o que nos ensina a jovem homossexual de freud sobre o que é ser ...
o que nos ensina a jovem homossexual de freud sobre o que é ser ...
o que nos ensina a jovem homossexual de freud sobre o que é ser ...
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
92 OKBA NATAHI E OLIVER DOUVILLE<br />
abismo melancólico on<strong>de</strong> se atirou a <strong>jovem</strong>, em afânise, diante da<br />
necessida<strong>de</strong> simbólica <strong>de</strong> realizar, escondida atrás da <strong>de</strong>claração <strong>de</strong><br />
amor, uma <strong>de</strong>claração <strong>de</strong> sexuação.<br />
Se num primeiro momento Freud fala somente do “olhar furioso”<br />
do Pai, ele não consi<strong>de</strong>ra <strong>que</strong> quando a Dama se enfureceu<br />
e or<strong>de</strong>nou à <strong>jovem</strong> <strong>que</strong> a <strong>de</strong>ixasse ela se<strong>que</strong>r sabia <strong>que</strong>m era esse<br />
homem. Po<strong>de</strong>ríamos encontrar aqui uma mudança <strong>de</strong> direção em<br />
<strong>nos</strong>sa análise. O efeito traumático do olhar do pai <strong>é</strong> um fato inegável,<br />
<strong>de</strong>vemos todavia esclarecer em <strong>que</strong> medida ele o <strong>é</strong>. Em <strong>nos</strong>sa<br />
análise da implosão subjetiva <strong>de</strong>ssa <strong>jovem</strong> não só ressaltaremos a<br />
amplitu<strong>de</strong> da ameaça advinda do pai, mas privilegiaremos a hipótese<br />
segundo a qual esse olhar <strong>é</strong> ameaçador por<strong>que</strong> ele dá livre<br />
curso à fúria da Dama em sua “sentença <strong>de</strong> morte”. Veremos a<br />
seguir em <strong>que</strong> sentido essa cumplicida<strong>de</strong>, cimentada pelo efeito<br />
surpresa entre o olhar furioso do Pai e a voz raivosa da Dama, <strong>é</strong><br />
<strong>de</strong>vastadora, justamente por<strong>que</strong> ela se assemelha para a <strong>jovem</strong> a<br />
uma outra fúria <strong>de</strong>struidora: a<strong>que</strong>la <strong>que</strong> po<strong>de</strong>ria sua mãe alimentar<br />
contra ela. Transformar-se em cavalheiro para a Dama, assim<br />
como ela tinha assumido o lugar <strong>de</strong> confi<strong>de</strong>nte edificante da mãe,<br />
era, para essa <strong>jovem</strong>, a maneira <strong>que</strong> tinha <strong>de</strong> inventar um mito<br />
para o <strong>que</strong> circula entre os homens e as mulheres, mas, tamb<strong>é</strong>m,<br />
para ela, entre mulheres e mulheres: o <strong>de</strong>sejo e o sexual. Toda a<br />
construção <strong>de</strong> seu corpo erótico acaba <strong>de</strong>struída <strong>de</strong> uma só vez por<br />
essa conjunção fatal entre o olhar <strong>de</strong> seu pai e a fúria da Dama.<br />
Estamos aqui na parte mais sensível da aposta do feminino na adolescência.<br />
Buscar uma testemunha confiável <strong>que</strong> possa atestar a<br />
valida<strong>de</strong> da separação do sujeito feminino da ira invejosa da mãe.<br />
Será esse abandono expresso pela <strong>que</strong>da (<strong>que</strong> nem mesmo <strong>é</strong> um<br />
ato, uma <strong>que</strong>da da psi<strong>que</strong> e do corpo) uma autopunição?<br />
Antes <strong>de</strong> tudo, <strong>é</strong> necessário procurar os motivos inconscientes,<br />
sem <strong>nos</strong> contentarmos com a falsa evidência <strong>de</strong> <strong>que</strong> toda auto-agressão<br />
<strong>é</strong> autopunitiva. A autopunição, segundo Freud, vingança contra<br />
o pai <strong>de</strong>struidor <strong>de</strong> seu amor, revela-se uma forma <strong>de</strong> realizar um<br />
<strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> morte contra a mãe. Esta <strong>de</strong>veria ter morrido no momento<br />
TEMPO PSICANALÍTICO, RIO DE JANEIRO, V.40.1, P.77-104, 2008