176 OLIVEIRA AND ENGLER CURY, PORTUGUESE STUDIES REVIEW 18 (1) (2011) 151-177 brar, por entre a névoa que recobre o passado, ape<strong>nas</strong> e tão somente aquilo que o próprio artista ou seu contratante queriam registrar (ou <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> registrar): (...) uma imagem, mesmo seletiva, não se limita a uma simples reprodução do real, mas (...) produz um discurso sobre ele. Se a imagem é um signo, ou um conjunto <strong>de</strong> signos, que traduz uma visão da realida<strong>de</strong> e transmite um sistema <strong>de</strong> valores, ela po<strong>de</strong> nos ensinar tanto quanto um texto sobre as socieda<strong>de</strong>s do passado. 40 O traço espontâneo e colorido <strong>de</strong>ssas imagens eterniza os gestos, roupas e vivacida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ssa população da Corte, apresentando um mundo multifacetado, cheio <strong>de</strong> sutilezas que se impõe sobre as interpretações usuais do período. Como escreveu Bau<strong>de</strong>laire, “o prazer que obtemos com a representação do presente <strong>de</strong>ve-se não ape<strong>nas</strong> à beleza <strong>de</strong> que ele po<strong>de</strong> estar revestido, mas também à sua qualida<strong>de</strong> essencial <strong>de</strong> presente” 41 . Provavelmente, este era um raciocínio partilhado por <strong>Debret</strong> ao pintar suas aquarelas. Se acreditarmos, como Gadamer—autor que reafirma <strong>de</strong> modo crítico a concepção aristotélica sobre o tema—que a arte, assim como a poesia, “torna o universal mais visível que do que a história, isto é, do que a <strong>de</strong>scrição fiel <strong>de</strong> fatos e acontecimentos reais consegue fazer” 42 , abre-se uma gama bem mais ampla <strong>de</strong> possibilida<strong>de</strong>s interpretativas para o conjunto da produção artística <strong>de</strong>bretiana, especialmente no que se refere às aquarelas, pensadas pelo artista como um tipo <strong>de</strong> catálogo enciclopédico pessoal e particular <strong>de</strong> ce<strong>nas</strong> a serem <strong>de</strong>pois organizadas, selecionadas e, porventura, incluídas em seu projeto editorial do Voyage Pittoresque. Nesse sentido, a presença ou não <strong>de</strong>stas ce<strong>nas</strong> fixadas <strong>nas</strong> aquarelas, posteriormente, <strong>nas</strong> gravuras das pranchas do Voyage Pittoresque se constitui, também, num interessante aspecto que <strong>de</strong>ve ser <strong>de</strong>stacado ao se preten<strong>de</strong>r analisá-las. Ainda recorrendo a Gadamer, vale lembrar que o filósofo alemão afirmava que ao “ler” uma obra <strong>de</strong> arte somente formulamos questões que 40 Cadiou; Coulomb; Lemon<strong>de</strong> & Santamaria, Como se faz a História, 148. 41 Charles Bau<strong>de</strong>laire, Sobre a mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>: o pintor da vida mo<strong>de</strong>rna, organização <strong>de</strong> Teixeira Coelho (Rio <strong>de</strong> Janeiro: Paz e Terra, 1996), 8. 42 Hans-Georg Gadamer, Hermenêutica da obra <strong>de</strong> arte, tradução <strong>de</strong> Marco Antonio Casanova (São Paulo: Martins Fontes, 2010), 55.
OLIVEIRA AND ENGLER CURY, PORTUGUESE STUDIES REVIEW 18 (1) (2011) 151-177 177 já trazem, em si, pressupostas suas possíveis respostas 43 , ou seja, só atentamos para <strong>de</strong>terminados <strong>de</strong>talhes e <strong>de</strong>sdobramentos interpretativos por eles já nos acenarem a partir da própria imagem que observamos. 43 Gadamer, Hermenêutica da obra <strong>de</strong> arte, 133-141.
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