16.04.2014 Views

Revista UnicaPhoto - 2.Ed/2014

Revista dos alunos, ex-alunos e professores do curso de Fotografia da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap)

Revista dos alunos, ex-alunos e professores do curso de Fotografia da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap)

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

apareceu”), fica sugerida também uma<br />

inversão da ordem dos fatos. A iconicidade<br />

(do grego, eikōn, ‘imagem”), portanto, é a<br />

propriedade que a linguagem verbal tem de<br />

“decalcar” a estrutura dos fatos.<br />

A conclusão natural seria então: se as<br />

palavras organizadas em enunciados têm a<br />

capacidade de decalcar os fatos, então há<br />

uma evidente correlação entre a linguagem<br />

verbal e a linguagem fotográfica. Contudo,<br />

é necessário cautela: os modos de captar a<br />

estrutura dos fatos não são os mesmos nas<br />

duas linguagens, e certamente há muitos<br />

traços da realidade captados por uma que<br />

não podem ser diretamente traduzidos na<br />

outra. No entanto, residem exatamente aqui<br />

as vantagens e a importância de se fazer um<br />

trabalho de conversão do discurso imagético<br />

para o discurso verbal. Com esse trabalho,<br />

atendemos à necessidade de ampliar os<br />

limites da percepção e da expressividade,<br />

no esforço de aproximar os dois modos de<br />

representar o mundo.<br />

Por exemplo: entre as formas de<br />

representação dos fatos na linguagem<br />

verbal encontramos a narração e a<br />

descrição. Em sua definição mais simples,<br />

a narração envolve a sucessão temporal<br />

dos fatos, enquanto a descrição importa<br />

na apresentação das características de um<br />

objeto apreendido em um dado momento de<br />

tempo, ou sem qualquer referência temporal.<br />

Um mecanismo essencial na distinção<br />

entre essas duas formas está no emprego<br />

dos tempos verbais: “Pedro já se afastara<br />

alguns metros do bar, quando ocorreu uma<br />

inflamada discussão entre dois homens e um<br />

deles disparou o revólver várias vezes. Pedro<br />

não retornaria mais ao local naquela noite.”<br />

Percebe-se nessa passagem narrativa que<br />

as formas verbais destacadas distinguem<br />

fatos propriamente narrados, que se sucedem<br />

(ocorreu, disparou), de comentários que<br />

contextualizam esses fatos (afastara,<br />

retornaria). Já em uma passagem descritiva,<br />

os tempos verbais sugerem exatamente a<br />

ideia de um “congelamento” do objeto em um<br />

dado tempo: “A casa tinha (tem) uma ampla<br />

varanda que dava (dá) para um jardim com<br />

plantas variadas.” Intuitivamente, somos<br />

levados a estabelecer uma aproximação<br />

mais estreita entre a forma descritiva de<br />

representação verbal e a imagem fotográfica.<br />

Mas isso é tudo? Será que um instante<br />

fotográfico não pode contar uma história?<br />

Como, então, se poderia desdobrá-lo em uma<br />

passagem narrativa?<br />

A proposta do trabalho com a língua portuguesa<br />

no Curso de Fotografia envolve, entre<br />

outras tarefas mais óbvias, a de estimular o<br />

aluno a transitar entre dois modos de conceber<br />

e representar o mundo, o da imagem e<br />

o das palavras, e, ao fazer isso, ampliar sua<br />

capacidade de manejar os recursos disponibilizados<br />

por esses dois sistemas de significação.<br />

Referências<br />

BENVENISTE, Émile. Problèmes de linguistique<br />

générale, vol. 2. Paris: Gallimard, 1974.<br />

SAUSSURE, Ferdinand de. Cours de linguistique<br />

générale. Paris: Payot, 2005.<br />

* Fanuel Paes Barreto é professor da disciplina<br />

de Português Instrumental do Curso de<br />

Fotografia da Unicap<br />

19

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!