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Texto Completo - Projeto HAM - História e Análise Midiática

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20 - Marxismo e Revolução: da “Estratégia de Derrocada” à “Guerra de Posições”<br />

vimento das forças produtivas de determinada<br />

sociedade e das relações de produção, um estudo<br />

objetivo e científico das forças materiais que, relativamente<br />

independentes da vontade dos homens,<br />

organizam a produção e o atendimento às necessidades<br />

construídas historicamente por tal sociedade. Este<br />

estudo permite reconhecer o terreno fundamental<br />

onde se desenvolvem a luta de classes e as disputas<br />

políticas e ideológicas na sociedade, apontando para a<br />

definição de existirem ou não as condições necessárias<br />

e suficientes para a sua transformação, conforme<br />

indicava Marx no célebre Prefácio.<br />

A relação das forças políticas corresponde<br />

ao grau de homogeneidade, autoconsciência e<br />

organização dos grupos sociais, cuja avaliação, por<br />

sua vez, exige o reconhecimento dos diferentes níveis<br />

de seu desenvolvimento, consoante ao maior ou<br />

menor grau de amadurecimento da consciência<br />

política coletiva dos grupos e classes sociais. Este<br />

processo abrangeria a passagem da consciência<br />

primária, econômico-corporativa, em que os grupos<br />

se organizam conforme seus interesses econômicos<br />

imediatos, forjando laços de solidariedade de acordo<br />

com a posição e a atividade profissional ocupadas na<br />

sociedade, para a consciência política propriamente<br />

dita, que supera os marcos corporativos e transforma<br />

as ideologias criadas anteriormente em “partido”.<br />

Este é o momento da hegemonia, que expressa a<br />

capacidade de um grupo social unificar em torno de<br />

seu projeto político um bloco mais amplo não homogêneo,<br />

marcado por contradições de classe. O grupo<br />

ou classe que lidera este bloco é hegemônico porque<br />

consegue ir além de seus interesses econômicos<br />

imediatos, para manter articuladas forças heterogêneas,<br />

numa ação essencialmente política, que impeça a<br />

irrupção dos contrastes existentes entre elas.<br />

Logo, a hegemonia é algo que se conquista<br />

por meio da direção política e do consenso e não<br />

apenas mediante a coerção. Pressupõe, além da ação<br />

política, a constituição de uma determinada moral, de<br />

uma concepção de mundo, numa ação que envolve<br />

questões de ordem cultural, na intenção de que seja<br />

instaurado um “acordo coletivo” através da introjeção<br />

da mensagem simbólica, produzindo consciências<br />

falantes, sujeitos que sentem a vivência ideológica<br />

como sua verdade. Portanto, além da unidade em<br />

torno de objetivos econômicos e políticos, busca-se<br />

construir, nesta hora, a unidade intelectual e moral,<br />

ultrapassando-se o plano corporativo para se atingir,<br />

numa ordem muito mais ampla, que se pretende<br />

universal na sociedade, a hegemonia do grupo social<br />

18 GRAMSCI, Antonio. Cadernos do Cárcere – Volume 3, p. 42.<br />

19 Idem, ibidem, p. 48.<br />

fundamental sobre grupos afins subordinados.<br />

Não se trata, entretanto, de idealizar a<br />

capacidade diretiva da facção dominante, confundindo<br />

hegemonia com controle absoluto do grupo<br />

hegemônico sobre seus aliados, pois o processo não<br />

extingue os embates e conflitos resultantes dos<br />

posicionamentos e interesses específicos de cada<br />

fração de classe. Trata-se, na verdade, de “uma<br />

contínua formação e superação de equilíbrios<br />

instáveis ... entre os interesses do grupo fundamental<br />

18<br />

e os interesses dos grupos subordinados” , tendo em<br />

vista, acima de tudo, a necessidade de se forjar um<br />

certo equilíbrio de compromisso a exigir sacrifícios<br />

de ordem econômico-corporativa que, por outro lado,<br />

não podem envolver o aspecto essencial da luta<br />

política, pois, segundo nosso autor, “se a hegemonia é<br />

ético-política, não pode deixar de ser também<br />

econômica, de ter seu fundamento na função decisiva<br />

que o grupo dirigente exerce no núcleo decisivo da<br />

19<br />

atividade econômica”.<br />

Gramsci aponta também para a necessidade<br />

de se estudar a relação das forças militares, o que<br />

indica, claramente, que sua visão de hegemonia não<br />

descarta o uso da violência revolucionária no processo<br />

da luta pelo poder. Debruçando-se sobre o<br />

Risorgimento, movimento responsável pela unificação<br />

da Itália na segunda metade do século XIX,<br />

destaca a “ausência desastrosa de uma direção<br />

20<br />

político-militar” tanto no Partido da Ação, liderado<br />

por Garibaldi e representativo das camadas populares,<br />

quanto no partido moderado da monarquia<br />

piemontesa. O resultado deste processo teria sido o<br />

seu caráter inacabado: “não transforma integralmente<br />

as estruturas do passado e não instaura um Estado<br />

renovado que incorporaria amplas camadas sociais à<br />

21<br />

cidadania” , porque nele nenhum grupo social foi<br />

capaz de expressar a radicalidade revolucionária dos<br />

jacobinos, na experiência clássica de revolução<br />

burguesa, terminando por fundar um compromisso<br />

entre frações da classe dominante para a manutenção<br />

da dominação.<br />

Concluindo sua análise sobre as relações de<br />

força na sociedade, Gramsci rejeitava categoricamente<br />

a perspectiva do economicismo, a enxergar o<br />

momento da ruptura ou da revolução como determinado<br />

mecanicamente por causas imediatas ligadas ao<br />

empobrecimento ou à miséria das massas, pois o<br />

processo revolucionário exigia, essencialmente, que<br />

os conflitos fundamentais se dessem no campo da<br />

política e da ideologia, onde os grupos que travam a<br />

20 Idem, ibidem, p. 43.<br />

21 SECCO, Lincoln. Op. cit., p. 85.

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