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Pobreza e Desigualdades - O Laboratório - UFRJ

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Das ruas às redes15 anos de mobilização social na luta contra a fome e a pobreza


www.coepbrasil.org.br/cidadaniaemredeNº 01 Das ruas às redes – 15 anos de mobilização socialna luta contra a fome e a pobrezaNovembro de 2008Uma publicaçãoRede Nacional de Mobilização Social COEPDireção editorialAndré SpitzGleyse PeiterAmélia MedeirosSarita BersonEdição, textos e entrevistasIracema DantasPesquisaAlessandra CeroyThais ZimbweRevisãoMarcelo BessaProjeto gráficoImaginatto DesignDiagramaçãoEscafandro / Laura Klemz GuerreroPublicação gratuita, com distribuição dirigida.Pode ser reproduzida sem autorização prévia desdeque citada a fonte e não seja para fins comerciais.Nossos textos adotam a linguagem de gênero como opção deengajamento na luta pela eqüidade entre homens e mulheres.A adesão das(os) articulistas convidadas(os) à essa políticanão é obrigatória.D251CATALOGAÇÃO NA FONTEDas ruas às redes : 15 anos de mobilização socialna luta contra a fome e a pobreza / COEP. – Rio deJaneiro : COEP, 2008.452 p. : il. – (Coleção COEP. Cidadania em rede ; 1)Inclui bibliografiaISSN 1983-94211. Comitê de Entidades no Combate à Fome e pelaVida - História. 2. Cidadania - Brasil. 3. Movimentossociais - Brasil. 4. Participação social - Brasil. I. Comitêde Entidades no Combate à Fome e pela Vida. II. Série.CDD: 323.60981CDU: 342.71(81)Rede Nacional de Mobilização Social COEPwww.coepbrasil.org.brRua Real Grandeza, 219 - Bloco O - Sala 208Rio de Janeiro, RJ. CEP: 22283-900Tel.: 21 2528-5700Fax: 21 2528-4938E-mail: coepbrasil@coepbrasil.org.brPresidenteAndré SpitzSecretária executivaGleyse PeiterSecretária executiva adjuntaAmélia Medeiros


8 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Construçãocoletiva AndréSpitz e Gleyse PeiterDesde sua criação em 1993, quando era constituído por 30 organizações de âmbito nacional, oCOEP cresceu, descentralizou-se, diversificou seu critério de participação transformando-senuma rede de organizações, com mais de 1.100 participantes no Distrito Federal, emtodos os estados e em mais de 20 municípios. Esse processo gerou uma Rede Nacional de MobilizaçãoSocial que, hoje, envolve, além da Rede de Organizações, uma rede com mais de cemcomunidades e a Rede de Mobilizadores, com cerca de 7 mil pessoas em mais de 520 municípios,ambas em processo de progressivo crescimento.A trajetória de 15 anos do COEP mostra que a gestão de uma rede e sua capacidade deatuar envolve desafios, como a habilidade de animar a participação e fazer fluir a informação, odesenvolvimento contínuo de mecanismos de articulação, bem como o conjunto de característicasde seus participantes, tais como suas competências, engajamento e a forma como interagementre si.Além disso, enxergar novos rumos a partir da análise histórica de seu desempenho e terclareza quanto aos múltiplos aspectos de sua atuação, de forma conjunta e complementar, sãoatitudes fundamentais para os resultados de uma rede.


apresentação | 9Uma rede deve ser capaz de refletir, de forma permanente e coletiva, sobre seu ponto de partida, olugar em que se encontra e para onde pretende ir. Essa reflexão é fundamental para o seu crescimentoe o fortalecimento da participação. Entretanto, criar tal capacidade coletiva não é tarefa simples, poisas redes, em geral, apresentam dificuldades para ter uma visão comum da história, porque o olhar decada participante é sempre parcial e seus pontos de vista são determinados pela forma como estãoinseridos na rede.Outra dificuldade resulta da falta de uma memória coletiva, pois, na maior parte das vezes, não sãofeitos registros adequados, o que se agrava pela constante renovação dos(as) participantes.Processos de mobilização social podem ser considerados como sistemas complexos, uma vez queenvolvem múltiplas e diferentes interações entre pessoas, organizações, grupos, redes, movimentos ououtros(as) participantes, cujos resultados podem ser previsíveis ou não.Nesse sentido, para atuar numa rede de mobilização social, é também importante o entendimentodo que é um processo de mobilização, assim como a valorização de dois elementos fundamentais paraesse processo: a criação de espaços, que fortalecem a integração, a identidade e a troca entre os(as) participantes;e o surgimento de ondas, que funcionam como fluxos de energia que fortalecem os(as)participantes e, dessa forma, realimentam e revigoram a mobilização.Fortalecer e ampliarConsiderando os desafios citados, o COEP, ao comemorar seus 15 anos, lança quatro iniciativas paracontribuir no fortalecimento e na ampliação da mobilização social e da atuação em rede.A primeira iniciativa é a criação de um instrumento na internet que permite registrar a trajetóriado COEP de forma compartilhada, possibilitando, assim, a construção de nossa memória. Essa iniciativaconstituirá um acervo fundamental para a Rede e uma prática que pode contribuir para o desenvolvimentoda gestão de outras redes.A segunda iniciativa é esta publicação, Das ruas às redes, sobre os 15 anos de mobilização no Brasil naluta contra a fome e a pobreza, que dá início à Coleção COEP Cidadania em Rede. Com ela, o COEPquer colaborar para a construção da visão, da memória e do entendimento comum dos espaços criados edas ondas geradas pelo processo de mobilização no Brasil e pelo desenvolvimento do COEP.A terceira iniciativa é a introdução de um novo instrumento, na internet, desenvolvido pelo COEP,que pretende possibilitar a construção cooperativa de conhecimentos, a troca de informações e a constituiçãode acervos. Trata-se da Coleção COEP Cidadania em Rede, na internet, que visa garantir


10 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008espaço para que novas reflexões e novos conteúdos sejam incorporados aos temas trazidos pela coleçãoimpressa. A publicação em papel será o ponto de partida de uma obra aberta, em permanente processode construção. Assim, a Coleção COEP Cidadania em Rede e sua versão web serão novos instrumentospara fortalecer a mobilização e o incentivo à participação cidadã.A quarta iniciativa é o lançamento do Prêmio Betinho – Atitude Cidadã, que, além de ser umahomenagem ao nosso fundador, pretende valorizar as pessoas que, no dia-a-dia, lutam contra a fomee a promoção da cidadania. Quer ainda dar rosto, voz e reconhecimento a quem acredita que cadapessoa – a seu jeito – pode fazer a sua parte para construir um Brasil melhor e mais justo.Nesta publicação, o desafio foi recriar, a partir de relatos pessoais, uma história que ainda é capazde gerar tantos sentimentos. Afinal, apenas 15 anos nos separam do lançamento da Ação da Cidadaniacontra a Fome e a Miséria e pela Vida, em março de 1993. Mas as dificuldades foram amenizadaspor contribuições bem ao jeito de uma “rede de mobilização nacional”, definição bem próxima do queé o COEP atual. Contamos com depoimentos de pessoas em todo o Brasil, que, por e-mail ou portelefone, atenderam ao nosso chamado. A todas e todos, nossos agradecimentos. O resultado poderáser conferido nas páginas a seguir.Esta edição está dividida em quatro partes. A primeira recebe o título de “Uma onda de cidadania” etraz os artigos de Silvio Caccia Bava e Ana Claudia Teixeira, do Instituto Pólis; Sonia Aguiar, do Núcleode Pesquisas, Estudos e Formação da Rede de Informações para o Terceiro Setor (Nupef-Rits); e LeilahLandim, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (<strong>UFRJ</strong>). Na seqüência, vem “Democracia se faz comparticipação”, formada pelos textos “Alguns antecedentes” e “Marcos da luta contra a fome e a pobreza”;pelos depoimentos sobre os atuais desafios da mobilização social, com o título “Um convite à reflexão”;e por um mapeamento de redes sociais brasileiras – “Tecer a rede, mobilizar o Brasil”. A íntegra de todasas entrevistas está disponível no endereço www.coepbrasil.org.br/cidadaniaemrede.A terceira parte – “Vale a pena acreditar” – mostra a trajetória do COEP desde a sua criação comoum comitê de empresas que se engajaram na Ação da Cidadania até sua “transformação” em uma redenacional de mobilização, que reúne comunidades, organizações e pessoas. Os articulistas são John Saxby,pesquisador canadense, com “Capacidade e mudança em uma rede brasileira”; Gleyse Peiter, secretáriaexecutiva do COEP Nacional; e Amélia T. Medeiros, secretária executiva adjunta, com “COEP, 15 anosconstruindo caminhos para mudar o Brasil”; e Sarita Berson, coordenadora da Rede Mobilizadores, com“O COEP e a tecnologia de informação e comunicação”. Além dos artigos, há ainda o texto “Marcosda trajetória do COEP”, que remonta o percurso da rede a partir do depoimento de integrantes e


apresentação | 11colaboradores(as) mais próximos(as). Todas as entrevistas também estão disponíveisintegralmente no endereço www.coepbrasil.org.br/cidadaniaemrede.Na quarta parte, fizemos uma homenagem a três personalidades que nosinspiraram ao longo da realização deste livro: Betinho, Josué de Castro e MariaJosé Jaime, a Bizeh. Os três – em diferentes instantes e com colaborações sempresignificativas – marcaram momentos da nossa trajetória. Betinho, como umdos fundadores do COEP; Josué de Castro, como referência intelectual; e Bizeh,como uma grande companheira de luta.Queremos, ainda, ressaltar uma novidade que chega nesses 15 anos do COEP:a opção de assumir, sempre que possível, o uso da linguagem de gênero comoparte do nosso engajamento na luta pela igualdade de oportunidades para mulherese homens. A Rede COEP tem o compromisso com um mundo maisjusto – e, conseqüentemente, com a luta das mulheres – e quer afirmá-lo a todase todos.Por último, cabe afirmar que o esforço do COEP ao relembrar essa ricatrajetória de 15 anos de mobilização social contra a fome, levantando marcoshistóricos e memórias afetivas, não é apenas recriá-la, mas relembrá-la paraextrair daí caminhos para construir um novo Brasil. André SpitzPresidente do COEPGleyse PeiterSecretária executivado COEP


© Julio Cesar Guimarães / Agência O GloboA passeata de 16 de agosto de 1992 foi um dos episódios mais marcantes do ano.Parte 1Uma onda de cidadania


Os sentidos dademocracia eda participaçãoDebater a importância dos conselhos de gestão de políticas públicas e de todo um sistema departicipação construído nos últimos 20 anos no Brasil é um desafio e uma grande necessidade. Aparticipação serve para quê? Ela amplia a democracia? Ela tem ajudado a melhorar as políticaspúblicas? A vida do cidadão e da cidadã brasileiros melhorou por causa da participação? Devemoscontinuar a apostar na ampliação da participação?Essas perguntas e uma avaliação em profundidade dos resultados da participação estão em aberto.Não temos respostas, mas elas estão aí, presentes nas discussões, nos conselhos, nas conferências,nos movimentos sociais, nos governos.O Instituto Pólis vem trabalhando essas questões em conjunto com fóruns e redes de defesa eampliação da cidadania. E verifica que é cada vez mais importante alimentar dois processos: o dadisputa de significados quanto aos sentidos da democracia e da participação; e o de uma avaliaçãodas experiências concretas de funcionamento dos canais institucionais de participação. Para alimentaro debate de tais questões, os dois artigos a seguir refletem sobre essas problemáticas.


uma onda de cidadania | 15A construção democráticae o futuroSilvio Caccia Bava“O socialismo do século XXI implica o estado de direito. Liberdadese direitos estendidos a toda a cidadania, proteção da identidade individuale da diversidade da espécie humana, supremacia do cidadão sobreo Estado: o socialismo não é mais que o controle da humanidadesobre o capital que o pode destruir.”Gustavo Petro, “De las armas a la Revolución Ciudadana”A crise atual de legitimidade e representação por que passam os partidos políticos,parlamentares e executivos, e mesmo o próprio parlamento, é a culminânciade um movimento de deslegitimação do poder político, intrinsecamentedestruidor da democracia. Já em 1992, Pierre Bourdieu identificava, noplano internacional, essa crise da democracia. E lançava uma convocatória: “éurgente criarmos as condições de um trabalho coletivo de reconstrução de umuniverso de ideais realistas, capazes de mobilizar as vontades sem mistificar asconsciências” (apud Robert, 2002).A democracia depende da educação dos cidadãos. E a melhor educação empolítica é a participação ativa – o que implica uma transformação das instituiçõesque permita e estimule a participação. Abre-se a discussão sobre a reformapolítica e o lugar que tem nela a participação cidadã.Existe uma questão de fundo que se coloca para o debate da reforma política.A democracia deve servir para sustentar a atual forma de organização denossa sociedade, ou deve servir para transformá-la? E, se for para transformá-la,em qual sentido? Qual é a sociedade futura que queremos?


16 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008É bom lembrar que, em nenhuma parte do mundo e em nenhum momentoda história, a democracia alcançou plenamente os objetivos a que se propõe:transferir o poder para o povo. Ao contrário, muitas vezes, a democracia serviupara limitar o acesso das maiorias ao poder.Aristóteles, há mais de 2.300 anos, ao ensinar seus discípulos, dizia: “se ariqueza está estreitamente concentrada, os pobres usarão seu poder de maioriapara redistribuí-la mais eqüitativamente, o que seria injusto: nas democracias,os ricos deveriam ser poupados. Não somente suas propriedades não poderiamser divididas, mas seus bens também deveriam ser protegidos”. Essas idéias, sistematizadasem sua obra Política, inspiraram também o pensamento moderno.James Madison, um dos 57 delegados constituintes que escreveram a Constituiçãonorte-americana em 1787, e que se tornou o quarto presidente dosEstados Unidos, dizia: “com o propósito de defender as minorias contra astentativas das maiorias de infringir seus direitos, o poder deve estar em mãosdos mais ricos, que demonstraram ser os homens mais capazes da nação” (apudChomsky, 2006). Ele alertava, na convenção constitucional, sobre os perigos dademocracia: “se as eleições fossem abertas a todas as classes de pessoas, a populaçãoentão usaria seus direitos de votar para redistribuir a propriedade daterra de maneira mais eqüitativa” (apud Chomsky, 2006). Para evitar essa possibilidade,Madison recomendava que se tomassem medidas para proteger aminoria opulenta contra a maioria. Talvez ele tenha se inspirado em AdamSmith, que, na mesma época, dizia: “o governo civil, uma vez que é instituídopara assegurar a propriedade, é em verdade instituído para a defesa dos ricoscontra os pobres, ou dos que têm alguma propriedade contra aqueles que nãotêm nenhuma” (apud Chomsky, 2006).Esses pensamentos, expressos de maneira tão crua, poderiam ser consideradossintomas de uma pré-história da democracia, se não tivéssemos exemplos maisrecentes, e mesmo atuais, da mesma postura.John Dewey, um dos principais filósofos sociais norte-americanos do séculoXX, declarava que “a política é a projeção na sociedade dos interesses das grandesempresas e vai continuar assim enquanto o poder residir nas empresas privadas


uma onda de cidadania | 17que se orientam pelo lucro e controlam o sistema financeiro, a terra, a indústria,reforçados pelo comando da imprensa e outros meios de publicidade e propaganda”(apud Chomsky, 2006).Para trazer o tema para os nossos tempos, quero lembrar as palavras de JohnWilliamson, um dos criadores do Consenso de Washington, ao analisar a realidadeatual da América Latina. Dizia ele: “ou retiramos os temas da economiae da política do âmbito da democracia, ou ela não sobreviverá no continente”(apud Fiori, 2001).Há, portanto, uma definição de democracia que limita e até mesmo obstaculizaa participação cidadã. A democracia, em tal concepção, é um instrumentode governabilidade, uma forma de assegurar a legitimação de governos voltadosà manutenção do status quo.No caso particular da América Latina da década de 1990, a democraciaserviu para a legitimação de governos que promoveram a implementação depolíticas neoliberais, ampliando as desigualdades sociais e provocando um empobrecimentoainda maior da maioria da população.O Brasil não é uma ilha isoladado resto do mundo. Aqui, como emoutros lugares, a democracia vemsendo ampliada por força das pressõessociais, mas carrega a mesmaherança elitista que vimos nas formulaçõesanteriores. Não se podedizer, por exemplo, que a chamadaRepública Velha (1889–1930) foiexatamente uma forma de Estado democrático. Votava apenas o segmentomasculino com posses e rendas, cerca de 1% da população. O voto universal esecreto somente se instituiu na década de 1930, ainda assim deixando de foraos analfabetos. A ditadura do Estado Novo (1937–1945) e a ditadura do regimemilitar (1964–1985) encurtaram o período de vigência das liberdades democráticasformais para menos de 40 anos (ver Pochmann, 2007).A ditadura do Estado Novo e a ditadura doregime militar encurtaram o período devigência das liberdades democráticasformais para menos de 40 anos


18 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008O Estado refém de interesses privadosAs lutas e as conquistas democráticas recentes ocorridas no Brasil, traduzidas juridicamentena Constituição de 1988, ampliaram sobremaneira a esfera pública eabriram espaço para a democratização de nossas instituições. Impulsionada pelaação de um campo político democrático e popular, nossa democracia se ampliou,oferecendo novas bases para a participação cidadã. Mas, ao mesmo tempo em quese democratizavam os mecanismos de gestão, o Estado se tornava ainda mais refémde interesses privados. Desde o início da década de 1990, assistimos a umverdadeiro seqüestro da política. Atores como o sistema financeiro, as grandescorporações industriais e o agronegóciocomandam, de forma ostensiva ouvelada, as políticas macroeconômicase instrumentalizam, direta ou indiretamente,o espaço público.A prestação dos serviços públicos, aremuneração do trabalho, a tributação,o ensino, os conteúdos da mídia e daindústria cultural são ordenados pelalógica voraz do maior lucro possível e da acumulação ininterrupta e crescente docapital. A sociedade inteira passa a ser submetida a tal paradigma. Sem poder paradisciplinar a atuação das grandes empresas privadas, nossa democracia se fragiliza.A retomada do processo democrático, que vivemos desde 1985, é carregadade contradições. Saídos da ditadura, vivemos, num primeiro momento, umaexplosão das demandas cidadãs, que repercutiram no processo constituinte e setransformaram em direitos na Constituição de 1988. Houve, então, uma claraintenção de democratizar as instituições, com a criação de conselhos de gestãoe conferências de políticas setoriais, como se exemplifica na arquitetura doSistema Único de Saúde (SUS).Apoiados por movimentos sociais, numerosos governos locais criaram, nadécada de 1990, novas formas de governança, que radicalizaram a idéia daparticipação cidadã na gestão pública. O orçamento participativo é a experiênciaImpulsionada pela ação de um campopolítico democrático e popular, nossademocracia foi se ampliando, oferecendonovas bases para a participação cidadã


uma onda de cidadania | 19mais emblemática desse processo. E as conferências para planejar o futuro dascidades, realizadas, por exemplo, em Porto Alegre, Belém, Santo André e Piracicaba,buscaram uma efetiva contribuição da cidadania na definição da sociedadefutura.Foi o momento em que a bandeira da transformação social, empunhada porum conjunto de atores, configurou um campo político democrático e popular,conquistando adesões e obtendo um respaldo muito generalizado da sociedade.A participação ganhou um sentido de inclusão e passou a interferir na construçãode novas políticas. A mobilização social carregava uma dimensão educacionale pedagógica, isto é, de conscientização, que constituía um elemento importantíssimo.Mas, na contramão dessa tendência ampla, já em 1989, durante o governoCollor, começaram a ser implementadas as políticas neoliberais, cuja tônica éexatamente a destituição de direitos. Tais políticas se radicalizaram nos governosseguintes, liderados pelo PSDB.Uma esquerda silenciosaColocaram-se em cena, portanto, dois projetos opostos de sociedade: de um lado,a defesa e a ampliação dos direitos; de outro, a lógica do lucro. As conseqüênciasdesse embate são conhecidas. Não somente adotamos as políticas neoliberais,mas também nos transformamos em uma sociedade neoliberal. Com isso, osprojetos de transformação social foram postos fora da agenda, e os movimentossociais, fragilizados.Essa nova situação acabou por influenciar os partidos de esquerda, queamenizaram seus programas e reduziram seus propósitos de mudanças, passandoa buscar alianças com setores conservadores e adotando as regras da políticatradicional. Alegava-se que essa era a única forma de chegar ao governo. Mas osque chegaram ficaram constrangidos pelas alianças e pressões do grande capital,sem a sustentação política das bases que os elegeram. A democracia se fragilizou.Muitos setores, que antes sustentavam o questionamento do governo e desuas políticas, se calaram. Não temos, hoje, uma posição à esquerda do governo


20 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008socialmente expressiva. Coletivamente, a esquerda deixou de ser portadora deum projeto de transformação social.Essa paralisia da esquerda tem sua razão de ser. Ao abandonar a discussãosobre o futuro de nossa sociedade, a questão da democracia se esvazia de seuconteúdo transformador, passando a jogar água em outro moinho. MarilenaChaui (1981) afirmava: “Ou há nademocracia um apelo interno ao socialismo,implicando a transformaçãodas bases materiais do poder e atransformação da sociedade privatizadaem coisa pública, ou não hácomo esperar que a força dos acontecimentostraga a relação”.A discussão sobre o futuro está associada à discussão sobre o futuro da democracia.Para aqueles que apostam na erradicação da pobreza, na busca daeqüidade social, na justiça e na liberdade, qual é o apelo que a nossa democraciatraz consigo para enfrentar esses desafios?No fim do ano passado, em um seminário sobre o socialismo do século XXI,Gustavo Petro, senador da República da Colômbia e dirigente nacional dopartido Pólo Democrático Alternativo, apresentou a seguinte reflexão:Ao abandonar a discussão sobre ofuturo de nossa sociedade, a questãoda democracia se esvaziaA experiência histórica demonstra que os meios determinam ofim. E que, portanto, se o objetivo do socialismo do século XXI é aconstrução de uma democracia global, o reino da humanidade, entãoseus meios têm que ser profundamente democráticos. Os meios sãoa escola em que se prepara o fim, são seu método de construção. Nospróprios meios se incuba o conteúdo do fim.O estado de direito, construído pelas revoluções burguesas, é umpatrimônio da humanidade a ser conservado e radicalizado. Liberdadese direitos estendidos a toda a cidadania; proteção da identidade individuale da diversidade do gênero humano; supremacia do cidadão


uma onda de cidadania | 21sobre o Estado: o socialismo do século XXI não é mais que o controleda humanidade sobre o capital que o pode destruir. E o conceitode humanidade é um conceito plural, diverso, multicolorido.O controle da humanidade sobre o capital só pode se dar com aconstrução de um poder público global, que implica a multiplicidade,o diálogo entre civilizações, um novo cosmopolitismo, uma interconexãoglobal baseada nas lutas sociais e nos propósitos comuns, essencialmentehumanos. No plano nacional, trata-se de construir estadosde direito amplamente democratizados, articuladores de movimentossociais (que não podem nem devem suplantar governos no diálogointercivilizatório), democratizadores da vida da sociedade e dos podereslocais, propiciadores da pluralidade econômica, da democratizaçãoda propriedade e dos ativos produtivos, colaboradores na reconstruçãodo território impulsionada por democracias locais. (Petro, 2007)Silvio Caccia BavaSociólogo, diretor de LeMonde DiplomatiqueBrasil e coordenadorgeral do Instituto Pólis.Essa visão, ainda genérica, é, assim mesmo, inspiradora. Ela abre um horizonteque se estende muito além das acanhadas perspectivas hoje presentes nodebate público. Ao lado de outros aportes, constitui uma contribuição à tarefacoletiva de ressignificar a democracia. ReferênciasCHAUI, Marilena. Cultura e democracia: o discurso competente e outras falas. SãoPaulo: Moderna, 1981.CHOMSKY, Noam. Failed States. New York: Metropolitan Books, 2006.FIORI, José Luis. 60 lições dos 90: uma década de neoliberalismo. Rio de Janeiro:Record, 2001.PETRO, Gustavo. De las armas a la Revolución Ciudadana. Revista Foro: Los socialismosdel Siglo XXI, Ediciones Foro Nacional por Colômbia, Bogotá, 62, out. 2007.POCHMANN, Marcio. O país dos desiguais. Le Monde Diplomatique Brasil, 3,out. 2007.ROBERT, Anne Cécile. Viva a crise política!. Le Monde Diplomatique, jun. 2002.


24 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Com o governo Lula, tais espaços cresceram, especialmente em âmbito nacional.Dos 64 conselhos federais existentes, 13 foram criados durante o governoLula e nove foram restabelecidos (ver Plataforma da Reforma do Sistema PolíticoBrasileiro, 2006). No que diz respeito às conferências, entre 2003 e 2006, foramrealizadas 35 conferências nacionais, várias delas antecedidas por conferênciasmunicipais e estaduais em todo o país. Segundo informações do próprio governofederal, estima-se que quase 2 milhões de pessoas tenham participado, duranteesse período, de conferências em todos os níveis da federação.Mas de que têm servido todos esses espaços? Qual é o significado de todas essasmobilizações? Qual papel exerce tudo isso na democracia brasileira? É possível dizerque outros atores sociais vieram à cena por meio desses espaços? Acaso provocarameles mais igualdade, mais acesso e melhor qualidade dos serviços públicos?Após 20 anos, é hora de um balanço. Esses 20 anos podem parecer um intervalode tempo relativamente curto na história de um país. Mas o Brasil é um paísjovem, onde tudo é relativamente recente. Ademais, 20 anos não constituem umtempo tão curto quando se trata de corrigir rotas. A pergunta que podemos nosfazer é: como aperfeiçoar os atuais mecanismos de participação? Sem descartá-los,nem mistificá-los como panacéia para todos os males, como tornar a democraciaparticipativa mais democrática e mais participativa? E como fazer dela um instrumentopara a conquista de maior justiça social?Os setores sociais que se organizam em torno desses espaços percebem algunsdesafios que merecem atenção.A importância dos espaços conquistadosÉ inegável que mais atores participam hoje do debate público e que a agenda foide alguma forma alargada por tal participação. Setores que antes estavam totalmentealijados do debate, como os usuários dos serviços de saúde, os portadores depatologias, os moradores de rua, os sem-teto e tantos outros, têm agora a possibilidadede discutir as políticas públicas. Além disso, ao contrário do que acontecemuitas vezes no Congresso Nacional e na grande mídia, os conselhos e as conferênciassão instâncias realmente voltadas para a discussão pública das grandes


uma onda de cidadania | 25questões de interesse nacional. Por exemplo, na última Conferência Nacionalde Saúde, discutiu-se a descriminalização do aborto. Apesar de a Conferênciater se posicionado desfavoravelmente em relação à proposta, porque pesaram atradição brasileira e a influência da Igreja Católica, o simples fato de o debateter emergido, obrigando os vários atores a se posicionarem, já pode ser consideradoextremamente positivo.No que diz respeito à dinâmica e ao funcionamento dos conselhos, relatosapontam que, apesar das dificuldades, há outros dois ganhos importantes. De umlado, os conselhos têm funcionado como forma de obtenção de informações porparte de lideranças populares. Isso não é de menor importância em uma sociedadecomo a nossa, na qual informações como quantidade de recursos orçamentários,equipamentos públicos disponíveis e quantidade e qualidade dos atendimentosprestados à população são restritas a poucos. De outro lado, esses fóruns funcionamcomo tribunas de denúncia, especialmente no que diz respeito à violação de direitose ao desvio de recursos públicos. Há vários casos de intervenção do Ministérioda Saúde em municípios a partir de denúncias feitas pelos conselhos municipais.Alguns desafios a considerarA lista dos desafios, porém, é maior do que a lista das conquistas. Vamos destacardois.1 – Atração de novos protagonistasUm dos objetivos centrais da criação dos espaços participativos era ampliar arepresentação característica da democracia formal e integrar na cena pública umnovo conjunto de representantes da sociedade.De fato, a sociedade civil brasileira está cada vez mais plural, e muitos setorestêm procurado tanto buscar assento nos conselhos como participar ativamentedas conferências. Mas é preciso olhar detidamente quem tem conseguido espaçosnos conselhos e para representar quem e o quê.Primeiro, é preciso reconhecer as grandes assimetrias de recursos, conhecimentoe poder que, de alguma forma, se reproduzem nesses espaços. Para citar um


26 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Como aprofundar a democraciaEm 2006, a Plataforma da Reforma do Sistema PolíticoBrasileiro, elaborada por várias organizações eredes da sociedade civil, apresentou algumas demandasimportantes para o aprofundamento da democraciaparticipativa. Vale destacar ao menos duas:1. Criação de mecanismos de participação, deliberaçãoe controle social das políticas econômicas ede desenvolvimento.2. Acesso universal às informações, especialmenteas orçamentárias, nos âmbitos da União, estados emunicípios.Um dos grandes desafios para a participação temsido o acesso à informação. É impossível participarativamente se as informações são restritas, assistemáticas,com baixa clareza e precisão. Nesse ponto, talvezvalha a avaliação sobre a Lei Federal de Transparênciae Acesso à Informação do México, de junho de2002. Essa lei garante o acesso de toda pessoa à informaçãoem posse dos poderes da União. Para garantiressa lei, foi criado o Instituto Federal de Acesso à InformaçãoPública, encarregado de difundir o exercíciodo direito à informação e resolver sobre a negativade solicitações e de proteger dados pessoais em poderdo Estado. Como sanção, os servidores públicos quenão cumprem a lei, ou dão informações erradas ouincompletas, respondem a processos administrativos.Tais medidas, estendendo à sociedade civil asgrandes decisões econômicas e a informação, podemcontribuir para o aprimoramento e a radicalizaçãoda democracia participativa.exemplo extremo, nos conselhos de assistênciasocial existe a vaga para a categoria “usuário”,que dificilmente consegue ser ocupada realmentepor um usuário, mas sim por entidadesque trabalham com usuários. Freqüentemente,moradores de rua procuram ter espaço nosconselhos de assistência e não conseguem. Aquestão que se coloca é como dar condições departicipação, tratando diferenciadamente os desiguaise permitindo o acesso e a atuação efetiva?Outra questão, correlata à anterior, dizrespeito às entidades que têm expressão apenasno nível local. Como abrir espaço para essasorganizações que não se estruturam nacionalmente?Além disso, como lidar com interessesde grupos, entidades e igrejas, que, muitas vezes,colocam sua identidade corporativa acima dadiscussão sobre a política pública?Por fim, sabemos que vários conselheirostêm vínculos também com partidos políticos.E trazem para dentro dos conselhos disputasque não necessariamente têm a ver com as políticaspúblicas. Como lidar com esses representantes,que exercem, por assim dizer, umadupla militância e se pautam, muitas vezes, porlimitados interesses partidários e eleitorais? Épreciso mencionar ainda que, não raro, os representantesdo governo nesses espaços são poucorepresentativos, dispõem de pouca informaçãoe têm pouco poder de fato para falar em nomede quem supostamente representam.


uma onda de cidadania | 27Duas alternativas – que, obviamente, não dão conta de todos esses desafios– têm sido experimentadas pelos conselhos. Primeiro, buscar mais formas decomunicar/divulgar o que se passa nesses espaços, para possibilitar alguma formade controle. Assim, alguns conselhos produzem boletins informativos de suasatividades – prática que poderia ser mais disseminada. Segundo, criar fórunsautônomos, para aumentar a representatividade, a capacidade de mobilização eo poder de pressão política da sociedade civil.2 – Democracia participativa ou representativaOs espaços participativos foram concebidos como um contraponto à democraciarepresentativa. Ou, na melhor das hipóteses, ambos se complementariam. Defato, o que observamos foi a subordinação da democracia participativa à democraciarepresentativa.Desde o início da década de 1990 até o presente momento, tem sido possívelobservar a emergência de diferentes atores, portadores de diferentes projetospolíticos, que enfatizam a participação como algo essencial. Entre eles, há osque pensam em um Estado mais enxuto, com as organizações da sociedadecivil substituindo as instâncias estatais no exercício de várias funções; ou aindadefensores de propostas que reforçam apenas o caráter fiscalizatório, e quasepolicialesco, da sociedade civil, com o intuito propalado de coibir a corrupçãonos poderes públicos. O resultado é uma confluência perversa, em que atorescom interesses contraditórios, e projetos políticos até antagônicos, defendem aparticipação dos cidadãos (ver Dagnino; Olvera; Panfichi, 2006).As expectativas sobre a participação têm sido frustradas. Como vimos, o governocriou muitos espaços participativos, mas, em geral, os tratou como momentosde “escuta forte”. 1 Tal postura foi compreensivelmente considerada insatisfatóriapor parte da sociedade civil (Moroni, 2005), mas, em distintos momentos, ela sereproduziu. Recentemente, o Ministério da Saúde lançou mão das fundaçõesprivadas como nova forma de gestão. Sem ter passado pelo Conselho Nacional, aproposta recebeu pronunciamento contrário tanto na Conferência Nacional comono próprio Conselho. Resta saber quem terá mais força nesse caso. Outro exemplo1 A expressão “escuta forte”foi utilizada pela SecretariaGeral da Presidência paradesignar o que significariao processo de consulta àsentidades feitas para oPlano Plurianual Federal(PPA), realizado em 2003.


28 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008diz respeito ao Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Desde o seulançamento, movimentos sociais e organizações estão preocupados com que esseprograma respeite os planos diretores participativos e as resoluções dos conselhose das conferências das cidades realizadas nos últimos anos, pois nada asseguraque a participação seja efetivamente respeitada e levada em conta na implementaçãodos projetos presentes no PAC.O que acontece no plano federalé cotidiano nas experiências participativasde âmbito local. O respeito aoConselho como instância deliberativadepende fortemente da vontade políticados governantes e da mobilizaçãoda sociedade civil. Se partirmos dopressuposto de que a criação de mecanismosparticipativos não substitui asinstituições da democracia representativa, mas complementa-as, o desafio pareceser como promover uma nova arquitetura institucional, na qual o sistema representativopossa ser fortalecido e tensionado pela inclusão de mecanismos departicipação cidadã (Tatagiba; Teixeira, 2007).No Brasil, embora várias instâncias participativas, como os conselhos de políticaspúblicas, tenham sido definidas como peças-chave do processo de descentralizaçãodas políticas – principalmente das políticas sociais –, elas não encontraramseu lugar na estrutura do Estado. Resultado disso, podem constituir-se, em muitoscasos, como institucionalidade paralela, com pouco ou nenhum efeito democratizantesobre as instituições estatais.Além disso, a experiência brasileira nos revela outra dimensão do problema. Emum contexto no qual a agenda política se encontra constantemente monopolizadapelas disputas político-partidárias, as instâncias participativas – principalmente noâmbito local – ficam contaminadas pelo jogo político próprio à formação dasmaiorias eleitorais. Em vez da complementaridade entre instituições participativase representativas, parece muito mais adequada a afirmação de uma combinaçãoEmbora várias instâncias participativastenham sido definidas como peças-chavedas políticas, elas não encontraram seulugar na estrutura do Estado


uma onda de cidadania | 29subordinada. 2 Ou seja, a democracia brasileira, ao mesmo tempo em que inaugurauma ampla variedade de interfaces governo/sociedade, não inclui os conselhosde políticas públicas como elementos de uma renovada arquitetura institucional,capaz de oferecer caminhos novos e alternativos à reforma democrática do Estadoe à governabilidade.Tem-se a impressão de que as experiências participativas no Brasil, mundialmentereconhecidas, “correm por fora”, ficando na periferia do sistema, afetandopontualmente uma ou outra política setorial, a depender da vontade políticados governos e/ou do poder de pressão da sociedade organizada. Elas parecemnão resultar de – ou induzir – uma estratégia mais profunda de articulaçãoentre representação e participação. Em alguns casos, é possível dizer até que,mesmo quando o governo aloca recursos que resultam em efeitos redistributivos,tal procedimento não se distingue das estratégias conservadoras de manutençãodo poder e de velhas práticas clientelistas. Ana Claudia TeixeiraCientista política ecoordenadora doInstituto Pólis.ReferênciasDAGNINO, Evelina; OLVERA, Alberto; PANFICHI, Aldo (Org.). A disputa pelaconstrução democrática na América Latina. São Paulo: Paz e Terra, 2006.MORONI, José. Participamos: e daí?. Observatório da Cidadania, Rio de Janeiro,Ibase, nov. 2005.PLATAFORMA da Reforma do Sistema Político Brasileiro – Versão para debate.2006. Disponível em: . Acesso em: 20 jul. 2008.TATAGIBA, Luciana; TEIXEIRA, Ana Claudia. Democracia representativa yparticipativa: complementaridad o combinación subordinada? Reflexiones acerca delas instituciones participativas y la géstion pública en la ciudad de Sao Paulo. TATA-GIBA, Luciana; TEIXEIRA, Ana Claudia; OLIVEIRA, Mariana et al. Contraloría yparticipación social en la gestión pública. Caracas: Clad, 2007.Esses dois artigos foram publicados na edição de fevereiro de 2008 do jornal Le MondeDiplomatique Brasil, um projeto do Instituto Pólis.2 A idéia de uma combinaçãode natureza subordinadaentre a democraciaparticipativa e a representativa,sob hegemonia destaúltima, foi aludida porLígia Lüchman em umaoficina de trabalho realizadaem Porto Alegre, emagosto de 2005, como parteda agenda de discussões doGrupo de Estudos sobreConstrução Democrática.


Redes sociais: damobilização popularao ativismo digitalSonia Aguiar2008 é um ano emblemático para a memória das lutas políticas e socioculturais:40 anos do Maio de 68, na França, e da Passeata dos Cem Mil, noRio de Janeiro; 20 anos da Constituição Cidadã promulgada em Brasília;e 15 anos da Ação da Cidadania, espalhada pelo Brasil. Mas, além de efemérides, oque mais há de comum entre esses acontecimentos tão distantes no tempo e noespaço? Todos são resultados de movimentos que se formaram pelo “contágio” deidéias, ideais, percepções e necessidades consideradas imperiosas e urgentes. Açõese atitudes como “boca a boca”, “leia e passe adiante” e “converse com o seu vizinho”fazem parte de uma mobilização em torno de uma vontade coletiva de mudança,que constitui uma rede de “contaminação” coletiva, de nó em nó. Quando a mobilizaçãorompe as fronteiras das estruturas estabelecidas, torna-se mais contundente eefetiva, gerando fatos inauditos e processos sociais inovadores, fazendo história.


uma onda de cidadania | 31Mobilização, movimento, ação coletiva e redes sociais fazem parte do vocabulárioda crescente dinâmica relacional que vem caracterizando as sociedadescomplexas contemporâneas, exponenciada desde a década de 1980 pelas comunicaçõesmediadas por computadores interconectados em torno do planeta. Mas,quando dezenas de milhares de estudantes e trabalhadores franceses ocuparamas ruas de Paris e Nanterre com seus slogans surpreendentes, 1 e cerca de 100 milpessoas desafiaram a ditadura militar no Brasil, com mais de seis horas de protestosno Centro do Rio de Janeiro, 2 o projeto da rede de computadores que daria origemà internet ainda era um rascunho no Departamento de Estado dos Estados Unidose nos laboratórios das universidades parceiras do experimento. 3 Como, então,explicar que, sem as facilidades das comunicações digitais de que dispomos hoje,e, no caso brasileiro, sob um sistema de cerceamento da circulação de informaçãoe da liberdade de expressão, tanta gente tenha literalmente se mobilizado?Essa é a força das redes sociais, uma forma de se relacionar que se diferenciada organização em grupos, em comunidades e em instituições sociais formais,cujo estudo foi iniciado por antropólogos, sociólogos e psicólogos sociais europeuse estadunidenses na década de 1940. Esses estudos passaram a utilizar asmetáforas de “tecido” e “teia” para dar conta das relações de “entrelaçamento” ede “interconexão”, por meio das quais as interações humanas e as ações coletivassão articuladas.Dinâmicas de interação: entre o individual e o coletivoRedes sociais são métodos de interação que sempre visam a algum tipo demudança concreta na vida das pessoas e/ou organizações envolvidas, seja nabusca de soluções para problemas comuns, na atuação em defesa de outros emsituações desfavoráveis, ou na colaboração em algum propósito coletivo. Asinterações de indivíduos em suas relações cotidianas – familiares, comunitárias,em círculos de amizades, trabalho, estudo, militância etc. – caracterizam asredes sociais informais, que surgem sob as demandas das subjetividades, dasnecessidades e das identidades. Mas redes sociais também podem ser articuladasintencionalmente, por indivíduos ou grupos com poder de liderança, em torno1 Ver o artigo “Conheça 68das frases mais marcantesde Maio de 68” (http://g1.globo.com/Sites/Especiais/Noticias/0,,MUL463636-15530,00.html). É possívelsaber mais sobre o assuntopor meio da reportagemespecial da Folha Online(http://www1.folha.uol.com.br/folha/especial/2008/maiode68/); e do livroSolidarity, uma narrativado calor da hora (http://www.ebooksbrasil.org/adobeebook/maio68.pdf ).Acesso em: 25 jun. 2008.2 A passeata foi realizadaem 26 de junho de 1968,após um ato público naCinelândia. Saiba mais em“Passeata dos Cem Mil”(http://www1.uol.com.br/rionosjornais/rj49.htm) e“Fotógrafo redescobrepersonagens de 68” (http://www.estado.com.br/editorias/2007/10/07/pol-1.93.11.20071007.5.1.xml).Acesso em: 25 jun. 2008.3 A ArpaNet (da AdvancedResearch Projects Agency– Agência para Projetosde Pesquisa Avançada) foioficialmente criada em1969, interligando quatrouniversidades. Em 1971,possuía 15 pontos deacesso, num total de 23servidores de rede instaladosno MassachusettsInstitute of Technology(MIT), na Nasa, agênciaespacial americana, emuniversidades e laboratóriosde pesquisa de empresas, efoi experimentando umcrescimento exponencial acada novo desenvolvimento(Fonte: AGUIAR, S. Desatandoos nós da rede. Rio deJaneiro: Senac, 1997).


32 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008de interesses, necessidades e/ou objetivos comuns. Os participantes desse tipode rede podem atuar como sujeitos ou como atores sociais – nesse caso, representando(ou atuando em nome de) associações, movimentos, comunidades, empresasetc. Redes sociais plurais são formadas por indivíduos e atores sociais; redesorganizacionais ou interorganizacionais são aquelas em que os participantes atuamapenas institucionalmente.A atuação em rede (networking) é, hoje, uma forma fundamental de expressãodos interesses individuais e coletivos que se expande na medida do aumento dacomplexidade da vida cotidiana nas diferentes sociedades. Isso fica mais evidentecom a intensificação da globalização econômica na atual fase de expansão docapitalismo neoliberal. Neste contexto marcado por desigualdades e privilégios, ahorizontalidade das interconexões e do fluxo de informações – enfatizada comoa marca registrada da rede – não é condição suficiente para garantir a plena participaçãonem a efetiva democratização dos processos decisórios, que dependemtambém da qualidade dos vínculos estabelecidos e dos conteúdos mobilizadoresque circulam pela rede.Em geral, as redes sociais possuem uma temática dominante, que serve demotivação e aglutinação de seus participantes, e se desdobra em subtemas geradospor interesses específicos surgidos ao longo do seu desenvolvimento. Mas essedesenvolvimento pode não ser simplesmente contínuo ou descontínuo, rápidoou lento, admitindo posições intermediárias de aceleração e desaceleração, emfunção de determinadas circunstâncias que animam, fragmentam ou estancam aintercomunicação.A dinâmica das redes sociais é complexa: não são obrigatoriamente evolutivas;também podem encolher e, muito freqüentemente, ganham e perdem nós aolongo do seu percurso, sem perderem sua identidade, assim como ocorrem mudançasqualitativas nos vínculos entre esses nós. É como uma roda de ciranda: ela podese deslocar no espaço, sem que as pessoas precisem desconectar as mãos (bastaque andem juntas em certa direção); se o espaço em torno é pequeno, as pessoas seapertam, e a roda encolhe; se quer acolher alguém ou algo dentro dela, alarga-se; sealguém quer entrar na roda, é só trocar as mãos dadas entre quem chega e quem


uma onda de cidadania | 33já está; se sai, basta religar-se com quem fica; assim, a roda se reorganiza e sereadapta a cada circunstância, sem que a ciranda perca o seu propósito.Os graus de participação na rede dependem do interesse dos integrantes natemática em foco e nos conteúdos que nela circulam; do fluxo de informaçõesque estimulem a participação; das ações comunicativas que propiciem a interaçãodos nós; das barreiras e facilidades dos participantes para lidar com os meios erecursos de interação (competências técnicas e lingüísticas, referenciais de mundocompartilhados etc.), entre outros incentivos e obstáculos que dinamizam asrelações. Nas redes espontâneas, ostipos de ações comunicativas que“animam” as interações costumamser mais abrangentes do que as estimuladasem uma rede orientada porobjetivos institucionais.Os animadores de uma rede – quepodem ser lideranças “naturais” oumoderadores instituídos – procuramsuperar as barreiras de comunicação dos participantes em potencial, de forma aampliar o espectro de alcance da rede, quando desejável. Para isso, procuram facilitaro fluxo de mensagens, lançando mão de traduções, explicações complementares,glossários etc., sempre que identificam ruídos de comunicação. Além disso,têm de lidar com eventuais falas dissonantes e/ou elementos desagregadores quepossam perturbar a dinâmica da rede. Ou seja, a comunicação horizontal, nãohierárquica, é sujeita a controvérsias e negociações no processo de construção dosconsensos que orientam a ação coletiva. Mesmo em uma rede não espontânea,orientada por objetivos predefinidos institucionalmente, não há possibilidade deprevisão nem garantia de controle de todas as interações que nela vão surgir. Porisso, é difícil planejar a organização de uma rede de forma rígida e detalhada,ainda que sejam claros seus objetivos, potencialidades e limites.Todas essas características são hoje estudadas por uma especialidade acadêmicadenominada análise de redes sociais (social networks analysis), que abrangeÉ difícil planejar a organização de umarede de forma rígida e detalhada, aindaque sejam claros seus objetivos,potencialidades e limites


34 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008diferentes métodos de observação de quem se comunica com quem, sobre queassunto, e com que grau de proximidade e distanciamento. As técnicas de análisede redes sociais utilizam “dados relacionais” e “dados de atributos”. Os primeirosdizem respeito aos contatos, vínculos, conexões, ligações e encontros de grupos,que associam um agente a outro, e nãopodem ser reduzidos a propriedadesindividuais de cada um. Já os atributossão referentes a atitudes, opiniões eobservações dos agentes, bem como apropriedades, qualidades ou característicasde indivíduos ou grupos (renda,ocupação, educação etc.). Um terceiro tipo de dados ainda pouco explorado nessaspesquisas é aquele relativo ao mundo das idéias, que descreve significados, motivos,definições e tipificações das ações em rede.Dezenas de programas de computador criados na última década permitemobter representações gráficas da estrutura da rede, a partir do mapeamento dasligações entre os nós e dos tipos de interação em determinado momento econtexto. Mas não conseguem dar conta dos processos de “enredamento”, dascaracterísticas qualitativas que diferenciam os vínculos e dos fatores que influenciamas dinâmicas das redes. Pesquisas mais recentes, desenvolvidas sobretudo naEspanha e na América Latina, vêm apontando novas possibilidades de observaçãodas redes sociais a partir dos seus “conjuntos de ações” e do seu processo dedesenvolvimento num dado contexto sócio-histórico. 4No Brasil, as redes sociais começaram a despertar interesse de pesquisadores dasciências humanas e sociais na década de 1990, a partir de estudos sobre novas formasassociativas, movimentos sociais e organizações não-governamentais (ONGs)que emergiram dos processos de resistência à ditadura militar, de redemocratizaçãodo país, de globalização da economia e de proposição do desenvolvimento sustentável.A produção nacional sobre o assunto só deslanchou, porém, ao longo dasegunda metade daquela década, tornando-se mais significativa a partir do ano2000, claramente sob o impacto da crescente expansão da internet no país.No Brasil, as redes sociais começaram adespertar interesse de pesquisadores dasciências humanas e sociais na década de 19904 Ver o texto sobre análisede redes ou “análisisreticular” da UniversidadeComplutense de Madriem: http://www.ucm.es/info/pecar/Analisis.htm.Acesso em: 25 jun. 2008.


uma onda de cidadania | 35De característica fortemente multidisciplinar, as pesquisas abrangem diversosrecortes e enfoques: as relações interpessoais nas práticas cotidianas; o papeldas redes sociais identitárias nos processos de educação e saúde; o potencial deintervenção das redes de movimentos sociais em políticas públicas; as articulaçõessociogeográficas, como as de migrantes e deslocados por desastres ambientais;as novas questões geradas pela virtualidade do ciberespaço e pela “cultura digital”;e o impacto das tecnologias na produção, na organização e no uso de informaçãoe conhecimento, entre outros. 5Mobilização popular e articulações sociopolíticasA disputa pela mobilização dos recursos públicos em favor das populaçõespobres, de comunidades marginalizadas, de grupos desfavorecidos ou socialmentediscriminados, no Brasil, vem gerando ações coletivas inovadoras desdeo processo de redemocratização do país, a partir de meados da década de 1980.Nesse contexto, o conceito de cidadania se ampliou para além da noção do“estado de direito”, em sucessivas experiências de participação na vida pública,como a mobilização pró-emendas populares à Carta Constituinte, entre 1986e 1988; os movimentos pela ética na política e pelo impeachment do presidenteCollor, em 1992; e o inédito voluntariado gerado pela Ação da Cidadania contraa Fome e a Miséria e pela Vida desde 1993, quando foi lançada. Nessas mobilizações,observam-se duas tendências importantes: a capacidade de respostapopular a discursos contundentes sobre situações de injustiça social e apelo àsolidariedade, que vai se expandido por “contágio” interpessoal e midiático dasidéias; e a atuação semi-invisível das redes sociais que se articulam em torno dadefesa de direitos (advocacy), 6 tanto os universais (educação, saúde, segurançaalimentar, meio ambiente etc.) como os focalizados (de mulheres, negros, homossexuais,crianças e adolescentes, quilombolas etc.).No contexto das lutas por direitos, surgem ou se fortalecem novos atoressociais, como as ONGs cidadãs (que se diferenciam das organizações filantrópicas,assistencialistas e prestadoras de serviços sociais a “populações carentes”)e algumas entidades do chamado “terceiro setor” (geralmente ligadas a fundações5 Redes sociais e tecnologiasdigitais de informação ecomunicação no Brasil(1996-2006), uma amplapesquisa sobre o assunto,está disponível em: http://www.nupef.org.br/pub_redessociais.htm. Acessoem: 25 jun. 2008.6 O termo, de difícil traduçãopara o português,indica uma ação coletiva decaráter político embasadaem valores e racionalidadesde interesse público ou desolidariedade com grupossociais desfavorecidos peloEstado. Diferencia-se,assim, das motivações depoder financeiro queorientam o lobby em favorde grupos privados oucorporações específicos.Envolve “promoção dedireitos”, quando visa ampliaro espectro de direitosjá conquistados, ou “defesade direitos”, quando estesestão sendo violados ousob ameaça.


36 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 20087 Ver o artigo “Formas deorganização e enredamentopara ações sociopolíticas”,de Sonia Aguiar, incluídona edição especial (v. 12,2007) da revista Informação& Informação, publicadapela Universidade Estadualde Londrina. Disponívelem: http://www2.uel.br/revistas/informacao/viewissue.php?id=39.Acesso em: 25 jun. 2008.privadas vinculadas ou financeiramente apoiadas por empresas), que, na organizaçãode ações coletivas e na interlocução com o poder público para atendimentodas demandas sociais, tanto se aliam aos movimentos populares comocompetem com eles. A variedade de vínculos estabelecidos por cada organizaçãocom suas assemelhadas, com as agências financiadoras e doadoras, com voluntáriose com outras instituições e movimentos da sociedade civil caracteriza acomplexidade dessa atuação em rededas ONGs que hoje se articulam emtorno de interesses sociopolíticos. 7Um seminário realizado pela Novib,ONG holandesa de cooperaçãointernacional, em 1988, na cidadepernambucana de Olinda, é consideradoo ponto de partida para umesforço mais amplo de organizaçãode redes de âmbito nacional, sob a liderança das ONGs apelidadas de “cincoestrelas” que trabalhavam com a temática do desenvolvimento social, como oInstituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), a Federação deÓrgãos para a Assistência Social e Educacional (Fase), o Instituto dos Estudosda Religião (Iser), do Rio de Janeiro; a Coordenadoria Ecumênica de Serviço(Cese), de Salvador; e o Centro Luís Freire e o SOS Corpo, ambos de Recife,Aos poucos, de forma quase invisível, essa “elite” das ONGs passou a se articularcom organizações congêneres no cenário internacional e se tornou protagonistade uma nova pauta política de abrangência global: a do desenvolvimento sustentável.Essas organizações trouxeram de fora o método de articulação em redessociais via redes eletrônicas para compartilhar conhecimento e experiências e,assim, aumentar a amplitude da sua capacidade de mobilização, interlocução einfluência sobre as instâncias de poder, embora, naquele momento, de formaainda muito incipiente.A eficácia dessa nova metodologia de ação coletiva – que se tornaria irreversívelna virada do século XX – fica evidente durante a preparação do FórumA eficácia dessa nova metodologia de açãocoletiva – que se tornaria irreversível navirada do século XX – fica evidentedurante a preparação do Fórum Global


uma onda de cidadania | 37Global, evento paralelo e alternativo à Conferência da Organização das NaçõesUnidas (ONU) sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (ECO 92 ou Rio-92).Para facilitar a participação da sociedade civil no megaevento foi criado, em1990, o Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambientee o Desenvolvimento (FBOMS), cujo principal desafio foi promoverconsensos entre as ONGs tradicionais no campo do desenvolvimento social eos ecologistas novatos na pauta do desenvolvimento sustentável, visando à produçãode documentos e posições coletivos. A empreitada foi facilitada pelacomunicação a distância, por meio da primeira ligação não exclusivamenteacadêmica à internet no Brasil.Redes eletrônicas da sociedade civil: origens na pré-história da internetO serviço de informação montado para dar suporte à ECO 92, com link paraa internet, só foi possível graças à ousada experiência iniciada anos antes peloIbase: utilizar o computador como ferramenta de fortalecimento institucionale ação política, pelo intercâmbio de informações, via correio eletrônico. A integraçãoa um projeto internacional de colaboração eletrônica entre ONGs, chamadoInterdoc, em 1984, foi o embrião do Alternex, serviço de comunicaçãoremota criado em 1985 (inicialmente como um BBS – bulletin board system 8 ) ede tudo o que as ONGs brasileiras vieram a construir depois em termos detrabalho colaborativo a distância. 9O Alternex foi criado no contexto das inovações políticas, metodológicas etecnológicas que o Ibase tentava trazer para a prática dos movimentos sociaisbrasileiros desde a sua criação, em 1981, quando um simples modelo de microcomputadorApple (anterior ao advento dos micros do tipo PC) causava estranheza.Naquela época, boa parte das organizações que trabalhavam em prol daspopulações pobres considerava importante trabalhar como os pobres, ou seja,empregar apenas os meios acessíveis a eles. Além disso, rejeitava a procedênciaestrangeira dos microcomputadores (“coisa de multinacionais”). Por isso, foigrande a resistência para incorporar o computador à rotina de trabalho dasentidades, o que tornou lento o processo de expansão do Alternex.8 O BBS foi um sistemade comunicação via computadormuito utilizado entreas décadas de 1970 e 1990.Por meio dele, pessoastrocavam mensagens,programas de computadore textos informativosmediante uma conexãodiscada gerenciada porum programa específico.9 Segundo Carlos Afonso,co-fundador do Ibase eum dos pioneiros da Redede Informações para oTerceiro Setor (Rits), ementrevista à Agência Ibase.Disponível em: http://www.ibase.org.br/modules.php?name=Conteudo&pid=1210. Acesso em: 25jun. 2008.


38 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 200810 As conferências eletrônicas(ou teleconferências)eram repositórios de mensagensequivalentes aosatuais grupos de discussãoe webfóruns, só que eminterface texto. As mensagenspostadas podiam serlidas e comentadas por umnúmero amplo ou limitadode pessoas, dependendodo seu status: algumaseram públicas, isto é,abertas a todos os usuáriosda rede; outras tinhamacesso restrito a uma organizaçãoou a usuáriospreviamente cadastrados.11 Em 1995, o Alternexveiculava três conferênciassobre meio ambiente emportuguês, contra 59 eminglês e espanhol. A maisimportante delas era aax.ambiente, que chegou aser alimentada, entre 1990e 1995, por usuários de 80entidades. Destas, 54 eramONGs e movimentossociais nacionais, dosquais 33 mantiveram-seativos na internet, pormeio de websites e departicipação em fóruns elistas de discussão.Durante alguns anos, a maior parte dos conteúdos postados nas “conferênciaseletrônicas” 10 do serviço provinha de organizações e redes de outros paísesfiliadas à Association for Progressive Communications – APC (Associaçãopara o Progresso das Comunicações), da qual o Ibase era o representante noBrasil. A participação nas conferências da ONU fazia parte de uma estratégiatraçada pela APC desde o início das suas operações, que coincidiram com afase preparatória para a ECO 92, o maior encontro de chefes de Estado atéentão realizado, que contou com um envolvimento sem precedentes de organizaçõesda sociedade civil de dezenas de países. Em 1990, o Ibase apresentou aosecretariado geral da conferência um projeto de informação estratégica para oevento, cujo principal objetivo era colocar à disposição de ONGs e indivíduosum sistema de intercâmbio eletrônico de informação em âmbito internacionalpor “quase custo nenhum”.O sistema foi planejado, implementado e operado pela equipe do Alternex,incluindo os seguintes serviços: correio eletrônico e conferências de alcance internacional;acesso on-line aos documentos relacionados à conferência e um boletiminformal diário de notícias sobre o evento. A APC foi designada como a redeoficial do megaencontro, por meio da qual seriam distribuídos a documentaçãooficial do secretariado geral da conferência, documentos-chave dos encontrospreparatórios (PrepComs), relatórios de reuniões e comunicados à imprensa.Durante os 22 meses que antecederam o evento, realizado em junho de 1992,cerca de 9 mil organizações e indivíduos distribuídos por mais de 70 paísesmantiveram-se informados das negociações por intermédio das atualizações diáriaspostadas pelas filiadas da APC. Ao Alternex coube a coordenação local dosserviços telemáticos montados nos três pólos de atividades do evento no Rio deJaneiro (Hotel Glória, Rio Centro e Fórum Global no Aterro do Flamengo).Foi assim que as entidades diretamente envolvidas com as questões ambientaistornaram-se pioneiras na utilização da rede eletrônica para articulação das suasredes sociais, por meio de mensagens e conferências temáticas. 11 Seguiam, assim,os passos de seus precursores da Califórnia, nos Estados Unidos, que, desde adécada de 1980, vinham disseminando o uso de computadores para colaboração a


uma onda de cidadania | 39distância entre ativistas de movimentos sociais e participantes de organizações dasociedade civil. A experiência da ECO 92 foi tão importante que se tornou praxenas conferências mundiais da ONU seguintes: Direitos Humanos, em Viena(1993); População e Desenvolvimento, Cairo (1994); Desenvolvimento Social, emCopenhague (1995); Convenção sobre Clima, em Berlim (1995); Mulher, emPequim (1995); e Habitat II, Istambul(1996). Todos esses eventos puderamser acompanhados remotamente pormeio das conferências eletrônicas abertascom mais de um ano de antecedênciae alimentadas tanto por documentosoficiais como por debates paralelose contribuições informais.A experiência acumulada permitiu que o Alternex se tornasse o primeiroprovedor nacional de acesso individual à internet no Brasil, já com a interfacegráfica World Wide Web, em 1995, em parceria com a Rede Nacional de Pesquisa(RNP). 12 De lá pra cá, as redes de ONGs e movimentos sociais não só se multiplicarampelo país, como ampliaram o leque temático no qual atuam e a escalade esferas nas quais buscam intervir – dos conselhos municipais aos fórunsinternacionais. Hoje, esse modelo de produção e disseminação de conhecimentopara intervenção na esfera pública tem exigido a crescente profissionalizaçãodas articulações, por conta das interlocuções altamente especializadas que enfrentam,e o uso intensivo de tecnologias digitais de informação e comunicação,incluindo ferramentas de trabalho colaborativo.A experiência da ECO 92 foi tão importanteque se tornou praxe nas conferênciasmundiais da ONU seguintesOutro mundo possível, em redeAs redes sociais plurais contemporâneas que utilizam a internet no combate àpobreza têm como características comuns: a articulação de diversos atores sociaispara ações multiplicadoras de idéias e comportamentos ante as desigualdades deoportunidades e de acesso aos bens coletivos; a internacionalização dessa articulaçãoem nome da construção de uma sociedade planetária com base em valores12 O papel precursor doAlternex é detalhado nadissertação de mestrado Atrajetória da internet noBrasil, de Marcelo Sávio(2006). Disponível em:http://www.nethistory.info/Resources/Internet-BR-Dissertacao-Mestrado-MSavio-v1.2.pdf.Acesso em: 25 jun. 2008.


40 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 200813 Vale ressaltar que aexpressão “redes sociais”usada para denominarambientes virtuais ousoftwares de relacionamentosinterpessoais(tipo Orkut e MySpace),que vêm se transformandoem um grande negóciocorporativo, tem umsentido diverso das redessociais do mundo real edas redes de mobilizaçãosocial que utilizam ainternet como ferramentade articulação e ativismo.14 Software colaborativoque permite a edição coletivade documentos parapublicação imediata naweb, incluindo hiperlinksinternos e externos, cujaprincipal aplicação é aWikipédia (http://pt.wikipedia.org/).15 Ver http://belemjaneiro2008.blogspot.com.Acesso em: 25 jun. 2008.16 Um padrão de páginada web cujas atualizações(chamadas posts) são organizadascronologicamente,da mais atual para a maisantiga. Originalmentedenominado weblog, possuium formato pré-estruturadoque dispensa conhecimentotécnico deedição pelos usuários, emborasua interface venhase sofisticando desde a suacriação por Jorn Barger,em 1997.humanistas; o pluralismo organizacional e ideológico; e as intervenções nas políticaspúblicas e na lógica excludente do mercado. 13O caso exemplar dessas redes é o Fórum Social Mundial (FSM), que, desde2001, vem demonstrando, na prática, o papel exponenciador das tecnologias dainformação e da comunicação (TICs) para as relações de entrelaçamento e deinterconexão apontadas no início deste artigo. Não se trata mais, apenas, dacomunicação a distância mediada por computador idealizada pelos pioneirosda internet. Trata-se de convergência e integração de variadas formas de processamentode informação, expressão do pensamento, difusão de ações e divulgaçãode acontecimentos.A plataforma de ativismo social participativo OpenFSM (http://www.openfsm.net/), baseada na tecnologia wiki, 14 visa transformar o FSM em umprocesso contínuo, de forma a facilitar a alternância de metodologias de açãoque vêm sendo experimentadas desde o evento centralizado que caracterizouos primeiros cinco anos sediados em Porto Alegre (2001–2005): a realizaçãopolicêntrica de 2006 (com fóruns em três cidades das regiões com maior concentraçãode pobres no mundo: África, Ásia e América Latina); o deslocamentodo evento centralizado para a África (Nairóbi, em 2007); a descentralizaçãoabsoluta, com a instituição da Semana de Mobilização e do Dia de Ação Globalem 2008, durante os quais foram realizadas cerca de 800 atividades e açõesautogestionadas em 80 países; e o retorno ao evento concentrado no Brasil,desta vez com um enfoque pan-amazônico, em 2009. Em todas essas táticas,mantém-se como referencial comum “o contraponto com o Fórum EconômicoMundial, que ocorre sempre em janeiro em Davos, Suíça, para aprofundar aprática da dominação mundial pelo capital neoliberal”. 15Mais recentemente, o blog 16 vem sendo utilizado como recurso complementardo processo de organização e divulgação das atividades coordenadaspelo comitê organizador do ano e, também, como meio de comunicação dosparticipantes para expressar seus diferentes pontos de vista sobre as iniciativase desdobramentos do FSM. Assim, substituem os velhos informativos em papel,com algumas vantagens agregadas: imediatismo na narrativa dos acontecimentos


uma onda de cidadania | 41e na mobilização para ação; eliminação de intermediários na edição dos conteúdos;custo “quase zero” de produção; possibilidade de ser replicado localmentepor qualquer pessoa que disponha de um computador conectado à internet euma impressora.A convergência e a integração de diferentes tecnologias digitais de domíniopúblico já são evidentes: a notícia sobre a definição do território do FSM 2009(constituído pela Universidade Federal do Pará, a Universidade Federal Ruralda Amazônia e o Núcleo Pedagógico Integrado, localizados na Avenida Perimetral,em Belém) inclui um link para o Google Earth, 17 por meio do qual aárea pode ser visualizada. Basta uma simples câmera digital ou um celular comesse recurso para que fotos e pequenos vídeos registrando manifestações, trechosde palestras e entrevistas sejam postados no You Tube 18 ou veiculados pelossites colaborativos como o da Ciranda Internacional de Informação Independente(http://www.ciranda.net/), cujo slogan é “Para que outro mundo sejapossível, é preciso reinventar a comunicação”, ou o do WSF 2008 (http://www.wsf2008.net/pt-br). Eventualmente, porém, incompatibilidades tecnológicasainda desafiam a proposta de convergência, expressas em mensagens do tipo“video type not supported” (tipo de vídeo não suportado).Todo o legado dos fóruns de Porto Alegre foi mantido como “memória” noendereço oficial da rede (www.forumsocialmundial.org.br), incluindo as quase700 notícias veiculadas até junho de 2008, os boletins desde 2001, os documentosproduzidos pelo conselho internacional desde o primeiro Fórum, os balanços,avaliações e análises do processo FSM e de seus eventos globais, e textos sobre aconjuntura e o movimento antiglobalização neoliberal.A bandeira multicultural do Fórum – com a oferta de conteúdos nos idiomasmais falados do mundo ocidental (inglês, espanhol/castelhano, francês, portuguêse, eventualmente, italiano) – está sendo radicalizada com a produção de uma áreado site oficial em esperanto (http://parolumondo.com/forumo/). Mas essa pequenaBabel ainda não contempla a maioria das populações africanas e asiáticas, com suavariedade de idiomas e dialetos. Prova de que muitos vínculos ainda têm de serfortalecidos na rede para que outro mundo seja mesmo possível. Sonia AguiarJornalista, doutoraem Comunicação/Ciência da Informação,professora aposentadada UniversidadeFederal Fluminense(UFF) e pesquisadoracolaboradora do Núcleode Pesquisas, Estudose Formação da Redede Informações para oTerceiro Setor – Nupef-Rits (www.nupef.org.br).17 Desenvolvido edistribuído pela empresaGoogle, esse programaapresenta um modelotridimensional do globoterrestre, construído apartir de fotografias desatélite obtidas em fontesdiversas. Com isso, épossível identificar lugares,construções, cidades,paisagens, entre outroselementos de localização.O programa é multiplataforma,isto é, funciona nossistemas operacionais maisutilizados no mundo,inclusive o Linux.18 Cerca de 160 vídeosdo FSM podem serencontrados na busca por“Fórum Social Mundial”e outros 400 por “WorldSocial Forum”. Acesso em27 jun. 2008.


Quandoas notíciassão boasLeilah LandimNaquele domingo de céu azul, dia 16 de agosto de 1992, saímos de manhãbem cedo em direção ao calçadão de Copacabana vestidos depreto. Sentamos em um quiosque, outsiders naquela cena multicor:mais uma vez, seríamos os gatos-pingados segurando bandeira? A ameaça dasensação durou pouco. Lenta e progressivamente, a paisagem ia sendo pontuadade negro. Uma mancha aqui, outra ali, não havia equívoco possível, pois essa nãoé cor usual nas roupas praianas dos domingos cariocas ensolarados: olhares cúmplices,alívio, alegria do reconhecimento comum, formou-se uma enorme passeataescura pela orla. Um protesto não anunciado.Esse domingo é emblemático de um momento raro da vida nacional que sedesdobraria no ano seguinte, marcado por mobilizações inusitadas e por umsentimento difuso de sociedade que se descobre como ativa, cívica e solidária.


uma onda de cidadania | 43Sem dúvida, era impossível prever o que aconteceria quando, dois dias antes, opresidente Collor de Mello surgira na TV em cadeia nacional para convocar apopulação a sair às ruas trajando verde e amarelo no domingo, em sinal deapoio e de resposta aos ataques que vinha sofrendo. Passou-se apenas um dia,um sábado de contramensagens espalhadas por canais bem mais discretos doque a mídia oficial e nos quais contaram as redes boca a boca, para que a contraconvocaçãose espalhasse: “vamos sair de preto”. Pesquisas poderiam revelar apartir de que instâncias, precisamente, vieram essas convocações – destaquem-seo Movimento pela Ética na Política e as entidades estudantis –, mas importaassinalar que a resposta maciça, nas principais capitais do país, parece ter sidovivida pela população como um sinal de que a sociedade existe e pode sintonizar-seem horizontes comuns. Como se sabe, isso não é evidente, historicamente, nacultura política brasileira, e as provas de que se criou um imaginário de sociedadeparticipativa viriam em tempos subseqüentes.Esse incidente era sintoma, entre outros que ocorriam em 1992 em funçãodo impeachment presidencial, de um momento da vida nacional caracterizadopor ampla mobilização e espaços de ação e debate, dos quais não se excluíram asinterações com os poderes públicos, dinâmicas que se tornariam mais intensas evisíveis a partir do início de 1993.Na verdade, fossem outros os critérios oficiais e os do senso comum sociológico,o ano de 1993 seria considerado um marco na história da sociedade brasileira.Foi um momento raro de interações no espaço público das mais diversas organizações,grupos, indivíduos, de diferenciadas origens e camadas da população, denorte a sul do país, em grandes e pequenas cidades, trazendo questões, discursose ações que, embora diferenciadas, produziam consenso em algum ponto intangível.Sobretudo, a forma de organização totalmente descentralizada pela qual sedavam esses processos – os “comitês”– foi invenção original e, diga-se de passagem,jamais se repetiria em futuras mobilizações análogas. Falo, claro, da campanha queteve seu auge entre 1993 e 1994, a Ação da Cidadania contra a Fome e a Misériae pela Vida, que foi criada paralelamente e em sintonia com o Conselho Nacionalde Segurança Alimentar (Consea), no plano do governo federal.


44 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008A seguir, de modo sucinto e esquemático, são apresentados alguns acontecimentos(ou versões deles) que, de modo imediato, antecederam e sucederam acriação do Consea e da Ação da Cidadania, focalizando as dinâmicas organizacionaise associativas que compuseram esse quadro ou esse momento conjuntural.Governo e (muita) sociedadeDiz-se que os anos 80 foram, em termos econômicos, a “década perdida”. Masnão se pode dizer a mesma coisa em termos de construção de um espaço públicoampliado, no Brasil. Seguindo uma trilha aberta por associações e novosmovimentos sociais (como o sindical e os comunitários e de bairros, uma históriaconhecida) surgidos com vigor no fim da década de 1970, ainda sob regimemilitar, os espaços participativos diversificam-se e ampliam-se crescentemente.Estudos quantitativos recentes evidenciam esse dinamismo na sociedade civil,pari passu à lenta retomada da institucionalidade política democrática, trajetoexpresso tanto por meio de mobilizações de base territorial como de lutas pordireitos específicos e difusos. Foi adécada de consolidação dos movimentosde mulheres, de negros, depovos indígenas, ambientalistas etc.As chamadas ONGs voltadas à açãocidadã, cuja institucionalidade entãose construía em fronteiras ambíguas com os próprios movimentos sociais, sãotambém fenômenos expressivos desses anos, ao mesmo tempo articuladoras,mediadoras e atores em diferenciadas mobilizações.O que ocorreu no início da década de 1990 não pode ser compreendido semque se considere o acúmulo de processos forjados cerca de 15 ou 20 anos antes,no plano da sociedade civil, tanto quotidianamente como em momentos espetaculares,como a Campanha pelas Diretas, ou como os meses das apaixonadasmobilizações que precederam a primeira eleição presidencial, após 27 anos.Quando se fala do ano de 1992, vale ainda lembrar acontecimentos queaconteciam paralelamente às movimentações contra o governo Collor. PorDiz-se que os anos 80 foram, em termoseconômicos, a “década perdida”


uma onda de cidadania | 45exemplo, no mês de junho, osinteressados em acompanharos rumos do campo associativotiveram uma demonstraçãodo amadurecimento da sociedadeorganizada no Brasilpor meio da ECO 92, encontroparalelo à Conferência dasNações Unidas para o MeioAmbiente e o Desenvolvimento.Mostraram-se várias centenasde organizações associativasbrasileiras, formaram-sefóruns de movimentos sociais,e as ONGs finalmente foramdescobertas pela opinião públicapor meio da mídia, que,nesse caso, chegou bem atrasadaaos fatos. Ou seja: o terrenoestava fértil para as movimentaçõesque se adensaramrapidamente, em protesto contradescaminhos do governochefiado por Collor de Mello(questão cuja complexidade de interesses e atores presentes não será tratada aqui).Desse campo de personagens e forças é que se desentranha mais um espaçode ação política, em meados de 1992, o qual marcou o encaminhamento e oresultado do impeachment: o Movimento Democrático pelo Fim da Impunidade,logo rebatizado de Movimento pela Ética na Política (MEP), que reuniu dezenasde personalidades (como o sociólogo Herbert de Souza, o Betinho) eentidades, entre as quais a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Associação© Agência Jornal do BrasilA passeata de 16 de agosto de 1992, realizada em várias capitais, foi manchete nosprincipais jornais do país


46 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Brasileira de Imprensa (ABI) e outras organizações profissionais, entidadesestudantis, partidos políticos, sindicatos e centrais sindicais, igrejas, ONGs,empresas públicas. “A verdadeira democracia é indissociável do respeito à ética”,era o mote central do MEP, frase que soava como ovo de Colombo, parecendocristalina e evidente diante do estilo de governar do presidente eleito.Ainda mobilizados por esse sucesso recente – é o que nos contam documentose relatos de seus fundadores –, alguns participantes do MEP uniram-se noinício de 1993 (já no governo de Itamar Franco) numa nova cruzada a partirda idéia de que o aprofundamento democrático estaria intimamente vinculadoe dependente do combate à fome, miséria e exclusão social crescentes no país.A ponte com o movimento anterior era clara, pela concepção de que a lutacontra a fome deveria ser encarada não apenas como questão econômica e social,mas, sobretudo, ética. Afinal, a fome de milhões de pessoas mancharia adignidade de uma nação, e sua reprodução se sustentaria em grande medidasobre a indiferença dos que compartilham com os indigentes as mesmas ruas ecidades. A luta contra a fome seria também a da conscientização da sociedade,tendo a solidariedade como um dos valores a ser cultivado, na contracorrente daindividualização.Dentro, portanto, de uma perspectiva que se pode considerar como de“transformação moral do país”, um conjunto de agentes que participavam doMEP fez, em documento de março de 1993, o seguinte apelo a todas as entidadesda sociedade:tomem já a iniciativa de criar em todas as cidades brasileiras os comitês,somando forças e encontrando ações concretas, iniciativas decombate à fome e à miséria, de caráter emergencial, mas ligando-ascom as mudanças estruturais necessárias para mudar o rumo do desenvolvimentodo país.Essa tensão entre os aspectos (ou etapas, como alguns queriam) emergencial eestrutural esteve presente em toda a campanha, assim como os tipos de chamadasvariadas à população que, por meio da dinâmica descentralizada e de incentivo a


uma onda de cidadania | 47uma “livre iniciativa”, ora privilegiavam as organizações, ora se dirigiam às consciênciasindividuais.Surgiu, dessa forma, a vigorosa Campanha contra a Fome, que teve a especificidadede nascer composta de duas instâncias: a Ação da Cidadania, desenvolvidano plano da sociedade, e o Conselho Nacional de Segurança Alimentar(Consea), criado em abril de 1993, que reunia governo e sociedade.Em traços gerais, destacam-setrês realizações ligadas à Campanhacontra a Fome, pelo governo Itamar(para as quais concorreram personagensdas mobilizações mencionadas).A primeira foi a divulgação do Mapada Fome, elaborado pelo Instituto dePesquisa Econômica Aplicada (Ipea),com dados dramáticos sobre a situaçãode indigência no país, os quais seriam divulgados à exaustão pela Ação daCidadania, medida objetiva do problema a ser enfrentado. A segunda foi aapresentação do Plano de Combate à Fome e à Miséria, uma sistematização depossíveis ações governamentais interministeriais. Por fim, a terceira foi a criaçãodo Consea, órgão consultivo ligado à Presidência da República, compostopor sete ministros e 21 representantes da sociedade civil (escolhidos com aparticipação do MEP), cuja principal atribuição era orientar a efetivação doplano mencionado. Experiência inédita no país, o Consea – presidido por d.Mauro Morelli, também indicado pelo MEP – foi extinto no fim do governoItamar Franco (sendo, no entanto, mencionado posteriormente em algumasocasiões por d. Ruth Cardoso, primeira-dama do governo seguinte, como inspiraçãopara o Conselho da Comunidade Solidária). A Ação da Cidadania, noentanto, continuou a existir.Nascidas a partir de fontes comuns, num desses parcos momentos, no país,em que o Estado e a sociedade organizada movimentam-se em confluência,essas duas histórias – da Ação da Cidadania e do Consea – em raras situaçõesExperiência inédita no país, o Consea –presidido por d. Mauro Morelli, tambémindicado pelo MEP – foi extinto no fimdo governo Itamar


48 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008se misturaram, caso consideremos a dinâmica dos amplos espaços e movimentosdesencadeados no plano das bases da sociedade. No entanto, um lugar parao Consea deve ser reservado, na análise das condições de criação de legitimidadeda Ação da Cidadania e das suas lideranças. O Consea foi instância deprodução de reconhecimento oficial, com tudo o que isso significa em termosde publicização e peso simbólico. Basta lembrar, por exemplo, de fatos ocorridosna fundação formal da Ação daCidadania, quando a campanha jáestava, de fato, funcionando a todovapor na sociedade (junho de 1993).Além de uma passeata por Brasíliacom representantes de 300 entidadessignificativas na vida social e políticado país e também de solenidade noSenado Federal, o lançamento oficialfoi marcado por um pronunciamento, em cadeia nacional de TV e rádio, de d.Mauro Morelli, presidente do Consea, e de Betinho, que já era líder incontesteda campanha (e talvez um dos poucos, senão o único, a falar em programaoficial em cadeia nacional, sem ocupar o cargo de governo).Apesar desse e de outros momentos mais visíveis de ligação entre o Conseae a Ação da Cidadania, a Campanha contra a Fome possuiu suas instânciaspróprias de organização e convocação: os milhares de “comitês” espalhadospelo país. Como instâncias relevantes de atuação nacional, podem-se destacar:a Secretaria Executiva Nacional, fundada em março de 1993 por participantes doMEP; o Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), organizaçãonão-governamental no Rio de Janeiro, na qual funcionava a assessoriade imprensa de Betinho, pólo fundamental irradiador da Campanha contra aFome; o Comitê Idéias, formado por publicitários; os artistas, que se unirampara significativa participação no movimento; o Comitê das Estatais, reunindoempresas públicas diversas (denominado Comitê das Empresas Públicas noCombate à Fome e pela Vida); o Fundo Inter-Religioso contra a Miséria eO Consea foi instância de produçãode reconhecimento oficial, com tudoo que isso significa em termos depublicização e peso simbólico


uma onda de cidadania | 49pela Vida, formado pelos mais diversificados grupos religiosos e igrejas. Aparticipação da mídia, com a adesão de editores, jornalistas, radialistas, apresentadores,foi também decisiva para a adesão em massa da população e a criaçãodos mais diversos e inusitados comitês, por todo canto.A história dos comitês – que resistiu, por sua “indisciplina”, a tentativas deregistro censitário e sistemático – merece ser contada com mais demora. Pormeio dela, poderemos refletir sobre as marcas deixadas na sociedade brasileirapelas ações sociais e coletivas construídas nesse período excepcional. Leilah LandimDoutora em AntropologiaSocial pelo MuseuNacional (<strong>UFRJ</strong>) eprofessora adjunta daEscola de Serviço Socialda mesma instituiçãoQual a sua opinião?Acesse www.coepbrasil.org.br/cidadaniaemrede e deixe seu comentário sobre osartigos desta publicação.


Encerramento do Fórum Social Mundial, em janeiro de 2005, em Porto Alegre© Samuel Tosta/Arquivo IbaseParte 2Democracia se faz com participação


52 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008ntecedAlgunsantecedentesNo Brasil, a história da conquista da democracia é também a história da mobilizaçãoe da participação cidadã. Último país das Américas a abolir a escravatura, em1888, o Brasil contou com um intenso movimento antiescravagista, que teve CastroAlves, José do Patrocínio, Joaquim Nabuco e Machado de Assis como figuras dedestaque. A luta pelo voto feminino também é outro exemplo de que, apesar dosobstáculos, sabemos nos organizar e lutar por um país melhor. A paulista BerthaLutz foi à Europa estudar Biologia, mas trouxe o feminismo na sua bagagem devolta. Foi ela quem fundou, em 1919, a Liga para a Emancipação Intelectual daMulher, mais tarde transformada na Federação pelo Progresso Feminino. Mas foiapenas em 1932 – e depois de muita pressão por parte das mulheres – que BerthaLuz viu o presidente Getúlio Vargas aprovar o novo Código Eleitoral contendo odireito de voto das mulheres.


democracia se faz com participação | 53Mas as lutas dos abolicionistas e das mulheres não foram suficientes para garantirum país melhor para a maioria da população brasileira. Momentos como essesrevelam que a democracia necessita do empenho cotidiano e da participaçãoativa de cada cidadão e cidadã. Esse tem sido o diferencial com o qual a recentedemocracia brasileira vem se construindo.Josué de Castro, médico pernambucano que chegou a embaixador do Brasilnas Nações Unidas e teve seus direitos políticos cassados, aos 56 anos, é outroexemplo a ser resgatado nessa história de lutas e conquistas. Autor de Geografiada fome, importante livro lançadona década de 1940, Josué morreu naFrança em 1973. Mas até hoje – cemanos após seu nascimento – Josué deCastro inspira o nosso engajamentopor um país melhor, sem fome e comjustiça social. O Centro Josué deCastro, em Recife, mantém vivos amemória e os ideais desse brasileiroque, com coragem e competência, jádenunciava a fome e suas causascomo questões nacionais.Também foi a participação cidadãque, mesmo após o golpe militar de1964 – e durante mais de 20 anosde ditadura –, manteve viva a crençaem um país livre e democrático. Simbolizadapela Lei da Anistia, em 1979,o início da redemocratização do país mostrou que aquelas pessoas que lutaramcontra o regime militar continuavam dispostas a mais uma batalha pelo exercícioda cidadania.Em 1982, realizaram-se eleições diretas para os governos estaduais, pelaprimeira vez, desde 1965. Em 1984, o país se mobilizou pela aprovação da lei que© Marta Strauch/Arquivo IbaseA participação cidadã foi fundamental na luta contra a ditadura militar


54 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008nos devolveria o direito de escolher o presidente da República – era o movimentoDiretas Já. Em todas as cidades e capitais brasileiras, a população manifestouseu repúdio às eleições indiretas e exigiu o voto direto para presidente. A maiormanifestação, realizada em São Paulo, reuniu aproximadamente 1,7 milhão depessoas. Apesar da enorme mobilização, a emenda constitucional que restabeleciaas eleições diretas não foi aprovada.Após um rápido abatimento, umanova efervescência política. Os últimosexilados e exiladas regressavamao Brasil, a sociedade civil rapidamentevoltava a se organizar, e surgiamas ONGs. As eleições para ogoverno dos estados ocorrem pelasegunda vez de forma direta, em1986 – quando também foram realizadospleitos para o Senado Federal,Câmara dos Deputados e AssembléiasEstaduais. O novo Congresso Nacionaltornou-se também a AssembléiaConstituinte, encarregada de redigira nova Carta Magna brasileira. Durantea elaboração da Constituição,aprovada em 1988 e com intensa participaçãopopular, o Congresso Nacionalfoi o grande fórum de debates sobre direitos sociais e conquistas, como oEstatuto da Criança e do Adolescente. Em 1989, ocorreram as eleições diretaspara presidente da república. Na disputa final entre Luiz Inácio Lula da Silva eFernando Collor de Mello, este foi o ganhador.Em 1990, a posse de um novo presidente eleito democraticamente é ummarco para um país. Mas a sociedade brasileira rapidamente demonstrou quenão queria apenas um novo presidente, queria um novo país, no qual a partici-Em 1984, o país se mobilizou na campanha Diretas já, mas só em 1989 o povoelegeu diretamente um presidente da República© Arquivo Ibase


democracia se faz com participação | 55pação cidadã tivesse seu lugar. Com a posse do novo governo, uma nova sociedade– mais exigente e vigilante em suas conquistas – chegava para lutar pormais uma etapa de aperfeiçoamento da democracia brasileira.No Brasil e no mundo, novos temas e formas de participação passaram a serdebatidos, e uma nova onda de mobilização social começou a nascer. No Riode Janeiro, realizou-se a ECO 92, conferência das Nações Unidas sobre o meioambiente. Também em 1992, criou-se o Movimento pela Ética na Política.Esses dois episódios estabeleceram de forma mais direta um terreno fértil paraa grande mobilização contra a fome e a miséria que ocorreria nos anos subseqüentese que será objeto de análise nas páginas seguintes.Rever essa história nos faz compreender como a participação cidadã inseriuo combate à fome na agenda nacional. É também condição fundamental paraentender os desdobramentos que provocaram e as mudanças que geraram nasociedade brasileira nos últimos 15 anos.Movimento pela Ética na PolíticaEm 7 de julho de 1992, representantes de mais de 200 entidades da sociedadecivil reuniram-se no Rio de Janeiro e leram, à luz de velas, 12 artigos da Constituiçãorelacionados aos princípios fundamentais da ética na política, dos direitossociais, da democracia e das responsabilidades do presidente da República.O encontro, inicialmente batizado de Movimento Democrático pelo Fim daImpunidade, acabou recebendo o nome de Movimento pela Ética na Política(MEP). Seu objetivo era garantir seriedade às investigações da comissão parlamentarde inquérito (CPI) que havia sido instalada em 1º de junho paraapurar denúncias de corrupção no governo federal. Era mais uma etapa da reaçãopopular às irregularidades atribuídas ao presidente Fernando Collor de Mello,o primeiro – após mais de duas décadas de ditadura militar – eleito, em 1989,de forma direta.Rapidamente, o Movimento ganhou a adesão dos mais variados segmentosda sociedade brasileira e gerou protestos e passeatas nas principais capitais.Toda essa mobilização social era articulada de forma descentralizada por enti-


56 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008dades da sociedade civil, como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), aAssociação Brasileira de Imprensa (ABI), a União Nacional dos Estudantes(UNE), a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e diversas organizaçõesnão-governamentais, com especial destaque para o Instituto Brasileiro de AnálisesSociais e Econômicas (Ibase), dirigido por Herbert de Souza, o Betinho.A participação juvenil no MEP não tardou. Estudantes ocuparam as ruascom seus rostos pintados de verde e amarelo. Por todo o país, rapazes e moçasacabaram conhecidos como “caras-pintadas”, e suas imagens tornaram-se umadas referências daquele momento político. Jorge Eduardo Durão, diretor daFederação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (Fase), outra ONGque participou ativamente do MEP, lembra que “havia uma grande aposta dasONGs e movimentos sociais na realização dos direitos, na luta contra a desigualdadee na ampliação da democracia”.Outra imagem ligada a esse momento da história é a de Leonardo Boff, umdos fundadores do Movimento Fé e Política, iniciativa que, como o MEP, reuniapolíticos e militantes que viam a necessidade de introduzir ética na política.Segundo Boff, a proposta pretendia “criar uma mística política como um conjuntode motivações e valores que deveriam imbuir a atividade política para que fosserepublicana, social e orientada pelas transformações necessárias”. Ele relembra:“Em inúmeros lugares do Brasil, dei palestras sobre esse assunto, algumas coma participação do Betinho, da Bené [Benedita da Silva] e de frei Betto”.Com denúncias freqüentes na imprensa e com a CPI despertando o interessecrescente da sociedade brasileira, Fernando Collor de Mello decide convocara população a sair às ruas vestida com as cores da bandeira nacional,como sinônimo de apoio ao governo. No dia 16 de agosto de 1992, um domingo,de forma espontânea, milhares de pessoas saíram de casa vestidas de preto. Nomesmo mês, no dia 26, foi aprovado o relatório final da CPI, que sugeria oimpeachment de Collor, sendo posteriormente encaminhado à ProcuradoriaGeral da República e à Câmara dos Deputados.Em 1º de setembro, representando o Movimento pela Ética na Política, ojornalista Barbosa Lima Sobrinho, presidente da ABI, apresentou formalmente


democracia se faz com participação | 57à Câmara dos Deputados o pedido de impeachment de Collor. Betinho, LindbergFarias, presidente da UNE, Marcelo Lavenere, presidente da OAB, e Jair Meneguelli,presidente da CUT, estavam à frente do grupo de 500 pessoas que percorrerama pé os três quilômetros existentes entre a sede nacional da OAB e oCongresso Nacional, onde já estava Barbosa Lima Sobrinho. Mas foi em 29 desetembro que a Câmara, por 441 votos contra 38, aprovou a admissibilidade doprocesso de impeachment. Nas ruas de Brasília, uma multidão de 100 mil pessoascomemorou o resultado da votação, o que se repetiu em inúmeras outras cidadesdo país. Em seguida, Collor foi substituído interinamente pelo vice-presidenteItamar Franco.Durante os três meses seguintes, Collor ficou afastado do cargo de presidenteda República, aguardando seu julgamento no Senado Federal. Em 29 de dezembrode 1992, Collor renunciou à Presidência da República. Mesmo assim, o Senadolevou adiante o processo e cassouseus direitos políticos por oito anos,tornando-o inelegível até 2000. O mineiroItamar Franco assumiu, assim, ocargo de chefe supremo da nação.Para André Spitz, um dos fundadoresdo COEP, a mobilização peloimpeachment representou um importantepapel organizativo para a sociedadecivil, tendo sido o elemento gerador em comum da Ação da Cidadania,do COEP e do Consea. “Era no Fórum de Ciência e Cultura da <strong>UFRJ</strong>, entãodirigido pelo professor Luiz Pinguelli Rosa, que ocorriam as principais reuniõesdo Movimento pela Ética na Política. Logo após o impeachment, naquela queseria a última reunião desse movimento, d. Luciano Mendes de Almeida, entãosecretário geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), fezum pronunciamento de que toda aquela energia e mobilização social deviamser utilizadas no combate à fome. Segundo d. Luciano, essa seria a questão maisaética que havia no país”, recorda. Para ele, a partir desse episódio, Betinho, queEm 29 de setembro, a Câmara aprovoua admissibilidade do impeachment. Nasruas de Brasília, uma multidão de 100 milpessoas comemorou o resultado da votação


58 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008também estava no encontro, sentiu-se inspirado para desenhar a Ação da Cidadania.“Era como se a mobilização e a energia do MEP tivessem sido redirecionadaspara a luta contra a fome”, acredita André.ECO 92Realizada no Rio de Janeiro de 3 a 14 de junho, a Conferência Mundial dasNações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, a ECO 92, geroutrês convenções: sobre mudança do clima, sobre biodiversidade e sobre florestas.A conferência também aprovou documentos com objetivos mais abrangentes ede natureza mais política: a Declaração do Rio e a Agenda 21. Os acordos foramassinados por 179 países. Mas, para a sociedade civil organizada brasileira, acúpula trouxe algo a mais: a oportunidade de articular-se com atores sociais detodo o mundo.Durante o mesmo período do encontro oficial, mais de 1.300 ONGs, de108 países, participaram do Fórum Global Rio-92, evento paralelo promovidopela sociedade civil organizada. Entre outros, estavam presentes o Fórum Brasileirode Organizações Não-Governamentais e Movimentos Sociais para oMeio Ambiente e Desenvolvimento (FBOMS), a Associação Internacional deEducação Comunitária, o Serviço Universitário Mundial, o Conselho Internacionalde Educação de Adultos, o Instituto Paulo Freire, Friends of Earth,Centro de Criação de Imagem Popular (Cecip), Central Única dos Trabalhadores(CUT), Políticas Alternativas para o Cone Sul (Pacs), Instituto Pólis,Fundação Arias, Ibase e Vitae Civilis, além de universidades e movimentossociais ligados às mulheres, às pessoas negras e indígenas, e aos(às) camponeses(as).No Fórum Global Rio-92, foram debatidos e aprovados 36 tratados, entre eles aCarta da Terra e a Declaração do Rio do Fórum Global.Para Cândido Grzybowski, sociólogo e diretor do Ibase, esse encontro “impactoua sociedade civil brasileira por mostrar a riqueza de trocas e análise que segera quando, no respeito mútuo, trabalha-se juntando diversidade de sujeitos epluralidade de perspectivas”. Nathalie Beghin, que foi pesquisadora do Ipea nadécada de 1990, também acredita que o Fórum Global inaugurou uma nova e


democracia se faz com participação | 59inédita fase de participação social em espaços globais: “Milhares de organizaçõesda sociedade civil reunidas no Rio de Janeiro questionaram os padrões deprodução e consumo prevalecentes no mundo capitalista, alegando que essespadrões alienam os indivíduos do mundo natural e de si próprios, violam ospreceitos ecológicos da diversidade, guardam poucas relações com as necessidadesbásicas dos indivíduos e contribuem para agravar os problemas de exclusãosocial, principalmente nos países do Terceiro Mundo, e para aumentar a distânciaentre países ricos e pobres”.O teólogo Leonardo Boff participou desse momento e afirma: “Havia muitoentusiasmo em tudo o que se fazia, seja pela novidade da temática, seja pelaconfiança de que se poderiam fazer reais transformações. Tínhamos a impressãode que havia solução para a Terra, que uma nova consciência política e éticaestava surgindo no sentido da emergência de uma nova responsabilidade pelofuturo comum”. Para saber mais, acesse:www.ibase.brwww.cpdoc.fgv.brwww.unb.brwww.leonardoboff.comwww.cartadaterra.org


60 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Marcos da lutacontra a fomee a pobrezaA seguir, estão alguns momentos de mobilização social apontados pelo COEP pararesgatar os episódios mais significativos da luta contra a fome e a miséria ao longo dosúltimos 15 anos, no Brasil. O esforço do COEP, ao relembrar essa rica história, não éapenas recriá-la, mas relembrá-la para extrair dela caminhos para construir um novoBrasil. Para isso, buscamos os relatos de pessoas que viveram – e, em alguns casos, atéprotagonizaram – esses episódios da ainda recente democracia brasileira. Sem seprender à exatidão ou à formalidade acadêmicas, o texto é um convite à reflexão: o queé capaz de mobilizar um povo, em especial as brasileiras e os brasileiros, para lutarcontra a fome e despertar coletivamente o sentimento de solidariedade? A respostatende a ser tão diversa quanto a constituição da nação brasileira. Encontre a sua.


democracia se faz com participação | 61Linha cronológica1993 Ação da Cidadania contra a Fome e a Miséria e pela VidaSemana da Arte contra a FomeMapa da FomeConseaCOEP1994 I Conferência Nacional de Segurança AlimentarNatal sem FomeFórum Nacional da Ação da Cidadania1995 Comunidade Solidária1996 Agenda Social Rio1997 Balanço social das empresas1998 Instituto EthosFórum Brasileiro de Segurança Alimentar e Nutricional1999 Consea de Minas Gerais2001 Dia Nacional de Mobilização pela VidaFórum Social Mundial2003 ConseaFome ZeroComitês gestoresRede de Educação CidadãPrograma Um Milhão de Cisternas2004 II Conferência Nacional de Segurança Alimentar e NutricionalMovimento Nacional pela Cidadania e Solidariedade2006 Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional (Losan)2007 III Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional2008 Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan)


62 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 20081993 e 1994Em 1993, surgem a Ação da Cidadania contra a Fome e a Miséria e pela Vida, oConselho Nacional de Segurança Alimentar (Consea) e o Comitê de EntidadesPúblicas no Combate à Fome e pela Vida (COEP). O Mapa da Fome, estudo elaboradopelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), aponta que 32 milhõesde brasileiros e brasileiras não têm comida à mesa. A Semana da Arte contraa Fome, uma série de mobilizações da classe artística em geral, emociona com seuchamado à participação.Em 1994, a I Conferência Nacional de Segurança Alimentar (CNSA), o FórumNacional da Ação da Cidadania e a campanha do Natal sem Fome são os espaçosnos quais participação, mobilização e políticas públicas se encontram.Ação da Cidadania contra a Fome e a Miséria e pela VidaLançada em março de 1993, a Ação da Cidadania contra a Fome e a Miséria epela Vida foi um movimento suprapartidário, ecumênico e plural, que estimuloua participação da sociedade brasileira nas ações emergenciais e na luta estruturalcontra a fome e a miséria. Em meio ao clima de mobilização social pósimpeachment,o sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, convocou a populaçãopara participar dessa luta. “Não se pode comer tranqüilo em meio à fome generalizada.Não se pode ser feliz num país em que milhões se batem no desesperodo desemprego, da falta de condições mais elementaresde saúde, educação, habitação e saneamento”,afirmava a Carta da Ação da Cidadania, documentodivulgado à época.“Em 18 de março de 1993, durante uma reunião ministerialem Brasília, lançou-se aquilo que popularmentefoi conhecido como ‘Campanha do Betinho’.


democracia se faz com participação | 63Mas a expressão ‘Ação da Cidadania contra a Fome e a Miséria e pela Vida’ foicunhada por d. Luciano Mendes, que integrava, pela Conferência Nacionaldos Bispos do Brasil (CNBB), o Movimento pela Ética na Política. Esse foi onome de batismo daquela indignação e da proposta que emergiu no período pósimpeachment.O incrível é que nunca, nem o Betinho e nenhum de nós, quisemosque fosse uma campanha, pois, embora qualquer movimento tenha campanhas, elassão estratégias que têm seu tempo certo de realização”, relembra d. Mauro Morelli.Menos de um ano após o início da Açãoda Cidadania, havia, no fim de 1993, maisde 3 mil comitês da Ação da Cidadania noDistrito Federal e em 21 estados brasileiros.Mas foi uma pesquisa do InstitutoBrasileiro de Opinião Pública e Estatística(Ibope) divulgada em janeiro de 1994 queconfirmou sua repercussão nacional. Apósserem ouvidas 2 mil pessoas maiores de16 anos em diversas cidades brasileiras, osBetinho foi o grande animador daresultados foram: 93% das pessoas entrevistadasconsideraram a campanha neces-Campanha contra a Fomesária, 68% já tinham ouvido falar dela; 32% já haviam participado ou contribuíramde alguma forma para a campanha; e 11% disseram fazer parte de algum comitê.Com tanta popularidade, aumentaram as adesões vindas dos quatro cantosdo país: sindicatos, associações de bairro, clubes, cooperativas e tantas outrasentidades se uniram à campanha. Além de alimentos, eram organizadas coletasde roupas, remédios etc. Comitês da Ação da Cidadania eram fundados emigrejas, escolas e empresas. Personalidades do mundo artístico e atletas se juntaramao movimento e era comum que participassem de eventos de arrecadação dealimentos e, também, fossem a programas de TV e dessem declarações a jornaisem busca do apoio da população.Gleyse Peiter, atual secretária executiva do COEP, avalia: “A Ação da Cidadaniadeu certo e foi tão emblemática para o país por conta de elementos presentes© Abril Imagens


64 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008© Arquivo Ibaseàquela época. Além do histórico de mobilizações como a ‘DiretasJá’, que demonstrava que tínhamos objetivos comuns, vivíamosum ambiente de mudanças no início da década de 90”.Para André Spitz, um dos fundadores do COEP, um “climareal de mudanças pós-impeachment” facilitava a mobilizaçãoe participação da sociedade. Outro fato ressaltado por Spitzfoi a divulgação do Mapa da Fome: “O estudo do Ipea deuconcretude ao problema da fome. E quem tinha fome passoua ter nome e endereço também”. Mas, para André, é precisosempre lembrar que, sem a liderança de Betinho, talvez osresultados não tivessem sido os mesmos: “Ele era um animadore um agregador nato. Quando ele morreu, suas iniciativasnão morreram. O que acabou foi essa incrível capacidade dejuntar pessoas, causas, iniciativas. O COEP, a AssociaçãoBrasileira Interdisciplinar de Aids (Abia), o Viva Rio, o InstitutoBrasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase) –só para citar alguns exemplos de instituições e movimentoscriados por Betinho – cresceram mesmo após sua morte. Oque ficou mais difícil foi a capacidade de construir pontesentre diferentes causas”.Campo de debatesA Campanha contra a Fome usou apropaganda a seu favorCom a campanha, o combate à fome entrou na agenda pública,e palavras como cidadania e solidariedade passaram a serusadas em diferentes espaços de debates. Flavio Valente, queatuou na Ação da Cidadania e no Consea, ressalta: “É importantelembrar que a Ação surgiu num momento da históriabrasileira em que crianças de/na rua eram tratadas como inimigosda sociedade e passíveis de exterminação sumária. Chacinaseram banalizadas e naturalizadas. A Ação da Cidadania


democracia se faz com participação | 65Carta da Ação da CidadaniaChega! Vamos dar um basta nesse processo insensato e genocida gerador da miséria que colocamilhões de pessoas nos limites insuportáveis da fome e do desespero.O tempo da miséria absoluta e da resignação com esse quadro acabou. O tempo da conciliaçãoe do conformismo acabou. A sociedade brasileira definiu a erradicação da miséria como sua prioridadeabsoluta. Esse é o clamor ético de nossos tempos, ao qual tudo o mais deve se subordinar.Essa deve ser a prioridade da sociedade e do Estado. Essa é a obrigação de cada um e de todos.Tudo deve responder a essa questão. O orçamento público, as políticas, as ações governamentaise não-governamentais, as atividades produtivas, comerciais e financeiras, as atividades de ensinoe cultural, em que medida dão prioridade à solução dessa questão? Ou em que medida ajudam aaprofundar esse fosso que nos separa e nos divide entre os que têm e os que vivem na mais profundamiséria?Não se pode viver em paz em situação de guerra. Não se pode comer tranqüilo em meio à fomegeneralizada. Não se pode ser feliz num país onde milhões se batem no desespero do desemprego,da falta das condições mais elementares de saúde, educação, habitação e saneamento. Não se podefechar a porta à consciência, nem tapar os ouvidos ao clamor que se levanta de todos os lados.A insanidade de um país que marginalizou a maioria deve terminar agora. O Brasil precisamobilizar todas as energias para mudar de rumo e colocar um fim à miséria. Devemos criar emtodos os lugares a ação da cidadania em luta contra a miséria e pela vida.Precisamos todos constituir esse movimento. Podemos ainda produzir o encontro do Brasilcom sua própria sociedade. Democracia e miséria não são compatíveis.Herbert de SouzaMOVIMENTO PELA ÉTICA NA POLÍTICA


66 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008provocou um choque cultural, especialmente, mas não unicamente, na classemédia. Aos poucos, essas crianças passaram a ser vistas como as principais vítimasde uma sociedade injusta e desigual. Elas necessitavam da solidariedadee do apoio da sociedade como um todo para que saíssem da miséria e da exclusão,a fim de ter uma oportunidade de uma vida digna”.Alcir Calliari, que presidia o Banco do Brasil àquela época, concorda: “Oprincipal resultado foi, em minha opinião, tornar pública a existência do problemada fome e da miséria em nosso Brasil, obrigando as elites e a populaçãoem geral a enfrentar a situação e a ter consciência da sua responsabilidade nabusca de soluções”. Alcir também acredita que a liderança de Betinho fez que“a iniciativa vingasse em amplos setores da sociedade brasileira”.Nathalie Beghin, pesquisadora do Ipea de 1992 a 2006, também acreditaque as experiências da campanha fazem parte de momentos que marcam a vidade um país: “A Ação da Cidadania teve o efeito notável de abrir um campo dedebate em torno da fome que ganhou lugar de destaque da grande imprensa.Tudo era discutido: questões relativas à produção e distribuição de alimentos,as relações entre saúde e nutrição, tecnologia e desenvolvimento local, a parceriaentre Estado e sociedade no enfrentamento da fome, a reforma agrária e ageração de emprego. Tratava-se de um debate que chamava a atenção para asresponsabilidades públicas na crise social brasileira”.O depoimento de José Ribamar Araújo e Silva, que, na época, trabalhava naCáritas do Maranhão, revela como a Ação da Cidadania deu início a váriasoutras ações políticas. “O comitê de São Luís foi fundado em 3 de julho de1993. Uma conquista que marcou nosso comitê desde o início foi a de que acampanha não deveria se prender só ao emergencial, mas ir do emergencial aoestrutural. Sempre assumimos a máxima de que não basta dar o peixe; é precisoensinar a pescar. Aqui, no Maranhão, onde se vive sob forte impacto da degradaçãoambiental, acrescentamos: nem só ensinar a pescar, mas organizar os trabalhadorese as trabalhadoras para vigiarem e não deixarem poluir ou privatizaremas águas.” E continua: “Aprofundamos o diagnóstico de que, no Maranhão, afome deriva de um modelo de desenvolvimento que concentra terra, rendas e


democracia se faz com participação | 67oportunidades; por isso, desde logo associamos a luta contra a fome com a lutapela reforma agrária e aquática”.Para Brizabel Rocha, da Fundação de Assistência Social e Cidadania dePorto Alegre, a Ação da Cidadania “gerou um sentimento de cidadania nacional,de solidariedade, de articulação de vários movimentos em torno de umaúnica causa”. Para ela, a dificuldade era “a instantaneidade dos momentos quevivíamos”. Em outras palavras, Brizabel explica: “Nosso grande animador naépoca, o Betinho, definia, lá do Rio de Janeiro, temas e os transformava emcampanhas. Foi assim que tivemos o ano da luta pela terra, a luta contra o trabalhoinfantil e também o Natal sem Fome. Infelizmente, não conseguíamosaprofundar esses temas. Mas as dificuldades do caminho foram motivaçõespara o crescimento da Ação da Cidadania e também para a consolidação devárias parcerias”.Mas a Ação da Cidadania também provocou polêmicas. Jorge EduardoDurão, da Federação dos Órgãos para Assistência Social e Educacional (Fase),aponta: “A popularização da luta contra a fome só foi possível graças ao apoiodos meios de comunicação, e esse apoio só foi viabilizado pela desvinculaçãoda problemática da fome e da pobreza de suas causas estruturais. Até certoponto, o discurso da Ação da Cidadanianão apontava para as causasestruturais da pobreza e não explicitavaos conflitos sociais. Na época,escrevi um artigo contra a convocaçãodos usineiros para participaremda Campanha contra a Fome, poisachava um absurdo que se difundissea ilusão de que um setor empresarialque vive da mais brutal exploração dos trabalhadores – que recebem salários defome e são submetidos a um regime de trabalho que, ainda hoje, leva muitostrabalhadores à morte por exaustão – pudesse contribuir de alguma maneirapara a erradicação da fome no Brasil”.Para Brizabel Rocha, as dificuldades docaminho foram motivações para ocrescimento da Ação da Cidadania e tambémpara a consolidação de várias parcerias


68 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008A opinião do consultor de empresas Alfredo Laufer, que atuou na Ação daCidadania, aponta para um conflito ideológico. “Por causa da grande carênciada nossa sociedade, vejo que houve um esforço para que o movimento alcançasseuma questão maior, mas a verdade é que, infelizmente, ficou preso a uma questãomenor. Existe, até hoje, uma massa de pessoas em que a carência não é apenasalimentar. Existe uma outra carência que étão profunda quanto a fome, que é a carênciada auto-estima. A Ação da Cidadania provocouo surgimento de comitês, acreditandoque a transformação maior seria essa organizaçãopolítica. Mas havia um conflito entreo que imaginávamos que deveria ser feito eo que acontece na realidade das pessoas que estavam à frente dos comitês. Numdeterminado momento, nosso sonho era muito superior às dimensões da práticada realidade cotidiana.”Essas considerações, no entanto, não impedem o reconhecimento da importânciado movimento. “Criou-se, no país, uma consciência difusa de que a fomeé inaceitável. A Ação da Cidadania contribuiu para a criação do Consea e para osurgimento dos programas governamentais de transferência de renda aos segmentosmais vulneráveis da população. Mas não representou um marco de transformaçãosocial na superação das desigualdades”, destaca Jorge Eduardo Durão.Para Alfredo Laufer, é importante reconhecer outro tipo de avanço: “Vejo umarelação desse envolvimento de empresas na Ação da Cidadania com o surgimento,posteriormente, do pensamento da responsabilidade social das empresas. Nãoacredito que o Banco do Brasil ou a Caixa Econômica Federal estivessem apenasquerendo usar o marketing social. O próprio COEP, com suas entidades associadas,é outro avanço proporcionado pela Ação da Cidadania. Esse vetor deresponsabilidade social das empresas passa a ser uma necessidade para todas asempresas – pequenas, médias ou grandes. Quando dou aula sobre planos denegócios, 15 anos depois de tudo isso ter começado, não há um aluno que nãoqueira introduzir uma política de responsabilidade social em sua empresa”.Para o Alfredo Laufer, existe uma massa depessoas em que a carência não é apenasalimentar, é a carência da auto-estima


democracia se faz com participação | 69Comitê IdéiasProfissionais da propaganda e publicidade formaram um grupo bastante ativo na Ação da Cidadania, que,posteriormente, foi chamado de Comitê Idéias. Celso Japiassu, especialista em marketing e comunicação,participou desse grupo. “Logo após o impeachment, Betinho me procurou na agência onde eu trabalhava. Elequeria manter a opinião pública mobilizada para enfrentar outros temasvitais para o país. Sabíamos que a queda de Collor havia sido um momentoimportante na afirmação da cidadania, mas o que fazer para aproveitaraquela força transformadora? Num segundo encontro, apresentei-lhealguns slogans e palavras de ordem. Um deles pedia o ‘impeachment dafome’. Essa formulação ia ao encontro do que Betinho procurava naquelemomento. A partir daí, engajei-me no movimento, sob sua liderança.Com a ajuda do departamento de criação da agência, em poucos diasapresentei a Betinho a primeira campanha contra a fome e o desenhoda marca da Ação da Cidadania”, recorda Celso.© Arquivo IbaseA publicitária Nádia Rebouças também integrou o Comitê Idéias.“Participei da primeira reunião na qual Betinho disse que precisava dacriatividade de todos os publicitários”. Segundo Nádia, Betinho afirmavaque não queria uma agência de propaganda e que não daria a “conta”a nenhuma delas. “Meus colegas me escolheram para fazer o planejamento,convocamos uma reunião com os profissionais de comunicação,falamos diretamente com os profissionais e resultou na maior campanhaplanejada já realizada. Foram cerca de 40 filmes publicitários veiculadosde forma totalmente gratuita, durante cerca de quatro anos”, garante.Apesar de resultados tão positivos, Nádia aponta quais eram asmaiores dificuldades: “Quebrar os preconceitos de uma esquerda quetinha aprendido a viver escondida e criando ilhas. Intelectuais que tinhammedo de se misturar. Aceitar a diversidade dos pensares e fazeres. Osectarismo. A mania de falar e falar e nada fazer. A velha política, o jogopolítico. Os egos e o academicismo”.© Arquivo Ibase© Arquivo Ibase


70 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Com ou sem polêmicas, a repercussão da Ação da Cidadania não foi apenasno Brasil. Em 1993, o sacerdote jesuíta Matias Martinho Lenz vivia em Roma eajudou a formar um “Comitê do Betinho”, com sede no Colégio Pio Brasileiro.O objetivo era apoiar a luta no Brasil, por meio de sua divulgação na Europa,e também angariar fundos para projetos sociais no país. “O que me motivoupara entrar mais fortemente nessa luta foi o exemplo do Betinho e de d. MauroMorelli e uma profunda convicção religiosa pessoal”, recorda Lenz.Novas bandeirasEm 1994, ano seguinte de seu lançamento, a Ação da Cidadania começou alevantar outras bandeiras, sem abandonar totalmente a questão da fome. A novidadeera associar essa luta à geração de emprego e renda. Na época, o InstitutoBrasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) havia lançado o Mapa do mercado detrabalho no Brasil. Nele, informava-se que, no país, eram 20 milhões de pessoasdesempregadas, que trabalhavam sem receber ou recebiam menos de um saláriomínimo mensalmente. Em 1995, a Ação da Cidadania optou por debater ademocratização do acesso à terra. Nesses dois anos, a arrecadação de alimentoscontinuou a ocorrer em todo o país, mas os temas do emprego e do acesso àterra nunca tiveram o mesmo impacto da fase inicial.Moema Miranda, antropóloga e coordenadora do Ibase, recorda: “Com essestemas, a possibilidade de ação direta das pessoas diminuiu, e a Ação da Cidadaniaencontrou seu limite e declínio. Quando tentamos articular a Ação da Cidadaniacom políticas públicas e ação do Estado, não dava mais para contar com a açãoindividual das pessoas, não dava para pedir que cada um fizesse a reforma agráriano seu quintal. Quando a Ação toca no tema da terra, esbarra no fato de que,no Brasil, o acesso à terra faz parte da manutenção dessa ‘ordem vigente’”.Quinze anos após ter sido lançada, a Ação da Cidadania está presente nãoapenas na memória afetiva da sociedade brasileira. Comitês sobrevivem de formaautônoma e descentralizada pelo país, exatamente como sempre foi incentivado,


democracia se faz com participação | 71sem donos ou donas e sem organogramas de funcionamento. Sobre essa continuidade,Moema Miranda sintetiza a complexidade dos avanços conseguidos:“Vejo três tipos de resultados: a Ação da Cidadania e a construção do papelpolítico das ONGs brasileiras; a Ação da Cidadania e a percepção coletiva deque a transformação social passa também pela mobilização das pessoas e pelofortalecimento da sociedade civil organizada; e a Ação da Cidadania comoinspiração para que uma série de iniciativas sociais, de forma descentralizada eautônoma, exista Brasil afora até hoje. Às vezes, nem lembramos, mas há umasérie de iniciativas que começaramna Ação da Cidadania. O COEP éuma delas, entre tantas que ganharamvida própria, criaram sua identidadee seguiram com seu trabalho”.Flavio Valente aponta no mesmosentido: “Muitas das lutas foram institucionalizadas,seja na esfera governamental,seja na esfera dos movimentossociais e das ONGs. A Ação da Cidadania continua viva, com muitas caras e formas”.Nas palavras do pastor Ariovaldo Santos, que participou da Ação e quecontinua na luta contra a fome, o período “foi, sem dúvida, um dos momentos maisfelizes do Brasil como nação. Nasce da força de uma figura ímpar – o Betinho – eencontra eco em toda a nação, criando uma consciência cidadã ímpar, que, pensoeu, está na gênese da mudança de paradigma que acabou por tornar possível aeleição de um governo popular, que se responsabilizou por solucionar a questãoda fome. Aprendemos, ainda que um pouco, que a nação somos nós”.Para o pastor Ariovaldo Santos, o período foium dos momentos mais felizes do Brasil.Nasce da força de uma figura ímpar – oBetinho – e encontra eco em toda a naçãoSemana da Arte contra a FomeCom apresentações de dança, poesia, teatro e música em vários pontos da cidadedo Rio de Janeiro, o dia 7 de setembro de 1993 marcou o início da Semana da


72 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Arte contra a Fome, um evento político-cultural realizado pela Ação da Cidadania.A primeira atividade da semana foi o Jejum pela Vida, um protesto realizadopor religiosos ao longo de 12 horas no Parque Lage, no Rio de Janeiro.O encerramento ocorreu no dia 14 de setembro, no Theatro Municipal, e teve aapresentação do espetáculo Cidadão!, quePostais distribuídos durante a Semana da Arte contra a Fome© Arquivo Ibasecontou com a participação de MarietaSevero, Fernanda Montenegro, GrandeOtelo e outras pessoas das artes. Para assistirà apresentação, bastava se comprometera cumprir o Contrato de Cidadania,um acordo que estabelecia uma doaçãoanual, no valor possível, a uma instituiçãoselecionada pela Ação.O ator Jonas Bloch, durante um ano,coordenou as ações de artistas na campanha.Sobre a Semana da Arte contra a Fome,garante: “Foi fantástica. Foram 200 eventos,pequenas cenas em saguões dos teatros,performances nas ruas, um superespetáculono Theatro Municipal, entre outros”. Segundoele, “a participação dos artistas nacampanha era exemplar. Isso estimulou apopulação a ter um olhar mais atento ao que estava sendo proposto. Era tambémum exemplo de que não era só de glamour, como as revistas divulgam, queum artista vive”.A publicitária Nádia Rebouças também relembra o evento: “Estavam látodos os grandes artistas nacionais, até artistas populares e escolas de samba.Um espetáculo inesquecível do qual guardo alguns trechos até hoje. A Semanada Arte contra a Fome também levou para as praias da Zona Sul do Rio deJaneiro um desfile inusitado, com obras de arte dos artistas plásticos que caminhavammostrando suas leituras sobre a fome no Brasil e no mundo”.


democracia se faz com participação | 73Mapa da FomeElaborado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e divulgadoem 18 de março em 1993, poucos dias após o lançamento da Ação da Cidadania,o Mapa da Fome se transformou em uma estratégia para dar visibilidade àscondições de vida da população mais pobre. O número de pessoas que viviamabaixo da linha da pobreza apontado pelo estudo – 32 milhões – foi um dosprincipais instrumentos usados para fomentar o debate público em torno daquestão. O número, na ocasião, correspondia à população da Argentina.Com os dados do Mapa da Fome em mãos, e utilizando-se de sua facilidade emmobilizar a sociedade civil, Betinho conseguiu ter a imprensa como aliada nadivulgação dos dados produzidos pelo Ipea: “A fome é exclusão. Da terra, da renda,do emprego, do salário, da educação, da economia, da vida e da cidadania. Quandouma pessoa chega a não ter o que comer, é porque tudo o mais já lhe foi negado”,declarou Betinho em um artigo publicado, em setembro de 1993, noJornal do Brasil.Ivônio Barros, que participou ativamente da Ação da Cidadania, confirma:“Betinho aproveitou um grande potencial apresentado pela equipe de estudossociais do Ipea, coordenada pela Anna Peliano, com a disposição do presidenteda República em estar diretamente ligado ao processo”. Nathalie Beghin trabalhouna elaboração do documento e revela quem teve a idéia de elaborá-lo:“Foi nossa equipe que produziu, a pedido do Betinho, o estudo chamado deMapa da Fome, que divulgou a existência de 32 milhões de pessoas que nãodispunham de renda sequer para se alimentar”.Anna Peliano, que atualmente coordena a área de estudos de responsabilidadesocial do Ipea, complementa: “Em uma reunião no Ipea, Betinho nos fezessa encomenda. Ele disse: ‘Eu queria que vocês fizessem um mapa da fome.Gostaria de saber onde estão os alimentos, onde estão as pessoas que passamfome, e como fazer uns chegarem até os outros’. Inicialmente, contestamos essetipo de levantamento. Primeiro, porque o acesso aos alimentos não era umaquestão de logística, de fazer chegar o alimento, e sim de garantir renda para a


74 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008população poder adquirir esses alimentos. Segundo, não era trivial dizer quantaspessoas passavam fome. Estávamos no ano de 1993, e os últimos dados disponíveissobre consumo alimentar eram de meados da década de 70”.Além de traçar um perfil da condição de vida do brasileiro, o Mapa daFome foi usado para estabelecer o que seria a chamada linha da pobreza. Oestudo inovou ao desenvolver estimativas baseadas na comparação entre osrendimentos familiares e o custo de uma cesta básica familiar com alimentoscom valor nutricional mínimo de acordo com cada região. Em agosto de 1994,uma atualização do Mapa da Fome apontou que o Nordeste possuía 30 dos 50municípios com maior número de famílias abaixo da linha da pobreza.Sobre a metodologia utilizada, Anna explica o caminho adotado: “Nossaproposta foi adotar a metodologia de estudos da pobreza da Comissão Econômicapara a América Latina e o Caribe (Cepal) – com a qual estávamos trabalhandono Ipea –, que consistia em levantar o custo, por região, de uma cestabásica de alimentos necessária para satisfazer as necessidades calóricas e protéicasdas famílias e identificar quantas famíliastinham renda que permitisse adquiriressa cesta básica. As pessoas que viviam emfamílias com uma renda igual ou inferior aovalor da cesta básica de alimentos eram, então,incluídas no grupo das que passavamfome. Isso porque as famílias têm outrosgastos além da alimentação, como, porexemplo, moradia, transporte, saúde, educação,vestuário etc. Assim, a fome podia ser medida com base na falta de rendapara comprar os alimentos necessários a uma alimentação adequada. Dessa maneira,chegamos ao número de 32 milhões de pessoas que não tinham rendasuficiente para garantir sua alimentação”.Anna Peliano também destaca a reação interna que houve a “encomenda” deBetinho: “Quando Betinho pediu os dados por município, os estatísticos ficaramassustados com a dificuldade de fornecer as informações municipais com aUma atualização do Mapa da Fomeapontou que o Nordeste possuía 30 dos50 municípios com maior número defamílias abaixo da linha da pobreza


democracia se faz com participação | 75precisão a que estávamos acostumados no Ipea. Aliás, isso não era problema parao Betinho, que sempre dizia que não estava preocupado com o rigor dos dados.‘Esse é um dado de mobilização, uma informação para mexer com a sociedade.O aperfeiçoamento vem depois’, lembrava ele sempre que alguém cobrava maistempo para aprimorar a metodologia. Não tínhamos metade dos equipamentospara processamento de dados que temos atualmente. E com Betinho tudo erapara ontem!”.Para saber mais, acesse:www.ipea.gov.br


76 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Consea1 Os nomes das pessoasque compuseram o Conseaestão disponíveis em:.Ao assumir a Presidência da República em 1993, Itamar Franco afirmou que aerradicação da fome no Brasil seria uma questão prioritária em seu governo.No mesmo ano, em 26 de abril, foi criado pelo Decreto Presidencial nº 807 oConselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea). Presididopor d. Mauro Morelli, bispo de Duque de Caxias, município da Região Metropolitanado Rio de Janeiro, o Consea também era formado por oito ministrosde Estado e 21 representantes da sociedade civil. 1 Sua missão era realizar açõesde combate à miséria e à fome e cobrar do governo soluções estruturais. Ainstalação oficial do Consea foi em 13 de maio de 1993.Sobre a composição do primeiro Consea, Ivônio Barros, uma das pessoasenvolvidas na criação desse conselho, relata uma história pouco conhecida: “Emuma reunião no restaurante do Hotel Garvey, em Brasília, Betinho e Maria JoséJaime [diretora do Instituto de Estudos Socioeconômicos – Inesc, falecida em2007], que acabou se tornando a responsável pela coordenação logística da Açãoda Cidadania e pela direção do escritório central da Ação em Brasília, elaborarama lista dos membros do primeiro Consea. Consultaram as entidades e os movimentos,mas o resultado final foi muito próximo daquele que elaboraram”.Denise Paiva, então assessora de assuntos sociais da Presidência da República,revela o lado governamental dessa etapa inicial: “Na criação do Consea,duas novidades geraram inicialmente uma batalha jurídica na Casa Civil, queteve que ser arbitrada diretamente pelo presidente Itamar. A primeira foi o fatode os representantes da sociedade civil no Consea serem indicados numa listaencaminhada pelo Movimento pela Ética na Política, a partir de critérios quenós do governo desconhecíamos, mas respeitávamos incondicionalmente. Aoutra novidade é que a representação dos cidadãos era majoritariamente dasociedade civil”. Para Denise, essas novidades contribuíram para a efetividadedo Consea: “Os conselheiros se sentiam com autonomia e independência, enfim,legitimidade na representação. Eles tinham respaldo não só das entidades queintegravam, mas puderam superar os interesses corporativos, específicos, para


democracia se faz com participação | 77defesa dos interesses gerais da sociedade e, também, da nação brasileira. Nãoraro foram os momentos que a representação civil defendeu e ajudou a fortalecero papel do Estado nas políticas públicas de combate à fome, tal como adescentralização da merenda escolar, a distribuição de cestas básicas, a reformaagrária, só como exemplo. Outro aspecto é que, sendo a sociedade civil majoritária,ao superar o critério da paridade, superou-se, concomitantemente, opadrão de conflito, de disputa, de voto, pelo padrão da busca do consenso. Àsvezes, conselheiros do governo defenderam posições vindas da sociedade, e osda sociedade sustentaram as posições do governo. Foi um tempo onde belas eprofícuas lições ficaram na superação da histórica dicotomia Estado e sociedade,vigorando a ética da autenticidade”.Visões complementaresCom um modelo de articulação inédito e com atribuições nada modestas, oConsea é considerado um marco não apenas no combate à fome, mas tambémna participação cidadã. A predisposição do presidente Itamar Franco para queseu governo estivesse em sintonia com as forças políticas que mobilizavam asociedade naquele momento fez que diferentes iniciativas pudessem ser articuladaspara o combate à fome. Assim, sua origem está vinculada tanto ao Plano deCombate à Fome e à Miséria do governo federal como a uma proposta elaboradapelo governo paralelo do Partido dos Trabalhadores (PT), ambos amplamentereforçados pelo Movimento pela Ética na Política.Ivônio Barros, que também já foi do Ibase, relata: “A fragilidade política dogoverno que se instaurou acabou se transformando em sua força. A busca de novasalianças fez que o presidente Itamar aceitasse a sugestão de uma política de combateà fome que o então presidente do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, encaminhou-lhee também a indicação do Herbert de Souza, o Betinho, como um nome capazde coordenar essa luta”. Embora totalmente envolvido com o tema, Betinhonão vislumbrava uma participação oficial no governo. Na opinião de Ivônio,


78 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008“esse detalhe foi um marco fundamental”. Para ele, Betinho acabou sendo umgrande estrategista por articular um movimento social com uma proposta deenvolvimento do Estado. “O Consea nasceu de fato nessa conjunção”, garante.Nathalie Beghin apresenta sua visão: “O governo paralelo, uma iniciativa delideranças do PT, divulgou uma proposta de uma Política de Segurança Alimentare Nutricional. Tal proposta foi entregue, junto com representantes da Ação daCidadania, ao recém-empossado Itamar Franco. O presidente assumiu o cargo coma clara compreensão de que a estabilidade política e social necessitava que fossemincorporadas essas demandas nas políticas públicas. Para tanto, adotou a bandeirado combate à fome e promoveu um ambiente propício à instauração de uma experiênciade participação que se articulou em torno de diferentes instrumentos: oMapa da Fome (março de 1993); o Plano de Combate à Fome e à Miséria (abrilde 1993); o Conselho Nacional de Segurança Alimentar – Consea (abril de 1993);e a I Conferência Nacional de Segurança Alimentar – I CNSA (julho de 1994)”.Denise Paiva teve um papel estratégico nesse momento. Com Anna Peliano,Betinho e d. Mauro Morelli, foi autora do Plano de Combate à Fome e à Miséria:“Desde antes da instalação oficial do conselho em 13 de maio de 1993 até últimodia do governo Itamar, tive, por força do cargo e determinação do presidente, opapel de assegurar o cumprimento da prioridade social do seu governo que foio combate à fome. Portanto, coube-me participar e ajudar no fortalecimentocontínuo do Consea e de todas as construções gestadas por iniciativa ou emsinergia com esse conselho oriundas do governo ou da sociedade”. No relato deDenise, foi o atual presidente Lula que entregou a Itamar Franco o documentodo governo paralelo: “Esse documento, entregue ao presidente Itamar pelo Lulaem janeiro de 1993, continha a sugestão da criação do Consea”.Na opinião de André Spitz, dois movimentos simultâneos foram responsáveispela instauração do Consea. “Betinho foi ao presidente Itamar e apresentoua proposta de criação do Consea que havia sido elaborada pelo Instituto daCidadania e coordenada pelo Lula. Betinho disse ao Itamar que essa era umainiciativa com apoio do Movimento pela Ética na Política. O presidente Itamartopou e propôs que Betinho fosse o presidente do Consea, mas ele recusou por


democracia se faz com participação | 79questões de saúde. Betinho, então, indicou d. Mauro Morelli, que na época erauma das pessoas mais próximas a ele. Mas houve também um encontro doLula com o Itamar para sugerir a criação do Consea. Foram dois movimentosconectados, mas feitos de forma independente.”Assim como na Ação da Cidadania, André também ressalta que vários elementosforam decisivos para que o Consea fosse instalado naquele momento:“O presidente Itamar era uma pessoa bastante aberta a contribuições. Betinho ed. Mauro tinham o respaldo da sociedade civil. E Anna Peliano e Denise Paivaeram capazes de dar todo o apoio técnico necessário”.Plínio de Arruda Sampaio, um dos fundadores do Partido dos Trabalhadorese ex-deputado federal constituinte pelo Estado de São Paulo, tem também alembrança de dois movimentos: “Instalado o governo Itamar, o presidente foiprocurado por Lula que lhe entregou um plano de alimentação popular preparadopelo José Gomes da Silva. Em seguida, Itamar chamou Betinho para organizar oConsea. Isso possibilitou ampliar as atividades que estavam em marcha”.Renato Maluf, um dos pesquisadores mais experientes no tema da segurançaalimentar, participou da elaboração do documento em questão. “Tenho umenvolvimento técnico político com o sistema desde 1985, quando se reuniu o queconsidero o primeiro grupo do Brasilque se debruçou sobre uma propostade uma política de segurança alimentar.Participei de iniciativas nas basesdas prefeituras desde o fim dos anos 80na incorporação da questão alimentar eda segurança alimentar nos seus programas.Depois, participei da elaboração do documento do governo paralelo desegurança alimentar entregue ao presidente Itamar Franco.” Embora não tenhasido conselheiro do Consea, Renato participou de momentos anteriores significativos:“Participei da audiência do Lula com o Itamar franco, do primeirocontato com Betinho. Participei como palestrante da I CNSA, além de terajudado na sua organização e, depois, na sistematização”.Segundo André Spitz, do COEP, várioselementos foram decisivos para que oConsea fosse instalado naquele momento


80 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Mudanças nos paradigmasFlavio Valente, que foi assessor de d. Mauro Morelli, relata um momento singular:“Nunca me esqueço que a primeira sala ocupada pela presidência doConsea, no Palácio do Planalto, foi a sala que antes era ocupada pelo SNI[Serviço Nacional de Informação]. D. Mauro me disse, então, quando visita-Contribuição do IpeaCitada em vários depoimentos sobre a operacionalizaçãodo Consea, Anna Peliano explica comoocorreu sua participação: “Oficialmente, não haviauma instância governamental específica para acompanhare articular os trâmites do Consea nos ministérios.Como eu participava como conselheira e eradiretora do Ipea, acabei mobilizando a minha equipee assumimos informalmente a secretaria executivado Consea. Em todas as reuniões, apresentávamosum balanço do andamento das ações dogoverno e participávamos dos debates de aprimoramentodas políticas públicas relacionadas ao temada segurança alimentar e nutricional. Nunca foi instaladaoficialmente essa secretaria executiva, massim uma assessoria técnica a cargo do Ipea”.As dificuldades para lidar com algo tão inovadornão foram poucas. “A maior dificuldade era coordenartodas as iniciativas de todos os ministérios conformeprevisto no Plano Nacional de Combate àFome. Assim, o Consea definiu seis programasprioritários que eram mais direcionados ao combateà fome: alimentação e nutrição infantil; merendaescolar; alimentação do trabalhador; distribuiçãoemergencial de alimentos; reforma agrária; e geraçãode emprego e renda. Alguns técnicos da diretoriasocial − como Anna Lucia Lobato, Carlos AlbertoRamos, Enid Rocha, Guilherme Delgado,Nathalie Beghin e Ronaldo Coutinho Garcia − seenvolveram quase que exclusivamente no acompanhamentode cada uma dessas áreas de atuação”,relembra a coordenadora do Ipea.Segundo Anna, ela e sua equipe acompanhavamos programas, propunham melhorias e escreviamrelatórios sobre a execução das iniciativas. “Foramdois anos de intensa participação do Ipea nessa assessoriatécnica ao Consea”, afirma.


democracia se faz com participação | 81mos a sala pela primeira vez: ‘Somente o xixi de meninos e de meninas na ruapode limpar a sujeira desta sala’”.Para a assistente social Denise Paiva, que, antes de assessorar Itamar Franco,havia sido funcionária de carreira da Prefeitura de São Paulo, instâncias epolíticas como Consea, Ação da Cidadania, COEP, Política de Reforma Agráriae Lei Orgânica da Assistência Social “mudaram o paradigma da políticaNathalie Beghin também recorda o envolvimentodo Ipea com o Consea: “Tive o privilégio departicipar tanto do Consea como da Ação da Cidadania.No Conselho, fazia parte da equipe do Ipea,coordenada por Anna Peliano, então diretora daárea social do instituto, que auxiliou a Presidênciada República, primeiramente, a estruturar e instalaro Consea e, depois de sua criação, a assessorá-lo”.Apesar do entusiasmo, Nathalie também diz quedificuldades foram encontradas: “No fim de 1994,nossa equipe no Ipea realizou uma avaliação dessaexperiência. Segundo nossa reflexão, os principaisentraves encontrados ao exercício dessa parceria diziamrespeito: à ambigüidade e indefinição de papeldo Consea; à precária organização da sua forma defuncionamento; à indefinição das atribuições dosparceiros; à concentração dos esforços em atividades‘compensatórias’: não se utilizaram a mobilizaçãoda sociedade civil e a influência do Consea naação governamental, para a formulação de políticaspúblicas que gerassem mudanças estruturais quepermitissem reduzir a necessidade de políticas compensatórias;e, por fim, à ausência de um projetopolítico por parte das organizações da sociedade civilque desse sustentabilidade à proposta”.Apesar dessas considerações e de ter duradoapenas os dois anos do mandato de Itamar Franco,para Nathalie os avanços do Consea foram significativos.Segundo ela, possibilitaram a politização doproblema da fome; a mobilização da sociedade civil,que encontrou poucos antecedentes na história recente;a ampliação da participação cidadã na formulaçãoe no controle das políticas públicas; a criaçãode um espaço inédito para discutir a exclusão social;e a consolidação da “versão brasileira” da segurançaalimentar, que passou a incorporar, de forma inéditano mundo, a dimensão nutricional.


82 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008social brasileira incorporando-lhe a noção de direito e cidadania no seu maisamplo sentido”.Diretor adjunto de política social do Ipea em 1993, Ronaldo CoutinhoGarcia dá a idéia do que foi a criação do Consea: “Com o movimento desencadeadopela Ação da Cidadania, o Consea ajudou a inscrever o combate àfome e à miséria na agenda das políticas governamentais e dos atores sociaiscomprometidos com um Brasil mais justo e solidário”. Guilherme Delgado,também do Ipea, complementa: “O Consea foi uma forma visível da reação dasociedade contra o projeto ultraconservador e neoliberal do governo Collor. Aexperiência daquele Consea não se repetiu.Um conselho que tinha o Betinho no campoda sociedade, os representantes do PT, domovimento sindical, das igrejas. Tinha umaparte do governo que era mais civil que governamental,tinha tensões entre governo e sociedadecivil. Aquilo tudo era administradode forma meio improvisada. Tinha o ladobom e o lado ruim. O lado bom é que nãovisava a algo convencional, fossilizado, formalizado. O lado ruim é que isso nãoproduzia aquelas ações maciças, coletivas, de política pública que as pessoas, muitasvezes, esperam ou desejam. Mas, por outro lado, as ações políticas da políticasocial nesse período estavam ocorrendo na direção que o Consea perseguia, naação de governo, na política educacional, na política previdenciária, na políticaassistencial. O governo Itamar foi muito positivo no sentido de reconhecimentoe implementação de direitos sociais”.Ainda segundo Delgado, o Consea conseguiu principalmente fazer uma ligaçãocom outras ações no centro da política social que o governo Itamar vinha desenvolvendo.Como exemplos, ele cita “a questão da merenda escolar, que havia sido fortementecortada no governo Collor, e as ações emergenciais de combate à fome noNordeste, que se tornaram prioritárias na seca de 1993–1994. O Consea tambémentrou nas avaliações dos programas de alimentação e nutrição, o programa dePara Ronaldo Coutinho Garcia,o Consea ajudou a inscrever ocombate à fome na agenda daspolíticas governamentais


democracia se faz com participação | 83alimentação ao trabalhador etc. Foram muitas ações que, na conjuntura, tinhampeso e relação direta ou indireta com a campanha de combate à fome. Foi mais umpalco, no bom sentido, de expressão de demandas e de ações e convergência, numaépoca em que havia ocorrido certa desmobilização dos movimentos sociais”.Na mesma linha de raciocínio, Denise Paiva ressalta: “É preciso pontuar, porfim, que o governo Itamar implementou a ordem social prevista na Constituiçãode 1988, assegurando suas leis complementares e ordinárias, viabilizando, assim,políticas públicas no âmbito da saúde, assistência social, reforma agrária e previdência”.Ela ressalta: “Sob a égide e a mística do Consea, representação-síntese,criou-se, no país, tal clima de concórdia, sentimento de solidariedade, uniãonacional e credibilidade que deu as condições subjetivas para o lançamento demais um plano econômico. Por meio de mecanismos da democracia participativa,houve melhores condições de governabilidade que se traduziram em avançospolíticos, sociais e econômicos”.Tânia Bacelar, que foi conselheira do primeiro Consea e integrante da Superintendênciade Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), extinta em maio de 2001,afirma que o principal avanço, naquele momento, foi a politização da questão damiséria, um tabu para a sociedade brasileira. “Josué de Castro havia tentado, masa repercussão dessa vez foi maior. Tratar o tema no coração do governo federal foium grande avanço”, explica. Para Tânia, as dificuldades tinham a ver com a propostade articulação inovadora: “Especialmente por colocar agentes do governosob a coordenação de um fórum que não era só de governo, presidido, aliás,por alguém estranho aos quadros da burocracia ou da cena político-partidáriae egresso da sociedade”, diz referindo-se a d. Mauro Morelli. Sobre isso, Tâniaacrescenta: “Chamava a atenção a desenvoltura do d. Mauro para navegar emambientes que lhe eram estranhos. Coordenar personalidades convidadas diretamentepelo presidente da República e conseguir tirar encaminhamentos concretosera um desafio grande. Ele se saía bem. Nosso papel, especialmente dealguns conselheiros mais experientes, era apoiá-lo”.Ivônio complementa: “O Consea unia certo espírito informal de movimentosocial com as formalidades do poder. Denise Paiva, a assessora do Itamar Franco,


84 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008ajudava muito nesse processo de informalidade e mobilização dos órgãos governamentais,sempre em nome do presidente. Anna Peliano trazia a dignidade e aseriedade da pesquisa e dos números. Betinho era um grande agitador e d. MauroMorelli trazia a serenidade. Artistas e técnicos se juntavam, alguns políticosapoiavam, e as empresas públicas eram, pela primeira vez, chamadas a contribuirem um movimento cidadão. Algo diferente acontecia”. André Spitz segue a mesmalinha: “Havia grupos de trabalho no Consea coordenados por ex-exilados,como o Plínio de Arruda Sampaio, que chefiavam operações de entrega de alimentose que tinham militares sob sua ordem direta. Era um tempo de mudançade ordem que nos surpreendia e, ao mesmo tempo, nos deixava esperançosos”.


democracia se faz com participação | 85Entrevista especialDom Mauro MorelliD. Mauro Morelli é uma figura histórica na luta contra a fome e a pobreza nopaís. Na década de 1980, foi bispo de Duque de Caxias, município da BaixadaFluminense, Região Metropolitana do Rio de Janeiro, e liderou várias ações contrao descaso com crianças e adolescentes. “Essa coisa de dizer que criança quemorre vai virar anjinho é um absurdo”, ressalta.Também participou de lutas pela reforma agrária e teve uma atuação dedestaque no Movimento pela Ética na Política, que levou ao impeachment deFernando Collor de Mello. “O Movimento pela Ética aproveitou o momentopara dizer que a maior corrupção do Brasil, na verdade, era o modelo de desenvolvimentoque concentra renda. O absurdo era ser um grande produtor dealimentos e ter milhões de pessoas passando fome”, acredita.Nesta entrevista, d. Mauro fala de outra experiência igualmente importante nasua trajetória como defensor dos direitos humanos. Ele foi o primeiro presidentedo Consea, ainda em sua edição de 1993. “O Consea foi uma evolução fabulosa,e muitas coisas que estão presentes hoje, como a descentralização da merendaescolar, nasceram naquele momento que durou pouco mais de um ano”, avalia.


86 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Conte-nos sobre o início de seu envolvimentocom o Consea.Dom Mauro Morelli – Logo depois doimpeachment, eu estava num período maisrecluso. Estava na minha casa quando o Betinhome telefonou e disse: “D. Mauro, nós,do Movimento pela Ética na Política, estamosreunidos aqui em Brasília. O senhortem que vir para cá porque estamos fechandoum acordo com o Itamar [Franco, então presidenteda República] e eu não tenho condiçãofísica de circular semanalmente tantopor Brasília como pelo Brasil”. Então, convocadopelo Betinho, lá fui eu para Brasília.E o que o levou a aceitar a presidênciado Consea?Dom Mauro Morelli – Betinho insistiaque eu deveria assumir o Consea, mas, antesda minha resposta, o Itamar me disse: “Aqui,o regime é presidencialista. Se o senhor forsecretário, a linguagem é de segundo escalãoe não vai funcionar. O senhor tem que serpresidente do conselho”. Ele me honrou comessa confiança e me nomeou presidente doConsea, mas eu era tratado protocolarmentecomo ministro. Eu não estava subordinadoa nenhum ministro e havia um acordo deque um pedido meu de audiência seria agendadoem, no máximo, 24 horas. Foi umprivilégio viver algo tão original. Na minhacompreensão, ali nós atingimos umestágio avançado da democracia, em quenão apenas se elege um governante, mas sediscutem ações de governo, formulam-sepolíticas públicas e acompanha-se essa concretização.Não se trata apenas de delegar aum constituinte, mas de acompanhar e influirnas decisões tomadas.Quais foram as principais dificuldadesna presidência do Consea?Dom Mauro Morelli – Eu gastava muitodo meu tempo com três coisas: desfazerintrigas, tentar convencer os que tinham opoder na mão de que esse caminho precisavaser percorrido e, por último, tentarviabilizar as propostas do Consea. Paranão dar margem a essas intrigas, cheguei afazer um acordo com o Itamar. Eu disse:“Presidente, eu não recebo recado de ninguémem seu nome, com exceção de umministro que combinamos. Se o senhornão quiser, não puder falar comigo diretamente,peça ao ministro. Ninguém mais”.Além das intrigas, outras dificuldadeseram a burocracia, a mediocridade e os ciúmes.Gasta-se muita energia nisso.Tínhamos uma equipe enxuta, emboraeu reconheça que o presidente nos deu amplapossibilidade de locomoção pelo país.Outra maneira de conseguir realizar coisas


uma onda de cidadania | 87era o acesso às empresas e aos bancos quepodiam apoiar eventos ou ações emergenciais.Lembro, inclusive, que foi assim queconseguimos formar uma rede de solidariedadeàs vítimas da seca no Nordeste. Opróprio governo realizou, com toda a críticaque se possa fazer, uma ação emergencialno Nordeste na época da seca.Manter ministros participando das reuniõesdo Consea não era fácil, à exceção dedois ou três que eram muito fiéis. Mesmocom todo o apoio recebido diretamente daPresidência da República, era como se metadedos ministros gerasse miséria e fome,e a outra metade tentasse consertar. É algoesquizofrênico mesmo. O Estado brasileiroé – aprendi isso na Constituinte – constituídopara garantir cidadania a uma elite.Apenas 25% ou 30% são contemplados. Alei, o orçamento e a estrutura são para garantiros direitos apenas a essa faixa da população.O resto é resto. Aqui, a elite semprefoi acoplada ao poder e criou um Estadodo qual se serve até hoje.O que mais destacaria nessa experiênciado Consea?Dom Mauro Morelli – A generosidade dopovo diante de tudo o que aconteceu. Asiniciativas, a vontade de apontar caminhos.Foi um momento de reconciliação do povobrasileiro. Ninguém estava preocupado apenascom uma ideologia. Qualquer ser humano,por mais rico que seja, não resolve o seuproblema de alimentação sozinho. Não hánenhum rico que possa comprar o planetaTerra. Se a cadeia alimentar for desfeita,todos morrem. O rico pode construir umaredoma de vidro, com água e alimentos excelentes,e passar a vida prisioneiro da suariqueza. Mas isso não é viver. Todo ser humano,pobre ou rico, mulher ou homem,criança ou idoso, precisa da alimentaçãopara viver. Estamos ligados à nossa mãepelo seio, pelo cordão umbilical por ondepassa oxigenação, por onde passa tudo.Precisamos de ternura, do leite da mãe, doarroz e do feijão. É um processo permanente.Costumo dizer que o Consea é diferentede outros conselhos porque neletodo mundo está de acordo no básico: seeu não comer e não beber, eu morro. É umdireito e uma necessidade de todos.E como o Consea terminou?Dom Mauro Morelli – Infelizmente, percebi,com a eleição de Fernando HenriqueCardoso, que as forças da República nãolevariam à frente aquilo que estávamostrabalhando. Havia uma tensão no governo,e encaminhamentos que o própriopresidente Itamar determinava acabavam


88 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008não acontecendo. Ainda antes da possedo novo governo, tive uma audiência como Fernando Henrique, com seu vice, MarcoMaciel, e alguns parlamentares da composiçãodo governo. Expliquei que o Conseaera fruto de um acordo entre o presidenteda República e o Movimento pela Éticana Política. Caberia ao novo presidenterenovar ou não e aguardaríamos uma decisão.Não entregamos uma demissão coletivaporque o nosso mandato tinha duas basesde sustentação: a Presidência e o Movimentopela Ética. Fernando Henrique, então,pediu que continuássemos o trabalho edisse que, após a posse, nos chamaria. Masnunca chamou. Por decreto, ele acaboucom tudo o que estávamos trabalhando.Foi assim que se desfez o Consea.Até onde vai o papel da assistência socialno combate à fome?Dom Mauro Morelli – Não tenho nadacontra assistência social. Pelo contrário,acho que é necessária e tem seu lugar. OBrasil tem uma lei de assistência socialexcelente, uma conquista. O problema nãoé a aplicação da assistência social. Por exemplo,uma pessoa desempregada tambémtem direito a comer. Então, são necessáriasmedidas assistenciais. O erro é tratarcomo assistência social o que é um direito.O Bolsa Família é uma medida de assistênciasocial e está dentro do Ministériode Assistência Social. Essa é uma medidaque tem seu valor, seu tempo de aplicação.Mas o que queremos são políticas públicasque assegurem acesso à habitação, à educaçãoetc. Políticas que assegurem que aspessoas tenham casa e que essa casa tenhaprivacidade e salubridade.Para garantir os direitos da alimentaçãoe nutrição, é preciso orquestrar as açõesda família, da sociedade com todas as suasinstituições e dos governos em todos osníveis. Isso é fundamental. Quer dizer, umaorganização que trabalha pelo direito à alimentaçãoe nutrição e não aceita dialogarcom o governo não conseguirá nada. Semgoverno, não se faz nada. E o que nósqueremos não é caridade. Para nós, é umaquestão social de raiz econômica e decisãopolítica. A fome não pode ser tratadacomo caridade. Não é questão de assistênciasocial.E qual foi seu envolvimento na criaçãodo Consea/MG?Dom Mauro Morelli – Eu estava umpouco afastado, mas a coordenação do entãorecém-criado Fórum Brasileiro de SegurançaAlimentar e Nutricional (FBSAN)se reuniu no Rio de Janeiro e me fez ver


uma onda de cidadania | 89que estava em curso uma articulação. Assim,decidimos dialogar com os governadoresque haviam sido eleitos em 1998 eque tinham um discurso crítico à conduçãoeconômica do país, entre eles MárioCovas, do PSDB. Então, escrevi uma cartade três páginas a esses governadores. Achoque eram uns nove, entre eles: Itamar,Anthony Garotinho, Ronaldo Lessa, OlívioDutra, Zeca do PT e Jorge Viana. Acompanhadodo Chico Menezes, do InstitutoBrasileiro de Análises Sociais e Econômicas(Ibase) e do FBSAN, visitei os governadorese propus retomar o caminho daparceria entre governo e povo, retomar oConsea, mas em âmbito estadual. MárioCovas queria isso, mas, por conta da suasaúde frágil naquele momento, não conseguimoslevar adiante a idéia. O OlívioDutra, no Rio Grande do Sul, iniciou ummovimento para criar o Consea, mas nãovingou. No Ceará, disseram que seria muitodifícil acertar com a governadora, masela me recebeu já com a mensagem decriação do Consea a ser encaminhada àAssembléia Legislativa e já está aprovado.Conversei com o Garotinho, governadordo Rio de Janeiro na época, mas naverdade só foram criados os Conseas deMinas Gerais, Mato Grosso do Sul e Alagoas.E foi só em Minas Gerais que o legadodo Consea e da Ação da Cidadaniarendeu. Além do Consea/MG, tambémfoi criado o Fórum Mineiro de SegurançaAlimentar e Nutricional.E quais têm sido os resultados do Consea/MG?Dom Mauro Morelli – Mesmo não sendobispo em Minas, fui convidado pelo entãogovernador Itamar Franco a aceitar a presidênciadesse Consea estadual. Estou hánove anos em Minas e posso afirmar queexiste a consciência de que se chegou a umestágio a que nenhum outro estado brasileirochegou. Foi em Minas que surgiu aprimeira Lei de Segurança Alimentar.Sigo como presidente do Consea/MG,mesmo com as mudanças políticas no governoestadual. O Consea/MG tem orçamentoe eu tenho uma equipe com seistécnicos e outras pessoas. Temos tambémtoda uma estrutura de funcionamento: estamoscom 25 comissões no estado, temosuma coordenadoria no gabinete do governador,uma secretaria executiva. Temos fundamentose exigibilidade.Como o senhor avalia os demais Conseasestaduais?Dom Mauro Morelli – Muitas coisas foramcriadas, muitos conselhos, mas sem


90 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008condições. Dificilmente haverá no Brasil oque conquistamos em Minas. Não foi concessãoalguma. Sempre digo que o povoconquista as coisas. O governador não énem bom nem ruim. É governador. Eleadministra. O prefeito é a mesma coisa.Tenho essa compreensão. Acho que hojealguns dizem: “Vamos criar conselhos”.Acho que não. Criar um conselho agoranão vai sanar bem o problema.Como vê o Brasil diante da crise de alimentosno mundo?Dom Mauro Morelli – O Brasil é um paísque tem muita capacidade de produzir bastantealimento, mas não é para balança comercial.Na minha visão, enquanto alimentofor commodity ou mercadoria, vamos terfome no planeta e degradação ambiental.Estive em Cuba há algum tempo, emuma reunião mundial sobre a questão daalimentação, e fiquei impressionado. É oúnico país das Américas, além do Canadá,que tem uma política de nutrição, nem osEstados Unidos chegam perto de Cuba nosíndices de nutrição do povo. Vi criançascom a pele revelando saúde, brilho nosolhos, e ouvi perguntas inteligentes. É dissoque o Brasil precisa. Precisamos de umsímbolo, uma menina, um menino brasileiro,aos 7 anos com tal estatura, saúde,vigor e perguntas inteligentes. Se a criançanão se desenvolve corretamente, seusneurônios ficam bloqueados. O que elavai fazer na escola?Como vê atualmente a questão da segurançaalimentar no Brasil?Dom Mauro Morelli – O quadro nutricionaldo Brasil era tão ruim, tão escandaloso,mas melhorou muito. Ainda assim,continua péssimo. Temos que ter essa vontadede transformação do país. Josué deCastro foi um profeta insuperável. Ninguémcomo ele, que era médico e geógrafoe um ser humano muito político, fez tãobem uma denúncia para a humanidade.Ele apontou qual o problema, sua gênese,e também apontou os caminhos de superação.Josué de Castro impressionou omundo, Betinho tem seu lugar na história,ele tocou as pessoas. O Lula, independentementede seu governo, tem omérito de ter recolocado, na agenda políticanacional e internacional, a fome comouma questão fundamental para a humanidade.Lula é um homem que tem fomee sede de justiça. Ele não é o melhor, masé um homem que viveu a injustiça e sentiua violência da migração.Uma sociedade democrática é uma sociedadecomprometida com as diferenças.


uma onda de cidadania | 91Ela se organiza em função disso e elaamanhece todo dia, determinada a nãoaceitar as desigualdades. É uma sociedadeque combate estrutural, política e diariamentea injustiça social. Essa era agrande questão do Movimento pela Éticana Política e que continua tão atual: organizaruma sociedade que tenha valorespreciosos, uma sociedade que não exclui,que preserva as fontes de vida, que valorizaas diferenças. Aliás, muitas pessoas se confundem,mas a diferença é uma benção. Adesigualdade é que é horrível. Creio quenós ainda não tivemos no Brasil a ousadia,a coragem, a força política de agircomo uma sociedade democrática deveriaagir. Tivemos condição de dar um passocorajoso, mas ainda temos um longo caminhopela frente.


92 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008COEPEm maio de 1993, um encontro no Fórum de Ciência e Cultura da UniversidadeFederal do Rio de Janeiro (<strong>UFRJ</strong>), na Urca, no Rio de Janeiro, reuniu dirigentesde organizações estatais para discutir o papel dessas empresas no combate àfome e à miséria. A iniciativa partiu do sociólogo Betinho, de Luiz Pinguelli,professor da Coppe/<strong>UFRJ</strong> e então presidente do Fórum, e de André Spitz,engenheiro de Furnas. Foi o primeiro passo para a criação do Comitê de EntidadesPúblicas no Combate à Fome e pela Vida, na época o nome do COEP.Nessa primeira reunião, ainda segundo Spitz, Betinho fez uma fala belíssimasobre os dados do Mapa da Fome e sobre a mobilização da sociedadecivil no combate à fome. “Ao final, ele fez um desafio e disse algo como: nós dasociedade civil já estamos organizados egostaríamos que as empresas também seengajassem nisso. O presidente de Furnasnaquela época, Marcelo Siqueira, era muitoligado ao presidente Itamar. Ele foi para areunião ciente de que nosso propósito erasair dessa reunião com um grupo de empresasestatais atuante na Ação da Cidadania.Seu papel foi fundamental para darcontinuidade a nossa proposta. Logo depois da fala do Betinho, Marcelo Siqueirapropôs a criação de um comitê das estatais e convidou Betinho para sero coordenador. Betinho aceitou, mas colocou como condição que eu fosse osecretário executivo.”“O envolvimento das empresas estatais surgiu muito pela iniciativa do AndréSpitz. Fizemos a reunião procurando envolver o governo Itamar nesse debate.Foi impressionante o número de presidentes de estatais e órgãos de governosque compareceram”, relembra Pinguelli. O professor da <strong>UFRJ</strong> complementa:“Acabei me afastando do dia-a-dia, mas mantenho um vínculo. Na Coppe,temos a sede COEP”.Um encontro no Fórum de Ciênciae Cultura da <strong>UFRJ</strong> reuniu dirigentesde organizações estatais paradiscutir o combate à fome


democracia se faz com participação | 93Mas as condições que propiciaram a realização dessa reunião foram estabelecidasbem antes e são reveladas também por André Spitz: “Eu já estava envolvidocom a Ação da Cidadania e fui conversar com o Pinguelli sobre a possibilidade dejuntar a mobilização que tínhamos no âmbito do Fórum de Ciência e Culturacom a discussão sobre a Ação da Cidadania. O eixo seria o papel público dasorganizações estatais, o tema que já discutíamos desde a Constituinte. A Açãoda Cidadania seria uma grande oportunidade para fortalecer esse debate. Então,eu e Pinguelli fomos à casa de Betinho e levamos a idéia de organizar as estatais,com as quais já tínhamos o diálogo no Fórum de Ciência e Cultura, para quedesenvolvessem iniciativas de combate à fome e à miséria. Depois, fiquei responsávelpor redigir uma carta que seria assinada por Betinho e Pinguelli eenviada aos presidentes das estatais recém-empossados pelo presidente ItamarFranco para uma reunião no Fórum de Ciência e Cultura”.A oportunidade de estabelecer essa parceria entre o Fórum de Ciência eCultura e a Ação da Cidadania não foi um mero acaso. Segundo André, nesseperíodo, o setor de energia vivia uma enorme crise. “Com o professor Pinguellià frente do Fórum de Ciência e Cultura da <strong>UFRJ</strong>, havia um grupo que dialogavasobre essa crise e que reunia pessoas de universidades, empresas e da sociedadecivil em geral. Tínhamos uma rotina de encontros com empresas de energiado setor elétrico e também do setor petrolífero. O modelo energético brasileiroentrou em crise e muitas empresas não cobriam nem suas despesas de funcionamento.Esse espaço do Fórum sempre foi muito importante para o diálogoentre atores tão diversos”, afirma.Segundo Luiz Pinguelli, esse momento só foi possível porque já havia umarelação entre ele, Betinho e André Spitz: “A origem de tudo isso está na resistênciaà ditadura militar e nos primeiros passos da redemocratização do país.Está também em momentos como o Movimento pela Ética na Política e aCampanha contra a Fome”. André complementa: “Em meados da década de80, eu e Pinguelli freqüentávamos reuniões de conjuntura no Ibase, recémcriadopor Betinho, Carlos Afonso e Marcos Arruda, após voltarem do exílio”.Com o fim do regime militar, a discussão sobre o papel do Estado fazia parte da


94 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008agenda pública, e o debate estatização versus privatização era dos mais comuns:“Começamos, então, uma proposta de terceira via: o conceito de empresa públicaem vez de empresa estatal. Iniciamos um debate no Ibase voltado à Constituintee fizemos diversas propostas de emenda à Constituição sobre como transformaras entidades estatais em entidades públicas. O deputado Miro Teixeira encaminhoumuitas de nossas propostas como emendas durante a Constituinte de1988”, explica André.D. Mauro Morelli, assim como Betinho, Pinguelli e André, teve forte participaçãonesse início do COEP e, até hoje, continua como membro de seu conselhodeliberativo. Para ele, a criação do COEP precisa ser vista dentro de umcontexto histórico: “Vivemos, em 1993 e 1994, um momento decisivo na históriada democracia do país. Assim como a ditadura militar teve uma linha divisóriaem 1968, toda a luta pela democracia viveu um momento sério, generoso, incrívelnesses anos da década de 90. Nesse movimento, surgiu o COEP, numa reuniãode presidentes de empresas públicas dentro de uma universidade”.Chamado éticoPaulo Buss, na época vice-presidente da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz),uma das entidades que participam do COEP desde o início, relembra: “Acompanheio então presidente da Fiocruz, Carlos Morel, à reunião do Fórum deCiência e Cultura. Lá, um grande contingente de megaempresas públicas, comoa Petrobras e outras gigantes, e outras não tão megas assim, como a Fiocruz, nãoresistiram à potência do discurso de Betinho contra a fome e pelo enfrentamentoda pobreza. Aderi na hora e me propus a representar a Fiocruz, o quefoi imediatamente aceito por Morel e pelos demais dirigentes da instituição.Assim, acabei na composição do COEP Nacional.Para Murilo Flores, presidente da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária(Embrapa) na década de 1990, que também participou da mesma reunião, opaís vivia um momento de intensa busca para superar as razões de seu atraso,


democracia se faz com participação | 95de sua alta concentração de renda e exclusão social, o que também teria facilitadodespertar nas pessoas uma ação que fosse além de sua prática rotineira detrabalho. “Figuras como Herbert de Souza, o Betinho, e d. Mauro Morellitinham um apelo carismático para criar essa predisposição”, complementa.O ex-presidente da Embrapa acreditaque, com o surgimento do COEP,as organizações e, também, as pessoasque delas faziam parte saíram de umaposição de desinteresse, “fazendocom que a indignação fosse transformadaem disposição para a luta embenefício da solidariedade”. Murilo também destaca como resultado do COEPo estímulo à troca de experiências e à criatividade na organização de projetosvoltados a comunidades excluídas.Presidente da Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (Chesf ) na décadade 1990, Julio Sergio Moreira revela o mesmo sentimento: “Naquele momentovivia-se, no Brasil, o despertar de uma consciência que levava a sociedade a umsentimento de indignação com relação à exclusão social e, particularmente,àquilo que foi eleito como símbolo da exclusão social: a fome. A fome dos excluídos”.Ele também acredita que a realização do Natal sem Fome e a criaçãodo Consea foram estímulos fundamentais. “Esses fatos me motivaram a participarde um movimento formado por dirigentes de instituições públicas quefundaram o COEP”.Julio Sergio Moreira também chama a atenção para o ineditismo daquelemomento: “Naquela época, não existia o termo ‘responsabilidade social’. Elenasceu anos depois, despertando, nas corporações estatais, a necessidade de iralém de suas obrigações legais, técnicas. O COEP aproveitou o ambiente favorávelpara organizar o voluntariado que surgia naquela época, sob a liderança deBetinho. Destaco duas pessoas que também foram fundamentais e comprometidascom o desenvolvimento do nosso país: d. Mauro Morelli, que significava aindignação da Igreja, e Luiz Pinguelli Rosa, que representava a comunidadeJulio Sergio Moreira chama a atenção para oineditismo daquele momento: “Naquela época,não existia o termo ‘responsabilidade social’”


96 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008acadêmica. Essas três pessoas foram fundamentais para a criação do COEP”.Moreira também destaca momentos afetivos: “Não posso deixar de ressaltar oprivilégio de ter convivido com Betinho alguns anos, de ter sido liderado porele, que era um exemplo de solidariedade e um grande ativista dos direitoshumanos no Brasil. Foi notável essa oportunidade de conhecê-lo e compartilharcom ele sonhos e desafios”.Plano de açãoCom a adesão de 33 instituições, em agosto de 1993 foi formalizada a criaçãodo COEP. A proposta era atuar na erradicação da fome, da miséria e da exclusãosocial no país, indo além das doações de alimentos e apoiando projetos quecriavam oportunidades de trabalho. Uma das primeiras atividades do COEP,segundo André, foi uma reunião dos representantes técnicos das organizações,todos indicados pelos presidentes das estatais que aderiram à iniciativa. “Elaboramosuma agenda de possibilidades e pedimos que cada empresa fizesse umplano de ação. Queríamos saber o que aquelas empresas públicas – e não apenasestatais – poderiam fazer para combater a fome e a miséria tanto no âmbito dasua atividade-fim como em suas práticas administrativas. O COEP era o espaçode articulação para viabilizar esses planos, incentivando inclusive a ação conjuntadas empresas.”Exemplo dessa estratégia vem do depoimento de Paulo Buss: “O COEPcriou uma nova cultura entre os dirigentes e funcionários das empresas públicasque dele participaram, que foi o compromisso social, para além das fronteirasrestritas dos objetivos próprios de cada empresa”. Segundo Paulo, na Fiocruz,esse compromisso social foi com a comunidade de Manguinhos, que inclui 11favelas extremamente pobres nos arredores da fundação, e acabou levando àcriação da Cooperativa de Trabalhadores Autônomos da Região de Manguinhos(Cootram). Em 1994, a Cootram substituiu empresas privadas na prestação deserviços de limpeza, jardinagem e outras atividades necessárias para o funcio-


democracia se faz com participação | 97namento da Fiocruz. A cooperativa chegou a empregar mais de 1.080 pessoas,injetando, mensalmente, mais de R$ 1 milhão naquela comunidade paupérrima –um dos menores Índices de Desenvolvimento Humano (IDHs) da cidade atéa atualidade.Lécio Lima, do Banco do Brasil, também afirma: “A Cootram foi a primeiraarticulação feita pelo COEP que uniu várias entidades, marcando o que seriauma maneira própria de atuação. Foi a primeira vez que conseguimos juntarvárias entidades para executar um projeto: Banco do Brasil, Fundação do Bancodo Brasil, Finep e Fundação Oswaldo Cruz” .Apesar dos elogios e incentivos recebidos pela Cootram, Paulo Buss afirmaque também houve reações contrárias, por exemplo, das federações e associaçõesde empresas dessas áreas que prestavam serviços a órgãos públicos. “Entraram najustiça contra a Fiocruz. Fizemos amplos arrazoados explicando todo o processo.Mobilizamos a dona Ruth Cardoso, então primeira-dama, para nos ajudar – eela foi dez nesse sentido –, e o Betinho ‘botou a boca no trombone’. Os primeirosexames dos tribunais que examinam as contas públicas foram, ao menos, neutrosem relação à extraordinária iniciativa”.Doze anos depois, o resultado da açãojudicial determinou que a Fiocruzencerrasse o contrato com a cooperativa.Segundo Paulo, foi possívelapenas garantir que as empresas quea substituíram contratassem todasas pessoas residentes na região e que,antes, compunham a cooperativa.Outra iniciativa articulada pelo COEP e que também envolveu a Fiocruzfoi a criação do Canal Saúde, um programa educativo em saúde, veiculadodiariamente, de graça, pelo chamado Canal Executivo da Embratel, então entidadepública. Segundo Paulo Buss, o projeto fez tanto sucesso que, atualmente,o Canal Saúde é parte fundamental da estrutura da Fiocruz e do Sistema Únicode Saúde do país.Outra iniciativa articulada pelo COEP e quetambém envolveu a Fiocruz foi a criação doCanal Saúde, um programa educativo emsaúde, veiculado diariamente, de graça


98 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Articulações e parceriasAnna Peliano explica como o COEP e o Ipea se aproximaram,formando uma parceria que permanece atéos dias atuais: “Nossa relação com o COEP se davapela possibilidade que tínhamos, com a assessoria dopresidente Itamar, de cobrar o engajamento das estataispor conta da articulação que fazíamos com os ministérios.Por outro lado, a própria instituição Ipea se incorporouà rede do COEP desde o primeiro momento.Mas, na minha visão, esse movimento das estatais estevesempre mais ligado à Ação da Cidadania. Havia oenvolvimento institucional, mas havia, sobretudo, e demaneira muito forte, o engajamento pessoal dos funcionáriosdas empresas estatais. Como cidadãos, sentiam-semobilizados pela Ação da Cidadania e, como funcionários,podiam ser respaldados pelo envolvimento da suaempresa. Como os personagens eram praticamente osmesmos no Consea, no COEP e na Ação da Cidadania,tudo funcionava de forma mais ou menos integrada”.Pesquisadora do Ipea quando o COEP foi criado,Nathalie Beghin também comenta a relação próximaque sempre houve entre as duas instâncias. Segundo ela,os diagnósticos e pesquisas sobre as condições de vida dapopulação brasileira elaborados pelo Ipea contribuírampara estimular, no âmbito do COEP, o debate, a reflexãoe o envolvimento de todos no encaminhamento de medidasnecessárias para melhorar o nível geral de bem-estar.Nathalie ressalta que o Ipea também colaborou na divulgaçãode iniciativas do COEP: “Merece destaque apublicação, realizada no fim dos anos 90, com o InstitutoBrasileiro de Administração Municipal (Ibam) e o ComunidadeSolidária, sobre experiências inovadoras decombate à fome e à miséria implementadas por entidadespertencentes ao Comitê, nas áreas de geração de empregoe renda, desenvolvimento rural, educação e assistênciasocial, entre outras. A divulgação das ações do COEP étambém uma maneira de multiplicar essas iniciativas,contribuindo, assim, para aliviar os graves problemas daexclusão social”.Gleyse Peiter ressalta também a maneira integradacomo o COEP se relacionava com o Consea: “Aspropostas surgiam nas reuniões de grupos de trabalhodo COEP e eram, depois de discutidas e aperfeiçoadas,levadas ao Consea. Não raro, viravam resoluções doConsea e voltavam para as empresas estatais comorientação de ser implantadas. Assim como o COEP,o Consea também era um espaço de articulação entregoverno e sociedade”. André Spitz complementa: “OCOEP conseguia articular muito bem diferentes instâncias.Se era para mobilizar pessoas, nós do COEParticulávamos com a Ação da Cidadania. Se era paramobilizar empresas, especialmente as públicas, articulávamoscom o Consea. A articulação entre Betinho,d. Mauro e eu era muito sintonizada”.Para Luiz Pinguelli, “essa capacidade de articulaçãovem da maneira como o COEP atua. O COEP


democracia se faz com participação | 99Mais resultadosfunciona bem porque funciona ‘porbaixo’, pessoas que dão parte do seutempo e do seu entusiasmo paraque ele funcione integrando diversasatividades. Mas por cima não éa mesma coisa: há uma falta deintegração dessas atividades no âmbitode governo”. Para Pinguelli, oCOEP precisa “consolidar-se, pormais que essa seja uma tarefa jábem iniciada, e também encontrarcaminhos para o futuro. Não podemosnos satisfazer com o que jáestá feito. É preciso virar o jogo emelhorar a condição econômicadas pessoas para que tenham umavida melhor”.Para Gleyse, outro tipo de parceriatem marcado essa trajetória:“O COEP proporcionou o encontrodo lado institucional, porconta da sua relação com a empresa,com o lado cidadão das pessoas.Os funcionários não se sentemapenas empregados, mas sim estimuladosa exercer sua cidadania ea mudar sua empresa e, também,o país”.Outro que participou do COEPdesde o seu início foi Alcir Calliari,do Banco do Brasil. Ele apontatrês outros tipos de resultados daatuação do COEP: a criação deuma consciência nacional a respeitoda responsabilidade social daspessoas e das empresas; a criaçãodo balanço social que comprometeas empresas com ações efetivasde combate à fome e à miséria; ea permanência dos esforços dandocontinuidade ao processo. AlcirCalliari relembra: “A criação doCOEP era imprescindível paraque se pudesse coordenar e integrartodos os esforços necessáriosà transformação da sociedade brasileirana busca de solução para umproblema que não pode ser só dosgovernos, mas sim de todos os brasileiros.Impossível ficar insensívela tão grave e vergonhosa situação.Pela primeira vez, senti que erapossível realizar alguma coisa globale concreta. Sair do discurso fácile se incorporar no mutirão”.Para o ex-presidente da Chesf,Julio Sergio Moreira, os resultados


100 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008do COEP podem ser divididos em três grupos: “O primeiro resultado foi tercolocado em pauta a questão da fome, da exclusão social. Reforçar uma agendaque era urgente. Nós não poderíamos conviver mais com a exclusão social quelevava fome a milhões de brasileiros. O segundo resultado foi o engajamentodas pessoas, dos dirigentes públicos e do corpo de funcionários das estatais. Oterceiro foi um despertar de uma consciência de que justiça social nas empresasnão é feita apenas em relação aos seus funcionários, e sim baseada na perspectivade relação entre a sociedade e o seu meio”.Julio Moreira relembra iniciativas quese destacam nesses 15 anos: “Com o COEP,articulamos e formulamos, na Chesf, doisprogramas muito bem-sucedidos naquelemomento”. Um deles foi a utilização dosterrenos localizados na área de influênciadas linhas de transmissão pelas pessoas debaixa renda. “Com esse programa quebramosvários paradigmas, o que nos levou a uma reflexão cujo principal comandantefoi o engenheiro João Paulo Maranhão Aguiar. Ele, que tinha uma nítida vocaçãoem liderar causas sociais das mais nobres, conseguiu nos convencer deque era melhor fazermos um acordo e dar uma destinação apropriada àquelasáreas, particularmente no perímetro urbano onde se concentrava a pobreza e omaior risco de invasão dos terrenos situados abaixo dessas linhas de transmissão.Nós cedemos essas áreas para o plantio de alimentos pela população maiscarente. Fizemos isso assistindo as pessoas”, recorda. Outra iniciativa citadapor Moreira é o programa Xingó: “O COEP, por sua capacidade de articulaçãointerinstitucional, foi fundamental para o programa”.Sergio Riede, do Banco do Brasil, acredita que o COEP é um instrumentoe um espaço de mobilização, de conscientização, de disseminação da cultura decompromisso com as causas sociais: “Foi e é, também, sinônimo de troca de experiênciasconcretas, materializou a oportunidade de atuação em rede, de complementaridadede ações. Participar do COEP tem sido uma oportunidadeSergio Riede, do Banco do Brasil, acreditaque o COEP foi e é, também, sinônimo detroca de experiências concretas


democracia se faz com participação | 101para as empresas acelerarem a busca de maturidade social, complemento indispensávelàs preocupações de natureza econômica”. Para Riede, “o COEP é umadas mais exitosas iniciativas de mobilização social que nosso país conheceu.Sua grande contribuição é o incentivo à atuação em rede, ao protagonismoamplo e irrestrito, permitindo a cada cidadão brasileiro a possibilidade de engajamentoconsciente e crítico, como verdadeiro ator da história de seu tempo, semtutelas nem amarras”.Conceição Contin, que participa do COEP desde 1995 e integrante da equipeque criou o então primeiro COEP estadual, no Paraná, aponta conquistas emdiferentes esferas de ação do COEP: “Entre os avanços gerados, destaca-se acapacidade do COEP Nacional de integrar pessoas, projetos e avanços tecnológicosna área social. Essa integração, por sua vez, gera conhecimento e inovação,garantindo a sustentação do trabalho desenvolvido e a intervenção social. Enquantorede, o COEP estabelece um vínculo com as organizações que a integram,como opção voluntária, que independe da missão institucional e de suaposição no estado ou município. Buscando diferenciar-se da filantropia tradicional,a filosofia de ação do COEP busca vincular a ação solidária à construção dacidadania ativa, desenvolvendo mecanismos de inclusão social. As ações são denatureza variada, podendo ser categorizadas genericamente como estruturais eemergenciais. As estruturais visam atingir as causas da pobreza e da miséria, pormeio de projetos na área educacional, promoção da saúde, geração de emprego erenda, cooperativismo, segurança alimentar e nutricional, meio ambiente, entreoutras. As ações emergenciais, conhecidas como ações de grandeza, têm caráterde auxílio à população excluída, como a arrecadação e distribuição de alimentose atividades voluntárias de assistência em geral, em situações sazonais. Na relaçãocom a sociedade, iniciativas de mobilização ajudam na sensibilização para a capitalizaçãode novas oportunidades. No trabalho comunitário, a melhoria da condiçãode vida da população local tem mostrado que é possível mobilizar o podertransformador das pessoas para que sejam geradoras de mudanças, induzidaspelas noções de fazer, trocar, aprender e somar. O formato do projeto de intervençãocomunitária do COEP, baseado nos Oito Objetivos de Desenvolvimento


102 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008do Milênio, definidos pela Organização das Nações Unidas, em 2000, refletindoa preocupação com a sustentabilidade do planeta e os graves problemas queafetam a humanidade, constitui-se, também, em um grande avanço”.Francisco Menezes, diretor do Ibase e ex-presidente do Consea, tambémacompanha a trajetória do COEP há bastante tempo: “É difícil pensar o Brasilde hoje dentro de seus aspectos mais felizes e mais promissores deixando defora uma experiência como o COEP. Vindo da iniciativa de funcionários deempresas públicas e também privadas, o COEP tem possibilitado a continuidadede se repensar o Brasil, como Betinho e tantos outros insistiam”. Menezestambém participou da Ação da Cidadania e é um dos fundadores do FórumBrasileiro de Segurança Alimentar e Nutricional (FBSAN). Ele complementa:“O que me impressiona é que, ao contrário de perder seu motivo de existência,tão ligado à Ação da Cidadania, o COEP tem mostrado uma capacidade de serecriar a cada momento. O COEP é tão absolutamente atual no Brasil de 2008,tão diferente do país da década de 90, quanto foi no momento de sua criação.É uma grande inspiração para muitas organizações, além de ser um grandeparceiro no Consea”.I Conferência Nacional de Segurança AlimentarCoordenada pelo Consea, a I Conferência Nacional de Segurança Alimentar(CNSA) foi realizada de 27 a 30 de julho de 1994, em Brasília. Segundo o relatóriodo evento, a conferência reuniu 1.800 mil delegados(as) representantes de estadose municípios, convidados(as) e estudiosos(as) das causas da fome e da misériae produziu dois documentos: um programático, com as condições e requisitospara uma política nacional de segurança alimentar, e uma declaração política.No documento voltado para a construção de uma política nacional de segurançaalimentar, foram apontadas as seguintes diretrizes: ampliar as condições de acessoà alimentação e reduzir seu peso no orçamento familiar; assegurar saúde, nutriçãoe alimentação a grupos populacionais determinados; e assegurar a qualidade


democracia se faz com participação | 103COEP 2008Atualmente, o COEP – cuja significado passou a serRede Nacional de Mobilização Social – age como umarede que reúne comunidades, organizações e pessoas.São cerca de 1.100 organizações, entre públicas e privadas(universidades, empresas, órgãos governamentais,entidades de classe e organizações não-governamentais,entre outras), mais de cem comunidades em todos osestados brasileiros e mais de 5.700 indivíduos. Suamissão é contribuir para o desenvolvimento, em todoo país, de iniciativas de combate à fome e à miséria ede promoção da cidadania. Para cumpri-la, o COEPmobiliza organizações e pessoas, articula parcerias,incentiva a prática de projetos, capacita para atuaçãona área social e divulga conhecimentos e ações concretasnessa área.Seus objetivos são: contribuir para a erradicaçãoda fome, redução da pobreza e das desigualdades sociais;fortalecer o protagonismo, a participação e acapacidade de ação das organizações, das pessoas e dascomunidades; estabelecer processos participativos deconstrução da cidadania; fortalecer o diálogo públicoentre comunidades de baixa renda, empresas, organizaçõesdo terceiro setor, formadores(as) de opinião,formuladores(as) de políticas públicas, órgãos de fomentoe desenvolvimento, organizações governamentais,mídia e sociedade civil.Por meio de estratégias de mobilização e de articulaçãode parcerias entre suas associadas e outrosparceiros, o COEP desenvolve projetos de desenvolvimentocomunitário no Distrito Federal e em todosos estados do país. Exemplos de iniciativas desenvolvidaspelo COEP serão relatados mais adiante, nas páginas262 a 427.Para saber mais sobre o COEP, acesse.biológica, sanitária, nutricional e tecnológica dos alimentos e seu aproveitamento,estimulando práticas alimentares e estilo de vida saudáveis.Um dos articuladores da I CNSA foi d. Mauro Morelli, pois, além de seuenvolvimento histórico com o tema, ele era o presidente do Consea: “Estiveem todo o país, com exceção de Rondônia e Roraima, acompanhando encontros,conferências regionais, congressos, seminários de todo o tipo. Tivemos1.800 delegados. Na abertura, havia cerca de 2.200 pessoas na Universidade de


104 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Brasília”. Segundo d. Mauro, realizar o encontro foi um grande desafio: “Trêsdias antes, eu não sabia como é que íamos pagar os custos de alimentação daqueleencontro. Houve muita pressão do governo, não do presidente Itamar,para suspender aquele encontro”. Apesar dos entraves, os dados positivos tambémsão lembrados: “Vivi algumas coisas memoráveis, por exemplo, participar emWashington, capital dos Estados Unidos, da grande marcha liderada por MartinLuther King e também da grande manifestação realizada no ABC paulista com100 mil mulheres e homens trabalhadores,com flores na mão e crianças no colo. Masa I CNSA foi muito especial”.Ainda sobre a conferência, d. Mauroafirma: “O que havia de mais aguerrido noBrasil estava naquele auditório: um pessoalmilitante, brigão pelas questões que importavamà cidadania, ao meio ambiente, à justiça social, à questão indígena, à questãodo povo negro. Ainda assim, Itamar Franco foi recebido com o maior respeito,mesmo vindo de um governo tão polêmico e em uma situação tão complexa.Um momento muito bonito, muito especial para a democracia”.Gleyse Peiter, do COEP, ressalta mais uma vez a integração entre as instâncias:“O Consea organizou a I CNSA e teve um grande apoio do COEP. Mobilizamosvárias associadas a fim de obter os recursos financeiros para realizar a conferência.Também preparamos um documento sobre o tema da segurança alimentarque foi totalmente absorvido pelo relatório final da conferência”.Tânia Bacelar, que também participou da I CNSA, aponta novamente parauma inovação: “A conferência deu mais legitimidade à ação que vinha sendoconstruída. Gerou novas propostas. Manteve o tema na agenda prioritária para aação das políticas públicas. A articulação de entes tão diferentes era um desafio”.Silvio Caccia Bava, diretor do Instituto Pólis, complementa: “A I CNSA foi aexpressão de que os movimentos sociais e a mobilização da cidadania encontravameco nas instituições e no governo, que passou a tratar a segurança alimentarcomo um direito”. Para Ronaldo Coutinho Garcia, “a conferência logrou fazerPara Tânia Bacelar, a I CNSA deu maislegitimidade à ação que vinha sendoconstruída e gerou novas propostas


democracia se faz com participação | 105do combate à fome uma preocupação e um movimento nacionais. Permitiu quea idéia não morresse e fosse retomada com o governo Lula”.Renato Maluf destaca a concretização da conferência como seu grande resultado:“Foi algo absolutamente novo. O mais próximo disso tinha sido em 1986,numa subconferência da Conferência Nacional de Saúde. O pessoal de alimentaçãoe nutrição fez uma sub-reunião, mas em nada comparada com o que se conseguiuem 1994: a mobilização de milhares de pessoas no Brasil todo e, depois,terminando com aquele evento maravilhoso em Brasília”. E complementa:“Outro fato a destacar como resultado dessa conferência, e também do próprioConsea, foi a organização de um grupo para participar da Cúpula Mundial daAlimentação, em Roma, em 1996. Além da delegação governamental, houveoutra da sociedade civil. Considero que isso ocorreu graças à articulação geradapela I CNSA”. Renato refere-se ao grupo que, posteriormente, fundaria o FórumBrasileiro de Segurança Alimentar e Nutricional (FBSAN), em 1998.Plínio de Arruda Sampaio também participou da I CNSA. Segundo o exdeputadofederal pelo Partido dos Trabalhadores em São Paulo, o maior resultadonaquele momento foi a própria realização da conferência. “Foi um marco inicialde uma preocupação que, a partir dela, se tornou permanente, mobilizando entidadesde todo o país na busca de soluções para o problema”, acrescenta.Natal sem FomeNo Natal de 1994, foram arrecadadas 600 toneladas de alimentos, dandoorigem a uma subcampanha da Ação: o Natal sem Fome. Com um discursoque afirmava que essa seria a melhor época para se praticar a solidariedade,a campanha incitava a sociedade a doar comida para as famílias ebrinquedo para as crianças. O Natal sem Fome teve também a participaçãoda classe artística em shows realizados por todo o país. Com oslogan “Quem tem fome tem pressa”, o Natal sem Fome se tornou umsímbolo nacional da luta contra a miséria.


106 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Getúlio Brunes, da Embrapa de Goiânia, foi um dos seus primeiros colaboradores:“Com Betinho, aprendi que o Natal sem Fome não era apenas paraarrecadar alimentos. Seu objetivo maior era colocar em pauta os graves problemaspor que, naquele momento, passavam 32 milhões de brasileiros”. Para Brunes,o difícil foi convencer as pessoas de que o problema da fome, da miséria e daexclusão social não era uma questão apenas do governo, mas também da sociedadebrasileira. No caso de Getúlio, essa participação foi por meio da empresaem que trabalha até hoje, além da parceria com o Comitê dos Funcionários doBanco do Brasil. Juntos, os comitês da Embrapa e do Banco do Brasil lançarama primeira lavoura comunitária do Brasil, na qual alimentos básicos como arroze feijão são produzidos e distribuídos para entidades filantrópicas. A iniciativafoi tão emblemática que levou o sociólogo Betinho até Goiânia: “Tivemos ahonra de receber, em Goiânia, o saudoso Herbert de Souza, na nossa primeiracolheita do projeto”. Até hoje, a iniciativa existe e é mantida por outras organizaçõessociais.Brizabel Rocha foi outra que, por meio da Ação da Cidadania, também seengajou no Natal sem Fome: “O gaúcho é um povo solidário, mas, embora todoo esforço, sempre tivemos dificuldades para sensibilizar a mídia e as pessoas. Nãoconseguimos marcar como uma campanha ou uma data que se destacava nocalendário. Talvez porque dedicamos muito nossas energias na implantação deuma política de segurança alimentar e suas formas de organização, tais comoos fóruns, conselhos de segurança alimentar e nutricional”.Irene Lima, secretária executiva do COEP Ceará, tem um relato emocionantesobre o que significou o Natal sem Fome: “A campanha mobilizou o paíscomo uma das forças sociais mais poderosas da sociedade brasileira contemporânea.As pessoas descobriram novos jeitos de colaborar, e a sociedade civil viuque era possível mudar. Uma idéia do Betinho tornou-se a força propulsora capazde mudar a situação crítica em que se achavam milhares de brasileiros. Ele fez opovo brasileiro sonhar novamente e acreditar num futuro melhor. O povo estavacarente de um líder que mudasse a situação de letargia em que se encontrava apolítica brasileira. Necessitava de um defensor, de uma pessoa que fosse capaz de


democracia se faz com participação | 107Com adesão em todo o Brasil, o Natal sem Fome foi uma estratégia de mobilização social© Arquivo Ibaselutar pela construção de uma sociedade democrática, justa e fraterna. O país tinhasede de dignidade e fome de alimentos, ética e cidadania”.Para André Spitz, o Natal sem Fome foi uma grande estratégia de mobilizaçãosocial, e não apenas uma maneira de arrecadar alimentos. “A quantidadede pessoas que se incorporaram à Ação da Cidadania ou a outros movimentospor causa do Natal sem Fome é impressionante. Betinho tinha a clareza de quenão estava incorporando militantes, mas sabia que cada um participava por


108 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008uma causa. A grande questão era combater a indiferença em relação à fome.Isso foi feito pela Ação e pelo Natal sem Fome muitíssimo bem, apesar de nãoentrar num primeiro momento nas questões estruturantes.”Segundo Gleyse Peiter, era comum a crítica ao Natal sem Fome por ser umacampanha assistencialista. “Essas críticas ignoravam a campanha como estratégiade mobilização social. O Natal sem Fome era também para arrecadaralimentos, mas seu principal objetivo era mobilizar as pessoas. Betinho eraespecialista nisso.” A secretária executiva do COEP acrescenta: “O Natal semFome continua a existir pelo Brasil. Em 2001, nós, do COEP, transformamosnossa participação em algo diferente. Criamos o Natal pela Vida, cuja idéia é adoação a uma causa, engajando ainda mais as pessoas”.Fórum Nacional da Ação da CidadaniaRealizado em Brasília, nos dias 10 e 11 de dezembro de 1994, o Fórum Nacionalda Ação da Cidadania contra a Fome e a Miséria e pela Vida pretendia ser umcanal para discussões sobre as estratégias de mobilização da campanha. Emboraformado por representantes de comitês da Ação da Cidadania – e também porentidades como COEP e Ibase, entre outras –, as resoluções tomadas pelo Fórumtinham caráter apenas opinativo, não definindo, necessariamente, as ações queseriam implementadas.O Fórum também reuniu membros da secretaria executiva nacional da Açãoda Cidadania, à qual coube sua operacionalização, e dos comitês estaduais, universitários,das empresas estatais e de organizações não-governamentais. Outradecisão tomada foi sobre a própria atuação da instância, garantindo que o Fórumnão representaria e nem se expressaria em nome da Ação da Cidadania, sendoapenas a expressão de uma parcela articulada de um movimento mais amplo.Também foi acordado que o Fórum poderia designar participantes para conversarcom o governo em seu nome, mas isso não poderia impedir ou desautorizar queoutros atores da Ação da Cidadania agissem dessa mesma forma.


democracia se faz com participação | 109Sobre essas decisões, André Spitz, que também participou do Fórum explica:“Betinho sempre dizia se orgulhar de ter criado algo descentralizado e sem coordenação.Dizia também que gostaria que chegasse o dia em que ele próprionão poderia mais avaliar os resultados da Ação da Cidadania, tamanha seria adiversidade de iniciativas país afora”.O presidente do COEP complementa:“As resoluções do Fórum da Ação daCidadania são um acordo operativojustamente sobre essa autonomia e essecaráter descentralizado que o Betinhotanto queria para o movimento, semque isso nos impedisse de ter um eloem nossas ações”.Como assessor de d. Mauro no Consea, Flavio Valente participou ativamenteda secretaria executiva nacional da Ação da Cidadania. “A riqueza do Fórumestava em sua diversidade. Cada fórum estadual tinha características e composiçõesdiferentes. Alguns eram mais voltados para ações emergenciais de distribuição dealimentos, outros mais concentrados em aspectos da promoção da economia popular,outros mais interessados em cobrar dos governos, em todos os níveis, aimplementação de políticas públicas tanto econômicas como sociais que fossemcoerentes com o objetivo de erradicação da fome e da miséria, de forma articuladacom a promoção da dignidade humana para todos”, afirma Flavio.José Ribamar Araújo e Silva, que representou o estado do Maranhão noFórum da Ação, acredita que a “nacionalização do movimento” foi um avançoe que favoreceu o diálogo com os governos na formulação de políticas. Mastambém aponta que havia um processo de disputa de lideranças e uma tentativade criar hegemonia. “Com isso, alijaram alguns que não se submeteram a essapolítica”, afirma Ribamar, que foi o primeiro presidente do Consea do Maranhão.Sua experiência em relação ao tema vem desde o início da década de 1990,quando trabalhava diretamente com vítimas de secas e enchentes, mas tambémde conflitos de terra.Betinho dizia que gostaria que chegasse o diaem que ele próprio não poderia mais avaliaros resultados da Ação da Cidadania, tamanhaseria a diversidade de iniciativas país afora


110 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Resoluções do FórumA seguir, estão dez cláusulas que expressam o consensoconstruído durante os dois dias de encontro do FórumNacional da Ação da Cidadania contra a Fome e aMiséria e pela Vida, realizado em Brasília, nos dias10 e 11 de dezembro de 1994.1 – Cria-se um fórum nacional, como espaço de cidadania,autônomo e plural. Esse fórum adota e promoveos valores básicos da solidariedade, igualdade, diversidade,participação e liberdade. Orienta-se pelos princípiosda Ação da Cidadania de iniciativa, descentralizaçãoe parceria.2 – O fórum, entre seus objetivos, pretende manterum espaço aberto de discussão política sobre linhasgerais capazes de orientar ações de cidadania, em especialde âmbito nacional.3 – O fórum será deliberativo nas questões procedimentais(isto é, que dizem respeito a sua economia interna).4 – O fórum é um espaço de discussão, proposição eindicação de ações convergentes de âmbito nacional(campanhas etc.).5 – Nas questões de conteúdo, o fórum vai se orientarpela busca de consenso como procedimento de decisão.Ou seja: não se adotará, nessas questões, o métododa votação.6 – O fórum não representa nem fala em nome daAção da Cidadania, mas apenas expressa opiniões deuma “parcela articulada” da Ação, quer dizer, daquelessetores que agrupa num determinado momento.7 – Reconhecendo o caráter descentralizado da Açãoda Cidadania, o fórum não poderá cobrar alinhamentoou obediência de nenhuma pessoa, grupo, entidade,comitê etc., que participe (ou não participe) dele.8 – O fórum reconhece e incentiva o caráter multipolarizadoda Ação da Cidadania, reconhecendo tambéma necessidade de articulação e integração entre as açõesque vêm sendo ou serão desenvolvidas.9 – O fórum pode designar um ou mais de seus participantespara conversar ou negociar com o governoem nome do próprio fórum, mas não pode impedirou desautorizar outros atores da Ação da Cidadania a


democracia se faz com participação | 111fazerem o mesmo (desde que eles não falem em nomedo fórum).10 – A presente reunião, de 10 e 11 de dezembro de1994, considerada constituinte do Fórum estabelece:a) A depender de confirmação dos participantes, aconstituição original do fórum é a seguinte: comitêsestatais, comitês universitários, comitês de entidadespúblicas, entidades e organizações não-governamentaisque trabalham no âmbito da Ação da Cidadania,secretaria executiva nacional da Ação da Cidadania.d) O fórum não poderá se constituir como entidadecom estatutos e registro jurídico próprios e orientaráseu funcionamento pelas dez diretrizes aqui livrementeconsensuadas entre os participantes desta reuniãoque o constitui, bem como por outras que não contrariemos princípios que o originaram.b) O fórum é aberto, podendo dele participar outrosatores que estão no âmbito da Ação da Cidadania.c) O fórum se organizará como rede, e não como organizaçãocentralizada, podendo, no entanto, se desdobrarestadual, regional ou localmente, estimulando aconstituição de fóruns semelhantes nesses níveis. Maso fórum não terá nenhum tipo de coordenação políticade caráter decisório.


112 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 20081995 e 1996O programa Comunidade Solidária, lançado em 1995, incorpora o combate à pobrezaàs políticas de desenvolvimento social. A Agenda Social Rio, em 1996, propõeum pacto por mudanças na cidade do Rio de Janeiro. Antes de ser sede olímpica, acidade deveria ser a sede de experiências bem-sucedidas nas áreas de educação, saúde,habitação etc.Comunidade SolidáriaCriado em 1995, o programa Comunidade Solidária procurou buscar novasmaneiras para acabar com a fome, a miséria e a exclusão social no país. O programafoi instalado pelo presidente Fernando Henrique Cardoso, eleito em1994, em substituição ao Consea. Em sua estrutura havia um conselho, presididopela primeira-dama, Ruth Cardoso, e uma secretaria executiva, a cargo deAnna Peliano. De caráter consultivo, tal como o Consea, o conselho do ComunidadeSolidária era composto por ministros de Estado e 21 membros da sociedade.Sua secretaria executiva fazia parte de sua estrutura formal e tinha comoobjetivo de assessorar o conselho do Comunidade Solidária e coordenar as açõesgovernamentais de combate à fome e à pobreza.Segundo Enid Rocha, pesquisadora do Ipea que fez parte da secretaria executivado Comunidade Solidária de 1995 a 1998, a iniciativa representou “um novoestilo de gerenciar ações públicas com base na integração, convergência e descentralizaçãodas ações de governo, e na ampliação da participação da sociedade naprocura de soluções mais adequadas para a melhoria das condições de vida daspopulações mais pobres”. Para ela, que também foi assessora técnica do Conseano governo Itamar Franco, a estratégia da secretaria executiva do ComunidadeSolidária “incluía a articulação e a coordenação de ações dos três níveis de governose da sociedade no combate à fome e à pobreza. Entre outros objetivos,


democracia se faz com participação | 113buscava melhorar a eficiência das políticas sociais, evitando o clientelismo, acentralização, a superposição e a fragmentação das ações, bem como a dispersãodos recursos públicos”.O programa funcionava de três maneiras distintas, ainda segundo o relato deEnid Rocha. “A primeira conferia uma espécie de ‘selo de prioridade’ a determinadosprogramas sociais, que eram selecionados por seu maior impacto nascausas determinantes da pobreza e da fome. Esses programas eram objeto deinterferência direta da secretaria executiva do Comunidade Solidária, que atuavana busca pela melhoria dos resultados e desempenho físico e orçamentário dosprogramas.” Assim, um conjunto de programas universais e específicos nas áreasda saúde, educação, habitação, saneamento, alimentação, assistência social, agriculturafamiliar e reforma agrária eram classificados como prioritários no âmbitoda burocracia pública, o que significava melhorar a gestão e a alocação derecursos públicos federais.Outra frente de atuação foi a “integração e convergência das ações nosmunicípios mais pobres do país”. Seu objetivo era promover a integração e aconvergência das ações públicas estatais, das três esferas de governo e da sociedade,nos municípios de maior concentraçãode pobreza. Para tanto, foiselecionado, com base em indicadoresde pobreza produzidos pelo IBGEe pelo Ipea, um conjunto de municípiosidentificados como os maispobres de todo o país. Enid Rochaexplica: “Para esse conjunto de municípios,a secretaria executiva do ComunidadeSolidária exercia ações de articulação com ministérios, governos estaduaise municipais e segmentos da sociedade civil, para, em um esforço concentrado,fazer chegar, a essas localidades, um elenco de programas importantes e açõespúblicas com potencial de mudar a situação social da população. Essa idéia erainovadora, apostava-se que a chegada conjunta de diversos programas e açõesSegundo Enid Rocha, do Ipea, outra frentede atuação do Comunidade Solidária foi aintegração e convergência das ações nosmunicípios mais pobres do país


114 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008públicas nesses municípios teria a capacidade de mudar a realidade local, alterando,para melhor, as condições de alimentação, saúde, educação, habitação esaneamento daquela população”. Ela ressalta ainda que, por se tratarem dosmunicípios mais pobres do país, conseqüentemente, eram os mais despreparadostécnica e administrativamente, detinham amenor representatividade política e enfrentavamimensas dificuldades de acesso aosrecursos do governo federal.A terceira frente de atuação do ComunidadeSolidária era a “parceria com a sociedadecivil”, que visava ao desenvolvimento deação conjunta para ampliar o alcance de suaestratégia de combate à pobreza e à fome.“Vínhamos de um período – movimento da Ação da Cidadania – em que váriossegmentos da sociedade estavam mobilizados para compartilhar desse desafioe demandavam, cada vez mais, espaços de participação para a atuação parceiracom os governos”, relembra. Esta era, das três vertentes, a que estava mais diretamenteligada ao seu conselho consultivo.Os dados apontam que essesmunicí pios jamais teriam conseguidoreunir as condições de acessar osprogramas federais disponíveisEntraves e conquistasEnid Rocha aponta: “Há relatórios do Comunidade Solidária, publicados peloIpea e pelo Ibam, que demonstram, por exemplo, o acerto da estratégia de integraçãoe convergência de programas sociais em municípios pobres do interior do país.Os dados apontam que, na ausência dessa intervenção, esses municípios jamaisteriam conseguido reunir as condições de acessar os programas federais disponíveis.Há também informações que dão conta de demonstrar a precariedade dascondições sociais e, sobretudo, administrativas e financeiras dos municípios queforam objeto de atuação do Comunidade Solidária. No que se refere à frente deatuação do gerenciamento dos programas que receberam o selo de prioridade, os


democracia se faz com participação | 115relatórios de acompanhamento e avaliação do Comunidade também são exaustivosem demonstrar que, no período, o conjunto de programas prioritários apresentoumelhor desempenho, medidos não somente pelo montante de recursosalocados e gastos, mas também pelo equacionamento de entraves burocráticos”.Além do relato técnico, Enid também ilustra o que, em sua opinião, representoua secretaria executiva do Comunidade Solidária: “Nunca me esqueço,por exemplo, de um caso em que determinado município muito pobre do interiordo Nordeste encontrava-se, há anos, impedido de acessar programas públicosporque estava inadimplente com órgãos do governo federal. Então, a secretariaexecutiva do Comunidade Solidária identificou que a inadimplência daquelemunicípio devia-se à ausência de quitação de uma dívida de valor irrisório –apenas R$ 12 –, adquirida em administrações anteriores! Identificado e solucionadoo problema, a população do município voltou a acessar o direito aosprogramas públicos federais. Esse exemplo, acredito, ajuda a compreender aimportância da atuação do Comunidade Solidária no âmbito governamental eo que era denominado de remover entraves burocráticos”.Enid Rocha finaliza: “Como gestora pública, pertencente a um grupo decarreiras de Estado da administração pública federal e conhecedora dos meandrosdo ciclo de elaboração, planejamento e gestão de políticas públicas, tenho a convicçãode que a experiência do Comunidade Solidária legou uma herança àburocracia pública federal. Hoje, termos diversos – como convergência, integraçãopolíticas, programas e ações, complementaridade entre programas – foramincorporados à preocupação permanente de gestores públicos, independentementeda matiz de governos e partidos políticos que almejam tornar o Estadomais eficiente, igualitário e justo”.André Spitz também destaca a importância da secretaria executiva do ComunidadeSolidária para a continuidade das iniciativas do COEP: “Tivemos muitoapoio da secretária executiva do Comunidade Solidária, Anna Peliano, que tambémtinha sido do Consea”. Segundo André, com a saída de Anna Peliano doComunidade Solidária, o diálogo com o governo ficou muito mais restrito. “Participeido Comunidade Solidária até 1996. A Anna ficou até 1998”, informa.


116 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Conselho do Comunidade SolidáriaFormado por ministros de Estado e 21 membros dasociedade civil – alguns até oriundos do extintoConsea –, o conselho do Comunidade Solidária erapresidido por Ruth Cardoso. Para Miguel Darcy,que foi um de seus integrantes, o conselho geroudois grandes avanços. O primeiro foi a promoção e ofortalecimento de um novo padrão de relacionamento,muito mais colaborativo, entre Estado e sociedade.Outro foi o estabelecimento de uma nova visãode desenvolvimento social, que gerava o fortalecimentodas capacidades das pessoas e potencializava os recursosdas comunidades. Darcy também aponta que oprojeto teve o papel de valorizar o voluntariado comouma expressão de solidariedade e cidadania.De acordo com dados oficiais divulgados em 2002,quando o conselho deixou de atuar, a iniciativa contabilizava2,4 milhões de brasileiros(as) alfabetizados(as),115 mil jovens capacitados(as) e 53 comunidades participantesdo programa de revitalização artesanal com2 mil profissionais atuantes.que promovia parcerias entre universidades, empresas,prefeituras e voluntários para, como o apoio doMinistério da Educação, alfabetizar jovens e adultos(as);o Artesanato Solidário, que apoiava a revitalizaçãode formas de artesanato tradicionais comoalternativa de renda; o Rede Jovem, espaços comacesso à internet como alternativa de lazer e aprendizadopara jovens carentes; e trabalhos voluntárioscomo o Amigos da Escola, que levou colaboradores(as)a escolas de todo o país.Para Darcy, as principais dificuldades enfrentadaspelo conselho foram: “vencer a resistência representadapelas velhas visões clientelistas e assistencialistaspara reconhecer o que parece evidente:combater a pobreza não significa apenas transferirrenda”. Segundo ele, é importante perceber que parceriasentre múltiplos atores – públicos e privados –ampliam as competências e recursos investidos naárea social.Entre os projetos desenvolvidos estão a UniversidadeSolidária (Unisol), que contava com a participaçãovoluntária de universitários(as) em trabalhosdesenvolvidos em comunidades carentes; o programaCapacitação Solidária (Capasil), cujo objetivo erafinanciar cursos de capacitação para jovens pobres de16 a 21 anos; o Alfabetização Solidária (AlfaSol),


democracia se faz com participação | 117Enid, por sua vez, cita como principal dificuldade a ausência de compreensãodo que era o Comunidade Solidária, seus objetivos e formas de atuação. “Lembrocomo era difícil passar a mensagem de que o Comunidade Solidária não era‘mais um programa’, mas que se tratava, na verdade, de uma estratégia de combateà pobreza e à fome. Que sua aposta não repousava na criação de novasestruturas, mas sim na melhoria da gestão dos programas sociais já existentes,os quais continuavam em suas respectivas pastas ministeriais. Apostava tambémna maior racionalidade da implementação das ações públicas quando propunhaa ação convergente e integrada, do governo e da sociedade, em municípios comelevada concentração de pobreza”, ressalta.


118 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Entrevista especialAnna PelianoSocióloga por formação, Anna Peliano ingressou no serviço público em1975. Desde o início, a fome esteve no centro de suas preocupações. “Na segundametade da década de 80, fui para a Universidade de Brasília (UnB) coordenaro Núcleo de Estudos da Fome, onde desenvolvemos diversas atividades, inclusivea edição de um jornal – Fome em Debate – com tiragem de 40 mil exemplaresdistribuídos dentro e fora do Brasil”, relembra.Responsável pelo estudo Mapa da Fome, que apontou, em 1993, o númerode 32 milhões de pessoas sem renda para garantir uma alimentação adequada,Anna teve participação de destaque no primeiro Consea, em 1993 e 1994, e noComunidade Solidária, de 1995 a 1998, quando exerceu o cargo de secretáriaexecutiva do programa do governo Fernando Henrique Cardoso.Nesta entrevista, Anna Maria Peliano apresenta uma interessante análisesob o prisma de quem conheceu diferentes governos e participou de importantesiniciativas. “Não considero que foi um acaso tudo o que aconteceu a partir de1993. No meu caso particular, já tinha participado da elaboração de outrosprogramas governamentais e publicado diversos estudos, inclusive críticos, sobrea descontinuidade das ações e a falta de recursos e de prioridade dos programassociais de combate à fome. A grande novidade de 1993 foi que, de fato, o combateà fome entrou na agenda das prioridades políticas”, afirma.


uma onda de cidadania | 119Depois de uma atuação de destaqueno Consea, você também participoudo Comunidade Solidária, criado em1995. Por favor, comente sobre essaparticipação.Anna Peliano – Eu já me dedicava, antesdo Consea, ao tema da fome. Entrei noInstituto de Pesquisa Econômica Aplicada(Ipea), em 1975, para participar da elaboraçãodo II Programa Nacional de Alimentaçãoe Nutrição (Pronan) e, depois,acompanhei sua implementação. Na UnB,tinha coordenado o Núcleo de Estudosda Fome, onde desenvolvemos diversas atividades,inclusive a edição de um jornal –Fome em Debate – com tiragem de 40 milexemplares distribuídos dentro e fora doBrasil. Esse jornal já refletia a preocupaçãocom a mobilização política em torno dotema. Em 1990, numa de suas edições,fizemos entrevistas com os então candidatosà Presidência da República para queapontassem, se eleitos, quais seriam asmedidas que adotariam para combater afome no país.A participação no Consea agregou novasexperiências, sobretudo de articulaçãogoverno e sociedade civil. Eu acreditava,após dois anos de trabalho numa espéciede secretaria executiva “informal” do Consea,que era fundamental institucionalizar umainstância operacional. Essa era uma avaliaçãodo Consea em geral, além daquelaque recomendava sua continuidade.Após a eleição do presidente FernandoHenrique, fui chamada pelo futuro ministroPaulo Renato – que coordenava, natransição, o programa do novo governo –para discutir uma proposta para a áreasocial. Não o conhecia pessoalmente e, nanossa primeira reunião, fui informada deque a nova iniciativa já tinha até nome:Comunidade Solidária. Conforme compromissode campanha, seria uma intervençãode combate à pobreza e aproveitariaa experiência do Consea. Mas o tema centralseria a pobreza, pois não se combate afome sem combater a pobreza, que é maiordo que a fome. E o programa ComunidadeSolidária teria essa dimensão. Então, eleme convidou para participar do grupo quedesenharia o programa e, no fim, acabeisendo convidada para assumir a sua secretariaexecutiva.Qual foi sua reação como defensorahistórica do tema da fome?Anna Peliano – Sempre trabalhei o temada fome como uma manifestação socialda pobreza. No Ipea, desde meados dadécada de 70, nossos estudos e propostasde programas já apontavam as relações


120 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008entre fome e pobreza. Apesar de considerarque o tema “fome” poderia dar maisconcretude a uma política de mobilizaçãosocial, não havia por que ser contra o governoassumir como prioridade o combateà pobreza. A orientação era clara: levar aexperiência do Consea para o ComunidadeSolidária, que era um compromisso decampanha de um presidente eleito democraticamente.Qual era a estrutura inicial do ComunidadeSolidária?Anna Peliano – Tinha um conselho que,a exemplo do Consea, era de caráter consultivoe composto por ministros de Estadoe 21 membros da sociedade que nãorepresentavam segmentos específicos, masque tinham expressão nas suas diversasáreas de atuação. O conselho era presididopela d. Ruth Cardoso, que tinha uma históriade defesa de causas sociais e era reconhecidano mundo acadêmico. Foi instalada,formalmente, uma secretaria executiva,que era uma antiga reivindicação e até umarecomendação do Consea, com o objetivode assessorar o conselho do ComunidadeSolidária. Em vez dos seis programas queacompanhávamos na secretaria informal doConsea, no Comunidade Solidária forameleitos, como prioritários, 16 programas.Foram incluídos programas nas áreas deeducação, saúde, habitação, saneamento,trabalho e agricultura familiar. Na saúde,além do combate à desnutrição, foi selecionadoo Programa de Agentes Comunitáriosde Saúde. Na assistência ao estudante,além da descentralização e da ampliaçãoda merenda escolar, incluímos o transporteescolar. No campo do trabalho, foiinstituído um programa de capacitaçãoprofissional e consolidada a proposta doprograma de microcrédito com recursosdo FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador).Esse, aliás, é um bom exemplo dealgo que surgiu em 1994, proposto peloConsea, germinou no Comunidade Solidáriae floresceu no governo Lula. Outroexemplo é o Programa Nacional de Fortalecimentoda Agricultura Familiar, o Pronaf.O programa foi desenhado e iniciado peloMinistério da Agricultura, em parceriacom a secretaria executiva do ComunidadeSolidária, e foi aprimorado e cresceu noatual governo.Mas não houve uma ruptura?Anna Peliano – Houve mudanças, é natural,e algumas levaram a várias incompreensões.Muitos criticaram a substituiçãodo Consea e o esvaziamento das políticasde segurança alimentar. Concordo que os


uma onda de cidadania | 121temas da fome e da segurança alimentarpareceram ter se diluído na proposta decombate à pobreza. Mas todos os programasque eram acompanhados pelo Conseaforam absorvidos pelo Comunidade Solidária,que deu a eles o seu selo de prioridade.Eram exatamente os mesmos programas,fortalecidos e ampliados. Atémesmo a distribuição nos municípios maispobres dos alimentos disponíveis nos estoquesdo governo permaneceu sendo feita deacordo com a sistemática anterior. Forammantidos, aprimorados e ampliados os programasdo Consea e acrescentados novos.Outras iniciativas importantes do ComunidadeSolidária podem ser destacadasno campo da segurança alimentar, taiscomo: a parceria com o Itamaraty e organizaçõesda sociedade civil para a elaboraçãodo relatório nacional apresentado naConferência Mundial de Alimentação daFAO, em 1996; a parceria com o Ipea paraa montagem de um banco de dados desegurança alimentar e nutricional que contoucom a participação de organizaçõesda sociedade civil, entre as quais o Ibase;um amplo debate com representantes dogoverno e da sociedade civil sobre conceitosde segurança alimentar, balanço dasrealizações e prioridades políticas, posteriormentepublicado.O que você destaca como inovação no seutrabalho à frente da secretaria executivado Comunidade Solidária?Anna Peliano – Nosso trabalho foi organizadoa partir de duas constatações básicas.A primeira delas é que as políticas decombate à pobreza têm de envolver açõesde diferentes setores e devem ser implementadasde forma integrada. Não há comoresolver, por exemplo, os problemas de rendada população sem resolver os de educação,e nem os de educação sem garantir condiçõesde saúde e alimentação. É preciso atuarem todas as dimensões de forma articulada.Mas a norma não era essa. Infelizmente,o que tínhamos na administração públicaeram ministérios e programas setoriais,cada um com suas prioridades e atuandode forma isolada e, muitas vezes, superposta.O Comunidade Solidária inovounesse esforço de integração do atendimentogovernamental, que foi reproduzido emtodas as unidades da federação por meiode uma rede de interlocutores estaduaisque articulavam os programas prioritáriosno âmbito estadual.De outra parte, os municípios maispobres são os últimos, quando conseguem,a ter acesso aos programas do governofederal. Muitos são excluídos por causa depequenas inadimplências, porque não têm


122 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008como dar a contrapartida exigida e mesmoporque não sabem como elaborar eencaminhar os projetos. Enfim, são inúmerasas dificuldades para acessar as políticaspúblicas, mesmo as ditas universais.São universais para quem consegue ultrapassartodas as barreiras, mas não paratodos os que precisam. O Comunidadeinovou no tratamento diferenciado dedicadoa cerca de 1.400 municípios distribuídosem todo o território nacional.E o que foi feito nesses municípios?Anna Peliano – Resolvemos selecionaros municípios mais pobres do país, usandocomo critérios o Mapa da Fome e umestudo sobre as condições da infância nosmunicípios brasileiros divulgado peloInstituto Brasileiro de Geografia e Estatística(IBGE) e o Fundo das NaçõesUnidas para a Infância (Unicef ). Eram osúnicos trabalhos disponíveis com informaçõesmunicipais. As capitais tambémforam incluídas porque nelas se observava,em números absolutos, a maior concentraçãode pessoas pobres. A seleçãofoi feita sem qualquer vínculo políticopartidário,e esses municípios receberamo selo de prioridade do Comunidade Solidária.Foi uma mudança total na formade fazer seleção de territórios beneficiados,que levou em conta exclusivamentecritérios técnicos.Para esses municípios selecionados,dedicávamos uma atenção especial parafazer chegar a eles os 16 programas doComunidade Solidária. Uma avaliação dotrabalho da secretaria executiva indicouque, em média, os municípios mais pobresreceberam 12 dos nossos programas.Sabíamos que, sem um tratamento especial,aqueles municípios dificilmente teriam alcançadoesse resultado. O tratamento especialincluía uma prioridade na alocaçãodos recursos, a liberação de contrapartidas ea solução mais ágil dos problemas de inadimplências,o que exigiu a dedicação de todaa administração pública federal. Esses municípiosconsiderados prioritários tinhamtambém acesso garantido a dois programasque não eram universais: o de distribuiçãode cestas básicas e o de transporteescolar. Ou seja, por não serem universaisou por não terem recursos suficientes paraserem implantados em todo o Brasil, algunspoucos programas foram exclusivamenteexecutados nos municípios selecionados.A grande maioria dos programas era extensivaa todo o território nacional, masainda assim insistiam em ver o ComunidadeSolidária como um programa de focalizaçãoem detrimento da universalização.


uma onda de cidadania | 123Isso gerou outra incompreensão porparte da opinião pública?Anna Peliano – De certa maneira, sim. Afocalização, nesse sentido de restrição dedireitos, era justamente o oposto do quequeríamos. Buscávamos oferecer um tratamentodiferenciado para que os municípiosselecionados pudessem ter acesso aprogramas universais. A única forma dese garantir acesso universal é tratar diferenciadamenteos que têm mais dificuldades,os mais pobres. Não adianta dizerque a educação é para todos, se nem todostêm sequer como chegar à escola. NoComunidade Solidária, não se defendiaque políticas de Estado, como as de educaçãoe saúde, fossem só para os mais pobres,mas queríamos garantir que aquelesque são sempre excluídos também pudessemter acesso ao atendimento público. Asecretaria executiva do Comunidade Solidáriabuscava a universalização, mas nãohouve jeito de passar a mensagem de quenosso tratamento diferenciado não era focalização.Talvez tenha contribuído paraessa imagem a seleção de municípios maispobres e a exclusividade do programa decestas básicas, que tinha uma grande visibilidade.O fato é que tivemos um graveproblema de comunicação e pagamos opreço de não pensar uma estratégia dedivulgação que pudesse explicar claramenteo trabalho da secretaria executivado Comunidade Solidária.Uma vez, ao conversar com uma jornalistasobre as nossas funções e exporseus objetivos – organizar e articular asações de governo e promover a sua implantaçãode forma integrada –, ela medisse que era um objetivo muito bonito,mas difícil de ser comunicado à sociedade.Sei que não é fácil explicar o que pareceser óbvio. Precisa mesmo de uma instânciapara garantir prioridades e articular açõesde governo? Como? Não deveriam sersempre integradas e articuladas? Essaseram perguntas comuns.Por que você deixou o ComunidadeSolidária?Anna Peliano – Fiquei como secretáriaexecutiva durante todo o primeiro mandatodo presidente Fernando Henrique.Foi um tempo importante para lançar asbases da estratégia do Comunidade Solidáriacomo uma política pública. Comoenvolvia uma mudança de cultura na administração,o período necessário para suaconsolidação é, naturalmente, muito maislongo. E eu diria que exige um esforço permanentedo governo. Aliás, a nossa estratégiafoi retomada, no segundo mandato,


124 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008pela Secretaria de Assistência Social como Programa Alvorada e, mais recentemente,no governo Lula, muitos daqueles princípiosestão sendo adotados no Programa dosTerritórios da Cidadania.Em paralelo, todavia, começou a ganharforça, dentro de alguns setores do governo edo conselho do Comunidade Solidária, aidéia de que a secretaria executiva deveriase concentrar em promover o desenvolvimentolocal integrado, sustentável e endógeno,em um número bem mais restritode municípios. Foi o que ocorreu no segundomandato, com a criação do ComunidadeAtiva.Houve todo um debate a respeito, massempre defendi que Brasília teria muitadificuldade para fazer desenvolvimentona “ponta”. Creio que o desenvolvimentolocal integrado e sustentável tem de sercompleto, isto é, incluir a dimensão endógena,que não poderia sair de Brasília. Nãoapostava na tese de que uma pequenaequipe do governo federal articulasse asociedade local, identificasse e desenvolvesseos potenciais de cada município, capacitasseas administrações municipais e osempreendedores locais, criasse canais deinserção num mercado mais amplo, enfim,desenvolvesse todas as atividades necessáriasa uma estratégia dessa natureza.Poderia até funcionar em algumas localidades,mas dificilmente em larga escala.Em minha opinião, o papel do governofederal deve ser a garantia de uma políticade desenvolvimento nacional que seja capazde incluir as regiões e populações maispobres, a garantia de que os recursos públicossejam alocados onde são necessáriose que sejam utilizados de forma maiseficiente, integrada e transparente. O governofederal tem de flexibilizar os seusprogramas e dar apoio às iniciativas locais,mas não deveria ser ele o principal protagonista.Esse é um debate que permaneceaté os dias atuais.Qual é o balanço desses 15 anos de mobilizaçãosocial no combate à fome?Anna Peliano – Essa história é ainda maislonga. Não considero que foi um acasotudo o que aconteceu a partir de 1993.Josué de Castro, na década de 50, já haviainiciado o debate político sobre o problemada fome no Brasil, e outras iniciativas posteriorescriaram as bases para esse últimociclo. Eu já tinha participado da elaboraçãode outros programas governamentais e publicadodiversos estudos, inclusive críticos,sobre a descontinuidade das ações e a faltade recursos e de prioridade dos programassociais de combate à fome. A grande novi-


uma onda de cidadania | 125dade de 1993 foi que o combate à fomeentrou na agenda nacional de prioridadesdas políticas sociais. A mobilização do Movimentopela Ética na Política, a divulgaçãodo Mapa da Fome, a instituição do Consea,da Ação da Cidadania, do COEP, juntamentecom a primeira Conferência Nacionalde Segurança Alimentar, são iniciativasque contribuíram para despertar a indignaçãocom a presença da fome num paísque produz alimentos em abundância.Considero que o balanço geral de todaessa mobilização social é positivo. O Brasil,hoje, é reconhecido internacionalmentepela luta contra a fome, e diversos estudosmais recentes sinalizam a redução da pobreza,da fome e da desnutrição no país.Mas não podemos nos contentar com osavanços obtidos. Ainda convivemos comum contingente de quase 22 milhões debrasileiros vivendo com uma renda equivalentea um quarto de salário mínimo, ecerca de 7% das crianças menores de 5anos apresentam déficit de crescimento.A fome, infelizmente, ainda é umaquestão mal resolvida pela humanidade.Assistimos ao seu recrudescimento no cenáriointernacional em uma época em queas soluções para seu equacionamento sãoconhecidas por todos. A crise global dospreços dos alimentos está mostrando, maisuma vez, a importância das políticas públicasde segurança alimentar e nutricional.Gostaria de comentar algum momentoespecial ou algo peculiar sobre sua trajetória?Anna Peliano – Foram vários os momentosmarcantes. No início da chamada NovaRepública, em 1985, quando o senadorPedro Simon era ministro da Agricultura,organizamos, sob a coordenação da CompanhiaNacional de Abastecimento (Conab), oDia D do Abastecimento Popular, que podeser considerado um embrião das conferênciasde segurança alimentar, pois, nascapitais, lideranças comunitárias de todoo país se reuniram para debater os problemasde acesso aos alimentos pelas comunidadespobres das periferias urbanas. Osresultados e as propostas desse evento foramdebatidos posteriormente em Brasíliacom representantes de todo o país. Era aprimeira vez que organizações de base sereuniam para discutir nacionalmente osproblemas da fome.Na UnB, na coordenação do Núcleo deEstudos da Fome, vivíamos fortes emoçõescada vez que saía o nosso jornal. Nuncaesqueço a primeira manchete: “Cupons:governo insiste no clientelismo”. Era umacrítica ao programa do leite considerado


126 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008como uma prioridade de governo. Ficávamossempre esperando a retaliação, que,ainda bem, nunca veio.Ainda na UnB, realizamos o seminárioFome e Salário, que me marcou profundamente.Fizemos algo inédito para a época:introduzimos a discussão da fome na agendado mundo do trabalho, associando-a diretamenteà insuficiência de renda. Conseguimoslevar para a universidade todas aslideranças sindicais do país para discutir otema e elaboramos uma carta entregue aUlysses Guimarães, que respondia, naqueladata, como presidente da República interino.Organizamos o Prêmio Josué de Castro, quefoi entregue, no mesmo evento, a WalterBarelli pelo trabalho realizado no DepartamentoIntersindical de Estatística e EstudosSocioeconômicos (Dieese) em defesa deuma política salarial mais justa. CristovamBuarque, então reitor da UnB, e d. HélderCâmara participaram da entrega do prêmioe deram depoimentos inesquecíveis.Todos os acontecimentos de 1993, a assessoriaao governo Itamar e a parceria comBetinho naquele momento de mobilizaçãonacional também foram muito emocionantese sintetizavam um sonho e uma lutade muitas pessoas e de muitos anos.Os quatro anos de experiência na secretariaexecutiva do Comunidade Solidária,na organização e implantação de uma novaestratégia de política de combate à pobrezae na articulação da rede de interlocutoresdo Programa marcaram, em definitivo,minha trajetória como servidora pública.Mais recentemente, a participação nogrupo de trabalho que desenhou o BolsaFamília, que considero um grande programade combate à fome, foi muito gratificantee me possibilitou transferir umaexperiência de tantos anos e conviver comuma nova forma de desenhar, coletivamente,programas governamentais.


democracia se faz com participação | 127Agenda Social RioEmbalada pela possibilidade de sediar as Olimpíadas de 2004, a população doRio de Janeiro viu surgir, em 1996, um novo movimento na cidade, a AgendaSocial Rio 2004. Considerado um apoio imprescindível à candidatura do Rio deJaneiro às Olimpíadas, o sociólogo Betinho condicionou sua adesão à criação deuma agenda na qual fossem incluídos projetos sociais. Dessa forma, o eventoseria, também, uma maneira de “contribuir para a erradicação da miséria e paraa melhoria da qualidade de vida no Rio de Janeiro”.Composto por representantes de vários setores da economia nacional – empresas,comunidades, órgãos governamentais e não-governamentais, ONGs e sociedadeem geral –, o comitê organizador da Agenda Social Rio 2004 tinha cinco metasfundamentais: unir esporte e cidadania como forma de crescimento e inclusãosocial para população carente; levar educação de qualidade para crianças e jovensde todas as comunidades; proporcionar uma alimentação adequada a todos; darmoradia a todas as pessoas que viviam nas ruas do Rio de Janeiro; e urbanizaras favelas e integrá-las à cidade. Taismedidas, além de transformarema cidade em um exemplo de infraestruturaadequada para receber osJogos Olímpicos, trariam uma realpossibilidade de inclusão social paraa população pobre.Poucos meses depois, em marçode 1997, o Rio de Janeiro perdeu aeleição para sediar as Olimpíadasde 2004, pois não apresentava umainfra-estrutura adequada. Apesardisso, as iniciativas levantadas pelaAgenda Social Rio continuariamcomo um desafio a ser alcançado.© Arquivo IbaseA Agenda Social Rio 2004 queria unir esporte e cidadania como forma decrescimento e inclusão social


128 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Tendo comunidades da Tijuca – um bairro que é considerado espelho do piore do melhor da cidade –, ONGs, escolas e outras instituições como parceiraspara levar adiante a proposta, a Agenda Social Rio continuou desenvolvendo,em escala micro, suas metas iniciais.Paulo Magalhães, que participava da coordenação da Agenda como representanteda Caixa Econômica Federal, acredita que a iniciativa consolidou o temada favela na agenda da Cidade, principalmente no que diz respeito à articulaçãoentre favela e asfalto. Além disso, ele garanteque “as camadas populares se identificaramcom a Agenda e como se apropriaramdas idéias propostas”. Moema Miranda,coordenadora do Ibase, também integroua iniciativa e concorda: “A Agenda não foio que imaginamos para a cidade inteira, mas,para algumas regiões, ela de fato cumpriu o objetivo de ser uma iniciativa queaproveita uma oportunidade e segue com uma mobilização mais focada. Hoje,na Tijuca, temos o projeto das Arteiras, de geração de renda para mulheres dascomunidades pobres, e também uma iniciativa de resgate de memória daquelasfavelas. Começaram com a Agenda Social e, por serem interessante, ganharamconsistência e vida própria”.Como secretária executiva do Comunidade Solidária, Anna Peliano tambémparticipou do grupo de trabalho e destaca “a importância da iniciativacomo uma experiência inovadora de articulação de parcerias entre diversas instânciasdo governo e da sociedade partindo do âmbito local, no caso a cidadedo Rio de Janeiro”.Para levar adiante sua proposta, a AgendaSocial Rio continuou desenvolvendo, emescala micro, suas metas iniciais


democracia se faz com participação | 1291997 a 1999Em 1997, o balanço social das empresas é uma oportunidade para que o setor empresarialtorne pública a sua contribuição para um país mais justo. Em 1998, o InstitutoEthos aparece no cenário e torna-se parceiro da sociedade na cobrança por atitudeséticas e responsáveis do setor produtivo instalado no Brasil. No mesmo ano, o FórumBrasileiro de Segurança Alimentar e Nutricional começa a atuar e rapidamente torna-seuma referência no direito à alimentação adequada. No fim dessa década, o Consea deMinas Gerais assume o desafio no âmbito estadual de deliberar, propor e monitorarações e políticas de segurança alimentar e nutricional sustentável.Balanço SocialCriado para estimular investimentos sociais por parte deempresas privadas e dar transparência a eles, o balançosocial (BS) é um relatório no qual tais organizaçõesdemonstram como e quanto investem na melhoria daqualidade de vida de funcionários(as), das comunidadesvizinhas e em projetos sociais. O BS também revela indicadores sociais,entre eles o número de mulheres em cargos de chefia e a relação entre o maiore o menor salário pagos pela instituição. Sua publicação deve ser anual e emjornal de grande circulação.A campanha pela adesão voluntária ao BS foi lançada em junho de 1997. Oevento, realizado no Centro Cultural do Banco do Brasil, no Rio de Janeiro, foiorganizado em parceria pelo COEP e pelo Instituto Brasileiro de Análises Sociaise Econômicas (Ibase). “Acredito que a experiência do COEP foi inspiradorapara Betinho. Ele dizia que o balanço social seria um instrumento de mobilizaçãodas empresas”, relembra André Spitz. Segundo ele, a reunião era, na verdade,um encontro do conselho deliberativo do COEP, que foi ampliada para


130 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008receber empresários convidados por Luiz Fernando Levy, presidente da GazetaMercantil e integrante do Fórum de Líderes Empresariais. O empresário játinha uma posição de destaque e teve ativa participação na iniciativa. “O Fórumde Líderes Empresariais da Gazeta Mercantil estava comemorando 20 anos.Tinha sido o pioneiro da mobilização do empresariado brasileiro e dele saiu ochamado Documento dos Oito, que foi a primeira manifestação dos empresáriospara a sociedade brasileira no regime autoritário”, afirma Levy.Durante o encontro, coube ao sociólogo Betinho convencer o empresariadoda importância de divulgar para a sociedade em geral os investimentos feitosem áreas como saúde, meio ambiente e inclusão social. Desde o início, a campanhajá contava com a adesão de empresas de porte significativo: Furnas, Light,Usiminas, Companhia Energética de Brasília(CEB) e Inepar. Gleyse Peiter, do COEP,garante que o balanço social é uma inovaçãoabsolutamente brasileira: “Não havia nadaparecido no mundo todo. Com essa iniciativa,o termo ‘responsabilidade social’ começaa se popularizar”. Luiz Fernando Levy continua:“Nossa idéia era influenciar o maiornúmero de empresas a participar na ação deobjetivos sociais, considerando que a empresa tinha de participar da responsabilidadeao lado de ações do governo e de entidades sociais, de ajudar a atender àcrescente demanda social do país”.Até 2007, cerca de 1.100 balanços sociais haviam sido contabilizados peloIbase, que leva adiante a iniciativa e que elabora anualmente a atualização domodelo de BS a ser adotado pelas empresas. Com o preenchimento desse modelo,a divulgação dos dados em jornal de grande circulação e seguindo critériosque impedem, por exemplo, a participação das indústrias de armas e cigarros, aempresa recebe o direito de usar, ao longo de um ano, o Selo do Balanço Social,uma espécie de atestado de que aquela organização tornou públicas suas açõessociais. Segundo Luiz Fernando Levy, “a Gazeta Mercantil disponibilizou espaçoCoube a Betinho convencer oempresariado a divulgar investimentosfeitos em áreas como saúde, meioambiente e inclusão social


democracia se faz com participação | 131para a publicação dos balanços sociais cobrando apenas 10% do preço. Forampoucos no início, mas o número foi aumentando gradativamente e acabou sendoum sucesso. Mostrou que as empresas já faziam muita coisa que não era conhecidana área social e foi um ótimo testemunho ao mercado”.Para saber mais, acesse:www.balancosocial.org.brwww.lideres.org.br


132 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Instituto EthosO Instituto Ethos de Responsabilidade Social é uma organização não-governamentalcriada em 1998 para auxiliar as empresas em seus programas sociais. Ainiciativa foi de Oded Grajew, empresário que fundou a Grow Jogos e Brinquedosem 1972: “Eu já estava no meio empresarial há algum tempo, essa é a minhaorigem. Sempre procurei engajar o setor empresarial numa mudança social, desdeos tempos da Fundação Abrinq e do Pensamento Nacional das Bases Empresariais,o PNBE”. Mas a idéia do Ethos só amadureceu mesmo no fim da décadade 1990. “Em 1997, viajei para a Europa e os Estados Unidos, para pesquisarmovimentos empresariais voltados à questão social. Vi organizações e entidadesavançando nesse sentido, passando da filantropia para a gestão socialmente responsável,introduzindo a responsabilidade social em toda a gestão da empresa eem relação a diferentes públicos, como funcionários, comunidade, fornecedores,governo e sociedade. Ainda em 1997, ajudei a organizar uma reunião nos EstadosUnidos para tratar da responsabilidade social empresarial. Convidei alguns empresáriospara conhecer esse mundo da responsabilidade social e empresarial. E foipara esse mesmo grupo que levei a proposta de uma organização brasileira quemobilizasse as empresas para uma gestão socialmente responsável. E nasceu aidéia do Instituto Ethos, que foi gestada em 1997 e lançada em 1998”, recordaOded, que também participou, em 1989, da criação do PNBE e da AssociaçãoBrasileira de Empresários pela Cidadania (Cives), em 1994.Oded insiste: “Acredito que, para promover mudanças na sociedade, é precisoengajar o setor empresarial, que considero, atualmente, o mais poderoso dasociedade. É onde está o poder econômico, financeiro e político. São as empresasque financiam as campanhas eleitorais. Então, são as empresas que têm muitopoder sobre os políticos e as políticas públicas. São as empresas que detêm osmeios de comunicação, nos quais se localiza o poder de eleger prioridades paraa sociedade, criar comportamentos e hábitos”.Com mais de 1.400 associados, entre eles empresas dos mais variados segmentos,o Ethos funciona como um espaço para a troca de conhecimento e


democracia se faz com participação | 133discussão sobre o tema responsabilidade social. Além disso, incentiva que as empresasdemonstrem a seus acionistas a relevância de um comportamento socialmenteresponsável para o retorno em longo prazo sobre seus investimentos eestimula a identificação de formas inovadoras e eficazes de atuar em parceriacom as comunidades na construção do bem-estar comum. Mas o início não foifácil. “O principal foi mudar a visãode que estávamos criando mais umencargo para a empresa, mais um custoe uma ameaça à sua competitividadeno mercado, ou, ainda, um obstáculoà melhoria do desempenhofinanceiro e econômico. Para contraporisso, foi preciso mostrar as vantagense que, quanto mais socialmenteresponsável for a empresa, menos riscos correrá. Menos risco ambiental, riscosocial e risco ético. E não só isso. Quando as pessoas são bem tratadas, o bem-estaré geral. Então, o apoio da comunidade, o respeito do consumidor, o engajamentodos funcionários e a credibilidade interna entre seus quadros de funcionários sãouma vantagem muito grande para a empresa. Quanto mais socialmente responsávela empresa é, melhores resultados terá”, garante.O Ethos ajuda as empresas na criação de programas de responsabilidadesocial, auxiliando-as a compreender e incorporar o conceito do comportamentoempresarial socialmente responsável. Também auxilia o setor empresarial a implementarpolíticas e práticas que atendam a elevados critérios éticos e a assumirsuas responsabilidades com os grupos atingidos por suas atividades – corpofuncional, comunidades vizinhas e sociedade em geral. “Estabelecemos comomissão, a mesma até hoje, mobilizar, sensibilizar e ajudar as empresas a gerir osnegócios de forma socialmente responsável para que sejam parceiras na construçãode uma sociedade sustentável e justa. O primeiro desafio foi exatamenteintroduzir esse conceito da responsabilidade social e promover esse ‘pulo qualitativo’da filantropia para a responsabilidade social. Para se ter a idéia do impactoO Ethos ajuda empresas na criação deprogramas de responsabilidade social,auxiliando-as a incorporar o conceito daresponsabilidade social empresarial


134 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008dessa mudança, as empresas mais filantrópicas do mundo investem no máximo,em casos raros de excelência, 1% do seu faturamento em ações sociais. Quandofalamos em responsabilidade social empresarial, juntamos esse 1% aos outros 99%,pois estamos falando da gestão socialmente responsável de todos os recursos”,explica Oded, que também é o idealizador do Fórum Social Mundial.Ao fazer um balanço das ações do Ethos, Oded afirma que o conceito da responsabilidadesocial e empresarial entrou na cultura empresarial brasileira:“Não significa que seja altamente praticado, mas, quando lançamos o Ethos, oconceito de responsabilidade social e empresarial não existia. Não havia vocabulário,não estava na agenda da sociedade nem das empresas. Sem dúvida, éum conceito assimilado e todos sabem do que se trata. Ainda que, às vezes, sejausado indevidamente, esse conceito está introduzido. Existe também a práticaefetiva da responsabilidade social. Várias empresas procuraram melhorar suasrelações com seus diferentes públicos, e não apenas atuando na filantropia. Muitasavançaram, com efeitos na sua cadeia produtiva. Vários pactos foram feitos,inclusive contra o trabalho escravo, do compromisso de não-desmatamento, danão-degradação do meio ambiente. Houvetambém uma participação no combate àcorrupção e na exigência de um comportamentomais ético das empresas”.Para os próximos anos, os desafios estãopostos. “Esperamos que as empresas aprofundema gestão socialmente responsávele, com isso, se credenciem para influenciaras políticas públicas. Avancem, de um lado, no entrosamento do desempenhosocialmente responsável e, de outro, na essência da empresa por uma sociedademelhor. Avancem nas parceiras de empresas e com outros setores da sociedade paraproduzir influência nas políticas públicas, instituir regras de mercado socialmenteresponsável”, aponta o empresário.Oded também é enfático na sua mensagem sobre o poder de pressão dasociedade: “É importante a sociedade perceber o seu poder para influenciar asOded Grajew afirma que o conceito daresponsabilidade social e empresarialentrou na cultura empresarial brasileira


democracia se faz com participação | 135empresas. As pessoas são consumidoras. A sociedade precisa valorizar as empresassocialmente responsáveis tanto na hora de comprar produtos e serviçoscomo na hora de escolher um trabalho. Mesmo quando já se trata de um funcionário,há também um cidadão que pode tentar influenciar o comportamento daempresa. Isso ajuda muito a dirigir a empresa para uma gestão socialmenteresponsável. É preciso mostrar as oportunidades que as empresas têm de atuare de promover impactos positivos na sociedade”.Para saber mais, acesse:www.ethos.org.br


136 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Fórum Brasileiro de Segurança Alimentar e NutricionalO Fórum Brasileiro de Segurança Alimentar e Nutricional (FBSAN) é formadopor grupos da sociedade civil e instituições que entendem a questão da segurançaalimentar e nutricional como central para o desenvolvimento humano.Criado em 1998, o FBSAN tem como meta garantir o direito à alimentaçãosaudável e nutricional a todas as pessoas. Sua origem está relacionada à CúpulaMundial de Alimentação, realizada em Roma, em 1996, pela FAO – braço daOrganização das Nações Unidas (ONU) que trata da alimentação. Suas estratégiasde ação incluem a participação em debates no Brasil e no exterior sobreo direito universal de uma alimentação e nutrição adequadas. Além disso, oFórum busca inserir o tema na agenda dos governos locais e estimular o desenvolvimentode ações que promovam a segurança alimentar e nutricional.Edmar Gadelha é um dos fundadores do Fórum e relembra como tudo começou:“Além da conferência oficial para chefes de Estado, houve um eventovoltado à sociedade civil, o Fórum Global de Soberania Alimentar. Do Brasil,seguiu uma delegação extremamente grande, cerca de 70 delegados e delegadas.Com a Cúpula Mundial de Alimentação, tivemos um momento propíciopara a mobilização das organizações que já estavam no tema desde a Ação daCidadania”. Ainda segundo Gadelha, logo após a volta do grupo ao Brasil, asorganizações que haviam mandado representantes a Roma realizaram um encontroda sociedade civil organizada para discutir e aprofundar a mobilizaçãosocial contra a fome. Dessa articulação – da qual participaram movimentossociais e populares, sindicatos, ONGs e organizações ligadas à Igreja Católica– surgiu o FBSAN, dois anos após a Cúpula.Flavio Valente, primeiro secretário executivo do FSBAN, também estava nogrupo que foi a Roma. Segundo ele, o grupo encarregado de articular o encontropós-conferência era formado por Francisco Menezes, do Ibase; Renato Maluf,da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ); Alberto Broch, daConfederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag); ChristianeCosta, da Associação Brasileira pela Nutrição e Direitos Humanos (Abrandh);


democracia se faz com participação | 137e o próprio Flavio. “O Fórum foi ganhando corpo, e, após algumas reuniões detrabalho e gestões com o governo, ficou clara a necessidade de formalizar acriação de uma rede nacional sobre o tema que pudesse ter incidência maisclara sobre o processo político e organizativo, especialmente com o enfraquecimentodo Fórum da Ação da Cidadania”, acredita.Edmar Gadelha acredita que, por meio do FBSAN, ocorreu uma rearticulaçãonacional em torno da segurança alimentar, num momento em que nãohavia mais o Consea Nacional. “Ao ser um espaço de confluência, o FBSANcomeçou a produzir proposições para inserir o tema da fome na pauta políticanacional. O próprio conceito de segurança alimentar e nutricional é uma contribuiçãodo FBSAN”, ressalta.Na mesma linha, Francisco Menezes, do Ibase, complementa: “O FBSAN surgenesse bojo de uma sociedade civil que busca continuar uma trajetória e tambémdar um salto para outro patamar. Com o surgimento do FBSAN, não falamos maisem fome, mas em segurança alimentar e nutricional como direito humano. Aoengajar o tema nutricional, há um grande enriquecimento, e o FBSAN se tornaum grande espaço de articulação das instituições sem que elas percam sua autonomiae independência, mas trabalhando por objetivos comuns”.Francisco Menezes acredita que o grande resultado do FBSAN “foi mostrarpara a sociedade que a alimentação é um direito fundamental, e não o resultadoda boa vontade alheia. Os movimentos e organizações envolvidos nesse momentotiveram um amadurecimento político e conceitual grande, justamente num momentoadverso. No governo que sucedeu o momento de maior apogeu da campanhacontra a fome, houve um congelamento de iniciativas comuns entre governoe sociedade civil. Então, a sociedade teve de se articular por conta própria e provavelmentedaí veio o avanço nas suas reflexões acerca do tema”.Outro resultado do FBSAN foi o surgimento dos Conseas estaduais. Sobre isso,Renato Maluf explica: “Começamos a espalhar a semente dos Conseas estaduaise municipais, que logo vingou em Minas e, depois, no Mato Grosso do Sul”.Para Luciene Burlandy, professora da Faculdade de Nutrição da UniversidadeFederal Fluminense (UFF), o FBSAN “fortaleceu o diálogo entre os atores


138 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008da sociedade civil sobre o tema, mobilizou governos, colocou o tema na agendapública em diferentes níveis de governo (federal, estadual e municipal), possibilitoua mobilização em torno da SAN numa conjuntura em que o governofederal tinha se retraído em relação ao tema. Dessa forma, foi possível torná-loprioridade na conjuntura político-institucional subseqüente do governo federal”.Para ela, o desafio é “manter a rede”, já que cada participante do FBSAN temmúltiplas atividades e as demandas no campo da SAN se multiplicaram nosúltimos anos. Mesmo assim, Luciene ressalta: “Apesar do número de pessoasainda ser deficiente diante da demanda de trabalho, já houve grande expansãodos profissionais que atuam nesse campo da SAN”.Atualmente, o FBSAN reúne cerca de 200 entidades, entre sindicatos, pastorais,movimentos sociais e ONGs no Brasil todo. Para Edmar, o grande desafio,não apenas para o FBSAN, mas para todo o movimento de SAN, é a concretizaçãoe implementação do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional(Sisan). “Assim como existe o Sistema Único de Saúde (SUS) e o SistemaÚnico de Assistência Social, o Sisan precisa ser implementado nos mais de 5 milmunicípios espalhados pelo Distrito Federal e pelos 26 estados”, informa.Francisco Menezes concorda com Edmar: “O FBSAN está à frente da implementaçãodo Sisan, sendo o lado mais propositivo dessa etapa, pois tanto oFBSAN como o Sisan têm como características a intersetorialidade. Antes doFBSAN, havia grupos que trabalhavam com alimentação e terra, alimentação esaúde, alimentação e agricultura e outros do tipo. O FBSAN agrega isso e mostra,por exemplo, que quem está plantando precisa saber qual o efeito da suaprodução em termos nutricionais. Essa linha que costura as diferentes partes é amágica do FBSAN. Enquanto preservar isso, vai continuar forte e atuante”.Para saber mais, acesse:www.fbsan.org.br


democracia se faz com participação | 139Consea de Minas GeraisA criação do Consea de Minas Gerais, em 1999, é apontada por Edmar Gadelha,membro do FBSAN, como um momento emblemático na luta contra a fome:“Quando a coordenação do FBSAN propôs a criação do Consea/MG ao governadorItamar Franco e, imediatamente, foi acatada, houve uma mobilização dasociedade civil de Minas que acabou gerando o Fórum Mineiro de SegurançaAlimentar. Esse fórum mineiro também foi chamado para participar da discussãosobre o Consea/MG. Uma das proposições do fórum mineiro ao governador foi aindicação de d. Mauro Morelli à presidênciado Consea mineiro. ItamarFranco concordou, e d. Mauro, mesmosendo bispo em Duque de Caxias,município da Região Metropolitanado Rio de Janeiro, resolveu aceitaro convite. Isso deu muita força aoConsea/MG, pois d. Mauro, além de ter presidido o Consea Nacional, era umafigura expoente na luta contra a desnutrição materno-infantil em todo o Brasil.O Consea/MG passou a oferecer toda a estrutura para que o FBSAN funcionasse,já que o fórum não tinha recursos financeiros”.Com o objetivo de deliberar, propor e monitorar ações e políticas de segurançaalimentar e nutricional sustentável, no âmbito estadual, o Consea/MGtem tido conquistas significativas. Ao longo de quase dez anos, realizou quatroedições da Conferência Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional Sustentável,divididas tematicamente da seguinte forma: “Minas tem fome de ação:diretrizes e prioridades para uma Política de Segurança Alimentar Nutricional emMinas Gerais”; “Políticas públicas de segurança alimentar e nutricional: realizandoo direito humano à alimentação”; “Democracia e cidadania também namesa do povo mineiro”; e “A Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricionale suas implicações práticas: diretrizes da Política Estadual de SegurançaAlimentar e Nutricional Sustentável”.O Consea de Minas Gerais realizou quatroedições da Conferência Estadual de SegurançaAlimentar e Nutricional Susten tável


140 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Criação dos Conseas estaduaisO Consea/MG inaugurou uma nova esferade participação, mas o FBSAN empenhou-setambém no debate sobre acriação de outros Conseas estaduais. “Estávamosno governo de Fernando HenriqueCardoso e não tínhamos mais a instâncianacional. Mas, em 1998, houve eleiçãopara governos estaduais, e a coordenaçãodo FBSAN resolveu enviar uma carta atodos os que foram eleitos propondo acriação de Conseas estaduais”, relembraEdmar Gadelha.Edmar confirma: “Outros governadoresresponderam também, como foi o casodo Zeca do PT, do Mato Grosso do Sul;Jorge Vianna, do Acre; Mário Covas, deSão Paulo; e Olívio Dutra, do Rio Grandedo Sul. Mas, naquele momento, foramefetivados apenas os Conseas de Minas,Alagoas, Mato Grosso do Sul e Acre”.Atualmente, existe Consea no Distrito Federale em quase todos os estados, apenasem Rondônia não está regulamentado. Arelação dos Conseas estaduais, com informaçõessobre a legislação que os criou, estádisponível em.O Consea/MG também é responsável pelacriação de campanhas públicas sobre segurança alimentare nutricional, pelas Comissões Regionaisde Segurança Alimentar e Nutricional Sustentável(CRSANS), por caravanas de segurança alimentare nutricional no norte de Minas Gerais e no Valedo Jequitinhonha e pela campanha para aprovaçãoda Política Estadual de Segurança Alimentar eNutricional Sustentável, sancionada em 2006. Essapolítica – resultado da aprovação da Lei Orgânicada Segurança Alimentar e Nutricional (PL 2.028/05),elaborada pelo Consea/MG – estabelece o acessoa uma alimentação saudável como um direito humanofundamental. Além disso, também prevê aconfecção de um orçamento específico para açõesde segurança alimentar no estado e propõe a criaçãode conselhos municipais.Sobre a trajetória de sucesso do Consea/MG,Edmar Gadelha afirma: “O Consea/MG logoconvocou uma conferência estadual, em 2002, quefoi uma das primeiras nessa retomada da luta. Naquelaépoca, houve a indicação de uma lei orgânica,que só depois seguiu para o âmbito nacional. OConsea/MG elaborou um projeto de lei, e Minasfoi o primeiro estado a ter uma lei orgânica de segurançaalimentar, aprovada em 2005, já no governoAécio Neves”.Para saber mais, acesse:www.conseamg.gov.br


democracia se faz com participação | 1412001O Dia Nacional pela Mobilização pela Vida, inicialmente uma homenagem a Herbertde Souza, o Betinho, transforma-se, em 2001, em um projeto de lei que quer tornarobrigatória a publicação de um balanço social do setor público – os poderes Executivo,Judiciário e Legislativo – que mostre seus compromissos e resultados no combate àfome, na promoção da cidadania e na valorização da vida e da dignidade humanas.No mesmo ano, inicia-se em Porto Alegre o processo Fórum Social Mundial. A cidadaniaplanetária mostra sua capacidade de mobilização e afirma que “outro mundoé possível”. Na sua primeira edição, o FSM reúne aproximadamente 20 mil pessoas,oriundas de 117 países.Dia Nacional de Mobilização pela VidaO Dia Nacional de Mobilização pela Vida foi inicialmente criado para homenagearo sociólogo Betinho, falecido em 1997. A proposta foi lançada peloCOEP, em 2000, que solicitou ao Congresso Nacional que fosse feita umamoção de apoio à data – 9 de agosto, dia do falecimento do sociólogo. Em2001, o COEP articulou-se com o Instituto Brasileiro de Análises Sociais eEconômicas (Ibase), a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), oConselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (Conic) e Fórum Brasileiro deSegurança Alimentar e Nutricional (FBSAN) e apresentou a idéia de um projetode lei “para o compromisso social”.Com o apoio do deputado federal Miro Teixeira, do Partido DemocráticoTrabalhista (PDT) do Rio de Janeiro, a proposta foi aceita pela mesa da Câmarade Deputados. Já como projeto de lei, a iniciativa estabeleceu que ospoderes Executivo, Legislativo e Judiciário deverão publicar todos os anos, atéo Dia Nacional de Mobilização pela Vida, um balanço social, referente ao anoanterior, que contemple o registro quantitativo e qualitativo de todas as ações


142 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008desenvolvidas no combate à fome, pela promoção da cidadania e pela valorizaçãoda vida e da dignidade da pessoa humana. O artigo 3º estabelece que osgestores da administração direta devem publicar um calendário de metas paracada gestão.Além de tornar transparentes as ações do governo no combate à pobreza, oprojeto de lei, que já passou por todas as comissões da Câmara, estabelece quetodas as esferas públicas devem se dedicar, sempre no dia 9 de agosto, a realizariniciativas voltadas para o combate à fome e à pobreza.


democracia se faz com participação | 143Entrevista especialAndré SpitzEnvolvido diretamente com o COEP desde a sua criação, André Spitz está àfrente da iniciativa que cria um balanço social para o setor púbico. A idéia faz partedo Projeto de Lei nº 5.471, que trata da Lei de Compromisso Social e do DiaNacional de Mobilização pela Vida. Em tramitação no Congresso Nacional desde2001, a lei visa tornar obrigatória a divulgação anual dos compromissos, inclusivede destinação de recursos, dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário – noâmbito federal – voltados ao combate à fome, à promoção da cidadania e à valorizaçãoda vida e da dignidade humanas. Cinco entidades subscrevem a proposta:COEP, Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), ConselhoNacional das Igrejas Cristãs (Conic), Conferência Nacional dos Bispos do Brasil(CNBB) e Fórum Brasileiro de Segurança Alimentar e Nutricional (FBSAN).No caso da administração direta, a lei também determina que seja publicadoanualmente um novo balanço, sempre no dia 9 de agosto, para que sejam comparadosos resultados e as metas previstas pelo governantes. A data é mais umadas homenagens do COEP ao sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, que foium de seus fundadores. “Buscávamos algo que gerasse um benefício coletivo eque pudesse ser um incentivo à mobilização social. Foi assim que instituímos9 de agosto, data em que Betinho morreu, como o Dia Nacional de Mobilizaçãopela Vida”, explica André Spitz, que é o atual presidente do COEP Nacional.


144 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008“O projeto já passou por todas as comissões e pode ser levado ao plenário para votaçãoa qualquer momento, basta que haja pressão da sociedade”, ressalta ele. Quem quiserdemonstrar seu apoio ao projeto de lei pode subscrever o abaixo-assinado eletrônicodisponível no endereço .Como surgiu a idéia da Lei de CompromissoSocial?André Spitz – Essa proposta tem a vercom a própria origem do COEP, em 1993,que foi baseada, entre outras coisas, na necessidadede dar visibilidade à ação pública.Em 1997, tivemos um estágio fundamentalna formação desse pensamento, que foio surgimento do balanço social, um instrumentopara que as empresas públicas ouprivadas, de forma não obrigatória, divulguemsuas ações em prol da sociedade. Massó em 2001 demos um salto realmente importante,com a elaboração do projeto delei e o lançamento de um abaixo-assinadoeletrônico de apoio à proposta.Paralelamente, começamos a ver oquanto seria importante ter um balançosocial para o setor público. Percebíamosque, em todos os processos eleitorais –municipais, estaduais ou nacionais –, atemática da fome estava inserida. O combateà miséria estava em todas as agendasdurante as campanhas, mas, depois daeleição, não havia como acompanhar ouavaliar as ações executadas pelos eleitos.Não existem ferramentas para essa “contabilidadesocial”, não temos como saber se asplataformas eleitorais daqueles que se elegeramestão sendo cumpridas ou não.E qual a relação com o Dia Nacional deMobilização pela Vida?André Spitz – O Dia Nacional de Mobilizaçãopela Vida faz parte do Projeto deLei nº 5.471, mas a Lei de CompromissoSocial é mais ampla. Três anos após amorte de Betinho, em 2000, nós do COEPbuscávamos uma maneira homenageá-lode forma produtiva, algo que gerasse umbenefício coletivo e que pudesse ser um incentivoà mobilização social. Foi assim queinstituímos 9 de agosto, data em que Betinhomorreu, como o Dia Nacional de Mobilizaçãopela Vida. Para que esse dia demobilização fosse formalmente criado, fizemosum ato na Câmara dos Deputados,ainda em 2000, com apoio do Ibase, do


uma onda de cidadania | 145Conic, do FBSAN e da CNBB, e entregamosum abaixo-assinado com milhares deassinaturas colhidas pela Rede COEP emtodo o país. Nesse momento, começamosa pensar na viabilidade de criar o projetoda lei de compromisso social, apresentadoum ano depois.O que propõe a Lei de CompromissoSocial?André Spitz – É um projeto simples,com apenas cinco artigos. Determina que,a cada início de mandato, o governanteeleito informe o que pretende fazer e quaissão os recursos que pretende investir emrelação ao artigo 6º da Constituição, quetrata de saúde, educação, trabalho, segurança,previdência social, proteção à maternidadee à infância e assistência dosdesamparados. A lei também determinaque seja publicado anualmente um novobalanço, sempre em 9 de agosto, para quepossam ser comparados resultados e asmetas previstas.Mas quais seriam os quesitos desse balançosocial do setor público? Há ummodelo específico?André Spitz – Na época, discutimos muitoisso com o Flavio Valente, que está atualmentena Fian, uma organização de direitoshumanos voltada ao direito à alimentação,e com a Anna Peliano, do Instituto dePesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Sabíamosque um debate sobre um modelode balanço social de governos seria complexoe poderia levar muito tempo. Queríamoslançar um ponto de partida concretoe simples. Chegamos à conclusão de queo melhor era usar a própria ConstituiçãoFederal. Assim, os governos teriam de prestarcontas simplesmente dos direitos sociaisconstitucionais. A lei necessitará deuma regulamentação depois de aprovada,mas é basicamente dos direitos constitucionaisque estamos tratando. Também precisaráque haja pressão para que estados emunicípios tenham o mesmo tipo de lei,já que, nesse assunto, a União não podelegislar sobre essas esferas. Mas já há iniciativaslocais, como no Distrito Federal,onde uma lei desse tipo foi aprovada coma ajuda da mobilização do COEP, faltandoapenas sua regulamentação. Mais recentemente,o Movimento Nossa São Pauloviabilizou uma iniciativa similar. Trata-sede uma emenda à Lei Orgânica do Municípioe compromete os prefeitos a apresentaremum programa de governo detalhadopara todo o mandato. A Lei do Programade Metas, como é chamada, foi aprovadaem fevereiro de 2008.


146 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Como está a tramitação do projeto de lei?André Spitz – O projeto já passou portodas as comissões e pode ser levado aoplenário para votação a qualquer momento,basta que haja pressão da sociedade. Épreciso reconhecer o apoio do deputadofederal Miro Teixeira. Ele propôs que oprojeto de lei não fosse apresentado comode sua autoria, embora tivéssemos buscadosua ajuda para isso. Miro sugeriu, e nósacatamos, que fosse apresentado como deautoria da mesa diretora da Câmara, oque o tornou um projeto de lei suprapartidário.Outra vantagem que obtivemoscom isso foi que o projeto, por ser de autoriada mesa, não se extingue e a cada anoé automaticamente reapresentado.Para saber mais, acesse:www.coepbrasil.org.br/leidocompromissosocial


democracia se faz com participação | 147Fórum Social MundialO Fórum Social Mundial (FSM) foi idealizado como um espaço para debates,reflexão e troca de experiências entre organizações contrárias à política neoliberal,cuja maior expressão é o Fórum Econômico Mundial, realizado em Davos,na Suíça. Além de protestar contra as políticas neoliberais e o imperialismo, oFSM também busca dar visibilidade às propostas políticas dos movimentossociais e ser um espaço internacional de convergência entre diferentes setoressociais. Sua primeira edição foi em janeiro de 2001, em Porto Alegre, no RioGrande do Sul, e foi organizada por um comitê brasileiro formado pela AssociaçãoBrasileira de Organizações Não-Governamentais (Abong), Ação pelaTributação das Transações Financeiras emApoio aos Cidadãos (Attac), ComissãoBrasileira Justiça e Paz (CBJP), AssociaçãoBrasileira de Empresários pela Cidadania(Cives), Central Única de Trabalhadores(CUT), Instituto Brasileiro deAnálises Sociais e Econômicas (Ibase),Movimento dos Trabalhadores Rurais semTerra (MST) e Rede Social de Justiça eDireitos Humanos.A idéia de criar um encontro em oposiçãoao neoliberalismo partiu de OdedGrajew, idealizador de várias outras iniciativas,entre elas o Instituto Ethos. “Erao ano de 2000 e estava para acontecermais um Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça. Era o auge do neoliberalismo,da idéia de que o mercado vai levar a sociedade à felicidade. Seexiste o Fórum Econômico Mundial, por que não criar um fórum social? Fiqueipensando o quanto seria marcante ter um fórum social mundial na mesmaépoca do Fórum Econômico Mundial. Seria uma grande oportunidade para© Iracema Dantas/Arquivo IbaseParticipantes vietnamitas na abertura do sétimo Fórum Social Mundial,em 2007, na África


148 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008A quinta edição do FSM, em Porto Alegre, ocorreu de 26 a 31 de janeiro de 2005 econtou com mais de 200 mil pessoas na marcha de abertura© Samuel Tosta/Arquivo Ibaseque a sociedade civil pudesse se expressar e mostrar outra visão de mundo.Uma maneira de mostrar que outro mundo é possível, um mundo onde o socialfosse predominante e onde a sociedade fosse composta de cidadãos. Um fórumpara contrapor outros valores aos de Davos”, relembra Oded.Na época secretário executivo da Comissão Brasileira Justiça e Paz da CNBB,Chico Whitaker foi uma das primeiras pessoas com quem Oded conversou sobresua idéia: “Tive a oportunidade de participar do processo FSM desde sua criação,representando a Comissão Brasileira Justiça e Paz no Comitê de Organização doFórum de 2001 e, em seguida, dos três outros Fóruns realizados no Brasil (2002,


democracia se faz com participação | 1492003 e 2005). Considerei, naquela ocasião, que a proposta de Oded Grajew – queteve, em 2000, a idéia de promover um Fórum Social Mundial como um contrapontoao Fórum Econômico Mundial de Davos – era extremamente oportuna, naperspectiva de reforçar as primeiras resistências à imposição de uma globalização aserviço do capital que emergiam depois da queda do Muro de Berlim (zapatistas,Seattle, manifestações contra o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional– FMI e a Organização Mundial do Comércio – OMC)”.Sérgio Haddad, diretor da ONG Ação Educativa, também fez parte dessemomento inicial do FSM. Ele recorda: “Na oportunidade, eu estava ocupandoa presidência da Abong (Associação Brasileira de ONGs), e a motivação maiorfoi a de poder ajudar a constituir um processo político que pudesse articularatores sociais que tradicionalmente não se encontravam na mesma cena pública,de uma forma nova e articulada, mais horizontal, construída a partir desses própriosatores”. Para Haddad, “construir algo novo em uma cultura política tradicional,na qual o verticalismo, o ‘vanguardismo’ e o autoritarismo são práticascorrentes” tem sido a maior dificuldade ao longo da existência do FSM. Masnão é a única. Sérgio também aponta a dificuldade de constituir um processointernacional que leve em conta diferentes atores, culturas, condições socioeconômicase ambientais, além da natureza das organizações e missões: “É umprocesso que andou muito rápido pelos seus desafios, mas que, ao mesmo tempo,exige tempo para a sua consolidação”.Maria Luisa Mendonça, da Rede Social de Justiça e Direitos Humanos,integra o FSM desde o seu início. Ela acredita que o Fórum se converteu numespaço importante de articulação e numa referência na luta contra o neoliberalismo:“O mais importante é que geramos um modelo que se multiplicou emmuitos países, nos fóruns locais, regionais, continentais e temáticos. A lista deatividades geradas a partir do FSM é imensa, além de reforçar muitas campanhassobre temas como a luta contra a guerra, contra a dívida externa, a Alca[Área de Livre-Comércio das Américas] e os TLCs [tratados de livre-comércio],as articulações em defesa do meio ambiente, dos direitos humanos, da soberaniaalimentar, entre outras”.


150 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Nova cultura políticaChico Whitaker, que continua a integrar o conselho internacional do FSM,acredita que o “processo FSM constitui – até hoje – uma criação contínua denovos métodos, ocasiões e instrumentos para que as organizações da sociedadecivil possam se articular e se unir cada vez mais, como um novo ator políticoautônomo em relação a partidos e governos, voltado para a construção do outromundo possível”. Para ele, o FSM tem conseguido avanços a cada ano: “Emergemnão somente novas iniciativas de ação, mas também uma experimentaçãode práticas que apontam para uma nova cultura política, baseada na horizontalidadedas relações e no respeito à diversidade. Multiplicam-se os espaços – local,nacional, regional ou mundialmente – em que surgem novas redes de atuaçãoconjunta, cuja eficácia transformadora encontra, pouco a pouco, seus caminhos”,acredita.Nas palavras de Jorge Eduardo Durão, da Federação de Órgãos para AssistênciaSocial e Educacional (Fase), “o FSM foi uma janela que se abriu e atravésda qual todos nós começamos a respirar, depois de anos de predomínio do pensamentoúnico que acompanhou a hegemonia da globalização neoliberal”. Comoresultado, Jorge aponta a identificação de uma agenda comum dos movimentosque questionam os impactos destrutivos do capitalismo globalizado: “O FSMfavoreceu mobilizações de milhões de pessoas em todo o mundo – como ocorreuem 2003 antes de ser desfechada a guerra contra o Iraque – e propiciou um intensodiálogo intercultural e de uma enorme gama de forças políticas”.Cândido Grzybowski, diretor do Instituto Brasileiro de Análises Sociais eEconômicas (Ibase) e membro do conselho internacional do FSM, tambémaponta mais avanços: “Perdeu-se a conta da quantidade de eventos e milhõesmobilizados. Mesmo reconhecendo vazios de FSM pelo globo, o fato é que estamosredesenhando o mapa-múndi, que passa de sua visão eurocêntrica, com adominância do Norte desenvolvido, para algo mais próximo dos povos e culturasdiversas que dão vida ao mundo, onde o PIB conta menos do que a densidade demovimentos e organizações sociais participantes”.


democracia se faz com participação | 151Para Sérgio Haddad, são dois resultados mais significativos do FSM: a construçãode um novo processo político, uma frente internacional de entidades emovimentos da sociedade civil contra as políticas neoliberais e o modelo de globalizaçãoeconômica atual; e o método de articulação e diálogo desse movimento,de caráter inovador quanto aos seus mecanismos participativos e democráticos.Oded Grajew acredita que a própria realização do FSM é em si mesma um resultado:“um primeiro avanço foi o próprio fato de ele ter sido constituído, criado.Depois, é preciso pensar como um processo. O modelo neoliberal, do mercado livre,não acabou totalmente. Mas é bom olhar como era o mundo naquela época e mostrarcomo ele é hoje. O mapa político da América Latina era completamente diferente.Veja os presidentes daquela época e veja os atuais. Vários presidentes que estãohoje no poder eram freqüentadores assíduos do Fórum”. Segundo Oded, difícil éexplicar a natureza do Fórum Social Mundial: “Ele não é uma ONG, não é um atorpolítico, mas é um espaço que, também, é um processo. O que faz as coisas aconteceremsão as organizações que fazem parte do Fórum Social Mundial e se articulamnele”. Ele aponta outra dificuldade, que é também um desafio: a expansão mundialdo processo. “Já fomos à Índia e à África, mas nosso maior desafio é fazer o FórumSocial Mundial realmente se expandir pelo mundo”, ele explica. Sérgio Haddadcomplementa: “Entendo que os desafios atuais são completar o seu processo deexpansão em regiões ainda com pouca presença como o Leste Europeu, os EstadosUnidos e setores da Ásia, e dar maior efetividade às propostas produzidas no processodo FSM por meio de estratégias de articulação e intervenção social”.DesafiosPara Maria Luisa Mendonça, que é jornalista e tem uma longa trajetória internacionalde luta pelos direitos humanos, a maior dificuldade é romper cominteresses econômicos, de empresas e governos, que tentam usar o FSM parase promoverem. “É muito importante que o FSM volte realmente a ser umespaço de mobilização e articulação de movimentos sociais, e não se torne umaespécie de ‘indústria’ ou uma forma de promover turismo social”, defende.


152 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008A Rede Social de Justiça e Direitos Humanos, embora pouco conhecida noBrasil, esteve presente nas articulações continentais e mundiais de luta contra aOMC, a Alca, o controle da Base de Alcântara pelos Estados Unidos, as políticasdo Banco Mundial e do FMI. Maria Luisa explica como atua: “Procuramosrelacionar a luta cotidiana de defesa dos direitos humanos com políticas macroeconômicasgeradoras das desigualdades e das violações de direitos básicos.Lutamos pela reforma agrária, pela defesa da agricultura camponesa e pelasoberania alimentar”.O teólogo Leonardo Boff, que participou das mais significativas edições doFSM, reconhece que há um temor de que o Fórum gere um centralismo e acúmulode poder num pequeno grupo. Mas, para ele, isso é um equívoco: “O temor doserros do passado, especialmente do socialismo e das esquerdas, não nos deveinvalidar os meios que garantem eficácia e que podem constituir um antipoderao poder imperial”. Para ele, a ausência de uma centralização funcional está setransformando em democratismo, o que acaba imobilizando os encontros e acontinuidade do processo FSM. Jorge Eduardo Durão vê dificuldades do mesmoteor: “Conciliar a dimensão de espaço aberto e plural, que não tem dono, coma necessidade de assegurar maior coordenação política e prática às lutas domovimento altermundialista. O excesso de ‘purismo’ na defesa dos princípiosdo FSM acaba se transformando num fator de imobilismo e esterilização”.Chico Whitaker segue a mesma linha: “A maior dificuldade que esse processoenfrentou desde seu início foi a pressão para que os Fóruns deixassem de serespaços abertos para se transformarem em eventos de um movimento políticocom objetivos, militantes e programas próprios. Isso terminaria por impedir suaexpansão e enraizamento para incluir, cada vez mais, setores e lutas da sociedadecivil. Com esse risco hoje quase superado, o desafio agora – e cada vez mais – écriar condições efetivas, nos Fóruns e nos instrumentos de articulação que vãosendo criados, para que seus participantes construam alianças em torno de objetivosconcretos e desenvolvam ações realmente transformadoras”.Cândido Grzybowski acredita que, como espaço aberto, é natural que oFSM comporte convergências e divergências. Para o diretor do Ibase, “planos


democracia se faz com participação | 153de ação em torno a propostas concretas são responsabilidade dos próprios sujeitoscoletivos e atores sociais que se juntam no Fórum, articulam e definemsuas propostas e plataformas, com maior legitimidade. Estamos no FSM menospor propostas e mais por valores e princípios comuns no enfrentamento dacrise de civilização, que a radical expansão da globalização pôs a nu: o modeloindustrial-predador-consumista, que concentra riquezas, cria desigualdadessociais, exclui, alimenta a lógica de violência-terror-guerra, que destrói o climae o planeta em que vivemos”. E Cândido completa: “As alternativas não sãoúnicas, mas diversas como somos e como é a própria natureza. A única certezaé que pode ser diferente do que temos hoje, desta globalização neoliberal quenem perspectiva de futuro nos pode dar”. Leonardo Boff segue a mesma linhaao indicar onde vê os avanços do FSM: “Especialmente na consciência de queassim como o mundo está não se pode continuar, que devemos salvar a Terra ea biodiversidade enquanto tivermos tempo, pois estão sendo pilhadas pela voracidadedo capital”.Em 2009, em sua nona edição, o FSM voltará a ser realizado no Brasil. Acidade de Belém, no Pará, será a sede da cidadania planetária, de 27 de janeiroa 1º de fevereiro. Cândido Grzybowski acredita que o Fórum de Belém serácarregado por enorme simbolismo: “Em Belém, demonstraremos a nossa radicaladesão às questões do bem comum natural, base de toda vida, como referênciado que somos e do que queremos. Vamos trazer, para primeiro plano, adensidade social e de perspectivas que desenvolvem os povos da floresta em suaresistência à investida das grandes corporações e aos predadores de sempre.Vamos resgatar uma questão e um modo de ver profundamente local e, aomesmo tempo, universal. Não tenho dúvida de que tal FSM fincará um marcofundamental da nossa agenda no centro do debate mundial”.Para saber mais, acesse:www.forumsocialmundial.org.brwww.fsm2009amazonia.org.br


154 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Trajetória da cidadania planetáriaDe 25 a 30 de janeiro de 2001, logo na primeira vezem que ocorreu, o FSM reuniu aproximadamente 20mil pessoas, de 117 diferentes países. Em 2002, o Fórumaconteceu de 31 de janeiro a 5 de fevereiro, coma presença de mais 50 mil pessoas, representando 123países. Em 2003, na terceira edição consecutiva emPorto Alegre, o FSM foi realizado de 23 e 28 de janeiroe 100 mil pessoas participaram. Nessa mesma ediçãode 2003, o Acampamento da Juventude reuniu 25mil pessoas.Nas duas primeiras edições, foram abordados osmesmos temas – a produção de riquezas e a reproduçãosocial; o acesso às riquezas e à sustentabilidade; aafirmação da sociedade civil e dos espaços públicos e opoder político e ética na nova sociedade. No ano seguinte,em 2003, o comitê organizador ampliou a grade dediscussão e incluiu assuntos como o desenvolvimentodemocrático e sustentável; princípios e valores, direitoshumanos, diversidade e igualdade; mídia, cultura ealternativas à mercantilização e homogeneização; poderpolítico, sociedade civil e democracia e ordem mundialdemocrática, luta contra a militarização e promoçãoda paz.Em 2004, o FSM teve sua primeira edição fora doBrasil. O encontro foi realizado de 16 a 21 de janeiro,em Mumbai, na Índia. Os debates foram divididos emdois grupos. O primeiro, chamado Eixos Temáticos,incluía os temas democracia, segurança ecológica eeconomia; discriminação, dignidade e direitos; mídia,informação e conhecimento; e militarismo, guerra epaz. No segundo, definido como Eixos Transversais,os assuntos abordados foram a globalização imperialista;patriarcado, regimes de castas e racismo e exclusõessociais; sectarismo religioso, políticas de identidadee fundamentalismo; e militarismo e paz. Forammais de 74 mil participantes de 117 países. No AcampamentoIntercontinental da Juventude, foram cercade 2.700 inscrições.A quinta edição, novamente realizada em PortoAlegre, ocorreu de 26 a 31 de janeiro de 2005 e contoucom mais de 200 mil pessoas na marcha de abertura.No total, foram 155 mil participantes cadastrados, sendo35 mil integrantes do Acampamento da Juventude,com 151 países representados. As maiores delegaçõesforam as do Brasil, da Argentina, dos Estados Unidos,do Uruguai e da França.A edição de 2006 ocorreu, seguidamente, em trêslocais – Bamako, capital do Mali, na África (de 19 a23 de janeiro), Caracas, na Venezuela (de 24 a 29 dejaneiro), e em Karachi, no Paquistão (de 24 a 29 de março).Nesse ano, cada evento teve uma programaçãodiferenciada, e um terremoto ocorrido no Paquistão


democracia se faz com participação | 155meses antes da realização do encontro prejudicou suaorganização. Em 2007, o FSM foi à África: sua sétimaedição ocorreu em Nairóbi, no Quênia, e reuniu 52mil pessoas – um marco diante das dificuldades enfrentadaspelo comitê organizador local.© Iracema Dantas/Arquivo IbaseEm 2008, o FSM ocorreu de uma maneira diferente.O Conselho Internacional do Fórum SocialMundial – uma instância que passou a reunir representantesdas organizações mais engajadas nesseprocesso – definiu que não haveria um evento centralizado,mas sim uma semana de mobilização comuma data específica para um evento de maior visibilidade.A escolha foi pelo 26 de janeiro, que simbolizariao Dia de Mobilização e Ação Global. Alémdisso, outros eventos e encontros foram marcados aolongo do ano com a participação das entidades quefizeram parte das outras edições do FSM. No Rio deJaneiro, um evento no Aterro do Flamengo reuniucerca de 10 mil pessoas.Em 2009, o encontro voltará a ser centralizado eretornará ao Brasil. Será novamente em janeiro. A novidadedessa edição é que o encontro não será no Sul,mas sim em Belém, no Pará, região Norte. Espera-seque mais de 100 mil pessoas participem.Em 2007, o FSM ocorreu em Nairóbi, no Quênia, e reuniu52 mil pessoas


156 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 20082003Com a chegada de Lula à Presidência da República, o tema da segurança alimentare nutricional volta com toda a força ao debate público. Já no seu discurso de posse, emjaneiro de 2003, o combate à fome é anunciado como prioridade de sua gestão à frentedo país. O Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) é reeditadoe amplia-se o espaço de interlocução da sociedade civil organizada na discussão depolíticas públicas. Na mesma perspectiva, o programa Fome Zero, com seus comitêsgestores, e a Rede de Educação Cidadã investem na participação cidadã como estratégiapara um país sem fome e também mais justo. O Programa Um Milhão deCisternas, elaborado e desenvolvido pela Articulação no Semi-Árido Brasileiro (ASA),é transformado em política pública.Mensagem contra a fomeEm seu discurso 2 de posse, em 1º de janeiro de 2003, o presidente Lula não deixou dúvida sobrequal seria a prioridade de seu governo: “Enquanto houver um irmão brasileiro ou uma irmãbrasileira passando fome, teremos motivo de sobra para nos cobrirmos de vergonha. Por isso,defini, entre as prioridades de meu governo, um programa de segurança alimentar que leva onome de Fome Zero. Como disse em meu primeiro pronunciamento após a eleição, se, ao finaldo meu mandato, todos os brasileiros tiverem a possibilidade de tomar café-da-manhã, almoçare jantar, terei cumprido a missão da minha vida. É por isso que hoje conclamo: vamos acabarcom a fome em nosso país. Transformemos o fim da fome em uma grande causa nacional, comoforam no passado a criação da Petrobras e a memorável luta pela redemocratização do país. Essaé uma causa que pode e deve ser de todos, sem distinção de classe, partido, ideologia. Em face doclamor dos que padecem o flagelo da fome, deve prevalecer o imperativo ético de somar forças,capacidades e instrumentos para defender o que é mais sagrado: a dignidade humana”.


democracia se faz com participação | 157ConseaAtendendo a uma solicitação do Fórum Brasileiro de Segurança Alimentar eNutricional (FBSAN) e de outros movimentos relacionados ao tema, o Conseafoi recriado pela Medida Provisória nº 103, de 1º de janeiro de 2003, e regulamentadopelo Decreto Presidencial nº 4.582, de 30 de janeiro de 2003. Ao antigonome Conselho Nacional de Segurança Alimentar somou-se o termo Nutricional.Atualmente, o Consea é formado por 57 conselheiros(as), entre representantesda sociedade civil, 3 ministros de Estado e membros do governo federal, alémde 23 convidados(as). Luiz Marinho, então presidente do Sindicato dos Metalúrgicosdo ABC, foi convidado para o cargo de presidente do Consea, no qualpermaneceu até 2004.Demanda da sociedadeSobre a recriação do Consea, Renato Maluf detalha: “Foi o FBSAN que teve ainiciativa de recompor o Consea, mas também teve o apoio de Oded Grajew efrei Betto, então assessores do presidente Lula, e do ministro José Grazianocuidando dessas relações e demandas da sociedade civil. O envolvimento doFBSAN é fruto de sua própria trajetória. Como eu era da coordenação, fui umdos que, com Chico Menezes, do Ibase, representaram o FBSAN na interlocuçãodo governo Lula”.Frei Betto relembra: “Havia assumido, a convite do presidente Lula, e emconjunto com Oded Grajew, a função de assessor especial do presidente daRepública para a mobilização social do Programa Fome Zero. Como semprefui um ING – ou seja, um indivíduo não-governamental –, exceto no período2003–2004, insisti para que a sociedade civil tivesse efetiva participação naelaboração de políticas públicas voltadas à erradicação da miséria. Nesse sentido,o Consea se constitui numa peça fundamental, pois nele estão presentes liderançasde sociedade civil e autoridades públicas”.2 A íntegra do discursoestá disponível em:.3 A lista completa com osnomes dos(as) conselheiros(as)está disponível em:.


158 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Para Elza Franco Braga, socióloga e professora da Universidade Federaldo Ceará (UFC), esse momento provocou um reconhecimento de lutas deum passado recente: “A recriação do Consea revelou que as lutas e as mobilizaçõescontra a fome e a pobreza, com expressão nos anos 90, quando daAção da Cidadania contra a Fome e a Miséria e pela Vida, também conhecidacomo a Campanha do Betinho, ainda estavam vivas, embora sem a abrangêncianacional, como em conjunturas passadas”.Segundo Malaquias Batista Filho,membro do Consea e pesquisador da UniversidadeFederal de Pernambuco (UFPE)e do Instituto de Medicina Integral ProfessorFernando Figueira (Imip), a recriação dessainstância representou “a perspectiva de ummovimento de massas, na onda de um processopolítico e eleitoral diferente e inovador,e colocou, na agenda do governo e da sociedade, idéias, compromissos eestratégias de enfrentamento de problemas sociais que jamais foram devidamentepriorizados no Brasil. O desejo era antigo, a oportunidade nova”. SilvioCaccia Bava sintetiza: “Retomamos o processo da segurança alimentar comoum direito”.Adriano Martins, que, em 2003, atuava na diocese de Barra, na ONG Centrode Assessoria do Assuruá, no sertão da Bahia, já tinha proximidade com oFBSAN e viu, na recriação do Consea, uma oportunidade para ampliar o debatesobre o acesso à água e a convivência com o semi-árido na agenda nacional.“Priorizamos a consolidação do Consea como espaço de diálogo e construçãode políticas.”Ana Lúcia Pereira, da Agentes de Pastoral Negros do Brasil, que tambémintegra o Consea, relaciona a importância da recriação do Consea com outroaspecto: “A criação do grupo de trabalho (GT) Fome Zero e População Negra,em meados de 2003, foi um grande avanço. Naquele momento, foi possíveldemonstrar ao governo brasileiro que o direito humano à alimentação adequadaAdriano Martins viu na recriação doConsea uma oportunidade para ampliaro de bate sobre o acesso à água e aconvivência com o semi-árido


democracia se faz com participação | 159só seria possível se atentássemos para a diversidade étnico-racial da populaçãobrasileira”. Como sugestão desse GT, em outubro de 2003, o Consea realizouo I Seminário de Segurança Alimentar e Nutricional das Populações Negras,que mobilizou 150 lideranças do movimento negro brasileiro. Ana relembra:“Fizemos uma mobilização do Consea para o movimento negro. Daí surgiramas propostas de políticas para a população negra urbana, para as comunidadesquilombolas e para as comunidades religiosas de matriz africana”.Ana Lúcia também faz questão de registrar que a recriação do Consea estimulououtras ações: “Um momento especial foi a realização do Caruru deNvunji, no dia 16 de outubro de 2004, Dia Mundial da Alimentação. O eventoaconteceu na Comunidade Kaonje, uma das mais pobres do Recôncavo Baiano,localizada no distrito de Santiago do Iguapé, na cidade de Cachoeira de SãoFélix, a 160 quilômetros de Salvador. O caruru é uma comida típica africanacujo preparo exige a presença e a participação de muitas pessoas. A palavranvunji significa criança e vem da língua quimbundo, etnia da maioria das comunidadesquilombolas do Brasil”. Segundo Ana Lúcia, o evento contou com apresença de autoridades do Ministério das Minas e Energia, do Ministério deDesenvolvimento Social, da Fundação Cultural Palmares e da Secretaria dePolíticas de Promoção da Igualdade Racial e foi um marco na discussão e proposiçãode políticas públicas de inclusão social.Naidison Batista, do Movimento de Organização Comunitária (MOC) etambém da Articulação do Semi-Árido Brasileiro (ASA), associa à recriaçãodo Consea outro ganho: “A maior parte dos estados possui seus Conseas. Emmuitos deles, está em pleno andamento a construção das leis estaduais de segurançaalimentar e nutricional, e em muitos municípios também ocorre amesma coisa. Isso evita a possibilidade de que um simples decreto do executivopossa extinguir os Conseas e, com eles, o sistema de segurança alimentar”. Orepresentante do MOC também afirma que o Consea Nacional passou gradativamentedo debate de temas isolados à interferência significativa na políticanacional de segurança alimentar, intervindo sistematicamente no orçamentoda União.


160 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Saiba maisO Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea)é um instrumento de articulação entre governo e sociedade civil na proposiçãode diretrizes para as ações na área da alimentação e nutrição.Instalado em 30 de janeiro de 2003, o Conselho tem caráter consultivoe assessora o presidente da República na formulação de políticase na definição de orientações para que o país garanta o direito humanoà alimentação.Pela sua natureza consultiva e de assessoramento, o Conselho nãoé, nem pode ser, gestor nem executor de programas, projetos, políticasou sistemas.Inspirado nas resoluções da Conferência Nacional de SegurançaAlimentar e Nutricional, o Consea acompanha e propõe diferentes programas,como Bolsa Família, Alimentação Escolar, Aquisição de Alimentose Vigilância Alimentar e Nutricional, entre muitos outros.O Consea estimula a participação da sociedade na formulação, execuçãoe acompanhamento de políticas de segurança alimentar e nutricional. Consideraque a organização da sociedade é uma condição essencial para asconquistas sociais e para a superação definitiva da exclusão.O Consea, na gestão 2007–2009, é formado por 57 conselheiros (38representantes da sociedade civil e 19 ministros de Estado e representantesdo governo federal), além de 23 observadores(as) convidados(as).Fonte: www.planalto.gov.br/Consea/


democracia se faz com participação | 161Políticas em práticaAldenora Pereira da Silva, da Pastoral da Criança, aponta o Programa de Aquisiçãode Alimentos (PAA), que, por meio da Conab, compra diretamente deagricultores e agricultoras familiares, e o Programa do Leite, que veio reforçaro aumento da bacia leiteira do Nordeste e no norte dos estados de Minas Geraise do Espírito Santo, como grandes resultados do Consea.Já Adriano Martins aponta avanços do Consea em outro campo. Segundo ele,a instância foi fundamental para que, ainda no primeiro mandato do governoLula, houvesse a evolução de uma concepção equivocada e restritiva de “combate àfome” para uma visão mais ampla e intersetorial de segurança alimentar e nutricional(SAN). “Era uma abordagem bastante desconhecida para muitos gestoresconvocados pelo governo para atuar nessa área, e o Consea conseguiu reunir umnúmero expressivo dos melhoresquadros, das pessoas mais preparadasnesse campo, militantes de longa datada SAN”, acredita.Na mesma linha, Flavio Valenteafirma: “Foi o debate no Consea quelevou o governo a rever sua posiçãosobre o programa Fome Zero e a aceitar a necessidade de elaboração de umapolítica de SAN que efetivamente integrasse e articulasse as diferentes açõesrelevantes à promoção da SAN e do direito humano à alimentação adequada(DHAA). A partir desse debate, o Fome Zero passou a ser reconhecido comoum conjunto de ações dirigidas ao combate imediato à fome e desnutrição daspopulações mais vulneráveis, de caráter emergencial ou estrutural. No entanto,o Consea, em seu debate entre sociedade civil e governo, definiu a necessidadede constituição de um Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricionalpara garantir a SAN, que articule e implemente a política de SAN”.Adriano Martins aponta, como característica marcante do Consea, a capacidadede elaboração e articulação política. Para ele, o Conselho também é umAldenora Pereira da Silva aponta o Programade Aqui sição de Alimentos e o Programa doLeite como grandes resultados do Consea


162 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008espaço de concertação de ações, de diálogo entre os diversos setores governamentaise a sociedade civil organizada. Walter Belik, da Universidade Estadualde Campinas (Unicamp), destaca esse aspecto plural do Consea: “Com a participaçãode empresários, sindicalistas, ambientalistas, especialistas em saúde eeducação, além de representantes de todas as religiões, o debate foi ampliado, asvisões e opiniões se tornaram claras e explícitas, e conseguimos avançar para aproposta de ações sustentáveis e mais efetivas”.Mas Adriano faz questão de lembrar que a luta não está totalmente ganha.“O desafio atual é o de recolocar a questão da SAN como eixo orientador dodesenvolvimento nacional, em contraposição à lógica do crescimento econômicoa qualquer custo”, aponta. Ele também destaca que o Conselho funcionou comuma estrutura operacional bastante pequena para o volume e a complexidade dasações desenvolvidas: “O que foi feito é quase um milagre. Tivemos muitas dificuldadescom a excessiva setorialização e fragmentação das ações do governo e tambémno campo da sociedade civil”.Naidison Batista, que também exerce a função de conselheiro do Consea,aponta para o mesmo tipo de questão de fundo: “O desafio dos desafios é fazero país assumir uma concepção política de desenvolvimento que garanta a segurançaalimentar e nutricional. Muitas vezes, temos a sensação de que estamossempre tendo acesso apenas à beirada do prato. E as questões centrais permanecemintocadas, tal como a política econômica”. E não é só. Segundo ele, oConsea precisa dialogar mais com a Presidência da República. “Muitas de suasmoções e resoluções morrem na estrada da burocracia, e temos a sensação deestar conversando com nós mesmos”, explica.André Spitz, do COEP Nacional, segue a mesma linha e afirma: “Um grandedesafio é conseguir, por meio do Consea, criar o orçamento da segurança alimentare nutricional. Já existem exemplos positivos dessa mobilização por partedo Consea”.O pastor Ariovaldo dos Santos também aponta o que considera avanços doConsea: “De início, a criação do Plano Safra para o pequeno agricultor, o agricultorfamiliar e o assentado da reforma agrária. Pela primeira vez, havia um


democracia se faz com participação | 163Plano Safra para esse grupo de trabalhadores na agricultura, com financiamento,assistência técnica e tecnológica, seguro e garantia da compra da safra. A únicaexigência era que se privilegiassem as culturas de subsistência, de modo que ogrupo em questão passaria a ser o fornecedor privilegiado para suprir a demandaque o Fome Zero geraria. Além disso, a criação da Lei Orgânica de SegurançaAlimentar foi outro avanço importante. A formulação de uma política de consagraçãodo direito humano à alimentação adequada e a publicização desseconceito foram conquistas do Consea”. E complementa: “Políticas públicasforam aprimoradas. Inclusive, por conta disso, fui convidado a falar na 32ªConferência Mundial da Organização das Nações Unidas para a Agricultura eAlimentação (FAO), em Roma, sobre como a comissão permanente de monitoramentode políticas públicas à luz do direito humano à alimentação adequadacooperou para o aprimoramento das políticas em questão. Essa ação foiconsiderada uma das eficazes no cumprimento das Metas do Milênio”.Fome ZeroParalelamente às articulações do FBSAN para a recriação do Consea e a retomadade uma discussão sobre uma política nacional de segurança alimentar enutricional, a idéia de um projeto nacional de combate à fome – que, depois,teria o nome Fome Zero – já vinha sendo elaborada pelo Instituto da Cidadania,entidade ligada ao Partido dos Trabalhadores.Sobre esse fato, o professor do Instituto de Economia da Unicamp WalterBelik, que, de 2000 a 2002, trabalhou com José Graziano da Silva e Maya Takagino Instituto Cidadania, faz um relato interessante. Segundo Belik, a preparaçãode um projeto político apartidário para o combate à fome foi solicitado por Lulaainda no ano 2000, visando dar seguimento à mobilização nacional por umapolítica de segurança alimentar. “Nesse projeto, que mais tarde recebeu o nomede Fome Zero, tivemos o envolvimento de mais de cem especialistas que contribuíramcom materiais, textos e participaram dos debates organizados na sede do


164 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Instituto Cidadania em São Paulo. Esse grupo era formado por pessoas de diversospartidos, empresários, acadêmicos e sindicalistas”.Belik continua: “No ano de 2001, realizamos três consultas públicas sobre oprojeto: na cidade de São Paulo, no ABC paulista e em Fortaleza. A versãofinal da proposta foi concluída em outubro de 2001 e entregue ao presidentedo Senado Federal e ao representante da FAO no Brasil no Dia Mundial daAlimentação, 16 de outubro, como uma contribuição do Instituto Cidadaniapara o combate à fome no Brasil”.Saiba maisPara implementar o programa Fome Zero, foi criadoo Ministério Extraordinário de Segurança Alimentare Combate à Fome, também chamado de Mesa, cujoministro foi José Graziano. O Mesa foi substituídopelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combateà Fome (MDS), criado em 2004. Desde então,Patrus Ananias de Sousa à frente do MDS.Essa nova estrutura no governo federal tambémmarcou o lançamento do Programa Bolsa Família,fruto da unificação de quatro programas de transferênciade renda do governo federal: Bolsa-Escola(Ministério da Educação), Bolsa Alimentação (extintoMinistério da Assistência e Promoção Social),Auxílio Gás (extinto Ministério da Assistência e PromoçãoSocial) e Cartão Alimentação (Mesa), os trêsprimeiros criados durante o governo Fernando HenriqueCardoso.O presidente Lula nomeou ainda dois assessoresespeciais – frei Betto e Oded Grajew – para apoiariniciativas de mobilização da sociedade articuladas aoFome Zero. Entre as iniciativas apoiadas, destacam-seo Movimento Nacional pela Cidadania e Solidariedade,a mobilização de empresas parceiras do FomeZero, o programa Escolas-Irmãs e a Rede Talher deEducação Cidadã, a qual foi uma ação conjunta entregoverno e sociedade.Em sua definição oficial, o Fome Zero é “uma estratégiaimpulsionada pelo governo federal para asseguraro direito humano à alimentação adequada às pessoascom dificuldades de acesso aos alimentos. A iniciativaaposta na atuação integrada de diferentes ministériosda área social, possibilitando uma ação planejada e articuladacom melhores possibilidades de assegurar oacesso à alimentação, a expansão da produção e o consumode alimentos saudáveis, a geração de ocupação e


democracia se faz com participação | 165Já em 2002, Lula foi escolhido candidato do Partido dos Trabalhadores àPresidência da República e tomou o Fome Zero como uma das bandeiras desua campanha. Com sua posse em 2003, o Fome Zero se transformou em umapolítica de governo.Para saber mais, acesse:www.fomezero.gov.br | www.mds.gov.brrenda, a melhoria na escolarização, nas condições desaúde, no acesso ao abastecimento de água, tudo sob aótica dos direitos de cidadania.Dessa maneira, os princípios do Fome Zero têmpor base a transversalidade e a intersetorialidade dasações estatais nas três esferas de governo; no desenvolvimentode ações conjuntas entre o Estado e a sociedade;na superação das desigualdades econômicas,sociais, de gênero e raça; na articulação entre orçamentoe gestão e de medidas emergenciais com açõesestruturantes e emancipatórias.Eixos articuladoresO Fome Zero possui quatro eixos articuladores. Oeixo 1, de acesso aos alimentos, reúne programas eações de transferência de renda, alimentação e nutriçãoe acesso à informação e educação. Entre suasações estão o Bolsa Família, o Programa Nacional deAlimentação Escolar e a construção de cisternas (leiasobre o Programa Um Milhão de Cisternas na página169). No eixo 2, de fortalecimento da agricultura familiar,estão as ações específicas voltadas à agriculturafamiliar, à geração de renda no campo e ao aumentoda produção de alimentos para o consumo, com destaquepara o Programa Nacional de Fortalecimento daAgricultura Familiar (Pronaf ), e o Programa de Aquisiçãode Alimentos (PAA). No eixo 3, de geração derenda, são previstas iniciativas de promoção da economiasolidária e de qualificação da população de baixarenda para a sua inserção no mercado de trabalho. Oeixo 4, de articulação, mobilização e controle social,estimula a sociedade a firmar parcerias com o governofederal para a realização de campanhas de combate àfome e de segurança alimentar e nutricional. Entre asiniciativas desse eixo, está a Rede de Educação Cidadã.


166 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Comitês gestoresFormados por representantes da sociedade e de governos, os comitês gestoresdo Fome Zero atuavam de maneira descentralizada nos municípios beneficiadospor essa política pública, administrando e controlando o programa em cadacidade. Além disso, cabia aos comitês gestores mobilizar a sociedade em tornodo tema e realizar campanhas ligadas à segurança alimentar e nutricional. Coma criação do Bolsa Família, que passou o controle às prefeituras, os comitêsgestores foram extintos em 2004.Selvino Heck, que coordenava a Rede de Educação Cidadã, explica que,com a criação do Bolsa Família, unificando os cartões de transferência de rendaentão existentes, os comitês gestores deixaram de existir da forma comotinham sido criados. “Foram substituídos por conselhos do Bolsa Família, emgeral paritários, não eleitos em assembléias populares abertas. Perdeu-se ali ummomento importante de mobilização social e participação direta das comunidadesnuma política pública. Os conselhos do Bolsa Família funcionam, emgeral, nos moldes tradicionais dos demaisconselhos existentes no nível local, com poucodebate, pouca inserção social, inseridos,muitas vezes, na rotina e na burocracia”,avalia Selvino.Frei Betto, que foi assessor especial daPresidência da República para a mobilizaçãosocial do Fome Zero, de 2003 a 2004,considera que a extinção foi um equívoco:“Um dos maiores erros do governo Lula foi erradicar os comitês gestores, quemonitoravam e fiscalizam o Fome Zero”. Segundo frei Betto, a extinção doscomitês gestores também desarticulou a mobilização social conseguida em 2003:“O governo deixou de lado a mobilização da sociedade civil e optou pelo pactodos entes federativos, ou seja, uma política mais voltada a interesses eleitorais doque a projetos emancipatórios”.Os comitês gestores do Fome Zeroatuavam de maneira descentralizadanos municípios beneficiados poressa política pública


democracia se faz com participação | 167Rede de Educação CidadãCriada para articular o trabalho de educação cidadã do programa Fome Zero,a Rede de Educação Cidadã, ou Rede Talher, foi idealizada por um grupo deeducadores(as) voluntários(as), entre eles frei Betto e Selvino Heck. O objetivoda Rede Talher é ser um multiplicador das ações organizadas para o combate àfome e à miséria no país, tornando as famílias autônomas e dando condiçõesdignas para sua sobrevivência. Mais do que buscar uma alimentação adequadapara todos e todas, a iniciativa atua em prol de processos de inclusão social.Nomes e propósitosO nome Talher não foi escolhido à toa. Pensando em tudo o que envolve o momento da alimentaçãoe também o combate à fome, o governo federal inventou nomes criativos para o MinistérioExtraordinário de Segurança Alimentar e Combate à Fome (chamado de Mesa), o ConselhoOperativo do Programa Fome Zero (Copo), o Programa de Ação Todos pela Fome Zero (Prato),os Agentes de Segurança Alimentar (Sal) e a Rede de Educação Cidadã (Talher).Ao Copo cabe traçar as diretrizes da política de segurança alimentar local, credenciar asentidades e as famílias que serão beneficiadas e estabelecer parcerias com instituições, empresasprivadas e voluntários(as). Além disso, tem a função de arrecadar recursos locais, administrar asdoações e selecionar as entidades que receberão recursos. O Prato é formado por voluntários(as)organizados(as) por local de trabalho e é o braço operacional do Fome Zero.O grupo responsável pelo acompanhamento das famílias carentes é o Sal. Os agentes de segurançaalimentar se encarregam de cuidar do dia-a-dia das famílias para ajudá-las no processo deinclusão social. O Talher é a espinha dorsal do programa. Sua equipe é responsável por capacitaros agentes que atuam nos Copos, Pratos ou como Sal.


168 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008A Rede Talher está presente em todo o país por meio dos Talheres estaduais,microrregionais e municipais. Em seminários realizados em todo o Brasil, ocorreramtrocas de experiências sobre ações de articulação e mobilização. Frei Bettoressalta sua importância: “A rede faz um exitoso trabalho de educação popular,segundo o método Paulo Freire, com agentes e beneficiários do Bolsa Família”.Ainda de acordo com frei Betto, a Rede Talher mantém, atualmente, mais de800 educadores(as) populares em todo o Brasil, “ajudando agentes e beneficiáriosdo Bolsa Família a não encarar o programa apenas pelo seu aspecto assistencialista,mas sim libertador, no sentido de despertar uma cidadania militante”.Selvino Heck confirma a importância da Rede de Educação Cidadã: “Expandiram-sepor todo Brasil, tendo coordenações macrorregionais, estaduais e locais,com participação de milhares de educadores nas suas ações. Realizam-se encontros,seminários e cursos de formação e de organização do trabalho nos diferentesníveis e, com apoio de recursos do orçamento federal, realizam-se portodo Brasil milhares de oficinas de formação, mobilização social e construçãode políticas públicas na área social”.Frei Betto insiste que não se combate a fome apenas com doação de alimentose distribuição de renda. “É preciso associar democracia política à democraciaeconômica, ou seja, distribuir também meios de produção, como é o caso daterra. O desafio do governo Lula é como passar de políticas assistencialistas, quenão considero de todo negativas, a políticas emancipatórias”, aponta. Para Heck,“o esforço é chegar às populações mais pobres, apoiar sua organização, estimulá-lasa buscar formas de auto-sustentação e envolver as pessoas dessas comunidadescomo cidadãos conscientes na vida política, social e cultural”.Para saber mais, acesse:www.recid.org.br


democracia se faz com participação | 169Programa Um milhão de CisternasIniciado em julho de 2003, o Programa Um Milhão de Cisternas (P1MC) édesenvolvido pela Articulação do Semi-Árido Brasileiro 4 (ASA), que reúneem torno de 750 entidades da sociedade civil.Por meio do fortalecimento da sociedade civil, da mobilização, envolvimentoe capacitação das famílias, com uma proposta de educação processual, o P1MCvem desencadeando um movimento de articulação e de convivência sustentávelcom o ecossistema do semi-árido. O objetivo do programa é beneficiar cerca de5 milhões de pessoas em toda região semi-árida, com água potável para beber ecozinhar, por meio das cisternas de placas. O programa inaugurou uma novaestratégia de participação: os recursoscaptados provêm de várias parcerias.Entretanto, o governo federal é o principalresponsável pelo financiamentodo projeto, e a ASA pela implementaçãoda iniciativa.Cada cisterna tem capacidade dearmazenar 16 mil litros de água. Essaágua é captada das chuvas, por meiode calhas instaladas nos telhados. Com a cisterna, cada família fica independente,autônoma e com a liberdade de escolher seus próprios gestores públicos, buscare conhecer outras técnicas de convivência com o semi-árido e com mais saúde emais tempo para cuidar das crianças, dos estudos e da vida, em geral.A cisterna é construída por pedreiros das próprias localidades, formados ecapacitados pelo P1MC, e pelas próprias famílias, que executam os serviçosgerais de escavação, aquisição e fornecimento da areia e da água. Os pedreirossão remunerados, e a contribuição das famílias nos trabalhos de construção secaracteriza com a contrapartida no processo. Se a água da cisterna for utilizadade forma adequada – para beber, cozinhar e escovar os dentes –, dura, aproximadamente,oito meses.Cada cisterna tem capacidade dearmazenar 16 mil litros de água.Essa água é captada das chuvas, pormeio de calhas instaladas nos telhados4 A região é formada pelosnove estados nordestinos(Maranhão, Piauí, Ceará,Paraíba, Pernambuco,Sergipe, Alagoas, RioGrande do Norte e Bahia)e o norte de Minas Gerais.


170 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Resultados do Programa Um Milhão de CisternasCisternas construídas 221.514Municípios atendidos 1.031Famílias mobilizadas 228.541Pessoas capacitadas em confecção de bombas d’água manuais 4.540Pedreiros executores capacitados 5.674Pedreiros instrutores capacitados 174Dados de novembro de 2007. Fonte: www.asabrasil.org.brPara saber mais, acesse:www.asabrasil.org.br


democracia se faz com participação | 1712004Dez anos após a realização do primeiro encontro a tratar do tema, a II ConferênciaNacional de Segurança Alimentar e Nutricional é realizada em Olinda, Pernambuco.O destaque é o debate sobre a criação da Lei Orgânica de Segurança Alimentar eNutricional (Losan).Também em 2004, o Movimento Nacional pela Cidadania e Solidariedade trazpara o debate público os Oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio: erradicar aextrema pobreza e a fome; atingir o ensino básico universal; promover a igualdadeentre os sexos e a autonomia das mulheres; reduzir a mortalidade infantil; melhorara saúde materna; combater o HIV/Aids, a malária e outras doenças; garantir a sustentabilidadeambiental; e estabelecer a parceria mundial para o desenvolvimento.II Conferência Nacional de Segurança Alimentar e NutricionalCom a recriação do Consea em 2003, logo foi programada a II Conferência Nacionalde Segurança Alimentar e Nutricional (II CNSAN). Realizado na cidadepernambucana de Olinda, em março de 2004 – após dez anos da primeira conferênciasobre o tema –, o evento teve como destaque o debate sobre a criação daLei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional (Losan). Além disso, foramaprovadas 160 outras propostas, das quais 48 foram consideradas prioritáriascomo as que se referem ao Plano Safra para a agricultura familiar e os assentamentosde reforma agrária e ao Sistema Nacional de Segurança Alimentar eNutricional Sustentável. O encontro também produziu a Carta de Olinda, comargumentos que relacionam a insegurança alimentar nutricional ao modelo depolítica econômica adotado pelo país (leia mais no boxe “Carta de Olinda”).Durante todo o período de preparação da II CNSAN, Renato Maluf esteveno Consea como representante do FBSAN. Ele comenta um lado emotivo desua participação: “Chegar a essa conferência e ver que o presidente da República


172 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008é a mesma pessoa com quem trabalhamos na época do governo paralelo, quandotudo começou, é significativo. Ver que essa pessoa, agora como presidente, estábotando na rua aquilo que esse grupo todo começou a construir lá atrás dá umsentimento de realização. Creio que uma das grandes conquistas da II CNSANfoi ter retomado uma herança histórica que é muito importante neste país depouca memória ou que não gosta de cultivar memória. A conferência recuperouessa trajetória e juntou pessoas da maior importância e que têm uma relaçãoverdadeira com esse tema. Gostei muito, tocou-me profundamente”.Malaquias Batista Filho, do Instituto Materno Infantil de Pernambuco,aponta como resultado mais notável da II CNSAN a maturação política daseguinte idéia: mais do que o compromisso de um governo e de um mandato,a segurança alimentar e seu princípio político e ético de sustentação – o direitohumano à alimentação – deveriam fazer parte da constituição do próprio país.Ele acredita também que foi um avanço a difusão da segurança alimentar emtodos os patamares da sociedade e dos governos, “embora as respostas ainda nãotenham alcançado o nível pleno de realização que só se completa com o exercíciotambém pleno da cidadania”. O pastor Ariovaldo concorda: “A conferência tevecomo seu maior destaque a formulação de prioridades para os Conseas e oaprofundamento da decisão para que fosse criada uma instância de monitoramentoda aplicação do direito humano à alimentação adequada”.Dificuldades5 As pessoas presentes àconferência homenagearamHerbert de Souza, oBetinho, e Josué de Castropela contribuição de cadaum ao combate à fome eà miséria.Naidison Batista, do Movimento de Organização Comunitária (MOC) e daArticulação no Semi-Árido Brasileiro (ASA), relembra algo que considera umadificuldade: “O deslanchar da conferência, durante a qual o governo ou gruposde pessoas a ele ligados queriam fazer do evento um grande encontro, em vez deuma ação que pautasse o país com os temas principais e mobilizasse a nação. Foium momento tenso”. Ainda assim, Naidison, que também participa do ConseaNacional, não deixa de indicar, como pontos positivos, a construção do Sistema


democracia se faz com participação | 173Carta de OlindaAs 1.300 pessoas – entre as quais representantesda sociedade civil e do poder público – que participaramda II Conferência Nacional de SegurançaAlimentar e Nutricional Josué de Castro eHerbert de Souza, 5 realizada de 17 a 20 de marçode 2004, no Centro de Convenções de Pernambuco,na cidade de Olinda, consideram aconferência um marco histórico na construçãoda política de segurança alimentar e nutricionalno Brasil, afirmando a garantia universal do direitohumano à alimentação e à nutrição. A insegurançaalimentar, a desnutrição e a obesidadeatingem parcela significativa da população, 53milhões de brasileiros e brasileiras vivem abaixoda linha da pobreza. O modelo de política macroeconômicavigente e o custo da dívida públicasão identificados como as principais causas dainsegurança alimentar e nutricional e da exclusãosocial.Esse modelo causa a insuficiência de renda, oelevado nível de desemprego, a concentração daterra, a mercantilização da água, a precarizaçãoda educação, limita o acesso à alimentação e ànutrição e impede uma vida digna para toda populaçãobrasileira. Outras causas da insegurançaalimentar e nutricional apresentadas são:• a fragilização da produção de alimentosoriunda da agricultura familiar em função doinsuficiente apoio e das circunstâncias adversaspor ela enfrentadas;• a desigualdade de renda, que torna as mulheresmais suscetíveis à insegurança alimentar;• a degeneração dos hábitos alimentares, que comprometeo patrimônio cultural alimentar, componenteessencial da identidade cultural dos povos;• o modelo social que gera discriminação e afeta,com maior intensidade, a segurança alimentare nutricional dos povos afrodescendentese indígenas.Reverter esse quadro adverso implica adotaruma política social e econômica com a efetiva redistribuiçãode renda, a imediata redução das taxasde juros e a negociação soberana dos acordos internacionais.Para isso, é necessário:1. rever a política de exportação e importaçãode alimentos, visando não desestruturar a produçãonacional, em particular a proveniente da agriculturafamiliar e da reforma agrária;


174 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 20082. instituir um sistema nacional de segurançaalimentar e nutricional, com lei orgânica e orçamentopróprio;3. investir no programa Fome Zero comouma das principais estratégias de inclusão social;4. orientar os programas e ações de SAN adotandoos princípios da intersetorialidade, assegurandoa existência de espaços de participação econtrole social da sua implementação;5. submeter as políticas econômica e setoriaisao cumprimento de metas sociais, em especial a geraçãode emprego, trabalho e renda e acesso à moradiadigna, fatores determinantes do acesso a umaalimentação adequada por toda a população;6. fortalecer a produção da agricultura familiaragroecológica e intensificar a reforma agrária,como componentes para a maior disponibilidadede alimentos;7. garantir o acesso e uso sustentável da águae sua relevância como patrimônio natural e bempúblico;8. assumir posição contrária à produção e comercializaçãodos alimentos transgênicos, vistoque não existe comprovação sobre os riscos àsaúde humana e ao meio ambiente, adotando-seo princípio da precaução;9. respeitar o direito à informação sobre osprodutos comercializados e controle propaganda;10. garantir o acesso diferenciado às populaçõesmais vulneráveis à insegurança alimentar: negros(as),indígenas, mulheres, crianças e idosos(as) a recursose ações de SAN, visando à redução das desigualdadese à afirmação de seus direitos;11. garantir que a política nacional de saúdeseja efetivada em todos os municípios, de formaa contribuir para a reversão dos agravos relacionadosà alimentação.A II Conferência Nacional de SegurançaAlimentar e Nutricional reafirma o direito dopovo brasileiro de produzir e consumir os seuspróprios alimentos, segundo o princípio da soberaniaalimentar, de forma a se ver livre da fome,da miséria e da injustiça social.


democracia se faz com participação | 175de Segurança Alimentar e Nutricional e a mobilização social conseguida tantopor movimentos sociais como pelo poder público.Renato Maluf acredita que uma dificuldade nesse processo foi a constatação deque certa parcela considerável dos delegados e delegadas não tinha boa compreensãosobre o tema: “Foram feitos documentos de referência e houve uma preocupaçãocom a linguagem. Mas eles ficaram prontos em cima da hora e não foram discutidosnas conferências estaduais. Faltou tempo para o preparo necessário. Com isso, aCNSAN precisou ser mais aberta do ponto de vista das possibilidades de resultados.Uma expressão disso é o número enorme de deliberações, sobre as mais variadasquestões”. Ele acredita que a conferência teve um simbolismo de “ressurgir dascinzas”, mas que, do ponto de vista do conteúdo da discussão, ficou aquém. Aindaassim, houve decisões importantes: “A deliberação sobre criar uma lei e um sistemapara a segurança alimentar foi nessa conferência. O Programa de Aquisição deAlimentos (PAA), as questões da alimentação escolar e as propostas de modificaçõesna política de saúde também se originaram no encontro de Olinda”.Nova gestãoA II CNSAN também marcou o fim da gestão de Luiz Marinho: foi seu últimogrande evento público antes de deixar o cargo de presidente do Consea. Em seudiscurso de despedida, proferido no dia 12 de maio de 2004, quando entregou aopresidente Lula o relatório e documentos da II CNSAN, Marinho afirmou:“Nesta gestão que ora termina, eu tive o prazer e a satisfação de presidir oConsea, com todas as dificuldades que nós enfrentamos, com as dificuldadesde partilhar outras atividades que cada conselheiro e conselheira tem”.Sobre as realizações desse reinício do Consea, Luiz Marinho destacou o PlanoSafra e seu efeito para a agricultura familiar. “Realizamos a nossa segunda ConferênciaNacional de Segurança Alimentar e Nutricional, que buscou avaliar o desempenhodo período, mas não só isso. Buscou, também, observar como dar continuidade,como aperfeiçoar o nosso funcionamento, como fazer com que adquiramos


176 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Outros espaçosNão foi apenas a recriação do Consea que tornoupossível a ampliação da participação cidadã naspolíticas públicas. A partir de 2003, outros espaçossurgiram como esferas de influência da sociedadenas ações governamentais. Entre os novosconselhos criados estão os que tratam dos seguintestemas: juventude, cidades, aqüicultura e pesca,e promoção e igualdade racial. O Conselho Nacionaldos Direitos da Mulher, criado em 1985 edesde então ligado ao Ministério da Justiça, foi, em2005, integrado à estrutura da Secretaria Especialde Políticas para as Mulheres.ConferênciasA conquista da democracia participativa tambémfoi feita por meio da realização de conferênciassetoriais e nacionais. Durante o primeiro mandatodo governo Lula, foram contabilizadas 38 conferênciasnacionais, que mobilizaram diretamentemais de 2 milhões de pessoas em todo o país, desdeas reuniões municipais até os grandes encontrosnacionais – instâncias de reflexões, de estímuloao pensamento criativo, de debates e negociação.Só em 2006, foram realizadas 12 conferências,três delas internacionais.mais condições de elaboração técnica e no assessoramento técnico da matéria, deforma que as comissões técnicas, o grupo de trabalho possa ter um desempenhomelhor do que nós conseguimos, efetivamente, fazer neste período”, acrescentouMarinho. Para ele, a conferência “cumpriu um papel extraordinário, com delegadose delegadas do Brasil inteiro, com a colaboração dos estados e municípios. Foi umverdadeiro sucesso e dela saíram diretrizes importantíssimas. No relatório final,constam as diretrizes, que vamos trabalhar no Consea. O trabalho vai ser comandadopelo nosso companheiro, que será nomeado daqui a pouco pelo presidente”,disse referindo-se a Francisco Menezes, que assumia a presidência do Consea.Os documentos, o relatório final da II CNSAN e a íntegra do discurso de Luiz Marinho estãodisponíveis em: .Para saber mais, acesse:www.presidencia.gov.br


democracia se faz com participação | 177Movimento Nacional pela Cidadania e SolidariedadeEm 2003, o empresário Israel Tevah procurou o presidente da República pararelatar como praticava sua responsabilidade social e como incentivava o trabalhovoluntário em sua empresa. Proprietário de uma indústria têxtil no Rio Grandedo Sul, o empresário relatou que realizava o “Dia da Solidariedade” – um fimde semana quando toda a produção de sua fábrica era revertida em apoio aprojetos sociais. Para isso, empregados(as) doavam sua capacidade, fornecedoresdoavam insumos e ao empresário cabia a cessão do espaço e maquinário.O Dia da Solidariedade, ainda segundo o relato de Israel, funcionava tambémcomo um momento importante de congraçamento entre pessoas que trabalhavamjuntas, além de ser um modelo testado e que poderia ser replicado por outras empresas.Intermediada por Oded Grajew, na época assessor de mobilização e apoio aoFome Zero, a reunião com o presidente Lula, Tevah e outros empresários, sindicalistase membros de redes sociais e ONGsserviu para o esboço de mais movimentode mobilização contra a fome e a pobreza.A partir desse histórico, surgiu, em2004, o Movimento Nacional pela Cidadaniae Solidariedade, que busca conscientizare mobilizar governos e sociedade civilem torno dos Oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODMs). Formadopor instituições sociais, organizações governamentais e não-governamentais,empresas e sociedade, o Movimento foi uma iniciativa pioneira e capaz de geraruma nova onda de mobilização. Carlos Lopes, subsecretário geral da Organizaçãodas Nações Unidas (ONU) e diretor geral do Instituto das Nações Unidas para aFormação e Pesquisa (Unitar), foi um dos fundadores do movimento e explica:“A idéia de criar um movimento foi o resultado de sinergias de vários atores dasociedade civil, do empresariado, dos vários níveis de governo e as agências da ONU.É preciso realçar que esse movimento é único no mundo na sua dimensão, mas nassuas características já foi copiado por todos os lados”.O Movimento Nacional pela Cidadania eSolidariedade foi uma iniciativa pioneiraque gerou uma nova onda de mobilização


178 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Saiba maisEm setembro de 2000, 191 países, inclusive o Brasil, assinaram a Declaraçãodo Milênio, um pacto internacional pela eliminação da pobreza.Na ocasião, a ONU elaborou os Oito Objetivos de Desenvolvimentodo Milênio, um acordo de metas a serem alcançadas até 2015 – erradicara extrema pobreza e a fome; atingir o ensino básico universal; promovera igualdade entre os sexos e a autonomia das mulheres; reduzir a mortalidadeinfantil; melhorar a saúde materna; combater o HIV/Aids; amalária e outras doenças; garantir a sustentabilidade ambiental; e estabelecera parceria mundial para o desenvolvimento.Nós podemosPercival Caropreso dirigia a McCann-Erickson, agência de propaganda historicamenteenvolvida nas questões sociais, e foi responsável pela campanha doMovimento, que acabou ainda mais conhecida pelos ícones criados para representaros Oito Jeitos de Mudar o Mundo. “Participamos com a nossa competênciaespecífica, a de comunicação. Nosso papel foi planejar e criar uma campanhapara informar e conscientizar sobre a existência e a importância dosObjetivos de Desenvolvimento do Milênio, tirá-los dos gabinetes, dos congressos,dos discursos, das publicações técnicas e fazer que chegassem à vida de todosos brasileiros. Nosso papel, como profissionais de comunicação, foi também ode mobilizar, fazer acontecer na prática”, explica Percival.O uso da publicidade, por meio de uma campanha de conscientização, foifundamental para que os ODMs passassem a ser conhecidos pela populaçãoem geral. “Um momento marcante foi quando decidimos abrir mão do controleda campanha e dos materiais de divulgação, informação, conscientização e


democracia se faz com participação | 179mobilização dos setores da sociedade. Nos modelos tradicionais de comunicação,isso é uma heresia. Queremos sempre manter o controle do uso que outrosfazem da nossa comunicação. No caso do Movimento, estrategicamente tomamosa decisão de estimular que todo mundo usasse os ícones dos Oito Jeitos deMudar o Mundo indiscriminada e democraticamente, porque, só assim, a sociedadede fato iria se apropriar do Movimento. Só assim os ODMs teriamchances de serem abraçados e promovidos na prática da vida real, lá na pontada vida de cada um. No mundo convencional da comunicação, há essa lógicade exercer o controle central. Percebemos que só precisa exercer o controlequem não tem poder”, relembra Percival.A publicidade foi fundamental para que os Oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio passassem a ser conhecidos pela população em geral


180 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Ainda sobre a campanha criada pela McCann-Erickson, Carlos Lopes garante:“Não há dúvida de que, hoje, os Objetivos de Desenvolvimento do Milêniotêm um nível de reconhecimento altíssimo. Acho interessante que até a campanhado candidato à presidência dos Estados Unidos, Barack Obama, tenhacomo slogan o ‘Nós Podemos’”.Semana Nacional pela Cidadania e SolidariedadeOutra ação para impulsionar a realização dos ODMs foi a criação da SemanaNacional pela Cidadania e Solidariedade. Sobre isso, André Spitz ressalta acontribuição do COEP ao sugerir que o Movimento Nacional fosse algo comoum “guarda-chuva” para diversas iniciativas que já ocorriam e que pudesse aindaalavancar outras: “A contribuição do COEP foi a Semana Nacional, umahomenagem a Betinho”.O evento, realizado anualmente no mêsde agosto, pretende levar ao público, além deinformação, o exercício da cidadania e dasolidariedade por meio da reflexão, discussãoe definição de ações práticas para acabarcom os problemas que atingem a populaçãomais carente do Brasil. Percival Caropresoacredita que o evento é uma iniciativa concretaque “merece ser divulgada, replicada,expandida, potencializada, levada a estádios,com direito a replay, melhores momentose debatida em apaixonadas mesas-redondasde TV”. Mas alerta para o pouco tempo que resta para que as metas sejamcumpridas: “Esse processo democrático e participativo deve ser acelerado, porque2015 está ali na esquina, logo depois da Copa do Mundo no Brasil. Comobrasileiro, não quero ganhar a Copa e perder de lavada a Copa dos ODMs, umOutra ação relacionada aos Oito Objetivos de Desenvolvimento doMilênio foi a Semana Nacional pela Cidadania e Solidariedade


democracia se faz com participação | 181ano depois. Pena que a mídia não esteja televisionando as etapas classificatóriasda Copa dos ODMs como está dando notoriedade à Copa de Futebol”.Gleyse Peiter, secretária executiva e conselheira do COEP, participou ativamentedo Movimento e, em especial, da Semana Nacional pela Cidadania eSolidariedade, em agosto de 2004. Para aperfeiçoar as metas da ONU e dar-lhesuma “roupagem brasileira”, o grupo de trabalho de mobilização social do Consea,com apoio do COEP e da assessoria especial de mobilização social da Presidênciada República, organizou umareunião com representantes de diferentesconselhos de políticas públicas:“A reunião ocorreu em 9 de agostode 2004, no Sesc Pompéia, em SãoPaulo, com participação de cerca decem pessoas, representantes de 14conselhos de políticas públicas participativasda área social. Esse encontrofoi criado como um incentivo à mobilização do Consea em torno dos ODMs.Surgiu a idéia de consultar os conselhos e abrir o debate sobre quais deveriamser as metas sociais brasileiras”.A experiência, segundo Gleyse, também permitiu a troca de experiência e aapresentação dos resultados alcançados por cada conselho e a elaboração de umaagenda comum. “A proposta do Consea era de se fazer ainda um cruzamento dasdeliberações das conferências dos conselhos para encontrar questões comuns relevantespara todos e discutir uma metodologia para a definição das metas sociaisbrasileiras”, detalha a secretária executiva. “Muitos conselhos efetivamente fizerampropostas, inclusive o Consea, que foram apresentadas em reunião com a presençada Casa Civil e do Ipea, que eram responsáveis pela preparação do relatório deacompanhamento dos ODMs. A idéia era incluir, nesse relatório, os indicadoressugeridos pelos conselhos. Penso que alguns foram incluídos”, acrescenta Gleyse.André Spitz, que participou ativamente desse momento, ressalta: “Essa articulaçãoentre conselhos é tão possível quanto necessária para o avanço daPara aperfeiçoar as metas da ONU, o GT demobilização social do Consea organizouuma reunião com representantes deconselhos de políticas públicas


182 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008participação social. Foi a primeira vez em que diferentes conselhos de políticaspúblicas se reuniram com uma pauta comum”. Gleyse ressalta também que alegitimidade do Consea ficou marcada pela ampla resposta dada pelos conselhosa essa convocação: “O papel do Consea como articulador de uma iniciativainovadora foi interessante. Os conselhos atenderam à convocação feita, o quedemonstra respeito pelo Consea”.Outra estratégia de divulgação dos ODMs, apoiada pelo Movimento, foi acriação do prêmio Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, que busca incentivargovernos, organizações governamentais e não-governamentais e a sociedadea realizar ações que ajudem o Brasil a alcançar as metas. O prêmio, divididoem três categorias – governos municipais, organizações (organizações públicasou privadas, com e sem fins lucrativos) e destaques (indicação de destaques individuaisou coletivos) –, foi lançado durante a Semana Nacional de 2005.Para saber mais, acesse:www.nospodemos.org.br


democracia se faz com participação | 1832006 a 2008Em 2006, dois anos após ter sido debatida na II Conferência Nacional de SegurançaAlimentar e Nutricional (CNSAN), a Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional(Losan) é aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada pela Presidênciada República. Em 2007, a III CNSAN é realizada em Fortaleza (CE), com o tema“Por um desenvolvimento sustentável com soberania alimentar e nutricional”. Outroassunto da conferência é o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional(Sisan), uma das exigências da Losan e um desafio que requer a articulação entreUnião, estados, municípios e sociedade civil. Em 2008, a implementação do Sisan éa meta que reúne as diferentes instâncias que atuam no direito à alimentação saudávele de qualidade.Lei Orgânica de Segurança Alimentar e NutricionalO Projeto de Lei n o 6.047/2005, referente à Lei Orgânica de Segurança Alimentare Nutricional (Losan), foi assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula daSilva em outubro de 2005 e encaminhado para aprovação no Congresso Nacional.Em 2006, a Losan (Lei n o 11.346 ) foi aprovada pelo Congresso Nacionale sancionada pelo presidente.De acordo com o artigo 2 o da Losan, “a alimentação adequada é direito fundamentaldo ser humano, inerente à dignidade da pessoa humana e indispensávelà realização dos direitos consagrados na Constituição Federal, devendo o poderpúblico adotar as políticas e ações que se façam necessárias para promover e garantira segurança alimentar e nutricional da população”. Para isso, as ações deverãoconsiderar as dimensões ambientais, culturais, econômicas, regionais e sociais.A Losan estabelece, ainda, que é dever do poder público contribuir para quetodos e todas tenham direito a uma alimentação adequada e de qualidade, o queabrange “a ampliação das condições de acesso aos alimentos por meio da produção,


184 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008em especial da agricultura tradicional e familiar, do processamento, da industrialização,da comercialização, incluindo-se os acordos internacionais, do abastecimentoe da distribuição dos alimentos, incluindo-se a água, bem como da geraçãode emprego e da redistribuição da renda; conservação da biodiversidade e autilização sustentável dos recursos; promoção da saúde, da nutrição e da alimentaçãoda população, incluindo-se grupos populacionais específicos e populaçõesem situação de vulnerabilidade social; a garantia da qualidade biológica, sanitária,nutricional e tecnológica dos alimentos, bem como seu aproveitamento,estimulando práticas alimentares e estilos de vida saudáveis que respeitem adiversidade étnica e racial e cultural da população; produção de conhecimentoe o acesso à informação e a implementação de políticas públicas e estratégiassustentáveis e participativas de produção, comercialização e consumo de alimentos,respeitando-se as múltiplas características culturais do país”.


democracia se faz com participação | 185Entrevista especialFrancisco MenezesDiretor do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase),Francisco Menezes esteve à frente do Consea de 2004 a 2007. Foi incansávelna luta pela aprovação da Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional(Losan), mas também atuou diretamente na conquista de políticas públicasimportantes como o aumento do valor per capita da alimentação escolar e acriação do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). Ao comparar os doismomentos do Consea – em 1994, no governo Itamar, e em 2004, no governoLula –, sua reflexão é a seguinte: “Acredito que o primeiro Consea tenha tidoo importante papel de acender, na sociedade e no governo, o desafio da urgênciado enfrentamento da fome, mas tinha ainda, ou talvez se confundisse comisso, uma natureza muito executora, de quase ir a campo para distribuir comida.No atual Consea, atuamos mais intervindo nas políticas públicas”.O economista Francisco Menezes, ou simplesmente Chico – como é mais conhecido–, fala das conquistas do Consea, mas não deixa de apontar as limitaçõesde um espaço de participação cidadã em que governo e sociedade precisam chegara consensos. “Foram várias intervenções do Consea. Algumas se realizaram efetivamentee outras ainda estão nas gavetas, mas faz parte. É um aprendizado importante:num espaço como esse, não se ganha tudo, mas é importante estar na luta.”


186 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Como avalia sua participação na presidênciado Consea?Francisco Menezes – Durante os três anose meio em que estive à frente do Consea,creio que um grande avanço foi o próprioaprendizado sobre o papel de um conselho.Acredito que, durante esse período, de2004 a 2007, o Consea logrou alguns sucessos:a própria Losan e alguns ganhosimportantes vindos de políticas públicasespecíficas. Falo da manutenção, da preservaçãoe do fortalecimento do Programa deAquisição de Alimentos, o PAA. E tambémda alimentação escolar, que, por abandono,estava quase se acabando com esseprograma. Além do aumento do valor percapita, retomamos o debate sobre a alimentaçãoescolar, que acabou gerando um projetode lei que já está no Congresso Nacionale que dará um enorme salto de qualidadeao programa da merenda, se for aprovado.São progressos importantes.Em relação ao Bolsa Família, tambémcreio que contribuímos bastante para torná-lomais focado ao seu público-alvo.Foram várias outras intervenções do Consea.Algumas se realizaram efetivamentee outras ainda estão nas gavetas, mas fazparte. É um aprendizado importante:num espaço como esse, não se ganha tudo,mas é importante estar na luta.O que prevê esse projeto?Francisco Menezes – O aspecto mais relevanteé a extensão do programa de alimentaçãoao ensino médio. Com isso, maisde 8 milhões de alunos serão beneficiados.Garantir esse direito aos estudantes doensino médio é um enorme efeito direto,mas o projeto também contribui indiretamentepara deter a evasão escolar, que setorna maior à proporção que avança a idadedo aluno. Outro aspecto é que deixa deexistir a punição com a suspensão da alimentaçãoquando os gestores não prestamcontas do repasse de recursos. No projeto,a penalidade passa a ser voltada para o gestore, ao mesmo tempo, abrem-se alternativasde fornecimento da alimentação àsescolas. Outra característica é que o fornecimentode no mínimo 30% das comprasdeve ser oriundo da agricultura familiar,fortalecendo e respeitando os hábitos locaise evitando as enormes viagens que osalimentos fazem.Quais as diferenças entre o Consea de1994 e o Consea atual?Francisco Menezes – Acredito que o primeiroConsea tenha tido o importante papelde acender, na sociedade e no governo, o desafioda urgência do enfrentamento da fome,mas tinha ainda, ou talvez se confundisse


uma onda de cidadania | 187com isso, uma natureza muito executora, dequase ir a campo para distribuir comida. Noatual Consea, atuamos mais intervindo naspolíticas públicas. Isso não significa que tenhadiminuído a incidência do Consea. Pelocontrário, por meio de políticas públicas, épossível atingir ainda mais objetivos do queutilizando apenas suas próprias e limitadasforças para estar nas áreas mais necessitadas.Como surgiu a idéia de criar a Losan?Francisco Menezes – A Losan surgiu commuita força durante todo o processo da IIConferência Nacional sobre SegurançaAlimentar e Nutricional (CNSAN) até arealização do encontro em Olinda, em2004. Em diversas conferências estaduais, eem particular na que ocorreu em MinasGerais, percebeu-se que havia a necessidadede estabelecer um marco legal de todo oacúmulo alcançado no tema da segurançaalimentar e nutricional. Quando ocorreu aII CNSAN, em março de 2004, a propostafoi apresentada como o tema principal. Foi,sem dúvida, a proposição de maior força daconferência e já nasceu de uma movimentaçãosocial muito expressiva.E como foi sua tramitação?Francisco Menezes – Sabíamos que eraalgo necessário e inadiável, mas que nãoseria nada fácil. Para construir a Losan,precisávamos de consensos na sociedade eno governo, além de considerar que haveriauma tramitação no Congresso Nacional.Não queríamos que a nossa proposta acabassemutilada. Então, optamos por proporuma lei com os pontos essenciais.É interessante observar que, em algunspaíses, ao se elaborar uma lei, procura-seestabelecer todas as situações possíveis. Já asleis brasileiras são mais breves e centradasno essencial, refletindo talvez uma dificuldadenossa em aprovar leis que se aprofundeme que mexam com uma enorme diversidadede interesses que estão sempre emjogo. Fizemos, então, essa opção duranteos debates no Consea.Mesmo quando passou pela Presidênciada República, houve uma grande preservaçãoda essência da proposta surgida noConsea. Os retoques foram muito mais deaspectos jurídicos e coisas dessa natureza.A fase no Congresso Nacional foi tambémde muita participação e debate, inclusivebuscamos ampliar a participação para alémdo que já tínhamos conseguido com o processoda conferência de Olinda.Dados os limites que tivemos, a Losanfoi fruto de uma intensa participação.Nós nos utilizamos muito de consultaspúblicas feitas por teleconferências. Com


188 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008isso, tivemos diferentes partes do país debatendoo que estávamos propondo.Tínhamos uma estratégia para tentaraprovar a Losan ainda dentro da legislaturaem vigor e tivemos uma postura agressiva.Fizemos intensas articulações nas comissõesda Câmara de Deputados. Comoa proposta passou na Câmara sem alteraçãode mérito, foi possível fazê-la chegarao Senado sem precisar passar no plenárioda Câmara. No Senado, tivemos novamenteuma postura agressiva. No dia 5 desetembro de 2006, bem próximo ao períodode eleições, a lei foi votada em caráter deurgência urgentíssima. Aprovada nas suasorientações mais essenciais, é preciso, agora,cuidar da sua regulamentação.Como está sua implementação? Quaistêm sido as dificuldades?Francisco Menezes – A Losan prevê aconstrução do Sistema de Segurança Alimentare Nutricional, o Sisan, mas tambémregulamenta o Consea como um espaço desociedade e governo que elabora e acompanhapolíticas públicas e cria a CâmaraInterministerial de Segurança Alimentare Nutricional. Com a lei, temos ainda depercorrer o caminho da regulamentaçãodo Sisan. E isso precisa ser feito ao mesmotempo em que se discutem questões daordem do dia. O Brasil tem outras experiênciasdesse tipo, como o Sistema Único deSaúde (SUS) e o Sistema Único de AssistênciaSocial. A diferença entre o Sisan eo SUS ou o Sistema Único de AssistênciaSocial é que estes estão ligados a áreasdeterminadas (saúde e assistência social), aopasso que a segurança alimentar, por suacaracterística intersetorial, impõe – e esseé um desafio ainda maior – uma participaçãohorizontal de diversos setores. A construçãode um sistema assim é algo maisdifícil, mas está sendo feita.A efetividade dos espaços de participaçãopopular nos governos é constantementecriticada pela sociedade civil organizada.O Consea é uma exceção?Francisco Menezes – É um espaço demuita vitalidade, mas não se pode dizer“está conquistado e agora tudo é fácil”. Naverdade, precisa ser disputado a cada dia, eisso já é algo consciente. Para os governos –federal, estadual e municipal – é muito maisfácil governar entre si. Sem tantas consultasà sociedade, os processos são sempremais ágeis para os que governam. Para asociedade civil organizada, também é maissimples dizer que está tudo ruim e que ésempre necessária uma mudança radical.Mas, para conseguir resultados efetivos e


uma onda de cidadania | 189duradouros, tanto para uma parte comopara outra, a possibilidade de participaçãoé um caminho muito promissor. Éum aprendizado muito importante peloqual vem passando a sociedade brasileira.Ainda que tenha havido frustrações, nãose pode dizer que os conselhos de nadaserviram. Seria, como se diz, jogar a criançafora com a água da bacia.Outro aspecto que eu e os conselheirosaprendemos na prática foi trabalhar comefetividade nossas conquistas. Não ficávamosachando que uma derrota ou limitação erao fim do mundo. Ao contrário, ganhávamosforça para continuar na disputa pelo processo.As políticas públicas são sempre construídasno embate de interesses diversos.


190 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008III Conferência Nacional de Segurança Alimentar e NutricionalA III Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CNSAN)foi realizada em maio de 2007, em Fortaleza, no Ceará. Com o objetivo deavaliar os impactos do modelo de desenvolvimento na produção de alimentossaudáveis e na garantia e segurança alimentar e nutricional da população, oevento foi formado por três eixos temáticos: “Segurança alimentar e nutricionalnas estratégias de desenvolvimento”,“Política nacional de segurança alimentare nutricional” e “Sistema Nacional deSegurança Alimentar e Nutricional”. Foramcerca de 1.800 participantes, sendo1.333 delegados(as) da sociedade civil ede governos (das esferas federal, estadual emunicipal), 360 convidados(as) nacionaisA III CNSAN teve cerca de 1.800participantese 70 convidados(as) internacionais oriundos(as)de 23 países.Edmar Gadelha, do Fórum Brasileiro de Segurança Alimentar e Nutricional(FBSAN), foi da coordenação da III CNSAN e relembra um longo processo:“O tema da primeira conferência foi a fome como questão política, em 1994.O tema da segunda, dez anos depois, foi a construção da política nacional desegurança alimentar e nutricional, e esse evento gerou a proposta da Losan. Naterceira, nosso esforço foi trazer o debate sobre soberania alimentar. O temaoficial foi ‘Por um desenvolvimento sustentável com soberania alimentar e nutricional’.Defendemos que não há segurança alimentar sem soberania alimentar,assim como não há soberania sem segurança alimentar”. O debate incluiu aautonomia dos povos na decisão sobre o que produzem, como produzem ecomo se alimentam e teve aspectos relacionados à cultura alimentar. Em outraspalavras, a III CNSAN discutiu o fato de um mesmo tipo de alimento, normalmentemuito calórico e capaz de provocar problemas alimentares (obesidade,hipertensão e diabetes), ser produzido em todo o mundo e pelo mesmo tipo de© Arquivo Consea


democracia se faz com participação | 191indústria. Outro debate foi sobre a patente de sementes e dos transgênicos, quetambém interfere na soberania alimentar. “É o enfrentamento do que chamamosde globalização alimentar”, sintetiza Gadelha.Apesar da complexidade do novo tema trazido à tona pela III CNSAN,Edmar destaca um ganho marcante do processo de preparação do encontro:“Viajar o país todo, na condição de coordenador da III CNSAN, e ver o vigor dasmobilizações foi muito marcante”. Outra novidade dessa conferência foi a criaçãode cotas para a população negra, os povos indígenas e outras comunidades detradicionais. Para Edmar, esses segmentos trouxeram uma grande contribuição,inclusive o aspecto histórico entre negritude e fome: “As comunidades de terreirotrouxeram essa experiência de terem sido sempre locais onde a populaçãomais pobre buscava alimentos. As comunidadestradicionais da Amazôniativeram um grande desempenho emrelação à resistência da cultura alimentar.Foi uma riqueza enorme emuito emocionante”.Para Ana Lúcia Pereira, da Agentesde Pastoral Negros do Brasil, aaprovação das cotas também foi decisivapara o resultado final: “O avanço gerado pela conferência foi o reconhecimentodesse segmento da população como parceiro na construção da políticade segurança alimentar e nutricional no Brasil”. Aldenôra Pereira da Silva, daPastoral da Criança, destaca: “A mobilização de todo o país gerou uma grandeesperança de que a Losan será aplicada em todos os níveis da federação”. Paraela, deve ser ressaltada “a garra das populações específicas e a homenagem aFrancisco Menezes, então presidente do Consea Nacional, que exerceu seumandato com verdadeira maestria”.Martinho Lenz, o jesuíta que levou a Ação da Cidadania para a Europa e,na volta ao Brasil, coordenou o Mutirão Nacional para a Superação da Misériae da Fome, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) em 2002,Outro debate da III Conferência Nacional deSegurança Alimentar e Nutricional foi sobrea patente de sementes e transgê nicos, quetambém interfere na soberania alimentar


192 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Declaração de FortalezaA III CNSAN também teve uma declaraçãofinal. Entre as prioridades aprovadas pelos delegadose delegadas presentes, destacam-se:• incorporar os princípios e mecanismos deexigibilidade do direito humano à alimentaçãoadequada como forma de expurgarpráticas clientelistas e assistencialistas epromover a cultura de direitos;• coordenar as políticas econômicas e sociaisde modo a subordinar o crescimento econômicoa prioridades sociais e sustentabilidadeambiental, mantendo e intensificandoa recuperação da capacidade de acesso aosalimentos pela população;• fortalecer o Estado em sua capacidade deregulação, distribuir riqueza e prover direitos,preservar o ambiente e promover a integraçãosoberana entre os povos;• aprofundar a integração dos programas eações de segurança alimentar e nutricional,rompendo a fragmentação setorial e incorporandoas dinâmicas de desenvolvimentoterritorial;• implementar políticas de segurança alimentare nutricional e de garantia do direitohumano à alimentação adequada dos segmentosmais vulneráveis, reconhecendo asexigências da diversidade de gênero, geracional,étnica, racial e cultural e das pessoascom deficiência;• prosseguir com a promoção do direito àrenda dos grupos sociais mais vulneráveis epessoas com deficiência, fortalecendo a articulaçãoentre programas de transferênciade renda e a geração de oportunidades aosbeneficiários;• realizar reforma agrária ampla, imediata eirrestrita, e a promoção da agricultura familiarcomo política pública estratégica ao desenvolvimento,incluindo a demarcação e atitulação de terras indígenas e quilombolas;


democracia se faz com participação | 193• intensificar o apoio à agricultura familiar eagroextrativismo com incorporação da agroecologianas políticas de desenvolvimentorural, bem como revisar a Lei de Biossegurança,e, especialmente, suspender a liberalizaçãode produtos transgênicos;• promover a saúde e a alimentação adequadae saudável por meio da Política Nacional deAlimentação e Nutrição (PNAN) de formaintegrada ao Sisan, fortalecendo os instrumentosde controle social, a vigilância nutricional,a fiscalização de alimentos e o monitoramentoda propaganda e rotulagem;• instituir processos participativos de educaçãoem segurança alimentar e nutricional,com base nos princípios da Losan;• estruturar uma política nacional de abastecimentoque priorize a participação da agriculturafamiliar e agroextrativismo por meiodo fortalecimento do PAA;• definir uma política energética sustentávelque não comprometa a segurança alimentare nutricional, ofereça oportunidades à agriculturafamiliar e fortaleça sua capacidadede produzir alimentos diversificados, e regulee limite o avanço das monoculturas;• gerar emprego e trabalho dignos, promovendoformas econômicas comunitárias, a cooperação,a economia e comércio solidários;• assegurar acesso universal à água de qualidadecomo direito humano básico de todaa população e sua preservação, e ampliaçãodos processos de captação de água das chuvaspara consumo humano e produção nosemi-árido;• promover um processo participativo de revitalizaçãoda bacia do rio São Francisco esuspender de imediato sua transposição.A íntegra da declaração está disponível em:.


194 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008também participou da III CNSAN. Segundo o religioso, a III CNSAN foipreparada com mais cuidado que a anterior: “Houve avanços na metodologia e nodebate das questões específicas de grupos de risco e de minorias. Consolidou-se aluta em torno da segurança alimentar como política de Estado, com avaliaçãoe monitoramento do planejamento. Um ponto alto nessa conferência foi a presençado diretor geral da FAO [Organização das Nações Unidas para a Agriculturae Alimentação], Jacques Diouf, mostrandoa projeção internacional do Consea,que hoje serve de inspiração para outros paísese governos, com apoio da própria FAO.Opinião semelhante tem Adriano Martins,da Coordenadoria Ecumênica de Serviços(Cese): “A conferência produziu umdebate mais amadurecido, fruto de um bomprocesso de preparação nos estados. Acreditoque o grande saldo foi o que resultou dos momentos preparatórios, dos diagnósticosde insegurança alimentar em cada Estado, das discussões sobre as prioridadespara uma política local de SAN. O fato de termos um documento-baseconstruído de forma bem participativa e debatido em todos os estados tambémconsolidou e enraizou pautas comuns para a política nacional e para a implementaçãodo Sisan”.A professora Elza Franco Braga, que também integra o Consea Nacional eo Consea do Ceará, ressalta que o ponto alto da III CNSAN “foi auscultar ossegmentos organizados sobre a Losan a fim de comprometê-los com a regulamentaçãodo Sisan. Nesse sentido, ficou evidente a responsabilidade do governoe das diferentes instâncias do Consea (nacional, estadual e municipal), bemcomo de outras instituições que, sintonizadas como os princípios da SAN,possam integrar o sistema”.Representante da Associação Brasileira de Nutrição no Consea e professorade Saúde Pública do curso de Nutrição da Universidade Federal de Pernambuco,Sonia Lucena aponta dois destaques da III CNSAN: “A Losan como pontoPonto alto na III CNSAN foi a presençade Jacques Diouf, mostrando aprojeção internacional do Consea, umainspiração para outros países


democracia se faz com participação | 195focal das discussões e a elaboração de propostas voltadas para a construção doSistema de SAN”. Tal como Ana Lucia Pereira e Edmar Gadelha, Sonia tambémressalta a participação de diferentes segmentos sociais (indígenas, quilombolas,religiões de raízes africanas, entre outros) como um avanço. Para ela,o fato de a SAN ser ainda um tema novo para alguns segmentos, a construçãode consensos foi uma dificuldade: “Nada insuperável, mas tomou muito tempoe poderíamos ter avançado mais. Talvez a dificuldade real tenha ocorrido antesda sua realização: conseguir, em alguns estados, mobilizar a população, realizaras conferências e escolher delegados comprometidos com a causa”.


196 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Entrevista especialRenato MalufUm dos objetivos da Losan foi a criação do Sistema Nacional de SegurançaAlimentar e Nutricional, o Sisan. Embora a Losan tenha estabelecido definições,princípios, diretrizes e composição do Sisan, cabe ao Consea e à CâmaraInterministerial de Segurança Alimentar e Nutricional direcionar as ações doSistema, cujas diretrizes são “a promoção da intersetorialidade das políticas,programas e ações governamentais e não-governamentais; a descentralizaçãodas ações e articulação, em regime de colaboração, entre as esferas de governo;o monitoramento da situação alimentar e nutricional, visando subsidiar o ciclode gestão das políticas para a área nas diferentes esferas de governo; a conjugaçãode medidas diretas e imediatas de garantia de acesso à alimentação adequada,com ações que ampliem a capacidade de subsistência autônoma da população;a articulação entre orçamento e gestão e o estímulo ao desenvolvimento depesquisas e à capacitação de recursos humanos”.Nesta entrevista, Renato Maluf, atual presidente do Consea (seu mandatovai até 2009), revela em que fase está o Sisan e faz uma análise da participaçãoda sociedade civil organizada nessa conquista: “Uma boa novidade dos últimosanos está no fato de ter havido um grande crescimento de entidades e setoressociais que se envolvem no tema. Hoje, já é possível dizer que é um tema presente


uma onda de cidadania | 197num conjunto de entidades das mais diversas atuações, dos mais diversos segmentos dossetores da sociedade. O Consea é uma expressão disso”. Um dos fundadores do FórumBrasileiro de Segurança Alimentar e Nutricional, Renato também é professor do Programade Pós-graduação de Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedadeda Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (CPDA/UFRRJ).O que é o Sisan?Renato Maluf – O Sisan, Sistema Nacionalde Segurança Alimentar e Nutricional,é uma proposta de organização daspolíticas públicas relacionadas com segurançaalimentar e nutricional de uma formasistêmica, semelhante em alguns aspectosa outros sistemas de políticas públicasque temos no Brasil como o SUS, na saúde,e o Sisnam, no meio ambiente. Mas o Sisané um modelo peculiar e diferenciado emrelação aos demais pela sua pretensão deser um sistema intersetorial.Acreditamos que, para promover a segurançaalimentar e nutricional, é precisoenvolver políticas que enfrentem as múltiplasdimensões da questão alimentar enutricional. O Sisan ainda está em fase deconstrução, mas é possível dizer que aconcepção adotada é a de um sistema quedialoga e interage com outros sistemas deuma maneira constitutiva. A intersetorialidadeé constitutiva do Sisan, ou seja, elearticula ações que dizem respeito ao sistemade saúde, ao aspecto de atendimentode alimentação e nutrição, ações que dizemrespeito à agricultura familiar e reformaagrária, ao meio ambiente, à assistênciasocial, à educação. Todas são áreas de políticasque têm seus sistemas. Então, oSisan vai exigir um diálogo. É uma condiçãocomplexa.Como surgiu a proposta de criação doSisan?Renato Maluf – Existe uma origem conceituale uma origem política. Em relaçãoao conceito, chegamos à conclusão de queo enfoque da segurança militar deve sersistêmico. Nossa realidade é sistêmica. Oque estamos fazendo é apreender essa realidadeusando um instrumental de umaabordagem sistêmica. As ações de saúdeguardam relação e dialogam com educação,por exemplo. As ações de política socialigualmente guardam relação com emprego


198 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008e renda. O sistema, além de ter interdependênciados seus componentes, envolvealgum grau de coordenação entre essescomponentes. Politicamente, o Sisan surgiuporque no Brasil, assim como em outrospaíses, avançou-se nessa concepção de sistemasde políticas públicas. Então, eu diriaque o Sisan tem essas duas raízes, duas origens.Uma origem conceitual, de uma compreensãoda segurança alimentar como sendointersetorial e que exige a construção deprogramas integrados, portanto, intersetorialidadeigual a interdependência. Construçãointegrada e programas integradoscorrespondem a coordenação de ações entrediferentes áreas. E politicamente porquequeríamos avançar nessa experiênciaque o país já tem de construir sistemas depolíticas públicas. Então, é nessa direçãocaminhamos.Como está a implementação do Sisan?Quais têm sido as dificuldades?Renato Maluf – Existem dificuldadespolíticas e dificuldades de compreensão.A lei orgânica é uma lei muito simples eenxuta. Isso facilitou sua aprovação, porque,quanto mais detalhada, mais exigiriaentendimento com setores diversos. Outrarazão é porque queríamos valorizar a idéiade processo. O SUS vai completar 20 anose continua em construção. Esses sistemassão processos de construção permanente.Exigem constante diálogo com setores.Precisamos ir construindo os instrumentos,implementando e revisando. Valorizaressa idéia de processo é muito importante.Não há precedente no mundo, não haviauma lei de segurança alimentar. Essa é umaidéia original nossa.Passado um ano e meio da Losan, temoso Consea localizado onde se queria,na Presidência da República. O Consea éuma das instâncias de coordenação nacionaldo Sisan. E já temos criado comuma primeira regulamentação, ainda preliminar,um outro novo componente: aCâmara Interministerial de SegurançaAlimentar e Nutricional, que ainda nãocomeçou a funcionar. Ela vai reunir os 19ministros do Consea sob a coordenaçãodo ministro Patrus Ananias. No planonacional, essa é a parte que ainda não estáconstruída. No plano estadual, já temosConseas praticamente em todos os estadose no Distrito Federal, mas num estágiomuito diverso de amadurecimento ereconhecimento. Alguns estão com umperíodo de vacância porque o decreto queos criou caducou, e o governo estadualainda não o refez. Ainda somos frágeis daesfera estadual. Esses sistemas estaduais


uma onda de cidadania | 199estão, com alguma exceção, um ou outroestado mais bem desenvolvido, aindamuito preliminares.Quais são as expectativas a médio elongo prazos?Renato Maluf – Nesse momento, o Conseaestá construindo etapas que quer vercumpridas o mais rapidamente possível.Não há dúvida de que o Consea é a forçamotriz do Sistema. Algumas coisas serãofeitas por iniciativa do governo, mas nãotenho dúvida de que são os Conseas queempurrarão a construção do sistema. Temosde divulgar para a sociedade e para osvários setores dos governos os princípiosdesse sistema. E começar a ir atrás da adesãodos setores. O Sisan não é como o SUS,que envolve obrigatoriamente o compromissode todas as esferas e participação.Nosso sistema é por adesão. Então, temosde buscar a adesão dos setores de governo.Uma adesão que será feita com base emprincípios. Isso em um horizonte de curtoa médio prazo, em termos nacionais. Noâmbito estadual, eu me satisfaria se, em umou dois anos, tivéssemos Conseas reconhecidose funcionando regularmente.Agora, isso não quer dizer que nadaacontece daqui até lá. Essa que é a história.O Sistema está sendo construído ao mesmotempo em que as ações são feitas. Então,por exemplo, o Consea deu origem a umprograma público que se tornou muito bemavaliado: o Programa de Aquisição de Alimentos.Esse é um produto concreto de umavisão intersetorial, antes mesmo de ter osistema funcionando. Outro exemplo: o governomandou para o Congresso Nacionalum projeto de lei que redefine o marcoinstitucional do programa de alimentaçãoescolar nacional, que é o maior programade alimentação escolar gratuita do mundo.Trata-se de 36 milhões de pessoas por diarecebendo alimentação escolar gratuita. Eserá estendido para o ensino médio, aumentandopara mais de 40 milhões de pessoasbeneficiadas. Essa lei incorporou todos osnossos preceitos. O Consea participou daelaboração da lei, com o enfoque da segurançaalimentar na alimentação escolar. Se oCongresso apreciar rapidamente essa lei eaprová-la, o presidente Lula vai sancioná-la,e ela entrará em vigor imediatamente. Essaé uma construção típica do Sistema.Estamos agora discutindo a políticanacional de alimentação e nutrição com oMinistério da Saúde. Se tivermos êxito, essapolítica sairá fortalecida provavelmentecom um projeto semelhante ao da alimentaçãoescolar. Então, tudo isso mostra que,embora a construção do Sistema seja gra-


200 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008dativa na sua institucionalidade e na interaçãoentre seus componentes, não significaque, ao longo deste período, não tenhamosações concretas acontecendo.Como a sociedade civil organizadapode colaborar com o Sisan?Renato Maluf – Na nossa concepção,uma política de segurança alimentar precisa,além da intersetorialidade, da participaçãosocial nas políticas públicas. Umaboa novidade dos últimos anos está nofato de ter havido um grande crescimentode entidades e setores sociais que se envolvemno tema. Hoje, já é possível dizer queesse é um tema presente num conjunto deentidades das mais diversas atuações, dosmais diversos segmentos dos setores dasociedade. Uma expressão disso é o Consea,que talvez seja um dos conselhos mais diversos,de composição mais diversa emtermos sociais, étnicos, regionais, justamentepor causa desse envolvimento crescente.As conferências também mostraramisso. Outro dado relacionado é queestamos conseguindo difundir no Brasil,de forma bastante generalizada, o enfoquedo direito humano à alimentação. São essesos elementos que me fazem pensar que épossível conseguir uma boa mobilizaçãosocial, tanto para a realização do sistemacomo para a aprovação da emenda constitucionalque transforma o direito à alimentaçãoem um direito constitucional.A mobilização visando ao sistema já éfeita e ela depende muito de capacitação.A sociedade civil, nessa área como emoutras, carece de capacitação tanto temática,específica sobre o tema, como capacitaçãosobre a questão mais geral do queé participar de política pública. Isso não éuma coisa óbvia. É difícil. Exige um esforçopor parte do representante de um setorem sair da lógica da demanda específica,do seu projeto, para uma lógica de política.Nesse caso, o desafio principal está na capacitaçãodessas representações dos conselhos.E também em uma boa pressão sobreos governos para conseguir o reconhecimentodessa participação como legítimana definição das políticas.Outra questão relacionada à mobilizaçãoé a PEC [proposta de emenda constitucional]do direito humano à alimentação.Há quase dez anos, tramitam no Congressoemendas que visam incorporar aalimentação no artigo 6º da Constituição,onde são definidos os direitos fundamentaisde todo cidadão brasileiro. Nesse momento,queremos divulgar e tornar públicaessa questão para mobilizar a sociedade e,justamente, conseguir que a PEC tramite.


uma onda de cidadania | 201Se for aprovada, a incorporação nos direitosprevistos pela Constituição torna a nossaquestão uma regulamentação de um direitoconstitucional. Então, a Lei Orgânica deSegurança Alimentar e Nutricional, que éuma lei ordinária, passa a ser uma lei queregulamenta um direito previsto na Constituição.Passaríamos a outro patamar. Passaríamosa ter um estatuto parecido com asaúde, com a educação.Como atual presidente do Consea, porfavor, aponte os desafios no campo dasegurança alimentar.Renato Maluf – O mais importante éque a segurança alimentar e nutricionalse torne uma questão de Estado, e não degoverno. A alternância de governos é umacoisa saudável para a democracia, mas cadagoverno tem suas prioridades. Não gostariade que a segurança alimentar ficasse ao sabordas opções de cada governo. Ela tem de serpermanente. Por isso, o desafio da aprovaçãoda PEC é importante, pelo aspectode dar permanência ao tema. Mas acho queo desafio principal é a construção do sistemae da política nacional. Nós ainda nãochegamos lá. Como eu disse, existem algumaspeças que estão sendo montadas, masainda não conseguimos a construção dessapolítica que seja capaz de reunir mais setoresenvolvidos, compartilhar objetivos, sobretudocompartilhar orçamento.Você pode ler maisAs entrevistas citadas neste livro estãodisponíveis integralmente no endereço.Acesse e deixe seu comentário!


202 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Um conviteà reflexãoPara que este livro pudesse se tornar uma realidade, houve um grande empenhopara colher o maior número possível de depoimentos. Por correio eletrônico e portelefone, mais de cem pessoas foram contatadas. Como parte desses depoimentos,solicitamos que essas mesmas pessoas refletissem sobre as seguintes questões:“Quais são os desafios para a mobilização social hoje? Como aumentar e fortalecera participação cidadã?”.Nosso propósito foi reunir, a partir de um grupo tão diverso e ao mesmo tempotão identificado com a construção de uma sociedade mais justa, indicações decomo manter viva e estimular ainda mais a prática da democracia participativa. Essematerial revelou-se tão significativo que optamos por apresentá-lo em destaque eem conjunto, nas páginas a seguir. Não deixe de conferir a íntegra das entrevistasno endereço .


democracia se faz com participação | 203Adriano MartinsSociólogo, assessor de projetos da Coordenadoria Ecumênica de Serviços (Cese)Percebo certo desencanto com a política disseminado na sociedade, bemcomo uma rápida desagregação dos laços societários, das relações de vizinhança,da identidade de classe. Essa falta de horizonte utópico e delaços que favoreçam a mobilização e as lutas sociais são preocupantes.Comecei minha militância em Porto Alegre num outro momento, deascensão dos movimentos sociais e de uma maior politização da juventude.Nesse período, tive os primeiros contatos com o movimento contraa carestia, com o nascente movimento dos sem-terra, com os movimentossindical e estudantil ainda vigorosos. Também nesse momento, conheciautores fundamentais para minha formação: Josué de Castro, Celso Furtado,Sérgio Buarque de Holanda e Marilena Chaui.Sinto que hoje faltam espaços de formação e engajamento políticopara a juventude. Os partidos políticos em geral estão muito atrelados àlógica eleitoral, reduzindo muito sua capacidade de dialogar e agregar osprocessos sociais mais interessantes e renovadores existentes.Ao mesmo tempo, temos um processo muito interessante de afirmaçãode identidades, de conquista de espaços por parte de comunidades tradicionais,de povos indígenas, de grupos sociais até então invisibilizados.Creio que uma forma de contribuir é apostar nos processos de formação,na criação de espaços para sistematização e intercâmbio de experiências,no apoio ao fortalecimento institucional das organizações nascentes.Creio que a criação de espaços como os fóruns e redes, bem como osespaços de diálogo e concertação a exemplo do Consea, pode contribuirmuito para potencializar e qualificar a mobilização social.


204 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Alcir CalliariEx-presidente do Banco do BrasilPara aumentar e fortalecer a participação cidadã é preciso credibilidade,apartidarismo, inclusão, continuidade e ética.Aldenôra Pereira SilvaPastoral da CriançaDeve haver uma atuação articulada e unida entre as diversas organizaçõese a descentralização e o controle do poder. Só assim podemos construirum outro mundo possível. Precisamos acreditar no trabalho em rede, respeitandoas especificidades das organizações.Só podemos chegar ao fortalecimento da participação cidadã comtrês importantes caminhos: 1°) informação; 2°) formação; e 3°) organização.Os três possibilitam a mudança, a transformação e a libertação.Ariovaldo Ramos dos SantosPastorEsse é um desafio sempre presente e um aprendizado. Penso que a mobilizaçãosocial, hoje, passa por uma reforma político-eleitoral que dêfim ao sistema proporcional, substituindo-o por, no mínimo, um sistemadistrital misto, que torne possível o direito de veto, uma vez que, por ora,só temos a obrigação do voto. Temos de repensar o presidencialismo eredefinir o quadro partidário, de modo a haver partidos que façam jus aoconceito. E, por fim, avançar na democracia participativa, de modo quea noção de nação seja implementada.Ana Lúcia PereiraAgentes de Pastoral Negros do BrasilO desafio para a mobilização social hoje é a definição de uma agenda comumpara o movimento social. O combate à fome e a luta em prol da terra


democracia se faz com participação | 205deveriam ser uma agenda comum, mas infelizmente não são. A única formade aumentar e fortalecer a participação cidadã é garantir o acesso à informação.Temos que investir na educação básica e na formação política.Anna Maria T. Medeiros PelianoSocióloga, pesquisadora e coordenadora de Estudos de Responsabilidade Social do Institutode Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea)A descentralização das políticas sociais e a disseminação dos conselhossão instrumentos fundamentais para garantir a participação da sociedadecivil e o controle das políticas públicas. A instituição de conselhos depolíticas públicas que contam com a presença de representantes governamentaise de organizações da sociedade civil prevista na Constituiçãobrasileira é uma forma de oficializar a participação da sociedade civil. Asconferências nacionais, que foram tão estimuladas pelo governo Lula,também representam um espaço importante de participação.Mas penso que há muita coisa a ser repensada nesse campo. Porexemplo, para que os municípios pequenos possam cumprir toda a legislaçãovigente, teriam de ter uns 15 conselhos diferentes. Não me pareceviável. A questão da representatividade da sociedade civil nos conselhosprecisa ser rediscutida. É necessário também capacitar a sociedade civilpara participar desses espaços, ou isso fica prejudicado por falta de informações.Como controlar, por exemplo, um orçamento público sem dominarminimamente as informações? É preciso investir muito ainda emtransparência de dados e informações para que a participação da sociedadepossa ser efetiva. E, nesse campo, os meios de comunicação podemdar uma contribuição fundamental.É necessário ampliar o debate sobre o papel da sociedade nas políticaspúblicas que não deveria ser apenas cobrar, mas também agir. Era esse oespírito do movimento da Ação da Cidadania. Para exigir mais e melhoros seus direitos, é preciso que os cidadãos pensem nos seus deveres e


206 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008façam a sua parte. É necessário assumir essa responsabilidade. O Brasilavançou muito, mas ainda há muito que caminhar.Brizabel RochaPresidente da Fundação de Assistência Social e Cidadania da Prefeitura de Porto AlegreNunca foi tão atual essa luta. Entraremos numa nova década de fomeem plena modernidade. Estamos sem estoques de alimentos no mundoe, ainda, inflacionando seus preços. O desafio é recomeçarmos onde paramos,uma mobilização geral, agora em favor do mundo subdesenvolvido.O Brasil tem o que ensinar, refazer a própria lição de casa e passar essalição para o planeta.Carlos LopesSubsecretário geral da ONU e diretor geral da UnitarO Brasil é um laboratório de experiências únicas de participação social.É penoso ver que essas experiências são fragmentadas e, muitas vezes,não têm continuidade por causa da forma como o sistema político estáestruturado. Seria bom que se desse um jeito de obrigar candidatos acargos públicos a assumir o compromisso, antes de eles conquistarem opoder, de não mudar ganhos de participação.Cândido GrzybowskiSociólogo, diretor geral do IbaseA verdade é que ainda há muitos “invisíveis”, sem identidade e sem voz.Suas questões e visões não qualificam a democratização brasileira. O desafioé voltar às bases e promover a emergência de uma nova onda democratizadora.Uma onda que seja capaz de questionar o modelo de desenvolvimentoconcentrador de riquezas, socialmente excludente e destruidor dopatrimônio comum natural. Algo que realmente promova a democraciainclusiva, a justiça social na diversidade e a sustentabilidade.


democracia se faz com participação | 207Celso JapiassuConsultor de marketing e comunicaçãoPara se mobilizar a sociedade, são necessários temas que chamem dramaticamentea sua atenção e sobre os quais não exista forte oposição. Casocontrário, tratar-se-ia apenas de criar o debate sobre certos temas e provocara geração de correntes de opinião contraditórias. Naquele tempo,havia ainda o fator favorável de a sociedade já se encontrar mobilizada evitoriosa pelo impeachment de Fernando Collor e, portanto, receptiva alevar adiante um movimento maior, tendo como objetivo lutar contra amiséria e melhorar o país.Chico WhitakerEx-secretário executivo da CBJP/CNBB, integrante do Conselho Internacional do FórumSocial MundialA mobilização social e a participação cidadã no Brasil enfrentam hoje umproblema de sempre – a pequena proporção de cidadãos ativos ante a massados passivos e dos que nem sabem que têm direitos – e um problema conjuntural:a eleição de um governo de bases populares que se propôs a“mudar” o Brasil, mas enveredou pela opção do crescimento econômicoa qualquer preço, cooptando ao mesmo tempo as lideranças dos movimentossociais. Teremos de passar ainda por uma fase de crítica maisradical do atual sistema de poder e de autonomização da sociedade civil,para que esta retome sua capacidade de reivindicação, pressão e denúncia,rumo a um controle mais rigoroso do poder público e a uma capacidadeprópria de ação transformadora.Conceição ContinSecretária executiva do COEP ParanáSegundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), adistribuição mais igualitária da renda, a erradicação da pobreza e a ele-


208 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008vação dos níveis de renda da população em geral constituem grandesdesafios. E, diante da complexidade de cada um deles, é preciso deixarclaro que não há soluções simples e isoladas. Para superá-los, impõe-seum conjunto de iniciativas. No âmbito econômico, é fundamental promoverum modelo de desenvolvimento que propicie a combinação de crescimentocom geração de ocupação e renda, possibilitando a inserção da populaçãono mercado de trabalho e a melhora da qualidade dessa inserção.No político, é preciso não apenas ampliar os mecanismos de participaçãosocial, mas, sobretudo, garantir que sejam canais efetivos de valorização eempoderamento da população em geral. Também, no tocante às políticassociais, entre as ações que podem contribuir para reduzir a desigualdadee erradicar a pobreza, destacam-se a aceleração da reforma agrária, aampliação da previdência, da assistência social e das transferências de renda,a elevação dos padrões de educação e o combate às discriminaçõesraciais e de gênero.Edmar GadelhaIntegrante da coordenação do FBSANAcredito que trabalhar com causas seja um caminho. No Fórum Brasileirode Segurança Alimentar e Nutricional, estabelecemos estratégiasde trabalhar políticas mais setoriais, entre elas a alimentação escolar. Osestudos demonstram que uma parte grande da população brasileira temna alimentação escolar uma maneira importante de acesso à alimentação.Então, optamos por melhorar esse programa. Já existem propostasque melhoram e estendem esse programa a alunos do ensino médio.Essa é uma possibilidade de mobilização forte. Outra discussão compotencial para mobilização é a que trata da alimentação saudável e adequada,tendo em vista os problemas decorrentes da má alimentação.


democracia se faz com participação | 209Denise PaivaEx-assessora do presidente Itamar FrancoPenso que é fortalecer os mecanismos já institucionalizados de participaçãonos conselhos e, também, certas conquistas históricas que são osfóruns, os comitês, as redes, enfim, todos os mecanismos que permitemdiálogo, cooperação, maximizam os resultados dos esforços do governo eda sociedade e os consolidam como algo integrado.Precisam ser urgentemente superados os padrões – às vezes muitoconflitivos, em outras de passividade ou cooptação – que vigem nos conselhosparitários previstos em lei, como, por exemplo, no Estatuto daCriança e Adolescente.Penso que as lições do Consea, da I CNSA, da Ação da Cidadania edo COEP poderiam ajudar no aumento, no fortalecimento e na efetividadeda participação da cidadania brasileira na nossa política social.Elza Franco BragaProfessora da Universidade Federal do CearáDesenvolver estratégias que instituam/alarguem o processo de mobilizaçãonos setores mais excluídos, nas instituições de ensino (universidades,escolas de educação básica), nas organizações de trabalhadores rurais eurbanos, nos sindicatos de profissionais relacionados com a SAN, entreoutros. É também fundamental um maior comprometimento das esferasdo parlamento e do judiciário em relação à consecução do direito humanoà alimentação. Nesse sentido, vamos ampliando o arco de aliados para quenão somente se aprove o projeto de emenda constitucional que reconheceesse direito humano à alimentação adequada, mas também que se estabeleçamas condições institucionais ao seu efetivo cumprimento.Ao falarmos de mobilização, é impossível deixar de registrar o papelda Rede Nacional de Mobilização Social do COEP, que, desde 2003,vem criando parcerias, articulando entidades e devolvendo inúmeros


210 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008projetos socioeducativos na perspectiva de construir uma cidadania ativaem centenas de comunidades espalhadas em todas as regiões do país. Aolongo dos últimos 15 anos, a Rede COEP vem se consolidando e deixandomarcas significativas na construção de um país mais justo e solidário.Enid RochaPesquisadora do Ipea e conselheira do ConandaA participação social no Brasil, entendida como a participação da sociedadenas decisões do Estado, ampliou-se muito nos últimos anos. Desde2003, com a assunção da atual força política no poder, houve, de fato, aampliação de espaços públicos no âmbito da esfera pública federal coma criação de novos conselhos de políticas públicas e com a realização demais de 40 conferências nacionais, inclusive aquelas que versaram sobretemas nunca tratados anteriormente em fóruns nacionais dessa natureza,como igualdade racial, economia solidária, igualdade de gênero, direito doidoso, direito da pessoa com deficiência, juventude etc. Além disso, é dignade nota, dada a sua importância na transparência e no controle social, aampliação de espaços de prestação de contas do governo para a sociedadee de acolhimento das sugestões e reclamos do cidadão comum, como asouvidorias, que hoje existem em praticamente todos os órgãos da administraçãopública federal, e a criação de mecanismos como a CorregedoriaGeral da União e o desenvolvimento do Portal da Transparência (http://www.portaltransparencia.gov.br), disseminando, em todos os rincões doBrasil, a forma e o conteúdo da utilização dos recursos públicos.No entanto, apesar da ampliação quantitativa da participação social,penso que é necessário, tanto ao governo como à sociedade, preparar-separa dar o salto qualitativo. Isto é, investir na capacitação humana paraa participação com qualidade nos inúmeros espaços públicos existentes,investir em arranjos burocráticos de participação social que sejam mais


democracia se faz com participação | 211ágeis e democráticos para tornar, de fato, o Estado mais permeável àssugestões e às reivindicações da sociedade civil.Flavio ValenteSecretário geral da Fian Internacional, ex-assessor do Consea (governo Itamar Franco)Acho que o principal eixo da mobilização social, hoje, tem de estar nofortalecimento dos mecanismos de cobrança que garantam que o Estadodefina claramente, de forma transparente e participativa, por meio deampla divulgação, como as prioridades políticas serão transformadas emações, com recursos orçamentários garantidos e com definição clara demetas, cronograma de cumprimento e responsabilidades institucionaisdas diferentes estruturas públicas para que isso aconteça.Somente dessa forma, poderemos passar de uma luta caso a caso paraa consolidação de mecanismos públicos de fácil acesso a que os habitantesdo território brasileiro possam recorrer quando sintam que seus direitosnão estão sendo garantidos.Em suma, temos de sair da cultura do favor para entrar em umacultura do direito, na qual a sociedade, representada pelo Estado, assumacoletivamente suas obrigações, enquanto estado de direito, garantindo acriação das condições para que cada um dos brasileiros e brasileiras possaexercer e usufruir da plenitude de sua cidadania e, ao mesmo tempo, assumirsuas responsabilidades para consigo mesmo, sua família e para comsua comunidade.Francisco MenezesDiretor do Ibase, ex-presidente do Consea (governo Lula)Essa é uma questão extremamente importante. Precisamos refletir comocontinuar avançando dentro de um contexto que já não é o mesmo quenos educamos para trabalhar. Precisamos nos renovar e nos atualizar.


212 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Não é mais suficiente dizer o que não queremos e ficar esperando quealgo tire o país das redes do atraso social. Precisamos ser propositivos:esse é o desafio. Todas as organizações que pretendem incidir de fato emudar a realidade precisam cada vez mais saber, de forma clara, qual é aproposta que pode levar ao avanço.Quando nos seguramos em posições muito rígidas, estamos demonstrandodificuldades nesse sentido. Muitas vezes, a sociedade civil organizadacontinua a seguir a mesma prática de tempos atrás – e que foi muitonecessária –, originária do período da ditadura militar. Nosso lema era:resistir, resistir e resistir. Precisamos continuar resistindo sim, mas precisamospropor e avançar. Nesse sentido, a experiência dos conselhos e dasconferências tem sido muito útil. Todo o processo da Conferência daJuventude, que ocorreu em maio de 2008, por exemplo, mobilizou pertode 1 milhão de jovens. Imagine o que significa essa quantidade de jovensdiscutindo políticas públicas! Os resultados não são tão imediatos, masque sementes estão sendo plantadas para o futuro? São possibilidadesmuito ricas. Temos de nos cobrar, nós da sociedade civil organizada, medidase propostas para combater as desigualdades e mudar o país. Issodesafia nossa inteligência. É o grande passo a ser dado agora.Frei BettoFrade dominicano, escritor e educador popularHoje, o desafio é lutar em duas frentes para reativar a mobilização social:nas classes populares, por meio de pedagogias libertárias capazes de organizá-lase mobilizá-las, e na mídia, pois é ela que lida com o nossoimaginário e, portanto, detém o poder de mobilizar ou desmobilizar.


democracia se faz com participação | 213Irene LimaSecretária executiva do COEP CearáCom expansão ilimitada, muitas redes representam, hoje, importantesinstrumentos de organização, articulação e mobilização social. Porém, aspessoas continuam esbarrando nas questões educacionais e burocráticas,que deveriam servir como chaves para um processo de mobilização e comunicaçãosocial, pois existe uma grande necessidade de coletivização,dos direitos e deveres dos cidadãos, dentro da própria comunidade emque habita, que ainda não são respeitados.A visão de mundo dessa coletividade é bastante prejudicada pelafalta de conhecimento coletivo, desrespeito às diferenças regionais, políticasincorretas e falta de líderes, como o Betinho, que venham mobilizara sociedade civil, de forma mais ativa, e façam que a população se insiranos processos criados pelas diversas instâncias governamentais e sociais,aprenda a conhecer e buscar seus direitos (a população pobre os desconhece)e os defenda como forma de crescimento e desenvolvimento.Um grande desafio é causado pelas mudanças nas formas de vidacoletiva, advindas do intenso desenvolvimento dos meios de comunicação,que levam o formato da comunidade a um eterno processo, gerando dificuldadese constrangimentos, exigindo dos movimentos sociais, atençãopara novos modos e formas comunicativas, que possam não apenas darvisibilidade às principais dificuldades de mobilização social, mas venhaalcançar um ambiente de cooperação intercomunidades, transcenda oespaço local e alcance novos horizontes.A complexidade da vida atual exige a criação de outras formas demobilização das pessoas. O desafio é fazer que os meios de comunicaçãocolaborem mais intensamente com a educação, com o conhecimento e aconsciência coletiva, levando o cidadão comum a aprender, apreendernovos conhecimentos e se desenvolver.


214 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008A cada desafio enfrentado novos surgirão. O importante é estar atentoe colaborar, por meio de fóruns, seminários e debates, com a mobilizaçãocoletiva de novos agentes e formadores de opinião.Jorge Eduardo DurãoSociólogo, diretor da FaseOs principais desafios hoje dizem respeito à construção de novas referênciaspolíticas ante a dissolução do bloco político e social que se convencionouchamar de “campo democrático e popular”. Com o governoLula e os limites que se evidenciaram do processo de mudanças que sehavia gestado nas décadas anteriores, os movimentos sociais enfrentamo desafio de reafirmar a sua autonomia em relação ao Estado e aos partidos,atualizando as suas agendas. Uma questão central nesse processo éa disputa entre modelos de desenvolvimento atualmente recolocada naordem do dia.José RibamarIntegrante do Consea Maranhão e do Consea NacionalO resgate da cidadania, por meio da construção de sistemas estaduais emunicipais de Sisan, e a construção de uma política intersetorial, por meioda política de implantação dos Territórios da Cidadania, com o devidofortalecimento do controle social e empoderamento da sociedade civil.Julio Sergio MoreiraEx-presidente da ChesfO nosso grande desafio é não nos deixar levar pela acomodação dosprogramas sociais. Chegamos à ampliação desses programas, particularmentenos estados mais pobres, e isso tem sido fundamental para a elevaçãoda qualidade de vida, da auto-estima das populações mais carentes.Por outro lado, há certa acomodação, aquilo que, no passado, chamávamos


democracia se faz com participação | 215da convivência com os princípios do Consenso de Washington, que sãopolíticas liberalizantes na economia associadas às políticas de amortecimentoda pobreza. Os programas sociais são relevantes, mas são claramenteinsuficientes para levar ao desenvolvimento das pessoas e das comunidades,que, afinal é objetivo maior do país. E mais: eles correm orisco de gerar um efeito de “anestesia social”. Como sairmos das políticasde compensação social, que serão sempre necessárias, e transformá-lasem ritos de passagem, em instrumentos para a libertação, para fazer comque as pessoas sejam agentes de sua própria mudança? Como deixar dedar o peixe àqueles que deveriam ser ensinados a pescar? E aí há outrogrande trabalho a ser feito: a melhoria radical da educação. O programaBolsa-Escola ampliou o acesso das crianças às salas de aula, mas agora épreciso concentrar esforços na qualidade do ensino, sobretudo o dosmais pobres, das regiões mais atrasadas, que mais precisam desse instrumental.Além de enfrentar essas questões, é necessário pensar em comolevar sustentabilidade aos beneficiários do Bolsa Família, como estimularo auto-emprego por meio do empreendedorismo, como criar oportunidadesde inclusão econômica e produtiva. Acredito que esse é o grandedesafio que aumentará e fortalecerá a participação do cidadão.Leonardo BoffTeólogo e escritorA mobilização social, hoje, deve se articular sobre dois eixos: o local e oglobal. O local é sempre urgente, pois trata dos problemas concretos, ligadosà sobrevivência, à questão da fome, do trabalho, da terra, da saúde, dasegurança e de uma forma mais avançada de democracia de cunho popular.A global deve considerar aquilo que está afetando todos e vai seagravar daqui em diante: a devastação crescente da natureza pela voracidadedo capital mundialmente integrado; o aquecimento, que poderámodificar todos os projetos de desenvolvimento (crescimento), afetando


216 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008milhões de pessoas e criando cenários políticos dramáticos para a humanidade;e, especialmente, a escassez de água potável (só 0,7% dela é acessívelpara consumo humano e animal), que vai gerar conflitos para garantir acessoa ela e produzir milhões de emigrados econômicos. Mais e mais se fazurgente uma governança mundial, quer dizer, articulações de poder quevisem à totalidade da humanidade e ao cuidado necessário para preservaros recursos escassos da natureza a fim de que sejam acessíveis a toda ahumanidade, e não apenas àqueles de detêm o poder de matar. Antevejocenários dramáticos para os próximos anos, com enfrentamentos perigososentre os povos, porque milhões e milhões de pessoas ameaçadasem suas existências não aceitarão o veredicto de morte sobre elas. Lutarãopara não morrer e para encontrar um lugar dentro da única casa comumque lhes é negado por aquela pequena porção da humanidade – apenas20% – que prefere passar por cima de cadáveres humanos e de cinzas danatureza a renunciar a seus privilégios. Apesar disso, creio que o sofrimentoque sentimos não é um sofrimento de morte, mas de um novoparto, de uma humanidade mais sensível e respeitosa diante da herançaque recebemos do universo e de Deus e que deve ser participada portodos e legada enriquecida àqueles que vierem depois de nós.Luciene BurlandyProfessora da Universidade Federal FluminenseSão vários, desde as dificuldades cotidianas de tempo até os embatesentre diferentes enfoques, que, por vezes, imobilizam os movimentos; osdesafios em congregar questões mais gerais com demandas pontuais; acorrelação de forças que, por vezes, ameaça os participantes; a compreensãodas instituições às quais os participantes estão vinculados, que, porvezes, dificulta a própria liberação de seus integrantes para participaremde movimentos supra-setoriais.


democracia se faz com participação | 217Luiz Fernando LevyPresidente do Grupo Gazeta MercantilHoje existe uma consciência da parte do empresariado das suas responsabilidadessociais e existe disposição de participar cada vez mais. Porém, épreciso projetos concretos para a quantificação dos recursos necessários.Precisamos abrir a discussão para a sociedade em geral, para identificaçãodos esforços a serem efetivados, e chamar mais pela responsabilidadesocial do que por apelos emocionais.Malaquias Batista FilhoPesquisador da Universidade Federal de PernambucoEm vez de uma resposta teórica, prefiro uma solução empírica. Porexemplo, reunir 15 ou 20 projetos ou iniciativas bem-sucedidas que possamrepresentar uma massa crítica de experiências para uma boa análise.Os ensinamentos dessa análise poderiam oferecer um guia básico deprocedimentos para a mobilização social e a “participação cidadã” nosprogramas e, mais que isso, nas políticas de segurança alimentar.Maria Luisa MendonçaJornalista e membro da Rede Social de Justiça e Direitos HumanosÉ um momento difícil para os movimentos sociais no Brasil. Há grandeconfusão ideológica e divisões políticas. Mesmo assim, os movimentoscamponeses continuam combativos na defesa de seus direitos básicos,apesar de sofrerem forte repressão. As políticas do governo brasileiro estãona contramão de outros processos de avanço de lutas sociais na AméricaLatina, como no caso da Venezuela, da Bolívia e do Equador, países emque o poder público promove a conscientização da sociedade. Apesardas dificuldades, esses países optaram por um caminho soberano em relaçãoaos interesses dominantes.


218 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Matias Martinho LenzSecretário executivo da Conferência dos Provinciais Jesuítas da América LatinaCreio que é necessário fomentar a organização autogerida de pequenosprodutores, artesãos e prestadores de serviços, dentro de um sistema cooperativadoe com visão de sustentabilidade econômica e ambiental. Outrocaminho é desconcentrar a propriedade, a renda e as oportunidades detrabalho produtivo, fomentando o empreendorismo social. Também épreciso combater a tendência de concentração das riquezas e da renda eas leis que favorecem a concentração e os privilégios (por exemplo, poruma reforma fiscal socialmente justa) e promover um modelo de desenvolvimentoparticipativo, socialmente justo e ecologicamente sustentável.Cito ainda a responsabilidade social das empresas, real e efetiva, incluindotoda a questão ambiental, com controle público sobre dispêndiose resultados.Miguel DarcyDiretor da Comunitas, ex-integrante do Conselho do Comunidade SolidáriaAprofundar o entendimento sobre o significado e o potencial de três tendênciasemergentes na sociedade: o surgimento de uma camada crescentede cidadãos capazes de pensar pela própria cabeça, fazer escolhas e influirsobre as questões que afetam sua vida e o futuro da sociedade; o fortalecimentode uma opinião pública informada e independente; e o papel dasnovas tecnologias na ampliação dos espaços de debate e colaboração emrede em torno de questões de interesse público. Essas três tendências sãoinerentes a sociedades abertas e complexas onde os padrões de organizaçãovertical cedem gradualmente lugar a padrões colaborativos de interação.


democracia se faz com participação | 219Moema MirandaAntropóloga, coordenadora do IbaseNo Brasil, diferentemente do que aconteceu em muitos países nos quaisos partidos de esquerda definiam as ações dos movimentos, temos umpartido político que incorporou muitas das demandas dos movimentossociais. Muitas das bandeiras de lutas que vieram desde a AssembléiaConstituinte tiveram seu auge com a eleição do governo Lula, mas tenhoa sensação de que a forma como o governo Lula vem se realizando acabougerando certa desmobilização.Antes da eleição do Lula, a perspectiva de mobilização social era fazerum questionamento mais radical de uma ordem que produz incessantementemiséria, desigualdade e injustiça. Mesmo quando há umamudança na qualidade de vida dos mais pobres, se essa mudança não forestrutural, é apenas uma circunstância, que corre o risco de acabar comum vento mais forte. Quando uma pesquisa mostra que 58% da populaçãoacha o governo Lula ótimo, é como se dissessem que esse é o máximoque podemos alcançar, como se bastasse estar um pouco melhor do queera antes. Fica a sensação de que uma pequena melhora é tudo de melhorque podemos ter.Creio, então, que o principal desafio é reconstruir a confiança na possibilidadede transformação. É fazer brotar no imaginário coletivo aconvicção de que outro mundo é possível, é factível e que se faz com anossa participação e nosso envolvimento. Esse desafio passa por vencero descrédito de que uma transformação mais radical é possível.Murilo FloresAgrônomo e doutor em sociologia política, presidente da Epagri-SCÉ preciso fazer com que as pessoas voltem a acreditar que são fundamentaisa ação organizada, a mobilização social e a solidariedade. Que nãocabe mais ficar apenas esperando a ação do poder público. Se não temos


220 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008mais entre nós pessoas como Betinho, que fascinava as pessoas com a suafala, precisamos construir estratégias baseadas na ampla participação, cadavez mais exigindo que os projetos tenham o aval e a participação da população.A transparência e a persistência são essenciais neste momento.Nádia RebouçasPublicitáriaApesar de termos conseguido um grande avanço na mobilização cidadã,os desafios ainda são muito grandes. As empresas aumentam sua participação,mas ainda engatinham em colocar responsabilidade social nassuas estratégias de negócio. Não se discute somente para o futuro asações de investimento social privado ou a filantropia, mas sim efetivamenteconstruir empresas que, além do lucro, gerem lucros sociais. Issoé difícil porque exige um amadurecimento dos executivos, uma compreensãode novos paradigmas que afeta diretamente a forma de operar.Significa um engenheiro pensar na dona de casa da comunidade. Significater uma visão sistêmica dos problemas sociais, econômicos, educacionaise culturais. Estamos num momento de “mudança da cabeça” da civilizaçãoatual. Pensar sistemicamente é perceber que tudo o que fazemosafeta todos, que a existência de 850 milhões de seres humanos vivendona Idade Média não pode não ter significado para todos nós. Não farábem ao planeta ou para nossas vidas. Significa também que, para transformarconsciências, é necessário percebermos que a tecnologia promoveua comunicação e que ela precisa ser vista como oportunidade para educarpara a cidadania. Imprensa, entretenimento, propaganda estão semprecriando estilos de vida e crenças.Quais são os valores que conscientemente escolhemos para nossomundo? Isso sem contar que o planeta grita por socorro e respeito enquantonós resistimos a perceber que há uma revolução de atitudes a serrealizada. O planeta caminha, só que precisamos de senso de urgência e


democracia se faz com participação | 221a volta para valores humanitários. Respeito a tudo que tem vida. Os governostêm enormes problemas de gestão, um primarismo no trato com acomunicação, a ausência de pesquisas de como a comunicação pode funcionarcom eficiência quando vende idéias. Sabemos vender sabonete, asempresas têm muito dinheiro para pesquisar, mas nada disso é feito paraa comunicação da dengue, da Aids, da gravidez na adolescência, o protagonismoetc. Vivemos prisioneiros de nossas grades e das atitudes violentasque deixamos serem anunciadas ao longo de um século. Triste século,em que avançamos tanto, com tanta tecnologia, e nos esquecemos do quetem vida, do valor da vida. Todos temos muito que avançar. Nas nossasvidas pessoais e profissionais. Sou otimista porque vejo a transformaçãoocorrer no dia-a-dia do meu trabalho. A comunicação estratégica, planejadadentro e para fora das empresas é cada vez mais compreendidacomo ferramenta para construir uma massa crítica, ou seja, uma quantidadetal de atores sociais transformados que nos possibilite olhar e vernovos habitantes no planeta, todos privilegiando a paz e a harmonia.Naidison de Quintella BaptistaSecretário executivo do Movimento de Organização ComunitáriaDepois da eleição de Lula, reina uma grande confusão conceitual queimpede maiores e mais fortes mobilizações e que se enraízam em váriosaspectos. Nós, integrantes dos movimentos, somos responsáveis emgrande parte pela eleição de Lula e, por isso, nos consideramos partícipese parte do governo. Ao nos depararmos com falhas nos princípios decondução do governo e de suas opções de ação, ficamos numa encruzilhadamuito difícil: denunciamos e damos munição à oposição que querinviabilizar o governo, ou buscamos corrigir por dentro, o que dificilmenteacontece? O governo, por seu lado, assume posturas ditatoriais etotalitárias: só é parceiro quem diz amém. Quem critica é inimigo. Issose torna evidente a cada dia. O governo dificulta o diálogo e, quando o


222 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008pratica, não é de modo sério, porque os acordos não são cumpridos.Muitos movimentos, por terem acesso a mais recursos, se tornaram cooptadose não têm mais capacidade crítica. Isso tem gerado inseguranças,omissões, falta de mobilizações. Temos de ampliar o debate e a reflexãosobre o papel da sociedade civil, sobre sua função crítica, sobre seu papelde vanguarda.Nathalie BeghinEx-pesquisadora do Ipea, assessora de advocacy da Oxfam InternacionalEm meados da década de 1990, as experiências da Ação Cidadania e doConsea se desfizeram. Muitas das energias hibernaram e, depois, voltaramcom a eleição do presidente Lula e a (re)instalação do Consea, em 2003.Outras foram direcionadas, por exemplo, para promover a reforma agrária,para combater o livre-comércio em mobilizações em torno do questionamentoaos acordos da Organização Mundial do Comercio (OMC) eda rejeição à criação da Área de Livre-Comércio das Américas (Alca).É indiscutível que, nesses últimos 15 anos, a democracia, nas suasdimensões representativa e participativa, vem se consolidando no Brasil.Após a ratificação do estado de direito na Constituição Federal de 1988,além de eleições legítimas e regulares, o país vem conhecendo alternânciapolítica no poder. Desde então, assistimos à emergência de uma sociedadecivil pujante, composta dos mais diversos sujeitos sociais, comnovos e vibrantes movimentos sociais, alargando e fortalecendo o tecidosocial e a capacidade de intervenção de uma cidadania ativa na afirmaçãoe na conquista de direitos. Ao mesmo tempo, foi sendo moldada umainstitucionalidade política do estado de direito para desmontar as estruturasda ditadura militar e criar condições para a participação democrática.Foi, por isso, um extraordinário processo de reconquista de liberdadese de instituições democráticas, de construção de espaços de participaçãoe concertação política (isto é, conferências, conselhos, fóruns, comitês e


democracia se faz com participação | 223comissões), de formulação de demandas de inclusão econômica e cultural,de maior justiça social e de mudanças profundas.No entanto, começam a ficar claros os sinais de esgotamento desseciclo de democratização. Os recentes escândalos envolvendo o Estado,nos seus três poderes, em um enorme esquema de corrupção e de manipulaçãoda coisa pública, bem como o aguçamento das práticas de nepotismo,de fisiologismo e de clientelismo, acentuam a descrença generalizadana eficácia das instituições governamentais. Os partidos políticostambém entraram em crise: reduziu-se sua capacidade de unificar ossetores sociais e, ao mesmo tempo, de orientar o Estado e articular aspolíticas governamentais.Para além dessa crise da democracia representativa, há uma outra questão:os limites da própria onda portadora de democracia, incapaz de irmuito à frente de um modelo formal e de desafiar e transformar o poder,a estrutura, as relações, os processos e as políticas em que se baseia asociedade e o seu desenvolvimento econômico. Como resultado, o Brasilcontinua sendo uma economia emergente e um poder ascendente nageopolítica do mundo, mas que se alimenta na manutenção da exclusãoe da desigualdade social, no sexismo, na homofobia, no racismo, na violênciae num sistemático extrativismo do patrimônio natural de que édotado o país. A democracia brasileira, apesar de enormes ganhos, aindanão consegue garantir o acesso de todos aos direitos humanos e produziruma base econômica justa, solidária e sustentável, nem um poder políticomais participativo, mais cidadão.Paulo BussMédico sanitarista, presidente da Fundação Oswaldo CruzDevemos batalhar para que todas as políticas sociais governamentaistenham controle social, o que só se consegue com ampla mobilizaçãosocial e participação cidadã. Contudo, não devemos nem banalizar, nem


224 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008burocratizar tal processo. A proliferação de conselhos é um risco, poiscontribui para a fragmentação do próprio movimento social. Daí quetenho pensado e proposto que discutamos a alternativa de conselhos dedesenvolvimento social, com componentes setoriais, de tal forma queevitemos, no movimento social, a fragmentação que freqüentemente severifica nas políticas públicas em todas as esferas de governo.Percival CaropresoPublicitárioHá uma consciência crescente das necessidades sociais, da necessidadede todos construirmos uma sociedade mais justa e equilibrada, sustentável.Também há uma cobrança crescente muito forte para que cada umde nós faça a sua parte, tenha uma atuação social. Também há uma ofertacada vez maior de caminhos de engajamento e participação sociais. Ouseja, em linguagem de marketing, a realidade está aí na nossa cara: hámercado consumidor, há demanda e há oferta.Só que a necessidade de transformações sociais efetivas é maior emais premente, mais séria, do que qualquer necessidade de consumo.Acredito no varejo social local, com visão estratégica abrangente. Comoacontece com uma marca global, respeitada e admirada no mundo todo,mas que, na hora do “vamos ver”, é vendida no armazém de cada esquina.Se a comunidade local não se mobilizar, os resultados não serão efetivos.A consciência política transformadora nasce a partir de uma visão estratégicamacro, mas a mobilização rola mesmo é na paróquia, lá na ponta final.Plínio de Arruda SampaioEx-deputado federalApós o ataque terrorista aos Estados Unidos, a conjuntura mundial enacional tornou-se extremamente adversa aos movimentos populares, demodo que as mobilizações sociais perderam vigor. Esse é um dos problemas


democracia se faz com participação | 225mais sérios que temos pela frente. Só poderemos vencê-lo com uma propostacorajosa de ruptura com o sistema de dominação.Renato MalufPresidente do ConseaPrimeiramente, precisamos de uma boa construção de agenda. A sociedadebrasileira e, portanto, os movimentos sociais nela presentes sãomuito diversos; felizmente é assim. A construção de uma agenda que dêconta dessa diversidade é um grande desafio. Acho que um caminhopara se fazer emergir essa agenda seria por meio das várias redes sociais,idealmente, com base em algumas referências unificadoras que promovessemo diálogo entre as várias mobilizações. Mas sei que isso não ésimples. A sociedade brasileira é uma sociedade tão insuportavelmentedesigual que o enfrentamento da desigualdade poderia ser um tema quenos unisse. No nosso campo, acho que estamos contribuindo para aconstrução de uma forte referência de segurança alimentar e nutricional,na qual são múltiplos os temas a serem pensados.Mais importante, é preciso encontrar maneiras para que a mobilizaçãosocial seja conduzida para incidir sobre as políticas públicas, sobre oformato e atuação do Estado brasileiro. Sinto que, às vezes, o termo“mobilização social” é utilizado apenas com o sentido de mobilizar bonssentimentos, sentido importante mas limitado. Como se mobilizar significasse,no caso da fome, incentivar pessoas para que façam doações. Éimportante uma mobilização que ensine política, que ensine a maneirade atuação do Estado, que leve à participação cidadã.Alguns costumam sintetizar esse tipo de agenda em um projeto depaís, mas suspeito desse tipo de formulação. Sou um pouco mais modestonisso. Certamente, é possível falar em projeto de país no singular, porém,apenas em seus contornos gerais, sem incorrer no erro de imaginar umavisão homogênea. É preciso comportar a diversidade. Assim, mesmo


226 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008sem concordar inteiramente com a idéia de um projeto de país, acreditoque a construção da agenda a que me refiro deve expressar o país que agente quer, uma construção plural. É fundamental que essa agenda e,portanto, a expressão do país que se quer sejam capazes de dar espaçosuficiente para os setores subalternos da sociedade. E esse subalternoprecisa ser tão amplo quanto é ampla a desigualdade do Brasil.Outra questão é quanto à qualificação da mobilização e da participaçãosocial, que depende, em parte, de políticas públicas pelo lado da educação e,em outra parte, depende de nós mesmos, membros da sociedade, de sermoscapazes de implementar atividades que qualifiquem essa participação.Em suma, precisamos construir uma agenda que valorize a discussãodo país que se quer. Portanto, que vá além de demandas setoriais, emboraelas sejam bastante legítimas. Precisamos também de uma melhor qualificaçãodessa participação. Por fim, é importante evitar que o Brasil se deixerender a uma propensão muito comum aos grandes países que é ficarolhando o seu próprio umbigo. Trata-se de uma visão pobre e provinciana.No campo internacional, temos tanto a aprender como a ensinar.Ronaldo Coutinho GarciaTécnico do Ipea, secretário de Articulação Institucional e Parcerias do Ministério doDesenvolvimento Social e Combate à FomeSão desafios a falta de bandeiras e idéias-força que apontem para um projetode mudanças ou um projeto nacional de desenvolvimento, a fragilidadedos partidos políticos que não conseguem elaborar um projeto para o país,a segmentação da ação do governo, o papel imbecilizador da mídia.Selvino HeckEx-coordenador da Rede de Educação CidadãA mobilização social hoje não pode restringir-se a conquistar os direitosbásicos como o direito à alimentação, ainda não definitivamente asseguradoa todos os brasileiros e todas as brasileiras.


democracia se faz com participação | 227É preciso conquistar o direito à cidadania e à participação democráticae livre todos os dias. É preciso, principalmente, mobilizar a sociedadecontra a exclusão social e a concentração de renda. A desigualdade econômicae social é hoje o principal problema brasileiro, do qual derivama fome, a miséria, a falta de renda, a impossibilidade da auto-sustentaçãodos que não têm emprego e trabalho, embora tenham ocorrido avançosnos últimos anos, especialmente no governo Lula.Além disso, os valores principais e mais cultuados na sociedade brasileiranão levam à solidariedade, à justiça, ao respeito à diferença. Sãovalores de mercadorização de tudo, do afeto ao corpo, do sentimento aoespírito. Ligar o problema material e de sustentação física ao espiritual eà beleza talvez seja o grande desafio do Brasil e do mundo de hoje. Paraisso, é preciso envolver as crianças, os jovens, as escolas, as comunidades,as igrejas, num grande mutirão que torne o Brasil justo e solidário.Isso precisa ser feito numa espécie de mutirão, com trabalho conscientee voluntário de milhares e milhões, com consciência dos valores aserem vividos e tornados estruturantes na sociedade brasileira. Não é oesforço de um dia ou de um ano, mas de anos, de décadas, de uma vidainteira. Para isso, governos e sociedade precisam atuar em parceria, buscandoobjetivos comuns, que não são os do lucro sem limites, do acúmulode riqueza sem freios, da ganância, do poder antidemocrático. A luta porjustiça, por uma sociedade sem discriminações, por igualdade social fazparte desse esforço comum e coletivo, não só brasileiro mais mundial, desuperação da fome, da miséria, e da construção de um Brasil e de mundodemocrático, justo, igualitário.Sergio HaddadDiretor da ONG Ação EducativaO grande desafio é dar conseqüência à percepção sobre os limites danossa precária e recente democracia representativa, realizando uma reformapolítica e uma mudança na prática dos partidos. Ao mesmo tempo, é


228 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008necessário fortalecer o trabalho político na base da sociedade, produzindoforça de mobilização e participação social que permita, de fato, uma mudançasignificativa e sustentável no caminho de uma sociedade mais justa,democrática e que cuide dos seus bens naturais.Silvio Caccia BavaDiretor do Instituto PólisPrecisamos trabalhar os requisitos para a participação das representaçõescoletivas da cidadania: transparência nas decisões do governo e no manejodo orçamento público; construção por parte do governo de indicadoresde resultados; financiamento da participação, no sentido de produção deconhecimento que permita processos de monitoramento e avaliação independentespor parte da sociedade civil; e preparação dos momentos dereunião com documentos e informações relativas à pauta de cada reuniãorepassados para os participantes com a devida antecedência para que sepreparem para as discussões.Sonia LucenaProfessora de Saúde Pública da Universidade Federal de PernambucoA sociedade está um pouco decepcionada e descrente das promessas de mudançaspropostas e não concretizadas. Além disso, os mecanismos de apoioaos atores que participam do controle social em regiões mais pobres do Brasilsão incipientes. Ainda há muita pressão e ameaças aos conselhos que tentammoralizar as políticas públicas. Os gestores não têm nenhum interesse emmelhorar suas ações em função das demandas apontadas pelos conselhos.Por fim, alguns partidos políticos que assumem o poder, ao convidarmuitos militantes para assumir cargos de gestão, não os prepararam paraserem representantes do poder. Isso cria confusão e desânimo nas pessoasque participam da mobilização.


democracia se faz com participação | 229Tânia BacelarProfessora da Universidade Federal de PernambucoO triste papel da grande mídia, confundindo mais que esclarecendo,prejudica a mobilização social. A vitória de Lula e a perplexidade dasorganizações da sociedade civil em lidar com um governo que saiu desua luta também atrapalharam. A cobertura quase universal aos maispobres tirou o tema da fome agônica da agenda. Fica a fome crônica,mais difícil de estimular grandes mobilizações.Walter BelikProfessor do Instituto de Economia da UnicampSão vários os desafios, e todos eles decorrem da falta de tradição, participaçãoe das práticas autoritárias e personalistas existentes em nossasorganizações sociais. O primeiro passo é democratizar os movimentossociais, abrindo espaços de participação (não partidária, ideológica oureligiosa) a quem quiser participar. Hoje, os principais movimentos sociais,que tiveram uma presença marcante na história brasileira, estãoburocratizados, emperrados e vivem de privilégios e benefícios sociaispara os seus integrantes. Eu me refiro especificamente ao movimentoestudantil e movimento sindical. Temos de abrir essas estruturas dandovoz àqueles que querem participar e mantêm a sua indignação com oBrasil injusto e desigual em que ainda vivemos.E você? Que desafios aponta para a mobilização social?Como aumentar a participação cidadã?Acesse www.coepbrasil.org.br/cidadaniaemrede e dê sua opinião.


230 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008bilizarTecer a rede,mobilizar o BrasilUm rico levantamento de redes e fóruns que atuam nos mais diversos temassociais está nas páginas a seguir. São 39 diferentes organizações que têm emcomum o combate à pobreza e o fortalecimento da participação cidadã comouns de seus eixos de atuação. Além desse direcionamento, não houve nenhumtipo de seleção por região, tema ou mesmo proximidade com o COEP e/ou suasorganizações associadas. Por meio desse levantamento, pretende-se ampliar apossibilidade de interação das diversas agendas de mobilização social.As informações foram apuradas em dezenas de páginas da internet e enviadasa cada rede ou fórum listado para que as confirmasse ou revisasse. Apenas as queresponderam com essas informações até o dia 1º de julho de 2008 puderam serincluídas neste livro. Outras, no entanto, ainda podem ajudar a “tecer a rede”.Visite www.coepbrasil.org.br/cidadaniaemrede e saiba como incluir outras organizaçõesnesse mapeamento.


democracia se faz com participação | 2311 – Articulação Nacionalde Agroecologia (ANA)www.agroecologia.org.brRua da Candelária, 9 / 6º andarCentroRio de Janeiro – RJCEP 20091-020Tel.: (21) 2253-8317 (r. 242)Fax: (21) 2233-8363E-mail: secretaria.ana@agroecologia.org.brEixosSegurança alimentar e nutricionalDesenvolvimento comunitário e geração de trabalho e rendaParticipação social e políticas públicasComunicação e informaçãoObjetivos gerais e estratégiasA ANA é um espaço de convergência de movimentos, redes, organizações e experiênciasque trabalham na promoção da agroecologia nos diferentes biomas brasileiros. Articulainiciativas da sociedade civil na construção de um novo modelo de desenvolvimentoecológico e democrático, promovendo a agroecologia como alternativa para asustentabilidade da produção familiar.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãPromoção da agroecologia como alternativa para a sustentabilidade da produção familiare como parte de um novo modelo de desenvolvimento ecológico e democrático para asociedade brasileira.Favorece a ampliação e a intensificação dos fluxos de informação e intercâmbio entreas experiências concretas e as dinâmicas coletivas de inovação agroecológica e dedesenvolvimento local, integrando o esforço coletivo dos movimentos sociais e das redeslocais e regionais.Âmbito / região em que atuaNacionalOrganizações que fazem parteMovimentos, redes e organizações da sociedade civil envolvidas em experiências concretasde promoção da agroecologia e do desenvolvimento rural sustentável em diferentes regiõese biomas do Brasil.2 – Articulação no Semi-Árido Brasileiro(ASA)www.asabrasil.org.brRua Nicarágua, 111Bairro EspinheiroRecife – PECEP 52020-190Tel.: (81) 2121-7666Fax: (81) 2121-7629E-mail: asacom@asabrasil.org.brEixosDireitos sociaisSegurança alimentar e nutricionalDesenvolvimento comunitário e geração de trabalho e rendaParticipação social e políticas públicasComunicação e informaçãoPopulações específicasObjetivos gerais e estratégiasAtua na promoção e na implementação de políticas públicas adequadas à região, por meiodos seguintes eixos: promoção da agricultura familiar de base agroecológica, valorização doconhecimento dos agricultores e agricultoras, respeito às relações eqüitativas de gênero edemocratização do acesso à terra e à água.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãGerenciamento dos programas Um Milhão de Cisternas (P1MC) e Uma Terra e Duas Águas (P1+2).


232 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Âmbito / região em que atuaSemi-árido brasileiro, que abrange 11 estados (nove estados do Nordeste, Minas Gerais eEspírito Santo).Organizações que fazem parte750 entidades dos mais diversos segmentos, como igrejas católicas e evangélicas, ONGs dedesenvolvimento e ambientalistas, associações de trabalhadores(as) rurais e urbanos(as),associações comunitárias, sindicatos e federações de trabalhadores(as) rurais.3 – Assembléia Popular: Mutirão por umNovo Brasilwww.assembleiapopular.com.brRua Abolição, 227, 2º andarBela VistaSão Paulo – SPCEP 01319-010Tel.: (11) 3112-1524Fax: (11) 3105-9702E-mail: assembleiapopular@terra.com.brEixosDireitos sociaisParticipação social e políticas públicasObjetivos gerais e estratégiasÉ um espaço de construção de idéias coletivas por meio da prática democrática,participativa e de decisões vividas nas bases.A Assembléia Popular é representativa de várias entidades, pastorais e movimentos sociais.Expressa a vontade do povo de participar na elaboração de propostas políticas que definemo futuro do país.A Assembléia Popular quer ser uma prática de democracia participativa, construída emtodos os níveis (local, regional, estadual e nacional).Pretende garantir uma forma democrática de organização da vida social, com base naAssembléia Popular, propiciar ao povo informações e estimular a participação.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãÉ um processo de articulação e organização de várias campanhas, redes e movimentos emâmbito nacional, por meio de diversas campanhas: plebiscito sobre a dívida externa (2000)e auditoria cidadã contra a Alca (2002); campanha pela nulidade do leilão da Cia. Vale doRio Doce (2007); campanha contra a transposição do rio São Francisco; campanha pelaredução da tarifa de energia e com a articulação do Grito dos Excluídos, entre outras redese campanhas, para construir o poder popular no local. Construir o poder popular a partir daslutas e da organização em cada estado, discutindo “O município que temos e o municípioque queremos”, o “Brasil que temos e o Brasil que queremos”, sem que esse processosubstituía qualquer iniciativa, mas que possa somar-se e fortalecer-se em mutirão.Âmbito / região em que atuaLocal, estadual, regional e nacionalOrganizações que fazem parteAssembléia Popular de diversos estados (AC, AM, AP, BA, CE, DF, GO, MA, MG, MS, MT,PA, PB, PE, PI, PR, RN, RS, SC e SP), CPT Nacional, ENFF/Sence, Grito dos Excluídos,Intersindical, MAB Nacional, Políticas Alternativas para o Cone Sul (Pacs), Pastorais Sociaisda CNBB, Pastoral dos Migrantes, Rede Brasil sobre Instituições Financeiras Multilaterais,Jubileu Sul Brasil, Grito dos Excluídos Continental, Sindicato dos Bancários de Mato Grosso,


democracia se faz com participação | 233Jornal Brasil de Fato, Conlutas, Comitê Mineiro, SindSaúde/MG, CDDH/MS, MTD Nacional,Andes, Abong, Cáritas Brasileira, Ibrades/CNBB, Consulta Popular, Pastoral da Juventude,Recid, Intervozes, Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Marcha Mundialdas Mulheres, Pastoral da Mulher Marginalizada, Feab, Estudantes de Filosofia, Inesc,Sindicato dos Advogados SP, Cimi, Pastoral Operária Nacional, Pastoral Carcerária, RedeSocial, Sindpetro de Nova Friburgo, Via Campesina, Fé e Política, MPA, Evangélicos pelaJustiça, Adital, ENEEnF, Contraponto, Denem, Rebrip, Luta por Moradia, Fórum Nacional pelaReforma Agrária, CEBs MT, Comitê FSM de Minas Gerais, AMB, Resistência e Luta-Hip Hop DF,Brigadas Populares MG, CRB MT, MMC, Associação Cultural dos Povos Indígenas, Renap,Tyguas, Comitê da Campanha contra a Transposição do Rio São Francisco – BA.4 – Associação Brasileira de OrganizaçõesNão Governamentais (Abong)www.abong.org.brRua General Jardim, 660 / 7º andarVila BuarqueSão Paulo – SPCEP 01223-010Telefax: (11) 3237-2122E-mail: abong@uol.com.brEixosDireitos sociaisSegurança alimentar e nutricionalDesenvolvimento comunitário e geração de trabalho e rendaParticipação social e políticas públicasComunicação e informaçãoPopulações específicasObjetivos gerais e estratégiasConsolidar a identidade das ONGs brasileiras, promovendo o intercâmbio entre entidadesque buscam a ampliação da cidadania, a constituição e expansão de direitos, justiça sociale a consolidação de uma democracia participativa.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãSão alguns dos objetivos da Abong: promover o intercâmbio entre entidades que buscama ampliação da cidadania, a constituição e expansão de direitos, a justiça social e aconsolidação de uma democracia participativa; combater todas as formas de discriminação;ser um instrumento de promoção em âmbitos nacional e internacional das contribuiçõesdas ONGs ante os desafios do desenvolvimento e da superação da pobreza.Entre outros, são compromissos da Abong e de suas associadas:- buscar e defender alternativas de desenvolvimento humano e sustentável que considerema eqüidade, a justiça social e o equilíbrio ambiental para as presentes e futuras gerações;- lutar pela erradicação da miséria e da pobreza e colocar-se contra políticas quecontribuam para reproduzir desigualdades de gênero, sociais, étnicas e geracionais;- lutar pelos direitos humanos, que são uma conquista fundamental da humanidade, quetem o direito, coletiva e individualmente, de exercê-los e ampliá-los;- afirmar seu compromisso com o fortalecimento da sociedade civil, defendendo asoberania popular, a cidadania e o pluralismo político, étnico, racial, de gênero e deorientação sexual.Âmbito / região em que atuaRegional, nacional e internacionalOrganizações que fazem parte270 organizações não-governamentais.


234 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 20085 – Associação Brasileira deOrganizações da Agricultura Familiar eEmpreendimentos no Comércio Justo eEconomia Solidária – Rede Ecojus Brasilwww.nordestecerrado.com.br/ecojus-brasilTel.: (49) 3323-1908 / 9997-0436E-mail: dj.de.biasi@hotmail.comEixosSegurança alimentar e nutricionalDesenvolvimento comunitário e geração de trabalho e rendaComunicação e informaçãoObjetivos gerais e estratégiasFomentar o intercâmbio de experiências e informações sobre economia solidáriae agricultura familiar. Incentivar o comércio justo por meio da cooperação entreempreendimentos articulados.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãParticipação na construção do Sistema Brasileiro de Comércio Justo e Solidário e nosSistemas Participativos de Garantia.Âmbito / região em que atuaNacionalOrganizações que fazem parte120 empreendimentos de diferentes cadeias produtivas nas cinco regiões do Brasil.6 – Associação Cultural de Preservação doPatrimônio Bantu (Acbantu)www.acbantu.org.brRua João de Deus, 17 – Térreo 3Centro Histórico PelourinhoSalvador – BACEP 40026-250Tel.: (71) 3321-5135E-mail: acbantu@acbantu.org.brEixosDireitos sociaisSegurança alimentar e nutricionalDesenvolvimento comunitário e geração de trabalho e rendaParticipação social e políticas públicasComunicação e informaçãoPopulações específicasObjetivos gerais e estratégiasUnir pessoas e grupos para o engrandecimento do povo afrodescendente e contribuirpara o resgate das suas tradições, promovendo e incentivando ações culturais que visamà defesa e à promoção da cidadania nas áreas de educação, saúde, profissionalização,promoção social, segurança alimentar e nutricional, pesquisa de campo, registro histórico,preservação do patrimônio material e imaterial, envolvendo crianças, adolescentes e jovens,mulheres, idosos(as), pessoas com deficiência e portadores(as) de HIV/Aids.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãAtividade regular de distribuição de alimentos para 50 mil famílias em situação de fome noestado da Bahia.Realização de oficinas culturais com enfoque banto em comunidades da RegiãoMetropolitana de Salvador.Participação em seminários, conferências, cursos e palestras, abordando temas como ocandomblé das nações Angola e Congo, cultura banto, história do povo afrodescendente,cidadania, tolerância religiosa, elaboração e gestão de projetos, estudos lingüísticosquicongo, umbundo e quimbundu etc.


democracia se faz com participação | 235Participação de fóruns virtuais com entidades e associações congêneres e de pesquisa noBrasil e em países africanos.Âmbito / região em que atuaNacionalOrganizações que fazem parteCerca de 2 mil terreiros de diversas etnias, quilombos, grupos de capoeira Angola da RegiãoMetropolitana de Salvador, associações comunitárias de educação e promoção da cidadania,Associação dos Sambadores e Sambadeiras de Roda, grupos de jongo e congada etc.7 – Central do Cerradowww.centraldocerrado.org.brSCLN 202, Bloco B, Salas 101 a 104Brasília – DFCEP 70832-525Telefax: (61) 3327-8085E-mail:centraldocerrado@centraldocerrado.org.brEixosSegurança alimentar e nutricionalDesenvolvimento comunitário e geração de trabalho e rendaObjetivos gerais e estratégiasPromover a divulgação e inserção dos produtos comunitários de uso sustentável docerrado nos mercados locais, regionais e internacionais, atuando também como um centrode disseminação de informações, intercâmbio e apoio técnico para as comunidades namelhoria dos seus processos produtivos, organizacionais e de gestão.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãLigação entre produtores(as) comunitários(as) e consumidores(as), oferecendo produtos dequalidade (pequi, baru, farinha de jatobá, farinha de babaçu, buriti, mel, polpas de frutas,artesanatos, entre outros), que são coletados e processados por agricultores(as) familiares ecomunidades tradicionais no cerrado.Âmbito / região em que atuaBioma cerradoOrganizações que fazem parte21 organizações comunitárias que desenvolvem atividades produtivas a partir do usosustentável da biodiversidade do cerrado.8 – Coordenação das OrganizaçõesIndígenas da Amazônia Brasileira (Coiab)www.coiab.com.brAvenida Ayrão, 235Presidente VargasManaus – AMCEP 69025-290Tel.: (92) 3621-7501 (r. 517)Fax: (92) 3621-7501 (r. 516)E-mail: secretaria@coiab.com.brEixosDireitos sociaisParticipação social e políticas públicasComunicação e informaçãoPopulações específicasObjetivos gerais e estratégiasCriada em 1989 para ser instrumento de luta e representatividade dos povos indígenasda Amazônia brasileira pelos seus direitos (território, saúde, educação, sustentabilidade,economia e interculturalidade), articula esses povos e organizações indígenas daAmazônia Legal brasileira na luta pelos seus direitos básicos, promovendo atividades queassegurem qualidade de vida por meio de opções econômicas sustentáveis de baixo


236 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008impacto como: artesanato e comercialização de produtos indígenas com certificação, pormeio do selo indígena.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãExploração sustentável de produtos não madeireiros e de outros recursos naturais,pagamento pelos serviços ambientais prestados pelos povos e territórios indígenas, vendade cotas de seqüestro de carbono e outros.Intervenção e mobilização para aprovação do Estatuto dos Povos Indígenas, de acordo comas propostas,Pressionar o governo federal e os governos dos estados amazônicos para formulaçãode políticas públicas voltadas aos povos indígenas, tais como a criação de um banco dedados de áreas ameaçadas e de impactos ambientais, para que subsidie a Coiab e asorganizações indígenas nas tomadas de decisão.Coordenar e participar de fóruns de discussão e formulação de propostas do movimentoindígena sobre os empreendimentos (hidrelétricas, rodovias, hidrovias etc.) que afetam osterritórios indígenas e a necessidade de estratégias de sustentabilidade econômica.Fortalecer o movimento Indígena para a formação estratégica de indígenas em temasambientais e de gestão territorial, através do Centro Amazônico de Formação (Cafi),Fortalecer as formas próprias de economia indígena para a sustentabilidade dos povosindígenas e seus territórios.Âmbito / região em que atuaAtua no âmbito da Amazônia Legal brasileira, nos Estados do Acre, Rondônia, Roraima, Pará,Amapá, Mato Grosso, Amazonas, Maranhão e Tocantins.Organizações que fazem parteCerca de 170 diferentes povos indígenas e população de 410 mil pessoas comcaracterísticas particulares, que ocupam aproximadamente 110 milhões de hectares noterritório amazônico, e várias organizações representativas desses povos.9 – Fórum Brasileiro de ONGs eMovimentos Sociais para o Meio Ambientee o Desenvolvimento (FBOMS)www.fboms.org.brSCS Quadra 8, Edifício Venâncio 2000,Bloco B-50, Sala 105Brasília – DFCEP 70333-900Telefax: (61) 3033-5535E-mail: coordenafboms@fboms.org.brEixosParticipação social e políticas públicasObjetivos gerais e estratégiasFacilitar a participação da sociedade civil nas discussões de meio ambiente edesenvolvimento, firmando-se no seu papel de interlocução com atores sociais nacionaise internacionais importantes, unificando questões socioeconômicas e ambientais na buscade um desenvolvimento sustentável, com a finalidade de atingir uma sociedade mais justa,eqüitativa e ambientalmente correta.


democracia se faz com participação | 237Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãAcompanhamento e participação da implementação dos acordos da Conferência Rio-92 e seus desdobramentos por meio de seus 15 grupos de trabalho (Agenda 21, Água,Clima, Comércio e Meio Ambiente, Direito Ambiental, Energia, Florestas, Formação Políticae Educação Ambiental, Integração, Juventude, Novas Tecnologias, Políticas Públicas eColegiados Ambientais, Sociobiodiversidade, Químicos, e Turismo Sustentável), além deacompanhamento do processo legislativo e das discussões sobre projetos de lei, tais comogestão florestal, Política Nacional de Mudanças Climáticas e Biossegurança.Âmbito / região em que atuaNacional, regional e internacionalOrganizações que fazem parteCerca de 600 ONGs e movimentos sociais, redes e fóruns que discutem meio ambiente edesenvolvimento sustentável.10 – Fórum Brasileiro de SegurançaAlimentar e Nutricional (FBSAN)www.fbsan.org.brAvenida Rio Branco, 124 / 8º andarCentroRio de Janeiro – RJCEP 20148-900E-mail: secretaria@fbsan.org.brEixosDireitos sociaisSegurança alimentar e nutricionalParticipação social e políticas públicasComunicação e informaçãoObjetivos gerais e estratégiasColaborar para a formação de uma opinião pública favorável à implementação da segurançaalimentar e nutricional mobilizando a sociedade para a realização do direito humano àalimentação adequada.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãPromoção do debate no âmbito da sociedade civil sobre o tema da segurança alimentar enutricional e participação nas instâncias de formulação e implementação de políticas públicas.Âmbito / região em que atuaNacionalOrganizações que fazem parteCerca de 300 entidades, movimentos sociais da sociedade civil organizada, indivíduos einstituições que se ocupam da questão da segurança alimentar e nutricional.


238 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 200811 – Fórum de Entidades Nacionais deDireitos Humanoswww.direitos.org.brSCS – Quadra 08 – Bloco B-50 /Salas 431/441Edifício Venâncio 2000Brasília – DFCEP 70333-970Tel.: (61) 3212-0200E-mail: direitos@direitos.org.brEixosDireitos sociaisSegurança alimentar e nutricionalParticipação social e políticas públicasComunicação e informaçãoPopulações específicasObjetivos gerais e estratégiasOrganizar uma rede de comunicação que facilite a interação entre as entidadesparticipantes, bem como fomentar a participação de novos atores políticos para, cada vezmais, ampliar a participação da sociedade civil organizada e, conseqüentemente, fortalecera defesa dos direitos humanos econômicos, sociais, culturais e ambientais no Brasil.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãArticular, de forma autônoma, independente e transparente, com os poderes constituídos(Legislativo, Executivo e Judiciário), em todos os seus níveis, buscando ampliar o debate eas ações necessárias para o aperfeiçoamento do Sistema Nacional de Direitos Humanos.Âmbito / região em que atuaNacionalOrganizações que fazem parteAção Brasileira pela Nutrição e Direitos Humanos (Abrandh), Ações em Gênero, Cidadaniae Desenvolvimento (Agende), Articulação Brasileira de Lésbicas (ABL), Articulação deMulheres Brasileiras (AMB), Articulação do Semi-Árido (Asa), Associação Brasileira deOrganizações Não Governamentais (Abong), Associação Brasileira de Gays, Lésbicas eTransgêneros (ABGLT), Associação Lésbica Feminista de Brasília – Coturno de Vênus, CáritasBrasileira, Central Única dos Trabalhadores (CUT), Centro Dandara de Promotoras LegaisPopulares, Centro Feminista de Estudos e Assessoria (CFEMEA), Centro de Referência contraa Discriminação e Violência ao Homossexual (Cerconvidh-DDH-RJ), Coletivo de EntidadesNegras, Comissão Brasileira Justiça e Paz/CNBB, Comissão Nacional de Direitos Humanosda Ordem dos Advogados do Brasil, Comissão Pastoral da Terra, Comunidade Baháí,Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Conectas Direitos Humanos, ConselhoFederal da Ordem dos Advogados do Brasil, Conselho Federal de Psicologia, ConselhoIndigenista Missionário (Cimi), Conselho Nacional de Igrejas Cristãs (Conic), CoordenadoriaEcumênica de Serviços (Cese), Criola, Fala Preta! – Organização de Mulheres Negras,Federação de Órgãos para a Assistência Social e Educacional (Fase), Fundação Fé e Alegriado Brasil, Gabinete de Assessoria Jurídica a Movimentos Sociais (Gajop), Geledés - Institutoda Mulher Negra, Grupo de Apoio à Prevenção à Aids da Bahia (Gapa-BA), Instituto Brasileirode Análises Sociais e Econômicas (Ibase), Instituto de Estudos, Formação e Assessoria emPolíticas Sociais (Pólis), Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), Instituto Feministapara a Democracia – SOS Corpo, Instituto de Formação e Assessoria Sindical Rural“Sebastião Rosa da Paz” (Ifas), Instituto Paulo Freire, Instituto Socioambiental (ISA),Intervozes - Coletivo Brasil de Comunicação Social, Justiça Global, Movimento D’Ellas,Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Movimento Nacional de DireitosHumanos (MNDH), Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua (MNMMR),Observatório de Favelas, Rede de Informações para o Terceiro Setor (Rits), Rede Social deJustiça e Direitos Humanos, Somos - Comunicação, Saúde e Sexualidade, Terra de Direitos.


democracia se faz com participação | 23912 – Fórum Nacional de Defesa dosDireitos da Criança e do Adolescente(Fórum DCA)www.forumdca.org.brSAS Quadra 05, Bloco N, Lote 01, sala 221Brasília – DFCEP 70070-913Tel.: (61) 3323-6992 / 3322-6444E-mail: forumdca@forumdca.org.brEixosDireitos sociaisParticipação social e políticas públicasObjetivos gerais e estratégiasGarantir a defesa dos direitos da criança e do adolescente, monitorando não só osrepresentantes da sociedade civil no Conselho Nacional de Direitos da Criança eAdolescente (Conanda), mas também projetos de lei e orçamento público das questõesrelativas à criança e aos adolescentes no Congresso Nacional.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãMobilização e articulação dos 27 fóruns estaduais e das 53 entidades filiadas, de forma aqualificar a sociedade civil para uma atuação permanente na defesa dos direitos da criançae do adolescente.Âmbito / região em que atuaNacionalOrganizações que fazem parte27 fóruns DCAs estaduais53 entidades filiadas, das quais quatro são as atuais eleitas para o secretariado nacional(Abec-Marista, CFP, SBP e Fenatibref).13 – Fórum Nacional deParticipação Popularwww.participacaopopular.org.brSCS Quadra 08, ed. Venâncio 2000 –Entrada B-50, sala 433/443CEP 70333-970Brasília – DFTel.: (61) 3212-0200E-mail: protocoloinesc@inesc.org.brEixosDireitos sociaisParticipação social e políticas públicasObjetivos gerais e estratégiasAutonomia da sociedade civil em relação ao Estado, aos governos e aos partidos políticos.Participação cidadã no controle social das políticas públicas.Democracia participativa e direta como mecanismos de ampliação dos processosdemocráticos e da cidadania.Controle social sobre todas as esferas e instituições da democracia representativa.Diversificação das formas de diálogo entre os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e asociedade, por meio da nossa participação em espaços e arenas públicas.Democratização da economia como condição de acesso aos direitos sociais, paraenfrentamento dos mecanismos que produzem desigualdade, ou seja, como possibilidadede realização de uma economia baseada na solidariedade na sociedade.Democratização da cultura para que os direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais(Dhescas) se realizem, fortalecendo a igualdade, a liberdade de associação e as diversasidentidades que conformam distintos sujeitos políticos.


240 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Reforma do Estado, no sentido de ampliar a base democrática de controle social sobresuas ações.Resgate do sentido público das ações tanto do Estado como da sociedade civil.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãCriação de uma plataforma de ações comuns que expresse nossa diversidade.Fortalecimento dos conselhos e das conferências, da representação da sociedade civil e desua incidência nesses espaços.Fortalecimento da organização autônoma da sociedade civil em fóruns, redes e articulações.Criação de mecanismos de participação e controle social sobre as decisões da políticaeconômica.Mobilização dos diferentes sujeitos que lutam por uma sociedade democrática para produziras bases de um novo modelo de desenvolvimento, não fracionando o econômico do social.Democratização e controle social sobre os meios de comunicação.Aperfeiçoamento dos mecanismos de democracia participativa em todas as esferas degoverno, como os orçamentos participativos, conferências e conselhos.Qualificação dos instrumentos de consulta e participação direta dos cidadãos e cidadãs,como plebiscitos, referendos, projetos de lei de iniciativa popular e audiências públicas.Proposição de uma arquitetura da participação que supere a pulverização ecompartimentação dos espaços de participação e a fragmentação das políticas.Enfrentamento dos velhos problemas criticados na democracia representativa que serepetem na democracia participativa.Reformulação dos mecanismos da democracia representativa tanto em relação aoLegislativo como ao Executivo.Estabelecimento de uma relação mais orgânica com a sociedade brasileira que não seencontra organizada em estruturas associativas, o que pressupõe criar uma alternativa paraos não-incluídos.Utilizar novas metodologias, por meio de diversas linguagens, nas práticas de educaçãopara a cidadania.Âmbito / região em que atuaNacionalOrganizações que fazem parteCearah PeriferiaAssociação dos Moradores do Conjunto Residencial Samarita B – Amos


democracia se faz com participação | 241Fundação de Defesa dos Direitos Humanos Margarida Maria AlvesInstituto Pólis – Instituto de Estudos, Formação e Assessoria em Políticas SociaisConcidadania – Fórum da Cidadania de SantosCentro de Ação Cultural (Centrac)Ação Comunitária do BrasilCentro de Ação Comunitária (Cedac)Cidade – Centro de Assessoria e EstudosInstituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc)Centro de Estudos e Defesa dos Negros do Pará (Cedenpa)Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT)Centro de Cultura Professor Luiz FreireInstituto CultivaEquipe Técnica de Assessoria, Pesquisa e Ação Social (Etapas)Centro Dom Helder Câmara de Estudos e Ação Social (Cendhec)Centro Nordestino de Medicina PopularEscola de Formação Quilombo dos Palmares (Equip)Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase)Sociedade Terra Viva (STV Brasil)Fórum Popular do Orçamento do Rio de JaneiroAssociação Sedup – Serviço de Educação PopularFórum da Amazônia Oriental (Faor)CampInappEtapasInstituto CidadesCoordenação Nacional:InescInsituto PólisEquipFaorCearah Periferia – Centro de Estudos e Articulação e Referência sobre AssentamentosHumanosEtapas, representando o Fórum Nordeste de Participação PopularCentrac (como suplente da Etapas)14 – Fórum Nacional deReforma Urbana (FNRU)www.forumreformaurbana.org.brRua das Palmeiras, 90BotafogoRio de Janeiro – RJCEP 22270-070Tel.: (21) 2536.-7350E-mail: forumreformaurbana@fase.org.brEixosDireitos sociaisParticipação social e políticas públicasComunicação e informaçãoObjetivos gerais e estratégiasDisseminar e lutar pela plataforma da reforma urbana, compreendida como:direito à cidade e à cidadania;gestão democrática da cidade;e função social da cidade e da propriedade.


242 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãApoio à agenda de luta dos movimentos sociais.Constituição de grupos de trabalho para monitoramento das seguintes temáticas urbanas:habitação; conflitos fundiários urbanos e poder Judiciário; saneamento ambiental;mobilidade e transporte público; gênero e reforma urbana; implementação dos planosdiretores e regularização fundiária.Formação e qualificação de lideranças dos movimentos sociais urbanos, articuladas nosfóruns locais, regionais e no FNRU.A campanha de Olho no seu Voto tem como objetivo difundir a agenda da reforma urbanapara a sociedade e os(as) candidatos(as).Âmbito / região em que atuaNacionalOrganizações que fazem parteMovimentos populares, fóruns regionais, associações de classe, ONGs e instituiçõesacadêmicas ligadas à questão urbana. A coordenação do FNRU é composta por 26entidades, e a secretaria executiva está a cargo da Federação de Órgãos para a AssistênciaSocial e Educacional (Fase).15 – Fórum Nacional pela Democratizaçãoda Comunicação (FNDC)www.fndc.org.br/Avenida Carlos Gomes, 403/802Porto Alegre – RSCEP 90480-003Tel.: (51) 3328-1922E-mail: secretaria@fndc.org.brEixosParticipação social e políticas públicasComunicação e informaçãoObjetivos gerais e estratégiasArticular a sociedade civil, buscando o desenvolvimento e o acesso público aoconhecimento e às informações necessárias para uma compreensão da realidade das áreasdas comunicações no Brasil e no mundo.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãElaboração de formas de controle público sobre os sistemas de comunicação, de formaa orientá-los de acordo com o interesse público e a necessidade de representação dapluralidade.Âmbito / região em que atuaNacionalOrganizações que fazem parte16 entidades nacionais e 135 entidades regionais.


democracia se faz com participação | 24316 – Jubileu Sul Brasilwww.jubileubrasil.org.brRua Abolição, 227 – 2º andarBela VistaSão Paulo – SPCEP 01319-010Tel.: (11) 3112-1524Fax: (11) 3105-9702E-mail: jubileubrasil@terra.com.brEixosDireitos sociaisParticipação social e políticas públicasObjetivos gerais e estratégiasDesenvolver um movimento global pelo cancelamento e repúdio às dívidas externasinternas e exigir a reparação e restituição das dívidas ilegítimas e os imensos danos queprovoca o seu pagamento, fortalecendo a mobilização e a articulação popular e militante naluta pelas auditorias financeira, ecológica, social, cultural e históricas.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãRealização de tribunais e mobilizações sociais e populares para as auditorias. Desse modo,pretende estabelecer quem realmente deve a quem e avançar para o não-pagamento dedívidas ilegítimas.Âmbito / região em que atuaAmérica Latina e Caribe, África, Ásia e PacíficoOrganizações que fazem parteCerca de 200 movimentos sociais, organizações populares e religiosas, comunidades ecampanhas internacionais.17 – Movimento Nacional dos Catadoresde Materiais Recicláveis (MNCR)www.movimentodoscatadores.org.brRua dos Estudantes, 287LiberdadeSão Paulo – SPCEP 01505- 001Tel.: (11) 3399-3475EixosDireitos sociaisDesenvolvimento comunitário e geração de trabalho e rendaParticipação social e políticas públicasPopulações específicasObjetivos gerais e estratégiasGarantir o protagonismo popular de catadores e catadoras de materiais recicláveis, pormeio da ação direta. Dessa forma, busca transformar a realidade em que vive a categoriahoje, além de avançar na construção do poder popular.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãFormação e capacitação para o avanço na cadeia produtiva de reciclagem. Viabilização dotrabalho coletivo e solidário por meio da autogestão.Âmbito / região em que atuaNacionalOrganizações que fazem parte35 mil catadores e catadoras em todo o Brasil organizados em cooperativas, associações,entrepostos e grupos, presentes em 25 estados brasileiros.


244 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 200818 – Articulação Pacari – PlantasMedicinais do CerradoTel.: (62) 3371-1121E-mail: pacari@pacari.org.brEixosSegurança alimentar e nutricionalDesenvolvimento comunitário e geração de trabalho e rendaParticipação social e políticas públicasObjetivos gerais e estratégiasEstimular a prática da medicina popular e da segurança alimentar e nutricional. Promovero uso sustentável do bioma cerrado, visando à produção e à comercialização de produtosecossociais. Promover a valorização, a proteção e o uso de conhecimentos tradicionaisassociados à biodiversidade do bioma cerrado.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãProdução de remédios caseiros; produção de óleos vegetais fixos e essenciais de plantas docerrado para a produção de cosméticos.Âmbito / região em que atuaMinas Gerais, Tocantins, Maranhão e Goiás.Organizações que fazem parte80 grupos comunitários.19 – Rede de Articulação Nacional pelaCidadania Empresarial (ACE)R. Dona Maria César, 170 – sala 201Bairro do RecifeRecife – PECEP 50040-000Tel.: (81) 3424-9282EixosDireitos sociaisDesenvolvimento comunitário e geração de trabalho e rendaParticipação social e políticas públicasComunicação e informaçãoObjetivos gerais e estratégiasEstimular o crescimento da cidadania empresarial no país, a partir de núcleos regionais quetrabalhem articuladamente para o fomento e a qualificação da participação de empresas detodos os portes no desenvolvimento social.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãOferece mecanismos e canais de consulta, orientação, capacitação e apoio à atuação deseus núcleos regionais, visando à sensibilização, à motivação e à facilitação de políticas deresponsabilidade social das empresas (RSE), potencializando e qualificando as iniciativasexistentes e fomentando novas ações que contribuam para um desenvolvimento sustentávelda sociedade.Âmbito / região em que atuaNacionalOrganizações que fazem parteDez entidades presentes em todas as regiões do Brasil.


democracia se faz com participação | 24520 – Rede Andi Brasilwww.redeandibrasil.org.brRua Gonçalo Afonso, 55Vila MadalenaSão Paulo – SPCEP 05436-100Tel.: (11) 3819-1234E-mail: redeandibrasil@redeandibrasil.org.brEixosDireitos sociais (indireto)Segurança alimentar e nutricional (indireto)Desenvolvimento comunitário e geração de trabalho e renda (indireto)Participação social e políticas públicas (indireto)Comunicação e informação (direto)Populações específicas (indireto)Objetivos gerais e estratégiasPriorizar a infância e a adolescência na definição e na implementação de políticas públicas.Com esse objetivo, as 11 organizações da Rede Andi Brasil trabalham diariamente paraincidir o universo infanto-juvenil na agenda da mídia, pautando e qualificando notícias ereportagens sobre o tema.Organizações sociais e conselhos de defesa dos direitos infanto-juvenis também recebematenção especial da Rede na elaboração de planos de comunicação que melhorem suarelação com a mídia, dêem visibilidade ao seu trabalho e contribuam na mobilização emtorno de suas causas.Estudantes de comunicação são o terceiro público estratégico da Rede, que desenvolveprogramas de apoio a sua formação para que atuem como agentes da comunicação emobilização social.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãUma das linhas de ação é o monitoramento de mídia, com a clipagem de notícias sobreinfância e adolescência de 116 jornais e revistas.Outra linha de ação é a capacitação de organizações sociais. A Rede realiza oficinas decomunicação para organizações sociais, conselhos tutelares e conselhos de direitos e faz oacompanhamento para a realização de planos de comunicação nas organizações.Há também a mobilização de comunicadores por meio de visitas a redações, a disponibilizaçãode mais de 2 mil contatos de fontes de informação, o atendimento diário a comunicadores, e oenvio de boletins com pautas, eventos e indicação de fontes para mais de 3 mil comunicadores.Âmbito / região em que atuaNacionalOrganizações que fazem parteAgência Uga-Uga de Comunicação (AM)Agência de Notícias dos Direitos da Infância – Andi (DF)Auçuba Comunicação e Educação (PE)Catavento Comunicação e Educação (CE)Cipó Comunicação Interativa (BA)Ciranda – Central de Notícias dos Direitos da Infância e da Adolescência (PR)Girassolidário – Agência em Defesa da Infância e Adolescência (MS)Matraca – Agência de Notícias da Infância (MA)Associação Companhia Terramar (RN)Instituto Recriando (SE)Oficina de Imagens – Comunicação e Educação (MG)


246 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 200821 – Rede Arte na Escolawww.artenaescola.org.brAl. Tietê, 618, casa 3Cerqueira CésarSão Paulo – SPCEP 01417-020Tel.: (11) 3103-8088EixosParticipação social e políticas públicasPopulações específicasObjetivos gerais e estratégiasMelhorar o ensino da arte no país, qualificando professores e professoras dos níveis infantil,fundamental e médio e estimulando-os a formar jovens mais perceptivos(as), criativos(as) ecríticos(as) de sua realidade.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãDesenvolvimento, nas universidades conveniadas, de programas de educação continuadavoltados para professores(as) da rede pública de ensino. Anualmente, são beneficiados(as)cerca de 30 mil professores(as) das redes públicas brasileiras, que, por sua ação, atingemalunos(as) da educação infantil e dos ensinos fundamental e médio.Valorização do trabalho pedagógico do(a) professor(a) com projetos de qualidade no ensinodas linguagens da arte por meio do Prêmio Arte na Escola Cidadã, com ênfase na ampliaçãodo repertório dos(as) alunos(as) e no comprometimento com sua formação cultural, visandoà construção da cidadania e à transformação social.Âmbito / região em que atuaNacionalOrganizações que fazem parteUniversidades, instituições culturais e educacionais, somando 53 pólos presentes em 47cidades de 24 estados brasileiros e do Distrito Federal.22 – Rede Brasileira de Informaçãoe Documentação sobre Infância eAdolescência (Rebidia)www.rebidia.org.brRua Jacarezinho, 1.691Bairro MercêsCuritiba – ParanáCEP 80810-900Tel.: (41) 2105-0250Fax: (41) 2105-0299E-mail: rebidia@rebidia.org.bEixosDireitos sociaisSegurança alimentar e nutricionalDesenvolvimento comunitário e geração de trabalho e rendaParticipação social e políticas públicasComunicação e informaçãoPopulações específicasObjetivos gerais e estratégiasSistema descentralizado de documentação e informação sobre infância e adolescência,gerenciado por uma rede de organizações não-governamentais.A Rebidia cobre diversas áreas do conhecimento, entre elas: demografia, políticas públicas,ações sociais, educação, desenvolvimento infantil, saúde e segurança alimentar, indicadoressocioeconômicos e legislação.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãCriação de múltiplos canais de acesso à informação e à documentação, bem como promoçãoda capacitação, por meio de um processo de educação continuada dos(as) usuários(as).


democracia se faz com participação | 247Realização de cursos, seminários e outros eventos que permitem melhorar o impacto daação direcionada à solução dos problemas da infância e adolescência, por meio da ação deconselhos nas três esferas de governo.Âmbito / região em que atuaNacionalOrganizações que fazem partePastoral da Criança, com sua rede de 260 mil voluntários, presentes em 4.100 municípios;Fundação Esquel – Alternativas de Desenvolvimento Sustentável; e Fé e Alegria –Movimento de Educação Popular.23 – Rede Brasileira de Justiça Ambientalwww.justicaambiental.org.brRua das Palmeiras, 90BotafogoRio de Janeiro – RJCEP 22270-070Tel.: (21) 2536-7350Fax: (21) 2536-7379E-mail: rbja@fase.org.brEixosDireitos sociaisParticipação social e políticas públicasComunicação e informaçãoPopulações específicasObjetivos gerais e estratégiasDenunciar que a destruição do meio ambiente e dos espaços coletivos de vida e trabalhoocorrem predominantemente em locais onde vivem populações negras, indígenas ou semrecursos econômicos e fortalecer ações coletivas que possam se contrapor a esse processo.Promover o intercâmbio e a troca de experiências, de esforço analítico e elaboração deestratégias de ação entre os múltiplos atores e atrizes de lutas contra injustiças ambientais:entidades ambientalistas, sindicatos urbanos e rurais, atingidos(as) por barragens, movimentonegro, remanescentes de quilombos, trabalhadores(as) sem terra, movimentos e associaçõesde moradores(as), moradores(as) de unidades de conservação, organizações indígenas e ONGs.Aproximar pesquisadores(as) e ativistas sociais brasileiros(as) para conhecimento mútuo,encorajamento da formação de parcerias para trabalho conjunto e desenvolvimento dessaárea de atuação no Brasil.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãMapa de Conflitos Causados pelo Racismo Ambiental no BrasilGrupo de Trabalho Racismo Ambiental: reúne denúncias, promove articulações, defineestratégias, campanhas e outras ações de luta contra as injustiças ambientais que recaempredominantemente sobre grupos étnicos vulneráveis. Entre essas ações, destaca-se aconstrução do Mapa de Conflitos Causados pelo Racismo Ambiental no Brasil.Grupo de Trabalho sobre Químicos: reúne denúncias, promove articulações, define estratégias,campanhas e outras ações de luta relacionadas a impactos socioambientais, advindos dapoluição e da contaminação de trabalhadores(as) e populações expostas a riscos ambientais,sem direito de escolha, submetidos(as) a trabalhos e a ambientes precários e perigosos.


248 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Âmbito / região em que atuaNacionalOrganizações que fazem parteCerca de 60 organizações e instituições de pesquisas, entre elas Geledés, Ibase, Fase,Fiocruz, Movimento Cultura de Rua (CE), Associação de Combates aos Poluentes OrgânicosPersistentes, Associação Brasileira de Expostos ao Amianto, Instituto Terramar, Movimentodos Atingidos por Barragens, Conselho Pastoral dos Pescadores (BA) e Inesc.24 – Rede Brasileira pela Integração dosPovos (Rebrip)www.rebrip.org.brRua das Palmeiras, 90BotafogoRio de Janeiro – RJCEP 22270-070Tel.: (21) 2536-7350Fax: (21) 2536-7379EixosDireitos sociaisSegurança alimentar e nutricionalParticipação social e políticas públicasComércio internacional e integração regionalObjetivos gerais e estratégiasAtuar como pólo de articulação e divulgação de iniciativas sociais em tratados dedesregulamentação financeira e comercial, entre os quais a Organização Mundial doComércio (OMC), a Área de Livre-Comércio das Américas (Alca) e outros acordos comerciaisbilaterais e entre regiões, como o acordo Mercosul–União Européia.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãO Grupo de Trabalho em Agricultura procura monitorar e influenciar os acordos assumidospelo governo brasileiro nas rodadas de negociações comerciais agrícolas internacionais nosdiferentes blocos comerciais.O Grupo de Trabalho de Serviços, no eixo água, debate e atua na perspectiva do acesso àágua e ao saneamento ambiental para todos.O Grupo de Trabalho sobre Propriedade Intelectual, que enfatiza a discussão demedicamentos, busca alternativas para minimizar o impacto das patentes farmacêuticas noacesso aos medicamentos essenciais.O Grupo de Trabalho em Gênero busca acompanhar as negociações comerciais e osprocessos de integração regional na perspectiva de gênero, fortalecendo o papel das mulheresnesses debates e levantando os impactos do comércio internacional na vida das mulheres.Âmbito / região em que atuaNacional, com articulações regionais e internacionaisOrganizações que fazem parteCerca de 50 organizações, articulações e movimentos sociais, entre eles CUT, Abia, Inesc,Action Aid Brasil, Dieese, Fase, MST, Fetraf e Contag.


democracia se faz com participação | 24925 – Rede Cerradowww.redecerrado.org.brSCLN 114 – Bl. B – sala 104Brasília – DFCEP 70764-510Tel.: (61) 3274-7789E-mail: contato@redecerrado.org.brEixosSegurança alimentar e nutricionalDesenvolvimento comunitário e geração de trabalho e rendaObjetivos gerais e estratégiasIncentivar e promover a troca de experiências e informações entre as instituições, visandoconciliar eqüidade social, conservação ambiental e desenvolvimento.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãRealizar ações de defesa e promoção dos ecossistemas do cerrado e de suas populaçõeshumanas, incentivando o diálogo entre as instituições civis e os governos municipais,estaduais e federal, em prol da promoção de ações e do aperfeiçoamento de instrumentosde gestão pública que conservem a diversidade biológica, social e cultural, e induzir asustentabilidade do desenvolvimento no cerrado.Âmbito / região em que atuaRegião do cerradoOrganizações que fazem parteCerca de 300 entidades identificadas com a causa socioambiental no cerrado, querepresentam trabalhadores(as) rurais, extrativistas, indígenas, quilombolas, quebradeiras decoco, pescadores, integrantes de ONGs etc.26 – Rede de Ação e Informação peloDireito a se Alimentar (Fian Brasil)www.fianbrasil.org.brRua 19, n o 35 - Ed. Dom Abel1º andar, sala 3CentroGoiânia – GOCEP 74030-090Tel.: (62) 3092-4611E-mail: fian@fianbrasil.org.brEixosDireitos sociaisSegurança alimentar e nutricionalComunicação e informaçãoObjetivos gerais e estratégiasAtuar em âmbito mundial pelo direito a se alimentar, divulgando, no debate público,que uma grande parte da fome e da desnutrição atual não é resultado da escassez dealimentação ou limitação geral de recursos, mas conseqüência de violações do direitohumano a se alimentar.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãCriação de procedimentos na esfera internacional, como meio para o melhoramento darealização do direito a se alimentar em países individuais. Junto com outras organizações, aFian participa da construção de uma cultura de direitos humanos, na qual os direitos sociais,econômicos e cultuais se encontrem em pé de igualdade com os direitos civis e políticos.Âmbito / região em que atuaMundialOrganizações que fazem parteRepresentantes individuais de 60 países de todos os continentes.


250 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 200827 – Rede de Agendas 21 Locaiswww.redeagenda21local.org.brEixosParticipação social e políticas públicasObjetivos gerais e estratégiasPromover a integração e o intercâmbio de informações/experiências e o fortalecimento dosprocessos de elaboração e implementação de Agendas 21 Locais em todas as cinco regiõesdo país.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãFormulação e implementação de políticas públicas, por meio de metodologia participativa,que produza um plano de ação para o alcance de um cenário de futuro desejávelpela comunidade local e que leve em consideração a análise das vulnerabilidades epotencialidades de sua base econômica, social, cultural e ambiental.Âmbito / região em que atuaNacionalOrganizações que fazem parte153 entidades e organizações da sociedade civil.28 – Rede de Comercializaçãodo Território de ItaparicaRua Horácio Ferraz, 46Floresta – PECEP 56400-000Tel.: (87) 9632-6173E-mail: coopercaprifloresta@yahoo.com.brEixosDireitos sociaisSegurança alimentar e nutricionalDesenvolvimento comunitário e geração de trabalho e rendaParticipação social e políticas públicasComunicação e informaçãoPopulações específicasObjetivos gerais e estratégiasComercializar e estimular a produção agrícola, fomentando e preservando 15 mil hectaresirrigados, com grande produção de frutas tropicais e potencial para a produção orgânica.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãComercialização de ovinocaprinos e derivados, frutas tropicais, mel, peixes e hortaliçasorgânicas.Âmbito / região em que atuaBahia e PernambucoOrganizações que fazem parte50 cooperativas, sindicatos, ONGs e organizações governamentais de acompanhamento eassistência técnica.


democracia se faz com participação | 25129 – Rede de CooperaçãoAlternativa (RCA)www.rcabrasil.blogspot.comSHCN CL QD 210 Bl. C sala 215Brasília – DFCEP 70862-530Tel.: (61) 3447-4870E-mail: rca@trabalhoindigenista.org.brEixosDireitos sociaisParticipação social e políticas públicasComunicação e informaçãoPopulações específicasObjetivos gerais e estratégiasFomentar o intercâmbio e ações em educação e políticas indigenistas, que visam aobem-estar social e ambiental dos povos indígenas, e promover a cooperação e a trocade conhecimentos e experiências entre organizações indígenas e indigenistas, a fim defortalecer a autodeterminação e a autonomia dos povos indígenas, bem como ampliar suasustentabilidade e seu bem-estar.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãApoio à defesa dos direitos dos povos indígenas na proteção e na divulgação de suacultura, organização social, costumes e tradições, em questões socioambientais, comoa preservação dos seus recursos naturais, a defesa do seu meio ambiente e do direito àposse das terras tradicionalmente ocupadas, bem como ao usufruto dos seus recursos.Âmbito / região em que atuaNacionalOrganizações que fazem parte15 ONGs indigenistas, organizações indígenas e organizações socioambientais.30 – Rede de Educação Cidadã– Talher Nacionalwww.recid.org.brCentro Cultural do Banco do Brasil – SCES,Trecho 02, lote 22, sala 2.229Brasília – DFCEP 70200-002Tel.: (61) 3411-3890 ou 3310-9510Fax: (61) 3310-9511E-mail: talher.nacional@planalto.gov.brou talher.nacional@bb.om.brEixosDireitos sociaisSegurança alimentar e nutricionalDesenvolvimento comunitário e geração de trabalho e rendaParticipação social e políticas públicasPopulações específicasObjetivos gerais e estratégiasArticular a luta de entidades da sociedade civil que investem no desenvolvimento daeconomia solidária, na geração de emprego e renda e na defesa de todos os direitosconquistados pela população, promovendo ações de elevação da auto-estima, debatessobre segurança alimentar e inserção desses temas na agenda política.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãSuperação da fome, reforço da auto-estima e conquista de uma política de segurançaalimentar e nutricional a partir da organização popular e da inclusão do tema na agendapública em todos os níveis.Âmbito / região em que atua26 estados brasileiros e o Distrito FederalOrganizações que fazem parteCerca de 500 educadores(as) populares voluntários(as) e 1.200 entidades envolvidas nocombate à miséria e à pobreza.


252 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 200831 – Rede de Experiências emComunicação, Educação e Participação(Rede CEP)www.redecep.org.brRua Gonçalo Afonso, 55Vila MadalenaSão Paulo – SPCEP 05436-100Tel.: (11) 3034-4046E-mail: redecep@redecep.org.brEixosDireitos sociaisParticipação social e políticas públicasComunicação e informaçãoObjetivos gerais e estratégiasPromover, qualificar e disseminar as metodologias das organizações, como forma deinfluenciar a sua adoção por políticas públicas dirigidas, prioritariamente, a crianças ejovens de todo o Brasil.Aprofundar e disseminar conceitos e metodologias de comunicação, educação eparticipação. Inserir o tema na agenda das políticas sociais no país.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãEstimular as escolas públicas brasileiras a oferecer oportunidades para que todas ascrianças, adolescentes e jovens participem da produção de mídia.Âmbito / região em que atuaNacionalOrganizações que fazem parteReúne dez organizações, um centro de pesquisa e dois colaboradores com vastaexperiência nas áreas de comunicação, educação e participação.32 – Rede de Informações para o TerceiroSetor (Rits)www.rits.org.brRua Álvaro Alvim, 21/16º andarCentroRio de Janeiro – RJCEP 20031-010Tel.: (21) 2215-0605E-mail: rits@rits.org.brEixosDireitos sociaisDesenvolvimento comunitário e geração de trabalho e rendaParticipação social e políticas públicasComunicação e informaçãoObjetivos gerais e estratégiasFortalecer organizações da sociedade civil e movimentos sociais, promovendo a interação deiniciativas e projetos por meio do uso efetivo de tecnologias da informação e comunicação(TICs), em especial da internet.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãFomento e suporte para o compartilhamento de informações, conhecimento e recursostécnicos entre organizações e movimentos sociais.Âmbito / região em que atuaNacionalOrganizações que fazem parte227 associadas.


democracia se faz com participação | 25333 – Rede de Tecnologia Social (RTS)www.rts.org.brSCLN 109 – Bloco C – Sala 213Asa NorteCEP 70752-530Brasília – DFTel.: (61) 3340-9816EixosDireitos sociaisSegurança alimentar e nutricionalDesenvolvimento comunitário e geração de trabalho e rendaParticipação social e políticas públicasComunicação e informaçãoPopulações específicasObjetivos gerais e estratégiasReunir, organizar, articular e integrar um conjunto de instituições e suas ações, com opropósito de contribuir para a promoção do desenvolvimento sustentável, mediante adifusão e a reaplicação, em escala, de tecnologias sociais.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãDifusão e reaplicação de tecnologias sociaisÂmbito / região em que atuaNacional e internacionalOrganizações que fazem parte587 instituições públicas e privadas que trabalham com reaplicação, difusão,desenvolvimento, monitoramento e avaliação de tecnologias sociais.34 – Rede Ecovida de Agroecologiawww.ecovida.org.brCentro Ecológico Rua Padre Jorge, s/nDom Pedro de Alcântara – RSE-mail: laerciomeirelles@terra.com.brEixosDesenvolvimento comunitário e geração de trabalho e rendaParticipação social e políticas públicasObjetivos gerais e estratégiasDesenvolver e multiplicar as iniciativas em agroecologia; estimular o trabalho associativo naprodução e no consumo de produtos ecológicos; articular e disponibilizar informações entreas organizações e pessoas; aproximar, de forma solidária, agricultores e consumidores;estimular o intercâmbio, o resgate e a valorização do saber popular.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãA certificação participativa é um sistema solidário de geração de credibilidade, no quala elaboração e a verificação das normas de produção ecológica são realizadas com aparticipação efetiva de agricultores e consumidores, buscando o aperfeiçoamento constante eo respeito às características de cada realidade. A Rede trabalha também pela popularização,democratização e massificação da produção e consumo de produtos ecológicos.Âmbito / região em que atuaParaná, Santa Catarina e Rio Grande do SulOrganizações que fazem parte24 núcleos regionais, abrangendo cerca de 180 municípios. Seu trabalho congrega,aproximadamente, 300 grupos de agricultores, 30 ONGs e dez cooperativas deconsumidores. Em toda a área de atuação da Ecovida, são mais de 120 feiras livresecológicas e outras formas de comercialização.


254 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 200835 – Rede Evangélica Nacionalde Ação Socialwww.renas.org.brRua Bom Pastor, s/nBairro Vale da BênçãoAraçariguama – SPCEP 18147-000Contato: Débora FahurTel.: (11) 4136-4777E-mail: deborafahur@valedabencao.org.brEixosSegurança alimentar e nutricionalDesenvolvimento comunitário e geração de trabalho e rendaParticipação social e políticas públicasComunicação e informaçãoObjetivos gerais e estratégiasSer uma ampla rede de relacionamento entre as organizações evangélicas que atuam naárea social, proporcionando encorajamento, capacitação, articulação, mobilização, troca deexperiências, informações, recursos e tecnologia social.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãPromover e facilitar a comunicação dos integrantes da rede.Incentivar e fortalecer a criação de redes locais, regionais e temáticas.Identificar a ação social evangélica no Brasil.Facilitar a capacitação dos atores sociais evangélicos.Articular e mobilizar a rede em torno de ações no campo das políticas públicas.Âmbito / região em que atuaNacionalOrganizações que fazem parte20 organizações filiadas além das redes: Rede Mãos Dadas, Rede Fale, Rede SOS Global, RedeEvangélica do Terceiro Setor de MG, Rede Evangélica do Paraná de Ação Social, Rede Evangélicade Ação Social Grande Rio, Fepas, Rede Viva/RJ, Rede de Cosmovisão e Renas – São Paulo.36 – Rede Feminista de Saúde, DireitosSexuais e Direitos ReprodutivosAvenida Salgado Filho, 28 cj 601CentroPorto Alegre – RSTel.: (51) 3212 4998E-mail: redefeminista@uol.com.br oucomunicarede@redesaude.org.brEixosDireitos sociaisParticipação social e políticas públicasComunicação e informaçãoObjetivos gerais e estratégiasArticular o movimento de mulheres e feminista em torno de uma proposta de ação conjuntaque garanta o espaço das idéias feministas dentro da nova ordem mundial, potencializandosua participação na criação e na formulação de políticas públicas e sociais na área dasaúde, direitos sexuais e direitos reprodutivos.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãConceituação dos direitos reprodutivos e sexuais como direitos humanos; defesa da PolíticaNacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher (PNAISM) e da Política Nacional de DireitosSexuais e Direitos Reprodutivos, a defesa da Plataforma de Ação do Cairo (1994) como basepara cumprimento de compromissos do Estado brasileiro; a participação no Pacto pelaRedução da Mortalidade Materna e Neonatal; a luta pelo direito de a mulher decidir comautonomia sobre o aborto.


democracia se faz com participação | 255Âmbito / região em que atuaNacional e internacionalOrganizações que fazem parte270 grupos de mulheres e feministas e filiadas autônomas, incluindo pesquisadoras quedesenvolvem trabalhos políticos e profissionais na área da saúde da mulher e dos direitosreprodutivos.O conselho diretor da Rede Feminista de Saúde é formado pelas seguintes instituições:Coletivo Feminino Plural (RS), Maria Mulher Organização de Mulheres Negras (RS),Casa da Mulher Catarina (SC), Coisa de Mulher (RJ), Católicas pelo Direito de Decidir (SP),Malunga (GO), Grupo de Mulheres Graal (MG), Loucas de Pedra Lilás (PE), Centro 8 deMarço (PB), Fórum de Mulheres da Amazônia Paraense (PA) e Agende (DF).37 – Rede Nacional deMobilização Social (COEP)www.coepbrasil.org.brRua Real Grandeza, 219 – Bl. O – Sala 208BotafogoRio de Janeiro – RJCEP 22283-900Tel.: (21) 2528-4377E-mail: comunica@coepbrasil.org.brEixosSegurança alimentar e nutricionalDesenvolvimento comunitário e geração de trabalho e rendaParticipação social e políticas públicasComunicação e informaçãoDireitos humanos e sociaisObjetivos gerais e estratégiasA missão do COEP é contribuir para o desenvolvimento, em todo o país, de iniciativas decombate à fome e à miséria e de promoção da cidadania.Para cumprir sua missão, o COEP mobiliza organizações e pessoas, articula parcerias,incentiva a prática de projetos, capacita para atuação na área social e divulgaconhecimentos e ações concretas nessa área.Por meio de estratégias de mobilização e de articulação de parcerias entre suas associadase outros parceiros, o COEP desenvolve projetos de desenvolvimento comunitário em todosos estados do país e no Distrito Federal.Seus objetivos são: contribuir para a erradicação da fome, redução da pobreza e dasdesigualdades sociais; fortalecer o protagonismo, a participação e a capacidade de açãodas organizações, das pessoas e das comunidades; estabelecer processos participativosde construção da cidadania; fortalecer o diálogo público entre comunidades de baixa renda,empresas, organizações do terceiro setor, formadores(as) de opinião, formuladores(as) depolíticas públicas, órgãos de fomento e desenvolvimento, organizações governamentais,mídia e sociedade civil.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãRede MobilizadoresA iniciativa reúne pessoas, do Brasil e do exterior, que atuam ou desejam atuar na áreasocial. Os(as) participantes interagem e aprimoram conhecimentos e práticas na área socialpor meio do site .


256 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Rede de ComunidadesAtualmente, já existe uma rede de cerca de cem comunidades, urbanas e rurais, que sãoobjeto de trabalho do COEP em parceria com suas associadas e outros parceiros.Nesses locais, são promovidas ações como implantação de telecentros de informática,iniciativas de geração de renda e de fortalecimento comunitário.Em particular, nas 24 comunidades rurais do semi-árido nordestino (estados de Alagoas,Ceará, Paraíba, Pernambuco, Piauí e Rio Grande do Norte), são ainda desenvolvidasiniciativas como criação de animais de médio porte, implantação de viveiros de mudas,implantação de cisternas etc.www.comunidadescoep.org.brBanco de Projetos – MobilizaçãoDivulga, por meio da internet, iniciativas de promoção da cidadania, possibilitando suareplicação em outros locais. É aberto à inclusão de projetos das entidades associadas, deoutras organizações e de pessoas em geral.www.coepbrasil.org.br/mobilizacaoJornada pela CidadaniaIniciativa de mobilização social para integrar um número maior de pessoas em açõesvoltadas para a melhoria das condições de vida de comunidades de baixa renda.Suas atividades principais são: implantação de um centro comunitário nas comunidades edesenvolvimento de ações voltadas para o fortalecimento e organização comunitária.www.coepbrasil.org.br/jornadaO COEP e a Escola Caminhando Juntos na Construção da CidadaniaIniciativa para mobilização de jovens para o exercício da cidadania, compreensão críticada sociedade em que vivem, formação de hábitos de convivência mais solidária eoportunidades de participação em atividades coletivas e de interesse da comunidade.Iniciativas desenvolvidas: debates, concurso de redação, concurso de frases, concurso demúsica etc.Âmbito / região em que atuaLocal, regional e nacionalOrganizações que fazem parteO COEP é uma rede que reúne comunidades, organizações e pessoas.São cerca de 1.100 organizações, públicas e privadas (universidades, empresas, órgãosgovernamentais, entidades de classe e organizações não-governamentais, entre outras);mais de cem comunidades em todos os estados brasileiros; e mais de 5.700 indivíduos.


democracia se faz com participação | 25738 – Rede Saciwww.saci.org.brAvenida Prof. Luciano Gualberto, trav. J,374, térreo, sala 20Cidade UniversitáriaSão Paulo – SPCEP 05508-900Tel.: (11) 3091-4155 / 4371EixosDireitos sociaisDesenvolvimento comunitário e geração de trabalho e rendaParticipação social e políticas públicasComunicação e informaçãoPopulações específicasObjetivos gerais e estratégiasFacilitar a comunicação e a difusão de informações sobre deficiência, visando estimulara inclusão social e digital, a melhoria da qualidade de vida e o exercício da cidadania daspessoas com deficiência.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãBanco de currículos e vagas para pessoas com deficiência.Âmbito / região em que atuaNacionalOrganizações que fazem parteOrganizações que atuam com pessoas com deficiência, instituições de pesquisa ecomunicação etc.39 – Programa Redes Sociais Senac/SPwww1.sp.senac.br/terceirosetor/redesocialRua Dr. Vila Nova, 228 – 6º andar – sala 605Vila BuarqueSão Paulo – SPCEP 01222-903Tel.: (11) 3236-7535Fax: (11) 3236-2429E-mail: redesocial@sp.senac.brEixosDesenvolvimento comunitário e geração de trabalho e rendaObjetivos gerais e estratégiasPromove a articulação e integração de ONGs por localidades geográficas. O objetivo dessametodologia é otimizar recursos e conjugar esforços para favorecer o desenvolvimento local.Iniciativas de combate à pobreza e/ou de fortalecimento da participação cidadãAssociação dos Voluntários do Hospital Padre Albino, que oferece trabalho voluntário deatendimento aos pacientes do Hospital Padre Albino. Atualmente com 274 leitos, o hospitalatende uma média mensal de 960 internações, 650 cirurgias e 7.200 consultas em diversasespecialidades.Âmbito / região em que atuaEstadualOrganizações que fazem parteSão cerca de 700 organizações trabalhando em rede e mais de 70 projetos em andamento.


258 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Conheça tambémArticulação dos Povos Indígenas do Nordeste, MG e ESapoinme@oi.com.brAssociação em Áreas de Assentamento no Estado do Maranhão (Assema)www.assema.org.brCidade do Conhecimentowww.cidade.usp.br/blogComitê Nacional de Implementação do Direito Humano à Alimentação Adequada (Comidha)www.comidha.org.brCoordenação Nacional das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq)www.conaq.org.brFórum Nacional pela Reforma Agrária e Justiça no Campocptnac@cultura.com.brFórum Social Nordestinowww.forumsocialnordestino.org.brFrente Nacional pelo Saneamento Ambientalwww.assemae.org.brGrupo de Trabalho Amazônico (GTA)www.gta.org.brInstituto Regional de Pequena Agropecuária Apropriada (Irpaa)www.irpaa.orgInter-Redeswww.inter-redes.org.brMovimento de Adolescentes do Brasil (Rede MAB)www.redemab.org.brMovimento Interestadual de Quebradeiras de Coco Babaçu (MIQBC)www.miqcb.org.br


democracia se faz com participação | 259Plataforma Interamericana de Direitos Humanos, Democracia e Desenvolvimento (PIDHDD)www.pidhdd.orgRede Amiga da Criançarede@redeamigadacrianca.org.brRede Cyberelawww.cemina.org/a_redecyberelaRede de Educação Popular e Saúdewww.redepopsaude.com.brRede de Religiões Afro-Brasileiras e Saúdewww.religrafosaude.blogspot.comRede Nacional de Pessoas Vivendo com HIV/AIDS (RNP+)www.rnpvha.org.brRede Unitrabalhowww.unitrabalho.org.brRede Universitária de Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas Populares (Rede ITCP)www.itcp.coppe.ufrj.br/rede_itcp.phpUnião e Solidariedade das Cooperativas de Economia Social do Brasil (Unisol Brasil)www.unisolbrasil.org.brUnião Nacional das Cooperativas da Agricultura Familiar e Economia Solidária (Unicafes)www.unicafes.org.br


Participante do projeto do algodão orgânico colorido© Marcelo ValleParte 3Vale a pena acreditar


Capacidade emudança numarede brasileiraJohn SaxbyTradução: Jones de FreitasEste texto 1 analisa uma rede brasileira de mobilização social, o Comitêde Entidades no Combate à Fome e pela Vida (COEP), por meio dalente da capacidade e da mudança organizacional e social. O COEPtem o compromisso de buscar a construção de uma sociedade justa e inclusivapara toda a população brasileira – uma sociedade sem fome e pobreza. Entreseus membros estão agências governamentais, paraestatais, assim como organizaçõesdo setor privado e da sociedade civil. Na verdade, o COEP é uma redede redes, ativa no plano federal em todos os 26 estados brasileiros, no DistritoFederal e em 30 municípios. Entre as estratégias adotadas, estimula seus membrosa apoiar e participar de projetos de desenvolvimento comunitário, mobilizandorecursos públicos e institucionais na luta contra a pobreza, assim como promovendoa cooperação entre seus associados nesse trabalho.


vale a pena acreditar | 263A análise do COEP é um dos vários estudos de caso de um projeto queenvolve múltiplos países, “Capacidade, Mudança e Desempenho”, organizadopelo Centro Europeu para a Gestão de Políticas de Desenvolvimento (ECDPM,na sigla em inglês), da cidade holandesa de Maastricht. Por três razões, oCOEP atraiu o interesse dos organizadores desse estudo mais amplo:• É um caso unicamente brasileiro, sendo parte da democracia renovada do país edo amplo movimento social contra a fome. Criado pela iniciativa de brasileirose brasileiras, o COEP vem sendo mantido com recursos brasileiros.• É um híbrido curioso – uma rede voluntária nacional que incorpora muitosaspectos de uma organização da sociedade civil, porém que opera numaárea fronteiriça entre o Estado, o setor paraestatal, a iniciativa privada e asociedade civil.• Está envolvido com as questões de desenvolvimento mais importantes da atualidade,mobilizando cidadãos e organizações para trabalhar na luta contra apobreza e em prol da justiça social. O COEP inspira legitimidade como umator do desenvolvimento, o que ajuda a manter esses temas na agenda pública.Este artigo examina três amplas áreas da vida organizacional do COEP: suasorigens, crescimento e mudanças no período de mais de uma década; seu desempenho;e os fatores que explicam sua capacidade. O estudo completo, revisto e comreferências e apêndices, estará disponível em formato eletrônico ainda em 2008.Origens, crescimento e desempenhoDe longe, a própria existência do COEP pode parecer difícil de entender. É umcomitê de mobilização social dedicado a combater a pobreza e a miséria, iniciadoem 1993 por um grupo de empresas públicas importantes numas das sociedadesmais ricas e desiguais do mundo. Após 15 anos, seus princípios diretivos permanecemintactos, assim como o núcleo de integrantes iniciais.O COEP foi criado por um pequeno grupo de intelectuais ativistas, imbuídosde audácia e visão, liderados pelo sociólogo Herbert de Souza, o Betinho. Os líderesdas entidades públicas do Brasil responderam positivamente à iniciativa1 Resumo atualizado deum estudo de caso de2004 preparado para oprojeto “Capacidade, Mudançae Desempenho”, doCentro Europeu para aGestão de Políticas deDesenvolvimento.


264 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008desse grupo. A sinergia desse encontro, num momento histórico determinado,possibilitou que criassem o COEP e o mantivessem durante os primeiros anos.Segundo um ativista do COEP, Betinho era um líder universalmente respeitadoe ajudou a moldar um período notável da história do Brasil.Betinho e seus amigos perceberam nas entidades públicas brasileiras umaoportunidade e um desafio: utilizar seus significativos recursos organizacionaise materiais na mobilização contra a fome e, ao mesmo tempo, dar um novoconteúdo à idéia de empresa pública– uma empresa que servisse aos interessesde toda a população brasileira.O grupo de Betinho convidou os presidentesdas principais estatais para seunirem ao movimento popular contraa fome e a miséria e logo teve umaresposta positiva dos executivos. Representando setores como o bancário, daenergia, telecomunicações, saúde, agricultura e educação, esses executivos reconhecerama “prioridade absoluta” da Campanha contra a Fome para o governofederal, assim como o poder do movimento nacional da cidadania. Eles assumiramo compromisso de uma participação “ativa e plena” na iniciativa e, desdeentão, permaneceram atuantes na rede nacional e nas redes estaduais e municipaisdo COEP. 2Assim, a própria criação do COEP pode ser vista como um exemplo decapacidade organizacional e de pensamento e ação estratégicos muito competentes,embora seus fundadores trabalhassem apenas com um conjunto coerentede pressupostos e princípios, e não com um plano formal. A opção por umarede com estrutura não hierárquica refletia a intenção de estimular a flexibilidadeorganizacional, assim como a participação e a criatividade dos integrantes.Os companheiros de Betinho na criação do COEP reconhecem sua influênciana concepção do Comitê, especialmente sua crença de que uma forma organizativaaberta possibilitaria que as pessoas usassem a imaginação para provocarmudanças em si mesmas e na sociedade.Betinho e seus amigos perceberamnas entidades públicas brasileiras umaoportunidade e um desafio2 Ver, no anexo, ocompromisso escrito, em1993, dos presidentes dasorganizações fundadoras.


vale a pena acreditar | 265Princípios claros de objetivo social também moldaram a rede:• O COEP buscou engajar os setores mais importantes e influentes da sociedadena campanha Contra a Fome.• O COEP convidava as entidades para que dessem apoio ao movimentosocial por meio de suas competências organizacional e técnica. A rede simplesmentepedia que fizessem o que sabiam fazer, mas de forma diferente,trabalhando em conjunto com as comunidades pobres e marginalizadas emprol de seus interesses.• Governança e cidadania responsávelsempre fizeram parte da agendado COEP, que, no entanto, temconscientemente evitado posiçõespolítico-partidárias. Essa posturatem sido rigorosamente mantidaem todos os níveis para preservara autonomia da rede.À medida que o COEP crescia,a rede foi se descentralizando, coma formação de redes estaduais e, posteriormente,municipais. Em 1995, oCOEP modificou seus estatutospara incluir as redes estaduais, comoórgãos autônomos regidos pelos mesmosprincípios e estruturas da redenacional. Foram considerações estratégicasque informaram essa descentralização,pois o Comitê via as redesestaduais como uma forma de aproximaro COEP das realidades regionais e das diferentes faces e dinâmicas dapobreza. Há muito tempo, essa diversidade da pobreza havia sido reconhecida;nas palavras de Betinho: “a fome tem nome e endereço”. A descentralização© Acervo COEP/Guilherne SellesAurisberto, morador da Comunidade COEP de Lagoa de Dentro, na Paraíba, alimenta ovelhasque recebeu, em 2005, por meio do projeto Pólo de Desenvolvimento Comunitário Integrado


266 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Muitos resultadosDesde 1993, o COEP apresenta conquistas importantes:(1) O COEP mobilizou mais de 1.100 entidades em âmbito nacional, estadual emunicipal a assumir um compromisso com a Campanha contra a Fome.A rede pode justificadamente reivindicar avanços reais na mobilização de recursossubstanciais – conhecimentos especializados, serviços, equipamentos, assim como a energia,o tempo das pessoas e recursos financeiros – para apoiar campanhas públicas e iniciativasde desenvolvimento comunitário em todas as partes do Brasil. Originalmente limitada àsentidades públicas, a formação do COEP torna-se muito mais diversificada, incluindoórgãos governamentais, empresas privadas, universidades, ONGs e outras organizaçõesda sociedade civil. Numa organização voluntária, um crescimento sustentado desse tipoé, em si mesmo, um sinal de sucesso, pois um número sempre crescente de pessoas engajadasopta por participar da organização.O programa do COEP fornece outros indicadores de sucesso. Por meio da rede nacionale das redes estaduais e municipais, o COEP tem realizado campanhas vigorosaspara mobilizar instituições e o público a fim de que apóiem a luta contra a pobreza e amiséria, estimulando a “cidadania ativa”. O COEP apóia ações governamentais, como oPrograma Fome Zero, e realiza suas próprias atividades. Entre elas, a Semana Nacionalde Mobilização pela Vida, realizada todos os anos para marcar o aniversário da morte deHerbert de Souza, o visionário fundador do COEP, ocorrida em 1997. O COEP participou,em 2004, da criação do Movimento Nacional pela Cidadania e Solidariedade,juntando-se a outros parceiros na mobilização de cidadãos, empresas e organizações paraajudar no cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio. Ao engajar asentidades públicas nas suas iniciativas, o COEP tem contribuído para mudar o discursopúblico e manter a luta contra a pobreza na agenda nacional.


vale a pena acreditar | 267(2) O COEP tem encorajado, apoiado e participado de centenas de iniciativasde desenvolvimento implementadas por seus afiliados.Até meados de 2008, o COEP, por meio de suas associadas, tinha apoiado mais de milprojetos e programas, incluindo tanto operações emergenciais como projetos estruturais, paraenfrentar as causas fundamentais dos problemas de desenvolvimento. O papel do COEP temsido o de promover a cooperação e a parceria entre os associados, para que comprometam seusrecursos com projetos de sua escolha. Normalmente, a rede não tem um papel operacionalnesses projetos, mas, algumas vezes, tem cumprido um papel proativo para juntar órgãos operacionaise desafiá-los a realizar um projeto inovador. Um exemplo disso é o Programa Semi-Árido, uma iniciativa de desenvolvimento comunitário que teve início em 2000, com o apoio àprodução de algodão para agricultores familiares no Nordeste e, atualmente, envolve mais de 40comunidades, com iniciativas em quatro eixos: geração de trabalho e renda; convivência com osemi-árido; educação e cidadania; e organização comunitária. O COEP mantém uma base dedados desses projetos e programas, muitos dos quais estão documentados nas suas publicações(cadernos) e numa série de vídeos. Nas suas iniciativas e projetos de desenvolvimento, o COEPpromove cooperação e parcerias entre seus afiliados e tem conseguido sensibilizá-los para alocarrecursos expressivos para ações de responsabilidade social. Entre os exemplos, estão o CanalSaúde, um canal de televisão que promove educação a distância sobre atendimento primário àsaúde, e o Programa Nacional de Incubadoras de Cooperativas Populares (Proninc).(3) Por meio dessas iniciativas, o COEP tem contribuído para mudar a culturade suas entidades associadas.Atualmente, os integrantes do COEP são bem mais sensíveis e proativos em relação àsquestões de justiça social, assim como no que diz respeito à sua própria responsabilidadesocial, do que eram em 1993. O COEP tem utilizado sua capacidade de influência nãosomente na vida pública, mas também na sua própria esfera. À medida que as entidades seenvolveram com o debate público e a ação contra a pobreza, elas foram modificadas por


268 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008essa experiência. Hoje, várias entidades possuem políticassobre responsabilidade social e estruturas administrativascom pessoal responsável pela ação empresarial.Além dessas conquistas importantes, é difícil avaliaros efeitos mais amplos e de longo prazo das ações doCOEP sobre os grandes problemas. O desafio é analisarum dos pressupostos críticos dos fundadores do COEP.Segundo eles, os recursos das entidades brasileiras poderiamser utilizados em iniciativas para acabar com a pobrezae, assim, poderiam fazer uma diferença substancial.Claramente, foram mobilizados recursos significativos.Porém, resta a pergunta: com quais resultados?O COEP está iniciando um programa de pesquisaaplicada que deve fornecer algumas respostas. Com apoiodo Centro Internacional de Pesquisa sobre o Desenvolvimento(IDRC, na sigla em inglês) e o Centro para Pesquisae Desenvolvimento do Setor Voluntário (CVSRD,na sigla em inglês) da Universidade de Carleton, emOttawa (Canadá), a rede começou, em meados de 2008,uma avaliação do Programa do Semi-Árido no Nordeste.A pesquisa analisará a metodologia do COEP deapoio ao desenvolvimento econômico de comunidadesrurais produtoras de algodão, os avanços alcançados pelosmembros dessas comunidades, assim como as mudançasocorridas entre as entidades participantes. A pesquisaoferecerá uma oportunidade para que todos os envolvidosreflitam sobre como têm trabalhado juntos, o quealcançaram e suas opções futuras.permitiria que o COEP apoiasseiniciativas de desenvolvimento comunitárioem todo o país. Um engajamentodesse tipo exige presença,conhecimento e credibilidade locais– não pode ser feito de longe.Inicialmente, a descentralizaçãofoi lenta, mas, decorridos oito anos,havia redes em todos os 26 estadose no Distrito Federal. Em 2003, oCOEP mobilizava suas primeirasredes municipais e, em meados de2008, já existiam 30 dessas redes,com a mesma forma e função darede nacional e das estaduais. A descentralizaçãotambém causou umatransformação profunda no COEP,pois agora sua capacidade de apoiariniciativas de desenvolvimento comunitárioestá principalmente nas redesestaduais e municipais.A rede tem utilizado seus consideráveisrecursos internos para administraresse crescimento. Suas liderançasnacional, estaduais e municipais têmcultivado a legitimidade do COEPcomo ator na vida pública, mantendouma posição apartidária ao mesmotempo em que se mantém fiel a seusvalores e objetivos originais. O COEPcontinuou a adequar suas estruturas


vale a pena acreditar | 269às exigências do crescimento. Em 1997, criou a Oficina Social, uma estruturade apoio administrativo sediada por um dos seus filiados, a Coordenação dosProgramas de Pós-Graduação de Engenharia da Universidade Federal do Riode Janeiro (Coppe/<strong>UFRJ</strong>). A Rede Mobiliza, uma ONG com a finalidade deapoiar o trabalho do COEP, foi fundadaem 2003. A Rede de Pessoas-Mobilizadores, criada em 2004 parapermitir que indivíduos participassemdas iniciativas do COEP, inclui atualmentecerca de 6 mil participantesem 435 municípios. Em 2007, a redecriou a Jornada COEP pela Cidadania,que usa tecnologia baseada nainternet para mobilizar cidadãos e cidadãs que desejam doar seus conhecimentose tempo ao trabalho com organizações comunitárias. Na última década, à medidaque se descentralizava, o COEP também estabelecia relações próximas e de apoiocom comunidades em todo o país. A Rede de Comunidades já passou de cemmembros. O efeito cumulativo dessas mudanças tem sido significativo e as açõesdo COEP deram origem a uma Rede Nacional de Mobilização Social envolvendocomunidades, organizações e pessoas.Habilidades e capacidade – o que faz o COEP funcionar?Na última década, à medida que sedescentralizava, o COEP tambémestabelecia relações próximas e de apoiocom comunidades em todo o paísO estudo de caso do Centro Europeu para a Gestão de Políticas de Desenvolvimento(ECDPM) procura explicar as razões do sucesso do COEP. As forçascríticas estão localizadas nos recursos internos substanciais da rede, tanto intangíveiscomo materiais. Três fatores principais atuam e se reforçam. Primeiro, oCOEP tem se beneficiado de lideranças criativas em todos os níveis, que desfrutamde legitimidade substancial na rede e fora dela. Além disso, essa legitimidadevem sendo reconhecida e cuidadosamente mantida. Segundo, a redetem demonstrado uma capacidade considerável e sustentada para a reflexão estratégicae a mudança, renovando-se continuamente, mas mantendo seu caráter


270 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008e princípios. Terceiro, nada disso teria sido possível sem o compromisso claro deseus membros institucionais e, mais ainda, sem a paixão, as idéias e a energiaque as pessoas do COEP trazem para seu trabalho.Considerações materiais significativas complementam esses fatores intangíveis.O COEP tem sido mantido por importantes formas de contribuição desuas organizações-membros, incluindo seus recursos técnicos e alcance nacional.A rede também criou comunicações eletrônicas eficazes por meio da internet.Outro nível de análise poderia ampliar essa avaliação. A rede mostra numerososparadoxos em seu estilo, sua dinâmica e sua estrutura. Os exemplos aseguir ajudam a explicá-los:• O COEP não tem personalidade jurídica, e seu desenho não hierárquicotem a finalidade de abrir espaço para a diversidade, criatividade e energia,assim como incentivar a participação. Tanto no funcionamento cotidianocomo no estratégico, a rede depende muito do poder informal – da químicaentre as pessoas, seus conhecimentos e contatos. No entanto, não se trata deuma organização fluida ou simples.Seus princípios diretivos são claros epossui estatuto e regimento internodetalhados. É organizada de formacoesa e cada vez mais complexa. Suasestruturas de governança são consistentesnos níveis nacional, estadual emunicipal. À medida que o COEPcresce, desenvolve suas capacidadesadministrativas e operacionais.• O COEP é conscientemente apartidário, porém precisa ser hábil em termospolíticos, pois opera num meio institucional altamente polarizado. Está engajadonas grandes questões do desenvolvimento – pobreza e justiça social –,que são inevitavelmente temas políticos.• O COEP é tanto uma rede de organizações como de pessoas. Seus membrossão instituições, mas a qualidade das contribuições organizacionais dependeO COEP é tanto uma rede de organizaçõescomo de pessoas. Seus membros sãoinstituições, mas a qualidade dascontribuições organizacionaisdepende dos indivíduos envolvidos


vale a pena acreditar | 271Em primeiro plano, seu Zezito, presidente da Associação de Moradores da Comunidade Sítio Barreiros, emCajazeiras, na Paraíba, acompanhado de jovens participantes do projeto do algodão orgânico colorido© Marcelo Vallemuito dos indivíduos envolvidos. São as pessoas que participam do COEPque o fazem funcionar com seu compromisso, paixão e competência.• A química interpessoal e o poder informal energizam a rede, mas o COEPtem também utilizado, de forma criativa, a moderna tecnologia de comunicações.Sua primeira onda de descentralização se beneficiou da disseminaçãoda internet em meados da década de 1990. Mais recentemente, a JornadaCOEP pela Cidadania utiliza tecnologia web para recrutar e alocar voluntáriosqualificados no apoio a iniciativas de desenvolvimento comunitário.


272 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Olhando para o futuroTrês questões estratégicas provavelmente desafiarão o COEP no futuro.Identidade organizacional – Continua relevante uma velha questão: como oCOEP preservará sua autonomia organizacional e seu papel apartidário navida pública, ao mesmo tempo em que permanece engajado nos problemascríticos de justiça social no Brasil?Desenvolvimento de programa: engajando-se nas iniciativas de desenvolvimentocomunitário – Desde o início da década de 2000, o COEP tem priorizado oapoio às iniciativas de desenvolvimento locais realizadas pelas comunidadese suas organizações. As redes estaduais e municipais são os principaisagentes desse trabalho. O COEP é uma rede de organizações autônomas, enão uma entidade única com um centro de autoridade e responsabilidadefacilmente reconhecível. À medida que o COEP tiver um papel mais destacadono desenvolvimento local, enfrentará uma questão importante degovernança: que prestação de contas deve ser feita para as comunidadeslocais e como isso será executado?Aprendizado continuado – Os participantes da rede continuam buscandomaneiras de aumentar seus conhecimentos sobre desenvolvimento comunitárioe obter apoio técnico quando necessitam. O COEP tem um bomhistórico de estimular o desenvolvimento e o aprendizado profissionais entreas pessoas no seu âmbito. A rede está assumindo um papel mais direto noseu trabalho com as comunidades, e essa mudança é um desafio e, também,uma oportunidade para continuar fortalecendo as habilidades dos indivíduos,assim como para sistematizar seus próprios conhecimentos e experiência. Aquestão, agora, é saber como a rede enfrentará esse desafio enquanto continuacrescendo.


vale a pena acreditar | 273• Os ativistas do COEP têm sentimentos profundos sobre a organização eseu trabalho. Embora existam personalidades fortes na rede, ela quase nãotem sido afetada por conflitos divisionistas e não foi capturada por nenhumaagenda pessoal, política ou comercial.• Fatores intangíveis, como liderança, criatividade, confiança e legitimidade,dão ao COEP energia e atraem novos participantes. No entanto, ele sóconsegue fazer o que faz porque seus membros institucionais alocaram recursossignificativos ao desenvolvimento social no Brasil, incluindo o temporemunerado de seus empregados. Planejada ou casual, essa simbiose é poderosa.Além disso, todo esse empreendimento funciona em escala nacionalnum país tão grande quanto o Brasil, em parte por causa de sua confiávelinfra-estrutura de comunicações.John SaxbyPesquisador canadenseEsses paradoxos parecem ser fontes de tensão criativa no interior da rede e,como tais, sugerem a atuação de outro conjunto de forças sociais, que aindaprecisa ser compreendido.


274 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008AnexoReprodução do Termo de Adesão ao COEP assinado por dirigentes de empresasestatais em 1993.


vale a pena acreditar | 275


aminhoCOEP, 15 anosconstruindocaminhos paramudar o BrasilGleyse PeiterComemorar os 15 anos do COEP, com uma vida longa e repleta de resultados,também é momento para refletir sobre sua trajetória. Desde1993, quando era constituído por 30 organizações associadas, o COEPse modificou, cresceu – transformando-se numa rede de organizações, a RedeCOEP – e viabilizou a criação da Rede Nacional de Mobilização social, quetambém inclui, hoje, a Rede de Comunidades e a Rede Mobilizadores, que éformada por pessoas.Como espaço de mobilização de organizações, a Rede COEP reúne, atualmente,no Distrito Federal e nos 26 estados da federação, e em 20 grandes


vale a pena acreditar | 277municípios, mais de 1.100 organizações, públicas e privadas, que, em parceria,assumem o compromisso com a promoção do desenvolvimento humano e social,focando em especial as ações em comunidades de baixa renda, urbanas e rurais.Este texto reflete a evolução da Rede COEP considerando suas características,estratégias e resultados alcançados, à luz dos objetivos que se mantêm portodos esses anos, a partir de uma gestão baseada nos princípios da democraciasocial 1 – igualdade, diversidade, participação, solidariedade e liberdade.Atualmente, existem estudos sobre atuação em rede, mas é consenso que a capacidadede desenvolver iniciativas no âmbito de uma rede é sempre maior que asoma das partes, ou seja, redes podem gerar – ou mesmo fortalecer – a capacidadede ação ou competências de seus membros ou participantes. Em julho de 2004,o COEP foi objeto de análise numa pesquisa realizada sobre redes sociais peloEuropean Centre for Development Policy Management (ECDPM). 2 O estudo,feito pelo pesquisador canadense John Saxby, gerou para o COEP a oportunidadede uma auto-reflexão sobre suas características como Rede Nacional de MobilizaçãoSocial. Desse modo, a partir de um exame mais profundo do que é COEP 3e de seu funcionamento, algumas de suas particularidades – a motivação, os tiposde atividades, os níveis de intervenção, as esferas de atuação, estrutura e organizaçãointerna – serão descritas a seguir.MotivaçãoO COEP foi criado com a finalidade principal de reunir organizações para,num esforço conjunto, somarem esforços na articulação e implantação de açõesvoltadas para o combate à miséria e às desigualdades sociais.A convocação feita por Betinho, associada ao clima de mudança que havia naquelaépoca, e a conscientização de que 32 milhões de pessoas tinham fome 4 sensibilizaramdirigentes das organizações e os levaram a participar do COEP. Assim,uma causa importante – mudar a realidade social do país – passou a unir essaspessoas e esse foi o grande motivo que permitiu o início da história do COEP.O COEP inclui também, entre seus objetivos, a mobilização das empresas paraque exerçam seu papel público e dêem um passo à frente, incorporando à sua cultura1 Esses princípios foramdefinidos pelo sociólogoHerbert de Souza, oBetinho, como os cincopontos fundamentais aserem afirmados pelasociedade civil paragarantir o desenvolvimentohumano, oudemocracia social, segundoLeonardo Boff.2 SAXBY, John. COEP– Mobilizing against hungerand for life: an analysis ofcapacity and change in aBrazilian network.Maastricht, Netherlands:European Centre forDevelopment PolicyManagement, 2004.(Occasional Paper).3 Neste texto, as referênciasao COEP dizem respeitoà Rede COEP.4 Segundo os dados doMapa da Fome no Brasil,uma pesquisa realizadapelo Instituto de PesquisaEconômica Aplicada(Ipea), em 1993.


278 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008o tema da fome e da pobreza. Além disso, incentiva as empresas a valorizar seusempregados a promover sua participação cidadã, fortalecendo a visão de que, “antesde empregados de empresas, são cidadãos de um país”. 5 Da mesma forma, sãometas do COEP promover o compromisso social das empresas e incentivar o exercíciodas práticas de gestão associadas à responsabilidade social corporativa.Tipos de atividadesPara conviver com as mudanças do ambiente em que está inserido, acompanhara dinâmica própria da Rede e continuar atuando como Rede Nacional deMobilização Social, o COEP utiliza diferentes estratégias, como mobilizaçãode organizações e pessoas, articulação de parcerias, desenvolvimento de capacidades,incentivo à prática de projetos em comunidades e divulgação e comunicação(leia mais nos boxes a seguir).Níveis de intervenção5 Declaração de Betinhoem entrevista no vídeoCOEP.6 Os oito ODMsrefletem o compromissoassumido, no ano de 2000,pelo Brasil e por mais 192países na assinatura daDeclaração do Milênio,estabelecida pela ONU,para buscar a sustentabilidadedo planeta por meioda melhoria dos indicadoressociais e ambientais,até 2015.O COEP funciona como um espaço, ponto de encontro, promovendo o diálogopúblico entre pessoas, organizações e comunidades. Como aglutinador deforças e construtor de elos, atua nos três níveis da vida pública – no âmbitoestratégico nacional, no institucional e no comunitário – e estabelece pontesentre os três.No nível estratégico, contribui para o debate e a criação de políticas públicasna área social por meio da participação em movimentos e fóruns que envolvemtemas fundamentais de interesse público. O COEP atua também na mobilizaçãode suas associadas para apoio a programas governamentais e projetos quese tornaram políticas públicas no combate à fome, ao desemprego e na valorizaçãodos direitos. Mobiliza também para o apoio a compromissos de governo,entre eles a adoção dos Oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODMs), 6como eixo de sua atuação social.Para a mobilização de formadores de opinião e de líderes sociais, o COEPpromove, anualmente, campanhas de conscientização pública em torno dotema da pobreza e das desigualdades sociais.


vale a pena acreditar | 279Mobilização e articulaçãoNo início da atuação do COEP, as organizações forammobilizadas para atuarem socialmente, de várias formas,entre as quais o desenvolvimento de projetos sociaisnas comunidades do entorno de seus empreendimentos,a utilização social de seus recursos e bensinservíveis, e o engajamento em campanhas e ações desolidariedade.Para isso, foram realizadas diversas ações de mobilizaçãoe articulação, tais como reuniões entre dirigentes,apresentação de planos de ação ao presidente daRepública, elaboração de documentos de diretrizes, sugestõesde atividades, recomendações, entre outros. 7Com a crescente conscientização das organizaçõesa respeito de seu papel na sociedade, suas ações sociaisganharam outra dimensão e seus resultados puderamser contabilizados, o que permitiu ao COEP criar novosprocessos de mobilização. Foram realizadas pesquisase lançados prêmios referentes à atuação socialdas empresas, eventos de divulgação das ações e publicaçãode balanços sociais. 8A articulação do COEP para descentralizar suaatuação para os estados e municípios, com significativoaumento de associados, bem como a aproximaçãocom as comunidades, possibilitou a realização de campanhasde mobilização, com alcance nacional, em tornodas questões associadas à fome e à pobreza. Parauma atuação em rede, foram desenvolvidos, nainternet, 9 novos instrumentos mobilizadores, com altograu de inovação tecnológica.No âmbito institucional, promove a articulação de um trabalho em parceriaentre as organizações associadas, ampliando o alcance das ações e o impactodos resultados. Fortalece a Rede de diversas formas: capacita os participantes,viabiliza a troca de experiências e valoriza as complementaridades entre asações desenvolvidas pelas próprias organizações e em relação às políticas públicas.Garante a continuidade da participação das instituições no COEP articulando ainstitucionalização dessa participação, por meio de normas e instruções internasàs organizações.O COEP trabalha também, no âmbito comunitário, diretamente com as liderançase organizações para implantar projetos de desenvolvimento local, por meioda valorização da organização comunitária e do apoio ao processo emancipatório7 Ver as ações efetuadasno texto “Marcos datrajetória do COEP”,incluído nesta publicação(p. 298-427).8 Idem nota 7.9 Leia também o texto“O COEP e a tecnologiade informação e comunicação”,de Amélia Medeirose Sarita Berson, incluídonesta publicação(p. 286-297).


280 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008CapacitaçãoA contribuição do COEP para a capacitação dosparticipantes é um processo contínuo e atendeao crescimento da Rede e à ampliação de suasações, bem como ao desenvolvimento de projetosem comunidades.Além de seminários e oficinas nas áreas deeducação, geração de trabalho e renda, agricultura,técnicas de gestão, comunicação e outros, sãorealizadas três teleconferências anuais, em nívelnacional, com palestras e troca de experiências. 10Em parceria com universidades e outras instituiçõesde ensino, são oferecidos cursos presenciaise a distância em gestão de redes, desenvolvimentoe monitoramento de projetos e açõessociais, metodologias de desenvolvimento comunitárioe outros. 11Na internet, também estão disponíveis diversosinstrumentos com informações e dados importantespara o desenvolvimento do trabalho.Além de melhorar o desempenho do COEP,tais iniciativas permitem ampliar os resultadosdas ações nas próprias organizações associadas.Nesse sentido, uma das iniciativas mais valorizadaspelos membros na participação de uma redecomo o COEP é o acesso regular às ações decapacitação e treinamento.da comunidade, que transforma seus membrosem agentes de seu próprio desenvolvimento.A partir de sua experiência nessa área, oCOEP desenvolveu uma metodologia deorganização comunitária baseada na participaçãoinclusiva, com o apoio técnico e financeirodas entidades membros do COEP. Ametodologia baseia-se também na utilizaçãode projetos de sucesso como modelos parareplicação e multiplicação do desenvolvimentosustentável em regiões vizinhas, cujo eixo principalsão os ODMs.Para fortalecer o capital social já existenteem comunidades, o COEP promove o encontrodos órgãos de governo responsáveis pelaaplicação e desenvolvimento de diversas políticaspúblicas nas áreas do desenvolvimentosocial como educação, saúde, desenvolvimentoagrário, agricultura, ciência e tecnologia e outras,com membros dos COEP estaduais emunicipais e lideranças comunitárias, proporcionandoo acesso das comunidades às políticaspúblicas disponíveis.Esferas de atuaçãoA Rede COEP tem seu espaço de ação nas esferasnacional, estadual – por meio dos COEPsestaduais, no Distrito Federal e nos 26 estadosda federação – e municipal, pelos mais de20 COEP em grandes cidades, totalizandomais de 1.100 organizações associadas.


vale a pena acreditar | 281Todas as características da Rede no plano nacional se repetem nos estadose municípios, o que permite uma atuação descentralizada, com redes interligadasem diversos níveis. Isso faz do COEP uma “rede de redes”. Embora interligadas,não existe nenhuma subordinação entre as redes, que atuam de modoautônomo, com respeito às regras de funcionamento do COEP. A independênciaentre as instâncias garante que sejam atendidas as especificidades decada espaço de atuação, mas semprede acordo com as diretrizes gerais e asatividades coletivas, propostas e implantadaspor toda a Rede.A estrutura e a cultura do COEPpropiciam o desenvolvimento de múltiplaslideranças, atuando nas diferentesesferas. Para resultados efetivos, a liderança não pode ser autoritária, vistoque a participação na Rede COEP é voluntária e por adesão; deve ser acessívele pronta a ouvir, a fim de atender aos interesses dos seus membros; ter capacidadede mobilização para viabilizar e facilitar a participação de todos; ser abertaà diversidade de opiniões e de visões, para incorporar as diferenças e ser inclusiva;deve também trabalhar em conjunto para manter a integridade dos valores, objetivose missão da Rede, com autonomia suficiente para desenvolver as ações emcada local.EstruturaAo caminhar para uma atuação maislocalizada, o COEP estabelece processosde desenvolvimento comunitárioA participação na Rede COEP se altera, ao longo do tempo, com a integraçãode novos associados. No princípio, eram apenas empresas estatais. Depois, foramincorporadas autarquias, fundações e universidades. Com o crescimentoquantitativo e geográfico da Rede COEP, com atuação nos estados e municípios,houve a inclusão de empresas privadas e organizações do terceiro setor.Ao caminhar para uma atuação mais localizada, na direção das populações maisvulneráveis, o COEP estabelece processos de desenvolvimento comunitário, emdiversas localidades.10 Leia também o texto“Marcos da trajetória doCOEP”, incluído nestapublicação (p. 298-427).11 Idem nota 10.


282 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Comunicação e divulgaçãoNa época em que era um grupo de 30 organizaçõestrabalhando juntas no combate à pobreza, no começoda década de 1990, COEP realizava a comunicaçãocom suas associadas por fax.Com a descentralização do COEP e a necessidadede se manter uma comunicação constante com a Redepara a mobilização e articulação de seus membros, oCOEP desenvolveu uma página na internet e iniciou oprocesso de comunicação virtual com suas associadas.O crescimento constante da Rede, alcançandomilhares de organizações e de pessoas e centenas decomunidades, além de parceiros no exterior, levou aodesenvolvimento do portal do COEP Nacional nainternet, 12 ponto de encontro da Rede por meio doqual são feitos os processos de consolidação e de distribuiçãodas informações.com o portal do COEP Nacional. Além de permitiruma construção coletiva e integrada da informação,no portal do COEP Nacional estão disponíveis outrasredes e produtos, como a Rede Comunidades, pormeio do Portal Comunidades, a Rede Mobilizadorese o Banco de Projetos Mobilização. 13A instalação de telecentros comunitários, principalmenteno semi-árido, possibilita que os moradorestenham acesso a esses dados e informações, além deincentivar a comunicação das comunidades entre elaspróprias e com a sociedade como um todo.À proporção que aumentam os resultados do trabalhoda Rede, novos instrumentos de divulgação sãoimplementados, como jornais periódicos, relatóriosanuais de atividades, informativos virtuais quinzenaise publicações e vídeos, individuais e em coletânea.Os portais dos COEP estaduais e municipais sãocriados de forma independente, mas mantêm vínculo12 Idem nota 9.13 Idem nota 9.O COEP tem uma atuação direcionada no semi-árido nordestino, em parceriacom diversas instituições e órgãos governamentais, com vários projetosde desenvolvimento social em comunidades. Da mesma forma, a atuação dosCOEP estaduais e municipais é efetuada nos territórios definidos pelos participantesdas redes locais, com a articulação de parcerias com organizações que


vale a pena acreditar | 283atuam localmente e com órgãos governamentais estaduais ou municipais. Alémdas parcerias institucionais, são desenvolvidos projetos nas comunidades poratuação de voluntários, via Jornada pela Cidadania. 14O conjunto das comunidades ligadas ao COEP tem em comum a incorporaçãodos valores e princípios definidos para a Rede 15 em todas as suas atividadese iniciativas, assim como o eixo nos ODMs, o que permitiu a criação da Redede Comunidades. 16Quando se deparou com o interesse de pessoas em participar como indivíduos,numa ação cidadã, sem a representação formal de uma organização, o COEPviabilizou a criação de uma rede de pessoas, a Rede Mobilizadores, 17 que, numambiente virtual, comporta milhares de participantes, no Brasil e no exterior.Uma característica da Rede COEP que a diferencia de outras, até mesmoda Rede Mobilizadores e da Rede de Comunidades, é a existência de instrumentosformais de estruturação. No COEP há um estatuto, com as principaisdiretrizes que regem sua atuação, em todas as esferas – por exemplo, a interdiçãode seus coordenadores serem candidatos a cargos políticos – e um regimentointerno, com regras de funcionamento que caracterizam a Rede.A participação na Rede COEP, embora voluntária, é formalizada pela adesãoda organização associada aos estatutos e regimento do COEP, que se dá a partirda assinatura do dirigente da instituição num termo de adesão, documentopadrãopara toda a Rede. A institucionalização desse processo, internamente àsorganizações, tem como base o termo formalmente assinado e a criação deinstrumentos administrativos específicos, que definem as regras de participaçãoda instituição e de seus empregados.Organização internaO COEP mantém intocáveis seus princípios, valores e missão e sua estrutura,com um conselho deliberativo, composto pelos dirigentes das associadas epresidentes dos COEP estaduais, no caso do COEP Nacional, e uma comissãoexecutiva, formada pelos(as) representantes técnicos(as) dessas organizações eo(a) secretário(a) executivo(a).14 Idem nota 9.15 Idem nota 1.16 Idem nota 9.17 Idem nota 9.


284 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Conforme definido em seus estatutos, tal estrutura se repete nos estados emunicípios criando uma coerência e homogeneidade na forma de funcionamentoda Rede. A adesão aos estatutos e ao regimento interno do COEP implica aconcordância com suas diretrizes, seus fundamentos e sua forma de funcionamento,o que estabelece um padrão de comportamento para todos da Rede.Em âmbito nacional, também há um conselho de administração, compostopor representantes dos COEP estaduais e das organizações associadas nacionais,com a responsabilidade de garantir o cumprimento dos estatutos. Uma secretariaexecutiva nacional, apoiada por uma dasorganizações associadas, é responsável pelaanimação da Rede em todos os níveis, criaçãoe manutenção dos instrumentos de gestão,organização das atividades coletivas epela articulação das parcerias em âmbito federal.Estrutura idêntica existe nos estadose municípios, com o objetivo de articular asredes locais. Embora bem estruturada e formal, com estatutos e normas de funcionamento,a Rede COEP não mantém personalidade jurídica.A contribuição dos membros associados para o funcionamento da Rede ocorrede diferentes formas: apoio à participação de seus representantes na Rede, comomembros da comissão executiva, com seu tempo, dedicação, passagens e diáriasnas reuniões; apoio de infra-estrutura ao funcionamento das secretarias executivas;desenvolvimento de seus próprios projetos sociais, em consonância com as diretrizesda Rede, sob a ótica do desenvolvimento humano e combate à pobreza; ecom apoio financeiro a iniciativas desenvolvidas pelo COEP.O processo decisório no âmbito da Rede se realiza pela construção de consensos,considerando um sentido comum para todos os participantes, como omodo de atuação da Rede, diretrizes e suas principais estratégias.A construção e a manutenção da identidade do COEP são fruto de um planejamentogeral de sua atuação, estabelecido em conjunto com os representantes detodas as instâncias. Nesse processo, são reavaliados os rumos do COEP, a partirA construção e a manutenção daidentidade do COEP são fruto de umplane jamento geral de sua atuação


vale a pena acreditar | 285de reflexão sobre as questões: “De onde viemos? Quem somos? O que fizemos epara onde vamos?”. O fortalecimento dos elos da Rede resulta de um padrão derelações criado entre as instâncias, que reflete o compromisso existente entre osmembros com as propostas de atuação, valores e objetivos da Rede.Gleyse PeiterSecretaria executiva doCOEP NacionalFortalecimento da Rede e garantia de seu desempenhoA Rede COEP tornou-se complexa e multidimensional, ao longo da últimadécada, em resposta às transformações do contexto externo, às mudanças daspróprias organizações associadas e às oportunidades que emergiram. Isso exigea criação de novas estratégias de gestão, com objetivo de fortalecer a atuação daRede e garantir seu desempenho, ampliando os resultados. Ao mesmo tempo,é fundamental promover sua renovação, sem, no entanto, modificar suas característicasfundamentais.Para responder a essa demanda, além das competências e técnicas hoje utilizadas,o desafio do COEP é aperfeiçoar as habilidades da Rede, considerando que:• o dinamismo da Rede COEP exige uma capacidade de reagir com rapidez amudanças e uma habilidade de se adaptar a novas circunstâncias, para mantera Rede sempre em sintonia com a realidade interna e externa;• a capacidade de enxergar o futuro e gerar novos caminhos também é essencialpara que a Rede possa ser inovadora, assim como a habilidade de ajustaro pensamento estratégico às ações a serem desenvolvidas;• ter mais agilidade e dinamismo para implantar as ações, para manter a Redesempre em movimento.O fortalecimento da Rede COEP, portanto, é resultado do investimentonas capacidades individuais e coletivas de seus membros, na ampliação dashabilidades técnicas e intangíveis, na existência de canais de comunicação entreos participantes e na criação de espaços de compartilhamento.


ecnologO COEP e atecnologia deinformação ecomunicaçãoAmélia Medeirose Sarita BersonOinício da década de 1990, no Brasil, foi marcado por uma gama expressivade movimentos sociais. Nesse panorama, o sociólogo Herbert deSouza, o Betinho, exerceu papel fundamental na articulação e animaçãode diferentes ações, sendo a mais conhecida a Ação da Cidadania Contraa Fome e a Miséria e pela Vida, ou simplesmente a Campanha contra a Fome,lançada em março de 1993.Para além de seus próprios resultados, a Campanha contra a Fome propicioua multiplicação de iniciativas e parcerias em todo o país. Uma delas foi oCOEP, que surgiu em 1993, com o nome de Comitê de Entidades Públicas no


vale a pena acreditar | 287Combate à Fome e pela Vida, como um espaço de articulação de instituiçõespúblicas na luta contra a fome e a exclusão social.Betinho, que sempre esteve um passo adiante dos fatos, já percebia, naquelaépoca, o alcance da internet. Dizia que um dia seria possível usar um mecanismoque daria outra dimensão para articular o que hoje chamamos de rede. E écom essa inspiração deixada por Betinho que a internet, assim como a informática,tem sido fundamental no processo de consolidação da Rede COEP.Desde sua criação, o COEP teve como referência o fortalecimento do sentidopúblico das organizações, sejam elas públicas ou privadas, na construção deuma sociedade mais justa e solidária. Naquela época, além de uma linha de açãovoltada para a coleta e distribuição de alimentos e outros bens, as iniciativas doCOEP priorizaram outro caminho, o trabalho conjunto, utilizando a experiênciatécnica das associadas e de seu corpo funcional para articular parcerias entreas empresas, órgãos federais, estaduais e municipais, organizações comunitáriase do setor produtivo privado. O objetivo era a implantação de projetos estruturantesvisando a melhores condições de vida para toda população brasileira.A preocupação do COEP em trazer para o foco das discussões a questão douso da informática no processo de construção da cidadania pode ser evidenciadapela escolha desse tema para nortear um dos nove grupos de trabalho constituídosem agosto de 1993 para dar início às ações do Comitê. Os outros eram:saúde; energia e alimentos; saneamento e habitação; educação; transporte eabastecimento; multiplicação do uso de recursos; legislação; e comunicação.Com o objetivo de ampliar o elenco das linhas de trabalho e multiplicariniciativas de articulação e implantação de programas e projetos, o grupo deinformática deu início à montagem de uma base de dados, articulada on-linecom várias empresas integrantes do Comitê, para a ampla divulgação das possibilidadese experiências em curso.Tendo em vista os resultados até então alcançados e buscando a consolidação efortalecimento das ações, as entidades associadas assinaram, em setembro de 1994,um termo de vinculação ao protocolo de constituição do COEP. Com isso, formalizou-sea criação de várias comissões técnicas, entre as quais a de informática.


288 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Passado pouco mais de um ano, na reunião do conselho deliberativo do COEP,realizada na Petrobras em dezembro de 1995, o presidente da Financiadora deEstudos e Projetos (Finep), que, na época, era o conselheiro do COEP, LourivalCarmo Mônaco, sugeriu o estabelecimento, via internet, de uma rede para divulgaçãodas ações dos projetos em desenvolvimento, bem como de uma rede paracomunicação entre as entidades.Na ocasião, Betinho, como presidente do conselho, defendeu a proposta dedesenvolvimento da Rede Solidariedade, que poderia atender ao COEP. Paratanto, pôs o Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase) e oAlternex (primeiro serviço brasileiro de acesso à internet fora da comunidadeacadêmica, desenvolvido pelo Ibase) à disposiçãodo COEP. Também sugeriu a criação,de imediato, de uma home page paraessa rede.O secretário executivo do COEP, AndréSpitz, informou estar em andamentoum projeto, coordenado pelo Serpro, decriação de conferência eletrônica para interligaçãodas entidades do COEP e facilitaçãodas comunicações. Isso poderia dar conta do então grande gargalo para odesenvolvimento das ações que já começava a se formar, visto que o principalmeio para sua articulação, na época, era o fax.A questão do uso da internet para viabilizar a comunicação e a troca deinformação teve continuidade na reunião do conselho deliberativo do COEPNacional, realizada em agosto de 1997, na qual uma das deliberações diziarespeito à mobilização das entidades associadas para implementar páginas deinternet referentes às suas ações no combate à fome e à miséria, bem comoarticular essas páginas à do COEP.Nessa mesma reunião, o presidente da Finep propôs incluir, no programa deação do COEP, a divulgação de iniciativas de caráter social e de práticas solidáriasbem-sucedidas, como forma de disseminar e democratizar a informação.A questão da internet para viabilizar acomunicação e a troca de informaçãoteve continuidade na reunião doconselho deliberativo do COEP Nacional


vale a pena acreditar | 289André Spitz informou que o COEP já trabalhava nesse sentido. Como exemplo,citou a Rede de Infocidadania, uma base de dados para divulgar o COEPe o trabalho realizado pelas entidades associadas, promover o Banco de Projetose a Rede de Solidariedade, e disponibilizar informações sobre projetosbem-sucedidos e outras informações relevantes para a cidadania.Comunicação para uma redeA reunião do conselho deliberativo do COEP, de dezembro de 1995, teve comomarco importante a formalização da criação dos comitês estaduais, uma estratégiade aproximar a rede das diferentes realidades locais, possibilitando ampliariniciativas de desenvolvimento humano e social em todo o país. O início daformação do COEP em âmbito estadual ocorreu em 1995 e foi o ponto de partidapara a construção da ampla Rede Nacional de Mobilização Social.Uma rede não funciona sem comunicação e troca de informação. No COEP,a preocupação em equacionar essas questões surgiu não só da necessidade deintegração dos participantes, mas também da importância de organizar asações e promover unicidade à rede.Quando se fala em instrumentos de comunicação a distância e em tecnologiasda informação, é mais que natural, hoje, pensar na internet. E essa percepçãoexistia no COEP desde a época de sua criação, como ressaltado por Betinhojá em 1993. O desafio de se implementar um instrumento quepossibilitasse a cooperação foi vencido com o lançamento, na internet, da primeirapágina eletrônica do COEP, em 1998 (leia mais no boxe).Instrumentos de mobilização socialO ambiente em rede, com seu potencial de capilaridade e horizontalidade, possibilitaa concretização de novas formas de mobilização e de geração de conhecimento,por meio das quais todos contribuem não apenas como consumidoresde conteúdo e serviços, mas também como produtores de idéias e informações.Entre outros benefícios, o trabalho assim conduzido possibilita: incrementaro acesso à informação, expertises, recursos, interlocução e suporte técnico;


290 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Portal do COEPCom a expansão gradativa do número de pessoas eorganizações envolvidas com o trabalho do Comitêe a diversificação das iniciativas, o site do COEPfoi gradativamente incorporando as novas demandas,aprimorando-se eficando mais atrativo parao usuário.Assim, em 2000, a páginaeletrônica do COEPdeu lugar ao primeiro portalda Rede Nacional deMobilização Social (www.coepbrasil.org.br). Atualizadoem 2001, o portal se tornou, na época, umdos meios de comunicação intra-rede e o principalmeio de divulgação externo.Embora circulando informações dos vários nósda rede entre todos os participantes, o portal doCOEP não permitiu, nesse estágio, uma sistemáticapara consolidar tais informações.O crescimento expressivo da rede nos últimosanos, incluindo pessoas e comunidades, além das organizações,implicou uma reformulação maior doportal. Lançada em 2008, uma nova versão foi idealizadacom uma concepção de construção coletiva eintegrada, promovendo, assim, uniformidade à informação,mesmo quando oriunda de diferentes locais.As informações passaram a ter um caminho deida e volta, com dados provenientes do COEP emsuas ramificações estaduais e municipais e que começarama fazer parte do portal do COEP Nacional, evice-versa.O novo portal marca, dessa forma, um novoestágio na trajetória do COEP. Traz, ainda, comoaspecto inovador: a questão da acessibilidade, coma preocupação em dar acesso a pessoas com algumgrau de deficiência visual.O portal disponibiliza, em sua página principal,publicações, notícias, entrevistas, textos e artigos,eventos, destaques, além de ser um espaçode troca de informação com o COEP dos estadose municípios.Para uso interno da rede, o portal apresenta,ainda, alguns instrumentos de apoio, por meio doqual a experiência de um participante pode seraproveitada no trabalho de outras pessoas. Dessaforma, o portal disponibiliza: banco de idéias,banco de cartas, banco de apresentações, banco dereleases, banco de documentos e outros de interessepara a rede como um todo.O portal constitui, também, uma porta de acessopara os vários sistemas e ferramentas desenvolvidospelo COEP em sua trajetória de 15 anos voltadapara a mobilização de pessoas e organizações emprol de iniciativas de desenvolvimento humano esocial em comunidades de baixa renda.Visite: www.coepbrasil.org.br


vale a pena acreditar | 291reduzir isolamentos e compartilhar responsabilidades, com o desenvolvimentode práticas compartilhadas; aumentar a visibilidade das iniciativas; fortalecer odiálogo público; facilitar o trabalho colaborativo a distância; multiplicar osefeitos/impactos das ações; e favorecer o conhecimento e o aprendizado.Esse processo coletivo implica, no entanto, a necessidade de implementaçãode tecnologias e metodologias específicas e de disponibilização de ferramentasque possibilitem viabilizar as ações e produzir resultados consistentes.No processo de construção e consolidação da Rede Nacional de MobilizaçãoSocial, a evolução da tecnologia foi fundamental para a execução das iniciativas,permitindo o desenvolvimento e a implementação de diferentes instrumentos,de caráter inovador e com um grau de sofisticação bastante elevado,como o Banco de Projetos na Área Social – Mobilização, a Rede Mobilizadores,o Portal das Comunidades, a COEP TeVê, o Sistema de Mídia e Educação(Sime) e a Jornada pela Cidadania. 1O COEP também utiliza a internet como meio de mobilização social eminiciativas de promoção da cidadania de caráter mais pontual. Um exemplo é olançamento, em outubro de 2002, no Portal do COEP, do abaixo-assinadoeletrônico para apoio ao Projeto de Lei 5.471/2001, acerca do compromissosocial, que, entre outras providências, dispõe sobre a instituição do Dia Nacionalde Mobilização pela Vida.Banco de Projetos na Área Social – Mobilizaçãowww.coepbrasil.org.br/mobilizacaoDesde o início de suas atividades, ficou patente para os participantes do COEPo papel da divulgação de iniciativas de caráter social e de práticas solidáriasbem-sucedidas na mobilização de novos parceiros, possibilitando a ampliaçãodessas ações, além de permitir a construção de um acervo de idéias e projetospassíveis de replicação.Com essa convicção, partiu-se para a construção de um sistema de bancode dados com o objetivo de registrar, sistematizar e disponibilizar, por meio dainternet, iniciativas na área social, em áreas de atuação como: geração de trabalho1 José Aglailson R. dosSantos e José EduardoNogueira Diniz são osresponsáveis pelodesenvolvimento dossistemas implementadospelo COEP.


292 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008e renda, desenvolvimento local, cooperativismo, crédito popular e muitas outrasde interesse social.O Banco de Projetos desenvolvido pelo COEP foi lançado, publicamente, emmeados de 2001, incluindo, de início, informações sobre projetos conduzidos pelasentidades associadas e pelos COEP nos estados em diferentes regiões do país.Em 2003, como uma das iniciativas deapoio ao Programa Fome Zero, do governofederal, o COEP abriu o Banco a qualquerentidade ou pessoa interessada em compartilharsuas experiências voltadas para odesenvolvimento humano e social.Atualmente, estão cadastrados no Bancomais de 2.300 projetos, constituindo-senuma importante fonte de consulta para todos aqueles que buscam informaçõessobre boas práticas na área social. As buscas podem ser efetuadas segundomodalidades distintas e, ainda, permitem o cruzamento de dados, de acordocom as necessidades da pesquisa.Além de uma descrição sucinta das ações, o Banco apresenta informaçõessobre as demandas financeiras, materiais e de recursos humanos relativos acada projeto, estimulando o intercâmbio e abrindo possibilidades para parceriase apoios. Possibilita, assim, o encontro entre as necessidades de uma ação e adisponibilidade de pessoas ou entidades interessadas em apoiar essa iniciativa.O Banco apresenta informações sobreas demandas financeiras, materiais e derecursos humanos relativos a cada projetoRede Mobilizadoreswww.coepbrasil.org.br/mobilizadoresA necessidade de ampliar o campo de atuação do COEP,viabilizando a participação de mais pessoas nas suasações, foi um dos motivos para a criação da Rede Mobilizadores.Lançada em fins de 2003, a rede é formadapor pessoas compromissadas com a questão social, doBrasil e do exterior, que interagem por meio do site.


vale a pena acreditar | 293Atualmente, o site disponibiliza 11 grupos temáticos 2 sobre diferentes assuntosna área social, nos quais é possível ter acesso à informação atualizada; consultartextos de referência; conhecer iniciativas sociais; compartilhar idéias,experiências e conhecimentos, por meio de fóruns de debates, bate-papos, treinamentoson-line e enquetes. Hoje, são cerca de 7 mil mobilizadores, em mais de500 municípios, que atuam nesse espaço privilegiado para troca de experiências,discussão de temas relevantes e articulação de ações conjuntas e de incentivo aovoluntariado, em especial em comunidades de baixa renda.COEP TeVêwww.coepbrasil.org.br/coepteveA COEP TeVê é um produto criado para apoiar e complementar outros sites daRede. Ela veicula, por meio da internet, ações de caráter informativo, de educaçãocidadã e de mobilização social sobre temas diversos na área social. Divulga,assim, diferentes iniciativas desenvolvidas pelo COEP e por outras instituições,além de entrevistas com especialistas, abordando assuntosde interesse para os integrantes da Rede.Os principais beneficiários da COEP TeVê são osmobilizadores, as comunidades e os participantes doCOEP (tanto em âmbito nacional como estadual e municipal),bem como os diferentes usuários da internet.Portal Comunidadeswww.coepbrasil.org.br/comunidadescoepCom o crescimento, em todo o Brasil, da rede de comunidadesparticipantes de ações em parceria com o COEP,ficou patente a necessidade de se criar um espaço na internetpara representar a base virtual dessas várias comunidades.Assim, em 2006, foi criado o Portal Comunidades.Trata-se de um ponto de encontro e interação entremembros dessas localidades, que disponibiliza um acervo2 Alguns exemplos degrupos temáticos:economia solidária, meioambiente, agroecologia,turismo e cultura, universidadese cidadania, políticaspúblicas, infância eadolescência, comunicaçãoe mobilização social,mulheres e relações degênero.


294 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008a ser construído colaborativamente ao longo do tempo a respeito da história,cultura, manifestações e conquistas.Entre as ferramentas disponíveis no Portal, estão blogs, fotologs, arquivos devídeo produzidos pelas comunidades ou sobre elas, ferramenta de educação adistância (Sime), salas de bate-papo e e-mail. As páginas de cada comunidadesão customizadas por elas próprias, incluindo o tipo de material a ser incluído.Sistema de Mídia e Educação (Sime)www.coepbrasil.org.br/comunidadescoep/simeA evolução do trabalho desenvolvido pelo COEP em comunidades de baixarenda, em especial no semi-árido nordestino, trouxe a necessidade de se implementarum processo de capacitação pela internet que pudesse atender a demandasespecíficas, além de servir comoalavanca impulsionadora de transformaçõessociais e comunitárias. Esse foi o desafioque motivou a criação do Sistema de Mídiae Educação (Sime).Lançado em meados de 2007, o Sime,com acesso pelo Portal das Comunidades,possui uma interface gráfica de fácil navegabilidadeque simula elementos existentesnas comunidades e, assim, gera uma identidade com os usuários. Possibilita oacesso a todo material disponibilizado, permitindo combinações de acordo comos interesses e necessidades.A partir do levantamento periódico das demandas das pessoas das comunidades,são escolhidos temas a serem trabalhados, como saúde, cooperativismo,mobilização, capacitação, entre muitos outros. A partir dos assuntos selecionados,o Sime disponibiliza cursos de caráter informativo sob forma de cartilhas eletrônicas,vídeos e materiais complementares, desenvolvendo conteúdo e dandoênfase à construção ativa do conhecimento e da capacidade dos usuários derecombinarem o material disponibilizado com seu próprio saber.A partir do levantamento das demandasdas comuni dades, são escolhidostemas a serem trabalhados, comosaúde, cooperativismo e mobilização


vale a pena acreditar | 295No momento, o site está preparado para o trabalho com comunidades rurais.Em breve, deverá ser ampliado para comunidades urbanas.Jornada pela Cidadaniawww.coepbrasil.org.br/jornadaO desafio de promover a atuação integrada de um número cada vez maior de organizaçõese pessoas em ações voltadas para a melhoria das condições de vida decomunidades de baixa renda levou ao desenvolvimento da Jornada pela Cidadania.A Jornada, lançada em meados de2007, é uma iniciativa inovadorade mobilização social, organizadaem ambiente da internet.Seus principais objetivos são:• aprofundar o compromisso dasorganizações e pessoas com atransformação da situação depobreza em comunidades debaixa renda;• fortalecer a mobilização socialdas organizações e das pessoase o comprometimento com o combate à fome e à miséria e com os Objetivosde Desenvolvimento do Milênio (ODMs);• incentivar a incorporação do compromisso social à cultura das organizações,bem como valorizar mecanismos que favoreçam processos de cooperação(parcerias).Na Jornada, as pessoas se organizam em equipes para atender a diferentesatividades, organizadas em etapas. O sistema da Jornada, além do gerenciamentodas diferentes atividades, permite contabilizar as ações. Dessa forma,possibilita a consolidação de uma tecnologia inovadora voltada para a mobilizaçãosocial.


296 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Instrumentos de gestãoPara a efetividade do trabalho em uma rede doporte do COEP, foi necessária, ainda, a implementaçãode um conjunto de sistemas computacionaisvoltados para a governança da rede. Nesse sentido,foram desenvolvidos diversos sistemas de gestão,como: SGCOEP (sistema de gestão) e o Recon(rede de contatos).Recon (rede de contatos)A necessidade de um processo ágil de mobilizaçãoda Rede COEP, presente em todo o país, commais de mil associadas e outros parceiros, implicoua construção do Recon – um sistema de cadastroe acesso a um banco de dados na internetvoltado para o arquivamento e gerenciamento detodos os contatos da Rede, possibilitando a unificaçãodas informações e seu grupamento portipo de contato.A partir desse cadastro, o Recon possibilita, comrapidez, elaborar cartas, e-mails, fax e outros tiposde correspondências, bem como gerenciar o encaminhamentodos diversos tipos de documentos.e coletiva, por meio do sistema é possível que cadamembro de uma equipe possa programar suasatividades e divulgar sua programação à coordenaçãoe aos demais membros do grupo. Possibilita,ainda, agendar atividades para outra pessoa pormeio de encomendas, ou seja, permite solicitar aum membro da equipe a execução de uma atividadeem um prazo determinado e acompanharseu desenvolvimento.Outra área de destaque do site é a de relatos,em que cada participante de uma equipe registra,periodicamente, as atividades realizadas e seusresultados, formando um banco de informaçõesque pode ser consultado por outros membros oupela coordenação, filtrados por tema, colaborador,data, local entre outros parâmetros. Além disso,viabiliza que todos os usuários enviem comunicadospara um mural, mantendo as equipes queatuam em outras áreas atualizadas sobre o desenvolvimentode atividades e acontecimentos dedestaque em todos os setores de atuação.SGCOEP (sistema de gestão COEP)O SGCOEP é uma ferramenta on-line que permitea comunicação, interação e gestão de equipesa distância. Dispondo de agenda on-line, pessoal


vale a pena acreditar | 297DesafiosUma rede, assim como um organismo vivo, precisa de constantes e diferentesestímulos para crescer e se fortalecer. Nas redes sociais, esses estímulos são resultado,especialmente, de um processo contínuo de mobilização e de comunicaçãoentre os vários nós que a constituem.Num cenário, onde as mudanças nas tecnologias de informação e comunicaçãosão cada vez mais rápidas, o grande desafio para o COEP, como uma redenacional de mobilização social, é estar sempre atento, atualizando-se e criandonovas estratégias de mobilização e ação social, com base em sistemas inovadores.Ao comemorar seus 15 anos, o COEP traz um novo instrumento para fortalecera comunicação em rede e o incentivo à participação cidadã: um espaço nainternet que, tendo como ponto de partida a publicação impressa Coleção COEPCidadania em Rede, possibilita a incorporação de novos conteúdos e reflexões.Constitui, assim, uma obra aberta em processo permanente de construção. Amélia MedeirosSecretária executivaadjunta do COEPNacionalSarita BersonCoordenadora da RedeMobilizadores, Banco deProjetos e COEP TeVê


Marcos datrajetória do COEPCriado no ano de 1993 em meio aos desdobramentos do Movimentopela Ética na Política, o COEP possui uma trajetória capaz de revelaro vigor da mobilização social como instrumento para o aprofundamentoda democracia brasileira. Por meio de uma ação descentralizada, o COEPsempre buscou criar, incentivar e aperfeiçoar as linhas de atuação de suas organizaçõesassociadas na promoção da cidadania. Desde o início, havia tambémo interesse em fortalecer o sentido público das empresas estatais e o compromissosocial das empresas privadas.A maior inovação, porém, foi romper com a lógica setorial dos projetossociais viabilizados por empresas e possibilitar a soma de esforços. Ao reunir,em maio de 1993, importantes instituições do país, rapidamente o COEP setransformou em um fundamental espaço de articulação para as demandas geradasàquela época pela sociedade civil brasileira.Quinze anos depois, ao refletir sobre os sucessos e as dificuldades de sua trajetória,o COEP encontra pistas para pensar o seu futuro. Para essa reflexão, buscouas análises e observações de colaboradores(as) mais próximos(as) 1 – representantestécnicos(as) de empresas associadas e secretários(as) executivos(as) estaduais e


vale a pena acreditar | 299municipais – e também de companheiros(as) de luta em outras organizações.Todo o esforço feito por quem respondeu às nossas questões, cumprindo prazose buscando informações em documentos do passado, pode ser conferido nas páginasa seguir. 2 Mas uma conclusão já é certa: os resultados positivos dessa históriasão tão significativos quanto os desafios que se apresentam.Linha Cronológica1993 Reunião no Fórum de Ciência e Cultura da <strong>UFRJ</strong>Assinatura do Termo de AdesãoPlano de Ação das Entidades1994 Resolução do ConseaMoção do Consea de incentivo à criação de cooperativas popularesContribuição à Conferência Nacional de Segurança AlimentarCooperativa de Trabalhadores Autônomos da Região de Manguinhos (Cootram)Protocolo de constituição do COEPCanal SaúdeNatal sem Fome (participação ininterrupta até 2001)1995 Ingresso no conselho do Comunidade SolidáriaReunião do conselho deliberativo do COEP: posse de d. Ruth Cardoso noconselho e eleição de Herbert de Souza, o Betinho, para presidente do conselhoIncubadora de Cooperativas Populares da Coppe/<strong>UFRJ</strong>Projeto XingóO&M da CidadaniaCriação da home page Rede de SolidariedadeSurgimento do COEP Paraná e COEP Ceará1 Este texto foi elaboradoa partir das respostasde secretários(as)executivos(as), representantestécnicos(as) e demaiscolaboradores(as) a questionáriossobre cada um dosmarcos da trajetória doCOEP Nacional.2 As entrevistas estãointegralmente disponíveisem .


300 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 20081996 Mobilização de solidariedade às pessoas atingidas pela enchente no SudesteFórum Nacional de CooperativismoSurgimento do COEP Pernambuco e COEP São Paulo1997 Programa Nacional de Incubadoras de Cooperativas Populares (Proninc)Reunião do conselho deliberativo do COEP Nacional/lançamento dobalanço socialRecomendação da Casa Civil: implantação de iniciativasdesenvolvidas pelo COEPHomenagem a Betinho em FurnasSurgimento do COEP Rio Grande do Sul, COEP Santa Catarina,COEP Maranhão, COEP Paraíba, COEP Rio Grande do Norte,COEP Rio de Janeiro e COEP Bahia1998 Criação da Oficina SocialMobilização de solidariedade às pessoas atingidas pela seca no NordesteEvento Mais um Ano com Betinho, no CCBBLançamento do portal do COEPSeminário Balanço Social: Cidadania e Transparência Pública em EmpresasCurso Prática do CooperativismoLançamento do livro Caminhos para mudar o BrasilOficina Projetos Inovadores para o Polígono da Seca: Gestão, Capacitação eMobilizaçãoSeminário Agricultura Familiar: Desafios para a SustentabilidadeSurgimento do COEP Minas Gerais e COEP Goiás1999 Prêmio Mobilização 1ª edição – Valorização do Trabalho VoluntárioPesquisa Ação Social COEP/IpeaLançamento das séries Imagens da Oficina Social e Cadernos da Oficina SocialSurgimento do COEP Distrito Federal, COEP Amazonas, COEP Alagoas,COEP Sergipe e COEP Espírito Santo


vale a pena acreditar | 3012000 Seminário Responsabilidade Social das Empresas: Balanço Social, aExperiência InternacionalCapacitação Desenvolvimento Local Integrado e SustentávelCurso Construindo Cidadania em Comunidades de Baixa Renda: daIdéia à AçãoInovação na comunicação da Rede COEP: lançamento das teleconferênciasBanco de Projetos Sociais – MobilizaçãoSemana Nacional de Mobilização pela VidaProjeto Algodão em Sistema Integrado à Indústria Juarez TávoraSurgimento do COEP Rondônia e COEP Acre2001 Projeto Algodão, Tecnologia e CidadaniaPrêmio Mobilização 2ª edição – Efetivação do Compromisso Social dasOrganizaçõesLei do Compromisso Social / Dia Nacional de Mobilização pela VidaConcurso de redação “O COEP e a Escola Caminhando Juntos naConstrução da Cidadania”Novo estatuto e regimento interno do COEPCriação do conselho de administração do COEPSurgimento do COEP Pará, COEP Mato Grosso do Sul, COEP Tocantinse COEP Roraima2002 I Encontro Nacional do COEPEvento de mobilização O COEP nas Asas da SolidariedadeLançamento do jornal Mobilização SocialNatal pela VidaCOEP Piauí


302 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 20082003 Apoio ao programa Fome ZeroReunião do conselho deliberativo do COEP NacionalReunião com a Presidência da RepúblicaEvento de mobilização O COEP Transportando SolidariedadeMobilização das associadas para certificação como “Parceiro do Fome Zero”Apoio ao programa Primeiro EmpregoParticipação no ConseaRede Mobilizadores COEPProjeto Mamona, Energia e CidadaniaSurgimento do COEP Mato Grosso e COEP AmapáInício da criação dos COEP municipais: Ji-Paraná (RO), Ouro Preto doOeste (RO) e Foz do Iguaçu (PR)2004 Movimento Nacional pela Cidadania e SolidariedadeApoio à Secretária Especial de Direitos HumanosFestival de Música do COEPProjeto Desenvolvimento ComunitárioSeminário internacional Gerenciamento de Redes para oDesenvolvimento ComunitárioSeminário Responsabilidade Social do Setor ElétricoCurso Elaboração, Acompanhamento e Articulação em Projetos Sociais:Elementos para Atuação de Voluntários e Mobilizadores2005 Rede de Comunidades COEPProjeto Universidades CidadãsSeminário Energia Promovendo CidadaniaInformativo Notícias COEPCOEP TevêSurgimento do COEP Dourados (MS), COEP Macaé (RJ) e COEP Campos (RJ)


vale a pena acreditar | 3032006 Institucionalização da participação das associadas no COEPCD 1ª edição – Os Oito Objetivos do Milênio na voz dos jovensSurgimento do COEP Sobral (CE), COEP Angra dos Reis (RJ),COEP Poços de Caldas (MG), COEP São José da Barra (MG),COEP Petrolina (PE), COEP Limoeiro do Norte (CE), COEP Tucuruí (PA),COEP Ponta Grossa (PR), COEP Ivaiporã (PR), COEP Londrina (PR),COEP Alto Tietê (SP), COEP Arapiraca (AL), COEP Pelotas (RS)e COEP Vale Histórico (SP)2007 Jornada COEP pela CidadaniaCurso de extensão Gestão de Iniciativas SociaisSeminário Políticas Públicas e Comunidades Semi-ÁridoLançamento do Sistema de Mídias e Educação (Sime)Surgimento do COEP Blumenau (SC) e COEP Contagem (MG)2008 Novo portal da Rede Nacional de Mobilização Social e da RedeMobilizadores COEPLançamento do Prêmio Betinho Atitude CidadãLançamento da Coleção COEP Cidadania em Rede impressa e emmeio eletrônicoII Encontro Nacional do COEPComemoração 15 anos do COEP e lançamento do selo COEP 15 AnosLançamento da tecnologia de construção da memória COEP – TrajetóriaCOEP em meio eletrônico


304 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 20081993Fórum de Ciência e CulturaNo dia 28 de maio, representantes de empresas públicas, fundações e autarquiasresponderam ao chamado de Betinho e Luiz Pinguelli Rosa e compareceram auma reunião no Fórum de Ciência e Cultura da <strong>UFRJ</strong>. O encontro marcou oprimeiro passo para a criação do COEP, então Comitê de Entidades Públicas noCombate à Fome. Sobre aquele momento, relata d. Mauro Morelli, então presidentedo Consea: “Sabíamos que, ao entrarem nesse processo de indignaçãodiante da exclusão da fome, as empresas poderiam descobrir sua vocação nodesenvolvimento do país. Queríamos que cada empresa pensasse qual seria a suacontribuição específica para um país que se organiza e que se desenvolve, pensandoem ser justo, fraterno e solidário. Essa era a nossa preocupação e era a intuiçãodo Betinho. Ele acreditava que, ao levar para a empresa essa preocupaçãocom a ação solidária, também estaria promovendo uma reflexão sobre o porquêde não sermos ainda um país sem fome e sem miséria”.Além de Betinho, André Spitz e Luiz Pinguelli Rosa e d. Mauro Morelli, areunião contou com a presença do deputado federal Roberto Freire, então líderdo governo Itamar Franco. Segundo Alcir Calliari, ex-presidente do Banco doBrasil, foi marcante “o apoio efetivo e completo do presidente da RepúblicaItamar Franco. Reconhecendo a importância e a necessidade de envolver asociedade civil na solução dos problemas da fome e da miséria, ele orientou aincorporação das entidades públicas do governo federal e as incentivou a participardo movimento, que redundou na criação do COEP”.Em junho, outra reunião apontou como diretrizes para o Comitê a importânciade multiplicar a utilização dos recursos de cada empresa, a transformaçãosocial do desperdício, o uso social dos excedentes, o incentivo à participaçãodos empregados(as) como cidadãos(ãs) e o apoio à formação de outros


vale a pena acreditar | 305comitês nas áreas de atuação de cada organização. A partir dessas orientações,segundo André Spitz, ficou acordado que cada instituição faria um plano deação: “A idéia era descobrir como cada uma poderia agir”.Uma das participantes desse encontro, Lia Hermont Blower, ex-gerente decomunicação da Petrobras, logo foi envolvida por essa oportunidade de envolver asgrandes empresas do país em um movimento de solidariedade. Segundo ela, a talcarta enviada aos presidentes das estataischegou à Petrobras justamentequando ela não estava: “A carta foiencaminhada para o Carlos Leonam,então superintendente de comunicaçãoda Petrobras. Lógico que vi umcaminho de poder mexer com a minhaempresa. Mas, ao mesmo tempo,vinha aquele preconceito: ‘mais umacampanha, mais filantropia’”.Felizmente, Lia estava enganada: “Vi pessoas realmente preocupadas em agir, enão apenas inclinadas a discutir propostas impossíveis. Conheci Betinho. Naqueleprimeiro encontro, dei um objetivo à minha vida. Eu iria utilizar toda a estruturada minha empresa para mudar, transformar. E, hoje, posso dizer que consegui.Cem por cento? Não acredito, em absoluto. Mas certamente deixei, ao sair da empresa,mais que uma semente, uma boa plantação de solidariedade e cidadania”.Vicente Guedes, funcionário da Embrapa, também se envolveu profissionale pessoalmente com o COEP: “A Embrapa foi uma das três dezenas de estataisque atenderam ao chamamento para a criação do COEP. No momento seguinte,fui designado como representante técnico da empresa no Comitê”. E ele continua:“Por trás daquela indicação de meu nome, havia certa comunhão de interesses eprincípios pessoais em aspectos ligados às temáticas da redução das desigualdadese do desenvolvimento sustentável, ambos aspectos relevantes no conjuntode parâmetros sob os quais transcorriam as discussões e alinhamentos da gestãoda empresa na época”.A partir de algumas orientações, ficouacordado que cada instituição faria umplano de Ação. A idéia era descobrircomo cada uma poderia agir


306 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 20083 As empresas e instituiçõesrepresentadas foram:Banco do Brasil, Banco doEstado do Espírito Santo(Banestes), Banco doNordeste do Brasil (BNB),Banco Nacional de DesenvolvimentoEconômico eSocial (BNDES), CaixaEconômica Federal (CEF),Companhia Energética deMinas Gerais (Cemig),Companhia Energética deSão Paulo (Cesp), CompanhiaHidro Elétrica do SãoFrancisco (Chesf), Empresade Tecnologia e Informaçõesda Previdência Social(Dataprev), DepartamentoNacional de Combustíveis(DNC), Empresa Brasileirade Correios e Telégrafos(ECT), Centrais ElétricasBrasileiras (Eletrobrás),Empresa Brasileira dePesquisa Agropecuária(Embrapa), Empresa Brasileirade Telecomunicações(Embratel), FundaçãoOswaldo Cruz (Fiocruz),Financiadora de Estudos eProjetos (Finep), FurnasCentrais Elétricas, InstitutoBrasileiro de Geografia eEstatística (IBGE), InstitutoNacional de Colonização eReforma Agrária (Incra),Instituto Nacional deTecnologia (INT), LightServiços de Eletricidade,Nuclebrás Engenharia(Nuclen), Petrobras,Empresa Brasileira deRadiodifusão (Radiobrás),Rede Ferroviária Federal(RFFSA), Serviço Federalde Processamento de Dados(Serpro), Superintendênciade Desenvolvimento doNordeste (Sudene),Telecomunicações doEstado do Rio de Janeiro(Telerj), UniversidadeFederal do Rio de Janeiro(<strong>UFRJ</strong>) e Companhia Valedo Rio Doce (CVRD).Adesão formalEm agosto, 30 empresas 3 assinaram o termo de adesão ao COEP e apresentaramsuas propostas (ver termo de adesão nas páginas 274 e 275). Foram dois oscaminhos apontados: um de resultado imediato e assistencial, como doações ecoletas de alimentos, a ser conduzido pela entidade e seu corpo funcional; eoutro de caráter estrutural de combate à fome e à miséria, que seria aplicadonacionalmente e em parceria com demais instâncias.Os dirigentes das empresas associadas ao COEP foram recebidos pelo presidenteItamar Franco, graças a uma articulação entre Consea e COEP, conformelembra d. Mauro Morelli. “Fiz um discurso saudando o presidente Itamar eapresentando o COEP. Foi um momento importante por sinalizar exatamenteque o poder público, com as suas expressões, com os seus ministérios, autarquiase empresas, se comprometia com a superação da miséria e da fome. Noprimeiro momento, uma grande ação para garantir que as pessoas comam; e, nosegundo momento, eliminar as causas da exclusão, da miséria e da fome. O COEP,com a visão profética do Betinho, já nasceu com uma dupla vocação, o momentotransitório emergencial de resposta a algo inaceitável e, ao mesmo tempo, umprocesso. E o COEP até aprofundou isso quando se abriu para as empresas nãopúblicas, para as privadas. Ao ampliar a ação para todo esse setor empresarial,o COEP estava responsabilizando as empresas pela contribuição às mudançassociais de que o país precisa”. E continua: “É bom sempre resgatar a vocaçãodo COEP, que tem essa dupla dimensão: uma ação emergencial de solidariedadee de articulações, mas também a missão de pensar o país, o nosso desenvolvimento,a energia que produzimos e o impacto no meio ambiente”.Alcir Calliari relembra: “No Banco do Brasil, empresa que eu presidia àépoca, o resultado da ação do COEP foi impressionante. Houve um comprometimentointegral, dos mais de 5 mil pontos de venda do Banco, todos querendocontribuir com ações em suas comunidades. No entanto, o que mais mecomoveu foi a incorporação das entidades dos funcionários do Banco, como asAssociações Atléticas Banco do Brasil. Desses comprometimentos, surgiram


vale a pena acreditar | 307muitas linhas de ação, como o BB Educar, que enriqueceram o esforço paraenfrentar a fome e a miséria”.Plano de açãoPara estudar a viabilidade das propostas de caráter estrutural de combate à fome,foram criados nove subgrupos de trabalho: saúde; energia e alimentos; saneamentoe habitação; educação; transporte e abastecimento; multiplicação do usoQuestões para uma nova realidadeÉ importante ressaltar que o COEP deixou de ser,há muito, um comitê de entidades públicas queaderiram à Campanha contra a Fome. Ao longo dotempo, o COEP ampliou-se, e novas estratégias demobilização social e participação cidadã foram buscadas.Surgiram COEP nos estados e municípios,houve adesão de organizações privadas, entidadesde classe, universidades e outros atores institucionais,assim como foram implementadas experiênciaspráticas de desenvolvimento comunitário. Maisrecentemente, o COEP deu origem a uma redenacional de comunidades, organizações e pessoas,tornando ainda mais complexo o planejamento desuas ações. Mas essa nova realidade do COEP étambém um dado importante para confirmar apremissa de que o enfrentamento da desigualdadesocial só é possível se feito de maneira integradacom governos, empresas e pessoas.E ainda há muitas outras questões a avançar.Como potencializar a atuação do COEP? Comoampliar a divulgação das ações realizadas? Comofortalecer o diálogo entre comunidades e gestoresde políticas públicas? Quais são os resultados aserem alcançados? Se o combate à pobreza passapelo combate às desigualdades de raça e de gênero,como aprofundar essa transversalidade nas açõesdo COEP? Como fortalecer o processo de cooperaçãoentre parceiros? Como fortalecer a interaçãocom movimentos sociais e organizações nãogovernamentais?Essas são apenas algumas dasquestões que o COEP quer discutir coletivamentecom leitores e leitoras da Coleção COEP Cidadaniaem Rede.Acesse: www.coepbrasil.org.br/cidadaniaemrede


308 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008de recursos; informática; legislação; e comunicação. Coube a esses grupos apontarquais iniciativas teriam o maior potencial, além de buscar as parcerias paraque fossem realizadas. “Juntávamos para discutir as idéias. Isso em si era umanovidade, pois até então uma empresa de um ministério não conversava comoutra”, garante André.Os projetos inicialmente escolhidos foram: Milagre das Águas; Hortas Comunitárias;Teleducação; Treinamento de Recursos Humanos para VigilânciaNutricional; Aproveitamento de Reservatórios de Hidroelétricas para Produçãode Pescado e Irrigação; Produção de Álcool em Pequenas Propriedades; eMelhoria das Condições de Favelas e Periferias. Segundo André, nem todos osprojetos foram implantados. “O subgrupo de educação, por exemplo, queriafazer teleducação para escolas públicas, mas não foi possível. Chegamos a juntarpossíveis parceiros, mas não desatamos esse nó.” Mas o que parecia perdidotomou outro rumo. O subgrupo da saúde, liderado pela Fiocruz, transformou aidéia no Canal Saúde. Paulo Buss, então vice-presidente da Fiocruz, acompanhouos primeiros debates: “Esse projeto fez tanto sucesso que, hoje, o CanalSaúde é parte integrante (e muito importante) da estrutura da Fiocruz e doSistema Único de Saúde do país”, afirma.


vale a pena acreditar | 3091994Resolução do ConseaEm fevereiro, uma resolução do Consea de incentivo à adoção por parte deempresas públicas de iniciativas elaboradas no âmbito do COEP celebrou umaarticulação que já ocorria desde 1993. As iniciativas que receberam essa espéciede aval do Consea foram as seguintes: aproveitamento de águas públicas paraprodução de pescado; aproveitamento de poços já perfurados da Petrobras; teleducaçãopara a área de saúde (Canal Saúde); uso de terra das empresas estatais;grupo de trabalho em pesquisa sobrefome, alimentação e nutrição; programaLeite É Saúde; e ação das empresasestatais no programa de combateà fome e à miséria.“A resolução veio fortalecer todoo trabalho de articulação desenvolvidopelo COEP para definição deum conjunto de propostas das associadasem apoio ao Consea. Em reforço à resolução, vieram, ainda, orientaçõesdo governo federal às próprias organizações, priorizando a implementaçãodessas iniciativas e agilizando os instrumentos necessários à sua realização”,explica Sarita Berson, coordenadora do COEP.A proximidade com o Consea também possibilitou ao COEP uma açãobastante efetiva na I Conferência Nacional de Segurança Alimentar (CNSA),tanto na realização como no processo preparatório: “Tivemos uma participaçãoimportante na I CNSA, não só por causa da articulação com o Consea.Além de termos elaborado um documento que foi praticamente todo assimiladopelo relatório final da conferência, mobilizamos nossas entidades para queEm fevereiro, uma resolução do Conseade incentivo à adoção de iniciativaselaboradas no âmbito do COEP celebrouuma articulação que já ocorria desde 1993


310 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008apoiassem financeiramente o evento”,relembra André.Vicente Guedes, da Embrapa, JoséCarlos de Sousa, do Banco do Brasil,e Acurcio Alencar Araujo Filho, doBanco do Nordeste, foram os coordenadoresdo grupo de trabalho criadopelo COEP para elaborar o documentocitado por André Spitz. “No processosociopolítico da I CNSA, houveuma diversidade de eventos preparatórios,vários deles circunscritos a órgãose entidades públicos e outros tantos,talvez mais numerosos e qualitativamentemais relevantes do ponto devista da participação popular, em espaçosnão-governamentais. Movimentossociais e diferentes formas de organizaçõesdo terceiro setor desencadearamações ou tomaram providênciasrumo ao objetivo. Nesse processo, oCOEP, como um colegiado de entidadespúblicas preocupadas com a fome, a miséria e suas outras conseqüências,foi convocado a preparar um documento de contribuições para a I CNSA. Noevento, cada entidade participante do Comitê teria um delegado participante e,coletivamente, o documento seria tomado com um dos insumos para os trabalhosprogramados na conferência”, explica Vicente Guedes, representante técnico daEmbrapa no COEP de 1993 a 1995.Ainda segundo Guedes, esse fato levou o COEP a recomendar a cada umade suas entidades participantes que preparassem uma contribuição institucional.Além disso, o COEP organizou um seminário nacional para a compatibilizaçãoDe 27 a 30 de julho de 1994, em Brasília, foi realizada a I ConferênciaNacional de Segurança Alimentar© Arquivo COEP


vale a pena acreditar | 311desses textos. Esse esforço foi realizado em Fortaleza, com participação de representantestécnicos(as) das entidades, e as discussões foram realizadas sobre umaproposta preliminar de texto-síntese escrito por um grupo técnico criado pelopróprio COEP: “No grupo técnico, estavam representantes da Embrapa, doBanco do Nordeste e do Banco do Brasil. Como contribuições institucionais,foram recebidas quase duas dezenas de documentos prévios, todos aproveitadosnaquela síntese”.“Vale a pena lembrar que o documento institucional elaborado pela Embrapatambém foi preparado em um esforço interinstitucional. A empresa convidoupara um grupo de trabalho representantes do Conselho de Organizações Estaduaisde Pesquisa Agropecuária (Consepa) e da Associação Brasileira dasEntidades Estaduais de Assistência Técnica e Extensão Rural (Asbraer). Tambémparticiparam desse grupo de trabalho pesquisadores de diversas áreas daprópria Embrapa. Como resultado, foi construído um texto multissetorial ecom enfoques multidisciplinares”, acrescenta Vicente Guedes. Segundo ele, oCOEP consolidou o texto e o enviou como contribuição para a conferência:“No documento final do evento, há um registro sobre a síntese carreada para asdiscussões em Brasília, para a qual foram consideradas as contribuições dasconferências estaduais, do COEP e dos comitês universitários”.Solução jurídicaCom a proximidade do fim do governo Itamar Franco e preocupada com aspossíveis mudanças nas presidências das empresas públicas, a comissão executivae alguns representantes técnicos(as) resolveram buscar uma maneira de garantircontinuidade ao COEP. O relato é de André Spitz: “Decidimos formalizar oCOEP como uma instância, mas não sabíamos que modelo adotar. Tivemos aajuda da Cida Seabra Fagundes, advogada de Furnas. Foi ela quem encontrou asolução jurídica. Assim, criamos um protocolo de constituição do COEP. Emtrês meses, conseguimos todas as assinaturas de que precisávamos. O protocolo


312 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008tinha associado a si um estatuto, que definia nosso modo de ação e objetivos, bemcomo direitos e deveres das organizações associadas”. Às 30 empresas iniciaisjuntaram-se mais duas: Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos RecursosRenováveis (Ibama) e Instituto Nacional de Alimentação e Nutrição (Inan).Hoje, Cida é funcionária aposentada de Furnas. Mas ela lembra com exatidãocomo foi o processo de constituição do COEP: “Na época, havia, em Furnas, umgrupo de pessoas que sempre se reuniam para debater assuntos variados. Faziaparte do grupo André Spitz, que costumava me pedir apoio para redação dedocumentos de cunho jurídico. Um dia, ele falou do COEP, ainda como umaProjetos inovadoresTambém em 1994 são iniciadas as articulaçõesque levariam à criação do Canal Saúde, mais umprojeto desenvolvido no âmbito COEP, por meiode uma parceria entre Fiocruz e Embratel. Funcionandoa pleno vapor até os dias de hoje, o objetivodo Canal Saúde é viabilizar o treinamento adistância, via satélite, para profissionais de saúdede todo o país. Por meio de sinal aberto e captadopor antena parabólica, o Canal Saúde transmiteduas horas diárias de palestras, cursos, conferênciase outros materiais de orientação. A populaçãoem geral também tem acesso ao Canal Saúde, queé retransmitido semanalmente pela TV Educativa.O ano de 1994 também registra o surgimentoda Cooperativa dos Trabalhadores Autônomos daRegião de Manguinhos (Cootram), que substituiuempresas privadas na prestação de serviços de limpezaem geral, jardinagem e outras atividades geraisda Fiocruz. A inovação deu início a uma marcana ação do COEP: o cooperativismo. A iniciativarecebeu o apoio do Consea, registrado em umamoção de incentivo à criação de cooperativas popularespara prestação de serviços e produção debens, gerando trabalho e renda em comunidadescarentes. “A moção do Consea de incentivo à criaçãode cooperativas populares fortaleceu e tornoupúblico o apoio do governo federal a essa iniciativainovadora, servindo ainda de respaldo para aexperiência”, acredita Sarita Berson.Outro fato marcante nesse período foi a adesãodo COEP à campanha Natal sem Fome, idealizadapor Betinho, a qual se tornou a estratégia mais conhecidada Ação da Cidadania contra a Fome e aMiséria e pela Vida.


vale a pena acreditar | 313idéia. Fiquei muito entusiasmada, porque Betinho, que tanto admirava – umexemplo vivo de que ‘o homem é feito da matéria de seus sonhos’, na fala dePróspero, personagem de A tempestade, de Shakespeare –, estava envolvido noprojeto. Então, começamos a ‘bolar’ como seria a estruturação, que foi surgindodas conversas”.Ela continua: “O André fez uma minuta e trabalhamos diversas alternativas,buscando a melhor solução para que as empresas estatais pudessem aderir aoprojeto sem maiores dificuldades jurídicas. Depois, lembro bem, foi uma alegriaestar presente à cerimônia de instituição do COEP”. Mas Cida também lembradas dificuldades geradas pela inovação que representou a criação do COEP: “Todainiciativa diferente e arrojada enfrenta, no início, obstáculos, principalmenteno âmbito das estatais”.


314 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Entrevista especialLécio Lima da CostaO cooperativismo é uma aposta antiga do COEP e foi uma de suas primeirasestratégias utilizadas para promoção de trabalho e renda e fortalecimentocomunitário. Lécio Lima da Costa é funcionário do Banco do Brasil e responsávelpela coordenação de assuntos ligados ao cooperativismo no âmbito doCOEP. Segundo ele, sua aproximação com o COEP começou em 1994, anoem que gerenciava uma área de negócios com o segmento de cooperativas.Desde então, Lécio é um grande incentivador do cooperativismo como meiode superação da pobreza e participou da emblemática experiência da Cooperativados Trabalhadores Autônomos da Região de Manguinhos (Cootram): “OBanco já vinha atuando nos primeiros trabalhos com o COEP, representadopela Nilda Bragança. A Fiocruz também já era parceira do COEP. Ao ser levantadoo ‘caso das favelas de manguinhos’ e sua relação com a Fiocruz, percebeu-seque a solução para a geração de trabalho para as populações de baixa renda noentorno da fundação passava também pela aproximação dos interesses das comunidadescom os da Fiocruz. O cooperativismo apresentou-se como o modeloapropriado e, então, fui chamado a participar do projeto. Nunca mais eu e oCOEP nos separamos”, resume Lécio.


uma onda de cidadania | 315A Cootram foi a primeira experiênciade cooperativismo do COEP. O querepresentou?Lécio Lima da Costa – Além de ser umprimeiro projeto mais concreto a apresentaruma solução pontual para aquela comunidadeespecífica, a Cootram inaugurouuma nova forma de agir das empresas.Tratava-se de uma forma proposta peloBetinho, com a criação do próprio COEP,e que passou a ser o nosso próprio modusoperandi. A novidade foi que as organizaçõespassaram a trabalhar juntas na buscade uma solução para um problema da sociedade.A Cootram não é um projeto apenasda Fiocruz. É um projeto, em conjunto,da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), daFinanciadora de Estudos e Projetos (Finep),da Fundação Banco do Brasil e do Bancodo Brasil. As entidades não mais competempara ver quem faz mais, quem tem a melhorimagem na sociedade. O essencial passa aser a soma dos esforços individuais gerandoum bem social para a coletividade.Pela experiência acumulada nesses 15anos do COEP, posso afirmar com convicçãoque os resultados para a sociedadesão melhores quando as entidades se unemem torno de projetos comuns. Infelizmente,em muitos casos, a vaidade de ser “odono” é maior do que o interesse social.Apesar da grande evolução, até hoje muitasinstituições têm dificuldades para realizarprojetos comuns.E como essa experiência influenciou aação do COEP?Lécio Lima da Costa – Inicialmente, oCOEP trabalhava muito em campanhascontra a fome e na distribuição de alimentos.E, logo, avançou para a discussãode como tirar as pessoas daquela situaçãode pobreza. O cooperativismo se apresentoucomo um mecanismo muito bom paraisso. Trata-se de um modelo que funcionadentro do modelo capitalista porque é umaempresa e, ao mesmo tempo, pode ajudar aspessoas a se juntarem para vender os seusserviços sem necessariamente estarem subordinadasao capital do empresário. É ummodelo excelente para atuar na questão dageração do trabalho e renda.Mas sempre mantivemos o propósito deprimeiro buscarmos levar o conhecimentode como funciona, quais são os riscos, quaissão os problemas, quais são as dificuldades,os direitos de quem participa, as assembléias,os conselhos possíveis e necessários. Essa éuma grande preocupação, pois cooperativasestão muito sujeitas a caírem no domínio depequenos grupos ou pessoas inescrupulosas,especialmente envolvendo pessoas com me-


316 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008nor nível de instrução e sem conhecimentoda legislação que envolve o tema.Como surgiu a idéia da primeira cooperativa?Lécio Lima da Costa – Havia um diagnósticoque indicava que a Fiocruz precisavater uma atitude que vinculasse sua ação comas comunidades de Manguinhos. A Fiocruzera muito atingida pela violência, muitostiros, muitas invasões, e até animais de pesquisadesapareciam. A instituição era uma“estranha” naquele local, era como se nãofizesse parte. Imagina o que é ter, de umlado, um castelo com mosaicos europeus e,do outro, pessoas sem qualquer condição dedignidade, sem qualquer tipo de saneamento.A Fiocruz se viu assim, como uma ilha.Na época, em 1994, Paulo Buss, vicepresidenteda fundação, e André Spitz deraminício ao debate de como construir umasolução. Havia a sugestão de blindar janelas,fazer muros, coisas desse tipo. Então, a novaproposta foi a de criar algumas relações coma comunidade que, ao mesmo tempo, resolvesseo problema da Fiocruz e também resolvesseo problema da comunidade.Como esses conhecimentos foram passadosaos(às) trabalhadores(as)?Lécio Lima da Costa – Sabíamos que nãopodíamos cometer o erro de simplesmenteajudar a criar a cooperativa sob o ponto devista jurídico e depois abandoná-la à suasorte. Era fundamental que atuássemos naeducação e na cultura das pessoas. Fizemosum acordo com a Universidade Federal doRio Grande do Sul e trouxemos para o Riode Janeiro professores em cooperativismo.Foram meses de teoria e de treinamentossobre a prática do modelo. Mais uma vez,a Fundação Banco do Brasil, o Banco doBrasil e a Fiocruz nos apoiaram, cada qualda forma como podia.Assim, conseguimos recursos para patrocinar,dentro da Fiocruz, os professores queensinaram aos futuros cooperados-empresáriosa atuar dentro do modelo cooperativista.Passamos uma temporada treinandoessas pessoas para formar a cooperativa,demos o suporte jurídico para a formaçãode estatuto, registro comercial etc. Tambémtivemos o apoio do Departamento de Cooperativismo,que, à época, fazia parte daSecretaria de Desenvolvimento Rural doMinistério da Agricultura.Dessa experiência surgiu a Incubadorade Cooperativas Populares?Lécio Lima da Costa – Sim. O professorLuiz Pinguelli, também um dos fundadoresdo COEP, era diretor da Coppe/<strong>UFRJ</strong>


uma onda de cidadania | 317e participou desse processo. Obviamente,por essa proximidade, também surgiu aidéia de fazer uma “outra Cootram” noâmbito da Coppe/<strong>UFRJ</strong>. A idéia era fundaroutra cooperativa de pessoas que prestariamserviços para a universidade. Tivemosuma reunião para falar sobre isso naCoppe e, nessa ocasião, surgiu a propostade transformar a idéia inicial em um processocontínuo. Em vez de fazermos maisuma cooperativa, optamos por criar ummodelo que permitisse que a experiênciafosse replicada.A Coppe já tinha uma incubadora deempresas, mas a lógica do que estávamoscriando era bastante diferente. As empresasde tecnologia são empresas de ponta,e o caso da incubadora de cooperativas nãoera essa a lógica. Nosso propósito era atuarno combate à pobreza, no combate à fomepor meio da geração de trabalho e renda.Recriamos a idéia da incubação sob esseponto de vista.Como essa idéia foi viabilizada?Lécio Lima da Costa – Foi novamentepor meio de uma articulação no âmbitodo COEP. A Finep, a Fundação Banco doBrasil, a Coppe, a Fiocruz e o Banco doBrasil se uniram e escreveram um projeto.Cada entidade teria uma atribuição, mascada uma atuaria de forma a complementaro papel da outra. A Coppe disponibilizouprofessores e estagiários. A Finep ea Fundação Banco do Brasil entraram comrecursos. O Banco do Brasil com o conhecimentoem cooperativismo. O COEP coma articulação das entidades. Interessante,também, foi a transformação na lógica daatuação da Finep que, até então, só apoiavaprojetos de inovação tecnológica e passoua apoiar um projeto de inovação tecnológicana área social. A Maria Lúcia Hortade Almeida, da Finep, teve papel fundamentalno processo. Foi criado um conceitode tecnologia social. A proposta, então,ganhou o nome de Incubadora de CooperativasPopulares. A idéia deu certo.Depois de criar essa “metodologia”, qualfoi o próximo passo?Lécio Lima da Costa – Replicar a idéiadas incubadoras para outras universidades.Queríamos testar se essa tecnologia socialhavia sido uma experiência que somentedeu certo naquele local e naquelas circunstânciasou se era mesmo uma grande idéia.Para debater essa e outras questões, realizamosum seminário no Rio de Janeiro, noCentro Cultural Banco do Brasil. Nesseencontro, foram definidas as universidadesque receberiam os recursos para a im-


318 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008plantação de novas incubadoras. As escolhidasforam: Universidade Federal de Juizde Fora (UFJF), Universidade do Estadoda Bahia (Uneb), Universidade Federal doCeará (UFC), Universidade Federal Ruralde Pernambuco (UFRPE) e Universidadede São Paulo (USP). Na proposta, auniversidade, na concepção da incubadora,é o ambiente em que as cooperativaspodem se instalar como empresa: ter suporteem administração, em marketing, emcontabilidade, em direito e, obviamente,em questões relativas ao modelo do cooperativismo.Do que trata o Projeto de Lei 1.670/96?Lécio Lima da Costa – Depois das dificuldadesenfrentadas pela Fiocruz paracontratar a Cootram, tivemos a idéia deapresentar um projeto que reformulasse aLei das Licitações. O Projeto de Lei 1.670está tramitando no Congresso Nacionaldesde 1996, infelizmente. Caso seja aprovado,possibilitará que, durante um ano, oente público, quando apoiar a criação deuma cooperativa em comunidades de baixarenda, possa contratá-la sem processo delicitação. Até hoje, um dos grandes gargalosé como inserir uma cooperativa formadaem comunidades de baixa renda no processolicitatório de forma que as empresasestatais e o setor público em geral possamcontratar tais cooperativas.Mas de forma alguma esse projeto prevêque a cooperativa fique isenta do processoregular licitatório, apenas adia issodurante um ano. Particularmente, acreditoque, quando uma cooperativa funcionabem, tem mais chances de ganhar qualquerlicitação porque não teria motivos paraapresentar um custo maior de um serviçodo que uma empresa terceirizadora.O que queremos com esse projeto éque os entes públicos possam dar o pontapéinicial. Depois, a cooperativa tem deter competência e qualidade, que podemser fornecidas por meio do processo deincubação. As idéias se encontram.E como surgiu o Proninc?Lécio Lima da Costa – O Proninc é tambémresultado dos processos de articulaçãoem torno do COEP. Por volta de 1998, estávamosarticulando um apoio do governofederal para as incubadoras, por intermédiodo Programa Comunidade Solidária.A Ana Peliano, à época secretária executivado Comunidade Solidária e também umagrande parceira do COEP, apoiava osnossos esforços. Buscávamos transformaressa iniciativa em um programa de governoe ampliar o acesso a recursos públicos.


uma onda de cidadania | 319Foi a primeira vez que tratamos do conjuntocomo sendo um programa nacionalde incubadoras de cooperativas.Vale lembrar que, no âmbito do ComunidadeSolidária, criamos até um FórumNacional de Cooperativismo, que visavadiscutir o cooperativismo brasileiro paraalém das questões das incubadoras. Tínhamosquestões legais, trabalhistas, de capacitação,agrícolas etc. Inclusive imaginávamoslevar a proposta da Incubadora deCooperativas Populares para outras instituiçõesque não fossem as universidades,como organizações não-governamentais eorganizações da sociedade civil de interessepúblico, de forma a expandir o modelo etestá-lo em outras formas de organização.Como avalia a trajetória do COEP nocooperativismo?Lécio Lima da Costa – O COEP cresceumuito. Da mobilização que começou em1993, o COEP avançou para muitos projetos.O cooperativismo é um dos temas quepermeiam diversas iniciativas. Em Manaus,por exemplo, o COEP ajudou a formaruma cooperativa de costureiras. Essa cooperativade costureiras presta serviço a umagrande indústria de bonecas. As mulheresfazem roupinhas e outros adereços para aindústria. Essa cooperativa anda com aspróprias pernas, tem as próprias máquinas,presta serviços etc. Isoladamente, elas nãotinham condições de organização e produção.Para elas, a outra forma de ter renda éserem empregadas de alguém. Mas, assim,elas não participariam do lucro nem, obviamente,do risco do negócio. Atualmente,também trabalhamos na criação de umaindústria cooperativada no âmbito do projetoComunidades do Semi-Árido. Eventualmente,ainda organizamos alguns cursose treinamentos para COEP estaduaisou municipais que os solicitam. Ao longodessa história, constatamos que esse eraum modelo interessante, mas não podíamossair por aí incentivando a aberturade cooperativas de maneira irresponsável.Estaríamos criando situações para desastresfuturos, pois há grande necessidade dese praticar o modelo, conhecer, saber dosriscos, imbróglios jurídicos, tributários, etoda a teoria e a prática que envolvem umaempresa-cooperativa.


320 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 20081995Conselho DeliberativoEm maio de 1995, em uma reunião no Centro Cultural do Banco do Brasil, noRio de Janeiro, Betinho foi eleito presidente do conselho deliberativo do COEPe d. Ruth Cardoso, então presidente do conselho do Comunidade Solidária,passa a ser conselheira do COEP. Na mesma reunião, apresentou-se o documentoDiretrizes e Recomendações para 1995, distribuído às associadas já no âmbito deum novo governo. “Foi como se pedíssemos um novo plano de ação às empresas”,afirma André. Ele complementa: “Conseguimos construir uma lógica de funcionamentoque deu sustentabilidade ao COEP. Essa reunião foi importante porafirmar o trabalho do COEP aos novos dirigentes”.Tecnologia socialOutro fato ocorrido nessa reunião marcaria para sempre a ação do COEP nomundo do cooperativismo. Depois do sucesso da Cooperativa de TrabalhadoresAutônomos da Região de Manguinhos (Cootram), um protocolo de intençõespara aperfeiçoar essa nova tecnologia social foi assinado com a Finep. O protocologarantiu financiamento para a Coppe/<strong>UFRJ</strong>, que tinha à época uma incubadorade empresas e ficou responsável pela formatação da nova incubadora. Tambémhouve o apoio financeiro da Fundação Banco do Brasil e participação da Gerênciade Negócios do Sistema Cooperativista do Banco do Brasil (Gecoop-BB)e da assessoria do Instituto de Cooperativismo da Universidade Federal deSanta Maria (UFSM).Maria Lucia Horta de Almeida, representante da Finep no COEP de 1993 a2003, ressalta: “Atualmente, não pairam mais dúvidas quanto a esse entendimento,


vale a pena acreditar | 321mas, naquele momento, em que os apoios à ciência e tecnologia na área socialvoltavam-se basicamente para a realização de estudos que pudessem contribuirpara o entendimento de diversos aspectos da sociedade e em que os processosseletivos baseavam-se principalmente no mérito científico das propostas, foi necessáriotodo um trabalho de convencimento – tratava-se de ampliar substancialmentea importância de uma outra dimensão nos critérios de avaliação: o possívelretorno imediato para a sociedade dos benefícios daquela proposta de cunho social.Tratava-se de valorizar mais fortemente apesquisa aplicada e de atender não apenas acomunidade acadêmica, as empresas ou osformuladores de políticas públicas, mas simos usualmente excluídos desse processo”.Para ela, as principais dificuldades se relacionaramà já mencionada necessidade deconvencer as diversas instituições partícipesda relevância da iniciativa e em encontrarsoluções para superar os obstáculos inerentesa toda experiência inovadora: “Nesse aspecto,o esforço coletivo dos membros do COEPfez toda a diferença”.A incubadora de cooperativas popularesfoi das experiências mais inovadoras e maispositivas da trajetória do COEP. “Os resultadosobtidos em termos de alternativas degeração de emprego e renda foram altamentepositivos. Agregaram-se a eles outros benefícios,como a qualificação das pessoas dascomunidades, o aumento da auto-estima doscooperativados, a transferência de conhecimentoda universidade para as comunidadesque dele necessitam etc. Efetivamente,© Arquivo COEPBetinho foi fundador e presidente do Conselho Deliberativo do COEP


322 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008desenvolveu-se uma metodologia de geração de trabalho e renda e, conseqüentemente,de inclusão social. O apoio à Coppe/<strong>UFRJ</strong> foi renovado e, ao términodos dois primeiros anos, estavam incubadas 19 cooperativas, responsáveis pormais de mil postos de trabalho, em diversos setores de atividade, beneficiandoparcela expressiva da população que se encontrava até então excluída do mercadode trabalho”, avalia Maria Lucia Horta de Almeida.EstadualizaçãoEm 1995, o COEP começou seu enraizamento nos estados brasileiros. NoParaná e no Ceará, as primeiras experiências contaram com importantes parceriaslocais. “As ações de cidadania e voluntariado já faziam parte de meuIncubadora de desafiosAlém da incubadora da <strong>UFRJ</strong>, o COEP teve envolvimentodireto na criação de outras cinco incubadoras,nas seguintes universidades: UniversidadeFederal Rural de Pernambuco (UFRPE), Universidadede São Paulo (USP), Universidade Federalde Juiz de Fora (UFJF), Universidade doEstado da Bahia (Uneb) e Universidade Federaldo Ceará (UFC).A iniciativa exigiu muito mais do que o apoiodas empresas associadas ao COEP. “Foi um grandeesforço para que os resultados positivos da Cootramnão fossem vistos como acaso e para que os trabalhadorespudessem provar a capacidade em gerircoletivamente o próprio negócio. O COEP reuniusuas associadas para discutir como superar os desafiosda capacitação e da gestão. Assim, surgiu aIncubadora de Cooperativas Populares. Atualmente,existem mais de 80 incubadoras popularesespalhadas em universidades por todo o Brasil”,informa André Spitz, presidente do COEP.Essa iniciativa transformou-se em uma importantepolítica pública incentivada e gerida atualmentepela Secretaria Nacional de Economia Solidáriado Ministério do Trabalho, da qual está àfrente o professor Paul Singer.


vale a pena acreditar | 323dia-a-dia e eu já havia auxiliado na instalação dos Comitês de Cidadania doBanco do Brasil no estado do Paraná. Nesse contexto, realizamos a instalaçãodo primeiro COEP estadual, no Paraná, por intermédio da articulação do Bancodo Brasil e da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), com aesperança de contribuir na transformação do Brasil em um país mais justo esolidário”, relembra Regina di Marcantonio, funcionária aposentada do Bancodo Brasil, que foi a primeira secretária executiva do COEP Paraná.Conceição Contim, então funcionária da Companhia Nacional de Abastecimento(Conab), também foi convidada a participar da criação do COEP Paraná,do qual é a atual secretária executiva. “Entendendo que poderia contribuir para amobilização das organizações públicase para a adoção do diálogo social entredirigentes e empregados, visando àcriação de alternativas inovadoras nocombate à fome, aceitei participar doCOEP”, conta Conceição.No Ceará, foi Irene Lima, funcionáriaaposentada do Banco do Brasil,quem se integrou a essa nova fase doCOEP. Como secretária executiva, relembra: “Através de ações direcionadas àspopulações menos favorecidas, o COEP Ceará conquistou o respeito da sociedadecivil, de empresas públicas, privadas e de comunidades atendidas, além da adesãode mais de 40 associadas e diversos parceiros. Hoje, atende diretamente a cincocomunidades, através de 47 equipes, formadas por mais de 190 mobilizadoresCOEP, voluntários da Jornada COEP pela Cidadania, com ações estruturais ede desenvolvimento e, indiretamente, a outras que solicitam, por meio de trabalhose campanhas específicas, cursos, palestras e seminários” – orgulha-se asecretária executiva do COEP Ceará, que permanece à frente do cargo.No Paraná, os resultados também chamam a atenção: “Ao longo de 13 anos,o COEP Paraná contabiliza iniciativas que mudaram a vida de muitas pessoas.Entre os projetos de destaque, encontram-se: a qualificação social e profissional,O COEP Ceará conquistou o respeito dasociedade civil, de empresas públicas,privadas e de comunidades, além daadesão de mais de 40 associadas


324 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008proporcionando oportunidades para extratos da população de baixa renda. Osefeitos de tais esforços proporcionaram mais de 3.500 pessoas capacitadas na áreade microinformática, por meio de iniciativas das associadas Dataprev, EmbrapaFlorestas, Infraero, Justiça Federal e Serpro. Além disso, reforçando essa capacitaçãopara o mercado de trabalho, o COEP Paraná qualificou mais de 1.500 pessoasem diferentes cursos, tais como: alvenaria, eletricidade básica, marcenaria e papelmicroondulado, assentamento em azulejo e hotelaria. Outra medida importante noCOEP ParanáPrimeiro a ser criado no âmbito estadual, oCOEP PR surge de um esforço de articulação daEmpresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária(Embrapa) e do Banco do Brasil, que assumiusua secretaria executiva. Em sua história, podemser destacados projetos de qualificação profissional,formação de alfabetizadores(as) e direito àalimentação, além de campanhas de arrecadaçãode peças de roupas.Por meio do projeto O COEP e a Escola CaminhandoJuntos na Construção da Cidadania,criado em 2001, o COEP PR realiza concursosde redação, frases, poesias, cartas, esquetes e demúsica em todo o estado paranaense. O COEPPR teve um papel de destaque na criação dosCOEP municipais de Foz do Iguaçu, PontaGrossa, Londrina e Ivaiporã, no Paraná, e deJoinville, Itajaí e Blumenau, em Santa Catarina.A partir de 2004, o COEP PR ampliou suaparticipação social com ações nas comunidadesde baixa renda, tendo escolhido a comunidadeVila Audi, no bairro Uberaba, como local da intervenção.A proposta foi baseada nos Oito Objetivosde Desenvolvimento do Milênio e no MovimentoNacional pela Cidadania e Solidariedade.Segundo Conceição Contim, secretária executivado COEP PR desde dezembro de 1997, coma criação da Jornada COEP pela Cidadania, em2007, o trabalho se intensificou: “Duas comunidadesparticipam da Jornada: Vila Audi e Via JardimUnião Ferroviária. As equipes formadas têm viabilizadoas tarefas que integram cada etapa daJornada, mas o projeto mais ousado refere-se aoCentro Comunitário na Vila Jardim União Ferroviária,que está em construção”.


vale a pena acreditar | 325COEP CearáCriado em dezembro de 1995, por meio de umaarticulação do Banco do Brasil, desde então oCOEP CE vem realizando trabalhos contínuos nasáreas de educação, saúde, prevenção às doenças,segurança alimentar e nutricional, capacitação profissionale funcional, inserção de jovens e adultos(as)no mercado de trabalho, realização de pequenosprojetos e fabricação caseira de produtos, desenvolvimentodo artesanato local, construção e/ou ampliaçãode escolas e centros de apoio comunitário,criação de pequenos animais e doação de alimentos,material escolar e equipamentos.Segundo Irene Lima, funcionária aposentadado Banco do Brasil e secretária executiva do COEPCE, ao longo de 13 anos foram distribuídas maisde 1.500 toneladas de alimentos, beneficiandoaproximadamente 45 mil famílias. Irene tambémressalta a construção de três centros comunitários,um no interior do estado e dois em Fortaleza,com mais quatro em andamento. “Na comunidadeLagoa Redonda, em Fortaleza, o centro comunitáriofoi inaugurado em abril de 2008. Está aparelhadocom seis salas de aula, biblioteca, binquedoteca,videoteca, sala de reunião, cozinha,dispensa, banheiros, espaço de jogos e oficinas decapacitação, beneficiando, inicialmente, 200 criançase aproximadamente 150 famílias”, informaIrene Lima. Ainda de acordo com Irene, no mesmolocal está sendo instalado um telecentro. “Os beneficiáriosreceberão acompanhamento do COEPCE e participarão de oficinas e cursos até queconsigam se estabelecer como cidadãos de direitoe de fato.” Além disso, por meio da Jornada pelaCidadania, o COEP CE atua em cinco comunidadespelo trabalho de 47 equipes, formadas pormais de 190 mobilizadores(as), com ações estruturaisde desenvolvimento.campo da inclusão diz respeito à formação de alfabetizadores. A abordagem sobresegurança alimentar permitiu, desde a criação do Comitê, a atenção no debatesobre o direito à alimentação para todos e nos cursos de alimentação alternativa.As campanhas desenvolvidas configuram a oportunidade da cadeia de solidariedade.Somente em 2007, beneficiaram mais de 15 mil pessoas, com uma arrecadaçãoem torno de 60 mil peças de roupas”, informa Conceição Contim.Aurino Valois Júnior representa a Conab no COEP Nacional, mas tevegrande envolvimento na estratégia de estadualização dos COEP. “Cada novo


326 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008COEP representa não só o crescimento da rede, mas também um crescimentopessoal para aqueles que, como eu, se sentem realizados ao ver realizações concretasda nossa ação” – garante. Ele também lembra a satisfação de ter participadoda criação do COEP Maranhão e do COEP Paraíba. “Num curto espaçode algumas horas, viajei para os dois estados e participei da instalação dos doiscomitês. Mesmo cansado, eu me senti realizado”, relembra Aurino, que na épocaera o superintendente da Conab.Rede de SolidariedadeMaurilio Engel foi representante do Serviço Federal de Processamento de Dados(Serpro) no COEP Nacional de 1993 a 2004 e acompanhou o surgimento dosCOEP estaduais. Para ele, esse momento tem grande relação com a criação dahome page da Rede de Solidariedade, outra ação inovadora do COEP: “A criaçãoda home page da Rede de Solidariedade permitiu ampliar a participação de umaquantidade maior de colaboradores. Sua divulgação incentivou a adesão de pessoasque buscavam uma forma de atuar em ações solidárias. A partir do acesso àsinformações sobre o que estava sendo feito em outros locais da empresa e emoutras instituições, houve encorajamento para novas ações”, acredita.Para ele, “a rede propiciou que as pessoas tomassem conhecimento de experiênciasconcretas, ações promovidas no mundo real, e não só num nível dodiscurso, como acontecia anteriormente. Essa realidade foi bastante motivadorae facilitou que o movimento se expandisse com maior ou menor ênfase emtodos os estados”. Particularmente, Maurílio relembra o que o despertou paraa ação solidária: “A maior motivação para meu engajamento no movimento foiantever a possibilidade de uma utopia: o desafio de articular e integrar açõescom a colaboração de diversas instituições, motivadas por objetivos comuns.As ações, mesmo quando realizadas no âmbito individual de uma organização,representavam a manifestação da vontade coletiva, construída no ambiente doCOEP”, enfatiza.


vale a pena acreditar | 327Projeto XingóAinda em 1995 surgiu o projeto Xingó. A partir de uma proposta da Chesf paraa utilização da infra-estrutura física e social – casas, igrejas, escolas, centro comercial,alojamento, fórum judicial, centros sociais, hospital, estação rodoviária,restaurantes, centros comunitários, telefone, energia elétrica, saneamento etc. –montada para suportar a construção da Usina Hidrelétrica de Xingó, a iniciativatornou-se um fator propulsor do desenvolvimento no semi-árido brasileiro.Foram articuladas diversas parcerias com centros de pesquisas, universidadese outras entidades para a criação de um núcleo compartilhado de desenvolvimentocientífico e tecnológico do semi-árido nordestino, atuando nas áreas deeducação; fontes de energia alternativas; recursos hídricos e qualidade da água;aqüicultura; atividades agropastoris; solo, clima e meio ambiente; turismo ehotelaria; arqueologia e patrimônio histórico; ecologia e biodiversidade da caatinga.Cerca de 30 municípios – nos estados de Alagoas, Bahia, Pernambuco eSergipe – têm sido beneficiados desde 1995 por meio dessa iniciativa surgidagraças à articulação promovida pelo COEP e suas entidades associadas.


328 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 20081996Mobilização de solidariedadeEm fevereiro de 1996, a cidade do Rio de Janeiro sofreu intensamente com asenchentes provocadas pelas chuvas de verão e pelas más condições de galerias subterrâneas.O COEP realizou uma reunião extraordinária, em 28 de fevereiro, e criouum grupo de trabalho formado pelas seguintes instituições: Finep, Coppe/<strong>UFRJ</strong>,CEF, Telerj, Light, Serpro, Embratel e Petrobras. Esse grupo atuaria a partir detrês orientações: a primeira, de emergência, era destinada ao atendimento daspessoas atingidas pelas chuvas; a segunda era voltada à criação de uma rede deemergência, coordenada pelas autoridades locais com participação das entidades; ea terceira, de longo prazo, voltava-se para a elaboração de possibilidades de contribuiçãodas entidades na construção de umplano de emergência, bem como no desenvolvimentode ações que poderiam melhoraras condições de vida em favelas e periferias.“Lembro-me perfeitamente de uma reuniãono IBGE em que Betinho e Luiz Pinguelliestavam presentes. Os dois chamavama atenção para o fato de que o COEP deviafazer algo em relação às enchentes que ocorriamfreqüentemente na cidade do Rio de Janeiro”, afirma Gleyse Peiter, secretáriaexecutiva do COEP Nacional. Ela também lembra que essas enchentesforam verdadeiras tragédias: “Morreram muitas pessoas por causa de alagamentose desmoronamentos. A cidade sofreu muito. Betinho, inclusive, durante o carnaval,usou uma tarja preta em sinal de luto por toda aquela situação”.Em relação à elaboração de possibilidades de contribuição das entidades naconstrução de um plano de emergência para longo prazo, formou-se outro grupoEm 1996, a cidade do Rio de Janeirosofreu intensamente com as enchentesprovocadas pelas chuvas de verão e pelasmás condições de galerias subterrâneas


vale a pena acreditar | 329de trabalho, do qual participaramEmbrapa, Petrobras, Finep e Coppe/<strong>UFRJ</strong>. E foi dessa articulação quesurgiu a proposta de organizar oseminário Prevenção e Controle dosEfeitos dos Temporais no Rio deJaneiro. Lia Hermont Blower, exgerentede comunicação da Petrobras,representou a empresa no grupode trabalho e também no seminário,realizado em agosto do mesmo ano.“O seminário foi muito importante.Acredito, inclusive, que foi a primeirainiciativa nesse sentido. A sociedadeorganizada debateu e apresentousuas propostas.”A decisão de criar uma articulaçãoda sociedade civil para enfrentaro problema foi influenciada também,segundo Gleyse Peiter, pelofato de ser aquele um período préeleitoral:“No seminário, tivemos apresença de candidatos à Prefeiturado Rio, suas equipes, e especialistasna questão, além de representantesda sociedade civil em geral. Nossa proposta era ir além de uma solução técnica,queríamos uma solução política que envolvesse várias representações”.Os principais debates desse encontro foram editados e publicados no livroTormentas cariocas, coordenado por Luiz Pinguelli Rosa e Willy Alvarenga Lacerdae lançado pela Coppe/<strong>UFRJ</strong>. “Essa publicação foi entregue aos candidatos àPrefeitura e é um exemplo do que a sociedade civil pode fazer para participar© Arquivo COEPOs debates do seminá rio Prevenção e Controle dos Efeitos dos Temporais noRio de Janeiro foram editados e publicados no livro Tormentas cariocas


330 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008de decisões sobre políticas públicas. Para as autoridades, é de fundamental importância,pois sistematiza soluções já debatidas por uma parcela significativada sociedade”, ressalta Gleyse Peiter.COEP PernambucoO COEP PE surgiu em 1996, por meio de uma articulação do ServiçoFederal de Processamento de Dados (Serpro). Segundo sua secretáriaexecutiva Selda Cabral, funcionária da Caixa Econômica Federal, asatividades desenvolvidas sempre estiveram focadas na inclusão social ena melhoria da qualidade de vida das comunidades atendidas.Entre as realizações, cabe destacar o projeto Melhoria da Qualidadedos Serviços & Produtos, voltado aos(às) ambulantes da orla marítima doRecife, e outras ações específicas para o município de Lagoa de Gatos,que apresentava o quinto pior índice de desenvolvimento humano (IDH)de Pernambuco.“Mais recentemente, em 2007, o COEP PE realizou o curso CozinhaBrasil, sobre o potencial nutritivo dos alimentos, do qual participaram160 mulheres. Ainda em 2007, a iniciativa Brasil Alfabetizado contoucom 500 participantes”, relata Selda.


vale a pena acreditar | 3311997Agora é com vocêsO ano foi marcado pela perda de Betinho, que morreu em 9 de agosto. Mas foitambém um período de desafios e novas conquistas, certamente inspiradas pelafrase “Agora é com vocês”, que acompanhou muitas das homenagens ao sociólogorealizadas após sua morte. Entre os fatos emblemáticos de 1997 estão aassinatura do Programa Nacional de Incubadoras de Cooperativas Populares(Proninc), o lançamento do modelode balanço social para empresas, arecomendação da Casa Civil paraimplantação de iniciativas desenvolvidaspelo COEP e a homenagem aBetinho, realizada pelo COEP Nacionalem Furnas, no Rio de Janeiro.Em 1997, também surgiram as instânciasestaduais do COEP no RioGrande do Sul, Santa Catarina,Maranhão, Paraíba, Rio Grande doNorte, Rio de Janeiro e Bahia.© Arquivo COEPPronincMaria Lucia Horta de Almeida,ex-representante da Financiadorade Estudos e Projetos (Finep) noCOEP, relembra o que houve emEm novembro de 1997, o COEP Nacional faz uma homenagem a Betinho. MariaNakano, viúva do sociólogo, vai à sede de Furnas para plantar um manacá.A cerimônia também marca a criação do COEP RJ


332 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 20081997: “Nesse ano, o COEP, a Finep, a Fundação Banco do Brasil, a Coppe, a Secretariade Desenvolvimento Regional (SDR), a Gecoop-BB e a secretaria executivado Programa Comunidade Solidária constituíram o Proninc, que representa oprincipal desdobramento da experiência-piloto inicial com a Coppe/<strong>UFRJ</strong>. EmCOEP Rio de JaneiroCriado em 1997, o COEP RJ foi inicialmente secretariadopela Petrobras, representada por LiaHermont Blower, ex-gerente de comunicação daempresa. De 2000 a 2004, a secretária executivafoi Henriette Nariacy Krujman, do Instituto Nacionalde Tecnologia (INT). Segundo a atual secretáriaexecutiva, Ana Cláudia Gesteira, funcionáriade Furnas, “desde seu surgimento, o COEPRJ realiza atividades em sintonia com a agendaproposta pelo COEP Nacional”. Ela aponta algumasdessas iniciativas: Semana Nacional de Mobilização;o concurso COEP e a Escola CaminhandoJuntos na Construção da Cidadania; oDia Mundial da Alimentação; e Natal pela Vida.“O COEP RJ também atuou na proposta COEPTransportando Solidariedade, com ações em aeroportos,barcas, terminais e estações de trem, entreoutras”, complementa.Também merecem destaque os projetos dedesenvolvimento comunitário desenvolvidos nacomunidade Tubiacanga, localizada no entorno doAeroporto Internacional Antonio Carlos Jobim/Galeão, e no morro do Juramento, próximo ao bairrode Vicente de Carvalho, na região Norte da cidade.Em Tubiacanga, área de aproximadamente milmetros quadrados, com 750 casas, cerca de mil famíliase aproximadamente 6 mil habitantes, o projetoé realizado desde 2004: “Algumas instituições –Banco do Brasil, Brasil Veículos, Dataprev, Furnas,Serpro, Sociedade Digital e INT – acreditaram narelevância dessa proposta e contribuíram diretamentepara a estruturação do Telecentro Comunitáriode Tubiacanga, disponibilizando recursoshumanos e materiais”, ressalta Ana Cláudia.Em 2004, o COEP RJ começou a atuar nomorro do Juramento. Com o surgimento da Jor nadaCOEP pela Cidadania, em 2007, este apoio foiampliado e, atualmente, um cen tro comunitárioestá sendo construído com a ajuda de um mutirãode moradores e moradoras e com material doadopela Brasil Veículos, Serpro e Caixa EconômicaFederal. O morro do Juramento possui aproximadamente25 mil habitantes.


vale a pena acreditar | 333COEP MaranhãoInstaurado em dezembro de 1997, com a adesãode 25 entidades públicas, o COEP MA é atualmentesecretariado por Goreth Campos Coelho,da Superintendência Regional do Trabalho, noMaranhão. De 2002 a 2006, destacou-se a realizaçãoda Semana Nacional de Mobilização pelaVida, com concursos de redação, esquetes e música,que reuniu diversas escolas públicas e privadas,com a participação de aproximadamente 5 milalunos e alunas. Além disso, participou das discussõeslocais sobre segurança alimentar e fez partedo fórum de entidades que criou o Consea de SãoLuís do Maranhão.Outra ação ressaltada por Goreth CamposCoelho é o projeto Mãos na Massa, que trata daimplantação da padaria-escola Mãos na Massa:“O projeto iniciou em 1999, com a capacitação dejovens na área de panificação e confeitaria, capacitandono período de 1999-2001, o total de 94jovens, com recursos do Programa CapacitaçãoSolidária e parceria de várias entidades e pessoasvoluntárias. A padaria já está funcionando com aprodução e venda de produtos de panificação, e osjovens já integrados no projeto estão participandode ações de qualificação em cooperativismo, atendimento,gerenciamento e outros cursos similarescom o acompanhamento de um consultor”. O objetivodo trabalho é que o grupo alcance sua autonomia.A proposta de organização do grupo é aformação de uma cooperativa que já está em fase derealização da assembléia de constituição. O resultado,até agora, é a inclusão social por meio da capacitaçãoe a experiência em atividade de geração derenda. Essa atividade beneficia diretamente 12jovens já integrados ao projeto e 16 que estão emprocesso de integração, no total de 28 pessoas,além de 500 pessoas indiretamente envolvidas.sua primeira etapa, o programa apoiou a criação de outras cinco incubadorasem universidades de Minas Gerais, São Paulo, Pernambuco, Bahia e Ceará”.Ainda de acordo com Maria Lucia, “os bons resultados obtidos nessa iniciativacertamente influenciaram a ação da Finep na área social, destacando-se apermanência do Proninc como uma de suas ações até a data de hoje. Naquelemomento, também se observou a ampliação dos recursos destinados pela Fineppara as pesquisas sociais e a criação de área específica para tratar desse campodo conhecimento, tornando ainda possível o apoio a outras experiências, como


334 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008em desenvolvimento local integrado e sustentável (DLIS) e em empreendimentosautogestionários, e, ainda, o financiamento ao projeto do algodão, vigenteaté o presente momento”.José Carlos de Sousa, ex-representante do Banco do Brasil, também estevecom o COEP desde o seu início. Ele afirma: “Acho que o movimento deflagradopor Betinho, em defesa da dignidade da vida, foi o marco inicial de uma transfor-COEP Rio Grande do SulNo Rio Grande do Sul, a instalação do COEPocorreu em maio de 1997, na Superintendênciado Banco do Brasil, em Porto Alegre. Para a funçãode secretário executivo, foi indicado AntônioCarlos Lopes, do Banco do Brasil. Entre os trabalhosdesenvolvidos, destaca-se a criação da cooperativaUnivens, uma iniciativa para geração de rendaque apresenta trajetória próspera desde a sua criação.Nesse período de formação do Comitê, foipriorizada, além das iniciativas de combate à pobrezae de promoção do desenvolvimento humano,a incorporação da responsabilidade social à culturadas entidades associadas.De maio de 1999 a março de 2000, MariaAparecida Veeck, da Caixa Econômica Federal,secretariou o COEP. No período, os projetos voltadosà juventude ganharam destaque, e a bandamusical Atrevidos do Pagode recebeu premiaçãonacional pela abrangência de valores que proporcionouaos envolvidos.De 2000 a 2005, a secretaria executiva do COEPfoi coordenada por Dalmira Cristina Lopes, daDataprev. Foi um período voltado à participaçãodos(as) funcionários(as) das associadas em açõesde promoção da cidadania, ao envolvimento deestudantes em atividades de reflexão para a questãoda fome e da miséria, à promoção de feiras e deoficinas sociais para oportunizar geração de renda eà atuação do COEP em comunidades de baixarenda, com foco na comunidade Vila Laranjeiras.Atualmente, o COEP RS atua também na comunidadedo loteamento Santa Terezinha. Em parceriacom a Associação de Comerciantes de Materiaisde Construção de Porto Alegre (Acomac),oferece cursos de capacitação profissional de azulejistae pedreiro e nas áreas de pintura e instalaçãohidráulica, com o envolvimento das associaçõesde moradores da região. Desde 2005 o COEPRS está sediado no Banco Regional de Desenvolvimentodo Extremo Sul (BRDE), e seu secretárioexecutivo é Vercidino Albarello.


vale a pena acreditar | 335mação que ainda se processa e se verifica tanto no Estado como nos cidadãos. Asiniciativas do COEP são algumas das faces visíveis desse movimento que, porcerto, imprimiu rumo novo à configuração da cultura organizacional e, especificamente,de atuação social das entidades adesas”. É dele também a análise do querepresentou o apoio da Casa Civil às ações do COEP: “A legitimidade do COEPfirmou-se exatamente por causa da forma como se originou. Não se tratou doresultado de uma recomendação expressa do Estado, mas da manifestação de cadaempresa pública em resposta à proposição visceral defendida por vozes potentescomo a de Betinho em favor do combate à fome e à miséria. A recomendação daCasa Civil, contudo, foi crucial para o movimento, por legitimar as ações das empresaspúblicas em favor do que se propunha”.Modelo para empresasA reunião do conselho deliberativo que marcou o lançamento do modelo debalanço social foi realizada em 18 de junho de 1997, no Centro Cultural doBanco do Brasil, no Rio de Janeiro. Foi a última aparição pública de Betinho.Para Francisco Assis C. M. da Silva, que foi superintendente de Furnas na décadade 1990, “a morte de Betinho foi desastrosa para o COEP, mas André Spitz ecompanhia conseguiram dar seguimento às suas ações”.Mesmo com a difícil tarefa de seguir adiante sem Betinho, a campanha pelobalanço social prosseguiu. “A idéia do Betinho sempre foi fazer o balanço socialde forma não obrigatória. Para ele, o fato de uma empresa voluntariamentedemonstrar aquele tipo de informação é algo que valorizaria ainda mais o balançosocial”, ressalta Gleyse Peiter.Na época, Gleyse era a representante de Furnas no COEP: “Houve umagrande mobilização em torno do lançamento do balanço social, e o COEPincentivou suas associadas a publicarem o modelo divulgado na reunião”. Segundoela, Furnas foi uma das primeiras empresas a usar essa ferramenta, aindano ano de 1998. “Foi um grande esforço encontrar tantas informações em


336 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008COEP Santa CatarinaFruto de uma articulação do Banco do Brasil, oCOEP SC foi criado em maio de 1997. Até 1999,Herta Capaverde, funcionária do Banco do Brasil,foi sua secretária executiva. De 2004 a 2007, o cargofoi exercido por Joyce Viana, do Banco Regional deDesenvolvimento do Extremo Sul (BRDE).Bernadeti Panceri, da Empresa de PesquisaAgropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina(Epagri), é atual secretária executiva do COEPSC. Ela avalia: “Como principais realizações, ressaltamoso Mutirão da Cidadania, realizado nodia 19 de agosto de 2000, em Cerro Negro, umdos municípios mais carentes do estado, com aparticipação de 50 voluntários de 20 entidadesassociadas ao COEP. Mais de 800 pessoas, sendoa maioria de jovens e crianças, foram beneficiadaspor inúmeras ações, palestras sobre cooperativismoe programas disponibilizados. Como resultado doMutirão, surgiu a idéia de formação de uma cooperativarural e a abertura de uma Casa FamiliarRural, voltada para atender os filhos de agricultorescom estudo e técnicas modernas para seremaplicadas no campo. A Casa Familiar Rural do municípiode Cerro Negro foi inaugurada em 2002,com o apoio da Oficina Social do COEP, da Associaçãode Pais do Município e do Centro Vianeide Lages. Ela está em funcionamento até hoje,capacitando e mantendo inúmeros jovens no município.No ano de 2004, foi reinaugurado o ProjetoPadaria e Cozinha Comunitária Vila Aparecida,com novas parcerias e incentivos, formando,já na primeira turma do curso de panificação, 30jovens. Atualmente, identificamos algumas dificuldadesinternas de organização na Associaçãode Moradores, onde a padaria está instalada, poissua produção diária não ultrapassa 600 pães”.relação aos funcionários e às ações sociais da empresa. Simplesmente não existiamdados dessa espécie”, conta Gleyse. Desde então, Furnas publica seu balançosocial anualmente.Em seguida, dois novos encontros foram realizados: Balanço Social: Cidadaniae Transparência Pública em Empresas, em 1998, e Responsabilidade Socialdas Empresas: Balanço Social, a Experiência Internacional, em 1999. LiaHermont Blower, então representante da Petrobras no COEP, ressalta: “Valeutodo o esforço dos primeiros momentos. Hoje, a empresa já recebeu vários prêmios,


vale a pena acreditar | 337e tanto o balanço social como o relatório de responsabilidade social são ferramentasde gestão da empresa. Orgulho-me de ter participado de todo esse movimentodesde o primeiro tempo. E sigo sempre o pedido de Betinho: ‘Agora écom vocês’”.Sobre essa relação entre empresas e sociedade civil, Sergio Riede, gerenteexecutivo de relações socioambientais do Banco do Brasil, que tem um longoengajamento no COEP, avalia: “O mundo empresarial tem uma dinâmica predominantementecartesiana, ainda baseada nos velhos conceitos de tempos emovimentos. As atividades de cunho social, em muitos casos, tiveram uma conotaçãode trabalho paralelo, apartado das atividades-fim das empresas, quase comose fosse um favor à sociedade. Isso vem sendo superado paulatinamente, com aabsorção de um papel mais integrado das corporações, gerando a compreensãoCOEP Rio Grande do NorteInstalado em dezembro de 1997, pela associadaBanco do Brasil, o COEP RN contou com Haydéde Araújo Sabry como secretária executiva até 1999.Em seguida, o cargo foi exercido por Iris Lopes deAraújo, da Caixa Econômica Federal, até 2001. Apartir de 2001, a secretaria executiva é exercida porMariédes Guimarães, da Dataprev.Inicialmente, o COEP RN realizou campanhasde arrecadação de peças de vestuário e alimentos.Em 2003, seu foco de atuação passou aser o projeto de desenvolvimento comunitário nacomunidade Retiro, localizada a 30 quilômetrosde Natal, no município de Macaíba. Trata-se doprojeto Beija-Flor, responsável por atividadescomo palestras, oficinas de bijuterias, reciclagem,artesanato, além de atividades culturais para ascrianças e jovens.Maria de Fátima Soares, secretária de Trabalhoe Assistência Social de Macaíba, parceirano projeto Beija-Flor, tem uma forma afetiva dese dirigir às pessoas que participam do COEPRN: “A Turma do Betinho, como são carinhosamentechamados, através da mobilização, conduza população local para a participação dasdecisões na sua comunidade, promovendo o desenvolvimentohumano e a cidadania”.


338 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008COEP ParaíbaCriado em dezembro de 1997, e articulado pelaConab, que desde então está à frente de sua secretariaexecutiva, o COEP PB conseguiu, ainda nadécada de 1990, a implantação de políticas, programase ações públicas nas áreas de educação, saúde,nutrição, moradia e geração de renda para 7.708famílias indígenas situadas em 20 aldeias dos municípiosde Baía da Traição, Marcação e Rio Tinto.Outra realização foi a mobilização que resultouna produção do mapeamento da fome na Paraíba,agravada pela seca em 1998 e 1999. SegundoMarçal Cavalcanti, secretário executivo do COEPPB, o êxito dessa iniciativa resultou na ampliaçãoda mobilização para vários municípios.de que a perenidade de uma empresa estáatrelada à imagem e à reputação que ela temem todos os públicos com as quais se relaciona.Esse ainda é um desafio a ser superadode maneira mais articulada, mais permanente.Além disso, hoje é preciso lidar tambémcom certo desencanto de parte da sociedade,que tem caminhado em algumas situaçõespara uma postura mais individualista, menospolitizada – e aqui falo do melhor sentidode política”.De 2000 a 2008, O COEP PB priorizou açõesmobilizadoras em pequenas comunidades do interior.No mesmo período em tela, o COEP PBtambém se destacou na promoção da campanhaNatal pela Vida, que tem obtido resultados acimada média e beneficiado, anualmente, em torno de120 mil famílias. Segundo o secretário executivodo COEP PB, “é a maior campanha de mobilizaçãoe arrecadação de alimentos, brinquedos e remédiosda Paraíba, acumulando registros de maisde 3,9 milhões de toneladas arrecadadas”.


vale a pena acreditar | 3391998Oficina SocialCinco anos após sua criação, o COEP partiu para mais uma ousadia e criou oCentro de Estudos e Projetos em Tecnologia, Trabalho e Cidadania – ou, simplesmente,Oficina Social. Por meio de um convênio, 4 a Oficina Social surgiucomo uma forma de ampliar a capacidade de ação do COEP no apoio a projetosde desenvolvimento da cidadania e combate à pobreza. Seus objetivos são propiciarconhecimentos, metodologias e tecnologias e formar recursos humanos paraprestar cooperação técnica e alavancar apoios a projetos no campo da cidadania.A Oficina Social funciona como uma incubadora de projetos, sendo umespaço descentralizado de articulação, formado por núcleos e projetos que podemser coordenados por diferentes entidades. Vera Araripe estava recém-alocadana assessoria da presidência da Dataprev quando chegou uma convocação parauma reunião do COEP: “Pediram que eu representasse a empresa. Fui, acheium projeto ambicioso e resolvi que a Dataprev seria atuante”. Vera teve intensaparticipação na criação da Oficina Social e, mesmo afastada da Dataprev desde2000, continua a participar da entidade.Vicente Guedes, da Embrapa, também é entusiasta da Oficina Social: “Parainstitutos de pesquisa e órgãos de apoio e fomento ao desenvolvimento, espaçose ambientes de interação, como o COEP e a Oficina Social, são especialmentepropícios a certo exercício de diálogo e negociação integrantes do quetem sido chamado novo modo de construção do conhecimento. Por institutosde pesquisa, refiro-me a entes como a Embrapa, e, por órgãos de desenvolvimento,a entes como a então existente Secretaria de Desenvolvimento Ruraldo Ministério da Agricultura. Quanto ao dito novo modo, importantes estudosindicam ser caracterizado, entre outros aspectos, pelo fato de ser transdisciplinar,heterogêneo e ter origem num contexto de aplicação e implicar maiorresponsabilidade social”.4 O convênio para criaçãoda Oficina Social foi entreBanco do Brasil, CaixaEconômica Federal,Empresa Brasileira deInfra-Estrutura Aeroportuária(Infraero), FederaçãoNacional das AssociaçõesAtléticas do Banco doBrasil (Fenabb), Financiadorade Estudos e Projetos(Finep), Fundação Bancodo Brasil, FundaçãoOswaldo Cruz, FurnasCentrais Elétricas,Petrobras, Serviço Federalde Processamento deDados (Serpro) e FundaçãoCoordenação de Projetos,Pesquisas e Estudos Tecnológicos(Coppetec), quepassaram a ser membrosmantenedores fundadores.


340 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008© Arquivo COEPO livro Caminhos para mudar o Brasil foi lançado durante reunião do conselho deliberativo do COEP Nacional,em dezembro de 1998, na sede da Petrobras, no Rio de Janeiro. A publicação reúne 44 experiências naárea social, desenvolvidas pelas entidades associadas, em áreas como: abastecimento de água e irrigação,capacitação profissional, cooperativismo, crédito popular, desenvolvimento rural, enfrentamento da seca esegurança alimentar. Os relatos contêm informações sobre metodologias utilizadas, entrevistas com dirigentese depoimentos de beneficiários(as).


vale a pena acreditar | 341No arTambém em 1998, entra no ar a primeira versãoda página web do COEP. Com a expansão gradativado número de pessoas e organizações envolvidascom o trabalho do Comitê e a diversificaçãodas iniciativas, o site do COEP foi incorporandonovas demandas, aprimorando-se e ficando maisatrativo para as pessoas que o acessam e nele navegam.Em 2000, a página eletrônica do COEPdeu lugar ao primeiro portal da Rede Nacional deMobilização Social. Em, 2001, o portal foi atualizadoe se tornou ainda mais eficaz na comunicaçãointra-rede como meio de divulgação externo.Em 2008, o portal do COEP 2008 apresenta umanova versão, idea lizada com uma concepção deconstrução coletiva e integrada, capaz de promoveruniformidade à infor mação, mesmo quando oriundade diferentes locais.Visite: www.coepbrasil.org.brMais um ano com BetinhoEm agosto de 1998, no Rio de Janeiro, um evento no Centro Cultural Bancodo Brasil e uma feira cultural no Museu da República foram a maneira encontradapelo COEP, Ibase e Petrobras para mais um reconhecimento ao papel dosociólogo Betinho na transformação da sociedade brasileira. Outra homenagemfoi o lançamento do livro Mobilização – Betinho e a cidadania dos empregados deFurnas. Gleyse Peiter foi a organizadora do livro: “Convidamos vários amigose amigas do Betinho para que escrevessem um relato pessoal sobre a convivênciacom uma pessoa tão especial. Aderbal Freire Filho, Alcione Araújo e padreRicardo Rezende são alguns dos articulistas do livro. Também incluímos napublicação todas as ações de promoção da cidadania realizadas por Furnas, soba inspiração de Betinho, de 1994 a 1998”. Para isso, Gleyse visitou todas asunidades da empresa, coletando informações e fotografando os projetos sociais:“O livro é interessante porque traz o depoimento mais emotivo das pessoas, mastambém mostra resultados concretos das ações”.


342 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008COEP GoiásGetúlio Brunes, com camisa da Embrapa, Betinho e demaisintegrantes do comitê de funcionários(as) do Banco do Brasil© Acervo pessoal/Getulio BrunesCriado em agosto de 1998, o COEP GO foi umdos primeiros a implantar uma lavoura comunitária,com o apoio de funcionários(as) da Embrapa,que cedeu terras para o plantio de arroz e feijão.Na primeira colheita, 90 toneladas de arroz foramdistribuídas para mais 500 famílias carentesda região. Donizete Alves, funcionário de Furnase secretário executivo do COEP GO, conta: “Nosúltimos anos, o COEP Nacional observou que ofoco não era só distribuir alimentos, mas ir maisalém, ou seja, ‘não só dar o peixe, mas tambémensinar a pescar’. Daí surgiu a idéia de criar acomunidade COEP em todos os estados e municípiosque já tinham criado COEP”. Com isso,continua Donizete, “a comissão executiva do COEPlocal escolheu o bairro Madre Germana II comocomunidade COEP e piloto para um projeto dedesenvolvimento local. O bairro escolhido é extremamentecarente, violento, sem saneamento básico”.Para reverter esse quadro, o COEP GO realizouuma pesquisa socioeconômica na região, oque tem orientado algumas conquistas para a populaçãoda comunidade. Em uma parceria com oMinistério Público, o COEP GO forneceu osdados coletados para utilização no termo de ajustamentode conduta (TAC) no âmbito dos governosestadual e municipal para levar melhorias paraa população da comunidade, atualmente com 17mil habitantes.“Podemos citar melhoria nos atendimentosmédicos, com a destinação de ambulância para olocal, consultório odontológico, melhorias no espaçofísico do posto de saúde e mais profissionais noatendimento”, informa Donizete Alves. O COEPGO e suas associadas também realizaram várioscursos profissionalizantes na comunidade na buscade geração de emprego e renda, tendo sido criadaa Cooperativa de Confecção Madre Germana II,a (Coopermadre).


vale a pena acreditar | 343Agricultura familiarO seminário Agricultura Familiar: Desafios para aSustentabilidade foi realizado em 1998, na cidadede Aracaju, capital de Sergipe. Vicente Guedes,da Embrapa, relata os antecedentes dessa iniciativa:“Em meados de 1995, o então presidenteda Embrapa, Murilo Flores, foi para o Ministérioda Agricultura, sendo nomeado secretáriode Desenvolvimento Rural, a fim de levar adianteo processo de concepção e implementação de umapolítica pública federal para a agricultura familiar.Havia, então, um compromisso governamentalcom entidades civis e setores organizados daagricultura no sentido dessa política. Estamosfalando dos primórdios do atual Programa Nacionalde Fortalecimento da Agricultura Familiar,o Pronaf ”.Ainda segundo Vicente, em um curso de formulaçãodo Pronaf, a Secretaria de DesenvolvimentoRural (SDR) apresentou uma série demedidas estratégicas para a criação de bases dequalidade que o fundamentassem: “Mirava-seuma política qualificada e viável e, como um dos fundamentos, havia a discussãodos elementos da ação do poder público com agentes e atores os mais diversos,de onde pudessem ser colhidas contribuições críticas para aquela qualificação.Para esse objetivo, a inserção da SDR em redes ou o diálogo com redes institucionaisjá existentes era medida importante. Foi nesse contexto que a SDR aderiuao COEP e, dentro dele, aos trabalhos de constituição da Oficina Social”.Para conseguir levar o Pronaf à discussão pública, foram organizados semináriosnacionais e, em torno desses eventos, organizaram-se grupos ou consórcios© Arquivo COEPO livro Mobilização – Betinho e a cidadania dos empregados deFur nas foi lançado em agosto de 1998, no Rio de Janeiro, emum evento no Centro Cultural Banco do Brasil


344 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008circunstanciais de entidades que os viabilizaram e deles fizeram surgir os produtosesperados – contribuições teóricas e práticas para os avanços em políticaspúblicas. Vicente continua: “Por distintas razões, três desses eventos foramorganizados em cooperação entre a SDR e a Embrapa, cada um deles contandocom um arranjo específico de organizações públicas, não-governamentais eprivadas. O primeiro desses seminários ocorreu em Pelotas (RS), em 1996, osegundo em Jaguariúna (SP), em 1997, e o terceiro em Aracaju (SE), em 1998.O COEP aderiu ao consórcio multiinstitucional de dois deles: A AgriculturaFamiliar como Base do Desenvolvimento Rural Sustentável, realizado em Jaguariúna(SP), de 15 a 18 de dezembro de1997; e Agricultura Familiar – Desafiospara a Sustentabilidade, ocorrido em Aracaju(SE), de 9 a 11 dezembro de 1998.Desses eventos sugiram produtos teóricose práticos críticos para reflexões acercado Pronaf, assim como para outras políticaspúblicas”.Em um balanço final sobre o seminário,Vicente aponta: “Além dos efeitosde curto prazo almejados e alcançados,no campo das reflexões qualitativas e discussõespúblicas sobre o Pronaf e outraspolíticas públicas, contabilizaram-se positivasrepercussões para organizações representadasnos seminários, por força daspessoas que deles participaram. Outroproduto relevante está no número 7 dosCadernos da Oficina Social”.Outra iniciativa que teve o apoio daSDR foi o curso Prática de Cooperativismo,também realizado em 1998. ComA experiência do seminário Agricultura Familiar: Desafios para aSustentabilidade está no número 7 dos Cadernos da Oficina Social,lançado em 2001© Arquivo COEP


vale a pena acreditar | 345aulas voltadas para a iniciação e prática do cooperativismo e com três dias deduração, o curso foi promovido em 11 COEP estaduais e capacitou 870 pessoas.Ação de solidariedade no NordesteEm 1998, mais uma seca castigou o Nordeste brasileiro. E o assunto foi posto empauta na reunião do conselho deliberativo do COEP, realizada no Rio de Janeiro,em dezembro daquele ano. “Realizamos a oficina Projetos Inovadores para o Polígonoda Seca”, informa Sarita Berson, do COEP Nacional. Segundo ela, os debatesconcentraram-se em três temas: gestão de políticas públicas; capacitação; e geraçãode ocupação e renda: “Os destaques dessa oficina foram as experiências do programaAlfabetização Solidária, as medidas tomadas pela Sudene na implementaçãodo programa federal de combate aos efeitos da seca, as iniciativas do Banco doNordeste voltadas ao desenvolvimento local sustentável na região e as ações doCentro Universitário UMA, de Contagem, Minas Gerais, desenvolvidas em Várzeada Roça, no sertão da Bahia”, relembra Sarita. Houve, ainda, a participação daEmbrapa sobre pesquisas e tecnologias que possibilitam a convivência com a secae a apresentação do projeto Salas de Situação, iniciativa do Fundo das NaçõesUnidas para a Infância (Unicef) no combate aos efeitos da seca.Marçal Cavalcanti, secretário executivo do COEP Paraíba e sempre envolvidocom questões do Nordeste, tem experiência suficiente para avaliar esse tipode ação: “Mais importante que essa medida de socorro e caridade, foi o despertardo governo ao conclamar as agências internacionais das Nações Unidas e asorganizações da sociedade civil, entre elas o COEP, para discutir e criar mecanismosindutores de políticas permanentes de convivência com o fenômeno daseca no Nordeste”. Sobre o projeto Salas de Situação, proposto pelo Unicef,Marçal ressalta: “Elas se converteram em verdadeiros laboratórios que congregavambanco de dados e informações diárias da situação de necessidades eflagelo de todos estados e municípios nordestinos; subsidiavam o governo federalpara tomada das decisões de caráter emergencial e permanente; mobilizavam


346 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008instâncias de governos locais (estado e municípios) para materializar sinergiacom o governo federal; estimulavam a formação dos Comitês de Solidariedadeno ambiente interno das organizações associadas ao COEP e demais entidadesda sociedade. Enfim, deixou, como produtos para formulação de políticas públicasde convivência com a seca no Nordeste, diversos subsídios: para um grandeprojeto de instalações de cisternas na zona rural; para construções de passagensmolhadas/estradas vicinais; para construção de grandes barragens e singelossistemas de irrigação; para sistemas de abastecimento de água tratada para ospequenos municípios; entre outros”.COEP Minas GeraisCriado em 1998, o COEP MG conta atualmentecom 27 entidades parceiras. Entre suas realizaçõesestá a construção de um centro comunitário noAglomerado da Serra, onde são ministrados cursosprofissionalizantes, como corte e costura e culináriaalternativa. O local também possui um laboratóriode informática e abriga a entidade RedeMuim, que capacita agentes culturais. Outro destaqueé o projeto Sorriso Comunitário, que atendeatualmente mais de 500 pacientes carentes pormês. Graças também à atuação do COEP MG,56 mil famílias do Aglomerado da Serra passarama receber suas correspondências diretamente emsuas casas, pelos Correios.Outra comunidade assistida é o AglomeradoSanta Lúcia, que, com o Projeto Visão da Vida,atende mais de 300 adolescentes por meio de atividadesesportivas, monitores(as) especializados(as),material esportivo e alimentação complementar.“Com a 124ª Companhia de Polícia Militar deMinas Gerais, acabamos de inaugurar um telecentroque atenderá toda a comunidade. Além de atuarem projetos sociais, o COEP MG promoveu ecoordenou, em 2007, o seminário Meio Ambientee Sustentabilidade. O COEP MG atua em outrascomunidades, realizando cursos profissionalizantescom o intuito de promover a auto-suficiênciae a auto-sustentabilidade. São elas: o QuilombolaMangueiras, a Comunidade Zilah Spósito, a ComunidadeNova Pampulha e a Comunidade Granjade Freitas”, informa Ricardo José Dinelli Costa,funcionário de Furnas e secretá rio executivo doCOEP MG.


vale a pena acreditar | 3471999Pesquisa Ação SocialO processo de ampliação do COEP tomou novo impulso em 1999, chegando aoDistrito Federal e aos estados de Alagoas, Amazonas, Espírito Santo e Sergipe.No mesmo ano, em parceria com o Ipea, foi realizada a pesquisa Ação Socialdas Entidades Associadas do COEP, cujo objetivo foi a elaboração de um mapeamentodas iniciativas desenvolvidas pelas associadas na área social, possibilitando,assim, uma reflexão coletiva quanto ao trabalho realizado. Alguns resultadosobtidos foram: 92% das entidades associadas ao COEP declararam querealizar ações sociais faz parte da estratégia da entidade, e 49% fizeram constarde documentos e/ou orçamento próprioas ações realizadas; 92% realizaramações sociais com a participaçãode funcionários(as); 73% possuemavaliação sobre as ações sociais realizadas;e 73% divulgam sua ação social.“A pesquisa mostra, ainda, que amaior parte das iniciativas está voltadapara alimentação, educação, desenvolvimentocomunitário e qualificação profissional, sendo jovens e criançaso público-alvo prioritário. Esses resultados ressaltam a importância do COEPna mobilização de suas associadas e no desenvolvimento de iniciativas de combateà pobreza”, complementa André Spitz, presidente do COEP Nacional.“O Ipea já tinha realizado uma pesquisa nacional sobre a ação social dasempresas privadas em geral. Isso nos inspirou nessa parceria com o institutopara descobrir as particularidades das ações sociais praticadas por nossas associadas.Foi feita uma adaptação ao método investigativo, já que o perfil dasO processo de ampliação do COEP tomounovo impulso em 1999, chegando aoDistrito Federal e aos estados de Alagoas,Amazonas, Espírito Santo e Sergipe


348 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008empresas do COEP é bem diversificado e reúne organizações privadas e públicas”,relembra Amélia Medeiros. Segundo a secretária executiva adjunta doCOEP Nacional, a pesquisa superou a expectativa no número de respostas –foram 430 organizações – e foi um grande subsídio para o planejamento dasações das associadas ao COEP. Por conta de suas especificidades, não forampesquisadas as associadas ligadas à administração direta do poder Executivo.Cadernos e Imagens da Oficina SocialAtendendo a seus objetivos de subsidiar o trabalhodo COEP e desenvolver conhecimentos, tecnologiase metodologias de atuação na área social,a Oficina Social lançou, em 1999, a sérieCadernos da Oficina Social. A proposta dasérie é fundamentar as reflexões conceituais e divulgarexperiências inovadoras e bem-sucedidasna promoção da cidadania, incentivando a replicaçãodessas iniciativas.Treze números foram lançados até 2007:Compromisso social: um novo desafio para asorganizações; Projetos inovadores da OficinaSocial; Desenvolvimento local; Prêmio Mobilização– Edição Especial; Desenvolvimento local:práticas inovadoras; Construindo cidadania emcomunidades de baixa renda: da idéia à ação;Agricultura familiar e o desafio da sustentabilidade;Multiplicadores comunitários de cidadania;Planejamento de projetos sociais: dicas,técnicas e metodologias; Construindo alternativasde geração de trabalho e renda: Proninc; A questãosocial e as saídas para a pobreza; I SeminárioInternacional do COEP – Gerenciamento deRedes para o Desenvolvimento Comunitário; eAnálise de uma rede brasileira de ação social – oCOEP / Reintrodução da cultura do algodão nosemi-árido do Brasil.Para complementar e enriquecer o processode promoção e disseminação de conhecimentos,tecnologias e metodologias de promoção da cidadania,também foi lançada a série Imagens daOficina Social. O primeiro vídeo – Cootram,construindo cidadania – é sobre a cooperativade Manguinhos. “A série também é utilizada paradivulgar exemplos concretos de projetos sociais einiciativas de mobilização, articulados no âmbitodo COEP”, informa Sarita Berson.Todas as publicações e vídeos estão disponíveisem .


vale a pena acreditar | 349Prêmio MobilizaçãoEm 1999, ocorreu a primeira edição do Prêmio Mobilização, uma estratégia doCOEP para colocar o debate sobre a participação das entidades associadas nocombate à pobreza na agenda cotidiana de cada uma. “O prêmio foi mais umaestratégia para, como o próprio nome já indica, mobilizar as associadas do COEPem relação a seu compromisso social. É importante lembrar que ele ocorreu em1999, quando não havia ainda esse consensosobre o papel social das empresas”, ressaltaAmélia Medeiros, secretária executiva adjuntado COEP Nacional e coordenadora doPrêmio Mobilização.Em sua primeira edição, o prêmio foi voltadoà valorização do trabalho voluntário realizadopor funcionários(as) com o apoio dasempresas. Foram contemplados com o TroféuCOEP 38 projetos. Todas as experiênciasvencedoras do prêmio estão reunidas no número4 dos Cadernos da Oficina Social.Em 2001, outra edição do Prêmio Mobilizaçãoobjetivou provocar nas organizaçõesassociadas uma auto-avaliação sobre aefetivação de seu compromisso social. SegundoAmélia Medeiros, as empresas associadasreceberam questionários sobre quaiseram as estratégias adotadas para efetivaçãodas ações sociais. Mais de 260 empresasderam retorno sobre o que faziam naárea social – como incentivo à contrataçãode pequenas e microempresas, incentivoao trabalho voluntário –, o que acabou se© Arquivo COEPO Prêmio Mobilização foi uma estra tégia do COEP para colocar odebate sobre a participação das entidades associa das no combateà pobreza na agenda cotidiana


350 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008COEP AlagoasInstalado em agosto de 1999, com incentivo e mobilização da Dataprev, o COEP AL é atualmentesecretariado por Jussiara Gonçalves Gulden Gravatá, funcionária da Caixa EconômicaFederal. Algumas iniciativas estão sendo direcionadas para a melhoria da qualidade de vida daVila Emater, como a criação, no centro comunitário, de uma sala de aula para oficinas de artesplásticas (pintura, reciclagem de materiais), artes manuais (bordados, crochê, tapeçaria, costura),leitura e escrita (biblioteca, produção de texto, edição de livros), atividades esportivas (recreação,gincanas, jogos), ecológicas (reciclagem, cuidados com o meio ambiente) e de informática.O COEP AL também já apoiou ações como curso de cooperativismo e também palestrassobre autoconfiança, sensibilização, gravidez na adolescência e autovalorização, além de promoverdoações de brinquedos, roupas, alimentos e livros para comunidades pobres.COEP AmazonasCriado em 1999, o COEP AM tem como secretário executivo Raimundo Souza, funcionáriodos Correios. Entres atividades de maior impacto está o apoio à comunidade Rio Piorini. Aolongo de três anos, o COEP AM propiciou, em parceria com a população local e apoio da SecretariaEstadual do Meio Ambiente (Sema), atividades de arborização do local. Também houveorientações para construção de poços artesianos e demais esclarecimentos sobre o problema dafalta de água. “Incentivamos a implantação do Clube de Mães Trabalhadoras, que propicia cursosde capacitação. Outra parceria com a Sema gerou um curso de reciclagem de garrafas PET econfecções de vassouras”, relata Raimundo Souza.Outras atividades do COEP AM estão relacionadas a seu envolvimento com a comunidadeNossa Senhora Aparecida: “Estamos envidando esforços no sentido de sensibilizar algumas universidadespara participarem ativamente de ações na comunidade”, garante o secretário executivoRaimundo Souza.


vale a pena acreditar | 351transformando em uma espécie de lista de sugestões de práticas empresariaispara a cidadania. “Ao sistematizar o conjunto dessas estratégias e divulgá-las,estamos mostrando ações já testadas e, portanto, viáveis. Além disso, é importanteregistrar que, em nenhuma das duas edições, houve um caráter de competiçãoentre as empresas. O que buscamos ao divulgar e valorizar as ações sociaisdas empresas é incentivar a ampliação e o aprimoramento dessas práticas”, apontaAmélia Medeiros.COEP Espírito SantoInstalado em dezembro de 1999, o COEP ES foiarticulado pela Caixa Econômica Federal. Atualmente,atua nas comunidades de Santa Helena ede São José, em Vitória, com a proposta de ajudarno desenvolvimento local e fortalecer a mobilizaçãosocial das organizações e pessoas no combateà fome e à miséria. Segundo Rita de CássiaPaiva de Carvalho, da Superintendência Regionaldo Trabalho do Espírito Santo e secretária executivado COEP ES, duas iniciativas merecem destaque:o Coral Infanto-Juvenil da Escola de EnsinoFundamental Terra Vermelha e a oficina deconstrução de instrumentos da Banda de Congo,na comunidade remanescente de quilombos emRetiro, Santa Leopoldina. “No Projeto Vem Ser,temos um convênio com a escola Terra Vermelhapara realização da Oficina de Musicalização, queocorre desde 2000 até a data de hoje. Passarampelo coral mais de 900 jovens, todos cursando daquinta à oitava série, com idade entre 10 a 14 anos”,explica Rita sobre a primeira iniciativa.Sobre a oficina de instrumentos musicais, Ritaexplica que a atividade é ministrada pela Federaçãode Bandas de Congos do Espírito Santo, com apoioda ONG Moradia e Cidadania, associada ao COEPES. “A banda de congo de Retiro passava por momentosde dificuldade materiais para sua continuidade,pois não tinha instrumentos próprios, usavaos cedidos pela prefeitura local que serviam paravárias bandas. Com a oficina, as pessoas foram capazesde construir seus próprios instrumentos. Apartir daí, a banda fortaleceu a identidade localde sua cultura. A banda de congo passou a teruma agenda intensa, o que demonstra o quanto éreconhecida e valorizada, agora com autonomia deatuação. Participaram da oficina 25 pessoas, entreadultos e jovens da comunidade”, informa.


352 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008COEP Distrito FederalDesde agosto de 1999, o COEP DF vem mobilizandoorganizações e pessoas na construção de umarede de mobilização social que reúne, hoje, cercade 50 organizações, promovendo ações conjuntasque contribuem para a redução das desigualdadesno Distrito Federal. Mobilizar as associadas paraincorporarem à sua cultura organizacional a responsabilidadesocial também é uma das ações doCOEP DF.O Distrito Federal foi pioneiro na aprovaçãoda Lei 2.928, de 6 de maio de 2002, que institui oDia Nacional de Mobilização pela Vida. “Em sessãosolene, a Câmara Legislativa do DF valorizou aimportância da atuação do COEP”, afirma DulceTannuri, secretária executiva do COEP DF.Dulce complementa: “O COEP DF tambémpromove eventos e campanhas, implanta projetose articula parcerias, a fim de combater a fome e amiséria em nossa cidade. Os resultados positivosdesses projetos têm sido reconhecidos e, por isso,o governo federal está interessado em multiplicaras experiências em todo o país”. Um dos destaquesé o curso de qualificação profissional intitulado“Uma nova tecnologia de produção de cimento”,oferecido a 30 chefes de família desempregados e80 jovens em regime de semiliberdade. “Nossopróximo desafio é implementar a Jornada COEPpela Cidadania em cinco comunidades, instalandoum centro comunitário em cada uma delas, afim de proporcionar sua auto-sustentabilidade”,aponta Dulce.


vale a pena acreditar | 3532000Desenvolvimento local integrado e sustentávelSob coordenação do Núcleo de Desenvolvimento Social da Oficina Social, foirealizado, em fevereiro de 2000, o curso sobre desenvolvimento local integrado esustentável (DLIS). A capacitação ocorreu no Rio de Janeiro e contou com aparticipação de 40 pessoas. Na programação, conceitos, experiências em andamentoou realizadas e os instrumentos disponíveis para a implantação de projetosde DLIS. “Os benefícios e a oportunidade da implantação de um processo deDLIS em comunidades de baixa renda motivou o COEP na mobilização de suasassociadas na direção de ações locais, com o desenvolvimento de projetos conjuntose a formação de parcerias”, aponta Sarita Berson. O material didático docurso foi divulgado nos números 3 e 5 dos Cadernos da Oficina Social e estádisponível em .Essa capacitação acabou levando ao aperfeiçoamento da experiência da Cootram,a cooperativa de trabalhadores desenvolvida pelo COEP e pela Fiocruz ainda noinício da década de 1990. Surgiu, assim, o COEP Manguinhos. “Mais uma vezarticulamos nossas associadas, organizações da sociedade civil e o poder públicopara a implementação de um processo de desenvolvimento local, integrado e sustentávelna região – o COEP Manguinhos. O objetivo era propiciar, com as açõesrealizadas por meio do esforço compartilhado, o desenvolvimento econômico e amelhoria da qualidade de vida na região, a partir de iniciativas geradoras de trabalhoe renda, incremento dos níveis de saúde, nutrição e educação, construção emelhoria das habitações, saneamento básico, serviços urbanos e utilização de áreascomuns”, ressalta Gleyse Peiter, secretária executiva do COEP Nacional.Sônia Moreira, coordenadora de projetos sociais da presidência da Fiocruz,participou da iniciativa e a considera positiva: “As experiências se cruzam e secomplementam, entre uma instituição e outra. Assim, vamos aproveitando


354 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008sempre as experiências exitosas, os trabalhos em conjunto que se reforçam mutuamente”.A Fiocruz já tinha experiência em projetos DLIS, conforme exemplificaSônia: “Na Fiocruz, desde a criação do COEP, até um pouco antes, sãofeitos projetos na área da comunidade de Manguinhos, onde moram 60 milpessoas. O Projeto Fiocruz Manguinhos existe há mais ou menos 20 anos e sótem se atualizado e tornado mais atuante com o passar dos anos. A parceriacom o COEP vem dinamizar esse trabalho, igualmente com o trabalho conjuntocom outras entidades na cidade do Rio de Janeiro”.Mas não foi apenas em Manguinhos que o curso sobre DLIS gerou resultadossignificativos. “Trabalhando em um território bem definido e integrandovários parceiros para o desenvolvimento das ações, cada um contribuindo comsuas potencialidades, a iniciativa de Manguinhosfoi precursora da proposta que deuorigem, posteriormente, à criação dos COEPBalanço social e a experiência internacionalmunicipais”, revela Gleyse Peiter.O tema da responsabilidade social das empresascontinuou no foco das ações do COEP, que realizou,em 2000, o seminário Responsabilidade Socialdas Empresas: Balanço Social, a Experiência Internacional,na sede da Petrobras, no Rio de Janeiro.Segundo Lia Hermont Blower, ex-gerente de comunicaçãoda Petrobras, patrocinadora do evento, o semináriotambém ajudou a internalizar o tema naempresa: “Foi uma estratégia que adotei. Como envolvermais profissionais para que pudessem conhecere saber da importância do balanço social? Comoenvolver, também, a alta gerência, além de associar amarca Petrobras a um evento de tão grande importância?O patrocínio proporcionou todas essas metas”.O encontro também teve o apoio do Instituto Brasileirode Análises Sociais e Econômicas, o Ibase.Da idéia à açãoOutro curso realizado pelo COEP em 2000foi Construindo Cidadania em Comunidadesde Baixa Renda: Da Idéia à Ação. “Ocurso ocorreu no mês de setembro, em Curitiba,no Paraná. O programa contemplou ostemas identificação e priorização dos problemas,formulação e implementação dosprojetos, acompanhamento e avaliação dasações, além de apresentar como exemploiniciativas concretas. Cerca de 150 pessoasforam capacitadas”, informa Sarita Berson.O material do curso está disponível no sexto


vale a pena acreditar | 355número dos Cadernos da Oficina Social e também na série Imagens da OficinaSocial, disponíveis em .Gleyse Peiter também comenta essa experiência: “No início do COEP, aindanão tínhamos tão clara a questão da capacitação, mas já investíamos em formasde aperfeiçoamento das ações que desenvolvíamos”. Para ela, o curso foi umpasso adiante: “Um curso estruturado com grade curricular e diploma. Foi umamudança fundamental e só fez fortalecer a nossa rede”.TeleconferênciaPromovidas em parceria com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e PequenasEmpresas (Sebrae), as teleconferências foram realizadas pela primeira vez emmaio de 2000. Os objetivos eram fortalecer os laços que unem o COEP emâmbito nacional, ampliar o alcance das atividades de capacitação e divulgar asações sociais desenvolvidas pelas entidades associadas. Realizadas na sede doSebrae, em Brasília, as teleconferências são captadas por antenas parabólicasou acompanhadas diretamente em auditórios regionais da empresa. Depois, sãogravadas e passam a fazer parte da série Imagens da Oficina Social. “A primeirateleconferência foi realizada em maio de 2000, com a apresentação de um brevehistórico do COEP, objetivos e modo de atuação e os resultados da pesquisasobre responsabilidade social das entidades associadas. Na mesma ocasião, fizemoso lançamento do Portal da Rede Nacional de Mobilização Social e doBanco de Projetos Mobilização”, recorda Sarita Berson.“A teleconferência é fundamental para o nosso desafio de manter a rede bemarticulada e coesa, envolvendo sempre o maior número possível de pessoas e organizaçõesnas nossas discussões. Anualmente, temos uma reunião do conselho deliberativoe duas da comissão executiva, que reúne todos os secretários executivosestaduais e municipais, representantes técnicos das empresas associadas em âmbitonacional e toda a secretaria executiva do COEP Nacional. São, ao todo, cerca de cempessoas. Mas a rede é composta por mais de mil pessoas. Então, a teleconferência é


356 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008imprescindível para manter e fortalecer o engajamento das pessoas e organizações,já que nos possibilita replicar nossos encontros em todo o Brasil. É uma forma denos aproximar”, avalia Amélia Medeiros. “É um espaço de troca de informações etambém é útil para capacitações, já que podem ser feitas perguntas e realizar conversascom especialistas em determinados temas”, conclui Amélia.COEP AcreResultado de esforços conjuntos de empresascomo o Incra, Embrapa, Correios e Banco doBrasil, entre outras, o COEP AC foi instaladoem 1999. A proposta inicial foi adotar uma comunidadecarente para a realização de projetos einiciativas sociais, motivados pelo desejo de contribuirpara a promoção da cidadania e melhoriada qualidade de vida de seus moradores e moradoras.Um diagnóstico socioeconômico realizadoem diversas comunidades apontou a comunidadeVitória, do Bairro Eldorado, como uma das regiõesmais populosas e carentes de Rio Branco. A primeiragestão, coordenada pelo Incra, teve comosecretária executiva a colaboradora Fátima Duck,no período de 1999 a 2001, sucedida por Gilmardos Santos Rodrigues, de 2001 a 2004.As ações do COEP AC viabilizaram a implantaçãode hortas domiciliares e, posteriormente, deuma horta comunitária como forma de promover asegurança alimentar e nutricional na comunidade.Implantada na Escola Bertha Vieira de Andrade, ahorta comunitária possibilitou o treinamento demoradores(as) da comunidade para a produção dehortaliças destinadas à alimentação das crianças dacreche comunitária e ao preparo de sopas distribuídassemanalmente para crianças carentes do bairro.Além do trabalho na comunidade, o COEPAC participou de todas as atividades coletivas daRede COEP. A partir de 2004, a secretaria executivafoi assumida pela Embrapa Acre, por meio dacolaboradora Cleísa Brasil da Cunha Cartaxo, quepermaneceu no cargo até 2007, quando assumiuo colaborador Milcíades Heitor de Abreu Pardo,atual secretário executivo e funcionário da Embrapa.Nesse período, o COEP intensificou o trabalhode mobilização para ampliar o número de parceirose os territórios de atuação. Em 2007, alémdas ações na comunidade Vitória, o COEP ACencampou a Jornada COEP pela Cidadania. Oprojeto tem como propósito o fortalecimento docompromisso das organizações e pessoas no combateà fome e à miséria do país. Além disso, vemreforçando a promoção da cidadania, solidariedadee justiça social no Acre.


vale a pena acreditar | 357Banco de ProjetosDisponível no endereço www.coepbrasil.org.br, o Banco de Projetos, criado em2000, tinha como proposta inicial divulgar apenas iniciativas desenvolvidas noâmbito do COEP e de suas associadas. No entanto, acabou sendo ampliado e foiaberto para a inclusão de programas, projetos, ações, idéias e demais iniciativassociais de qualquer instituição, seja ela pública ou privada, organizações da sociedadecivil e outras, incluindo também pessoas físicas. “Em 2003, como uma dasiniciativas de apoio ao programa Fome Zero, do governo federal, o COEP abriuo Banco a qualquer entidade ou pessoa interessada em compartilhar suas experiênciasvoltadas para o desenvolvimento humano e social”, informa Sarita Berson,coordenadora do Banco de Projetos.Atualmente, mais de 2.230 iniciativas estão registradas e podem ser acessadaspor qualquer pessoa. Mas, para inserir um projeto, é necessário um cadastramentoanterior. Para fazer uma pesquisa sobre um projeto, poderão ser indicadosparâmetros como área de atuação, faixa etária dos(as) beneficiários(as) ouaté mesmo a relação com algum dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio. 5Segundo André Spitz, “o Banco de Projetos é um rico acervo de iniciativasvoltadas para a construção da cidadania, que facilita a troca de experiências einformações e ajuda a mobilizar novos parceiros”. Sarita Berson complementa:“Além de uma descrição das ações, o Banco apresenta informações sobre asdemandas financeiras, materiais e de recursos humanos relativos a cada projeto,estimulando o intercâmbio e abrindo possibilidades para novas parcerias e apoios.Possibilita, assim, o encontro entre as necessidades de uma ação e a disponibilidadede pessoas ou entidades interessadas em apoiar essa iniciativa”.Semana Nacional de Mobilização pela VidaInicialmente uma homenagem ao sociólogo Betinho, a Semana Nacional deMobilização pela Vida é mais uma maneira de propor ações solidárias para5 São estes os Oito Objetivosde Desenvolvimentodo Milênio: erradicar aextrema pobreza e a fome;atingir o ensino básicouniversal; promover aigualdade de gênero e aautonomia das mulheres;reduzir a mortalidadeinfantil; melhorar a saúdematerna; combater oHIV/Aids, a malária eoutras doenças; garantira sustentabilidadeambiental; e estabeleceruma parceria mundialpara o desenvolvimento.


358 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008toda a Rede COEP. Realizada sempre em torno do dia 9 de agosto – data defalecimento de Betinho –, a Semana propicia à sociedade em geral uma oportunidadede participar de mobilizações, passeatas, abraços, debates, eventos eoutras manifestações para tornar visíveis as questões sociais do país. Em suaprimeira edição, em 2001, a Semana ocorreu de 7 a 13 de agosto, em 18 estadosbrasileiros. “É mais uma estratégia para ampliar as iniciativas de mobilizaçãodas associadas e integrar a sociedade como um todo, em um amplo movimentode promoção da cidadania”, informa Amélia Medeiros, do COEP Nacional.Ainda segundo a secretária executiva adjunta do COEP Nacional, AméliaMedeiros, a Semana “compreende atividades eventuais – como exposições empraça pública, debates, palestras e oficinas – nas quais o tema principal é apromoção da cidadania. A diversidade de ações é imensa. Imagine a criatividadede tantas pessoas do COEP sendo canalizada em uma mesma época, emtodo o país”.Como estratégia de viabilização da Semana, a cada ano o COEP Nacionalsugere uma atividade de caráter coletivo para toda a rede. “A estratégia da redeé que cada COEP municipal e estadual procure atingir os objetivos globais,mas cada um a sua maneira, de acordo com suas possibilidades e dificuldades”,explica Amélia. Em 2001, o projeto O COEP e a Escola Caminhando Juntosna Construção da Cidadania promoveu, entre outras atividades, um concursode redação entre alunos do ensino fundamental. Em 2002, a Semana Nacionalde Mobilização pela Vida teve como destaque o evento O COEP nas Asas daSolidariedade, que realizou concomitantemente atividades nos principais aeroportosdo país. Em 2003, o mote principal foi O COEP Transportando Solidariedade.“No Rio de Janeiro, houve atividades nas barcas que fazem a travessiaentre as cidades do Rio e de Niterói”, explica Amélia Medeiros. “Em 2003, alémdessa mobilização, nossa sugestão era para que fossem realizados eventos diretamenteem comunidades de baixa renda, com prestação de serviços ligados àcidadania. A partir de 2004, a Semana se incorporou ao Movimento Nacionalpela Cidadania e Solidariedade, que tem como eixo os Oito Objetivos de Desenvolvimentodo Milênio.”


vale a pena acreditar | 359Dia Nacional de Mobilização pela VidaEm 2001, articulação com a Semana Nacionalde Mobilização pela Vida, o COEP, a CNBB, oConic, o Ibase e o Fórum Brasileiro de SegurançaAlimentar e Nutricional, com apoio do deputadofederal Miro Teixeira, do PDT-RJ, apresentaramao Congresso Nacional a proposta de criação doDia Nacional de Mobilização pela Vida, 9 deagosto, para que as empresas do setor público acada ano demonstrem suas metas sociais. Transformadoem projeto de Lei do Compromisso Social– PL 5.471/2001 –, ainda está em tramitação.(Para saber mais, leia a entrevista de André Spitz,nas páginas 143 a 146.)Enquanto uma lei nacional aguarda o momentode ser votada, na capital do país já existe umalei local. Quem explica é Dulce Tannuri, secretáriaexecutiva do COEP DF: “Logo que a propostado projeto de lei foi entregue na Câmara Federal,nós, do DF, o enviamos à Câmara Legislativa doDistrito Federal. A lei local foi aprovada porunanimidade e regulamentada com o propósito decontribuir com a mobilização das entidades paraque incorporassem à sua cultura organizacional aresponsabilidade social”.Apesar do avanço, Dulce é crítica quanto aoresultado: “Infelizmente, a lei, apesar de sancionada,não está sendo cumprida integralmente. Todo mêsde agosto, as empresas deveriam publicar seus balançossociais, que, por sua vez, deveriam ser consolidadosno balanço social do DF. Algumas empresaspublicam seus balanços, mas individualmente,sem que a consolidação esteja sendo feita”.Para apoiar esse projeto de lei, assineo abaixo-assinado eletrônico no endereço.Algodão em Sistema Integrado à Indústria Juarez TávoraEm conjunto com a Embrapa, o COEP apostou em mais uma iniciativa dedesenvolvimento local comunitário. Acreditando no potencial do plantio doalgodão no semi-árido nordestino, a proposta foi inicialmente testada no municípiode Juarez Távora, na Paraíba. Sua metodologia previa a transferência detécnicas de cultivo, manejo do solo, processamento e outras tecnologias. RenatoCabral, sociólogo e técnico de desenvolvimento rural da Embrapa, participou


360 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008de tudo desde o início: “A idéiaera começar com um produto quegerasse dinheiro para as famíliase seguisse com outros componentes,como pequenos animais, águae tear”.Ele continua a relembrar ospassos iniciais do projeto: “O COEPpretendia atuar no semi-árido,onde existem 50% dos pobres dopaís. Fomos consultados e sugerimosa atuação na zona rural e aretomada da cultura do algodão,em sequeiro, pois é alternativa viávele de tradição. Fiquei de proporuma sugestão. Contatei o colegaJosé Mendes, pesquisador daEmbrapa Algodão, de CampinaGrande, e disse-lhe que não era um projeto para produzir algodão, mas dedesenvolvimento social/rural, no qual a âncora seria o algodão. Ele sugeriu umassentamento rural em Juarez Távora”. Aliás, sobre José Mendes, Cabral fazquestão de ressaltar: “A execução e o sucesso do projeto de Juarez Távora couberama José Mendes, um craque em desenvolvimento de projetos sociais”.Na primeira reunião com a comunidade, houve uma mostra do que estavapor vir. “Muita discussão entre agricultores, prefeito, vigário, líder comunitário,desconfianças de parte a parte, dificuldade de se entender o COEP, mas comuma aceitação geral para se discutir uma proposta. O vigário, de 1,90 metro dealtura, sandálias Havaianas, camisa puída, idéias claras, levantou-se e desafiouo prefeito, às vésperas das eleições, a arrastar uma cruz, descalço, pela comunidade,em um morro de peregrinação local, debaixo do sol de sertão, caso nãocumprisse as promessas daquela reunião”, relembra Renato Cabral.Em conjunto com a Embrapa, o COEP apostou no plantio do algodão como umainiciativa de desenvolvimento local comunitário© Marcelo Valle


vale a pena acreditar | 361Mas apesar de um padre tão decidido, o projeto não foi facilmente implantado.“Tudo aquilo foi tempo perdido. A terra do assentamento, já dividida e aradapara os cultivos, foi retomada, pelo proprietário da fazenda, por medida judicial.Então, o projeto foi transferido para o atual assentamento Maria MargaridaAlves. O projeto implicava a instalação de uma miniusina de processar algodão,que necessitava de energia elétrica e trifásica, mas não havia. Então, o prefeitosugeriu instalar as máquinas na cidade. Fomos contra e dissemos que aí residia oproblema. Era preciso deixar as famílias onde estavam, e não as levar para a cidade.Uma rede de 11 quilômetros, trifásica e muito cara, seria necessária. Apelamospara o governador. Cheguei a escrever uma carta ao governador da Paraíba, aquem encaminhei por meio de um amigo, solicitando a construção da rede. Tivemossucesso. A rede foi construída, as máquinas foram instaladas, e houve ainauguração. Muita gente, candeeiro apagado e máquinas funcionando. A alegriadas famílias foi maior com a chegada da energia elétrica do que com o funcionamentoda miniusina. E nós estávamosfelizes com o funcionamento da miniusina.Eram interesses diferentes”,conta Renato Cabral.Sobre seu envolvimento com oCOEP, Renato Cabral explica: “Minhaparticipação no COEP deveu-seà condição de trabalhador da Embrapa,no Departamento de Pesquisa eDesenvolvimento, coordenando o Programa de Desenvolvimento Rural e demaisprojetos de apoio às ações de desenvolvimento social. Nesse trabalho, euconstantemente representava a empresa em todos os fóruns de discussão dotema pobreza e fome. A Embrapa era muito solicitada para apoiar essas iniciativas,pois realizava muitas ações voltadas para as famílias rurais e periurbanas,nas quais esse problema é mais evidente. Como técnico da empresa, eu possuíamuitas informações a respeito do tema e interesse no assunto. A instituição eraparceira do COEP, tornei-me conhecedor dele, sobretudo da figura do AndréO projeto implicava a instalação de umaminiusina de processar algodão, quenecessitava de energia elétrica. Uma redetrifásica e cara seria necessária


362 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Spitz, que sempre me convidou para participar das ações da organização, oracom idéias, ora com projetos em andamento”.José Mendes, o colega a quem Renato Cabral credita o sucesso do projeto doalgodão, também revela seu motivo para participar do COEP: “Realizar um trabalhocomprometido com o desenvolvimento e a organização de comunidadesrurais, tendo como pano de fundo a geração de trabalho e renda com a revitalizaçãoda cultura do algodão”. Para ele, “o maior destaque está no fato de o COEPCOEP RondôniaCriado em outubro de 2000, o COEP RO contaatualmente com 38 organizações associadas. Entresuas iniciativas, destaca-se o diagnóstico socioeconômicoe ocupacional do bairro Feliz Cidade, realizadoem parceria pelas faculdades FIP e Unipec epelo IBGE, sob coordenação do COEP RO. O resultadofoi a regularização fundiária de aproximadamente600 famílias, numa ação conjunta do COEPcom a Prefeitura de Porto Velho. “Ressalte-se queas famílias eram posseiras, porque a ocupação dobairro decorreu de invasões e a regularização fundiáriafoi a primeira experiência da Prefeitura nessaárea de atuação socioeconômica. Essa experiênciafoi tão exitosa que vem sendo replicada em outrosbairros periféricos oriundos de invasões”, afirmaMaria Helena Cruz Magalhães, funcionária doIncra e secretária executiva do COEP RO.Outra iniciativa relevante é a construção einstalação da escola de ensino fundamental cominclusão digital, na Vila Princesa, que atende maisde cem alunos da primeira à quarta série do ensinofundamental. A escola foi edificada com o apoio daUnimed Rondônia e de outras entidades associadasao COEP RO, e os cursos foram implantados comcolaboração da Fundação Universidade Federal deRondônia (Unir), Faculdade São Lucas e tambémda Unimed. “Hoje, a escola encontra-se incluída nagestão municipal, funcionando dentro dos padrõesda Secretaria Municipal de Educação. As famíliastambém participam ativamente da escola, freqüentadapor seus filhos e filhas. Entre essas atividadesparticipativas, incluem-se as funções voluntáriasdas mães que residem na Vila Princesa, que atuamna zeladoria, copa-cozinha e vigilância. Trata-se deuma iniciativa sustentável, altamente promissora ede grande alcance social, cultural e intelectual, umavez que contribui enormemente para a erradicaçãodo analfabetismo em uma comunidade periféricada capital de Rondônia”, garante Maria Helena.


vale a pena acreditar | 363voltar-se para a problemática que envolve o meio rural da região semi-árida nordestina,não apenas focada nas atividades agropecuárias, mas também nos aspectosda educação, inclusão digital, capacitação técnica, associativismo, organizaçãosocial e gênero, mediante a aplicação de uma metodologia participativa”.Para Gleyse Peiter, essa experiência inaugura uma nova forma de articulaçãofeita pela COEP: “Até então, promovíamos a articulação necessária para umdeterminado projeto, pensando nas necessidades de cada iniciativa. Com JuarezTávora, mudamos e começamos a promover várias articulações para que cada umadas associadas desse uma contribuição específica àquela proposta. Começamosa buscar o que cada parceira tinha a oferecer de acordo com a sua missão comoempresa. A Chesf, por exemplo, apoiou com sua infra-estrutura e logística,ajudando a viabilizar o fornecimento de energia elétrica. A Embrapa introduziutécnicas agrícolas”.Os resultados dessa primeira incursão do COEP no semi-árido foram animadores:“Pela primeira vez na região, é possível pré-processar o algodão dosagricultores na roça, permitindo-lhes maior ganho, pela venda do algodão empluma e pela retenção do caroço para replantio. Além disso, podem vender aosvizinhos e a sobra pode ser usada para alimentar os animais. É um trabalhocoletivo. Isso também permitiu absorver facilmente novas tecnologias na produçãodo algodão – como novas sementes, uso da curva de nível, controle do bicudo,fortalecimento da organização comunitária – e aumentar a auto-estima e acoesão da comunidade para executar outras demandas para ampliar o bem-estar,tipo abastecimento de água, telefonia, calçamento, telecentro, entre outros”,informa Renato Cabral.


364 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 20082001Algodão, Tecnologia e CidadaniaO sucesso da experiência do plantio do algodão em Juarez Távora proporcionouuma nova articulação no âmbito do COEP: Finep, Chesf, CNPq e Coppe/<strong>UFRJ</strong>uniram-se para replicar a iniciativa. Em 2001, cinco municípios do semi-áridonordestino foram escolhidos para essa nova fase. Foi assim que o projeto, quepassou a se chamar Algodão, Tecnologia e Cidadania, chegou às comunidadesde São José das Piranhas (PB), Engenho Velho (CE), Boi Torto (PE), Quixabeira(AL), e ao assentamento José Rodrigues Sobrinho (RN).A Eletrobras também se tornouparceira nessa experiência, comoexplica Tereza Cristina RozendoPinto, gerente do Departamentode Desenvolvimento Humano eResponsabilidade Social da empresa:“Trata-se de um projeto queestá estritamente alinhado comos objetivos das ações sociais daEletrobras. Ou seja, a promoçãodo desenvolvimento comunitárioem zonas rurais. Esse projeto investeno potencial da agriculturafamiliar dando condições aos pequenosprodutores de competiremno mercado por meio do beneficiamentodo algodão. O projetoviabiliza a aquisição de meios deCom o sucesso do plantio do algodão em Juarez Távora, Finep, Chesf, CNPq eCoppe/<strong>UFRJ</strong> uniram-se para replicar a iniciativa© Marcelo Valle


vale a pena acreditar | 365O projeto Algodão, Tecnologia e Cidadania está nas comunidades de São José das Piranhas (PB), EngenhoVelho (CE), Boi Torto (PE), Quixabeira (AL) e no assentamento José Rodrigues Sobrinho (RN)© Marcelo Valleprodução tecnologicamente competitivos e estimula, entre os agricultores, ocooperativismo. Dessa forma, a cidadania é a conseqüência do ‘empoderamentosocial’ dessas comunidades, que começam a ter mais auto-estima e mais consciênciado seu trabalho e da sua terra”. Ela continua: “Esse projeto é um exemplode uma tecnologia social que deu certo e está sendo replicado pelo Nordeste.A meu ver, para a Eletrobrás, a forma como o projeto pactuou o compromissoentre os parceiros em torno de objetivos comuns tem sido a grande novidade eo diferencial”.


366 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008André Spitz complementa: “Com a realização de um diagnóstico em cada umadas comunidades envolvidas, a proposta evoluiu para a construção de um núcleogerador de trabalho e renda, transformando-a em um vetor de crescimentopara facilitar a agregação de novos projetos e ações saneadoras de problemas locais.Foi o embrião do que chamamos Comunidades COEP, que só surgiria em 2005”.COEP Mato Grosso do SulCriado em maio de 2001, o COEP MS foi resultadode uma articulação conduzida pelo Incra, napessoa de Elizabeth Ribeiro da Fonseca, representantetécnica desse instituto no COEP Nacional.A secretaria executiva foi exercida inicialmentepor Elsi Oliveira Freire, também do Incra, tendosido repassada, em 2005, para Tânia Tannuri, doBanco do Brasil.Uma das principais ações do COEP MS foi acriação do Bosque Betinho, localizado no Parquedas Nações Indígenas, maior parque urbano doestado. “Nesse bosque, temos mais de 500 árvoresplantadas e fazemos periodicamente a doaçãode adubos e insumos. Essa é uma ação de responsabilidadeambiental que visa ajudar a neutralizaçãodos gases de efeito estufa”, garante IsmaelMachado, funcionário do Banco do Brasil e atualsecretário executivo do COEP MS.Outra ação de destaque é a realização anualdo festival de música O COEP e a Escola CaminhandoJuntos na Construção da Cidadania. SegundoIsmael, “já foram realizados três festivais eestamos organizando o quarto festival com aparticipação de alunos, professores e diretores deescolas públicas municipais e estaduais, além deescolas particulares. Os festivais já envolverammais de mil alunos dessas escolas”.O secretário executivo também cita o que consideraum grande desafio: “Extrapolar o assistencialismo.Atualmente, temos duas máquinas demarcenaria, capazes de produzir 80% dos trabalhosem marcenaria, que foram cedidas para o LarEscola Anália Franco, a fim de formar jovens noofício de marceneiros. Estamos com aulas de xadrezpara crianças e adolescentes e queremos implantaraulas de corte e costura, panificação e outrasatividades geradoras de atividade e renda”.Em 2005, o COEP MS ajudou a criar o COEPmunicipal Dourados, cuja secretaria executiva foiassumida por Franciele F. Costa, da Embrapa.


vale a pena acreditar | 367COEP ParáCriado em outubro de 2001, o COEP PA tem desenvolvidosuas atividades prioritariamente nas comunidadesPantanal e Paraíso Verde, no bairro Curió-Utinga,focadas na educação, geração de renda e atividadesculturais. Mais recentemente, o investimento maiortem sido a ampliação do espaço do centro comunitário,visando diversificar a programação e proporcionarmaior conforto às comunidades. Em 2008 em especial,as equipes estão aplicando, na prática, o que aprenderamnas oficinas. Espera-se que a produção de mel, deprodutos fitoterápicos e outros voltados para a alimentaçãopor meio da prática de fruticultura se consolideem prol da comunidade.Segundo Virginia Barros de Castro, funcionáriada Eletronorte e secretária executiva do COEP PA,“é importante para o estado e para o Brasil como umtodo que essas representações se multipliquem e sefortaleçam para que possamos contribuir na erradicaçãode tantas desigualdades. Agir com ética, praticar,desenvolver o pensamento crítico e a ação solidária édever dos participantes da Rede COEP”.COEP TocantinsInstaurado em novembro de 2001, o COEP TO é secretariadodesde então pela Caixa Econômica Federal econta com nove entidades associadas. Sua atual secretáriaexecutiva é Silvana Reis Alencar de Almeida, queexplica: “O COEP Tocantins começou mobilizando asassociadas para as práticas do combate à fome e à misériae para o exercício da responsabilidade social. Para isso,promovemos eventos e divulgações como O COEP nasAsas da Solidariedade, por três anos consecutivos, noaeroporto e na rodoviária de Palmas, capital do estado”.Entre as campanhas de arrecadação de alimentos,roupas, calçados, brinquedos e material escolar, destaca-seo Natal pela Vida. Segundo Silvana, “embora se trate deações pontuais, o COEP TO mantém a preocupaçãoem agregar iniciativas estruturantes, efetuando as doaçõesacompanhadas de palestras ambientais, plantaçãode árvores, vídeos educativos, oficinas para trabalhosmanuais, reciclagem, entre outros”.Outra iniciativa exitosa é o projeto O COEP e aEscola Caminhando Juntos na Construção da Cidadania,que envolve professores(as) e alunos(as) nas reflexõese práticas sobre os Objetivos de Desenvolvimentodo Milênio. Desse modo, estimula que atuem comoagentes de transformação da sociedade. Para a secretáriaexecutiva, “a participação na Jornada COEP pelaCidadania contribui para superar o desafio de aumentaro número de associadas, envolver mais pessoas e expandiressa grande Rede Nacional de Mobilização Socialpara outros municípios. É o diferencial que integra oenvolvimento de comunidade, organizações e pessoas”.


368 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Gestão inovadoraEm 2001 três ferramentas de gestão surgiram: o estatuto e regimento interno doCOEP e a criação do seu conselho de administração. Para Francisco Ivo, representantedo Ibama no COEP, “a criação do conselho de administração foi uma grandesacada, tendo em vista a necessidade que a Rede tinha – e tem – de encaminhar eresolver questões que talvez só pudessem ser equacionadas no conselho deliberativo,que, geralmente, tem dificuldade de se reunir. O surgimento do conselho deadministração foi, realmente, oportuno e adequado. É claro que questões fora dapauta meramente administrativa continuarão sob a responsabilidade do conselhodeliberativo”. Para ele, o estatuto e o regimento interno são fundamentais.Amélia Medeiros acredita que o conselho de administração seja mais umespaço de democratização na tomada das decisões da rede: “O que surge foradas duas reuniões anuais que temos não poderia ser resolvido, não fosse essainstância. Sempre que há, na Rede, uma questão sem consenso, é no conselhode administração que podemos debatê-la. Dele participam alguns representantestécnicos de associadas e alguns secretários executivos dos COEP estaduaise municipais, além do COEP Nacional. Também cabe a esse conselho fazercumprir o regimento e o estatuto, além de sempre se preocupar em manter umpadrão básico dentro da diversidade da Rede COEP”.Para Dalmira Lopes, que foi secretária executiva do COEP do Rio Grandedo Sul de 2000 a 2005 e membro do conselho de administração, a instância“cumpre a missão de ficar atento aos problemas que possam prejudicar o nomedo COEP e buscar um tratamento adequado para cada situação adversa aobom andamento da Rede. Fui membro do conselho e lembro-me de que líamoso estatuto e discutíamos as situações com o maior cuidado, pois era necessáriomanter a harmonia entre as partes para garantir a unidade na Rede”. Dalmiratambém revela que a possibilidade de trabalhar com pessoas que se preocupamem mudar a realidade do país foi a principal condição para seu ingresso noCOEP: “Em 1996, recebi o convite para representar a Dataprev no COEP RioGrande do Sul. Aceitei de imediato, pois sabia tratar-se de algo muito especial,


vale a pena acreditar | 369uma vez que o mentor do Comitê era Herbert de Souza, o Betinho. Acompanheio crescimento da Rede e percebi a habilidade da coordenação para tratarcom as diversidades culturais, em busca de unidade”.Na opinião de Aurino Valois Júnior, assessor da presidência da Conab e representantetécnico da empresa no COEP Nacional, o conselho de administração éuma ferramenta imprescindível para manter o diálogo entre diferentes segmentosque compõem uma rede tão ampla: “É também uma maneira de garantir certopadrão nas nossas ações, sempre com estímulo ao debate”. Aurino também fazquestão de apontar o estágio avançado de planejamento que o COEP tem alcançado:“Em cada reunião, há um avanço. Não são passos, são saltos”.Saiba maisEm 1994, foi estabelecido o protocolo de constituiçãodo COEP e um primeiro estatuto regulamentandoas atividades do Comitê. Com o crescimentoda Rede, ampliação do número de organizaçõesparticipantes e atividades desenvolvidas,foi necessária uma revisão do estatuto com o objetivode fortalecer e dar unicidade à rede.da comissão executiva e do conselho deliberativodo COEP Nacional e de suas instâncias estaduaise municipais, e o modo de funcionamento do Comitê.“O regimento e o estatuto são a expressão doacordo operativo feito pela Rede COEP”, defineAmélia Medeiros, secretária executiva adjunta doCOEP Nacional.O novo estatuto do COEP, aprovado em 6 dejulho de 2001, a partir dos objetivos sociais doCOEP, dispõe sobre os membros do Comitê, entidadesassociadas, seus direitos e deveres, formas departicipação, regras para criação dos COEP estaduaise municipais e a estruturação do Comitê.O regimento interno, complementando o estatuto,traz as normas que disciplinam as reuniõesCriado a partir da aprovação do novo estatutodo COEP, o conselho de administração é o gestorde primeira instância do COEP e sua finalidadeé democratizar a gestão da Rede. Seus principaisobjetivos são deliberar sobre casos omissos doestatuto e tomar as devidas providências para ocumprimento do estatuto.


370 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008O COEP e a escolaComo parte das atividades da Semana Nacional de Mobilização pela Vida de2001, foi lançado o projeto O COEP e a Escola Caminhando Juntos na Construçãoda Cidadania. Tendo as escolas como parceiras e contando com os professorese professoras como protagonistas da ação educativa, a iniciativa estávoltada para jovens que cursam a partir da quinta série do ensino fundamental.Entre as atividades propostas, debates sobre cidadania, redação de poesias eincentivo ao envolvimento com a comunidade local. “É também uma estratégiapara ampliar as atividades voltadas para jovens. Nosso objetivo é mobilizar essesegmento, inicialmente alunos da quinta à oitava série do ensino fundamental,e posteriormente ampliando até a nona série, para questões relacionadas à cidadania”,explica Sarita Berson. Segundo Amélia Medeiros, “incentivar que asassociadas realizassem ações sociais voltadasà juventude sempre foi estratégia do COEP.Mas, em 2001, resolvemos atuar mais fortementenesse campo”.No primeiro ano de sua realização, odestaque do projeto foi um concurso de redação.Foram três temas propostos: convivência,solidariedade e participação. “Essestemas foram escolhidos porque acreditamosque os três são imprescindíveis ao exercício da cidadania, pois, para exercê-la, épreciso ter uma convivência solidária e participativa com a sociedade em geral”,explica Amélia Medeiros.As três melhores redações de cada estado foram publicadas no livro homônimodo projeto. Em 2002, foi a vez de um concurso de poesias e frases de incentivoà mobilização social. As poesias vencedoras foram divulgadas no Portal doCOEP, e as frases foram publicadas na Agenda COEP 2004. Em 2003, os(as)jovens escreveram cartas sobre cidadania, que foram trocadas entre os(as) autores(as)premiados(as), em vários estados. A partir de 2004, o projeto se voltou para osNo primeiro ano de sua realização,o destaque do projeto foi umconcurso de re dação. Em 2002,foi um concurso de poesias


vale a pena acreditar | 371Trecho da redação de Adriano Martins, aluno do Instituto Estadual de Educação, de Florianópolis, Santa Catarina© Arquivo COEPOito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, com esquetes teatrais sobre otema apresentados por alunos e alunas. Segundo André Spitz, “a intenção doCOEP é motivar a juventude a se tornar protagonista das mudanças que querpara o mundo, discutindo seus direitos e suas responsabilidades”.Em 2005, um concurso de música norteou o concurso. As músicas vencedorasforam gravadas em um CD, e a idéia acabou replicada nos anos seguintes. Oresultado está nos três CDs Os Oito Objetivos do Milênio na voz dos jovens, produzidospelo COEP, que trazem músicas inéditas de jovens de todo o país.Selda Cabral, secretária executiva do COEP Pernambuco, é a responsávelpela mobilização da rede local para concretizar a agenda anual do COEP Nacional.Para ela, “o projeto trouxe uma proposta muito importante na área da educaçãocom jovens do ensino fundamental. No início, o tema era quais iniciativas


372 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Trecho da redação de Antônio F. Martins, aluno do curso noturno da Escola Professor Almeida Leite,em Maceió, Alagoas© Arquivo COEPpoderiam melhorar a vida da população. Os jovens expressavam suas idéias pormeio de redações e escolhíamos a melhor. Mobilizamos, na época, a SecretariaEstadual de Educação, que foi nossa parceira no primeiro momento. Os meninosda rede pública abraçaram a proposta e foi um sucesso. O retorno disso paratodos da Rede foi, na verdade, muito emocionante”.Sobre os resultados dessa iniciativa, Selda relata: “Em Pernambuco, houvedestaque de três redações, além de premiações, homenagens, entrega de certificadoe, ainda, a publicação de um livro do COEP com temas fortíssimos para nossa


vale a pena acreditar | 373reflexão, como ‘Nossos Valores’, ‘O exemplo doBeija-Flor’ e ‘Pela Igualdade’. Não posso exemplificaros desdobramentos, mas esses jovens, após ocontato com a Rede COEP, não são mais os mesmos.Acredito que geramos jovens muito mais críticose preocupados com um futuro melhor”.“Queremos combater essa imagem de que asociedade é apenas consumista, que ninguém seimporta com o outro. Procurar despertar sentimentosque incentivem a cidadania dos jovens.Tudo isso faz parte dos nossos propósitos comessas iniciativas. Não tem melhor parceira paraisso do que a própria escola, onde se aprende conhecimento,mas também valores. Independentementeda forma de expressão proposta a cadaano, o projeto O COEP e a Escola quer fazercom que o jovem discuta seu papel na construçãoda cidadania”, ressalta Amélia Medeiros.© Arquivo COEPO concurso de re dação teve três temas: convi vência,solidariedade e participação


374 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 20082002Encontro nacionalO 1º Encontro Nacional do COEP ocorreu de 6 a 8 de maio de 2002© Arquivo COEPO 1º Encontro Nacional do COEP ocorreu de 6 a 8 de maio de 2002, no Fórumde Ciência e Cultura da Universidade Federal do Rio de Janeiro (<strong>UFRJ</strong>), mesmolocal de sua criação. Foi a primeira vez que representantes de todos os estados emque o COEP atua se reuniram. “Foram cerca de 300 participantes. Foi uma oportunidadeúnica de integração e de capacitação da Rede para gestão no campo dodesenvolvimento humano e social”, afirma Sarita Berson, do COEP Nacional.O encontro também sediou a reunião do conselho deliberativo do COEPNacional, além de promover o curso Elaboração de Projetos Sociais, cujo objetivofoi contribuir para a melhoria das práticas sociais no âmbito da Rede edas associadas em particular. “A ementa do curso, ministrado pela equipe doLaboratório de Tecnologia de DesenvolvimentoSocial da Coppe/<strong>UFRJ</strong>, contemplou a apresentaçãodos principais aspectos metodológicosrelacionados ao planejamentode projetos na área social”,complementa Sarita.A ocasião também serviu, segundoGleyse Peiter, para divulgaçãodo projeto do algodão, iniciadoem caráter experimental noano 2000. “Foi algo como um lançamentooficial dessa proposta inovadora,já em base mais definidas”.Gleyse relembra, ainda, outro fato


vale a pena acreditar | 375Mais de 300 participantes se reuniram no Fórum de Ciência e Cultura da Universidade Federal do Rio deJaneiro mesmo local de criação do COEP© Arquivo COEPmarcante do 1º Encontro Nacional do COEP: “Fizemos um tipo de jogral comos textos dos alunos que participaram do concurso de redação do projeto OCOEP e a Escola Construindo Cidadania. Nosso mote era refletir sobre a incrívelcapacidade desses jovens, mesmo diante de poucas possibilidades, deconstruir um futuro melhor. Foi muito especial esse momento”.Asas da solidariedadeA Semana Nacional de Mobilização pela Vida, em 2002, teve como destaqueo evento O COEP nas Asas da Solidariedade. Para Amélia Medeiros, do


376 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008A Semana Nacional de Mobilização pela Vida, em 2002, teve como destaque oevento O COEP nas Asas da Solidariedade© Arquivo COEP TocantinsCOEP Nacional, essa foi uma das oportunidades mais concretas de mostrarpara as pessoas em geral o que é uma rede social. “Um passageiro que fez trêsconexões em diferentes aeroportos comentou: o COEP está em todos os lugares?”,conta Amélia. Ela continua: “Em cada aeroporto participante, distribuímosmaterial informativo sobre as ações sociais que são implementadas pelo COEPno Brasil e naquela localidade específica. Também fazíamos uma provocaçãodo tipo: ‘E você? O que pode fazer?’”.Em Rondônia, a experiência foi bastante positiva, como revela Maria HelenaCruz Magalhães, secretária executiva do COEP Rondônia: “Tendo sido o primeiroevento do projeto O COEP nas Asas da Solidariedade, a secretaria executiva


vale a pena acreditar | 377do COEP Rondônia se esforçou na mobilização das entidades associadas a fimde dar grande expressividade ao projeto. Visando atrair a atenção dos passageirose das pessoas que os acompanham nos embarques, assim como daquelas quevão receber passageiros que chegam, o COEP Rondônia organizou várias atividadesatrativas como: banda de música, coral, exposição de trabalhos artesanais,recitais, além da distribuição de fôlderes, panfletos, filipetas e publicações paradivulgação do COEP, de maneira expressiva, em todo o Estado de Rondônia eno território nacional”.Sobre as dificuldades, Maria Helena aponta: “As principais limitações doCOEP são a falta de recursos financeiros e o restrito nível de comprometimentodos conselheiros, resultando num baixo envolvimento das entidades. Assim, afalta de estrutura exige um esforçohercúleo da secretaria executivana busca de convencimento de representantestécnicos para aderirao projeto e dele participar commaior efetividade”. Ainda assim,Maria Helena aponta a integraçãoe o despertar dos representantestécnicos como resultadosbastante positivos: “Acabaram seconscientizando da importânciado COEP como Rede Nacionalde Mobilização”.No Tocantins, também há registrosbastante positivos, comorelata Silvana Reis Alencar deAlmeida, assistente institucionalda Caixa Econômica Federal esecretária executiva do COEPTocantis: “Realizamos o evento© Arquivo COEP TocantinsSegundo Silvana Reis Alen car de Almeida, do COEP TO, o evento no Aeroporto dePalmas foi no dia 7 de novembro de 2002


378 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008pela primeira vez no Aeroporto de Palmas, em Tocantins, no dia 7 de novembrode 2002. Houve distribuição de fôlderes, exposição de banners, vídeos, fotos doCOEP e apresentações culturais (apresentação de sax e teclado por alunos darede municipal de ensino e do coral municipal de Palmas, com 40 crianças, quereceberam um kit escolar). Tivemos a preocupação em realizar um evento dedivulgação, com práticas cidadãs, entre elas proporcionar que crianças e jovensconhecessem o aeroporto da cidade, sensibilizar entidades e pessoas para seengajarem na luta contra a fome e divulgar a cultura local”.COEP PiauíCriado em 24 de outubro de 2002, o COEP Piauítem dois projetos que merecem ser destacados:produção da mamona e do feijão-caupi e núcleocomunitário social mirim, também conhecido comopelotão mirim.O primeiro é desenvolvido no município deAnísio de Abreu, tendo como ponto de partida aprodução da mamona consorciada com o feijãocaupi.O objetivo, segundo a secretária executiva doCOEP PI, Francisca Ferreira da Silva, da Dataprev,é gerar renda e melhorar a qualidade da alimentaçãoda população das comunidades onde é realizado.Em 2006, o projeto foi expandido para ascomunidades de Boa Vista, no município de Jurema;Solidão, em São Braz do Piauí; e Quixó, emSão Raimundo Nonato. Em 2007, foi a vez dascomunidades de Baixa do Morro e Pão de Açúcar,nas cidades de Fartura do Piauí e Várzea Branca,respectivamente. “A mamona foi escolhida comoproduto para impulsionar o projeto porque é umproduto perfeitamente adaptado à região. Entreos ganhos obtidos, está uma telessala que facilitaa comunicação, via satélite, das comunidadesatendidas”, informa Francisca.Em parceria com o COEP PI, o pelotão mirimé desenvolvido pela Coordenadoria de Polícia Comunitáriae Cidadania da Polícia Militar do Piauí,aliada ao Conselho Comunitário de Segurança Públicada Região Grande Pedra Mole e à comunidadeda Vila Firmino Filho. O objetivo é oferecer acompanhamentoeducacional, esportivo e cultural a cemcrianças e adolescentes de 7 a 14 anos, dando-lhesnoções de cidadania e orientações a respeito dosriscos do uso de drogas e da violência.


vale a pena acreditar | 379Natal pela VidaDe 1994 a 2001, o COEP participou ininterruptamente da campanha Natal semFome, mas, em 2002, optou por uma iniciativa capaz de despertar, de maneiradiferente, a solidariedade das pessoas que participam da Rede. Em vez de mobilizara Rede para doar alimentos, aaposta foi uma mobilização voltadapara o desenvolvimento de açõesafirmativas, que pudessem gerarmudanças efetivas na vida de quemprecisa. Surgiu, assim, a campanhaNatal pela Vida. Segundo AméliaMedeiros, “em 2002, a campanhade Natal desenvolvida no âmbitodo COEP assumiu nova proposta,com o incentivo à ampliação dogesto de doar e o estabelecimentode vínculos mais duradouros com apromo ção da cidadania”.“Passamos a incentivar, porexemplo, que durante o mês dedezembro cada integrante da redeescolhesse uma entidade social ouuma comunidade para fazer algorelacionado à capacitação ou outrainiciativa que fortalecesse o protagonismocomunitário. A doaçãode alimentos pode acontecer, masqueríamos estimular a participaçãocidadã”, explica Sarita Berson,do COEP Nacional.© Arquivo COEPLançado em 2002, o jornal Mobilização Social foi mais uma estratégia paraanimar a Rede COEP


380 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Amélia também ressalta que a campanha do Natal pela Vida passou a promovereventos que possibilitassem a discussão e reflexão sobre a responsabilidadede cada um(a) quanto à questão da pobreza no país, “além de estimular acontinuidade do trabalho voluntário e concentrar as ações desenvolvidas emuma ou mais comunidades”.O COEP Paraíba também inovou na busca de parcerias para a campanhaNatal pela Vida: “Desenvolvemos gestões com um grupo de comunicação local,hoje vinculado à TV Record, denominado Sistema Correio de Comunicações,que assumiu os compromissos não só de veiculação da campanha, mas efetuousua filiação ao COEP Paraíba, assumindo de pronto todos os conceitos deresponsabilidade social que norteavam os projetos e as campanhas do COEPParaíba”, explica o secretário executivo.


vale a pena acreditar | 3812003Apoio ao Fome ZeroAo assumir seu primeiro mandato, o presidente Luiz Inácio Lula da Silvaanunciou o combate à fome como prioridade de seu governo e convocou asociedade a apoiar o programa Fome Zero. A resposta do COEP não demorou.Em março do mesmo ano, na sede de Furnas, no Rio de Janeiro, ocorreu a reuniãodo conselho deliberativo do COEP, com a presença de frei Betto, entãoassessor especial da Presidência da República, do professor Luiz Pinguelli Rosa,fundador e presidente de honra do COEP, além de dirigentes de entidadesnacionais associadas ao COEP e de representantes do Distrito Federal e dos26 estados brasileiros. Como desdobramento, em maio, no Palácio do Planalto,o presidente Lula recebeu o presidente do COEP, André Spitz, e mais 37 dirigentesde organizações associadas ao COEP, que entregam o primeiro resultadodessa articulação: o documento Mutirão contra a Fome, uma relação de iniciativase projetos de combate à insegurança alimentar já apoiados pelo COEP eorientações para outras formas de apoio ao programa federal.André Spitz resume o que foi esse momento: “Valendo-se dessa capacidadede articular organizações em todo o país em torno de um mesmo propósito, emmarço de 2003, o COEP deflagrou um amplo processo de mobilização das associadas,que teve início na reunião do conselho deliberativo nacional”.Ainda em relação ao Fome Zero, Gleyse Peiter, atual secretária executiva doCOEP Nacional, explica: “Uma das contribuições do COEP foi a mobilizaçãodas entidades associadas para construírem seus planos de ação com iniciativasde apoio ao Fome Zero. Outra forma de apoio do COEP ao Fome Zero foi adisponibilização do Banco de Projetos Sociais – Mobilização para a inclusãode idéias e ações em desenvolvimento que podem ser implementadas por qualquersegmento da sociedade brasileira”.


382 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008André Spitz, frei Betto, José Pedro Rodrigues e Luiz Pinguelli Rosa – da esquerda para a direita© Arquivo COEPAndré Spitz complementa: “Por meio de estratégias de mobilização, da troca deexperiências e da articulação de parcerias entre suas associadas, o COEP tem implementadoprojetos inovadores, muitos dos quais se tornaram referência e sãoreplicados nas diferentes regiões do país. Respaldado na sintonia de ideais e princípios,o COEP somou esforços com o Fome Zero, disponibilizando a capacidadede mobilização, a experiência e a determinação que têm marcado a atuação danossa rede desde 1993”. A legitimidade do COEP em relação ao combate à fometambém foi reconhecida com o convite ao COEP Nacional para integrar o novoConselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, reeditado também noinício do governo Lula (leia mais sobre o Consea nas páginas 156 a 163).


vale a pena acreditar | 383Apoio ao Programa Primeiro EmpregoO sucesso da articulação em torno ao Fome Zero serviu de inspiração para outraação do COEP. Ainda em 2003, o COEP promoveu uma reunião sobre o ProgramaPrimeiro Emprego, no Ministério do Trabalho. Além de André Spitz e derepresentantes das entidades associadas ao COEP, estavam presentes o secretáriode Políticas Públicas de Emprego, Remígio Todeschini, o assessor especial daPresidência da República, Oded Grajew, e o professor Antônio Almerico BiondiCOEP Mato GrossoO COEP MT foi criado em maio de 2003, tendoAdão Sérgio Gomes, funcionário de Furnas, comosecretário executivo; em, 2005, José Nunes Xavier,também de Furnas, assumiu o cargo. A primeiracampanha foi realizada em junho de 2003: Mobilizaçãopela Vida, uma grande mobilização dosempregados e empregadas voluntários das empresasassociadas visando à arrecadação de alimentos,roupas, agasalhos e outras doações. Foramarrecadados 7.684 quilos de alimentos, destinadosa entidades carentes de Cuiabá, Várzea Grande eChapada dos Guimarães.Na Semana Nacional de Mobilização pela Vida,de 2005, em parceria com os Correios, foi realizada,na estação rodoviária de Cuiabá, a distribuição decartões postais divulgando os Oito Objetivos deDesenvolvimento do Milênio (ODMs). Nessa atividade,as pessoas em trânsito escreviam mensagensnos cartões postais, e os Correios encarregavam-sedo envio, que era feito gratuitamente.Na mesma ocasião, o COEP MT, em parceriacom a Infraero, realizou o evento O COEP nasAsas da Solidariedade, no Aeroporto MarechalRondon, em Várzea Grande. Houve apresentaçãode caratê, de dança de rua e distribuição defolhetos para a divulgação dos ODMs. SegundoTereza Nobuko Belmonte, do Banco do Brasil, eatual secretária executiva do COEP MT, “no decorrerde 2006 e 2007, diversas ações foram realizadasem datas comemorativas, tais como: DiaMundial do Combate à Aids, Dia da Comunidade,Dia da Criança, Dia Mundial da Alimentação,além do Natal pela Vida”.


384 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Lima. “A solicitação do apoio das associadas ao COEP na implementação edisseminação do Programa Primeiro Emprego é o reconhecimento a nossa capacidadede mobilização”, enfatiza André Spitz.A reunião foi uma oportunidade para que representantes das associadasbuscassem esclarecimentos e informações sobre o programa, além de indicardificuldades e sugestões para sua aplicação. Tal como no programa Fome Zero,André Spitz solicitou que cada entidade associada ao COEP Nacional fizesseuma proposta de apoio ao Primeiro Emprego. A consolidação das propostasem um único documento do COEP representou a contribuição ao ProgramaPrimeiro Emprego e foi entregue ao então ministro do Trabalho Jacques Wagner,em junho de 2003.“A questão da juventude e a questão do trabalho têm sido focos prioritáriosda mobilização do COEP e de suas associadas desde 1993. Mostramos váriaspossibilidades de iniciativas que articulam os dois programas (Primeiro Empregoe Fome Zero), em particular o apoio aos jovens agentes comunitários parao desenvolvimento de projetos de trabalho civil voluntário voltados para comunidadesde baixa renda”, enfatiza André Spitz. Um exemplo foi a medida adotadapela Conab. Segundo Aurino Valois Júnior, representante da empresa no COEPNacional, depois dessa mobilização, o número de estagiários foi ampliado.Rede MobilizadoresCriada em 2003, a Rede Mobilizadores é formada por pessoas compromissadascom a questão social, do Brasil e do exterior, que interagem por meio do site. A rede possui grupos temáticos sobrediferentes assuntos na área social, nos quais é possível ter acesso à informaçãoatualizada; consultar textos de referência; conhecer iniciativas sociais; e compartilharidéias, experiências e conhecimentos, por meio de fóruns de debates, batepapos,treinamentos on-line e enquetes. “São mais de 7 mil mobilizadores, de550 municípios e também do exterior – 14 países –, que atuam nesse espaço


vale a pena acreditar | 385privilegiado para troca de experiências, discussão de temas relevantes e articulaçãode ações conjuntas e de incentivo ao voluntariado, em especial em comunidadesde baixa renda”, informa a coordenadora dessa iniciativa Sarita Berson.Paulo Gonçalves, da Eletronuclear, conheceu o COEP em 2003, mesmoano em que foi criada a Rede Mobilizadores. “Tomei contato com o COEP,quando assumi o cargo de assessor de responsabilidade socioambiental da Eletronuclear.Após as primeiras reuniões tornei-me um entusiasta pelas atividadesdo nosso COEP. A maneira simples de atuar é a característica marcante daatuação do COEP”. Para Paulo, “a Rede Mobilizadores veio oficializar e fortalecera atividade de voluntariado, que sempre foi uma atividade isolada e semorientação. A iniciativa teve um impacto muito positivo e incentivou as empresasa liberarem os seus empregados para a realização dessas atividades”.Maria Inês, secretária executiva do COEP Macaé, no Rio de Janeiro, tambémé entusiasta da Rede Mobilizadores, mas não deixa de apontar qual a dificuldadea ser superada: “O engajamento de novos mobilizadores. Por isso,estamos agendando visitas a escolas, cursinhos e faculdades para ampliarmosessa adesão por meio dos estudantes”.Mamona, energia e cidadaniaSeguindo a mesma metodologiados projetos ligados à cultura doalgodão, o projeto Mamona, Energiae Cidadania está voltado para aprodução com base na agriculturafamiliar. Iniciado na comunidadede Cacimba, em Anísio Abreu, oprojeto foi expandido, em 2006,para as comunidades Boa Vista,no município de Jurema; Solidão,© Marcelo ValleO projeto Mamona, Ener gia e Cidadania é voltadoà agricultura familiar


386 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008em São Braz do Piauí; e Quixó, em São Raimundo Nonato. Em 2007, foi a vezdas comunidades de Baixa do Morro e Pão de Açúcar, nas cidades de Fartura doPiauí e Várzea Branca, respectivamente. Todas ficam no sul do estado do Piauí.Francisco de Brito Melo, pesquisador da Embrapa Meio-Norte, está à frenteda parte técnica do projeto desde o início: “Essa iniciativa surgiu da necessidadede levar uma oportunidade de geração de renda para aquele públicoresidente no semi-árido nordestino,onde existem poucas oportunidadesde ocupação de formarentável e sustentável. A mamonae o feijão-caupi foram apenasa bandeira principal, pois outrasatividades foram desenvolvidascom a participação das pessoasque residem nas comunidades doCOEP no Piauí. Podemos citartambém as capacitações formaiscom sistemas de produção de culturaspraticadas na região, os importantesintercâmbios oportunizadospelo COEP Nacional eos telecentros de informática”.O envolvimento de Brito como COEP revela bem o perfil daspessoas que se engajam nos projetose iniciativas da rede: “A vontadede servir ao próximo de formavoluntária foi a maneira queencontrei de retribuir os gastospúblicos realizados com a minhaformação educacional e profis-O projeto foi expandido para as comunidades Boa Vista, Solidão e Quixó. Em 2007, foipara Baixa do Morro e Pão de Açúcar. Todas no sul do estado do Piauí© Marcelo Valle


vale a pena acreditar | 387sional”. Para ele, “a principal dificuldade foi começar, ou seja, as pessoas nãoacreditavam mais em projetos, programas, instituições e técnicos. As primeirasreuniões foram muito difíceis, pouca gente, muita resistência em aceitar qualquersugestão, falta de participação de forma generalizada.COEP municipaisEm 2003, surgiram os primeiros COEP municipais, dando ainda mais densidadeà rede de mobilização. COEP Ji-Paraná e COEP Ouro Preto, ambos emRondônia, e COEP Foz do Iguaçu, no Paraná, foram os precursores dessa novaestratégia. “Como toda a rede, os COEP municipais estão voltados para a criaçãode projetos de referência que possam ser replicados e ampliados em outrascomunidades e para o incentivo à formulação de parcerias em ações inovadorasno combate à fome”, garante André Spitz. “A criação dos COEP municipaisveio atender a uma demanda de vários municípios que gostariam de ver replicadoo trabalho do COEP em sua localidade”, complementa Amélia Medeiros,do COEP Nacional. Atualmente, são 22 COEP municipais.Ainda segundo Amélia Medeiros, o surgimento dos COEP municipais tevecaracterísticas bem diferentes da criação dos COEP estaduais. Os COEP municipaisforam criados a partir da ação de parceiros que se envolveram previamentecom comunidades: “De início, é escolhida uma comunidade e uma ação.Algumas empresas se responsabilizaram pela articulação necessária para darlegitimidade àquele COEP municipal. Então, ao nascer, o COEP municipaltem sempre uma ação concreta para realizar”.Essa metodologia, conforme relata a secretária executiva adjunta do COEPNacional, Amélia Medeiros, surgiu inspirada na experiência que o COEP e aFiocruz desenvolveram em 2001 em Manguinhos: “Foi a primeira vez que asorganizações se articularam previamente para trabalhar em uma determinadacomunidade, em um território específico. Deu tão certo que acabou virandouma forma de ação da Rede COEP”, relembra Amélia Medeiros.


388 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Aurino Valois Junior é outro que se empenha para que o COEP tenha impactotambém nessa esfera local: “O que está ao meu alcance tem sido feito paraincentivar a instalação de COEP municipais. Estimulo bastante a Conab paraque ela também participe no âmbito municipal”, diz o representante da empresano COEP Nacional. Elizabeth Fonseca, do Incra, também acredita nessa formade atuação do COEP: “Procuro estimular que cada uma das superintendênciasregionais e unidades avançadas do Incra se engaje nos COEP estaduais e municipais.E posso dizer que os resultados têm sido positivos”, afirma.Luís César Vieira Tavares, funcionário da Embrapa e secretário executivodo COEP de Londrina, no Paraná, já participava de ações sociais promovidaspela empresa, mas aceitou o desafio de criar um COEP local. “Fui estimuladoa participar no COEP municipal de Londrina, no Paraná, como secretárioexecutivo, por meio do convite da nossa amiga Conceição Contin, uma grandeincentivadora e mobilizadora do COEP”, recorda.Mas parece que não foi apenas o COEP de Londrina que contou com oincentivo de Conceição Contin. “Contribuí para a criação dos COEP estaduaisdo Maranhão, da Paraíba, de Minas Gerais e do Amazonas. Quanto aos COEPmunicipais, minha contribuição estendeu-se aos seguintes municípios: Foz doIguaçu, Ponta Grossa, Londrina e Ivaiporã, no Paraná. Em Santa Catarina, fuiresponsável pela criação dos COEP municipais de Joinville, Itajaí e Blumenau”,destaca a secretária executiva do COEP Paraná.“Muitos dirigentes das organizações associadas ao COEP Nacional têmestimulado gerentes regionais para a criação e o fortalecimento do COEP emâmbito municipal. Destaco, entre esses, o Silvio Crestana, da Embrapa; RolfHackbart, do Incra; Carlos Henrique Almeida Custódio, dos Correios; MarcosVinicius Ferreira Mazoni, do Serpro; Lino Roque Camargo Kieling, da Dataprev;Luiz Oswaldo Sant’Iago Moreira de Souza, do Banco do Brasil; Wagner Rossi,da Conab; e José Pedro Rodrigues de Oliveira, ex-presidente de Furnas”, afirmaAmélia Medeiros.Valquíria Andrade, funcionária de Furnas e secretária executiva do COEPde São José da Barra, em Minas Gerais, criado em 2006, revela que os desafios


vale a pena acreditar | 389são grandes. “Por ser uma cidade pequena, temos poucos parceiros e, com poucosrecursos, fica difícil fazer algumas atividades. Apenas duas ou três associadascolaboram com recursos, as outras colaboram com voluntários. Por exemplo,meu tempo disponível para buscar mais recursos e mobilizar mais organizaçõese pessoas é muito curto, pois tenho três outras funções na minha organização”,explica. “Nosso maior desafio tem sido o projeto de desenvolvimento comunitário”,enfatiza Valquíria.Leila Aparecida, também funcionária de Furnas, é a secretária executiva doCOEP Vale Histórico, que engloba as cidades Cachoeira Paulista, Lorena eCruzeiro, em São Paulo: “A partir de 2005, como mobilizadora na área de responsabilidadesocial, senti-me estimulada a participar de trabalhos na área social,por meio da elaboração de projetos focados na melhoria da qualidade de vidadas comunidades do entorno, tendo como vertente a promoção do desenvolvimentona área da educação, saúde, cidadania, direitos, trabalho e renda. Eu meapaixonei pelo trabalho voluntário e me encantei com a oportunidade de fazera diferença”.


390 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 20082004Apoio aos direitos humanos6 Erradicar a extrema pobrezae a fome; atingir oensino básico universal;promover a igualdade entreos sexos e a autonomiadas mulheres; reduzir amortalidade infantil; melhorara saúde materna;combater o HIV/Aids, amalária e outras doenças;garantir a sustentabilidadeambiental; e estabelecer aparceria mundial para odesenvolvimento.Tal como nos programas Fome Zero e Primeiro Emprego, o COEP tambémconvocou suas associadas para apoiar as ações da Secretaria Especial de DireitosHumanos (SEDH), em especial às voltadas aos direitos da criança e do(a) adolescente.Como resultado dessa mobilização, foram apresentadas 164 iniciativasem prol do fortalecimento dos direitos humanos no Brasil. “Foi uma respostamuito positiva. Cada associada desenvolveu um plano de ação para ser somadoàs iniciativas da SEDH. Sistematizamos as propostas e entregamos ao entãosecretário Nilmário Miranda”, informa Amélia Medeiros, secretária executivaadjunta do COEP Nacional.Também em 2004, o COEP participou da criação do Movimento Nacional pelaCidadania e Solidariedade, uma iniciativa formada por instituições sociais, organizaçõesgovernamentais e não-governamentais, empresas e sociedade, que buscaconscientizar e mobilizar governos e sociedade civil em torno dos Oito Objetivosde Desenvolvimento do Milênio (ODMs). 6 Gleyse Peiter, secretária executiva doCOEP Nacional, ressalta: “Com a certeza da importância da mobilização de pessoasem uma rede de solidariedade mundial, no sentido de incorporarem o compromissosocial à cultura organizacional, o COEP colocou sua extensa bagagem acumulada aserviço de um movimento que se amplia no mundo: o estímulo às ações afirmativasno combate às causas estruturais da pobreza”. Foi mais uma oportunidade dearticular a capacidade de mobilização do COEP com o engajamento em ações quecoincidem com os valores e ideais da rede. Uma das formas encontradas para issofoi propor que as entidades associadas ao COEP realizassem as atividades da SemanaNacional de Mobilização pela Vida voltadas aos temas dos ODMs.Vercidino Albarello, coordenador de responsabilidade social do Banco Regionalde Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE) e secretário executivo do


vale a pena acreditar | 391COEP Rio Grande do Sul, logo viu que essa era uma oportunidade que não poderiaser desperdiçada. E foi assim que surgiu o Festival de Música do COEP: “Nossoobjetivo foi levar ao conhecimento de toda a rede escolar a existência dos ODMs,estimular a discussão a respeito deles e provocar que cada aluno descubrisse o seujeito de mudar mundo a partir de gestos simples e singelos, no seu ambiente”.Festival de músicaPara levar a idéia adiante, o secretário executivo foi atrás de parcerias: “Buscamosa Secretaria Estadual de Educação, para que a rede escolar estadual seinserisse, e ela prontamente aderiu. Entramos em contato com o Sindicato dosEstabelecimentos do Ensino Privado no Estado do Rio Grande do Sul, para ainserção das escolas particulares, e também tivemos uma imediata acolhida ecolaboração. Em relação às escolas da rede municipal, tivemos a colaboração daFederação das Associações de Municípiosdo estado (Famurs), quetambém abriu a oportunidade defazermos o contato com as SecretariasMunicipais de Educação”.Ainda assim, Vercidino Albarellonão se deu por satisfeito. “Entendemosque havia a necessidade de apoiadores para que se trabalhasse o assunto nasbases. Uma verdadeira rede se organizou, e cada entidade ajudou em seu âmbito deatuação: Sistema de Crédito Cooperativado (Sicredi), Banco do Brasil, InstitutoBrasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Caixa Econômica Federal, BRDE,Associação Rio-grandense de Empreendimentos de Assistência Técnica e ExtensãoRural / Associação Sulina de Crédito e Assistência Rural (Emater/Ascar). Essasentidades espalharam a notícia e visitaram secretarias e escolas estimulando a participação.Buscamos a participação da agência de publicidade Supernova, que produziue nos doou o material publicitário. O mutirão estava montado. E a participaçãoBuscamos a participação da agência depublicidade Supernova, que doou o materialpublicitário. O mutirão estava montado


392 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008foi satisfatória, desde o primeiro, aumentando a cada ano. Um grupo de colaboradoresformado por maestros e professores de música selecionou as 20 melhorescanções enviadas para participarem do festival, que ocorreu no Teatro Dante Barone,da Assembléia Gaúcha. Outros envolvimentos ainda eram necessários, como opatrocínio da premiação, que é dada às três primeiras escolas e aos seus respectivosalunos, à melhor letra, ao melhor intérprete, à torcida mais vibrante. Também houvelanche para todos os participantes, transporte das escolas participantes, gravaçãodo CD e do DVD do evento, que foram distribuídos gratuitamente a todos. Hoje,as escolas esperam pela realização do Festival de Música do COEP”, orgulha-se.Outro COEP que realiza o Festival de Música é o de Pelotas, de âmbito municipal.Segundo Diná Bandeira, secretária executiva do COEP Pelotas, a iniciativatem gerado “a adesão dos professores e de diretores de várias escolas domunicípio de Pelotas, a mobilização de toda a comunidade escolar e o planejamentodos próximos festivais”. Para ela, essa proposta de parceira com as escolasé o grande destaque da ação do COEP. “Nosso COEP foi criado em 2006. Em2007, realizamos o 1º Festival de Música. E foi um sucesso”, anima-se.© Arquivo COEPO Festival de Música é uma das ações mais replicadas pelos COEP estaduais e municipais. Já houve ediçõesno Distrito Federal e nos seguintes estados: Acre, Amapá, Amazonas, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão,Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, RioGrande do Sul, Rondônia, Santa Catarina, São Paulo, Sergipe e Tocantins. E também foi realizado nas cidadesSão José da Barra e Poços de Caldas, em Minas Gerais; Tucuruí, no Pará; Petrolina, em Pernambuco; Foz doIguaçu e Ivaiporã, no Paraná; Angra dos Reis, Campos dos Goytacazes e Macaé, no Rio de Janeiro; Pelotas,no Rio Grande do Sul; e nas regiões Alto Tiête e Vale Histórico, em São Paulo


vale a pena acreditar | 393Desenvolvimento comunitárioOs Objetivos de Desenvolvimento do Milênio também serviram de inspiraçãopara o projeto Desenvolvimento Comunitário, que tem ações integradas voltadasà melhoria da qualidade de vida das comunidades envolvidas. Um relatosobre a iniciativa é feito por Rita de Cássia, secretária executiva do COEP doEspírito Santo: “Em 2004, o COEP se compromete com o pacto social deimplantação dos ODMs por meio do desenvolvimento de um projeto de desenvolvimentocomunitário em cada estadodo país. Aqui, no Espírito Santo,partimos da experiência que já tínhamoscom a Comunidade de TerraVermelha. Num primeiro momento,foram realizadas reuniões, pesquisase seminários onde a comunidadepode apresentar suas demandas aomesmo tempo em que as associadasao COEP Espírito Santo apresentaram alternativas de atuação que vão ao encontrodas necessidades constatadas. A proposta do projeto se apresenta comoum compromisso das associadas que identificaram na Comunidade de TerraVermelha formas de atuação tendo como eixo principal o Pacto do Milênio”.Segundo a secretária executiva do COEP Espírito Santo, “o impacto naimplementação na Comunidade de Terra Vermelha, ocorreu de forma positiva,pois houve o envolvimento da representação comunitária, que possibilitouo envolvimento das pessoas das comunidades. Elas sentiram a oportunidadereal que se daria com essa parceria das organizações associadas ao COEP.”Atualmente, a comunidade possui um grupo gestor que atua com uma redesocial, composta por 66 entidades, inclusive o COEP Espírito Santo. “Hoje, acomunidade sabe lutar por seus direitos e buscar solução para seus problemas”,garante Rita.Os ODMs serviram de inspiração para oprojeto Desenvolvimento Comunitário, quetem ações volta das à melhoria da qualidadede vida das comunidades envolvidas


394 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Saiba maisA experiência adquirida na implementação de projetosestruturantes em comunidades de baixa renda,ao longo dos 15 anos da trajetória do COEP, levouà criação de uma metodologia de desenvolvimentocomunitário própria, que tem por base um processoparticipativo com moradores e moradoras, o fortalecimentoe organização das comunidades e a divisãode responsabilidades, envolvendo um númeromaior de pessoas, organizações, instituições públicase privadas na implantação dos projetos.A partir de 2004, as iniciativas de desenvolvimentocomunitário têm sido desenvolvidas tendocomo eixo os Oito Objetivos de Desenvolvimentodo Milênio. “Para atingir esses objetivos concentramosnossos esforços em um dado território,para mobilização das associadas e outras instituiçõespara a formação de parcerias, de modo a somaresforços e viabilizar o atendimento às demandasdas comunidades, possibilitando a ampliação dasiniciativas e a implantação de políticas públicas nolocal”, explica Gleyse Peiter, secretária executivado COEP Nacional. O objetivo é, ainda, promovero protagonismo dos diferentes atores da comunidadena busca de um desenvolvimento sustentávelnessas localidades.Seminário internacionalTambém em 2004 o COEP procurou estreitar laços com redes similares de outrospaíses. Prova disso foi a realização de seu primeiro seminário internacional:Gerenciamento de Redes para o Desenvolvimento Comunitário. Ao consolidarvínculos internacionais com redes e organizações com interesses comuns, o seminárioofereceu aos participantes um acesso a políticas e práticas sobre desenvolvimentocomunitário, bem como um fórum de debates que permitiu a troca deidéias e experiências sobre a criação e o fortalecimento de redes para promover odesenvolvimento comunitário local.O encontro internacional foi realizado em Maceió, de 29 de março a 2 deabril, e reuniu 230 participantes, entre eles(as) 25 convidados(as) internacionais.Representantes de Angola, Bolívia, Peru, Chile, Costa Rica, El Salvador, África


vale a pena acreditar | 395do Sul, Gana, Holanda, Inglaterra e Canadá compartilharam suas experiênciasno desenvolvimento de projetos sociais em redes com outras entidades brasileiras,como Articulação no Semi-Árido Brasileiro (ASA), Conferência Nacionaldos Bispos do Brasil (CNBB), Instituto Brasileiro de Análises Sociais eEconômicas (Ibase), Visão Mundial, membros do COEP nacional e de suasesferas estaduais e municipais, além de representantes técnicos(as) de empresasassociadas ao COEP.Segundo Gleyse Peiter, secretária executiva do COEP, “os convidados internacionais,em suas exposições, deixaram claro que o empobrecimento dapopulação e a exclusão social são fenômenos mundiais que afetam países ricose pobres”. Gleyse também ressaltou que as formas de enfrentar esse modelo dedesenvolvimento gerador de desigualdades têm sido semelhantes nos diversospaíses presentes ao seminário. “As redes sociais de alguns dos 11 países presentessão espaços de aprendizagem e atuam tendo por princípio a promoção dajustiça social, da cooperação e do respeito à diversidade. Em geral, todas sãonorteadas por valores como ética, autonomia, transparência, inovação e capacidadede mudança, usando as tecnologias de comunicação como instrumentode atuação e de manutenção de sua coesão”, afirma Gleyse.Acompanhamento e articulaçãoTambém em 2004, nos meses de junho, setembro e outubro, o COEP promoveuo curso de extensão universitária Elaboração, Acompanhamento e Articulaçãoem Projetos Sociais: Elementos para a Atuação de Voluntários e Mobilizadores.Ministrado pelo Laboratório de Tecnologia e Desenvolvimento Social(LTDS) do Programa de Engenharia de Produção da Coppe/<strong>UFRJ</strong>, o cursoutilizou recursos de educação a distância para o desenvolvimento de suas atividadese priorizou a interação professor(a)–aluno(a) por meio de fórum de discussãona web. Segundo Sarita Berson, o objetivo era qualificar um número maiorde pessoas para a implementação de projetos sociais. “O curso proporcionou


396 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008capacitação em metodologias voltadas para o planejamento e a implementaçãode iniciativas sociais, conjugando uma reflexão sobre fundamentos ético valorativosda prática social”, explica.Energia e cidadaniaRealizado em setembro de 2004, o seminário Energia Promovendo Cidadania,uma iniciativa do COEP em parceria com o apoio da Eletrobras e de Furnas,foi o primeiro evento desse tipo a reunir as empresas do setor de energia elétricapara discutir questões de responsabilidade social e apresentar projetossociais de sucesso implantados por essas empresas em todo o país. Participaram70 empresas brasileiras, públicas e privadas, 30 delas pertencentes ao setorelétrico. Foram apresentados 22 projetos sociais em andamento.Segundo Gleyse Peiter, secretária executiva do COEP Nacional, o encontrofoi mais uma inovação nesses 15 anos de atuação. “Foi a primeira vez em queo tema de chamada para os trabalhos que seriam apresentados no seminário foivoltado a projetos sociais. Normalmente, um seminário do setor elétrico temcomo tema assuntos técnicos, como manutenção e transmissão.”O resultado dessa ousadia não podia ser mais positivo. “Tivemos um númerosurpreendente de trabalhos inscritos, muitos tratando do tema do voluntariado.O COEP montou uma comissão para avaliar cada um deles. Foi umaexperiência inédita e até hoje única”, ressalta Gleyse.


vale a pena acreditar | 3972005Comunidades COEPEm 2005, surgiram os COEP nas cidades de Dourados, no Mato Grosso do Sul;São José, em Santa Catarina; Macaé e Campos, no Rio de Janeiro. No mesmoano, a proposta de desenvolvimento comunitário iniciada em 2004 aperfeiçoou-see transformou-se no projeto Comunidades COEP. O objetivo do projeto éComunidades COEP Semi-ÁridoOutro resultado da implementação do processo dedesenvolvimento comunitário criado pelo COEPfoi a formação da Rede Comunidades COEPSemi-Árido. “No semi-árido nordestino, o COEPNacional vem impulsionando a criação da RedeComunidades por meio da implementação de projetosque capacitem agricultores familiares da regiãopara uma melhor convivência com a seca. Os esforçossempre foram para introduzir no cotidiano dasfamílias práticas e técnicas adequadas ao semi-árido,além de reintroduzir culturas que estavam praticamenteextintas na região, como algodão e mamona”,ressalta Marcos Carmona, coordenador do programaComunidades Semi-Árido.A iniciativa abrange atualmente 45 comunidadesem sete estados: Pernambuco, Paraíba, RioGrande do Norte, Sergipe, Alagoas, Ceará e Piauí.Como resultados, destacam-se o resgate da culturado algodão e da mamona, a implantação detelecentros comunitários de informática e a implantaçãode viveiros de mudas.Para André Spitz, o apoio das universidadesdo semi-árido e da Secretaria de DesenvolvimentoRural do Ministério da Agricultura, Pecuária eAbastecimento, assim como dos parceiros Finep,CNPq, Chesf, Embrapa e Eletrobras, tem sidofundamental para o sucesso do projeto: “Em particular,também ressalto o apoio da Presidên ciada República, por meio de seu chefe de gabi neteGilberto de Carvalho, e do ministro de Ci ência eTecnologia, Sergio Rezende.


398 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008estabelecer parcerias entre comunidades e entidades da sociedade civil parapromover o desenvolvimento humano e socioeconômico, garantindo, porém, aparticipação ativa da comunidade em todo o processo. “Nessa proposta, todosos COEP estaduais e municipais passam a trabalhar com pelo menos uma comunidade.Os principais resultados para as comunidades são, além do fortalecimentoda organização comunitária, a inclusão econômica, social e política de seusmoradores. Para as entidades parceiras, os resultados são a construção de umaagenda alternativa e o exercício mais amplo de sua responsabilidade social. Paraas pessoas, de um modo geral, a atuação em projetos de forma organizada ecoletiva possibilita aumentar o seu grau de participação e de exercício da cidadania”,analisa André Spitz.‘‘Em 2008, com resultado de um processo significativo de mobilização deorganizações e pessoas e de articulação de parcerias, a Rede já inclui cerca de70 comunidades distribuídas em 26 estados brasileiros e no Distrito Federal,além das 43 comunidades, de sete estados, do semi-árido nordestino”, informaSarita Berson, do COEP Nacional.Universidades cidadãsAinda relacionado a essa nova empreitada, o COEP intensifica sua parceria cominstituições de ensino, dando início a outro projeto: Universidades Cidadãs. Osobjetivos são incentivar a participação das universidades públicas na implantaçãode iniciativas de desenvolvimento comunitário, promover a melhoria da qualidadede vida da população de baixa renda e gerar oportunidades de renda. Seis universidadesparticipam do projeto: Universidade Federal do Piauí (UFPI), UniversidadeFederal Rural de Pernambuco (UFRPE), Universidade Federal de Campina Grande(UFCG), Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), UniversidadeFederal de Sergipe (UFS) e Universidade Regional do Cariri. Professores(as) ealunos(as) atuam em comunidades do semi-árido nordestino, realizando diagnósticosde demandas e potencialidades, ministrando capacitações e assessorando


vale a pena acreditar | 399associações e grupos produtivos na implantação de suas atividades de geração derenda. As atividades do projeto são realizadas em sete estados do semi-árido nordestino:Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Sergipe, Alagoas, Ceará e Piauí.Guilherme Soares, engenheiro agrônomo da UFRPE e professor da Faculdadede Ciências Aplicadas de Limoeiro, relata o histórico dessa empreitada: “A concepçãodesse projeto ocorreu em função da necessidade de ampliar o alcance das açõesdo COEP nas comunidades, em relação aos segmentos sociais das mulheres ejovens. Até então, o COEP desenvolvia ações muito voltadas para os agricultores,no cultivo do algodão, criação de animaisetc. A partir da percepção de quehavia uma lacuna no apoio a tais segmentos,vislumbrou-se a perspectivade realizar projetos que focassem, especificamente,as iniciativas comunitáriasde organização de grupos locaisem outras atividades que não somente agricultura, tais como: corte e costura, informática,artesanato, pintura, entre outros. Então, concebeu-se o projeto UniversidadesCidadãs e saímos à busca de instituições parceiras, visitando as universidadesnos estados em que o COEP desenvolvia ações em comunidades. Pessoalmente,visitei três universidades e costuramos uma articulação institucional para viabilizara proposta. Hoje, estão engajadas seis universidades, das quais cinco são federais(UFRPE, UFRN, UFPI, UFS e UFCG) e uma estadual (UniversidadeRegional do Cariri, no Ceará). Essas universidades agem na linha da formação(capacitação) em diferentes atividades, apontadas em diagnóstico de demandasrealizado no início de 2006. Hoje, depois de dois anos, o projeto passa por reformulaçõesde sua natureza conceitual, de sustentabilidade financeira e institucional.É importante ainda destacar a missão desse projeto: atuar na formação, de umlado, de estudantes de graduação e pós-graduação da universidade, dando-lhesoportunidades de vivenciar a realidade regional, e, de outro lado, interagir com asociedade, por meio das comunidades, para promover o intercâmbio de experiênciase conhecimento entre universidade e comunidade”.O projeto é realizado em sete estados dosemi-árido: Pernambuco, Paraíba, Rio Grandedo Norte, Sergipe, Alagoas, Ceará e Piauí


400 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008COEP Campos dos Goytacazes (RJ)Em dezembro de 2005, foi oficialmente criadoo COEP Campos dos Goytacazes. “OCOEP Campos, no Norte Fluminense, surgiua partir de reuniões entre empresas eorganizações do município que tinham comoobjetivo promover dignidade e sustentabilidadeem uma comunidade que apresentassevários problemas sociais”, afirma AlexandreRocha, funcionário de Furnas e secretárioexecutivo do COEP Campos.Segundo ele, “Parque Aldeia é a comunidadede atuação escolhida, situada nazona urbana e com aproximadamente 8 milmoradores. Os problemas são os mais comunsde uma comunidade periférica de baixa renda:desemprego, analfabetismo, carências dosserviços públicos, saneamento básico, iluminaçãoe serviços médicos”. Após o contato coma população local e seus representantes, oCOEP Campos promoveu atividades queajudavam na integração com a comunidade,propiciando também para o COEP Camposum conhecimento aprofundado daquela realidade.Entre as atividades, destacam-se: recreaçãoinfantil, palestras sobre prevenção dedoenças (DST/Aids) e dicas de saúde, distribuiçãode preservativos, bate-papo comadolescentes sobre sexualidade, oficina desucatas com as crianças e informações paraas mães sobre higiene doméstica e prevençãode doenças.Posteriormente, foi realizado o Dia daComunidade COEP. Entre os objetivos, encontraros(as) líderes da comunidade, discutirsobre os principais problemas, levantar aspotencialidades e demandas da comunidadee expor propostas de soluções participativasque pudessem ser implantadas em médioprazo. “Com os dados em mãos, realizou-seo Seminário com os Dirigentes, apresentandoa agenda de atividades COEP, expondo ediscutindo os problemas apresentados pelacomunidade, estudando a viabilidade de açõese projetos, bem como atribuindo funçõespara cada representante técnico”, relata AlexandreRocha.Como atividade de maior envolvimentodos(as) jovens e adolescentes, o COEP Camposrealiza o projeto O COEP e a Escola.Também realiza o Festival de Música, incentivandoalunos e alunas a explorarem musicalmenteo tema “Oito jeitos de mudar omundo”.


vale a pena acreditar | 401Estratégias de comunicaçãoAinda em 2005, o COEP lançou o Informativo Notícias COEP e a COEP TeVê– duas estratégias de comunicação voltadas a manter a sintonia da rede e buscarnovas parcerias. “A proposta é, por meio de parcerias e realização própria devídeos, inclusive por parte dos moradores das comunidades, construir um acervocoletivo na área social. Espera-se que os principais beneficiários da COEPTeVê sejam as comunidades, os participantes do COEP – tanto em âmbitonacional como estadual e municipal –, os mobilizadores, bem como os diferentesusuários da internet”, afirma Sarita Berson, coordenadora da COEP TeVê.A COEP TeVê também é mais uma forma de democratizar o acesso a informaçõesque circulam na rede. Ajuda também a manter os(as) secretários(as)executivos(as) em dia com a “pauta do COEP”. Um bom exemplo vem da regiãoNorte do país. Milcíades Heitor de Abreu Pardo, analista em gestão depessoas da Embrapa, é secretário executivodo COEP Acre desde 2005: “Sempre vi apossibilidade de fazer parte de uma granderede de relacionamentos, envolvendo pessoas,Saiba maiscomunidades e instituições como algo bom.A COEP TeVê, lançada em 2005, é um instrumentocriado pelo COEP para apoiar e comple-A forma como o COEP Nacional vinha seaprimorando na realização de um trabalhomentar o conteúdo de outros sites da Rede. Elasocial contínuo e benéfico em comunidadesveicula, por meio da internet, ações de caráter informativo,de educação cidadã e de mobilizaçãocarentes acendeu em mim o desejo de abraçara causa como cidadão preocupado com osocial sobre temas diversos na área social. Divulga,bem-estar coletivo. Então, eu me cadastreiassim, diferentes iniciativas desenvolvidas peloCOEP e por outras instituições, além de entrevistascom especialistas, abordando assuntos decomo mobilizador do COEP em 2005, semalardear e criar muita expectativa com a causasocial, pois já sabia que o trabalho era árduointeresse para os integrantes da Rede.e que não faltariam demandas para agirmosVisite .como agentes positivos nesse processo”.


402 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008COEP Macaé (RJ)Criado em setembro de 2005, o COEP Macaétem como área de atuação o assentamento PrefeitoCelso Daniel, às margens da rodovia AmaralPeixoto. Nele residem 188 famílias. Entre as suasprincipais conquistas estão a implantação do NúcleoComunitário da Defesa Civil (Nudec), formadopor pessoas que, organizadas em um distrito,bairro, rua, edifício, associação comunitáriae/ou entidade, participam como voluntárias emdiversas atividades. “O primeiro núcleo foi implantadono assentamento e formou 36 agentes comunitários.Todos foram treinados para tomar a primeirainiciativa em caso de acidentes domésticos,incêndios florestais e primeiros socorros até a chegadados órgãos competentes”, informa a secretáriaexecutiva Maria Inês Barbosa da Silva, funcionáriada Petrobras.O objetivo da iniciativa é a mudança culturale comportamental, aumentando o senso de percepçãode risco e contribuindo para formar comunidadesunidas, protegidas e apoiadas, preparadaspara atuar de forma proativa e coordenada, e ainteração com a defesa civil municipal. Ainda segundoa secretária executiva do COEP Macaé,durante a implantação do Nudec, os(as) técnicos(as)envolvidos(as) detectaram a necessidade de açõesefetivas relacionadas ao recolhimento de lixo ereciclagem. “Entramos em contato com a Secretariade Serviços Públicos e articulamos uma parceriacom uma empresa, cujo representante, proferiupalestras de conscientização da forma dereciclagem do lixo para transformá-lo em adubopara peixe, galinha e porcos. Também, após essecontato, foram colocadas três caçambas para recolhimentodo lixo duas vezes por semana”, detalhaMaria Inês.Outro destaque do COEP Macaé é a transformaçãode uma sede de fazenda abandonada emum centro comunitário. “A comunidade MariaAmália, que também faz parte do assentamentoPrefeito Celso Daniel, está localizada na BR 101,distante cinco quilômetros da sede da fazendaque estava abandonada”, explica Maria Inês. Articuladopelo COEP Macaé, foi iniciado um mutirãoenvolvendo 25 moradores(as) da comunidade.Após a conclusão das obras, o centro será capazde atender as 50 famílias que moram no local,com atendimento médico, odontológico, alfabetizaçãode pessoas adultas, bibliotecas, oficinas,palestras e treinamentos.


vale a pena acreditar | 4032006Fortalecimento institucionalEm 2006, para fortalecer a participação do corpo funcional de suas empresas associadas,o COEP Nacional buscou uma maneira de oficializar essa relação. AméliaMedeiros, secretária executiva adjunta do COEP Nacional, explica: “Por conta danecessidade da criação de instrumentos formais nessa relação, o COEP Nacionalfez um amplo movimento de mobilização das suas associadas. Em decorrênciadesse esforço, 15 associadas formalizaram normas sobre sua participação no COEP.Tudo feito absolutamente em consonância com as atribuições contidas no estatutoe no regulamento interno do Comitê e considerando que essa participação éuma importante estratégia para reduzir a pobreza e promover a cidadania”.Gleyse Peiter complementa: “Tudo começou com o Banco do Brasil, parceirodo COEP desde 1993. O banco criou, em maio de 2006, uma norma pararegular o relacionamento da instituição e de seus funcionários com o Comitê.O processo teve continuidade com a criação de normas por outras entidadesassociadas, cada uma levando em conta suas características e especificidades:BRDE, CGTEE, Codevasf, Conab, Correios, Dataprev, Eletronorte, Embra pa,Furnas, Ibama, Incra, INSS, INT e Serpro”.Segundo Marta Krueger, assessora da Diretoria de Relações com Funcionáriose Responsabilidade Socioambiental do Banco do Brasil, a medida ajudoua derrubar o caráter informal com que até então era vista a participação dobanco no COEP: “Confundiam a participação institucional da empresa comvoluntariado. Nos normativos, deixamos bem claro até onde era o envolvimentoinstitucional e a partir de onde era voluntariado. A institucionalização do envolvimentodo BB no COEP derrubou um dos principais argumentos utilizadospelos gerentes: de que não havia nada escrito nos normativos de que eles deveriamautorizar ou incentivar tais ações”.


404 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Ainda de acordo com Marta Krueger, antes disso era comum ouvir explicaçõesquanto à falta de participação de funcionários(as): “Quando eu tentava motivaros funcionários para se envolverem com as iniciativas do COEP, recebia inúmerasjustificativas para as dificuldades que encontravam e até os impediam de participardas ações. Os motivos eram muitos, mas o principal era a não-autorizaçãodas chefias para esse tipo de ação. Eu me sentia impotente, uma vez que esseschefes tinham argumentos fortes para justificar tal atitude. A sensação de frustraçãoera enorme, pois eu não podia interferir no que eles decidiam”.Marta trabalhou durante oito anos na Fundação Banco do Brasil analisando eacompanhando projetos sociais: “A identificação que tive com esse tipo de trabalhoCOEP Angra dos Reis (RJ)Criado em abril de 2006, o COEP Angra dosReis tem, desde então, Maria Ercilia Pereira,funcionária da Eletronuclear, como sua secretáriaexecutiva. “Tivemos a presença de 50 pessoas, entreelas representantes de empresas locais, empresasestatais e privadas e diretores de entidades escolaresda região”, ela explica.No âmbito do projeto de DesenvolvimentoComunitário, o COEP Angra dos Reis atua emparceria com a Eletronuclear e com o Institutode Desenvolvimento da Baía de Ilha Grande naimplementação de uma fazenda marinha paracriação de coquilles Saint-Jacques (vieiras), na IlhaComprida, próxima à central nuclear. “Por meiodessa iniciativa, temos a oportunidade de promovergeração de emprego e renda, referente aomanejo do coquille e também na venda para os restaurantesda região”, destaca Maria Ercilia.Outra iniciativa de destaque é o Aldeia daCidadania, realizado em dezembro de 2007 emJardim Paraíso, no Perequê, em Angra. Forampromovidos os seguintes serviços básicos na áreade saúde: aplicação de flúor e orientação quantoà higiene bucal de crianças de até 12 anos e aferiçãode pressão arterial. Na área da cultura e cidadania,houve recreação infantil, com oficina dedesenho e pintura e demais brincadeiras compula-pula e piscina de bolas. Durante o evento,foram distribuídos lanches, cachorro-quente, águae refrigerantes, para aproximadamente 500 pessoasentre crianças e adultos.


vale a pena acreditar | 405foi tão grande que resolvi aprofundar meusestudos na área e fiz, na Universidade Federaldo Rio de Janeiro (<strong>UFRJ</strong>), uma especializaçãoem Gestão de Iniciativas Sociais.Algum tempo depois, surgiu a oportunidadede exercer um cargo no Banco doBrasil que envolvia o voluntariado da empresae, a partir daí, comecei a participardo COEP Nacional”.Ainda sobre a institucionalização, MartaKrueger explica: “Na época em que resolvemosnormatizar a participação do BBno COEP, a disseminação da cultura deresponsabilidade social na empresa aindaera um grande desafio. Os funcionáriosnas pontas vivem um grande dilema: abusca por resultados para satisfazer osacionistas, pois estamos numa empresa emque o lucro é muito cobrado, e ao mesmotempo a dedicação às ações de responsabilidadesocial. Para motivar a atuação deuma dependência nas ações do COEP,existe uma bonificação que é somada aoseu resultado semestral”. E ressalta: “Essasiniciativas ajudam a quebrar resistênciasà cultura de responsabilidade socioambientalna empresa. Muitos gerentes que consideravama busca do lucro incompatívelcom o desenvolvimento de ações sociaisreviram seus posicionamentos”.COEP Ivaiporã (PR)O COEP Ivaiporã foi criado em junho de 2006, coma adesão de 16 associadas. Sílvia Paulina Vieira deGóes Maciel, de Furnas, é desde então sua secretáriaexecutiva. Entre as atividades de destaque está o Festivalde Música, no qual cerca de 200 pessoas estiverampresentes. Outra iniciativa realizada pelo COEPIvaiporã foi a campanha Natal pela Vida, em 2007.“Foram coletados no comércio local cerca de 400quilos de alimentos, distribuídos a famílias carentes”,informa Sílvia.COEP Londrina (PR)Criado em junho de 2006, o COEP Londrina temLuís César Vieira Tavares, funcionário da Embrapa,como seu secretário executivo. Entre as principais realizaçõesdo COEP Londrina, vale ressaltar a promoçãoda inclusão digital na comunidade, o curso sobre ouso da soja na alimentação, o curso de empreendedornas comunidades (uma parceria com o Sebrae), a capacitaçãodo curso telessalas e os cursos Boas PráticasAgrícolas na Comunidade e Geração de Renda OportunizandoAções Coletivas de Produção.“Nosso desafio é aumentar o trabalho integradoentre telecentro, sala de treinamento, cozinha comunitária,padaria comunitária, biblioteca e as oficinas”,ressalta Luís César.


406 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008COEP São José da Barra (MG)Instalado em julho de 2006, o COEP São José daBarra tem como secretária executiva Valquiria SilvaAndrade, funcionária de Furnas. O foco do trabalhoestá na comunidade Nossa Senhora de Fátima,mais conhecida como Cam-Cam, que tem aproximadamente900 pessoas. Diante da falta de espaçofísico para qualquer tipo de atividade, o COEP SãoJosé da Barra tem se empenhado para a construçãode um centro comunitário. “Para trabalhar com ascrianças e jovens no primeiro momento, depoiscom o restante da comunidade”, explica Valquíria.Ainda sobre o centro comunitário, a secretáriaexecutiva relata: “O terreno foi doado pela prefeitura,mas ainda não temos os recursos para obra. Játemos também a planta da obra, que não fica tãocara. Estou tentando buscar entre os associados oque falta para a realização da obra”.Entre as atividades do COEP São José da Barra,vale ressaltar a realização do Dia da Cidadania, emagosto de 2007. “Com nossas associadas, fizemos váriosatendimentos de saúde, social e entretenimentopara cerca 600 pessoas. Foi um dia muito alegre”,relembra a secretária executiva. Outra mobilizaçãoimportante foi o Festival de Música, que reuniucerca de 450 pessoas. “As duas escolas do municípioparticiparam 100%. O festival foi um momento degrande divulgação do COEP e interação dos alunose comunidade com os Oito Objetivos de Desenvolvimentodo Milênio”, afirma Valquíria.Estratégia de sustentabilidadeNo COEP Nacional, Quirino José de Azevedo Rodrigues representa a Embrapa,uma antiga parceira das ações contra a fome. “O meu interesse mais concretopelo COEP emergiu quando das articulações que Betinho fez com a Embrapapara a produção de alimentos em Goiânia, dando muita visibilidade à luta contraa fome. Na época, o nosso representante técnico em Goiás era o Getúlio e esseacontecimento foi muito difundido dentro da empresa”, relembra, referindo-sea Getúlio Brunes, um dos fundadores do COEP Goiás.Para Quirino, a institucionalização da participação das associadas foi “umainiciativa absolutamente estratégica para dar sustentabilidade e efetividade à


vale a pena acreditar | 407participação das associadas”. Ele também acredita que, com essa medida, “oCOEP passou a fazer parte do dia-a-dia da instituição e caminhos foram sendoabertos para possibilitar ações mais efetivas tanto das instituições como dos seusempregados. Vejo a institucionalização como um processo e como tal tem etapase velocidade próprias de maturação e de abrangência. O mecanismo de comprometimentomúltiplo, das instituições e dos empregados, com as coisas doCOEP, tende a crescer e se fortalecer”.Especificamente na Embrapa, Quirino explica que a efetivação dessa institucionalizaçãofoi dificultada pela dispersão da empresa, que está espalhada portodo o país: “Cada uma de nossas unidades possui características próprias. Épreciso sempre levar em conta as peculiaridades de cada uma delas”. Aindaassim, não há dúvida do efeito positivo gerado: “Maior exposição do COEPdentro da instituição, maior interesse e por parte dos empregados e, especialmente,comprometimento institucional. Concretamente, maior participaçãoda Empresa e de seus empregados na luta contra a fome e a miséria, com maiornúmero de projetos voltados às comunidades de baixa renda ou excluídas assimcomo efetiva contribuição na instalação de COEP municipais, por exemplo”.Hermínia Nepomuceno, representante dos Correios no COEP Nacional,considera que a institucionalização da participação das associadas foi a iniciativade maior destaque ao longo dos 15 anos de ação do COEP: “A institucionalizaçãoda participação das associadas ao COEP permitiu a necessária padronizaçãodos procedimentos até então executados pelas empresas parceiras,fortalecendo a mobilização social”. Para ela, a medida “contribuiu para a disseminaçãodo conceito e a incorporação das práticas de responsabilidade socialpelas diretorias regionais”.Eduardo Peters, da Companhia de Geração Térmica de Energia Elétrica(CGTEE), faz questão de relembrar a relação entre a companhia e o COEP,antes mesmo da institucionalização: “A história recente da CGTEE no COEPiniciou-se em 2003, quando fomos formalmente apresentados em uma reuniãodos conselheiros do COEP, da qual participamos. Como fator facilitador paraa adesão ao COEP, deve-se registrar que a CGTEE é uma empresa do Sistema


408 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Eletrobrás, cuja parceria de suas demais empresas vem desde a fundação doCOEP. Paralelamente, começou-se a desenvolver dentro da companhia a áreade responsabilidade social – até então inexistente na estrutura organizacional,com ações muito pouco expressivas e, de certa forma, bastante paternalistas.Em 2004, foi realizado um conjunto de diretrizes, políticas e normas a fim deinstitucionalizar essa área na CGTEE, que, com certeza, pode se orgulhar deser uma das primeiras empresas a institucionalizar a participação no COEP.No conjunto de normas aprovadas pela diretoria executiva da companhia, aindaem 2004, já constava não somente a adesão, mas também era definida aparticipação da CGTEE em ações do COEP. Tal trabalho culminou no anode 2006, quando efetivamente ocorreu, de forma interna, a regulamentação daparticipação da companhia no COEP”.Para Eduardo Peters, a institucionalização dessa relação foi “um instrumentofacilitador, que possibilitou direcionar estruturas internas de logística ede recursos para o desenvolvimento de ações em parceria com outras empresasassociadas ao COEP”. Quanto aos empecilhos, ressalta: “Dificuldades e riscosainda existem. A institucionalização por si só não é o bastante. Por exemplo, aCGTEE teve recentemente uma reestruturação de pessoas na área de responsabilidadesocial. Tal fato acarretou uma descontinuidade momentânea na participaçãono COEP. Estamos buscando resgatar essa participação por meio daapresentação, da sensibilização e da conscientização da importância da parceiracom o COEP”.Por fim, Eduardo ainda complementa: “Com certeza, a grande dificuldade e,por conseqüência, o desafio constante são dois. Um deles é a multiplicação docomprometimento do maior número de pessoas quanto à necessidade e, principalmente,à importância do trabalho desenvolvido pelo COEP para a sociedade.Outro é a medida que essa parceria pode representar positivamente paraa companhia, refletindo, inclusive, nos indicadores socioambientais, cada vezmais utilizados pelo mercado”.Ricardo Dentino, ex-representante técnico da Dataprev no COEP Nacional,também teve grande envolvimento na estratégia de institucionalização das


vale a pena acreditar | 409COEP Petrolina (PE)Criado em junho de 2006, a partir de umaarticulação da Universidade Federal do Vale doSão Francisco (Univasf ), o COEP Petrolinatem seu foco de trabalho em assentamentosrurais de agricultores(as) cuja terra tenha sidoobtida por meio da reforma agrária. Para LúciaMarisy S. R. de Oliveira, secretária executivado COEP Petrolina e professora da Univasf,“os saberes da academia devem ser colocadosà disposição de toda a coletividade, mas especialmentedaqueles segmentos marginalizadosque não tiveram acesso à cultura letrada. Portanto,ao enfrentarem situações que envolvamcriatividade, informação, domínio de tecnologiapara produzir, apresentam maior dificuldadepara enfrentamento da competitividadena sociedade globalizada”.A área escolhida para o trabalho do COEPPetrolina é o assentamento Mandacaru, ondevivem 70 famílias. “As pessoas, assentadas háoito anos naquele espaço social, continuamsobrevivendo do aluguel da sua mão-de-obrapara fazendeiros vizinhos, ou seja, como diaristasrurais assalariadas, e não como proprietáriasde terra”, enfatiza Lúcia. Em umainvestigação para descobrir as causas dessasituação, foram apontadas a falta de água e apouca terra.Para tentar reverter esse quadro, o COEPPetrolina tem trabalhado temas como cidadania,participação, mutirão, organizaçãocomunitária, associativismo, gestão social eeducação ambiental. Uma das atividades adestacar foi a aquisição de 300 mudas, queestão sendo plantadas pelas crianças e jovensda comunidade.Também está sendo construído um centrode convivência, cujo mutirão foi o resultadode um trabalho coletivo da prefeiturauniversitária do campus da Univasf com empreendedoreslocais. “Os alunos fizeram aplanta da obra, definiram os materiais, calcularamseus custos e discutiram com a comunidadetodas as etapas. Tudo sob supervisão deprofessores das mais variadas áreas, num verdadeiroexercício interdisciplinar, partilhado,coletivizado”, ressalta a secretária executiva.“De todas as experiências do COEP Petrolina,essa foi muito relevante por ter proporcionadoaos atores um intercâmbio de saberes ea ampliação das redes sociais envolvidas comos movimentos populares, cujo resultado foio aprendizado de todos para a solidariedade”,conclui.


410 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008COEP Ponta Grossa (PR)Criado em junho de 2006, o COEP Ponta Grossafoi inicialmente secretariado por Marco Bernardin,do Centro de Ensino Superior dos Campos Gerais(Cesage). Em seguida, o secretário executivo passoua ser Benau Negri, funcionário dos Correios.Desde março de 2007, o COEP Ponta Grossafoca seu trabalho na comunidade Jardim Novo VilaVelha, onde uma escola pública foi escolhida paraser inicialmente beneficiada. “A escola tem problemasde informática. Para que o sistema da redefuncione, é necessário um novo servidor. Entramosem contato com a Receita Federal e solicitamosprodutos apreendidos para vender por meio debazar e, assim, conseguir o dinheiro necessário”,explica Benau.Em abril de 2008, ainda segundo o secretárioexecutivo, a Receita Federal forneceu os produtos,que inicialmente foram vendidos pela associaçãode moradores local num bazar próximo à comunidade:“Fizemos assim para que os moradorespudessem comprar esses produtos com preços módicos,visto que, na praça, são vendidos por preçode duas a três vezes superiores. Esse bazar ocorreuno dia 7 de junho de 2008”. Ainda este ano, osrecursos necessários para o equipamento estarãodisponíveis na associação de moradores, que efetivaráa compra.associadas ao COEP: “Participamos de forma efetiva e colaborativa nos 23 estadosem que a Dataprev atua. Conseguimos sensibilizar e mobilizar alguns órgãosinternos e externos, como algumas unidades do INSS”. Ele acrescenta: “Apesarde a Dataprev ter um histórico de participação nas ações do COEP antes de 2006,foi necessário realizar um trabalho de sensibilização nos órgãos diretivos da empresa,incluindo as unidades localizadas nos estados. A partir de exemplos concretos,a institucionalização da participação da Dataprev no COEP ocorreu emforma de resolução da presidência da empresa, a RS/PR 2.701/2006”.Apesar de ser funcionário da área técnica, Dentino afirma que a mobilizaçãosocial sempre foi algo que despertou sua atenção. Até que houve uma mudançabastante positiva: “A oportunidade apareceu quando passei a atuar na área de


vale a pena acreditar | 411responsabilidade social da minha empresa. Nessa ocasião, conheci a estruturado COEP, as pessoas envolvidas na mobilização e os projetos”.Ainda sobre a formalização da relação entre empresas e o COEP, Dentinoavalia: “Foi a melhor possível, pois os empregados da empresa que já participavamda estrutura formal do COEP se sentiram aliviados. Foram oficialmenteCOEP Pelotas (RS)Instalado em novembro de 2006, o COEP Pelotasfoi fruto de uma articulação promovida pelaEmbrapa, que, desde então, sedia sua secretariaexecutiva, exercida pela funcionária Diná Bandeira.Vila Farroupilha foi o local da cidade escolhidopara ser a Comunidade COEP de Pelotas. “Analisamosos seguintes critérios para seleção dessacomunidade: organização e liderança, acessibilidadee segurança, carência ou aspectos de miserabilidade,estruturas (escola/igreja) e que não estivessecontemplada por projetos de outras organizaçõesou ONGs. A Vila tem, em sua maioria, moradoresdesempregados ou que vivem de subempregos:empregadas domésticas, pedreiros e papeleiros”,explica Diná.“Todas as iniciativas do COEP Pelotas são implantadasutilizando a metodologia de desenvolvimentocomunitário, que tem por base um processoparticipativo com os moradores, o fortalecimento, aorganização da comunidade e a divisão de responsabilidades,para o cidadão ser protagonista deseu próprio crescimento”, complementa Diná.Em 2006, duas atividades mereceram destaque:a audiência pública na Câmara de Vereadorespara comemorar a Semana Nacional de Mobilizaçãopela Vida, em 9 de agosto; e um festival demúsica, em 20 de outubro: “A Escola MunicipalFrancisco Caruccio, de Pelotas, conquistou o primeirolugar no Festival de Música do Estado doRio Grande do Sul, com a música ‘Luz da solidariedade’.Um dos alunos da escola também recebeuo prêmio de melhor intérprete”, orgulha-se a secretáriaexecutiva. Em 2007, houve a apresentação dodiagnóstico socioeconômico da Vila Farroupilha,com apoio do Instituto Técnico de Pesquisa e Assessoria(Itepa) e da Universidade Católica de Pelotas.Foram realizados, ainda, três módulos de semináriosvoltados para representantes técnicos(as),com os seguintes temas: articulação comunitária,políticas públicas para assistência social e gestãode responsabilidade social.


412 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008reconhecidos como membros do COEP”. Ele ainda ressalta uma mudança naprópria Dataprev: “O principal ponto notado, de um modo geral, foi o reconhecimentoe o respeito, por parte do nosso público interno, quanto às questõessociais”.Dedite Souza Jochims, representante técnica do Serpro no COEP, afirma:“A institucionalização da participação das associadas ao COEP trouxe, inequivocamente,resultados positivos e alvissareiros para ambas as partes. Para oCOEP foi bom, pois viu consagrada sua representação nacional e fortalecidaCOEP Vale Histórico (SP)Criado em novembro de 2006, o COEP ValeHistórico iniciou suas atividades com participaçãode 17 associadas. “Começamos mobilizando as váriasentidades das cidades de Cachoeira Paulista,Lorena e Cruzeiro para realizar trabalhos em rede.Para sensibilizá-las a atuar em parceria, iniciamosos trabalhos com a Aldeia da Cidadania. Desenvolvemosainda a oficina Desenvolvimento Territoriale Sustentabilidade, referente às comunidadesdo milênio. Em consenso com as entidadespresentes, foi escolhida a comunidade do bairroSanta Terezinha para participar do Projeto deDesenvolvimento Comunitário”, explica LeilaAparecida Braga de Andrade Amorim, funcionáriade Furnas e secretária executiva do COEPVale Histórico.Tendo como objetivo investir na geração de alternativasde progresso humano por meio do estímuloe articulação de ações em parceria, o COEPVale Histórico também realizou no bairro SantaTerezinha um diagnóstico para levantamento dasnecessidades e potencialidades, no sentido deconstruir um processo de desenvolvimento territorialsustentável em comunidades de baixa renda.A iniciativa O COEP e a Escola CaminhandoJuntos na Construção da Cidadania também contoucom a adesão do COEP Vale Histórico, queconseguiu a participação de 300 alunos da redemunicipal e estadual de ensino da cidade de CachoeiraPaulista. “O trabalho foi positivo em váriosaspectos. Por meio das composições, o aluno expressao que observou no dia-a-dia e torna-se umagente solidário multiplicador, sem contar nas descobertasartísticas que podem ser conferidas nofestival. Houve momentos de muita participação,envolvimento e alegria”, acredita Leila.


vale a pena acreditar | 413sua rede de mobilização. Para as associadas, os ganhos são ainda mais significativos,pois passam a contar com direcionamento, apoio e parceria, além deampliar sua inserção na comunidade”. Quanto aos impactos da institucionalizaçãoem sua empresa, ela ressalta: “Como esse fato é relativamente novo, aindanão temos um ano de novas diretrizes, estamos buscando a conscientização docorpo funcional, por meio da realização de palestras com a participação dossecretários executivos objetivando a disseminação do COEP entre todos osempregados”. Ainda assim, os resultados são apontados por Dedite: “Umamaior conscientização da empresa a respeito de nosso papel no COEP, principalmenteo apoio do diretor-presidente e de toda a diretoria, quando da definiçãoda política de responsabilidade social e cidadania. Nossa maior dificuldadeé não podermos aplicar recursos nos projetos encaminhados, a imposiçãolegal é nosso maior impedimento”.


414 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 20082007Jornada pela CidadaniaA Jornada COEP pela Cidadania surgiu como uma iniciativa de mobilizaçãosocial que visa estimular a atuação integrada de um número maior de pessoasdas organizações associadas ao COEP e dos mobilizadores COEP em açõesvoltadas para a melhoria das condições de vida de comunidades de baixa rendae fortalecer o compromisso social das instituições e pessoas. Seus objetivos são:aprofundar o compromisso das organizações e pessoas com a transformação dasituação de pobreza em comunidades de baixa renda; criar um centro comunitárioem cada uma das comunidades envolvidas na Jornada; fortalecer a mobilizaçãosocial das organizações e das pessoas e o comprometimento com o combateà fome e à miséria e com os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio; incentivara incorporação do compromisso social à cultura das organizações; valorizarmecanismos que favoreçam processos de cooperação (parcerias); e estimularum maior envolvimento das gerências/direções das organizações com a valorizaçãodo trabalho voluntário. Até setembro de2008, havia 2.295 participantes. O endereçoé .“A Jornada pela Cidadania é uma iniciativainovadora de mobilização social, organizadaem ambiente da internet. É uma tecnologiade mobilização social criada pelo COEPa partir de sua experiência de 15 anos em projetos voltados para a melhoria daqualidade de vida de comunidades de baixa renda. Na Jornada, as pessoas se organizamem equipes para atender a diferentes atividades, organizadas em etapas.Ela envolve metodologia de desenvolvimento comunitário, mobilização social,A Jornada COEP pela Cidadania surgecomo uma iniciativa de mobilização socialque visa estimular a atuação integrada deum número maior de pessoas


vale a pena acreditar | 415trabalho voluntário, compromisso social de organizações e pessoas, gestão deredes e comunicação”, explica Amélia Medeiros, secretária executiva adjuntado COEP Nacional.Jornada em números*75 comunidades170 ações desenvolvidas nas comunidades2.295 participantes492 equipes43 locais onde há COEP20 centros comunitários em implementação319 organizações formaram equipes em todo o Brasil(*) Números de agosto de 2007 a julho de 2008.O Instituto Nacional de Tecnologia (INT) está no COEP desde a sua criaçãoem 1993, e Maria Carolina Santos é sua representante desde o ano 2000.“Eu me encantei com a proposta maior do Comitê – mobilizar as entidadesassociadas para o combate à fome e à miséria. Acredito que a forma mais eficazde atuação das entidades aconteça por meio das parcerias, que são o que realmentepermite o desenvolvimento sustentável: parceria entre associadas, representantestécnicos, comunidades, mobilizadores, órgãos públicos, entre outros.Assim, o que mais me motiva a participar do COEP Nacional e estadual é ofato de ser uma Rede de Mobilização Social, o que resulta numa gestão semhierarquia e com a comunicação fluida entre seus participantes. Isso estimulaas diversas parcerias na realização de projetos sociais com o intuito de contribuirpara a diminuição da desigualdade social do Brasil”, ressalta.A representante técnica do INT no COEP Nacional – e também no COEPRio de Janeiro – é uma entusiasta da Jornada COEP pela Cidadania. Ela acreditaque a iniciativa teve papel importante na expansão do número de atividadesvoltadas à melhoria de vida dos moradores e moradoras das comunidades


416 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008COEP, gerando resultados concretos nas localidades onde são realizadas astarefas e propiciando chances reais de transformação social. “Para a população,os resultados já obtidos são a ampliação no número de comunidades atendidase, em cada uma delas, o aumento no número de atividades realizadas. Esseaumento revela o maior envolvimento das entidades, o que está relacionado aomovimento de elevar a responsabilidade social a um valor organizacional.”Mas há também outros resultados que Carolina indica: “A identidade doCOEP foi fortalecida. Por sua atuação, foi reconhecido e legitimado pela sociedade.No INT, em virtude da participação na Jornada e das experiênciasrelacionadas a essa iniciativa, hoje o corpo funcional tem uma compreensãomais clara do que é o COEP e de que forma a instituição está inserida na rede.Essa iniciativa também viabilizou a aproximação de alguns profissionais, possibilitandoo desenvolvimento de outras atividades internas e a elaboração deoutros projetos de inclusão social”.Internamente, também houve mudanças: “O INT estreitou sua relação com oCOEP ao ficar responsável pela criação do troféu para as equipes-destaque daJornada e pelo monitoramento da produção feita por moradores da comunidadedo Juramento, atividades realizadas por profissionais de diversas áreas da Instituição.Como resultado desses acontecimentos, o princípio de responsabilidade social,traduzido em ações, foi fortalecido no INT”, informa Carolina dos Santos.Quirino José de Azevedo Rodrigues, da Embrapa, acredita que os resultadospodem ser ainda mais expressivos: “No nosso ponto de vista, poderia tersido muito melhor. Tivemos boa participação em alguns estados e quase nenhumaou mesmo nenhuma em outros”. O representante técnico da Embrapatambém aponta duas dificuldades que podem explicar essa avaliação: “Umaquestão é o trabalho em equipe e a articulação com equipes de outras instituiçõespara dar corpo uno às ações; outra é o registro de ações desenvolvidas, queexige conhecimento do sistema de informática e o entendimento dessa novalinguagem”. Mas Quirino também acredita que é justamente a atuação com foconos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio – como é o caso da Jornada – ogrande destaque da ação do COEP nesses 15 anos.


vale a pena acreditar | 417Mas Carolina, do INT, também aponta os obstáculos que precisam ser superados:“A falta de disponibilidade de tempo dos profissionais das associadas; atradição dos profissionais das associadas de trabalhar em estruturas pautadasnuma gestão hierarquizada, e não em rede; o despreparo dos moradores para otrabalho em equipe; a falta de conhecimentos de empreendedorismo e gestão,tanto por profissionais das associadas como por moradores de comunidades-alvodos projetos; as conseqüências da proposição de projetos elaborados sem o devidodiagnóstico nos locais a serem atendidos;mecanismos para tornar o projetoauto-sustentável, especialmente pela faltade atitudes proativas dos moradores dascomunidades envolvidas; limitação dosrecursos financeiros disponíveis”.Para Elizabeth Fonseca, representantetécnica do Incra no COEP Nacional, aJornada é também uma oportunidade paramobilizar as pessoas que estão ingressando mais recentemente nas empresas: “Alémde mobilizar as organizações parceiras, a Jornada funciona como um despertar paranovos servidores. Temos conseguido a adesão de áreas bem diversas dentro doIncra, inclusive nas superintendências regionais. A Jornada permite visualizar cadaconquista na transformação das comunidades de baixa renda”, acredita.Ricardo Dinelli, de Furnas e secretário executivo do COEP Minas Gerais,tem participado ativamente da Jornada COEP pela Cidadania: “Nossa contribuiçãofoi incentivar todas as entidades participantes do COEP Minas a montar suasequipes, pois sabíamos que todas elas participam de atividade nas suas comunidadese em suas empresas”. Dinelli relembra que seu engajamento não é recente:“Sempre gostei de trabalhar como voluntário em obras sociais. Iniciei aos 10 anoscomo ajudante das missas na igreja próxima a minha casa. Só aceitei ser secretárioexecutivo do COEP, quando Furnas garantiu total apoio para desenvolver obras quepudessem ter resultados em beneficio das comunidades carentes”. Para Dinelli,a “maior dificuldade é a anotação pelos participantes das atividades realizadasAlém de mobilizar as organizaçõesparceiras, a Jornada permitevisualizar cada conquista natransformação das comunidades


418 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008on-line na jornada. Tivemos de montar um esquema para ajudar todos a fazeremas anotações das tarefas realizadas”. Sobre resultados da iniciativa, explica: “Nós játrabalhávamos com seis comunidades. A jornada ajudou a contabilizar os resultadose a demonstrar que as atividades desenvolvidas são valorizadas. Furnas é umadas empresas que mais atuam na área social. A jornada agregou novos participantes,incrementando as ações sociais da empresa”.Etapas da JornadaPrimeira etapa: DE 9 DE AGOSTO A 20 DE JANEIRO DE 2008Objetivo 1Acabar com a fome e a misériaSegunda etapa: DE 21 DE JANEIRO A 31 DE JULHO DE 2008Objetivo 2Objetivo 3Educação básica de qualidade para todosIgualdade entre sexos e valorização da mulherTerceira etapa: DE 1º DE AGOSTO A 11 DE NOVEMBRO DE 2008Objetivo 7Objetivo 8Qualidade de vida e respeito ao meio ambienteTodo mundo trabalhando pelo desenvolvimentoQuarta etapa: DE 12 DE NOVEMBRO DE 2008 A 15 DE MARÇO DE 2009Objetivo 4Objetivo 5Objetivo 6Reduzir a mortalidade infantilMelhorar a saúde das gestantesCombater a Aids, a malária e outras doençasVisite www.coepbrasil.org.br/jornadaCurso de extensãoO ano de 2007 teve ainda uma ação do COEP voltada à capacitação de sua própriarede: o curso de extensão Gestão de Iniciativas Sociais, com duração de umano. Roberto Bartholo, professor do programa de Engenharia de Produção daCoppe/<strong>UFRJ</strong>, foi um dos docentes do curso oferecido pelo COEP. Para ele, “o


vale a pena acreditar | 419impacto foi positivo tanto para o corpo docente como para o corpo discente,principalmente no que se refere à troca de conhecimento e experiência. Em termosde aprovação, o resultado foi a aprovação de 68% dos alunos, índice positivoquando se trata de curso semipresencial.”Gleyse Peiter, secretária executiva do COEP Nacional, chama a atençãopara algo inédito até então nos cursos promovidos pela rede: “Diferentementedo que sempre fazíamos, que era desenvolver o conteúdo com uma única instituiçãode ensino, resolvemos fazer um curso que trouxesse diferentes olharessobre uma determinada questão. A articulação inicial envolvia a Coppe/<strong>UFRJ</strong>,a Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz, o Instituto Pólis e a UniversidadeCandido Mendes, que acabou se desligando dessa proposta”.A secretária executiva complementa: “Cada uma das instituições preparouseus módulos separadamente, respeitando essa diversidade de abordagens. Aidéia principal foi montar um curso que pudesse atender às necessidades dosparticipantes do COEP que executam atividades nas comunidades, apresentandotambém a fundamentação teórica. O curso foi a distância, mas houve umencontro inicial de todo o grupo aqui no Rio de Janeiro. Além disso, houvetutoria durante toda a sua duração”.“No COEP, trabalhamos para que as ações desenvolvidas sejam complementaresàs políticas públicas. Por isso, é fundamental o conhecimento sobreessas políticas em vigor. A experiência foi absolutamente inovadora e feita sobmedida para as necessidades do COEP. Não se vê isso em outro lugar, nemmesmo em cursos de responsabilidade social. Também buscávamos o fortalecimentodo processo de participação social, objetivo que eu desconheço existirem outra iniciativa do tipo”, complementa André Spitz.Sonia Moreira, coordenadora de projetos sociais da presidência da Fiocruz,vê bons resultados esse tipo de proposta: “O curso de gestão formou váriaspessoas que hoje podem reinventar projetos, inovar e renovar idéias. Foi umagrande iniciativa, pela qual o COEP lutou muito! A Fiocruz teve uma alunaque aproveitou 100% o curso e que certamente está trazendo um novo olharpara as novas idéias”.


420 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Saiba maisRealizado no período de agosto de 2007 a agostode 2008, o curso de extensão Gestão de IniciativasSociais foi coordenado pelo COEP em parceriacom o Laboratório de Tecnologia e DesenvolvimentoSocial, a Escola Nacional de Saúde PúblicaSergio Arouca (ENSP/Fiocruz) e o Instituto Pólis.A iniciativa foi dirigida a profissionais das associadasque atuam em áreas de responsabilidade socialde empresas e organizações públicas e privadas,configurando uma oportunidade de aprofundar conhecimentose práticas no campo das políticas públicas,da responsabilidade social, desenvolvimentoe participação social e gestão de projetos sociais.Os objetivos específicos foram:• favorecer o desenvolvimento da capacidade do(a)aluno(a) de trabalhar os conhecimentos de formamultidisciplinar e interdisciplinar buscando aidentificação de problemas prioritários e alternativasde soluções para tomada de decisões;• refletir acerca dos processos de formulação eimplementação de intervenções públicas decorte social na sociedade contemporânea;• utilizar sistemas de informações, mecanismose instrumentos de coleta de dados para a análiseda realidade social brasileira e dos contextosespecíficos de atuação das organizações;• contribuir para a melhoria dos processos deprodução do conhecimento e das práticas depromoção da saúde e da responsabilidade socialnas organizações;• refletir sobre o papel do(a) cidadão(ã) e deempresas (públicas ou privadas) preocupadascom a efetivação dos direitos em nosso país;• apresentar técnicas e ferramentas de responsabilidadesocial empresarial;• apresentar os canais e formas de participaçãoe controle social sobre as políticas públicas;• apresentar instrumentos de gestão de projetose iniciativas sociais;• identificar parceiros potenciais na formulaçãode projetos sociais;• analisar e construir o acompanhamento do monitoramentoe avaliação de projetos sociais;• realizar análise política na escolha de ferramentasgerenciais;• e avaliar o planejamento e a proposição deestratégias para realizar ações sociais autosustentáveis.


vale a pena acreditar | 421Ismael Machado, secretário executivo doCOEP Mato Grosso do Sul, e Tereza Nobuko,secretária executiva do COEP Mato Grosso,COEP Blumenau (SC)participaram do curso e têm avaliações positivas.Para Ismael, “o curso foi excelente, poisuma coisa é fazer, e outra é fazer com conhecimento.O grande impacto foi repensar asatuações da minha empresa e do COEP MatoGrosso do Sul e a minha própria como voluntário,agora com um conhecimento acadêmicoe muito voltado para a prática social”.Tereza acredita que o curso Gestão deIniciativas Sociais tenha ampliado seus conhecimentossobre responsabilidade social, algoque ainda considera recente. “Dependendoda área de atuação dos funcionários da organização,pouco se conhece sobre a responsabilidadesocioambiental. O grande impactoda iniciativa do COEP Nacional com o cursofoi justamente a questão de unir a teoria coma prática, por meio das atividades propostaspelas instituições parceiras do curso (<strong>UFRJ</strong>, Fiocruz e Instituto Pólis) e, também,dos conhecimentos sobre projetos sociais (formação, formulação, implementação,acompanhamento e avaliação)”, ressalta a secretária executiva do COEPMato Grosso.Instaurado em março de 2007, o COEP Blumenau,em Santa Catarina, tem Giselle Silva Virtuoso comosecretária executiva. “Desde a sua criação, o COEPBlumenau se uniu às empresas associadas para atuarde acordo com os objetivos do COEP na comunidadeescolhida: Vila Vitória”, relata Giselle, funcionáriados Correios.Ainda segundo a secretária executiva do COEPBlumenau, no início houve alguma dificuldade paraentrar em contato com a comunidade e iniciar efetivamenteos trabalhos. Mas esse foi um obstáculojá superado: “As conquistas de lá pra cá não foramcomo esperávamos, contudo conseguimos realizar avisita na comunidade e fazer contato direto com olíder da Vila Vitória, tornando os laços do COEPcom a comunidade mais estreitos”.Sistema de Mídias e Educação (Sime)Lançado em 2007, o Sistema de Mídias e Educação (Sime) integra informação,comunicação e educação a serviço do desenvolvimento comunitário. Trata-se de


422 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008uma plataforma que faz a convergência de diferentes mídias (vídeos, textos, programasde rádio, cartilhas eletrônicas), trazendo temas de interesse para as comunidadesnas áreas da saúde, cultura, educação, mobilização e produção rural.Segundo Sarita Berson, do COEP Nacional, foi a evolução do trabalho desenvolvidopelo COEP em comunidades de baixa renda, em especial no semi-áridonordestino, que trouxe a necessidade desse tipo de capacitação: “O Sime veioatender a demandas específicas, além de servir como alavanca impulsionadorade transformações sociais e comunitárias”, aponta.O endereço do Sime é e possuiuma interface gráfica de fácil navegabilidade que simula elementos existentesnas comunidades, gerando uma familiaridade com seu público. A ferramentapossibilita o acesso a todo material disponibilizado, permitindo combinaçõesde acordo com os interesses e necessidades. “A proposta é construir um amploacervo de informações e conhecimentos para as pessoas das comunidades, urbanase rurais”, ressalta Sarita.Políticas públicas para o semi-áridoDe 17 a 21 de setembro de 2007, o COEP Nacional promoveu o seminárioPolíticas Públicas e Comunidades Semi-Árido, em Brasília. O objetivo foi ampliaras condições de acesso das comunidades participantes do Programa ComunidadesSemi-Árido às políticas públicas direcionadas ao meio rural e a mulherese jovens, como forma de potencializar seu desenvolvimento. Participaram cercade 60 pessoas, incluindo lideranças das comunidades parceiras, professores(as)das universidades cidadãs, representantes governamentais e gestores(as) de políticaspúblicas. A programação contou com atividades como palestras, debates,oficinas e reuniões, servindo como embasamento para a realização mais adiantede minifóruns com agricultores(as) em cada uma das regiões de atuação doprograma e, posteriormente, de um grande fórum com lideranças de todas ascomunidades participantes.


vale a pena acreditar | 423Marcos Carmona é coordenador do Programa Comunidades do Semi-Ári doe organizou o encontro. Ele explica: “O que fizemos foi reunir as duas pontas:moradores das comunidades e gestores de políticas públicas, mostrando o quejá existe em termos de propostas e como fazer para acessá-las”. Ainda segundoMarcos Carmona, o seminário teve uma avaliação bastante positiva: “Além depropiciar esclarecimentos aos beneficiários das políticas públicas, o encontrotambém serviu para dar aos gestores um tipo de retorno sobre a prática dessasiniciativas. Isto é, além de aprender como acessar uma dada política, os representantesdas comunidades também puderam apontar quais são os entravesdessa mesma política, o que é bom e o que não funciona”.© Arquivo COEPCerca de 60 pessoas participaram do seminário, incluindo lideranças das comunidades parceiras,professores(as) das universidades cidadãs, representantes governamentais e gestores(as) depolíticas públicas


424 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 20082008Integração de mídiasComo parte das comemorações por seus 15 anos, o COEP lançou um novoportal na internet. Nele estão integradas a COEP TeVê, o Banco de ProjetosMobilização, o Portal das Comunidades e a Rede Mobilizadores. “Ao longodos anos, tudo isso foi construído de forma independente. Atualmente, estamosem outro estágio, e o novo Portal nasce com a característica da integração doCOEP como uma rede de comunidades, organizações e pessoas. O lançamentomarca essa nova caminhada. Traz, ainda, como inovação, a consideração doaspecto da acessibilidade, com o site mais preocupado em dar acesso a pessoasSaiba maisO portal da Rede Nacional de Mobilização Social –ou simplesmente portal do COEP – disponibiliza,em sua página principal, publicações, notícias, entrevistas,textos e artigos, eventos, destaques, alémde ser um espaço de troca de informação com oCOEP dos estados e municípios.Para uso interno da Rede, o portal apresenta, ainda,alguns instrumentos de apoio, por meio do qual aexperiência de um(a) participante pode ser aproveitadano trabalho de outras pessoas. Dessa forma, oportal oferece: banco de cartas, banco de apresentações,banco de releases, banco de documentos e outrosde interesse para a Rede como um todo.O portal constitui, também, uma porta de acessopara os vários sistemas e ferramentas desenvolvidospelo COEP em sua trajetória de 15 anos voltadapara a mobilização de pessoas e organizações emprol de iniciativas de desenvolvimento humano esocial em comunidades de baixa renda.Visite .


vale a pena acreditar | 425com algum grau de deficiência visual”, ressalta André Spitz. Sarita Berson,também do COEP Nacional, complementa: “O novo portal marca um novomomento na vida do COEP, mais integrado, no qual cada vez mais conseguimostrabalhar o conceito de rede”.Mão dupla“Também é bom ressaltar que o novo portal é uma via de mão dupla, com dadosque vêm dos COEP estaduais e municipais e que começam a fazer parte doportal do COEP Nacional, e vice-versa. Nessa nova concepção, o portal ganhaum papel de integração que uma rede como o COEP merece e precisa ter, ondetodas as comunidades, também, podem absorver o conjunto disponível de informações”,acredita o presidente do COEP.Nessa nova fase do COEP, o site Mobilizadores ganhou um novo layout e aapresentação do conteúdo também foi reformulada, facilitando a navegação.Os temas abordados estão reunidos em dois grandes grupos: direitos e participaçãosocial, e desenvolvimento sustentável e comunidades. “O objetivo foireforçar, ainda mais, a cobertura de assuntos relacionados aos direitos de cidadaniae à promoção do desenvolvimento comunitário, além de ampliar o espaçode integração dos participantes da Rede”, explica Sarita Berson. As novidadesficam por conta da ampliação do tema turismo, que passou a enfocar tambéma cultura, e do tema extensão universitária, que mudou o enfoque e passou a serdenominado universidades e cidadania.Ainda sobre as novidades do COEP na rede mundial de computadores,Sarita continua: “É o nosso ponto de encontro, no qual são feitos os processos deconsolidação e de distribuição das informações. Esperamos, assim, ter atendidoà demanda de criar um canal mais cooperativo. Esse novo portal foi pensado apartir do nosso empenho para a construção coletiva e integrada da informação,garantindo uma unidade editorial, ainda que a ‘matéria-prima’ seja provenientede diferentes COEP”.


426 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008ReconhecimentoA consolidação do COEP como Rede Nacional deMobilização Social só foi possível pela ampla e engajadaparticipação das associadas e, em particular,daquelas que apoiaram as secretarias executivas doCOEP nos âmbitos nacional, estadual e municipal.Nesse sentido, o COEP Nacional ratifica amoção de agradecimento prevista na Deliberaçãonº 5/97, aprovada pelo conselho deliberativodo COEP Nacional na reunião de 26 de agostode 1997, e registra o reconhecimento à associadaFurnas Centrais Elétricas S.A., que, ao longo destes15 anos, tem apoiado a secretaria executiva doCOEP Nacional, e às associadas que apoiaramno passado e/ou apóiam atualmente as secretariasexecutivas dos COEP estaduais e municipais: Bancode Sergipe (Banese); Banco do Brasil; Banco doNordeste do Brasil (BNB); Banco Regional deDesenvolvimento do Extremo Sul (BRDE); CaixaEconômica Federal; Centrais Elétricas de RondôniaS.A. (Ceron); Centrais Elétricas de SantaCatarina (Celesc); Centrais Elétricas do Norte doBrasil (Eletronorte); Comissão Executiva do Planoda Lavoura Cacaueira (Ceplac); Companhia de SaneamentoAmbiental do Distrito Federal (Caesb);Companhia Nacional de Abastecimento (Conab);Furnas Centrais Elétricas; Eletrobrás TermonuclearS.A (Eletronuclear); Empresa Brasileira deCorreios e Telégrafos; Empresa Brasileira de Infra-Estrutura Aeroportuária (Infraero); Empresa Brasileirade Pesquisa Agropecuária (Embrapa); Empresade Agropecuária e Extensão Rural de SantaCatarina S.A (Epagri); Empresa de Tecnologia eInformação da Previdência Social (Dataprev);Empresa Transmissora de Energia Elétrica do Suldo Brasil S.A (Eletrosul); Instituto de Desenvolvimentodo Trabalho (IDT), Limoeiro do Norte,Ceará; Instituto Nacional de Colonização e ReformaAgrária (Incra); Instituto Nacional de Tecnologia(INT); Itaipu Binacional; Petróleo BrasileiroS.A (Petrobras); Pontifícia UniversidadeCatólica de Minas Gerais, campus Poços de Caldas;Secretaria do Emprego do Estado de São Paulo;Secretaria do Trabalho do Estado de São Paulo;Serviço de Apoio à Micro e Pequenas Empresas(Sebrae); Serviço Federal de Processamento deDados (Serpro); Serviço Social do Comércio (Sesc)de Sobral, Ceará; Superintendência Regional doTrabalho dos Estados do Maranhão e do EspíritoSanto (SRT); Suzano Papel e Celulose, Mogidas Cruzes, São Paulo; Universidade Federal doVale do São Francisco (Univasf ); e Vilma Alimentos,Contagem, Minas Gerais.


vale a pena acreditar | 427Uma nova etapa15 anos após sua criação, o COEP se consolida como uma ampla e singular rede nacional de mobilizaçãosocial, que tem a cooperação como valor fundamental. Atuando em 27 unidades da federaçãoe em 22 municípios, reúne atualmente mais de 1.100 entidades associadas, parceiras naconstrução de uma sociedade mais solidária e na implementação de iniciativas de combate à pobrezae de incentivo à ação cidadã de seus(suas) funcionários(as).A troca de experiência entre as empresas associadas tem propiciado a implementação de projetosdiferenciados, que vão da teoria à ação em uma velocidade não comum e acabam replicadosrapidamente em diferentes regiões do país. Essa multiplicaçãodas melhores práticas é também estimulada peloCOEP por meio da promoção de cursos de capacitação edisseminação de informações para o aperfeiçoamento dagestão na área social.Ao longo deste texto, foi exposto um detalhado panoramadas ações realizadas ao longo da trajetória do COEP,com suas ramificações e transformações. Para acompanhara evolução dessas ações, acesse o portal do COEP.


Apresentação cultural no Fórum Social Mundial, Porto Alegre, 2005© Samuel Tosta/Arquivo IbaseParte 4


HomenagensAo mesmo tempo em que o COEP reconhece a contribuição fundamentalde todos os indivíduos e organizações que o apóiam, há trêspessoas que são a fonte de inspiração para o trabalho desenvolvido aolongo desses 15 anos e também para os desafios que estão por vir: Herbert de Souza,um dos fundadores do COEP; Maria José Jaime, Bizeh, fundadora do Institutode Estudos Socioeconômicos (Inesc); e Josué de Castro, intelectual que usou suasensibilidade e competência para colocar no mundo o tema da fome no Brasil.Josué de Castro, depois de uma vida dedicada ao estudo das causas da fome,morreu em Paris em 24 de setembro de 1973. Maria José Jaime morreu em 23 denovembro de 2007, era historiadora, ex-exilada política e uma das precursoras dasociedade civil organizada brasileira. Betinho, o sociólogo que emocionava pelafrágil aparência e também pela força do olhar, morreu dia 9 de agosto de 1997vítima das complicações da Aids, em sua casa, como havia pedido a sua família.A esses(a) brasileiros(a), nossa homenagem e reconhecimento.


parte 4 | 431O jeito Betinho de lutarpela causa públicaSebastião SoaresEm suas próprias palavras, Betinho – como era conhecido o sociólogo Herbertde Souza – se qualificava como um “otimista ativo”! Essa expressão talvez caracterize,da forma mais perfeita, o “jeito Betinho” de ser cidadão, completo eacabado, de sempre lutar – toda vida e a vida toda – pela causa pública.Mas o que é ser otimista ativo? Pretendo, neste texto, compartilhar comleitores e leitoras algumas reflexões para construir uma resposta a essa pergunta.Começo rememorando, e relatando, um episódio no qual Betinho teve umaparticipação decisiva, e penso que isso ocorreu porque tal atitude foi motivadae sustentada por seu otimismo ativo.Era fim de 1982 ou início de 1983. O senador Teotônio Vilela, talvez jávislumbrando sua alvorada eterna, e por ela iluminado, iniciou a grande e derradeirapregação cívica da sua carreira. Começou, modesta, na tribuna do Senado,mas logo cresceu; tomou forma consistente, conteúdo abrangente e ordenado,e transbordou para os campos e praças deste país.Apresentava o senador o Projeto Emergência, que consistia em pequena –mas sólida – análise da situação econômica, social e política do Brasil, entãoem passagem da ditadura para a democracia. O projeto conceituava as quatrodívidas que então se abatiam sobre a sociedade brasileira: a dívida externa, adívida interna, a dívida social e a dívida política. Analisava o que as havia motivado,quem delas se beneficiava e quais eram suas conseqüências perversaspara todos nós; por fim propunha formas de resgatá-las. Tudo muito simples,mas muito denso e objetivo.O Projeto Emergência, assim como a peregrinação do senador, mobilizou opovo brasileiro e o motivou para o exercício da cidadania, culminando imedia-


432 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008tamente no movimento Diretas Já e contribuindo, na seqüência e a médioprazo, com os debates amplos e diversificados que possibilitaram a elaboraçãoe a promulgação da Constituição cidadã de 1988. Como se vê, episódio comoesse constitui a reunião de elementos indispensáveis, embora não suficientes, àconstrução de uma nação democrática. Isso é História!Pois bem, o que poucas pessoas conhecem é a participação relevante queBetinho teve nessa história. O Projeto Emergência foi por ele concebido earticulado com o senador Teotônio Vilela. Assim também ocorreu durante suaelaboração, edição e divulgação por todo o país, nos eventos liderados pelosenador ou nos que contavam com sua presença.Os estudos e análises que suportam as propostas e os próprios textos queintegram a publicação da Editora Codecri – Coleção Em Cima do Fato, Vol.02,1983 – foram todos elaborados pelo Instituto Brasileiro de Análises Sociais eEconômicas, o Ibase, então recém nascido. Três colaboradores voluntários danova entidade, todos profissionais, empregados em importantes empresas estatais(daí o anonimato), encarregaram-se das abordagens referentes às dívidasexterna, interna e social, respectivamente. O próprio Betinho tratou da dívidapolítica e redigiu a introdução e as conclusões no plural mesmo?. Também coordenoutodo o trabalho, até mesmo revisando-o e fazendo pequenos ajustes nostextos dos três colaboradores voluntários. Enquanto desenvolvia o trabalho, essaequipe – Betinho inclusive – realizou inúmeras reuniões, entre eles mesmos ecom o senador. Todos os encontros ocorreram no Rio de Janeiro, nas residênciasdos colaboradores, na recepção do hotel onde o senador costumava se hospedar,no restaurante do Aeroporto do Galeão, entre outros locais.Esse episódio, sucintamente relatado, constitui um exemplo emblemáticode como é possível, com ínfimos recursos e em prazo reduzido, organizar eempreender ações poderosas, capazes de produzir resultados tão significativoscomo aqueles mencionados. É verdade que o Brasil vivia, no início dos anos1980, um momento mágico de redemocratização – o sol da esperança renasciadissipando as sombras de quase duas “décadas de chumbo”. Além disso, haviaa dimensão e o carisma do senador.


© Arquivo Ibaseparte 4 | 433


434 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008Mas, se não houvesse um agente capaz de perceber a oportunidade oferecidapor essa conjuntura auspiciosa, bem como de traçar um rumo e de deflagraruma ação conseqüente, nada aconteceria: a conjunção favorável dos fatores sedesvaneceria, ou a ação empreendida seria caótica e desorientada, ou os resultadosnão se acumulariam, nem se agregariam sinergicamente – ou tudo isso ocorreriaconcomitantemente. No entanto, e afortunadamente, havia o Betinho – onosso otimista ativo – liderando a empreitada. E foi o que se viu.Voltemos à nossa pergunta inicial: o que é um otimista ativo? Penso que é aquelapessoa que consegue reunir em si três virtudes ou características: a audácia, acapacidade de fazer boas articulações e a competência para realizar ações eficazes.Audácia é a virtude de quem sabe ousar, o que se manifesta de variadas maneiras:ousar pensar ou conceber projetos de grande porte, seja por suas dimensões,seja pela relevância dos resultados que poderão propiciar; ousar o equacionamentode soluções inéditas, grandiosas ou arriscadas, mas sempre atento, buscandoser positiva a diferença entre os bônus e os ônus das soluções equacionadas.Capacidade de fazer boas articulações é característica que demanda um conjuntode atributos: perspicácia para identificar interesses afins dos diversos atores em cena;de avaliar atitudes e posturas complementares; e de juntar esses interesses, atitudese posturas na realização de uma ação definida. É, em síntese, dialogar e estabeleceralianças para avançar, cooperativamente, na realização do objetivo maior.Competência para realizar ação eficaz – uma ação eficaz requer, entre outrascondições, a definição prévia, clara e consistente dos objetivos buscados, medianteo diálogo entre os diversos atores e por meio de estudos e reflexões próprias.Requer, ainda, a presença de liderança incontestada de ator protagonista; poroutro lado, competência para liderar é um traço de personalidade que englobae amalgama atributos cognitivos e comportamentais desse ator protagonista.Ademais, o líder precisa da sabedoria e da intuição para escolher o melhor métodopara a ação, dadas as circunstâncias observadas. Sobretudo, a persistência éatributo indispensável à liderança.Betinho tinha, em nível elevado, essas características e as forjou ou desenvolveudesde muito jovem e ao longo de toda a sua vida. Nesse aspecto, cabe


parte 4 | 435registrar que ele fez parte de uma geração de brasileiros e brasileiras que tomouconsciência da própria cidadania – das responsabilidades pessoais que ela gerae das potencialidades que o seu exercício disponibiliza – durante um períodoexcepcionalmente denso em ameaças e oportunidades, em problemas e soluções,nos campos econômico, social e político da vida nacional. Por isso os 20 anosque mediaram 1945 e 1965 constituem uma época singular na história recentedo nosso país, o que certamente muito contribuiu para a sua formação.No episódio relatado – Projeto Emergência –, é evidenciada a capacidadede Betinho de fazer boas articulações. Na mobilização pelo impedimento dopresidente Collor, realizado em conformidade com os estritos limites do ritodemocrático, fica ressaltada a sua audácia, especialmente na já famosa reuniãode conjuntura realizada no Ibase, em uma noite de trovoadas no fim de marçode 1990. Naquela reunião, Betinho, talvez pela primeira vez no país, indicouessa solução como a mais adequada para corrigir o grande equívoco que cometeraa sociedade brasileira ao eleger aquele personagem. Na Ação da Cidadaniacontra a Fome e a Miséria e pela Vida, iniciada em 1993, o relevante foi sua competênciapara realizar ações eficazes, especialmente pela nitidez dos objetivos definidos,pela boa escolha do método estruturante da campanha – os comitês – epor sua enorme persistência, como autêntico brasileiro que era.Finalmente, na criação do Ibase, juntamente com outros dois excepcionaiscidadãos brasileiros da mesma geração, bem como na gestão da entidade enquantoviveu, Betinho utilizou e exercitou, plena e intensamente, aquelas trêsvirtudes ou características.Uma última pergunta: Como se manifestaria o otimismo ativo do nossoBetinho no Brasil de 2008, em tempos de Pré-Sal? Penso que a resposta a essaindagação necessita outros debates e reflexões que todos nós devemos fazercom urgência.Sebastião SoaresPresidente do conselhocurador do Ibase


AgradecimentosUma ampla e singular Rede Nacional de Mobilização Social. Assimse transformou o COEP em 15 anos de atuação e trabalho. Agradecemosa todas as pessoas que, com um “jeito Betinho de ser”, nãoaceitam a fome e a miséria como um fato normal da história humana, que lutampara transformar a realidade e mantêm a capacidade de indignação perante avergonha da exclusão.Agradecemos também a todas as pessoas que, no âmbito do COEP, se empenhamem mudar a cultura da indiferença das pessoas e das organizações, estabelecendoo direito à vida com dignidade como um valor fundamental da democracia – einsistem na cidadania como direito de todos e de todas, e não como privilégio deuma parcela da sociedade.Um agradecimento especial é destinado a quem ajudou a viabilizar esta primeiraedição da Coleção COEP Cidadania em Rede e também as demais iniciativasrelacionadas às comemorações pelos 15 anos do COEP: o Instituto Brasileiro de


parte 4 | 437© Arquivo IbaseAnálises Sociais e Econômicas (Ibase), o cartunista Ique, o ConselhoNacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), aAgência Jornal do Brasil, a Agência O Globo e, principalmente,todas as pessoas que se dispuseram a dar seus depoimentos sobreos fatos aqui narrados.Muito obrigado(a).


SiglasAAABB – Associação Atlética Banco do BrasilABI – Associação Brasileira de ImprensaAbia – Associação Brasileira Interdisciplinar de AidsAbong – Associação Brasileira de Organizações Não-GovernamentaisAbrandh – Associação Brasileira pela Nutrição e Direitos HumanosAcbantu – Associação Cultural de Preservação do Patrimônio BantuAcomac – Associação de Comerciantes de Materiais de Construção de Porto AlegreAids – Síndrome da imunodeficiência humana


parte 4 | 439Alca – Área de Livre Comércio das AméricasAlfasol – Alfabetização SolidáriaAPC – Association for Progressive CommunicationsASA – Articulação no Semi-Árido BrasileiroAscar –Attac – Ação pela Tributação das Transações Financeiras em Apoio aos CidadãosBBAP – Bomba d’Água PopularBBS – Bulletin board systemBNB – Banco do Nordeste do BrasilBRDE – Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo SulCCapasil – Capacitação SolidáriaCBJP – Comissão Brasileira Justiça e Paz


440 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008CCBB – Centro Cultural Banco do BrasilCecip – Centro de Criação de Imagem PopularCepal –Cese – Coordenadoria Ecumênica de ServiçosCGTEE – Companhia de Geração Térmica de Energia ElétricaChesf – Companhia Hidro Elétrica do São FranciscoCives – Associação Brasileira de Empresários pela CidadaniaCNBB – Conferência Nacional dos Bispos do BrasilCNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e TecnológicoCNSA – Conferência Nacional de Segurança AlimentarCNSAN – Conferência Nacional sobre Segurança Alimentar e NutricionalCNSS –Coep – Rede Nacional de Mobilização SocialConab – Companhia Nacional de AbastecimentoConanda – Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente


parte 4 | 441Conic – Conselho Nacional de Igrejas Cristãs no BrasilConsad – Consórcio de Municípios de Segurança Alimentar e Desenvolvimento LocalConsea – Conselho Nacional de Segurança Alimentar e NutricionalContag – Confederação Nacional dos Trabalhadores na AgriculturaCootram – Cooperativa de Trabalhadores Autônomos da Região de ManguinhosCoppe –Coppetec – Fundação Coordenação de Projetos, Pesquisas e Estudos TecnológicosCPAL – Conferência dos Provinciais Jesuítas da América LatinaCPDA/UFRRJ – Programa de Pós-graduação de Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agriculturae Sociedade da Universidade Federal Rural do Rio de JaneiroCPI – Comissão parlamentar de inquéritoCRSANS – Comissões Regionais de Segurança Alimentar e Nutricional SustentávelCUT – Central Única dos TrabalhadoresCVSRD – Centro para Pesquisa e Desenvolvimento do Setor Voluntário


442 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008DDHAA – Direito humano à alimentação adequadaDhesc – Direitos humanos, econômicos, sociais e culturaisDieese – Departamento Intersindical de Estatística e Estudos SocioeconômicosDLIS – Desenvolvimento local integrado e sustentávelECDPM – European Centre for Development Policy Management (Centro Europeupara a Gestão de Políticas de Desenvolvimento)EEmater –Embrapa – Empresa Brasileira de Pesquisa AgropecuáriaEmbratel –ENSP – ESCOLA NACIONAL DE SAÚDE PÚBLICA SERGIO AROUCAEpagri – Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S.A.


parte 4 | 443FFamurs - Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do SulFAO – Organização das Nações Unidas para a Agricultura e AlimentaçãoFase – Federação de Órgãos para Assistência Social e EducacionalFAT –FBB – Fundação Banco do BrasilFBMOS – Fórum Brasileiro de Organizações Não-Governamentais e MovimentosSociais para o Meio Ambiente e DesenvolvimentoFBSAN – Fórum Brasileiro de Segurança Alimentar e NutricionalFenabb – Federação Nacional das AABBsFian – Organização Internacional de Direitos Humanos para o Direito à AlimentaçãoFinep – Financiadora de Estudos e ProjetosFiocruz – Fundação Oswaldo CruzFlacso – Faculdade Latino-Americana de Ciências SociaisFMI – Fundo Monetário Internacional


444 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008FNRU – Fórum Nacional de Reforma UrbanaFNSAN – Fórum Nacional de Segurança Alimentar e NutricionalFSM – Fórum Social MundialGGCAP – Global Call for Action Against PovertyGecoop-BB – Gerência de Negócios do Sistema Cooperativista do Banco do BrasilGT – Grupo de trabalhoHHIV – Vírus da imunodeficiência humanaIIbam – Instituto Brasileiro de Administração MunicipalIbase – Instituto Brasileiro de Análises Sociais e EconômicasIBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística


parte 4 | 445Ibope – Instituto Brasileiro de Opinião Pública e EstatísticaIDH – Índice de Desenvolvimento HumanoIDRC – Centro Internacional de Pesquisa sobre o DesenvolvimentoImip – Instituto Materno Infantil de PernambucoIncra – Instituto Nacional de Colonização e Reforma AgráriaInesc – Instituto de Estudos SocioeconômicosInfraero – Empresa Brasileira de Infra-Estrutura AeroportuáriaINT – Instituto Nacional de TecnologiaIpea – Instituto de Pesquisa Econômica AplicadaIser – Instituto de Estudos da ReligiâoLLBA – Legião Brasileira de AssitênciaLosan – Lei Orgânica de Segurança Alimentar e NutricionalLTDS – Laboratório de Tecnologia e Desenvolvimento Social


446 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008MMDS – Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à FomeMEP – Movimento pela Ética na PolíticaMesa – Ministério de Segurança AlimentarMIT – Massachusetts Institute of TechnologyMMC – Movimento de Mulheres CamponesasMNCR – Movimento Nacional dos Catadores de Materiais RecicláveisMOC – Movimento de Organização ComunitáriaMST - Movimento dos Trabalhadores Rurais sem TerraNNudec – Núcleo Comunitário da Defesa CivilNupem – Núcleo de Pesquisas Ecológicas de Macaé


parte 4 | 447OOAB – Ordem dos Advogados do BrasilODMs – Objetivos de Desenvolvimento do MilênioOMC – Organização Mundial do ComércioONG – Organização Não-GovernamentalONU - Organização das Nações UnidasOscip – Organização da Sociedade Civil de Interesse PúblicoPP1+2 – Programa Uma Terra e Duas ÁguasP1MC – Programa Um Milhão de CisternasPAA – Programa de Aquisição de AlimentosPAC – Programa de Aceleração do CrescimentoPacs – Políticas Alternativas para o Cone Sul


448 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008PEC – Proposta de emenda constitucionalPIB – Produto Interno BrutoPnad - Pesquisa Nacional por Amostra de DomicílioPNAN – Política Nacional de Alimentação e NutriçãoPNBE – Pensamento Nacional das Bases EmpresariaisPNQ – Programa Nacional da QualidadeProer – Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro NacionalProger –Pronaf – Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura FamiliarPronan – Programa Nacional de Alimentação e NutriçãoProninc – Programa Nacional de Incubadoras de Cooperativas PopularesRRNP – Rede Nacional de Pesquisa


parte 4 | 449SSAN - Segurança Alimentar e NutricionalSDR – Secretaria de Desenvolvimento RuralSebrae – Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas EmpresasSEDH – Secretaria Especial de Direitos HumanosSenaes –Seppir – Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade RacialSerpro – Serviço Federal de Processamento de DadosSicredi –Sime – Sistema de Mídia e EducaçãoSindsep –Sisan – Sistema Nacional de Segurança Alimentar e NutricionalSNI – Serviço Nacional de InformaçõesSudene – Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste


450 | Coleção Coep Cidadania em Rede • nov 2008SUS – Sistema Único de SaúdeTTIC – Tecnologia da Informação e ComunicaçãoTLC – Tratado de livre comércioUUerj – Universidade do Estado do Rio de JaneiroUFBA – Universidade Federal da BahiaUFC – Universidade Federal do CearáUFJF – Universidade Federal de Juiz de ForaUFPE – Universidade Federal de PernambucoUFPI - Universidade Federal do Piauí<strong>UFRJ</strong> – Universidade Federal do Rio de JaneiroUFRN - Universidade Federal do Rio Grande de NorteUFRPE – Universidade Federal Rural de Pernambuco


parte 4 | 451UFS - Universidade Federal de SergipeUFSM – Universidade Federal de Santa MariaUnB – Universidade de BrasíliaUnicamp – Universidade Estadual de CampinasUnicef – Fundo das Nações Unidas para a InfânciaUnisol – Universidade SolidáriaUnitar – Instituto das Nações Unidas para a Formação e PesquisaUnivasf – Universidade Federal do Vale do São Francisco

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