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Nº28 - FEVEREIRO/2010 37<br />
ela tem um propósito muito claro de “definir-se” diante<br />
dos problemas e atuar consequentemente, considerandoos<br />
como situações que estão além de nossas próprias intenções<br />
e atuações pessoais, para incluir sua análise como<br />
problemas que têm uma origem social e histórica. Para<br />
Kemmis (1987), refletir criticamente significa colocar-se no<br />
contexto de uma ação, na história da situação, participar<br />
de uma atividade social e ter uma determinada postura<br />
diante dos problemas. Significa explorar a natureza social<br />
e histórica, tanto de nossa relação como atores nas práticas<br />
institucionalizadas da educação, quanto da relação entre<br />
nosso pensamento e ação educativos. Como essa maneira<br />
de atuar tem consequências públicas, a reflexão crítica<br />
induz a conceber como uma atividade também pública,<br />
exigindo, por conseguinte, a organização das pessoas envolvidas<br />
e dirigindo-se à elaboração de processos sistemáticos<br />
de crítica que permitiriam a reformulação de sua<br />
teoria e prática social e de suas condições de trabalho.<br />
Com o objetivo de poder articular a forma pela qual a<br />
prática reflexiva se relaciona com um compromisso crítico,<br />
Kemmis (1985) chamou a atenção para os elementos<br />
que configuram como processo. São os seguintes:<br />
1. A reflexão não está biológica ou psicologicamente determinada,<br />
nem é tampouco “pensamento puro”; expressa<br />
uma orientação à ação e tem a ver com a relação<br />
entre pensamento e ação nas situações reais históricas<br />
nas quais nos encontramos.<br />
2. A reflexão não é o trabalho individualista da mente, como<br />
se fosse um mecanismo ou mera especulação; pressupõe<br />
e prefigura relações sociais.<br />
3. A reflexão não está livre de valores nem é neutra;<br />
expressa e serve a particulares interesses humanos, sociais,<br />
culturais e políticos.<br />
4. A reflexão não é indiferente ou passiva em relação à<br />
ordem social, nem se reduz a discutir os valores sobre<br />
os quais exista acordo social; ativamente, reproduz ou<br />
transforma as práticas ideológicas que estão na base<br />
da ordem social.<br />
5. A reflexão não é um processo mecânico nem tampouco<br />
um exercício puramente criativo na construção de novas<br />
ideias; é uma prática que expressa nosso poder para<br />
reconstruir a vida social pela forma de participação por<br />
meio da convivência, da tomada de decisões ou da ação<br />
social (Kemmis, 1985:149).<br />
8. O fundamento habermasiano<br />
da reflexão crítica<br />
Todas estas discussões sobre a reflexão crítica encontram<br />
seu fundamento na Teoria Crítica e, mais especificamente,<br />
nas ideias de Habermas. O projeto teórico de<br />
Habermas está baseado na ideias da emancipação, no<br />
aprofundamento de seu significado, na fundamentação de<br />
sua razão de ser e no papel do conhecimento nela contido.<br />
A partir de sua teoria dos interesses constitutivos do conhecimento,<br />
Habermas (1982; 1984) defende que as concepções<br />
práticas, ou seja, aquelas que supõem uma ação comunicativa<br />
dirigida ao entendimento e ao acordo (e sobre<br />
as quais se sustenta o modelo profissional reflexivo), não<br />
são possíveis em uma sociedade em que os modos dominantes<br />
de produção, o imperativo da mentalidade<br />
tecnológica, aplicada aos sistemas de relações humanas, e<br />
dos interesses dos grupos que detêm o poder, forçaram certas<br />
relações que estão enraizadas em uma comunicação<br />
distorcida, ou em sistemas diretamente coercitivos, que dão<br />
lugar a consciências deformadas pela ideologia.<br />
Nas relações que Habermas estabelece em todo este<br />
plano de conhecimento dirigido à ação política, a figura<br />
do teórico (e de sua teoria) fica esboçada de forma problemática,<br />
já que reconhece por um lado um momento de<br />
privilégio, simultâneo à incapacidade de justificar-se conclusivamente.<br />
“A reivindicada superioridade do ilustrador sobre aquele<br />
que ainda deve se ilustrar é teoricamente inevitável, mas<br />
é, ao mesmo tempo, fictícia e necessita de autocorreção:<br />
em um processo de ilustração há somente participantes”<br />
(Habermas, 1987:48).<br />
9. Diversos entendimentos sobre crítica<br />
A importância deste fato para nós é que, quando se<br />
trata de estimular professores a buscarem processos de<br />
emancipação guiados pela reflexão crítica, à maneira do<br />
que propunham Kemmis ou Smyth, não é nem um pouco<br />
evidente que estejamos diante de uma caso semelhante<br />
aos dos grupos organizados por interesses comuns e por<br />
intenção política. Em todo o caso, o que se propunha era<br />
mais o desejo de que a reflexão crítica conduzisse à necessidade<br />
de uma ação transformadora.<br />
10. Autonomia ou emancipação<br />
O que o modelo dos professores como intelectuais críticos<br />
sugere é que tanto a compreensão dos fatores sociais<br />
e institucionais que condicionam a prática educativa,<br />
como a emancipação das formas de dominação que afetam<br />
nosso pensamento e nossa ação não são processos<br />
espontâneos que se produzem “naturalmente” pelo mero<br />
fato de participarem de experiências que se pretendem<br />
educativas. Do esforço também para descobrir as formas<br />
pelas quais os valores ideológicos dominantes, as práticas<br />
culturais e as formas pelas quais os valores ideológicos<br />
dominantes, as possibilidades de ação do professor, mas<br />
também as próprias perspectivas de análise e compreensão<br />
do ensino, de suas finalidades educativas e de sua função<br />
social. Igualmente o intelectual crítico está preocupado<br />
com a captação e potencialização dos aspectos de sua<br />
prática profissional, que conservam uma possibilidade de<br />
ação educativamente valiosa, enquanto busca a transformação<br />
ou a recondução daqueles aspectos que não a possuem,<br />
sejam eles pessoais, organizacionais ou sociais.<br />
AUTONOMIA E SEU CONTEXTO<br />
A CHAVE DA AUTONOMIA<br />
DOS PROFESSORES<br />
A autonomia profissional de acordo com os três modelos<br />
de professores: