02.11.2014 Views

Lazer e Leitura nas Imagens de Debret - Profª Carla Mary S. Oliveira

Lazer e Leitura nas Imagens de Debret - Profª Carla Mary S. Oliveira

Lazer e Leitura nas Imagens de Debret - Profª Carla Mary S. Oliveira

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

OLIVEIRA AND ENGLER CURY, PORTUGUESE STUDIES REVIEW 18 (1) (2011) 151-177 159<br />

sante é que como essas aquarelas <strong>de</strong> <strong>Debret</strong> sobre a cida<strong>de</strong> foram feitas ao<br />

longo <strong>de</strong> quinze anos, mostram que neste período sua característica étnica<br />

não se modificou significativamente, nem mesmo após a In<strong>de</strong>pendência.<br />

<strong>Lazer</strong>es e sociabilida<strong>de</strong>s cotidia<strong>nas</strong><br />

Uma das intenções pessoais <strong>de</strong>claradamente assinaladas por <strong>Debret</strong> em seu<br />

Voyage Pittoresque era <strong>de</strong>screver o caráter e os hábitos cotidianos dos brasileiros,<br />

bem como a formação histórica do país a partir da instalação da corte<br />

portuguesa no Rio <strong>de</strong> Janeiro e subsequente processo <strong>de</strong> estruturação da<br />

nova nação após sua In<strong>de</strong>pendência 20 . Não é incorreto, portanto, consi<strong>de</strong>rar<br />

que suas aquarelas, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início, tivessem como horizonte o projeto edito -<br />

rial que o artista francês efetivamente concretizou após o retorno a seu país<br />

natal, em 1831.<br />

Nesse sentido, além <strong>de</strong> “Uma tar<strong>de</strong> na Praça do Palácio” (Fig. 1), selecio -<br />

namos outras duas ce<strong>nas</strong> que se referem a formas bem específicas <strong>de</strong> sociabi -<br />

lida<strong>de</strong>: “Passeio <strong>de</strong> domingo à tar<strong>de</strong>” e “Meninos brincando <strong>de</strong> soldados ou<br />

O primeiro ímpeto da virtu<strong>de</strong> guerreira”.<br />

Se na primeira imagem apresentada neste artigo (Fig. 1) o que se vê é<br />

uma pequena multidão <strong>de</strong> homens e mulheres negros indo e vindo pelo Terreiro<br />

do Paço, carregando objetos e ven<strong>de</strong>ndo quinquilharias e comestíveis,<br />

os poucos homens brancos que ali se encontram ou estão sentados sobre a<br />

mureta <strong>de</strong> pedra lavrada do atracadouro em frente ao Chafariz da Pirâmi<strong>de</strong>,<br />

a comprar quitutes e beber líquidos refrescantes, ou simplesmente perambu -<br />

lam pela praça a assistir àquela efervescência cotidiana. O único homem <strong>de</strong><br />

pele clara a exercer seu trabalho, naquele momento, é o circunspecto guarda<br />

que abraça, resolutamente, sua arma ao lado da guarita que o protege do sol<br />

tropical. Embora a cena mostre a informalida<strong>de</strong> da vida cotidiana num espaço<br />

público carioca, não se po<strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> notar que o status diferenciado <strong>de</strong><br />

cada uma das personagens ali representadas fica bem evi<strong>de</strong>nte: enquanto<br />

uns labutam—os negros e o militar—outros se <strong>de</strong>dicam a flanar e aproveitar<br />

a brisa que sopra no fim <strong>de</strong> tar<strong>de</strong> sobre as águas da Baía da Guanabara. O artista<br />

francês mostra ali, aparentemente sem se dar conta, as entranhas da es -<br />

truturação da socieda<strong>de</strong> brasileira recém liberta do mo<strong>de</strong>lo colonial, marcada<br />

pelas vicissitu<strong>de</strong>s e estigmas <strong>de</strong> cada função laboral numa conjuntura em<br />

20 <strong>Debret</strong>, Voyage Pittoresque et Historique au Brésil, vol. 1, I-II.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!