04.02.2015 Views

o_19d955cvj1uav16i39ej78r1rg2a.pdf

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Nº28 - FEVEREIRO/2010 29<br />

O presente texto está estruturado em três partes:<br />

• na Parte I, analisa-se o problema do profissionalismo no<br />

ensino, situando essa questão no debate sobre a<br />

proletarização do professor, as diferentes formas de entender<br />

o que significa ser profissional e as ambiguidades<br />

e contradições ocultas na aspiração à profissionalidade.<br />

• na Parte II, o autor discute as três tradições diferentes<br />

com respeito à profissionalidade de professores: a que<br />

entende os professores como técnicos, a que defende o<br />

ensino como uma profissão de caráter reflexivo e a que<br />

adota para o professor o papel do intelectual crítico.<br />

• a Parte III é dedicada a estabelecer uma visão global do que<br />

se deve entender por autonomia de professores, mostrando<br />

o equilíbrio necessário requerido entre diferentes necessidades<br />

e condições de realização da prática docente,<br />

e propondo as condições pessoais, institucionais e<br />

sociopolíticas que uma autonomia profissional deveria ter<br />

que não signifique nem individualismo, nem corporativismo,<br />

tampouco submissão burocrática ou intelectual.<br />

Segundo o autor, este não é um livro no qual se façam<br />

propostas concretas, se entendermos por isso planos de<br />

ação. Ao contrário, o livro possui, sim, um sentido muito<br />

prático, se aceitarmos que a forma com que pensamos<br />

tem muito a ver com a forma com que encaramos a realidade<br />

e decidimos nela nos inserir. A Autonomia não é<br />

isolamento e não é possível sem o apoio, a relação, o<br />

intercâmbio.<br />

Nem sempre as sugestões provêm das leituras dos rascunhos.<br />

Provêm também, e neste caso especialmente,<br />

do clima intelectual e profissional no qual se criam oportunidades<br />

para discussões interessantes ou para análise<br />

de nós mesmos como docentes e de nossas circunstâncias<br />

profissionais.<br />

CAPÍTULO 1: A AUTONOMIA PERDIDA: A<br />

PROLETARIZAÇÃO DOS PROFESSORES<br />

Uma das ideias mais difundidas na atualidade com respeito<br />

aos professores e, ao mesmo tempo, uma das mais<br />

polêmicas é a sua condição de profissional. Uma das razões<br />

que torna esse assunto problemático é que a palavra<br />

“profissional”, e suas derivações, embora em princípio pareçam<br />

apenas referir-se às características e qualidades da<br />

prática docentes, não são sequer expressões neutras. O<br />

tema do profissionalismo – como todos os temas em educação<br />

– está longe de ser ingênuo ou desprovido de interesse<br />

e agendas mais ou menos escusas.<br />

O ensino, enquanto um ofício, não pode ser definido<br />

apenas de modo descritivo, ou seja, pelo que encontramos<br />

na prática real dos professores em sala de aula, já<br />

que a docência defini-se também por suas aspirações e<br />

não só por sua materialidade. Por isso, se quisermos entender<br />

as características e qualidades do ofício de ensinar,<br />

temos de discutir tudo o que se diz sobre ele ou o que dele<br />

se espera. E também o que é e o que não deveria ser; o<br />

que se propõe, mas que se torna, ao menos, discutível.<br />

Esta é a razão pela qual, se quisermos abordar o tema<br />

da autonomia profissional, precisamos discutir os aspectos<br />

contraditórios e ambíguos que encerra. A aspiração do<br />

autor com essa discussão é, portanto, conseguir manter o<br />

confronto ideológico, com o objetivo de resgatar uma posição<br />

comprometida com determinados valores para a prática<br />

docente.<br />

O tema da proletarização dos professores nos oferece<br />

uma perspectiva adequada para essa preocupação. A tese<br />

básica da proletarização de professores é que o trabalho<br />

docente sofreu uma subtração progressiva de uma série<br />

de qualidades que conduziram os professores à perda de<br />

controle e sentido sobre o próprio trabalho, ou seja, à perda<br />

da autonomia.<br />

1. O debate sobre a proletarização dos professores<br />

Embora não se possa falar em unanimidade entre os<br />

autores que defendem a teoria da proletarização de professores,<br />

a tese básica dessa posição é a consideração de que<br />

os docentes, enquanto categoria, sofreram ou estão sofrendo<br />

uma transformação, tanto nas características de suas<br />

condições de trabalho como nas tarefas que realizam as<br />

quais os aproxima cada vez mais das condições e interesses<br />

da classe operária. Autores como Apple (1987; 1989b;<br />

Apple e Jungck, 1990), Lawn e Ozga (1988; Ozga, 1988),<br />

ou Densmore (1987) são representantes de tal perspectiva.<br />

Este tipo de análise, segundo Jimenez Jaén (1988),<br />

tem como base teórica a análise marxista das condições<br />

de trabalho do modo de produção capitalista e o desenvolvimento<br />

e aplicação dessas propostas realizadas por<br />

Braverman (1974). Com o objetivo de garantir o controle<br />

sobre o processo produtivo, este era subdividido em processos<br />

cada vez mais simples, de maneira que os operários<br />

eram especializados em aspectos cada vez mais reduzidos<br />

da cadeia produtiva, perdendo deste modo a perspectiva<br />

do conjunto, bem como as habilidades e destrezas que<br />

anteriormente necessitavam para o seu trabalho. O produto<br />

dessa atomização significava, por conseguinte, a perda<br />

da qualificação do operário. Agora, o trabalhador passa<br />

a depender inteiramente dos processos de racionalização<br />

e controle de gestão administrativa da empresa e do conhecimento<br />

científico e tecnológico dos experts. Deste<br />

modo, os conceitos-chave que explicam esse fenômeno<br />

de racionalização do trabalho são:<br />

a) A separação entre concepção e execução no processo<br />

produtivo;<br />

b) A desqualificação;<br />

c) A perda de controle sobre o seu próprio trabalho.<br />

Esta lógica racionalizadora transcendeu o âmbito da<br />

empresa, como âmbito privado e de produção, enquanto<br />

processo de acumulação de capital para invadir a esfera<br />

do Estado.<br />

No caso do ensino, a atenção a essas necessidades realizou-se<br />

historicamente mediante a introdução do mesmo<br />

espírito de “gestão científica”, tanto no que se fere ao<br />

conteúdo da prática educativa como ao modo de organização<br />

e controle do trabalho do professor. Assim, o currículo<br />

começou a conceber também uma espécie de processo<br />

de produção, organizado sob os mesmos parâmetros

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!