10.02.2015 Views

Em torno da poesia - Eutomia

Em torno da poesia - Eutomia

Em torno da poesia - Eutomia

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

160<br />

fosforescências <strong>da</strong>s pedras. Os rubis, as gemas: devendo seu brilho e intensi<strong>da</strong>de às<br />

pressões e temperaturas a que foram expostas.<br />

Redução valorizadora <strong>da</strong> linguagem. Levar o poema ao essencial, ao nuclear. É assim<br />

a <strong>poesia</strong> de José Paulo Paes:<br />

A torneira seca<br />

(mas pior: a falta<br />

de sede)<br />

A luz apaga<strong>da</strong><br />

(mas pior: o gosto<br />

do escuro).<br />

A porta fecha<strong>da</strong><br />

(mas pior: a chave<br />

por dentro).<br />

(PAES, 1986,p. 79).<br />

Talvez o Twitter ajude os poetas: cabe ali uma dicção mais próxima <strong>da</strong> plastici<strong>da</strong>de<br />

do registro oral – e, simultaneamente, há a restrição dos caracteres que convi<strong>da</strong> à concisão.<br />

Do contrário, cai no espontaneismo, no gratuito, no prolixo – sem o cui<strong>da</strong>do <strong>da</strong><br />

estruturação. A lucidez não mata a <strong>poesia</strong>, depura-a. A palavra de Fernando Pessoa chegou<br />

antes de a <strong>poesia</strong> pousar em meios digitais, mas é oportuna:<br />

A ruína dos ideais clássicos fez de todos artistas possíveis, e portanto, maus<br />

artistas. Quando o critério <strong>da</strong> arte era a construção sóli<strong>da</strong>, a observância<br />

cui<strong>da</strong>dosa de regras — poucos podiam tentar ser artistas, e grande parte<br />

desses são muito bons. Mas quando a arte passou de ser ti<strong>da</strong> como criação,<br />

para passar a ser ti<strong>da</strong> como expressão de sentimentos, ca<strong>da</strong> qual podia ser<br />

artista porque todos têm sentimentos. (PESSOA, 1986, p. 383).<br />

Poesia – arte vital, também pode confundir ao confundir-se com certa incontinência<br />

verbal, mero exercício inconsequente de entediados de fim de noite frente ao computador.<br />

Cedendo à tentação midiática e condiciona<strong>da</strong> fun<strong>da</strong>mentalmente pela veloci<strong>da</strong>de e<br />

efemeri<strong>da</strong>de do espaço virtual, o poeta-nauta pode, por isso mesmo, ser coagido a facilitar<br />

as convenções <strong>da</strong>s redes sociais, satisfazer um mercado. Um crítico mais rigoroso ou mui<br />

celoso – porque há aqui ciúme e zelo, na guar<strong>da</strong> de um legado – como Alcir Pécora pode, em<br />

<strong>da</strong>do momento, dizer que não há na<strong>da</strong> na Internet que se equipare a Hil<strong>da</strong> Hilst; que há ali<br />

mais redundância que dicção poética realmente nova. Adquirindo ci<strong>da</strong><strong>da</strong>nia digital a <strong>poesia</strong><br />

estendeu seu campo de experimentação e pesquisa; o meio convoca à facili<strong>da</strong>de – que pode<br />

levar à beira <strong>da</strong> insignificância. Há um cansaço <strong>da</strong> <strong>poesia</strong> redita; e um desafio, como em

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!