva indiana era <strong>de</strong> 31:100 leguas quadra<strong>da</strong>s, habitando n'ella<br />
133:400 inclios que se administravam aixtorioinati~ente, sob a fiscalisação<br />
d'um superinten<strong>de</strong>nte geral nomeado pelo governo americano. A importa-<br />
c;áo <strong>de</strong> aguar<strong>de</strong>nte é prohibi<strong>da</strong> em todo o territorio, e a alienação do solo<br />
s6 se pb<strong>de</strong> realisar com prdvia auctorisação do governo norte-americano.<br />
No enclave <strong>de</strong> Alaska, o limitadissimo numero dos colonos permitte,<br />
ain<strong>da</strong> hoje, aos indigenas, a, livre disposiçáo do solo que <strong>de</strong>sejam occupar.<br />
No (jdnadk o governo obteve por contractos especiaes que to<strong>da</strong>s as<br />
tribus reniinciassem á reivindicaçgo dos seus direitos <strong>de</strong> soberariia, me-<br />
diante a qirantia <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> extensas reservas territorilie-. caujci-<br />
fracçów -6 são aliennveis c m assentimento du governo canadiano. Os<br />
chefes e os gran<strong>de</strong>s indigen s recebem iim soldo especial coriceclido pelo<br />
governo, th aos habitantes <strong>da</strong>s regióes estereis E conferido o direito <strong>de</strong> pe+ca<br />
i<br />
s caça em todos os terrenos ~ncultos.<br />
Em quasi to<strong>da</strong>s as colohias mo<strong>de</strong>rnas, como adiante veremos <strong>de</strong>talha-<br />
<strong>da</strong>mente, para os estabelecimentos coloniaes mais importantes, ou se bem<br />
procedido <strong>de</strong>limitaçgo <strong>de</strong> reservas para usufructo dos iiidigenas, ou' se<br />
teem <strong>de</strong>cretado a3 medi<strong>da</strong>s necessarias para que se,ja respeita<strong>da</strong> e conubli-<br />
<strong>da</strong><strong>da</strong> a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena jk existente, siibmettendo-a nos paizes mais<br />
atrazados a uma tutelln que ponlia os indigenas ao abrigo <strong>de</strong> contractos<br />
dolosos com alguns aventureiros europeus, e evite as conceqiiencias <strong>da</strong> im-<br />
previ<strong>de</strong>ncia, irreflexRo e puerili<strong>da</strong><strong>de</strong> do caracter indigena.
REGIMEN DA I'ROPRIEDADE 343<br />
A fórma <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena é naturalmente em extremo varia-<br />
vel com o respectivo grau <strong>de</strong> civilisação. Entre as populaqões indigenas<br />
mais civilisa<strong>da</strong>s siibsistem geralmente, a par. as proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>s individiial e<br />
collectiva. E' assim que os habzrs tunisinos e as co~)ii~~~i~~idn<strong>de</strong>s indianas ou<br />
annamitas náo impe<strong>de</strong>m o <strong>de</strong>senvolvimento e prcgreeso <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> individual.<br />
A' medi<strong>da</strong> que o nivel <strong>da</strong> civilisaçáo e <strong>de</strong> cnltnra social vae <strong>de</strong>crescendo,<br />
rareia ate <strong>de</strong>sapparecer a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> individual, e simplifica-se<br />
até se tornar rudimentar a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> collectiva.<br />
Entre as tribus mais selvagens, p0<strong>de</strong> asseverar-se qiie a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
individual é exclusivamente constitiii<strong>da</strong> pelos escravos e pelas mulheres,<br />
sendo apenas reserva<strong>da</strong> aos chefes a posse individual <strong>de</strong> gado, dinheiro, ou<br />
<strong>de</strong> quaesqiier objectos <strong>de</strong> valor, e pertencendo o usufrucio <strong>da</strong> terra li collectivi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
indigena. A noçfto <strong>da</strong> posse plena c10 solo, mesmo sob a fórma<br />
collectiva, raras rezes faz parte integrante <strong>da</strong> i<strong>de</strong>ologia indigena lias socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
mais rudimentares.<br />
A circnmstancia dos indigenas náo formarem uma idf.ia preciza <strong>da</strong><br />
proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> individual, tal como o direito romano a fez implantar na civi-<br />
lisaçáo occi<strong>de</strong>ntal, tem frequentemente servido <strong>de</strong> argiimento, contra o<br />
respeito que os colonisadores <strong>de</strong>rem clemonstrar pela manutenqáo <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
indigena.<br />
Esta allegaç&o carece absolutamente <strong>de</strong> fiin<strong>da</strong>mento justificativo,<br />
porque, se entre as populaç6es indigenas <strong>da</strong>s colonias a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> do solo<br />
apresenta quasi sempre a fórmtt collectiva, esse facto indica apenas qiie os<br />
sgrnpamentos sociaes consi<strong>de</strong>rados sgo <strong>de</strong> formaçxo relativamente recente.<br />
Com effeito, a Historia parece ter plenamente <strong>de</strong>monstradu que todos os<br />
povos, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente do meio physico c <strong>da</strong> raça, adoptaram nas primitivas<br />
eras <strong>da</strong> sua existencia social a fdrma collectiva <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
Evi<strong>de</strong>ntemente, Lima <strong>da</strong>s tarefas que a colonisação mo<strong>de</strong>rna se <strong>de</strong>ve<br />
impor, é a evolução progressiva <strong>da</strong> i<strong>de</strong>ia <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> e <strong>da</strong> ntit~ireza dos<br />
obj&,os possuidos, no e~pirito <strong>da</strong>s popnla~óes indiçenas, mas isso náo significa<br />
que se nác, <strong>de</strong>~am c~i<strong>da</strong>dc~s~rníritê atalar. cs dixeitos existentes<br />
taes como os indigenas actualmente os comprehen<strong>de</strong>m. e <strong>de</strong>ntro dos preceitos<br />
legaes do seu direito consitetiidinario. A s~ibstitni\áo <strong>da</strong>s mercadorias
344<br />
.<br />
POLITICA IXDIGENA<br />
-- -- - -<br />
usa<strong>da</strong>s nas trocas, pelos metaes amoe<strong>da</strong>dos, é um dos mais seguros meios<br />
<strong>de</strong> obter a modificaçáo <strong>da</strong> i<strong>de</strong>ia (1;t liroprie<strong>da</strong><strong>de</strong> nas mais atraza<strong>da</strong>s cere-<br />
brações indi~enas,<br />
incutindo-llii:-: fatalmente o instincto capitalisador indis-<br />
pensavel 8 mellioria do condicioiinlismo economico e social.<br />
Se em theoria to<strong>da</strong>s as nizUes confluem na <strong>de</strong>monstração tla <strong>de</strong>ver e<br />
necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> garantir a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena, na pratica coioiiial as dif-<br />
ficul<strong>da</strong><strong>de</strong>s que suscita o acatamento cl'essrt proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> são numerosas e,<br />
por vezes, custosamente superaveis. Duas hypotheses principaes se po<strong>de</strong>ni<br />
formular, em que se torna indispensavel <strong>de</strong>finir os limites physicos e juri-<br />
dicos <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> immobiliaria iridigenn directamente visa<strong>da</strong> : constitiii-<br />
ção do dominio do Estado ou terras do governo, e concessóes <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s<br />
extensões territoriaes a particulares ou a companhias No<br />
segundo caso, quasi to<strong>da</strong>s a': n;i($es coloniaei: obrigam os concessionarios,<br />
nos respectivos actos <strong>de</strong> coiicessáo, a garantirem aos indigenas, não s6 a<br />
proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> e usufriicto <strong>da</strong>a ,!erras que elles occupem e cultivem, como<br />
tambem os direitos <strong>de</strong> caça, pesca, corte <strong>de</strong> lenha, etc., que primitivamente<br />
lhes fossem reconhecidos pelos seus chefes.<br />
As clifficul<strong>da</strong><strong>de</strong>s que estorvam a constituição <strong>da</strong>s terras do governo,<br />
quando se preten<strong>de</strong>m evitar collisões com os direitos dos indigenas, e se<br />
<strong>de</strong>seja respeitar to<strong>da</strong> a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> legitimamente preexistente, consistem<br />
principalnicmte, como diz Giranlt: na maneira <strong>de</strong> interpretar o direito dos<br />
costumes infligenas referentes á occupaçFio do solo, e na <strong>de</strong>limitação precisa<br />
do dominio territorial. Dizer que as terras <strong>de</strong>soccupa<strong>da</strong>s são ~ro~rie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
do Estado ti fdcil, mas estaljelecer <strong>de</strong>finitivamente os limites dos terrenos<br />
vagos é qiiasi impossivel. Em muitas regióes o nomadiamo inveterado dos<br />
habitos indigenas faz variar a ca<strong>da</strong> passo a situação do tracto <strong>de</strong> terre$o<br />
momentanc.amente ciiltivado, mu<strong>da</strong>ndo, assim, constantemente os terrenos<br />
vagos. Por outro lado o indigena que, em geral, pouco apêgo <strong>de</strong>monstra<br />
pela proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> immobiliaria, abandonando sem difficul<strong>da</strong><strong>de</strong> a terra tem-<br />
porariamente occiipa<strong>da</strong>, B em regra muito aferrado & facul<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> usar li-<br />
vremente, em seu proveito, cios terrenos inciiltos que alimentam 0s seus<br />
rebanhos, <strong>da</strong> lenha <strong>da</strong>s florestas e tios fructos silvestres.<br />
N'este caso é <strong>de</strong>sliurnano e anti-politico privar os indigenas dles&s
direitos cu,ja legitimi<strong>da</strong><strong>de</strong> a tradição radicou nos seus espiritos, e, rliiando<br />
seja indis~ensavel a soa restricçg,~, <strong>de</strong>ve-se proce<strong>de</strong>r lentamente e com a<br />
maxima tolerancia e paciencia. Para obviar a estes in~onvenient~es po<strong>de</strong>m-se<br />
crear reservas territoriaes, on<strong>de</strong> os indigeiias ol,rigittoriament,e re2iidiim (I<br />
cuja exploraçao tigricola Ihes é reserva<strong>da</strong>, ou promover pelos meios siiusorios<br />
o seu acantonamento em al<strong>de</strong>ias indigenas, esparsas pela colonia, em<br />
torno <strong>da</strong>s qoaes se <strong>de</strong>marca uma periplieria territorial rasoavelmente bastante<br />
para a snbsistencia dos habit.tintcs, e cii,ja posse comrniirn fica attribui<strong>da</strong><br />
a ca<strong>da</strong> collectivi<strong>da</strong><strong>de</strong> inrligeria. O al<strong>de</strong>iamento dos indigenas que em<br />
tempos remotos foi a forma predilecta <strong>de</strong> coloniaaçáo 110s ,je~iiitas do Paraguay<br />
e do Hrazil, parece-nos <strong>de</strong>stinado a prodiizir resultados muito mais<br />
uteis Á civilieaçáo, do que os que proveem <strong>da</strong> instituiçzo dits reservas territoriaes,<br />
cios habitant,es ficam totalmente sabtraliitloa ao irifluxo lienefico<br />
do contagio civilisador (10 elemento colonisante.<br />
Quando náo existam reservas indigeiias, e náo seja praticamente rea-<br />
lisavel o acantonamento metliodico, pó<strong>de</strong> entretanto haver necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>finir clarameilte os limites do dorninio do Estado nos terrenos vagos,<br />
surgintlo assim a difficul<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> obter a <strong>de</strong>marcação precisa dos immoveis<br />
occiipaclos pelos indigenas.<br />
N'este caso, o11 se roced <strong>de</strong> indirectamente, marcando um <strong>de</strong>terminado<br />
prazo parti os indigenas interessados fazerem valer ou seus direitos, e tor-<br />
nando essa disposição, conheci<strong>da</strong> por intermedio <strong>da</strong>s anctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s adminis-<br />
trativas e dos chefes kndigenas, ou se recorre directamente <strong>de</strong>limitação<br />
e inventario d ~ s<br />
terre os vagos e, correlativamente, <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> immo-<br />
biliaria indigena. Es L ultimo processo, embora muito clispendioso, 6 O<br />
i~nico<br />
que na pratica dá resultados efficazes. A indifferença e a ignorancia<br />
dos intligenas não lhes <strong>de</strong>ixam vêr a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> e a vantagem <strong>de</strong> legali-<br />
sar it posse o11 o usufructo dos terrenos que occupam, e to<strong>da</strong>s as leis colo-<br />
niaes que teern procurado levar as popu1ac;úes intligenas mais atraza<strong>da</strong>s a<br />
garantir a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>, por intermedio <strong>de</strong> <strong>de</strong>claraçóes ou <strong>de</strong> registro vo-<br />
luntario, teem geralmente <strong>da</strong>do resultados insignificantes ou nullos.<br />
Nas colonias <strong>de</strong> populaç0es mais civilisa<strong>da</strong>s, a <strong>de</strong>limitaçao <strong>da</strong> pro-<br />
prie<strong>da</strong><strong>de</strong> B muito f.acilit.a<strong>da</strong>? e a garantia <strong>da</strong> sua posse, collectiva o11 indi-
346<br />
--<br />
POLITICA INDIGENA<br />
vidnal, está frequentemente assqgnra<strong>da</strong> por registro especial anterior á<br />
colonisação como, por exemplo, acontece no Annam.<br />
Reconhecido aos indigenas P direito <strong>de</strong> possuirem o solo, e <strong>de</strong>marca<strong>da</strong>s<br />
as zonas em que essa posse se exerce, o regimen a que <strong>de</strong>vem ficar<br />
sujeitas as temas que Ihes são <strong>de</strong>ixa<strong>da</strong>s, tem <strong>de</strong> ser necessariamente o<br />
mesmo que os costumes locaes, ou as leis tinham estabelecido na socie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
nativa antes <strong>da</strong> ingerencia dos doniinatlores. E' o procedimento mais viilgarmente<br />
seguido, c aquelle que os preceitos tolerantes <strong>da</strong> mo<strong>de</strong>rna politica<br />
colonial mais naturalmente impúem, para evitar pertrirbayóes politicas<br />
ou prejuizos economicos no seio <strong>da</strong>s collectivi<strong>da</strong><strong>de</strong>s indigenas.<br />
A proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena nBo <strong>de</strong>ve ser caracterisa<strong>da</strong>, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o inicio,<br />
pela posse plena e pelo direito completo ás transacçúes immobiliarias. Esses<br />
são os limites para qiie <strong>de</strong>ve ser orientado o seu progresso, mas raras<br />
vezes a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> total qiie indicam, correspon<strong>de</strong>ria a uma vantagem real,<br />
quer para OS naturaes, quer pnra a administraç5o <strong>da</strong> colonia, se essa liher<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
fosse prematuramente estabeleci<strong>da</strong> na socie<strong>da</strong><strong>de</strong> iniiigena nimiamente<br />
atraza<strong>da</strong> para a po<strong>de</strong>r comprchen<strong>de</strong>r e iitilisar.<br />
O Estado colonisador, cerceando aos indigenas o direito <strong>de</strong> transaccionarem<br />
com as proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>s cyjo usufructo Ihes reconhece, prociira impedir<br />
os abusos e a má f6 reriprocn dos compradores europeus e dos ven<strong>de</strong>dores<br />
indigenas, protegendo estes, ao mesmo tempo, contra a sua louca<br />
imprevi<strong>de</strong>ncia qiie, entre africanos, iria até no ponto do sacrificio dos terrenos<br />
indispensaveis h suhsistencia <strong>da</strong> familia oii <strong>da</strong> trihn, em troca d'iim<br />
garrafio d'aguar<strong>de</strong>nte, d'lim reale-jo <strong>de</strong>sconjnnctado, ou <strong>de</strong> algumas ja<strong>da</strong>s<br />
<strong>de</strong> vistoso algodáo riscado.<br />
Muitas vezes são os especnladores e aventureiros europeus que abnsam<br />
<strong>da</strong> ignclrancia dos indigenas, comprando-lhes por preços irrisorios<br />
extensas e rics:i* ár~as tcrritoriaes <strong>de</strong>stina<strong>da</strong>s á especiilaçáo que é tTio prejiidicial<br />
ROS interesses essenciaes <strong>da</strong> colonisa~r?~. O Estado projecta lima<br />
estrrt<strong>da</strong> o11 iiin caminho <strong>de</strong> ferro, e logo a especiilação busca por todos os<br />
meios apo<strong>de</strong>rar-se dos terrecos qne a via <strong>de</strong>ve cortar, obrigando o governo<br />
a por elevado preço as terras proposita<strong>da</strong>mente compra<strong>da</strong>s aos<br />
indigenag por uma ridicnlaria.
REGIMEN DA PROPRIEDADE 347<br />
-<br />
Outras vezes são estes que proce<strong>de</strong>m <strong>de</strong> iná f6 aproveitando as ciiI'-<br />
ferenças <strong>de</strong> lingua, <strong>de</strong> costumes e <strong>de</strong> leis, e enganando os compradores<br />
europeus que habitualmente ignoram os costumes locaes. O indigena ven<strong>de</strong><br />
proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> que náo p6<strong>de</strong> dispor, ou por não passar <strong>de</strong> mero co-pro-<br />
prietario, ou por ser apenas iisiif'riictiiario d'um solo ciija posse pertence á<br />
cammuni<strong>da</strong><strong>de</strong> ou ao Estado. N'estas circiimstancias, é forçoso que o go-<br />
verno <strong>da</strong> colonia possa proteger efficazniente os interesses dos colonos,<br />
tantas vezes iliiididos pela mEL fé dos naturaes.<br />
Bs restricçóes que, mais ou menos, to<strong>da</strong>s as legisiaçóes coloniaes<br />
estabelecem ao livre direito <strong>da</strong>s transacçóes inimobiliarias entre europeus<br />
e indigenas, encontra varios impiignadores entre os publicistas <strong>da</strong> escola<br />
liberal, que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m a theoria sobre a harmonia dos interesses, hoje inteiramente<br />
posta <strong>de</strong> parte, e que reclamam insistentemente a mais completa<br />
liber<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> transacçúes entre europeus e indigenas, o que, como accentiia<br />
o sr. di. Narnoco ('1, sc; pC<strong>de</strong> servir ao <strong>de</strong>senvolvimento do proletariado.<br />
Em geral, as diversas legislaçóes coloniaes n ~ o prollibem absolutamente<br />
essas transacçóes, limitandó-se a estabelecer, como condiçáo impre~cindirel<br />
para a vali<strong>da</strong><strong>de</strong> doa contractos, a annuencia e fiscalisaçHo <strong>da</strong>s auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
europeias. Contra as transacçóes entre indigsnas, as quaes :ifiectatn um<br />
caracter <strong>de</strong> interesse privado. e só po<strong>de</strong>m concorrer para o aperfeiçoamento<br />
economico <strong>da</strong> respectiva socie<strong>da</strong><strong>de</strong>, náo militam os argiimentos qiie fazem<br />
restringir a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> dos contractos entre iiidigenas e nno in~ligenas, e<br />
por isso são ellas livremente aiictorisa<strong>da</strong>s pelos governos coloniaes.<br />
Expostas assim rapi<strong>da</strong>mente as principaes normas <strong>de</strong> politicx indigena<br />
que <strong>de</strong>vem presidir ao estabelecimento do regimen <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />
procurando frequentemente fazê-la evoliicionar <strong>da</strong> f'6rma collectira 5 indivichial,<br />
e em qualquer caso, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o simples usiifriicto ou posse inalienitrel,<br />
até 6 plena posse juridica <strong>de</strong>scripta nos nossos codigos, vaino* agora occii-<br />
par-nos em estu<strong>da</strong>r especialmente, nas colonias mais import:~ntcs, a fdrma<br />
local <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena e o regimen legal a que os dominadoreu a<br />
siibnietteram.
India Ingleza<br />
Anteriormente A dominay~o ingleza o rcgimen <strong>da</strong> proI>rieditdc atravea.+oii<br />
na India differentes ~)liases. Sa origem, os Estados liindiis, geralmente<br />
peqnenoci, eram constitiiidos por um dominio central pertencente ao<br />
rqjah, ro<strong>de</strong>iiido <strong>de</strong> feiirlos territoriaes, e, sobre o po<strong>de</strong>r dos rajalis, existia<br />
n'alg~imas regióes o (10s irialiara,jabs suzeranos <strong>de</strong> varios Eutados. ,i conqiiista<br />
mongol ixnificoii os Estados n'um irnperio geral qiic ttttingiii o sei1<br />
maior graii dc esplendor <strong>de</strong>sdc o reinttdo <strong>de</strong> Akbiir Xagno no scculo xvr,<br />
até á epoclia 1,rilliantc <strong>de</strong> hiireng-Zeb. 1)oriinte a longa siicceas~o <strong>da</strong>s monarcliiai!<br />
hindus, c ain<strong>da</strong> cluriintc o periodo correspon(1ente & durac;to politica<br />
do irnperio fiintlarlo por Ti~rnerlZo, to<strong>da</strong>s as fontes Iiistoricas concor<strong>da</strong>m<br />
em <strong>de</strong>inonstrar a. existencia cla proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> priva<strong>da</strong> na India. O<br />
soberano nunca era o proprietario uiiico dos dorninioa territoriaes <strong>de</strong> ca<strong>da</strong><br />
Estado, mas possuia sempre o direito <strong>de</strong> cobrar lima parte do producto <strong>de</strong><br />
to<strong>da</strong>s as terras cultiva<strong>da</strong>s, c tlc tliupor <strong>de</strong> t,o<strong>da</strong>s au terras vagas, iitilisando-as<br />
para caçar e fazer ~:oric~eas6eu aos scos siil)ditos, OU <strong>de</strong>ixando-as abandona<strong>da</strong>s<br />
conforme a unica Ici <strong>da</strong> siitt vonta<strong>de</strong>. (')<br />
Com a que<strong>da</strong> do imperio mongol, ou melhor, com o seii successivo<br />
esphacellamento, os differentes Estado* cliie entáo se formaram, modificaram<br />
completamente o regiinen <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>, reivindicando para os soberanos,<br />
ncio só os direitos <strong>de</strong> s~izerania, mas tambem a posse immediata <strong>de</strong><br />
todo o solo. No meiatlo do sec~iio XVIII a transic;áo estava iiltima<strong>da</strong>, e todos<br />
os chefes <strong>de</strong> E3tatl0, rnusulmaiios o~i liindus, eratii reconliecidos como<br />
unicos proprictarios, tendo-se todos os <strong>de</strong>tentorea do solo, simples eultivadores<br />
acci<strong>de</strong>nt~ites, ou proprictario~ legitirnoa, convertiilo ein meroa ren<strong>de</strong>iros<br />
com direi1 o a occnpaçáo perrnanente e transmisstio hereditaria..<br />
() Ba<strong>de</strong>n-Po\vell - Z'lte L«tirl Syxtons of British I~ldilc.
REGIMEN DA PROPRIEDADE<br />
- - - -<br />
- -- --<br />
A unica excepçao existente <strong>da</strong>va-se quando o soberano, para recom-<br />
pensar os serviqos d'urn favorito, ou para. instituiçzo caridosa ou religiosal<br />
concedia territorios sobre os quaes abandonava todos os seus direitos, oii-<br />
thorgando-os aos cecsionarios. Este rcaimen é o que ain<strong>da</strong> hoje perdura<br />
em todos os 13staclos indigenas, mais oii rneno- :iiitoilomos, <strong>da</strong> India Tngleza.<br />
Como conseqnencia d'este systema, os ren<strong>de</strong>iro^., ou antes, os arren-<br />
<strong>da</strong>tario.. do rendimento agricola, e os seus agentes sub-commissionados, <strong>de</strong><br />
proprietarios transformaram-se em empregados do Estado, e n'nlgnmas<br />
regiúes os ciiltiv~dores<br />
hereditarios <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> communi<strong>da</strong><strong>de</strong> foram siibmetti-<br />
dos ao pagamento <strong>de</strong> taxas tão eleva<strong>da</strong>s, que a locação <strong>da</strong>s terras pouco<br />
oti na<strong>da</strong> rendia. Em militas locali<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> India, os funccionarios pnblicos<br />
e os arren<strong>da</strong>tarios (10% impostos consegiiiam reunir nas snas máos a pro-<br />
prie<strong>da</strong><strong>de</strong> qiiasi effectiva cie vastissiinas extensúcs territoriaes.<br />
Quando sobreveiii a administração inglezit, todos os direitos, regalias<br />
e dominios territoriaes, atd entao possuidos <strong>de</strong> facto pelos soberanos indi-<br />
genaq, passaram pela iaonquista ou pela lettra dos tratados para n posse<br />
do governo inglez. O governador geral lor(2 Cornwallis, reconlieccndo que<br />
attribuir ao Estado a posse universal do solo era medi<strong>da</strong> impolitica e abso-<br />
lutamente contraria As tlicorias europeias <strong>de</strong> progresso economico, resolveu<br />
e tlecretoii pelo celehre Pernmite/zt Settlernent of I3~1i.1ltcl <strong>de</strong> 1793, o reco-<br />
nl~ccirn~nto<br />
integral (1% proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> priva<strong>da</strong>.<br />
h administraqfio iiiqlcza occupon-se segni<strong>da</strong>mente em investigar e<br />
fixar, para ca<strong>da</strong> provincial a melhor fórma <strong>de</strong> garantir a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
priva<strong>da</strong>, e x personalidí~<strong>de</strong> moral com capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> juridica para po<strong>de</strong>r pos-<br />
suir o solo. Com este fim proce<strong>de</strong>u-se a um longo e cui<strong>da</strong>doso inquerito <strong>de</strong><br />
todos os factos e costumes respeitantes ao regimen <strong>de</strong> exploraçáo e posse<br />
<strong>da</strong>s terras em ca<strong>da</strong> rcgiáo, <strong>de</strong> maneira a aclarar perfeitamente todos os<br />
interesses e direitos respeitaveis.<br />
Este inquerito impunha-se egualmente pela necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> estabelecer<br />
<strong>de</strong>finitivamente quaes as enti<strong>da</strong><strong>de</strong>s que em ca<strong>da</strong> região se <strong>de</strong>viam tornar<br />
responsaveis pelo pagamento do imposto territorial que, ora se fazia incidir<br />
sobre a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>, ora sobre a importancia <strong>da</strong> ren<strong>da</strong>. O Zandhol<strong>de</strong>r -<br />
<strong>de</strong>tentor do solo - podia ser: ou o landlord, proprietario intermediario<br />
349
350 I'OLITICA INDIGENA<br />
-- .- --<br />
entre o Estado c os vertladciroa ciiltivaùores, ou commiini<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> al<strong>de</strong>ia,<br />
ou o simples ciiltivador isalitdo e in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> ren<strong>de</strong>irou intermedios.<br />
Nos referidos iiiqiieritos registavam-se todo3 os direitos c interesses rela-<br />
tivos ao solo, e fixava-se o iinposto fiindiario, que na Indid recebeu o nome<br />
<strong>de</strong> uLnnd Recenue Settlei~/e~at<br />
n, oii simplesmente c SettIoazr,lt I>. 0. funccio-<br />
narios enc.irregador tl'esses estudos e peequizas - Srttlrii/rrrt í!(fic~rs -<br />
redigiram rnagnificos e con~pleti.jsiinos relatorios - S~tt101)i~)lt<br />
Ii'e/io).t< -<br />
sobre o regimen <strong>da</strong> proprieila<strong>de</strong>, costiimes, naturesa tlo solo, prodiicqáo<br />
agricola c industrial, etc., constitnindo esses trabalhos uma <strong>da</strong>s mais segu-<br />
ras bases <strong>da</strong> legislaçiio indigena que o governo do iniperio anglo-indiano<br />
teni <strong>de</strong>cretailo. Càdn a Settlerne~lt Ikport )> 6 precedido d'iima pereqiiaçáo<br />
catlastral ilc toilas as terras e outros bens imnioveis ; nas al<strong>de</strong>ias cultiva<strong>da</strong>s<br />
a pereqi1aç;io ca<strong>da</strong>stra1 esten<strong>de</strong>-se a todos os campos agricultados ou incul-<br />
tos, c ;is gran<strong>de</strong>s cxtciisGes tcrritoriae-; incnltas e <strong>de</strong>spovoa<strong>da</strong>s foram ca<strong>da</strong>s-<br />
tra<strong>da</strong>s C I ~<br />
vastos lotes.<br />
Na regiEio <strong>de</strong> Rengala, a mais antiga <strong>da</strong>s provincias inglezas <strong>da</strong><br />
Inditi, cstiabeleceu a administraggo britnnnica pelo c Pc.r.~nu~terrt<br />
Settbnent~<br />
<strong>de</strong> li!)3 iirn verilaleiro regirnen <strong>de</strong> feu<strong>da</strong>lismo aqrario que tem sido muito<br />
impiiq~~ado.<br />
Para organirnr a l~rhprie<strong>da</strong>do particiilar foram reconhecidos<br />
legitinios 1,rol)rietario~ do solo, Z(!tr~)ti~itlnres,<br />
os arren<strong>da</strong>tarios do imposto<br />
agricolii e iilqiin~ meml~ros d:t nobresa que, no imperio mongol c nos Esta-<br />
dos qiic $C 1l1e segiiiram. i120 passavam <strong>de</strong> meros cobradores (10s impostos<br />
<strong>de</strong> que rrcca<strong>da</strong>vam lima parte, contribuindo com iiina certa quoti<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
para O E tiido. concess5o ilefinitiva <strong>da</strong> posse do solo foi oilthorga<strong>da</strong> me-<br />
9<br />
diantc n b11rigac;úo do pagaincnto do imposto territorial e <strong>de</strong> serem respei-<br />
tados os direitos dos qiie cnltirnvxm directamente a terra. O direito <strong>de</strong><br />
proprie~la~dc<br />
iissiin coni:editlo cornpreliendia tambem a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> ven<strong>da</strong>,<br />
cessco, transferc.ncia e liypotlieca, logo que a lei e os costumes musnlmanos<br />
oii hiniliis niio limitassem essas transacções.<br />
Em geral. os direitos dos camponezes indios cultivadores (10 solo não<br />
f;)ram respeitados, e ;i publicação <strong>da</strong> lei <strong>de</strong> 1793 seguiu-se iim periodo em<br />
que os iioi.o.s proprietarios abusaralm largamente dos seus recentes direi-<br />
tos, elevando ao exagero as ren<strong>da</strong>s <strong>da</strong>s proprie<strong>da</strong>ileq. 1)epoiq <strong>da</strong> revolta <strong>de</strong>
REGIMEN DA PROPRIEDADE<br />
---<br />
--<br />
36 1<br />
18.57, foi melhora<strong>da</strong> a situação dos cultivadores pela Laud Law <strong>de</strong> 1859,<br />
que os repartia em quatro classes, <strong>de</strong>termina<strong>da</strong>s pelo numero <strong>de</strong> annos <strong>de</strong>-<br />
corridos, <strong>de</strong> occupação e cultivo do solo. Aquelles ren<strong>de</strong>iros que ha 20 ou<br />
mais anrios occlipassem O solo, pessoalmente ou pelos seiis directos ascen-<br />
<strong>de</strong>nt,cs, constit,iiiam duas classes 6s qiiaes era garanti<strong>da</strong> a fixavão <strong>da</strong> ren<strong>da</strong>,<br />
que náo po<strong>de</strong>ria, em caso algum, vir a ser augmentads. 03 ren<strong>de</strong>iros, que<br />
o fowem ha mais <strong>de</strong> 12 e menos <strong>de</strong> 20 annos, formavam a terceira classe,<br />
cojas ren<strong>da</strong>s sG po<strong>de</strong>riam ser eleva<strong>da</strong>s em casos excepcionaes e com prece-<br />
tlt.ii,.i;l tlt. wcpgo judicial. Finalmente, a quarta classe era constitili<strong>da</strong> por<br />
tod:is as restantes cathegorias <strong>de</strong> ren<strong>de</strong>iros, a qirem a referi<strong>da</strong> lei não ga-<br />
rantia direito algum. Algum tempo <strong>de</strong>pois foram <strong>de</strong>creta<strong>da</strong>s novas medi<strong>da</strong>s,<br />
qae estendiam a consoli<strong>da</strong>ção <strong>da</strong>s ren<strong>da</strong>s e a protec$,o do governo, aos<br />
ren<strong>de</strong>iros que provassem ter, pelo menos, tres annos <strong>de</strong> occupaç~o effectiva<br />
no solo. .i dcsvaiitagem geral provoc,a<strong>da</strong> pela existencia dos proprietarios<br />
interirieclios n'ctste sy~t~ema <strong>de</strong> ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira administraçáo aristocratica e<br />
feilclal, levou o governo <strong>da</strong> India Ingleza a <strong>de</strong>cretar em varias locali<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
disposiçóes ten<strong>de</strong>nt,es a :i+Jegiirar e garantir 03 direitos dos possuidorescrr~tir.rrdores,<br />
raiyntes, tratando directamente com elles a irnpo3içLo e co-<br />
branya do imposto, sem interferencia <strong>de</strong> nenhum intermeciiario.<br />
Esta fórma <strong>da</strong> pqoprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena, embora geralmente sujeita a<br />
1<br />
uin c~erto numero <strong>de</strong> r stricçóes imposta3 pelas circumstãncias locaes, e<br />
poli(,,, diflerente <strong>da</strong> occ ação transmissivel por Iierança, mas inalienavel,<br />
rcprissenta, entretanto, 11m senaivel progre53o economico snbre 03 zaitrin-<br />
d('ies <strong>de</strong> Bengala, estal-ielcciclos em 17!);3, pela necessi<strong>da</strong>tlt. imperiosa <strong>de</strong><br />
olltt.r lima classe tribiitavel pouco numerosa que f.acilitt~ssc :i cohrsnça<br />
dos iml~ostus.<br />
Kou territorios <strong>de</strong> bIadrasta e Bombaim, segundo Ba<strong>de</strong>n Powell,<br />
a16iii (Ias ccmmuni<strong>da</strong><strong>de</strong>s dc al<strong>de</strong>ia qiie tambem existem, prevalece a pro-<br />
pie<strong>da</strong><strong>de</strong> rniyatt)nry, isto é, a occ~ipação do solo por locatarios do Estado<br />
qne pagam directaniei-ite os seus impostos, e são sensivelmente consi<strong>de</strong>ra-<br />
dos como proprietarios do solo que cultivam. A adininistraçgo ingleza pre-<br />
fere este systema <strong>de</strong> occupaç5o transmissirel e hereditaria, á posse plena<br />
propriamente dita, porque permitte estabelecer restricç~es que protejam
3 F2<br />
- --<br />
POLITICA INDIGENA<br />
-- - --<br />
os agricultores indios contra o flagello tla lisura, que geralii~er~te os arrniiia.<br />
Naturalmente imprevitlentes, os indios estáo sempre promptos a acceitar<br />
lettras garanti<strong>da</strong>s pelas siias terras, (liapen<strong>de</strong>ndo o dinheiro rapi<strong>da</strong>mente<br />
eni f~stas, C vendo-se afinal espoliados dos seus haveres immoveis, por não<br />
po<strong>de</strong>rem, A <strong>da</strong>ta do vencimento dos comproniissos, solver ;L su;t importanvia.<br />
I'or oiitro lado, nos matis arinos agricolas a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> dch viver e <strong>de</strong><br />
Il:lgiir o respectivo imposto, leva o indigena, a li-vpothecar as sn;w proprie-<br />
REGIMEN DA PROPIiIEDhDE<br />
.-<br />
- - . -<br />
3.53<br />
No Assam e na Birmania predomina tainbem a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> rciaes, p6tle ser coiicecli<strong>da</strong> nina lucaçáo periodicn por praso<br />
snpcrlor H urn atino.<br />
Finalniente, quando um districto, ou parte importante <strong>de</strong> districto,<br />
est:i .iiLinettido a uma cultura permanente, estabelece-se o reuenuc settlorze?it,<br />
as tt'rr;i-: ciiltirii<strong>da</strong>s s5o medi<strong>da</strong>s e regista<strong>da</strong>s, c a occupação torna-se per-<br />
maiit iitc.. Iicrcdit:iria, e transmissivel.<br />
S;t fiiriiiaiiia iiáo existem as communi<strong>da</strong><strong>de</strong>a <strong>de</strong> al<strong>de</strong>ia ta0 completas<br />
como no resto cfa India. Comtiido, encontram-se frequentemente agrnpa-<br />
mentos <strong>de</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>s rusticns individiiaes, on<strong>de</strong> as resi<strong>de</strong>nciau formam<br />
uma esprcie <strong>de</strong> al<strong>de</strong>ia, e que, nas regióes mais povoa<strong>da</strong>s, corncciairi a apre-<br />
sentar symptomas <strong>de</strong> administraçilo collectiva. Estaq aldricis náo ser-<br />
vem para uni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> di11h50 iinmohiliaria, c nito teem iitili<strong>da</strong>dc para a<br />
e]aboraç;io tio ca<strong>da</strong>stro. dc maneira qiie a :~dministraçáo ingleza estabele-<br />
ceu tlivihúes arbitrarias <strong>de</strong>noniina<strong>da</strong>s qurrty. Diversoa que919 constitiiem um<br />
circrilo administrado por iiin funccionario indigcna chamado thugyi, e iim<br />
agupaniento <strong>de</strong> circiilos f6rina o qiie se <strong>de</strong>nominou fo~onship, muito seme-<br />
lhante ás instituiyóes indian do thabvl e do tcrluká, que sáo administraçóes<br />
çommuns <strong>de</strong> territorios, inteiramente tlistinctas <strong>da</strong>s nossas miinicipali<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />
A Hirmania é, csoniu dissemos, uma regi50 ein qiie predomina a cul-<br />
tura t aicrte, - principalmente nas locali<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> cultura noma<strong>de</strong> chama<strong>da</strong><br />
hlcl,,,-yach - , náo admittindo a respectiva legislaçáo o direito absoluto <strong>de</strong><br />
proluiedii<strong>de</strong>, e limitando-se a reconliecer e garantir um direito ile occupa-<br />
$ 5 ~<br />
usiifructo permanente, hereditario, transferivel, e que importa o pagamcbnto<br />
d'um <strong>de</strong>terminado imposto fiintliario. E' uma situaçno absolutamente<br />
analoga ti dos raiytrfes <strong>da</strong> pro\~incia <strong>de</strong> Bombaim.<br />
P3
3.54 POLITICA INDIGENA<br />
- - - - -- - - -<br />
Nas pro\.incias tle i;or* tinliam direitos siizemiios. tic:iiic\o a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
iiii\iqc~ii.t s011 iiiri r.cgiirit:ii arialogo ao dou zrcrttit~11~~t.r~ tle Bengala.<br />
0s ciiit i\,iitloi.ct- '111t: t:ii~~I)c'i~i n'csta provincin virain os seiis direitos<br />
<strong>de</strong>sI)rczado.~. I. t;ir,ttil iil\.o (li*.; iiliiiores prepoteiiciau, só inellion~ram <strong>de</strong> siti1açFto<br />
eiri 1SSti. cuni a pruiiii11g:lc;áu d'iirna lei que estabeleceu a condição,<br />
<strong>da</strong> elevaçáo l~rogrw"Jiva <strong>da</strong>s ren<strong>da</strong>s r(; se po<strong>de</strong>r fazer <strong>de</strong> 'i em 7 annos, e<br />
assegtiroii nos rctntlciros que 1)wgnin reg~ilarrriente as soas ren<strong>da</strong>s o direito<br />
a occli[)art.iil irit1t:fitiitlitinentc ;li tctrriis qiie agriciiitain.
Indias Orientaes Neerlan<strong>de</strong>zas<br />
do passo que na ~ndia a administrauáo ingleza procurou frequentemente<br />
garantir a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> priva<strong>da</strong> intiividual, o que! como vimos, nEio tem<br />
<strong>da</strong>do praticameiite resultados muito satisfactorios, nas colonias hollan<strong>de</strong>zas<br />
do Oriente, proce<strong>de</strong>u-se por f6rmit bem diversa. A hiutoria <strong>da</strong> administraçko<br />
<strong>da</strong> Companhia <strong>da</strong>s Indias Orientaes mostra-nos que a industria agricola<br />
particular raramente era tolera<strong>da</strong>, estalido sujeita a restricções que tolhiam<br />
o seu progresso. 0s indigenas cultivavam o solo, cuja proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> era<br />
apanagio exclusivo <strong>da</strong> Coiiipanhia. Esta arreca<strong>da</strong>va sempre o grosso do<br />
rendimento agricola cobrado por interrnedio dos chefes indigenas, )eyentes,<br />
com quem prkvitimente se celel~ravam contractos especiaes .< ~icte~z van Der-<br />
I)c~ittl», e os qiiaes, a seu turno, obtiilliain os productos agricolas, por meio<br />
dos pesados impostvs (le traballio applicados aos seus siibditos. Durante a<br />
epoclia <strong>da</strong> tlomina(;Zo inglezu, <strong>de</strong> 1812 a IHlG, o governador Stnmford<br />
Baffles introduziu reformas importantes .no regimeii <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> e do<br />
tral.)allio indigeiiii, prociir,tndo individ~ialisar aquella, e suavisar as exageradissimau<br />
iinposições <strong>de</strong> traballio. Nandxndo proce<strong>de</strong>r a iim inquerito<br />
summario nas I~orst~itlrtu/lt()1, o11 priiicipa(lo13 autonotnou tle Soraltarta e<br />
Djolrjokarta, reconli~i~cii iliie a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s terras pertencia unicamente<br />
aos respectivos sol)eraiioa. I+:rn harmonia com este principio, RsfHes <strong>de</strong>cretoli<br />
'[tie ;I 1)IIifi: :r"li~~u/ttc, do solo ficava l)ertencenclo ao Estado inglez, sendo,<br />
porcin, rcconliecirloa ;tos intligenas certos (lireitos <strong>de</strong> occupaçáo e <strong>de</strong> pro-<br />
pri:.tla<strong>de</strong> nas terriis que arroteassem e ciiltivauàern. Segilnclo se pou<strong>de</strong> cle-<br />
prelieri<strong>de</strong>r do inquerito citatlo, os indigenit* que satisfizessem os seiis impostos<br />
eni generos agricolas e (:i11 trabalho, eriiin peloli costumes locaes consi<strong>de</strong>ra-<br />
dos tacitameiite, legitimas <strong>de</strong>tentores do solo. Assim, tendo ~assndo<br />
ao<br />
dorninio directo <strong>da</strong> naçáo colonisadora gran<strong>de</strong> parte do territorio <strong>de</strong> Java,<br />
Raffles <strong>de</strong>cidiu que os indigenas cultivadores e <strong>de</strong>tentores do solo, fossein<br />
*
356 POLITICA INDIGENA<br />
- - - - ---<br />
isentos <strong>de</strong> trabalho obrigatorio, pagando annualmente urna taxa especial,<br />
lnntl-r~r~t, que não era bem um simples in~posto, mas antes o preço <strong>da</strong> 10-<br />
c,~p;lo <strong>da</strong>s terras do Estado. Esta ren<strong>da</strong>, que Raffles <strong>de</strong>terminara fosse<br />
paga, tanto quanto possivel, em dinheiro, passou niais tar<strong>de</strong> a ser cobra<strong>da</strong><br />
excliisivamente em genero*, (. constitiie :~ctiialment~ rim imposto egual 4<br />
quinta parte <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> colheita.<br />
As acerta<strong>da</strong>s reformas <strong>de</strong> Raffles, ou ficarani 1t.ttra morta, ou foram<br />
clefcituosamente applica<strong>da</strong>s.<br />
Quando a Hollan<strong>da</strong> retomou posse <strong>da</strong>s Indias Orientaes, foi alli envia<strong>da</strong><br />
uma comniis40 composta <strong>de</strong> tres commissarios geraeh, Elont, Biiys-<br />
Ices e Tan <strong>de</strong>r Capellen, para procp<strong>de</strong>r ;i reorganisaçáo <strong>de</strong> todos os serviços.<br />
Surgindo <strong>de</strong>sintelligençiah cbntrc. tb-tr. iiinccionarios, visto o programma<br />
liberal cie Eloiit exigir uma 1cgislac;Eo <strong>de</strong> fomento á industria agricola<br />
priva<strong>da</strong> incligena e náo indigenu, e estas i<strong>de</strong>ias repugnarem absolutamente<br />
ás tendcncias centralisadoras <strong>de</strong> Van <strong>de</strong>r Capellen que reclamava, para o<br />
rei dos Paizes Baixos, o exclusivo <strong>da</strong> posse e exploruçxo do solo colonial,<br />
foi dissolvi<strong>da</strong> aqilella commiesáo, ficando governador geral Van dcr Capellen.<br />
Ante9 <strong>de</strong> <strong>de</strong>screver a evoliiç5o legal por cliic teiri p:i.*iitlo o regimen<br />
<strong>da</strong> propriecla<strong>de</strong> indigena, na ultim;~ ~hase 11~ aclininistracno necrlan<strong>de</strong>za, é<br />
interessante analysar a natureza <strong>da</strong> occ*upa$o indigena do solo, que é<br />
variavel nas (li ferentes rcgiõcb~ cle .lava.<br />
Nos paizes <strong>de</strong> It~str e owtr predomina a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> individual e<br />
heredjtaria, que ca<strong>da</strong> cultivador explortt, <strong>de</strong>ntro <strong>da</strong>s restricçóes impostas<br />
pelos costumes locaez ou pela legisla+o Iiollan<strong>de</strong>za. Nas provincias do<br />
centro, a extensa0 tle terrenos occiiptidos pela pronriecla<strong>de</strong> individual,<br />
representa apenas cerca tle 34 (I/,, <strong>da</strong> superficie territoria1 ~ttribiii<strong>da</strong> ti proprie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
coinmunal, predominando, portanto, a poshc collectiva do solo.<br />
Nas communicia<strong>de</strong>s <strong>de</strong> al<strong>de</strong>ia, as habitaçóes e os perliicnou terrenos circum-<br />
,jacentes são proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> individual, e os arrosizes pertencem & al<strong>de</strong>ia ou<br />
<strong>de</strong>sa que os
REGIMEN DA PROPRIEDADE<br />
--- . - - --<br />
terrenos incultos são consi<strong>de</strong>rados proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> collectiva <strong>da</strong> <strong>de</strong>sn, mas ca<strong>da</strong><br />
habitante tem direito a litilisa-10s individualmente, para pastos, corte <strong>de</strong><br />
lenha, etc.<br />
Egualrnente, o direito <strong>de</strong> <strong>de</strong>sbravar e arrotear estes terrenos pertence<br />
aos habitantes <strong>da</strong> tlesn, que d'esse modo se po<strong>de</strong>m tornar proprietarios<br />
individnaes.<br />
O direito dos costumes locaes, tcdnt, limita e restringe to<strong>da</strong>s as trans-<br />
acçúes immobiliarias sobre :i proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> individual ou collectiva, impe-<br />
dindo geralmente a ven<strong>da</strong> <strong>da</strong>s terras, ou cessiio <strong>de</strong> quaesquer direitos terri-<br />
toriaes, a indivicluos estranhos á <strong>de</strong>sa. O udnt diligenceia obter que c solo<br />
não se,ja ventlido oii arren<strong>da</strong>do a pessoas incapazes <strong>de</strong> prover ao seu cui-<br />
tivo e (IP satisfhzer, tanto os impostos propriamente ditos, como as presta-<br />
çúe. dt, tral)allio.<br />
Para <strong>da</strong>r uma noçgo clara <strong>da</strong> indole <strong>da</strong> legislaçáo neerlan<strong>de</strong>za rela-<br />
tiva á indigena, é conveniente bosquejar rapi<strong>da</strong>mente os travos<br />
essenciaes (Ia politic:~ territorial segui<strong>da</strong> nas Indias Orientaes, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o<br />
governo centralisador <strong>de</strong> Vàn <strong>de</strong>r Ciipellen, até 6 lei liberal <strong>de</strong> 9 <strong>de</strong> abril<br />
<strong>de</strong> 1870 - Sfllntoblnd 8." .Li-, <strong>de</strong>vi<strong>da</strong> á iniciativa Iiabil do ministro <strong>da</strong>s<br />
colonias Iliaal. 1<br />
Em accordo com RS suas i<strong>de</strong>ias, o governador Van <strong>de</strong>r Capellen sus-<br />
to,,. durante o seu goveriio, o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>da</strong> industria agricola pri-<br />
v;I,!;I. I)epois <strong>da</strong> sua <strong>de</strong>missáo em 1826, e tendo as contas <strong>da</strong> sua adminis-<br />
tra~$~<br />
fechado com <strong>de</strong>ficit sensivel, foi enviado a Java, como commissario<br />
geral, Bus <strong>de</strong> Gissignies. a quem encarregaram <strong>de</strong> estu<strong>da</strong>r in loco os regi-<br />
mens territoriaes preconisados por Van <strong>de</strong>r Capellen e por Eloiit, e que<br />
terainou os seus trabalho3 por uma calorosa apologia d'este ultimo systema.<br />
Bpezar dYestas i<strong>de</strong>ias serem ao mesmo tempo <strong>de</strong>fendi<strong>da</strong>s na metropole<br />
perante o rei, pelo proprio Elout entáo ministro <strong>da</strong>s colonias, longe <strong>de</strong><br />
"irem a ter realisaçao pratica, foram completamente postas <strong>de</strong> parte pelo<br />
novo geral celebre Van <strong>de</strong>n Bosch que introdiiriii em Jnva o<br />
Ktlltllr S!jrt~ln. Este spstema tornou o Estado monopolisador <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a<br />
producçáo agricola <strong>da</strong> colonia, e introduziu o regimen <strong>da</strong>s cultiiras força<strong>da</strong>s<br />
dos generos <strong>de</strong> exportaçáo mais procurados pelo commercio geral.<br />
357
358 POLITICA INDIGENA<br />
-<br />
Ao ~rincipio, Van <strong>de</strong>r Capellen esforçou-se por fabricar ao inonopolio<br />
uma capa <strong>de</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong>, sustentando que apenas se tratava <strong>de</strong> contractos<br />
commerciaes, livremente celebrados entre os indigenas e os fiinccionarios<br />
do Estado. Não tardou, porém, muito tempo, que os productos agricolas<br />
passassem a ser iinicamente obtidos pelo trabalho forçado dos indigenas,<br />
compellidos a introduzir as noras culturas, que mais convinliam ao mohil<br />
ganancioso <strong>da</strong> administ.raçáo hollan<strong>de</strong>za.<br />
O Iít~lft~r ~Systevz fiinccionon at6 1860, esmagando a iniciativa priraclii,<br />
e explorando intensivamente a riqueza agricola <strong>de</strong> Java por conta do thesouro<br />
rnetropolitano que arrecadou rendimentos fabulosos. Em 1837 o governador<br />
geral Eerens promiilgou medi<strong>da</strong>s <strong>de</strong> timi<strong>da</strong> protecção A proprie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
particular, as quaes, xliAs, náo tardttram cin merecer a rcprovaçRo do<br />
governo <strong>da</strong> metropole. Atc'. 1856 subsistiu intacto o regimen inaiignrado<br />
por Van <strong>de</strong>n Bosch, e, n'e~se aiino, em resultado <strong>da</strong> campanha movi<strong>da</strong> pelo<br />
partido liberal, o governador geral 1)iiyinaer van Twist repoz em \ '1 'g or as<br />
leis <strong>de</strong>creta<strong>da</strong>s por Eereris, e na metropole promiilgoii-sc o 5Vantsblnr/ c1e 3<br />
<strong>de</strong> julho <strong>de</strong> 185(i, qiie concedia aos particiilares a facul<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> arreiiclar<br />
terras vaga3, por um periodo nTio superior a vinte annos.<br />
Esta medi<strong>da</strong> náo satisfez a indnstriit priva<strong>da</strong> que. liictando com gran<strong>de</strong>s<br />
difficiil<strong>da</strong><strong>de</strong>s para <strong>de</strong>sbravar os terrenos, preferia po<strong>de</strong>r apropriar-se<br />
por um processo qualqiier tlas terras occupa<strong>da</strong>s pelos indigenas, on<strong>de</strong> se<br />
<strong>de</strong>sejava ensaiar c~llt~uras mais rendosas do que o arroz que, até então,<br />
era a producqáo qiiasi cxcliisiva d'aquellcs terrenos. Para esse fim, como<br />
aos indigenas nunca foi permittido, n'ttquellüs colonias, ven<strong>de</strong>r ou alugar<br />
as terras aos niio indigc~ii:i~; os colonos hollan<strong>de</strong>zes celebravam coiitractos,<br />
em que os cnltivadores jilvanexrs se olrigavam a empregar as snas terras<br />
.em <strong>de</strong>termiriiill;is ciiltilras. e a entregar as colheitas, mediante o pagamento<br />
d'nma quanti8a <strong>de</strong>termina<strong>da</strong>. Estas convençóes <strong>da</strong>vam origem a duas cathegorias<br />
<strong>de</strong> abusos.<br />
Em primeiro logar, os europeus iiWo tinham maneira <strong>de</strong> se <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r<br />
contra a má fé dos indigenas, per<strong>de</strong>ndo muitas vezes a totali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s importancias<br />
adianta<strong>da</strong>s para promover a cultura, e podcndo apenas recorrer a<br />
uma accáo <strong>de</strong> per<strong>da</strong>s e <strong>da</strong>mnos, <strong>de</strong> osito mais do que duviJoso. Em segiindo
logar, os colonos hollan<strong>de</strong>zes, justamente para evitar es-+eu inconveiiicntes<br />
contractavam com os chefes indigenas que coml,elliam pela violencia os<br />
seiis siibditos oii administrados, áq ciiltnras coinl~ina<strong>da</strong>u e ti entrega <strong>da</strong>s<br />
colheitas.<br />
O StncitsÒl(itl, <strong>de</strong> 7 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> ltJ(i:j, para evitar esta especie d e<br />
abusos, proliibin os contractos collectivos, só reconhecendo r;ilicI:i<strong>de</strong> A s<br />
convençUes celebra<strong>da</strong>s directamente com os ciilti\.aclores do solo.<br />
Alguns annos mais tar<strong>de</strong>. o miniqtro Yan <strong>de</strong> Piitte propoz-se resolve r<br />
a questão immobiliaria indigena, e aci~nisição <strong>de</strong> terras pelos hollan<strong>de</strong>zes,<br />
n'um primoroso prcjecto <strong>de</strong> lei que uma cabala parlamentar náo <strong>de</strong>ixo ii<br />
vingar. Por esse diploma, as terras vagas eram empliyteuticn<strong>da</strong>s aos colonos<br />
até um prazo maximo <strong>de</strong> 99 annos, e a poqse territorial indigena,<br />
regi<strong>da</strong> por um direito consuetiidinario <strong>de</strong>masiaclamerite vago e elastico, era<br />
substitiiicla por um regimen <strong>de</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> individual. sujeito apenas á<br />
restricção, <strong>de</strong> nenhum direito <strong>de</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> po<strong>de</strong>r ser alienado em favor<br />
dos não indigenas. As commiini<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong>s tlescis podiam transformar o seu<br />
systerna <strong>de</strong> posse collectira em proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> individiial, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que a maioria<br />
dos seus membros o copsentisse. Os indigenas tinham a f,iciiltla<strong>de</strong> <strong>de</strong> alugar<br />
as suas terras oii o seu trabalho aos náo incligenao, teml)orariamentc, e por<br />
contracto escripto.<br />
Poiico tempo <strong>de</strong>poi., outro projecto <strong>de</strong> iniciativa do injniatro Frukra-<br />
nen, relativo emphyteiire doa terrenos vagos, sossobrou tamhem no parla-<br />
mento hollanclez.<br />
Finalmente, em 1870, a Agrnrische IVetf, proposta pelo ministro I\'aal,<br />
foi vota<strong>da</strong> pelos Estados Geraes e ~rornulga<strong>da</strong><br />
em $1 <strong>de</strong> abril cl'csse mesmo<br />
anno. Essa lei trata e regulamenta a locaçáo e empliyteuse <strong>da</strong>s terras<br />
vagas, e fixa o direito immobiliario dos indigenas. O direito dos indigeiias<br />
sobre o solo -- posse indivic11i:il i111 cotnmiinal - Q expressamente assegurado<br />
e protegido por esta lei, contra os abuso.; e ingerencia illegal, quer dc Es-<br />
tado, quer dos colonos. O governo apenas ~o<strong>de</strong>rá<br />
dispor <strong>da</strong>s terras indige-<br />
nas, no que respeite As ciiltiiras forç:iclas qiie ain<strong>da</strong> siibristam do systema<br />
Van <strong>de</strong>n Boscli, e que hoje praticamente se resumem aos caft!zncs, ou<br />
ain<strong>da</strong> quando tenha <strong>de</strong> expropriar por utili<strong>da</strong><strong>de</strong> publica, pagando n'este
360 I'OLITICA IXDIQENA<br />
caso as in<strong>de</strong>mnisaçóes fixa<strong>da</strong>s. Além ci'isso, a lei confere ao indigena a<br />
facul<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> transformar o iiaiifr~icto do solo em ngr,lriscl~,~ P ~ ~ P I ~ ~ o11 O ~ I Z ,<br />
proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> agrarin, que diR~re (li+ posse plena consi<strong>de</strong>ra<strong>da</strong> pelo codigo<br />
civil, em que o proprietario agrario niio pódc ven<strong>de</strong>r os sen.; campos oii<br />
onerá-los com direitos reaes, em beneficio dos núo indigenas. O direito <strong>de</strong><br />
hypotheca 6 reconliecido, mas o governo procurou garantir os interesses<br />
dos natnraes, cxigindo a iiitervençfio previa <strong>da</strong>s aiictori<strong>da</strong><strong>de</strong>s jiidiciarias<br />
na celebração dos contractos. Se tis ven<strong>da</strong>s oii cessúes territoriaes aos não<br />
indigenas são <strong>de</strong>fezas, o direito <strong>de</strong> arren<strong>da</strong>mento <strong>da</strong>s proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>s era <strong>de</strong><br />
começo completamente livrc, tendo sido <strong>de</strong>pois regulamentado e limitado,<br />
pelos Stacctubla<strong>de</strong>n <strong>de</strong> 30 <strong>de</strong> ontiibro <strong>de</strong> 1871 e <strong>de</strong> 26 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 189.7.<br />
A lei agraria foi amplia<strong>da</strong>, modifica<strong>da</strong> e interpreta<strong>da</strong> pelo3 Stuírtsblarlen <strong>de</strong><br />
20 cle julho <strong>de</strong> 1870, 16 dc abril rle 1572 e 22 dc setembro <strong>de</strong> lS97, todos<br />
actualmente ain<strong>da</strong> cni vigor. Em nenhum d'estes diplomas se inserem claasulas<br />
<strong>de</strong>terminativas ou proliibitivas <strong>da</strong> trnnsforma~ão <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> communa1<br />
<strong>da</strong>s <strong>de</strong>sas em posse iiitlividnal, <strong>de</strong>ixando-se esqa evolnçRo apenas<br />
<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte d;~ propria iniciativa (10s indigenas.<br />
Effectivamente, alguns casos houve <strong>de</strong> transforinação, mas, em geral,<br />
os novos proprictarios arre~~entliam-se (lepressa, e voltavani ao regimen <strong>da</strong><br />
posse collectiva. A coiiversáo do typo <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> trazia gran<strong>de</strong>s difficul<strong>da</strong><strong>de</strong>s,<br />
porque todos o-; (lireitor e <strong>de</strong>veres dos indigenas, incluin(1o as<br />
prestaçúes <strong>de</strong> trabalho, se baseavam na proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> commiinal, originando<br />
a nova or<strong>de</strong>m <strong>de</strong> coisa.: uma sitlia~&o clubia e difficil, que a ninguem convinha.<br />
Esta siti~aç&o ain<strong>da</strong> hoje permanece, sem que o governo hollan<strong>de</strong>z<br />
tenlia julgado conveniente adoptar as medi<strong>da</strong>s necessarias para promover<br />
o progresso <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indivirl~ial indigena, á custa do <strong>de</strong>smenilíra-<br />
mento <strong>da</strong>s <strong>de</strong>sas.<br />
O a<strong>da</strong>t perrnitte nos iniligenas tornarem-se proprictarios individiiaec<br />
e hereditarios dos terrenos inciiltos que <strong>de</strong>sbravem, mas, a propria varia-<br />
ção dos costumes locaes, faz com que esta posse iiiriividual seja, umas vezes<br />
<strong>de</strong>finitiva, e outras vezes apenas temporaria, passando <strong>de</strong>pois os terrenos<br />
a fazer parte do dominio commiinal. Claro está que, n'este ultimo caso, o<br />
I
REGIilliCX DA PROPRIEDXIJE<br />
- -<br />
cultivador scí se preocciipa em ganhar muito em pouco tempo, estragando<br />
o solo para fi~tiiras exploraçUcs. Para evitar este inconveniente, o governo<br />
prescreveu certas regras especiaes para o <strong>de</strong>ubravamento e arroteamento<br />
do solo, qiie, sendo cumpri<strong>da</strong>s, conferem ao cultivador o direito h occupação<br />
<strong>de</strong>finitiva e individual d'esses terrenos.<br />
Como se vê, to<strong>da</strong> a legislação hollan<strong>de</strong>za obe<strong>de</strong>ceii sempre ao criterio<br />
<strong>de</strong> assegurar 6 proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> uma protecção efficaz, contra qualqiicr especie<br />
<strong>de</strong> espoliaqáo territorial, por parte <strong>de</strong> europeus ou orientaeh riáo indigcriiis,<br />
po<strong>de</strong>ndo considcrar-se, realmente mo<strong>de</strong>lares. as garantias qiie appoiam o,<br />
interesses dos proprietkirios indigenas.<br />
A tiitela. poiico liberal a que esta, su,jrita a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena, visa<br />
principalmente & sua consoli<strong>da</strong>çáo, <strong>de</strong>ntro <strong>da</strong>s normas mais apropria<strong>da</strong>s ao<br />
estado tle adiantamento social e economico <strong>da</strong> popiilaçao nativa.<br />
Argelia<br />
X'e-;ta colonia, a administraçáo franceza que carecia <strong>de</strong> terras livres<br />
para a colonisaçáo eiiropeia, revelou semprc Lima ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira mania <strong>de</strong> in-<br />
diviíliittlisar a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena, e <strong>de</strong>cretou numerosas leis sobre o<br />
regimen <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>, que scí teem <strong>da</strong>do resultados <strong>de</strong>sastrosos, e pro-<br />
vocado a inconcebivel confusão em que, ain<strong>da</strong> lioje, alli se <strong>de</strong>batem os dif-<br />
ferenteu typos <strong>de</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>, systemas <strong>de</strong> registro e garantias <strong>de</strong> posse.<br />
Se a fi;rma por que os fraricezeu teem respeitado e feito progredir os regi-<br />
mens immobiliarios <strong>da</strong> Tiinisia e <strong>da</strong> Indo-Cliina náo attestasse claramente<br />
a siia habili<strong>da</strong><strong>de</strong> colonial, a serie <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconcIiavos Iegislados para a Argelia<br />
provaria a sua, absoluta incapaci<strong>da</strong><strong>de</strong> parti administrar colonias.<br />
Prodiicto natural <strong>da</strong> tlieoria [ia assimilação systematica que, tão<br />
<strong>de</strong>sacerta<strong>da</strong>mente, tem influido na administraçáo argelina, as leis immobi-<br />
liarias <strong>da</strong> Argelia nem sequer teem o merito <strong>da</strong> conseqiiencia. Tergiver-
362 I'OLITICA INDIGENA<br />
-<br />
santes, variaveis, contradictorias, reflectem-se n'ellas as minimas fliictuaçúes<br />
<strong>da</strong> opiniáo publica metropolitana em materia <strong>de</strong> colonisaçáo.<br />
Quando os francezes conquistaram a Argelia, nas regiúes kabylas<br />
predominava quasi unicamente a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> individual, e nas regiúes<br />
arabes distinguiam-se os seguintes typos <strong>de</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> : terras do Estado<br />
(JLI Õlrrd e1 Urylik; terras dos particulares oii bl(td e1 Melk; bens commiinaes<br />
o11 blad e1 1)jemmaia; fun<strong>da</strong>çóes piedosas ou blad e1 Hablts. Esta ultima<br />
fórma <strong>de</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> musulmana consiste em doaçúes immobiliarias feitas<br />
a mesquitas, As ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s santas <strong>de</strong> Mecca e Medina, ou a algum estabeleci-<br />
mento <strong>de</strong> utili<strong>da</strong><strong>de</strong> publica. O doador conserva in<strong>de</strong>fini<strong>da</strong>mente o usufructo<br />
dos bens doados, e pó<strong>de</strong> legar esse usufructo a qiicrn queira, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte-<br />
mente <strong>da</strong> lei koranica, a cujas regras <strong>de</strong> successão os hnbus estão siibtra-<br />
liidos.<br />
Além <strong>da</strong> pose pura, exiatiam e ain<strong>da</strong> ho,je existem certos direitos<br />
especiaes sobre os immoveis.<br />
A clz~ff~rici<br />
é um direito cle preempção que attribiie ao proprietario<br />
indiviso <strong>de</strong> iim immovel, a f'aciilcla<strong>de</strong> <strong>de</strong> preferencia para beneficio <strong>da</strong> acqiii-<br />
siçáo feita por um estranho d'iima fracçáo dii co-proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>. I1.renici, B O<br />
direito <strong>de</strong> resgatar, <strong>de</strong>ntro d'um certo praso, o immovel vendido, mediante<br />
o reembolso do pre(;o principal e <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as <strong>de</strong>spezas siipplementnres cla<br />
acquisiçáo. R(rIlciuia, que B semelliante 6, antichrese, é Lima convenw5.o pela<br />
qual um <strong>de</strong>vedor proprietario d'nrn immorel confere ao seu credor o pleno<br />
usufriicto <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> até :i liqiiidnçáo <strong>da</strong> divi<strong>da</strong>.<br />
Franclí Chaiiveau, n'um relatorio apresentado ao Instituto Colonial<br />
Internacional, refere-se nos seguintes termos ás dificul<strong>da</strong><strong>de</strong>s que os fran-<br />
cezes encontrpni eni <strong>de</strong>strinçar e regularisar :i existencia confusa <strong>da</strong>s di-<br />
versas mo<strong>da</strong>li~latles <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> arabp:<br />
Pó<strong>de</strong> imaginar-se a amalgama informe d'estes multiplos direitos<br />
n'um paie on<strong>de</strong> não havia registros, cartas topographicas, archivos, ca<strong>da</strong>s-<br />
tros, estado civil, e nem sequer existiam documentos authenticos e muitas<br />
vezes convençúes escriptas; on<strong>de</strong> havia ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iras fabricas <strong>de</strong> falsificacão<br />
<strong>de</strong> titnlos <strong>de</strong> prnprie<strong>da</strong><strong>de</strong> e on<strong>de</strong> quaesquer direitos podiam ser constata-<br />
dos. simplesmente por notorie<strong>da</strong><strong>de</strong> oii por prova testemunlial. Mas ain<strong>da</strong>
Rbc+I;\lEY D-4 PROPRIEDADE<br />
- - - - - - -- -<br />
não era tudo. O arabe, como se sabe, é essencialmente noina<strong>de</strong>; não se<br />
pren<strong>de</strong> ao solo como o camponez francez oii Iíaljyla; pe<strong>de</strong>-llie alimentos<br />
para si e para os seus, mas mu<strong>da</strong> <strong>de</strong> boa runta<strong>de</strong> <strong>de</strong> estancia e <strong>de</strong> campo,<br />
não nutrindo pelo seu canto <strong>de</strong> terra esse sentimento exclusivo e ciiimento<br />
que lhe tornaria odioso partilliar com oiitrem os trabalhos do cultivo e os<br />
proveitos <strong>da</strong> colheita. 1)'este modo, na maior parte dos casos, permanece<br />
na indivisgo limitando-se a fazer partilhas temporarias e provisorias que<br />
ae modificam á vonta<strong>de</strong>, segundo a conreniencia <strong>da</strong>s cultiiras. Pó<strong>de</strong> ima-<br />
ginar-se que confusão extraordinaria não produziria um tal estado <strong>de</strong> coi-<br />
sas. no momento em que a conqiiista fazia affluir para o solo argelino os<br />
especiiladores e os colonos avidos <strong>de</strong> possuirem a terra, e que obstaculos<br />
d'alii resiiltavaili para a transmissão regular <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> e consequen-<br />
temente <strong>da</strong> colonisaçáo. O adqiiirente europeu comprava ás cegas, attrahido<br />
pela barateza, sem saber o que fazia, sem garantia e sem titiilo serio; o<br />
indie;ena rendia cum o seu clesprendimento <strong>de</strong> creanca gran<strong>de</strong>, feliz por<br />
receber algum dinheiro, sen, muitas vezes lhe importar se o que alienava<br />
lhe pertencia realmente, se teria o direito e a <strong>de</strong> o entregar,<br />
e dizendo, sem dnri<strong>da</strong>, <strong>de</strong> si para si, qiie no dia seguinte tiido remediaria<br />
expulsando-no* (Ias terras (1'Africa ». Pela conquista franceza, to<strong>da</strong>s as pro-<br />
prie<strong>da</strong><strong>de</strong>s do I~ltrtl e1 Hrylil, e <strong>da</strong>s ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> Medina e IvIecca passaram<br />
á posse c10 Estado francez.<br />
Em 1833 comecoti a ser ilecretadd tinia vasta 1egislac;Ro que seria<br />
fastidioso enunciar e que principalmente procurava regiilariaar os titiilos<br />
<strong>de</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>, e limitar rt agiotagem e a eupeculaçáo immobiliaria que<br />
causava graves transtornos. A or<strong>de</strong>nança <strong>de</strong> 1 <strong>de</strong> ontiibro tle 1844 regii-<br />
lamentou todos os direitos immol)iliarios, consolido~i as vent1:i-i dos l~trbzrs,<br />
validou to<strong>da</strong>s as ven<strong>da</strong>s effectiiaclas anteriormente, <strong>de</strong>creto11 :i app1icac;Zo<br />
stricta do codigo civil francez a todiis as ven<strong>da</strong>s futuras, estalieleceii a cx-<br />
3 (i :3<br />
propriaçáo por utili<strong>da</strong><strong>de</strong> publica, esclareceu a competencia <strong>da</strong>s jiirisdicqóes<br />
jndiciaes em materia civil, e creou um imposto cle 5 francos por Iiectare<br />
<strong>de</strong> terreno inculto. A or<strong>de</strong>nança <strong>de</strong> 21 <strong>de</strong> julho <strong>de</strong> 1846 tentou elaborar<br />
uma especie <strong>de</strong> ca<strong>da</strong>stro rudimentar, <strong>de</strong>terminando que todos os prr: rie-<br />
tarios tanto europeus como indigenas nos terriiorios <strong>de</strong> colonisaçáo. com-
parecessem perante as respectivas aiictoridtt(1es administrativas para se<br />
proce<strong>de</strong>r A verificaçáo dos titiilos <strong>de</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>. Em 19-13 interrompeu-se<br />
diiri~nte algum tempo a applicnç50 pratica d'cstas or<strong>de</strong>nanças que foram<br />
<strong>de</strong>pois amplia<strong>da</strong>s pela lei <strong>de</strong> 1851, >L qual <strong>de</strong>cidiu que as transacçóes<br />
immol)iliarias entre miisulmanos continriasseni a ser regi<strong>da</strong>s pela lei musiilniana,<br />
r: to<strong>da</strong>s as restantes pelo codigo civil. Esta lei reconhecia todos<br />
os direitos <strong>de</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> ou usiifriicto inilividual e collectivo, ate então<br />
mantidos e regulamentados, c <strong>de</strong>terminava que iienlium direito <strong>de</strong> proprie<strong>da</strong>rle<br />
oii usnfrixcto relativo ao solo do territorio <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> tribii po<strong>de</strong>ria ser<br />
aliciiado oni proveito <strong>de</strong> pessoas estranhas á tribii, reservando-se ao Estado<br />
francrz a faciil<strong>da</strong><strong>de</strong> cie adquirir esse direito.<br />
E' <strong>da</strong> tlíita <strong>da</strong> :ipplic:içáo (l'estii lei que part9 a distincçZo subtil e<br />
artificial entre as terriis wch, que se siippôein constitiiir proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> ou<br />
antes usiifraçto collectivo <strong>da</strong>s trihiis. c as terra3 rncll,., qiie eáo proprie<strong>da</strong>dy<br />
privativa tle iim:i iinicil ~~cs$o:r, oii proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indivisa <strong>de</strong> tima ou varias1<br />
familias. Est;i distincc;Ho, Iiojc faniiliar aos administradores tla Argelin, náo<br />
se encontra, hegiintlo diz Chiinveaii, nem nos juristas nem nos t,itulos musulmanos.<br />
Estes consi<strong>de</strong>ravam a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> collectiva tlas tribus, simples<br />
blad el melk cujos co.proprietarios eram muito rniiis numerouos e com menos<br />
direitos; terra co.ch era c:oiaa que ellea náo conheciam. drclr significa<br />
tribii e como as tribus náo eram 1x10 direito musulinaiio uni<strong>da</strong><strong>de</strong>s civis ou<br />
pessoas moraes, pó<strong>de</strong> dizer-se qiie a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> tribii náo tinha existencia<br />
juridica.<br />
A seguir B lei <strong>de</strong> 1851 qu8, estabelecendo o direito ciniiiente do Es-<br />
tado subi.e as terras rr~clr,<br />
reconhecia apenas ás tribus u direito <strong>de</strong> iisufru-<br />
cto e occupac;go ternporariit,
--<br />
REGIMEN DA PROPRIEDSDE<br />
- - -- -- - -<br />
nisaçáo. Em 1863 foram postas <strong>de</strong> parte as operaqóes <strong>de</strong> acantonamento e<br />
comcçaram a ser a.pplica<strong>da</strong>s as disposiçúes do celebre senatiis-consulto <strong>de</strong><br />
22 <strong>de</strong> abril d'esse anno, que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1830 xtd 1897 representa a unica tentativa<br />
intelligente e bem iiitencioiiad:i <strong>de</strong> regnliirisar e normalisar a situa<strong>da</strong><br />
proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena. Esta lei referia-ec apenas aos territorios yuiJ<br />
as t.ril)~is occiipavam collectivamente, isto S, ás terras arc18, e preparava<br />
habilmente a transiçito suave para o regirnen <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> individual,<br />
conce<strong>de</strong>ntlo 6s tribus a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> efectiva dos terrenos que occiipav;im,<br />
<strong>de</strong>terminando que fosse dividi<strong>da</strong> a terra pelos adnares, com excepçgo cl'uma<br />
p:trt,e reserva<strong>da</strong> H ~OLSC ~~mmlinitl, e regulnmeiitaiido mesmo o estabt?lecimento<br />
gradual <strong>da</strong> proprietla(1e intlivid~ial nos xduares on<strong>de</strong> essa medi<strong>da</strong><br />
fosse consi<strong>de</strong>r:id:i faciL e opportuna. 0 senatus-cuiihiilto i.e\.oguii a interdicçáo<br />
<strong>da</strong> ven<strong>da</strong> ou cessao territoria1 a pessoa extranlia á tribii, e <strong>de</strong>clarou<br />
que os propriet:irios indivi<strong>da</strong>aes em que se subdividissem os adnares, só po<strong>de</strong>ssem<br />
transmitt,ir livremente as suas proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>^, <strong>de</strong>pois d'cstas ficarem<br />
<strong>de</strong>finitivamente legalisx<strong>da</strong>s com titiilos <strong>de</strong> posse e registro predial. O regulainento<br />
que interpretou e amplioii o senatus-consulto prescrevia o estabelecimento<br />
d'ama matriz pretlixl para o trrritorio <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> aduar, e regulava<br />
todo o rklo(ll~,s vfitr~irrlt/i tli~ tlelimit,a\:iio (, inercaçno tias proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>s, <strong>da</strong> (livisão<br />
eiri lotes, (. t~iiitltt a f(írma (lu ]>i.(JCehSo civil nos .julgamentos, contes-<br />
taçóeu, etc.<br />
Esta Ici veio (liir urna Itit~e scgiira á'occupaqáo do solo pelos iiidigenas,<br />
estabclt.rcndo dirc?itos <strong>de</strong> [)rol)rit~d;t<strong>de</strong> perfeitamente garantidos. .k revolta<br />
<strong>de</strong> 1SiO-'71 i~& termo execiiç5o do sciiatus-coiisiilto. Em 1871 fez-se<br />
a, confiscaç~o geral <strong>de</strong> to<strong>da</strong> ;I territorial dos rcbcl<strong>de</strong>s em fiivor<br />
cla colonisaçáo, mas esse accresciino <strong>da</strong> area colonisavel aintla mais aguçou<br />
o appetite aos colonos fraricezes, cu,jas successivas exigencias e insistente<br />
campanha levaram o governo a <strong>de</strong>cretar a lei <strong>de</strong> 26 <strong>de</strong> julho <strong>de</strong> 1873 que<br />
foi o mais nefasto dos erros em qiie a administraçáo d'aquella colonia tem<br />
sido podiga. As teiitlencias apparentes d'csta lei eram a assimilaçáo <strong>da</strong><br />
proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> argelina á 1)roprie<strong>da</strong><strong>de</strong> franceza, e a constituiy30 immediata <strong>da</strong><br />
proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> individual, mas o seu objectivo essencial foi fornecer :i colonisa-<br />
çáo a maior extensáo possivel <strong>de</strong> terras indigenas.<br />
366
366 POLITICA IKDIGENA<br />
Os meios empregados furam, principalmente, o alargamento <strong>da</strong> area<br />
colonisavel h custa tlo dorriiiiio tio Estado, a applicação (\a legislação francezii,<br />
a to<strong>da</strong>s as transac\:6lis iinmobiliarias, e a constitiiiçáo <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
inrlividnal.<br />
Qrinnto li tr:insformaçKo clki posse collectiva em proprie<strong>da</strong>tle intlividual,<br />
6 sempre piirn clese,j:ir que se ct€ectiic: vist,o qiic o regimen indi\~idiixl facilita<br />
enormemente as tran~xcçóc~: i~ttralie o capital e estimula melhor o esforco<br />
valorisador <strong>de</strong> cliiein a poasna e explore. Entret,anto esta mii<strong>da</strong>nça <strong>de</strong> regimen<br />
<strong>de</strong>ve necessariamente realisnr-se por evoluç5o mnito lenta e progressiva,<br />
ciija acceleracTo artificial p6ile att! frequentemente ser contraprodiicente.<br />
0.3 argelinos, em qiiein iirnii hcredit:irii:ilii<strong>de</strong> spciilar comniunicoii o habito<br />
<strong>de</strong> se agriipsrem em fiimilias 1)ilt-a ciiltirar e explorar o solo, nRo podiam<br />
por forma :~lgum~, <strong>de</strong> iim moinento parti o o~it~ro, iilercS d'iima simples disposiqko<br />
1egis.lativ:i. adoptar irniiiediatamente o typo <strong>de</strong> posse intlivi(liia1 qne<br />
lhes era imposto. Para que os arapes pu<strong>de</strong>ssem comprelit~nilcr. tL soiil)c.ssem<br />
tirar partiil,) (10 regimen <strong>de</strong> propkieila<strong>de</strong> inilivi(liia1, atieiçoanilo-se a essa<br />
nova fórmn (li, pmsnir o solo. crit itidispeiis:i\~t~l rdiica-10s préviamente<br />
n'iima trnnsiq8o griidii;il qiie ilevcria oi.,,iil~;ir (liiil.: oii t,rcs gernçóes. Assim,<br />
sliccet\e em geral que, quando o cpi)irni.i.s~ii~~~,-~,~i~,~/~t~,~~~.<br />
(fiinccionario encarrcg:i(lo<br />
<strong>de</strong> fiz~~r n re;,artiq?to, ciidnstro e regiqtro tloi lotes indivictiiaes <strong>de</strong><br />
c:itla adrinr) tt1rmin;i o-: st:iiq tr;ili:illion c retira, os iiidigenxn <strong>de</strong>ixam siibsistir<br />
x iniliri-ao. continn:inilo a explorar o solo c. a c:el~hrar contrnctos<br />
iniiiiohilin rio. i~oll~rtivi~meiite. E' conseqiiencia iiatoral 1111 t~+tabelcciment.o<br />
1)rernntiiro i171iina legislapso ficticik que n&o correspo~iile nem nos costumes<br />
loc~es ricain :i- tr:idi(;óes dos povo?!<br />
-2 lei (1,. 1SÍ3 ciistoii ciirii n to<strong>da</strong> a gent,r, ao governo francex que<br />
tliaIli:ll<strong>de</strong>u :!ti: 1X!fO i~iiatorzt: iiiilliõi:~ -:le francos coin os siirvit;os qae<br />
clla dcteriniii:~. prevenclo se ~tinilii iiriia <strong>de</strong>speza provavcl <strong>de</strong> (i0 inilhóes <strong>de</strong><br />
franco3 coiii 04 triiballios ;L reiili<strong>da</strong>r ate ao meiatlo do seciiln actual, para<br />
po<strong>de</strong>r conc:Iiiir :i (livisao cla proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>, o ca<strong>da</strong>stro e o reçistro creados<br />
pelo seiixtii~-::oiic;iiIto e pela lei ile 1873; aos indigenae porque, apesar <strong>da</strong><br />
simplificaçgo introduzi<strong>da</strong> no processo civil, o artiqo (10 codigo civil que<br />
exige n licitiiyáo sempre que o immovcl ngo possa ser commo<strong>da</strong>mente par-
tilhado pelos seus proprietarios, continuava em vigor, subsistindo a praga<br />
<strong>da</strong>s licitaçfies e acçóes judiciaes que arruinavam completameilte os indiqenas.<br />
A divisgo <strong>da</strong>s terras dos aduares <strong>da</strong>va, em regra, pessimos resnltados,<br />
<strong>de</strong>striiindo a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena e creando uma legizo cle proletarios.<br />
As vezes, os lotes individuaes eram tão minusciilos que sc podiam consi<strong>de</strong>rar<br />
<strong>de</strong> valor real niillo. Outras vezes, o governo, consi<strong>de</strong>rando impossii-e1<br />
essa divisgo, promovia a ven<strong>da</strong> global <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indivisa, e repartia o<br />
prodricto <strong>da</strong> transacção pelos indigenas, qiie vinham a receher quasi sempre<br />
iima qiiantia insignificante que, <strong>de</strong> maneira alguma, os compensava <strong>da</strong><br />
per<strong>da</strong> do territorio qiie compartilhavam. Uma <strong>da</strong>s disposicóea legaes mais<br />
iniqiias <strong>da</strong> lei <strong>de</strong> 197.3 era a que estabelecia a licitação obrigatoria <strong>da</strong> proprietl~i
368 POLITICA INDIUENA<br />
-- - - - - - - - - - -<br />
nino, est;.ibelecc,u um registo <strong>de</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> semelhante ao do Acto <strong>de</strong><br />
Torrens, (lite veio siiiiplificar bastante to(1os o.: \c.rvi(:os, e representa a pri-<br />
meira garantia séria dos clireitos indigenacz.<br />
A <strong>de</strong>limita~áo 1n:ircaváo <strong>da</strong>s terras náo é feita <strong>de</strong> inotii 1)roprio pela<br />
administracKo que sO procetle a esee serviço em accordo caoni xs r*eqiiisiçóes<br />
f<br />
que os prop ietaric~s lhe fizerem.<br />
A ve4cl;i em leilão (Ia proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> collectiva, para pagamento do<br />
credor d'iim' co-proprietario, é proliibi<strong>da</strong> por esta lei que dt~termina que<br />
esse pagamento seja fibito com o lote pertencente 80 <strong>de</strong>vedor, quando seja<br />
possivel effertuar a liartilha individual, oii i~iie, no caso contrario, se faça<br />
a repartiçRn tlas terras por f:iniilias, ficando us mcmbros <strong>da</strong> fiimilia do<br />
<strong>de</strong>vedor com :L faciil<strong>da</strong>tle tle ac.c~t.itar a licitaqso sobre o seu lote, oii 3ntis-<br />
fazer pecunfitriamente H importancia <strong>da</strong> divi<strong>da</strong>. Esta lei que constitiie um<br />
grantle progresso, nao protege corntiido airi<strong>da</strong> efficazmente a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
indigena contra a mk ft': dos especuladores europeus.<br />
Em 28 <strong>de</strong> ,junlio cle 1898 foi nomea<strong>da</strong> iiina commiss2o er1c:arrega<strong>da</strong><br />
<strong>de</strong> estu<strong>da</strong>r ;L fdrrria <strong>de</strong> evitar us inconvenientes resultaritcs <strong>da</strong> facili<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>masia<strong>da</strong> coin que os indigenas po<strong>de</strong>m alienar as suas terras, (I) pois at6<br />
a propria ;ttlrninistraçiio local se <strong>de</strong>ixou impressionar pelos tlesrtstrosoe<br />
effeitos prodiizidos na economiit geral (Ia popola(~~lo indigena pclo regimen<br />
<strong>de</strong> alienaçzo territorial, rigo sti livre e faciiltativa, como at8 por vezes for-<br />
ca<strong>da</strong>. A politica indigena tlio ~iif~liz qrie ;i Fran~a tciri scgiiido ria Srgelia<br />
6 a consec~ilt~iicia natiirtil <strong>de</strong> clii;isi to<strong>da</strong> a legisl;iyHo se <strong>de</strong>ver ;i iniciativa<br />
dos represcritantcs electivos dos colonos, que apenas teeni tido cBm mira<br />
(lefen<strong>de</strong>r o:: iiitercssc5 d'esteq. Paul Reinsch accentiia esta meqma. opinião<br />
nos seguintcx- termos : c< -1 politica territorial argelina mostra o perigo que<br />
ha em contiiir os interesses dos jndigenas aos representantes politicos do8<br />
colonos europeus. O <strong>de</strong>srespeito cumpleto pelas institnições indigenas ; O<br />
E ri,, crer que os trabalhos e propostas d'essa cominissão estejam actiial-<br />
(I)<br />
riiente con~er.ii,los em regolamentos locaes ci1,ja existencia não tii'errios, 11i3rf:i11,<br />
ineio <strong>de</strong> averirliar.
REGIMEN DA PROPRIEDADE<br />
<strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> accclerar os processos <strong>de</strong> <strong>de</strong>sapossnr os indigenas <strong>da</strong>s terras pa-<br />
trimoniaes ; a severi<strong>da</strong><strong>de</strong> com que se reforçaram as disposiçóes <strong>da</strong> lei con:<br />
trarias aos indigenas, e com que se procedia á execução judicial <strong>da</strong>s suas<br />
terras, most,ram que os interesses indigenas carecem <strong>de</strong> permanente e vi-<br />
gilante protecçáo por parte <strong>da</strong> administração D .<br />
Palavras perfeitamente justas. A administração d'aquella colonia<br />
precisa, entretanto, tambem <strong>de</strong> promover a promulgaçáo <strong>de</strong> niedi<strong>da</strong>s que<br />
vão, pouco a pouco, apropriando ao meio e aos costumes locaes, a mistura<br />
informe <strong>de</strong> 1egislac;ão franceza e argelina que actualmente rege o regimen<br />
<strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
O systema Torrens, embora muito modificado e <strong>de</strong>svirtiiado, que a<br />
lei <strong>de</strong> 1897 introduziu, já tem <strong>da</strong>do os melhores resultados praticos, e E<br />
<strong>de</strong> presumir que, se se adoptarem disposiçóes ten<strong>de</strong>ntes a difficultar bas-<br />
tante as ven<strong>da</strong>s immobiliarias entre indigenas e europeus, a situação eco-<br />
noiriica <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena accuse uma melhoria sensivel.<br />
Tunisia<br />
A pon<strong>de</strong>ra<strong>da</strong> e intelligente politica indigena adopta<strong>da</strong> pela adminis-<br />
traçiio do protectorado francez na Tunisia, tem manifestamente exercido<br />
uma influencia salutar no progresso e consoli<strong>da</strong>ção do regimen <strong>da</strong> proprie-<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong>. Na Tixnisia o direito eminente, kharadj, do soberano sobre o solo,.<br />
existe apenas sobre as terras mortas, ou sobre os bens confiscados. Terras<br />
~nortns são aqnellas <strong>de</strong> que nenhuma utili<strong>da</strong><strong>de</strong> se tira; po<strong>de</strong>m ser conce-<br />
di<strong>da</strong>s aos particulares pelo Bey, ou apropria<strong>da</strong>s directamente pelos indi-<br />
gerias que as <strong>de</strong>sbravem e arroteiem. As raças que successivainente<br />
dominaram na Tunisia pela conqiiista arabe do seculo VI, pela invaraão<br />
hillaliana do seciilo x, e pela conquista turca do seculo xv1, conservaram<br />
sempre o dominio privado absoliltamente livre <strong>de</strong> qiiaesquer direibs emi-<br />
nente> ou siizeranos. Ern to<strong>da</strong> a area do protectorado é raro enoan#aRF<br />
L<br />
X4<br />
369
370 POLITICA INDIGENA<br />
vestigios <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> collectiva dos aduares, tal oomo ella existe na<br />
Argelia.<br />
A proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena na Tunisia reparte-se em dois typos : pro-<br />
prie<strong>da</strong><strong>de</strong> musulmana priva<strong>da</strong> ou melk; e habus publicos ou privados. A<br />
proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> melk, quasi i<strong>de</strong>ntica á que <strong>de</strong>screvemos para a Argelia, é a<br />
posse plena e franca do solo, apenas sujeita ao Zekkat ou imposto kora-<br />
nico que quando inci<strong>de</strong> sobre os fructos recebe o nome <strong>de</strong> Achzbr. Os<br />
direitos reaes <strong>de</strong> chtfaia, tsenia, e rahanin ou rcthn, correspon<strong>de</strong>m tambem<br />
na Tunisia a <strong>de</strong>termina<strong>da</strong>s situaçóes juridicas dos immoveis previstas e<br />
regula<strong>da</strong>s pelo Alkoráo, e são <strong>de</strong> todo o ponto equivalentes aos que in-<br />
dicamos para a Argelia. A instituição dos habzts remonta ás eras primiti-<br />
vas do Islam.<br />
As maximas koranicas prescrevendo a cari<strong>da</strong><strong>de</strong> aos fieis <strong>de</strong>ram origem<br />
a estas instituiqóes piedosas, doaçóes feitas a Deus ou a obras <strong>de</strong> benefi-<br />
cencia, que nunca mais po<strong>de</strong>m ser <strong>da</strong><strong>da</strong>s, vendi<strong>da</strong>s, hypotheca<strong>da</strong>s, ou her-<br />
<strong>da</strong><strong>da</strong>s segundo os ritos musulmanos. Um dos versiculos do Alkorão qu~<br />
ain<strong>da</strong> hoje t? a formula consagra<strong>da</strong> que necessariamente se insere em todos<br />
os contractos respeitantes a bens habus, diz: < . . . . o hnbu é eterno, sa-<br />
grado e perpetuo; não po<strong>de</strong>rcí eer vendido, <strong>da</strong>do ou her<strong>da</strong>do até ao dia ena<br />
que Deus her<strong>da</strong>r a terra. Deus d o melhor dos her<strong>de</strong>iros. - . . .<br />
Des<strong>de</strong> o primeiro secnlo <strong>da</strong> hegira que os habus se multiplicaram em<br />
todos os paizes musulmanos, mas na Tunisia a gran<strong>de</strong> sriperficie dos habtls<br />
publicos e privados é <strong>de</strong> origem muito mais recente, tendo-se a instituição<br />
<strong>de</strong>senvolvido em larga escalla durante a primeira phase <strong>da</strong> dominação<br />
turca, pelo empenho e interesse que os indigenas manifestaram em subtrahir<br />
os seus haveres aos abusos e espoliaçóes dos conquistadores, submettendo-os<br />
a um regimen sagrado para todo o bom mnsi~lmano. O habu é privado<br />
quando o seu fun<strong>da</strong>dor lega o usufructo do immovel aos setis <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>nte$<br />
<strong>de</strong>signando no acto <strong>da</strong> fun<strong>da</strong>ção a obra pia ou <strong>de</strong> assistencia que <strong>de</strong>ve b 4<br />
neficiar <strong>da</strong> <strong>de</strong>voluç~o, quando a <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ncia se extinga. IIabus publicos,<br />
ou s8o as fun<strong>da</strong>çúes feitas directamente a favor <strong>de</strong> obras religiosas e <strong>de</strong><br />
interesse geral, ou as que, primitivamente priva<strong>da</strong>s, passam a <strong>de</strong>volutario<br />
publico por extincçáo dos her<strong>de</strong>iros directos. Os hnbus eram administrados
REGIMEN DA PROPRIEDADE 371<br />
-<br />
até 1874 por tlkiles, fiinccionarios a quem competia a manutenção e geren-<br />
cia <strong>da</strong>s fun<strong>da</strong>ções, arreca<strong>da</strong>ndo annualmente, como retribuição pelos seus<br />
serviços, o exce<strong>de</strong>nte <strong>da</strong>s receitas sobre as <strong>de</strong>spezas que incumbiam a. ca<strong>da</strong><br />
fun<strong>da</strong>ção.<br />
O estado <strong>de</strong> <strong>de</strong>sorganisac;ão dos serviços <strong>da</strong> instituição era geral, os<br />
zckiles tratavam apenas <strong>de</strong> reduzir to<strong>da</strong>s as <strong>de</strong>spezas para augmentar<br />
os seus lucros, e a fiscalisa~iio doa abusos era pfaticamentc impossivcl. Em<br />
1874 o general Kheredine centriilison a gerencia <strong>de</strong> todos os hnbus pablicos<br />
nas mãos d'uma commissão central, Uje~nn~aia, com s4<strong>de</strong> em Tunis, a<br />
qual fiscalisava a administração dos ukiles por intermedio <strong>de</strong> agentes especiaes<br />
<strong>de</strong>nominados ~zaibes. Os bens, <strong>de</strong> cuja gestáo está encarrega<strong>da</strong> a<br />
Dje~nvzaia, consistem em predios urbanos e r~i3tic03, e em olivaes e palmares.<br />
Os rendimentos dos hablru proveem principalmente <strong>da</strong>s locações, do<br />
e~bzel e <strong>da</strong> ven<strong>da</strong> dos fructos. Em geral aliigain-se apenas os edifieios e os<br />
terrenos não plantados <strong>de</strong> arvores, visto a legislação tiinisina náo permittir<br />
a locação <strong>da</strong>s arvores cuja prodncção é vendi<strong>da</strong>.<br />
O enzel, tolerado uni~ament~e pelo rito malekita, consiste na occupaçáo<br />
e posse dos iinmoveis mediante o pagamento <strong>de</strong> uma ren<strong>da</strong> perpetua e<br />
fixa que, em regra, nos terrenos annualmente fornecidos pela Jjjernmnia á<br />
colonisaçáo europeia. tem variado entre dois a <strong>de</strong>z francos por hectare.<br />
0s que adquirem immoveis n'estas condições, enzeliutas, po<strong>de</strong>m dispor<br />
dl~lles á vonta<strong>de</strong>, comtanto que paguem sempre e ininterruptamente a ren<strong>da</strong><br />
prefixa<strong>da</strong>.<br />
Os hnbus, tanto piiblicos como privados, só po<strong>de</strong>m ser adquiridos pelo<br />
elzael cm hasta publica precedi<strong>da</strong> <strong>de</strong> bastante p~iblici<strong>da</strong><strong>de</strong>. A lei musul-<br />
mana proliibe a sua ven<strong>da</strong>, mas consente a troca por outro immovel <strong>de</strong><br />
idcntico valor, segundo um processo legal bastante complicado e vagaroso.<br />
Nr. <strong>de</strong> Dianoiis, n'um excellente trabalho apresentado ao Congresso Colo-<br />
nial <strong>de</strong> Marselha <strong>de</strong> 1'308, escreve : (< Eu sei perfeitamente que o proprio<br />
fiintlamento dos Iznbr~s 6 g~ralrnentc milito criticado em certos meios ouro-<br />
1,ciis. N5o <strong>de</strong>ixa pois <strong>de</strong> scr interessante fazer aqui sobresahir a differença<br />
qrie existe, sob o ponto <strong>de</strong> vista ei?onomico, entre os bens habtts e aqiielles<br />
que em Franp se chamavam bens dc ináo morta. Assacava-se a estes<br />
*
372 . POLITICA INDIGENA<br />
ultimos o estarem completamente retirados <strong>da</strong> circnlação, diminuindo o do-<br />
minio nacional e os rendimentos do Estado. Ora esta censura não po<strong>de</strong><br />
applicar-se aos bens habzis, atten<strong>de</strong>ndo que elles são objecto <strong>de</strong> numerosas<br />
transacçúes: enzel, irocas, locaçúes, qiie favorecem o commercio e aprovei-<br />
tam ao thesonro publico. Por outro lado estes bens estão sujeitos a todos<br />
os impostos <strong>de</strong> direito commum pela mesma forma que as proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
particulares. k pois injusto assimila-los aos bens <strong>de</strong> mão morta. Se agora<br />
consi<strong>de</strong>rarmos o assumpto d'esta exposição, sob o ponto <strong>de</strong> vista dos interesses<br />
moraes que a naçáo protectora se comprometteu a salvaguar<strong>da</strong>r na<br />
Tunisia, chegaremos sem custo a concluir que a administraçáo franceza<br />
tem a obrigação stricta <strong>de</strong> respeitar uma instituição quc, aos olhos dos<br />
indigenas, é uma <strong>da</strong>s bases fun<strong>da</strong>mentaes <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> musulmantt » .<br />
Para a colonisação franceza teem, com effeito, os bens dos hnbus<br />
adquiridos pelo enzel ou por trocas, contribuido importantemente. Des<strong>de</strong> o<br />
<strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 13 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1898 estabelecendo que a I)je?)z»rcticl <strong>de</strong>ve<br />
fornecer annualmente á Direcçso <strong>de</strong> Agricultura <strong>de</strong> T~inis uma superficie<br />
<strong>de</strong> habus publicos não inferior a 2:000 hectares, em troca pecuniaria segundo<br />
o rito hanefita, para ser distribui<strong>da</strong> exclusivamente por colonos francezes,<br />
a ~roprie<strong>da</strong><strong>de</strong> habu tem passado em larga escalla para as mãos d'estes<br />
ultimos. Ora os indigenas, ciija industria e commercio estão em plena <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncia,<br />
e que encontravam na agricultura um ultimo refugio, estão vendo<br />
successivamente transit,ar á posse <strong>de</strong> estrangeiros os melhores terrenos do<br />
paiz, e como não po<strong>de</strong>m adquirir terras do dominio do Estado, nem tão<br />
pouco as dos habus piiblicos, appoiam-se no seu ultimo baluarte, os habus<br />
privados, que ain<strong>da</strong> hoje constituem uma parte importante do territorio<br />
tunisino.<br />
O <strong>de</strong>creto beylical <strong>de</strong> 22 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 1905, que obriga os enzelis-<br />
tas a acceitar o resgate <strong>da</strong> ven<strong>da</strong> perpetua pela entrega, por uma s6 vez,<br />
<strong>de</strong> uma quantia proporciona<strong>da</strong> á ren<strong>da</strong>, ain<strong>da</strong> mais reluctancia creou entre<br />
os indigenas em ce<strong>de</strong>rem as suas proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>s segundo o systema enzel. O<br />
governo do protectorado <strong>de</strong>via respeitar religiosamente este refugio <strong>da</strong><br />
proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena, não promovendo mais facili<strong>da</strong><strong>de</strong>s para as transac-<br />
çúes sobre os habns privados, sem primeiramente ter procedido a uma per-
REGIMEN DA PROPRIEDADE 373<br />
.- -<br />
feita organisaqão do credito e <strong>da</strong> instrucção profissional dos naturaes, <strong>de</strong><br />
fórma a permittir-llies a competencia com os colonos europeus nas industrias<br />
e na agricultura. Além d'isso, é tambem necessario que seja concedido<br />
aos indigenas o direito <strong>de</strong> concorrerem, em egual<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> circumstancias<br />
com os europeus, á compra <strong>da</strong>s terras para colonisação, postas B<br />
ven<strong>da</strong> pelo Estado. A situavão actual 6 iniqua e excepcional. Des<strong>de</strong> que se<br />
proce<strong>de</strong>sse á pr6via educaqão agricola dos indigenas, a agricultura e a riqiieza<br />
<strong>da</strong> colonia nacla teriam a per<strong>de</strong>r com o novo incremento <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
rustica indigena, e evitar-se-liia por outro lado a fermentação sur<strong>da</strong><br />
<strong>de</strong> futuras discordias.<br />
Existindo no interior <strong>da</strong> Regencia <strong>de</strong> Tunis alguns casos isolados <strong>de</strong><br />
proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> collectiva <strong>de</strong> tribus ou fracç6es <strong>de</strong> tribus, o <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 14 <strong>de</strong><br />
janeiro <strong>de</strong> 1901, regularisou a existencia d'essa proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> man<strong>da</strong>ndo<br />
proce<strong>de</strong>r á sua <strong>de</strong>lim~~ação, <strong>de</strong>clarando-a inalienavel,, e reconhecendo s6mente<br />
aos seus actuaes <strong>de</strong>tentores o usufructo <strong>da</strong>s terras occupa<strong>da</strong>s.<br />
Até 1881 a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> iinmobiliaria tunisina, tanto melk como habu,<br />
era regi<strong>da</strong> pelo direito musiilmano, e to<strong>da</strong>s as contestaçóes que lhe dissessem<br />
respeito eram <strong>da</strong> competencia dos tribunaes religiosos <strong>de</strong> Chara. As<br />
~'roprie<strong>da</strong><strong>de</strong>s dos europeus resi<strong>de</strong>ntes na Tunisia estavam tambem sujeitas<br />
á lei líoranica e á jnrisdicçáo dos referidos tribunaes musulmanos, nas contestaçóes<br />
entre europeus e indigenas, o que trazia alguns inconvenientes,<br />
visto tratar-se <strong>de</strong> tribunaes religiosos on<strong>de</strong> os christáos não po<strong>de</strong>m <strong>de</strong>pôr.<br />
Além d'isso, as regras musulmanas <strong>da</strong> indivisão, <strong>da</strong> chefaia, etc., contrariavam<br />
os liabitos e os interesses dos europeus.<br />
Antes do estabelecimento do protectorado lavrava uma gran<strong>de</strong> confusão<br />
quanto á garantia do direito <strong>de</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>. Este direito era conferido<br />
por um titulo regular, na falta d'este por um acto <strong>de</strong> notorie<strong>da</strong><strong>de</strong> ou<br />
zltika, facil <strong>de</strong> obter fazendo comparecer perante dois notarios algumas testomunhas<br />
venaes qiie jiirassem ter o immovel sempre pertencido a quem se<br />
dizia seu proprietario, e, finalmente, a jurispru<strong>de</strong>ncia musulmana ain<strong>da</strong><br />
admittia que, náo apparecendo titulo regular ou zctika, se podia consi<strong>de</strong>rar<br />
a simples occupaçáo corno sufficiente .para provar o direito <strong>de</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
É facil prevêr quanto este estado <strong>de</strong> coisas era favoravel a frau<strong>de</strong>s <strong>de</strong> to<strong>da</strong>
3 74 POLITICA INDIGENA ---.-<br />
a natureza. Assim, era frequentissimo um proprietario possuir dois titulo~<br />
<strong>da</strong> siia proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>, o regular e a utikn, e servir-se <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> um d'elles para<br />
ven<strong>de</strong>r a mcsms proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> :I dois compratlorcs tliffcrentes. (:lar0 est li qiie<br />
o comprador qiie tivesse recebiilo o titiilo rcgulnr tiiilia prefercncia sobre o<br />
portador <strong>da</strong> ictilin, que ficava completnn~entc<br />
logrado.<br />
Se a origem e a propria existencin do direito <strong>de</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> eram<br />
muitas vezes duvidosas, a extensão d'c.;se direito ain<strong>da</strong> era mais difficil dc<br />
precizar, visto que a Icgislaçáo local admittia um gran<strong>de</strong> numero <strong>de</strong> direi-<br />
tos reaes ou <strong>de</strong> encargos occultos que, oiier,~ndo a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>. Ilie redu-<br />
ziam consi<strong>de</strong>ravelmente o rendimento. Para prover a estes inconvenientes,<br />
e assentar n'uma base soli<strong>da</strong> e pratica n orgxnisaç80 <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> immo-<br />
biliaria, tanto indigena como europcia, <strong>de</strong>cretou-se a lei immobiliaria <strong>de</strong> 1<br />
<strong>de</strong> julho <strong>de</strong> 1885, <strong>de</strong>vi<strong>da</strong> á intelligente iniciativa <strong>de</strong> I'aul Cambon, resi-<br />
<strong>de</strong>nte geral na Tunisia. Este diploma, que tem sido modificado pelas leis<br />
<strong>de</strong> 16 <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 1886, <strong>de</strong> 6 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1888 e <strong>de</strong> 15 <strong>de</strong> marrjo <strong>de</strong><br />
1902 é <strong>de</strong>calca<strong>da</strong> sobre o Acto <strong>de</strong> Torrens, salvo as modificaçóes impostas<br />
pelos costiimes e condiçóes locaes. Esta lei tem <strong>da</strong>do na pratica os melho-<br />
res resiiltiidos, porquc, conserviindo aos indigeiias os seus typos ou regi-<br />
mens <strong>de</strong> propriedi~<strong>de</strong>, facilita n coiisoli<strong>da</strong>çilo gradual do direito <strong>de</strong> proprie-<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong> pelo processo simples <strong>de</strong> titulaçito e registo que arrasta logicamente<br />
a sujeiçzo dos immoveis indigenas assim garantidos, á lei c jurisdicção eu-<br />
ropeias. Como no Acto <strong>de</strong> Torrens o registo 6 voluntario, a lei náo melin-<br />
dra nem colli<strong>de</strong> com os costumes dos indigenas que, quando querem garantir<br />
melhor os seus direitos, recorrem á matricula dos immoveis que possuem,<br />
sem necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> coacçi%o. Os benkficios d'esta lei foram augmentados<br />
com a gran<strong>de</strong> diminuiçh <strong>da</strong>s <strong>de</strong>spezas a cargo do requerente, e hoje a ma-<br />
tricula Q regra geral para a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> frdnceza e comesa a ser frequen-<br />
temente requeri<strong>da</strong> pelos proprietarios indigenas. E' <strong>de</strong> prever que a nova<br />
titulaçgo dos pretlios indigenas se generalise com rapi<strong>de</strong>z, em vista <strong>da</strong><br />
institnição recente do Credito Predial <strong>da</strong> Tnnisia que só po<strong>de</strong> realisar<br />
empreutimos sobre os immoveis matriculados.
\ BEGIMEN DA PROPRIEDADE 875<br />
Colonias <strong>da</strong> Africa Occi<strong>de</strong>ntal<br />
Typo <strong>da</strong> occupaçtío. - Na Africa Occi<strong>de</strong>ntal o regimen <strong>da</strong> pro-<br />
pric.d:itlo indigena B bastante caracteristico. Quasi to<strong>da</strong>s as terras, ain<strong>da</strong><br />
as que parecem <strong>de</strong>soccapa<strong>da</strong>s, teem um proprietario que po<strong>de</strong> ser o chefe<br />
indigena, a communi<strong>da</strong><strong>de</strong> ou al<strong>de</strong>ia, e as familias <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> tribu.<br />
Ha casos em que as familias que compõem a al<strong>de</strong>ia ou a tribu n&o<br />
possuem separa<strong>da</strong>mente o solo, existindo, porém, sempre a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> ter-<br />
ritorial do chefe, e o dominio commrim cuja <strong>de</strong>signação os inglezes traduzctti<br />
~)or stool land (letra do banco). Segundo a opiniiio <strong>de</strong> Rayner, juiz do<br />
niil)remo tribunal <strong>de</strong> Lagos, as terras na origem <strong>de</strong>vem ter pertencido<br />
exclusivatnente aos potentados indigenas. Esta auctorisa<strong>da</strong> opiniiio está<br />
em <strong>de</strong>saccordo com a circumstancia <strong>da</strong>s terras serem absolutamente inalienaveis<br />
segundo os costiimes locaes. Os indigenas não chegam a ter a noção<br />
<strong>de</strong> que a terra pO<strong>de</strong> ser vendi<strong>da</strong>, e em to<strong>da</strong>s as transacções immobiliarias<br />
os direitos do primitivo proprietario siio sempre mantidos. E: essa a base<br />
essencial do seu systerria immobiliario. Nas terras indigenas a cultura<br />
1)' nnanente, po<strong>de</strong> dizer-se que, em geral, não existe; O processo seguido t!<br />
o :i!qiic:ive, sendo as terras <strong>de</strong>ixa<strong>da</strong>s em pousio <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> dois annos consecutivos<br />
<strong>de</strong> explora(;iio zigricola. Quando os indigenas luctam com diEcul<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
materiaes, B frequente contrahirem emprestimos, ce<strong>de</strong>ndo as terras<br />
que possuem com previo consentimento <strong>de</strong> todos os co-proprietarios, como<br />
cnciçáo <strong>da</strong> quantia reoebid~. As terras passam á posse temporaria do cretlor<br />
atú ao reembolso <strong>da</strong> divi<strong>da</strong>, cc~jo resgate total se po<strong>de</strong> fazer em qualquer<br />
O, i :~siHo, seguindo-se iinme(1iatamente O retrocesso do immovel hypothecado<br />
:i1,i: seus proprietarios Iegitiinos. Entre as transacções immobiliarias effectua<strong>da</strong>s<br />
entre indigenas, a qiic mais se assemelha 4 alienaçáo territorial 6<br />
a permissão conferi<strong>da</strong> a um estranho para viver e trabalhar n'unia certa<br />
propfie<strong>da</strong>d;lc. Se o arren<strong>da</strong>tario B <strong>da</strong> mesma al<strong>de</strong>ia, o tributo que fica <strong>de</strong>vendo<br />
annualmente ao proprietario do solo occupado c! meramente nominal ;
37G POLITICA INDIBENA<br />
---___ -- .. -4 -<br />
se não pertence á collectivi<strong>da</strong>rle, o tributo é real e geralmente cobrado em<br />
generos.<br />
O beneficiario d'uma occnpaçáo d'este genero po<strong>de</strong> usufrui-la illimi-<br />
ta<strong>da</strong>mente, mas se abandonar a terra, esta volve ao proprietario, que tem<br />
tamhcm a faciil<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> expulsar toclo o locatario que, por qualquer forma,<br />
preten<strong>de</strong>r arrogar-se o direito dc proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> sobre os terrenos que lhe<br />
hajam sido concedidos d'esta maneira. Esta occupação, e o iisufructo do<br />
solo sgo transmissiveis por herança. As conccssíjes recentemente feitas<br />
pelos indigenas aos europeus são producto <strong>da</strong> penetracão na socie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
indigena <strong>da</strong>s i<strong>de</strong>ias e leis enropeias relativas ii proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>. Não ha cos-<br />
tume indigena em que se appoiem; as ce<strong>de</strong>ncias <strong>de</strong> terrenos feitas aos<br />
europeus no inicio <strong>da</strong> colonisaçáo <strong>da</strong> Africa Occi<strong>de</strong>ntal, assumiam um cara-<br />
cter perfeitamente analogo ás transacçóes immobiliarias effectua<strong>da</strong>s entre<br />
indigenas, e, muito embora os concessionarios raras vezes pagassem qualqner<br />
in<strong>de</strong>mnisaçáo periodica nos chefes indigenas, estes consi<strong>de</strong>ravam-se, entre-<br />
tanto, como proprietarios eminentes do territorio temporariamente cedido.<br />
Esta i<strong>de</strong>ia <strong>da</strong> impossibili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> alienação permanente <strong>da</strong> terra, que<br />
6 fun<strong>da</strong>mental no direito consuetudinario <strong>de</strong> qnasi todos os povos <strong>da</strong> Africa<br />
Occi<strong>de</strong>ntal é, ali&, commum a gran<strong>de</strong> numero <strong>de</strong> raças socialment,e atra-<br />
za<strong>da</strong>s in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>da</strong> variabili<strong>da</strong><strong>de</strong> ethnica. Outra caracteristica<br />
<strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena no occi<strong>de</strong>nte africano, é a aiisencia <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
individual, tanto em noção theorica como em sitoaç80 real, abstrahindo, é<br />
clar,?, <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> dos chefes, e <strong>da</strong> situação crea<strong>da</strong> nos centros habita-<br />
dos por europeus, on<strong>de</strong> as leis immobiliarias <strong>da</strong> nossa civilisação se teem<br />
pouco a pouco implantado, modificando os costumes indigenas. A terra per-<br />
tence ao chefe indigena, communi<strong>da</strong><strong>de</strong> e á familia, e nunca ao individuo.<br />
Embora em ambas as hypotheses <strong>de</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> collectiva, todos os coproprietarios<br />
tenham direitos eguaes, a gerencia dos bens communs B em<br />
-geral attributo do chefe indigena e do chefe <strong>da</strong> familia, os quaes administram<br />
as terras, po<strong>de</strong>ndo fazer pessoalmente concessóes a naturaes <strong>da</strong> mesma<br />
al<strong>de</strong>ia, mas carecendo <strong>da</strong> annuencia <strong>de</strong> todos os co-proprietarios quando a<br />
ce<strong>de</strong>ncia seja em beneficio <strong>de</strong> um estranho.<br />
e Quanto ao regimen successorio, a regra primitiva estabelece quasi
invariavelmente a linha feminina, vindo portanto a gerir o dominio commum<br />
o filho varáo mais velho <strong>da</strong> irmâ mais velha do <strong>de</strong>functo. Nas locali<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
on<strong>de</strong> os indigenas recebem mais directamente a influencia civilisadora do<br />
elemento colonisador, esta regra tem sido pouco a pouco substitui<strong>da</strong> pela<br />
formula adopta<strong>da</strong> nos codigos europeus. São estes os traços mais salientes<br />
do regimen <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena na Africa Occi<strong>de</strong>ntal. Expozemo-10s<br />
em to<strong>da</strong> a generali<strong>da</strong><strong>de</strong> visto a gran<strong>de</strong> variabili<strong>da</strong><strong>de</strong> dos costumes locaes e<br />
a infiltraçáo dos habitos europeus differenciarem gran<strong>de</strong>mente, para ca<strong>da</strong><br />
regiáo e para ca<strong>da</strong> uni<strong>da</strong><strong>de</strong> ethnica, as exteriorisaç6es objectivas respeitan-<br />
tes ao direito <strong>de</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>. Vamos agora <strong>de</strong>screver rapi<strong>da</strong>mente as dis-<br />
posiçóes principaes dos diplomas legislativos que regularisam a situação<br />
<strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena, nos mais importantes estabelecimentos coloniaes<br />
<strong>da</strong> zona occi<strong>de</strong>ntal do continente negro.<br />
Colonias britannicas- Na colonia <strong>de</strong> Lagos ha a consi<strong>de</strong>rar o ter-<br />
ritorio <strong>de</strong> administraçko directa e as terras do protectorado. No primeiro<br />
náo ha limites aos direitos dos indigenas quanto á ven<strong>da</strong>, arren<strong>da</strong>mento e<br />
sub-arren<strong>da</strong>mento <strong>da</strong>s terras que lhes pertencem. No protectorado, por<br />
disposiçáo legal <strong>de</strong> 18'37: to<strong>da</strong>s as concessóes feitas por indigenas a não<br />
indigenas scí são vali<strong>da</strong>s, quando mereçam a approvação do governador <strong>da</strong><br />
colonia, a quem <strong>de</strong>vem sempre ser submettidos todos os actos <strong>de</strong> concessão.<br />
Cornprehen<strong>de</strong>-se esta <strong>de</strong>terminação visto que, no territorio do protecto-<br />
rado, a facul<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> dispi,r <strong>da</strong>s terras vagas pertence exclusivamente aos<br />
chefes indigenas, sendo portanto necessario garantir os interesses inglezes<br />
contra os inconvenientes <strong>da</strong>s gran<strong>de</strong>s concessóes territoriaes a colonos <strong>de</strong><br />
outras nacionali<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />
Na parte peninsular <strong>da</strong> Serra Leôa, os indigenas são principalmente<br />
<strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> escravos libertos ou <strong>de</strong> iinmigrantes vindos do interior<br />
que, ou se teem tornado proprietarios comprando terras ao governo, ou<br />
se converteram em sguutters, especie <strong>de</strong> arren<strong>da</strong>tarios que <strong>de</strong>vem annual-<br />
mente um tributo nominal. Na ilha Sherbro, o direito dos indigenas <strong>de</strong>ten-<br />
tores do solo no momento <strong>da</strong> cesazo ii cor<strong>da</strong> e o dos seus <strong>de</strong>sceri<strong>de</strong>ntes fo-<br />
ram plenamente reconliecidos, e n'esta regiáo, como aliás em to<strong>da</strong> a colo-
378 POLITICA INDIGENA<br />
nia, a administraçso ingleza não impúe aos indigenas a menor restricçáo $<br />
liber<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s transacçúes immobiliarias.<br />
Na Gambia, os indigenas teem direito ao usufructo <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as terras<br />
que occupam. 0s chefes indigenas <strong>da</strong>s regiúes obti<strong>da</strong>s por conquista per-<br />
<strong>de</strong>ram, ipso farto, todos os direitos á posse territorial. Os chefes que accei-<br />
taram ou pediram a administraçáo ou o protectorado britannico, conser-<br />
varam a sua proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> particular, renunciando á posse <strong>da</strong>s terras vagas.<br />
As al<strong>de</strong>ias indigenas cultivam em dominio commum os terrenos circumja-<br />
centes, e qualquer individuo ou collectivi<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena se po<strong>de</strong> tornar<br />
proprietario <strong>de</strong>sbravando terrenos virgens, ou convertendo paues em arro-<br />
xaes, sein limite legal quanto á. extensão <strong>de</strong> terras apropriavel por este<br />
processo.<br />
Na Costa do Oiiro as concess6es feitas por indigenas a colonos ca-<br />
recem <strong>de</strong> aiietorisaç&o i10 governador, e a sua vali<strong>da</strong><strong>de</strong> só B garanti<strong>da</strong>,<br />
quando sujeitas a um rcgistro especial perante o tribunal <strong>da</strong> colonia.<br />
Em to<strong>da</strong>s estas colonias se tem cui<strong>da</strong>dosamente evitado interferir<br />
com O regime11 imriloliliario indigena, respeitando-se todos os seus costii-<br />
rnes e at8 por vezes proce<strong>de</strong>ndo-se A respectiva codificação.<br />
Colonias francezas- Na Africa Occi<strong>de</strong>ntal Franeeza as terras que<br />
constitiiem proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> collectiva dos indigeilas, ou que os chefes indige-<br />
nas possuem como representantes <strong>da</strong>s collectivi<strong>da</strong><strong>de</strong>s, náo po<strong>de</strong>m ser cedi-<br />
<strong>da</strong>s a particulares náo indigenas mediante ven<strong>da</strong> on arren<strong>da</strong>mento, sem O<br />
consentimento (10 governatlor em conselho, previamente expresso em <strong>de</strong>-<br />
creto colonial.<br />
A expropriaçno <strong>da</strong>s terras iiiriigenas, para creação <strong>de</strong> centros iirbanos,<br />
ou para coiistriicçáo <strong>de</strong> obras piihlicns <strong>de</strong> titili<strong>da</strong><strong>de</strong> geral, sc; po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>-<br />
cidi<strong>da</strong> pelo gor(.rnatlor em conselho, fixando-se pela mesma fórma as in-<br />
<strong>de</strong>mnisaçóes cor.rc.spon<strong>de</strong>ntes.<br />
Na Cost:t do hlarfim, o <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 10 <strong>de</strong> setembro <strong>de</strong> 1893, regula-<br />
mentando as concessúes e ventlas territoriaes, estabelece no artigo 20 que<br />
os concessionarios <strong>de</strong>verbo conservar e garantir aos indigenas o direito <strong>de</strong><br />
caça e pesca, a colheita <strong>de</strong> grãos e fructos nua produzidos por cultura espe-
oial, a extracção <strong>da</strong> surn nas palmeiras não planta<strong>da</strong>s por exploração<br />
agrkola regular, e o direito ao córte <strong>da</strong> lenha e ma<strong>de</strong>ira, necessarias ao<br />
aqiic~c~imento, e 5 constriicção <strong>da</strong>s palhotas e embarcaçúes.<br />
a<br />
No I)aliom6, o <strong>de</strong>areto <strong>de</strong> 23 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1892, <strong>de</strong> iniciativa do<br />
genclriil Uodd~, <strong>de</strong>terminou que todos os indigenas que preten<strong>de</strong>ssem ser<br />
prol" ietarios <strong>de</strong> immoveis, <strong>de</strong>pozessem os respectivos titulos, ou fizessem<br />
vaiei. os seus direitos perante as auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s locaes. Escusado será dizer<br />
que esta disl~osiçáo ficou lettra morta, e que os indigenas continuaram apenas<br />
com o simples usufructo do solo que occupam, como acontece na gran<strong>de</strong><br />
mnioria <strong>da</strong>s colonias africanas. O mesmo diploma legislativo estabelecia<br />
que todos os actos, referentes a transacçúes immobiliarias effectua<strong>da</strong>s com<br />
indigenas, <strong>de</strong>viam ser examinados por uma commiss&o especialmente no-<br />
mea<strong>da</strong> para esse fim.<br />
Pelo <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 8 <strong>de</strong> junho <strong>de</strong> 1901 sobre a classificação <strong>da</strong>s terras<br />
vagas e regimen <strong>de</strong> conoeesúes no Daliomé, ficou estatuido que, no caso <strong>de</strong><br />
surgir alguma contestnçiio por parte dos indigenas, relativa A proprie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> terrenos proximos B respectiva al<strong>de</strong>ia e cuja concessão tenha sido re-<br />
queri<strong>da</strong>, ser& concedido aos indigenas um praso <strong>de</strong> dois annos para valori-<br />
sar os referidos terrenos. Llecorrido esse periodo, se o terreno não estiver<br />
valorisado, p:issarB a fazer parte do dominio.<br />
No Congo Francez o <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 26 <strong>de</strong> setembro <strong>de</strong> 1891 nuctorisou<br />
os iiidigenas a trocar ou ven<strong>de</strong>r as suas terras sob a condi@o, n cargo do<br />
adquirente, <strong>de</strong> submetter o acto <strong>de</strong> ven<strong>da</strong> ou troca á approvayáo <strong>da</strong> admi-<br />
nistração franceza <strong>de</strong>ntro d'um praso <strong>de</strong> seis mezes, contados R partir <strong>da</strong><br />
<strong>da</strong>ta <strong>da</strong> assignutura do contracto. Nenhum contracto <strong>de</strong> acquisiçáo <strong>de</strong> ter-<br />
ras aos indigenas é valido, se não tiver recebido a approvação <strong>da</strong> adminis-<br />
traçáo, que <strong>de</strong>ve constatar a vali<strong>da</strong><strong>de</strong> do direito <strong>de</strong> posse allcgado pelo<br />
ven<strong>de</strong>dor indigena, e lavrar o titulo <strong>de</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong>finitiva. No <strong>de</strong>creto<br />
<strong>de</strong> I3 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> lS!)I), que faz parte <strong>da</strong> serie <strong>de</strong> diplomas legislati-<br />
vos que promoveu no Congo Francez o regimen <strong>da</strong>s gran<strong>de</strong>s concessúes,<br />
<strong>de</strong>clara-se no artigo 10 do ca<strong>de</strong>rno <strong>de</strong> encargos que as socie<strong>da</strong>dcs conces-<br />
sionarias só po<strong>de</strong>rá0 exercer os direitos <strong>de</strong> usufructo e exploração que lhe<br />
-- --.<br />
são concedidos, fóra <strong>da</strong>s al<strong>de</strong>ias occupa<strong>da</strong>s por indigenas e dos terrenos <strong>de</strong>
cultura, <strong>de</strong> pastagem o11 florestaes que lhes são reservados. Os usos, costu-<br />
mes, religiões e organisaçáo social <strong>da</strong>s populaç0es indigenas <strong>de</strong>veráo ser<br />
rigorosamente respeitados. 03 contractos entre os concessionarios e 0s in-<br />
digenas <strong>de</strong>vem ser examinados pelo governador <strong>da</strong> colonia, e os confiictos<br />
ou litigios entre uns e outros <strong>de</strong>vem ser submettidos á <strong>de</strong>cizão <strong>da</strong> aiictori-<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong> administrativa, em cuja area jurisdiccional se tenham praticado os<br />
actos <strong>de</strong>lictuosos, ou resi<strong>da</strong>m os pleiteantes indigenas. Em 28 <strong>de</strong> março <strong>de</strong><br />
1899 foi introduzi<strong>da</strong> no Congo Francez uma legislaváo immobiliaria ba-<br />
sea<strong>da</strong> sobre o systema <strong>de</strong> Torrens, mas applicavel sómente aos immoveis<br />
pertencentes a europeus, <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> europeus e indigenas naturalisa-<br />
dos. O artigo 2.0 d'esse <strong>de</strong>creto <strong>de</strong>termina que os bens immoveis perten-<br />
centes aos indigenas continuem a ser regidos pelos costumes locaes, em tudo<br />
que diga respeito acquisição, conservação c transmissão succcssoria.<br />
A exploração do Congo Francez pelas emprezas concessionarias tem<br />
<strong>da</strong>do origem a gran<strong>de</strong> numero <strong>de</strong> abusos e violencias exerci<strong>da</strong>s sobre os<br />
indigenas a qiiem, em regra, nunca sáo praticamente reconhecidos os direitos<br />
que o <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> concess6es lhes reserva. Para evitar, at6 certo ponto,<br />
os actos censuraveis praticados pelos administradores <strong>da</strong>s concessões, constituiram-se<br />
provisoriamente, por <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 9 <strong>de</strong> outubro <strong>de</strong> 1903, reservas<br />
territoriaes, exclusivamente attribui<strong>da</strong>s aos indigenas, e que sáo constitui<strong>da</strong>s<br />
ein ca<strong>da</strong> concessão pela <strong>de</strong>cima parte <strong>da</strong> re~pect~iva area. Os indigcnas<br />
conservam o livre iisufructo <strong>de</strong> todos os productos <strong>da</strong>s reservas on<strong>de</strong> ficam<br />
acantonados, po<strong>de</strong>ndo commerciar com o exce<strong>de</strong>nte <strong>da</strong> producçáo, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que<br />
paguem o imposto <strong>de</strong> palhota, e o valor d'essa producção não ultrapasse<br />
seis centesimos <strong>da</strong> producçíio total <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> concessáo.<br />
Colonias allemãs - Nas colonias allemás, ao contrario do que acon-<br />
tece nagran<strong>de</strong> maioria <strong>da</strong>s colonias francezas, o principio <strong>de</strong> que aos indi-<br />
genas não <strong>de</strong>ve ser concedi<strong>da</strong> a facul<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> transaccionarein com as suas<br />
terras, E, coiiio accentúa I'aul Reinsch, geralmente <strong>de</strong>fendido e applicado.<br />
Nas colonias 110s Camarócs e <strong>de</strong> Toga todos os contractos celebrados entre<br />
indigenas e riso indigenas, para acquisiçso <strong>de</strong> terras, <strong>de</strong>vem ser levados ao<br />
conhecimento tla aiictori<strong>da</strong><strong>de</strong> competente. A or<strong>de</strong>iian(;a <strong>de</strong> 15 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong>
REGIMEN DA PROPBIEDADE 38 1<br />
1888 estatuia que as acquisições <strong>de</strong> terras <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> 10 hectares pertencentcla<br />
a indigenas, <strong>de</strong>viam ser submetti<strong>da</strong>s á approvação do governador.<br />
Pela or<strong>de</strong>nança <strong>de</strong> 20 <strong>de</strong> março do mesmo anno estabelecia-se a obrigação<br />
<strong>de</strong> siii~metkr :i ,approvação do governador imperial todos os contractos re-<br />
lativos a acquisiçiio <strong>de</strong> terras pertencentes aos indigenas. Finalmente, o<br />
<strong>de</strong>creto imperial <strong>de</strong> 15 <strong>de</strong> junho <strong>de</strong> 1896, applicavel áquellas duas colonias,<br />
<strong>de</strong>termina que a cessão <strong>de</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>s urbanas superiores a um hectare,<br />
e <strong>de</strong> todos os immoveis riisticos, a titulo <strong>de</strong> ven<strong>da</strong> ou por arren<strong>da</strong>mento<br />
superior n 15 annos, feita por indigenas em beneficio <strong>de</strong> não indigenas, sd<br />
B permitti<strong>da</strong> com auctorisay50 do governador. Todos os contractos a que<br />
esta auctorisaçáo for recusa<strong>da</strong> ficará0 sem effeito juridico.<br />
Na Africa Occi<strong>de</strong>ntal Allemã a or<strong>de</strong>nança <strong>de</strong> 10 <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong> 1890<br />
e a <strong>de</strong> 5 <strong>de</strong> outubro <strong>de</strong> 18118 que em parte altera e substitue a primeira,<br />
<strong>de</strong>terminam que os arren<strong>da</strong>mentos e acquisiqóes <strong>de</strong> terras aos indigenas<br />
sejam previamente aiictorisados pelo governador <strong>da</strong> colonia, e invali<strong>da</strong>m<br />
todos os contractos celebrados sem prece<strong>de</strong>ncia <strong>da</strong> referi<strong>da</strong> auctorisação,<br />
estabelecendo, n'este caso, penali<strong>da</strong><strong>de</strong>s para o contractante não indigena.<br />
Pelo <strong>de</strong>creto imperial <strong>de</strong> 10 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 1898 foram organisa<strong>da</strong>s reservas<br />
territoriaes para resi<strong>de</strong>ncia e usufructo exclusivo dos indigenas, <strong>de</strong>claran-<br />
do-se proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> inalienavel d'uma tribn ou d'um grupo <strong>de</strong> tribus, <strong>de</strong>ter-<br />
mina<strong>da</strong>s zonas comprehendi<strong>da</strong>s nos limites do Protectorado, já pertencentes<br />
a indigenas, já fazendo parte <strong>da</strong>s terras do governo.<br />
A primeira reserva indigena crea<strong>da</strong> na colonia, nos arredores <strong>de</strong><br />
Rietmond e I
382 POLITICA INDIGENA<br />
exploraçáo collectiva <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminados terrenos, administrados superior-<br />
mente pelo chefe <strong>da</strong> communi<strong>da</strong><strong>de</strong>. Exceptuando certas regióes do Alto<br />
Kassai, do Sankuru e do Uellê, os indigenas limitavam-se a cultivar as<br />
circumvisinhanças immediatas <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> al<strong>de</strong>ia. Comtudo, em to<strong>da</strong>s as re-<br />
gióes <strong>da</strong> colonia, as popiilacócs indigenas dispunham livremente <strong>da</strong>s flores-<br />
tas para caçar o marfim ou collier a borracha, c a or<strong>de</strong>nança <strong>de</strong> 14 <strong>de</strong><br />
setembro <strong>de</strong> 1886, que apropriou ao Estado as terras vagas, comprehen<strong>de</strong>ndo<br />
n'esta <strong>de</strong>signacão to<strong>da</strong>s as zonas florestaes-explora<strong>da</strong>s pelos indigenas, sem<br />
o minimo respeito pelos direitos d'estes, foi recebi<strong>da</strong> pelas populaqóes indi-<br />
genas como espoliação violcnta que o regimen <strong>de</strong> trabalho obrigatorio<br />
adoptado na colonia e as atroci<strong>da</strong><strong>de</strong>s commetti<strong>da</strong>s pelos proprios funccio-<br />
narios administrativos, mais cruel e injusta teem tornado.<br />
O Acto <strong>de</strong> Torrens modificado, foi introduzido na legislação congo-<br />
lense por <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 32 <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong> 1885, mas o beneficio <strong>da</strong> nova lei<br />
immoliliaria ficou apenas reservado aos não indigena~. As terras occupa-<br />
<strong>da</strong>s pelos indigenas continuaram a ser regi<strong>da</strong>ã pelos usos e costumes locaes<br />
segundo <strong>de</strong>terminação expressa do <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 11 <strong>de</strong> setembro <strong>de</strong> 1886.<br />
Pela lei relativa á ven<strong>da</strong> e arren<strong>da</strong>mento dos bens do dominio do Estado,<br />
promulga<strong>da</strong> em 9 <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong> 1893, foi <strong>de</strong>terminado que, quando algumas<br />
al<strong>de</strong>ias indigeii~r fiquem entrava<strong>da</strong>s cm territorios alienados o11 arren<strong>da</strong>-<br />
dos, os habitaiites indiqenas po<strong>de</strong>rá0 alargar as suas culturas sobre as<br />
terras vagas dos arredores, prescindindo do consentimento do proprietario<br />
ou locatario, emquanto se não effectnar a mediçáo official dos terrenos.<br />
In<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>da</strong> situaçáo em excesso precaria do proprietario<br />
indigena, perante os abusos do monopolio governamental <strong>da</strong> exploração <strong>da</strong>s<br />
terras vagas, creado pelos <strong>de</strong>cretos tle 30 <strong>de</strong> o~itubro<br />
e <strong>de</strong> 5 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro<br />
<strong>de</strong> 1892, e que apresenta tantos pontos <strong>de</strong> contacto com o primitivo kul-<br />
tur system javaiiez, não O possivel <strong>de</strong>scobrir em to<strong>da</strong> a lebislaçáo immo-<br />
biliaria do Conq-o belga uma unica medi<strong>da</strong> ten<strong>de</strong>nte a promover a evolução<br />
<strong>da</strong> l)roprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena para uma fórma mais perfeita, e a outhorgar-lhe<br />
garantias mais qoli<strong>da</strong>s e praticamente efficazes.
Colonia do Cabo<br />
N'esta colonia, saIvo pequenas propri~d~ites territoriacs espalha<strong>da</strong>s<br />
nas provincias orientaes, os immoveis na posse dos indigenas encontram-se<br />
nos districtos situados entre o rio Icei e o Umzimkulu, conhecidos pela <strong>de</strong>-<br />
signação <strong>de</strong> territorios do Transkei. Anteriormente á dominaçáo britannica,<br />
o solo pertencia, em ca<strong>da</strong> tribii in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte, ao chefe supremo, e era repar-<br />
tido em fracçóes administra<strong>da</strong>s pelos chefes subordinados, as quaes a seu<br />
tiirno se subdividiam em kraals ou al<strong>de</strong>ias. Os terrenos cultivaveis attri-<br />
buidos a ca<strong>da</strong> kraal eram <strong>de</strong>pois separados em lotes, e distribuidos pelos<br />
seus habitantes, <strong>de</strong> maneira que ca<strong>da</strong> adulto casado recebia um numero <strong>de</strong><br />
parcellas proporcionado ao numero <strong>da</strong>s suas mulheres, unicas pessoas que<br />
se empregavam nos trabalhos agricolas.<br />
Quasi todos os chefes indigenas, com escepc;áo <strong>de</strong> um ou outro <strong>de</strong>s-<br />
pota, mantinham e reconheciam rigorosamente a ca<strong>da</strong> kraal ou a ca<strong>da</strong><br />
familia, o direito á occupaçáo e usiifructo'ilns terras que lhes eram concedi<br />
<strong>da</strong>s, e pelas qiiaes náo eram obrigados a pagar nenhum tributo, po<strong>de</strong>ndo<br />
ain<strong>da</strong> utilisar em commiim todos os campos <strong>de</strong> pastagem, florestas, rios e<br />
fontes. Havia casos em que os chcfes reservavam para usufructo proprio<br />
algumas terras incultas <strong>de</strong>stina<strong>da</strong>s á creaçGo do gado que quasi sempre pos-<br />
suiam em gran<strong>de</strong> quanti<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
A transmissão <strong>da</strong> lieranqa territorial fazia-se sempre <strong>de</strong> paes para<br />
filhos, mas era raro o mesmo immovel permanecer miiito tempo na posse<br />
<strong>da</strong> mesma familia, em resultado <strong>da</strong>s ten<strong>de</strong>ncias erraticas <strong>da</strong>s tribus indigv~<br />
,L" c <strong>da</strong>s penas constantes em que estas an<strong>da</strong>vam envolvi<strong>da</strong>s. A medi<strong>da</strong><br />
(111~~<br />
OS inglezes se iam apo<strong>de</strong>rando do territorio indigena pela força <strong>da</strong>s<br />
armas, creavam reservas siifficientes para usufructo <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> tribu, e con-<br />
fiscavam as terras restantes em beneficio <strong>da</strong> colonisaçáo europeia. No ter-<br />
ritorio <strong>de</strong> Transkei, as tril~iis<br />
Amapondo, Amahoinvana, Amatembo, Amabaca<br />
e outras <strong>de</strong> menor importancia, submetteram-se voluntariamente $9 quctg,
384 POLITICA INDIGENA<br />
ri<strong>da</strong><strong>de</strong>s inglezas, tendo-lhe sido <strong>de</strong>ixado o pleno usufructo <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as suas<br />
terras, e passando a posse eminente á coroa ingleza. O chefe indigena<br />
supremo, que foi <strong>de</strong>stituido do seu cargo e s~lbstituido por um funccionario<br />
inglez, recebe um subsidio especial a titulo <strong>de</strong> compensa~áo.<br />
Em ca<strong>da</strong> districto do Translcei funcciona um resi<strong>de</strong>nte inglez subordinado<br />
ao resi<strong>de</strong>nte geral, empregando-se sob as suas or<strong>de</strong>ns diversos<br />
fiinccionarios indigenas, geralmente recrutados entre os antigos chefes ou<br />
seus <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes.<br />
A administraç~o ingleza tem posto em pratica principios <strong>da</strong> mais<br />
intelligente e tolerante politica indigena, não impondo a menor transição<br />
brusca ao systema <strong>de</strong> occupação do solo. Os indigenas continuam a exploração<br />
agricola <strong>da</strong>s terras que occupavam antes <strong>da</strong> sujeiyno ao dominio<br />
inglez, e usufruem em commum o direito <strong>de</strong> pastagem sobre os terrenos<br />
incultos.<br />
Uma <strong>da</strong>s primeiras medi<strong>da</strong>s adopta<strong>da</strong>s pela administraçso britannica<br />
foi a <strong>de</strong>limitação e <strong>de</strong>marcação dos territorios districtaes, e, <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> ca<strong>da</strong><br />
districto, a <strong>de</strong>marcação niti<strong>da</strong> <strong>da</strong>s reservas attribui<strong>da</strong>s ás diversas tribus<br />
ou agrupamentos differentes que ali resi<strong>de</strong>m. O estabelecimento e consoli-<br />
<strong>da</strong>ção do regimen <strong>de</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> individual mediante um titulo regular,<br />
foi iniciado na reserva <strong>de</strong> Tambookie, annexa<strong>da</strong> á colonia em 1848, e hoje<br />
chama<strong>da</strong> districto <strong>de</strong> Glen Grey, pelo « G'len. Grey Act n, <strong>de</strong> iniciativa do go-<br />
vernador Sir George Grey, e approvado pelo parlamento do Cabo em 1894.<br />
O novo regimen estabelecido por essa lei tem sido siiccessivamente implan-<br />
tado nas reservas cujos indigenas espontaneameiite o <strong>de</strong>sejem e sollicitem.<br />
A organisapo geral <strong>da</strong>s reservas indigenas foi regula<strong>da</strong> pelo Native Lo-<br />
cations, Lautls and Colntnonage Act n <strong>de</strong> 1879, que já continha disposições I<br />
relativas á individualisagáo <strong>da</strong> ~ro~rie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
immobiliaria indigena.<br />
O e G IP~<br />
Grey Act D <strong>de</strong>termina que a todo o requerente indigena, nas<br />
condicóes legaes, seja <strong>da</strong>do um titulo <strong>de</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> individual-referente a<br />
um immovel <strong>de</strong>stinado a edificapóes e a cultura, e contendo a especificaçáo<br />
dos direitos communs <strong>de</strong> pastagem que lhe ficam garantidos. A superficie<br />
<strong>de</strong> ca<strong>da</strong> parcella individual é pouco mais ou menos <strong>de</strong> nove acres, e a area<br />
territorial reserva<strong>da</strong> ao direito commum <strong>de</strong> pastagem varia com a extensáo
<strong>da</strong>s terras que ficam livres, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> effectuado o parcellamento <strong>da</strong> zona<br />
<strong>de</strong>stina<strong>da</strong> a habitaçóes e exploração agricola. Os proprietarios indigenas<br />
ficam siijeitos ao pagamento d'llm censo annual bastante reduzido, e 6-lhes<br />
ve<strong>da</strong>do ven<strong>de</strong>rem 0s seus bens, sem consentimento escripto <strong>da</strong>s alictori<strong>da</strong><strong>de</strong>íi<br />
inglezas. Na pratica. csm transacvões limitam-se aos indigenas, e os eliropeue<br />
s6 ~o<strong>de</strong>m tornar-se proprietarios <strong>de</strong> pequeiias parcellas territoriaes<br />
na ares <strong>da</strong>s reservas, se 0s indigeilas O conseiitirern e a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> for<br />
<strong>de</strong>stina<strong>da</strong> e um fim religioso e educativo, ou a uma estaçao cornrnercial recon]leci<strong>da</strong>n~ente<br />
util aos i~ldigenas, e na qiial 6 e.upress;tniente prohibido,<br />
como aliiis em to<strong>da</strong> a sliperficic <strong>da</strong>s reservas, o conimercio tle ou<br />
c~uaesquer bebi<strong>da</strong>s espirituosas.<br />
Em 1898 comeyaranl-se n applicar as claiis~iia. rlo -(;/r,, (:Te?, AC~B<br />
na Firigolandia, on<strong>de</strong> 0s indigenas (10 (listricto <strong>de</strong> Biitterlvorth tinham sol-<br />
licitado o beneficio do regimcn immobiliario individtial. Segundo affirma<br />
Stamford, superinten<strong>de</strong>nte dos negocios iiitligeriax cfa Colonia tlo C';*bo, lia<br />
algumas locali<strong>da</strong><strong>de</strong>s cujos habitalltes, gos:irido lia annos do systema <strong>de</strong> pro-<br />
prie<strong>da</strong><strong>de</strong> individual, manifestam o <strong>de</strong>sejo tIe voltar á posse collectiva do<br />
atten<strong>de</strong>ndo a qiie o enorme <strong>de</strong>senvolvimento <strong>da</strong>. populaç&o no regimen<br />
<strong>de</strong> eegnraiiça e liber<strong>da</strong><strong>de</strong> implantado pela adrnini~t~raçáo ingleza, provoca<br />
iim parceSiame~~t~ excessivo <strong>da</strong>s terras, diminuindo nottivelmente o territo-<br />
rio commiim para creaçáo do @Uso, que t! a maior fonte <strong>de</strong> receita indigena.<br />
Na Bechuana, annexa<strong>da</strong> colonia pelo K Ll,z,te.rtctio,t dct » <strong>de</strong> 1895,<br />
a juridica <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena B um pouco differente. Sob o<br />
regimen <strong>de</strong> CTOWTL coiony anterior annexavao, tinham-se concedido aos<br />
chefes indigenas e respectivas tribiis, <strong>de</strong>termina<strong>da</strong>s reservas territoriaes, sd<br />
alienaveis com a. auctorisação expressa cio Colonial Ofice. A referi<strong>da</strong> lei<br />
<strong>de</strong> annexapão estatuiu que essa alienaçáo continuiiria a ser feita sob egual<br />
condiçáo, ou ain<strong>da</strong> com O bastante consentimento do parlamento do Cabo,<br />
e <strong>de</strong>terminou tambem que O e Ole?z Grey Act . <strong>de</strong> 1895 só po<strong>de</strong>ria ser appli-<br />
ca<strong>da</strong> na Bechuana com i<strong>de</strong>ntica auctorisação.<br />
A legislação ingleza que acabamos <strong>de</strong> citar, perfeitamente a<strong>da</strong>ptavel<br />
ao social dos indigenas e sua organisaçáo economica, tem<br />
surtirio 0s melhores resultadw, sob o ponto <strong>de</strong> vista <strong>da</strong> civilisaçáo <strong>da</strong>s po-<br />
en
386 POLITICA INDIGENA<br />
-- -<br />
pnlaçóes e do progresso <strong>da</strong> exploração agricola. As differentes exposiçóes<br />
<strong>de</strong> productos agricolas exclusivamente obtidos pela cultura indigena são a<br />
prova bem evi<strong>de</strong>nte do beiiefico influxo que a excellencia <strong>da</strong>s leis po<strong>de</strong><br />
exercer no progresso <strong>da</strong>s socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />
Africa Oriental<br />
No Natal os indigenas gouarn do usufructo <strong>de</strong> reservas territoriaes<br />
cu,ja posse e administração pertencem a uma corporação europeia consti-<br />
tiii<strong>da</strong> por funccionarios publicas, o Natal Yative Trust, creado por <strong>de</strong>-<br />
creto real. Aos indigenas niio são permitti<strong>da</strong>s quaesquer transacgóes im-<br />
mobiliarias sobre as terras que occupam, reservando-se o referido conselho<br />
<strong>de</strong> administrayko o direito <strong>de</strong> as hypothecar, alienar e aforar conforme se<br />
julgar mais conveniente aos interesses e bem estar dos indigenas.<br />
Na Rhoctesia, a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> dos indigenas civilisados é assimila<strong>da</strong><br />
á dos colonos eiiropeus, e legalisa<strong>da</strong> por um titulo regular sujeito a contri-<br />
buição predial perpetua. Para os indigenas não civilisados é feita a repar-<br />
tição do solo pela auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> administrativa, <strong>de</strong> accordo com os costumes<br />
locaes, e importa unicamente o ixsufructo <strong>da</strong>s terras occupa<strong>da</strong>s. Nos terri-<br />
torios reservactos aos indigenas é expressamente prohibido que estes ven-<br />
<strong>da</strong>m ou ce<strong>da</strong>iii as respectivas parcellas.<br />
Em Ma~lagascar foi <strong>de</strong>cretado em 16 <strong>de</strong> julho <strong>de</strong> 1897 um extenso<br />
diploma legisl,ttivo, baseado no syatema <strong>de</strong> Torrens, applicavel tanto a<br />
europeus coriici a indigenas, que tem concorrido para a consoli<strong>da</strong>ção <strong>da</strong><br />
proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> iiiimobiliaria pertencente ao ramo mais civilisado <strong>da</strong> população<br />
malgache. O artigo 2.0 d'esta lei <strong>de</strong>clara que as disposições do codigo civil<br />
francez só se applicarão á situação juridica dos immoveis matriculados,<br />
quando não se,jam contrarias ao estatuto pessoal dos malgaches, ou ás re-<br />
gras successorias dos indigenas titulares <strong>de</strong> direitos reaes immobiliarios.<br />
To<strong>da</strong> a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena náo matricula<strong>da</strong> está, sujeita ao direito con-
REGIMEN DA PROPRIEDADE<br />
- 387<br />
- -<br />
suetudinario, e como as leis francezas não póem difficul<strong>da</strong><strong>de</strong>s aos contractos<br />
<strong>de</strong> ven<strong>da</strong> <strong>de</strong> immoveis, celebrados entre europeus e indigenas, estes ulti-<br />
mos, ce<strong>de</strong>ndo imprevi<strong>de</strong>ntemente aos colonos as siias melhores terras, vão<br />
caminhando para uma situação ca<strong>da</strong> dia menos lisongeira.<br />
Na Africa Oriental Allemá a or<strong>de</strong>nança <strong>de</strong> 26 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1893<br />
relativa & posse e alienaçáo <strong>da</strong>s terras <strong>da</strong> Corôa <strong>de</strong>termina que, no<br />
caso <strong>de</strong> se tomar posse <strong>de</strong> terras <strong>da</strong> Corôa na proximi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> agglome-<br />
raçúes indigenas, <strong>de</strong>verko ser reservados territorios cuja cultura ou utili-<br />
saçáo satisfaça plenamente as necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s dos indigenas, mesmo na hypo-<br />
these <strong>de</strong> futuro accrescimo <strong>de</strong> população. A mesma lei estatue (artigo 11)<br />
que a concessão <strong>de</strong> terras urbanas <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> um hectare, ou <strong>de</strong> qualquer<br />
extensa0 territorial riistica, feita por indigenas a não indigenas a titulo<br />
<strong>de</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong>finitiva oii <strong>de</strong> aforamento superior a quinze annos, s6 6<br />
perrnitti<strong>da</strong> com auctorisaçáo do governador <strong>da</strong> colonia, sendo nullos os con-<br />
tractos celebrados sem essa auctorisaçáo. O <strong>de</strong>creto colonial <strong>de</strong> 4 <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1898 <strong>de</strong>termina que as commissijes encarrega<strong>da</strong>s <strong>de</strong> arrolar<br />
e <strong>de</strong>terminar as terras <strong>da</strong> Coroa <strong>de</strong>vergo sempre reservar, em torno <strong>de</strong><br />
ca<strong>da</strong> al<strong>de</strong>ia, communa, ou proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> particular pertencente a indigenas,<br />
e para a16m <strong>da</strong>s terras por estes cultiva<strong>da</strong>s, uma area favoravel á cultura,<br />
pouco mais ou menas egual ao qnadruplo <strong>da</strong> siiperficie já cultiva<strong>da</strong>.<br />
Nas possessóeis italianas <strong>da</strong> Erithrêa, cuja colonisaçáo começou em<br />
1885 com a occnpac:áo <strong>de</strong> Massauah, e com a occupação do plató superior<br />
em 1889, a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> eminente <strong>da</strong> totali<strong>da</strong><strong>de</strong> do solo pertencia ao sobe-<br />
rano. Ca<strong>da</strong> uma (Ias tribus, ou linhagens, em que a população se divi<strong>de</strong>, con-<br />
si<strong>de</strong>ra-se <strong>de</strong>scenclente d'um antepassado commum, gosando collectivarnente<br />
<strong>da</strong> posse <strong>de</strong> um territorio subordinado ao direito eminente do soberano.<br />
As terras abandona<strong>da</strong>s, e as que pertencem a tribus incursas em rebeldia<br />
revertem á posse directa do soberano.<br />
A conservaç%o <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> collectiva foi adrnitti<strong>da</strong> elo governo<br />
italiano, como principio fun<strong>da</strong>mental do direito e jurispru<strong>de</strong>ncia para os<br />
indigenas. Os territorios reservados aos indigenas foram <strong>de</strong>clarados inalie-<br />
naveis, a fim <strong>de</strong> assegurar os seus meios <strong>de</strong> subsistencia, contra as conse-<br />
quencias fataes dos contractos arrancados á irnprevi<strong>de</strong>ncia e ignorancia<br />
*
388<br />
- -. . .- - -- - -<br />
POLlTICA INDIGENA<br />
-- -<br />
indigena Iior especiiladores europeus. No intuito <strong>de</strong> evitar erra<strong>da</strong>s inter-<br />
pretaçóes dos costumes indigenas respeitantes ao regimen <strong>de</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />
orearam-se tribunaes compostos <strong>de</strong> officiaes italianos e <strong>de</strong> assessores indi-<br />
gerias com voto consultivo, e <strong>de</strong>cretoii-se a nulli<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as trans-<br />
acçóes territoriaes entre indigenau e eiiropeus ou assimilados.<br />
A constituiçfio do dominio colonial está regula<strong>da</strong> pelo <strong>de</strong>creto real<br />
<strong>de</strong> 19 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 1893, que salvaguar<strong>da</strong> cui<strong>da</strong>dosamente o direito dos<br />
indigenas h posse do solo que occupam, ou dc que venham a carecer para<br />
a sua subsistencia.<br />
Colonias orientaes<br />
No hnnam e no Tonkin, para que os contractos <strong>de</strong> ven<strong>da</strong>s immobiliarias<br />
entre indigenas e europeus sejam validos, é indispensavel que o<br />
ven<strong>de</strong>dor indigcria siibmetta á aiictori<strong>da</strong><strong>de</strong> administrativa franceza, nos<br />
termos do <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 13 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 1886, todo.; os actos relativos ti<br />
transferencia clíi proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>. Como P sabido, snbsistem n'esta colonia as<br />
duas fhrmas intlividiial e collectiva <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena, apresentando<br />
um excesso dtb ~~oriceiitraçáo nas planicies <strong>da</strong> regigo <strong>de</strong>ltica, c sendo bastante<br />
dispersa i10 restante territorio <strong>da</strong> colonia.<br />
Em 1888 o governo do protectorado, <strong>de</strong>sejoso <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolver a pro-<br />
prie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigen,~ no Alto Tonkin, alliviando as terras do Delta <strong>da</strong> popu-<br />
lação superflua, cuja <strong>de</strong>nsi<strong>da</strong><strong>de</strong> exige mais do que a terra po<strong>de</strong> fornecer,<br />
gerando-se d'estt. modo uma <strong>de</strong>ploravel situaçáo <strong>de</strong> pirataria e <strong>de</strong>pre<strong>da</strong>çóes<br />
constantes, <strong>de</strong>ci,t~tou<br />
a concessão perpetua <strong>de</strong> terrenos dominiaes a colonos<br />
indigenas, sob a condição <strong>de</strong> valorisarem as parcellas concedi<strong>da</strong>s, e nunca<br />
superiores a cinco hectares, n'um praso maximo <strong>de</strong> dois annos.<br />
To<strong>da</strong> a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena no Annam e no 'PonBin, continha a es-<br />
tar siibmetti<strong>da</strong> ao direito annamita, e a ser garanti<strong>da</strong> pelos registos jB<br />
existentes antes <strong>da</strong> clominaçáo franceza. Na Nova Caledonia, <strong>de</strong> que o go-<br />
verno francez <strong>de</strong>sejou primeiro fazer uma colonia exclusivamente penal, a
! /<br />
REGIJIEN DA PROPRIEDADE<br />
- - -- 389<br />
-<br />
administração reservou-se pela lei <strong>de</strong> 1855 o direito <strong>de</strong> comprar as terras<br />
aor indigenas. Mo<strong>de</strong>rnamente, a orientacao colonisadora parece obe<strong>de</strong>cer<br />
ao pla~io <strong>de</strong> aproveitar as excellentcs condiçóes locaes para povoamento,<br />
promoveil(10 a immigraçáo <strong>de</strong> colonos francezes que disponliarn <strong>de</strong> c~pitaes<br />
medianos, mas a dispo~iyHo rliie impe<strong>de</strong> aos particiilarc~.: comprarem ou<br />
arren<strong>da</strong>rem terras indieenas ain<strong>da</strong> niio foi revoga<strong>da</strong>. F: r~rtl:~cl~ tamllem<br />
que o dominio colonial chegi~ p~rfeitamente para a colonisac'lo ciiropeia,<br />
visto que a j)»piil~çáo cansca acantoiia(1a nas ~iias reservas, esta <strong>de</strong>crescendo<br />
por uma fdrrna cxtraordinaria, 3eiido ca(l;t v~i, menos importante o<br />
territorio <strong>de</strong>stinado a prover á sua siibsistencia.<br />
Em Talliti e nas nuas <strong>de</strong>penclencias a administração franceza, encontrando<br />
lima popiilaçko indigena, docil, intelligente e muito facilmente civilisavel,<br />
tein conseguido obter a consoli<strong>da</strong>ção e garantia <strong>da</strong> respectiva<br />
proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> por uma serie <strong>de</strong> diplomas legislativos, que inclistinctamente<br />
revelam o <strong>de</strong>sqjo <strong>de</strong> fazer respeitar o:: direitos immobiliarioq clor indigenas.<br />
A proprie<strong>da</strong><strong>da</strong> indigenn divi<strong>de</strong>-se em proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> priva<strong>da</strong>, e terras fnvii-hnu.<br />
Estas ultimas s%o aganagio dos chefes indigenas e siias famiiias que as<br />
possuem plenamente, embora as não possam alienar sem pr6via auctorisa-<br />
ção do governo (Ia colonia.<br />
As ven<strong>da</strong>s territoriscs ftitas por indigenas a europeus careceram<br />
sempre <strong>de</strong> prévio consentimento (Ia ituctori<strong>da</strong><strong>de</strong> franceza, que o podia negar,<br />
ou transferir para b Ert:t(lo o beneficio <strong>da</strong> ven<strong>da</strong>, quando enten<strong>de</strong>sse conve-<br />
niente. Pelo <strong>de</strong>creto rie 17 <strong>de</strong> oiitli1)ro <strong>de</strong> 1871, este conwntimento e to<strong>da</strong>s<br />
as correlativas formali<strong>da</strong><strong>de</strong>s Jixridicas foram tornados extunsivo,q As ven<strong>da</strong>s<br />
entre indigenas. a fim <strong>de</strong> se po<strong>de</strong>r legalisar <strong>de</strong>finitivamenle a sitiiaqTio e os<br />
direitos dos proprictarios indigenas.<br />
Na colonia ingleza <strong>de</strong> Bornéo Septentrional, qiiantlo se conce<strong>de</strong>m<br />
terras aoa curopciis garantem-se rigorobamente os direitos dos indigenas á<br />
i posse (lo solo qiie occupam, e ain<strong>da</strong> a uma certa area circiimscripta ás ter-<br />
ras cultivadns, erii regra, nunca inferior ao triplo <strong>da</strong> snperfcie d'estas<br />
terras. 0s fiinccionarios dos districtos conce<strong>de</strong>m aos indigenas titulos <strong>de</strong><br />
usiifructo e occupaçgo, nos termos <strong>da</strong> ~NotiJication~<br />
<strong>de</strong> 1888, garantindo a<br />
posse commilm ou individual emquanto o imposto <strong>de</strong> capitação fôr regular-
390 POLITICA INDIGENA<br />
mente pago, e as terras forem <strong>de</strong>vi<strong>da</strong>mente cultiva<strong>da</strong>s. A «EJ~.ocltr,nntionn<br />
<strong>de</strong> 22 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 1889, rehrçarido a lettra <strong>da</strong> lei anterior, prescreve<br />
cui<strong>da</strong>dosas medi<strong>da</strong>s anteriores á concessáo dos titulos <strong>da</strong>s novas proprie-<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong>s, <strong>de</strong>stina<strong>da</strong>s a assegurar o respeito pela proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> dos indigenas,<br />
avisando estes <strong>de</strong> tiido o qiie os possa interessar, e fiicilltando-lhes u. nieios<br />
praticc!~ <strong>de</strong> fazerem valer os seus direitos. O mesmo diploma estabelece re-<br />
gras tcncleiites n concentrar grndrialmente as pequenas proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>s dis-<br />
persas, nas reservas incligenas continuas em torno <strong>da</strong>s respectivas al<strong>de</strong>ias<br />
ou commiinitla<strong>de</strong>s, facilitando a concessáo gratuita aos indigenas <strong>da</strong>s ter-<br />
ras vagas n'aqiiellas locali<strong>da</strong><strong>de</strong>s. Como to<strong>da</strong>s as locacócs e aforamentos são<br />
subortlinados aos direitos indigenas preexistentes, todo o colono que inva-<br />
dir as reservas indigenas, ou que prejudicar <strong>de</strong> qualquer maneira os inte-<br />
resses dos indigenas, será immediatamente compellido a retirar-se d'essas<br />
reservas, e a pagar a in<strong>de</strong>mnisayao que a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> administrativa lhe<br />
impuzer.<br />
Nos protectorados <strong>da</strong>s illias Gilbert e Ellice a ven<strong>da</strong> <strong>da</strong>s terras in-<br />
digenas aos não indigenas C illegal, e o seu arren<strong>da</strong>mento s(í po<strong>de</strong>rá effe-<br />
ctuar-se com o consentimento do resi<strong>de</strong>nte inglez.<br />
Nas ilhas hlanahiki, Rakahanga, Tongareva e Puliapiilia, e nos gru-<br />
pos Danger e ITni80, a a1leriaç:Tio <strong>da</strong>s terras é egnitlmente interdicta e a<br />
locaç&o <strong>de</strong>pend,. ila auctorisaçáo do supremo comniissario Gritannico no ar-<br />
chipelego <strong>de</strong> L; ~lomáo. So protectorado <strong>da</strong>s illias Salomáo po<strong>de</strong>m-se adqui-<br />
rir as terras {iidigenas pata estabeleuinientos agricolas ou commerciaes,<br />
mediante a al,l,rovaçáo do co~iiiiiissitrio supremo. Xo caso tlas estaç6es<br />
comrnerciaes 4 io vstarem completamente niontaclas dois annos <strong>de</strong>pois <strong>da</strong><br />
ven<strong>da</strong>, ou as .tbrrai pi\r
REGIMEN DA PROPRIEDADE 391<br />
prie<strong>da</strong><strong>de</strong> matacali subdivi<strong>de</strong>-se em confrarias, e estas em lotes attribuidos<br />
ao uso e occupaçáo <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> individuo (homem ou mulher). Esses lotes p<strong>de</strong>m<br />
ser legados aos filhos, irmãos ou irmãs, mas ficam sempre sojeitos ao di-<br />
reito eminente do chefe do matucnli, como representante <strong>da</strong> collectivi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
immobiliaria. To<strong>da</strong>s as qiiestóes litigiosas referentes á ocriipaçfio <strong>da</strong>s parcellas,<br />
o11 á sua tran~missão legitimaria são resolvi<strong>da</strong>s em iiltjma instancia,<br />
segundo os costumes locaes, pelo chefe do mattccc~li, por si scí, ou presidindo<br />
A assemhleia <strong>da</strong>s diversas ilubdivisfirs communaes. A legislação ingleza<br />
applicavel :i proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena é a ( Il'crtice Lnfids Ordi~zancen <strong>de</strong> 1892,<br />
com as subseqiientes emeii<strong>da</strong>ci. Por esse diploma estabelece-se que nenhuma<br />
terra indigena po<strong>de</strong> ser vendi<strong>da</strong> ou concedi<strong>da</strong>, salvo ao governo <strong>da</strong> colonia,<br />
que tem o direito <strong>de</strong> a comprar em caso <strong>de</strong> necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> publica imperiosa. Os<br />
arren<strong>da</strong>mentos são conseiitidos por um praso maximo <strong>de</strong> 21 annos, e as<br />
h~pothecas ou qiiaesquer outros encargos sobre as terras indigenas sjio<br />
absolutamente probibidoe. N'esta colonia introduziu-se o Acto <strong>de</strong> Torrens<br />
para registo <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> ei~ropeia iinicamente. Em 1802 esho~ou-se uma<br />
tentativa <strong>de</strong> individ~ialisaçáo <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena, nas provocou taes<br />
pertiirbaçóes que a administração ingleza <strong>de</strong>sisti11 promptamente do seu<br />
intento.<br />
Nas ilhas Marschall, Brown e Provi<strong>de</strong>ncia, sol) o protectorado allemão<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> outilbro <strong>de</strong> 1885, e nas ilhas Pleasarit incorpora<strong>da</strong>s no territorio<br />
do protectorado em abril <strong>de</strong> lt.88, a acqiiisição <strong>da</strong> ~roprie<strong>da</strong><strong>de</strong> immobiliaria<br />
estA regulamenta<strong>da</strong> pelos Vwovtlnung~n. <strong>de</strong> 8 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 1887 e 28<br />
<strong>de</strong> junho <strong>de</strong> 1888, que interdizem expressamente a acquieição <strong>de</strong> terras aos<br />
indigenas por compra, troca, doac;áo, oii rlrialquer outra forma, e prohibem<br />
a acquisição <strong>de</strong> quaesqiier direitos reaes sobre os immoveis pertencentes<br />
aos indigentts. A segun<strong>da</strong> <strong>da</strong>s leis cita<strong>da</strong>s leva o rigor a estabelecer, no seu<br />
artigo 2.0, penas <strong>de</strong> prisão e miilta até 5:000 marcos, applicavcis :ios con-<br />
traventores <strong>da</strong>s disposiçóes impeditivau <strong>da</strong>s transtlrçóes imniobiliariau com<br />
os indigenas.<br />
No protector:ido allemáo <strong>da</strong> Nova GiiinB as A~t~veisl~ngen<br />
relativas<br />
á acquisiçáo <strong>de</strong> terras <strong>da</strong> Companhia <strong>da</strong> Nova Guiné, <strong>de</strong>terminam que o<br />
apropriamento <strong>da</strong>s terras <strong>de</strong>ve ser precedido <strong>de</strong> um inquerito cui<strong>da</strong>doso
392<br />
-<br />
POLITICA 1NI)IGENA<br />
-- -- --<br />
que nverigue claramente se as terras em qiiextao são cultiva<strong>da</strong>s »i1 iitilisa<strong>da</strong>s<br />
pelos indigenas, e se n'ellas se encontram signaes exteriores que<br />
<strong>de</strong>monstrem a existencia anterior (1e proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> individual r111 collectiva.<br />
Apparecendo estes indicios, d nc1c8r-is:~rio interrogar os indigenas <strong>da</strong>s proximi<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
r especialmeiite o5 i>liefes <strong>de</strong> farnilia 011 <strong>de</strong> commiini<strong>da</strong><strong>de</strong>s, in<strong>da</strong>gando<br />
qiiem s50 as PrS*oiis com direitos sobre ar terras :t t.onc.e<strong>de</strong>r, e qual<br />
a natiireza e extensso d'rsses direitns. Esses direitos <strong>de</strong>vorii~i scr scnipre<br />
respeitados, po<strong>de</strong>ndo, porém, entrar-se em negociac;óes com os interessados<br />
para a siia ce&io, inediantc compra ou troca livremente acceite. Sr. na terras<br />
pertencem a individuos oii collectivi<strong>da</strong><strong>de</strong>s indigenas, ou se sobre ellas<br />
impen<strong>de</strong>m encargos em beneficio <strong>de</strong> indigenas, a compra ou cessão, sempre<br />
fiscalisa<strong>da</strong>, <strong>de</strong>ve ser feita por contracto t>scripto, <strong>de</strong>terminando-se previamentr<br />
com seguranCa a pessoa ou pessoas qiie, na opinião dos indigenas,<br />
teem o direito pleno <strong>de</strong> alienar essas terras oii esses direitos.<br />
Nas Filipincis os :imcricanos introtliiziram o systema Torrcnq applicando-o<br />
tanto ;i propric.<strong>da</strong>tle dos colonos como á proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena, e<br />
consi<strong>de</strong>ram os iinmoveis indigenas niri<strong>da</strong> riáo matriculados como ~roprie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
plena e allodial, niio estnbelecentlo nenhuma restricção ás transacçóes im-<br />
mobiliarias.<br />
Colonias Portuguezas<br />
Possessfies africanas. - Nas nossas colonias africanas, a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
immobiliaria iiitligena encontra-se geralmente na phase inicial do periodo<br />
agricola, apre-,.ntaiido diversas variantes consoante a organisaçáo social<br />
<strong>da</strong>s difierentes poplilaçúes, e o resultado mais ou menos visivel e pronun-<br />
ciado do influxo civilisador <strong>da</strong> nossa colonisaçáo. Nas rrgiúes menos dire-<br />
ctamente adm~riistra<strong>da</strong>s, a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> terra 4 quasi sempre apanagio<br />
do soba, regulo, fumo, induna ou inhacuana, e os indigenas apenas possuem<br />
individualmente a:: suas mulheres, alhot tas e os tractos <strong>de</strong> terreno que<br />
cultivam. Por vezes mesmo, os productos <strong>da</strong>s varzeas são <strong>de</strong> usiifructo col-
I<br />
REGIMEN DA PROPRIEDADE 393<br />
- -- ______---_I__<br />
lectivo do agrupamento al<strong>de</strong>Ro que as explora. N'algnmas locali<strong>da</strong><strong>de</strong>s os<br />
indigerias, oii só os seiis chefe+. sáo proprietarios (10 gado a eii,ja creaçáo<br />
se <strong>de</strong>dic:arn, n'ontras, a proprirttl;t<strong>de</strong>, incliiinilo R.; rniillieres qiie com generos<br />
se compriim, (! iinicamente producto do traballio agricolii.<br />
Xs SUIL iiiterc:ssaiite theae Regirnen drz P,.oprieritrd~ ~t,c.s Colonias,<br />
apresenta<strong>da</strong> ao congresso colonial <strong>de</strong> IJisbôa <strong>de</strong> 1001, o Sr. Moreira Feio<br />
escreve a este rt?speit,o o seguint,e :<br />
UA propriectadc trrritorial acha-se pois iil~qiielliis riossas colonias no<br />
ultimo tet.mo <strong>da</strong> sii:i tlirrii:~ ah.triic,t:i, pois que ,j& começa a ser infliiencia<strong>da</strong><br />
pelo trabalho, nias c:onserv;i-c;,, ;tili<strong>da</strong> a1)soliitamente inimobilisa<strong>da</strong>, ahsolutamcnte<br />
estavel (: intlivisivel, c., digamos mesmo, Fih~01llt~i~ e indivi(lila1ment,o<br />
jriapropriavel » .<br />
Nas populaçóes mais directamente s~bmett~i<strong>da</strong>s ao contagio social (10<br />
elemeiit,o colonisante, a i<strong>de</strong>ia tla propricdri<strong>de</strong> immol)iliitri;t é já relativamente<br />
niticla, 1. um dos factores qiie mais po<strong>de</strong>rosamente concorrem para o<br />
seu progresso, é notorisinente o commercio introductor <strong>da</strong> moe<strong>da</strong>, qne 6 a<br />
base essericial do habito capitalisador, esse po<strong>de</strong>roso agente fixador do nomadismo<br />
e gerador <strong>da</strong> prol)rie<strong>da</strong>do territorial. A predisposi@o para O<br />
estabelecimento <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> fixa, que é já reconheci<strong>da</strong>mente caracteristica<br />
erri muitas popalaçóes indigenas, pd<strong>de</strong> e <strong>de</strong>ve ser generâlisa<strong>da</strong> aos<br />
agrupamento* rriais atrazados, pela intensificaçiio do commercio até aos<br />
invios recessos cio sertão, e pela orgariisn,:ao do traballio, qiie c! a mola real<br />
<strong>de</strong> toClo o apct,recliamento economico <strong>da</strong>s socie<strong>da</strong>dw. 6. cmonsequentemente do<br />
regimeri iminobiliario.<br />
Na pliase motleriia <strong>da</strong>
394 POLITICA INDIGENA<br />
utilisar. Claro está, as consequencias d'epsa tentativa unitaria que reflecte<br />
bem a indolo porfiad~mente a~similaclora <strong>da</strong> nossa colonisaçáo, nem che-<br />
garam a ser perniciosas porque foram absolutamente iiullas.<br />
A carta <strong>de</strong> lei <strong>de</strong> 21 <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong> 18.56 que organisoii o dominio do<br />
Estado na$ colonias e regiilou a concessáo <strong>de</strong> terras, <strong>de</strong>termina simliles-<br />
mente que sejam exceptuados <strong>da</strong> alienação ou terrenos qiie forem necessa-<br />
rios para logradoiiro dos povos <strong>de</strong> qualquer divisão territorial.<br />
No <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 10 <strong>de</strong> outiibro <strong>de</strong> 1865 encontra-se a primeira refereiicia<br />
A occupaçáo indigeria propriamente dita. O artigo 6, Cj unico, man<strong>da</strong><br />
exceptuar dos terrenos concedidos, os que estiverem preoccupados, 011 em<br />
que os indigenas costumarem fazer as siias sementeiras e plantagúes.<br />
Vinte e cinco annos mais tar<strong>de</strong>, no <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 18 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong><br />
1800, com que Antonio Ennes promoicii a reorganisaçáo dos Prazos <strong>da</strong><br />
Coroa na Zambezia, cstabelece-se qnc as ciiltnras dos colonos indigenas<br />
serão respeita<strong>da</strong>s e <strong>de</strong>fendi<strong>da</strong>s pelos arren<strong>da</strong>tarios dos prazos, que para<br />
ellas <strong>de</strong>ixará0 livre o terreno neieesario, fornecendo gratuitamente aos indigenas<br />
agua, lenha e ~rrmutla, provendo mesmo ao seu sustento em caso<br />
<strong>de</strong> crise alinichriticia.<br />
No <strong>de</strong>creto sobre concessóes ultramarinas <strong>de</strong> 21 <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 1892,<br />
(Ferreira do Amaral), estipula-se que, qiiando o concessionario requerer a<br />
concessáo, <strong>de</strong>\.(: <strong>de</strong>clarar se <strong>de</strong>sejs qiie as p:illiotas dos indigenas permaneçam<br />
nos locars on<strong>de</strong> se acham, oii se,jaiii to<strong>da</strong>s removi<strong>da</strong>s para urna faixa<br />
<strong>de</strong> terreno in(~luid:t na concessão e que scrk <strong>de</strong>limita<strong>da</strong> e marca<strong>da</strong> pelo governo,<br />
por fi;rma que, em qualquer dos casos, junto <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> palhota ou<br />
agrupamento <strong>de</strong> palhottis. se rtvervc, para os indigenas cultivarem. uma<br />
área <strong>de</strong> terrc~iio egual a nm licctare por palliota. No caso <strong>de</strong> preferir a remoçgo<br />
<strong>da</strong>s ptilhotas, terá o concessionario ile pagar a ca<strong>da</strong> indigena uma<br />
in<strong>de</strong>mnisac;ao qiie serii tixatla pelo governador (10 tlistricto, sob informação<br />
<strong>da</strong> auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> superior <strong>da</strong>s terras. Os ,riil(c~c(los levantados entre o concessionario<br />
e 0s indigenas estabelecidos na área <strong>da</strong> siia concess5o serio julga-<br />
dos e resolvidos pela aiictori<strong>da</strong><strong>de</strong> siiperior clas terrau, oii por qiiem exerqa<br />
as siias f~incçóes,<br />
com recurso para o governador tio districto. Estas dispo-<br />
siçóes foram amplia<strong>da</strong>s e intt~rprctatlas pelos regulamentos tle 7 <strong>de</strong> jiilho
IEEGIMEN DA PROPRIEDADE 3:) 5<br />
' -- ----------I-i-___- - _-<br />
<strong>de</strong> 1892 e <strong>de</strong> 7 <strong>de</strong> outnbro do mesmo anno. O primeiro diploma legislativo<br />
que com intelligencia e acerto procuroii resolver a queutiio <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
incligena, n5o meramente reco~il~ecendo e garantindo direitos existentes,<br />
mas <strong>de</strong>sbravando o terreno para tini aperfeiwoameiito progressivo do respe-<br />
ctivo regimrn immobiliario, foi o tlecreto <strong>de</strong> !) <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1899, <strong>de</strong>vido<br />
& esclarecitla iniciativa do Sr. Consclhriro I1:ilii:trclo YilIa~a. N'uma parte<br />
d'esse diploma. que já estiidámos cletiilamente c1ii:rndo nos referimos á orga-<br />
nisação do trabalho obrigatorio nas nossas cololiias, conteem-se algumas<br />
regras intei.essantes, e Tior certo proficuas, com que se procura <strong>de</strong>senvolver<br />
entre indigenas o estabelecimento <strong>da</strong> occupaçáo e exploração effectiva do<br />
solo. Sgo resumi<strong>da</strong>mente as seguintes :<br />
O Estado permitte que em to<strong>da</strong>s as provincias ultramarinas on<strong>de</strong> ha terrenos publicas<br />
+<br />
<strong>de</strong>volutos, incultos e seni applica
<strong>de</strong>ve estipiilar sempre no contrncto <strong>de</strong> alienação qiie esse doiniiiio util ficará reservado aos indi-<br />
genas, como emphyteutas. se clles quizercin sujeitar-sc no I).igniiiento d'iim foro cujn quoti<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
será fixa<strong>da</strong> no mesino contracto. Caso nXo qiirirniii, (1 ;idiliiirt.iite s') po<strong>de</strong>ri <strong>de</strong>sapnssa-los pagan-<br />
do-llics o valor dc to<strong>da</strong>s as bemfeitorias.<br />
Sc c) Estado alienar o dominio utii dc tcricnoj cuja occiil~açàr) iiáo tenha ain<strong>da</strong> durado um<br />
anno, esliqulará no contracto <strong>de</strong> aliena@o qiie o adqiiirente só po<strong>de</strong>rá <strong>de</strong>sapossar os colonos que<br />
estivcrcrn cultivando esses terrenos, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> Ihes pagar o valor <strong>da</strong>s btmfeitorias por elles reali-<br />
sa<strong>da</strong>s. Qltrrlido eleçam indigenas<br />
cultivando parcellas do solo, não po<strong>de</strong>rão espolia-10s em tempo algum, sem lhe2 pagarem as bem-<br />
feitorias qu elles tiverem feito. i E, se esses iiitligenai. tiverciii .r i i : ~ 11ropri;i ci1,t.i. 111:iritado arvores oii plantas vivazes atC<br />
ellas produzirciii, ter80 por esse facto adquirido o doininio iitil i1o.i terrenos cobertos pelas planta-<br />
ções e pelas moradias que junto d'ellas tenhnin co;istriiiJo, nào po<strong>de</strong>ndo os proprietarios exigir<br />
dlelle.j, senha iirn foro annual conio emphyteiitns ou sub-einphyteutai. O valor <strong>da</strong>i benifeitorias<br />
e o quantum do foro sei-80 fixados pelo curador dos iridigenas e approvados pelo governador em<br />
conselho. A's auctorid:i<strong>de</strong>s atliiiiiiistr:itiv;is inciiinl~e n miss3o <strong>de</strong> incitar os indigenas a utilisnrc.ii-se<br />
i<br />
<strong>da</strong>s vantageiis concedi~las por r.t.1 l
BEBIMEN DA PR0PRIEDAI)E<br />
-C --- - -<br />
bases para o respectivo ca<strong>da</strong>stro. Yela lettra <strong>da</strong> lei, as novas terras occupa<strong>da</strong>s<br />
em conformi<strong>da</strong><strong>de</strong> com as suas disposi(;óes náo po<strong>de</strong>m, como dissemos,<br />
ser ob*jecto <strong>de</strong> quaesquer traiisacqóes, quer entre indigenas c colonos, quer<br />
sómente ciitre indiçenxs. 0s ilireitos dos proprietarios iridigeiias que gosem<br />
d'essit (1i~sli<strong>da</strong><strong>de</strong>. in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>da</strong> utilisayáo tlo <strong>de</strong>creto cie I) <strong>de</strong> novembro<br />
<strong>de</strong> IS!)!), acham-se actiialmerite corisigiiudus na carta <strong>de</strong> lei <strong>de</strong> 9<br />
<strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 1!)0I, (lei <strong>de</strong> concess6es Tei.ít?ira <strong>de</strong> Sousa), que reconhece aos<br />
indigenas o direito ií proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> dor terrenos por elles habit~islmente ciiltivados,<br />
que sejam cornprehendido* na espliera <strong>da</strong>s conceesóes, e que reserva,<br />
uma certa area, para Iiabitapáo c. traballio agricola dos qiie alli tenham<br />
resi<strong>de</strong>ncitt e se náo d~diqiiem :i riiltiira. A successrio legitimaria é garanti<strong>da</strong><br />
segundo os usos e costumes locaes, mas, n trans~)zis~Tio por testamento, ou<br />
por ,-,ilnl71ier otttrct fo~.t~z(z,<br />
tJe indigenas para ?&no<br />
indigenus, .fica <strong>de</strong>ppn<strong>de</strong>nte<br />
<strong>de</strong> 1 , I ri// c~~ic~forisnçTio<br />
ou <strong>de</strong> confinnaçTio ctn clicctoritltctl~ ctt1i)zinistrativn.<br />
São nullos todos os actor e contractos com os iiitliqenas, ou com os<br />
seus cliefcs, celebrados contra as disposiqóes dlesta lei, e n'este caso, as<br />
terras H que se referirem sergo incorpora<strong>da</strong>s no dominio i10 Estado, sem<br />
que d'ahi possa resultar acçáo contra o indigena ou contra o Estado. To<strong>da</strong>s<br />
as qiiestóes entre indigenas, relativas a <strong>de</strong>marcação <strong>de</strong> immoveis e a divisáo<br />
<strong>de</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> commiini, ser50 resolvi<strong>da</strong>s em primeira instancia pelo gover-<br />
nador i10 tlistricto, e c111 sc~qiiricta elo governador <strong>da</strong> provincia nos termos<br />
cio. rt~giilamentos.<br />
O diploma cle 2 <strong>de</strong> setembro <strong>de</strong> 1901, que regtilamenta minuciosa-<br />
mente a lei supracita<strong>da</strong>, <strong>de</strong>clara que os direitos dos indigenas á. posse do<br />
solo que occupani ser60 respeitados, náo só nas terras do Estado, como em<br />
to<strong>da</strong>s as concess6es particulares, e que, havendo necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> expropriar<br />
por utili<strong>da</strong><strong>de</strong> publica os imrnoveis indigenas, o Estado se reserva o direito<br />
<strong>de</strong> iii<strong>de</strong>mnisar os e~~ropriandos,<br />
unicamente com terrenos, <strong>de</strong> area e mais<br />
condiçóes, quanto possivel, i<strong>de</strong>nticas ás dos terrenos expropriados.<br />
Este regtilamento <strong>de</strong>termina tambem que os casos em que aos indi-<br />
genas po<strong>de</strong>rão ser conferidos titulos <strong>de</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> perfeita, em re1ac;áo a<br />
terrenm que hajam cultivado oii occupado pelas construcc;óes <strong>de</strong> sua resi-<br />
<strong>de</strong>ricia. por mais <strong>de</strong> vinte annos, sejam regulados por lei especial.<br />
397
398 POLITICA INDIGENA<br />
No seu citado livro c< Helntorios sobr~ Mogarnbique m, o Sr. Conselheiro<br />
Freire dlAndra<strong>de</strong> transcreve integralmente o texto d'uma lei geral<br />
<strong>de</strong> concessáo <strong>de</strong> terrenos n'aquella provincia, que muito recentemente foi<br />
discuti<strong>da</strong> e approva<strong>da</strong> pelo Conselho do Governo. No capitulo IV d'esse regulamento,<br />
referente As concessóes a indigenas, estabelece-se a creaçáo <strong>de</strong><br />
reservas territoriaes, on<strong>de</strong> ser& permittido aos indigenas occupar quaesquer<br />
parcellas, sc.m que tal occupaçáo lhes confira jamais direitos <strong>de</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />
e conce<strong>de</strong>-se al611i d'isso aos indigenas a faciil(1a<strong>de</strong> <strong>de</strong> occupar provisoriamente<br />
terrenos <strong>de</strong>volutos, incultos e nko <strong>de</strong>marcados, fóra d'aquellas reservas<br />
ou <strong>da</strong>s terras <strong>de</strong>stina<strong>da</strong>s ao dominio publico. Para que essa occupaç&o<br />
se consi<strong>de</strong>re legitima <strong>de</strong>ve ser titula<strong>da</strong>, assignala<strong>da</strong> por resi<strong>de</strong>ncia e culturas<br />
habituaes, náo ultrapassar uma certa area territorial, e ser claramente<br />
<strong>de</strong>fini<strong>da</strong> e <strong>de</strong>marca<strong>da</strong>. Para que aos indigenas que, á <strong>da</strong>ta <strong>da</strong> publicação<br />
d'este diploma estejam occupando qaaesquer parcellas <strong>de</strong> terrenos, se<br />
garanta essa occnpa(;ko, é indispensavel que, <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> iim anno, a contar<br />
<strong>da</strong> mesma <strong>da</strong>ta, requeiram por escripto ou verbalmente, o competente titulo<br />
aos respectivos administradores <strong>de</strong> concelho, chefes <strong>de</strong> circiimscripções<br />
civis. oii capitkes-m0res. SKo competantes para fazer concessóes aos indigenas<br />
as menciona<strong>da</strong>s auctori<strong>da</strong>cles administrativas, mas para vali<strong>da</strong>r <strong>de</strong>finitivamentq<br />
o direito e occiiparHo C necessaria a confirmação do secretario<br />
dos NegTos <strong>Indigena</strong>s. As aiiotori<strong>da</strong><strong>de</strong>s administrativas <strong>de</strong>vem fazer,<br />
sem <strong>de</strong>mora, comprehen<strong>de</strong>r claramente aos indigenas os preceitos relativos<br />
1<br />
á titulaç5o e lhes garante o solo qiie occupam, incita-los a aproveitar-se<br />
d'estas dispo iç«es regulamentares tornando-as bem conheci<strong>da</strong>s por intermedio<br />
dos ch fes cafreaes, <strong>de</strong>fendr-10s contra usurpac;ões ou violencias, fiscalisar<br />
o cutnprimento cl'esta lei, awegnrar a conservaçáo dos signaes<br />
naturaes ou artificiaes <strong>de</strong>limitantes <strong>da</strong>s ~arcellas indigenas, e enviar<br />
anniialmente h Secretaria dos Negocios <strong>Indigena</strong>s um <strong>de</strong>senvolvido relatorio<br />
<strong>de</strong> tudo o que na. respectiva afea. jurisdiccional se refira a concessões<br />
indigenas.<br />
O regulamento organisa minuciosamente a tombação <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />
estabelecendo cliie todos os actos e documentos que se refiram ao registro<br />
serão absolutamente gratuitos. 0s pr~prieta~ios indigenas só terão <strong>de</strong>
REGIMEN DA PROPRIEDADE<br />
- -<br />
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pagar a construcçáo <strong>de</strong> marcos <strong>de</strong> alvenaria, quando indispensaveis á <strong>de</strong>-<br />
marcação dos respectivos immoveis, e as custas e sellos do titulo <strong>de</strong> pro-<br />
prie<strong>da</strong><strong>de</strong> plena e seu registro a que teem direito ao fim <strong>de</strong> 20 annos <strong>de</strong><br />
occupação, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que as terras cultiva<strong>da</strong>s sejam pelo menos eguaes a uma<br />
terça parte do predio rnstico. Este titulo <strong>de</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> plena é concedido<br />
pelo governador geral, em <strong>de</strong>ferimento <strong>de</strong> requerimento competentemente<br />
instruido. Emquanto não <strong>de</strong>correr o periodo <strong>de</strong> vinte annos <strong>de</strong> occupação,<br />
é expressamente proliibido ao indigena recorrer ao meio <strong>de</strong> justificação a<br />
que se refere o artigo 595 do Codigo do Processo Civil, e, bem assim,<br />
alienar, trocar, hypothecar ou arren<strong>da</strong>r o terreno, o qual nem mesmo po-<br />
<strong>de</strong>rá ser penhorado ou arrestudo. A transmissão legitimaria <strong>de</strong>verá effe-<br />
ctuar-se segundo regras mol<strong>da</strong><strong>da</strong>s nas disposiçóes do <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 9 <strong>de</strong><br />
novembro <strong>de</strong> 1899 que já transcrevemos. As in<strong>de</strong>mnisaçóes attribui<strong>da</strong>s aos<br />
indigenas (occupantes titula(los), lesados por concessóes a particulares, são<br />
fixa<strong>da</strong>s pelo governador geral, tomando por base o numero <strong>de</strong> palhotas e o<br />
valor <strong>da</strong>s areas cultiva<strong>da</strong>s. As terras indigenas expropria<strong>da</strong>s por utili<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
publica serão substitui<strong>da</strong>s pela concessáo aos expropriandos, <strong>de</strong> outros ter-<br />
renos <strong>de</strong> egual ~uperficie.<br />
Para limitação dos effeitos legaes <strong>da</strong>s estipulaçóes prece<strong>de</strong>ntes, o re-<br />
gulamento <strong>de</strong>termina que seja consi<strong>de</strong>rado indigena c apenas o individuo<br />
<strong>de</strong> ciir natu,raL <strong>da</strong> provin<strong>da</strong> e n'ella resi<strong>de</strong>nte, que, pelo seu <strong>de</strong>senvolvi-<br />
mento moral e intellectual, se náo afaste do commum <strong>da</strong> sua raça ..<br />
h principal novi<strong>da</strong><strong>de</strong> que este diploma insere rS a creaçáo <strong>de</strong> reser-<br />
vas indigenas, naturalmente semelhantes ás <strong>da</strong>s colonias inglezas <strong>da</strong> Africa<br />
do Sul. Quanto ao registro obrigatorio <strong>da</strong> occupação parece-nos que virá a<br />
ficar sensivelmente lettra morta, pelo menos em grandissima parte <strong>da</strong> pro-<br />
vincia, on<strong>de</strong> essas prematuras disposições se po<strong>de</strong>m consi<strong>de</strong>rar pratica-<br />
mente irrealisaveis. Entretanto, não ha duvi<strong>da</strong> que em algumas locãli<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
<strong>de</strong>ve <strong>da</strong>r resultados efficazes, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que se proce<strong>da</strong> com pru<strong>de</strong>ncia e tole-<br />
rancia.<br />
Se ao fin<strong>da</strong>r o prazo d'um anno previsto na lei, ou qualquer proro-<br />
gação tambem prevista, a titulação <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena n5o estiver<br />
effectua<strong>da</strong> na sua quasi totali<strong>da</strong><strong>de</strong>, valerá sempre mais prorogar novamente
400 POLITLCA INDIGENA<br />
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o prazo, ou tolerar simplesmente a occupaçáo do solo a titulo provisorio,<br />
do que promover a acantonamento compellido dos indigenas em quaesqiier<br />
reservas. Os preceitos relativos á limitação <strong>da</strong>s transacçúes immobiliarias<br />
e ao regimen succeisorio sWo couiparaveiu, corno 6 factil verificar, pelo que<br />
<strong>de</strong>ixamos escripto, As iiiu<strong>de</strong>rrias regiilamenta(:r>es (ta proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena<br />
em vigor nas coloniss estrangeiras, coni a priiicipal cxcep~áo (10s r9t;ibelecimentos<br />
fraiicexes, on<strong>de</strong> cni geral 6 rt~coiilirc*i<strong>da</strong> aoh iiidigenas a 1il)er<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> transticcionarem sobre os seus iiriirioveis, pondo-os assim á mercê <strong>da</strong> es-<br />
peculaçáo europeia.<br />
Estado <strong>da</strong> India. - Quando tratámos <strong>da</strong> Inditl Ingleza <strong>de</strong>screvêmos<br />
os tres t,ypos principaes <strong>de</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena que alli existem: com-<br />
muni<strong>da</strong><strong>de</strong>s, terras raiyatvari e zarnin<strong>da</strong>res. Nos fragmentos que na India<br />
nos restam do famoso iinperio com tanto valor. coiic~aistado, a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
indigena, ao tempo <strong>da</strong> conqiiistti, pertencia ex.cliisivamei~te ao typo colle-<br />
ctivo que 03 portiigiicses appelli<strong>da</strong>ram <strong>de</strong> co~nmunitlntles <strong>da</strong>s cil<strong>de</strong>ias. Não C<br />
nosso intuito faaer R liistoria ~iolitica<br />
c a critica economica d'essas institui-<br />
çóes que, <strong>de</strong> ha muito, .;e encontram <strong>de</strong>scriptas pela prnna erudita e aiicto-<br />
risa<strong>da</strong> <strong>de</strong> pacientes investigadores e experimentados indianistas que abso-<br />
Intamente esgotaram o assiimpto. Entretaiito, E conveniente e parece-nos<br />
iitil Q hom~genei<strong>da</strong><strong>de</strong> d'este trabalho, travar as linhas geraes <strong>da</strong> evolução<br />
historica e <strong>da</strong> traiisfurmação organica d'estas corporações que, n'outros<br />
I<br />
tempos, possuiram quasi exclnsivamente o solo aproveitavel <strong>da</strong>s nossas colo-<br />
nias indianas, e que, ain<strong>da</strong> mo<strong>de</strong>rnamente, constituem o principal proprie-<br />
tario immobiliario d'aquellaa regiúes.<br />
As emigraçúes humanas, qiie em tempos immemoriaes, expulsas por<br />
quaesquer inci<strong>de</strong>ntes politicos, ou impiilsionti<strong>da</strong>s por causas economicas,<br />
<strong>de</strong>ixaram as ferteis planuras do Canará e galgaram as alcantila<strong>da</strong>s ver-<br />
tentes dos Ghattes, espalhando-se nas florestas e nas margens flnviaes do<br />
paiz Concáo, organisaram-se collectivamente para possuir e explorar o<br />
solo em associaçúes ptriarchaes, d'on<strong>de</strong> ~rovierarn por lenta evoluçiio e<br />
transformação as communi<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong>s al<strong>de</strong>ias com a sua fórma mo<strong>de</strong>rna.<br />
Na phase primitiva cio povoamento Q natural que ca<strong>da</strong> associação
composta <strong>de</strong> uma só, ou <strong>de</strong> varias familias immigra<strong>da</strong>s, tenha escolhido<br />
para seus dirigentes os chefes <strong>de</strong> familia (chPfes <strong>de</strong> vangor) ou gaocnres, em<br />
cujas mãos ficaram portanto <strong>de</strong>positados os direitos territoriaes e a adminis-<br />
tra('50 completa <strong>da</strong>s (~íiocclrias.<br />
Des<strong>de</strong> a origem d'estas associaçóes, á medi<strong>da</strong> que se iam rnultiplicando<br />
os elementos dos primeiros immigrados, eram os filhos varúes <strong>de</strong><br />
estirpe gáocarial, quando attingiam uma certa e<strong>da</strong><strong>de</strong>, inscriptos como membros<br />
<strong>da</strong>s gáocarias. com direito a uma quota parte; ou jono, dos rendimentos<br />
liquidos <strong>da</strong> communi<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
O organismo collectivo foi progressivamente tornando-se mais complexo,<br />
e, para prover ás ne~p~~i<strong>da</strong><strong>de</strong>s do cnlto religioso e & remuneração<br />
<strong>de</strong> certos misteres attrihiiidos a familias <strong>de</strong> serviclnres cujos <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes<br />
os her<strong>da</strong>vam, forcim concedidos aos pago<strong>de</strong>s e aos servidores os usufructos<br />
<strong>de</strong> algnns immoveis (numoxins). A' primeira corrente <strong>de</strong> immigraçáo, siic-<br />
ce<strong>de</strong>ram-se prolavelniente novas entrad~s <strong>de</strong> immigrantes isolado, Q OU<br />
em<br />
massa, constituindo-se uns em novas gHocarias. e acolhendo-se outros á<br />
protecção <strong>da</strong>s communi<strong>da</strong><strong>de</strong>s agricolas jft existentes. Alli recebidos, era-lhes<br />
geralmente concedido o usufructo <strong>de</strong> parcellas <strong>de</strong> terreno sáfaro e impro-<br />
ductivo que elles cultivavam, e pelas quaes se obrigavam a pagar in perpetuum<br />
uma certa quantia (foro <strong>de</strong> cotubana). Nno obstantrl estii especie <strong>de</strong><br />
donativos e os namoxins ca<strong>da</strong> vez mais numerosos obrigarem as communi<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
a uma impo~tante repartição do solo, a área territorial cu,jo direito<br />
exclusivo era reservado aos gáocares, constituia ain<strong>da</strong> uma gran<strong>de</strong> extensão<br />
impossivel <strong>de</strong> valorisar sem a intervenção do trabalho <strong>de</strong> servos (culacharins).<br />
A concorrencia d'estas diversas classes a <strong>de</strong>ntro <strong>da</strong> collectivi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
impoz, como E obvio, successivas modificaqóes ten<strong>de</strong>ntes ao equilibrio economico<br />
<strong>da</strong> associação.<br />
No seu primoroso livro «As Com~nunido<strong>de</strong>s I)bdianns <strong>da</strong>s Velha<br />
Conpuistas~, escreve o Sr. Conselheiro Teixeira (rluimarães o seguinte:<br />
403 POLITICA INDIGENA -.<br />
outra parte para beneficio directo dos gãocares, sendo o seu producto <strong>da</strong><br />
natureza <strong>de</strong> divi<strong>de</strong>ndo fiotio pe$soul), e ain<strong>da</strong> um terceiro quinhão para<br />
sustentaçáo e salario dos culacharins.<br />
l)o segundo lote, as terras <strong>de</strong> inferior quali<strong>da</strong><strong>de</strong>, separou-se uma<br />
parte cujo usufructo (ntcmoxins) pertenceria aos pago<strong>de</strong>s, seus servidores e<br />
servidores <strong>da</strong> commiini<strong>da</strong><strong>de</strong> (vantellos, vantellis, parpotis), outra foi applica<strong>da</strong><br />
ás servidóes, como estra<strong>da</strong>s, pastos communs, campo para sacrificios,<br />
para cremaçóes, etc. ; ain<strong>da</strong> a ultima parte ficou reserva<strong>da</strong> para os aforamentos<br />
in perpetuurn (cotirbunn), e para os arren<strong>da</strong>mentos temporarios<br />
(foro corrente) servindo as <strong>de</strong>signaçóes - gorrnan<strong>da</strong>, culagor, gorbata, tican<br />
-para indicar a applicaçáo que po<strong>de</strong>ria ter a terra <strong>da</strong><strong>da</strong> <strong>de</strong> aforamento<br />
ou <strong>de</strong> ren<strong>da</strong>.<br />
Foi, porém, mais longe a reorganisação do estado social. Affirmando-se<br />
terminantemente a existencia do patriciado gáocarial, estabeleceu-se que<br />
a quali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> gáocar se náo podia per<strong>de</strong>r, e que a gerencia dos negocios<br />
<strong>da</strong> communa 96 cabia aos que tiriham aquelle titulo. Lançando por esse<br />
tempo as bases <strong>de</strong> ama incipiente organisacáo politica, formulou-se um<br />
codigo <strong>de</strong> penas e premios (morta<strong>da</strong>s), e investiu-se o conselho dos gáocares<br />
em urna magistratura administrativa e judicial, suprema e <strong>de</strong>cisiva.. Quando<br />
se impôz ás communi<strong>da</strong><strong>de</strong>s a suzerania <strong>de</strong> um imperante politico, ou pelo<br />
direito <strong>da</strong> força, ou porque aquellas collectividt<strong>de</strong>s voluntariamente se tenham<br />
acolhido á egi<strong>de</strong> d'um soberano capaz <strong>de</strong> as proteger contra os inimigos<br />
externos, foi-lhes sempre reconhecido pelas successivas dynastias, o<br />
direito á posse plena do solo que occupavam. O imposto cobrado pelos monarchas<br />
hindus parece ter sido, na opiniáo dos mais proficientes indianistas,<br />
espontaneame~te otFerecido como acto <strong>de</strong> ostensiva mas voluntaria submissão.<br />
Com o agrnpamento <strong>da</strong>s gáocarias em uni<strong>da</strong><strong>de</strong> nacional as funcçóes<br />
administrativas siiperiores e a magistratura judicial passaram a ser exerci-<br />
<strong>da</strong>s por funccionarios nomeados pelo soberano, tana<strong>da</strong>res, <strong>de</strong>nominação esta<br />
qiie se conservou até a uma epocha bastante recente. Com o advento do<br />
periodo <strong>da</strong>s guerras, ataques e incursóes musulmanas que durou sete lon-<br />
gos seculos, transitaram as communi<strong>da</strong><strong>de</strong>s indigenas <strong>da</strong> feliz tranquilli<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
que usufruiam, para uma situação permanentemente angustiosa, ameaçadora,
REGIMEN DA PROPRIEDADE<br />
--- --<br />
403<br />
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e com muita difficul<strong>da</strong><strong>de</strong> siistentavel. h cruel<strong>da</strong><strong>de</strong> dos arabes e as suas<br />
funestas <strong>de</strong>pre<strong>da</strong>çóes, <strong>de</strong>vastavam os campos e a pacifica população hindu.<br />
0s foreiros, ren<strong>de</strong>iros, e culacharins, gente humil<strong>de</strong> e tendo pouco a<br />
per<strong>de</strong>r, escapavam com maior facili<strong>da</strong><strong>de</strong> á morte e á per<strong>da</strong> total dos seus<br />
bens, voltando-se geralmente as hor<strong>da</strong>s incursoras do Islam contra a classe<br />
gãocarial, tambem mais fun<strong>da</strong>mente feri<strong>da</strong> nos seus interesses materiaes.<br />
A gran<strong>de</strong> dureyáo do periodo em que. mais ou menos, se repetiram as<br />
correrias dos arabes aportados tis praias concanicas, e a <strong>de</strong>struição e roubo<br />
<strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> communal que quasi sempre eram consequencia <strong>da</strong>s incur-<br />
sóes mahometanas, conduziram as gáocarias a uma situação economica<br />
muito pecaria, vendo-se os giiocares reduzidos á necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> ft~vorecer<br />
os<br />
seus ren<strong>de</strong>iros com a emissão <strong>de</strong> titulos <strong>de</strong> comparticipaçáo nos rendimen-<br />
tos communs, (tnnyn.~ <strong>de</strong> cunto). Parece po<strong>de</strong>r attribuir-se a essa epocha a<br />
creação <strong>da</strong> nova classe <strong>de</strong> associados, cuntocares, portadores d'esses titulos<br />
que o Sr. Conselheiro Teixeirã Guimarkes <strong>de</strong>screve nas seguintes palavras:<br />
a Eram esses titulos limitados por numero fixo, náo conferiam aos<br />
possuidores o direito <strong>de</strong> interferencia nos negocios communaes ; tinham ga-<br />
rantia no rendimento <strong>da</strong>s varzeas (tangas <strong>de</strong> cunto <strong>de</strong> recanto), ou no dos<br />
palmares, arecaes, etc., (tangas <strong>de</strong> uanti, nriqueiras, melagns, cutins, etc.), e<br />
parece que se não podiam alienar, sem que primeiramente se fizesse trans-<br />
acção sobre a terra sua garantia, por isso que sd no seculo XVII, se en-<br />
contra noticia <strong>de</strong> se fazerem negociaçóes distinctas sobre as ditas tangas D .<br />
A proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s terras pertenceu invariavelmente á classe dos<br />
gãocares até que, com o estabelecimento <strong>da</strong> soberania musulmana, o im-<br />
posto cozi-vorado, até então recebido pelos principes hindus, assumiu o cara-<br />
cter d'um tributo feu<strong>da</strong>l ou censo emphyteutico, e o soberano arabe passou<br />
a ter a posse eminente <strong>de</strong> todo o solo dominado em nome do Propheta. A<br />
dominação portugueza, que breve seguiu a ephemera occupação musulmana<br />
do Concáo, manteve o mesmo principio, consi<strong>de</strong>rando to<strong>da</strong> a terra proprie-<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> Corôa lusitana, e as communi<strong>da</strong><strong>de</strong>s agricolas simples foreiros.<br />
Estas differenças theoricas passaram indifferentes ou <strong>de</strong>sapercebi<strong>da</strong>s ás<br />
gáocarias, a quem unicamente po<strong>de</strong>ria preoccupar uma possivel elevqáo do<br />
quantuw do imposto que Ihes era exigido. *
404 POLITICA INDIGENA<br />
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Afforiso <strong>de</strong> Alboqiierqne, conquistando Gõa em 1310, e substituindo O<br />
dominio portuguez ao dominio miisiilmaiio, iniciou <strong>de</strong>s<strong>de</strong> logo a sua admi-<br />
ravel politica <strong>de</strong> attracçáo do elemento Iiindu. As proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>s musul-<br />
manas foram violentamente sequestra<strong>da</strong>s, em nome do direito <strong>de</strong> conqiiista,<br />
e distribui<strong>da</strong>s pelos portuguezes, ficando as gáocarias exonera<strong>da</strong>s <strong>da</strong> obri-<br />
gaçáo <strong>de</strong> pagar a parte do tributo correspon<strong>de</strong>nte a essas terras.<br />
Foram guar<strong>da</strong>dos os usos e costumes <strong>da</strong>s al<strong>de</strong>ias e permaneceram<br />
intactos os seus liniites. 03 tana<strong>da</strong>res passaram a ser nomeados pelo go-<br />
verno portuguez, e El-Rei <strong>de</strong> Portugal, approvando a politica <strong>de</strong> Albu-<br />
querque e <strong>de</strong>sejando confirmar as promessas <strong>de</strong> tolerancia que este fizera,<br />
escolheu em 1515, para primeiro <strong>de</strong>sempenhar aquelle cargo, a ,Toá0 Ma-<br />
chado, nco pelo que este se houvesse assignalado na conquista, ?nau pelo<br />
muito que constava snher dos usos e costurnes <strong>da</strong> gente indiano.<br />
No primeiro periodo <strong>da</strong> dominação portugueza predominaram as pra-<br />
ticas tolerant,es <strong>da</strong> politica indigena, crija efficiencia o genio do gran<strong>de</strong><br />
Albuquerque previra algiins seculos antes <strong>da</strong>s naçóes civilisa<strong>da</strong>s a reco-<br />
nhecerem. A politica tlo valoroso capitáo <strong>de</strong>staca-se principalmente <strong>da</strong> que<br />
os inglezes seguem no seu imperio <strong>da</strong>s Indias, pela i<strong>de</strong>ia dominante <strong>de</strong><br />
obter a fixaçáo <strong>da</strong> raça portiigueza pela colonisaçiio e pela mestiçagem.<br />
As terras sequestra<strong>da</strong>s aos moiiros eram doa<strong>da</strong>s aos portuguezes cazados<br />
ou que quizerem cazar com mulheres hindus e ficar residindo na India.<br />
Por carta patente <strong>de</strong> 15 <strong>de</strong> março <strong>de</strong> 1518 fez El-Rei I). Manuel mercê e<br />
doação .aos portuguezes já cazados em Gôa, como aos que ao diante a<br />
ella fossem cazados, ou n'ella se cazassem e assentassem viven<strong>da</strong>, <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s<br />
as terras que <strong>de</strong> direito pertencessem ao mesmo Rei, e que fossem já<br />
aproveita<strong>da</strong>s! assim aqiiellas que ficaram dou mouros que, ou haviam mor-<br />
rido na conquista <strong>da</strong> ci<strong>da</strong><strong>de</strong>, ou d'ella se haviam ausentado para on<strong>de</strong><br />
ficassem a salvo <strong>da</strong>s armas portuguezas, como qiiaesquer outras terras.<br />
Man<strong>da</strong> outrosim que as terras, que náo aproveita<strong>da</strong>s <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a ilha <strong>de</strong><br />
Gôa, se dêem <strong>de</strong> sesniaria aos cazados portuguezes ou a quaesquer outros<br />
que <strong>de</strong> outras partes forem, <strong>de</strong> quaesquer naçóes que sejam; tudo segundo<br />
as or<strong>de</strong>naç6es e regimentos dos reinos <strong>de</strong> Portugal. Descontentou esta<br />
carta a portuguezes e a naturaes; e logo na volta <strong>da</strong>s naus requereram
-<br />
REGIMEN DA PROPRIEDADE<br />
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105<br />
contra ella a El-Rei man<strong>da</strong>ndo a ci<strong>da</strong><strong>de</strong>, isto é, os portngii~zrs n'ella<br />
moradores, um procurador seu especial ao reino n 'tratar este negocio.<br />
Deu El-Rei ouvidos ás duvi<strong>da</strong>s que lhe representaram, e aos 24 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zem-<br />
bro <strong>de</strong> 1519, mandou por outra carta que as terras, que se hoiivesuem <strong>de</strong><br />
repartir pelos portuguezes cazados, fossem só as dos moiiros. E cliianto ás<br />
oiitras que havia man<strong>da</strong>do <strong>da</strong>r <strong>de</strong> sesmariti. que as tivessem os naturaes <strong>da</strong><br />
terra, isto 8, as communi<strong>da</strong><strong>de</strong>s, como sempre as tiveram, pagando o9 direi-<br />
tos que <strong>de</strong>vessem ;ia forma do costume. (')<br />
O governo <strong>da</strong>s communi<strong>da</strong><strong>de</strong>s nos primeiros tempos <strong>da</strong> occiipação por-<br />
tiigiieza corria, como dissemos, segundo os usos e costumes que os dominado-<br />
res trabalhavam por guar<strong>da</strong>r. Comtudo levantavam-se a ca<strong>da</strong> passo duvi<strong>da</strong>s<br />
e conten<strong>da</strong>s sobri? qual era o costume. J6 Affonso d'illbuquerqiie previra<br />
que, para resolver estas duvi<strong>da</strong>s e assentar iima norma <strong>de</strong> conducta certa,<br />
seria riecessario obter ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira informaçáo dos usos e costiimes <strong>da</strong>s com-<br />
muni<strong>da</strong><strong>de</strong>s e 1ançA-la em registro aiithentico e imperativo. Foi o que fez o<br />
vedor <strong>da</strong> fazen<strong>da</strong> Affonso Mexia promulgando em 1526, sendo governador<br />
<strong>da</strong> India Lopo Faz <strong>de</strong> Sampayo, o celebre Foral dos Usos e Costumes lon-<br />
gamente preparado por consulta aos lettrados indianos, e cuja applicaçáo<br />
já náo pou<strong>de</strong> ser dirigi<strong>da</strong> pelo seu ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro inspirador, o conqiiistador <strong>da</strong><br />
India Portngueza.<br />
O Foral contirma á gkocaria o nome <strong>de</strong> cnmartc, consi<strong>de</strong>ra as fun-<br />
cçóes <strong>de</strong> gáocar e tle escriváo como cargos publicos, regiila as obrignçóes<br />
d'aquelles officiaes, os seus direitos e regalias ; dá os preceitos para melhor<br />
aproveitamento <strong>da</strong>s terras, prescreve o modo como a fazen<strong>da</strong> dos tlefiinctos<br />
passarh a seus her<strong>de</strong>iros, e, n'esta parte é muito minucioso, prevendo os<br />
('asos em que esses bens <strong>de</strong>vem reverter para a Corôa e fisco real ; indica<br />
as formali<strong>da</strong><strong>de</strong>s que o accordo ou nem <strong>da</strong> camara gãocarial <strong>de</strong>ve ter para<br />
ser valido ; reconhece a cawbnrn geral como representante dc to<strong>da</strong>s as al<strong>de</strong>ias<br />
e gáocarias particulares; d& aos livros <strong>da</strong> aI<strong>de</strong>ia O caracter <strong>de</strong> reçistros<br />
prediaes, para por elles se provar e jiistificar o direito <strong>de</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> ;
406 POLITICA INDIGENA<br />
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constitue os gãocares, que ain<strong>da</strong> então, em gran<strong>de</strong> maioria, ciram gentios,<br />
como adjuntos ao tana<strong>da</strong>r-mcir no julgamento <strong>de</strong> certos crimes ; etc., etc.<br />
Para evitar os conflictos que frequentemente se <strong>da</strong>vam entre portu-<br />
giiezes e naturaes, maiidoii Affonso Mexia qiie nentiiim portiigriez poddsse<br />
comprar, na ilha <strong>de</strong> Gôe, fazen<strong>da</strong> <strong>de</strong> gentio, nem outra qualquer que se<br />
ven<strong>de</strong>sse por conta <strong>da</strong> Corôa. Esta medi<strong>da</strong> foi <strong>de</strong>pois man<strong>da</strong><strong>da</strong> revogar em<br />
parte pelo rei <strong>de</strong> Portiigal, com prece<strong>de</strong>ncia <strong>de</strong> consulta ao governador Lopo<br />
Vaz <strong>de</strong> Sampayo.<br />
O Foral que <strong>de</strong>u satisfação geral á popiilação hindu foi na reali<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
pela sua natureza <strong>de</strong> diploma imperativo a base e pretexto cle to<strong>da</strong> a futura<br />
ingerencia <strong>da</strong> administraçáo portugneza nos negocios <strong>da</strong>s commurii<strong>da</strong><strong>de</strong>s. A<br />
titulo <strong>de</strong> esclarecimento iam-se publicando successivos <strong>de</strong>cretos que alte-<br />
ravam a lettra do Poral, ou pelo menos <strong>de</strong>svirtuavam o espirito <strong>da</strong>s suas<br />
or<strong>de</strong>naçóes.<br />
Os proprietarios indigenas iam vendo os seus direitos serem frequen-<br />
temente postergados, e to<strong>da</strong> a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> commiinal soffreu intensamente<br />
durante a era <strong>da</strong>s implacaveis e barbaras perseguiçóes religiosas. Todos os<br />
bens (10s que pereciam nas fogueiras cla inquisição, ou dos que se refugiavam<br />
em paiz estrangeiro, para escapar ás violencias e aos crimes do <strong>de</strong>sorientado<br />
proselptisnio religioso dos doniinadores, eram confiscados pelo ti-co real e<br />
segiii<strong>da</strong>merite vendidoh oii doados a portuguezes.<br />
Como as gáocari;is tB csc.rc\,;ininhas eram reputa<strong>da</strong>s cargos publicas,<br />
coniepram a setr pediil;ts por portiigaezes, cm recompensa <strong>de</strong> serviços, sendo<br />
freqiientemeiit,e concc~litlas oii vendi<strong>da</strong>s em hasta publica aos naturaes do<br />
reino. 12 facil <strong>de</strong> supli(,r a perturbaçgo que os sol<strong>da</strong>dos portilguezes Hrvo-<br />
rados em gãocares e escrivães occasionaram na vi<strong>da</strong> e na administraçáo<br />
<strong>da</strong>s communi<strong>da</strong><strong>de</strong>s. Niio tar<strong>da</strong>ram as reclama~óes, man<strong>da</strong>ndo entáo El-Rei<br />
D. Sebastião, e mais tar<strong>de</strong> Fillippe I, que fosse mantido e respeitado o Foral<br />
dos Usos e Costumes. Esta lei estava, porem, já tão altera<strong>da</strong> transtorna<strong>da</strong><br />
pelas subsequentes modificaçúes, que na ver<strong>da</strong><strong>de</strong> se podia afirmar não ha-<br />
ver legislação <strong>de</strong>fini<strong>da</strong> que garantisse aos natilraes o reconhecimento e<br />
segurança dos seus direitos territoriaes.<br />
Por este motivo, os gãocares, fartos <strong>de</strong> verem os seus interesses sa-
BEGIMEN DA PROPRIEDADE<br />
crificados rio arbitrio variavel dos governantes, cÓmeçaram a alienar por<br />
-.<br />
407<br />
ven<strong>da</strong> ou cessão as suas qiiotas <strong>de</strong> divi<strong>de</strong>ndo commiinal oii jonos pessoaes,<br />
reservando-se sempre as honras e prerogativas inherentes aos seus cargos.<br />
Satisfazendo uma reclamação <strong>da</strong> cctmnra yernl, que assistia ao empobrecimento<br />
e quasi diseoliiqão <strong>de</strong> muitas communi<strong>da</strong><strong>de</strong>s, ieeolveu a administraçfio por-<br />
tugueza prohibir aos gãocarfs a alienscíio dos seus jonos. Foi então, em<br />
pleno seculo xv11, que tiveram principio as tranearçóes sobre os tangas<br />
<strong>de</strong> cunto, in<strong>de</strong>yen<strong>de</strong>ntcmente <strong>de</strong> qualquer acto relativo ás terras que as<br />
garantiam. Aesim ee <strong>de</strong>senvol\en rapi<strong>da</strong>mente a claese dos cztntocares,<br />
simples accionistas, sem direito a interferir nos negocios <strong>da</strong> commiini<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
Náo sendo muito justo que os primitivos ciintocarep, e a nova classe dos<br />
accionistas não ti\eesem o minimo direito a fiscalisar a administração dos<br />
seus interesses, e fossem privados do ensejo <strong>de</strong> licitar pelos fraudulentos<br />
conliiios $os gáocares por cuja voz se fazia a licitayáo, não tardou muito<br />
a <strong>de</strong>clarar-se uma ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira e insistente campanha entre aquellas duas<br />
classes, uma reivindicando os seus direitos historicos, e outra pugnando pelos<br />
seus interesses materiaeu.<br />
Aos protestos dos cuntocares procurou-se <strong>da</strong>r remedio com o Regi-<br />
mento <strong>da</strong>s Communi<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> 15 <strong>de</strong> junho <strong>de</strong> 1735, que nem conseguiu re-<br />
solver a questão, nem tão pouco conciliou os odios e reseiitimentos, princi-<br />
palmente acirrados na classe dos accionistas pelas i<strong>de</strong>ias <strong>de</strong> egual<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
humana préga<strong>da</strong>s por miisiilmanos e christáos, que mais odiosa lhes faziam<br />
parecer a situação crea<strong>da</strong> pelo regimen <strong>da</strong>s castas.<br />
As reclainaçóes dos cuntocares e culacharins não cessavam, e em<br />
-1820 chegaram a pedir a extincção <strong>da</strong>s communi<strong>da</strong><strong>de</strong>s, pedido que, com O<br />
patrocinio do governo geral, renovaram em 1861, náo consegnindo ain<strong>da</strong> en-<br />
tgo vêr realisa<strong>da</strong>s as suas aspiraçóes.<br />
Em 16 <strong>de</strong> setembro <strong>de</strong> 1880 foi publicado um <strong>de</strong>creto reorganisando<br />
as communi<strong>da</strong>(les, regulamentado pelo Regimento <strong>de</strong> 1882 que permittiu a<br />
dos ciintocares na administração, fazendo-se representar os seus<br />
interesses por gãocares, ad hoc nomeados, o que evitava a dissolução <strong>da</strong>s<br />
associagóus inevitavel se se permittisse a ingerencia directa dos cuntocares<br />
ias funcçóes historicamente adstrictas ao patriciado gãocarial.
408 -<br />
POLITICA IXDIGENA<br />
. - -. -<br />
Este Regimento pouco tempo vigorou, mas foram manti<strong>da</strong>s pelo di-<br />
ploma que o supprimiu muitas <strong>da</strong>s suas disposiçóes, aclara<strong>da</strong>s (?) <strong>de</strong>pois<br />
pelas portarias <strong>de</strong> 8 <strong>de</strong> julho e 4 <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong> 1884 e <strong>de</strong> 11 <strong>de</strong> fevereiro<br />
e 16 <strong>de</strong> março <strong>de</strong> 1886.<br />
Os negocios <strong>da</strong>s communidii<strong>de</strong>s suejeitos a tima legislação diibia, in-<br />
certa e contradictorin, tinham cahido n'um estado cahotico, n'iima extraor-<br />
dinaria confusáu.<br />
A portaria <strong>de</strong> 6 <strong>de</strong> jnllio <strong>de</strong> 1884 mandou proce<strong>de</strong>r a uma nova re-<br />
gulamentação cui<strong>da</strong>dosa <strong>de</strong> todos os preceitos legaes em vigor, nomeando<br />
uma comrnissiio especial que terminou os seus trabalhos em 1886, tendo sido<br />
man<strong>da</strong>do approvar, por portaria <strong>de</strong> 30 <strong>de</strong> outubro <strong>de</strong> 1886, do governador<br />
Conselheiro Perreira do Amaral, o novo regulamento <strong>da</strong>s conimuni<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />
Os erros <strong>da</strong> administraçiio portugueza, as <strong>de</strong>ficiencias economicas <strong>da</strong><br />
organisaçáo <strong>da</strong>s cotnmuni<strong>da</strong><strong>de</strong>s tiio bem estu<strong>da</strong><strong>da</strong>s pelo Sr. Conselheiro<br />
Teixeira Guimarbes no seu citado livro, e a rapi<strong>da</strong> <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncia geral d'esstis<br />
instituiçóea, levaram ao convencimento do commissario regio Neve3 Fer-<br />
reira a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> impreterivel <strong>de</strong> promover a <strong>de</strong>satnortisação dos respe-<br />
ctivos bens immpveis. O <strong>de</strong>creto provincial <strong>de</strong> 25 <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong> 1806 <strong>de</strong>s-<br />
creve com bastante exactidão tr ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira situação <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
indigena nos consi<strong>de</strong>randos preliminares que a seguir transcrevemos na<br />
integra.<br />
c Consi<strong>de</strong>rando que as commnni<strong>da</strong><strong>de</strong>s teem perdido com o <strong>de</strong>correr<br />
do tempo o typo caracteristico e com elle as vantagens inherentes á sua<br />
primeira orgasisaçao, <strong>da</strong>ndo presentemente escassos resultados, seja pelo<br />
cerceamento dos sciis bens produzido por siiccesuivas e crescentes usurpa-<br />
çces, seja pelo progressivo :iiigrnento <strong>da</strong> população interessa<strong>da</strong>;<br />
Consi<strong>de</strong>rando cliie o principio <strong>da</strong> <strong>de</strong>samortisaçáo <strong>da</strong> terra não 6 hoje<br />
impugnado por pesqoa algtima e já foi applioado pelo <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 14 <strong>de</strong><br />
setembro <strong>de</strong> 1880 aos cstabelecirnentos e corporaçúes religiosas d'este<br />
Estado, tendo sitio tambem consignado, embora sob rima outra variante<br />
no artigo 12 do Regimento <strong>de</strong> 30 <strong>de</strong> março <strong>de</strong> 1882, ora <strong>de</strong>rogado;<br />
Consi<strong>de</strong>rando que o systema communal adoptado pelos fun<strong>da</strong>dores<br />
d'aquellas associaçóes aldm <strong>de</strong> ter restado n'outras eras relevantes servi'
REGIMEN D h PROPRIEDADE 409<br />
00s á India, offerece ain<strong>da</strong> hqje to<strong>da</strong>s as vantagens do espirito associativo<br />
e convem por isso mantê-lo, mas <strong>de</strong> fúrma que as suas iitili<strong>da</strong><strong>de</strong>s se conci-<br />
aliem n5o s6 com a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> terra, que é uma <strong>da</strong>s maiores conquistas<br />
economicas do seculo, mas tambem com os interesses <strong>da</strong> fazen<strong>da</strong> nacional;<br />
Consi<strong>de</strong>rando que a <strong>de</strong>samortisação a effectuar necessita impreteri-<br />
velmente garantias cxcepcionaes, não s6 para salvaguar<strong>da</strong>r os interesses<br />
legitimos <strong>da</strong>s associaç8es, mas ain<strong>da</strong> os d'aquelles que preten<strong>de</strong>m concorrer<br />
& licitação ;<br />
Consi<strong>de</strong>rando que em assumpto <strong>de</strong> tanta importancia e gravi<strong>da</strong><strong>de</strong> é<br />
essencial que a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> se apresente na praça, o mais possivel, <strong>de</strong>sem-<br />
baraça<strong>da</strong> <strong>de</strong> litigios, porque só assim se impor& ao publico confiança abso-<br />
luta na opera
410 POLITICA INDIGENA<br />
<strong>de</strong> todos os recursos que sem grave perturbação e injustiça possam ser exigidos<br />
em razoavel proporção ;<br />
consi<strong>de</strong>rando que as acçúes <strong>da</strong>s communi<strong>da</strong><strong>de</strong>s, livres até hoje <strong>de</strong> qual.<br />
quer imposto e entrando como um factor importante em to<strong>da</strong>s as transacçúes<br />
<strong>da</strong> vi<strong>da</strong> civil, po<strong>de</strong>m supportar uma taxa <strong>de</strong> sello que não influa directamente<br />
na soa circulação ou actos em que as mesmas figurem e garantam;<br />
bem, ueando <strong>da</strong>s facul<strong>da</strong><strong>de</strong>s que me confere o <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 22<br />
o, <strong>de</strong>cretar o seguinte:<br />
Artigd 1 .O - E facultado ás camaras agrarias, torofos, e communi<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
agricolab do Estado <strong>da</strong> India o promoverem a <strong>de</strong>samortisação dos seus<br />
bens immovkis por meio <strong>da</strong> ven<strong>da</strong> ou aforamento perpetuo em hasta publica<br />
......................................... ................. B<br />
O Sr. Consellieiro Teixeirn Guimarães, advogando a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong><br />
creaqáo <strong>da</strong> gran<strong>de</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> agricola para promover o resurgimento eco-<br />
nomico <strong>da</strong> colonia, propozera em 1886, um regulamento <strong>da</strong>s communi<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
<strong>de</strong>stinado a obter, quanto poesirel, a extincçáo dos aforamentos e arren<strong>da</strong>-<br />
mentos, e a itnificação <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> territorial para que esta passasse a,<br />
ser directamente explora<strong>da</strong> pela collectivi<strong>da</strong><strong>de</strong> por meio <strong>da</strong> gran<strong>de</strong> cultura.<br />
O Commissario regio Neves Ferreira, vendo a mesma questão sob um<br />
ponto <strong>de</strong> vista inteiramente diverso, promoveu pelas razóes transcriptas<br />
uma <strong>de</strong>samortisa(ão que pelo menos acarretou fatalmente a disso1uc;áo <strong>da</strong>s<br />
communi<strong>da</strong><strong>de</strong>s commissas, isto é, <strong>da</strong>s collectivi<strong>da</strong><strong>de</strong>s insolventes ,jh directa-<br />
mente encampa<strong>da</strong>s :i camara agraria.<br />
O problema é Imstante melindroso e difficil <strong>de</strong> resolver. Se a pertur-<br />
bação economica, d(.vido ti lei <strong>de</strong> 1896, e ao regulamento para sua execução<br />
man<strong>da</strong>do approvar l)or ~ortaria<br />
provincial <strong>de</strong> 1 <strong>de</strong> fevereiro <strong>de</strong> 1897, já<br />
não po<strong>de</strong> ser grandcb. attento o actual <strong>de</strong>scalabro administrativo e financeiro<br />
<strong>da</strong>s communi<strong>da</strong><strong>de</strong>s iigricoltis, t! comtudo para lamentar que se náo busqiie<br />
assegurar por to<strong>da</strong>s as formas a existencia d'essas sym~athicas<br />
associaç6es<br />
que não se limitando a possuir e explorar a terra, são origem <strong>de</strong> numerosa><br />
obras <strong>de</strong> previ<strong>de</strong>ncia e soccorro com gran<strong>de</strong> beneficio para OS seus associ:i-<br />
dos. Para terminar este ligeirissimo estudo <strong>da</strong> forma essencial <strong>da</strong> proprie-<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena nas nossas possessíies indianas é indispensavel dizer algiimtt-
palavras sobre a generali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> mo<strong>de</strong>rna str~ictara organica <strong>da</strong>s commu-<br />
ni<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />
Ca<strong>da</strong> communi<strong>da</strong><strong>de</strong> r: forma<strong>da</strong> <strong>de</strong> componentes por direito <strong>de</strong> nascimento<br />
(gfio-car~s, rwlnchtrrins, ,joltoeiros i e <strong>de</strong> cuntocarcs ou acci~r~istas. O<br />
regulamento <strong>de</strong> 30 <strong>de</strong> oixtilbro <strong>de</strong> 1886, ortlrrioii que o interesse alienavel<br />
<strong>da</strong>s commiiiii<strong>da</strong><strong>de</strong>s possuido [ic~r particiilares, pela fazrn<strong>da</strong> piiblica, ou por<br />
qualquer corporaçíio sob diversas <strong>de</strong>signaçues, taes como ta~~!jci,, olrcyores,<br />
melagas, ~onos j'nteosins, etc., fossem convertidos em acç6e.r <strong>de</strong> uma unica<br />
especie, <strong>de</strong>nomina<strong>da</strong>s ciccões <strong>da</strong>s coi)ilrritni<strong>da</strong>tlrs, e que o seu valor fosse fixo<br />
e egual a vinte rupias por ca<strong>da</strong> acçáo. A rt~uaiáo <strong>de</strong> diversas communi<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
sob a mesma administrac;ão, ou <strong>de</strong> diversas al<strong>de</strong>ias constituindo uma<br />
unica commnni~la<strong>de</strong>, realisa-se frequentemente e serve a <strong>de</strong>signação <strong>de</strong><br />
torofo. Ca<strong>da</strong> commnni<strong>da</strong><strong>de</strong> oii torofo 6 administra<strong>da</strong> pur urna junta administrativa<br />
<strong>de</strong> qiie náo po<strong>de</strong>m f'azer parte os gáocares qiie riso teiiham beneficio<br />
<strong>de</strong> jono. Alem d'estas juntas ha as catruzrus (~!yrari(w, encarrega<strong>da</strong>s <strong>de</strong><br />
regular os interesses geraes <strong>da</strong>s comrnuni<strong>da</strong><strong>de</strong>s, <strong>de</strong> gerir as al<strong>de</strong>ias commissas,<br />
e que são biennalmente eleitas pelos prociiradores <strong>da</strong>s commnni<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />
Quer nas juntas, qiier nas camarns, os cargos <strong>de</strong> prociiraclores e escrivães<br />
são <strong>de</strong> nomeac;Zo do governo r embora membros natos <strong>da</strong>s administracóes,<br />
teem apenas voto c~riii~nltivo. Em ca<strong>da</strong> communi<strong>da</strong><strong>de</strong>, torofo, o11 ciimara agraria<br />
existe um exactor nnniial responsavel pela receita integral, que tem O<br />
nome <strong>de</strong> mcccdor. Para sirpcrinten<strong>de</strong>r e fiucalisar os negocios <strong>da</strong>s communi<strong>da</strong><strong>de</strong>s,<br />
ha em ca<strong>da</strong> iirn dos concelhos <strong>da</strong>s Velhas Conquistas um administrador<br />
privativo, <strong>de</strong> nomea@o do governador geral; nas Novas Cnnqiiistas<br />
exercem as funcc;õeu <strong>de</strong> adniinistradores <strong>da</strong>q commiini<strong>da</strong><strong>de</strong>s os re~pectivos<br />
administradores do concelho. As administraçóes <strong>da</strong>s communi<strong>da</strong>dcq sáo repartiçóes<br />
publicas para todos os eff'eitos. O regtilamento tle 18H(i, <strong>de</strong>terminou<br />
que o jono pessoal e a <strong>de</strong> componente continnassern a ser<br />
inalienaveis, permittindo to<strong>da</strong>s as fórmas <strong>de</strong> transmissão aos jonos hteosins<br />
e As acçóes <strong>da</strong>s communi<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />
A par <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> communal existe na India portugueza a pro-<br />
prie<strong>da</strong><strong>de</strong> individual snbmetti<strong>da</strong> á legialação immobiliaria <strong>da</strong> metropol . dif-<br />
ferindo alli apenas a tributação d'algumas cathegorias <strong>de</strong> ~redios. A posse
412 POLITICA INDIGENA<br />
. . -<br />
individiial é ain<strong>da</strong> siisceptivel <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento, sem que <strong>de</strong> fórma<br />
alguma seja necessario prejudicar as comniuni<strong>da</strong><strong>de</strong>s, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que se proce<strong>da</strong><br />
em larga escalla ao esta1)elecimento perfeito <strong>da</strong> irrigaçRo que iria valorisar<br />
gran<strong>de</strong>s superficies territoriaes, ain<strong>de</strong>i, hoje absoliitament,e improductivas.<br />
Conclusóes geraes<br />
Coino ,já tivemos occasiáo <strong>de</strong> dccentuar quando estudámos a condição<br />
juridica e politictt <strong>da</strong>s popultlçBes iri(1igenas <strong>da</strong>? colonias, os direitos conce-<br />
didos aos indigclnas teem necessariamente <strong>de</strong> ser proporcionaes a o seu<br />
estado sociologico e nivel intellectiial.<br />
O regimen a qiic <strong>de</strong>ve ser sujeita a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena, não po<strong>de</strong><br />
pois exorbitar <strong>da</strong> regra, e se, por um lado, 6 <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> quem colonisa, ga-<br />
rantir rigorosamente ROJ indigenas os direitos <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong>rivados<br />
dos costumes locaes, unicos qiie elles comprehen<strong>de</strong>m e agra<strong>de</strong>cem, procu-<br />
rando fazê-los evoluciontrr por processo gradual e lento para um estadio<br />
economico e sociologico superior, por outro lado é indispensavel não exce-<br />
<strong>de</strong>r o alvo, exagerando a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> e o egualitarismo <strong>da</strong> lei no intuito <strong>de</strong><br />
promover uma unificação absur<strong>da</strong> ou utopica.<br />
No seu tral~alho<br />
já citado, o Sr. Moreira Feio escreve a este respeito<br />
o seguinte : K( )r:i se p-eten<strong>de</strong>rmos fundir e unificar estes mesnios elementos<br />
pela iiniformi<strong>da</strong>dt> <strong>da</strong> legislação, chegaremos ao absurdo <strong>de</strong>, oii negar a<br />
uns a part,icip:i,.,io <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as immuni<strong>da</strong><strong>de</strong>s, confortos, regalias e foros<br />
que representani o patrimonio <strong>da</strong> humani<strong>da</strong><strong>de</strong> pela conquista <strong>da</strong> civilisaçáo,<br />
ou <strong>de</strong> conce<strong>de</strong>r 1. impi,r a outros d'aquelles elementos commodi<strong>da</strong><strong>de</strong>s que<br />
não pe<strong>de</strong>m, necti--;i<strong>da</strong><strong>de</strong>s que <strong>de</strong>sconhecem, facul<strong>da</strong><strong>de</strong>s qiie <strong>de</strong>sprezam, obri-<br />
gaç6es e direit t,l: que níto po<strong>de</strong>m cumprir nem sabem fruir; e qualquer<br />
d'estes absurdos, sem inquirir qiial o maior, importa evitar por contrario<br />
e opposto a todos os principias sociolagicos, civilisadores e humanita-<br />
rios. »
--<br />
REGIRlEN DA PROPRIEDADE<br />
- - --<br />
-<br />
E' indispensavel que o systema educativo e a legislaqáo immobiliaria,<br />
absolutamente apropriados á i<strong>de</strong>ologia rudimentar cios autochtones, sejam<br />
orientados por forma a insiiiiar e radicar nos costiimes, e no espirito geral,<br />
a iioçáo si~ccessivamentt: mais perfeita <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
Geralmente o criterio scientifico consi<strong>de</strong>ra a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> individual<br />
na mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong><strong>de</strong> que ella assume na nosua civilisaçáo, como o termo fatal e<br />
ultimo d'iimn serie continua <strong>de</strong> estadcs sociologicos, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o simples apro-<br />
priamento dos fructos silvestres, provavelmente a primeira utilisação <strong>da</strong><br />
terra nas edn<strong>de</strong>s prehistorictis, passando por differentes phases <strong>de</strong> commu-<br />
nismo e ser-vidáo até attingir a forma actual.<br />
Evi<strong>de</strong>ntemente a Historia mostra a justeza d'essa theoria quanto á<br />
raça e civilisação ciiropeia, mas parece-nos <strong>de</strong> todo o ponto injustifica<strong>da</strong><br />
a generalisação que muitos fazem d'este criterio, á pratica colonial. Assim<br />
como as uni<strong>da</strong><strong>de</strong>s anthropologicas evolucioiiando em meios physicos diver-<br />
sos, e sob a influencia <strong>de</strong> factores externos frequentemente oppostos, attin-<br />
giram com o perpassar dos seculos a differenciaçáo ethnica que as diversi-<br />
fica, assirn as leis que são a consequencia logica dos costumes e <strong>da</strong>s<br />
cerebrayóes variaveis, segiiiram ou po<strong>de</strong>m seguir, na sua lenta elaboração,<br />
tramites differentes dos que occorreram na formação do direito <strong>da</strong>s mo-<br />
<strong>de</strong>rnas socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s occi<strong>de</strong>ntaes.<br />
Dizer que a posse collectiva foi o ponto <strong>de</strong> parti<strong>da</strong> <strong>da</strong> mo<strong>de</strong>rna pro-<br />
prie<strong>da</strong><strong>de</strong> individual B affirmar uma ver<strong>da</strong><strong>de</strong> incontroversa.<br />
Sustentar que, por esse motivo, a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> individual 4 universal-<br />
mente a forma mais perfeita <strong>de</strong> possuir a terra, é exagerar uma opiniáo<br />
que as mo<strong>de</strong>rnas theorias sociaes com tanto vigor teem combatido.<br />
Nem o communismo carece <strong>de</strong> ser imposto aos africanos atrazados,<br />
como gra<strong>da</strong>çáo intermedia entre o nomadismo cultural <strong>de</strong> hoje e a fixi<strong>de</strong>z<br />
<strong>da</strong> posse plena e individual <strong>de</strong> amanhã, nem a dissolução <strong>da</strong>s admiraveis<br />
organisaçóes <strong>de</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> collectiva <strong>de</strong> todo o Oriente representaria um<br />
beneficio real para as populaçóes indigenas, tanto sob o ponto <strong>de</strong> vista so-<br />
cial, como sob o ponto <strong>de</strong> vista economico.<br />
Entre os indigenas <strong>da</strong> Africa, mais facilmente assimilaveis, 6 natu-<br />
ral que os colonisadores tentem a implantação do proprio regimen <strong>de</strong> pro-<br />
413
414 POLITICA INDIGENA<br />
prie<strong>da</strong><strong>de</strong>, attribuindo-lhes, B claro, formas cresoentemente complica<strong>da</strong>s, e<br />
conce<strong>de</strong>ndo-lhes garantias ca<strong>da</strong> vez mais plenas.<br />
Nas colonias asiaticas, a existencia e o fomento <strong>da</strong> posse immobiliaria<br />
individual não (levem nunca prejudicar as collectivi<strong>da</strong><strong>de</strong>s territoriaes que<br />
são uma <strong>da</strong>s pedras angulares <strong>da</strong> respectiva mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong><strong>de</strong> civilisa<strong>da</strong>.<br />
k sempre um erro <strong>de</strong>sorganisar instituiçóes que correspon<strong>de</strong>m 8s<br />
necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s existentes, aos costumes mais radicados e ás tradiçóes mais<br />
essenciaes. Ain<strong>da</strong> que, por eventuali<strong>da</strong><strong>de</strong>, <strong>da</strong> <strong>de</strong>struição <strong>da</strong>s commiinas orientaes<br />
resultasse momentaneamente uma melhoria sensivel na economia geral<br />
<strong>da</strong>s populac;óes, o abalo sociologico produzido pela ruina d'um dos mais<br />
solidos alicerces do edificio social, e as perturbaçóes <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a natureza,<br />
enfraqiiecendo as forças que presi<strong>de</strong>m á evolução sociologica, motivariam<br />
uma paragem evolutiva e uma phase <strong>de</strong> transição que em muitas circumstancias<br />
po<strong>de</strong>ria redun<strong>da</strong>r n'um retrocesso economico e social. Demais, a<br />
coexistencia dos dois typos fun<strong>da</strong>mentaes <strong>de</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>, longe <strong>de</strong> significar<br />
um atrazo social 6 talvez a formula mais perfeita, <strong>de</strong>ntro <strong>da</strong> imperfeição<br />
<strong>da</strong> legislação humana, que po<strong>de</strong> alcançar a organisação do direito <strong>de</strong><br />
posse territorial.<br />
Em nenhuma naçgo civilisa<strong>da</strong>, se <strong>de</strong>sconhece a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> economica<br />
<strong>de</strong> attribiiir os baldios ao Estado reservando aos povos o ser logradouro,<br />
salvo as restricyóes crea<strong>da</strong>s pelos regimens florestaes.<br />
Ora o quc: é o Estado, senão a personali<strong>da</strong><strong>de</strong> moral e juridica que<br />
abstractamente representa a associação nacional?<br />
Terras individualmente possui<strong>da</strong>s e terras communs são indispensaveis<br />
e simultan~~as necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s economicas <strong>de</strong> to<strong>da</strong> tt organisaqão social,<br />
e, no velho Oricxnte, a vi<strong>da</strong> municipal ou communal, sobrelevando notavelmente<br />
á vid;i nacional correspon<strong>de</strong>nte a fronteiras politicas tão amiu<strong>de</strong><br />
variaveis, fez ;&na1 <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> miinicipio ou communi<strong>da</strong><strong>de</strong> um pequeno<br />
Estado, on<strong>de</strong> fi,rçosamente teem <strong>de</strong> subsistir as duas formas <strong>de</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
nas maneiras eupeciaes quc os costumes locaes lhes houverem feito<br />
assumir.<br />
Nas communi<strong>da</strong><strong>de</strong>s annamitae e chinezas o socio <strong>da</strong> ~roprie<strong>da</strong><strong>de</strong> col-<br />
lectiva B tambem quasi sempre proprietario individual <strong>de</strong>ntro ou fóra <strong>da</strong>
XEGIMEN DA PROPRIEDADE<br />
- - --<br />
415<br />
-<br />
area communal, e nas gãocarias <strong>da</strong> nossa India, o mesmo veio acontecer<br />
com os gãocares, jonoeiros e cuntocares.<br />
Entre a administração dos baldios <strong>de</strong> logradouro publico immediato<br />
e <strong>da</strong>s florestas <strong>de</strong> rendimento applicado ao interesse geral, que se observa<br />
nos organismos politicos <strong>da</strong> Europa a cargo <strong>da</strong> enti<strong>da</strong><strong>de</strong> abstracta que repre-<br />
senta a nação, e a administração directa e interessa<strong>da</strong> dos bens communaes<br />
exerci<strong>da</strong> pelos proprios associados nas collectivi<strong>da</strong><strong>de</strong>s orientaea, a differença<br />
B to<strong>da</strong> a favor d'esta ultima que realisa indubitavelmente uma forma admi-<br />
nistrativa mais efficaz, e mais apropria<strong>da</strong> ao zelo dos interesses communs.<br />
Se tudo aconselha o acatamento <strong>da</strong>s instituiçóes proprias aos negros<br />
menos civilisados, com mais forte raiz80 se <strong>de</strong>ve impor a manutenção <strong>da</strong><br />
proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> oriental na sua forma caracteristica. Se a evolução <strong>da</strong>s socie-<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong>s indigenas sob o influxo <strong>da</strong> nossa civilisação fiz& prescrever, ou tor-<br />
nar inuteis as regras que se lhes applicam, será sempre tempo para as<br />
supprimir, <strong>de</strong>ixando-as simplesmente <strong>de</strong>spren<strong>de</strong>r-se dos ramos do tronco<br />
social, como fructos em <strong>de</strong>masia sazonados, cuja propria evolução organica<br />
está já termina<strong>da</strong>.<br />
Respeitar o existente e fazê-lo evolucionar progressivamente por<br />
methodos rigorosamente proporcionaes e apropriados ao meio, á civilisação<br />
e á raça, eis o necessario e primordial lemma <strong>de</strong> politica indigena, que<br />
<strong>de</strong>ve reger todo o estabelecimento <strong>da</strong> educação, instrucção, trabalho e re-<br />
gimen civis politicos e immobiliarios applicaveis ás populações indigenas a<br />
civilisar.
CAPI'TULO VI1<br />
IMPOSTO INDIGENA<br />
Generali<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />
{ Colonias poríuguezas<br />
I Capi tação . . . . . . . I<br />
I<br />
Colonias estrangeiras<br />
Colonias portUgUeZaS<br />
Imposto <strong>de</strong> palhota { Colonias estrangeiras<br />
Imposto territorial<br />
Diversos impostos.<br />
I<br />
I<br />
-- -- J
Generali<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
Qiier como ci<strong>da</strong>dáos do Estado colonisador, quer simplesmente como<br />
subditos coloniaes, ao abrigo d'urn estatuto politico especial, não é justo<br />
que os indigenas <strong>de</strong>ixem <strong>de</strong> contribuir, com o pagamento <strong>de</strong> impostos apro-<br />
priados á sua organisação economica, para a constituição <strong>da</strong>s receitas orça-<br />
mentaes <strong>de</strong> que <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> o progresso <strong>da</strong> obra colonisadora sob os pontos <strong>de</strong><br />
vista material e moral.<br />
Se, theoricarnente, o imposto s6 é justo quando producto do con-<br />
tracto voluntario entre o individuo e o Estado, sendo em to<strong>da</strong>s as naçóes<br />
livres annualmente votado pelas <strong>de</strong>legaçóes nacionaes que fixam a sua im-<br />
portancia e auctorisam a sua percepção, po<strong>de</strong>r-se-hia objectar que, mesmo<br />
nas colonias cujos iniiigenas gozam do direito <strong>de</strong> eleger <strong>de</strong>legados á repre-<br />
sentaçiio nacional, o imposto 6 uma extorsão violenta, visto os naturaes não<br />
terem sequer consciencia <strong>da</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong> politica que em theoria usufruem.<br />
Sob o ponto <strong>de</strong> vista exclusivo <strong>da</strong> capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> juridica, o governo colo-<br />
nisador não tem frequentemente o direito <strong>de</strong> lançar impostos sobre as po-<br />
pulaçóes indigenas, a não ser que a lettra dos tratados <strong>de</strong> submisstio,<br />
quando estes existam, expressamente lhe confira essa facul<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
A pratica colonial nFio po<strong>de</strong>, porem, cingir-se á estreiteza doutrinaria<br />
<strong>da</strong>s formulas juridicas, cuja, ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira essencia em materia <strong>de</strong> contribuiçóes,<br />
se vê com tanta frequencia pôr <strong>de</strong> parte, ain<strong>da</strong> nas mais civilisa<strong>da</strong>s e an-<br />
tigas organisaç6es sociaes. Se o indigena niio po<strong>de</strong>sse ser tributado, por<br />
inconsciente ou alheio 8, eleiçgo do <strong>de</strong>legado nacional que, em seu nome,<br />
*
420<br />
--. -.<br />
POLITICA INDIQENA<br />
----<br />
fixa e approva o respectivo imposto, teriam, pelo mesmo motivo, <strong>de</strong> ser<br />
isentos <strong>de</strong> qualquer contribiiiçáo, os camponios ru<strong>de</strong>s e illctrados cujo nivel<br />
<strong>de</strong> civilisagáo, em muitas regióes europeias, pouco ou na<strong>da</strong> 3e avantaja ao<br />
dos negros africanos. D'este modo, obe<strong>de</strong>cendo a uma formula juridica abstracta<br />
p~iticament~e insignificativa, entrava-se no campo d'iima <strong>da</strong>s maiores<br />
injiistiças sociaes, o privilegio <strong>da</strong> isenção tributaria.<br />
Os indigenas africanos ou oceanianos que a civilisaçko dos colonisa-<br />
dores vae arrancar a um atrazado e Farbaresco estadio social, e as popula-<br />
çóes indigenas <strong>da</strong>s colonias asiaticas do Oriente, cu,jo progresso scientifico,<br />
economico e moral, representa o escopo essencial <strong>da</strong> acçiio colonisadora,<br />
<strong>de</strong>vem evi<strong>de</strong>ntemente contribuir para a possibili<strong>da</strong><strong>de</strong> economica d'essa reor-<br />
ganisaçáo social <strong>de</strong> que tão accentuado beneficio lhes resultará.<br />
Demais, o imposto era jA conhecido <strong>de</strong> qiiasi to<strong>da</strong>s as popiilaçóes in-<br />
digenas anteriormente á colonisaç50, umas vezes como imposiçáo força<strong>da</strong>,<br />
outra3 como tributo voluntario, mas, em qualquer caso, constituindo habito<br />
antigo e profun<strong>da</strong>mente radicado nos costumes locaes.<br />
Quando a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> dos dominaciores se siibstitile ,Z dos chefes na-<br />
turaes, os indigenas continuam a pagar sem reluctancia os tributos a que<br />
se habituaram, e, por esse motivo, o regimen tributario a applicar-lhes<br />
<strong>de</strong>ve baseiar-se principalmente na conservação do systema <strong>de</strong> imposição<br />
e cobranqa até entAo em vigor. Manteem-se assim instituiçóes locaes que<br />
sempre convem respeitar, e evitam-se as complicaçóes que quasi infallivel-<br />
mente resultam do estabelecimento <strong>de</strong> impostos novos <strong>de</strong>masiado onerosos,<br />
ou vexatorios <strong>de</strong> qiialqiier aprecia<strong>da</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
Os indigenas consi<strong>de</strong>ram geralmente o imposto como o tributo <strong>de</strong>vido<br />
ao chefe <strong>de</strong> cuja auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m, e apenas se revoltam ou protestam<br />
contra a elevação do quantitativo.<br />
Billiard accentua esta opinião nos seguintes termos : c Para um povo<br />
conquistado, a consequencia mais immediata e mais sensivel <strong>da</strong> submissão<br />
ao vencedor é a obrigação <strong>de</strong> lhe pagar imposto. A importancia e a natu-<br />
reza do tributo a satisfazer constituem, pois, importantissimos factores <strong>da</strong><br />
rapi<strong>de</strong>z e sinceri<strong>da</strong><strong>de</strong> d'essa submissão. Para o contribuinte a substituição<br />
<strong>de</strong> um beneficiario por outro 6 um facto que se acceita sem pan<strong>de</strong> diffi-
cul<strong>da</strong><strong>de</strong>, porque 96 moralmente po<strong>de</strong> incommo(1ar; o que sobret~idô 1l1ê im-<br />
porta é que os seus encargos não sejam aggravaclos , . ( 1)<br />
Seja pois o tributo imposto pela conquista, ou seja simplesmente<br />
tranrferi<strong>da</strong> a fticnl<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> O cobrar á pesooa juridica do Estado domina-<br />
dor, o que é importante fixar, é que o seu estabelecimento e manutençáo<br />
nem representa uma extorsão, nem repugna aos contribuintes.<br />
Pelo lado economico, O imposto tem a vantagem principal <strong>de</strong> incitar<br />
os indigenas ao trabalho, e quando seja pago em dinheiro, a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> economisar a SLIR importancia, lança na socie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena o germen <strong>da</strong><br />
capitalisaçáo.<br />
Quando aconteça estarem os autochtones isentos <strong>de</strong> qualquer imposto<br />
antes do estabelecimento <strong>da</strong> aiictori<strong>da</strong><strong>de</strong> dos colonisadores, E indispensavel<br />
que a tribntaçáo que 3e lançar seja muito mo<strong>de</strong>ra<strong>da</strong>, e que na sua cobrança<br />
se observe a mais evangelica paciencia, contemporisando se, sempre que<br />
possivel fíir, com as rcclamaçóes dos interessados. Por se terem mostrado<br />
intolerantes e exigentes 04 seus agente9 fiscaes, tiveram os inglezes <strong>de</strong> suf-<br />
focar penosamente as sacceasivas revoltas que o langamento do imposto <strong>de</strong><br />
alhot ta provocou na Serra Leôa e na Achantilandia.<br />
Ha to<strong>da</strong> a vantagem em conservar o syatema <strong>de</strong> cobrança <strong>de</strong> impos-<br />
tos usado pelos indiqenaq, e, até em certos casos, é conveniente continiiar<br />
aproveitando os serviços dos primitivos recebedores.<br />
Nas contribuiç6rs fixas <strong>de</strong> capitaçdo ou territoriaes a cu,ja cobrança<br />
baste iim pessoal europeu pouco numeroao, é preferivel sub+titiiir por eiiro-<br />
Ileiis o pssoal indigena, a fim <strong>de</strong> diminuir, quanto possivel, os ronbos e<br />
prevaricaçóes; nos impostos cujo lançamento e recepção carec;arn d'iirn com-<br />
plicado funccionalismo, é bem mais vantajoso e barato manter a organi-<br />
saçáo existente, melhoraiido-a, mas prescindindo <strong>de</strong> preencher 03 qiiadrou<br />
com funccionarios europeus, incomparavelmente mais dispendiosos.<br />
A economia resultante d'iima cobranqa niaia rigorosa e Iionesta, nem<br />
<strong>de</strong> leve compensaria o augmento <strong>da</strong> <strong>de</strong>speza coni o respectivo ~essoal.<br />
1<br />
7
422 YOLITICA INDIQENA - - -<br />
São dois os processos vulgarmente indicados para se obter a rece-<br />
pção do imposto, a saber, udministrcrlido oii urretzticii~rlu.<br />
A recepçáo diz-se feita por utl?nilzistruçúo quando P immediatamente<br />
commetti<strong>da</strong> á naçiio que a torna effectiva por meio <strong>de</strong> empregados seus.<br />
Chama-se <strong>de</strong> cwrentlumento, como o mesmo termo indica, quando o go-<br />
verno accor<strong>da</strong> coni certa pessoa ou pessôas, por meio <strong>de</strong> ajuste em<br />
mercado, em estas tomarem a seu cargo a cobrança <strong>da</strong> contribuiçáo, pela<br />
fórma <strong>de</strong>signa<strong>da</strong> nas leis, adiantando áquelle um quantitativo nljÁs menor.<br />
A preferencia a <strong>da</strong>r a um ou a outro d'ester systemas tem provo-<br />
cado a mais larga controversia entre quasi todos os mais di$tinctos econo-<br />
inistas, e, apezar <strong>de</strong> nas iiaçóes mais civilisa<strong>da</strong>s nao ser j& mo<strong>de</strong>rnamente<br />
usado o systema <strong>de</strong> arren<strong>da</strong>mento que táo odioso se tornou aos povos,<br />
comtudo, 6 fóra <strong>de</strong> duvi<strong>da</strong> que esta questiio po<strong>de</strong> racionnlmcnte ter uma<br />
ou outra soluçáo pratica, segundo a natureza <strong>da</strong>s circumstancias predo-<br />
minantes.<br />
Aquelles que impugnam o arren<strong>da</strong>mento <strong>da</strong> cobrança do miissoco nos<br />
prazo?: <strong>da</strong> Zanibezia, <strong>de</strong>sconhecem geralmente o resultatlo <strong>de</strong>sastroso <strong>da</strong><br />
cobrança por administraçáo, leva<strong>da</strong> a effeito no Barli6 c: na Maganja <strong>da</strong><br />
Costa. O Barué tem sido <strong>de</strong>sertado pelos indigenas que em massa emigram<br />
para os territorios <strong>da</strong> Companhia <strong>de</strong> Moçambiqiie.<br />
E certo que este exodo se <strong>de</strong>ve As extnrsóes mais ou menos violentas,<br />
commetti<strong>da</strong>s por alguns chefes administrativos OLI militare9 felizmente ra-<br />
ros, na<strong>da</strong> prouando contra o rcgimen cte administraçáo directa, visto que a<br />
culpa ou o dobo cl'um funccionario po<strong>de</strong> fazer baquear a mais perfeita e<br />
irreprehensive/l organisaçáo social.<br />
To<strong>da</strong>via o pre,juizo é bem patente, e scí evitrivel com uma severa fiscalisaçtio,<br />
quasi irnpossi~~el <strong>de</strong> estabelecer 110 interior <strong>da</strong>s gran<strong>de</strong>s colonias<br />
durante a primeira phase <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> colonial. Portanto lia casos - e na<br />
pratica colonial sao bem frequentes - em que o governo <strong>da</strong> colonia tem<br />
vantagem em arren<strong>da</strong>r a cobrança <strong>de</strong> <strong>de</strong>termina<strong>da</strong> contribuiçáo. O que é<br />
necessario é que os contractos <strong>de</strong> arren<strong>da</strong>mento, contenliam clansnlas que<br />
garantam os interesses do Estado e os direitos dos indigenas. contra qu:~cs-<br />
quer frau<strong>de</strong>s ou oxtorsóes por parte i10 arrematante.
IMPOSTOS 423<br />
Com relação á fórma do pagamento, o imposto iiidigena po<strong>de</strong> ser co-<br />
brado em trabalho, em generos e em dinheiro.<br />
Sobre o imposto em trabalho pouco temos a accrescentar ao que a<br />
esse respeito escrevemos quando estu<strong>da</strong>mos o trabalho obrigatorio.<br />
E sempre um mal, mas em alguns casos é um mal necessario que<br />
serve para prevenir outros peiores. Quando as obras publicas <strong>de</strong> interesse<br />
geral e immediato terminantemente o exijam, e náo se offereça mão d'obra<br />
voluntaria, po<strong>de</strong>rá o governo colonial recorrer mo<strong>de</strong>ra<strong>da</strong>mente ás requisi-<br />
ções, ou prestaçóes <strong>de</strong> trabalho, que, n'esta hypothese, núo apresentarão<br />
o caracter <strong>de</strong> impostos, porque os indigenas compellidos ao trabalho <strong>de</strong>vem<br />
ser pecuniariamente retribuidos.<br />
O imposto propriamente dito, a estabelecer-se, <strong>de</strong>ve reduzir-se a 6<br />
até 10 dias <strong>de</strong> trabalho por anno, empregados em obras publicas que re-<br />
vertam, tanto quanto possivel, em beneficio directo <strong>da</strong> collectivi<strong>da</strong><strong>de</strong> indi-<br />
gena a que os trabalhadores pertencerem.<br />
O imposto em trabalho é con<strong>de</strong>mnado pela tlieoria pois, como disse<br />
Montesquieu, na<strong>da</strong> ha mais favoravel á escravidão e mais pernicioso 4<br />
liber<strong>da</strong><strong>de</strong>, do que a prestaçáo obrigatoria <strong>de</strong> serviços pessoaes.<br />
Na'pratica, ti sua applicação enferma egualmente dos principaes in-<br />
convenientes do trabalho forçado, isto é, <strong>de</strong>smoralisaqão dos compellidos e<br />
rendimento <strong>de</strong> mGo d'obra qiiasi nullo.<br />
A cobrança do imposto indigena em yenwos, é muito frequente em<br />
numerosas colonias, e alguns publicistas coloniaes <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m essa forma <strong>de</strong><br />
pagamento como mais commo<strong>da</strong> para os contribuintes, allegando que o go-<br />
verno colonial po<strong>de</strong>rá n'alguns casos empregar os generos rece1)idos na re-<br />
tribuição do pessoal encarregado <strong>da</strong> cobrança.<br />
Combatemos abertamente esta opinião. Se era realmente mais com-<br />
modo para os indigenas pagar in<strong>de</strong>fini<strong>da</strong>mente os seus tributos em generos,<br />
não se <strong>de</strong>ve comtudo sacrificar a uma commodi<strong>da</strong>cle, que apenas significa<br />
atrazo economico, todo o progresso material e social que <strong>de</strong>riva <strong>da</strong> circu-<br />
lação monetaria.<br />
Se atten<strong>de</strong>rmos ás <strong>de</strong>spezas avulta<strong>da</strong>s, á gran<strong>de</strong> difficul<strong>da</strong><strong>de</strong> do trans-<br />
porte, B l~ossivel <strong>de</strong>terioração, e finalmente ás <strong>de</strong>moras e gran<strong>de</strong>s transtor-
424 POLITICA INDIGENA<br />
nos, que a recepção do imposto em generos comsigo importa, torna-se bem<br />
evi<strong>de</strong>nte e incontestavel a superiori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> cobrança em dinheiro. Mas não<br />
B s6 na economia e fdcili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> arreca<strong>da</strong>çgo que assenta o fun<strong>da</strong>mento<br />
d'essa superiori<strong>da</strong><strong>de</strong>. O imposto indigena, como todos os impostos, 6 utilisado<br />
pelo Estado para acquisição <strong>de</strong> utensilio~ e retrihuiçáo <strong>de</strong> funccionarios,<br />
e to<strong>da</strong> a mo<strong>de</strong>rna sciencia economica mostra, sem contestação possivel,<br />
as immensas vantagens provenientes do padrão geral <strong>de</strong> valores.<br />
«O Estado adquire pela moe<strong>da</strong> mais facilmente o material <strong>de</strong> que carece<br />
e os funccionarios aproveitam mais sendo retribuidos em numerario.<br />
Po<strong>de</strong> to<strong>da</strong>via allegar-se que, na hypothese do imposto ser pago em generos,<br />
a moe<strong>da</strong> ficando nas mãos dos particulares po<strong>de</strong>ria aiigmentar sensivelmente<br />
as transacçóes e com ellas a fortuna publica.<br />
Isto que á primeira vista parece indiscutivel, scí <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> certos<br />
limites po<strong>de</strong> ser admittido como provavel.<br />
Em primeiro logar, com a cobrança em generos, o Estado tem <strong>de</strong><br />
expor primeiramente R ven<strong>da</strong> a contribuição recebi<strong>da</strong> a fim <strong>de</strong> alcançar a<br />
mercadoria commum, e ninguem ignora que elle não reune nenhuma <strong>da</strong>s<br />
condiçóes requeri<strong>da</strong>s a um bom indiistrial. Se a alguem compete fazer as<br />
permutaçóes necessarias para a acqiiisição, em moe<strong>da</strong>, do imposto, seja esse<br />
alg~iem o contribixinte, porque só n'elle ha uma cabal iniciativa motiva<strong>da</strong><br />
no interesse.<br />
Em segundo logar, a cobranva em generos diminue sensivelmente a<br />
força <strong>da</strong> circula
-<br />
IMPOSTOS<br />
Segundo qualquor cios dois modos <strong>de</strong> pagamento - em generos e em<br />
numerario - o imposto atftlcta mais ou menos os diversos ramos dn acti-<br />
vi<strong>da</strong><strong>de</strong> humana, porcliie Ilie retira capitties, mas sob o ponto <strong>de</strong> vista do<br />
interesse geral e <strong>da</strong> cirilisaçfio dos indigenas, 6 preferivel e até neceasario<br />
O imposto em moe<strong>da</strong>. O imposto em generos scí se justifica por <strong>de</strong>ficiencia<br />
irrediictivel <strong>da</strong> cir~iilii
426 POLITICA INDIGCENA<br />
comprehen<strong>de</strong>ria certas differenças, talvez muito scientificas, mas que s6 injustas<br />
lhe pareceriam.. ............................................<br />
3.0 A populaçílo ipzdigena ní7o <strong>de</strong>ve ser sujeita aos mesynos inzpostos<br />
que ct l1opulup7o europeiu; 6 preciso contar efectivamente com o estado social<br />
dos indigenas; muitas vezes, entre elles, serão a al<strong>de</strong>ia e a tribn e<br />
não o individuo, que <strong>de</strong>vem ser collecta<strong>da</strong>s. D'uma maneira geral, é preferivel<br />
conservar os t,ributos a que os indigenas estiverem habituados. por<br />
mais imperfeitos que aquellcs sejam. Occasionam sempre menos resistencias<br />
do que um imposto'novo ...........................................<br />
4." Os imn~?ostos <strong>de</strong>vem .srr aiiyntewtados 4 medi<strong>da</strong> que a riqliei~ 1111bliccz<br />
se. fOr <strong>de</strong>senvolve~zclo<br />
n (i)<br />
............................<br />
As differenças entre os impostos respectivamente applicaveis a colonos<br />
e a indigenas, nas colonia~ cujos naturaes já possuem civilisaçáo antiga:<br />
sao em geral uma injustiya que po<strong>de</strong> acarretar dissabores. O Sr.<br />
Cunha (ionçalves c'screve a este respeito o s~guinte:<br />
O principio <strong>da</strong> differeiiça <strong>de</strong> rtxgimen torna-se d'uma applicação<br />
singularment,e diffic-il trat.arido-se <strong>de</strong> paizes velhos, como as colonias asiaticas,<br />
em que existe um tradicional systema <strong>de</strong> impostos. Os colonos europeus,<br />
n'essas coloiiias, <strong>de</strong>verão estar subordinadoi ao regimen europeu, ou<br />
a um regimen especial? Ou ser& antes preferivel sujeitá-los ao regimen<br />
tradicional dos indi~eriii..;:', isto é, collectar i<strong>de</strong>nticamente to<strong>da</strong>s as materias<br />
habitiialmente trib:it.adns, srja quem for o seu dono? Esta combinação tem,<br />
seni duvi<strong>da</strong>, superiori!l;~<strong>de</strong> sobre a prece<strong>de</strong>nte, pois, como nota Billiard,<br />
náo sti ella at,t,irigc. os ~)roductos que a experiencia dos seciilos revelou<br />
como os mais impi~:~tiintt.s, niils siipprime <strong>de</strong> vez rt quest,áo, assim irritante<br />
como <strong>de</strong>lica<strong>da</strong>, que subsistiria eterna com a (luali<strong>da</strong><strong>de</strong> do regimen: - Qual<br />
B o elemento explorador l. .. Qual o elemento sacrif cado?. .. - ; approxi-<br />
ma :is duas raças n'iim terreno commuin em que o seli :tccordo só po<strong>de</strong> es-<br />
clarecer o governo: sem o enfraquecer. Com effeito, se o imposto tradicional<br />
B pru<strong>de</strong>ntemente mo<strong>de</strong>rado, o europeu rienliuma razão tem para se recusar<br />
(I) Girault - O. C.tl1"
IMPOSTOS 127<br />
a pagá-lo; se, pelo contrario, elle B <strong>de</strong>masia<strong>da</strong>mente pesado, 6-0 Itfipa todos,<br />
europeus e indigenas. E claro que se não preten<strong>de</strong> com isto petrificar<br />
o regimen fiscal <strong>da</strong>s colonias. Mas as modificacões futuras <strong>de</strong>vem ser feitas<br />
sem se perturbar a economia do systema tradicional e sobretudo sei11 se<br />
offen<strong>de</strong>r o principio <strong>de</strong> egiialdii<strong>de</strong> dos contribuiiites.<br />
Tudo isto leva-nos á conclusFio <strong>de</strong> clilr, ri'estit materia, nHo lilt principiou<br />
inflexiveis. Se ern theoria, diz Ler(,)- Braillieu, 4 facil citar uin imposto<br />
typo ruja applicaçáo seja prefcrivcl, cbon<strong>de</strong>mnando-se toclos (14 outros,<br />
na prática 4 forcciw conformarmo-nos com as circnmstancias sociacs e geographicas,<br />
com os gostos e os cohtumcs do piiblico, I, o ~)r~llror il~~~posto,<br />
tt'zunn stf imçí?o dtc<strong>da</strong>, i o que pesu 711, )to\ ?tos r o~ztribtcii~teu qzie o st~).li)ot tmn,<br />
e produz ~nnis cio IJst(ldo que o ~*ccrbc~. (')<br />
Os impostos c~oloriiaes indirectos inci<strong>de</strong>ni oii repercutem-se i<strong>de</strong>nticamente<br />
sobre os colonos e sobre os indigena~, n5o cabendo, no objectivo<br />
d'este nosso trabaIlio, a sua enumeração e estudo. Os impostos directos qiie<br />
mais immediatamente se pren<strong>de</strong>m A organi~uç20 social e A var~açáo do meio<br />
economico, S~O, na rneioria <strong>da</strong>s liypothesex, distinctos para os indigenas e<br />
para a raça colonisadora. Por isso eututlareriios as f6rm:is qiie mais riilgar-<br />
mente assume o imposto indigena : capitação, i,nl)nsto <strong>de</strong> /)tililofn e inlposto<br />
f~rritorial.<br />
Capitação<br />
Colonias portuguezas - A capitac;&o 4 por excellencia o iniposto <strong>da</strong><br />
conquista e <strong>da</strong> repressão. Nos tribntos <strong>de</strong> guerra, em todos os tempos im-<br />
postos pelos vencedores aos vencidos, a capitaçgo tem sido quasi scml)re a<br />
base <strong>da</strong> repartição do imposto. A capitaqáo uniforme que ain<strong>da</strong> lioje em<br />
algumas naçóes europeias se emprega como meio repressivo, é unia <strong>da</strong>s<br />
(I)<br />
--<br />
L. C. Gonçalves - O Iniposto C'olonial.
428 POLITICA INDIGEXA<br />
.- - -.<br />
formas mais commo<strong>da</strong>s e mais equitativas do imposto indigena nas colonias<br />
cu,jos habitantes manifestam lima organisacáo economica milito rudimentar.<br />
N'esta classe <strong>de</strong> coloiiias, os meioa <strong>de</strong> existencia dou indigenas equivalem-se<br />
para todos os indivitliios; nko lia contritstc <strong>de</strong> miseria e riqiieza.<br />
O imposto pessoal iiniforincl teiii, como diz (;iraiilt, a vantagem <strong>de</strong><br />
evitar to<strong>da</strong>s as reclam:i
--<br />
IMPOSTOS 429<br />
- -<br />
constituidos, não conforme o direito emphyteutico vigente no reino no se-<br />
culo XVI, mas, segundo os principias feu<strong>da</strong>es, visto que essa capitaçáo im-<br />
plicava o senhorio, isto é, n soberania allia<strong>da</strong> á proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> para quem a<br />
cobra, exprimindo a servidão mais ou menos completa <strong>de</strong> quem a paga,<br />
servidáo resultante <strong>da</strong> conquista.<br />
O eniphyteuta colonial portuguez dos prazos <strong>da</strong> Africa Oriental,<br />
tendo ao lado o filmo (maioral ou juiz indigena), oii o inhacuaua (chefe <strong>de</strong><br />
povoac;ão) negro, não era mais do que o siiccessor dos antigos principes<br />
indigenas que lavravam a terra para os siiltóes e em troca <strong>da</strong> cobrança<br />
<strong>da</strong> capitação obtinham direitos <strong>de</strong> soberania sobre os homens e <strong>de</strong> proprie-<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong> sobre as terras.. . . . . . . , . . . . . . . . . . . . . . . Em Africa, o donatario<br />
era, não s6 o senhor <strong>da</strong> terra, mas tambem o senhor <strong>da</strong> gente, pois que<br />
uma especie <strong>de</strong> servidão <strong>de</strong> gleba a mantinha sobre o prazo; e os servos,<br />
presos pelo mussôco, quando n2io eram vendidos como escravos, tinham <strong>de</strong><br />
vêr n'aquelle que o cobrava o seu senhor e o seu principe. A cobrança era<br />
feita, como em todos os paizes on<strong>de</strong> ha ain<strong>da</strong> n adscripc;iio á gleba, com<br />
os traços peculiares indigenas. - «Junto a ca<strong>da</strong> frc~)lo, diz (Xamito, ha um<br />
chuanya, escravo do donatario, e homem <strong>da</strong> siia confiança; elle e o firmo<br />
fazem juntos o recenseamento, operaçáo que se verifica <strong>da</strong>ndo elle tantos<br />
nós em uma cor<strong>da</strong>, quantos são os individuos que teem <strong>de</strong> pagar tributo. . .<br />
Regularmente os tributos sáo pagos em agosto ou setembro, tempo em<br />
que já se teem feito e <strong>de</strong>bulhado as colheitas. Ca<strong>da</strong> cazal <strong>de</strong> colonos paga<br />
um quitundo <strong>de</strong> milho, que nunca tem menos <strong>de</strong> tres alqueires. O fumo<br />
paga pela sua povoação ordinariamente 5 manchilas, e paga mais um <strong>de</strong>-<br />
terminado numero <strong>de</strong> gallinhas. % - Mas, além a'esta prestação em generos,<br />
o mussôco abrangia diversos serviços pessoaes e forçados, a arbitrio do<br />
emphyteuta que, a pouco e pouco, se substituira completamente ao dynasta<br />
indigena.~ Os gran<strong>de</strong>s abusos commettidos na cobrança do mussôco, e<br />
principalmente a completa <strong>de</strong>generescencia <strong>da</strong> instituição dos prazos <strong>da</strong><br />
cor<strong>da</strong>, que <strong>de</strong> nenhuma fórma correspondia já 4 i<strong>de</strong>ia que presidira 4 sua<br />
creação, levaram o Viscon<strong>de</strong> <strong>de</strong> Athouguia, então ministro <strong>da</strong> marinha, a<br />
supprimir simultaneamente, por <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 22 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1554, a<br />
existencia dos prazos e a cobrança do mussôco que era substituido pelo
430 POLITICA INDIGENA<br />
- -- - -- - -. - -<br />
imposto <strong>de</strong> palhota. No artigo 3 estipiila-se que to<strong>da</strong>s e quaesquer obriga-<br />
çóes, serviços pessoaes, ou prestaçfies <strong>de</strong> qualquer <strong>de</strong>nominação, impostas<br />
aos colonos e indigeiias livres fic~m extinctas ; e estes sdmente obrigados<br />
ao pagamento annual parti o E~tttdo <strong>de</strong> 1$600 reis, por ca<strong>da</strong> fogo, palhota,<br />
funco, oii qualquer outra habitaçEo, os quaes pnrlergo ser pagos em generos.<br />
N5o s&o comprehendi<strong>da</strong>s n'edtits dispodições, as obrigaçóes ou prestaçóes<br />
em dinheiro o~i em generos impostas por senhorios particulares em<br />
bens seus patrimoniaes. Em todo o caso. porém, nenlium l~abitante livre<br />
ficava obrigado a prestar serviços pessoaes forçados qiie náo fossem os<br />
exigidos por utili<strong>da</strong><strong>de</strong> publica. Estas <strong>de</strong>terminaçóes po<strong>de</strong> dizer-se que ficaram<br />
lettra morta e o miissôco contin~iou sempre a ser exigido aos negros.<br />
Mais tar<strong>de</strong>, o <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 27 <strong>de</strong> outubro <strong>de</strong> 1880, que confirmoii e ampliou<br />
as estipu1ac;óea <strong>de</strong> 1864 relativas it aboliçáo dos prazos, 15 mudo quanto ao<br />
systema dos impostos indigenas, e a sua regiilamentação <strong>de</strong> 1883 restabelece<br />
legalmente o mussoco atiniial <strong>de</strong> 800 reis em dinheiro ou generos dc<br />
exportação (borracha, copra, cer:~, marfim, etc.), acompanhado do trabalho<br />
forçado gratuito em obras <strong>de</strong> interesse piiblico, e do trabalho obrigatorio<br />
remunerado em dinheiro oa em algodáo. Esta ultima fórma <strong>de</strong> pagamento<br />
<strong>de</strong>u origem a constantes logros e extorsões em prejuizo dos trabalhadores<br />
indigenas, o que se procuroii evitar em 1886 edtabelecendo que a prestação<br />
<strong>de</strong> 800 reis fosse remivel por trabalho na proporção <strong>de</strong> 400 reis por ca<strong>da</strong><br />
semaris completa <strong>de</strong> trabalho, e qiie Aqi fazen<strong>da</strong>s usa<strong>da</strong>s para pagamento<br />
fosse ~ttribuido o valor que realmente tivessem no mercado.<br />
Em 1890 o coii1icc:ido clccreto <strong>de</strong> Antonio Ennes, que reorganison os<br />
prazos <strong>da</strong> corôa e 111;~ntt:vc; o rn~~ssôco como imposto indigena, e o regulamento<br />
publicado cm 1892, rt*qiilaram e fixaram a sua importancia e lançamento<br />
pela seguinte fdrma :<br />
Os colonos indigenas <strong>da</strong>s terras dos prazos continuam sujeitos ao<br />
mussôco, capitaçáo annual <strong>de</strong> 800 reis paga meta<strong>de</strong> em dinheiro e meta<strong>de</strong><br />
em trabalho. Esta capitaç5o incido tamhem sobre os colonos indigenas<br />
resi<strong>de</strong>ntes nos llcrines e terrenos aforados sempre que essas proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
Bstiverem inclui<strong>da</strong>s na área dos prazos, e sd d'ella ficam isentos os sarnaçôas,<br />
sa,ngirtrs. i~~~~rrc.srt~)zf~os, os menores <strong>de</strong> 14 annos, os velhos <strong>de</strong> mais <strong>de</strong>
IMPOSTOS<br />
~- --<br />
160 e os invalidos. A prestação <strong>de</strong> trabalho gratuito exigivel annualmente<br />
para limpeza <strong>de</strong> caminhos, vnucurros, etc., foi fixa<strong>da</strong> n'uma semana ; o<br />
miissôco propriamente dito po<strong>de</strong> ser remivel por trabalho; e os arren<strong>da</strong>-<br />
tarios <strong>da</strong> cont&buição são mesmo obrigados a cobrar meta<strong>de</strong> <strong>da</strong> sua im-<br />
portancia em trabalho. A cobrança do mussôco, em virtu<strong>de</strong> <strong>de</strong> varias<br />
<strong>de</strong>terminaçóes locaes, era feita, anteriormente ao <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 1890, por<br />
administração directa n'alguns dos extinctos prazos, e por arren<strong>da</strong>mento<br />
em outros. O referido diploma dividiu os prazos <strong>da</strong> corôa em dois grupos<br />
consoante o estado <strong>de</strong> submissão mais ou menos completa dos seus habi-<br />
tantes, mas eutabeleceii em ambos os grupos, embora sobre bases differentes,<br />
o exclusivo do systema <strong>de</strong> arren<strong>da</strong>mento. No relatorio que prece<strong>de</strong> o <strong>de</strong>-<br />
creto, o gran<strong>de</strong> colonial que foi Antonio Ennes, explica as razóes que o<br />
levaram a adoptar essa medi<strong>da</strong> nos seguintes termos:<br />
a O pensamento fun<strong>da</strong>mental d'este <strong>de</strong>creto, é promover o <strong>de</strong>senvol-<br />
vimento dti agricultura industrial nas terras dos prazos, e para isso con-<br />
vert,er o imposto do mussôco em meio indirecto <strong>de</strong> obrigar quem o paga e<br />
quem o cobra a applicar-se á exploração do solo. A cobrança do mussôco,<br />
sendo feita por agentes <strong>da</strong> fazen<strong>da</strong> provincial, como já se experimentou,<br />
talvez désse maior rendimento do que an<strong>da</strong>ndo arren<strong>da</strong><strong>da</strong>. Tambem quero<br />
crêr que os indigenas, sendo immediatamente sujeitos a um funccionario<br />
publico, militar ou civil, estariam menos dispostos a servir <strong>de</strong> instrumento<br />
a rebeldias, do que acostumando-se a obe<strong>de</strong>cer a um particular. Mas as<br />
conveniencias 11ublicas e fiscaes n5o <strong>de</strong>vem preterir as economicss n'um<br />
paiz que é pobre, apezar <strong>de</strong> ter nas entranhas riquezas fabulosas, e menos<br />
o <strong>de</strong>vem quanto 6 certo que o trabalho e o bem estar tambem são condi-<br />
çóes <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m, e que a producçáo sd raramente <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> in<strong>de</strong>mnisar o fisco<br />
dos sacrificios e privaçúes a que elIe porventura se sujeita para a animar.<br />
A Zambezia agriculta<strong>da</strong>, a Zambezia retalha<strong>da</strong> em proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> particular,<br />
ficará mais sujeita á auctoridti<strong>de</strong> <strong>da</strong> corôa do que occupa<strong>da</strong> militarmente,<br />
e as contribuiçóes hauri<strong>da</strong>s dos seus productos, suppriráo a maior receita<br />
do massôco. O objectivo <strong>de</strong>' to<strong>da</strong>s as reformas que se façam no systema<br />
dos prazos <strong>de</strong>ve, pois, ser o transform&-10s em fazen<strong>da</strong>s agricolas, pelo tra-<br />
balho e pelo ,aforamento. Mas a cultura, e principalmente a cultura que<br />
431
432<br />
- ----<br />
POLITICA INDIGENA<br />
- - - - - - -. - - - -. - - - . - -<br />
náo C! meramente df~stiria<strong>da</strong><br />
a alimentar a população indigena, a ciiltiira<br />
dos generos ricos <strong>de</strong> exportaqáo náo se faz sem bravos, e o meio mais effi-<br />
caz <strong>de</strong> vencer a natural indolencia do africano, nos districtos centraes <strong>de</strong><br />
Moçambique, k induzi-lo a resgatar oix a ganhar por serviços ruraes a im-<br />
portancia do mussôco, qiie muitas geraçóes <strong>de</strong> sechores feu<strong>da</strong>es, variamente<br />
<strong>de</strong>nominados, o habituaram a pagar resigna<strong>da</strong>mente, como elle nunca pa-<br />
gar& outro tributo. D'aqui a conveniericia <strong>de</strong> conservar a cobrança do rnus-<br />
soco nas máos <strong>de</strong> quem se proponha a explorar a terra e para isso precise<br />
obreiros ................................................ ........<br />
.A cobranva pelc Estado, se n'ella se persistisse, <strong>de</strong>veria, pois, paralysar<br />
to<strong>da</strong>s as iniciativas particulares <strong>de</strong> aproveitamento do solo, sendo poucu d,.<br />
esperar. que o Estado remediasse semelhante inconveniente, tirando partido<br />
industrial doa exercitos <strong>de</strong> colonos assim monopoli~ados, porque não 6 <strong>de</strong><br />
cbri.r que o clima africano <strong>de</strong>senvolva n'elle aptidóes que lhe faltam na Eii-<br />
rapa)). O sr. Cunha Gonçalves, no seu citado livro, combate o systema dr<br />
arren<strong>da</strong>mento do mussôco com argumentos mais vistosos do qne probativos<br />
Citando os <strong>da</strong>dos do Boletim provincial <strong>de</strong> 1888 affirma que, n'alguns pra-<br />
zos, o reginien <strong>de</strong> administração directa fez augmentar o rendimento fiscal,<br />
o que aliás ninguem contesta, esquecendo que, no momento actual, ao passo<br />
que a pessima gerencia dos territorios administrados, tem provado sobeja-<br />
mente contra esse systema, os redditos do Estado na Zambezia teem au-<br />
gmentado geralmente com o accrescimo <strong>da</strong> producçáo, n'uma escalla pro-<br />
gressiva que nunca po<strong>de</strong>ria ter sido attingi<strong>da</strong> pela simples cobrança directa<br />
do mussôco. A coprtc (Ia C. Z., e do Boror, e os restantes generos exporta-<br />
dos em gran<strong>de</strong> quanti<strong>da</strong><strong>de</strong> para a Europa, mercê <strong>da</strong> iniciativa particular<br />
que nunca po<strong>de</strong>ria ter vingado sem se appoiar directamente no mussôco,<br />
são fontes <strong>de</strong> riqueza que o Estado nunca saberia crear e utilisar. Diz o<br />
Sr. Cunha Gonçalves que a agricultura não se effectua sómente na Zam-<br />
bezia á sombra do mussôco, e que em to<strong>da</strong> a provincia <strong>de</strong> Noçambique exis-<br />
tem hoje emprezas agricolas muito florescentes. Pó<strong>de</strong> ser que assim acon-<br />
teça, inas o conhecimento pessoal que temos d'aquella colonia, mostra-nos<br />
precisamente que, em região alguma <strong>da</strong> provincia, existem emprezas agri-<br />
colas <strong>de</strong> importancia sequer comparavel ás que na Zambezia progri<strong>de</strong>m.
! --<br />
IMPOSTOS<br />
433<br />
-- -- -<br />
N'outros tempos. quando os donatarios dos prazos furam transformados em<br />
simples emphyteutas sem senhorio directo e sem direito á cobrança do<br />
muss6c0, a agricultnra já existente ficou paralysa<strong>da</strong> por falta <strong>de</strong> mão<br />
d'obra voluntaria, t. o seli progresso tornou-se impossivel nlaqliellas con-<br />
diçóes.<br />
Não discutimos se em geral o systema <strong>de</strong> arren<strong>da</strong>mento dos impostos<br />
pessoaes nas colonias <strong>de</strong>ve ser consi<strong>de</strong>rado mais vantajoso, mas na Zam-<br />
bezia a sua maior efficacia está tão <strong>de</strong>monstra<strong>da</strong> pelos factos, que é inutil<br />
forjar novos arg~mentos em sua <strong>de</strong>feza. O proprio exemplo <strong>da</strong> Companhia<br />
<strong>de</strong> Noçambique lembrado pelo Sr. Oonçftlveci 6 mal escolhido. Se a C. M.<br />
obtem braços abun<strong>da</strong>ntes para as suas limita<strong>da</strong>s exploraçóes agricolas 6<br />
precizamente porque tendo o direito <strong>de</strong> lanyar e cobrar os impostos, é reconheci<strong>da</strong><br />
pelos indigenas como a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> suprema a quem temem e<br />
respeitam.<br />
De resto, essa ahun<strong>da</strong>ncia <strong>de</strong> offerta <strong>de</strong> máo dlobra indigena d&-se<br />
principalmente na circiimhcripçáo <strong>da</strong> Gorongoza, antigo prazo dtc Corôa<br />
cuja organisação, embora juridicamente extincta, subsiste nos usos e costu-<br />
mes dos indigeiias, que afinal trabalham porque o chefe 'ela circumscripçko,<br />
successor dos antigos donatarios, assim lhlo <strong>de</strong>termina. A immigraçáo rie-<br />
gra nos territorios <strong>da</strong> C. M. é principaimentc <strong>de</strong>vi<strong>da</strong> á suppressáo <strong>da</strong><br />
parte do miissôco paga em trabalho; mas que o imposto cobrado seja <strong>de</strong><br />
capitaçiio ou <strong>de</strong> prtlhota pouco importa para a prosperi<strong>da</strong><strong>de</strong> agricola. Seja,<br />
pordm, qual for a fórma <strong>de</strong> tributaçáo, B vantajoso que a sua cobrança<br />
seja arren<strong>da</strong><strong>da</strong> a quem preten<strong>de</strong> agricultar a terra ou explorar as minas,<br />
como melhor meio <strong>de</strong> obter dos indigenas a concorrencia ao trabalho. Theo-<br />
ricainente, o imposto <strong>de</strong> palhota 6 sem duvi<strong>da</strong> superior ao mussôco, mas na<br />
pratica o melhor imposto é aquelle que melhor se acceita e mais produz. O<br />
imposto <strong>de</strong> palhota extinguiria esses restos <strong>de</strong> servidão que representa a<br />
prestação <strong>de</strong> trabalho, mas o mussôco está tão indissoluvelmente ligado á<br />
organisaçáo social e particularismo ethnico dos ribeirinhos do Zambeze que<br />
a sua substituição em muitas regióes nem seria util, nem com~rehendi<strong>da</strong>,<br />
nem bem acceite. As proprias missóes religiosas tem sido por vezes neces-<br />
sario conce<strong>de</strong>r o arren<strong>da</strong>mento do mussôco, corno meio <strong>de</strong> adquirir influen-<br />
S8
434 POLITICA INDIGENA<br />
- - - - .- -<br />
cia no espirito cios indigenas habitantes <strong>da</strong> área a qlle se edten<strong>de</strong> O trabalho<br />
<strong>da</strong> catechese. hindd ha bem pouco tempo os padres <strong>da</strong> Chupanga<br />
tiveram acceso ~nilnndo com a C. X. por causa <strong>da</strong> cobrança directa do imposto<br />
que aquelles religiosos consi<strong>de</strong>ravam indispensavel não s6 á vi<strong>da</strong> economica<br />
<strong>da</strong> missão, mas tambem & consoli<strong>da</strong>ção <strong>da</strong> sua prepon<strong>de</strong>rancia<br />
espiritual.<br />
Portanto, ain<strong>da</strong> que o m~issôco venha a ser substituido pelo imposto<br />
<strong>de</strong> palhota, será sempre convenieiite, no presente e n'um futuro muito dilatado,<br />
arren<strong>da</strong>r a cobranca dn contribuição na Zambezia ao proprietario ou<br />
foreiro agricola c in(lnstria1. Demais, o imposto <strong>de</strong> trahalho exigido na<br />
Zambezia é muito mo<strong>de</strong>rado, se o compararmos, por exemplo, & corvie javaneza<br />
que pó<strong>de</strong> subir a 42 dias por anno, <strong>de</strong> trabalho gratuito. E ningnem<br />
pensa em <strong>de</strong>negar aos hollan<strong>de</strong>zes, a quali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> emeritos colonisadores<br />
e habilissimos administradores <strong>de</strong> indigenas. O imposto em trabalho<br />
6 por certo con<strong>de</strong>mnavel, mas muitas vezes é indispensavel. O proprio<br />
sr. Cunha Gonçalves o reconhece, criticando o <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 1906, que estabeleceu<br />
a capitaçáo em Timor, por esse diploma não i<strong>de</strong>ntificar ti nova<br />
tributação ao mussôco, exigindo prestaçóes <strong>de</strong> trabalho, que obrigassem os<br />
timorenses a <strong>de</strong>spertar <strong>da</strong> sua perniciosa indolencia, e tornassem possivel<br />
a exploraçáo <strong>da</strong>s gran<strong>de</strong>s riquezas agricolas d'aquella colonia. Segundo<br />
o Sr. Cunha C;onçalves, o imposto <strong>de</strong> palhota é a contribuição do preto<br />
livre, e o rniissGco que envolve prestaç6es <strong>de</strong> trabalho, 6 o tributo do servo.<br />
Se admittisseiiios esta opinico em todo o seu exclnsivismo, seriamos levados<br />
a concliiir tlii(l ain<strong>da</strong> lia escravos em França, visto alli vigorar em<br />
algumas cotrimiiiias uma taxa municipal cobra<strong>da</strong> em trabalho. O quantitativo<br />
tlo mussôco tem sido siiccessi\ramente elevado a 1$000 reis em 1899 e<br />
a 1$203 reis crii 1902, sendo a sua cobrança e arren<strong>da</strong>mento feitos ain<strong>da</strong><br />
h6je segundo as disposicóes legaes dos diplomas <strong>de</strong> 1890 e 1892 ,já supracitaclos.<br />
Outra fórma do imposto pessoal em vigor nas nossas colonias 6 O<br />
regimen <strong>da</strong>s Jintns iisado em to<strong>da</strong> a parte portngueza <strong>de</strong> Timor, at6 uma<br />
<strong>da</strong>ta muito recente, e qne se po<strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rar uma especie <strong>de</strong> capitaçgo<br />
-variavel attri\)ii<strong>da</strong> apenas aos chefes indigenas, oii mais propriamente um
tribiito <strong>de</strong> vassallagem. Esta coiitribuiçáo especial era imposta aos reis<br />
indigenas que voluntariamente se submettiam, oii que as armas portugue-<br />
zas reduziam pela força, á condiçáo <strong>de</strong> vassallos e cobra<strong>da</strong> em dinheiro ou<br />
em generos. Os chefes indigenas repartiam a importancia <strong>da</strong>s fintas pelos<br />
seus subditos, segundo a unica lei do seu arbitrio. Essa repartiçáo <strong>da</strong>va<br />
origem a bastos abusos que o Sr. Cunha Gonçalves <strong>de</strong>screve rios segilintes<br />
termos. (')<br />
c A cobranwa <strong>da</strong> finta, pornm, <strong>da</strong>va ensejo a varias outras alcavállas<br />
sob o titulo <strong>de</strong> gusto, canceira e cabeçu tlpjntu. Os officiaes ou individuos<br />
encarregados <strong>da</strong> cobrança pelo chefe ou rei, - pois a contribuiygo é repar-<br />
ti<strong>da</strong> pelos siibditos - <strong>de</strong>moram-se nas al<strong>de</strong>ias até arreca<strong>da</strong>rem o tributo ;<br />
e durante esse tempo fazem as maiores exigencias a titulo <strong>de</strong> gccsto, taes<br />
como arroz, gttllinhas, porcos, cera, etc., sommando isto muito mai': do que<br />
a importancia <strong>da</strong> finta. Cobra<strong>da</strong> esta, é contluzi<strong>da</strong> á povoaçgo do rei; e o<br />
povo tem <strong>de</strong> pagar a canceiru, on a jorna<strong>da</strong> do cobrador, sendo por este<br />
arbitra<strong>da</strong> conforme o seu capricho. Alem dlisto, paga ain<strong>da</strong> o ljovo aos<br />
chefes <strong>da</strong>s al<strong>de</strong>ias, e estes ao rei, uma somma arbitraria chama<strong>da</strong> cabeçu<br />
<strong>de</strong> .fintn. Po<strong>de</strong>-se fazer i<strong>de</strong>ia <strong>da</strong>s continuas vexayóeb, arbitrarie<strong>da</strong><strong>de</strong>s e <strong>de</strong>sor<strong>de</strong>ns<br />
a que semelhante tributo <strong>da</strong>va e ain<strong>da</strong> dá logar. Tambem, poucos<br />
eram e são os reis que o p:tgam pontualmente ao governo portugiiez.. Em<br />
meiado do seculo XVIII fez-sc uma tentativa bem intenciona<strong>da</strong>, mas que<br />
teve pessimas consecliiencias, a substituição <strong>da</strong>s fi~ztas por uma capitaçáo<br />
uniforme <strong>de</strong> um par.cicír6 tirnoreiise, acompanha<strong>da</strong> <strong>da</strong> obrigaçzo do fornecimento<br />
d'iim <strong>de</strong>terminado contingente indigena para serviço militar. Se.<br />
gui<strong>da</strong>mente a csqai rnedi<strong>da</strong>s lavrou intensa, e duradoura a rebeldia dos<br />
indigenas. e, suffoca<strong>da</strong> a revolta, restabeleceram-se novamente as antigas<br />
Jintns, agora basea<strong>da</strong>q n'um systema mais equitativo <strong>de</strong> repartiçáo, visto<br />
qile no lançamento nao se atten<strong>de</strong>ra nem B riqueza, nem &<br />
importancia respectiva dos reit~os tributados. Em 13 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1906<br />
foi <strong>de</strong>creta<strong>da</strong> a suhstituiçko <strong>da</strong>s fintas por uma capitaçáo annual <strong>de</strong> 750<br />
(1) L. C. Gonçalves - C?. C.t'bllL<br />
X
436 POLITICA INDIU ENA<br />
reis, dos qiiae:: 500 reis são recebidos pela administraçtio portugueza, e 250<br />
reis servem para gratificar os chefes indigenas que fazem a cobrança. Na<br />
Guiné, <strong>de</strong>pois <strong>da</strong> campanlia <strong>de</strong> 1902, foi lança<strong>da</strong> uma taxa <strong>de</strong> capitaçiio<br />
<strong>de</strong> caracter repressivo que foi substitui<strong>da</strong>, por <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 21 <strong>de</strong> novembro<br />
<strong>de</strong> 1903, pelo imposto <strong>de</strong> 1$,500 reis por palhota ou cubata. Até hoje o es-<br />
tado quasi constante <strong>de</strong> rebelliáo <strong>da</strong> maior parte <strong>da</strong> populaqno indigena<br />
d'aquella colonia tem obstado á regiilari<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> c0branç.a do imposto, e<br />
prejudicado gravemente o seu rendimento.<br />
Colonias estrangeiras. - No Tonkin o imposto pessoal indigena 6<br />
<strong>de</strong>vido por todo o homem valido entre os <strong>de</strong>zoito e os sessenta annos, e foi<br />
fixado pcla portaria colonial <strong>de</strong> 7 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 1903, em tres p:itacas (I)<br />
para os inscriptos nas communas, cincoenta avos para os não inscriptos, e<br />
quarenta avos para os dispensados. N'algumas al<strong>de</strong>ias <strong>da</strong>s provincias<br />
Huong-Hoa, Thai-N'guyan, Tuyen-Quang, Yen-bai e Van-bu, a enti<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
collecta<strong>da</strong> é a ftimilia indigena, man ou muong, e o tributo, variavel entre<br />
tres patacas e oitenta avos, e uma pataca e meia, congloba a capitação e<br />
o imposto fundiario.<br />
No Annam as prestaçóes <strong>de</strong> trabalho foram aboli<strong>da</strong>s pela or<strong>de</strong>nança<br />
imperial <strong>de</strong> 15 <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong> 1898, que fixou a taxa <strong>da</strong> capitação indigena<br />
em ~URS patacas e vinte avos para os inscriptos, e quarenta avos para os<br />
restantes indigenas.<br />
Na Cochinchina o imposto pessoal B uma capitação fixa <strong>de</strong> uma pa-<br />
taca por ca<strong>da</strong> homem valicio.<br />
No Camboilje a capitação B variavel segundo se applica aos indigenas<br />
propriament,~ ditos, ou aos annamitas resi<strong>de</strong>ntes na colonia. No primeiro<br />
caso consi<strong>de</strong>ram-ee quatro cathegorias <strong>de</strong> contribuintes : os!inscriptos (P) <strong>de</strong><br />
21 a 50 pagam duas patacas e meia; os inscriptos <strong>de</strong> 51 a 59 annos,<br />
(1) A pataca que circula em todo o Extremo Oriente terri iim valor que oscilla<br />
entre 450 e 500 reis <strong>da</strong> nossa moe<strong>da</strong>.<br />
(9) Por insçriptoa enten<strong>de</strong>-se a classe superior <strong>da</strong>s çorriiriuni<strong>da</strong><strong>de</strong>s ciijos iuembros<br />
l~ossuern a terra ou interveem na administração.
oitenta avos ; os niio insoriptos <strong>de</strong> 21 a 50 annos, uma pataca e vinte avos ;<br />
os não inscriptos <strong>de</strong> 51 a 5'3 annos, noventa avos. Xo segundo caso, os<br />
annarnitas validos pagam tres patacas e <strong>de</strong>z avos, e os servos d'eàsa na-<br />
cionali<strong>da</strong><strong>de</strong> duas patacas e <strong>de</strong>z avos.<br />
No Laos os nnnamitas resi<strong>de</strong>ntes pagam duas patacas, e a mesma<br />
taxa é applica<strong>da</strong> aos indigenas naturaes <strong>da</strong> colonia, que, além d'isso, são<br />
obrigados a uma prestaçáo <strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong> 20 dias por anno, remivel ti ra-<br />
záo <strong>de</strong> <strong>de</strong>z avos por dia.<br />
No territorio <strong>de</strong> Quang-Tchu sáo contribuintes collectivos as commu-<br />
ni<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong>s al<strong>de</strong>ias reparti<strong>da</strong>s em cinco classes differentes. consoante a<br />
respectiva capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> collectavel.<br />
Em Ma<strong>da</strong>gascar, on<strong>de</strong> os indigenas estko ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iramente sobrecar-<br />
regados tle impostos, a taxa <strong>da</strong> capitação que <strong>de</strong>ve ser paga por todos os<br />
individuos do sexo masculino maiores <strong>de</strong> 16 annos, é <strong>de</strong> 30 francos em Tananarive,<br />
variando <strong>de</strong> 20 a 10 francos nas differentes regióes <strong>da</strong> colonia.<br />
N'alguns pontos do inte~ior o imposto po<strong>de</strong> ser pago collectivamente e<br />
cobrado parcialmente em generos. S8 são isentos <strong>de</strong> imposto os indigenas<br />
militares e aquefles erz,ju invali<strong>da</strong><strong>de</strong> se comprove. Altim <strong>da</strong> capitaçáo muitos<br />
outros impostos onerosos inci<strong>de</strong>m sobre os indigenas, difficultando-lhes excessivamente<br />
a existencia. Fl interessante trínscrcver a opinião esclareci<strong>da</strong><br />
<strong>de</strong> Girault,, qiie reprova este excesso <strong>de</strong> tribiitaçáo:<br />
Depois 11a quc~la<br />
(10 governo hova, o general Gnllieni proce<strong>de</strong>u a<br />
uma serie <strong>de</strong> reformas fiscac* qiie <strong>de</strong>ram em resiiltado elevar o producto<br />
<strong>da</strong>s receitas <strong>de</strong> 11.200:OOO francos em 18!18 a 2í,.400:000 francos em 1905.<br />
Estas reformas fiacaes permittiram ao governo local prescindir <strong>da</strong>s sribven-<br />
;fies <strong>da</strong> metropole <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1!10:3, e fazer frente, apezar d'isso, a <strong>de</strong>spezas<br />
cresceiites <strong>de</strong> anno para anno. Sob o ponto <strong>de</strong> vista meramente financeiro,<br />
o resultado <strong>de</strong>sejado foi obtido e as reformas foram efficazes. Mas sob O<br />
ponto <strong>de</strong> vista economico, resta snher se o encargo imposto á população<br />
náo foi <strong>de</strong>masia<strong>da</strong>mente oneroso, e se as contribuiçóes n8o foram augmen-<br />
ta<strong>da</strong>s coin <strong>de</strong>masia<strong>da</strong> rapi<strong>de</strong>z, sem se atten<strong>de</strong>r 5s facul<strong>da</strong><strong>de</strong>s contributivas.<br />
Os auctores d'essas reformas allegaram que, em summa, o encargo imposto<br />
aos contribuintes náo excedia em 1905, 10 francos por cal)eçn, que nenhum
438 POLITICA INDIGENA<br />
imposto provincial ou regional se junta ao que é localmente pago, que o<br />
imposto B iim estimulante feliz cjue obriga indirectamente ao trabalho o<br />
indigena naturalmente preguiçoso, pondo-o na necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> ~anhar dinheiro<br />
para pagar as suas contribuicóes. A estes argumetitor oppfiem-se<br />
o ilescontentamento causado na popniaçno indigena eiil 1!)0.5 pelo augmento<br />
dos impostos, que se traduziu n'uma revolta no sul <strong>da</strong> ilha, e :i situac.áo<br />
estacionaria <strong>da</strong> prodiicyiio local e do commercio exterior, o que parece claramentcb<br />
indicar um <strong>de</strong>ywnimo geri11 produzido pelo exce.i-o <strong>da</strong> tri1)ntaçGo.<br />
Sopesa<strong>da</strong>s estas razões, pareceu pru<strong>de</strong>nte não ir mais lonye no caminho<br />
que se trilhava e o actual governador geral tem-se applicado a reduzir as<br />
<strong>de</strong>spezas e consequentemente os encargos dos contribuintes.*<br />
Na Rcnniáo o imposto <strong>de</strong> capita~áo é <strong>de</strong> C, francos, e é pago pelos<br />
chefes <strong>de</strong> familia, pelos celibatarios maiores <strong>de</strong> um ou <strong>de</strong> outro sexo, pelas<br />
inulheres separa<strong>da</strong>s dos maridos. e pelos menores <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> 16 annos que<br />
exeryam profissão remunera<strong>da</strong> ou possuam rendimento proiirio.<br />
Em Mayotte os indigenas maiores <strong>de</strong> 16 annos c os assalariados<br />
pagam uma capitaçiio anniial <strong>de</strong> 12 francos, sem distinc~ão <strong>de</strong> sexos.<br />
Nas Comoroi a importancia <strong>da</strong> capitação cS <strong>de</strong> 5 franco*, e 6 paga<br />
sem tlistinrq8o <strong>de</strong> -cxni por todos os individuos indigenas maiores <strong>de</strong> 1'2<br />
annos.<br />
Na Nova C.11edunia uma capitação <strong>de</strong> 10 francos t: <strong>de</strong>vi<strong>da</strong> pelos<br />
adultos do sexo maqciilino, mas a difficul<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> percepçRo tl'e~te imposto<br />
tem levado ao reciirso (Ir! tornar responsavel pelo pagamento o con.jiincto<br />
<strong>da</strong> respectiva tribii, em harmonia com o numero approximado dos contribuintes,<br />
annualmeiite indicado á administraçgo franceza pelos chefes indigenas.<br />
Nas (~olonia* fr;incezas (ta Oceania existe n'algumaq localicla<strong>de</strong>s o<br />
imposto em tral)~llio, C a taxa <strong>da</strong> capitação é <strong>de</strong> 10 francos por ca<strong>da</strong><br />
a(1~ilto do sexo masculino.<br />
Em to<strong>da</strong> a Africa Occi<strong>de</strong>ntal Franceza (Senegal, Protectorados do<br />
Senegal, Mauritania, Alto Senegal e Niger, Territorio Militar do Niger,<br />
Guinb, Costa do Marfim, Dahom6) e no Congo Francez, a 1)ase do imposto<br />
indigena 6 a capitação que varia segundo a antigiii<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> colonia. o grau
~ -.<br />
IMPOSTOS<br />
- - -. --- - --<br />
<strong>de</strong> siibitiissáo dos indigenas e as rondiçóes <strong>da</strong> cobrança, (lesdc 25 centimos<br />
até 4 francos. Para se avaliar a importancia d1este imposto como<br />
recurso financeiro. l~asta dizer q11e sendo ain<strong>da</strong> siisceptivel <strong>de</strong> gr;tn<strong>de</strong><br />
augmento fntiiro, era compiitado pelo orçamento <strong>de</strong> 1907 na somma <strong>de</strong><br />
lCi.%J1:376 francos.<br />
Aos habitantes moiiros <strong>da</strong> Mauritania B exigido, em vez <strong>da</strong> cspitaçáo,<br />
o zekkat que 6 '/,, do rendimento dos anirnaes domesticas e I/,, <strong>da</strong><br />
producçáo agricola.<br />
Nti Argelia os kabylas estão siijeitos ao pagamento il'iima capitaçáo.<br />
lezrna, cujo regimen <strong>de</strong> lançamento consi<strong>de</strong>ra sete classes <strong>de</strong> contril)~iintes,<br />
isentando totalmente o.: <strong>da</strong> primeira classe, e graduando o imposto para<br />
as restantes, entre os limites millimo e maximo <strong>de</strong> 5 e <strong>de</strong> 100 franco
410 POLITICA INDIGENA<br />
- --P<br />
prestaçóes <strong>de</strong> trabalho gratuito, estabeleceu, conio cornpensaçáo d'esse beneficio,<br />
o lançamento d'lirna capitnçáo fixa <strong>de</strong> iim florim. N'aquella colonia<br />
neerlan<strong>de</strong>za sul)-iistcrri. pois, a par, a capitaç8o pecuniària e o imposto individual<br />
<strong>de</strong> tràl)nllio, qiie é variavel entre S e 42 dias <strong>de</strong> trabalho por anno.<br />
Nas Philil)l~i~iar a adininistraçi%o americana conservou a capitaç&o<br />
exigi<strong>da</strong> aos indigenas, corriu pagamento <strong>da</strong> cetit<strong>da</strong> pessoal, que os hespanlior-:<br />
tinharii estabelecido para organisar o registo do estado civil dos natiiraes,<br />
mas reduziram e iinificaram o quantitativo d'essa contribiiição que hqje é<br />
<strong>de</strong> uma pataca por habitante. No Transwaal e no Orange a capitaçáo indigena<br />
tem sido successivemente eleva<strong>da</strong> a fim <strong>de</strong> constranger o indigena a<br />
trabalhar nas minas. No Orange 6 <strong>de</strong> lima libra esterlina por ca<strong>da</strong> adiilto,<br />
e no Trariswaal a lei <strong>de</strong> 1902 elevou a taxa do imposto a cliias libras por<br />
ca<strong>da</strong> adulto do sexo masculino, mais duas libras por ca<strong>da</strong> mulher alem <strong>da</strong><br />
primeira, e <strong>de</strong>z shillings por ca<strong>da</strong> cão pos~uido pelos indigenas.<br />
Na Colonis do Cabo o imposto <strong>de</strong> capitaçáo, creado pelo Glen Grey<br />
Act, tem sido tambem successiuamente elevado, siipprimindo-se as isençúes<br />
previstas por esua lei.<br />
Imposto <strong>de</strong> palhota<br />
Colonias portuguezas O imposto <strong>de</strong> palhota 6 a fórma mais viilgarisadn<br />
do impo9to indigena e talvez tambem n qiie melhor se coaduna,<br />
com o estado social e economico dos contribuintes a quem B applica<strong>da</strong>. Na<br />
siia essencia, (S uma fórma simplista <strong>de</strong> contribuiç50 predial especialmente<br />
a<strong>de</strong>qua<strong>da</strong> á materia collectavel <strong>da</strong> riqueza indigena. Nas colonias portuçuezas,<br />
que nos conste, o primeiro diploma legislativo que se lhe refere 6<br />
(I <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 28 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1854, que siipprimia o mussôco zambeeiano,<br />
aubstituindo-o pelo imposto <strong>de</strong> palhota e cujas disposiç6es ficaram, como já,<br />
dissemos, lettra morta. JLais tar<strong>de</strong>, o <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 20 <strong>de</strong> outubro <strong>de</strong> 1880<br />
estabeleceu novamente o lanqamento d'esse imposto, na ~rovincia <strong>de</strong> RIO-
qaml~ique, mas s6 <strong>de</strong>pois do <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 5 <strong>de</strong> julho <strong>de</strong> 1883 6 que a cobrança<br />
se aornecou a effectuar em proveito dos cofres publicas. Este diploma, nos<br />
seu': consi<strong>de</strong>randos preliminares, reconhece que se não trata <strong>de</strong> iim imposto<br />
novo. visto que <strong>de</strong> longa <strong>da</strong>ta elle vinha sendo cobrado em varios pontos<br />
<strong>da</strong> l~rovincia eni beneficio <strong>de</strong> particulares europeu': ou dos chefes indigenas.<br />
O tlccretc? estipula que seja lançado, na provincia <strong>de</strong> &Ioc;ambique, iim im-<br />
posto sobre as palhotas, representado: pela taxa annual <strong>de</strong> 800 reis por<br />
ca<strong>da</strong> palhota situa<strong>da</strong> nas ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s e villas <strong>da</strong> provincia; pela <strong>de</strong> 600 reis<br />
sobre ca<strong>da</strong> palhota situa<strong>da</strong> fiíra <strong>da</strong>s ci<strong>da</strong><strong>de</strong>3 e villas nos districtos <strong>de</strong> Cabo<br />
Delgado, Moçambiqiie, Angoche, Quelimane, Lourenço Marques e outros<br />
territorios tlo littoral; e pela <strong>de</strong> 400 reis sohre ca<strong>da</strong> palhota situa<strong>da</strong> fdra<br />
<strong>da</strong>s ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s e villas nos districtos <strong>de</strong> Sena, Tete e terra3 <strong>de</strong> Inhambane.<br />
Ficam isentos do pagamento d'este impojto oa indigenas que ,já pagarem<br />
111 ttss4ro.<br />
Todos os individuos indigenas <strong>de</strong> 18 a 50 annos, sem distincyiio <strong>de</strong><br />
sexos, sáo obrisados a concorrer com tres dias <strong>de</strong> trabalho por xnno, remi-<br />
veis a dinheiro, para a construcção e reparaçáo <strong>de</strong> estra<strong>da</strong>s e outras vias<br />
<strong>de</strong> communicaçáo <strong>de</strong> uso e dominio publico. Esta prestaçáo <strong>de</strong> trabalho só<br />
po<strong>de</strong> recahir nos indigenas que habitarem n'uma zona <strong>de</strong> <strong>de</strong>z kilometros <strong>de</strong><br />
raio, que tenha por centro o local <strong>da</strong> obra em que <strong>de</strong>vem ser empregados.<br />
Por <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 2H <strong>de</strong> junho <strong>de</strong> 1894, referen<strong>da</strong>do por Neves Ferreira,<br />
foi a taxa do imposto <strong>de</strong> palhota em Moqambiqiie eleva<strong>da</strong> a 900 reis nos<br />
districtos <strong>de</strong> Moçambique e Zambezia, e a 1$350 reis nos districtos <strong>de</strong><br />
Inharnbane e Louren~o Marques, com excepção <strong>da</strong>s Areas <strong>da</strong> ci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> Mo-<br />
çambique e <strong>da</strong>s villas <strong>de</strong> Quelimane e Inhambane, on<strong>de</strong> o imposto ficou<br />
sendo rle 11$500 reis. Este diploma estabelecia, no seu artigo 2.0, que O go-<br />
vernador geral em conselho po<strong>de</strong>ria arren<strong>da</strong>r a cobrança do imposto <strong>de</strong><br />
palhota por um periodo niio superior a cinco annos, nos territorios on<strong>de</strong> até<br />
então não houvesse sido lança<strong>da</strong> e cobra<strong>da</strong> a referi<strong>da</strong> contribuição.<br />
Em 1896 o governador geral Mousinho d'A41buquerque, reconhecendo<br />
que a fdcul<strong>da</strong><strong>de</strong> contributiva dos indigenas <strong>da</strong> ~rovincia<br />
permittia a eleva-<br />
ção <strong>de</strong> hxa, do imposto, e querendo aldm d'isso verificar e fazer consagrar<br />
no eapirito indigena a submissão <strong>de</strong>finitiva dos regulos vencidos nos distri-
442 POLITICA INDIGENA<br />
- - - -- -<br />
ct,os do sul, publicou a portaria <strong>de</strong> 9 <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 1896, que cfeterminou o<br />
seguinte :<br />
1." Que o imposto annnal <strong>de</strong> palhota nos districtos <strong>de</strong> Lourenço<br />
Marqiies, G~za e Moçarribiqiie passasse a ser <strong>de</strong> 25600 reis ou meia libra<br />
em ouro, exceptuando-se a Ares <strong>da</strong> ci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> T~ourenço.DIarques, on<strong>de</strong> o<br />
imposto seria <strong>de</strong> i$600 reis ou libra e meia eiri ouro por palhota.<br />
2.0 Que, durante dois annos, no ilistricto <strong>de</strong> Inhambane, na iirea<br />
dos regulatos fieis e ciiie já pagavam imposto ant,es <strong>da</strong> cainpanha, fosse<br />
manti<strong>da</strong> a taxa <strong>de</strong> 1$350 reis.<br />
Estas taxas foram altera<strong>da</strong>s em Mogambiqiie: (I) pelo <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 17<br />
<strong>de</strong> agosto <strong>de</strong> 1901, no qual o Sr. Conselheiro Teixeira <strong>de</strong> Sousa, f~in<strong>da</strong>do<br />
nas circnmstancias penosas <strong>da</strong> crise agricola e alimenticia que esse districto<br />
atravessara, reduzia provisoriuinente a.2$000 reis a respectiva contribuição<br />
indigena. Nos districtos do si11 as taxas <strong>de</strong> 18!11i continiiaram vigorando at6<br />
1907, sendo altera<strong>da</strong>s pelo governador geral, Conselheiro Freire dlAndra<strong>de</strong>,<br />
que elevou o imposto a uma libra por anno e por palhota em todo o territorio<br />
a oeste do rio Limpopo. Este a~igrnento foi imposto pela necessi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> equilibrar o estado financeiro <strong>da</strong> colonia, c11,jas receitas diminuiam, e,<br />
embora bastante elevado, náo é incomportavel com a capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> contributiva<br />
dos indigenas. A melhor prova d'isso est,A no facto <strong>da</strong> sua colrança se<br />
ter <strong>de</strong>s<strong>de</strong> essa <strong>da</strong>ta continuado a realisar sem a menor difficu1d:i<strong>de</strong>. 1)e resto,<br />
este augmento <strong>de</strong> 60 "i,, tio quantitativo do imposto foi geralmente I~em<br />
acceite pelos indigenas, 'i,ist,o que coincidiu e serviu <strong>de</strong> compensaq&o á snppressRo<br />
<strong>da</strong> prktica immoral do chihnlo, a (pie já nos referimos quando estu<strong>da</strong>mos<br />
o trabalho obrigatorio, e que era <strong>de</strong>test,a<strong>da</strong> pelos natiiraes.<br />
() imposto <strong>de</strong> palhota 6 a mais rendosa contribiliçFio <strong>da</strong> provincia <strong>de</strong><br />
Moçambiqne.<br />
O orçamento para 1908-1909 calcula o sei1 rendimento em reis<br />
1.360.000$000. Nos territorios <strong>da</strong> C. &I. existem a par o ~ni~ssoco e o irn-<br />
(I) Esta alteracão não se applicoii a to<strong>da</strong> a provincia, como diz o Sr. Ciinha<br />
Gonqal\.es no seti citado livro, nias sim apqnas ao districto <strong>de</strong> Moçambique.
--<br />
I<br />
IMPOSTOS 4-13<br />
-<br />
posto <strong>de</strong> palhota, serrdo este ultimo <strong>de</strong> 25.j00 reis. Ka Companhia do 'Nyasia<br />
vigora o imposto <strong>de</strong> palliota com a taxa cle 2$500 reis por palhota.<br />
No districto do (jonqo o impostct (\e palliota com a itesiqnacáo ilnposto<br />
<strong>de</strong> rtlh~zt(r, foi creado pelo <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> :31 <strong>de</strong> maio dc 1887, referen<strong>da</strong>do<br />
por Barr«s Gomes, que fixoii o sei1 qii:intitativo ern 2.50 reiq anniiae3 por<br />
ca<strong>da</strong> ciib:it:~.<br />
Em 1906, por iiiiciativa do mallozrado Eduardo Costa, fi~i generalisado<br />
o imposto rle ciibata a to<strong>da</strong> a pro\,iricia (te Angola. O <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 13<br />
<strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro cl'cice armo lança o tributo consi<strong>de</strong>rando que o imposto in-<br />
digena, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que seja lancado equitativamente e cobrado com suavi<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />
não sómente se jristifica como contribuiçáo directa Jestina<strong>da</strong> a cobrir oii a<br />
diminuir os encargos tlo Eqtado resultantes <strong>da</strong> necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> do policiamento<br />
e <strong>de</strong>senvolvimento <strong>da</strong>r regióes occupa<strong>da</strong>s, mas 6 tambem perfeitamente le-<br />
gitimo como tributo significativo <strong>da</strong> ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira e effectiva submissão <strong>da</strong>s<br />
trihus indigena~ 6 no++x wberania, e como taxa <strong>de</strong> civili-ay%o por ol~riqar<br />
o indigena ao tra1)allio para obter os recilrsos necessarios ao sei1 pagamento*.<br />
O quantitativo do iniposto <strong>de</strong>ve ser fixado triennalmente pelo gover-<br />
nador geral, ouvidos o3 governadores dor ilistricto5 r o c'onsellio do go-<br />
verno. No primeiro triennio o valor tlo imposto náo (leve exce<strong>de</strong>r (i00 reis<br />
por cubata, excepto nas ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> Iloan<strong>da</strong>, Henguella, e villas do Ambriz,<br />
Novo Redondo, Catumbella, BIo$samr<strong>de</strong>s e Porto Alexandre, ontltl po<strong>de</strong> ser<br />
elevado ate 1$500 reis por ciihata.<br />
Nas regities on<strong>de</strong> é impos
444 POLITICA INDIGENA<br />
-- -- -.<br />
imposto <strong>de</strong> cubatti em to<strong>da</strong> a prorincia <strong>de</strong> Angola, a quantia <strong>de</strong> reis<br />
60:0009000.<br />
Na Guine os diplomas que regulam e aiictorisnm a cobrança cio im-<br />
posto <strong>de</strong> palhota síio a, portaria provincial <strong>de</strong> 7 cle novembro <strong>de</strong> 1903, e o<br />
artigo 9 do <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 21 do mesmo mez e anno. O orçamento para<br />
1908-1909 calcula em 66:000$000 reis, o rendimento d'essa contribuição.<br />
Colonias estrangeiras - Quasi to<strong>da</strong>s as naçóes colonixes teem utilisado<br />
esta fdrma <strong>de</strong> tributação em algumas <strong>da</strong>s suas colonias. No Congo<br />
Francez o imposto predial indigena 6 <strong>de</strong> tres francos por ca<strong>da</strong> palhota,<br />
<strong>de</strong> seis francos por ca<strong>da</strong> casa <strong>de</strong> ma<strong>de</strong>ira, e po<strong>de</strong> ser pago em prestaçúes<br />
parciaes <strong>de</strong> dinheiro ou generos. Ein Maditgasc~r :L taxa <strong>da</strong> contribiiição é<br />
<strong>de</strong> um franco para as casa9 tcrreas, <strong>de</strong> dois francos e cincoenta centimos<br />
para as casas com antlare~, mas corn meno4 <strong>de</strong> quatro divisóes, e <strong>de</strong> cinco<br />
francos em todos os oiitru.; caso*. X:t Costa dos Somalis é <strong>de</strong> dois francos<br />
por palhota, e nas Comuro.: I: cle l,6S fr. para as casas <strong>de</strong> pedra, e <strong>de</strong> 83<br />
centimos para as pa!hotas. Nas colonias inglezas <strong>da</strong> Africa Oriental, Rho<strong>de</strong>sia,<br />
Natal, British Protectoritte e Rritish Central Africa, vigorou sempre<br />
o imposto <strong>de</strong> palhota, hut ttrx, que principalmente na segun<strong>da</strong> e terceira<br />
d'aquellas colonias 6 hastttnte elevado. Mais recentemente introdiiziram<br />
os inglezea esta contribuição nas suas colonias <strong>da</strong> Africa Occi<strong>de</strong>ntal, Lagos,<br />
Serra TAa, Gambia, Nigeria, Costa do Ouro, etc., tendo a siia cobrança<br />
occasionado graves perturbaçíies e successivas revoltas indigenas<br />
na Serra 1,eijii c na Achantilandia. A importancia <strong>da</strong> contribuição é mais<br />
eleva<strong>da</strong> que nas colonins fi.itncezas e varia entre 3 a 6 sliillings. Na B. C.<br />
A. a taxa é <strong>de</strong> 3 shi!lings e na Rho<strong>de</strong>sia e Natal <strong>de</strong> 10 a 20 shillings. Nas<br />
colonias inglezas <strong>da</strong> Africa Occi<strong>de</strong>ntal os colonor brrtncos que empregam<br />
trabalhadores indigenãs sáo responsaveis pelo pagamento do imposto <strong>de</strong><br />
palhota <strong>de</strong>vido pelos seus assali~riados.<br />
Xas colonias allen~iis <strong>da</strong> Xfrica existe geralmente, com quantitativo<br />
variavel, o imposto <strong>de</strong> palhota, e na D. O. A. essa contribuiçiio constitue<br />
o elemento mais importante <strong>da</strong>s receitas coloniaes, pois o sei1 rentlimento<br />
tinnual ex~e<strong>de</strong> um milha0 <strong>de</strong> marcos.
O imposto indigena na costa oriental Q sempre mais elt:vado do que<br />
na occi<strong>de</strong>ntal, e, por vezes mesmo, <strong>de</strong>sproporcionado á capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> collecta-<br />
vel dos aiitochtones.<br />
Os motivos principaes d'esta digerença s5o : a maior antigui<strong>da</strong><strong>de</strong> do<br />
imposto na costa oriental que favorece a sua percepção e o augmento<br />
progressivo <strong>da</strong>s taxas, a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> obrigar indirectamente os in-<br />
digenas a trabalhar, e, ain<strong>da</strong> n'alguns casos, a superior riqueza dos na-<br />
turaes. A elevação dos salarios na Africa Oriental permitte cobrar iim<br />
quantitativo <strong>de</strong> imposto qiie difficilmente po<strong>de</strong>rá vir a ser attingitio nos<br />
esta1)elecimcntos coloniaes <strong>da</strong> Africa Occi<strong>de</strong>ntal.<br />
Imposto territorial<br />
O imposto sobre a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> rustica é uma <strong>da</strong>s fórmas mais com-<br />
muns do imposto indigena, nas colonias em que os riatnraes se encontram<br />
n'iim relativo estado <strong>de</strong> civilisaçáo, e on<strong>de</strong> os registros, as leis, ou as cir-<br />
cumstancias, facilitam a respectiva cobrança.<br />
Na Argelia os drabes agricultores estão sujeitos ao pagamento <strong>de</strong><br />
duas variantes do impbsto fundiario: o achur, e o hockor que já existiam<br />
sob a <strong>de</strong>nominação tiirca e que a administração franceza conservou, alte-<br />
rando, porém, o valor <strong>da</strong>s taxas e a fórma <strong>de</strong> pagamento.<br />
O uchz~r inci<strong>de</strong> sobre a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> agricnlta<strong>da</strong> e tem por base a<br />
charrua, que equivale a 10 hectares pouco mais ou menos. Primitivamente<br />
era cobrado em generos e na actuali<strong>da</strong><strong>de</strong> constitue iim tributo pecuniario<br />
com o quantitativo fixo <strong>de</strong> 25 francos no <strong>de</strong>partamento <strong>de</strong> Constantina, e<br />
variavel annualmente nos <strong>de</strong>partamentos <strong>de</strong> Alger e Oran, segundo a qua-<br />
li<strong>da</strong><strong>de</strong> do anno agricola e o preço dos productos do solo.<br />
O hockor vigora apenas no <strong>de</strong>partamento <strong>de</strong> Constantina e applica-se<br />
ás terras arch. A sua importancia somma<strong>da</strong> á do achur e ti varios addicio-<br />
naes, faz montar a quoti<strong>da</strong><strong>de</strong> annnal do imposto por ca<strong>da</strong> charrua d'este
446 POLITICA INDIGENA<br />
<strong>de</strong>partamento, á quantia exorbitante <strong>de</strong> 55 francos, que representa uma<br />
<strong>de</strong>sproporciona<strong>da</strong>, injusta e pesadissima tributaçáo, <strong>de</strong> todo o ponto ruinosa<br />
para a agricultura indigena. Estes doi9 impoqtos ren<strong>de</strong>m anniialmente cerca<br />
<strong>de</strong> sete milhóes <strong>de</strong> fraricos. qiiantia que compara<strong>da</strong> com a liniita<strong>da</strong> Area<br />
<strong>da</strong>s terras dos indigenad :tgriciiltores, sohqjamente mostra o exagGro e a<br />
injiistiqa <strong>da</strong> contribuição.<br />
Sa Tiiniqia iis terras iridigenas estiio onera<strong>da</strong>s coin iim systema <strong>de</strong><br />
trib~itos realmente curioso a excliieivo aquella colonia. O c~cl~iir. arat)e as-<br />
sume na Tunisia o caracter d'um dizimo sol~re<br />
os cereaes que actiialmente<br />
é pago em dinheiro. 0s agriciiltores indigenas que usarem na lavoura char-<br />
ruas ou outras machinas agricolas <strong>de</strong> fnhrico franccz, pagam apenas a <strong>de</strong>-<br />
cima parte do imposto. Esta disposiçáo original <strong>de</strong>ve ter sido simultanea-<br />
mente rnotivadã, pela necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> fazer progredir os processos culturaes<br />
dos indigenas, e pelo <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> proteger efficazmente a industria franceza.<br />
Na opiniáq <strong>de</strong> Leroy Beaiilleu, este ho~azis differencial <strong>de</strong>via ser gradual-<br />
mente reddzido até ilm quarto do imposto. O lihanun Q outro imposto tuni-<br />
sino que inci<strong>de</strong> sobre as oliveiras e alfarrobeiras que constituem um dos<br />
mais irnportanter factores <strong>da</strong> riqueza agricola <strong>da</strong> colonia. Sntigamente<br />
esta contribiiiçáo era cobra<strong>da</strong> directamente em fructos <strong>da</strong>s arvores tribu-<br />
tadns, o que <strong>da</strong>va origem ;i gran<strong>de</strong>s abusos e pre,judicava altamente o ren-<br />
dimento agr~coln. Yresentemerite subjtituiu-se esse dizimo em geiieros por<br />
uma taxa fixa erri dinheiro.<br />
Aléq dos impostos j& citados, ha ain<strong>da</strong> na Tunisia o wzmrljas que<br />
inci<strong>de</strong> nas ~uperficies cultiva<strong>da</strong>s <strong>de</strong> arvores <strong>de</strong> fructo, e o imposto <strong>de</strong> carube,<br />
que é uma taxa <strong>de</strong> 6,25 O/, sobre o valor locdti~o<br />
<strong>da</strong>s terras. Existem<br />
ain<strong>da</strong> oiitrhs pequerias (bontribuiq6es <strong>de</strong> menos importancia que o governo<br />
do protectorado tem procurado slipprimir ou unificar. Comtudo, o conjuncto<br />
do systema tributnrio na Tiirtisia, carece, como diz Reinscti, <strong>de</strong> ser simpli-<br />
ficado, e reformado quanto A natureza <strong>da</strong> materia collectadã.<br />
Em Ma<strong>da</strong>gasoar um doo variou impostos a que os indigenas estão sn-<br />
jeito* B a taxa sobre os arrozaes, quer estes estejam cultivados quer não.<br />
Essa taxa B <strong>de</strong> 5 francos por hectare nas provincias <strong>de</strong> Tãnanarive e <strong>de</strong> Ime-<br />
rina Centrd, rle 4 frtincos nau <strong>de</strong> Xngavo-Mangoro-hlvotra, <strong>de</strong> Imerina
IMPOSTOS 447<br />
-<br />
Norte e <strong>de</strong> Itasy, e <strong>de</strong> 3 francos nas <strong>de</strong> Vakinankaratra, <strong>de</strong> AmLositre e<br />
<strong>de</strong> Fianarantsoa. As restantes provincias estão isentas do pagamento d'esta<br />
contri buiçáo.<br />
Na Tntlia Ingleza, a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena (I) po<strong>de</strong> assumir o caracter<br />
collectiro nas co~n~lrunidn<strong>de</strong>s <strong>da</strong>s al<strong>de</strong>ias, a fórma individual no systema<br />
ruiy~tonri em que os proprietarios do solo são os proprios agricultores que<br />
o exploram, e o caracter d'um genuino feu<strong>da</strong>lismo agricola nas provincias<br />
<strong>de</strong> zri1ni7z<strong>da</strong>res que SXO ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros senhorios, rcsponsaveis perante o goverrio<br />
pelo pagamento <strong>da</strong>s contribuicúes. A administração ingleza <strong>de</strong>calcando<br />
o figurino oriental reservou para a coroa britannica o direito eminente<br />
á posse <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as terras, <strong>de</strong> fórma que a contribuição imposta aos<br />
occupantes do solo, mais propriamente se <strong>de</strong>ve consi<strong>de</strong>rar como o preço do<br />
arren<strong>da</strong>mento.<br />
Se tlicioricamente o reuenue settle~nent é uma ren<strong>da</strong>, na reali<strong>da</strong><strong>de</strong> não<br />
passa tf'iitna t>ontril)iii(;áo, a mais onerosa a que estão sujeitas as populaçóes<br />
indigenas <strong>da</strong>s colonias asiaticas.<br />
A pereqilaçiio ca<strong>da</strong>stra1 que acompanha os Settlements Ceports (8) classifica<br />
ciii<strong>da</strong>dosamente as terras incligenas, e fixa equitativamente a capaci<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
collectavel <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> classe <strong>de</strong> terrenos.<br />
A taxa annnal do imposto territorial assim <strong>de</strong>terminado, é <strong>de</strong>creta<strong>da</strong><br />
pelo governo colonial com um valor fixo durante um espaço <strong>de</strong> tempo variavel,<br />
segundo as circumstancias locaes, entre 20 e 30 annos na gran<strong>de</strong><br />
maioria <strong>da</strong>s prorincias indianas. Findo este prazo, o settlement reuenue é<br />
revisto, a sua taxa manti<strong>da</strong> ou altera<strong>da</strong>, conservando-se o novo quantitativo<br />
fixo durante um periodo egual ao anterior. Na riquissima provincia<br />
<strong>de</strong> Hengãlrr, err, alglma gran<strong>de</strong>s znmin<strong>da</strong>res <strong>da</strong> Presi<strong>de</strong>ncia <strong>de</strong> Matlrasta, e<br />
n'alguns districtos do rioroeste vizinhos a Benares, vigora iiina taxa perpetua<br />
<strong>de</strong> imposto territorial, fixa<strong>da</strong> pelo Perrnanent Settle~rlent oj' Bengnl<br />
D <strong>de</strong> 1793, que conce<strong>de</strong>u aos za~nintlcr,.~~, simples arren<strong>da</strong>tarios do<br />
i') Vi<strong>de</strong> capitulo anterior pag. 439 e seguintes.<br />
(e) -Cri<strong>de</strong> capitulo anterior pag. 330.
448 POLITICA WDIGEXA<br />
-- -- - -----<br />
imposto durante o imperio mongol, direitos <strong>de</strong> posse plena e <strong>de</strong>finitiva<br />
sobre o solo, fixando cld perpehtzi~n a quoti<strong>da</strong>dc do imposto.<br />
Tbeii motivo a esta disposição a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> reduzir ao minimo os<br />
respoii.-:i\ eis I calas contribuiçóes, attentas as difficiil<strong>da</strong><strong>de</strong>s insuperaveis que<br />
n'aqiiella epoclia se oppunham ao ca<strong>da</strong>stramento methodico c minncioso <strong>da</strong><br />
proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>, e a gran<strong>de</strong> nrgencia que os inglezes tinham <strong>de</strong> realisar a cobrança<br />
<strong>da</strong>s coiitribuiçóes para equilibrar a balança financeira <strong>da</strong> colonia.<br />
Koh districtos <strong>de</strong> Bengala que foram successivamente annexados á provincia<br />
não se npplica o a Pr~?nnne?2t Settle?ne?lt n, vigorando os sr>ttl~irr~nt.s recenues<br />
ordinarios sujeitos a revisáo periodica. Os zn7nintlrire.s sob o regimen<br />
do imposto fixo beneficiam gran<strong>de</strong>mente do augmento do valor <strong>da</strong>s terras<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> 17'33, em <strong>de</strong>sproveito dos cofres piiblicos que, n'este caso, não comparticipam<br />
dos proventos d'essa crescente valorisaçáo. Em to<strong>da</strong>s as oiitras<br />
regió es <strong>da</strong> India Ingleza, o qiiantitativo do imposto é periodicamente fixado,<br />
e applica-se indifferentemente á proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> ~cliyrcfzxwi e aos zamin<strong>da</strong>res.<br />
A primeira qiie predomina principalmente nas provinciris <strong>de</strong> Bonibaim,<br />
Madrasta, Assam e Hirmania, o tributo exigido 4 <strong>de</strong> 50 O/', do rendimento<br />
liquido <strong>da</strong> exploração agricola <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> <strong>de</strong>duzi<strong>da</strong>s to<strong>da</strong>s as <strong>de</strong>spezas referentes<br />
ao amanho e grangeio <strong>da</strong>s terras, e a cobrança 4 feita (lirectamcnte<br />
pelo fisco aos cultivadores indigenas. Na. opinião <strong>de</strong> varios poblicista* in-<br />
glezes e indios que teem criticado esta maneira <strong>da</strong> fixar o imposto, seria<br />
preferivel effectiiar o lançamento <strong>da</strong> contribuiçko sobre o rendimento bruto<br />
<strong>da</strong> prcprie<strong>da</strong><strong>de</strong>, consi<strong>de</strong>raiido que uma quinta parte d'esse rendimento <strong>de</strong>ve<br />
ser proximamente equivalente aos 50 O/, do rendimento liqilido actualmente<br />
collectado, Na reali<strong>da</strong><strong>de</strong>, o valor do imposto está longe <strong>de</strong> attingir esta alta<br />
percentagem, porque a administraçáo ingleza nunca se recusa a conce<strong>de</strong>r<br />
valiosas reducçóes, quando as crises cerealiferas, as intemperies climateri-<br />
cas, o afastamento dos mercados, etc., provavelmente as jiistifiqiiem. Quando<br />
se approxima a epocha <strong>de</strong> revisgo do imposto, e <strong>da</strong> nova classificação <strong>da</strong>s<br />
terras, sfio frequentes as agitaçúes populares origina<strong>da</strong>s pelo receio do au-<br />
gmento do tributo, já <strong>de</strong> si tão elevado. E portanto com a maior attenção<br />
e equi<strong>da</strong><strong>de</strong> qiie as auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s anglo-indianas proce<strong>de</strong>m periodicamente a.<br />
essa revisão.
IMPOSTOS 43 (3<br />
-<br />
Os melhoramentos taes como canaes do irriga@, etc., introduzidos<br />
& custa dos agricultores não são contados como valorisantes <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
para o effeito <strong>da</strong> elevaç80 do imposto.<br />
Os zamiladn1.e~ que prevalecem no Pendjab, nas Provincias Centraes<br />
e em Agra, est5o egaalmente snjeitos a um imposto egual a meta<strong>de</strong> do<br />
rendimento liquido, cobrado pelo Estado aos senhorios, e por estes aos seus<br />
ren<strong>de</strong>iros. Durante a dominação mongol, este imposto era ain<strong>da</strong> mais exagerado,<br />
e dc onze partes do rendirncnto liquido, <strong>de</strong>ducçiio feita <strong>da</strong>s <strong>de</strong>xpczas<br />
<strong>da</strong> cobrança, <strong>de</strong>z <strong>de</strong>stinavam-se aos cofres imperiaes, rescrvanrlo-sc<br />
apenas a unàecima parte do rendimento para rcmuneraçáo dos zainiadnrc,~.<br />
Nas provincias s~~.jeitas ao dominio maliratta o tributo era <strong>de</strong> 75 01,.<br />
A administração ingleza reduziu successivamente estas taxas e conce<strong>de</strong><br />
sempre as reducçúes ou <strong>de</strong>scontos cuja justifa se podér averigiiar. No<br />
Pendjab a média do imposto, segundo Badcn Powell, (1) é <strong>de</strong> 40 a 45 01,.<br />
Albim d'esta pcsadissima tributaçáo indigena ain<strong>da</strong> existe, em quasi to<strong>da</strong>s<br />
as provincias, um imposto addicional applicavcl a obras <strong>de</strong> interesse local,<br />
taes como escolas, ennnes <strong>de</strong> irrigaçiio e estra<strong>da</strong>g, cujo valor vnria <strong>de</strong> 2 a<br />
14 O/, <strong>da</strong> respectiva quoti<strong>da</strong><strong>de</strong> do imposto territorial.<br />
O coajiincto d'eates tributos representa um terrivel encargo financeiro<br />
que quasi snffoca o <strong>de</strong>senvolvimento economico <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena,<br />
e que é por certo um dos factores mais importantes <strong>da</strong>s fomes periodicas<br />
que assolam a India. 0s inglezes, aferrados 8 conservaç80 <strong>da</strong> sua<br />
politica oriental, não pensam em renunciar á posse eminente do solo, transformando<br />
as exageradissimas taxas actuaes, n'ums contribuiçiio predial<br />
semelhante As que na Europa vigoram, senáo na fdrma <strong>de</strong> lançamento e<br />
cobrança, pelo menos na razoabili<strong>da</strong><strong>de</strong> do quantitativo.<br />
Entretanto, d necessario dizer que a administração ingleza busca<br />
attenuar todos os rigores d'estas contribuiçócs, pcla gran<strong>de</strong> elastici<strong>da</strong><strong>de</strong> do<br />
systcma. <strong>de</strong> cobrança, que lhe permitte attendcr com <strong>de</strong>scontos ou compen-
460 POLITICA INDIGENA<br />
saçóes, As circiimstancias dos agricultores, 6s variaçõeg <strong>de</strong>vi<strong>da</strong>s ás cstaçBes,<br />
4 <strong>de</strong>ficiencia <strong>da</strong>s colheitas c á <strong>de</strong>terioração dos productos agricolas.<br />
Na India Francrza (I) o imposto territorial indigena varia segnndo as<br />
locnli<strong>da</strong><strong>de</strong>s. Em Pondicliery d 25 "/, do rendimento bruto do solo cultivado.<br />
Em Kariltal e em lanaon inci<strong>de</strong> sobre a uni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> snperficie cely(P) ou<br />
caizdy (S) c varia conforme a natureza dos terrenos e <strong>da</strong>s culturas.<br />
Em liahd o imposto sobre os arrozaes é <strong>de</strong> um terço <strong>da</strong> prodi1cçá.o<br />
total, e cxiste uma taxa especial sobre as arvores <strong>de</strong> fructo.<br />
Nas Indias Oriciitaes Neerlan<strong>de</strong>zas, o imposto territorial, lnnd rmt,<br />
foi introùiizido pclo governador inglcz Stamford Raffles ( 1812-1816) que,<br />
isentando os cultivadores indigenas <strong>da</strong>s exagera<strong>da</strong>s prestaçúes <strong>de</strong> trabalho<br />
obrigatorio a qnc estavam sugeitos, estabeleceu, como compensação, o pa-<br />
gamento anniial d'iima quantia equivalente a lima <strong>de</strong>terminndn pnrtc <strong>da</strong>s<br />
suas colheitas, po<strong>de</strong>ndo tarnbem excepcionalmente effectuar-se a cobrança<br />
do imposto em gcneros. Com a restaiiraçáo <strong>da</strong> aiictori<strong>da</strong><strong>de</strong> neerlan<strong>de</strong>za, esta<br />
medi<strong>da</strong> apenas foi manti<strong>da</strong> parcialmente. A cobrança <strong>da</strong> lnnd rtnt conti-<br />
niioii a fazer-se ca<strong>da</strong> vez mais prodtictiramcnte e sd em generos, mas o<br />
trabalho obrigatorio dos indigenaa foi rc.stabclecido e as cnrrhas sempre<br />
crescentes constituiram, no periodo atire0 do systcma Van <strong>de</strong>n Bosch, iim<br />
pesadissimo regimen cle trabalho servil. Em Jara, a uni<strong>da</strong><strong>de</strong> collecta<strong>da</strong> k a<br />
dcsn, oii communi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> al<strong>de</strong>ia, e a fixação do imposto correspon<strong>de</strong>nte a<br />
ca<strong>da</strong> collectivi<strong>da</strong><strong>de</strong> fazia-se at6 1872, por meio <strong>de</strong> previo accordo entre as<br />
auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s locaes e os principaes indigenns.<br />
A Or<strong>de</strong>nança <strong>de</strong> 1872 repartiu as <strong>de</strong>sas em <strong>de</strong>z cathegorias, segundo<br />
a maior oii menor fertili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s terras respecti~amante explora<strong>da</strong>s, <strong>de</strong>terminando<br />
que o imposto fosse periodicamente revisto, e a sua importancia<br />
fixa durante ca<strong>da</strong> periodo <strong>de</strong> cinco annos. O imposto, variavel com a classe<br />
<strong>da</strong>s terras, passoii a scr constituido, para ca<strong>da</strong> al<strong>de</strong>ia, por iim quinto do<br />
(1) (iirault - Principea <strong>de</strong> Coloiiinution et <strong>de</strong> Legidlntion Coloniuk.<br />
(e) Vely = 267,55 ares.<br />
(3) Ca~tdy = 303,93 ares.
IMPOSTOS 451<br />
rendimento bruto attri1)iiido ás terras <strong>de</strong> menos valia. A inci<strong>de</strong>ncia ftiz-se<br />
sobre a uni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> siiperficie L~ii/r, que ú ~)roximan~entc cgoal a s/, do are.<br />
Em 1878 urna nova orclennriça <strong>de</strong>clarou perrnnneiite o qiiantitativo (lo imposto<br />
lançado no aiino anterior, po<strong>de</strong>ndo, comtiido, os resi<strong>de</strong>ntea hollan<strong>de</strong>-<br />
zes, com prévia a ~~t~i'i~açá~ do governador geral, modificar a importaiicia<br />
dos tributos na Arca <strong>da</strong> sua jurisdicção administrativa, conso;tiite o aconselhassem<br />
as circiimstaiicias locaes.<br />
Como é facil <strong>de</strong> prever, a consequencia natural d'esta disposi
452 POLITICA IXDIGENA<br />
No Ann~m existem rgualmente estas duas classcs <strong>de</strong> imposto territorial,<br />
variaiiclo a taxa sobre os arrozaes entre sessenta avos e uma pataca<br />
c meia, e a taxa applica<strong>da</strong> aos terrenos cmprcgados em diversas culturas,<br />
entre <strong>de</strong>z avos c uma pataca c meia.<br />
Na Cocliincliina o imposto 6 milito variavel para ca<strong>da</strong> localidli<strong>de</strong>, c<br />
comprelien<strong>de</strong> as duas classcs anteriores reparti<strong>da</strong>s em diversas taxas. A<br />
uni<strong>da</strong><strong>de</strong> territorinl adopta<strong>da</strong> para lançamento do imposto é o Iiectare. Nos<br />
pnizca <strong>de</strong> protectorado, Cambodjo c Laos, n5o existe ain<strong>da</strong> o imposto territorial<br />
iniligena, qiie B siibstitiiido por varias taxas indirectas que inci<strong>de</strong>m<br />
sobre os prodlictos <strong>da</strong> agriciiltnrn indigena.<br />
Diversos Impostos<br />
Temos assim dcscripto as formas mais gencrsliua<strong>da</strong>s do rcgimen tribiitiirio<br />
applicndo aos indigenns, n5o nos tendo proposita<strong>da</strong>mcntc <strong>de</strong>tido no<br />
cstrido <strong>da</strong>s contribuiçócs applicailas aos colonos, e n'algumas colonias aos<br />
immigrantcs asiaticop, por náo se relacionarem com o objectivo que nos<br />
propuz':mos. As contribiiiç6cs indirectas, sob forma <strong>de</strong> encargos adiianeiros,<br />
affectam mais particiilarmente os cdonos, que, mórmente em Africa, reprcsentam<br />
utp importante elemento comprador no commercio <strong>de</strong> importaçíio.<br />
Quando, porbm, tenliam o caracter <strong>de</strong> impostos dc consumo, affectam indifferentemcnte<br />
todos os consiirniclorcs scm distincçáo <strong>de</strong>'nacionalirladc oii <strong>de</strong><br />
cor. O imposto dc consiimo, <strong>de</strong> to<strong>da</strong>9 as formas tributarias, a mais nefasta<br />
para a ecanomia social e para a robiistez <strong>da</strong> raça, quando se applica a gencros<br />
<strong>de</strong> primeira necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>, tem, pelo contrario, quando adstricto a prodiictos<br />
taes como o alcool c o opio, <strong>de</strong> effeitos siimmamente <strong>de</strong>leterios sobre<br />
a sau<strong>de</strong> physica e a sani<strong>da</strong><strong>de</strong> mental, a cnormc vantagem <strong>de</strong> anniillar ou<br />
pelo menos red~izir considcravelmcnte o seu pernicioso consumo.<br />
O imposto directo indigena reveste innumeras mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong><strong>de</strong>s que, por<br />
serem <strong>de</strong> applicaçáo restricta tio particnlarismo <strong>da</strong>s circumstaiicias <strong>de</strong> ca<strong>da</strong>
IMPOSTOS<br />
--<br />
- - -<br />
locali<strong>da</strong><strong>de</strong> não po<strong>de</strong>m servir <strong>de</strong> elemento <strong>de</strong> comparaçiio n'um estudo generico.<br />
Taes são as taxas <strong>de</strong> assistencia medica vulgares em diversas colonias<br />
francczas, as formas diversas <strong>de</strong> tributação dos animaes domesticas, as licenças<br />
commerciaes, as variantes <strong>da</strong> contribuiçiio industrial, etc., etc. To<strong>da</strong>via,<br />
po<strong>de</strong> dizer-se il'iima maneira geral que esses impostos, ou são m6ras<br />
a<strong>da</strong>ptaçóes mais ou menos felizes dos tribiitos metropolitanos, ou, pela fbrma<br />
do lançamento e cobrança, não passam dc simples addicionaes <strong>da</strong> taxa<br />
<strong>de</strong> capitação indigcna.<br />
O imposto, que 6 um bom instriimento <strong>de</strong> civilisaçóo e uma excellente<br />
arma repressiva, requer entretanto, como attriblito <strong>de</strong> quem o empregue,<br />
a maxima pon<strong>de</strong>raçso alliacla á maior equi<strong>da</strong><strong>de</strong>. O exagero <strong>da</strong>s taxas<br />
ou a injustiça <strong>da</strong>s isençues, motiva a <strong>de</strong>sor<strong>de</strong>m, <strong>de</strong>sorganisa o apetrechamento<br />
economico, e po<strong>de</strong> cavar um abysmo insuperavel entre a raça indigena<br />
e os seus dominadores. Por isso mesmo que o pagamento facil dos<br />
impostos representa o mais seguro symptoma <strong>da</strong> completa siibmissão, niio<br />
<strong>de</strong>ve o governo colonisador nunca esquecer cliic, sendo o imposf,o uma troca<br />
em que o ci<strong>da</strong><strong>da</strong>o compra ao Estado a garantia dos sciis direitos reae~ e<br />
adquiridos, 6 indispensarel que a organisaçfio financeira <strong>da</strong> colonia permitta<br />
a utilisação <strong>da</strong> receita resultante do imposto em obras <strong>de</strong> interesse local<br />
qiic, directa ou indirectamente, revertam em proveito dos contribiiintes.<br />
453
LzdEdigena.<br />
1 Cooperativas.<br />
Assistencia Publica e Medica.<br />
- .- .- -.<br />
-----
CAPITULO VI11<br />
Credito <strong>Indigena</strong><br />
Na organisação do mcclianismo financeiro nas colonias E <strong>de</strong> justiça<br />
evi<strong>de</strong>nte e <strong>de</strong> interesse inadiavcl attendcr ciiidndosamcnte á importxncia<br />
inaior ou mcnor do armamento economico do elemento indigena, creando<br />
instituiçóes que promovam o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>da</strong> siia riqueza, c garantam<br />
a segurança dos capitaes contra a especnlaç50 dos aç;imbnrcadorcs, a avi<strong>de</strong>z<br />
dos iisiirarios, as irregulari<strong>da</strong><strong>de</strong>s clirnatericas e a irnprevi<strong>de</strong>ncia dos<br />
naturaes. -41em <strong>de</strong> que oe mais elementares <strong>de</strong>veres <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong> civilisadora<br />
impóem a adopção <strong>de</strong> medi<strong>da</strong>s protectoras <strong>da</strong> economia geral <strong>da</strong>s<br />
socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s indigenas, accrescc ain<strong>da</strong> nas colonias miictas, oii nas rlc exploraçiio,<br />
a incalc~ilavel vantagem <strong>de</strong> fazer progredir rapi<strong>da</strong>mente n organisaçáo<br />
economica dos natiiracs predominantes em numero, porque a sua<br />
fortuna <strong>de</strong>senvolvi<strong>da</strong> e mobilisa<strong>da</strong> virá a influir po<strong>de</strong>rosamentc na prosperi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
material d'es~~s colonias. Se,ja qiial for o estadio social <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
nativa, e ain<strong>da</strong> nos mais recuados graus <strong>de</strong> barbarie, é iiidispcnsavel,<br />
para o progresso economico d'essas organisaçóes sociaeci, que se façam germinar<br />
no seu seio i<strong>de</strong>ias dc associaçSo e previ<strong>de</strong>ncia, praticamente realisa<strong>da</strong>s<br />
em institntos! apropriados.<br />
A diversi<strong>da</strong><strong>de</strong> d'estas institiiiçóes tem <strong>de</strong> ser gran<strong>de</strong>, para que se possa<br />
atten<strong>de</strong>r ao particularismo <strong>da</strong>s condiçóes locaes, tGo rariarcl com os paizes,<br />
com as raças, e com o nivel eociologico.
458 POLITLCA ~XDIQENA<br />
A imprevi<strong>de</strong>ncia, qiie estas organisaçóes <strong>de</strong>vem tentar <strong>de</strong>bellar, C,<br />
porém, vicio inherente a todos os povos atrazados. O asiatico fatalista não<br />
se ~~rcoccupa<br />
em garantir a segurança e o bem estar filturos. O negro B<br />
imprevi<strong>de</strong>nte por nat~ireza, e afinal até por uma necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> tradiccional<br />
<strong>de</strong> qiie ain<strong>da</strong> se não consegoiu <strong>de</strong>sliabituar. Anteriormente á occupação<br />
europeia, e nos primeiros periodos <strong>da</strong> colonisaçáo, o preto, ou era escravo<br />
e na<strong>da</strong> podia poesiiir, oii era noniinalmente livre, mas sujeito As exacções,<br />
violencias e extorsóes dos chefes e gran<strong>de</strong>s indigcnas que o <strong>de</strong>sapossavam<br />
do melhor <strong>da</strong> sua proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>. Quer n'um, quer n'outro caso, fazer econo-<br />
mias era capitalicar para os estranhos, o que, <strong>de</strong>vemos concor<strong>da</strong>r, náo era<br />
o mellior incitamento ás regras <strong>da</strong> economia. Alem ci'isto, a facili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong><br />
vi<strong>da</strong> sob os tropicos e as pequcnas ilecessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s dos indigenas, permit-<br />
tem-lhes viver quasi sem tr:il~alliar, prescinclindo <strong>da</strong> capitalisaçtio previ-<br />
<strong>de</strong>nte táo indispensavel As populaçóes <strong>da</strong>s zonas tempera<strong>da</strong>s e frias.<br />
A diflusáo <strong>da</strong> moe<strong>da</strong> 6 um meio bastante preconisado para consegiiir<br />
dos indigenas a economieação <strong>de</strong> peciilios. To<strong>da</strong>via, a i~scgiirança <strong>da</strong> vi<strong>da</strong><br />
africana torna difficil e atd pcrigosa a coneervaçáo do numerario, e mesmo<br />
admittindo qiie o proprietario indigena conseguc escon<strong>de</strong>r em sitio seguro<br />
as suas economias, é fdra <strong>de</strong> diivi<strong>da</strong> que esse capital se mantem totalmente<br />
improdiictivo. I;: por isso quc lia to<strong>da</strong> a convenicncia em crear instituiçúee<br />
espcciaes que correspon<strong>da</strong>m 6 micsáo particular <strong>da</strong>s caixas economicas.<br />
Mr. Eugenc RIatlion, ri'urn relatorio sobre a A. O. F. aprcseritado ao<br />
Congresso <strong>de</strong> Rlarselha <strong>de</strong> 1906, propóe a adopçáo, n'aqiiella colonia, <strong>da</strong><br />
caixa economica postal que, alem dc reunir as ncccssarias condiçóes <strong>de</strong><br />
simplici<strong>da</strong><strong>de</strong> e modici<strong>da</strong><strong>de</strong>, po<strong>de</strong> generalisar rapi<strong>da</strong>mente os seus bcneficios<br />
a todo o territorio, atten<strong>de</strong>ndo B gran<strong>de</strong> irradiaçáo dos serviços do correio.<br />
Nas colonias inglezas <strong>da</strong> Africa Occidcrital, mormente na Gambia,<br />
fiinccionam caixas economicas para incligenas, e o seu tiesenvolvimento<br />
e importancia váo-se accentnando <strong>de</strong> aniio para anno.<br />
A organisaq5o <strong>da</strong>s instituiyíjes clc prcvi<strong>de</strong>ncia existeutes cni ca<strong>da</strong> CO-<br />
lonia e a maneira <strong>de</strong> se rccolher beneficio d'ellas <strong>de</strong>viam, n nosso ver,<br />
fazer parte integrante do programma <strong>de</strong> ensino priniitrio, leigo ou reli-<br />
bioso; niiiiistrado aos indigenas que, d'estc moclo, clcs<strong>de</strong> creanças se familia-
CREDITO<br />
----<br />
risariam com o seu fiinccionamento e apren<strong>de</strong>riam a apreciar as siias van-<br />
tagcne.<br />
A par <strong>da</strong> previclcncia é indispensavel crear ou fortalcccr o credito,<br />
iniciando a educaçáo economica dos indigcnas. Com effeito, o credito, ctljo<br />
emprego sensato e pru<strong>de</strong>nte garante o aiigmento <strong>da</strong> riqueza, condLiz tam-<br />
bem frequentemente 6 ruina quem ignora a maneira <strong>de</strong> o iitilisar, quem<br />
d'elle faz liso immo<strong>de</strong>rado, e finalmente quem se <strong>de</strong>ixa inconscientemente<br />
explorar pelos tisurarios.<br />
O endivi<strong>da</strong>meiito dos indigenas po<strong>de</strong> at6 provocar revoltas, como re-<br />
centemente aconteccu na D. S. W. A. Os Izerreros, a quem os commercian-<br />
tes allemáes fdcilitavam emprcstimos sobre penlior iinmobiliario, empenha-<br />
ram doitlamente a respectiva proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>. Os crédores ciiropeiis que não<br />
eram reembolsados prooiiravam apropriar-se dos terrenos que caiicionavam<br />
os emprestimos, mas como n'aquella coloilia a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena assume<br />
vulgarmente a fúrrna. çollectiva, tornavam-se inniimeras e ca<strong>da</strong> vez mais<br />
graves as complicaçóes origina<strong>da</strong>s pela 1iqiiiila~:áo dos penhores pertencentes<br />
aos <strong>de</strong>vedores insolveiites, miiltiplicavarn-sc ti3 perturbaçóes <strong>da</strong> or<strong>de</strong>m piiblica,<br />
e <strong>de</strong>clarava-se a breve trecho na populaqáo indigena nm estado <strong>de</strong><br />
accesa rebcldia que, vamo 6 sabido, as forças militares allcnins a tanto<br />
ciisto tecm siiffocado. O Estado colonisador tem o <strong>de</strong>ver e a nccessitla<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
tlesenvolver o credito indigena, mas preciza <strong>de</strong> pôr os natur.aes, q~innto<br />
?ossivel, ao abrigo <strong>da</strong> usura e <strong>da</strong> imprevi<strong>de</strong>ncia propria.<br />
Náo é indiflerente proteger iim oii outro ramo do credito; é precizo<br />
arcrigiiar primeiro qiines sáo as siias mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong>dcs, cujo <strong>de</strong>senvolvimento<br />
mais directamente se reflectirá na prosperi<strong>da</strong>cle material cla populaçáo aiitocl1to11e.<br />
A riqueza dos indigenas po<strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rar-se, lia maioria dos casos,<br />
como resiimindo-se A proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> immobiliaria, ou simplesmeiite á sua exploraçao.<br />
Por esse motivo, as Mrmas que o creditc indigena <strong>de</strong>ve assumir,<br />
ao seti fim economico, são a <strong>de</strong> credito predial agrnrio e a <strong>de</strong> crcdito<br />
ngricoln. No pirneiro caso, o credito obtido <strong>de</strong>stina-se a melliornmentos e<br />
s~~ervalorisaçfio do capital f~indi:irio, no segundo caso o beneficio resulta<br />
em favor (10 cnpitiil inove1 cmpregodo na exploroç5o <strong>da</strong>s terras. (Saanto ao<br />
459
--<br />
460 POLITICA INDIGENA<br />
-- - . . ~<br />
--<br />
systema <strong>da</strong>s garantias náo ha rtizáo para separar niti<strong>da</strong>mente estas duas<br />
mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong><strong>de</strong>s do credito.<br />
Alguns escriptores, allegando a duraçáo <strong>da</strong>s operaçces financeiras <strong>de</strong><br />
credito predial agrario, geralmente celebra<strong>da</strong>s a longo prazo, querem que<br />
se reserve s6 para este caso a garantia Iiypothecaria sobre os immoveis,<br />
effectuando-se as operaçúes do credito agricola sobre a garantia dos penho-<br />
res, com ou sem entrega do objecto penhorado. Na reali<strong>da</strong><strong>de</strong> não ha razão<br />
alguma que justifiqiic a cspeciali.;ac;áo <strong>da</strong>s garantias para ca<strong>da</strong> typo economico<br />
<strong>de</strong> credito, c as opcra~,~úes dc credito agricola n50 <strong>de</strong>ixam <strong>de</strong> o ser,<br />
pelo facto <strong>de</strong> se realisarem a longo prazo, on com garantia <strong>de</strong> liypotheca.<br />
A forma do credito predial agrario 15 principalmente applicavel ás colonias<br />
on<strong>de</strong> a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena, individiial ou collectiva, mantiver situação<br />
c limites estaveis, e se encontrar mais ou menos perfeitamente<br />
ca<strong>da</strong>stra<strong>da</strong> e titula<strong>da</strong>. N'esta hypothese, a constituiçáo juridica <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
offerece ao capital garantias snfficientes, c a organisação economicn<br />
dos indigenas, relativamente superior, permitte iniciar a transição progressiva<br />
do credito real ao credito pessonl, á medi<strong>da</strong> que o augmento <strong>da</strong> riqueza<br />
e a e<strong>da</strong>caçáo economica, agricola e social dos proprictarios indigenas,<br />
forem firmando em bases ca<strong>da</strong> vez niais soli<strong>da</strong>s a solvabili<strong>da</strong><strong>de</strong> dos <strong>de</strong>vedores<br />
e respectivos fiadores.<br />
O credito «gricoln beneficia indistinctamente todos os estabelecimentos<br />
colonines on<strong>de</strong> fôr organisado; indispensavel ao progresso <strong>da</strong> obra colonisadora,<br />
é egaalmente iima <strong>da</strong>s melliores maneiras <strong>de</strong> conseguir o <strong>de</strong>senvolvimento<br />
e corisoli<strong>da</strong>çWo <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena, libertando-a do jiigo (1%<br />
iisura, e esta1)ilisaiiilo-llie 09 limites nas regiúcs on<strong>de</strong> ain<strong>da</strong> domine o nomadismo<br />
agricolii.<br />
No sei1 cxcellente traballio c O Credito Agricoln em PortugalB, o<br />
Sr. Joáo Ulricli subdivi<strong>de</strong> o credito agrícoIa, consoante o systema <strong>de</strong> garantias<br />
adoptacio, nas seguintes catliegorias :<br />
1.a O credito ngricola co,n garantia i~nntobiliarict - baseado na hy-<br />
potheca;<br />
2.s O credito ny~*icoln coiit gnl*a,tticl ~nobilinrin -baseado no penhor<br />
e nos li.n~.r.nnfs ;
CREDITO 461<br />
3." O credito agricoln pessoal- tendo por garantia a solviibili<strong>da</strong>d~<br />
do <strong>de</strong>vedor orr dos seus fiadores ;<br />
4.~ O credito agricolu nssoricifioo - baseado no principio ilii. miitiia<br />
cooperação c garantido pela responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong> dcs diversos membros oii socios<br />
<strong>de</strong> qualquer associaçáo agricola. »<br />
Vamos ver qiial d'estes systemas <strong>de</strong> garantias <strong>de</strong>rerd ser preferido<br />
na pratica colonial. Con.ji<strong>de</strong>remos em primeiro lof;,zr a garantia hypotliecaria.<br />
Sob o ponto <strong>de</strong> vista <strong>da</strong> soli<strong>de</strong>z e cfficacia <strong>da</strong> garantia, sO as colonias<br />
<strong>de</strong>nsamente povoa<strong>da</strong>s on<strong>de</strong> a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena 6 fixa e tcm rcconliecido<br />
valor mercantil, po<strong>de</strong>m offerecer f~in<strong>da</strong>mento serio ao credito hypotliecario.<br />
Entretanto, mesmo ii'cssa Iiypotliese, a hypotlieca serve melhor como garantia<br />
<strong>de</strong> largos emprestimos que valorisem o capital agrario, do que como<br />
base <strong>da</strong>s operaçees <strong>de</strong> credito agricola.<br />
A constituiç80 <strong>da</strong>, hypotheca faz-se geralmente por um processo <strong>de</strong>morado<br />
e dispeiidioso que acarreta <strong>de</strong>longas e pre,juizos incompativeis com<br />
a situayáo e as necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> qiiem recorre ao credito segundo a urgencia<br />
impreterivel <strong>da</strong>s exploraçóes agricolas. Por ontro lado, ningnem ignora<br />
qrie uma gran<strong>de</strong> partc tla classe agricola, assim na metropole como nas<br />
colonias, não possue o senhorio directo sobre os immoveis qiie são explora-<br />
dos por arrcn<strong>da</strong>mento.<br />
N'cste caso, os cii1tiv:dores do solo, que náo são proprictarios, care-<br />
cendo <strong>de</strong> capital para a exploração agricola, estão impossibilitados <strong>de</strong> re-<br />
correr ao credito hypothecario por náo po<strong>de</strong>rem onerar cotn direitos reaes<br />
o solo que não lhes pertence.<br />
Como na maioria <strong>da</strong>s colonias é freqiientissimo faltar a constituiçáo<br />
jiiridica <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong>(le, ou predominar nas terras indigenas a cultirra<br />
arren<strong>da</strong>taria e a posse limita<strong>da</strong>, comprehen<strong>de</strong>-se facilmente que a garantia<br />
hypotliecaria estii longe <strong>de</strong> ser praticamente realisavcl.<br />
N'algamas colonias, como na Argelia, Tnnisia, India Inglcaa c Co-<br />
cliinchina, on<strong>de</strong> o credito indigena pú<strong>de</strong> muitas vezes repousar sobre a Iiy-<br />
potlicca, é to<strong>da</strong>via preferivcl reservar essa complica<strong>da</strong> garantia immobilia-<br />
ria ao credito prcdial agrario proprianente dito, libertando as operaç6es<br />
sigricolas <strong>da</strong>s formali<strong>da</strong><strong>de</strong>s oiicrusas do systeina liyputliccario,
463 POLITICA INDIGENA<br />
O credito ngricoln ~obilinr-i0 baseia se na garantia representa<strong>da</strong> pelos<br />
morcis offerecidos pelo dcvedor como penlior do cmprestimo. Esses moveis<br />
po<strong>de</strong>m ser constitiiidos por qnacsqiiar objectos dc valor que o proprictario<br />
tem mais interc~sr em ven<strong>de</strong>r do qiie em pcriliorar e, portanto, raramente<br />
sáo utilisados, oii pelo ga(lú, alfaias c marliinas agricolas necessarias ao<br />
amanho e ciiltiro <strong>da</strong> terra. N'esta ultima Iiypotlicse, a circiimstancia do<br />
agriciiltor difficilmente po<strong>de</strong>r dispensar o trab:illio <strong>da</strong>s macliinas oii dos<br />
animaes penhorailos, inseparaveis <strong>da</strong> cxplor,.ição :igricola a que se <strong>de</strong>stina<br />
o emprestimo rontraliitlo, fez eridrnciar a convciiicncia economica <strong>de</strong> conscrvar<br />
os objectos periliorados 113 giiardn do dcvedor, assim constitiiido em<br />
fiel <strong>de</strong>positario.<br />
Esta fórrn~t dc creclito agricola, baseia<strong>da</strong> no qiic os francezes cliamam<br />
- gnge snus clessnisiss~~nent -, 6 insiisteiitavel sob o ponto <strong>de</strong> vista jiiridico,<br />
pois, como accentiia o Sr. João Ulricli, i. a propria negavão <strong>da</strong> <strong>de</strong>finição<br />
jnridica <strong>de</strong> ~~e~zl~or, qne importa sempre ri. cntregn ao crddor do objecto penhorado.<br />
Comtiido, economicamente, 6 bem justifica<strong>da</strong> a generalisação que<br />
actiialrnente attinge nos cstabclccimentos tle credito colonial.<br />
Qiiando o penhor for constitiiidu por productos agricolas, po<strong>de</strong> o seu<br />
<strong>de</strong>posito effectiiar-se em armazens geraes oii locaes, ou conservar-se nos<br />
celleiros (10s dcvcdorcs, cobrando-se em qualquer dos casos o warrant, que<br />
6 iim tit iilo transmissivcl por intloseo, reunindo ordinariamente os caracteres<br />
<strong>de</strong> conhecimento ilc dcpo-ito e cantelã. <strong>de</strong> pcnlior. (I) A ~c.cirraatagetn<br />
dos l~rodiictas ngricolas podc consi<strong>de</strong>rar-se irrealisavel nas colonias, qiiando<br />
diga respeita ao credito fornecido aos agriciiltorcs indigenas.<br />
A ftirma rclati~nmente complica<strong>da</strong> do scii funccionamento torna-a<br />
inapplicavel ás socic<strong>da</strong><strong>de</strong>s riidimentarcr c illetra<strong>da</strong>s.<br />
Demais, nas colonias, a escassez clos capitaes <strong>de</strong> exploraçiio agricola<br />
po<strong>de</strong> ate levar W neccssitladc <strong>de</strong> admittir, tanto aos colonos agricultores<br />
como aos indigenae, mas principalmente a estes ultimos, o peiihor 11.~~0-<br />
thetico cunstitiiido pela prodiicção agricola pen<strong>de</strong>nte.<br />
(I) J. IIenrirlue Ulrich - O Crcdito dgricoln cm Portugnl.
CREDITO 463<br />
- - - - -<br />
As futuras collieitas resultantes dos cnpitaes obtidos a crctlito, sáo<br />
freq~ientemeiite o uiiico pmlior que os agricultores pil<strong>de</strong>m offerecer como<br />
garantia dos ernprestirzios qiie sollicitam. Na orgaiiisctçáo financeira dns<br />
coloiiias francezas foi introdiizido lia mais <strong>de</strong> 50 annos o principio do --<br />
penhor seai cnfvrgct do ohj(vv'o uellhorcltlo - , praticamente realisado nos referidos<br />
emprestirnos sol)re as novi<strong>da</strong><strong>de</strong>s agricolas pen<strong>de</strong>ntes, consenticlos<br />
aos diversos bancos coloniaes.<br />
Para abnfkir os escrnpiilos jaridicos do parlamento francez <strong>de</strong> 1851,<br />
que nHo podia ntlmittir qiic o penlior fime apenas tima promessa futura, e<br />
não iiinn cxistcnc*in ac~tii 11 e a qiiein rcpiignava o gnge sans <strong>de</strong>ssnisissonent,<br />
mascaron-se o cnncionamcnto dos fructos pen<strong>de</strong>ntes, com a fórmula -prêt<br />
szir cession <strong>de</strong> recoNec 11r)ltlalifes - o que presiippóe uma ven<strong>da</strong> que 11a reali<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
se não cffectua.<br />
Esta garantia c'! scm diivi<strong>da</strong> aleatoria e, utilisa<strong>da</strong> sem disccrnimento,<br />
pó<strong>de</strong> proinorer a ruina dos estnbelecimeiitos bancarios, ou nssocinçóes <strong>de</strong><br />
credito que a consentirem <strong>de</strong>sprècavitlamente. A 1egisl;ic;no franceza prevê<br />
cui<strong>da</strong>dosamente as contingencias x que fica sii,jeito o rcernbolso <strong>da</strong> quantia<br />
empresta<strong>da</strong>. Esta não po<strong>de</strong> ir al4m <strong>da</strong> terça parte do valor provavel <strong>de</strong><br />
oolheita, o que, salvo eventuali<strong>da</strong><strong>de</strong>s extraordinarias só remediaveis pelo<br />
seguro, dá margem siifficiente para o completo reembolso do creciito, mesmo<br />
nos peores annos agricolas.<br />
Os bancos nko <strong>de</strong>vem fazer emprestimos sem qiie o estado <strong>da</strong> ciiltura<br />
<strong>de</strong>ixe já prevÇr o resultado provavel <strong>da</strong> fructifcaçáo. Legalmente, os em-<br />
prestimos náo <strong>de</strong>rem cffitctiiar-se com antece<strong>de</strong>ncia superior a quatro me-<br />
zes sobre a epoclia provavcl <strong>da</strong> colheita. Subsistiu, por&m, sempre a pratica<br />
benevola, imposta pelas necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> agricultura colonial, <strong>de</strong> alongar<br />
esse prazo at,: oito iiiczp.;. renlisando-se o cinprestimo a quatro mezes, mas<br />
consentindo-qe invariavelmente a renova(i30 do prdzo por egtial tempo. A<br />
lei francexa estal-)elece tambem um engenhoso sptema <strong>de</strong> publici<strong>da</strong><strong>de</strong> qiic<br />
116~<br />
OS interesses do banco colonial a coberto <strong>de</strong> qiiaesqiier reclamaçúcs pri-<br />
vilegiatlii\ <strong>de</strong> prece<strong>de</strong>ntes crddores. Sc o <strong>de</strong>vedor por m(i fé ou <strong>de</strong>sleixo 1150<br />
effcc~tiia os tr;tl)alIios agricolas neeessarios :i friictificac;iXo, ou não recolhe<br />
os fructos, o banco tem a facul<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> fazer pqr conta proprirc o cultivo,
sni POLITICA INDIGEXA<br />
apropriando-se a respectiva colheita, mediante rima simples sentença do<br />
juiz <strong>de</strong> paz.<br />
Se o <strong>de</strong>vedor se csqniva ao pagamento, o branco po<strong>de</strong> fazer ven<strong>de</strong>r<br />
em hasta publica a collicita penhora<strong>da</strong> pagando-se directamente.<br />
Acerca <strong>da</strong> iitilisação d'este systerna <strong>de</strong> garantias nas colonias fran-<br />
cezae, Giranlt escreve o seguinte :<br />
A expcriencia mostrou qiic as apprcliens6cs <strong>da</strong> commissáo <strong>da</strong> assembleia<br />
<strong>de</strong> 1851 náo eram fi~n<strong>da</strong><strong>da</strong>~. Assim, em 1874, náo se liesitou em <strong>de</strong>senvolver<br />
egta inatitiiiyáo: o ciircito <strong>de</strong> negociar emprestimos sobre collieitas<br />
pendcntc~, que atC então só pcrtcnc~ra ao proprietario, foi gcneralisado<br />
aos ren<strong>de</strong>iros, nttnyers, locatarios dc tcrrcnos c emprezarios <strong>de</strong> plantaçóes,<br />
que actualmente gosam d'esse direito sob a reserva <strong>da</strong> nnnnencia do senhorio<br />
<strong>da</strong>s tcrras. » (I)<br />
O juro anniial que vencem esses rmprestimos B <strong>de</strong> 6 a 9 O/, na Indo-<br />
China e <strong>de</strong> 5 O/, na Giia<strong>da</strong>lupc, Martinica c Reiinião. Nas outras colonia~,<br />
que nos conste, os estabclccimentos bancarios ngo rcalisam emprestimos<br />
sobro colheitas pen<strong>de</strong>ntes, nem aos colonos nem aos agricnltores indigenas.<br />
O credito ngricoln pessonl, qiie se firma unicamente nas <strong>de</strong><br />
caracter do <strong>de</strong>vedor, na sua repiitaçgo <strong>de</strong> probi<strong>da</strong><strong>de</strong> e nas facul<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />
traballio já <strong>de</strong>monstra<strong>da</strong>s, apparece-nos, como diz o Sr. João Ulrich, .na<br />
Iiistoria <strong>da</strong>s institiiições rconomicas como manifestação evi<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> aperfei-<br />
çoa<strong>da</strong>s organis~qúcs superiores, dcvendo consi<strong>de</strong>rar-sc adiantado estadio<br />
evolutivo qiic o credito real prececleii.><br />
N'esta.j circiimstancias 6 facil rcconhcccr que, o que ain<strong>da</strong> hoje re-<br />
presenta iim i<strong>de</strong>al por attingir na gr'in<strong>de</strong> maioria doa meios agricolas civi-<br />
lisados, on<strong>de</strong> R commcrci~1isaçHo<br />
<strong>da</strong> agricaltiira, ou o cstabslecimento d'uma<br />
jnsta eqiiivalencin cntrc commerciantcs e agricultores perante o forneci-<br />
mcnto do credito, B ain<strong>da</strong> um problema (te nctiiali<strong>da</strong><strong>de</strong>, constitue na pra-<br />
tica colonial iim alvo tão longinquo qiic ngo merccc por agora ser consi<strong>de</strong>-<br />
rado. Isto nHo quer dizer qiie a garantia basea<strong>da</strong> exclusivainente na
CREDITO<br />
- . - . -. -- . -<br />
465<br />
reputaçáo pessoal dos indigenas nHo existe n'algumas colonias, mas n'estes<br />
casos refere-se geralmente a commerciantes, banqueiros, on gran<strong>de</strong>s proprietarios,<br />
cujo grau tle ciiltiira occiclental, oii nivel <strong>de</strong> civilisaçáo propria,<br />
os colloca fdra do gr11p0 genericamente <strong>de</strong>nominado indigenu, pois que a<br />
siia riqueza e intellectuali<strong>da</strong><strong>de</strong> snperiores, nivelando-os ao elemento colanisante,<br />
lhes permitte utilisar os estabelecimentos e fórinas <strong>de</strong> crcditos creados<br />
para os europeus.<br />
N'esta hypothese, tornam-se até dispensaveis as instituic~cs <strong>de</strong> credito<br />
e ou bystemas <strong>de</strong> garantias, especialmriite <strong>de</strong>stinados a proteger e<br />
tlescnvolvcr n proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigenn, cii,ja organisação e meios dc fomento<br />
nos propuzemos estu<strong>da</strong>r. Comtudo, na realid~itle, embora um ou oiitro indigena<br />
instruido e honesto mereça accictentalrnç*nte diliitiido credito pessoal<br />
aos bancou <strong>da</strong> colonia, esse facto, pela IimitiiyAo tla sua frequelicia, constitue<br />
apenas uma excepqão, cuja improbabili<strong>da</strong>tle permitte afirmar que o<br />
oredito indigena peciaoiil, e principalmente o credito agricola indigena sobre<br />
garantia pessoal, é um i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> perfeivão táo afastado, que o seu estudo 6<br />
iniitil á <strong>de</strong>termiiiaçlio tias regras a fixar <strong>de</strong>s<strong>de</strong> ji, para melhorar a situação<br />
ecoiiomica dos indigeniis.<br />
Finalmente, resta-no3 consi<strong>de</strong>rar o cretiifo agj.icolta czssociccfico que julgamos<br />
ser, e prociiraremos <strong>de</strong>monstrar que é, a fdrma <strong>de</strong> credito agricola<br />
mais apropria<strong>da</strong> ao <strong>de</strong>senvolvimento <strong>da</strong> riqneza indigena, e, pela sua malleabili<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />
mais mol<strong>da</strong>vel ás diversas gra<strong>da</strong>çóes economicas do superorganismo<br />
indigena. As vantagens geraes do credito associntiro sáo brilhante-<br />
mente expostas pelo sr. Ulrich nos seguintes termos:<br />
K Ha, pordm, um principio <strong>de</strong> organisaçfio social que, quando <strong>de</strong>vi<strong>da</strong>mente<br />
applicado, resolve todos os obstacnlos. E a miltuali<strong>da</strong><strong>de</strong>, a cooperaçdo,<br />
a ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira fórnia <strong>de</strong> organisaqão agricola que a experiencia e o exemplo<br />
dos povos adiantados consagraram. E: a associaçáo livre que pacificamente<br />
ha <strong>de</strong> revolucionar os antigos preconceitos fazendo surgir um novo innndo<br />
<strong>de</strong> progresso e civiiisaçáo. !i? esta nova força, no dizer <strong>de</strong> Gi<strong>de</strong>, - o resultado<br />
d'uma lei natural mais po<strong>de</strong>rosa que tt liumarii<strong>da</strong><strong>de</strong> e qcie por si mesmo<br />
actua, olhando iridifierentemente todos os <strong>de</strong>sfallecimentos - que, pondo<br />
em prática a velha maxima <strong>de</strong> que, - a uniíío fàz (I jòrçu - , ten<strong>de</strong> a au-<br />
30
466 POLITICA INDIGENA<br />
-- - -- -<br />
gmentar o potencial <strong>de</strong> garantia <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> individuo, facilitando-lhe, quando<br />
necessario, o recurso ao credito.. ...................................<br />
................... A coopernção, a mutnali<strong>da</strong><strong>de</strong> creando garantias novas,<br />
lançando mão do que, isola<strong>da</strong>mente, na<strong>da</strong> valia, reunindo aquelles <strong>de</strong><br />
quem nenhum baneiro confiava seus capitaes, cria um <strong>de</strong>vedor collectivo<br />
- permitta-se-me a expressáo - em que todos po<strong>de</strong>m fiar-se. Estreitando<br />
os intimos laços que entre si uniam os differentes individuos que <strong>de</strong> futuro<br />
hão <strong>de</strong> reciprocamente valer-se, transforma-os <strong>de</strong> <strong>de</strong>vedores insolventes<br />
em mutuarios merecedores <strong>de</strong> credito, a quem os novos encargos, insensivelmente,<br />
levar80 a honrar os compromissos tomados, nko os <strong>de</strong>ixando esquecer<br />
que o <strong>de</strong>vedor é, ao mesmo tempo, fiador <strong>de</strong> si proprio ». Pois bem,<br />
as instituições cooperativas que o distincto escriptor consi<strong>de</strong>ra como fructo<br />
consagrado d'nma adianta<strong>da</strong> organisaçáo ec~nomica, constituem egualmente<br />
a so1uc;áo mais elegante do problema financeiro do credito indigena. Eri<strong>de</strong>ntemente,<br />
o cooperativismo economico náo nasce espontaneamente nas<br />
organisaqóes sociaes mais atraza<strong>da</strong>s, mas a sua introdiicção artificial, por<br />
intermedio <strong>da</strong> administração dos dominadores, B absolutamente viavel.<br />
Quantas instituiçóes judiciaes e administrativas, quantas leis e regulamentos<br />
se estabelecem nas colonias e se applicam aos nsturaes, que estes<br />
....<br />
nem sabem utilisar, nem comprehen<strong>de</strong>r ! A associação econo-<br />
mica, pelo contrario, fazendo reflectir directamente todo o beneficio sobre<br />
o bem-estar material dos associados, não tar<strong>da</strong>rá em vincar fun<strong>da</strong>mente no<br />
espirito indigena a comprehensáo <strong>da</strong>s suas vantagens.<br />
De resto, cornprehen<strong>de</strong>-se a germinação facil do principio associativo<br />
nas cerebrações mais rudimentares, qiiendo se consi<strong>de</strong>ra que o phenomeno<br />
psycliologico se limita á fixação intellectual e consciente d'um instincto in-<br />
nato na maioria <strong>da</strong>s organisaç~es<br />
animaes, e que é a propria base <strong>da</strong> socia-<br />
bili<strong>da</strong><strong>de</strong> humana.<br />
Certamente que, a principio, a utili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> simples associacóes <strong>de</strong> cre-<br />
dito ficaria incomprehendi<strong>da</strong>. Quando, pordm, prestaçáo do credito, se<br />
juntarem servivos <strong>de</strong> soccorros e <strong>de</strong> previ<strong>de</strong>ncia economica, a<strong>da</strong>ptados ás<br />
necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s dos antochtones, a nova organisaçáo motiialista insinuar-se-ha<br />
facilmente nas socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s nativas.
CREDITO 467<br />
-<br />
A instituição cooperativa pó<strong>de</strong> ser associação <strong>de</strong> soccorros mutuos,<br />
caixa economica, estabelecimento <strong>de</strong> credito agricola em generos ou dinheiro,<br />
e cooperativa <strong>de</strong> producção e consumo. To<strong>da</strong>s, ou pelo menos algumas<br />
d'estas formas <strong>de</strong> mutuali<strong>da</strong><strong>de</strong>, po<strong>de</strong>m coexistir em ca<strong>da</strong> associação indigena,<br />
e a sua estreita fiscalisação tem <strong>de</strong> ficar attribui<strong>da</strong> ao funccionalismo<br />
colonial.<br />
Com effeito, o principio associativo que nas socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s adianta<strong>da</strong>s é<br />
consequencia <strong>da</strong> evolução natural, carece <strong>de</strong> ser, como dissémos, artificial-<br />
mente introduzido e amparado nas socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s indigenas por intermedio <strong>da</strong><br />
acção directa do Estado colonisador. Esta intervenção do Estado, na ge-<br />
rencia dos interesses <strong>de</strong> associaçóes particulares, justifica-se plenamente<br />
nas c*olonias, attenta a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> educar os indigenas no aproveita-<br />
mento e gerencia <strong>da</strong>s institiiiçóes miitualistas que, entregues inteiramente<br />
aos >tatis irnprevi<strong>de</strong>ntes e ignorantes societarios, em breve <strong>de</strong>sappareceriam<br />
sem <strong>de</strong>ixar v mais leve vestigio <strong>da</strong> sua benefica influencia na economia geral.<br />
As cooperativas indigenas mo<strong>de</strong>stamente organisa<strong>da</strong>s com estatutos<br />
elementares e apropriados ao nivel intellectual e social dos mutuarios, e<br />
bastamente dissemina<strong>da</strong>s pelo territorio colonial, <strong>de</strong> maneira que os culti-<br />
vadores encontrem na locali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> resi<strong>de</strong>ncia, OLI perto d'ella, o credito<br />
ou os soccorros <strong>de</strong> que careçam, representam, como vimos dizendo, a me-<br />
lhor garantia <strong>de</strong> progresso economico para a população nativa.<br />
A insufficiencia dos bancos coloniaes, como instituiçóes <strong>de</strong> previ<strong>de</strong>n-<br />
cia ou <strong>de</strong> credito indigena, é manifesta em theoria e está sobejamente<br />
<strong>de</strong>monstra<strong>da</strong> na prática colonial. Theoricamente, a propria organisação ca-<br />
pitalista dos bancos, com intiiitos accentua<strong>da</strong>mente lucrosos, nem permitte<br />
a constituição <strong>da</strong> pequena c'pccrgne, nem pó<strong>de</strong> fornecer aos proprietarios in-<br />
digenas capitaes <strong>de</strong> credito agricola ou immobiliario a juro acceitavel.<br />
A eleva<strong>da</strong> taxa <strong>de</strong> juro exigi<strong>da</strong> pelos accionistas, inhibe os bancos <strong>de</strong><br />
realisarem operaçóes <strong>de</strong> credito agricola, que só se po<strong>de</strong>m effectuar vanta-<br />
josamente em caixas locaes ou regionaes, quer basea<strong>da</strong>s na forma associa-<br />
tiva, quer producto <strong>de</strong> qualquer organisaçáo que não tenha por mira o<br />
rendimento do capital empregado.<br />
Xesrno sob o ponto <strong>de</strong> vista do credito hypothecario, os bancos diffi-<br />
*
cilmente po<strong>de</strong>m Iiictar contra o flagello <strong>da</strong> usura, esse polvo insaciavel<br />
que suif'oc:~ ;L evoluqao economica tlas sociedn<strong>de</strong>s indigenas.<br />
O usurario tem sobre o banco colonial a gran<strong>de</strong> vantagem <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r<br />
acceitar qiialquer especie <strong>de</strong> penlior, e <strong>de</strong> alterar á vonta<strong>de</strong> a <strong>da</strong>ta do pagamento,<br />
conce<strong>de</strong>ndo 1)rorogaçóes silccessivas. E o indigena irnprevi<strong>de</strong>nte<br />
que, acima tlc tudo, receia a nece~si<strong>da</strong><strong>de</strong> impraterivel do pagamento em <strong>da</strong>tas<br />
fixas, pr~fere mil vezes lancar-sc! nos braços avidos <strong>da</strong> usiira, e sujeitar-se<br />
a estorsóes por vezes inverosimeis. A intervençáo repressiva do<br />
governo colonial, nem sempre pro(1iiz resultados clfficazes. Assim, segundo<br />
diz Aubry, (I) o principal resultado <strong>da</strong> lei inglexa que prohibiu a hypotheca<br />
e a execução jiidicial dos imnioveis pertencentes aos indigenas, a não<br />
ser em favor ile oiitros indigenag, na provincia indiana do Pendjab, foi a<br />
extincçáo do credito.<br />
A proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> immobiliaria foi conserva<strong>da</strong> ao seu legitimo possuidor,<br />
mas a respectiva valorisaçáo agrícola tornou-se impossivel.<br />
As conseqiiencias <strong>da</strong> assimilaçko dos indigenas aos colono^, para<br />
effeitos <strong>de</strong> utilisaçáo do credito h~pothecario fornecido pelos particulares<br />
ou pelos estabelecimentou bancarios, teem sido n'algiimas colonias gran<strong>de</strong>mente<br />
<strong>de</strong>sastrosas. Na Argelia a concessão feita aos natiirses <strong>de</strong> po<strong>de</strong>rem<br />
livremente hypothecar os seus bens immoveis, associa<strong>da</strong> ii implantaçáo<br />
prematura <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> individual e do foro civil curopeii, provocou a<br />
<strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncia vertiginosa <strong>da</strong> organisac;áo economica dos indigenas, que se<br />
viram em ponco tempo <strong>de</strong>~pojados <strong>da</strong>s siias terras c reduzidos ao s roletariado.<br />
O estabelecimento do credito tem <strong>de</strong> ser acompanhado, ou mesmo<br />
precedido, pelas i<strong>de</strong>ias <strong>de</strong> previ<strong>de</strong>ncia propaga<strong>da</strong>s pelo exemplo, persiiasão,<br />
e creaçáo <strong>de</strong> institutos apropriados. D'outro modo, os indigenas abusará~<br />
<strong>da</strong> facul<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> realisar emprestimos, não empregarão as importancias<br />
recebi<strong>da</strong>s na valorisação do penhor, e em vez do progresso economico<br />
<strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>, a influencia do credito, contraprodiicente, apenas concorrer4<br />
para precipitar a sua ruina.<br />
(I) Pierre Auhry - La Colonisation et leu Coloiiiea.
CREDITO<br />
- - --- - - -- - 469<br />
-- - - --<br />
Uma prova frisante <strong>da</strong> incapaci<strong>da</strong><strong>de</strong> dos bancos coloniaes para garantir<br />
o credito indigena, tanto agricola como immobiliario, encontra-se<br />
actualmente 1111 situaçio economica di~ proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena na India Ingleza.<br />
Paiil Reinscli escreve a este respeito o seguinte : (I) « A India carece,<br />
comtudo, d'um systema <strong>de</strong> bancoq igrarios e <strong>de</strong> credito agricola scientificamente<br />
<strong>de</strong>senvolvido. Na reali<strong>da</strong>tfe existe na Tndia o mais completo divorcio<br />
entre o capital e a terra. O ciiltivador liindil tem <strong>de</strong> pagar taxas<br />
<strong>de</strong> juro <strong>de</strong> 24 O/, ou mesmo siipcriores. pelo dinheiro qiie lhe é adiantado<br />
pelos profissionaes <strong>da</strong> iisiir:i, ao passo que os banco3 com caixa ecoiiomica<br />
(seving-banka), exigem stmente 3 "1,. Esta gran<strong>de</strong> divergencia nas taxas<br />
dos juros indica que o governo ain<strong>da</strong>, náo procr<strong>de</strong>ii ao estabelecimento <strong>de</strong><br />
intermediarios regulart.5 e l~gitimos, entre o credito e a classe agricola~.<br />
No Egypto a rapi<strong>de</strong>z e intelligencia com que as railas indigenas adoptam<br />
e assimilam as institiiiçóes occi<strong>de</strong>ntaes <strong>de</strong> caracter politico ou economico,<br />
í'ac~litoii notxvelmente o estabelecimento do credito por meio dos<br />
bancos. 1)epois <strong>de</strong> Lord Crorner tentar inutilmente em 1894 a mobilisaçáo<br />
do cap~tal particular para einprestiinos agricolas, o governo iniciou, um<br />
pouco <strong>de</strong>pois, por intermedio do N(1tiotzctl Bastk oj' Egypt um serviço <strong>de</strong><br />
pequenos emprestimos em dinheiro ou em sementes, aos cnltivndores indigentis.<br />
Náo obstante a sua repiitaçáo <strong>de</strong> imprevi<strong>de</strong>ntes, estes reembolsaram<br />
o govcriio integralmente, e o serviço dos emprestimos agricolas adquiriu<br />
um tal incremento que em 1902 fun<strong>da</strong>va-se o Agricultura1 Bnnk o f Fjgypt,<br />
cLljo capital 6 já hoje <strong>de</strong> 35 milhóea <strong>de</strong> dollars, tendo já efiêctnado a colo-<br />
nos e iiidigenas mais <strong>de</strong> 50 milhóes tle dollars <strong>de</strong> emprestimos, sem soif'rer<br />
o mais insignificante prejuizo. Os incligenas que, durante cieciilos, se ha-<br />
viam <strong>de</strong>batido n:is garras dos prestamistas, logo que t1escobrir;im a gran<strong>de</strong><br />
vantagem que auferiam, utilisnntlo os serviços do banco, s:icudiram vigoro-<br />
samente «Y enleios <strong>da</strong> usura e aproveitaram, táo bem como os colonos, as<br />
garantias economicas <strong>da</strong> nova or.banisaçáo bancaria implanta<strong>da</strong> no Egypto .<br />
Este resultado é, poréni, excepcional e <strong>de</strong>vido. ao mesmo tempo,<br />
(I)<br />
€'a111 Keinsch - O. c. tl'lll
470 POLITICA INDIGENA<br />
intelligencia dos naturaes, e A primorosa organisaçáo do credito, a cargo<br />
<strong>da</strong>s diversas agencias que o L4gric~tltural Bnnk estabeleceu rias locali<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
em que se impunha a sna existencia. e nas qiiaes se emprega um systema<br />
simples e expedito na concess50 dos emprestimos.<br />
Na Indo-Cliina o direito annarnita estabelece dois principiou fun<strong>da</strong>nientaes,<br />
regulamentadores do cmprestimo a juros: (') a taxa maxima do<br />
juro annual <strong>de</strong>ve ser <strong>de</strong> 36 O/,, ou <strong>de</strong> 3 O/, ao mez; a capitalisação dos juros<br />
nunca po<strong>de</strong>rá exce<strong>de</strong>r a importancia do capital emprestado, qualquer<br />
que seja o prazo do emprestimo. Na prática estas regras sáo constantemente<br />
transgredi<strong>da</strong>s, e os indigenas são vilmente rxplorados pelos chetties,<br />
negociantes hindus <strong>de</strong> metaes preciosos que quasi ljossuein o monopolio <strong>da</strong><br />
agiotagem e <strong>da</strong> usura n'aquellas colonias. A primeira vista, parccc qiie 0%<br />
emprestimos consentidos pelo Hanco <strong>da</strong> Indo-China, sol~re ;t garantia <strong>da</strong>s<br />
colheitas ~en<strong>de</strong>ntes ao juro <strong>de</strong> 8 "I,,, <strong>de</strong>veriam ter representado uma gran<strong>de</strong>,<br />
melhoria economica, proporci~~nando aos indigenas refugio seguro contra as<br />
extorsóes dos usurarios. I'iiro erro; a fórma collectiva <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> communa1<br />
impoz um processo <strong>de</strong> garantias por tal modo complicado que os<br />
indigenas <strong>de</strong>sistem quasi sempre <strong>de</strong> recorrer ao banco. A necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
garantir o capital bancario contra a má f6 ou a insolrabili<strong>da</strong><strong>de</strong> dos <strong>de</strong>vedores,<br />
accresci<strong>da</strong> com a inevitavel complicacáo do formalisrrio burocratico<br />
caracteristico <strong>da</strong>s administraçóes neo-latinas, e o proprio typo <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
fez estabelecer os seguintes tramites, <strong>de</strong>ecriptos por (Xiraiilt: ()<br />
a É a communa que pe<strong>de</strong> emprestado em nome e por conta dos seus<br />
membros inscriptos que assim o sollicitarem. Este pedido, estabelecido em<br />
triplicado, 4 levado ao residciite <strong>da</strong> provincia pelo maire <strong>da</strong> communa,<br />
acompanhado <strong>de</strong> dois principaes e dos interessados. I? a Administraqáo que<br />
conce<strong>de</strong> o emprestimo e adianta o dinheiro. O 13anco restitue-lh'o em se-<br />
glii<strong>da</strong>, mas o thesouro fica responsavel para com o Banco pelo reembolso<br />
do emprestimo. 0s emprestimos sáo feitos por seis mezes, mas po<strong>de</strong>m ser<br />
(i) Girault - Op.<br />
(2) I<strong>de</strong>tn.
enovados por um periodo <strong>de</strong> egual duração em caso <strong>de</strong> colheita ruim, <strong>de</strong><br />
innun<strong>da</strong>çáo e <strong>de</strong> força maior. w<br />
No Senegal, apezar do respectivo banco, ultimarnentc reorganisado e<br />
transformado no gran<strong>de</strong> Banco <strong>da</strong> A. O. F., nHo consentir aos indigenas<br />
emprestimos sobre as colheitas, o credito real mobiliario entre commer-<br />
ciantes europeus e agricultores indigenas tem tomado um certo <strong>de</strong>sen-<br />
volvimento que não se pd<strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rar sensivelmente vant.joso para os<br />
indigenas, para quem a imprevi<strong>de</strong>ncia economica arrasta amiii<strong>de</strong> a impos-<br />
sibili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> rehaverem os objectos penhorados.<br />
Qs commerciantes europeus, para emprestarem a juros, precisam <strong>de</strong><br />
prCvia auctorisaçáo <strong>da</strong> administração <strong>da</strong> colonia, e ficam su,jeitos á fiscali-<br />
!iacão e aos regulamentos, ereados para proteger tanto <strong>de</strong>vedores como<br />
cr6clores.<br />
Cooperativas <strong>Indigena</strong>s<br />
Como se conclue do que <strong>de</strong>ixamos exposto, os bancos coloniaes sáo<br />
instrumentos muito <strong>de</strong>feituosos <strong>de</strong> credito indigena, e o papel primordial<br />
na ~aegcneraçao economica <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> nativa pertence <strong>de</strong> ilireito e <strong>de</strong> fa-<br />
cto ii mutuali<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena.<br />
Já adduzimos as consi<strong>de</strong>rações <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m theorica que nos levam a<br />
formular esta nossa opiniiio. Resta-nos agora examinar a evolilçáo do prin-<br />
cipio associativo na prktica colonial, pondo em evi<strong>de</strong>ncia o seu indisc~~tivel<br />
progresso e a sua incomparavel influencia economica e civilisadora.<br />
Começaremos pela Arçelia, on<strong>de</strong> a associaçHo dos naturaes vae pouco<br />
a pouco reparando os estragos causados pelos abusos do credito hypothe-<br />
cario c pela incerteza do regirnen agrario. Des<strong>de</strong> eras niuito remotas<br />
houve na Argelia, como aliás em to<strong>da</strong> a Africa do Norte, o costume <strong>de</strong><br />
conservar reservas cerealiferas em cavi<strong>da</strong><strong>de</strong>s suhterraneas chama<strong>da</strong>s silos.<br />
Estas reservas eram <strong>de</strong>stina<strong>da</strong>s a soccorrer os mendigos e necessitados, e<br />
a garantir as novas sementeiras em epochas <strong>de</strong> crise. Na origem, eram ge-
472 POLITICA INDIGENA I<br />
ralmente prodncto d'uma doação piedosa dos chefes arabes, continiiaiido<br />
<strong>de</strong>pois a serem alimenta<strong>da</strong>s pela cari<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s familiau mais ricas <strong>de</strong> ca<strong>da</strong><br />
locali<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
Quando os francezes conquistaram a Argelia a institiiic;Ho foi manti-<br />
<strong>da</strong>, n&o por acatamento dos costilmes indigenas. mas pela conveniencia<br />
utilitaria retira<strong>da</strong> d'cssa manutenção.<br />
Com effeito, os grãos dos silos começaram a servir frequentemente<br />
ao aprovisionamento <strong>da</strong>s tropas francezas qiie, mórmente durante as ope-<br />
ra(;óes activas, nem <strong>de</strong> leve eucrupulizavam no saque aos siloç.. Os mante-<br />
nedores d:t instituiçáo inspirit<strong>da</strong> nas maximaq caritativas (Ia doutrina<br />
islamica, vendo qiie, <strong>de</strong>svirtuado3 os seus fiiid, as tiadivas cori~aqra<strong>da</strong>s 4<br />
pobreza apenas serviam para o comniodo abastecimento <strong>da</strong>s tropas inva-<br />
soras, esmoreceram no sei1 esforço caridoso. As esmi,liiq entraram <strong>de</strong> fra-<br />
que,jar, e os silos argelinos qiie tinliam crr-tos pontos <strong>de</strong> contacto com os<br />
c~lleiros cojnlnzcna portugiieze* e com os irlotiti f~ri~iz~ntccri italianos, caliiram<br />
em rapi<strong>da</strong> <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncia, passando os indigenas fjmiiitos e os agricultores<br />
sem sementes a recorrer <strong>de</strong>ntro tic ~ ~ dwdilar i l á cari<strong>da</strong><strong>de</strong> individual.<br />
Só <strong>de</strong>pois <strong>da</strong>s fomes <strong>de</strong> 1867 e <strong>de</strong> 1868, 4 que a administraçáo franceza<br />
se começou a interessar n:i necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> crear a previ<strong>de</strong>ncia indigena,<br />
occorrendo entko a gran<strong>de</strong> vantagem <strong>de</strong> ressuscitar os sllo~, aperfeiçoando<br />
o seu funccionamento. O general Tliebert, comman<strong>da</strong>nte militar <strong>de</strong> Miliana,<br />
que observava <strong>de</strong> perto o exito proveniente <strong>da</strong> restaurapio ti'estes <strong>de</strong>positoe,<br />
lembroii-se <strong>de</strong> 03 aprovcitar para bases <strong>de</strong> associaçóes indigenas <strong>de</strong><br />
soccorros mutuos e <strong>de</strong> credito agricolã.<br />
N'essa or<strong>de</strong>m <strong>de</strong> itleias, orgnniuou em Miliana a primeira d'essas<br />
instituiçóes, cujos estatutos e auctorisn(:ho anniial <strong>de</strong> funccionamento foram<br />
approvadoq pelo governador gcrtil em 31 <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong> 1869. Des<strong>de</strong> o principio<br />
<strong>da</strong> siia vi<strong>da</strong> social foram valiosos e nottiveis os serviços prestados<br />
aos mutuarios por esta associaçko q~ie, ao mesmo tempo, concorria na medi<strong>da</strong><br />
<strong>da</strong>s suas forças parii. riiinordr os inales dos indiqentes não societarios.<br />
To<strong>da</strong>via, as graves perturbaçóes <strong>da</strong> or<strong>de</strong>m em 1870 e 1871, sustaram temporariamente<br />
o alastramento <strong>da</strong>s socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<strong>de</strong>vi<strong>da</strong>s á intelligente iniciativa<br />
<strong>de</strong> Liebert, e em 1876 apenas existiam em to<strong>da</strong> a colonia quatro
associnçóes indigenas. Em 1882, nas socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s creadtis em Palestro e Eoqhnri,<br />
modificaram-se ou estatutos <strong>da</strong>s prece<strong>de</strong>ntes, constitiiindo-se, annexa<br />
aos silo-s, uina caixa siistclnta<strong>da</strong> pelas quotas pagas em niimerario e pelo<br />
prodiicto <strong>da</strong> ven<strong>da</strong> (10s grãos exce<strong>de</strong>ntes. Em 1884, o governador geral<br />
Tirman prescreveu a creaçáo <strong>de</strong> associaçóes tl'esta natiirrza cri1 to<strong>da</strong>s as<br />
commanas mixtns cfa Argelia, e em 1887 as coopcratiras intfiqcnas eram<br />
jk em numero <strong>de</strong> 41, reiiniam 60:000 societarios e tlispiinliam (lc cerca <strong>de</strong><br />
1.700:000 francos <strong>de</strong> capital em dinheiro e generos.<br />
Pela lei <strong>de</strong> 14 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 1X93 foram reconheci<strong>da</strong>s como estabelecimentos<br />
( 1 iitili<strong>da</strong><strong>de</strong> ~ publica to<strong>da</strong>s as associações indigenas <strong>de</strong> previ<strong>de</strong>ncia<br />
e credito rniit,iio <strong>da</strong>s commilnas mixtas <strong>da</strong> Argelia. Descle entáo o progresso<br />
(IR ~nl~t~lalirla<strong>de</strong> n'aqiiella cnlonia tem sido verciacleirnmente assombroso.<br />
Pclns <strong>da</strong>doq que segui<strong>da</strong>mente t,ranscrevemos, se po<strong>de</strong> avaliar a rapi<strong>de</strong>z<br />
crc-cente <strong>da</strong> siia progressRo.<br />
Em 188: existiam 44 associações com 6o:293 societarios e iinl capital <strong>de</strong> I.;OO:OOO francos<br />
» rSqn » 70 » » r85:09o » » » » » 379o:ooo<br />
>> 18qq » r28 » B 327:346 » B » » ;.grr:ooo D<br />
1907 » r76 x >> 466:207 » » » » B 15.209:ooo »<br />
Os <strong>da</strong>dos que <strong>de</strong>mos para 1907 são OS que resultam <strong>da</strong>s estatisticas<br />
rc>t't~rentes no fim do anno <strong>de</strong> 1906. A repartição do capital era. a seguinte:<br />
Nunierario eni caixa . . . . .<br />
9.35[):7", frc.<br />
Valor dos grúos <strong>de</strong>positados . . . . . . . . . 1.188: 561 frs.<br />
Adiantamentos em dinheiro . . . . . . . . . 4 43;: i 22 frs.<br />
>> » seiiientes . . . . . . . . . 49:1r7 frs.<br />
Quotas a receber . . . . . . . . . . . . 176:335 frs.<br />
Total . .<br />
15.208:895 frs.<br />
Estes significativos algarismos mostram a sitiiaçTio florescente do<br />
rniitiialismo indigena, que ain<strong>da</strong> em fins <strong>de</strong> 1908, por occasião <strong>da</strong> crise<br />
cerealifera em Constantina, motivacla ])ela secca prolonga<strong>da</strong> e pela praga
474 POLITICA INDIGENA<br />
dos gafanhotos, <strong>de</strong>u uma soberba prova <strong>da</strong> sua vitali<strong>da</strong><strong>de</strong>, po<strong>de</strong>rio e effi-<br />
cacia economica. Segundo uma noticia <strong>da</strong> Qui~ízaine Coloniale, (I) as socie-<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong>s do <strong>de</strong>partamento <strong>de</strong> Constantina concorreram, para <strong>de</strong>bellar os effei-<br />
tos <strong>da</strong> crise, com uma somma total <strong>de</strong> 5.252:324 francos? o que representa<br />
um bello gesto <strong>de</strong> soli<strong>da</strong>rie<strong>da</strong><strong>de</strong> traduzido n'um importanti~simo aiixilio.<br />
Quanto & sua organisaçáo e funccionamento, as cooperativas indige-<br />
nas apresentam um typo sui generis que náo correspon<strong>de</strong> a nenhuma orga-<br />
nisaçáo semelhante nas naçóes europeias. A adhesáo doe indigenas é abso-<br />
lutamente livre. Compelli-10s a acceitar ás garantia3 e a comparticipar<br />
dos encargos <strong>de</strong> miituarios, seria 0 maior dos coiitra-sensos politicos. As<br />
associaqúes conservam um accentnado caracter <strong>de</strong> protcc@o agricola, visto<br />
que sd os indigenas agricultores $20 admittidos como socios, sendo rigoro-<br />
samente exclnidos os que se <strong>de</strong>dicam á indiistria e ao oommercio. O paga-<br />
mento <strong>da</strong>s quotas po<strong>de</strong> ser feito em dinheiro o11 em grãos, á escolha do<br />
societario. As quotils em dinheiro tornaram-se indispensaveis visto que as<br />
operaçóes <strong>de</strong> seguro collectivo dos gráos <strong>de</strong>positados nos silos e os empres-<br />
timos pecuniarios para compra <strong>de</strong> gado oii alfaias :igricolas, tornaram<br />
necessaria a conversão em numerario d'uma parte do capital social.<br />
Os silos propriamente ditos foram mantidos, e materialmente muito<br />
melhorados, por maneira a evitar, rliianto possirel, a <strong>de</strong>terioraçáo dos<br />
grãos em <strong>de</strong>po3ito.<br />
O caracter d'estas associaçóes 6 duplo, pois são ao mesmo tempo so-<br />
cie<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> credito mutuo e institutos <strong>de</strong> cari<strong>da</strong><strong>de</strong>. Contra esta fcírma táo<br />
a<strong>da</strong>pta<strong>da</strong> aos costumes e crenças (10s indigenas, levantou-se em tempos a<br />
opinião assimiladora dos que <strong>de</strong>fendiam a transformaçko <strong>da</strong>s miitiiali<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
indigenas em bancos agricolas, ou caixas regionaes i<strong>de</strong>nticas ás que em<br />
França vigoram. Káo foi ávante esta mutaçáo absur<strong>da</strong>, e prevaleceu<br />
felizmente a opinião sensata d'aqiielles que reconheciam a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
conservar ás socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s indigenas, refractarias a innovaçóes, a sua orga-<br />
nisação especial.<br />
(I) Niimero <strong>de</strong> 10 <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 1909.
COOPERATIVISMO<br />
Os mutuantes indigenas consi<strong>de</strong>ram, na sua maioria, a quota paga<br />
como esmola <strong>de</strong>vi<strong>da</strong> aos indigentes por todo o bom musi~lmano, e por esse<br />
motivo, sendo difficil ligar praticamente as i<strong>de</strong>ias <strong>de</strong> cari<strong>da</strong><strong>de</strong> e Ilicro, estas<br />
associaçóes niio pagam divi<strong>de</strong>ndo algum. A t.srnola aos indigenas estranhos<br />
á associação é limita<strong>da</strong> aos casos <strong>de</strong> reconheci<strong>da</strong> miseria, liavendo Iiqje<br />
ten<strong>de</strong>ncia para se reduzir ca<strong>da</strong> vez mais o numero cle excepçóes, a firn <strong>de</strong><br />
<strong>da</strong>r solidos fun<strong>da</strong>mentos ao principio associatiro. Os emprestimos effectuados<br />
por estas associações individualmente aos cultivadores indigenas nunca<br />
são muito con~i<strong>de</strong>raveis. Pelo contrario, o fim principal que +c tcm em<br />
V ~ S ~ 6 R soccorrer os necessitados com adiantamentos em sementes ou generos,<br />
que náo ultrapassem as possibili<strong>da</strong><strong>de</strong>s do rendimento <strong>da</strong>s proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>s,<br />
permittindo quasi sempre o reembolso do credito sein recurso á usura,<br />
liypotheca e á ven<strong>da</strong>, que tão nocivas teem sido á situação material dos<br />
intligenas argelinos.<br />
As associaçóes, n:t siia constante lucta contra a usura, teem obtido<br />
resultados importantes qile ten<strong>de</strong>m a accentuar-se com firmeza nos ultimos<br />
annos, ~endo já hoje sensiveis varios s~rmptoriiaa <strong>de</strong> progresso economico<br />
que ain<strong>da</strong> ha bem pouco tempo falleciani por completo.<br />
Para a distribuiçáo <strong>da</strong>s associações adoptou-se a uni<strong>da</strong><strong>de</strong> corritnunal.<br />
A sé<strong>de</strong> <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> C! na locali<strong>da</strong><strong>de</strong> principal <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> commiina mixta, e a<br />
socie<strong>da</strong><strong>de</strong> divi<strong>de</strong>-se em tantas secçóes locaes qnantas forem as secçóes indigenas<br />
- tribiis, aduares, fracq6es <strong>de</strong> tribus oii <strong>de</strong> adiiiires -, ficando ca<strong>da</strong><br />
uma d'estas com os seus silos particulares e com um coiiselho <strong>de</strong> administração<br />
local chamado c!jr~nmniu. São as djemmicins que informam a administração<br />
central sobre a solvabili<strong>da</strong><strong>de</strong> dos que sollicitam emprestimos, e sobre<br />
a qiitintia que maximamente lhes po<strong>de</strong>rá ser a<strong>de</strong>anta<strong>da</strong>. Egualmente fazem<br />
valer a justiça dos que forem victimas <strong>de</strong> eventuali<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong>sastrosas e<br />
imprevistas, propondo ao conselho central as prorogaçóes <strong>de</strong> prazo, e as<br />
diminniçóes <strong>de</strong> encargos e prestaçóes que enten<strong>de</strong>rem jiistifica<strong>da</strong>s.<br />
SO os agricultores indigenas domiciliados na commiina po<strong>de</strong>m fazer<br />
parte <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong>. O conselho <strong>de</strong> administraçáo central C presidido :~~lo<br />
~nnire ou pelo administrador <strong>da</strong> communa, e a gerencia fin;tiiceira está a<br />
cargo do recebedor municipal.<br />
-- 47.5
476 POLITICA INDIBENA<br />
-- - - - -- -- - - -. --<br />
O fundo social, que 6 constitaido pelas quotas pagas em dinheiro ou<br />
geileros, e pelo inro <strong>de</strong> 5 O/,, vencido pelos cmprestinios, C 1)roprie<strong>da</strong><strong>de</strong> social<br />
commum e inriivisa, tentlo essa intlivisibilitla<strong>de</strong> o caracter perpet.uo. Os<br />
ernprestimos s5o renlisados a curto l)r?izo, geralrne~it~e pela tliiraçáo tlo anno<br />
agricoia, permittindo-se em caso <strong>de</strong> força maior it prorogii~áo do prazo pelo<br />
mesmo tempo.<br />
A lei organica. d'estxs institriiçfies <strong>de</strong> previ<strong>de</strong>nciit tornou extensivo ás<br />
uni<strong>da</strong><strong>de</strong>s associat~ivas o principio <strong>da</strong> isolidririedtitle. D'eatc, modo, as socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
indipniis tl'uma regi50 assola<strong>da</strong> po<strong>de</strong>m recorrer, por via tlc emprestimos,<br />
tis suas congencres que fiinccionnm nas zonas poupa<strong>da</strong>s pelo flagello.<br />
O referido cliplom;~ <strong>de</strong> 1.4 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 1893 consente aos societarios o<br />
segoro cont,ra its gea<strong>da</strong>s e granizo, por meio <strong>de</strong> apolice* collectivas, e em<br />
18!)-1, foi aiict,oris:ido qus a terqa parte do prodiicto nnniial <strong>da</strong>s qiiotisaçóes<br />
potleiise ser ernpregtitla excli~sivamente em opcraqóes <strong>de</strong> seguro xgricola.<br />
Em 1900 foi nl)plic:irla li Argc~li;~ :L lei sobre seguros mutiios promiilgadn<br />
na metropolc, c em 1907 fiincloii-se cm Alger lima caixa central,<br />
encontrando-se actiialtnentcr eni via <strong>de</strong> constituiyáo diversas caixas locaes,<br />
miituantes <strong>de</strong> seguros ~igricolas, qiie admittem tidherentes eiirnpt?ris e indigentis,<br />
e c11,ja. ft.<strong>de</strong>r:iy,;to ecoriomica <strong>de</strong>vk em pouco tempo produzir urna perfeita<br />
organisayso tle seguros miitixos, concorrendo, além d'isso, para approximar<br />
as duas rayas pcla influencia poclerosa <strong>da</strong> associa(;,io dos interesses.<br />
Taes siio, a traços largos, a physionomia cnracteristica e o modo <strong>de</strong><br />
funccionamento especial <strong>da</strong>. organisaçáo mutualista dos indigcnas argelinos,<br />
a quem o beneficio extraordinario <strong>da</strong> prbtica associativa tem iiltimamente<br />
rendido urn progresso economico milito notavel.<br />
Po<strong>de</strong> dizer-se que a popiilaçfio indigena est6 hoje plenamente ao<br />
abrigo <strong>da</strong>s temerosas fomes que matavam milhares <strong>de</strong> indigentes, sem que<br />
o governo francez tenlia <strong>de</strong> fazer quiiesquer pesados sacrificios pecuniarios.<br />
Os soccorros mut~ios indigcnas ,j& qiinsi se po<strong>de</strong>m <strong>de</strong>frontar, isola<strong>da</strong> e victoriouamente,<br />
com essas periodicas crises <strong>de</strong> miseria e <strong>de</strong>solação.<br />
E' um do: mais brilhantes successos cooperativistas que por emquanto<br />
se po<strong>de</strong>m-egistar nos fastos <strong>da</strong> colonisaçfio mo<strong>de</strong>rna.<br />
Na Tunisia fiinxionoii até 1890 Lima instituição indigena, a Rabtu,
que, anteriormente ao estabelcc~imento do protectorado francez, pr~stoil<br />
valio~os serviços aOS agricultores tiinisinos. A primeira í,'clbttc foi fun<strong>da</strong><strong>da</strong><br />
pelos monros emigrantes <strong>da</strong> An<strong>da</strong>luzia no pcriodo dyirastico dos Hafsi<strong>de</strong>s.<br />
Era constitiiiíla por iim gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>posito cciitral <strong>de</strong> cereaes obtidos pela<br />
inipusiy%o <strong>de</strong> um dizimo sobre as collicitas, c arreca<strong>da</strong>Jos em silos situados<br />
n'iima eininencia viziiilia a Tunis, on<strong>de</strong> ficavam ao abrigo <strong>da</strong> liumi<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
Mais tar<strong>de</strong> crearam-se rnhtns tiiixiliares em Beja, Kizerta, etc., nas<br />
locali<strong>da</strong><strong>de</strong>s on<strong>de</strong> predominava a ci~ltnra cercalifera, cobrando-sc~ o imposto<br />
em dinheiro nas oiitras regióes,<br />
Effecti:a<strong>da</strong> a cobrança dou dizimns, cram os cereaes provisoriamente<br />
guar<strong>da</strong>dos nas rwhttrs auxiliares, d'on<strong>de</strong> <strong>de</strong>pois sahiam para serem distribnic'los<br />
pelos 150 silos <strong>da</strong> rabtn <strong>de</strong> 'riiniil. Em epoclias normaes, estas reservas<br />
cle cereaes serviam alimentayHo (10 exercito e do fiinccionalismo<br />
superior <strong>da</strong> Regencia; em epochas <strong>de</strong> peniiria e <strong>de</strong> fome serviam para fornecer<br />
aos agriciiltores indigenas emprestimos reembolsaveis em generos.<br />
Na primeira pliase administrativa do Protectorado foram aboIi<strong>da</strong>s, talvez<br />
preinatiiramente, cstn.: instituiçóes, e durante as crises agricolan e alimenticias<br />
<strong>de</strong> 18!):), 18!líi, 1897, 1902 e 1905, o governo teve <strong>de</strong> soccorrer<br />
directamente os necessitados com esmolas e emprestimos dc sementes que<br />
representaram um oneroso ericnrgo financeiro para o orçamento local.<br />
Reconhecendo a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> incutir i<strong>de</strong>ias <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m e <strong>de</strong> economia no<br />
espirito indigena, pensou a administra
478 POLITICA INDIGENA<br />
exercicio na locali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> sé<strong>de</strong> associativa. O conselho <strong>de</strong> administraváo<br />
compunha-se tle seis membrog, e a contabili<strong>da</strong><strong>de</strong> estava a cargo <strong>de</strong> recebedores<br />
que venciam gratificaç6es proporcionaes As transacçóes effectua<strong>da</strong>s.<br />
O principal <strong>de</strong>feito <strong>de</strong> origem d'estas associaçóes era a falta <strong>de</strong> estatuto<br />
juridico que lhes ve<strong>da</strong>va to<strong>da</strong>s as operayúes financeiras susceptiveis<br />
<strong>de</strong> melhorar o respectivo equilibrio economico.<br />
Assim como na Argelia a lei <strong>de</strong> 1HY3, que conferiu ás mutuali<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
indigenas a personali<strong>da</strong><strong>de</strong> civil, foi um dos factores mais efficazes do seu<br />
progresso tão rapiclo, assim na Tunisia o <strong>de</strong>creto beylical <strong>de</strong> 27 <strong>de</strong> maio<br />
<strong>de</strong> 1007, que implantou um systema associati\~o em tiido semelhante ao<br />
<strong>da</strong> Argelia, provocou a generalisação qnasi instantanea <strong>da</strong> organisaçáo<br />
mutualista a todo o territorio do Protectorado. No meiado c10 anno <strong>de</strong> 190s<br />
existiam na Siinisia 36 mutuali<strong>da</strong><strong>de</strong>s indigenas, dispondo d'um activo <strong>de</strong><br />
1.250:000 francos, o qual, apezar <strong>da</strong> temerosa crise agricola, estava, ao<br />
fin<strong>da</strong>r o anno, augmentado com mais 200:000 franco3 <strong>de</strong> qiiotisaçóes. Para se<br />
avaliar a transformiiç2o realisa<strong>da</strong> durante um aiino <strong>de</strong>corrido após a piibli-<br />
caçáo r10 referido <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 1907, basta relatar os inestimavcis serviços<br />
prestados pelas riovns socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s no mais agiido <strong>da</strong> crise <strong>de</strong> 1908. A estia-<br />
gem implacavel queimara as searas e resequira as oliveiras <strong>de</strong> forma tal,<br />
que n'algumas rirciirnscripc;óes nao se chego11 a colher um alqueire <strong>de</strong> trigo<br />
ou um almiidc <strong>de</strong> azeite. Os agriciiltores indigenas, em lcicta com difficul-<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong>s e privaçóes <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a especie, reportaram a sua activitla<strong>de</strong> á creaçáo<br />
do gado, mas a pro1ong;itla sccca outomnal veio consiimmar a obra <strong>de</strong><br />
miseria, calcinando 03 pastos, e fazendo perecer os animaes ft mingua <strong>de</strong><br />
sustento. Entre as popiiliiçóes riiraes absolutamente <strong>de</strong>sprovi<strong>da</strong>s <strong>de</strong> reciir-<br />
sos, começoii a fazer-se sentir a fome, e a administraçáo interveio com<br />
numerosas obras <strong>de</strong> assistcncia e com um serviço <strong>de</strong> emprestimos agrico-<br />
Ias em generos, ao qual foi attribiii<strong>da</strong> a quantia <strong>de</strong> 550:000 francos. Diri-<br />
gido um appello ás socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s intligenas <strong>de</strong> previ<strong>de</strong>ncia, acaba<strong>da</strong>s <strong>de</strong> crear,<br />
contribniram estas para os emprestimos agricolas com a importancia <strong>de</strong><br />
1 .250:000 francos.<br />
Este meritorio e generoso esforço já <strong>de</strong>ve ter recebido o premio aqui-<br />
latado a que tinha jus. O anno agricola <strong>de</strong> 1909 correu regularmente, o que
COOPERATIVISMO 459<br />
<strong>de</strong>ixa prevêr que as mutuali<strong>da</strong><strong>de</strong>s tunisinas <strong>de</strong>vem ter sido reembolsa<strong>da</strong>s dos<br />
adiantamentos feitos, e <strong>de</strong>vem estar já hoje <strong>de</strong> posse d'um activo global<br />
exce<strong>de</strong>nte a dois milh6es <strong>de</strong> francos.<br />
O <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 20 <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 1907 previu a necessitfa<strong>de</strong> <strong>de</strong> utilisar o<br />
capital <strong>da</strong>s associaçóes <strong>de</strong> previ<strong>de</strong>ncia na lucta contra a usura que corroe a<br />
população fellah, e para esse fim estttbeleceii a facul<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> se negociarem<br />
emprestimos entre as uni<strong>da</strong><strong>de</strong>s associativas, e conferia aos <strong>de</strong>vedores indi-<br />
viduaes a facul<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> se soli<strong>da</strong>risarem perante a socie<strong>da</strong><strong>de</strong> ou socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
crétloras.<br />
Mas, não 6 s6 no ambito do credito agricola que o mutualismo indi-<br />
gena triumpha na Tunisia. Devi<strong>da</strong>s á iniciativa intelligente d'alguns tuni-<br />
sinos cultos e educados, fun<strong>da</strong>ram-se alli ha poucos mezes duas cooperati-<br />
vas <strong>de</strong> producç50 industrial : uma, a Es-Saadia, <strong>de</strong>stina-se a restaurar o<br />
fabrico indigena <strong>da</strong>s chinellas levantinas, a outra, Manufacture <strong>de</strong>s Tupis<br />
<strong>de</strong> ííuirouan, propõe-se erguer a industria afama<strong>da</strong> dos tapetes orientaea<br />
at6 um nivel <strong>de</strong> eleva<strong>da</strong> perfeiçáo manufactureira. -4 organisaçáo mutua-<br />
lista na Argelia e na Tunisia, constituindo um instrument.0 inegualavel <strong>de</strong><br />
progresso economico e social, representa por isso, a mais soli<strong>da</strong> garantia<br />
<strong>de</strong> estabili<strong>da</strong><strong>de</strong> politica que se po<strong>de</strong>ria <strong>de</strong>sejar, e facilita em larga escalla<br />
a politica indigena <strong>de</strong> associação economica que tão preconisa<strong>da</strong> vem sendo.<br />
O principio <strong>da</strong> cooperação que, como se vê, tem <strong>da</strong>do resultados bri-<br />
Il.;i:ites nas colonias norte-africanas, é natural que venha a <strong>de</strong>sempenhar<br />
um papel muito importante na educação economica dos indigenas coloniaes,<br />
e está principalmente indicado para surtir effeito mais eficaz entre os in-<br />
digerias <strong>da</strong>s colonias asiuticas do Extremo Oriente, cuja educação essen-<br />
cialmente collectivista lhes faz propen<strong>de</strong>r o espirito para a prática asso-<br />
ciativa. Assim o comprehen<strong>de</strong>u Mr. Charles Prêtre, administrador dos<br />
serviços civis <strong>da</strong> Indo-China, creando em 1902 a cooperativa Dong-Luá <strong>de</strong><br />
Phii-Liang, que foi a primeira d'uma serie que ten<strong>de</strong> hoje a <strong>de</strong>senvolver-se<br />
com rapi<strong>de</strong>z. Estas socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s teem por fim principal o commercio dos pro-<br />
duetos <strong>da</strong> região, <strong>de</strong> fórma a subtrahir, tanto os productores como os con-<br />
sumidores indigenas, á ganancia dos intermediarios. A medi<strong>da</strong> que a edu-<br />
cacáo economica e m'utualista dos annamitas se for tornando Lima reali<strong>da</strong><strong>de</strong>,
480<br />
- - - --<br />
POLITICA IXDIGENA<br />
- -- - - - - --- A<br />
as socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s Dong-lluá que, ao principio, fiinccionam coirio cooperativas<br />
<strong>de</strong> prod~icc;iio, preciz:~m montar uma citixa rconomica alimentatla com<br />
uma quota parte do producto <strong>da</strong>s (1iiotiuay~es, fbrmando-se :issini filntlos <strong>de</strong><br />
eapitalisaçáo individual, e teráo tamb(.in <strong>de</strong> organisar iim servi(:o <strong>de</strong> emprestimos<br />
iininobiliarios.<br />
Est,as soc:ie<strong>da</strong>tles fiinccionam hoje na Indo-China principalmente como<br />
reguladoras tio preço local do arroz, que é a base <strong>da</strong> alimentaçáo dos indi.<br />
genas. Uma <strong>da</strong>s disposiç6es mais curiosas <strong>da</strong> siia organisaçáo financeira<br />
consiste em qiie as compras <strong>de</strong> 11nddly xRo feitas com o auxilio <strong>de</strong> emprestimos,<br />
e náo com os fiindos proprios di~ associação. E~ta disposição permitte<br />
realisar beneficios relativamente importantes, ficando sempre livre o oapital<br />
social que, no inicio, B quasi sempre enipregatlo nas compras dos immoveis<br />
neceesarios 4 arrcca<strong>da</strong>çRo dos generos, e que inais tar<strong>de</strong> po<strong>de</strong>ri directamente<br />
servir ao fornecimerito do credit,o hypothecario. Esta fórma <strong>de</strong><br />
credito miituo B nat,ural que venha a ser prepon<strong>de</strong>rante no rnritualismo<br />
annamita, porqiie correopon<strong>de</strong> prcciuamente ii necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> mais flagrante<br />
<strong>da</strong> economia indigena esmaga<strong>da</strong> entre os pesacios onua do processo hypothecario<br />
nos bancos coloniaes, e a avi<strong>de</strong>z insaciavel dos prestamistas profissionaes.<br />
A primeira tentativa <strong>de</strong> implantaçáo do cooperativismo na popiilaçao<br />
malgache <strong>de</strong> Ma<strong>da</strong>gascar, encontra-se n'iima, recente portaria do governador<br />
geral Df. Angagneur, que aiictorisou a creitçáo, em Nanisana, perto <strong>de</strong><br />
Tananarive, d'iirna socie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena para ven<strong>da</strong> e conservac;áo do arroz.<br />
O fim a que se propoz a crcaçáo d'esta cooperativa foi o <strong>de</strong> fnmiliarisar os<br />
indigenas com as i<strong>de</strong>ias mais elementares <strong>da</strong> previ<strong>de</strong>ncia e economia, e incitS-los<br />
a aperfeiçoar os seus processos culturaes por forma a tirar maior<br />
rendimento <strong>da</strong>s suas exploraçóes agricolas. Os principaes objectivos indicados<br />
nos termos dos estatutos s&~ OS seguintes: 1." permittir aos indigenas<br />
a conservaç&o <strong>da</strong>s sementes <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a collieita A sementeira, e a iitilisaçáo<br />
<strong>de</strong> apparelhos <strong>de</strong>stinados a preparar e a seleccionar as sementes ; 2.O effe-<br />
ctuar as ven<strong>da</strong>s do arroz em commum, a fim <strong>de</strong> regularisar os preços n'iima<br />
rnddia remuneradora ; 3.0 comprar em commum as materias primas, adubos<br />
e rnachinas nccessarias ao aperfeiyoamento <strong>da</strong>s cnlturas e <strong>da</strong> prodiicqáo.
COOPERATIVISMO 4% 1<br />
- - - -- --- -- --<br />
A associação tem poucos mezes <strong>de</strong> esistencia e por iszu ~ ~ rpie- i u ~<br />
maturas quaesquer consi<strong>de</strong>raçóes relativas A sua provavel eBcacia ou ao<br />
seu possivel estac.ionamento. É <strong>de</strong> esperar, porém, que a população hova,<br />
bastante intelligeiite, saiba tirar part,iclo tia innovaçáo, e comprehen<strong>de</strong>ndo-lhe<br />
as vantagens, promova e.-ipont:tneilmentc a sua diffilsão. De resto,<br />
como já tivemos occasiáo <strong>de</strong> affirmar, o conperntivisrnn não B apenas applicave1<br />
ás populações civiliaa<strong>da</strong>s, ou pelo menos r<strong>da</strong>tivamente cultas, e ao<br />
contrario a sua applicaçao B extenaivel aos b;trl.)aros africanos. O essencial<br />
4 que o espirito do legislador saiba apprehen<strong>de</strong>r aa ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iras necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
du indigena, fabricando-lhe organisaçóes cooperativistas gradua<strong>da</strong>mente<br />
proporc~iunaes ao seu nivel intellectual e ás suas po~ibili<strong>da</strong><strong>de</strong>s economicas.<br />
JA iilludimos ao pwgresuo <strong>da</strong>s cb,iisar ci~c)nornica~ para indigenas nos<br />
rst,iI~elt~cimentos inglezes ilt~ Africil Occi<strong>de</strong>ntal. Na Guiné esta0 os frãncezes<br />
empregando os melhores esforços para <strong>de</strong>senvolver o mi~tualismo indigena,<br />
e tiido leva a crâr que ein breve attinsirzo o fim ii que se propõem.<br />
Finalmente, no Senegal, on<strong>da</strong> as alternativas <strong>da</strong> colheita do amendoim<br />
obrigam com frelquencia os agricixltore~ indigenas a recorrerem ao<br />
credito real mobiliario, fornecido pelos commerciantes eiiropeuu, estabeleceu-se<br />
ha pouco tempo uma socierlaiir indigen;~ <strong>de</strong> credito itgricola que tem<br />
tido um exito mesino surprehen<strong>de</strong>iite p:+r;i. aqiielles que rnilis justiça, rentlein<br />
4 intellectuali<strong>da</strong>cie negra, habitualmi:iit,t: tko calumnia<strong>da</strong>. F~incciona<br />
essa socie<strong>da</strong><strong>de</strong> em Kaolack, sob a presi<strong>de</strong>nc:i:t ilo fiinccioriario europeu que<br />
administra o respectivo circulo regional, e foi fun<strong>da</strong><strong>da</strong> em jiilho <strong>de</strong> 1907.<br />
E interessante relatar minucio3amente a sua histeria, por isso que pó<strong>de</strong><br />
servir <strong>de</strong> base a futuros ensaios inutiialistas em colonias africanas.<br />
Em 1907, no intuito <strong>de</strong> soccorrer 03 indigenas que luctavam com a<br />
fome, e <strong>de</strong>sejando ao mesmo tempo esboçar uma tentativa <strong>de</strong> miituali<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />
o governo <strong>da</strong> colonia p6z 20:000 francos á disposicão <strong>de</strong> M. Lefilliâtre,<br />
administrador do circiilo <strong>de</strong> Sine-Salnme. Este funccionario fez constar na<br />
regiao vizinha a Kaolack que emprestava sementes <strong>de</strong> amendoim ao juro<br />
<strong>de</strong> 5 em peso. (') Os indigenas habituados pelos prestamistas usuaes,<br />
- - - . --<br />
(1)<br />
Quinzaine Coloniale. 25 <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 1909.<br />
31
482 I POLITICA INDIGENA<br />
I<br />
a entregarem 200 kilos <strong>de</strong> smeiidoim por ca<strong>da</strong> 100 recebidos, inscreve-<br />
ram-se immediatamente n'um registo especial, e esgotaram completamente<br />
as cem tonela<strong>da</strong>s <strong>de</strong> amendoim qiie lhes eram empresta<strong>da</strong>s.<br />
Segui<strong>da</strong>mente 11. Lefilliiitre nomeou um conselho <strong>de</strong> administração<br />
provisorio, composto dos chefes indigenas <strong>da</strong> região e <strong>de</strong> um cultivador in-<br />
fluente <strong>de</strong> Kaolack. O conselho <strong>de</strong>cidiu em <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1907 pedir a ca<strong>da</strong><br />
<strong>de</strong>vedor indigena, alem do juro <strong>de</strong> 5 O/,, em peso, uma quotisaçáo annual <strong>de</strong><br />
O francos. Esta quotisação transformou os <strong>de</strong>vedores em societarios, e confe-<br />
riu-lhes o direito <strong>de</strong> receber em 1908 as sementes <strong>de</strong> amendoim a um juro<br />
muito modico, ao passo que os indigenas não societarios sG po<strong>de</strong>riam gozar<br />
d'essa regalia, pagando previamente em generos ou dinheiro a importancia<br />
<strong>da</strong> quota.<br />
Depois <strong>da</strong> colheita, a sociedia<strong>de</strong> <strong>de</strong> previ<strong>de</strong>ncia recebeu 124493 kilos<br />
<strong>de</strong> amendoim contra 100:OOO kilos que havia emprestado. Avaliando o<br />
amendoim a 20 francos a tonela<strong>da</strong>, o capital social encontrava-se augmen-<br />
tado dc 1:898 francos, quando <strong>de</strong>vera ter tido um accrescimo <strong>de</strong> 6:000<br />
franc~s,<br />
sendo esta differença causa<strong>da</strong> pelos inconvenientes <strong>da</strong> armazena-<br />
gem, e pelas substancias estranhas conti<strong>da</strong>s entre as sementes. Tomaram-se<br />
precauçGes para diminuir o quantitativo d'esta qiiebra, augmentou-se a<br />
taxa <strong>de</strong> reembolso a 28 O/, do pe$o, e manteve-se a quotisaç?io annual <strong>de</strong> 5<br />
francos, paga em dinheiro na occasião <strong>da</strong> entrega <strong>da</strong>s sementes. Em <strong>de</strong>-<br />
zembro <strong>de</strong> 1908, o conselho <strong>de</strong> administração resolveu crear uma secção em<br />
Fatik, com iim <strong>de</strong>posito <strong>de</strong> 21 tonela<strong>da</strong>s <strong>de</strong> amendoim retira<strong>da</strong>s do celleiro<br />
central <strong>de</strong> liaolacli. O reembolso dos emprestimos <strong>de</strong>pois <strong>da</strong> colheita <strong>de</strong><br />
1908 realisoii-se em optimas condiçóes. Em 1 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 1909 o capital<br />
<strong>da</strong> associapão era <strong>de</strong> 28:010 francos em dinheiro, e 187 tonela<strong>da</strong>s <strong>de</strong> amen-<br />
doim, e a lista dos associados cornprehendia na<strong>da</strong> menos <strong>de</strong> 764 indigenas.<br />
No curto espaço <strong>de</strong> 18 mezes, e luctando com a imprevi<strong>de</strong>ncia innata dos<br />
naturnes, (: clifficil fazer tanto, e impossivel conseguir mais.<br />
O exemplo d'esta associação B prova <strong>de</strong>cisiva do muito que se po-<br />
<strong>de</strong>ria facilmente conseguir do indigena africano no campo economico, se os<br />
colonisadores se preoccupassem em geral, um poiico que fosse, com o estudo<br />
<strong>da</strong>s instituicóes cooperativas mais a<strong>da</strong>ptaveis ao condicionalismo ethnico e
local. Mas não, a uns, cega a mania unitaria e assimiladora que preten<strong>de</strong><br />
applicar ex abrupto aos indigenas menos civilisados, as instituiçóes mais<br />
complexas que na metropole existem, a outros, que vaidosamente apregoam<br />
conhecer a indole do preto, repugna a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que elle pó<strong>de</strong> vir a ser<br />
tanto ou mais civilisado do que os que assim o julgam, e consi<strong>de</strong>ram inuteis<br />
to<strong>da</strong>s as tentativas para a educaçáo moral e intellectual, e para a<br />
organisaçáo economictt <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena. Na phrase ôcca <strong>de</strong> muitos<br />
banaes <strong>de</strong>clarnadores, cujo conhecimento <strong>da</strong> psycliologia negra se limita<br />
a não ignorar que os muleques gostam <strong>de</strong> assucar, os adiiltos <strong>de</strong> vinho, e<br />
as mulheres <strong>de</strong> chibantes, a boçali<strong>da</strong><strong>de</strong> negra impedirá sempre o progresso<br />
<strong>da</strong>s instituiçóes civilisa<strong>da</strong>s.<br />
$1 possivel que assim aconteça, mas acreditamos mais que, se alguma<br />
lio[:alitla<strong>de</strong> impe<strong>de</strong> o progresso social e economico dos indigenas, 4 antes a<br />
( ~ I I , ~<br />
11" <strong>de</strong>ixa ver a tanto funccionario e a tanto colono, o erro crasso em<br />
que laboram. Náo fallamos como colonial <strong>de</strong> gabinete pelo que volumo-<br />
sos tratadistas nos ensinem. mas sim com a convicçáo fun<strong>da</strong>menta<strong>da</strong> <strong>de</strong><br />
quem, tendo vivido algum tempo entre africanos, e propenso á observação<br />
<strong>da</strong> sua ethnica e <strong>da</strong> s~ua mentali<strong>da</strong><strong>de</strong>, reputa possivel a civilisaç&o gradual<br />
e lenta, mas segura e infallivel, <strong>da</strong> população negra. E, na educação<br />
eocial dos povos, o mutualismo representa o mais seguro elemento <strong>de</strong> con-<br />
soli<strong>da</strong>ção economica e <strong>de</strong> estabili<strong>da</strong><strong>de</strong> politica. É por isso que, apreciando<br />
vantagens já <strong>de</strong>monstra<strong>da</strong>s do cooperativismo indigena, não 4 arrojado<br />
affirmar ser sempre possivel e sempre utilissima a implantação do seu<br />
mechanismo na socie<strong>da</strong><strong>de</strong> nativa.<br />
Saiba quem administra achar a exacta solução local <strong>da</strong> formula mu-<br />
tualista, que o progresso e o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>da</strong> instituiçtto surgir50 es-<br />
pontaneamente a concluir a obra do legislador. Fugir acima <strong>de</strong> tudo á<br />
suggestão <strong>da</strong>s soliiç6es já conheci<strong>da</strong>s, e sacrificar todos os formalismos á<br />
mais ru<strong>de</strong> e intuitiva simplici<strong>da</strong><strong>de</strong>, <strong>de</strong>ve primar como systema, para os que<br />
se applicam a modificar quaesquer instituiçóes indigenas, ou preten<strong>de</strong>m<br />
implantar innnvaçóes que a prática aconselha, ou a theoria justifica.
484<br />
POLITICA INDIGENA<br />
- -- -- . - - 1 -- - - - -<br />
Assistencia Publica e Medica<br />
I? um facto incontestavel a diminuiçáo rapi<strong>da</strong>, em muitas colonias,<br />
<strong>da</strong>s raças indigenas sujeitas á influencia colonisadora. Es,se lamentavel<br />
<strong>de</strong>crescimo tem sido attribuido :I duas causas dist,inctas.<br />
Para iins, é consequencia pura e simples <strong>da</strong> selecçHo natural; as<br />
raças antochtones, sob o <strong>de</strong>terminismo <strong>da</strong> siia supposta inferiori<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />
succumbem no strwggl~<br />
,for Zqe perante a vitali<strong>da</strong><strong>de</strong> ethriica c social dos<br />
dominadoreu.<br />
Para oiitros, a origem d'esse mal está na violencia cios agentes pa-<br />
thogenicos irriportados pela raqa dominante, e lia predisposiqão para o<br />
aggravamento <strong>da</strong>s en<strong>de</strong>mo-epi<strong>de</strong>mias loc-acs, provoca<strong>da</strong> por certos regimens<br />
exhaustivos cle trabalho indigena, como, por exciriplo, o dos carregadores,<br />
que em tão subido grau concorre para dizimar effectivo.; popiilosos c arra-<br />
zar constituiçóes robustas.<br />
Contra a opiniao dos primeiros, levanta-se o exemplo tla rohubtt.z e<br />
rapi<strong>da</strong> miiltiplicac;#o dos negros norte-americanos qiie rrio levando <strong>de</strong><br />
venci<strong>da</strong> no progresso <strong>de</strong>rnographico os seus compatriotas brancos dos Estados<br />
Unidos do Sul. Evi<strong>de</strong>ntemente, a selecção natural presi<strong>de</strong> sempre á elimi-<br />
nação oii á rnultip1icac;ão dos seres organisados, do mesmo modo que, em<br />
ca<strong>da</strong> individuo, vae atrophianifo os orggos improprios itu necessitla<strong>de</strong>s <strong>da</strong><br />
especie ou ina<strong>da</strong>ptaveis ao meio.<br />
Isso ligo quer, porém, dizer que a causa do <strong>de</strong>sapparecimento dos<br />
indigenas seja, em qualquer hypothcse, a inferiori<strong>da</strong><strong>de</strong> racial. Se assim<br />
succe<strong>de</strong>s~e<br />
ter-se-hia <strong>de</strong> concluir que os I)rancos <strong>da</strong>s Antillias ciijo numero<br />
diminue sensivelmente, pertencem a uma raça inferior ás rapas negra e<br />
mestiça que n'algurnas locali<strong>da</strong><strong>de</strong>s supplnntaram em numero e riqueza o<br />
elemento caucasico.<br />
Se do contagio <strong>da</strong>s raças dominadora e autochtone muitas vezes<br />
resulta o <strong>de</strong>sapparecimentc, ou pelo menos a rapi<strong>da</strong> <strong>de</strong>generescencia d'esta
- - - - - - - - - - -<br />
ASSISTENCIA<br />
- -<br />
ultima, não prQcuremOS enganar-nos a nós proprios fabric,anc]o inferiod-<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong>s anthr~~ologicas ou tleficienciau intellectuaes. . . A vercldJe, CS~~n(~e<br />
ver<strong>da</strong><strong>de</strong> é que os colonisadores raras vezes coram <strong>de</strong> educar, instriiir e<br />
proteger os indigen~s por espirito <strong>de</strong> altriiismo piiro e em beneficio exclusivo<br />
dos protegidos.<br />
A ten<strong>de</strong>ncia litilitaria <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a expansáo colonial relega para<br />
segundo plano o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> civilisar. O indigena é aproveitado como carre-<br />
gador, mineiro, trabalhador rural ou domestico, e sol<strong>da</strong>do colonial. Em<br />
militas colonias obe<strong>de</strong>ce-se apenas 6 iirgencia do interesse momentaneo, sem<br />
cui<strong>da</strong>r <strong>da</strong>s consequencias futuras. Em vez <strong>de</strong> escolas abrem-se cantinas,<br />
em vez <strong>de</strong> asylos e hospitaes edificani-se casernas, e em vez <strong>de</strong> oficinas<br />
prnfiqsionaes estabelecem-se agencias <strong>de</strong> emigraçáo.<br />
X civilisaçáo, abrindo novos horizontes intellectuaes, creando neces-<br />
si<strong>da</strong><strong>de</strong>s crescsnte's e habitos novos, arrasta comsigo uma transformaqáo<br />
radicttl dos costumes indigenas, até d'aquelles que mais directamente se<br />
reflectem na economia animal como o trabalho e a aliinentaçáo.<br />
Directa ou indirectamente introduzi<strong>da</strong>, o que é certo, 6 que a modi-<br />
ficação <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> individiial e social nos niicleos indigenas <strong>da</strong>s colonias <strong>de</strong><br />
povoamento ou mixtas, é sempre importantissima, ain<strong>da</strong> quando se man-<br />
tem mais rigorosamente o acatamento <strong>da</strong>s instituiçíies locaes.<br />
N'estas circumstancias, logo que a intensi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> indigena ten<strong>de</strong><br />
a augmentar, e a aproximar-se, mesmo <strong>de</strong> longe, <strong>da</strong> craveira civilisa<strong>da</strong>,<br />
evi<strong>de</strong>nceia-se a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> fornecer aos naturaes meios <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r resis-<br />
tir e Iiictar, sob os pontos <strong>de</strong> vista economico, intellectiial e physiologico<br />
contra as difficul<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> civilisa<strong>da</strong>.<br />
Se assim se não proce<strong>de</strong>r, é claro que entre os colonisadores instrui-<br />
dos, economicamente organisados, e physicamente protegidos pelo bem estar,<br />
pela hygiene e pela assistencia, e a popiilaçáo indigena <strong>de</strong>seduca<strong>da</strong> e <strong>de</strong>s-<br />
protegi<strong>da</strong>, a <strong>de</strong>segiial<strong>da</strong><strong>de</strong> 6 manifesta e a competencia social traduzir-se-ha<br />
infallivelmente pela <strong>de</strong>rrota do mais fraco.<br />
Além <strong>da</strong> fraqueza ingenita dcs individuos e dos superorganismos indi-<br />
geiias difficultar qualquer tentativa efficae <strong>de</strong> resistencia á intensi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong><br />
mo<strong>de</strong>rna vi<strong>da</strong> civilisa<strong>da</strong> que exige um combustivel <strong>de</strong> energias quasi inex-<br />
-<br />
485
f86- POLITICA INDIGEXA<br />
gotavel, outros factores concorrem ain<strong>da</strong> para o <strong>de</strong>pauperamento rapido<br />
do elemento aiitochtone.<br />
Entre elles avulta o alcool amo, n ppior <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s (rs c7rrIr11,;rrs ,,/ri-<br />
i<br />
canos.<br />
Em nome <strong>da</strong> moral, em nome <strong>da</strong> civilisa( 20. t. em nome do proprio<br />
futuro economico <strong>da</strong>s colonias tropicaes que niii!ca:i ~,ocleráo prescindir <strong>da</strong><br />
rnso d'obríl indigena, 6 indii.pens:i~i,l que as l~olc.nt>i:is coloniaes adoptem<br />
to<strong>da</strong>s as medi<strong>da</strong>s repressivas qiie se tornarem iic~c,c>,.:iri:t\ á ~ererissima<br />
limitaçgo i10 consumo dos inebriante~.<br />
Em geral, náo 4 <strong>da</strong>s 1)cliiclas fermenta<strong>da</strong>s que os iridigenas em to<strong>da</strong>s<br />
as epochas localmente fabricaram, que proveem os maiores males.<br />
Os alcooes indiistriaes e as mixordias venenosa$, como o celebre vinho<br />
tJe iwefo, fabricado no 1'090 do Bispo e consumido na nosq:l Africa, 6 que<br />
teem mais nefastas conseqiiencias. D'esse cummercio criminoso resulta a<br />
progressiva intoxicação dos negros africanos, sem os quaes niinca po<strong>de</strong>r&<br />
haver emprezas coloriiaes nos tropicos, e que, mesmo postas tle parto quaesquer<br />
consi<strong>de</strong>raçóe~ <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m econ mica, teem afinal tanto direito como os<br />
'P<br />
colonisadores a verem respeita<strong>da</strong>3 /a sau<strong>de</strong> e a existenria.<br />
A fim <strong>de</strong> preparar os in~ligenas para a concorrencia social com os<br />
europeus 4 preciso assegurar por varios modos a cfficacia <strong>da</strong> protecçáo. h<br />
par do alcoolismo. oiitros vicios c ropeus conseguem com facili<strong>da</strong><strong>de</strong> impregnar<br />
os costi~iiic~s intligenas. Cont estes <strong>de</strong>ve ser especialrnrrite orienta<strong>da</strong><br />
1<br />
a propagand:) etliieativ:t.<br />
Em vista <strong>da</strong> imprcvidt~nci:i iliiusi gflrxl 110s indigenas, pertcnce tambem<br />
aos dominadores organiuar o creclito a nshoci;ic;río segunclu as formulas<br />
que <strong>de</strong>lineánios. Como garantitis <strong>de</strong> progresso economico, 4 forçoso con>oli<strong>da</strong>r<br />
o regimrn <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> c, drsenvolver, acima <strong>de</strong> tudo, o liabito <strong>de</strong><br />
trabalhar, garantindo cui<strong>da</strong>dos;iinente o s:ilari:irlo contra as exigencias<br />
abilsivas dos colonos. Para assegurar a integriclx<strong>de</strong> <strong>da</strong> organisac;áo social<br />
dos indigenas, impõe-se, finalmente, a creac;Go i10 ~statuto civil proprio e <strong>da</strong><br />
especialisaçiXo jiiridica c politica que <strong>de</strong>senvolvi<strong>da</strong>mente estudRmos.<br />
Tsto representa muito, mas ain<strong>da</strong> náo E tiido.<br />
Outras cansas ha, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes <strong>da</strong> influencia <strong>da</strong> colonisa~ão, qiie fa-
zem egualmente sentir os seus <strong>de</strong>sastrosos effeitos na
488 POLITICA INDIGENA<br />
-- -- ---- - -- --<br />
Um processo hygienico que tem produzido 09 melhores resnltados na<br />
prática colonial, revertendo em notorio beneficio <strong>da</strong> saii<strong>de</strong> piiblica tanto<br />
dos eiiropens como dos indigenas, 6 o dos fornos crematorios que ultima-<br />
mente se teem generalisaclo liastante na maioria <strong>da</strong>s colonias. As vanta-<br />
gens do seu emprego fazem <strong>de</strong>sejar a siia applicaçáo intensiva em todos os<br />
centros indigenas popillosos on<strong>de</strong> o sei1 estabelecimcrito t.: facil e os seus<br />
beneficios serão rapi<strong>da</strong>mente comprehendidos.<br />
Nas colonias africanas iiuo existem em regra, gran<strong>de</strong>s agrupamentos<br />
indigenas. Estes, ou resi<strong>de</strong>m nas povoaçúes habita<strong>da</strong>s pelos colonos, oti se<br />
encontram mais ou menos disseminados por todo o territorio. No primeiro<br />
caso, as medi<strong>da</strong>s hygienicas e prophylaticas adopta<strong>da</strong>s em proveito dos colo-<br />
nos, beneficiarfio tambem os naturaes. No segundo caso, que é regra nas<br />
colonias tropicaes, os preceitos Iiygienicns individuaes só muito lentamente<br />
trespassarílo a coiiraya <strong>da</strong> ignorancia indigena, e os servigos <strong>de</strong> hygiene<br />
publica só po<strong>de</strong>rão existir (liiando a concentraç30 <strong>da</strong>s massas populares,<br />
pelo al<strong>de</strong>iamento livre oii imposfto e pela emigraçHo rustico-urbana, for<br />
uma realidudc palpavel. Até esse momento, o combate contra os virus <strong>da</strong><br />
pathologia exotica, não po<strong>de</strong>ndo basear-se nas generali<strong>da</strong><strong>de</strong>s hygienicas,<br />
tem <strong>de</strong> se limitar á particu1arisac;ão dos processos prophylaticos, consoante<br />
a natureza do agente pathogenico que convier <strong>de</strong>struir.<br />
Contra o impaludismo o colono aproveita o mosquiteiro que o preserva<br />
<strong>da</strong> inociilaçáo, mas o indigena, cujas condiçóes <strong>de</strong> vi<strong>da</strong> são tão differentes,<br />
só pó<strong>de</strong> escapar á molestia pela <strong>de</strong>struição directa do anopheles<br />
transmissor.<br />
O brilhantissimo resultado do emprego do petroleo pelas aiictori<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
sanitarias <strong>da</strong> Havana e do Rio <strong>de</strong> .Janeiro na lilcta contra o Steyomyin<br />
fascista, propagndor <strong>da</strong> febre amarella, <strong>de</strong>ve servir <strong>de</strong> incclntivo po<strong>de</strong>roso<br />
ás naçúes coloniaes para a adopcáo <strong>de</strong> medi<strong>da</strong>s i<strong>de</strong>nticas que vão limitando<br />
ca<strong>da</strong> vez mais a extensão e a virulencia d'esse outro flagello exotico, a<br />
infecção paliistre.<br />
O quinina, tanto em dose curativa como proph';latica, é muito bem<br />
acceite pelos indigenas ; entre africanos é a ~n<strong>da</strong>hltn dr hrtrnco mais altamente<br />
aprecia<strong>da</strong>.
LI variola 6 talvez o principal flagello <strong>da</strong> cnntincritt. ii+,
I<br />
490 j POLITICA INDIGENA<br />
I<br />
2.' O laboratorio vaccinogenico <strong>de</strong>ve ser in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte e isolado do<br />
laboratorio bactereologico ;<br />
3.0 A vaccinaçáo movel <strong>de</strong>ve ser pratica<strong>da</strong> <strong>de</strong> preferencia durante<br />
a estaçáo sêcca e interrompi<strong>da</strong> durante o inverno ;<br />
4.0 O serviço medico <strong>de</strong> vaccina(;áo movel <strong>de</strong>ve ser distincto do ser-<br />
viço ordinario <strong>de</strong> assistencia medica estabelecido na colonia.<br />
A vaccinaçáo é a mais importante <strong>da</strong>s medid:is <strong>de</strong> preservaçáo social<br />
immediatamente applicaveis aos indigenas, e a sua influencia acceleradora<br />
do inovimento ascensional <strong>da</strong> pol~ulação não tar<strong>da</strong> em manifestar-se cla-<br />
ramente. (I)<br />
A lepra, que B en<strong>de</strong>mica na Asia tropical e que tem feito gran<strong>de</strong>s<br />
estragos em algumas regióes <strong>da</strong> Africa e <strong>da</strong> America, cr:t <strong>de</strong>sconheci<strong>da</strong> atc<br />
ha sessenta annos na Oceania, on<strong>de</strong> <strong>de</strong>s<strong>de</strong> essa época se tem <strong>de</strong>senvolvido<br />
largamente.<br />
A populaçáo canaca <strong>da</strong> Nuva Caleclonia está sendo dizima<strong>da</strong> por essa<br />
terrivel enfermi<strong>da</strong><strong>de</strong>. E hoje um facto <strong>de</strong>monstrado a sua propagaçáo ~iclo<br />
contagio, po<strong>de</strong>ndo ser contaminados Canto indigrnas como europeus. I'--,<br />
contagiosi<strong>da</strong><strong>de</strong> foi durante muito tempo posta em duvi<strong>da</strong>, mesmo por i<br />
cos experientes, e lioje, que ninguem a contesta, é-lhe entretanto recíli 1<br />
cido um caracter <strong>de</strong> extrema lentidáo, e uma diminuta virulencia microl)<br />
que permitte, muitas vezes, ficarem immunes individiios sujeitos a uui<br />
tagio infeccioso muito prolongado.<br />
Contra a lepra, a therapeutica individiial po<strong>de</strong> :iconselhar trataii<br />
tos diversos, mas a prophylaxia social imph uma nnica medi<strong>da</strong>, o in* I<br />
namento. Na Europa 6 facil concentrar os leprosos no perimetro
ASSISTENCIA 09 1<br />
-- -- --<br />
social, parece-me possivel applicar aos indigenas o r~gimen <strong>de</strong> internamphto<br />
em gafarias <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> perimetro rural que constituam um ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro do-<br />
minio territorial para os doentt>s.<br />
O int,ernamento sd seria, comtiido, obrigatorio na esIllicr:t <strong>da</strong> coloni-<br />
saçáo europeia e s6mente com prece<strong>de</strong>ncia <strong>da</strong> dcciar:~çHo mctlica <strong>de</strong> haver<br />
perigo para a visinhança do leproso, em razilo rlo carnct,er adiantado<br />
<strong>da</strong>s suas Iesóes. Em outros termos, o internarnento ,iao seria justificado<br />
apenas pelo diagnostico <strong>da</strong> lepra, mas sim pela gravi<strong>da</strong><strong>de</strong> do c:iso observado<br />
B .<br />
O cholera na Asia, a doença do somno c?rn .Ifrica, :i l)e.~te I~iiboni~a<br />
em ambos os continentes, 950 tambem origem <strong>de</strong> parorosas (levristaqões<br />
nas raças indigenas. A pr~plr;r.l;~xi;i do cholera, para sc2r c~nicaz, exige reclirsos<br />
e coniliyóes <strong>de</strong> existt!ncia que, sd por excejlygo, se realisam nas<br />
socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s nativas. 1: PPS:I :t c:t~l~~ <strong>da</strong> eleva<strong>da</strong> mortali<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena nas<br />
on<strong>de</strong> grassam epi<strong>de</strong>mi~is rlc cliolera.<br />
Contra a peste bubonica, quando acci<strong>de</strong>ntal, (: possivei luctar pela<br />
<strong>de</strong>sratisaçáo, isolamento, c pelas inocula~.õcs <strong>de</strong> soro. O serii~o move1 <strong>de</strong><br />
injecqóes Iersin. estabelecido durante algixm t,empo n'algiinias regióes <strong>da</strong><br />
Zambezia a fim <strong>de</strong> tratar os indigenas <strong>da</strong> peste (lu(: ayipiirctbrr.:t i105 arre-<br />
(Iores do Chiri<strong>de</strong>, c: as rigorosas tlc.sirifi~c~~;fic:: n qiie H(: procetlcu, extingui-<br />
ram rapi<strong>da</strong>mente o foco epitleniicu.<br />
Com rclaç%o :i doença do somno, para nFto fallar do beri-lleri, a propliylaxia<br />
é por emc~iiarit,~ <strong>de</strong>sconheci<strong>da</strong>. Embora o seu veliiciilo 1)iLreya ser<br />
apenas a tsA-ta;, é i!di%cil evitar a inoculaq&o do virus, tL cstA aiiitla por<br />
<strong>de</strong>scobrir o respectivo agente immnnisador.<br />
Exactamente porqrre a liygiene e a prophylnxia <strong>de</strong>ixcini rircessaria-<br />
mente muito a <strong>de</strong>sejar nos agrupamentos indigenas, é qiie sc t.orn:i impor-<br />
tante e urgente organisar os serviços <strong>de</strong> assistencia metlicti. Esta, como<br />
em to<strong>da</strong> a parte, reveste as fórmas <strong>de</strong> assistcncia aos tlornicilios e assis-<br />
tencia hospitalar.<br />
Nas colonias predomina naturalmente a Ii«spitalisa(;2o. As vantagens<br />
mais que prova<strong>da</strong>s do tratamento medico no domicilio dos enfermos, não<br />
bastam para o seu estabelecimento. A estreiteza dos quadros do funccio-
492 POLITICA IXDTGENA<br />
- - - - - - .- -- - - - - - --<br />
nalismo medico nas colonias, e a preferencia accentua<strong>da</strong> dos indigenas pelos<br />
seus curan<strong>de</strong>iros, são obstac~ilos difficeis <strong>de</strong> transpor.<br />
O pequeno numero <strong>de</strong> iiictlicos dos qiiadros coloniaes 6, em especial,<br />
limitadissinio nas colonias portiigiiezas. Em Angola, por exen~plo. para<br />
uma popiilac;%o <strong>de</strong> alguns milhoes <strong>de</strong> habitantes, existem apenas vinte e<br />
cinco medicos! Isto t! mais tlo qiic incuria, (i uma vergonha que nos <strong>de</strong>s-<br />
acredita perante o niundo civilisado. Por maiores que sejam a competen-<br />
cia profissional e a <strong>de</strong>dicaviio pelo serviço que aqiielles funccionarios<br />
revelem, é evi<strong>de</strong>nte que os seus mais prestantes esforços nunca consegui-<br />
rão evitar que a quasi totali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> populaçáo indigena permaneça pri-<br />
va<strong>da</strong> dos mais elementares soccorros medicos.<br />
A gssistencia medica aos inctigenas nas gran<strong>de</strong>s colonias portugiiezas<br />
qiiasi náo existe.<br />
I\ triste dizê-lo, mas B preciso publick-lo para que provi<strong>de</strong>nceie quem<br />
nas colonias administra c quem na metropole 1egisl;i.<br />
Olhemos o exemplo que a Lranva nos esta, <strong>da</strong>ndo, com a creaçiio <strong>da</strong>s<br />
mo<strong>de</strong>lares instituiçóes (te assisteincia medica, ultimamente introdiizi<strong>da</strong>s nas<br />
suas colonias mais importantes, sigamos-lhe o exemplo, <strong>de</strong>ntro dos limites<br />
pouco elesticos dos nossos recudos financeiros.<br />
l? dlaro que niio t'! possivel alargar in<strong>de</strong>fini<strong>da</strong>mente os quadros medico~,<br />
porque isso iria onerar consi<strong>de</strong>ravelmente os orçamentos <strong>da</strong>s colonias,<br />
mas, entre a extrema escassez actual e o que, sem sacrificio, seria possivel<br />
fazer-se, ha margem para gran<strong>de</strong> melhoramento.<br />
Na nossa <strong>de</strong>sauctorisa<strong>da</strong> opiniáo, o que, antes <strong>de</strong> tudo, convem estabelecer,<br />
siio os cursos <strong>de</strong> enfermeiros indigenas. Aproveitando os indigenas<br />
mais intelligentes, podia crear-se um corpo <strong>de</strong> enfermeiros que prestaria<br />
inestimaveis serviços. Espalhados pelo aertáo, iriam levar (i maioria <strong>da</strong><br />
população os principios mais indispensaveis <strong>de</strong> hygiene, e to<strong>da</strong>s as medi<strong>da</strong>s<br />
prophylaticas ou soccorros medicos que, na falta <strong>de</strong> medico europeu, seriam<br />
auctorisados a prestar. Ensinando-os a vaccinar, a collocar to<strong>da</strong> a<br />
especie <strong>de</strong> pensos, e titi! mesmo a conhecer e a iitilisar um resumido receituario<br />
previamente estu<strong>da</strong>do por fórma a correspon<strong>de</strong>r ás doenças mais<br />
vulgares em ca<strong>da</strong> colonia, obrigando-os a tirocinar, por um periodo mais
ou menos longo, nas enfermarias dos lio+~~it;ie*. ou f(;rct ti'tt,;ds illas bob a<br />
direcçáo dos rnedicos europeus, obter-se-liiam escellentes auxiliares para<br />
organisar proficuamerite a assistencia medica aos indigenas em to<strong>da</strong> a colonia.<br />
Entre as inriumeras vantagens que adviriam <strong>da</strong> formaq80 dleste<br />
pessoal, resaltam duas mais importantes. Em primeiro logar, a remunera-<br />
çáo d'estes mo<strong>de</strong>stos funccionarios podia ser bastante limita<strong>da</strong>, e com<br />
poiico dinheiro - o que para nús 6 essencial -- ter se-liia conseguido orga-<br />
sar praticamentc iini serviço primitivo mas eficlax <strong>de</strong> assistencia medica<br />
incligena.<br />
Em wgiindo logar, a circunistancia do? enfermeiros serem indigenas,<br />
torna-los liia !,em acceites pelas poprr1açóes 'mais atrazadss do interior e<br />
os heiis remedios c consrllhos seriam recebidos sem <strong>de</strong>sconfianc;a. Em vez<br />
clo curan<strong>de</strong>iro primitivo, que 1lie.- fazia ingerir drogas atrozes, que os ex-<br />
plorava, e que afinal lhes nHo curava o mal, teriam outro curan<strong>de</strong>iro que<br />
os não roubava, e cujas rnezi~~l~~zs<br />
bemfazqjas lhes alliviariam os soifrimentos.<br />
E evi<strong>de</strong>nte que esta mu<strong>da</strong>nça para melhor firmaria soli<strong>da</strong>mente a<br />
reputação d'aquelles fiinccionarios, e representaria um gran<strong>de</strong> passo <strong>da</strong>do,<br />
no caminho do melhoramento <strong>da</strong> condi~%o<br />
material dos indigenas.<br />
l? inutil encarecer OS servi9os qile estes enfermeiros potliarn <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />
jA prestar na lucta contra a variola, o impaludismo, a dysenteiia, as pneu-<br />
~nonias, a syphilis, etc. E se amanli8 algum bactereologista <strong>de</strong>scobrisse o<br />
soro lnngamente immunisador <strong>da</strong> terrivel cephalalgia trypanosomica, que<br />
t&o consi<strong>de</strong>raveis estragos está caiisantlo nas populações africanas, esse<br />
mesmo pessoal medico-auxiliar se encarregaria <strong>de</strong> generalisar rapi<strong>da</strong>mente<br />
o tratamento preventivo á gran<strong>de</strong> massa <strong>da</strong> populaçáo.<br />
Na organisaçáo do3 ciii-sos <strong>de</strong>ver-se-ha fugir cui<strong>da</strong>dosamente a theo-<br />
rias iniiteis e a complicacóeu c~~cusa<strong>da</strong>s.<br />
Na<strong>da</strong> <strong>de</strong> psroltcs t)l~tlic.ns. Na<strong>da</strong> <strong>de</strong><br />
aulas. Prática, prBtica e niiiis prática. aoompanlia<strong>da</strong> apenas <strong>da</strong>s explicaçóes<br />
e ensinamentos <strong>da</strong>dos pelos medicos europeus, sob a ftirma mais comprehensi-<br />
vel e apropria<strong>da</strong> ao intellecto <strong>da</strong> raça <strong>de</strong> que se tratar. Nas colonias portu-<br />
guezas não faltam hospitaes on<strong>de</strong> esse ensino po<strong>de</strong> ser ministrado. E mesmo<br />
costume nosso cui<strong>da</strong>r mais <strong>da</strong> hospitalisaqáo do que do saneamento. Em<br />
Loan<strong>da</strong> temos ha annos um hospital colonial ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iramente mo<strong>de</strong>lar,
'4W POLITICA INDIGENA<br />
emquanto que, para se realisarern 114 rn~rlid~~ ao ~~n~nmento mais indk-<br />
pensaveis, s6 ha poucos dias foi concedi<strong>da</strong> a necessaria auctorisaçáo para<br />
0 respectivo emprestimo municipal.<br />
E:, como Loan<strong>da</strong>, muitas locali<strong>da</strong><strong>de</strong>s ha nas colonias portuguezas, on<strong>de</strong><br />
existem hospitaes admirados ate por medic~os estrangeiros, e on<strong>de</strong> se po<strong>de</strong><br />
affirmar que tiido estA por fazer sob ob por~tos <strong>de</strong> vista <strong>da</strong> hygiene publica<br />
e <strong>de</strong> assistencia iiidigena.<br />
A instituiçáo do corpo mctlico-auxiliar, composto tle indigenas, <strong>da</strong>ria<br />
principalmente resultados rapidoi c t,rilliariteu ern Cabo Ver<strong>de</strong> e na India.<br />
on<strong>de</strong> a intelligencia dos naturaes facilitaria notavelmente a sua organisação.<br />
Em qualquer colonia, porém, seria realisavel e, o que é mais, realisavel<br />
com um encargo financeiro muito reduzido. As <strong>de</strong>spezas a crear serviriam<br />
para gratificaçúes aos medicas europeus, encarregados dos cursos, e<br />
para remiiiierar OS serviços (10s fl~turos enfermeiro9 que, attentas as pequenas<br />
necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s indigenas, náo cnstariam muito caros. As gratificaçóes ao<br />
pessoal medico, prefeririamos que constituissem uma verlia global posta á<br />
disposição dos governadores que, por iniciativa propria, ou segilndo as indicaçóes<br />
dos chefes <strong>de</strong> sau<strong>de</strong>, a repartiriam pelos medicou instructores.<br />
proporcionalmente aos serviços resta dos. On<strong>de</strong> ha vercla<strong>de</strong>ira <strong>de</strong>dicação<br />
pelo serviço, a gratificaçáo pouco influe, e on<strong>de</strong> aqiiella niio existe, B incentivo<br />
mais po<strong>de</strong>roso o <strong>de</strong>sqjo dc ganhar muito, do que a certeza d'um provento<br />
fixo.<br />
esta, <strong>de</strong> resto, a orientacão que os inglezes, os gran<strong>de</strong>s mestres <strong>da</strong><br />
colonisação, seguem quasi invariavelmente em materia <strong>de</strong> gratificaçóes ex-<br />
traordinarias aos funccionarios cdloniaes.<br />
O alargamento do quadro dos medicos europeus, impõe-se tambem<br />
com impreterivel iirgencia. E <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> subdividir as gran<strong>de</strong>s<br />
circumscripçóes <strong>de</strong> serviço medico. Em ca<strong>da</strong> commando militar <strong>de</strong> official,<br />
<strong>de</strong>veria ser creado um posto medico, encarregado do serviço directo<br />
n'uma certa área limita<strong>da</strong>, e <strong>da</strong> fiscalisaçáo do serviço dos enfermeiros in-<br />
digenas espalhados por todo o territorio <strong>da</strong> divisão militar ou adrninistra-<br />
tiva. A cargo d'estes, po<strong>de</strong>riam <strong>de</strong>ixar-se pequenas e rudimentares enfer-
ASSISTENCIA 495<br />
marias que, pelo menos, proporcionassem aos doentes completo abrigo e<br />
relativo conforto.<br />
Estas enfermarias vinham preencher uma importante lacuna. As<br />
enfermarias indigenas dos nossos hospitaes dos principaes centros coloniaes<br />
seriam <strong>de</strong> todo o ponto insiifficientes, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que se pensasse em organisar<br />
efficazmente a assistencia e a hospitalisação indigena.<br />
Um dos problemas <strong>da</strong> assistencia medica aos indigenas que carece <strong>de</strong><br />
mais prompta resoluçáo é o <strong>da</strong> assistencia obstetrica e infttntil.<br />
A temerosa e <strong>de</strong>sanimadora mortali<strong>da</strong><strong>de</strong> dos recemnascidos e <strong>da</strong>s<br />
creanças é o mais serio obstaculo á progressáo <strong>de</strong>mographica do elemento<br />
nativo. Nas colonias francezas tem-se procnrado remediar esse mal, com a<br />
creaçko <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> parteiras, e com o estabelecimento <strong>de</strong> materni<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />
Estas instituições teem sido coroa<strong>da</strong>s do maior exito, principalmente na<br />
Indo-China e em Ma<strong>da</strong>gascar, on<strong>de</strong> os beneficios resultantes <strong>da</strong> sua implan-<br />
tação teem excedido to<strong>da</strong> a expectativa.<br />
Na India e em Cabo Ver<strong>de</strong> seriam, por certo, facilmente acclimata-<br />
veis e, estamos convencidos, que tambem o exito alli compensaria a inicia-<br />
tiva do seu estabelecimento.<br />
Em materia <strong>de</strong> assistencia indigena, E pois vasto o campo que ha a<br />
percorrer nas colonias portuguezas, para se attingir uma organisação<br />
acceitavel.<br />
Comtudo, se nos lembrarmos que to<strong>da</strong>s as futuras possibili<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
economicas e politicas <strong>da</strong>s colonias inter-tropicaes estão <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes <strong>da</strong><br />
existencia d'uma indigena <strong>de</strong>nsa e trabalhadora, talvez nos resol-<br />
vamos a realisar por interesse o que nTio fazemos por simples altruismo.<br />
Seja qual for a causa <strong>de</strong>terminativa do progresso a alcançar, o que B<br />
indispensavel é cui<strong>da</strong>r, quanto antes, e com a maior attençáo, <strong>de</strong> generalisar<br />
nos dominios ultramarinos portuguezes, serviços <strong>de</strong> assistencia e hospita-<br />
lisaçáo indigena que correspon<strong>da</strong>m, na medi<strong>da</strong> do possivel, ás necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
mais urgentes.<br />
Demais, nem mesmo carecemos <strong>de</strong> ir buscar a casa estranha exem-<br />
plos <strong>de</strong> conducta. Siga o Governo Portuguez, siga a administraç50 <strong>da</strong>s<br />
colonias, no caminho trilhado pelos opulentos plantadores <strong>de</strong> S. Thom6 e
POLITICA INDIOENA<br />
procurem imitar os hospitaes iniiigenas creados nas roças, tão primorosf-.<br />
mente rrioiitados e tao intelligentclmente concebido^.<br />
Se rias outras colonins a. iniciativa <strong>da</strong> administração tem fa1t:tdo<br />
maioria <strong>da</strong>. popillaçáo nativa com os soccorros medicos mais elementares<br />
em S. 'I'liomP, pelo contrario, u iniciativa particiilar tem creado n'ess -<br />
sentido institiltos mo<strong>de</strong>lares.<br />
Como medi<strong>da</strong>s <strong>de</strong> caracter provisorio, mas <strong>de</strong>stina<strong>da</strong>s a melhorar<br />
sensivelmente a sitiiaçáo actual, julgamos, pois, ser indispensavcl o ai1<br />
gmento do funccionalismo medico, a creaçáo do corpo indigena medico-aiixiliar,<br />
e a multiplicaç~o <strong>de</strong> peqiierias e mo<strong>de</strong>stas c~nfermarias indigerins ntir<br />
al<strong>de</strong>ias mais populosn~.<br />
Com certeza não temos a pretençáo <strong>de</strong> affirmar qiie o problema <strong>de</strong><br />
assistencict indigena fica assitil resolvido por iim:t f\írina <strong>de</strong>finitiva, mas,<br />
entretanto, é bastante prorarel que, com a adopçiio d'aqiiellas medi<strong>da</strong>s,<br />
no que ellaq possam ter tle a~roveitavel, se viesse a alcançar lima gran<strong>de</strong><br />
diminuiç'o <strong>da</strong> morbili<strong>da</strong><strong>de</strong> e mortgli<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena.<br />
9<br />
I \
CAY II'LT1,O IS<br />
UTILISAÇÃO DOS IN1)IGEXAS NA DEFEZA<br />
E POLICIA DAS COLONIAS<br />
---- --t -.<br />
Papel dos indigetias na <strong>de</strong>feza <strong>da</strong>s colonias.<br />
Composição <strong>da</strong>s giiarniçóes <strong>da</strong> marinha colonial.<br />
lJolicia indigena.<br />
Utilisação <strong>da</strong>s tropas indigenas fóra <strong>da</strong>s respectivas<br />
colonias.
CAPITULO IX<br />
Papel dos indigenas na <strong>de</strong>feza <strong>da</strong>s colonias<br />
A expansfio militar nas colonias e a manutenção <strong>da</strong> or<strong>de</strong>m nos territorios<br />
occupados, raramente se ~o<strong>de</strong>m effectuar sem a cooperação <strong>de</strong><br />
elementos indigenas. D'abi resulta a eleva<strong>da</strong> percentagem por que são representados<br />
na coimposiçáo dos corpos <strong>de</strong> occiipaçáo, <strong>de</strong>feza e policia, os<br />
mturaes <strong>de</strong> quasi to<strong>da</strong>s as colonia~. Durante as operaçóes militares <strong>da</strong><br />
conquista e occupacfio, iitilisam-se as rivali<strong>da</strong><strong>de</strong>s entre as tribiis, oii entre<br />
raças ou castas, para obter auxiliares aguerridos e conhecedores do terreno,<br />
obrigam-se as populaçóes inermes ao serviço <strong>de</strong> transportes, abastecimentos,<br />
etc., compra-se a neutrali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> uns, lisonjeia-se a arnbiçáo <strong>de</strong> outros,<br />
em resumo. divi<strong>de</strong>-se para reinar.<br />
Embora antes <strong>da</strong> pacifica(;go <strong>da</strong> colonia os effectivos militares <strong>de</strong>vam<br />
ser essencialmente constituidos por sol<strong>da</strong>dos vindos <strong>da</strong> metropole, é certo<br />
tambem qne, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> principio, os indigenas prestam excellentes serviços<br />
como exploradores, carregadores, interpretes e, principalmente, como emeritos<br />
razziadores, o que não é para <strong>de</strong>sprezar em guerras africanas, on<strong>de</strong><br />
a razziii, digam os humanitaristas o que disserem, Q muitas vezes uma necessi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
impreterivel para se po<strong>de</strong>r vencer. 0s inglezes na India, os francezes<br />
na Indo-China e no norte d'Africa, e to<strong>da</strong>s as naçóes nas suas colonias<br />
intertropicaes teem utilisado largamente o elemento indigena nas<br />
operaçóes <strong>da</strong> occupação. De entre as mo<strong>de</strong>rnas naçóes colonisadoras, Portugal<br />
foi a primeira que tirou vantagens notaveis do auxilio militar prestado<br />
pelos indigenas. Na conquista <strong>de</strong> Gôa e em tantos outros brilhantis-<br />
O
500 POLITICA INDIGENA<br />
-a---- - - - - - - - -<br />
simos feitos, Affonso <strong>de</strong> Albuquerque <strong>de</strong>rrotou os dominadores miisulmanos<br />
.com o auxilio do elemento hindíi, e aproveitou sempre habilmente as riva-<br />
li<strong>da</strong><strong>de</strong>s entre os principes indios.<br />
Nos presidios marroq~iinos, n'essa admiravel escola <strong>de</strong> gnerra on<strong>de</strong> a<br />
bravura indoinita <strong>da</strong> gente portugueza se altanou ao mais glorioso presti-<br />
gio, on<strong>de</strong> n heroici<strong>da</strong><strong>de</strong> e a resistencia iiidomavel dos cavalleiros luzitanos<br />
vacillaram amiu<strong>de</strong> entre o epico e o sublime, tambem a inexcedivel habili-<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> nossa raça para attrahir e conciliar as populaçóes indigenas con-<br />
seguiu vencer os escrupnlos patrioticos e religiosos e a valentia inegualavel<br />
dos berbéres fanaticos, levando-ou em gran<strong>de</strong> numero a pelejar nas nossas<br />
fileiras.<br />
Outro tarito não conseguia a Hespanha nos seus presidios do Slediterraneo.<br />
A extraordinaria coragem (10s seus sol<strong>da</strong>dos nunca foi ali acom-<br />
~anlia<strong>da</strong> do geito especial para tratar os indigenas, que 6 iim dos traços<br />
mais cnriosos e accentuados <strong>da</strong> colonisa~áo portugiieza.<br />
Em p~iz<br />
clesconhecido, propicio a cila<strong>da</strong>s t. embosca<strong>da</strong>s, sem pontos<br />
certos <strong>de</strong> abastecimento, sem vias <strong>de</strong> communica~Bo,<br />
c. perante a superiori-<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong> numerica dos indigenas sol)re os effectivos europeus <strong>de</strong> occupaç~o, I<br />
não B facil nem talvez possivel prescindir do cboiicnrso dos iiatnraes para<br />
se po<strong>de</strong>r levar a effeito a conqiiista. Nem d'oiitra fiirma sc proce<strong>de</strong>u na<br />
antigui<strong>da</strong><strong>de</strong> liistorica: na conquista <strong>da</strong>s (;allias as legi6cs <strong>de</strong> Cezar enqua-<br />
dravam largos contingentes gaulezes. Xas, náo se limita a esse periodo a<br />
vantagem que ha em ntilisar o indigena como sol<strong>da</strong>do. Pelo contrario,<br />
quando a occiipaçBo se estabelece em bases seguras, e á medi<strong>da</strong> que a<br />
pacificação do territorio se vae completaiido, mais necessario se torna o<br />
concurso militar dos autochtones, para siiflocar rebellióes possiveis e fazer<br />
a policia <strong>da</strong>s popiilaqões subrnetti<strong>da</strong>s, dc que elles, iiiellior que ningueiii,<br />
conhecem os usos e costumes.<br />
Nas regióes tropicaes, on<strong>de</strong> C impossivel manter gran<strong>de</strong>s effectivos<br />
europeiis, ain<strong>da</strong> o papel do exercito indigena mais sóbe cle inportancia.<br />
Com effeito, n'este caso, a gran<strong>de</strong> massa do exercito c~olonial. tlesti-<br />
na<strong>da</strong> não sd a reprimir as <strong>de</strong>sor<strong>de</strong>ns e revoltas internas, mas taml~em<br />
a<br />
supprir a to<strong>da</strong>s as cxigencias <strong>da</strong> <strong>de</strong>feza <strong>da</strong> colonia em qiialqiier conflicto
UTILISSQ~~O MILITAR<br />
Lii- -- 501<br />
- - .-<br />
internacional, tem necessariamente <strong>de</strong> ser co~istitiii<strong>da</strong> pelo elemento indi-<br />
gena enquadrado por officiaes europeus. Ha quem reprove uma utilisaçáo<br />
militar muito <strong>de</strong>senvolvi<strong>da</strong> do elemento indigena, com receio <strong>de</strong> revoltas<br />
militares. Não nos parecem niiiito fun<strong>da</strong>dos esses receios; a revolta, dos<br />
cypaios em 1857 na India Ingleza B um facto hiutorico isolado, e teve ori-<br />
gem no impru<strong>de</strong>nte <strong>de</strong>sprêzo com que os inglezes lhes <strong>de</strong>srespeitavam as<br />
mais sinceras e arreigadtis crenças religiosas.<br />
Muitas vezes at6, as populações indigenas que mais custa a submete<br />
ter são as que mais tar<strong>de</strong> fornecem aos colonisadores os melhores sol<strong>da</strong>dos,<br />
os mais valentes, cfisciplinados e fieis.<br />
Na epocha actual, temos d'esse facto iim exemplo brilhante na nossa<br />
colonia <strong>de</strong> Moçambique. Muito dinheiro e rriiiitas vi<strong>da</strong>s nos custaram as<br />
guerras <strong>de</strong> 1805-96, necessarias ci paciticaváo do suI <strong>da</strong> provincia, mas<br />
muitas mais vi<strong>da</strong>s e capitaes nos tem ultimamente poupado a utilisação<br />
nas campanhas coloniaes <strong>da</strong>s ..~dmiraveis companhias <strong>de</strong> landins cuja bra-<br />
vura e disciplina supportam vantajosamente o confronto com os mais mo-<br />
<strong>de</strong>lares corpos indigenas <strong>da</strong>s colonias estrangeiras.<br />
Quando, porc:m, as populaç6es indigenas forem civilisa<strong>da</strong>s e manifes-<br />
tarem uma certa ten<strong>de</strong>ncia para reivindicar a sua in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ncia politica,<br />
4 razoavel e pru<strong>de</strong>nte manter n'essas colonias os effectivos europeus suffi-<br />
cientes para prevenir ou suffocar qualquer revolta. Na India Ingleza a<br />
proporção dos sol<strong>da</strong>dos europeus <strong>da</strong> Hritisl~ Indian Anny para os indigenas<br />
<strong>da</strong>s Ntrtiue Troops é <strong>de</strong> 1:2 ; nas Indias Orientaes Neerlan<strong>de</strong>zas essa pro-<br />
porção 6 <strong>de</strong> 2:3.<br />
Nas colonias tropicaes, <strong>de</strong> popiilaçúes atraza<strong>da</strong>s e mais facilmente<br />
assimilaveis, o contingente europeu pd<strong>de</strong> ser muito mais reduzido e limi-<br />
tar-se, quando a pacificac;áo seja completa, a um pequeno nucleo d'on<strong>de</strong> na<br />
paz partirá o exemplo <strong>da</strong> disciplina, e que durante a guerra representar&<br />
com a sila presença o baluarte moral tão necessario para conservar 6s<br />
tropas indigenas um alto nivel <strong>de</strong> coragem, resistencia e espirito conibativo.<br />
A presença dos brancos constitue, para a ingenua creduli<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> muitas<br />
popnlaç~es africanas, ,,ma garantia <strong>de</strong> exito seguro. E, se a disciplina era<br />
bastante para obter dos sol<strong>da</strong>dos pretos obediencia cega e relativa firmeza,
a convicção <strong>da</strong> victoria pó<strong>de</strong> levá-los ao commettirnento <strong>de</strong> ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iras<br />
heroici<strong>da</strong><strong>de</strong>s. O effectivo do contingente europeu <strong>de</strong>ve, pois, limitar-se sempre<br />
ao minimo indispensavel. As tropas enropeias são sempre muito dispendioqah.<br />
O seu sustento, alojamento e equipamento absorvem quantias importantis-<br />
simas. Por oiitro lado, a maligni<strong>da</strong><strong>de</strong> dos climas tropicaes caiisa innumeras<br />
victimas sem vantagem para ningiiem, e com manifesto gravame para o<br />
orçamento qiie houver <strong>de</strong> pagar a repatriayao dos doentes, o transporte<br />
dos que veern preencher as baixas. (, :i caixa <strong>da</strong>s apoqentaqõe~.<br />
Aquelles que apenas querem os indigenas empregados nas operaçóes<br />
<strong>de</strong> policia, e reclamam para as tropas europeias todos os sc.rviços <strong>de</strong> occu-<br />
paçáo, <strong>de</strong>feza e inanutençáo <strong>da</strong> ordcm, esqiiecein qiie os eml)rehendimentos<br />
coloniaes são iim:i tarefa rle civiliofiçáo e <strong>de</strong> riqiieza, e n50 iim pretexto<br />
para augmentar as classes militares e onerar as finanps <strong>da</strong> metropole.<br />
Sendo, portanto, náo sú ntil, mas até indispensavel, o aproveitamento dos<br />
aborigenes coloniaes sob o ponto <strong>de</strong> vista militar, vejamos como <strong>de</strong>verá rea-<br />
lisar-se essa iitilisação, para que seja proficua e correspon<strong>da</strong> integralmente<br />
ao fim visado, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> as operaçóes do recriitaniento até á utilisaç&o tactica<br />
<strong>da</strong>s ani<strong>da</strong>tlrs c-onstitiii<strong>da</strong>s. Não se pó<strong>de</strong> preconizar um <strong>de</strong>terminado typo<br />
<strong>de</strong> recriitaniento iiidigena indistinctamente applicavel a to<strong>da</strong>s as colonias.<br />
A variabili<strong>da</strong><strong>de</strong> dos costiimes, <strong>da</strong>s circuinstancias pccu!iares a ca<strong>da</strong> regiáo<br />
e dos cxaracteres anthropopsychologico~ impe<strong>de</strong> o estabelecimento d'iima<br />
formula geral.<br />
Nas (olo~ias<br />
on<strong>de</strong> já exista um rudimento <strong>de</strong> urganisayHo militar an-<br />
terior ;i conquista, convem manter a fóriiia wual do recrutamento, aperfei-<br />
çoando os processos prkticws, mas conservando ao alistamento a indol~<br />
a que osindigcnas rc acostiimaram. Nas colonias africanas em que<br />
OS natiiraeh sqjarn admiriistr~idos por iiitermedio dos seiis proprios chefes,<br />
sáo estes que <strong>de</strong>vem fornecer os contingentes qiie Ilies sejam reqiiisi-<br />
tados. Nas colonias asiaticas, on<strong>de</strong> o regimen cornniiinal esteja fort~~mriite<br />
radicado nos Iiubitos <strong>da</strong>s popiilaçóeo, constitiiindo como que ri base <strong>da</strong> res-<br />
@ectiva organisaçáo social, os sol<strong>da</strong>dos clevein scr pedidos a ca<strong>da</strong> commnni-<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong>, em numero proporcionado á ~)opulaqão<br />
c. importancia <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> aggre-<br />
miaçáo municipal.
UTILISAÇÃO MILITAR 503<br />
- -. - - - - -<br />
0 alistamento voluntario, theoricaiilente s~iperior, iit iii bempre se<br />
pó<strong>de</strong> empregar. Se se tratar <strong>de</strong> populaçúes em estado <strong>de</strong> barbarie muito<br />
primitiva, completamente <strong>de</strong>stitui<strong>da</strong>s <strong>de</strong> espirito militar, náo haverá volnn-<br />
tarios, e os resultados obtidos serão insignificantes ou niillos. Se o adianta-<br />
mento sociologico dos indigenas fôr mais perfeito, mas que estes dêem<br />
mostras <strong>de</strong> irrequietos ou insubmissos, o resiiltado do alistamento pó<strong>de</strong> ser<br />
contraprodiicente e perigoso. Diz Laneesan (I) que na Indo-China os voliin-<br />
tarios se apresentavam em gran<strong>de</strong> numero a alistar-se, mas que, uma I ez<br />
recebido o armamento e equipamento, <strong>de</strong>sertavam para o campo inimigo,<br />
ou iam engrossar os bandos <strong>de</strong> piratas. Quando se esteja em presença tle<br />
uma raça aguerri<strong>da</strong> e cuja fi<strong>de</strong>li<strong>da</strong><strong>de</strong> os factos tenham sobejamente com-<br />
provado, pó<strong>de</strong>-se então permittir o alistamento voluntario.<br />
Qualqner que seja o systema <strong>de</strong> alistamento, <strong>de</strong>verá po<strong>de</strong>r effectuar-se<br />
sempre a incorporaçíio compulsoria dos vadios. Nno queremos qiie o alista-<br />
mento a cor<strong>de</strong>l <strong>de</strong> vadios sem morali<strong>da</strong><strong>de</strong> se,ja erigido em systema unico <strong>de</strong><br />
recrutamento, do que resiiltariam tropas dificilmente disciplinaveis e <strong>de</strong><br />
pouca confian~a, mas não ha duvi<strong>da</strong> que todos os inconvenientes <strong>de</strong>sappa-<br />
recem se se disseminarem os vadios pelos corpos regularmente recrutados<br />
por fórma a ficarem representados em ca<strong>da</strong> uni<strong>da</strong><strong>de</strong> por uma infima minoria.<br />
Nas colonias em que a complicação sociulogica do elemento autoch-<br />
tone e a crença religiosa tenham estabelecido diversas classes ou castas, t!<br />
indispensavel respeitar todos os preconceitos existentes, e, at8 mesmo, tirar<br />
partido d'clles, agrupando em ca<strong>da</strong> corpo os membros <strong>da</strong> mesma classe,<br />
formando corpos <strong>de</strong> elite, em summa, iitilisando os antagonismos como bases<br />
<strong>de</strong> proficua emiilaçáo, e procurando <strong>de</strong>senvols~er quanto possivel o prazer e<br />
a prosápia <strong>de</strong> pertencer a este ou áqiielle regimento. Paul Reinsch, refe-<br />
rindo-se á organisaçáo do exercito anglo-indiano, escreve o seguinte: (")<br />
=NO exercito indiano differenciam-se cui<strong>da</strong>dosamente as classes SO-<br />
ciaes e aproveitam-se as aptidúes especiaes, fomentando-se o orgulho <strong>de</strong><br />
raça e o esprit <strong>de</strong> coqns por fórma a augmentar a efficiencia militar <strong>da</strong>s di-<br />
(1) Lanessan - f'rincip~s <strong>de</strong> Colonisntion.<br />
(9) Reinsch- 0. C.ltu1
504 I'OLITIUA INDIGENA -<br />
versas uni<strong>da</strong><strong>de</strong>s combatentes. Pela concentraçilo <strong>de</strong> certas tribiis em <strong>de</strong>ter-<br />
minados regimentos, <strong>de</strong>senvolve-se o orgulho e a soli<strong>da</strong>rie<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> ca<strong>da</strong><br />
raça e torna-se mais popiilar o alistamento. O Sikhismo, que hoje é quasi<br />
por completo uma religião militar, foi avivado e generalisado com o auxilio<br />
e protecção <strong>da</strong> administração britannica a fim <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolver as melliores<br />
fontes <strong>de</strong> recrutamento do exercito indiano. n<br />
AlBm d'isto, ha sempre vantagem em aproveitar os servivos militares<br />
dos indigenas, na propria região a que pertencem e on<strong>de</strong> foram recrutados.<br />
Em campanha t! evi<strong>de</strong>nte que esta consi<strong>de</strong>ração não pó<strong>de</strong> prevalecer,<br />
mas, para o serviço ordinario <strong>de</strong> gnarnição 6 importante que seja attendi<strong>da</strong>,<br />
porque torna o serviço militar mais acceitavel aos indigenas, facilitando o<br />
alistamento voluntario. Quando na mesma colonia, houver raças differentes,<br />
é indispensavel não excluir nenhuma do serviço militar, utilisando-as simul-<br />
taneamente em ca<strong>da</strong> locali<strong>da</strong><strong>de</strong> mas sempre agrupa<strong>da</strong>s em regimentos dif-<br />
fersntes. Fica-se assim ao abrigo <strong>da</strong>s conseqiiencias funestas d'uma revolta<br />
militar, ou, pelo menos, limita-se sensivelmente a sua extensão provavel.<br />
O serviço militar obrigatorio para todos os ci<strong>da</strong>dãos é um regimen que se<br />
não coaduna com a condição colonial. Antes, pelo contrario, ha to<strong>da</strong> a van-<br />
tagem em que o exercito colonial, tanto no contingente europeu como nas<br />
tropas indigenas se approxime o mais possivel d'uma nrmée <strong>de</strong> metier, com<br />
a duração <strong>de</strong> serviço, estabili<strong>da</strong><strong>de</strong> e garantias proprias a esta fórmi~la<br />
militar.<br />
Nenhum technico põe hqje em duvi<strong>da</strong> a immensa superiori<strong>da</strong><strong>de</strong> do<br />
sol<strong>da</strong>do <strong>de</strong> carreira que faz <strong>da</strong> sua missão o proprio fim <strong>da</strong> sua existencia,<br />
e para quem o pret constitue o exclusivo ganha-páo, sobre os bisonhos re-<br />
crutas que o serviço obrigatorio arranca temporariamente ás suas al<strong>de</strong>ias<br />
e aos seus misteres, para passarem contrariados e nostalgicos alguns mezes<br />
ou annos na semi-reclusão dos quarteis. É ver<strong>da</strong><strong>de</strong> que a organisação <strong>de</strong><br />
um exercito profissional é bastante cara, mas não é menos certo que a sua<br />
efficiencia militar é incomparavelmente superior á que se baseia no serviço<br />
temporario .e obrigatorio. No Congresso Colonial <strong>de</strong> Paris <strong>de</strong> 1908 che-<br />
gou-se a propor a instituiçáo d'uma nrmée <strong>de</strong> metier, não sb para as colo-<br />
nias, mas para a propria metropole, visto que o <strong>de</strong>crescimo <strong>da</strong> população
f'ranceza accusado pelo censo annual, e a reducçáo do tempo <strong>de</strong> serviço<br />
militar, tornam ca<strong>da</strong> vez mais difficil manter nas fileiras os actiiaes effe-<br />
etivos do excrcaito francez.<br />
Nas colonias, em vez <strong>de</strong> impor aos indigenas o serviço militar como<br />
tarefa odiosa e obrigatoria, <strong>de</strong>ve-se ao contrario procurar crear iirn;t cor-<br />
rente <strong>de</strong> alistamento voliintnrio, e <strong>de</strong>senvolver H. vocaçáo militar prolria<br />
a muitos povos atrazados, offerecendo-lhes garantias especiaes, e fazendo<br />
salientar sempre o prestigio tentador <strong>da</strong> far<strong>da</strong> e do privilegio.<br />
Se o problema do recrutamento dos sol<strong>da</strong>dos indigenas não 6 táo<br />
simples como á primeira vista se antolha, mais cui<strong>da</strong>do merecem ain<strong>da</strong> o<br />
recrutamento e a escollia dos officiaes e graduados europeus que <strong>de</strong>vem<br />
enquadrar os effectivos indigenas, e cle cujo valor e liabil orientação pri-<br />
macialmente <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> a efficiencia militar do exercito indigena. O official<br />
colonial não se improvisa <strong>de</strong> um momento para o outro. O gran<strong>de</strong> e per-<br />
feito conheciinento <strong>da</strong> lingiia, dos costunies indigenas, do terreno, dos re-<br />
cursos do paiz, e <strong>da</strong> natureza dos embustes e cila<strong>da</strong>s que urge evitar, não<br />
B facil <strong>de</strong> adquirir em pouco tempo, e tem <strong>de</strong> se exigir até mesmo aos me-<br />
nos graduados. Nas colonias. a natureza <strong>da</strong>s operaçóes militares <strong>de</strong>man<strong>da</strong><br />
um tal fraccionamento <strong>de</strong> forças, que é indispensavel que os officiaes subal-<br />
ternos e mesmo os inferiores tenham iim largo espirito <strong>de</strong> iniciativa, e<br />
muita pru<strong>de</strong>ncia e <strong>de</strong>sembaraqo. Isolados em postos do interior, ti testa <strong>de</strong><br />
pequenas colamnas, ou comman<strong>da</strong>ndo auxiliares, náo <strong>de</strong>vem <strong>de</strong>sconhecer as<br />
minimas particulari<strong>da</strong><strong>de</strong>s do terreno em que operam e dos costumes e ten-<br />
<strong>de</strong>ncias dos indigenas que comman<strong>da</strong>m, ou que <strong>de</strong>vem siibmettrr. l? esta<br />
uma <strong>da</strong>s razóes essenciaes que fazem aconselhar a longa permanencia dos<br />
officiacs europeus nos quadros coloniaes.<br />
0 i<strong>de</strong>al seria a completa separaçáo do exercito ultrdmarino do <strong>da</strong><br />
metropole, e a constituição do primeiro sob a fórmula profissional. CJuando<br />
assim nRo aconteça e que os officiaes e sargentos se,jam tirados dos quadros<br />
<strong>da</strong> metropole para servirem temporariamente nas calunias, htt to<strong>da</strong> van-<br />
tagem em alongar o tempo <strong>de</strong> serviço o mais possivel, <strong>da</strong>ndo aos volun-<br />
tarios ou nomeados as compensaçúes que se julgarem justas. O official 011<br />
sargento que poucos annos ou mezes passe no serviço colonial. e que nál~
506 POLITICA INDIGEXA<br />
-- -<br />
tenha valiosas garantias pecuniaririci ou <strong>de</strong> accesso, sd procurará aproveitar<br />
essa estação força<strong>da</strong> em colher honra jA qiie proveitos não cobra.<br />
Esta circiimstancia jiinta ao facto do completo <strong>de</strong>sconhecimento c10<br />
meio e dos costiimes indigenas, qiie perrnitte imaginar crimes ou rebelliúes<br />
on<strong>de</strong> afinal s/, lia uma ou oiitra <strong>de</strong>sor<strong>de</strong>m, t#o natural cntre selvagens,<br />
<strong>de</strong>senvolve nos officiaes e graduados europeus na ancia <strong>de</strong> se distinguirem,<br />
<strong>de</strong> bem servir a patria, <strong>de</strong> se cobrirem <strong>de</strong> gloria, esse espirito intolerante<br />
e bellicoso que, por vexes, ta0 nocivo se torna ao mobil essencial <strong>da</strong> colonisação.<br />
Por outro lado, a ignorancia <strong>da</strong> lingua indigena e <strong>da</strong> configiiração<br />
pliysica do terreno expóe-os com mais facili<strong>da</strong><strong>de</strong> a serem vict,imas <strong>de</strong> traiçóes<br />
ou <strong>de</strong> embosca<strong>da</strong>s.<br />
A longa perrnanencia nas colonias evita ou atteníia gran<strong>de</strong>mente estes<br />
inconvenientes, mas a ver<strong>da</strong><strong>de</strong> é que, á cliega<strong>da</strong> dos officiaes k colonia<br />
on<strong>de</strong> <strong>de</strong>vem servir, elles existem egiialmente, se,ja (liia1 fôr a diirar;áo do<br />
tempo <strong>de</strong> servi(;o colonial. E por isso que, em tempo normal, para niailtcr<br />
a or<strong>de</strong>m oii suffOcar peqiienas rt~hellióes sáo preferiveis os officiaes que,<br />
tendo ido ern kiirqentos para o exercito coloilial, nlli tenham conquistado<br />
os seus galóes. S%o por certo menos brilliantes e illi~stradi~s, mas o perfeito<br />
conhecimento do paiz e <strong>da</strong> ethnologia regional, e o 1ltibltO <strong>da</strong>s csraramucas<br />
com indigenas, qiie lhes advem <strong>da</strong> sua longa permanencia na colonia, s8o<br />
optimtis qn~licla<strong>de</strong>s, sc~li(las e práticas, qiie siibstituem com vantagem a<br />
maior il1nstrac;áo apriimo dos recemvindos. Isto 1130 quer dizer que os of-<br />
ficiaes tlieoricos, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> estanciarem <strong>de</strong>mora<strong>da</strong>mente na coloilia, náo lhes<br />
venliaiii ii sei. rrc.oiilieci<strong>da</strong>mente siiperiores, rii:ii o que 6 indispensarel B<br />
que esse tirocinio previo se effectiie.<br />
Os officiaes coloniaes qrie se <strong>de</strong>diquem ao estudo <strong>da</strong>s lingi~as indigenas<br />
e <strong>de</strong>monstrem práticamente esso conliecimento, dcvern per recompensndos<br />
por forma a crcar um estimulo que incite a essa :iprciidiziigem. NO exer-<br />
cito anglo-indiaiio os officiaes contractam-se volilntariirnente para iimi l]cLr-<br />
rnanencia <strong>de</strong> 12 annos, e o conherirneiito dos dialectos e costumes lo(,;tcs é<br />
uma melhores condicóes <strong>de</strong> rapido e brilhante accesso. Nas colonias til-<br />
1ernRs todos os uficiaes e sargentos conliecem H lingila dos indigcnas que<br />
commantlam, ate as proprias vozes tle cominando sác) <strong>da</strong><strong>da</strong>s n'esse (lia-
lecto. Em Dar-E$-Salfim tivcinos occasiiio <strong>de</strong> assistir 8 li(;~t.. rcb,.i,ilt:i e<br />
a exercicios militares em qiie para to<strong>da</strong>s as vozes tle commando ur<strong>de</strong>ns<br />
especiaes i;(; se empregava o szra!yl.<br />
Em Port,ilgal era <strong>da</strong> maior conveniencia qiie todos os officiacs ii quem<br />
compete servivo no exercito do Ultramar tivessem, antes do c.mharrliic para<br />
as colonias, iiina pcrii;anencia <strong>de</strong> seis oii oito meses iiii Esc,ola Colonitil. Ali<br />
estu<strong>da</strong>riam a lingiia indigena <strong>da</strong> regiáo :i que se <strong>de</strong>stinassem, priiicipios<br />
geraes <strong>de</strong> administraçiio colonial, <strong>de</strong> politica indigeri:~ c <strong>de</strong> tactica colonial.<br />
Esta po<strong>de</strong>ria ser professa<strong>da</strong> sol) a fdrma ite conferencias, fkit~ii pelos officiaes<br />
mais distinctos e conhecedores tlo particiilarisrno proprio As operaçóes<br />
militares no ultramar. T)ii <strong>de</strong>sca,ril)(;áo technicx c. niiniiciosii tliis rnotlernas<br />
campanhas coloniaes, <strong>da</strong> intlolc clo sol<strong>da</strong>tlo iric1igt~ii:i r: tla tactica inimiga,<br />
resiiltariil iim ensiriamento :igrii<strong>da</strong>vel e s~iriiiiliiiii~~iitt~ proveitoso para os<br />
nossos officiaes.<br />
Náo iam para os seus po~tos uncz coloniacs coiisiimniadocz, porque<br />
esses s6 a prática lobai os pótie fizer, iii;ts tcriain assim adqiiirido unia<br />
iitilissima preparaçáo ,que actiialmente Ihcs falta ein absoliitu.<br />
Um problema importante qiie n'wlgiimas coloniiis tem bastante<br />
actuali<strong>da</strong><strong>de</strong>, 6 o <strong>da</strong> atlmissáo dos iiidigcnas ao posto <strong>de</strong> sargento (: :í 1)atente<br />
<strong>de</strong> official. A :iscensáo aos postos <strong>de</strong> officiaes inferi0rc.s ~ t pOc\c j tliir-st!<br />
evi<strong>de</strong>ntemente rios corpos indigenas, porque seriam graves par;+ ti tliscipliiix<br />
as conseqiiencins (ta incorporaçáo <strong>de</strong> sargentos pretos ou ainarelios nas<br />
uni<strong>da</strong><strong>de</strong>s eiiropeias.<br />
Pela nicsma rttaiio, a patente <strong>de</strong> official concctiitla :i tini incligena<br />
saliido <strong>da</strong>s fileiras só llie <strong>de</strong>ve <strong>da</strong>r direito x c:onirnaritlwr iridividiios (Ia siia<br />
c6r. Out,ro tanto náo ;icontece com os offici;iits tlc cfir saliitlos il~s CSCOIHS<br />
<strong>da</strong> rnet,ropule, qne po<strong>de</strong>riio ser iiitlist,inctaniente inc~orl~c~ratlos nn;is tropa!: in-<br />
digenas oii iio coritingente europcii, pelo menos nas col»ni:is d'aqiieil;is naç6es<br />
qii~, como Portugal, tenham em poiica monta o 1)recoric~c~ito <strong>da</strong> cor. Os<br />
commandos siiperiores <strong>de</strong>vem ser reserviidos, eni tliialtluer c:isci, aos officines<br />
europeus oii comp1et:inicnte assimilados pela civilisa\:iio occidcntwl.<br />
IJma distincc;ao tiiie, ,z nosso ver, se impót. nos qiiiidrt1.1 coloniae~. e<br />
que milito <strong>de</strong>sejiirismos fosse leva<strong>da</strong> a effcito no nosso cxcrcito iilt,r;iriia-
ino, r! a que <strong>de</strong>ve existir cntre o quadro dos officiaes e sargentos <strong>de</strong>stins<br />
(10s a eiiqiiadrar as tropas indiqcnas, e o qiiadro dos quc prestam servi?<br />
nas uni<strong>da</strong><strong>de</strong>s europeias. Ein qiialquer uni<strong>da</strong><strong>de</strong> tactica, a Iiomogenei<strong>da</strong><strong>de</strong> e L<br />
valor militar crescem com o conhecimento que os chefes tenham dos seus<br />
subordinados, e com a confianva que estes <strong>de</strong>positem nos seus superiores.<br />
Aquelle conliecimei~to e esta confianc;;t &o prodiicto d'uma longa conviven-<br />
ci;i atravcz <strong>de</strong> perigos e necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s communs, e náo é variando constan-<br />
terneiite os chefes que se attingirti esrc <strong>de</strong>si<strong>de</strong>ratum. Na condição colonial,<br />
e rnórrnente com tropas indigenas, mais imperativa se torna a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> (lar a m~ixima fixi<strong>de</strong>z tios oficia(..: sargentos. N'este caso, al6m <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s<br />
as vantagens <strong>da</strong> confiança reciproca que sO pd<strong>de</strong> nascer d'um convivi0<br />
aturado, accresce ain<strong>da</strong> a circumstancia dos officiaea, findo um certo tempo,<br />
terem aprendido a tratar os indigenas, e ti coniprehen<strong>de</strong>r-lhes o feitio<br />
psychico, os costume$ e :i lingua, reunindo portaiito to<strong>da</strong>s as garantias <strong>de</strong><br />
pru<strong>de</strong>iicia c tolerancip. necessarias a quem tem <strong>de</strong> comman<strong>da</strong>r tropas indigenas.<br />
É in,jiistifictivel qiie se clesprezem essas garantias, <strong>de</strong>saproveitando<br />
esses excellentcs elementos com transferencias successivas entre as uni<strong>da</strong>-<br />
<strong>de</strong>s eiiropeias e indigenas.<br />
Os quadros <strong>de</strong>vem ser distinctos. O official que comman<strong>da</strong>r indigenas<br />
tem neccssariamcnte <strong>de</strong> se especialisiir. Além dos conhecimentos especiaes<br />
que Ihc são exigidos, prcciza <strong>de</strong> lançar mão <strong>de</strong> meios inteiramente diíferen-<br />
tes para se fazer respeitar, para manter a disciplina, e para educar os seus<br />
sol<strong>da</strong>tlos. 0.3 castigos tlisciplinares náo po<strong>de</strong>m ser os mesmos. As penas<br />
corporaes impóem-se em varia<strong>da</strong>s circiimstancias, e o que seria <strong>de</strong>gra<strong>da</strong>nte<br />
e <strong>de</strong>smcirwlisador para sol<strong>da</strong>dos brancos é frequentemente indispensavel<br />
para fazer jiistiça comprehensivel a pretos. Ilepois, o absoluto respeito que<br />
se <strong>de</strong>ve guar<strong>da</strong>r pelos usos e costiimes e pela organisaçáo <strong>da</strong> familia indi-<br />
geria, a propria coiisi<strong>de</strong>raçáo dã inferiori<strong>da</strong><strong>de</strong> sociologica dos indigenas,<br />
fazem aconselhar toleraiicias que, <strong>de</strong> maneira alguma, seriam adrnissiveis<br />
em qiialquer uni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> rcgiilares europeus. 1Jm official brilhante e disci-<br />
$nador mas que <strong>de</strong>sconheça ou <strong>de</strong>spreze to<strong>da</strong>s estas condiçóes, nunca, será<br />
iim bom elemento no commando <strong>de</strong> tropas indigenas e, principalmente nos<br />
po&os subalternos, pouco auxilio encontrar& nos seus subordinados. Por
- - - - - - -- - -<br />
UT~ISAÇA O MILITAR<br />
-<br />
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outro lado, o oficial que se habituar a comman<strong>da</strong>r indigenas e que n'esse<br />
papel est,eja prestando serviços releviintissimos, e <strong>de</strong>monstrando excellentes<br />
quali<strong>da</strong><strong>de</strong>s para o <strong>de</strong>sem;)eriho do seli cargo, :irrisca-sc coni a transferencia<br />
para o contingente enropeu, para ondo naturalmente leva o vinco<br />
especial que lhe <strong>de</strong>ixou o conhecimento particiilitr <strong>da</strong> indole do sol<strong>da</strong>do indigena,<br />
a iCr consi<strong>de</strong>ra<strong>da</strong>s como ontros tantos <strong>de</strong>feitos essas mesmas qiiali<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
que o tornaram notavel.<br />
Na India Ingleza, o exercito é formado por tres corpos diversos e<br />
com quadros completamente separados. Em primeiro logar as 81-itial~ I~ldicrn<br />
Troops compostris excliisivaiiiente <strong>de</strong> enropeii* cla rnetropole ; ein segundo<br />
logar as ~T'citiue TI.OO~JS em qiic os so1tl:itlos r sargentos sao todos indigenas,<br />
c os officiaes $50 em parte ~n[ligena,: t: (:r11 parte europeus; finalmente,<br />
em terceiro logar :i3 Ii,tperitll Ser.uic.e i't~~ops, creailas eiri 1888, cu,ja inst,r.ucç$o<br />
militar A ministra<strong>da</strong> por officiac~ inglezes, mas qiie sHo constitui<strong>da</strong>s<br />
excluuivamente por indigenas que exercem mesrno os commandoa superiores.<br />
Náo sb os quadros tiri 11. I. A. e <strong>da</strong> ,li. A. são digerentes, mas atS <strong>de</strong>ntro<br />
do qiiadro <strong>da</strong> Ar. A. os officiaes se eapecialisam no comrnando dos i+urklias,<br />
Sikhs, etc., <strong>de</strong> modo a familiarisarem-se com a lingua e os costumes <strong>de</strong><br />
ca<strong>da</strong> rava, para consoli<strong>da</strong>r o prest,igio <strong>da</strong> influencia britannica e fhcilitar o<br />
exercicio do coinmtindo. -4 artillieria, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a revolta dos cypaios, é giiarneci<strong>da</strong><br />
quasi exclasivainente com europeus.<br />
(J~ianto R con$titiiic;áo <strong>da</strong>3 uni<strong>da</strong><strong>de</strong>s em que se <strong>de</strong>vem <strong>de</strong>compôr as<br />
tropas indigenas, seria ahsnrtlo estabelecer qiialquer generalisaçzo. Depen<strong>de</strong><br />
do effcctivo total ser rnaior ou menor, <strong>da</strong>s condiçúes 1oc;ie.. ;:npôrem<br />
oii n%o o fraccionament,~ 11iis forças, <strong>da</strong> natureza tias posic;óes a occiipar e<br />
a <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r e até <strong>da</strong> indole do sol<strong>da</strong>do indigena.<br />
N'umas colonias, a constituiçáo <strong>de</strong> regimentos analogos aos <strong>da</strong> Europa<br />
scrii poasivel e <strong>de</strong>duzir-se-ha naturalmente <strong>da</strong>s exigencias do servivo,<br />
n'oiitras a uni<strong>da</strong><strong>de</strong> ~referivel será o batalhão ou mesnio a companhia. Nau<br />
colonias africanas, ou pelo inenos nas <strong>da</strong> zona tropical, a companhia iridigena<br />
parece-nos ser a fdrmala que rnellior correspon<strong>de</strong> á natureza <strong>da</strong>s<br />
operaçúes militares que ali se realisam. Facilmente disciplinavel e mol)ilisavel,<br />
tem ain<strong>da</strong> a vantagem <strong>de</strong> não exigir officiaes <strong>de</strong> patente eleva<strong>da</strong>,<br />
509
510 - --<br />
POLITICB INDIGENA<br />
-- - -<br />
que, além <strong>de</strong> peaareni <strong>de</strong>masiatlitmente no orqaiiiento colonirrl, não teein.<br />
por mais adiantaclo3 em annos, riem a resiutencia pliysica indispensavei<br />
para o serviço niilitar ~i'acliiellas Irititii<strong>de</strong>s, nem o ardor, o er~train, a boa<br />
disposic;ao, qiic perinittem superar alegremente to<strong>da</strong>s as contrarie<strong>da</strong><strong>de</strong>s I.<br />
pri\.a$es. A (3ornp;iiihiii fórma um todo necessariamente inais homogeneo<br />
do que o regimento: 03 sei13 solc1:idos po<strong>de</strong>m pertencer náo só á mesma<br />
raça, como á inesma tribii o11 altlciri, conliecendo-se bem uns aos outros; os<br />
officiaes terminam por cunliecer individualmente os seus solclados, ficam sabendo<br />
com qiiem po<strong>de</strong>m contar, e é-lhes mais fitcil expurgar a uni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
qiialquer elemento nocivo; emfim, o limitado eff'ectivo <strong>da</strong> companhitt simplitica<br />
e auxilia notiivelniente a tarefa <strong>da</strong> educaçáo do sol<strong>da</strong>do.<br />
Ortl a ctli~ca(~:áo do sol<strong>da</strong>ilo africano não pd<strong>de</strong> nem <strong>de</strong>ve limitar-se ti<br />
instriiqáo militar. A nosso ver, ;ws(~giiraila a pacificação, o serviço militar<br />
pó<strong>de</strong> prestar iim inestimavel conciirso B causa <strong>da</strong> instrucyko e civilisayno<br />
<strong>da</strong> socicd;i<strong>de</strong> indigena. A caserna, sem <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> o ser, pó<strong>de</strong> valer por uma<br />
escola, e os officiaes que dirigirem o ensino, que cliamarem a si essa tarefa,<br />
t,ho nobre e ale\~;intit<strong>da</strong>, servirao R sua patria tão beiii oii melhor do que<br />
quand,, por ella vertessem o seli sangue. Substituir B ociosi<strong>da</strong><strong>de</strong> enervante<br />
e <strong>de</strong>leteriti <strong>da</strong> caserna o labor suave dos estudos rudiment,ares e (10 ensino<br />
profissional, 4 <strong>de</strong>terriiinar praticamente e com facili<strong>da</strong><strong>de</strong> iima <strong>da</strong>s soluções<br />
convergerites ;i r-esulii(.;%o do problema eclncativo nas coloriias. Todos sabem<br />
quanto a infliieiicia iiniformis;tilura <strong>da</strong> tarimba actiia nos caracteres, nivelantlo-lhe3<br />
:I.: tliflereiigas, <strong>de</strong>gra<strong>da</strong>ndo os voos <strong>da</strong>s intelligencias superiores,<br />
e mellioraiido a iiitcllectiialidi~tle dos mediocres. Eate vinco especial <strong>da</strong> caserna<br />
é tanto niai~ profundo quanto mai..; ciiict,iu e <strong>de</strong>spidos <strong>de</strong> taras <strong>de</strong> in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nciii<br />
intellectiiiil forem os caracteres sujeitos a essa acçHo uniformisante.<br />
01-a como its pupiila~lóes indigenas inais atraza<strong>da</strong>s sáo constitui<strong>da</strong>s<br />
por vorilacleiras creiinças rio ingenuo entendimento e na ductili<strong>da</strong><strong>de</strong> psy-<br />
chologica, comprelien<strong>de</strong>-se bem a vantagem que haveria em aproveitar O<br />
nivelamento psychico <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> <strong>de</strong> caserna, trocando a monotonia exasperante<br />
e embriitecedora que só produz innteis ftira do campo strictamente militar,<br />
por iima vi<strong>da</strong> cle instriicçáo e trabalho indissolnvelmente liga<strong>da</strong> B nobreza<br />
que rrsiilta do cumprimento c10 <strong>de</strong>ver militar.
--<br />
ETILISAy.%O MILITAR<br />
-- -<br />
Os officiaes e OS graduados que cornman<strong>da</strong>rem iiidigeiias não <strong>de</strong>vem<br />
limitar o seu esforço ri obtençko <strong>de</strong> bons atiradores, <strong>de</strong> sol<strong>da</strong>dos valentes,<br />
disciplinados e fieis. k necessario e é possiveli fazer milito melhor. Em vez<br />
<strong>de</strong> simples machinas <strong>de</strong> guerra, serk mil vezes mais meritorio e pr't' i% 1CBmente<br />
proveitoso tornar esses sol<strong>da</strong>dos em ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros patriotas, substituindo-lhes<br />
o automatismo inconsciente do proprio valor pelo estimulo sagrado<br />
do amor <strong>da</strong> patria, e fazer d'esses patriotas outros tantos trabalhadores<br />
honrados e in<strong>de</strong>fessos. k indispensavel que os europeus estii<strong>de</strong>rn as linguas<br />
indigenas para melhor prescrntar a indole <strong>da</strong>s populaçóes, os costumes tradiccionaes<br />
e as ten<strong>de</strong>ncias do seu espirito, mas quando o typo <strong>da</strong> colonisação<br />
propentier 6 assimilaçáo politica -- e 15 o caso <strong>da</strong> co1onisac;áo portugueza<br />
-não se p6<strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> generalisar intensamente no elemento nativo a<br />
lingua dos dominadores. N'esta hypotherc tem <strong>de</strong> se ministrar aos sol<strong>da</strong>dos<br />
indigenas esse ensino, como po<strong>de</strong>roso Factor <strong>de</strong> nacionalisaçáo, mccs a instrucqáo<br />
que, principalmente e em todos os casos, aquelles <strong>de</strong>vem receber é<br />
a profissional. Ca<strong>da</strong> companhia indigena <strong>de</strong>ve ter os seus ferreiros, carpinteiros,<br />
etc., agrupando-se os officiaes do mesmo officio em ca<strong>da</strong> secção,<br />
aproveitando os sargentos europeus mais conhecedores do assumpto na instriicção<br />
profissional <strong>da</strong>s secçóes, e escolhendo os mistbres em harmonia com<br />
ti natureza dos trabalhos mais viilgares na região on<strong>de</strong> a força estiver<br />
aquartela<strong>da</strong>.<br />
Terminado o tempo do serviço militar, estará consi<strong>de</strong>ravelmente melhora<strong>da</strong><br />
n condicão moral e social do sol<strong>da</strong>do indigena, que pelo trabalho<br />
continuará a ser util ao seu paiz e a si proprio. De resto, at8 mesmo durante<br />
o periodo do serviço militar activo, po<strong>de</strong>rá ser utilisa<strong>da</strong> a mão d'obra<br />
forneci<strong>da</strong> pelos artífices indigenas.<br />
h essa a ten<strong>de</strong>ncia actual em diversas colonias estrangeiras. Paul<br />
I:c.in-ch refere-se ao assumpto nos seguintes termos: (I)<br />
«h Franca e a Xllemanha (assim como a Russia nas suas possessúes<br />
asiaticas) estão hoje empregando as forças militares na construcçáo<br />
(1) Reinsch - O. C.tuin<br />
511
<strong>da</strong>s obras pu1)licas. dlliando, por esta forma, os interesses militares aos<br />
interesses economicos <strong>da</strong> colonia, attinge-se um resultado duplo. Os eol<strong>da</strong>dos<br />
toem sempre que fazer, o que evita a indolenttl dcpenerescencia que<br />
os climas tropicaes t:io facilmente provocam, e a <strong>de</strong>speza com as obras publicas,<br />
<strong>de</strong> que as colonias novas geralmente tanto carecem, é consi<strong>de</strong>ravelmente<br />
rediizirla. Nos tropicos este regime11 6 applicado principalmente As<br />
tropas indigenas, emquanto os sol<strong>da</strong>dos eiiropeus recorreni ao exercicio<br />
physico dos sports athleticos para resistirem melhor á influencia do clima.)<br />
Em bTa<strong>da</strong>gast~ar tbi este regimen introduzido por Gallieni que iitilisoii largamente<br />
a máo d'obra militar. As tropas indigenas po<strong>de</strong>m ser titilisa<strong>da</strong>s<br />
n;i constriicçáo <strong>da</strong>s vias <strong>de</strong> commiinicação, em traballios <strong>de</strong> saneamento, e<br />
na construcçáo <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as obras e edificaçces que se ~)reii<strong>da</strong>ni com o serviço<br />
militar. Assim, os alo,jamtntos <strong>de</strong>vem ser construidos pela propria<br />
força que os tiver <strong>de</strong> habitar.<br />
Para aqiiartelamento <strong>de</strong> indigenas, em vez <strong>de</strong> iitilisar riiodFloh estii<strong>da</strong>dos<br />
na Europa com to<strong>da</strong>s as condiqfies hygienicas, mas inadiiptavci.: ,icondições<br />
locaes oii aos reciiràos orq:tmentacs, 4 preferivel escolher o proprio<br />
typo dfi hahitacÁo indigenii, com as pequenas modificaçóes que se jnlgarem<br />
necessarias para melhorar as respectivas condições <strong>de</strong> meio r tle<br />
hygiene. N'esta qriestiXo <strong>de</strong> alo,jamcnto, B convenientc, respeitar, qnanto<br />
possivel, a organisaçao <strong>da</strong> fitmilia indigena, náo separando os sol<strong>da</strong>dos <strong>da</strong>i:<br />
suas melheres, ou permittindo que estas resi<strong>da</strong>m nas proximi<strong>da</strong><strong>de</strong>s cfo~.<br />
quarteis. I'ara as populações negras <strong>da</strong>s colonias dii Africa trol~ical, o<br />
melhor systcma parece-nos ser o que Eduardo Costa preconizoii. Sempre<br />
que iis condições <strong>de</strong> segurança a isso se não opponham, (leve se dispor os<br />
sol<strong>da</strong>dos indigenas em povoações arrua<strong>da</strong>s e limpas, on<strong>de</strong> ca<strong>da</strong> sol<strong>da</strong>do habite<br />
com a sua miilher em palhota especial, havendo sempre ao abrigo <strong>da</strong><br />
fortificação uma caserna para conter pelo menos um terço <strong>da</strong> sita gtiarniçHo.<br />
(')<br />
Lanessan, escrevendo acerca <strong>da</strong>s relações entre os sol(Iac1os e os po-<br />
(I)<br />
E'ur,jaz cle Serpa. Pirnentel - ,\o Ilistricto (lu APoccl~>thiqzic.
pulaçóes indigenas, sdlienta a rapi<strong>de</strong>z com que o sol<strong>da</strong>do indigena adquire<br />
a convicçtio <strong>de</strong> que a sua nova condiçáo basta para lhe <strong>da</strong>r siiperiori<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
sobre todos os <strong>da</strong> sua raça incluindo as proprias auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>x indigenas, o<br />
que o leva a commetter mil tropelias roubando, insultando e batendo nos<br />
seus conci<strong>da</strong>dlos, e, o que é mais, imitando os europeus no <strong>de</strong>srespeito pelas<br />
crenças religiosas e pelos costumes trtttlic~cionxes. Partindo d'estas a6rmaçóee,<br />
o auctor citado con<strong>de</strong>mna o aqiiartelwmento <strong>da</strong>s tropas indigenas<br />
nas povoaçóes importantes, dizendo que o sei1 ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro logar é nos postos<br />
mais afastados do interior. Não é acceitavel esta opiniao evi<strong>de</strong>ntemente<br />
exagera<strong>da</strong>. As premissas são ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iras, a cuncliisáo é falsa. E claro<br />
que não ha <strong>de</strong>svantagem, antes pelo contrario é convenientissimo, que o<br />
prestigio e o orgulho do uniforme se radiquem fun<strong>da</strong>mente rios sol<strong>da</strong>dos<br />
indigenas, e quando haja exteriorisações prt~judicines d'esse orgulho, aliás<br />
naturaes em povos poiico civilisados, náo se impute a siia nocivi<strong>da</strong><strong>de</strong> á<br />
prosapia do sol<strong>da</strong>do indigcna mas antes r cxcliisivan~ente á tibieza dos<br />
chefes europeus que não tenham sabido manter integra a disciplina militar.<br />
De resto o proprio Lanessaii diz qiie os ~oldiido~ iniligenas <strong>de</strong>sacatam<br />
a religigo e os eostiimes usantlo dos mesmos processos que os enropeiis. Ora<br />
saibam os chefes e gríiduados cliiropeus nianter ;I boa disciplina e <strong>da</strong>r apenas<br />
bons exemplos, que as tropas iiidigenas seráo proveitosamente utilisaveiu<br />
em to<strong>da</strong> a parte.<br />
Além <strong>da</strong>s tropas indigenas regulares, po<strong>de</strong> haver tambem nas colonias<br />
corpos <strong>de</strong> irregulares acompanhando o nucleo <strong>da</strong>s forças regulares,<br />
umas vezes comman<strong>da</strong><strong>da</strong>s pelos seus proprios chefes, e outras vezes sob o<br />
commando <strong>de</strong> officiaes europeus. Quasi to<strong>da</strong>s as napões coloniaes teem lançado<br />
mão d'este recurso para engrossarem os setis effectivos <strong>de</strong> campanha,<br />
poupando as uni<strong>da</strong><strong>de</strong>s regularmente constitui<strong>da</strong>s ao embate directo do inimigo<br />
e aos sobresaltos <strong>da</strong>s avança<strong>da</strong>s, e reservando-as para a acção <strong>de</strong>cisiva.<br />
Nas colonias portuguezas tem-se sabido tirar partido com rara habili<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
dos irreglilares indigenas. Na Zambezia os cipaes do Governo, <strong>da</strong>s<br />
Companhias e dos Prazos, além <strong>de</strong> terem tomado uma parte activa e brilhante<br />
em to<strong>da</strong>s as campanhas ali realisa<strong>da</strong>s, teem por si só, sob o commando<br />
d'um ou <strong>de</strong> outro funccionario portugiiez, procedido á paci,lcaçRo<br />
5'1
514 POLITICA INDIQENA<br />
completa <strong>da</strong>s extensas regióes em que operam. Outra cathegoria <strong>de</strong> auxiliares<br />
do serviço militar, indispensavel em muitas colonias, Q a dos carregadores.<br />
Quando estiidámos as condiçóes clo trabalho indigena apont&mos as<br />
con~equencias, nefastas para a raça e para a civilisação, d'essa coruée brutal<br />
e extenuante que a inviabili<strong>da</strong><strong>de</strong> dos sertóes prolongará ain<strong>da</strong> infelizmente<br />
por muito tempo. Qiiando se tenha <strong>de</strong> recrutar carregadores, B preferivel<br />
requisitá-los mo<strong>de</strong>ra<strong>da</strong>mente aos seus chefes, sem estabelecer imposições<br />
\.iolentas. O pêzo <strong>da</strong>s cargas <strong>de</strong>ve ser limitado a um maximo razoavel, a<br />
duritçáo <strong>da</strong> marcha diaria nKo <strong>de</strong>ver& exce<strong>de</strong>r o numero <strong>de</strong> horas que esses<br />
indigenas habitualmente caminharem quando viajando no matto, e a jorna<strong>da</strong><br />
completa nunca <strong>de</strong>verá afàst.ar inuito os carregadores <strong>da</strong>s povoaçóes on<strong>de</strong><br />
tiverem sido recrutados.<br />
Composiçáo <strong>da</strong>s guarniç<strong>de</strong>s <strong>da</strong> marinha colonial<br />
O elemento indigena n8o se limita a fornecer aos colonisadores bons<br />
sol<strong>da</strong>dos. Frequentemente as populações manifestam <strong>de</strong>cidi<strong>da</strong> propensão<br />
1):ira os serviços maritimos e Q com a maior vantagem que se <strong>de</strong>ve tipro-<br />
veitar bsa ten<strong>de</strong>ncia na composição <strong>da</strong>s guarniçóes <strong>da</strong> marinha colonial <strong>de</strong><br />
guerra e mercante, utilisando-as especialmente nos serviços que, sob a acção<br />
<strong>de</strong>primente dos climas tropicaes, mais <strong>de</strong>pauperam o organismo dos euro-<br />
peus. Remadores, fogueiros, chegadores e pessoal <strong>de</strong> dispensa são os mis-<br />
teres mais distribuiveis aos indigenas africanos.<br />
Nas nossas colonias ha optimos elementos que muito conviria apro-<br />
veitar em rnai.~<br />
larga escalla do que já hqje se faz. Os zambezianos são<br />
geralmente excellentes marinheiros e chegadores; os cabin<strong>da</strong>s na costa<br />
occi<strong>de</strong>ntal e os macúas do Ibo são os mais correctos, primorosos e resisten-<br />
tes remadores que conhecemos. Náo se rema melhor na canoa almirante <strong>de</strong><br />
qualquer jiflng~lzip britannico.<br />
Sem os pilotos indigenas do Zambçze que, além dos cinco sentidos
UTILISA ÇÃO MILITAR 513<br />
<strong>da</strong>dos ao homem possuem certamente O que lhes permitte adivinhar o canal<br />
navegavel, e predizer a sua profundi<strong>da</strong><strong>de</strong> no meio d'aquella intrincadissima<br />
rd<strong>de</strong> <strong>de</strong> milhares e milhares <strong>de</strong> canaes constantemente variaveis; sem esse<br />
instincto marttrilhoso, a navegação do baixo Zambeze quasi que se não po-<br />
doria effectuar. Todos os navios <strong>de</strong> guerra portuguezes estacionados em<br />
Angola ou Moçambique recebem ao chegar ít estação um pessoal supplea<br />
mentar <strong>de</strong> rematlorea e ás vezes <strong>de</strong> serviçaes e cosinheiros indigenas, que<br />
se recrutam a granel, como é possivel, recebendo-se ás vezes o pessoal do<br />
navio que se foi ren<strong>de</strong>r. Nos navios propriamente <strong>da</strong> estação ha uma lotação<br />
fixa para este pessoal que geralmente comporta tambem um certo numero<br />
<strong>de</strong> ohegadores. Na<strong>da</strong> se tem feito, porém, para instruir o pessoal e p m<br />
organisar uma corporação militar como ha tanto tempo se <strong>de</strong>veria ter feito.<br />
Nas officinas navaes ou aracnaes do Estado po<strong>de</strong>riam ser organisados cnr-<br />
sos profissionees para os indigenas, que ali apren<strong>de</strong>riam, n8o sd como ope-<br />
rarios livres, mas tambem como praças <strong>da</strong> marinha colonial, os mistéres<br />
praticados a bordo, torneiros, carpinteiros, serralheiros, etc. Esth tam-<br />
bem intiicadir. a creaqiio <strong>de</strong> tres escolas <strong>de</strong> marinheiros indigenas, uma em S.<br />
Vicente ou na Praia para os cabover<strong>de</strong>anos, outra em Loan<strong>da</strong> para os ca-<br />
bin<strong>da</strong>s, e outra em Quelimane ou eni Moçambique para os indigenas d'esta<br />
colonia. Na<strong>da</strong> <strong>de</strong> organisaçóes pomposas e caras. Um casco <strong>de</strong> canhoneire<br />
já con<strong>de</strong>mna<strong>da</strong> para navegar no mar apparelha<strong>da</strong> ad hoc, um <strong>de</strong>posito em<br />
terra, um segundo tenente comman<strong>da</strong>nte, algumas pragas do estado menor<br />
como instructores, e um capelláo encarregado <strong>da</strong> doutrinação religiosa e<br />
<strong>de</strong> breves noçóes <strong>de</strong> historia patria. Estas escolas seriam, ao mesmo tempo,<br />
<strong>de</strong>positas centraes do pessoal indigena em via <strong>de</strong> transferencia, e do que<br />
recolhesse dos navios que regressassem á metropoIe, e proce<strong>de</strong>riam a to<strong>da</strong><br />
as operaçóes do recriitamento indigena organisando eepara<strong>da</strong>mente 0s qua-<br />
dros dos marinheiros, dos serviçaes e do pessoal <strong>de</strong> fogo.<br />
Se eln Portugal (33 serviços <strong>da</strong> marinha colonial estivessem separa-<br />
dos dos <strong>da</strong> <strong>de</strong> combate, (') d'esta organisaçáo <strong>de</strong> quadros indigenas<br />
(1) Essa separação. tão necessaria, parece que vir& a ser uma <strong>da</strong>s primeiras<br />
medi<strong>da</strong>s do programrna administrativo do actual titular <strong>da</strong> pasta <strong>da</strong> marinha e a-<br />
*
616 POLITICA INDIGENA --- ---- -- ----<br />
que preconizamos resultaria uma consi<strong>de</strong>ravel economia. Com effeito. c*<br />
pessoal branco seria reduzido ao stricto indispensavei, poupando-se a im-<br />
portante verba dos transportes para o reino, e diminuindo-se o numero dos<br />
europeus reformados por lesúes organicas <strong>de</strong>riva<strong>da</strong>s <strong>de</strong> infecçúes palustres.<br />
AlBm dvisso, o marinheiro preto ertt muito menos dispendioso; nko scí o pret<br />
podia ser muito mais reduzido, mas ain<strong>da</strong> e principalmente as <strong>de</strong>spezas<br />
com o seu sustento po<strong>de</strong>m consi<strong>de</strong>rar-se uma ridicularia, quando compara-<br />
<strong>da</strong>s com as que importa a alimentaç80 em Africa d'uma guarnição brancha.<br />
O arroz é a base essencial <strong>da</strong> alimentação indigena, e, com uma pequeiia<br />
gratificação <strong>de</strong> 20 ou 30 reis diarios per eaput, os ranchos indigenas <strong>de</strong> ca<strong>da</strong><br />
guarnição teriam o sufficiente para comprarem o qtrissuu, isto é, os tem11F-<br />
ros e o acompanhamento do arroz. Compare-se isto com as <strong>de</strong>spezas cor-<br />
respon<strong>de</strong>ntes ao ciimprimeiito <strong>da</strong> tabella <strong>de</strong> rancho em vigor na Arma<strong>da</strong><br />
Nacional, nas colonias on<strong>de</strong> os generos alimenticios tanto sobem <strong>de</strong> preço,<br />
e avalie-se a gran<strong>de</strong> economia qiie resultaria <strong>da</strong> creaqáo do corpo <strong>de</strong> auxi-<br />
liares indigenas <strong>da</strong> marinha colonial. Haveria to<strong>da</strong> a vantagem em milita-<br />
risar esse corpo, para o tornar coiisietente, homogenco, e para po<strong>de</strong>r cas-<br />
tigar severamente o <strong>de</strong>licto <strong>de</strong> <strong>de</strong>serçko. Coni o pessoal contractatlo<br />
actualmente em serviço, se os navios vão a Lourenço Marques, as <strong>de</strong>ser-<br />
çúes succe<strong>de</strong>m-se todos os dias e não ha maneira <strong>de</strong> as prevenir em abso-<br />
luto, nem lei que justifique lima penalitia<strong>de</strong> exemplar. Os indigenas sRo<br />
contractados no Chin<strong>de</strong>, em Quelimane, em Moc;ambique, etc., por mensali-<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong>s que variam entre 2$000 a 5$000 reis, e chegados a Loiirenqo Mar-<br />
ques on<strong>de</strong> o trabalho braçal nos caes t: pago <strong>de</strong> 450 a ]$O00 reis<br />
diarios, e on<strong>de</strong> um cosinheiro indigena chega a ganhar 7 e 8 libras por mez,<br />
não hesitam um segundo em <strong>de</strong>sertar. Acoitam-se na temòn o tempo que<br />
dura a permanencia do navio no porto, e quando este regressa aos portou<br />
do norte, reapparecem elles na ci<strong>da</strong><strong>de</strong> on<strong>de</strong> se empregam liicrativamentc..<br />
mar, Conselheiro João <strong>de</strong> Azevedo Continho, ciijo brilhantissimo passado como mili-<br />
tar <strong>de</strong>stemido e como colonial distincto, <strong>de</strong>ixa antever a esperança <strong>de</strong> vi<strong>da</strong> NOIV~<br />
intelligentemente orienta<strong>da</strong>, na administra~Ho <strong>da</strong> Marinha e <strong>da</strong>s coionias.
A militarisaçáo do pessoal indigena, attenuava consi<strong>de</strong>ravelmente<br />
estes inconvenientes, e facilitava a instrucção e edticaçZo que, fia impos.<br />
sibili<strong>da</strong><strong>da</strong> <strong>de</strong> ser ministra<strong>da</strong> a bordo, porque os arduos e constantes servi-<br />
ços do mar não <strong>de</strong>ixam livre senh o tempo indispensavel ao repouzo,<br />
<strong>de</strong>veria ser organisa<strong>da</strong> nas escolas qiie propomos, on<strong>de</strong> todos os indigenas<br />
recrutados estacionariam alguns mezes, antes do seu embarque <strong>de</strong>finitivo<br />
n'lim dos navios <strong>da</strong> marinha colonial.<br />
A instrucçko para os indigenas, quer sol<strong>da</strong>dos, quer marinheiros,<br />
<strong>de</strong>ve assentar sobre a mesma base uniforme, e orientar-se <strong>de</strong> maneira a<br />
que, findo o tempo <strong>de</strong> serviço militar, uns e outros regressem ás suas al-<br />
<strong>de</strong>ias com o verniz <strong>da</strong> civilisação soli<strong>da</strong>mente incrustado na malleabili<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
do carttcter, c levando comsigo o fermento excitador do progresso sociologico.<br />
Policia indigena<br />
Temos assim rripí<strong>da</strong>mente mostrado a possibili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> iitilisaçáo do<br />
elemento indigena na <strong>de</strong>feza <strong>da</strong> colonia, e indicámos as regras geraes a<br />
que, segundo enten<strong>de</strong>mos, <strong>de</strong>ve subordinar-se essa utilisaçálo. Resta-nos<br />
fallar do emprego dqs indigenas na policia colonial, on<strong>de</strong> prestam tambem<br />
inestimavais serviços.<br />
O problema <strong>da</strong> organisaçáo <strong>da</strong> policia colonial é variavel para ca<strong>da</strong><br />
colonia, e um systema que n'uma dê excellentes resultados, po<strong>de</strong> resultar<br />
<strong>de</strong>ficiente oii prcjiidicial quando applicado a outro meio colonial em que as<br />
condiçúes sejam diversas.<br />
h policia colonial po<strong>de</strong> ser militar ou civil. No primeiro caso apenas<br />
diflere praticamente do exercito, em estar directamente <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>da</strong> au-<br />
ctori<strong>da</strong><strong>de</strong> civil. Nos paizes mal pacificados é esta a fórma preferivel. No<br />
segiindo caso, a policia B constitui<strong>da</strong> por elementos civis, e é principal-<br />
mente aproveitavel nas colonias completamente submetti<strong>da</strong>s e socega<strong>da</strong>s.<br />
Seja, porém, qual fôr a organisaçiio policial adopta<strong>da</strong>, o emprego dos indi-
genas 6 lima necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> inilludivel. A manutcnçko <strong>de</strong> (luadros exclusiva-<br />
mente europeus seria <strong>de</strong> tal maneira dispendiosa que rienliuiii orçamento<br />
colonial a supportaria. Em Africa ou no Oriente a policia indigena 6, pois,<br />
uma necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>, e como tal tem sido organisa<strong>da</strong> ern todos os estabeleci-<br />
mentos coloniaes. Na India Ingleza existem dois corpos <strong>de</strong> policia inteira-<br />
mente ciifferentex, um civil e outro militar, ambos instruidos por officiaes<br />
ou inspectores europeus, mas quasi sempre comman<strong>da</strong>dos por officiaes in-<br />
digenas. Os effectivos <strong>da</strong> policia militar moiitain a perto <strong>de</strong> 70:000 homens.<br />
Na Birtnania a policia 6 exclusivamente militar e forma<strong>da</strong> por indigenas<br />
Siklis e Gurkhas, absolutan~ente estranlios ao paiz que ain<strong>da</strong> náo esta com-<br />
pletamente tranquillo.<br />
Em quasi to<strong>da</strong>s as colonias do Extremo Oriente existe, em ca<strong>da</strong> al-<br />
<strong>de</strong>ia iridigena, ou em ca<strong>da</strong> communa, lima policia especial que os colonisado-<br />
res mais ou menos teem mantido. Os hollan<strong>de</strong>zes, principalmente, teem sabido<br />
tirar partido d'essa instituição. Segundo diz Reinscli, a administraçno <strong>da</strong>s<br />
Indias Orieiltaes Neerlan<strong>de</strong>zas nGo retribue n policia rural <strong>da</strong>s <strong>de</strong>sns, que<br />
continíia mol<strong>da</strong><strong>da</strong> na instituiçao primitiva, sendo todos os indigenas obri-<br />
gados a servir rotativamente por periodos ciirtos na policia local. Por este<br />
moti\w, as <strong>de</strong>spezas policiaes n'aquellas colonias reduzem-ye :to indispensa-<br />
vel para sustentar os corpos <strong>da</strong> policia, iirhana e <strong>da</strong> que particularmente<br />
se <strong>de</strong>stina a vigiar e manter a orclem rios hairros ou agglomeraçóes <strong>de</strong><br />
immigrantes chinezeà. Na Indo-China, além <strong>da</strong> policia incligena <strong>da</strong>s commii-<br />
ni<strong>da</strong><strong>de</strong>s annamitas e <strong>da</strong> policia urbana parte europeitt e parte indigena,<br />
.existe um corpo especial <strong>de</strong>nominado Gar<strong>de</strong> Ithdi,yi.ne tle 2'Irzdo-Chirhe. I3<br />
uma força <strong>de</strong> policia arma<strong>da</strong> <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>da</strong>s nuctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s administrativas.<br />
6 <strong>de</strong>stina<strong>da</strong> As operaçóes <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> policia. Deve assegurar o policiamento<br />
interior, fornecer escoltas, proteger comboyos militares, fazer a guar<strong>da</strong> aos<br />
edificios do Estado e garantir a segurança <strong>da</strong>s vias <strong>de</strong> coinmunicaçiio. Os<br />
officiaes e sargentos são europeus que, tendo feito parte do exercito colonial,<br />
tenham tido n'essa condipão <strong>de</strong>mora<strong>da</strong> permanencia na colonia.<br />
l? convicção geral que a policia militar, <strong>de</strong>stinando-se mais geral-<br />
mente a operar em regióes mal submetti<strong>da</strong>s, <strong>de</strong>ve ser forma<strong>da</strong> por indige-<br />
ias provenientes <strong>de</strong> outra colonia ou pertencendo a tima raça differente.
natural que assim <strong>de</strong>va ser, mas os factos provam indiscutivelmente que,<br />
mesmo n'essa hypothese, B muitas vezes possivel empregar nas operaçóes<br />
<strong>de</strong> policiamento os proprios elementos locaes. O exemplo <strong>da</strong> cita<strong>da</strong> Gar<strong>de</strong><br />
Indiydne <strong>da</strong> Indo-China que durante o governo tle Lanessan levou a effeito<br />
a pacificação do Delta, julga<strong>da</strong> quasi impossivel, e ain<strong>da</strong> os maravilhosos<br />
resultados obtidos nas Philippinas pelos americanos, com a sua policia in-<br />
digena, Pltilippin~ Constnbulnry, em que os europeus s6 entram como offi-<br />
ciaes, <strong>de</strong>nionstram cabalmente essa possibili<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
Em to<strong>da</strong>s as colonias on<strong>de</strong> exista uma organisação policial, embora<br />
rudimentar, <strong>de</strong>ve esta ser conserva<strong>da</strong> com ou aperfeiçoamentos que a civi-<br />
IisaçFto impozer e que não váo <strong>de</strong>svirtuar os sens fins, ou transformar os<br />
seus mol<strong>de</strong>s essenciaes. Sas colonias <strong>de</strong> populapóes barbaras, mas on<strong>de</strong><br />
como em todos os eqtabelecimentos coloniaes se <strong>de</strong>vem conservar as aucto-<br />
ri<strong>da</strong><strong>de</strong>s administrativas indigerias, 4 <strong>da</strong> maior conveniencia entregar a<br />
essas auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s o serviço <strong>de</strong> policiamento do territorio sobre que exer-<br />
cem influencia permittindo que possam dirigir ellas proprias a policia in-<br />
digena, embora sob a sua responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong> individual, e sempre subordina-<br />
<strong>da</strong>s ao resi<strong>de</strong>nte administrativo europeu <strong>de</strong> que <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>rem. Antes <strong>da</strong><br />
pacificação, não terá razáo <strong>de</strong> ser este systema <strong>de</strong> policiamento; entbo<br />
to<strong>da</strong>s as operaçBes militares e a manutenc;%o <strong>da</strong> or<strong>de</strong>m incumbem 6s for-<br />
ças regiilares, ou, quando menos, a um corpo <strong>de</strong> policia militarmente orça-<br />
nizado, enquadrado e coinman<strong>da</strong>do por europeus. Porém, urria vez asse-<br />
gura<strong>da</strong> a tranquillitla<strong>de</strong> <strong>da</strong> colonia em que o elemento aiitoctitone seja<br />
numeroso, é precizo applicar á organizasão <strong>da</strong> policia o lemma <strong>de</strong> admi-<br />
nistraçlo indigena, <strong>de</strong> que os indi!l~ilns <strong>de</strong>v~»1<br />
ser trdmirti,$trtidos por intw-<br />
rnedio <strong>de</strong> indigenas.<br />
E' esta a formula mais a<strong>da</strong>ptavel ás circumstancias geraes <strong>da</strong>s colo-<br />
nias africanas. Entregar aos chefes indigenas a policia dos seus adminis-<br />
trados, e fazer exigir-lhes severamente as SUHS responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong>s pelas au-<br />
ctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s europeias administrativas ou militares é, no nosso enten<strong>de</strong>r, uma<br />
<strong>da</strong>s melhores maneiras, senáo a unica efficaz, <strong>de</strong> ~oliciar<br />
o sertão africano.<br />
Nas agglomeraçúes urbanas as condiçóes sgo muito diversas; a existencia<br />
d'um gran<strong>de</strong> numero <strong>de</strong> europeus, sempre pouco dispostos a admittir se-
,520 POLITICA INDIGENA<br />
quer a possibili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> intervenção d'uma auclori<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena nos seus<br />
actos, ain<strong>da</strong> os mais criminosos, faz con<strong>de</strong>mnar o emprego, pelo menos ex-<br />
clusivo, <strong>da</strong> policia indigena que forçosamente viria a ser inutil, ou <strong>da</strong>ria<br />
azo a situaçóes <strong>de</strong> manifesto <strong>de</strong>sprestigio para a corporagho.<br />
Nas ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s eni que predomine gran<strong>de</strong>mente o elemento europeu, a<br />
policia branca e civilmente organiza<strong>da</strong> é a melhor forma <strong>de</strong> garantir a<br />
or<strong>de</strong>m publica. Quando o elemento indigena seja tambem muito numeroso,<br />
e principalmente quando se agriipe em bairros especiaes, como ordinaria-<br />
mente acontece com os chinezes e com os pretos, torna-se entso muito<br />
necessaria a constitiiiçíio <strong>de</strong> foryad <strong>de</strong> policia indigenn especialmente <strong>de</strong>s-<br />
tina<strong>da</strong> a policiar esses bairros,<br />
Nas colonias <strong>de</strong> vastissima extens8o territorial, em que os colonos<br />
europeus que se <strong>de</strong>dicam á indiistria agricolit ou mineira se encontram<br />
isolados, a gran<strong>de</strong>s distancias uns dos outros e dos centros populosow, e por-<br />
tanto sujeitos a serem, pessoalmente ou nos seus haveres, victimas <strong>de</strong> mal-<br />
feitores, impóe-se a institiiiçko cle corpos <strong>de</strong> policia irionta<strong>da</strong>, bem arma<strong>da</strong><br />
e dota<strong>da</strong> <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> mobili<strong>da</strong><strong>de</strong> que lhe permitta longas patr:ilhas, e acor-<br />
rer rapi<strong>da</strong>mente on<strong>de</strong> o seu aiixilio fôr necessario. Este systerna <strong>de</strong>u ex-<br />
cellentes resultados na Australia.<br />
Portugal táo bem tem sabido utilisar o concurso dos indigenas <strong>da</strong>s<br />
suas colonias na constituição <strong>da</strong>s tropas regulares, como na formaç&o dos<br />
corpos <strong>de</strong> policia. Em Macau, na India e em Africa, é sempre com reco-<br />
nheci<strong>da</strong> vantagem que assim se tem procedido. Em Moçambique, por exem-<br />
plo, as ensacas <strong>de</strong> cipnes emprega<strong>da</strong>s na policia rural do norte ao sul <strong>da</strong><br />
provincial umas vezes submetti<strong>da</strong>s directamente ás auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s europeias<br />
e outras vezes sob a direcção dos chefes indigenas, teem sido um admira-<br />
vel instrumento <strong>de</strong> pacificação e <strong>de</strong> penetração. Acerca <strong>da</strong> utilisaçiio d'estes<br />
irregulares no districto <strong>de</strong> Moçambique escreve o Sr. Conselheiro Forjaz<br />
<strong>de</strong> Serpa Pimentel as seguintes palavras. (')<br />
UTILISAÇ2&0 MILITAR 521<br />
bom serviço nas se<strong>de</strong>s <strong>da</strong>s capitanias e nas chefias do Mossuril, quer na<br />
manutenção <strong>da</strong> obediencia <strong>da</strong>s populaçBes indigenas ao nosso domicio, quer<br />
na do socego <strong>da</strong>s populaçóes, no arresto <strong>de</strong> criminosos, na execução <strong>da</strong>s<br />
or<strong>de</strong>ns administrativas, na segurança dos caminhos, e na policia <strong>da</strong>s povoa-<br />
çóes. Estes corpos locaes, especie <strong>de</strong> milicias ou tropas <strong>de</strong> 2." linha, não<br />
teem ain<strong>da</strong> uma organisaçiio que os habilite a <strong>de</strong>sempenliar efficazmente<br />
todos os seus <strong>de</strong>veres policiaes, po<strong>de</strong>ndo comtudo tê-la já, se não cahisse<br />
no limbo, como tantos outros, o projecto <strong>de</strong> organ,iançilo e recrutamento dos<br />
cypais, elaborado em 1898 pelo sr. Eduardo Costa, projecto que organisava<br />
em boas e soli<strong>da</strong>s bases estas milicias. E comtudo urge que taes corpos<br />
sejam <strong>de</strong>vi<strong>da</strong>mente organisados, porque as ensacas <strong>de</strong> cipais <strong>de</strong>vem ir sub-<br />
stituindo as fôrças regulares. á medi<strong>da</strong> que o dominio fôr sendo por com-<br />
pleto effectivo e real, e se possa ir continriando a applicar ao districto o<br />
estabelecimento <strong>de</strong> chefias, pois está mais que <strong>de</strong>monstrado que o melhor<br />
e mais efficaz policiamento <strong>da</strong>s populaçóes indigenas é o dirigido pelos<br />
chefes e cabos <strong>de</strong> terras e executado pelas ensacas <strong>de</strong> cipais, mórmente<br />
tornando aquelles responsaveis pela segurança dos seus territorios, pela<br />
entrega dos culpaveis <strong>de</strong> assassino, roubo, etc., visto serem elles os que<br />
melhor conhecem os usos e costumes dos povos, e portanto os que melhor<br />
po<strong>de</strong>rão, na maior parte dos casos, dirigir estes serviços.<br />
Effectivamente, as ensacas <strong>de</strong> cipaes são a organisação policial que<br />
com mais garantias <strong>de</strong> exito po<strong>de</strong>mos empregar nas nossas colonias <strong>de</strong><br />
Africa. A experiencia está já largamente feita, e o effeito d'essa organisa-<br />
ção na occupação e policiamento <strong>da</strong> Zambezia é <strong>de</strong> mol<strong>de</strong> a tornar acon-<br />
selhavel a sua generalisaçko a to<strong>da</strong>s as regióes africanas on<strong>de</strong> o nosso<br />
dominio estêja consoli<strong>da</strong>do. Mesmo nas sé<strong>de</strong>s e circumvizinhanças dos<br />
eommandos militares é preferivel entregar aos cipaes o policiamento <strong>da</strong>s<br />
terras.<br />
As ensacas <strong>de</strong> cipaes como policia rural, e corpos <strong>de</strong> ~olicia civil<br />
europeia nas ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s, correspon<strong>de</strong>m quasi completamente As exigencias<br />
actuaes <strong>da</strong>s nossas gran<strong>de</strong>s possessúes africanas. Na India e em Nacau a<br />
utilização dos indigenas na policia urbana offerece menos inconvenientes<br />
que em Africa. Na Guiné, o estado <strong>de</strong> insubmissfio quasi geral do gentio
522<br />
I<br />
POLITLCA INDIUXNA<br />
-----<br />
obriga, por emquanto, a confiar o policiamento <strong>de</strong> Lo<strong>da</strong> a ~oionia 6s forças<br />
militares regulares, cujos effectivos tanto carecem <strong>de</strong> eer augmentados.<br />
Utilisação <strong>da</strong>s tropas indigenas fóra <strong>da</strong>s respectivas colonias<br />
Uma questão interessante, discuti<strong>da</strong> por varios escriptores coloniaes,<br />
é a do emprego dos effectivos militares indigenas nas operaçóes <strong>de</strong> occupa-<br />
ção e no servivo <strong>de</strong> guarnição fbra do territorio <strong>da</strong> colonia a que perten-<br />
cem. Será legal esse emprego? Será possivel? Trará vantagens? Quanto<br />
á legali<strong>da</strong><strong>de</strong>, evi<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>da</strong>s condiçóes em que se effectuou o<br />
recrutamento, e <strong>da</strong> propria lei organica <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> exercito colonial.<br />
Que é possivel, os factos o teem <strong>de</strong>monstrado <strong>de</strong> maneira a não<br />
<strong>de</strong>ixar duvi<strong>da</strong>s. Quanto ás vantagens d'eusa iitilisaçáo, ellas <strong>de</strong>rivam na-<br />
turalmente <strong>da</strong> indole <strong>da</strong>s populaçóes indigenas que constituirem as tropas<br />
transporta<strong>da</strong>s, e <strong>da</strong> natureza do serviço em que estas venham a ser em-<br />
prega<strong>da</strong>s.<br />
A questfio po<strong>de</strong> encarar-se sob dois aspectos diversos: transporte<br />
<strong>da</strong>s forças indigenas para outras colonios <strong>da</strong> mesma nação, ou utilisação<br />
d'essas forças na <strong>de</strong>feza do territorio <strong>da</strong> propria metropole. Em qualquer<br />
d'estas duas hypotheses, ha ain<strong>da</strong> a atten<strong>de</strong>r se as tropas indigenas se<br />
<strong>de</strong>stinam a operações militares activas, ou simplesmente a reforqar CI ser-<br />
viço <strong>de</strong> guarniçko.<br />
Examinêmos em <strong>de</strong>talhe ca<strong>da</strong> uma d'essas situaçóes e vejamos quaes<br />
são as respectivas possibili<strong>da</strong><strong>de</strong>s. No caso do tr:inuporte se effectuar para<br />
outras colonias ou paizes exoticos, on<strong>de</strong> a or<strong>de</strong>m publica esteja perturba<strong>da</strong><br />
e as tropas indigenas vão augmentar os effectivos do campanlia, não ha<br />
razoes importantes que <strong>de</strong>saconselhem o seu emprego. Eleva-se o nivel<br />
moral d'esses contingentes, aperfeiçoa-se a sua educação militar, poupa-se<br />
a <strong>de</strong>speza muito superior com o transporte <strong>de</strong> contingentes europeus <strong>da</strong><br />
metropole, e, Gomo esse emprego é naturalmente transitorio, n8o sobrevem,
entre os indigenas transportados, a reluctancia natural ciiiantlo se trata<br />
d'uma expatriação prolonga<strong>da</strong>. Os exemplos d'esta utilisaçáo são, neste<br />
caso, muito numerosoFi. As companhias tle Iandins rccriitados em Movambique<br />
teem sido emprega<strong>da</strong>s cbrn txito notavel, em Angola, na GuinB e<br />
recentemente em Timor. Os fra~icezes empregam os seus magnificos corpos<br />
<strong>de</strong> atiradores senrgalezes em to<strong>da</strong>s as suas campanhas africanas. A Inglaterra<br />
forneceu á columna internacional do niarechal (te Wal<strong>de</strong>rsee, que<br />
foi soccorrer as legaçócs em Pekim, na<strong>da</strong> menos <strong>de</strong> 13:200 sol<strong>da</strong>dos hindús,<br />
al6m dos aqnartelados sm Hong-Kong. Na guerra com o Transwaal figuravam<br />
no exercito inglez, ao lado <strong>da</strong>s uni<strong>da</strong><strong>de</strong>s europeias, 21 regimentos <strong>da</strong>s<br />
Native Troops do impcrio indiano.<br />
Se as tropas transporta<strong>da</strong>s para outras colonias se <strong>de</strong>stinarem ao<br />
serviço <strong>de</strong> guarnição, j& então ha a contar com os inconvenientes que nascem<br />
<strong>da</strong> sobreposição <strong>de</strong> raças differentes, e com a repugnancia qne.algiimas<br />
populaçóes indigenas <strong>de</strong>monstram em abandonar o sUlo patrio. Ain<strong>da</strong> assim,<br />
iste nZo é bastante para con<strong>de</strong>mnar em absoluto o einprego <strong>de</strong> guarnições<br />
indigenas ~sf~anhas á colonia. O que é preciso 6 utilisar apenas as raças<br />
que se expatriarem voluntariamente, e só Ihes confiar fiincçóes policiaes nas<br />
locali<strong>da</strong><strong>de</strong>s on<strong>de</strong> xervir(.in, quando essas funcçóes foreiti its dc iinia r)olicia<br />
<strong>de</strong> pacificação e ociciip;t@io, retirando-lhes o seli exercicio logo qiie se trate<br />
simplesmente <strong>de</strong> manter a or<strong>de</strong>m publica, diminuincio assim as aaii>as <strong>de</strong><br />
attricto e animosi<strong>da</strong><strong>de</strong> entre o contingente indigena estranho A colonia e<br />
ás populaçóes autochtones. Os inglezes manteem constantemente uma numerosa<br />
guarniçáo hindu (sol<strong>da</strong>dos Sikhs) em Singapilra, Hoiig-Kong, etc.,<br />
que longe <strong>de</strong> lhes trazer contratempos, tem sido <strong>da</strong> maior iitilitla<strong>de</strong>. As<br />
companhias <strong>de</strong> landins <strong>de</strong> Moçamhiqne tambem actualniente estgo fazendo<br />
parte <strong>da</strong> guarniçtio permanente <strong>da</strong>s colonias j& cita<strong>da</strong>s.<br />
Consi<strong>de</strong>remos agora a hypothcse <strong>da</strong>s tropas indigenas serem appli-<br />
ca<strong>da</strong>s B <strong>de</strong>feza <strong>da</strong> metropole em caso <strong>de</strong> conficto internacional. Achamos<br />
<strong>da</strong> mais rudimentar e intuitiva justiqa que os habitantes dns colonias que<br />
tanto sangue e dinheiro custaram aos natur:tes <strong>da</strong> metropule e para cujo<br />
progresso e civilisaçRo se exhaurem os cofres c as iniciati\.as nacionaes,<br />
correspon<strong>da</strong>m a esse incalcuIave1 beneficio com o aiixilio prestante do seii
524 YOLITICA INDIGENA ,<br />
- .-<br />
braço amado, ooncorrendo irmãmente com os europeus na <strong>de</strong>feza dos inte-<br />
resses e <strong>da</strong> in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ncia <strong>da</strong> patri~. E <strong>de</strong>pois, se ee administrar sob o<br />
regimen dii assimilação politica, a patrirt B uma sC e commum a todos os<br />
nacionaes sem <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ncia <strong>de</strong> côres, <strong>de</strong> raças, <strong>de</strong> linguas ou <strong>de</strong> fronteiras<br />
geographicas. E' justa essa iitilisaçiio, e po<strong>de</strong> representar mesmo uma van-<br />
tagem militar inapreciavel.<br />
Reata saber se será possivel. Sob este ponto <strong>de</strong> vista surge, em<br />
regra, um obice importante, quando liaja <strong>de</strong> se effecturtr o transporte <strong>da</strong>s<br />
tropas indigenas pela via maritima. E' o <strong>da</strong> naçko colonial gozar, ou náo,<br />
em relação ao outro belligerante, <strong>da</strong> hegemonia naval que lhe facultari o<br />
dominio e livre transito dos mares.<br />
No primeiro caso, é sempre possivel o aproveitamento <strong>da</strong>s forcas<br />
coloniaes na metropole; no segundo caso o scu transporte 6 uma aventura<br />
perigosa e par fórma algiimn recommen<strong>da</strong>vel. A França utilisou em to<strong>da</strong>s<br />
as guerras do segundo imperio os seus batalhóes <strong>de</strong> atiradores argelinos,<br />
e na Iiistoria <strong>de</strong> Roma lia frequentes exemplos <strong>de</strong> se empregarem na <strong>de</strong>feza<br />
<strong>da</strong> propria metropole tropa? cxcliisivamente recrota<strong>da</strong>s entre os habitantes<br />
doa paizes avassalados.<br />
Finalmente, falta-nos s6 discutir a possibili<strong>da</strong><strong>de</strong> do emprego <strong>da</strong>s<br />
forças indigenas no serviço <strong>de</strong> guarniçáo <strong>da</strong> metropole em tempo <strong>de</strong> paz.<br />
E' claro que scí acci<strong>de</strong>ntalmente po<strong>de</strong>ria haver necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> importar os<br />
effectivos indigenas ((a9 colonias para guarnecer a metropole, mas, ain<strong>da</strong><br />
que easrt necessi<strong>da</strong>ile fosse muito imperiosa, o que B pouco provavel, os<br />
gran<strong>de</strong>s e inevitaveis inconvenientes d'essa medi<strong>da</strong> bastariam para a<br />
con<strong>de</strong>mnar i11 lit~rine.<br />
Os indigenas acceitarinm mal esse serviço a que não reconheciam<br />
utili<strong>da</strong><strong>de</strong> visivel, e qiie representava um longo afastamento <strong>da</strong> terra natal<br />
em climas para elles geralmente inhospitos, e as populaçóes europeias clif-<br />
ficilmente tolerariam que a or<strong>de</strong>m fosse manti<strong>da</strong> por individuos <strong>de</strong> cor e<br />
lingua differentes. Os conflictos seriam amiu<strong>da</strong>dos e o <strong>de</strong>sprestigio do tini-<br />
forme tornar-se-hia sensivel.<br />
Do que <strong>de</strong>ixamos dito conclue-se, portanto, que as tropas indigenri~
salvo n'este ultimo caso, teem sido e po<strong>de</strong>m continuar a ser empregad as<br />
com proveito, fóra tlo territorio <strong>da</strong>s respectivas colonias.<br />
Um argumeiito frequentemente levantado contra a vantagem d'easa<br />
utilisa
CAPITULO X<br />
INSTITUIÇÓES ADMINISTRATIVAS<br />
--<br />
Conservação dos organismos administrativos indigenas.<br />
Circumscripçóes indigenas.<br />
Instituições municipaes. I<br />
Conclusões geraes. I<br />
I
I i<br />
Conservação dos organismos administrativos iridigbiiis<br />
4.. . 1,eiir administration, bien qu'impnrfitite B<br />
nos yeur, a pour eux qnelque chnse d'nttraynnt, onr<br />
ilr ont grandi avec elle ; elle est en riil~pnrt nveo leors<br />
gofit.. leu= ten<strong>da</strong>nc, a, leur origiiis, leu18 prhjugbs<br />
m8me. Elle sait s'aila~ter iiox exi;ences du iiioment,<br />
admeitre <strong>da</strong> temp8r;rrnr~nts <strong>da</strong>na lea momunts diffi-<br />
ciles; hndir que nos 101s sul,; inflexiblcs, iiiexor1ib11.s ;<br />
troy dorea pour enx .......<br />
A administrã(;iXo propriamente dita <strong>da</strong>s populaçóes indigena- coiiatitiie<br />
um dos problemas iiiais complexos e importantes <strong>da</strong> politica <strong>da</strong>s raças.<br />
N'este ponto, mais cliie ein qrinlquer outro, 4 impossivel a siibordinaçáo a<br />
uma formula unitaria. O processo administrativo tem <strong>de</strong> variar ao infinito<br />
com as condiçóes locaes c com a iiidole dits raças em contacto. Qiialquer<br />
que seja, porém, a sitiiaç%o cc~lonial, c in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>da</strong> indole dos<br />
colonisadores e do elemeiito nativo, é indispensavel que o systcma adminis-<br />
trativo repouze na conservaçáo e progressivo aperfciçoamento dos primi-<br />
tivos organismos <strong>de</strong> administração.<br />
A bem <strong>da</strong> civilisaçáo, a bem <strong>da</strong> consoli<strong>da</strong>çrio do siiperorganismo<br />
colonial, B preciso que esse respeito exista e praticamente se inanifestc.<br />
É: claro que o progresso <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena náo í: producto exclu-<br />
sivo <strong>de</strong> lima auto-evoluçáo in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> influencias estranlias, é certo<br />
qne o influxo <strong>da</strong> raça dominadora se faz sempre sentir na transformaçáo<br />
sociologica dos naturaes <strong>da</strong>, colonia, ma3 tambem não é menos certo que<br />
34
530 POLITICA INDIGENA<br />
a sedimentação <strong>da</strong>s forças econornicas e dos prinoipiosi <strong>de</strong> resistencia moral<br />
sb se opdra por vagarosa stratificaçáo. O nivel social dos povos atrazados<br />
sobe com os beneficias <strong>da</strong> educaçiio, do trabalho livre, dos melhor~amentos<br />
materiaes, e <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> primacialmente do contagio exercido pela civilisação<br />
dominante.<br />
Esse contagio social aproveitado pela lei <strong>da</strong> imitação, soberana a<br />
to<strong>da</strong> a humani<strong>da</strong><strong>de</strong>, é a mais natural e talvez a mais forte causa modifi-<br />
cadora <strong>da</strong>s instituiçóes juridicas, e <strong>da</strong> organisaçáo politica e administrativa.<br />
A constituiçáo social d'tirna população primitiva sujeita ao contacto d'uma<br />
civilisação avança<strong>da</strong>, semelha uma encosta <strong>de</strong> calcareo friavel, ou praia <strong>de</strong><br />
areias moveis, constantemente bati<strong>da</strong> por vagas açouta<strong>da</strong>s <strong>de</strong> vento rijo.<br />
Poiico a pouco o fluxo montante <strong>da</strong> civilisação escavando, minando e infil-<br />
trando-se sob os alicerces mal seguros e imperfeitos <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena,<br />
vae esboroarido lenta mas continuamente, rima após outra, as instituiçóes<br />
locaes que se não baseiam na propria essencia ethnica.<br />
E ao fin<strong>da</strong>r <strong>de</strong> longo tempo, on<strong>de</strong> havia as asperezas, irregulari<strong>da</strong>-<br />
<strong>de</strong>s, imperfeiçúes e durezas d'uma terra tôsca, vC-se apenas a superficie<br />
lisa e brilhante <strong>da</strong> on<strong>da</strong> civilisadora. Aqui e acoli, emergindo saliente-<br />
mente, resistirá, como recife <strong>de</strong> dura rocha, uma ou outra d'essaa institui-<br />
çóes intimas e fun<strong>da</strong>mentaes que constituem o traço differenciador e cara-<br />
cteristico <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> agrupamento ethnico. Essas tenazes sobrevivencias<br />
conservam a sua forma e contextura primitiva mas aparecem poli<strong>da</strong>s e<br />
alin<strong>da</strong><strong>da</strong>s á superficie pela acção erosiva do ambiente social. Ao progresso<br />
sociologico dos indigenas tem <strong>de</strong> correspon<strong>de</strong>r o regimen administrativo. A<br />
medi<strong>da</strong> que um se <strong>de</strong>senvolve, complica-se o outro. As necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s econo-<br />
micas vão crescendo, as exigencias <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m intellectual variando, e, passo<br />
a passo, acompanhando essa variaçáo, vão-se ampliando as garantias admi-<br />
nistrativas. Des<strong>de</strong> que 15 impossivel a conversão brusca d'iim povo barbaro<br />
n'iim nucleo civilisado, tambem não será a po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> <strong>de</strong>cretos e <strong>de</strong> compli-<br />
ca<strong>da</strong>s organisações burocraticas que se attingirá esse <strong>de</strong>si<strong>de</strong>ratum. A raça<br />
dominante po<strong>de</strong> interferir na evoluçáo social, accelerá-la ou pôr-lhe estor-<br />
vos, mas não tem a facul<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> a regular a seu bel-prazer. A potencia<br />
assimilativa <strong>da</strong> intellectiiali<strong>da</strong><strong>de</strong> humana <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> dos vincos hereditarios
ISSTITUIQÕES ADNINISTRATIVAS<br />
-.<br />
53 1<br />
-<br />
<strong>de</strong> ca<strong>da</strong> indiviciuo, <strong>da</strong> organisaçáo dos meios <strong>da</strong> producção e<br />
do meio social.<br />
De i<strong>de</strong>ntica maneira, as institiiiçúes administrativas para serem con-<br />
sentaneas com a mentali<strong>da</strong><strong>de</strong> geral, e para correspondcrcm integralmente<br />
ao seu fim, teem <strong>de</strong> ser a consequencia pura e sirnplcs <strong>da</strong> respectiva orga-<br />
nisaçiio sociologica. O respeito pelas formas primitivas dc ailministraçáo,<br />
não significa a petrificaç50 <strong>de</strong>finitiva <strong>de</strong> qualqiier institiiiç50, mas <strong>de</strong>ve ser<br />
o principio <strong>de</strong> orientação commiim em todos os systemas <strong>de</strong> administração<br />
colonial.<br />
Administrar directamente, com legióes dc funccionarios <strong>da</strong> metropole,<br />
as popiilaçúes <strong>de</strong> paizes longinquos <strong>de</strong> que mal sc conhecem os usos, cos-<br />
tumes, indole e aspiraçúes, não chega a ser um erro porque sempre foi e<br />
será impossivel. Po<strong>de</strong>r-se-hia impor o syjtema metropolitaiio ou outra<br />
qualquer formula administrativa, po<strong>de</strong>r-se-hiam exportar para as colonias<br />
multidúes militares e burocratas, mas administração, na ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira e mais<br />
completa accepção <strong>da</strong> palavra, nunca se conseguiria fazer. Sem o contacto<br />
intimo e directo, sem a comprehensão reciproca niti<strong>da</strong> e profun<strong>da</strong> entre<br />
administradores e administrados, não po<strong>de</strong> haver adniinistração. As insti-<br />
ti~içóes crea<strong>da</strong>s serão apenas vistosos lettreiros <strong>de</strong>signando uma coisa que<br />
não existe, e o progresso social <strong>da</strong>s massas indigenas resultará sensivel-<br />
mente nullo.<br />
Se se quizessc superinten<strong>de</strong>r directamente nas minucias <strong>da</strong> adminis-<br />
tração local, ampliava-se tanto a esphera <strong>de</strong> activi<strong>da</strong><strong>de</strong> do elemento domi-<br />
nante, complicavam-se e multiplicavam-se por tal forma as engrenagens<br />
administrativas, que uma tal organisaç50 não sd seria, como diss&mos,<br />
sociologicamente prejudicial, mas ain<strong>da</strong> se tornava financeiramente irreali-<br />
savel.<br />
Quer isto dizer que se <strong>de</strong>vam <strong>de</strong>ixar as populaçóes indigenas exclu-<br />
sivamente entregues a si proprias c obe<strong>de</strong>cendo apenas aos seus chefes?<br />
Evi<strong>de</strong>ntemente não.<br />
Todos 0s esforços <strong>de</strong>vem ten<strong>de</strong>r á constituição <strong>de</strong> organismos <strong>de</strong><br />
administraçáo indigena fortes, simples e apropriados, subordinando, com-<br />
tado, o funccionarnento <strong>da</strong>s ro<strong>da</strong>gens administrativas e os actos e proce-<br />
*
532 POLITICA INDIGENA<br />
dimento do3 chefes indigenas, á fi~calisaçáo exerci<strong>da</strong> pelas a~ictori<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
europeias. Tem <strong>de</strong> se en~inar um povo a governar, como se educa um individixo<br />
para a liicta pela cxistencia. Sob este ponto <strong>de</strong> vista o simile é<br />
flagrante. As raças que mellior sabem gerir os negocio3 publicos, as que<br />
mais ostensivamente revelam ten<strong>de</strong>ncias nobres e progressivas, são precizamente<br />
aquellas em cuja eclucação individual mais largamente se atten<strong>de</strong><br />
ao fortalecimento <strong>da</strong> iniciativa priva<strong>da</strong>.<br />
Ao caracter do individuo vale mais o conselho intelligente e a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
benevola e sem mesquinhez do educador, do que a limitação cautelosa<br />
<strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as manifestaçóes <strong>de</strong> in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ncia intellertual e moral. A<br />
indole pueril dos povos atrazados convem mais a tutella educativa <strong>da</strong> raça<br />
dominadora limita<strong>da</strong> á consoli<strong>da</strong>q50 <strong>da</strong>s instituiçóes locaes, intervindo<br />
apenas para rcprimir RELISOF, remcdinr erros c introdiizir aperfeiçoamentos,<br />
do que a ingerencia directa <strong>de</strong> quem superiorincnte os governa 11a3 mais<br />
infimas particulari<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> sua vi<strong>da</strong> social.<br />
A fiscalisaqão paternal exerci<strong>da</strong> pelas aiictori<strong>da</strong><strong>de</strong>s europeias sobre<br />
os organismos administrativos indigenas, náo é sG um <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> tutella, é<br />
tambem uma necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> politica. Como garantia <strong>da</strong> siibmissão <strong>da</strong> população<br />
nativa, e ain<strong>da</strong> para que essa obediencia se exteriorise praticamente,<br />
8 indispensavel que a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> metropole se faça sentir em to<strong>da</strong> a<br />
colonia com suavi<strong>da</strong><strong>de</strong> e com brandura, mas sem o menor <strong>de</strong>sfallecimento.<br />
To<strong>da</strong>s as questóes que se relacionem com os indigenas <strong>de</strong>vem ser trata<strong>da</strong>s<br />
por intermedio dos seus chefes. I? conveniente proce<strong>de</strong>r dc maneira a que<br />
nenhiim d'estes adquira importancia ou preponcierancia exagera<strong>da</strong> que lhe<br />
possa suggerir vellei<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> revolta, e Q <strong>de</strong> boa politica equilibrar quanto<br />
possivcl o po<strong>de</strong>rio e as attribiiiq6es officiaes <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> chefe. Sobre o assiimpto<br />
escrcveu Mousinho <strong>de</strong> Albuquerque as seguintes palavras: (I)<br />
aos pequenos chefes são auxiliares ntilissiinos, indispensaveis mesmo<br />
para a administração e politica n'aquellas vastas regióes on<strong>de</strong>, por vezes,<br />
um commando tem uma area <strong>de</strong> jurisdicção muito superior á dos districtos
administrativos <strong>da</strong> metropole. Apenas os cliefes po<strong>de</strong>rosos, os que porfiem<br />
na <strong>de</strong>sobediencia é necessario supprimir ; os outros <strong>de</strong>vem ser aproveitados,<br />
e na, maneira <strong>de</strong> o conseguir, que tem <strong>de</strong> ser differente <strong>de</strong> commando para<br />
commando <strong>de</strong>ntro do mesmo cliutricto, i! que o comman<strong>da</strong>nte militar preciza<br />
applicar to<strong>da</strong> a Iiabilirld<strong>de</strong>, empregar milito tacto e prii<strong>de</strong>ncia*.<br />
A utilisaçáo <strong>da</strong>s auctori<strong>da</strong>dcs indigenau tem-se feito em larga cscalla<br />
e com o mais brilhante exito nas nossas gran<strong>de</strong>s coloiiias africanas. Na<br />
provincia <strong>de</strong> Moçambique 6 digna <strong>de</strong> menção a facili<strong>da</strong><strong>de</strong> com qiic se administram<br />
em absoluta paz e or<strong>de</strong>m as populações dos districtos do Sul c<br />
<strong>da</strong> Zambezia, sem necessi<strong>da</strong>cle <strong>de</strong> complicacliis e dispendiosa..i org;iilisaçúes<br />
civis ou militares. Os indigenas encontram-se apenas siijcitos nos seus<br />
chefes que a seu turno <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m inteiramente <strong>da</strong> aiictori<strong>da</strong><strong>de</strong> portiigueza<br />
que po<strong>de</strong> ser o administrador cla circiimscrip~2o1 o chefe do concellio, o<br />
comman<strong>da</strong>nte militar ou o capitão-mor.<br />
No maravilhoso imperio indiano, on<strong>de</strong> os inglexes empregam segundo<br />
as condiyóes locaes <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> systemad differentes <strong>de</strong> administra(:ão, é<br />
invariavelmente aproveitado tudo o que <strong>de</strong> util e do bom apresentam as<br />
institiiiçúes <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> rcqirto, conservando se crn to<strong>da</strong> a parte a organisaí;áo<br />
qiie prece<strong>de</strong>u o dominio britnnnico, ou eiiiprcqando quasi exc!~isivnmcntc o<br />
elemento indio no provimento dos novos cargos que se tenham dc crcar. A<br />
esta liabilissima l)olitica, c ao gran<strong>de</strong> valor c proficiencia dou fiinccionarios<br />
europeus que fiscalisam a administra720 indigena, se <strong>de</strong>ve, em gran<strong>de</strong> parte,<br />
o collossal <strong>de</strong>acnrolvimento c consoli<strong>da</strong>ção <strong>da</strong> infliiencia britannica.<br />
0s francezes lia Coeliincliina teem-se obstinado em hzer administraçiio<br />
directa, <strong>de</strong> maneira qiie o dcsenvolvimcnto exiigeradissimo do funccion:ilismo<br />
civil e militar constittic iim cancro orçamental que muito atraza o<br />
prtrgregso economico d'aquella bella colonial malbaratando-se improductivainente<br />
Lima grandb parte <strong>da</strong>s receitas. No Annam, no Tonkin, fio Cambodje<br />
c no I,:~od n politica tem sido outra, c, cspccialmciite <strong>de</strong>pois do imp\~lsa<br />
arientador <strong>da</strong>do por llanessnn, a anctoridx<strong>de</strong> doa man<strong>da</strong>rins c a<br />
aiitonomia aclministrativa ~ 1 ~*~miiiiinii~<br />
~ s teern sido reconheci<strong>da</strong>s e aproveita<strong>da</strong>s.<br />
Poucas institiiiqóes se suppriiiliram mas introduziram-se numerosas<br />
innoraç6es. No Tonkin e no Annam a administraçáo <strong>da</strong>s provincias conti-
52 4 POLITICA XXDIOENA<br />
d- - -<br />
nua a effectuar-se em nome c10 imperador do Annam, mas os aqtigos podcrcs<br />
do vice-rei do Tonkin pertencem actualmente ao resi<strong>de</strong>nte superior<br />
francez. Os man<strong>da</strong>rins e a3 assemblcias doa principnes qoe governam lu<br />
provincias, cir~iim.jcripi~8.x e communaa, teem sempre junto a si um fiinccionario<br />
francez qiic pouco a pouco tcm adquirido cnthegoria superior (te<br />
direito e <strong>de</strong> 6dcto, á ~LIC~OP~I~~IC~C iniligena <strong>da</strong> resi<strong>de</strong>nciti. O Tonkin esti<br />
dividido em provincias, territorios militares e nas duas municipali<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
perfeitas <strong>de</strong> Hanoi e Hniphong. As provincias súo governa<strong>da</strong>s por administradores<br />
resi<strong>de</strong>ntes, e os territorios iiiilitares por coroneis do exercito<br />
colonial, todos subniettitlos ti direcçso superior do resi<strong>de</strong>nte geral no Tunkiii.<br />
A adminiutraç20 indigcna actiialmentc subordina<strong>da</strong> ás auctori<strong>da</strong>dcs<br />
frnncezas, manteve a respectiva cscalla Iiierarcliica. As provincias slro governa<strong>da</strong>s<br />
pelos Tolzy-Doc c 7'1in1~- Plzn governadores civis <strong>de</strong> primeira e segun<strong>da</strong><br />
classe.<br />
Em ca<strong>da</strong> provincia existe o An-Strt o11 encarregado dos serviços $1diciarios,<br />
e o Lloc-Hoc ou director <strong>da</strong> instrucção publica. As circumscripçóes<br />
em que se divi<strong>de</strong>m as proviiicias são governa<strong>da</strong>s por man<strong>da</strong>rins Tri-Phtc e<br />
l'ri-Huyan que <strong>de</strong>sen~penli~m as fiincçúes administrativas e judiciarias.<br />
Todos estes funccionarios sáo nomeados e retribuidos pelo Estado. Abaixo<br />
d'elles seguem-se os chefes dos cantócs que são eleitos pelos <strong>de</strong>legados <strong>da</strong>s<br />
communi<strong>da</strong><strong>de</strong>s al<strong>de</strong>ãs, e finalmente, em ca<strong>da</strong> comrnuni<strong>da</strong><strong>de</strong>, a assembleia<br />
dos notaveis. Na região do Alto Tonkin os territorios militares divi<strong>de</strong>m-se<br />
eni circlimecripçóes <strong>de</strong>nomina<strong>da</strong>s chntt que correspon<strong>de</strong>m ás liuynra aniiamitas<br />
e que sTio governa<strong>da</strong>s por cliefes hereditarios, Qua~t-Dau e ?'ri-Chau,<br />
cuja influencia os francezes aproveitam conferindo-lhe funcçóes administrativas.<br />
(I)<br />
On<strong>de</strong> teem sido mais rigorosamente respeita<strong>da</strong>s as instituiçóes administrativas<br />
dos indigenas, é sem duvi<strong>da</strong> nas Indias Orientaes Neerlan<strong>de</strong>zas.<br />
To<strong>da</strong> a adniinistraçáo se baseia no respeito e aproveitamento <strong>da</strong><br />
organisaçáo communal <strong>da</strong>s <strong>de</strong>sas.<br />
(i)<br />
françal riu Totlkin.<br />
Congresso Colonial <strong>de</strong> Marselha <strong>de</strong> 1906 - Coasi<strong>de</strong>rationn sio. le P,.otectorat
INSTITUIQ~ES ADMINLSTRATIVAS 535<br />
A <strong>de</strong>sa é a uni<strong>da</strong><strong>de</strong> comrnunnl a que jB nos referimoa a I)ropo3ito do<br />
regimen agrario em Java.<br />
A gerencia <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> <strong>de</strong>sa incumbe a uma especie <strong>de</strong> conselho administrativo<br />
obtido por eleição a que só concorrem 03 membros <strong>da</strong> communi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
que pagarem prestaçóes <strong>de</strong> trabalho, e composto <strong>de</strong> um chefe e <strong>de</strong>, pelo<br />
menos, quatro adjunctos. O chefe representa a <strong>de</strong>sa perante as auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
indigenas do districto, e recebe as or<strong>de</strong>ns ou instrucçóes do governo<br />
hollan<strong>de</strong>z por intermedio d'essas auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s; é isento do pagatnento <strong>de</strong><br />
todos os impostos e prestaçócs <strong>de</strong> trabalho, po<strong>de</strong> cobrar alguns dias <strong>de</strong><br />
coruée em proveito pmp~io e não recebe salario algiim fixo, tendo, comtudo,<br />
direito a uma certa percentagem sobre a importancia total dos impostos<br />
communaes, por cuja cobrança e arreca<strong>da</strong>ção tl: o primeiro responsavel.<br />
N'algiimas locali<strong>da</strong><strong>de</strong>s on<strong>de</strong> ain<strong>da</strong> subsiste a cultura força<strong>da</strong> do cafhzeiro,<br />
uma pequena percentagem do rendimento d'essa cultura, 6 applica<strong>da</strong> á, remuneração<br />
dos administradores <strong>da</strong>s <strong>de</strong>sas. 03 outros cargos adjunctos s8o<br />
os seguintes :<br />
a 0 kawi-toeioa B o substituto do chefe em caso <strong>de</strong> ausencia ou <strong>de</strong><br />
doença, e frequentemciite o seu saccessor; o kabaja~t chama ao trabalho os<br />
passiveis <strong>de</strong> coru<strong>de</strong>, regula os seus trabalhos, avisa-os <strong>de</strong> tudo o que se<br />
refere ao pagamento dos impostos, e é sempre o encarregado <strong>de</strong> transmittir<br />
a todos os habitantes as or<strong>de</strong>ns do chefe; o tjarik ou djoeroe toelis h o<br />
escrivgo encarregado <strong>de</strong> todos os registros communaes, e auxilia o chefe<br />
no exercicio <strong>da</strong>s suas funcçóes; finalmente o ntodin ou sacerdote <strong>da</strong> al<strong>de</strong>ia<br />
A o encarregado dos serviços <strong>de</strong> policia, vaccinaç&o, etc., e <strong>de</strong> outras funcçóes<br />
semelhantcs~. (I) As <strong>de</strong>sns agrupam-se em districtos governados por<br />
funccionarios indigeilas <strong>de</strong>nominados wedonos, e os districtos em regencins a<br />
que presi<strong>de</strong>m egualmente funccionarios indigenas <strong>de</strong> cathegoria siiperior<br />
chamados Regentes.<br />
A par <strong>da</strong> administração indigena, e estreitamente liga<strong>da</strong> a ella, func-<br />
(1) Congresso Internacional <strong>de</strong> Sociologia Colonial. - Memorin apresenta<strong>da</strong> por<br />
M. Vnn Kol.
536 POLITICA INDIGENA<br />
-- -<br />
ciona a administra(;To Iiollan<strong>de</strong>an com o sei, cliefe siiprcnio, ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro mon::rclin<br />
absoluto, o governador geral d:is India~ Orientnes a quem o rcgn-<br />
Iiiinrnto organico <strong>da</strong> colonin confere, cain os mais illimitados po<strong>de</strong>res, a<br />
obrigaçiio formal <strong>de</strong> proteger a popiilaçiío nativa, contra todn e qiialqiier<br />
arbitrarie<strong>da</strong><strong>de</strong>, e <strong>de</strong> velar por que iiunea seja violado o direito que teem<br />
as cominunas indigcnas <strong>de</strong> elegerem os seus proprios chefes e aclministradores.<br />
O governador geral nomeia os resitlufitrs e yorernadorts europeus,<br />
e escolhe entre os indigenas <strong>de</strong> catliegoria os qiie <strong>de</strong>vem <strong>de</strong>sempenhar<br />
os cargos cle reger~fes e <strong>de</strong> tretlonos. Todos os fiinccionarios indigenas<br />
que nBo sejam eleitos pelo povo o11 nomeados pelo governador geritl,<br />
sáo escolhidos pelo resi<strong>de</strong>nte europeu. As attribuic;óes dos resi<strong>de</strong>ntes e gocernudores<br />
variam com o grau mais oii nienos completo <strong>de</strong> autonomia<br />
conferido aos cliefes nativos. Em Java, cúm excepyáo dos sultanatos semiautonomos<br />
<strong>de</strong> Solo e <strong>de</strong> Djocd,jo, to<strong>da</strong> a ndministrag50 está directamente<br />
subordina<strong>da</strong> ao po<strong>de</strong>r do resi<strong>de</strong>nte. Van Kol <strong>de</strong>screve essa situaçiio nas segnintes<br />
palavras :<br />
«. . . . . o rcsi<strong>de</strong>jite tem directamente <strong>de</strong>bnixo <strong>da</strong>s siias or<strong>de</strong>ns todos<br />
os funecionarios administrativos civis, tanto europeus como indigenas, c<br />
representa na siia provincia o governador geral. E ao mesmo tempo legislador,<br />
juiz, administrador c cliefe <strong>de</strong> todo o f~inccionalismo civil». (I) As<br />
provincias ou as resi<strong>de</strong>ncias subdivi<strong>de</strong>m-se em circuinscripções, a ca<strong>da</strong> uma<br />
<strong>da</strong>s quaes correspon<strong>de</strong> um ussistcr~lt resi<strong>de</strong>rzt immediatamente siibordinndo<br />
ao resitlotte. Uma organisaqáo feliz, que constitue iima ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira trozicnil/~,<br />
E a dos fiscaes oii contrO1~1trs europeus. Estes funccionarios, que náo exercem<br />
directamente qiiaesquer funcçóes administrativas, circulam por to<strong>da</strong> a<br />
area <strong>da</strong> diviuzo territorial em que fazem serviço, em contacto constante<br />
com os cliefes e com a administraçáo indigena. Fiscalisam todos os ramos<br />
administrativos, rerilisam circurnstanciados estudos sobre a regifio, vigiam<br />
por que os direitos dos indigenas sqjam religiosamente acatados, e forne-<br />
(1) Van ICol - O. C.tu"n
INSTITUIÇ~ES ADMINISTRATIVAS 537<br />
eeh aos siiperiures to<strong>da</strong>s as iiiformaçóes que llies fiircm pedi<strong>da</strong>s. Tem sido<br />
proveitosissimos os serviços d'estes fnnccionarios que po<strong>de</strong>rosamente concorrem<br />
para evitar aitrictos entre os indigenas e a iidmiiiistraciio eiiropeia.<br />
e para firmar 3 infludncia neerltin<strong>de</strong>za nos clurncloiiros e resi,tentes cytc.ioq<br />
<strong>da</strong> paz e <strong>da</strong> justiça.<br />
A politica intligena segiii<strong>da</strong> pela Hoilandu nas siia3 roloniiis clo<br />
Oriente po<strong>de</strong> ser critica<strong>da</strong> pelo caracter <strong>de</strong> excessivo ab~tencionismo no<br />
campo ediicativo c economico, mas sob o aspecto stricto <strong>da</strong> adminictrag%o<br />
ti simplesn~ente ndrnirarcl. Para administrar 34 milliúes <strong>de</strong> 1i;ibitantes empregam-se<br />
apenas 131 fiiiiccionarios civis europeiis! Comparem se estes niimrrou<br />
corn os correspon<strong>de</strong>ntes eiii qua1qrit.r colonia portiigiieza ou franceza,<br />
e avaliem-se as vantagens <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a or<strong>de</strong>m que uma tal rediicçáo <strong>de</strong> pessoal<br />
fatalmcntc envolve.<br />
Nunca será <strong>de</strong> mais repetido que o inciigeiia <strong>da</strong>s regiúes intertropicaes<br />
é o mais iniprescindivel auxiliar <strong>da</strong> prosperitlatle coloiiial, e que sem<br />
elle nunca se po<strong>de</strong>rao valorisar csscs paizes. Cliailley Rc1.t escreveu: (I)<br />
538 POLITICA JNDIGENA<br />
-- _.__ __<br />
1-<br />
o que se dá com gente culta e cirilisa<strong>da</strong>, susceptivel <strong>de</strong> comprehen<strong>de</strong>r á<br />
priori os benefioios <strong>de</strong> novas orgaiiisaçóes mais liberaes, mas que se agarra<br />
receosa ao existente em respeito pelo passado, dá-se com mais forte razão<br />
com popiilaçócs primitivas e incultas, incapazes <strong>de</strong> comprehen<strong>de</strong>r a vanta-<br />
gem <strong>de</strong> qualqiicr modificação repentina nas suas instituiçóes, e para quem<br />
os novos systcmas administrativos trazem, aldm <strong>de</strong> tudo, o caracter odioso<br />
<strong>de</strong> uma imposição força<strong>da</strong>.<br />
Po<strong>de</strong> acontecer que os colonisadores <strong>de</strong>parem com instituições indi-<br />
genas mais ou menos artificialmente introduzi<strong>da</strong>s por um dcspota ou por<br />
iima casta, instit~iiçóes que convenha fazer <strong>de</strong>sapparecer. N'este caso é facil<br />
elimina-las sem pertiirbac,;&o sensivel, mas todos os organismos administra-<br />
tivos, fun<strong>da</strong>mcntc radicados: que sejam producto natural d'uma longa<br />
evolução, e6 podcráo vir a dcsapparcccr quando <strong>de</strong>sapparecerem as causas<br />
que lhes <strong>de</strong>ram origem, e se transformar o meio social a que se a<strong>da</strong>ptavam.<br />
Circumscripçóes indigenas<br />
Quando o plienomeno <strong>da</strong> emigràçao indigena rustico-urbana se coineça<br />
a verificar espontaneamente nas colonias, orientando-se para os centros<br />
habitados por ciiropeiis, B porque o nivel social do elerncnto nativo, sc ele-<br />
vou sensivelmente pelas lentas infiltraçócs ciiilisadoras que po<strong>de</strong>m conclu-<br />
zir á nacionalisaçtto perfeita e até preparar para a cgual<strong>da</strong><strong>de</strong> politica.<br />
N'essas circumstancias, é evi<strong>de</strong>ntc que, aos indigcnas progressivos que<br />
buscam voluntariamente o convivi0 <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> civilisa<strong>da</strong>, não lia incon-<br />
veniente em applicar as formulas administrativas em vigor n'essas locali-<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong>s. Antes mesmo <strong>da</strong> presença dos indigenas nos centros civilisados sêr<br />
fructo d'um movimento <strong>de</strong>mographico espontaneo, ain<strong>da</strong> quando a civilisa-<br />
çáo nativa <strong>de</strong>ixe muito a <strong>de</strong>sejar, é natnral que, nos centros urbanos, a<br />
unica auctoridridc reconliccidri, seja :i eiiropcia. Não po<strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> ser<br />
assim. O contrario acarretaria gran<strong>de</strong>s comp~icaçócs c constante encont,ro
<strong>de</strong> attribuiçóes entre cis diversas auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s. N'este caso, mesmo que se<br />
releguem os indigenas para bairros isolados e policiados por corpos espe-<br />
ciaes, <strong>de</strong>ve scmprc persistir a su1)ordinac;áo directa Qs auctori<strong>da</strong>dcs eiiro-<br />
peias <strong>da</strong> ci<strong>da</strong><strong>de</strong>, mas é indispensarel que nas relaçóes indigenas ellas accu-<br />
miilem o exercicio <strong>da</strong>s fnncçúes jutliciarias e administrativas.<br />
k claro que isto é apenas ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro para as raças muito atraza<strong>da</strong>s<br />
e nos centros urbanos fun<strong>da</strong>dos e <strong>de</strong>senvolvidos pela colonisação. Nas co-<br />
lonias do Norte <strong>de</strong> africa, na. India, no Extremo Oriente, o respeito pelas<br />
instituiçóes indigenas verifica-se tanto nos canipos como nas ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s, mas<br />
alli, além <strong>da</strong> civilisayiio dos naturaes impor outra norma <strong>de</strong> proce<strong>de</strong>r, as<br />
agglomerayúes iirbanas tinham jli dilata<strong>da</strong> existencia anterior ao dominio<br />
europeii. Em Xfricn, nas colonias tropicaes, as ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s nasccram com a<br />
vin<strong>da</strong> dos coloni~adores, c nem os indigcnas qiie geralmente llics virem<br />
alheios, estranham quando as habitam, que as aiictori<strong>da</strong><strong>de</strong>s a quem <strong>de</strong>vem<br />
obe<strong>de</strong>cer sejam differentes <strong>da</strong>s suas.<br />
Nas colonias africanas a gran<strong>de</strong> maioria <strong>da</strong> população encontra-se<br />
dispersa pelo interior, não sO fugindo <strong>da</strong>s ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s, como até raramente for-<br />
mando al<strong>de</strong>ias populosas. A sua administrac;Zo <strong>de</strong>ve ficar a cargo dos che-<br />
fes nativos, mas como a naçiio dominadora náo po<strong>de</strong> nunca prescindir <strong>de</strong><br />
fiscalisar estreitamente essa administração, impúe-se naturalmente a divisão<br />
do territorio habitado pelos indigenas, em circumscripçóes ruraes, cuja<br />
<strong>de</strong>signação, ambito, e constituiçáo po<strong>de</strong>m variar muito, mas a que corres-<br />
pen<strong>de</strong>m sempre um o11 mais funccionarios ciiropeiis incurnbiilos <strong>da</strong>s funcçóes<br />
administraqiio siiperior n'aqiiella arca ,jurisdiccional, e <strong>de</strong> fiscalisnçáo <strong>de</strong><br />
to<strong>da</strong>s as aiictori<strong>da</strong><strong>de</strong>s indigenas. Nas circiimscripçóes iirbanas o respectivo<br />
cliefe tem (fe vêr as siias attribuiçóes limita<strong>da</strong>s pela existencia <strong>de</strong> aiictori-<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong>s rnunicipaes. 0 administrador dos indigenas resi<strong>de</strong>ntes na ci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong>ve<br />
ain<strong>da</strong> conservar sobre os sciis administrandos a indispcnsavel alça<strong>da</strong> judi-<br />
cial com os temperamentos que a presença local <strong>de</strong> magistrados <strong>de</strong> carreira<br />
fizer aconselhar. O chefe <strong>de</strong> circumscripçáo é, como diz Eduardo Costa, um<br />
funccionario superior, directamente subordinado á auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> suprema do<br />
districto ou <strong>da</strong> colonia, e mantendo em qualquer caso correspon<strong>de</strong>ncia es-<br />
pecial com todos os chefes <strong>de</strong> serviço districtaes ou provinciaes ricerca dos
540 POLIT~CA INDIQENA<br />
-- - ----<br />
assumptos respeitantes a esses serviços e que interessem Q sua circiiiiiscripyão.<br />
I<br />
Os <strong>de</strong>veres do cliefe, sob o ponto <strong>de</strong> vista administrativo, s5o numerosos<br />
e complicadoc.<br />
A resoluçáo c~iii<strong>da</strong>ilosa e tolerante <strong>de</strong> todos os problemas <strong>da</strong> politica<br />
indigena local, o e;itutio dos uso3 C costiimes, a mediaçso conciliadora cru<br />
to<strong>da</strong>s as questúes suscita<strong>da</strong>s entre os regulos, e att. a propria intervenc;zo<br />
mais ou menos directa na <strong>de</strong>posiçáo e na siibstituiçáo cl'estes, a policia do<br />
territorio, a maniitenqso <strong>da</strong> or<strong>de</strong>m, o fomento <strong>da</strong> agriciiltlira e <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
indigena, o ensino <strong>de</strong> novos procsssos c~ilturaes c <strong>de</strong> novas culturas.<br />
o censo <strong>da</strong> populi.tçáo, o registro <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>, a fiscalisaqáo dos impostos<br />
e especialmente a cobrança directa. do imposto indigena, a vigilancia pelo<br />
cuinprimento dos contrnctoc, cle traballio local, a protccq5o aos assalariados,<br />
a fiscalisaçáo <strong>de</strong> todoi; oi; scrvi~os cla ernigr~y50 contracta<strong>da</strong> nas regiúcs<br />
on<strong>de</strong> syja ailrtol.i~;idtl, O ru~g:li~tielltu dc estrad;\~ carreteiras, caminlios vicinac~,<br />
etc*., ci estabelecimento cle granjas para instrucçáo agricola tios ii:ttiiraes,<br />
proteger e attraliir o maior numero possivel tlc agentes commerciiics<br />
di1igciici:irido qnc :is transacqúes com os iiidigenas se,jam iempi<br />
crescente:, etc., etc.; tudo isto c muito mais aindd pertencc as attri1)iiiçócdo<br />
clicfe <strong>de</strong> circiimscripção indigena. Assim, o gran<strong>de</strong> colonial qiic f, i<br />
Ed~iarclo Costa, n qiiein se <strong>de</strong>ve rt actual organisaçáo (I) bastantc prrfeit,,<br />
<strong>da</strong>s circumscripgúes adiniriistrativus <strong>da</strong> provincia dc illoçnmbique, <strong>de</strong> qul.<br />
hfousinlio nffirmoii scrcm o illclior ~~nsro <strong>da</strong>do para n nl~plicngiio ao.. ljoroq<br />
in(1ig~rlas tle ti111 q*tr~lln tlt gn/cr.rlo ( I I ~ P ~ ~ L I I I Z(10 O seu est(z(i0 <strong>de</strong> civilisriyio.<br />
preten<strong>de</strong>u seiiiprc que os chefes exercessem dircctn snpcrinten<strong>de</strong>ncia so\)rc,<br />
todos os serviços publicus representados rias sua.; circnmscripyócs. E na renli<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
assim <strong>de</strong>ve ser. rin Iiarmoiiia com o conliecido lernma administrativo<br />
que tiqnellc ercriptor, coiii tanta tenaci<strong>da</strong>cle como fiiridumento, sempre prociirou<br />
rlcseiivol\~er : tlc ,c1 1111 (11, ,(!$ao (I« altetorirlii<strong>de</strong> <strong>de</strong> yriltt PII~ griizb ilíi hic#r(rj eliiu<br />
adninistrntica, coilre~itr 1r5 io (/L> l)odt~'e.~ C ~ I L c(i(1u 111)~ d7es,~es grnlis SUCC~~~S~COS.<br />
Portanto, o cliefe cla circiimscripção <strong>de</strong>ve superinten<strong>de</strong>r em todos os<br />
I<br />
(1) Publica<strong>da</strong> no Boletim OWcial <strong>de</strong> hfo~ambique, n.0 15, <strong>de</strong> 9 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 1898.
INSTITUI~~ES ADMINISTRATIVAS 541<br />
serviços <strong>de</strong> correios, telegraphos, obras publicas, agrimensura e sau<strong>de</strong><br />
publica.<br />
As vezes estes scrvico.; oii parte d'elles pelo pouco <strong>de</strong>senvolvimento<br />
<strong>da</strong> circumscripção po<strong>de</strong>m estar directamente a cargo dos emprcgadog <strong>da</strong><br />
administração, mas ain<strong>da</strong> quando assim nKo aconteça, a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> do<br />
chefe administrativo <strong>de</strong>ve sempre prevalecer.<br />
A aclministraçáo indigena tem necessariamente <strong>de</strong> assumir o caracter<br />
unitario.<br />
O indigena pouco civilisado não comprehcn<strong>de</strong> as si~btilezns <strong>da</strong> nossa<br />
organisação social; e é incapaz <strong>de</strong> apprehen<strong>de</strong>r a vantagem <strong>da</strong> separaçáo<br />
dos po<strong>de</strong>res.<br />
Quando <strong>de</strong>senvolvemos a qnestáo <strong>da</strong> justiça indigcna tiremos occa-<br />
siiio cle fun<strong>da</strong>mentar largamente esta asserçáo. O administrador europeu<br />
<strong>de</strong> indigenas, o ch~fe, ha <strong>de</strong> ser tambem, para que como tal o reconheçam<br />
e respeitem, chefe militar superior e juiz dos pleitos, dos <strong>de</strong>lictos, e atd,<br />
em circiimstancias especiaes, julgador siimmario <strong>de</strong> fi~ltas mais graves.<br />
A policia militar ou civil est&-lhe directamente subordina<strong>da</strong>, e <strong>de</strong>ve ser<br />
ain<strong>da</strong> elle o comman<strong>da</strong>nte superior <strong>da</strong>r, forças irregiilarcs, cipaes, ou qual-<br />
quer outra especie tlc milicias auxiliares. C) exerci(-io d'psse commando B<br />
que principalmente o tornar6 respeitado pelos seus administrados. Quanto<br />
ao nucleo <strong>de</strong> força..i militares regulares em serviço na circumscripção, eri-<br />
tendia Eduardo Costa, n'cste ponto em <strong>de</strong>saccordo com ris suas proprias<br />
i<strong>de</strong>ias, que náo <strong>de</strong>via ficar subordinado ao chefe administrativo, logo que<br />
este fosse civil ou oficial <strong>de</strong> patente inferior k do comman<strong>da</strong>nte <strong>da</strong>s forças,<br />
por consi<strong>de</strong>rar essa subordinação perigosamente attentatoria do principio<br />
<strong>da</strong> hierarcliia militar.<br />
A este respeito enten<strong>de</strong>mos que as chefias d:is circumscripções admi-<br />
nistrativas propriamente ditas <strong>de</strong>vem-ser exclusivamente preenchi<strong>da</strong>s com<br />
elementos civis, e que n'este caso a.subordinaç80 do comman<strong>da</strong>nte militar<br />
ao administrador não lesa por fdrma -alguma a disciplina e a hiernrchia<br />
militar.<br />
Nos territorios que ain<strong>da</strong> exijam 11m avultado effectivo militar B<br />
-<br />
ninito preferivel a divisáo em commandos militares. O comman<strong>da</strong>nte supe-
512 POLITICA INDIGENA<br />
rior <strong>da</strong>s tropas B tambem coinman<strong>da</strong>nte militar <strong>da</strong> região e incumbem-lhe<br />
portanto to<strong>da</strong>s as attribuiçóes correspon<strong>de</strong>ntes As <strong>de</strong>scriptas para os chefes<br />
<strong>da</strong>s eircamscrip~óes civis. E não se julgue qiie as funcqócs administrativas<br />
são incompatireis com a quali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> militar. O contrario <strong>de</strong>monstrou<br />
Gallieni em Ma<strong>da</strong>gascar on<strong>de</strong> mesmo os n5o graduados collaboraram directamente,<br />
<strong>de</strong>pois <strong>da</strong> pacificação, em todos os ramos <strong>da</strong> administraçZo.<br />
Ca<strong>da</strong> companhia, no dizer <strong>de</strong> Gallieni, não representava apenas a<br />
uni<strong>da</strong><strong>de</strong> militar, mas uma multidso <strong>de</strong> mestres <strong>de</strong> officina, <strong>de</strong> jardineiros,<br />
<strong>de</strong> agricultores e <strong>de</strong> capatazes. A mesma <strong>de</strong>monstração se tem feito na<br />
Africa portugueza. Se bem que alli não tenhamos empresado os nossos<br />
sol<strong>da</strong>dos cm misteres tão diversos e em trabalhos tão alheios ao serviço<br />
militar, 6 certo que na vastissiina area ain<strong>da</strong> hoje dividi<strong>da</strong> em commandos<br />
militares os nossos officiaes se teem geralmente reveltido bons administradores.<br />
Seja, porCm, a circumscripção militar ou civil, o que é indispensavel<br />
6 que o chefe seja um só. Na<strong>da</strong> <strong>de</strong> dividir a aiictori<strong>da</strong><strong>de</strong>. Coniplicam-se os<br />
serviços, onera-se o orçamento, e originam-se riraliila<strong>de</strong>s e disputas <strong>de</strong> prece<strong>de</strong>ncia<br />
eminentemente nocivas ao nosso predominio e auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> moral<br />
sobre os indigenas. As fiincções mais complexas, e talvez as <strong>de</strong> maior responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />
do chefe <strong>da</strong> circumscripçáo, são as que se referem 9, administraçgo<br />
<strong>da</strong> justiça aos naturaes. O chefe bondoso, justo, incorruptivel,<br />
intelligente e bem conhecedor <strong>da</strong> lingua e <strong>da</strong> psychologia indigena 6 um<br />
explendido instrumento <strong>de</strong> dominapão e <strong>de</strong> influencia civilisadora. Ao contrario,<br />
a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> europeia venal, ignorante, e parcial nos seus julgamentos<br />
6 uma origem <strong>de</strong> <strong>de</strong>scontentamento para os indigenas que se retrahem<br />
<strong>de</strong> confiar-lhe os seus pleitos, e po<strong>de</strong> at6 mesmo, quando injustamente<br />
severa na repressão, ser causa <strong>de</strong> lamentaveis revoltas. As linhas geraes<br />
<strong>da</strong> ccnducta do chefe <strong>de</strong> circumscripção indigena em Africa, como juiz <strong>da</strong>s<br />
questóes e <strong>de</strong>lictos dos naturaes, acham-se perfeitamente tra(;a<strong>da</strong>s pelo<br />
Sr. A. Leão Pimentel nos seguintes periodos : (')<br />
(i)<br />
A. 1,eão Pimentel - Manual do Colono. Vol. 11." A gtierrn nna colonias.
cA applicação <strong>da</strong> justiça entre raças inferiores é talvez a pedra <strong>de</strong><br />
toque por oii<strong>de</strong> os indigenas avaliam <strong>da</strong> integri<strong>da</strong><strong>de</strong> do administrador. É<br />
sabido que o negro tem, em geral, uma noção muito luci<strong>da</strong> <strong>da</strong> jiistiça, e<br />
tanto que muitas vezes succc<strong>de</strong> o individiio punido por uma falta ser o<br />
primeiro a confessar que o branco teve razáo em o castigar; mas tambem<br />
o castigo injusto não lhe sae mais <strong>da</strong> memoria, <strong>de</strong>spertando-lhe os seus<br />
instinctos <strong>de</strong> revolta e <strong>de</strong> vingança atP. Por isso o prestigio d'um chefe<br />
<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> muito <strong>da</strong> boa e opportnna applicação <strong>da</strong> justiça. Que o negro rião<br />
veja no branco unicamente o seti explorador, o senhor que o obriga a trabalhar,<br />
a pagar tributos, mas que o <strong>de</strong>sinteresse e a imparciali<strong>da</strong><strong>de</strong> com<br />
que aquelle proce<strong>de</strong> na soliiçáo dos pleitos sejam garantia segura <strong>da</strong> or<strong>de</strong>m<br />
e do socego nas terras, e <strong>da</strong> <strong>de</strong>feza dos bens e <strong>da</strong> mulher contra as extorsúes<br />
e violencias pratica<strong>da</strong>s, não s6 pelos <strong>da</strong> sua raça, mas tambem pelos<br />
<strong>da</strong> nossa.<br />
No districto <strong>de</strong> Inhambane é gratuita a intervenção do comman<strong>da</strong>nte<br />
militar nos rnilandos entre indigenas. N'outras regiúes o queixoso paga um<br />
tanto por apresentar o seu pleito. Ao regulo paga quasi sempre o negro<br />
um tanto por apresentar milando. N~s, no commando <strong>de</strong> Chicoma, em<br />
Inhambane, só auctorisavamos os regulos a resolverem milandos pouco graves,<br />
e, sempre que visitavamos as povoaçóes d'estes chefes, inquiriamos<br />
por que se encontravam diversos negros no calabouço. Foi sempre nosso<br />
cui<strong>da</strong>do não <strong>de</strong>sauctorisar as auctoridx<strong>de</strong>s cafreaes aos olhos dos indigenas,<br />
visto serem ellas os auxiliares <strong>da</strong> nossa administraçáo, mas tambem não<br />
lhes <strong>de</strong>ixar nas mzos todo o po<strong>de</strong>r e força. É muito importante para a<br />
nossa soberania e para o prestigio do chefe branco, ser escolhido pelos<br />
naturaes para julgador <strong>da</strong>s suas causas. Assegura-se assim a influencia,<br />
6 o meio melhor <strong>de</strong> conhecer a indole e os costumes, dos habitantes, e B<br />
talvez o mais efficaz <strong>de</strong> polir as asperezas <strong>da</strong>s suas leis e iisos.<br />
k na solução <strong>da</strong>s questees <strong>de</strong> justiça que se torna mais sensivel a<br />
necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> do funccionario saber fallar, ou, ao menos, comprelien<strong>de</strong>r a<br />
lingua do paiz. Muitas vezes os interpretes por estupi<strong>de</strong>z, por falta <strong>de</strong><br />
attençdo, por preraricaç%o, ou nGo transmittem fielmente as nossas perguntas<br />
e as respostas <strong>da</strong>s partes, ou não dão ao interrogatorio a orientayá9
544 POLITICA INDIGENA<br />
que <strong>de</strong>sejamos, <strong>de</strong> modo que, apezar <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a nossa boa vonta<strong>de</strong>, <strong>da</strong>mos<br />
lima sentença injusta. Na apreciagáo dos factos, interpr~t~ação do procedimento<br />
<strong>de</strong> ca<strong>da</strong> uma <strong>da</strong>s partes, na <strong>de</strong>cisno, emfim, atten<strong>de</strong>r-se-lia semprc<br />
aos usos, costiimes, leis e indole dos h:tbitantes. Quando se resi<strong>de</strong> ain<strong>da</strong> ha<br />
pouco tempo na regizo, e não se conliecem bem estes elementos, convem<br />
chamar duas ou tres anctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s indigenas qiie <strong>de</strong>wonheçam os litigantes,<br />
ou alguns velhos <strong>de</strong> povoaçúes diflerentes, escolhidos ao acaso, e fazê-los<br />
assistir ao julgamento, em lugares separados, <strong>de</strong>ixando-os usar <strong>da</strong> palavra,<br />
e interroga-los bem um a iim isola<strong>da</strong>mente no fim, antes <strong>da</strong> <strong>de</strong>cisáo, confrontando<br />
as suas respostas e opiniões que nos eluci<strong>da</strong>ráo sobre a gravi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
e circumstancias que o pleito apresenta aos olhos <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena,<br />
e, por consequencia, nos aiixiliará no pronunciamento <strong>da</strong> sentença;<br />
tal proccsso tcm tambcm a vantagem <strong>de</strong> nos esclarecer sobre os costumes,<br />
leis, etc., do povo com que se está em contacto. Quando se tratar <strong>de</strong> castigar,<br />
<strong>de</strong> premiar, <strong>de</strong> c'iecidir, emfim, não esquecer nunca que os processos<br />
<strong>de</strong>vem ser apropriados aos homens e no meio, sem que lhes repugnem,<br />
alias a intervenção do branco per<strong>de</strong>rá to<strong>da</strong> a efficncia, e este arriscar-se-ha<br />
n que o natural o classifique <strong>de</strong> injusto e insensato, envolvendo os outros<br />
brancos na mcsma apreciaçilo. Náo esquecer que o negro na sua intelligencia<br />
e ediicagilo rudimentares, é muitas vezes mais leviano que crimiiioso<br />
nu pratica dos <strong>de</strong>lietos. Muito convem obter a corifiasáo do accusado,<br />
ou, pelo menos, o appoio moral, a approvaçgo espontanea dos indigenas<br />
chamados a conscllio. O negro nega e mentc sempre systematicamente,<br />
sendo difficil muitas vezes fazer luz num pleito; enganar, mentir, negar,<br />
são faltas <strong>de</strong>sculpaveis na sua moral inferior, não <strong>de</strong>vendo portanto, influir<br />
na <strong>de</strong>cisão final, embora seja justo reprimi-las.<br />
Deve-se prestar to<strong>da</strong> a attencko ao jogo physionomico dos assisten-<br />
tes, <strong>da</strong> parte e do interprete. O branco usarit <strong>de</strong> todo o tacto, sereni<strong>da</strong><strong>de</strong> e<br />
paciencia. A colera prejudica muito o ~restigio<br />
do branco, e leva-o a ser<br />
precipitado e a praticar injustiças. Antes <strong>de</strong> applicar o castigo, o branco<br />
esforçar-se-ha por mostrar em priblico ao <strong>de</strong>linquente (~iic<br />
proce<strong>de</strong>u mal. k<br />
necessario entgo distinguir bem 03 factos liraticadoq cbom intençáo crimi-<br />
posa dos <strong>de</strong>vidos ao uso do paiz ou & apouca<strong>da</strong> intelligencia e moral<br />
-
inferior dos habitantes. Estu<strong>da</strong>r-se-hão as impressóes que as differentes<br />
especies <strong>de</strong> castigos produzem sobre a população. Se se trata <strong>de</strong> uma in<strong>de</strong>-<br />
mnisaçáo a impor, quer pecuniaria, quer em bens, <strong>de</strong>ver-se-hti proporcio-<br />
n&-la aos recursos do accusado, não lhe exigindo impossiveis. Pronuncia<strong>da</strong><br />
a sentença, <strong>de</strong>ve ser cumpri<strong>da</strong> a todo o transe e quanto antes, para o cas-<br />
tigo ser mais exemplar.,<br />
Como se conclue d'esta transcripc;ão e cle tudo o que <strong>de</strong>ixamos dito<br />
sobre as attribuiçóes dos chefes <strong>de</strong> circumscripção, a missão d'estes func-<br />
cionarios é <strong>de</strong>lica<strong>da</strong> e importantissima. Do seti cxacto e intelligente cum-<br />
primento <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> primacialmente o bom exito do progresso social dos indi-<br />
genas e o fortalecimento <strong>da</strong> influencia dominadora. O administrador colonial<br />
tem <strong>de</strong> conhecer perfeitamente a lingua, os usos, as institniçóes sociaes, as<br />
ten<strong>de</strong>ncias psychologicas e as necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s materiaes <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> nativa.<br />
Tendo <strong>de</strong> contribuir por varias maneiras para o <strong>de</strong>senvo1viment.o eco-<br />
nomico dos seus administrados, sd po<strong>de</strong>rb orientar seguramente os seiis<br />
actos, quando muito bem conheça to<strong>da</strong>s tu fontes naturaes <strong>de</strong> riqueza <strong>de</strong><br />
que <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> o futiiro do paiz, e saiba perfeitamente com o que po<strong>de</strong> contar<br />
no que respeita b Iaboriosi<strong>da</strong><strong>de</strong>, robustez, tlijcili<strong>da</strong><strong>de</strong> e intelligencia dos in-<br />
digenas. O conhecimerito profundo <strong>da</strong> indole cla raca é egualmente indis-<br />
pensavel. O chefe europeu não po<strong>de</strong> ser excessivamente bondoso e tolerante<br />
porque perante os negros passar& apenas por fraco, medroso e injusto. Do<br />
mesmo modo nunca, <strong>de</strong>ver& cahir em excessos ou violencias que provoquem<br />
reacção e revolta entre os naturaes. Premiando sempre, o mais ostensiva-<br />
mente possivel, com protlecção e generosos beneficios, to<strong>da</strong>s as <strong>de</strong>dicaçóes e<br />
todos os serviços <strong>de</strong> valor, <strong>de</strong>ve ser sempre prompto e energico na repres-<br />
são dos <strong>de</strong>smandos.<br />
No umtanto, o recurso á mão arma<strong>da</strong> 96 <strong>de</strong>ve ser tomado, quando se<br />
esgotarem os meios pacificos <strong>de</strong> repressão, e qiiando um inquerito previo,<br />
ou a evi<strong>de</strong>ncia <strong>da</strong>s circumstancias obriguem ao emprego <strong>da</strong> força, procu-<br />
rando, ain<strong>da</strong> n'este caso, graduar a severi<strong>da</strong><strong>de</strong> do castigo, <strong>de</strong> maneira que<br />
as penas mais duras recaiam sobre os maiores culpados, e proce<strong>de</strong>ndo sem<br />
<strong>de</strong>mora e sem tibieza ao castigo exemplar e substituição immediata <strong>da</strong>s<br />
auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s indigenas incursas em rebeldia.<br />
35
Ora todo este saber e to<strong>da</strong>s estas quali<strong>da</strong><strong>de</strong>s que <strong>de</strong>ve possuir o admi-<br />
nistrador colonial, só ao cabo <strong>de</strong> longa pratica administrativa po<strong>de</strong>rão<br />
ser adquiridos. É preciso, pois, uma longa permanencia entre os indigenas,<br />
e uma atura<strong>da</strong> observação <strong>de</strong> todos os factos do seu viver social, para que<br />
o chefe europeu fique apto para o <strong>de</strong>sempenho <strong>da</strong> sua importantissima<br />
miss8o.<br />
Por outro lado, se o bom exito <strong>da</strong> administraçtio indigena <strong>de</strong>pen<strong>de</strong><br />
muito do tacto e saber do chefe europeu, não <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> menos tambem <strong>da</strong><br />
confiança e respeito dos naturaes por esse funccionario. Essa confiança que<br />
só se adquire com o habito d'unia dilata<strong>da</strong> convivencia B um argumento<br />
importante a favor <strong>da</strong> necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> conservar essa cathegoria <strong>de</strong> func-<br />
cionarios por largo tempo no exercicio dos seus cargos, evitando transfe-<br />
rencias para pontos muito afastados ou colonias diversas, em que a diffe-<br />
rença radical do meio sociologico vá inutilisar gran<strong>de</strong> parte do saber<br />
accumulado pela experiencia. De resto, ninguem hoje contesta a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
<strong>da</strong> existencia d'uma corporação <strong>de</strong> carreira para a administraçiio indigena.<br />
As funcçóes d'essa administravão são, como diz o Sr. Leão Pimentel, (I) a<br />
pedra angular <strong>da</strong> organisaçao administrativa ultramarina, e 6 <strong>da</strong> maior<br />
importancia que o pessoal que as <strong>de</strong>ve exercer seja intelligentemente es-<br />
colhido e convenieritemcnte preparado.<br />
Instituiçòes rnunicipaes<br />
X queatáo municipal nas colonias p6<strong>de</strong> ser estu<strong>da</strong><strong>da</strong> sob dois aspe-<br />
ctos tiistinctos: creaçáo <strong>de</strong> inàtituiçóes municipaes nos centros urbanos<br />
fun<strong>da</strong>dos pela colonisaçáo; e conservação e aperfeiçoamento <strong>da</strong>s organisa-<br />
çóes collectivas mais ou meiios municipalistas já existentes na socie<strong>da</strong><strong>de</strong>
IXSTITUICOES ADMINISTRATIVAS 547<br />
nativa. A primeira e tão interessante face do problema exhorhita evi<strong>de</strong>nte-<br />
mente do objectivo d'este nosso trabalho, porque á politica indigena pouco<br />
ou na<strong>da</strong> importa que a organisaç80 municipal nos centros urbanos, princi-<br />
palmente habitados por europeus, se limite a uma commissão urbana ou<br />
local, nomea<strong>da</strong> pela auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> superior, ou constitua um municipio em<br />
que mais ou menos largamente se represente o eleitorado <strong>da</strong>s locali<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
mais populosas, <strong>de</strong> mqior importancia commercial, e <strong>de</strong> melhores recursos<br />
financeiros.<br />
Pelo contrario, quando a organisaçiio communal seja instituição pro-<br />
pria á socie<strong>da</strong><strong>de</strong> nativa, o que d regra geral em to<strong>da</strong>s as colonias do Oriente<br />
e do Extremo Oriente, a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong>monstra<strong>da</strong> <strong>de</strong> respeitar to<strong>da</strong> a or-<br />
ganisaçáo administrativa dos naturaes leva naturalmente ao estudo rninu-<br />
cioso d'essas instituiçóes e á pon<strong>de</strong>ração cui<strong>da</strong>dosa dos processos mais<br />
aconselhaveiu paril intervir na fiscalisaçáo, e porventura, na alteração do<br />
seu funccionamento. X organisaçáo communista é a base do syatema social<br />
no Oriente. Suppriiní-la, se isso fosse possivel, seria <strong>de</strong>struir os al'<br />
:cerces<br />
d'uma velha civilisação, e lançar na <strong>de</strong>sor<strong>de</strong>m e na anarchia muitos mi-<br />
lhões <strong>de</strong> homens. Substitui-la por organisaç6es municipaes <strong>de</strong> mol<strong>de</strong> euro-<br />
peu ou americano, além <strong>de</strong> inutil e prejudicial, seria mentir ás ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iras<br />
necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s economicas e politicas n'aquelles paizes sem correspon<strong>de</strong>r a,<br />
nenhum <strong>de</strong>sejo ou ten<strong>de</strong>ncia dos povos que os habitam. Posta, portanto, <strong>de</strong><br />
parte a politica <strong>de</strong> assimilaç&07 fica ain<strong>da</strong> ás naçóes colonisadoras um<br />
gran<strong>de</strong> ~apel<br />
na ntilisação e aperfeiçoamento progressivo d'aquellas mes-<br />
mas instituiçóes. No Oriente o acatamento pela communa indigena tem<br />
sido pratica quasi geral. Apenas fazem excepçfio á regra a França na Co-<br />
chinchina, e Portugal na Iiidia. Não queremos dizer que os francezes te-<br />
nham <strong>de</strong>struido a commana annamita n'quella parte <strong>da</strong> Indo China, ou que<br />
tenhamos <strong>de</strong>struido as communi<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong>s al<strong>de</strong>ias, mas a ver<strong>da</strong><strong>de</strong> d que,<br />
n'uma e n'outra colonia, a intervenção constante e suffocante <strong>da</strong>s auctori-<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong>s europeias, a fiscalisação vexatoria, o cerceamento <strong>da</strong>s attribuiçúes e<br />
a complicaçáo dos regulamentos muito concorreram para a lamentavel <strong>de</strong>s-<br />
organisação d'aquellas admiraveis instituiç~es<br />
<strong>de</strong> administração collectiva.<br />
A generalisaçáo extemporanea do nosso regimen municipal metropolitano<br />
*
518 POLITICA INDIUENA<br />
á India prejiidicoii gran<strong>de</strong>mente as comrnuni<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong>s alrleias, roubando As<br />
gãocarias gran<strong>de</strong> parte, seiião quasi to<strong>da</strong>s as tLtt~iLui~~es municipaes. Em<br />
vez <strong>de</strong> limitar o estabelecimento <strong>da</strong> camara muriicipal ou ~niinicipio perfeito<br />
ás ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s mais important,es, <strong>de</strong>ixando ás cir~umscri~yóes ruraes o beneficio<br />
<strong>da</strong> orgi3riiu;lyáo existente, j& radica<strong>da</strong> nos habitou por uma pratica secular,<br />
semeámos <strong>de</strong> camaras municipaes todo o territorio e qiiedámo-nos<br />
satisfeitos perante mais essa estulta maniftstaçáo do fatal prurido assiiriilador.<br />
Valha-nos ao menos a coiiriolaçáo <strong>de</strong> termos tido dignos emulos. Os<br />
francezcs náo proce<strong>de</strong>ram mais atila<strong>da</strong>mente na Cochinchina, inas hoje, rcconhecidos<br />
os passados erros, em to<strong>da</strong> a vnst,issima regiáo successivamente<br />
conqnista<strong>da</strong> na Indo China pela forc,~ <strong>da</strong>s armas ou pela argucia rliplomatica,<br />
teem elles sinceramente respeitado a interessante organisaçáo commiinista<br />
dos naturaes. Para Port,ngal, que não pó<strong>de</strong> aspirar ao alargament,~<br />
<strong>da</strong>s suas possess6es indianas, é já muito tar<strong>de</strong> para recuar. Caminhou-se<br />
durante muito tempo no caminho <strong>da</strong> assitnilaçào para que valha jk a pena<br />
retroce<strong>de</strong>r ao restabelecimento <strong>da</strong>s instituiçóes primitivas.<br />
As organisrigões cominunaes doa differcn teu paizes do Oriente conservam<br />
entre si bastantes poiitos <strong>de</strong> semelhariça, mas sub o ponto <strong>de</strong> vista colonial<br />
trcs typos principaes se (levem consi<strong>de</strong>rar: a communi<strong>da</strong><strong>de</strong> al<strong>de</strong>ã <strong>da</strong><br />
India, a communa annamita e a communa javaneza ou <strong>de</strong>scr.<br />
Da comniui~i<strong>da</strong><strong>de</strong> iiicliiiiia nào nos occuparernos agora por já minuciosamente<br />
a termos <strong>de</strong>scripto como instituiçso <strong>de</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> collectiva.<br />
A communa annamita Xa ou Lang representa como a communa chineza<br />
a uni<strong>da</strong><strong>de</strong> administrativa e constitue um todo homogeneo com os seus<br />
chefes, as suas prerogativas, e os seus rit,os especiaes. Comprehen<strong>de</strong> geralmente<br />
uma al<strong>de</strong>ia principal e varios logarejos. Ca<strong>da</strong> communa B realtnente<br />
uma pequena repiiblica oligarchica e alitonoma, quc rciine os seus membros<br />
em estreita associação e cuja estructura e funccionamento apresentam<br />
muitos pontos <strong>de</strong> semelhança com as primitivas commiinas <strong>da</strong> antigui<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
occi<strong>de</strong>ntal. É simultaneamente pessoa moral, e individuali<strong>da</strong><strong>de</strong> objectivamente<br />
activa e responsavel, que possue to<strong>da</strong>s as instituiçces necessarias á<br />
sua administração interna, policia e segurança. É representa<strong>da</strong> pelo conselho<br />
communal ou asaembleia dos principaes e po<strong>de</strong> <strong>de</strong>liberar livremente,
Rem previa auctorisaçáo, em harmonia com as siiax leis essenciaes, sobre<br />
to<strong>da</strong>s as qiiestõea <strong>de</strong> int.erease local. To<strong>da</strong>s as obras pllblic~~ compativeis<br />
com os sciis recilrsos sáo directamente executa<strong>da</strong>s pela collectivi<strong>da</strong><strong>de</strong>, que.<br />
rtdministra os scbiis proprios bens, reparte equitativamente todos 0s encargos,<br />
como impost,oq, corribe e serviço militar, dirige e fiscalisa o ensino, con-<br />
ce<strong>de</strong> honras oix priviiegioa, e fixa to<strong>da</strong>s as suas cerimonias publicas e religiosas.<br />
O Estado s15 intervem para conce<strong>de</strong>r ou negar auctorisação <strong>de</strong><br />
part.icipar em jiiizo e <strong>de</strong> alienar os bens commiinae9. A populaçfio <strong>da</strong> communa<br />
ciAn, comprehen<strong>de</strong> os inscriptos, ddn-dijzh, e os n8o inscriptos ou<br />
ddn-lntr. Os primeiro9 gosam <strong>de</strong> todos os direitos do cirla<strong>da</strong>o, pagam os impostoci,<br />
e <strong>de</strong>sempenham todos os cargos piiblicos; os segundos constitiiem a<br />
plebe. A classe dos inscriptos não con~tit~iie uma corporaçko fechacla; A<br />
medi<strong>da</strong> que se v50 <strong>da</strong>ndo vaqas, v50 estas sendo immediatainente preenchi<strong>da</strong>s<br />
com indic~idiio~ tirwlos (IR clas~e dti~~-lnu, em harmonia com o preceito,<br />
geral na legisla~fio annamita, que <strong>de</strong>termina qiie o numero dos inscriptos<br />
em ca<strong>da</strong> commiina se,ja sempre o mesmo.<br />
O conselho dos principaes que adrnini~t~ra a commiina escolhe-se a si<br />
proprio entre os chefes <strong>de</strong> familia mais ricos <strong>da</strong> ~olle~tivi<strong>da</strong>clo e as nornea-<br />
çúes sáo vitalicias.<br />
Ca<strong>da</strong> itm (tos membros <strong>da</strong> assembleia <strong>de</strong>sempenha funcçóes especiaes<br />
e dirige iim ou outro serviço comm~inal. Repartem-se em duas cathegorias:<br />
os princip~e3<br />
inrciores, ou cnochzc-lon, <strong>de</strong>liberam e man<strong>da</strong>m, os principaes<br />
mpnores, ou crtc-rhu-nho, executam as or<strong>de</strong>ns e supcrinten<strong>de</strong>m directamente<br />
na administraçáo sob a direcção do ly-triiong que 6, por assim dizer, O<br />
nniw <strong>da</strong> communa. Este fiinccionario é o intermediario oficial entre a<br />
communn e a administraçgo superior. Transmitte a essa auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> todos<br />
os pedidos e reclamaçfirs dn commiina; visa e legalisa to<strong>da</strong>s as assignatu-<br />
ras; t,ranl;rnitte A cominiina to<strong>da</strong>s as or<strong>de</strong>na <strong>da</strong> administraçáo siiperior e<br />
responcle l,('la Jua execução; é responsavel pela policia administrativa e<br />
,judiciaria (Ia al<strong>de</strong>ia; finalmente superinten<strong>de</strong> na repart,ipko e na col~rança<br />
dos iinpostos. As suas funcçóes são temporarias e fin<strong>da</strong>s ellas o ly-tr~ong<br />
ascen<strong>de</strong> ft cathegoria superior e entra na parte <strong>de</strong>liberativa <strong>da</strong> assembleia<br />
communal.
550 POLITICA INDIGENA<br />
Taes são os traços geraeo <strong>da</strong> organisaçgo interna <strong>da</strong> communa íiiiiitiiiiit i<br />
que, pelo seu collectivismo miinicipal, presta relevantissimos serviços iii;iteriaes<br />
R estabili<strong>da</strong><strong>de</strong> economics <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> indigena, e que pela .;ti:i tr,r..<br />
mula politica facilita singularmente a administraçáo geral pondo o E~t,~tlo<br />
em contacto com iini<strong>da</strong>dcs collectivu~, inteiramente responsaveis e pet.ft?it;\mente<br />
orgtinisa<strong>da</strong>s, ein que <strong>de</strong>lega todos os seiie <strong>de</strong>vereci politicos, financeiros,<br />
liumanit,arios e educativos para com os individuos.<br />
Iloumer, o eminente administra(1or e egcriptor colonial, fazendo :i<br />
mais calorosa apologia <strong>da</strong>s institiiiç<strong>de</strong>s communaes na Tnrio Cliina, termina<br />
pelas seguintes justas coriai<strong>de</strong>raçóes: (I)<br />
a A organisaqão <strong>da</strong> commiina annamita, a16m <strong>de</strong> facilitar I\. maniiten-<br />
ção <strong>da</strong> or<strong>de</strong>m e <strong>de</strong> assegurar os serviços <strong>de</strong> interesse social <strong>de</strong> qiie nos vêmos<br />
<strong>de</strong>sembaraçados, tem ain<strong>da</strong> a vantagem <strong>de</strong> tornar facil e pouco dispendiosa<br />
a percepçiio dos impostos directos. N'esse ponto, tambem, encontramo-nos em<br />
presença <strong>da</strong> collectivi<strong>da</strong><strong>de</strong> contribuinte e náo dos individiios. O systema 4<br />
commodo para nús e parece bom. Dá B organisacão communal uma gran<strong>de</strong><br />
força e evita o contacto <strong>de</strong>mnsia<strong>da</strong>mente directo cntre a administraçáo<br />
franceza e a populaçáo, com os melindres e conflictos qiie d'ahi resultariam.<br />
A nossa acção não é menos efficaz, e antes Iiicra em se exercer por iiiter-<br />
medio dos representantes indigen:is. Na Cochincliina, on<strong>de</strong> proce<strong>de</strong>mos como<br />
coloniaes inexperientes, e on<strong>de</strong> importkinos, tanto qiianto foi possivel, as<br />
regras administrativas <strong>da</strong> Metropole, a commiina annamit,a per<strong>de</strong>u uma boa<br />
porção <strong>da</strong> siia autonomia. Os inconvenient,es (lixe d'ahi resiiltaram saltam<br />
aos olhos <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a gente, e vantagens foi <strong>de</strong>bal<strong>de</strong> que as procurei encontrar<br />
n.<br />
A communa annamita em <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncia na Cochinchinn: pouco tem soffrido<br />
no 'l'onkin e tem sido integralmente respeita<strong>da</strong> no Ann~m como base<br />
<strong>de</strong> to<strong>da</strong> a administraçáo indigena.<br />
Em to<strong>da</strong>s as Indias Neerl~n<strong>de</strong>zas, e mais perfeitamente em Java,<br />
funcciona a organisaçáo administrativa e municipal conheci<strong>da</strong> pelo nome<br />
(I) Paul Doumer - L'Indo Chine Frnnfnise.
<strong>de</strong> <strong>de</strong>sa, em cuja <strong>de</strong>scripçáo nos não <strong>de</strong>teremos agora, por jA o termos feito<br />
n'outra parte d'este trabalho. As attribuiqúes economicas, financeiras, admi-<br />
nistrativas, politicas, judiciaes e religiosas <strong>da</strong>s <strong>de</strong>sas correspon<strong>de</strong>m tis <strong>da</strong><br />
commiina annamita, e são cumpri<strong>da</strong>s sob o regimen r1a mais completa au-<br />
tonomia concedi<strong>da</strong> pelo governo hollanclez cqja mo<strong>de</strong>lar administração não<br />
pouco tem concorrido para o <strong>de</strong>seiivolvimento e progresso <strong>da</strong> instituição.<br />
0 artigo 71 <strong>da</strong> lei organica <strong>da</strong> coloni:~ prescreve formalmente essa auto-<br />
nomia, <strong>de</strong>terminando comtndo que ella náo po<strong>de</strong>ri contrariar a execiição<br />
<strong>da</strong>s or<strong>de</strong>nanças do governador geral, nem ir contra as instituiçóes indige-<br />
nas c os direitos legalmente adquiridos.<br />
Na India e no Extremo Oriente a uni<strong>da</strong><strong>de</strong> communal tem pois <strong>de</strong> ser<br />
toma<strong>da</strong> pelas naçóeu culoniaes, como base fiin<strong>da</strong>mental do seu systema<br />
administrativo e, sempre que haja reformas ti fazer em qu:ilquer serviço<br />
publico, ou instituiçóes novas a introduzir, C indispensavel que umas e<br />
outras sejam previamente estii<strong>da</strong><strong>da</strong>s e examina<strong>da</strong>s com cni<strong>da</strong>do, sob o ponto<br />
<strong>de</strong> vista <strong>da</strong>s suas relaçóes com a communa indigena. As novas medi<strong>da</strong>s que<br />
a pratica <strong>de</strong>monstrar que em na<strong>da</strong> lesam a constituiqgo collectivista <strong>da</strong>s<br />
communas, e náo repugnam á população nativa, po<strong>de</strong>rão ser manti<strong>da</strong>s, mas<br />
to<strong>da</strong>s as que náo respon<strong>de</strong>rem a estas quali<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong>vem ser invariavelmente<br />
regeita<strong>da</strong>s e aboli<strong>da</strong>s. Em materia <strong>de</strong> politica indigena nas colonias orien-<br />
taes, a integri<strong>da</strong><strong>de</strong> c progrewo <strong>da</strong> organisaçáo commnnal sáo o mais se-<br />
guro indicio <strong>da</strong> efficiencia dos processos administrativos segiiidos pelos<br />
dominadores.<br />
Nas colonias africanas, a barbarie <strong>da</strong>s populaçóes <strong>de</strong>sconheceu sempre<br />
qualquer esboço <strong>de</strong> organisaçáo municipalista. Em Ma<strong>da</strong>gascar, to<strong>da</strong>via,<br />
tomou gran<strong>de</strong> incremento, em epocha já muit,o afasta<strong>da</strong>, a instituição col-<br />
lectiva do fokonolona que caracterisa a communi<strong>da</strong><strong>de</strong> dos habitantes d'um<br />
agrupamento <strong>de</strong> casas. E uma especie <strong>de</strong> conselho municipal com um nu-<br />
mero illimitado <strong>de</strong> membros e com um chefe eleito o ~w~iadidy.<br />
Ca<strong>da</strong> foko-<br />
~iolona E a emanação directa dos cogtumes e <strong>da</strong>s tradic;«es <strong>da</strong> fracção <strong>de</strong><br />
tribu que representa, <strong>de</strong> maneira que a reiiniáo <strong>de</strong> todos os mpindidy <strong>de</strong><br />
ca<strong>da</strong> tribu investidos na representação dos interesses <strong>da</strong> respectiva colle-<br />
ctivi<strong>da</strong><strong>de</strong>, constituem a representação mais legitima e completa <strong>da</strong> totali-
552 POLTTICA INDIGBNA<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> tribu, cujo chefe ou n~pnnjnlc(s po<strong>de</strong> ser hereditario ou eleito. Em<br />
1902 uma commissão especial nomea<strong>da</strong> pelo governador <strong>da</strong> colonia reco-<br />
nheceu a gran<strong>de</strong> vantagem que havia em utilisar esta instituiçáo, consoli-<br />
<strong>da</strong>rido-a e aproveitando-a como intermediario entre a administração e os<br />
indigenas, e náo tardou que fosse piiblica<strong>da</strong> a lei tle 1) <strong>de</strong> Março d'esse<br />
anno que coii.iagrou a existencia legal do bfokonolo,~n.<br />
A lei confirma á col-<br />
lectivi<strong>da</strong><strong>de</strong> cnrrtos direitos <strong>de</strong>finindo a extensão <strong>da</strong> sua auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>, taes<br />
como: a eleiqko do ~npiccdid!y: :L c.xpiils%o, <strong>de</strong> accorclo com a administração<br />
franceza, d'um membro <strong>da</strong> communi<strong>da</strong><strong>de</strong> julgtttlo perigoso ou indigno; a<br />
proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> collectiva <strong>de</strong> predion <strong>de</strong> intcrtssc commiim; a administração<br />
dos direitos <strong>de</strong> pesca. portagens, etc.; a fiiciil<strong>da</strong>dc <strong>de</strong> estabelecer regulamentos<br />
especiaeu sanccionados por miiltas, etc., etc.<br />
Quanto ás obrigaçúes que por lei lhe são impostas repouzam, em materia<br />
policial, na. responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong> collectiva restricta a limites rasoaveis.<br />
Des<strong>de</strong> a <strong>da</strong>ta <strong>da</strong> publicavão <strong>da</strong> lei a administraçao franccza tem recebido,<br />
como era <strong>de</strong> esperar, os melhores resultados <strong>da</strong> utilisaçáo dos f'okonolonas<br />
que constituem já hoje o alicerce <strong>de</strong> to<strong>da</strong> ti f'iitiira organisaçáo municipal<br />
<strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> malgactie.<br />
Conclus6es geraes<br />
Qualquer qixe seja o systema <strong>de</strong> colonisação, e sejam quaes forem as<br />
condiçóes nat,uraes <strong>da</strong>s colonias, a indole <strong>da</strong>s raças domina<strong>da</strong>s e a sua or-<br />
ganisaçáo sociologica, o exame critico frio, sereno e imparcial <strong>da</strong> pratica<br />
segui<strong>da</strong>, conduz inevitavelmente á conclusão <strong>de</strong> que os naturaes s6 po<strong>de</strong>m<br />
ser proveitosamente administrados por intermedio d'elles proprios, <strong>de</strong>vendo<br />
ligar-se o maior interesse e attençáo a todos os problemas d'essa adminis-<br />
traçgo. Ha colonias - como a lndia e a Indo-China - <strong>de</strong> população nativa<br />
civilisa<strong>da</strong> e <strong>de</strong>nsa, em que a administração dos indigenas e a respectiva<br />
fiscalisaçáo europeia constituem o tronco <strong>da</strong> administraçáYo geral. N'outras,<br />
-
porCm, como geralmente aconteco nos estabelecimentos <strong>da</strong> Africa tropical<br />
e do sul, a administrac;áo indigena é nm pequeno ramo qiiasi <strong>de</strong>stacado<br />
<strong>da</strong> administração geral. Apezar d'isso, a sua importancia, po<strong>de</strong> dizer-se<br />
sem exagero, que sobreleva a toilos os re'itiint,es serviços administrativos<br />
que afinal <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m essencialmente tl'elle, visto entre os tropicos não ser<br />
viavel qualquer emprelientlirnento duratloiirc, sem o concurso <strong>da</strong> populaçlio<br />
indigena.<br />
h administrawáo dos incligenas cornprelien<strong>de</strong> dois serviços distinctos :<br />
a administraçáo direct,a a cargo do3 chefes locaes on (IAS commiinas, e a<br />
fiscalisação d'essa iidniinistração geralmente exerci<strong>da</strong> por funccionarios<br />
eu]-opcris.<br />
b: evi<strong>de</strong>nte que esta ultima terri um carncter essencialtnente educativo<br />
dos costumes <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> inferior, e o sr?ii papel E naturiilmente transitorio.<br />
Transição longa e laboriosa <strong>de</strong>ve ser essa, pois o <strong>de</strong>sapparecimento<br />
<strong>da</strong> fiscalisação europeia st po<strong>de</strong>rA cffectiiar-se quando a elevaçRo <strong>da</strong> mentali<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
e <strong>da</strong>s instituiçóes sociaes dos iiidigenas, permittir consi<strong>de</strong>rar a<br />
sua propria administraçgo parallelaniente á do elemento europeu.<br />
A melhor forma <strong>de</strong> consegiiir abreviar esse periodo <strong>de</strong> tixtella, facilitando<br />
a educaçáo administrativa e moral dos naturaes, é fazê-los pttrticipar<br />
abertamente na administraçác), jL náo st nos serviços administrativos<br />
propriamente ditos, mas mil todos os serviço$ publicos <strong>da</strong> coloi-iia. Nos correios,<br />
telegraphos, obras publicas, caminhos <strong>de</strong> ferro, fiscalisaçiio agricola<br />
e mineira, repartiçúes centr~es, etc., etc. Nas Indias Orientaes Neerlan<strong>de</strong>-<br />
zas, na Tunisia, e princip:dmente ia India Ingleza tem sido adoptado este<br />
principio. Em to<strong>da</strong>s as colonias, com qualquer forma ~olitica <strong>de</strong> governo, 6<br />
yossivel e e! util admíttir os indigenas aos empregos publicas subalternos,<br />
confiando mesmo logares <strong>de</strong> cathegoria superior a um ou outro individuo<br />
<strong>de</strong> élit~, mas, sem duvi<strong>da</strong>, rt formula politica que mais se coaduna com uma<br />
orgenisaçáo perfeita <strong>da</strong> adininistr;iç?io indigana nas colonias <strong>de</strong> população<br />
relativament,e civilisa<strong>da</strong>, t! o protectorntlo.<br />
Na sua apresenta@o theorica náo .fere nem apouca o patriotismo, e<br />
nRo colli<strong>de</strong> com nenhum interesse politic~ ou economico já existente. Na<br />
sua realisação pratica, esta formula, elastica entre as que niais o são, fa-
554 POLITICA INDIGENA<br />
- -- - - -<br />
culta a intervençáo mascara<strong>da</strong> c10 eIemento protector nos negocios e na<br />
administração do protegido, ora teniie ora energica, mas sempre dissimu-<br />
la<strong>da</strong> e subtil. Para o progresso econoniico tla colonia sobrevem a vantagem<br />
dos encargos financeiros serem muito menores do que no reçimen <strong>de</strong> admi-<br />
nistração directa, o que naturalmente perrnitte mais proficna applicaçáo<br />
<strong>da</strong>s receitas orçamentaes. No rrçimen r10 protectorado, a nação clominadora<br />
po<strong>de</strong> aproveitar to<strong>da</strong>s, absolutamente todtis, as instituiçúes admiriistrativas,<br />
militares, judiciaes, etc., j;i existentes, muitas <strong>da</strong>s quaes se administrasse<br />
directamente se veria força<strong>da</strong> a siipprirnir por muito tolerante que a sua<br />
politicn fosse, e o eiemento nativo <strong>de</strong>ixar-se-ha conduzir na sen<strong>da</strong> do pro-<br />
gresso quasi ineensivelmente.<br />
O papel importantissimo que, em todos os systeinas <strong>de</strong> administraçáo<br />
colonial, <strong>de</strong>sempenham os funccionarios europeus encarregados <strong>de</strong> dirigir e<br />
fiscalizar a administraqáo local, e R circumstancia do progresso politico e<br />
economico, e a educação administrativa <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> nativa, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r essen-<br />
cialmente do valor e <strong>da</strong> orientação d'esses funccionarios, mostra-nos a im-<br />
portante necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> preparação previa e cui<strong>da</strong>dosa d'urna corpora!.Ho<br />
ou d'um quadro administrativo absolutamente á altura <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r correq[)oii-<br />
<strong>de</strong>r ás exigencias <strong>da</strong> situaçáo em ca<strong>da</strong> colonia.<br />
aÉ evi<strong>de</strong>nte que o serviço ganha em ser feito por homens edli{.ticius<br />
<strong>de</strong> antemão e experimentados, ;to <strong>de</strong>pois, no <strong>de</strong>sempenho continuado <strong>de</strong> 10-<br />
gares <strong>da</strong> mesma natureza tectinioa. É: urna ver<strong>da</strong><strong>de</strong> que riáo precisit ile<br />
<strong>de</strong>monstração. Hoje, nas nossas colonias, muitos são os serviqos <strong>de</strong>semlllh-<br />
nhados por funccionarios <strong>de</strong> carreira e quadros espcciaes, mas nilo v ~ c<br />
longe o tempo em que <strong>de</strong> Portugal se man<strong>da</strong>va quem quer que fosse paill<br />
servir <strong>de</strong> engenheiro ou contliictor <strong>de</strong> obras publicas ; professores qurx ni 11<br />
sabiam ler e outros empregados <strong>de</strong> egual jaez. Comtudo, ain<strong>da</strong> actualnien.<br />
os logares <strong>de</strong> admi~zistrndores coloniaes, os <strong>de</strong> mais complexo exerci( )<br />
assim como os <strong>de</strong> mais alta responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong>. RXO logares abertos, on<strong>de</strong> el<br />
tra quem quer, ou quem po<strong>de</strong> dispor <strong>de</strong> empenhos, e d'on<strong>de</strong> se sahe com<br />
mesnia facili<strong>da</strong><strong>de</strong> com que se entra. sem que a experiencia sirva - vonl<br />
<strong>de</strong>via ser - <strong>de</strong> justificado documento a novas pretençóes, sem que a incs<br />
periencia para uns e a má conductn para outros sirvam <strong>de</strong> impecillio
I INSTITUIÇ~ES ADMINIBTRATIVAS<br />
"-<br />
h55<br />
-<br />
nomeação para altos cargos e á renomeação para outros. Pois se lií'i. carreira<br />
on<strong>de</strong> uma vi<strong>da</strong> inteira não seja <strong>de</strong>mais para <strong>da</strong>r a <strong>de</strong>vi<strong>da</strong> habilitla<strong>de</strong>, o<br />
tacto necessario, e a cxperiencia precisa, é a carreira administrativa. D'esta<br />
ver<strong>da</strong><strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as outras naçóes coloniaes estão absolutamente conrenci<strong>da</strong>s,<br />
e, em conformi<strong>da</strong><strong>de</strong> com eatas i<strong>de</strong>ias, assim proce<strong>de</strong>m. . . (')<br />
Dez annos se passaram <strong>de</strong>pois que Eduardo Costa escreveu os perio-<br />
dos que prece<strong>de</strong>m e ain<strong>da</strong> hoje elles conteem verdiules csonio punhos. NLo<br />
ha duvi<strong>da</strong> que temos tido nas nossas colonias alguns :idniinistradores emi-<br />
nentes, mas que orientação, que criterio presidi11 A siia escolha e nomea-<br />
çáo? Absoliitamente nenliiim. Sithirarn bons, como podia ter acontecido<br />
resultarem nefastos. Ninguem ignora que, por exemplo, o systema seguido<br />
pela Hollan<strong>da</strong> no Oriente, on<strong>de</strong> todos os funccionarios são <strong>de</strong> carreira e a<br />
hierarchia administrativa vae do mo<strong>de</strong>sto amanuense at6 ao vice-rei, monar-<br />
cha absoluto <strong>de</strong> trinta e tantos milhóes <strong>de</strong> homens, seria absolutamente<br />
ina<strong>da</strong>ptavel ao nosso meio, attenta a indole <strong>da</strong> raça e a gran<strong>de</strong> variabili-<br />
<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s regióes exoticas em que exercemos dominio. Mas isso não 6<br />
razão para que, <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> certas restricçóes, o não prociiremos imitar. Não<br />
concor<strong>da</strong>mos com Eduardo Costa, quando affirma que os logares <strong>de</strong> governadores<br />
geraes <strong>da</strong>s nossas colonias <strong>de</strong>vem ficar á apreciação do governo,<br />
porque o seu <strong>de</strong>sempenho tem melindres nem sempre satisfeitos pelas qiiali<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
revela<strong>da</strong>s no <strong>de</strong>curso d'iima longa carreira. E nSo concor<strong>da</strong>mos,<br />
porque enten<strong>de</strong>mos que, melhor que ninguem, po<strong>de</strong>rão preenclier esses logares<br />
os que em ca<strong>da</strong> provincia, como chefes (ta circumscripç~o, como comman<strong>da</strong>ntes<br />
militares, capitães-móres ou governadores dos districtos tenham<br />
podido adquirir um perfeito conhecimento do paiz, dos seus habitantes, e<br />
<strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as qnestões politicas e economicris internas ou internacion~es, que<br />
se lhe relacionam. Evi<strong>de</strong>ntemente, para os logares superiores dos districtos<br />
e <strong>da</strong> provincia não julgamos necessaria a rigi<strong>de</strong>z formalista ci'um quadro<br />
especial, mas consi<strong>de</strong>ramos indispensavel que a escolha recaia sobre quem<br />
(I)<br />
tramarinas.<br />
Eduardo Costa - Ealudo aobre a ndminixfrafllo civil dos ?ioasas poaa~ssõra ul-
,556 POLITICA INDIGENA<br />
-- --<br />
possa ofierecer boas garantias, e nlto sobre o primeiro adventicio munido<br />
<strong>de</strong> cartas <strong>de</strong> empenlio. On<strong>de</strong>, porhm, a corporação <strong>de</strong> carreira se torna indispensavel<br />
6 na administraqáo indigena. Todos os logares, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os mais<br />
humil<strong>de</strong>s empregados <strong>da</strong>s circumscripçóes ruraes, até ao Secretario dos<br />
negocios indigenas que em ca<strong>da</strong> colonia <strong>de</strong>ve siiperiormente dirigir a politica<br />
<strong>da</strong>s raças, teem necessariamente <strong>de</strong> ser rigor~sarnente hierarchisados<br />
a <strong>de</strong>ntro do mesmo quatlro.<br />
Por certo não queremos n'esse quadro a embrutecedora e estagnante<br />
promoçáo por antigiiidndr. C) valor e a importancia dos serviços prestados,<br />
a intelligencia e a dcdic;tcao (10 funccionario <strong>de</strong>ver50 ser a base unica do<br />
adiantamento na respectiva Iiierarcliia administrativa. E, ain<strong>da</strong> que o empenho,<br />
a protecção e o favoritismo alguma vez isola<strong>da</strong>mente triumphem,<br />
ficar6 sempre o beneficio <strong>da</strong> nomeação niio ir recahir em alguem totalmente<br />
alheio ás <strong>de</strong>lica<strong>da</strong>s qiieutóes <strong>da</strong> administração indigena.<br />
Temos assim rapiiliimente <strong>de</strong>lineado a orientação a seguir na administração<br />
<strong>da</strong>s raças domina<strong>da</strong>s. qiie afinal se po<strong>de</strong> reduzir a quatro principio~<br />
fun<strong>da</strong>meritaes : conserutrgáo dos organismos adn~ini.strtctiuos indigenas,<br />
participação dos ifzdiyenas na admiwiutraçZo gerol, czcidudosa preparaçdo<br />
tl'zim fttnrcionalisrno etlropeu <strong>de</strong> carreilia para sup~ri~dm<strong>de</strong>r na admirzistraçdo<br />
intligena, concentraçíto trnitnria <strong>de</strong> nas attribuiç<strong>de</strong>s d'esse funcciona-<br />
lisino.<br />
k esta a norma; os processos accessorios, esses variarão in<strong>de</strong>fini<strong>da</strong>mente<br />
com a indole dos doininadores, e com os temperamentos e entre os<br />
limites marcados pela interminavel variaçáo <strong>da</strong>s condiçóes locaes.
A<strong>da</strong>m Smith<br />
Alciador (Emile)<br />
Alma<strong>da</strong> Negreiros<br />
id.<br />
id.<br />
id.<br />
id.<br />
Almei<strong>da</strong> Garrett (Thomaz)<br />
Andra<strong>de</strong> Corvo<br />
Andrews<br />
Apchi6 (Charles)<br />
Arnold (T. W.)<br />
Aspe-Fleurimont<br />
Aubry (Pierre)<br />
Ba<strong>de</strong>n Powell<br />
id.<br />
id.<br />
Bagehot<br />
Bancroft<br />
Barroso (D. Antonio)<br />
Booker Washington<br />
id.<br />
Boutmy (IEmile)<br />
Bernard (Fernand)<br />
- I)e la r1~1~cs.s~~ <strong>de</strong>a nations.<br />
- Leu Anlilles fi-ar~çai~es.<br />
- Les colonies po~~tr~~y~ises.<br />
- Le Mozarnbique.<br />
- L'ina!,,iri-lion <strong>da</strong>ns leu colonies portugaiaer.---!<br />
- Lu mniti d'ceuvre en Afjaique.<br />
- L'Ile dc S. l'liomé.<br />
- C'rn (jouerno em Africa.<br />
- Estudos soú1.e as provincias ulttsamarinar.<br />
- Last Suarter of Centuvy in the Uniled Slnles.<br />
- Cnndilion juridique <strong>de</strong>s indighncs.<br />
- Tl~e Prenching of Islum.<br />
- La colonisnlion française (na Revice Internnlionale <strong>de</strong><br />
Sorioloqie, torno x.0)<br />
- La coloniuation et les colonies.<br />
- l'lie bldian Villaqe Community.<br />
- Lnnd Reuenue and í'en~we in Brilish Zndia.<br />
- I78e Lnnd Systems of Rrilish India.<br />
- Lois du <strong>de</strong>uéloppement <strong>de</strong>s nations.<br />
- Colorrizntion of lhe United Stnles.<br />
- R~lntorto sobre a prelaíin <strong>de</strong> Moçatnbique (Boletim h<br />
S. G. L. 1895).<br />
- mie Futitre of the American Negro.<br />
- Up from Slauery.<br />
- Le recrutement <strong>de</strong>s admini~trateurs coloniaux.<br />
- Rapport ci ln suite <strong>de</strong> missions d'étu<strong>de</strong>s aux In<strong>de</strong>s<br />
Neerlandnises.
Billiard (Albert)<br />
id.<br />
Braga (A. Rodrigues)<br />
Brehier (L.)<br />
Broca<br />
id.<br />
Brumiel<br />
Buckingham<br />
Cahn (0.)<br />
Cailleux<br />
Castilho (A. <strong>de</strong>)<br />
Castro (Affonso <strong>de</strong>)<br />
Carra <strong>de</strong> Vaux<br />
Cattier<br />
Chailley-Bert<br />
id.<br />
id,<br />
id.<br />
Ciiamberlain<br />
Charmes (O.)<br />
Chera<strong>da</strong>me<br />
Con<strong>de</strong> <strong>de</strong> S. e Faro<br />
Costa (Eduardo)<br />
id.<br />
Courant<br />
Cunha Gonçalves<br />
Cureau (D.teur)<br />
Darwin<br />
id.<br />
id.<br />
Demoor et Van<strong>de</strong>rvel<strong>de</strong><br />
Dantec (F. Le)<br />
Deschamps<br />
Desmouiins<br />
Dilke<br />
id.<br />
- Polifbqtte et «t'!/ciniantion roloninles.<br />
- gtu<strong>de</strong> aur ln contlilion polilique r1 jztridiqrre <strong>de</strong>a iildigtnes<br />
(Congrik Irit. <strong>de</strong> SU(-.O~~ 1900, tomo 11.0)<br />
- Fotnento colonicil porlir~gue: etrt Africn.<br />
- L'&/!/ple dc 17.38 ti InJ9.<br />
- Ali~~trctit~ra d'rrtilhropolo!/ip.<br />
- I:ec.ire rl'rctrlli~.opoloyie (W3-1875).<br />
- /.'I:'ial ei I'itidiuidii rlana la colonisnlion fvançaise morlet9r~c.<br />
- TIu 5qlflvs .5t(ll~.~ of :Imt:ricn.<br />
- Ile In conslilzcliot~ (10 l11~opl~i6lk iitdi!/irrie en Ah16rie.<br />
- La qucslion cllitcr,i.+e tor.x: l?ltrls Uniu et rlnns les possessioris<br />
d~s pt~i.wn~r(:s err~~o~ti;~?nnes.<br />
-- O ~li.:i~-irlo rlt3 IAo~ci.enc~o Jlitrclzces.<br />
- ils 1)osw~'aiteea ~O~.~U!/LI~;UJ na Oceania.<br />
- l:'/rctit! siri. In ~~t*opvii;lr; finrií.tse en Algé~ie.<br />
- 11r1i7' ('1 tidrniiiinlrrilinn tlcl1/~?1(rt In<strong>de</strong>yendirnt dic Con!go.<br />
- 1,i.i. triiii( es (LI I~oliliclite colottiale.<br />
- J(ioi[ c1 SI>S /~~~l~z!(rt~la.<br />
- f,n j~dilir~ire ~~rilti~iitrl~~ rle In 1;ran e.<br />
- ()~(oalioti~ d14 f~m1.1:: l.trc>ac.til. L'édr4cnlion et les coloniea.<br />
- lorelyn rind Colottitrl b5)ew1~ea.<br />
- Po1iliqi:o r.~,ic'vieci~e c1 ~.i~lo~iic~le;<br />
- Ln colonisalio~i c1 Ics c*tilonirn nllemcin<strong>de</strong>s.<br />
- A Zlhn <strong>de</strong> S. ilorn; o n liuc~t <strong>de</strong> ilglui-hl.<br />
CottyrCa cle Svciolo!qie Coloniitle. €'ntvisJ L!)UJ.<br />
Congresso Col! ninl tle /,ishoti, I!))/.<br />
Congrds Colui~icil <strong>de</strong> iIl(irat~ill,c:, 1SJíi.<br />
Congrki ('tilot~irrl t).citt~ciis. IJaviaJ 1908.<br />
- h's1 ir do so Ore e6 adminial).nçiro civil <strong>da</strong>s nossn~ posaee<br />
~ries (~fi*ic,cinar.<br />
- O ciia/rir
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Du Bois<br />
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Denys (Pierre)<br />
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Ellison<br />
Ennes (Antonio)<br />
id.<br />
Faucigny-Lucinge<br />
Ferreira Ribeiro<br />
Finot (Jean)<br />
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id.<br />
Freire d9Andra<strong>de</strong><br />
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id.<br />
id.<br />
id.<br />
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- Aipp>~essio,i o/' IIit, .~lrii-r I'ra<strong>de</strong>.<br />
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- Le Bt-Osil ai1 x ~.'~:: .*iii',c.le.<br />
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- La c.oizdilion so,.inle tlcs indi!givies algksbaesi.s.<br />
- Bvitt.di Cul~nznl Policy.<br />
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Lanersan<br />
id.<br />
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Leroy Beaulieu (Anatole)<br />
Leroy Beaulieu (Paul)<br />
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Leroy Beaulieu (Pierre)<br />
Lescure<br />
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Marco Fanno<br />
- 1,'Empire tlra I<strong>da</strong>t~u.<br />
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- Lcs notri~r~llr'.~ uocielt;~ dri!\lo bS'~tzonr~ea.<br />
- Ile,lP'tni, rle /
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Quatref ages - I!'ctsl>+ce lairni
564 BIBLIOGRAPHIA<br />
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Smith Cioldurin<br />
Sousa<br />
Stephen Ward<br />
Stokes (Whitley)<br />
Strachey (Sir John)<br />
Stuart Mill<br />
Sylvain<br />
Teixeira GnimarBes<br />
Thomson<br />
Topinard<br />
Treille<br />
Ulrich (J. Henrique)<br />
Ulrich (R. Ennes)<br />
Van Kol<br />
Varnhagen<br />
Vaeconceiios (Ernesto <strong>de</strong>)<br />
id.<br />
Vibert<br />
Vignon (Louie)<br />
Vilhena (Ernesto <strong>de</strong>)<br />
Warushkin<br />
Williams (G. W.)<br />
Wileon<br />
Woodward<br />
Worsfold<br />
Zaoache<br />
Zimmerman<br />
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- Ai) tli::l~-irto <strong>de</strong> Moçamliique.<br />
- 7'11~ 15trilii~.<br />
- Oriente (,'o~trlitiuludo.<br />
- 7?~e A'(ilio*cil IIzutor!\ of Mankind.<br />
- 'l'lle .4)rylo-Indicrn Co<strong>de</strong>s.<br />
- Indin.<br />
- IJrirrí,ipt~a d'econurriie polilique.<br />
- DIL .YOI-/ <strong>de</strong>u indighnes.<br />
- As com)t~irnid~idcs iittlianns tlns Velhas Conyztl.~l<br />
- Rho<strong>de</strong>sicc und ila Go11c:~nrnent.<br />
- L'dnlh~-opci~o;jie.<br />
- De l'acclinialalion <strong>de</strong>s européetzs <strong>da</strong>na ler pays #.,<br />
- O cvcdito a!/~~icol(i em Portugal : sua organistro<br />
-- Polilica coloninl.<br />
- Condiltnn poliliq~te et jztridique <strong>de</strong>s indigl:neã ( /<br />
rio apveuentcido ao Congreãao <strong>de</strong> Sociologia Ci.1<br />
- ITistoria !/eral do Brazil.<br />
- Coloniau Porlu!~uezaa.<br />
- A ilh~t <strong>de</strong> S. S.'ltomtl c, o trabalho indigenu.<br />
- Colonisnli,)n pralique e1 ~.ornpa?.i.e.<br />
- L'expansion coloriinle <strong>de</strong> la France.<br />
- Companhia do hr!lossa : relalorios do govenaac<br />
- Ulier die Pro/ilirtmy <strong>de</strong>8 Gesicl~tasel~ae<strong>de</strong>ls.<br />
- Histor!~ of lhe Ne!~rn Hnoe in Americ,,.<br />
- Suils of hlill's Ilisiory of H~~itisli India.<br />
- 1'11e E~pansio~i of lhe Uviii.:lr Ernpive.<br />
- A)ILIII dfvlcn.<br />
- Ltc propriCti. indi!/éne et Ia coloniaation (Zbniii~l<br />
- Uie eiirapilijclien Kolonien.<br />
- Bt.c:do tc favor dnu communi<strong>da</strong><strong>de</strong>r dna al<strong>de</strong>icix 11<br />
tadlb dci India.<br />
PUBLICAÇÕES OFFICIAES<br />
Boletim Oficial do Estado <strong>da</strong> India.<br />
,, u <strong>de</strong> Moçarnòique e Annexo <strong>de</strong> 1909.<br />
3, n » Angola.<br />
Collecçáo cotnpleta <strong>da</strong> legislaçâo ultramarina.<br />
E'stntir!ica geral <strong>da</strong>s possessões ultramarinas para 1900.<br />
Orprnento yerul <strong>da</strong>s yrovincias uliramarinaa 3905-1909.<br />
Relatorios dos governadores <strong>de</strong> Moçnmliiqzte, Zambezia, Teís e Inhnmbane 3!W;
BrifWt Parliutnenlat.!l puperr (Blue 1)ool;a) - 1908.<br />
Colonial 0lrir.e Lisi - 19ü7<br />
BIBLIOGRAPHIA 565<br />
Annziaires coloniatix, f9OS (p~rblii*ndou 8epnrn<strong>da</strong>me)lle pava ca<strong>da</strong> colonza).<br />
,~tutzstzclcce.r colonialee 19%-.19M (piiblicndna pelo n~iniuterio <strong>da</strong>s eolonins).<br />
PUBLICAÇÕES PERIODICAS<br />
Annalea d'rlntl~ropoloyie. I>uvia.<br />
Coloiziccl Gnzclte. Londtves.<br />
&'o'ol.ei!/n and Colonial Reuiew. Londres.<br />
Gazelle coloninle. Rtsic ~,ellíts.<br />
L'AnriL'e Coloniale. Pari*.<br />
L'Aclio~i Coloninle. Pa9.i~.<br />
La llépc(~/ie Coloninle. Pavi*. *<br />
L'lictlici r~oloitiitle. Rolna.<br />
1,ct Q~ri,c:cti,ie colo?iinle. Paris.<br />
pr~riti!lol on AfPrm. Lisl~iia.<br />
Queslio~ca diplon~aliques e1 (~r~lu~rictli~d. Pnl-ia.<br />
Reviuta Pot.ttcgzie,-a Colonial. e Jfflviliin,n. Lirhria.<br />
Revzte coloniale. Paris. (Ase))ii-o/li~inli.
Pagina Llnha<br />
44 18<br />
62 29<br />
66 24<br />
71 2<br />
82 27<br />
84 24<br />
98 5<br />
103 15<br />
111 18<br />
128 20<br />
145 27<br />
148 27<br />
I60 14<br />
213 11<br />
303 33<br />
312 16<br />
415 22<br />
466 5<br />
493 titulo <strong>de</strong> pg.<br />
506 14<br />
On<strong>de</strong> ae Ib<br />
feição social<br />
S\iccessão<br />
Siiccessão<br />
nossa<br />
vendo<br />
<strong>de</strong>vem n'este caso<br />
as protegessem<br />
<strong>de</strong>ve<br />
alcançou<br />
corpos inferiores<br />
com o livre pensamento<br />
siihtrncta<br />
repositario<br />
colonins<br />
Maria <strong>de</strong> Paiva<br />
com<br />
regimen<br />
baneiro<br />
Credito<br />
elles existem<br />
Deve Lér-se<br />
feic;ão especial<br />
Secessão<br />
Secessão<br />
nova<br />
sendo<br />
<strong>de</strong>vem n'este caso as missões<br />
a protegesseni<br />
po<strong>de</strong><br />
alcançar<br />
cargos inferior?^<br />
como o livre pensamento 6<br />
substracta<br />
repositorio<br />
colonias inglezas<br />
Mecia <strong>de</strong> Paiva<br />
um<br />
regimens<br />
banqueiro<br />
Assistencia<br />
estes inconvenientes existem<br />
Alem d'estes, alguns erros menos importantes apparecerão, faceis <strong>de</strong> corri-<br />
gir, e que foi impossivel evitar <strong>de</strong>vido á rapi<strong>de</strong>z com que se effectuoii a revisão.
CAPITULO I . Nocões Geraes . . . . . . . . . .<br />
<strong>Politica</strong> indigena: mo<strong>de</strong>rnismo <strong>da</strong> i<strong>de</strong>ia. significado. essencia .<br />
Conservação e restricções dos usos e instituições indigenas . .<br />
Meios civilisadores . Utili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s missões . . . . . .<br />
Possibili<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> civilisação <strong>da</strong> raça negra . . . . . .<br />
Theoria do meio . . . . . . . . . . . .<br />
caracteres exteriores<br />
I<br />
. . . .<br />
Caracteres anthropologicos caracteresanatomicos . . . .<br />
Caracteres physiologicos .<br />
Intellectuali<strong>da</strong><strong>de</strong> negra .<br />
Morali<strong>da</strong><strong>de</strong> negra . . .<br />
Conclusões geraes . .<br />
.<br />
.<br />
.<br />
.<br />
.<br />
.<br />
.<br />
.<br />
.<br />
CAPITULO I[ . Educação Moral e Religiosa dos <strong>Indigena</strong>s . . .<br />
Caracter humano . . . . . . . . . . . .<br />
Plienomenos educativos . . . . . . . . . .<br />
Necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s missões . <strong>Politica</strong> religiosa e educativa nas colonias<br />
. . . . . . . . . . . . . .<br />
Propagan<strong>da</strong> missionaria nas colonias portiiguezas . . . .<br />
Conclusões geraes . . . . . . . . . . . .<br />
Importancia <strong>da</strong> instrucção como elemento <strong>de</strong> politica indigena .<br />
Ensino indigena nas colonias portuguezas . . . . .<br />
D D w » francezas . .<br />
Generali<strong>da</strong><strong>de</strong>s sobre o ensino indigena em outras colonias estrangeiras<br />
. . . . . . . . . . . . .<br />
Conclusões geraes . . . . . . . . . .
570 INDICE<br />
CAPITULO IV . Condição Juridica e <strong>Politica</strong> dos <strong>Indigena</strong>s . . .<br />
Jiistiça jndige~ia: noções geraes . . . . . . . .<br />
<strong>Direito</strong> privado . . . . . . . . . . . .<br />
<strong>Direito</strong> privado indigena nas coloriias portuguezas . . . .<br />
<strong>Direito</strong> penal . . . . . . . . . . . . .<br />
IJireito penal indigena nas colonias portuguezas . . . . .<br />
Condição juridica dos mestiços . . . . . . . .<br />
Ilireitos politicos . . . . . . . . . . . .<br />
CL~PITULO V . Trabalho <strong>Indigena</strong> . . . . . . . .<br />
Generalicia<strong>de</strong>s . . . . . . .<br />
1 inethotlos directos . Mão d'obra local<br />
I rnethndos indirectos .<br />
.<br />
.<br />
.<br />
.<br />
.<br />
.<br />
.<br />
.<br />
.<br />
.<br />
.<br />
.<br />
Ileyiiiieii <strong>da</strong> rrião d'ohra local nas colonias portuguezas . . .<br />
Trabalho iiripcirtado . . . . . . . . . . .<br />
'I'rabalho importado nas colonias portuguezas- Mão d'obra em S .<br />
Thome e Principe . . . . . . . . . . .<br />
CAPITULO VI- Regimen <strong>da</strong> Proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>Indigena</strong> . . .<br />
Generali<strong>da</strong><strong>de</strong>s . . . . . . . . . . .<br />
IndiaJrigleza . . . . . . . . .<br />
Indiab Orientaes Neerlan<strong>de</strong>zas . . . . . . .<br />
Argelia . . . . . . . . . . . .<br />
l'unisia . . . . . . . . . . .<br />
Colnnias <strong>da</strong> Africa Occi<strong>de</strong>ntal . . . . . . .<br />
Colonia do Cabo . . . . . . . . . .<br />
(:olonias <strong>da</strong> Africa Oriental . . . . .<br />
(:oloriias Orientaes . . . . . . . . .<br />
. .<br />
. .<br />
. .<br />
.<br />
. .<br />
. .<br />
. .<br />
. .<br />
. .<br />
Golonias Portriguezas . . . . . . . . .<br />
CoiicliisOes geraes .<br />
CAPITULO V1 I . Imposto <strong>Indigena</strong><br />
Generali<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
. . . . . . . . . .<br />
. . . . . . . . .<br />
. . . . . . . .<br />
colonias port~iguezas .<br />
. I coloniasestrangeiras .<br />
colonias portuguezas .<br />
colonias estrangeiras .<br />
. . . . . . .<br />
.<br />
.<br />
.<br />
.<br />
.<br />
.<br />
.<br />
.<br />
. .<br />
. .<br />
. .<br />
, .<br />
. .<br />
. .<br />
Capitação . .<br />
Imposto <strong>de</strong> palhota I Iriiposto territorial<br />
Diversos impostos . . . . . . . . . . . .<br />
CL~PITITI. O V111 . Credito . Cooperativismo . Assistencia . . . 455 » 496<br />
. . . . . . . . . . . .<br />
. . . . . . . . . .<br />
. . . . . . . . .<br />
Credito <strong>Indigena</strong> 467 )) 471<br />
Cooperativas <strong>Indigena</strong>s<br />
Assistencia Piihlica e Medica<br />
471 » 483<br />
484 )) 496<br />
.
INDICE<br />
CAPITULO IX . Utilisação dos <strong>Indigena</strong>s na Defeza e Poliria d~is Colo-<br />
nias . . . . . . . . . . . . . .<br />
Papel dos indigenas na <strong>de</strong>feza <strong>da</strong>s colonias . . . + . .<br />
Composição <strong>da</strong>s gtlarniçies <strong>da</strong> marinha colonial . . . .<br />
Policia indigena . . . . . . . . . . . .<br />
Utilisação <strong>da</strong>s tropas indigenas fira <strong>da</strong>s respectivas colonias .<br />
CAPITULO X- Instituiç6es Administrativas . . . . . . .<br />
Conservação dos organismos administrativos indigeiias<br />
. . .<br />
Circumscripções indigenas . . . . . . . . .<br />
Instituições iiiiinicipaes . . . . . . . . . .<br />
Conclusões geraes . . . . . . . . . . .
PROPRIEDADE LITTERARIA RESERVADA<br />
TOUS DROITS RESERVES<br />
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