Novembro de 2011 - Paróquia Nossa Senhora das Mercês
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O que nos chama a atenção no calendário do mês <strong>de</strong><br />
novembro é a celebração dos finados. Há quem <strong>de</strong>teste<br />
pensar na morte.<br />
Poucos dias após a inauguração do Cemitério Parque<br />
Iguaçu, em Curitiba, fui conhecê-lo. Impressionou-me a beleza<br />
do espaço todo, o bosque, aquele bem cultivado gramado.<br />
Era mesmo um parque. Ao sair, falei à jovem secretária que<br />
ali estava sentada a um birô: - gostei muito daqui e voltarei<br />
mais vezes para meditar sobre a morte. Para minha surpresa<br />
ela me disse: “não, por favor; venha sim, para nos visitar e<br />
para um cafezinho, mas não para pensar na morte”.<br />
O fenômeno morte é paralelo ao nascimento. Como diria<br />
alguém jocosamente, embora possa parecer humor macabro:<br />
“a vida é uma doença terminal e sexualmente transmissível”.<br />
Porém a verda<strong>de</strong> crua, nua, mas também serena<br />
é: quem nasceu, necessariamente vai morrer um dia.<br />
Não dá para negar que <strong>de</strong> fato, a morte seja mesmo<br />
o fim <strong>de</strong> uma jornada. Talvez pudéssemos compará-la, um<br />
pouco com o entar<strong>de</strong>cer <strong>de</strong> um dia, o fim <strong>de</strong> uma festa, o<br />
último aceno <strong>de</strong> um encontro. O fechar <strong>das</strong> cortinas <strong>de</strong> um<br />
gran<strong>de</strong> espetáculo.<br />
O fato é que nos costumamos associar fim com uma<br />
coisa ruim. Quando enten<strong>de</strong>rmos que o fim não necessariamente<br />
precisa significar algo negativo, a própria dor da<br />
separação <strong>de</strong> um ente querido, será diferente. Até mesmo<br />
quando sentirmos que a morte ronda ao nosso redor seja<br />
por uma doença terminal ou pela velhice, a nossa atitu<strong>de</strong><br />
será bem diferente.<br />
Fiquei muito impressionado e bem impressionado,<br />
quando soube da morte <strong>de</strong> frei Irineu Costela; um dos<br />
egressos da Província Capuchinha do Rio Gran<strong>de</strong> do Sul e<br />
São Paulo: evangelização em meio aos conflitos<br />
Um dos temas fundamentais na teologia paulina é a<br />
evangelização. É fundamental porque mostra a figura do<br />
verda<strong>de</strong>iro discípulo <strong>de</strong> Cristo que escuta, crê e prega a<br />
palavra do Mestre, não obstante os momentos <strong>de</strong> crises e<br />
dificulda<strong>de</strong>s.<br />
São Paulo, o apóstolo dos gentios, passou por vários<br />
conflitos por causa do Evangelho. Um conflito forte foi o<br />
que diz respeito à acusação <strong>de</strong> que ele não era apóstolo<br />
(1Coríntios 9,2). O mesmo aparece na carta aos Gálatas,<br />
e é por isso que ele insiste em dizer várias vezes que não<br />
é apóstolo “da parte dos homens” (Gálatas 1,1), e sim da<br />
parte <strong>de</strong> Cristo (Gálatas 1,12).<br />
Embora Paulo não tenha ouvido/ entendido toda a revelação<br />
por parte <strong>de</strong> outro apóstolo ou <strong>de</strong> outro evangelizador,<br />
mas por parte <strong>de</strong> Cristo (Gálatas 1,12) não quer dizer<br />
que, no encontro com Cristo, ele recebeu como que uma<br />
caixinha que continha to<strong>das</strong> as verda<strong>de</strong>s que haveria <strong>de</strong><br />
proclamar ao mundo. Paulo se refere à salvação pela Fé em<br />
Jesus Cristo sem as obras da Lei (Gálatas 2,16).<br />
Outras dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong>correntes da evangelização surgem.<br />
Paulo faz questão <strong>de</strong> afirmar o direito que o missionário<br />
tem <strong>de</strong> ser sustentado por causa do trabalho que faz<br />
(1Coríntios 9,6-14; Gálatas 6,6; 2Tessalonicenses 3,9). Entretanto,<br />
quis trabalhar com as próprias mãos (1Cor 4,12)<br />
para não ser pesado para a comunida<strong>de</strong> (1Tessalonicenses<br />
2,9). Ele tinha uma profissão: fabricante <strong>de</strong> ten<strong>das</strong> (At<br />
18,3).<br />
Seguramente, a família <strong>de</strong> Paulo era rica. Devia ter uma<br />
empresa para a confecção <strong>de</strong> ten<strong>das</strong>, uma vez que <strong>de</strong>via<br />
dar um bom lucro, haja vista a presença dos soldados romanos<br />
(o império romano dominava toda esta região) que<br />
necessitavam <strong>das</strong> ten<strong>das</strong>. E Paulo opta em <strong>de</strong>ixar tudo isso<br />
para trabalhar com as próprias mãos, o que era <strong>de</strong>sprezível<br />
no mundo grego, uma vez que o trabalho manual era <strong>de</strong>stinado<br />
aos escravos.<br />
A morte como fim plenitu<strong>de</strong><br />
integrante do grupo fundador dos Missionários Franciscanos,<br />
que tem sua casa central em Ponta Grossa.<br />
Nos dias que antece<strong>de</strong>ram minha transferência para<br />
Umuarama, em 2002, frei Irineu, vitimado por um câncer,<br />
fazia quimioterapia no Hospital <strong>Nossa</strong> <strong>Senhora</strong> <strong>das</strong> Graças<br />
e hospedava-se no Convento <strong>das</strong> Mercês.<br />
Conversei longamente com ele que me pareceu, apesar<br />
da gravida<strong>de</strong> do seu estado <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, extremamente sereno.<br />
Em menos <strong>de</strong> um ano fiquei sabendo da sua morte.<br />
Por ocasião <strong>de</strong> uma vinda a Curitiba, fui visitar a minha,<br />
hoje também saudosa amiga, Irmã Atília e lhe perguntei:<br />
- como foi a morte do frei Irineu. A Irmã me respon<strong>de</strong>u:<br />
foi uma verda<strong>de</strong>ira catequese, uma pregação, para todo o<br />
Hospital. Médicos, enfermeiros, <strong>de</strong>mais funcionários, todos<br />
queriam vê-lo nos seus últimos dias. Tinha o semblante<br />
sempre tranquilo e sorri<strong>de</strong>nte. Perguntado se não estava<br />
triste, preocupado com a sua situação, dizia: “Por que <strong>de</strong>vo-<br />
-me preocupar? A vida toda me preparei para este encontro<br />
com o Pai. Agora está chegando a hora do gran<strong>de</strong> abraço<br />
com Ele”.<br />
De fato a morte é o fim da vida terrestre. Causa sem dúvida<br />
um trauma na família, na socieda<strong>de</strong> em que conviveu<br />
o indivíduo em questão. Mas quando esse fim é entendido<br />
como meta alcançada, então passa a ser nascimento. Ou<br />
ainda, ponto <strong>de</strong> partida e não apenas ponto <strong>de</strong> chegada.<br />
É verda<strong>de</strong> que a morte é mesmo o fim <strong>de</strong> uma jornada.<br />
Ela <strong>de</strong> fato marca a ruptura <strong>de</strong> um processo. A morte cria<br />
uma separação, uma cisão entre tempo e eternida<strong>de</strong>. Mas<br />
isto diz respeito apenas ao aspecto biológico, temporal,<br />
material. Porém o homem é mais do que isto, é mais do<br />
que animal, mais do que temporal, mais do que material. O<br />
Na carta aos filipenses, diz: “circuncidado ao oitavo dia,<br />
da raça <strong>de</strong> Israel, da tribo <strong>de</strong> Benjamim, hebreu filho <strong>de</strong><br />
hebreus; quanto a Lei, fariseu; quanto ao zelo, perseguidor<br />
da Igreja; quanto à justiça que há na Lei, irrepreensível”<br />
(Fil 3,5-6). Esta certamente foi uma <strong>das</strong> razões <strong>de</strong> crises/<br />
dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Paulo, uma vez que ele era legítimo ju<strong>de</strong>u,<br />
a ponto <strong>de</strong> observar to<strong>das</strong> as leis, e <strong>de</strong>ixou tudo por causa<br />
<strong>de</strong> Cristo.<br />
Logo, quando Paulo fala que “o que era lucro tive-o<br />
como perda, por amor <strong>de</strong> Cristo” (Fil 3,7), está falando <strong>de</strong><br />
algo que sentiu na pele. Não era como <strong>de</strong>ixar alguma coisa<br />
supérflua, e sim algo que o caracterizava naquele mundo<br />
(ju<strong>de</strong>u e cidadão romano) e que lhe era fonte <strong>de</strong> subsistência<br />
(fabricante <strong>de</strong> ten<strong>das</strong>, família...).<br />
Paulo teria as seguintes formas básicas para ganhar a<br />
vida naquele tempo: po<strong>de</strong>ria cobrar pelo ensino como faziam<br />
os gran<strong>de</strong>s mestres no mundo grego (o filósofo Aristóteles,<br />
por exemplo); ou receber esmolas. Estas formas<br />
estariam bem <strong>de</strong> acordo com o que pensavam os gregos,<br />
para quem o trabalho manual era próprio dos escravos e<br />
impróprio para um cidadão livre. Mas Paulo nunca aceitou<br />
esmolas, a não ser da comunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Filipos (Filipenses<br />
4,15-16; 2Coríntios 11,9).<br />
Po<strong>de</strong>ríamos nos perguntar por que Paulo faz toda essa<br />
renúncia e <strong>de</strong>ci<strong>de</strong> anunciar o Evangelho em meio a tantos<br />
conflitos, e 1Coríntios 9,19-22 po<strong>de</strong> apresentar uma luz:<br />
Paulo faz a opção <strong>de</strong> se rebaixar totalmente para ganhar a<br />
todos para Cristo.<br />
Outro gran<strong>de</strong> conflito que Paulo vivenciou aconteceu<br />
no Areópago, em Atenas. O apóstolo dos gentios preparou<br />
bem seu discurso e falou <strong>de</strong> Jesus, sem mencionar seu<br />
nome. Não se referiu à cruz (Atos dos Apóstolos 17,30-<br />
31). E quando falou da ressurreição <strong>de</strong> Cristo os ouvintes<br />
zombaram <strong>de</strong>le e disseram: “volte outro dia e talvez te ouviremos!”<br />
(Atos 17,32).<br />
homem é mais do que o tempo. Ele aspira pela eternida<strong>de</strong><br />
da vida. Portanto para o homem que viveu não só a sua<br />
animalida<strong>de</strong>, mas a totalida<strong>de</strong> do seu ser, a morte não é o<br />
fim <strong>de</strong> tudo. A morte é ponto <strong>de</strong> partida da vida verda<strong>de</strong>ira<br />
e eterna.<br />
O ciclo normal da vida é: nascer, crescer, amadurecer,<br />
envelhecer e morrer. Quando alguém não passa por este<br />
caminho, significa que algo <strong>de</strong> errado aconteceu com ele. E<br />
é bom que se diga, não é a vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> Deus. Quem morre<br />
em criança ou na juventu<strong>de</strong>, morre fora <strong>de</strong> hora. Deus naturalmente,<br />
não quer isto.<br />
Aquele gran<strong>de</strong> potencial <strong>de</strong> vida que se tem na infância<br />
e na juventu<strong>de</strong>, aos poucos vai se <strong>de</strong>sgastando com o passar<br />
dos anos. A morte vai acontecendo aos poucos; vamos<br />
morrendo em prestações. Cada segundo, cada momento<br />
representa vida <strong>de</strong>sgastada.<br />
A morte não po<strong>de</strong> nos assustar. Pois ela é o fim <strong>de</strong><br />
uma vida, a biológica, a material, a temporal e o começo da<br />
vida pessoal, interior, a que não termina. A morte só <strong>de</strong>ve<br />
causar medo para quem não se empenhou em construir<br />
essa vida interior.<br />
Então a morte é fechar os olhos para este mundo e<br />
abrir para a eternida<strong>de</strong>. De fato é mesmo, como dizia frei<br />
Irineu, o momento do gran<strong>de</strong> abraço com o Pai, para o qual<br />
nos preparamos durante toda a nossa<br />
vida.<br />
Que estes pensamentos nos levem<br />
a ver a vida e a morte com muito<br />
mais otimismo e principalmente com<br />
muito mais sentido cristão e religioso.<br />
Frei Davi Nogueira Barboza<br />
Esse foi mais um momento <strong>de</strong> crise e conflito para Paulo:<br />
fracassou no seu discurso. Talvez ele quisesse <strong>de</strong>rrubar<br />
o sistema da religião pagã que havia em Atenas. Entretanto,<br />
não conseguiu. E sua chegada em Corinto revela como<br />
vivenciou este gran<strong>de</strong> conflito (1Coríntios 2,3; 1Tessalonicenses<br />
3,7). Um <strong>de</strong>talhe: <strong>de</strong>pois do episódio <strong>de</strong> Atenas,<br />
Paulo começa a falar da Cruz <strong>de</strong> Cristo. Antes, parecia<br />
um gran<strong>de</strong> orador que <strong>de</strong>sejava mudar a opinião <strong>de</strong> todos<br />
através <strong>de</strong> sua palavra. Agora Paulo afirma: “Quando fui ao<br />
encontro <strong>de</strong> vocês não me apresentei com o prestígio da<br />
oratória ou da sabedoria, para anunciar-lhes o mistério <strong>de</strong><br />
Deus” (1Coríntios 2,1-5).<br />
Nesse contexto <strong>de</strong> conflitos, que Paulo viveu, é possível<br />
compreen<strong>de</strong>r que ele teve a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> transformar<br />
conflitos em fonte <strong>de</strong> fé, esperança e amor. Há quem fale<br />
em uma espiritualida<strong>de</strong> do conflito, uma vez que Paulo tirou<br />
proveito <strong>de</strong> to<strong>das</strong> estas crises, assim como os discípulos<br />
<strong>de</strong> Emaús: a cruz que era sinal <strong>de</strong> morte, <strong>de</strong>sânimo, <strong>de</strong>sesperança...<br />
transforma-se em sinal <strong>de</strong> vida e esperança<br />
(Lucas 24,13-35).<br />
Que o Apóstolo Paulo nos ilumine a enfrentar nossos<br />
conflitos e nunca <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> anunciar o Cristo – “Anunciar o<br />
evangelho não é título <strong>de</strong> glória para mim; é, antes, necessida<strong>de</strong><br />
que se me impõe. Ai <strong>de</strong> mim, se eu não anunciar o<br />
evangelho!” (1Coríntios 9,16).<br />
Paz e Bem!<br />
Frei Rogério Goldoni Silveira<br />
– OFMCap<br />
freiroger@yahoo.com.br<br />
Frei Rogério dá curso<br />
bíblico to<strong>das</strong> as primeiras<br />
segun<strong>das</strong>-feiras do mês<br />
na Igreja <strong>das</strong> Mercês.<br />
Boletim Informativo da Paróquia <strong>Nossa</strong> <strong>Senhora</strong> <strong>das</strong> Mercês - 7