"Mina Lassaô"a Igreja Católica também comemora esse santo.Segundo Lindoso (2007), a festa <strong>de</strong> SantoAntonio nesse terreiro é <strong>de</strong>dicada ao orixá Ogume é organizada pela Mãe e pelo Pai pequeno dacasa Aíla e Leandro. O toque <strong>de</strong> Mina neste diacomeçou por volta das três horas da tar<strong>de</strong> com ocântico entoado pelo Pai <strong>de</strong> Santo Airton Gouveia<strong>de</strong>nominado “Imbarabô”.Durante esse cântico os filhos <strong>de</strong> santoentram lentamente no salão, saudando osabatás (tambores que são utilizados no Tambor<strong>de</strong> Mina). Nesse instante, os filhos da casadançam em forma <strong>de</strong> roda, realizando, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ndodas doutrinas (músicas) que estãosendo cantadas, gestos e coreografias, comoapontar o <strong>de</strong>do da mão direita para o céu eimitar um arco e flexa com as mãos etc.No momento do transe do pai e mãe pequenosda casa, as suas entida<strong>de</strong>s Ogum <strong>de</strong>Lê <strong>de</strong> Mãe Aíla e Ogum Xorôquê <strong>de</strong> Pai Leandrochegam juntas. No momento em que eles entraramem transe, as suas entida<strong>de</strong>s são conduzidaspara fora do salão <strong>de</strong> dança, enquantoisso o ritual ainda continua com varias músicas,danças, e outros filho <strong>de</strong> santo que tambémentram em transe, mas continuam no salão.Mãe Aila e Pai Leandro apareceram nosalão <strong>de</strong> dança com suas vestes rituais trocadas,segundo esse grupo religioso o nomeque se dá para essas vestes é <strong>de</strong> paramento.Eles portavam objetos que remetem à mitologia<strong>de</strong> Ogum, consi<strong>de</strong>rado o Orixá da guerra edo ferro segundo a cultura iorubana. Eles portavamespada, escudo e capacete.Os filhos <strong>de</strong> santo dão espaço no salão paraque os Oguns façam a sua performance e realizemas suas danças rituais; Ogum Xorêquêe Ogum <strong>de</strong> Lê dançam como se estivessemnuma guerra, apontando a espada para frentee para o teto, <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>ndo-se com o escudo edando gritos que diziam “Ogum ê Patacuri”.Em um <strong>de</strong>terminado momento, um filhoda casa entra em transe com orixá iorubanoOxossi, orixá da fartura, da caça e do sustento.Ele dança como se estivesse em uma matacorrendo com os <strong>de</strong>dos das mãos apontados efazendo movimentos com as pernas.Logo após as apresentações das dançasrituais <strong>de</strong> Ogum e Oxossi que em seguida foramretirados do salão <strong>de</strong> dança, começam a ser homenageadasas entida<strong>de</strong>s nobres e gentis quenão são entida<strong>de</strong>s africanas. Segundo MundicarmoFerretti (2000a) a presença <strong>de</strong> entida<strong>de</strong>snão africanas no Tambor <strong>de</strong> Mina é explicadapelo próprio contato negro/ africano ou <strong>de</strong> seus<strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes com culturas não africanas.Cad. Pesq., São Luís, v. 18, n. 2, maio/ago. 2011.Os nobres e gentis no Ilê Axé Ogum Sogbôsão comandados por “Barão <strong>de</strong> Guaré” (filho<strong>de</strong> Rei Sebastião) que é recebido por PaiAirton. Percebeu-se que quando os filhos <strong>de</strong>santo <strong>de</strong>sse terreiro entram em transe comalguma entida<strong>de</strong> nobre ou gentil, recebemuma bengala <strong>de</strong> tamanho médio e dançamnum porte <strong>de</strong> supremacia e realeza. I<strong>de</strong>ntificaram-sealguns gentis incorporados em seus“filhos”: Dom Felipe, Dom Henrique, PríncipeRicardino e Rei da Escama Dourada. Algunsoutros que estavam em “terra” não foi possíveli<strong>de</strong>ntificar os nomes. Logo após terem cantadoe incorporado, as entida<strong>de</strong>s nobres e gentiscomeçaram a homenagear e invocar a família<strong>de</strong> Légua esse toque terminou por volta dassete horas da noite.4 CONSIDERAÇÕES FINAISEste artigo é resultante da pesquisa <strong>de</strong>campo feita há dois anos em terreiros <strong>de</strong> “Mina”antes <strong>de</strong> ser bolsista PIBIC com pesquisa e envolvimentonos toques <strong>de</strong> mina realizados naCasa Fanti-Ashanti e no Ilê Axé Ogum Sogbô.O Tambor <strong>de</strong> Mina é uma religião afro-maranhenseque vem sendo muito estudada porantropólogos, historiadores e cientistas sociaiscom o olhar voltado mais para outros aspectosda etnografia, existindo ainda poucos trabalhosfocando seus aspectos cênicos e performáticos.Um fator evi<strong>de</strong>nte da manifestação e expressãoreligiosa do Tambor <strong>de</strong> Mina <strong>de</strong>ssesgrupos estudados é a contextualização com omeio em que está inserido, seja em sua formaoriginal através <strong>de</strong> readaptações a padrões,a seu costume e a sua crença e a prática dosritos realizados <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>stas casas. A pesquisa<strong>de</strong>monstrou que a riqueza performática <strong>de</strong>sseritual tão maranhense segue em conjunto nosaspectos performáticos da música e da dança eda relação com o transe, em que elementos sãore-significados, o corpo ganha outro formatobaseado no que está sendo cantado no rituale nas formas que cada divinda<strong>de</strong> se apresenta.É necessário um olhar mais apurado para aobservação do Tambor <strong>de</strong> Mina, não somente oolhar etnográfico, mas também um olhar artístico,pois a riqueza em elementos teatrais queesta religião tem é <strong>de</strong> uma diversida<strong>de</strong> enorme.No universo do Tambor <strong>de</strong> Mina realizadona Casa Fanti-Ashanti e no Ilê Axé OgumSogbô observam-se aspectos cênicos e performáticosque vão <strong>de</strong>s<strong>de</strong> as imagens representativados santos católicos, no altar, até asconstruções coreográficas e musicais com seus25
Heriverto N. M. Júnior; Sérgio F. Ferrettiusos, significados e funções. Desvendar todaa constituição simbólica religiosa do contexto<strong>de</strong>ste rito nessas casas é algo impossível paraum único estudo, pois seria necessário buscara compreensão <strong>de</strong>sse mundo a partir <strong>de</strong> suasdimensões plásticas, dramáticas, gestuais, lingüísticas,antropológicas, musicais, religiosas,filosóficas etc.NOTAS1. Cântico gravado e transcrito durante nossapesquisa <strong>de</strong> campo no ritual do Ilê Axé Ogum eSogbô, é um cântico <strong>de</strong> abertura.2. O terreiro fundado na segunda meta<strong>de</strong> dos anos50, particularmente no ano <strong>de</strong> 1956, tendo suasprimeiras instalações em um sítio no bairro doCalhau em São Luis do Maranhão, pelo finadoJorge Itaci <strong>de</strong> Oliveira, mais conhecido comoJorge Babalaô ou Jorge da Fé em Deus. Naquelaépoca, meados dos anos 50, esse local era <strong>de</strong>difícil acesso, tanto para o Pai <strong>de</strong> santo, quantopara os (as) seus(suas) primeiros(as) filhos(as)<strong>de</strong> santo e <strong>de</strong>mais pessoas <strong>de</strong>sse grupo afro--religioso, <strong>de</strong>vido não morarem nessa área e teremque se <strong>de</strong>slocar até lá, por conta disso, esseterreiro se mudou para o bairro da Fé em Deus efunciona até hoje neste local (LINDOSO, 2007).3. Segundo Lindoso, é realizado também na casa<strong>de</strong> Iemanjá o ritual da “festa dos pretos-velhos”,no dia 13 <strong>de</strong> maio, uma linha <strong>de</strong> entida<strong>de</strong>s muitopresente na umbanda implementada por PaiJorge <strong>de</strong>ntro do seu terreiro, em face <strong>de</strong> homenagearo seu preto-velho, Pai Joaquim e <strong>de</strong> rememorarquestões atreladas ao próprio negrobrasileiro e a libertação dos escravos, reforçarainda i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s, etc. (LINDOSO, 2007).4. Nesse terreiro, essas famílias <strong>de</strong> caboclos sãocomandadas por entida<strong>de</strong>s espirituais recebidaspor seu lí<strong>de</strong>r, Pai Airton, como a famíliada Turquia que é comandada pelo caboclo JoãoGuará, a família <strong>de</strong> Codó, por Seu Folha Seca,a família da Gama por Miguelzinho da Gama, afamília <strong>de</strong> Ban<strong>de</strong>ira, por Olho d’Água e famíliada Mata por Taquariana, entre outras.REFERÊNCIASBASTIDE, Roger. As religiões africanas noBrasil. São Paulo: Pioneira, 1985.FERRETTI, Mundicarmo. Desceu na guma:o caboclo no Tambor <strong>de</strong> Mina. São Luís:EDUFMA, 2000a.______. Maranhão encantado: encantariamaranhense e outras histórias. São Luís:UEMA Editora, 2000b.______. Mina, uma religião <strong>de</strong> origemafricana. São Luís: SIOGE, 1985.FERRETTI, Sérgio. Querebetã <strong>de</strong> Zomadônu:etnografia da Casa das Minas do Maranhão. 2ed. São Luís: SIOGE, 1996.LIGIERO, Zeca. O conceito <strong>de</strong> “motrizesculturais” aplicado às práticas performáticas<strong>de</strong> origens africanas na diáspora americana.In: CONGRESSO DA ASSOCIAÇÃOBRASILEIRA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO EM ARTES CÊNICAS, 5., 2008,Belo Horizonte. Anais... Belo Horizonte:ABRACE, 2008.LINDOSO, Gerson Carlos Pereira. Pluralismose diversida<strong>de</strong> afro-religiosa em terreiros <strong>de</strong>mina no Maranhão: um estudo etnográficodo mo<strong>de</strong>lo ritual do Ilê Ashé Ogum Sogbô.Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais)– Programa <strong>de</strong> Pós-Graduação em CiênciasSociais, Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral do Maranhão,São LUÍS, 2007.LOPES, Antônio Herculano. Religião eperformance ou as performances das religiõesbrasileiras. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Casa <strong>de</strong> RuiBarbosa, 2007.OLIVEIRA, Jorge Itaci. Orixás e voduns nosterreiros <strong>de</strong> Mina. São Luís: VCR Produções ePublicida<strong>de</strong>, 1989.PAVIS, Patrice. A análise dos espetáculos:teatro mímica, dança, dança – teatro, cinemaTradução <strong>de</strong> Sergio Paiva]. São Paulo:Perspectiva, 2005.SCHECHNER, Richard. O que é performance.O Percevejo: Revista <strong>de</strong> Teatro, Crítica eestética, Rio <strong>de</strong> Janeiro, ano 2, n. 12, p. 25-50, 2003.SHAPANAN, Francelino. Entre caboclos eencantados. In: PRANDI, Reginaldo (Org.).Encantaria brasileira: o livro dos mestres,caboclos e encantados. Rio <strong>de</strong> Janeiro:Pallas, 2001.TURNER, Victor W. O processo ritual: aestrutura e enti-estrutura. Tradução <strong>de</strong> NancyCampi <strong>de</strong> Castro. Petrópolis: Vozes, 1974.26 Cad. Pesq., São Luís, v. 18, n. 2, maio/ago. 2011.