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As mulheres levantaram-se, respeitosas e mudas.<br />
— Agora aproximem-se, e venham aqui pedir por favor a esta<br />
rapariga, à minha pupila, entendem à minha pupila; venham pedir-<br />
-lhe que lhes abençoe as filhas. Vamos !<br />
O orgulho feminino revoltou-se contra a intimação.<br />
— Essa agora !<br />
— Era o que me faltava !<br />
— Olhem os meus pecados !<br />
— Não, que ele não há mais...<br />
— Disso o livrará o Senhor.<br />
— Não há-de ser a filha de meu pai.<br />
— Para longe a tentação...<br />
— Que é que é que é lá isso — exclamou o reitor, interrompendo<br />
este zunzum de má vontade e insubordinação. — Que virtuosíssimas<br />
criaturas sois vós todas ! Olhem lá que não manchem os lábios<br />
a pedir ! Não vos custa manchá-los a jurar em vão o santo nome de<br />
Deus, não se vos importa manchá-los a assoalhar as vidas alheias, a caluniar<br />
as amigas, a insultar as vizinhas ; mas fazeis escrúpulos de os<br />
empregar a pedir a bênção para vossas filhas, a quem, mais e melhor<br />
do que vocês todas juntas, lha pode e deve dar.<br />
— Ora ! — disseram algumas vozes.<br />
— Ora! Ora o quê — Saibam então que todas, todas vocês, nem<br />
são dignas de lhe beijarem as bordas dos vestidos. O que sabéis é<br />
engrolar padre-nossos, e roçar com a testa pelo chão das igrejas ; mas<br />
não tendes coração para a doutrina do Senhor, não. Vós, as santas criaturas,<br />
envergonhais-vos de pedir como se vos desonrásseis com isso<br />
Pois eu não me reconheço tão puro ; sou um pobre pecador, e por<br />
isso não devo ter essas soberbas de bem-aventurados.<br />
E o padre, dominado pela exaltação que se lhe apoderara do<br />
espírito irritado, curvou-se, descobrindo-se ; e, tomando a mão de Margarida,<br />
levou-a respeitosamente aos lábios, apesar dos esforços daquela.<br />
A assembléia feminina baixou toda os olhos de confusão.<br />
As crianças rodearam a sua jovem mestra, e desta vez espontaneamente<br />
lhe cobriram de beijos as mãos.<br />
Margarida, banhada de lágrimas, baixou-se, e uma por uma as<br />
apertou ao seio, sem poder falar de comovida.<br />
— Bem, minhas filhas, bem — disse o reitor. — Dais assim um<br />
nobre e belo exemplo às vossas mães ; é decerto a mão de Deus, que<br />
vos tocou os corações. Quem se recusará a imitá-las<br />
— Eu não — disse uma voz por detrás do reitor.<br />
Este voltou-se e viu José das Dornas, que se aproximara havia<br />
alquns momentos, e assistira à cena que descrevemos.<br />
O velho lavrador, depois de responder assim ao pároco, aproximou-se<br />
também de Margarida, e, pegando-lhe na mão, disse :<br />
— Minha filha, eu tenho setenta anos. Desde que minha mãe<br />
morreu... há cinqüenta anos quase, nunca mais beijei a mão a ninguém.