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Cronologia - Gazeta Das Caldas

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ActividadeEconómica1318 | Junho | 2010


UMA EMPRESA, VÁRIAS GERAÇÕESA travessia dos anos oitenta tinha sido, porém,muito dolorosa e a empresa enfrenta dificuldades.A nova administração resolve abandonaralgumas das áreas de negócio – artigos desportivos,caça e pesca, agricultura, etc. – e centrarsenos materiais de construção.”Não podíamosser um centro comercial e continuar comtanta dispersão”, conta Luís Saraiva, tambémadministrador da empresa. “Chegámos a ter73 funcionários. Hoje temos 36”.À decisãoJ. L. Barros – uma empresa caldense com quaOcartão de visita J. L. da Barros & Cunhas Gomes,SA ostenta no canto superior a expressão “Desde1918”. Um sinal de que a empresa se orgulha dosseus 92 anos de existência, apesar das atribulações da sua estrutura accionista.Tudo começou, pois, oitoanos depois de implantada a República e num período extremamente conturbadoda vida política portuguesa, quando Joaquim Luís de Barros Júnior abre uma lojana Rua Dr. Júlio Lopes que – tal como quase todos os estabelecimentos comerciaisda época numa vila da província – vendia praticamente de tudo.Em 1944 ocomerciante dá sociedade ao seu irmão, José Luís de Barros, ao seu contabilistaSebastião Cunha e ao funcionário César Lourenço. O capital social foi de 150contos (750 euros) e os dois irmãos detinham duas quotas de 50 contos e os doisfuncionários entretanto promovidos a patrões 25 contos cada.Alguns anos depois,César Lourenço compra as quotas de José Luís de Barros e de SebastiãoCunha, ficando imediatamente com 75% do capital. Mas como o seu objectivo nãoera ser sócio maioritário, combina com o outro fundador um aumento do capitalsocial para mil contos (cerca de 5000 euros) divididos em duas quotas de 500contos cada um.”Eram duas pessoas que se davam muito bem”, contaSalette Saraiva, referindo-se ao seu pai, César Lourenço e ao seu sócioJoaquim.Este último tinha casa na Foz do Arelho o que dava azo a dedicar-se à suapaixão pela caça e pela pesca, actividade a que dedicava muito tempo, deixandogrande parte da gestão da empresa a César Lourenço, no qual confiava plenamente.“Eram ambos muito sérios um com o outro e deram-se linda-mente”, sublinha a actual administradora.Nos finais dos anos setenta há umnovo aumento de capital, desta vez para 6000 contos (quase 30 mil euros), entrandoum novo sócio – Marcos Moreira de Barros – que fica com uma quota de 500 contos,equivalente a 8,3% por cento da sociedade.Com a morte de Joaquim Luís de BarrosJúnior, no início dos anos oitenta, sucede-lhe, por herança, a sua filha Carmen Barros(com quem <strong>Gazeta</strong> das <strong>Caldas</strong> não conseguiu contactar para obter o seu depoi-O casal Luís e Salette Saraiva são os administradores da J. L. Barros e representam a segunda geração.mento para esta reportagem). A liderança da empresa sofre alguma instabilidade eem 1987 César Lourenço adquire os 8,3% de Marcos Moreira de Barros e fica com a então que um dia ali passaria uma auto-estrada e muito menos que ficaria tãomaioria do capital. No ano seguinte compra a quota de Cármen Barros e torna-se o perto de um nó do que viria a ser a A8.”Quando soubemos, é claro queúnico proprietário da empresa. Mas, acto contínuo, procede a uma nova repartição doficamos contentes porque isso aumentou o valor da empresa. Des-capital com quotas de 25% para ele próprio, para a sua mulher, Maria Raposo Louren-de então temos sido pressionados por inúmeras empresas de váriosço, para a filha Salette Saraiva e para o genro Luís Saraiva.César Lourenço, que foisectores, para vender porque gostariam de transformar isto numaatingido pela doença de Parkinsson, morre em 1998.superfície comercial”. Mas o casal Saraiva não vende e o sócio Cunha Gomesestá de acordo.RECENTRAR O NEGÓCIOestratégica de assentar a actividade nos materiaisde construção, segue-se a entrada do grupoCunha Gomes, do Porto, que é um gigante nestemercado. Em 1991 a empresa caldense eleva o seu capital para 1 milhão de eurose torna-se uma sociedade anónima, com a necessária mudança de nome: J. L.Barros & Cunha Gomes, SA.Como o negócio agora não exige uma presença nocentro da cidade, a empresa vende a sua sede na Rua Dr. Júlio Lopes, cuja receitavai ajudar a financiar um investimento de 1 milhão de euros em modernas instalaçõesà saída da cidade, na Estrada da Foz. “O terreno já existia e tinhasido comprado no tempo do meu sogro, no fim dos anos setenta, por1100 contos [5487 euros]”, conta Luís Saraiva. São 10 mil metros quadrados,metade dos quais tem agora zona de vendas, salão de exposição e escritórios.Nem na altura da compra nem aquando da construção da nova sede, se sonhavaFoi criada em 1918 como uma loja que vendia quase tudo e atravessou o século XX comvárias mudanças na sua estrutura social. Hoje é uma sociedade anónima parceira domaior grupo de materiais de construção do país e chama-se J. L. Barros & Cunha Gomes,SA.Facturou no ano passado 5 milhões de euros e a administração não esconde as dificuldadesde uma empresa que pertence a um dos sectores mais expostos à crise.Salette Saraiva, filha de um dos sócios iniciais é hoje uma das administradoras daempresa, perfazendo duas gerações à frente dos seus destinos.O ACTO COMERCIAL ACABAVA NO MOMENTO DA VENDAToda a vida de Salette Saraiva está marcada pela J. L. Barros: “emmiúda brincava na empresa e lembro-me de estar ao balcãoa observar aquela actividade toda, lembro-me dos corredores,que na altura me pareciam enormes, onde se armazena-vam as mercadorias, e de andar por lá a ver e a mexer. Eraum fascínio. Aos sábados de manhã ia para o escritório dopai e sentava-me na secretária”.Não pensava, contudo, vir um dia a administrar os destinos dafirma. Salette Saraiva estuda e licencia-se em Germânicas, é professora,dá aulas no Magistério nas <strong>Caldas</strong> e no ensino secundário noBombarral, até que um dia o pai, consumido pela doença, lhe pedepara vir para a J. L Barros. Convite irrecusável.O marido, Luís, que foitambém funcionário da empresa, conta como a forma de trabalharde uma casa comercial evoluiu nas últimas décadas. Os materiais deconstrução, que dantes eram muito padronizados, passaram a sermais específicos e tornaram-se mais diversificados e completos. Edepois vieram as normas, as certificações de qualidade, as nomenclaturascomplexas. Luís Saraiva diz quejá nada é como era e que a actividadeexige hoje mais conhecimento e maisformação.Já a mulher e sócia refere a evoluçãoao nível da relação com o cliente.“Antes o acto comercial acabava nomomento da venda, agora o serviçoque prestamos só termina depois domaterial estar montado e validado,mantendo-se, ainda assim, o acom-panhamento pós-venda”, conta. Poroutro lado, a própria relação comercialevoluiu e hoje conta muito o aconselhamentoe o acompanhamento dos clientes, o que tem a ver com acomplexidade dos materiais.Desde os anos oitenta que a empresa,acompanhando os tempos, se abriu à comunidade. Costuma aceitarestágios profissionais de alunos das escolas Bordalo Pinheiro e TécnicaEmpresarial do Oeste, recebe visitas de estudo e, por vezes, ospróprios administradores são convidados a dar uma aula em escolasda cidade.Carlos Ciprianocc@gazetacaldas.comImagem da secção Caça e Pesca e da secção de Ferramentas. O armazém da empresa na Estrada da Foz, antes da construção da nova sede.


se um século de existência“Não vendemos nada que seja para o Estado”Oque fazer quando seestá numa actividade que é das maisfustigadas pela crise?Reduzircustos. A começar pelo pessoal.No ano passado, entre rescisõesde contrato e reformadosque não foram substituídos,a empresa reduziu o seu quadrode 47 para 36 pessoas. E aspoupanças noutras áreas têmsido tantas que “estamos achegar a uma estrutura decustas igual à de há 10anos”, conta Luís Saraiva.Em2004 a empresa facturou umpico de 7,3 milhões de euros,mas desde então tem vindo adescer e fechou 2009 com 5 milhões.As cobranças tambémestão difíceis e as próprias seguradorasdeixaram de seguraras vendas a crédito. Ainda assim,Luís e Salette Saraiva dizemque não vendem nada parao Estado porque este paga tãotarde que não compensa alienara mercadoria para um clienteassim.A J. L. Barros & Cu-César Lourenço - mais de 50 anos à frente da empresaCésar Lourenço (àdireita) com oPresidente da República,Ramalho Eanes, nofim dos anos setenta numadas feiras que então se realizavamno parque.O empresário esteve maisde meio século à frente dosdestinos da empresa e ocupouvários cargos nas <strong>Caldas</strong>da Rainha. Foi vereadorA sede da empresa na Rua Dr. Júlio Lopes. A carroça à direita era usada para ir buscarmercadorias à CP e aos Capristanos (mais tarde Claras e mais tarde Rodoviária Nacional).nha Gomes trabalha sobretudocom pequenas e médias empresasligada à construção, emborao segmento dos particularesnão seja displicente. Os resorts,como, por exemplo, o daSerra d’el Rey, são também ummercado alvo.O futuro é incerto.“Há sinais contraditóriosde retoma: há mais con-fiança, há empresas comoa antiga Rol que está a con-tratar pessoal, o que é bom,mas no nosso sector as em-presas que ainda tinhamobras no ano passado já asacabaram e ninguém está acomeçar nada. O sector estáparado.”C.C.César Lourenço esteve mais de 50 anos à frente dos destinos da empresada Câmara Municipal, presidenteda Comissão de Turismo e doGrémio Literário caldense (quemais tarde daria origem à associaçãocomercial) e foi dirigentedos bombeiros e da BandaComércio Indústria.“Ele encarava a empresaquase como um sacerdócio- tinha uma extrema atençãopara com os funcionários etinha sobretudo uma gran-de abertura de espírito, sem-pre disposto a aprender”,conta a filha, Salette Saraiva,que lhe sucedeu.Nascido em Vale de Maceira,César Lourenço esteve empregadonuma mercearia em S.Martinho do Porto e veio trabalharpara as <strong>Caldas</strong> depois deter sido despedido por uma vezter chegado atrasado. A famíliaveio a descobrir, após a suamorte, que nesse dia de 1939,César Lourenço iniciou um diárioonde passou a assinalaros acontecimentos mais importantesque o marcaram,não só os pessoais – como adescoberta de que tinha Parkinssonaos 47 anos – comoda vida social e política caldensee nacional.C.C.João Augusto -o trabalhador maisantigoTinha 11 anos o miúdoque no dia 31 de Outubrode 1955 se apresentouna Rua Dr. Júlio Lopespara iniciar o seuprimeiro dia de trabalhona conhecida firmacaldense.Viera das Gaeirasa pé e a pé continuariaa deslocar-se entreaquela (então) aldeia eas <strong>Caldas</strong> da Rainha durantemais quatro anos, até que o seu pai lhe comprou umabicicleta. Um salto de gigante para a época, que encurtava asdistâncias, difíceis de vencer sobretudo nas madrugadas e tardesfrias e chuvosas de Inverno.João Augusto fizera a 4ª classe,o que também naquele tempo já era escolaridade quase acimada média, pois no Portugal dos anos cinquenta nem todos tinhaminstrução primária. O normal seria ir trabalhar para o campoou arranjar alguma coisa na cidade.”O meu pai, que erafuncionário do Faustino Gama, aqui nas Gaeiras, como iamuitas vezes aviar-se ao J. L. Barros, conhecia o senhorCésar e fez-lhe o pedido”. Foi aceite. E começou por baixo,como seria de esperar – varrer a casa, fazer recados, levar encomendasa casa dos clientes, ir buscar materiais à estação da CPe aos Capristanos (rodoviária). Mais tarde passou a cortar papelpara embrulhos, a fazer massa para pôr nos vidros e, pouco apouco, saltou para o balcão onde pesava pregos e aviava osfregueses em produtos de menor responsabilidade.O primeiroordenado do aprendiz foram 60 escudos (30 cêntimos). JoãoAugusto diz que ainda se recorda das três notas de vinte (com aimagem do Sto. António) nas suas mãos. Ordenado, diga-se,apenas obtido ao segundo mês de trabalho porque no primeiro“era à experiência”.Nessa altura ainda não sabia que iria baterum recorde de longevidade no seio da J. L. Barros. Foram 53anos de trabalho sempre na mesma empresa, até que se reformouem Abril de 2009.Nunca pensou em sair?”Houve fases daminha vida em que me abordaram para mudar de patrão,mas acabava sempre por chegar a entendimento e fuicontinuando. Na altura era fácil sair e entrar noutra firmaporque eu tinha conhecimento de ferragens e haviaempregos”.O horário era de segunda a sábado e já só na idadeadulta é que este funcionário passou a ter a “semana inglesa”,ficando livre a partir das 13h00 de sábado. “Mas para issotivemos ainda de fazer uma greve. Antes do 25 de Abril”,conta, explicando que foi uma greve de todo os empregados decomércio e que se traduziu no encurtamento da semana de trabalhopara as 44 horas.É claro que a vida foi melhorando. JoãoAugusto nunca abandonou as Gaeiras e foi na sua aldeia quecasou e continuou a viver (hoje, paredes meios com filha, genroe netas). Mas depois da bicicleta seguiu-se uma motorizadapara ir para o emprego, mais tarde o inevitável carro e quandose reformou, o rapazinho que ia a pé para o trabalho, fazia-setransportar num Peugeot 206 (que hoje leva para a fazenda, comas alfaias na parte traseira). Do seu patrão, César Lourenço,guarda a imagem de um homem “muito apegado à casa emais próximo dos funcionários do que o sócio [Joaquim],que era assim um bocadinho mais desprendido e dedica-va-se mais à caça e à pesca”.E quanto à actividade em si,também a firma acompanhou a evolução dos tempos. Ao princípio,vendiam ferragens, pulverizadores, charruas, torpilhas, prensaspara lagares e muitas miudezas como redes, cimentos, ferro,mais tarde azulejos. Hoje o universo da J. L. Barro é outro,bem mais complexo. Seja como for, o próprio João Augusto,deixaria, às tantas de aviar ao balcão e passou a ter outrasresponsabilidades. Quando se reformou, já não aviava ao públicoe trabalhava na secção de compras da empresa.C.C.


UMA EMPRESA, VÁRIAS GERAÇÕESFerreira & Santos, Lda. – uma só firma com duas áreErnesto Ferreira. Se fosse vivo teria 99 anos. Foi ele quefundou a firma que já vai hoje na terceira geração.Durante 11 anos Ernesto Ferreirade Sousa teve o prazer detrabalhar em conjunto com o seufilho, João Maria e as netas MariaJoão e Ana Ferreira. Quando morreu,em 2000, com 89 anos, estecomerciante caldense deixava assimem boas mãos o negócio daourivesaria e das duas ópticas(uma delas comprada meses antes)com que fizera nome na cidade.Ernesto Sousa nasceu em 1911e começou cedo a trabalhar comoourives. Mas não quis ficar empregadotoda a vida e em 1941estabelece-se por conta próprianuma loja no Largo Heróis de Naulila,ainda como comerciante emnome individual. Três anos depoismonta uma sociedade com AugustoMendes dos Santos (1903-1994). Nasce assim a Ferreira &Santos, Lda. que é hoje uma dassociedades por quotas mais antigasdas <strong>Caldas</strong>.Durante a década de cinquentaa firma alarga a sua actividadeà óptica, com uma loja na Rua JoséMalhoa. João Maria conta que adecisão do seu pai teve em contao facto de na ourivesaria Mourão(onde ele antes trabalhara) sevenderem também óculos e por,à data, haver apenas uma lojadesse ramo na cidade.Durante meio século a firmacoexiste com os dois negócios,mas as novas tecnologias e omercado haveriam de ditar umpeso maior do ramo mais inovador,aquele que constitui hoje um“pelouro” das suas duas filhas.João Maria prefere a ourivesaria,mas reconhece que é hojemais um coleccionador do que umourives. E conta que o seu estabelecimentosempre teve um elementodistinto que é a joalhariaantiga. “É a área em que maisgosto de trabalhar, as pratas,as jóias, os objectos de artecom incorporação de joalha-ria, imagens de marfim comaplicação de pedras precio-sas e semi-preciosas... enfim,é esse mais o meu mundo”, diz.Por isso, a sua loja não é hoje“Sou mais um coleccionador do que um comerciante”. João Maria Ferreira na sua discreta ourivesaria. Herdou onegócio do seu pai e ainda mantém a firma Ferreira & Santos, Lda, que gere com as filhas, tendo alargado a actividade àópticaum estabelecimento permanentementeaberto ao público, comum corropio de clientes a entrar ea sair. Pelo contrário, a discretaloja aparece meio escondido emplena Praça da Fruta, mantendono interior o mobiliário de origemdos anos quarenta.Dir-se-ia que o tempo não passoupor ali, mantendo intactas asmadeiras e os expositores de vidroonde se guardam peças quepoderiam já lá ter estado há 50anos. Também discretas, duas câmarasde vídeo – que zelam pelasegurança - são os únicos sinaisde modernidade.“Neste momento sou maisum coleccionador do que umcomerciante”, diz João MariaFerreira, que se entretém com assuas peças e atende alguns clientesocasionais. Em linguagemmoderna poderia dizer-se que asua actividade está a ser “descontinuada”.Nem sempre foi assim, claro.Nos anos quarenta e cinquentaas ourivesarias respondiam a umaprocura de “ostentação”, sobretudoda burguesia endinheiradaA Ferreira & Santos, Lda. começou por ser uma ourivesaria em 1944, masalargou os seus negócios ao ramo da óptica. João Maria Ferreira, 77 anos,filho do fundador, reparte hoje com as duas filhas a gestão de uma firmaque inclui a ourivesaria e as lojas Novoptica e Óptica Ramiro.que gostava de comprar jóias epeças de ouro muito trabalhado.E respondiam também à necessidadede entesouramento por partedas classes mais baixas.“As pessoas não tinhammuita apetência para os bancose para os produtos finan-ceiros e o aforro era o ouro”,conta João Maria. Os fios, pulseirase colares deste metal podiamser usados no dia a dia, ou nasocasiões festivas e tinham a vantagemde, a qualquer momento,serem vendidos (ou penhorados),transformando-se em dinheiro.A clientela tradicional das ourivesariaseram “a gente domar” e “a gente do campo”,que usavam objectos de ouro maispesados, que valiam pelo seu pesoe valor facial, enquanto que osricos preferiam um ouro mais rebuscado,com incorporação demão-de-obra, ou seja, - outro termomoderno – com valor acrescentado.Carlos Ciprianocc@gazetacaldas.comO quotidiano caldense de 1947 a desfilar em frente à ourivesaria


as de actividadeO negócio das ópticas em expansãoMaria João Henriques PinheiroFerreira, de 54 anos e a irmã AnaFerreira Isaac, 41 anos, são, emconjunto com o pai, João MariaFerreira, os três sócios-gerentesdesta sociedade que é compostapor uma ourivesaria e duas ópticas.Ainda crianças, as duas irmãsmoviam-se entre a tabacaria Ibérica,ali bem perto, onde trabalhavama mãe e a sua madrinha(mulher de Augusto Mendes dosSantos, sócio do pai).Depois da escola primária e doExternato Ramalho Ortigão, MariaJoão fez o Magistério Primário(nos Pavilhões do Parque) e chegouainda a leccionar em VilaFranca Xira e nos Mosteiros (<strong>Caldas</strong>da Rainha). Mas já nessa alturaos professores andavam coma casa às costas e quando se lhedeparou uma colocação demasiadolonge das <strong>Caldas</strong>, Maria João,então com 29 anos e já casada,optou por ficar a trabalhar na ourivesariado pai.Não por muito tempo porqueem breve, em 1994, a firma decideabrir ali mesmo ao lado a Ópticada Praça. A sua mudança paraeste novo estabelecimento surgenaturalmente.“Sempre tive a percepção deque o negócio das antiguidadesa que o meu pai se dedi-cava era muito específico eque ele é que era o especialis-ta da área. Na verdade, nãoera muito apelativo para mime por isso decide-me pela óp-tica”, conta a empresária.A formação foi feita com a experiênciaadquirida e, mais recentemente,devido à complexidadedesta área, com acções promovidaspelos fornecedores e em viagensde trabalho.Hoje em dia uma óptica é muitomais do que uma loja que vendeóculos. Existe a óptica médica(cujos artigos só se vendem comreceituário médico), e a venda deartigos como óculos de sol, binóculos,termómetros, barómetros eobjectos afins. E há também os serviços,como os testes de visão, feitoshoje facilmente na loja, mas quehá 20 anos só podiam ser realizadosno oftalmologista porque necessitavamde uma tecnologia queainda não estava massificada.A responsável da Óptica Ramirorefere ainda as especificidadesdas lentes de contacto. “Dan-tes só havia as rígidas e assemi-rígidas, mas hoje há len-tes descartáveis que se usamdurante um mês ou até só porum dia”, conta.Já a irmã, Ana, andou no “liceu”,no Parque, e foi inaugurar oedifício da Raul Proença onde concluiuo secundário. “Assim queacabei o 12º ano tomei logo adecisão de vir trabalhar como meu pai. Foi uma decisão demomento, não tinha pensadomuito nisso antes, mas a ver-dade é que era importante darcontinuidade ao negócio dafamília”. Estava-se em 1986 e Anatinha então 18 anos. Desde entãonão mais largou esta actividade,partilhando a gestão com a irmãe o pai.A CRISE, A CONCORRÊNCIA EO COMÉRCIO TRADICIONALAs duas ópticas da Ferreira &Santos são praticamente vizinhas:Novoptica e Óptica Ramiro distamescassos 10 metros uma da outra.Não fazem concorrência entresi?As duas irmãs sócias dizem quenão. E explicam que - apesar dosclientes actualmente serem muitovoláteis e não haver a mesmafidelização que havia antigamente- é possível distinguir um segmentode mercado mais urbanona Óptica Ramiro e outro, de pessoasmais de fora da cidade, naNovóptica.A Ferreira & Sousa é, assim,um pequeno grupo económico quedetém uma ourivesaria e duasópticas. Emprega dez pessoas (incluindoos gerentes) e conta aindacom duas médicas oftalmologistase uma optometrista que alidão consultas várias vezes por semana.A sua facturação aproxima-sede 1 milhão de euros.A crise tem-se feito sentir, masa empresa, não estando pujante,está longe de sofrer dificuldades.“Noto que há quem tenhadificuldade em fazer a consul-ta e comprar os óculos nomesmo mês. E quem peça parapagar a prestações”, diz MariaJoão. Estes são alguns dos sinaisMaria João e Ana Isaac. As duas irmãs e sócias partilham com o pai a gestão da firma.da crise, mas também há as mudançasde comportamento dosconsumidores. Por exemplo, osóculos de sol, que já foram umnegócio florescente, estão embaixa porque há-os em todo o tipode lojas, mais baratos e de menorqualidade. “É mais agradávelter quatro pares de óculos desol, um de cada cor, do queter um bom par de óculos dequalidade”, ironiza a empresária.Já a entrada em cena do Vivaci,que possui a marca Multiópticas,não teve um impacto relevante.“É claro que ao princí-pio faz sempre mossa porqueos preços deles são muitocompetitivos e a sua publici-dade é muito agressiva, masdepois do primeiro impactotudo volta ao normal”.A irmã, Ana Isaac, acrescentaque a óptica ainda funciona comoum negócio de proximidade, confiançae de competência, onde aspessoas, sobretudo no caso daslentes, gostam de um acompanhamentomais personalizado emais familiar do que aquele queexiste em algumas marcas doscentros comerciais.Com os três estabelecimentosda firma situadas em pleno centroda cidade, as duas empresáriastêm uma visão muito própriado comércio tradicional: “fazsempre falta o comércio derua, até porque as pessoas sefartam também de estar nosespaços fechados dos cen-tros comerciais. É agradávelandar na rua às compras.Mas temos que oferecer qua-lidade e produtos distintospara contrariar a massifica-ção dos produtos que estãoem todas as grandes superfí-cies comerciais”.As duas irmãs dizem que nuncachegou a haver conflito de geraçõesna firma: “Deixámossempre a gestão das coisasmais importantes ao nossopai e ainda hoje é assim. Podehaver uma ou outra discordância,mas normalmente es-tamos de acordo”.C.C.Augusto Santos (1903-1994) foi sócio de João MariaFerreira. Na foto, datada de 13/05/1960, está com a mulher,Amélia Santos, no quintal da ourivesaria.João Maria Ferreira e o pai, Ernesto Ferreira, na ourivesaria em 1993CRONOLOGIA1941 – Ernesto Ferreira deSousa estabelece-se comocomerciante em nome individualnuma ourivesaria noLargo Heróis de Naulila1944 – Forma sociedadecom Augusto Mendes dosSantos e criam a Ferreira &Santos, Lda. na Praça da República1954 – A sociedade abreuma óptica no Largo Heróisde Naulila1974 – Abre a Novóptica, naRua José Malhoa1994 - Abre a Óptica da Praça,na Praça da República, aolado da ourivesaria. E fechao estabelecimento no LargoHeróis de Naulila.1999 – A firma compra a ÓpticaRamiro, na Rua José Malhoa2007 – Encerramento daÓptica da Praça


UMA EMPRESA, VÁRIAS GERAÇÕESMaratona – o café dos anos sessenta que é hoje um“Foi sem nada que ele foipara África e foi sem nada queele voltou de África”. É assimque José Elói, 36 anos, resumeuma boa parte da vida do seupai, Eloy Vale (1934-2005), quecriou uma importante empresacomercial em Moçambique, perdidadurante a descolonização.Em 1975, ao regressar à exmetrópole,o empresário nãoteve outro remédio a não ser começardo nada e iniciar em S.Martinho uma fábrica que nãoteve êxito, acabando por vir paraas <strong>Caldas</strong> iniciar-se no negócioda restauração.Mas comecemos pelo princípio.Eloy Nunes Varela Ramos doVale nasceu em Molelos (Tondela),em 1934, filho de gentepobre. Escapa à labuta do campoe parte para Moçambique “embusca do sonho africano”,como conta o seu filho, José Elói.“Começou do nada, mas ládeixou um pequeno impériode lojas, fábricas e armazénsque comercializavam, desdeum alfinete até toneladas decereais, exportando mesmopara a Europa e América doSul”.O 25 de Abril de 1974 e a consequenteindependência de Moçambiquee a guerra civil naquelepaís, obriga-o a um regressoforçado, deixando para trás tudoo que possuía. Acompanha-o amulher, Antónia Filomena VelhoRamos do Vale (1945-2004), e JoséElói, então um bebé, nascido doisanos antes em Quelimane.A família regressa às origens,a Molelos, enquanto não decideque rumo dar à nova vida. MasEloy Ramos do Vale tem espíritoempreendedor e pouco depoisestá em S. Martinho do Porto ainvestir numa fábrica de placasde cimento que, contudo, nãoteve sucesso e fecha em 1979.O empresário vem para as <strong>Caldas</strong>da Rainha onde, em 1978,toma de trespasse o Café ClarasJosé Eloi, 36 anos, prossegue o negocio da família num Maratona renovado(na Rodoviária) e em 1980 o CaféMaratona. Durante 12 anos exploraráos dois estabelecimentos,até que, em 1992, devido àdoença da mulher, renuncia aoQuem visita hoje o Maratona não dirá que este é um dos cafés mais antigos das <strong>Caldas</strong>. Data dosanos sessenta, mas a decoração é actual e o estabelecimento tem sido notícia devido a iniciativasinéditas e vanguardistas.A história de um café, hoje também restaurante, que transitou dos pais para o filho e a quem estesoube dar continuidade.Claras.“Ele optou por ficar com oMaratona porque o tipo deespaço era mais vantajoso epodia ser trespassado paraqualquer actividade, ao con-trário do Claras que teria deser sempre um café”, conta ofilho, que nessa altura já ajudavaos pais nos dois estabelecimentos.“Comecei a aprender a pro-fissão com 12 anos”, diz. Masnessa altura não contava seguiras pisadas dos pais. José Elói confessaque era um pouco rebeldee que não foi fácil o relacionamentofamiliar durante a juventude.Saiu do “métier” que aprendera,mas regressou mais tardequando viu que a saúde dos paisnão lhes permitia continuaremsozinhos com o negócio.A mãe morreria em 2004 e opai, a quem tinha sido diagnosticadauma doença grave algunsanos antes, estava cada vez maisdebilitado. Pouco a pouco o jovemfoi assumindo de forma cadavez mais séria a actividade dospais. E foi-se tornando um empresário.“Ao princípio não tinha ascoisas definidas. Vim para ocafé para responder a umanecessidade, para desenras-car. Não pensava então queeste seria o meu futuro. Sóem 2001 é que assumi o pro-jecto uma forma clara, o quelevou o meu pai a pôr o negó-cio no meu nome”.José Elói passou assim a ser oúnico detentor da firma Vale &Costa, Lda. Tinha 27 anos.Durante algum tempo não fezmuitas alterações ao funcionamentodo Maratona que, recorde-se,era composto por umasala de jogos e por um café.“O meu pai era um empresárioà antiga, que fazia mui-tas contas e não avançavade imediato”, conta. Por isso ofilho também demorou algumtempo até se decidir por umaautêntica revolução no estabelecimento.Eloy Vale e Filomena Vale foram durante mais de 20 anoso rosto do MaratonaEm 2009 fecha quatro mesespara obras e reabre depois comum Maratona irreconhecível.Prescinde da sala de jogos, umespaço demasiado grande nocentro da cidade para estar tãodesaproveitado, e transformaonum restaurante com bar ànoite. E o café reaparece comoutra decoração e um serviçocompletamente diferente. Umaassumida ruptura com o passado.“Esta obra foi feita porqueachei que o conceito tinha deser alterado, mas teve queueser primeiro pensado e tra-balhado. Não basta a obrafísica, era preciso ir mais lon-ge para haver retorno”.A aposta foi ganha e hoje oMaratona é uma referência nacidade em termos de qualidadede serviço. Nele trabalham 12pessoas a tempo inteiro e seteem part-time, sobretudo estudantesque ali fazem umas horas.“É um negócio muito dependentedos recursos humanospara a pouca rentabili-dade que tem”, diz José Elói. Sóna cozinha estão sete pessoas,“uma estrutura muito pesa-da e que é a menos visível”,mas decisiva para manter o patamarde qualidade que impôs.À noite o conceito muda e oMaratona transforma-se numbar. E vai surpreendendo com iniciativasarrojadas como a dosjantares com menus feitos comrecurso a técnicas de esferificação,liofilização e gelificação.“Hoje o meu pai teria orgu-lho no Maratona”, diz.Carlos Ciprianocc@gazetacaldas.comJovens caldenses dos anos sessenta. Da esquerda para a direita, Ana Belo Nascimento,Helena Magalhães e Francisco Vieira LinoO café pouco antes de ser remodelado


símbolo de modernidade das <strong>Caldas</strong>Tudo começou com uma pista de corridasUma café que marcou uma épocaO Maratona terá sido inauguradono Outono de 1966, de acordocom José Elói, que recuperaagora a memória deste emblemáticocafé. Certo mesmo é queo alvará data de 15/02/1967 e quea primeira sociedade que exploravaaquele espaço se chamavaMaratona Centro Ideal de Diversões,Lda.O nome não era inocente. Osseus sócios, onde se incluíam algunsdos mais destacados cidadãoscaldenses da época (AbílioFlores, Eng. Arroz, Bento Monteiro,Hergildo Velhinho (autor domural ainda hoje existente naentrada do restaurante) eramapaixonados na época por umdesporto emergente que eram ascorridas de carros eléctricos telecomandados.O Maratona tinha,por isso, como principal objectivocriar um espaço onde existisseuma pista de corridas. Ao queconsta esta terá sido uma dasmelhores do país.O café surge como um complementoà pista de carros, e sendoeste um desporto um pouco elitistana altura, o estabelecimentotransforma-se logo desde o seuinício num dos mais finos da cidade,imagem que manteve durantelongos anos.Mas as modas passam e a doscarros de corrida também passou.Por outro lado, as sociedades commuitas pessoas envolvidas tornam-sedifíceis de gerir e o Maratonafecha em fins de 1970 parareabrir pouco depois com umanova firma, datada de 4/02/1971 eintitulada Sociedade de EmpreendimentosTurísticos PrimaveraCaldense Lda, constituída porManuel Santos, José Vardasca,António Silvestre e António Vazquez.Terá sido esta sociedade queviria a dar inicio ao Salão de JogosMaratona, retirando a pistade carros e colocando cinco bilharese um snooker grande.Com estes proprietários o estabelecimentodurou uma décadapois em finais de 1979, iníciosde 1980, o Maratona volta a fecharportas, numa situação detotal falência com muitos dosseus bens penhorados pelas Finanças.Em 24 de Junho de 1980 é criadaa empresa Vale e Costa Lda.constituída por Eloy Ramos doVale e Antónia Filomena CostaVelho Ramos do Vale, pais de JoséElói. O alvará de licença data de11/12/1980, mas o estabelecimentoapenas virá a reabrir portas em4/03/1982, com a introdução nasala de jogos de umas inovaçõesabsolutamente fantásticas paraa época - máquinas de vídeo eflippers!O café manteve sempre a suaactividade regular, sendo reconhecidopela sua qualidade e bomgosto. Na sala de jogos foi-se trocandoalguns bilhares por snookers,surgindo em 1984 o grandeboom das máquinas de poker, situaçãoque durou até ao governode então voltar a proibir a exploraçãodos referidos jogos a dinheiro(algures em finais de 1985).Nos anos oitenta as <strong>Caldas</strong> daRainha estão inundadas de cafés,não pertencendo mais o Maratonaà meia dúzia de estabelecimentosdesse tipo que tinhammarcado os últimos vintes anosna cidade.Mas o casal Eloy e FilomenaVale aguenta-se no negócio. Afinalhavia uma história, um nomefeito e uma localização central nacidade.Em 30/09/2000 Filomena Valecessa funções como sócia gerente,devido a doença, sendo substituídatrês meses depois por JoséElói do Vale, seu filho.“Nos anos seguintes e deuma forma natural o meu paifoi-se afastando por motivosde doença, vindo a falecer aminha mãe a em Abril de 2004,com 59 anos, e o meu pai emMaio do ano seguinte com 70anos. Fui introduzindo gradu-almente novos conceitos decafetaria e refeições ligeirasque culminaram em 2009 comas obras de remodelação e alteraçãoda antiga sala de jo-gos em Restaurante LoungeBar. Fechei em 13 de Fevereirodesse ano e reabri com a ter-ceira geração Maratona em10 de Maio”, conta José Elói.Na remodelação houve o cuidadode recrear elementos doprojecto original, manter outrosdo intermédio, e ao mesmotempo criar uma estética modernae actual, com o propósito demanter viva a história do espaço.O rosto dessa “terceira geraçãoMaratona” diz agora que sesente “totalmente compensa-do pelo resultado final dessaremodelação, ao qual nin-guém fica indiferente”.C.C.“Aquela pista era um espectáculo”O meu pai não foi sócio fundador daMaratona, mas esteve ligado ao projectodesde o início pois foram os Móveis Serranoque fizeram o mobiliário do café, naaltura muito moderno para a época e paraa cidade. Lembro-me perfeitamente delá estar antes da inauguração e depoisna pista dos carrinhos, que eu adoravaver, mas como era muito pequeno e nãotinha dinheiro para um dos super bólides, andava por vezes comos carros da casa, que se podiam alugar, ou algum amigo meemprestava um para dar umas voltas. Aquela pista era um espectáculoe quando foi retirada vi-a mais tarde desmontada numarmazém na quinta do meu tio Henrique Sales Henriques.Depois da pista vieram os bilhares e uma mesa de snuker, aofundo, onde joguei muitas vezes com os meus amigos, especialmentequando não tínhamos aulas na Escola Comercial e Industrial,e mais tarde quando vínhamos de Lisboa de férias. Nessaaltura o Maratona era um ponto de encontro para a rapaziadadas <strong>Caldas</strong>.O campeão de Fórmula 1Carlos GouveiaQuando tinha 18 anos, João Paneiro foivárias vezes medalhado e ganhou taças porter conseguido cortar a meta à frente dosadversários nas corridas de carros que faziano Maratona. Apesar de se tratarem de miniaturas,nem por isso se poderia prescindirde uma boa dose de destreza, reflexos rápidose até uma dose de coragem para arriscarfazer curvas em grande velocidade sem arriscar um despiste quedesse cabo de uma daqueles caríssimos modelos.Era assim no Maratona dos anos sessenta. Nas <strong>Caldas</strong> daRainha havia um grupo de gente crescida que era fã das corridasde automóveis e o café era o ponto de encontro onde se assistiaàs provas, se discutia a tecnologia e os componentes do váriosmodelos e, naturalmente, se disputavam torneios.“Havia um senhor chamado Fernando da Ponte e Sou-sa, proprietário da Secla, então já com mais de 60 anos,que tinha muitos e bons carros e pouca habilidade. Porisso emprestava a alguns jovens da sua confiança paraos conduzir. Eu era um desses felizes contemplados e derepetente passei a ter uma panóplia de carros high tec àminha disposição. Lembro-me de um super fórmula 1 comtracção às quatro rodas que utilizei”. João Paneiro contaque aquelas corridas lhe davam “um gozo enorme” e que sãomuito gratas as recordações que guarda daquele período.A febre do modelismo ainda durou alguns anos, mas entretantoa cursar engenharia para Lisboa e só aos fins-de-semanavinha às <strong>Caldas</strong>, muitos deles ocupados a estudar. As velozescorridas de automóveis acabou por ser apenas uma recordação.Mas hoje, com 63 anos e reformado, ainda guarda alguns dosgalardões que recebeu na altura.C.C.Imagens dos anos oitenta. Mais do que um simples café, o Maratona esteve sempre associado ao recreio, primeiro com uma pista de automóveis e depois com as máquinas de jogos e bilhares


UMA EMPRESA, VÁRIAS GERAÇÕESTúnica – A primeira loja especializada em produtos d“Fomos a primeira casa es-pecializada em artigos parabebé nas <strong>Caldas</strong> e na região”,conta Fernanda Tomás, explicandoque o seu marido, depois de terpassado pela Casa Tomás aindalaborou para a firma de SerafimMoreira - onde é hoje a Açoteia - epassou por uma loja–atelier naMarinha Grande.Depois de fazer a tropa, e já casado,Carlos Tomás iniciava o seupróprio negócio. “Arrendámos em1970 um espaço na Rua dasMontras numa época em quenão havia muitas lojas disponíveise o aluguer era caríssi-mo”, disse a empresária, que hojetoma um papel de relações públicasdeixando a gestão aos dois filhos.A Túnica arrancou com a vendade tecidos a metro, atoalhados elingerie, tirando partido da sua experiêncianas casas onde já trabalhara.“Daquela geração, fomosdos primeiros a arrancar sozi-nhos”, disse Fernanda Tomás, recordandoque antes de ser Túnica,a loja arrendada era a Pastelariado Sr. Martins, da qual “ainda tenhoalguns móveis dessa altu-ra”. Para a época, “o o trespasseera razoável, mas muito caroera o valor do arrendamento”.Para encetar um novo negócioCarlos Tomás teve de sair da casacomercial onde laborava enquantoFernanda Tomás - então funcionáriada Contabilidade no Hospital –nunca teve intenção de deixar o seuemprego.No início era o seu salário quegarantia o pagamento da renda.Tomaram a decisão de arrendar aloja aproveitando o facto de Fernandater então sido aumentadade 2350$00 (11,72 euros) para 2450$00(12,22 euros). “Sobravam-nosapenas 50$00 [25 cêntimos] poisa renda era 2400$00 [12 euros],muito dinheiro naquela época”,recordou, acrescentando que o marido,quando saiu da última casacomercial, já ganhava 3300$00 (16,46euros).Nos anos 70 não era normal nas<strong>Caldas</strong> que as esposas dos comerciantestrabalhassem. “Desde quese abrisse uma loja, as senho-ras adquiriam o estatuto de nãoFernanda e Carlos Tomás, o casal fundador da Túnicano início dos anos setentatrabalhar”, lembrou a fundadora.Devido a este facto, o seu lugar naContabilidade no Hospital Distritalcomeçou a ser cobiçado.“Quando o meu chefe, o sr.Manuel Valente Sanches meveio informar que havia três ouquatro pequenas que já lhe ti-nham pedido para ficar com omeu lugar, tive que lhe explicarque este não estava à disposi-ção” e que dependiam daquelesalário para assegurar o negócio.A sua mãe também era funcionáriapública e Fernanda Tomás fezo curso geral do Comércio na EscolaComercial e Industrial. “Paragrande desgosto do meu painão quis estudar mais, já namoravao meu marido e querí-amos casar...”. Segundo a viúva,Carlos Tomás tinha alergia aos estudos“mas era um autodidactamaravilhoso”.Quando abriram portas, a 15 deJunho de 1970 sabiam que podiamcontar com pais e sogros “mas,felizmente, nunca precisámos”,disse.“Oh Fernanda, traz-meroupinhas de bebé de Lisboa”Corria o primeiro ano da aberturada Túnica e Fernanda Tomás iacom muita frequência a Lisboa areuniões no Ministério da Saúde.Era habitual as suas colegas pedirem-lhepara trazer roupas debebé, cuja oferta quase não existianas <strong>Caldas</strong>.“Nós também estávamosansiosos pelo primeiro filho eeu passei a comprar roupa e achamar a atenção do meu ma-rido para esta necessidade demercado”, recordou Fernanda Tomásque diz que a vontade do casalde ter um filho acabou por determinara mudança de negóciode têxtil lar para produtos de bebé.Carlos Tomás dizia à esposa queFernanda e os filhos, Alexandre e Dulce. A segunda geração gere a Túnica com osmesmos valores dos paisnunca tinha trabalhado com peçasde roupa tão pequenas, masde um dia para o outro acabaramcom os tecidos e inovaram o comérciolocal apresentando umacasa comercial totalmente dedicadaao bebé. O carrinho do primeirofilho, Alexandre, “já foicomprado a um dos nossosfornecedores”, contou a fundadora.O casal Carlos e Fernanda Tomásacabava por servir de exemploe incentivar outros comerciantesa tomar em mãos os seus negócios.Ao fim do dia “juntáva-mo-nos aqui a conversar, àporta da loja”, recordou, dizendoainda que havia então interajudae aconselhamento sobre oque fazer em relação aos negócios.A empresária sempre fez e continuaa fazer a escrita das suaslojas e recorda que já mesmo quandoestava no Hospital, abdicava dorecebimento das horas extraordinárias,preferindo ser compensadaem tempo livre para poderacompanhar o marido aos fornecedoresa fim de conhecer as novascolecções.“Às Às vezes saíamos às qua-tro da manhã para estar àsCarlos Tomás (1942-2005) foi marçano da casa comercial do seu tio, na Casa Tomás, situada naPraça da Fruta e começou a trabalhar novo, aos 13 anos. Mal sabia então que com 28 anos e com aajuda da sua esposa, então com 24, iria começar o seu próprio negócio na principal rua comercialdas <strong>Caldas</strong>. “Não foi nada fácil…”, recorda a viúva Fernanda Tomás, mulher de força e coragem,que sempre apoiou o seu marido e o ajudou a tomar decisões.Juntos construíram as bases do grupo Túnica - hoje com três espaços comerciais nas <strong>Caldas</strong> exclusivamentededicados aos produtos para bebé e criança – e no qual já participam na gestão os filhosdo casal, Alexandre e Dulce. As três lojas facturaram 734 mil euros em 2008.oito na porta do Pimenta Ma-chado em Guimarães”, recorda.Hoje parece incrível a FernandaTomás como cabia tudo na loja daRua das Montras. “Chegámos ater expostas 10 camas de bebée várias banheiras, não mepergunte como, mas tínha-mos”. Passados alguns anos, começarama investir na especializaçãodentro da mesma área e criarammais dois espaços comerciaisna cidade.“Ao fim do dia ou do mês, odinheiro que entra na caixa nãoé nosso. Nunca em 40 anos tivemosum atraso de pagamen-to de uma factura”, contou a fundadoraque não gosta de trabalhara crédito e aproveita sempre todasas oportunidades de pronto pagamento.“Não se dava o passomaior que a perna”, conta a matriarca,explicando que esse espíritofoi passado aos filhos.“Creio que houve sempreuma grande dedicação e muitotrabalho”, reforçou. A loja até poderiafechar às sete da tarde, masera frequente saírem do estabelecimentoà uma e tal da manhã poisera àquela hora que ficavam prontasas montras. “Quando saíamosera frequente encontrarmoso casal da Zélu que tam-bém saía muito tarde da sualoja”.São os próprios proprietáriosque fazem a decoração das lojas edas montras e mantêm como símboloa mesma máquina registadoraque já tinha vindo com o trespasseda pastelaria. O máximo que davaera 9.999 escudos e havia comprasrelacionadas com o enxoval dos baptizadose que ultrapassavam os 10contos, logo tinha que se colocar adiferença num outro registo. Agora,com os euros, “já está tudo bemoutra vez pois não vendo a nin-guém 9.999 euros em roupa paracriança”, disse Fernanda Tomás.Natacha Narcisonnarciso@gazetacaldas.comA loja da Rua das Montras em 1971 quando ainda não se dedicava a produtos para bebé, o que viria a acontecer pouco tempo depois


e bebé celebra o 40º aniversário“Nos anos setenta <strong>Caldas</strong> tinha uma grandecapacidade de atracção que hoje não tem”metros quadrados de exposiçãodistribuídos por dois pisos. “Nas<strong>Caldas</strong> não existia este concei-to, aplicámos um modelo quehavia noutros países, que é oda especialização das grandecadeias”, contaram.Esta loja acabou por ter o mesmoimpacto que o estabelecimentoda Rua das Montras quando seespecializou em produtos de bebé,em 1972. O problema é que 20 anosdepois a realidade comercial eradiferente. Havia agora uma novaforma de concorrência da grandeO estabelecimento na Rua do Jardim é a terceira loja dafamília Tomásdistribuição: abriam os hipermercados.“Convém lembrar quehavia excursões para ir aosprimeiros hipermercados àAmadora e mais tarde a Leiria”,disseram, recordando que esta formade comercialização acabou porcontribuir para a que apanhou ocomércio tradicional desprevenidoe foram muitas as lojas em diversaslocalidades que tiveram queencerrar. Hoje, para combater asgrandes superfícies, “temos queaplicar fórmulas e adoptar es-tratégias de competitividadeaguerridas que mantemos atéhoje”.Quando abriram a Super Túnica,já existia no Bairro Azul o CentroComercial Barão, o que ajudou adinamizar aquela zona.“Aqui não há a menina doshopping”Já em 1996 decidem abrir a terceiraloja, esta na antiga Rua doJardim, para o segmento de roupados oito aos 16 anos.Logo após a abertura da loja noBairro Azul, o pai Carlos Tomás, aos54 anos, foi vítima de um AVC, “oque me obrigou a assumir maisresponsabilidades e a crescerrapidamente naqueles meses”,conta Alexandre Tomás que, na altura,tinha 24 anos. O pai recuperariadeste susto, mas em 2001 viria asofrer um segundo ataque que odeixou incapacitado. Falecia quatroanos depois.Nesses anos dramáticos para afamília, Fernanda passa a dedicarsemais ao marido, remetendo onegócio da família para os filhos.Alexandre tinha frequentado o cursode Direito e Dulce terminara jáuma licenciatura em Economia e trabalhavanum banco.Estes herdaram os valores dospais e é com orgulho que dizem que“nunca incumprimos uma fac-tura”. Se o negócio tem um segredo,dizem, este será “a a integrida-de, o ser sério e não enganar”.A empresa labora com cincoempregadas, além dos responsáveis,desde há muitos anos, nãosendo politica da casa a rotatividadedo pessoal. “Aqui não há amenina do shopping”, contamAlexandre e Dulce Tomás explicandoque valorizam a experiência.“Contamos com profissionaiscompetentes e empenhadasque vestem a camisola”, disseram,acrescentando que afinal “to-dos dependemos do sucessodas lojas e todos sentem a Tú-nica como delas”.Na Túnica já se vendeu um carrinhode bebé que seguiu para Timore um par de sapatos que seguiupara o Japão. Mais usual são osenvios de produtos para clientes noBrasil e em Angola, cada vez maishabituais.“Temos uma cliente em Franentesquando surgiram os “ovos”de transporte, com os pais a dizerque nunca iriam transportar os filhos“numa coisa torta”. Hoje todaa gente possui aquele suporte, adaptávelaté ao automóvel, provando“que tudo muda em tão poucotempo”, remataram.<strong>Caldas</strong> deveria ter um planocomercial como tem uma loja“A cidade das <strong>Caldas</strong> deviater um planeamento estratégicoe uma perspectiva comerci-al como tem uma loja”. É o quedefende Alexandre Tomás, sugerindoeventos programados com ummês de antecedência e “saber queprodutos vender, como se de-senvolve a sua imagem, comque preço e para que target sedirigem”.Alexandre Tomás está preocupadocom o futuro da sua cidade edo seu centro, que “está abando-nado e é crescente a falta degente a passear nas principi-ais artérias”.Preocupa-se com as áreas doBairro Azul e da Rua do Jardim, ondetem as duas lojas “pois são som-bras daquilo que já foram”. Diz“Naquela época as <strong>Caldas</strong>da Rainha tinha uma capaci-dade de atracção comercialmuito maior, não tem compa-ração com o que há hoje”, disseramAlexandre Tomás, de 38anos e Dulce Tomás, de 37, recordandoque então não existia autoestrada,internet, jornais nem revistasda sociedade que ajudam apromover a estimular o consumo.Este era incentivado pela formacomo os produtos eram apresentadospelas lojas e consoante anotoriedade dos estabelecimentose da cidade.“Há algo que ninguém nostira - estamos cá há 40 anos”,dizem os responsáveis, que continuamo negócio com mesmo empenhodos seus pais.“Logo nos anos 70 acreditá-mos que o caminho para osucesso era a especializaçãodentro da nossa área”, contam,explicando que a determinada alturafoi necessário especializarmais e criar novos espaços comerciais.Na família, a empresa Túnica“sempre foi a quinta pessoana mesa ao jantar”, contam osirmãos, referindo que nem semprefoi fácil, quando eram crianças,tirar apenas mini-férias de doisa três dias, ou ficar a ajudar amarcar babygrows enquanto osamigos brincavam.“Hoje o comércio está comoos casamentos: hoje casa-see “descasa-se” enquanto quenos anos 70 era para toda avida”, disseram, fazendo um paralelismocom o comércio actualem que se abrem e fecham lojasque duram apenas meses.Em 1992, a loja da Rua das Montrascomeçou a tornar-se pequenae por ideia de Alexandre Tomása família decide a aberturado segundo estabelecimento noBarro Azul, dedicado à puericultura,mobiliário e brinquedos.Hoje aquele espaço tem 700ça que compra tudo por telefoneà Elizabete”, contam os responsáveis,que apostam forte no serviçopós-venda, outros das linhas de trabalhoque mantém desde o início.Também enviaram carrinhos debebé para a Suíça e vendiam muitaroupa para os emigrantes. Se houvessealgum problema com os tamanhos,deixavam que as pessoastrocassem as peças quando regressavamnas férias, “sem nuncavoltar com a palavra atrás, talcomo ainda hoje fazemos”.A velha caixa registadora já passou dos escudos paraAlexandre Tomás recorda tam-os euros e mantém-se operacionalbém com foi estranho para os cli-que a principal cruzeta - formadapela Rua Heróis da Grande Guerra,Rua das Montras e Miguel Bombarda- ainda consegue algum dinamismo,mas a preocupação desteempresário é grande. E isto porquevê o sucesso comercial como algocolectivo e não gosta que abramlojas para encerrar passadas algumassemanas.“Há uma década as <strong>Caldas</strong>estava comercialmente a parcom Leiria”, disse o empresário,que considera que actualmente“está muito próxima de TorresVedras e de Alcobaça, quandoantes era muito superior. Esta-mos a perder terreno a olhosvistos”, rematou.Natacha Narcisonnarciso@gazetacaldas.com“A nossa Natáliatem umas mãos deouro”“Trabalho nesta casa há 37 anos. Entrei para aqui erauma rapariga de 16 anos e hoje já sou avó”. Palavras deMaria Natália Jesus, que entrou no início da empresa e contacomo, em conjunto com Carlos e Fernanda Tomás, concretizarammuitas peças para bebé que então era muito difíceis deencontrar. “Fizemos muitas forras para colchões, saias,vestidos e até cobertas para vender, além das forras paraos cestos de verga para colocar a cosmética dos bebés”,lembrou a funcionária.Os clientes da Túnica continuam a vir de Peniche, Nazaré,Torres Vedras, Alcobaça, ou Rio Maior. “Temos mantido amesma clientela, mesmo que agora não tenha a mesmadisponibilidade financeira”.Conta também que as senhoras que vinham à Túnica comprarpara os seus filhos vêm agora buscar roupa para os netos.“A nossa Natália tem umas mãos de ouro”, disse FernandaTomás, recordando como compravam espuma própriapara fazer os colchões de bebé, forrados à mão. Também porcausa do jeito para a costura, ajudou Alexandre Tomás a concretizaruma ideia original de decoração para a terceira loja dacadeia. Compraram vários tecidos e esferovite e forraram todoo tecto da loja da Rua do Jardim de forma original.Maria Natália Jesus passou da loja da Rua das Montras paraa da Rua do Jardim e conta que alguns dos seus clientes, comidades entre os oito e os 15 anos, já vêm sozinhos escolher aspeças e depois regressam com pais ou avós para adquirir o quemais gostam.Quando veio para a loja, Dulce teria seis ou sete meses eAlexandre mais um ano. “Eles são os meus patrões, mas naverdade é como se fossem da família pois andei com elesao colo”, rematou a empregada.CRONOLOGIAN.N.Maria Natália Jesus trabalha na Túnica há 37 anos1970 – Abre a Túnica na Rua das Montras para têxtil-lar1972 – Passa a dedicar-se em exclusivo a produtos para bebé1992 – Abre a segunda loja no Bairro Azul dedicada à puericultura,mobiliário e brinquedos1996 – Abertura da terceira loja na Rua do Jardim dedicada àconfecção para crianças dos oito aos 16 anos1998 – Alargamento da segunda loja para o dobro da área2004 –Abertura do primeiro andar com showroom na loja doBairro Azul2005 – Morte do fundador, Carlos Tomás2008 - Parque de estacionamento para clientes na loja doBairro Azul


UMA EMPRESA, VÁRIAS GERAÇÕESCasa Antero – A cultura de beber vinho a copo desdeO casal Olímpia e Antero Feliciano, os filhos Paulo e Anabela e a neta Filipa. Trêsgerações que contam a história da Casa AnteroA taverna continua a ser o ex-libris da empresaCorria o ano de 1957. Da estaçãodos comboios até ao “hospitaldos banhos” existiam 58tabernas nas <strong>Caldas</strong>, mas o númeronão assustou Antero Feliciano,na altura com 27 anos e atropa feita, que procurava dar umrumo diferente à sua vida quenão o trabalho do campo queconhecia desde criança.Era o seu tio Manuel Calistoquem explorava a taberna “Coradinho”no Beco do Forno, e queo convidou para trabalhar comele. “Tinha um balcão de pou-co mais de um metro e unsbancos corridos”, lembra AnteroFeliciano, sentado agoranum banco de madeira e apoiadonuma mesa de tampo de pedra,que mantém fiel a rusticidadeda que tem sido a sua casanos últimos 53 anos.Antero Feliciano lembra, orgulhoso,que começou a trabalharpor sua conta no dia 1 de Agostode 1957, altura em que comprouo espaço ao tio por 10 contos (50euros). Como não tinha dinheiropara efectuar a compra, foi pagandoa prestações com o resultadodo trabalho diário.Como clientes tinha sobretudoo pessoal da Fábrica de MóveisSerrano (que na altura davaemprego a 80 pessoas e se localizavaonde é actualmente o CentroComercial da Rua das Montras),os cobradores e motoristasdos Capristanos (rodoviária),os vendedores da Praça da Frutae também os banhistas que frequentavamas termas.A qualidade do vinho era o“chamariz” das pessoas. Esse foisempre uma aposta e o garanteda freguesia, muita dela fiel aoespaço até aos dias de hoje.“Nessa altura trabalhava-se com o lápis na mão todosos dias”, a apontar o fiado, queera pago, normalmente, ao sábado.Era também usual que adespesa não fosse totalmentesaldada e, no seu livro de assentos,ficam registados alguns“calotes”.Em Setembro de 1958 AnteroFeliciano casou com Olímpia Simãoe levou-a para trabalhar naCasa Antero, começando a vendertambém comida. A segunda-feiraera o dia de maior movimentopois era quando afluíaà cidade grande parte da populaçãodas freguesias rurais.Nesse dia tinham três pratosdisponíveis – dobrada, frangoassado no forno e vitela de jardineira– alguns deles que aindahoje se mantêm.No resto da semana haviatambém peixe e os tradicionaispetiscos que são uma das imagensde marca deste estabelecimento.“Naquele tempohouve dias em que cozinhá-mos uma centena de pargosque, na altura, custavam a20 escudos [10 cêntimos] oquilo, ao passo que a carnedo talho custava 28 escudos[14 cêntimos]”, recorda AnteroFeliciano.Também nessa altura a suacasa era muito procurada pelosmais de 30 funcionários dos Correios,assim como de outrasempresas e serviços que funcionavamno centro da cidade.“Era um corrupio de manhãà noite”, lembra Antero Feliciano,assim como das multas queapanhou por também ali vendercomida, quando apenas lhe erapermitido vender bebidas.Nos primeiros anos os seusclientes eram maioritariamentehomens. Uma das excepçõesera a esposa do Almirante LeonelCardoso, que, indiferente àsua posição social, gostava defrequentar o estabelecimento eaté de ajudar a sua esposa nacozinha, chegando muitas vezesa almoçar com eles.A taberna do Beco do Fornoera ponto de encontro dos homensque, entre copos, jogavamàs cartas e ao dominó.Foi também no ambiente familiar,entre os proprietários eclientes, que foram criados osdois filhos do casal, Paulo e AnabelaFeliciano, que actualmentetomam conta do negócio, queinclui a Casa Antero, o restaurantePachá e a padaria PãoNosso Todos os Dias.Paulo, actualmente com 44anos, sempre ajudou os pais nataberna. “Quando não conse-guia fugir... para ir viver avida”, recorda dos tempos dejuventude. Mas, mas “mais asério” começou a trabalharquando deixou a tropa.Anabela Feliciano, de 51 anos,também conhece bem os cantosda casa onde nasceu. Sempreajudou os pais, mesmo quandoandava na escola. Contudo,e antes de vir dar continuidadeao negócio de família, ainda tomouconta de crianças, numasala do mesmo prédio que albergaa Casa Antero e que pertenceaos Feliciano.Vinho de marca e regionalvendido a copoA Casa Antero comemora no dia 1 de Agosto 53 anos de actividade. O negócio que começou com umataverna do Beco do Forno em finais da década de 50, alargou-se a uma empresa hoteleira que integratambém o restaurante Pachá e a padaria Pão Nosso de Todos os Dias.Paulo e Anabela Feliciano dão continuidade ao negócio iniciado pelos seus pais, Antero e OlímpiaFeliciano, modernizando a adaptando aos tempos actuais um local que continua a ser de convívio eponto de encontro obrigatório de muitos clientes.O vinho a copo, a par dos petiscos, continua a ser a referência deste espaço que, periodicamente,recebe exposições, tertúlias e jantares temáticos.Imagens antigas que mostram o convívio e camaradagem, característica desta casa comercialAinda hoje é a Casa Anteroque continua a ser o cerne donegócio. Os actuais proprietáriostentaram manter as característicasque tinha para continuara agradar aos clientes maisantigos e cativar os mais novos.Continuam a vender vinho acopo, mas com a novidade deagora também comercializaremvinhos de marca de várias regiões.Ao todo têm 10 vinhos demarca a copo e mais três vinhosregionais. “Marca a diferençae tem tido uma boa recep-tividade”, refere Paulo Feliciano,embora hoje as quantidadesconsumidas fiquem aquém dasde antigamente.O pai, Antero Feliciano, recordaque “enquanto eu vendiaum barril de 180 litros pordia, havia casas em que umbarril de 50 litros dava parauma semana”. E houve mesmoum dia em que chegou avender 200 litros de vinho ... acopo!A segunda-feira era o dia demaior movimento e, “houve umdia em que contei o pão epassou de mil sandes de car-ne assada, presunto, fiambree ovo”.Agora a segunda-feira estácompletamente descaracterizada,constata o octagenário, querecorda o tempo em que as pessoasescolhiam o início da semanapara vir à cidade e faziam-node transporte público.Chegavam de manhã e só regressavamàs suas terras à tarde,passando grande parte dotempo a conviver nestas casas.Durante décadas Antero Felicianocaminhou diariamentepara a Praça da Fruta, onde compravaos produtos para confeccionarno estabelecimento quemanteve durante 23 anos semfechar um único dia. “Não ha-via festa da terra, não havianada...”, conta, recordando quenem quando fizeram as obrasde melhoramento para o restaurantefecharam a porta.Fátima Ferreirafferreira@gazetacaldas.comGlossário dovinho a copoCopo de dois - copo maispequeno cheio de vinhoCopo de três – copo grandecheio de vinhoCiganinha - garrafa de cerveja(3dl) cheia de vinho tintotirado do barrilTraçado - vinho tinto comgasosaPenalti – copo de 0,25 de vinhoTraçadinho de ginja – copode aguardente e ginjaCatembe – copo de coca-colacom vinho tinto


1957Tertúlias e eventos culturais têm lugar cativo no restaurante Pachá A padaria Pão Nosso Todos os Dias é a mais recente aposta desta sociedade hoteleiraServiço e produtos de qualidade aliados apreços “simpáticos”Em 1972 Antero Feliciano comprou o prédio ondecontinua o estabelecimento e, em 1987, abriram o restaurantePachá. Foi nesse mesmo ano que Paulo e airmã, Anabela, tomaram as rédeas do negócio. A decisãode o passar aos filhos foi tomada numa viagemque o casal Feliciano fez a Espanha, mas o patriarcaainda esteve mais dois anos a comandar o barco.“Têm feito um bom trabalho”, diz, satisfeito,Antero Feliciano.Com capacidade para 45 lugares sentados, o restauranteacabou por ser o desenvolvimento da tabernaque, na altura, já não tinha a capacidade para acolheros muitos clientes que ali se dirigiam. O nomesurgiu de umas férias em Benidorm (Espanha) ondeexistia uma cadeia hoteleira apelidada de Pachá, masque ia mudar. “Aproveitei, pois fazia lembrar-me esse tempo de férias”, brinca.Inovadores no conceito de prato do dia, os empresáriosgarantem também um serviço e produtos dequalidade, aliados a preços “simpáticos” para todaa gente.Os petiscos, de onde se destaca a salada de povo,de orelha, rins, moela, ovas, mexilhão de escabeche,ovos mexidos ou alheira, continuam a ser o ex-librisda casa e têm tido uma grande aceitação por toda aregião. Têm clientes que vêm um pouco de todo o paíspara os provar.A sandes de ovo mexido com chouriço, uma especialidadeque conta já com mais de três décadas, continuaa ser muito procurada. Começou por ser vendidaa 12$50 (6 cêntimos) e agora, na era do euro, custa1,30 euros a unidade.As paredes do Pachá convertem-se periodicamenteem galeria de arte e a sala é muitas vezes anfitriãde eventos culturais, desde tertúlias, lançamentos delivros e jantares temáticos com animação musical.O objectivo é simples: mudar para que o clientequando voltar sinta que há sempre algo de novo, revelaPaulo Feliciano, que gosta de preservar um elo deligação com quem frequenta a sua casa. Uma característicaque herdou do seu pai que revela que “coisaque ainda me deixa muito satisfeito é anti-gos clientes virem à minha procura”.Padaria é a aposta mais recenteO conhecimento do fabrico do pão e a existência deespaço físico disponível levou os empresários a apostarnuma nova área. Em Fevereiro de 2009 inauguravama padaria Pão Nosso Todos os Dias, defronte daCasa Antero, no Beco do Forno. O cheiro que emananão deixa esconder as iguarias que diariamente alisão preparadas, como o pão com azeitona, com manjericão,com tomilho, com torresmos, leitão, bacalhau,ou o pão de diversos cereais.As tranças de salmão são das mais procuradas ea última novidade ao dispor dos clientes é o pão comqueijo da ilha. A inovação e a criatividade sãopalavras de ordem porque estão conscientesque as pessoas gostam de variar e a concorrênciaé cada vez mais feroz.Filipa Feliciano Rosário, de 25 anos, neta deAntero e filha de Anabela Feliciano continua onegócio da família. Tirou o curso de Contabilidadee como não conseguia arranjar trabalhodecidiu fazer o estágio profissional no Pachá,a tratar principalmente da “papelada”. Um anodepois de fazer o estágio abriram a padaria eFilipa ficou responsável pelo negócio. A jovem,que mesmo antes de ali trabalhar, já ajudava afamília, pretende continuar com a actividadeque herda do avô. Tem muito pouco tempo livre,mas gosta do que faz. “É um ambientefamiliar”, diz.Actualmente trabalham 12 pessoas nos trêsestabelecimentos da família Antero (quatro nacozinha, duas na padaria e mais três ao balcão).Nos últimos anos o Pachá teve uma facturaçãoanual em torno dos 290 mil euros.No próximo Verão o número de funcionáriosvai aumentar com a vinda de um estagiáriodo curso de turismo da Escola SecundáriaRafael Bordalo Pinheiro. As parcerias estendem-sea outros estabelecimentos, como como turismo rural Casal da Eira Branca (Salir deMatos).Paulo Feliciano reconhece que os tempossão difíceis. “Tenta-se sobreviver a estacrise com dificuldade, tem que se fa-zer uma grande ginástica”, conta o empresário,que se socorre da sua larga experiênciano ramo para ter as coisas sempre maisou menos preparadas para o caso de conseguirresponder se houver uma enchente declientes, mas “não estarmos a inventarmuito”. Cada dia é uma incógnita e se antes aquinta-feira era o dia mais fraco, agora já nãose consegue definir. Paulo Feliciano continuaa ver as <strong>Caldas</strong> como uma cidade com grandescaracterísticas comerciais, mas que temvindo a perder muitas das valências que criaramo pólo de outros tempos.Como projectos para o futuro, fixa o tentarmanter o negócio, “sem falhar nem baixara qualidade e manter os eventos”.A família, essa continua unida e a trabalharna casa à qual dedicaram a sua vida. A D. Olímpiacontinua a ajudar no estabelecimento e osr. Antero vai todos os dias de manhã às comprasà Praça da Fruta....Fátima Ferreirafferreira@gazetacaldas.com“Foi sempre um local de encontro e convívio, que aindahoje se mantém”Guilherme Santos, hoje com 60 anos,entes tem. “E tal é o am-começou a frequentar a Casa Antero aosbiente que aqui se vive13. Tinha começado a trabalhar num es-que os empregados secritório na Rua do Jardim e ali ia buscarsandes de manhã e à tarde. “Era omelhor que havia aqui na zona”,diz, lembrando as sandes com dois pastéisde bacalhau e um bocadinho demanteiga. “Uma maravilha!”, exclama.Aos sábados era dia de jogo de dominócom os amigos. “Foi sempre umlocal de encontro e convívio, queainda hoje se mantém”, conta GuilhermeSantos, que continua a ali ir quasetodos os dias. “É o santuário aquida zona”, adianta, especificando que asua família já sabe que quando ele nãoestá em casa, só pode estar no Antero.O local é o mesmo de antes, mas foimodernizado, revela o cliente que, daquelaaltura, lembra-se de ver a D. Olímpiaa sair da cozinha, pela porta que aindahoje se mantém. “As mesas eramdiferentes, os bancos são outros,mas fazem lembrar os de antiga-mente”, diz, lembrando que a CasaAntero faz parte da vida de centenas depessoas.Guilherme Santos não se lembra deassistir a uma zaragata naquela casa,realçando o espírito de amizade que reiteraentre os donos e os clientes do espaço.Realça que esta é, provavelmente,a casa de restauração dentro da cidadeque “mais emprega e mais cli-Natural da Vermelha, Herculano Ferreira,77 anos, trabalhou durante bastantesanos como cobrador e, mais tarde,motorista da empresa Claras (que sucedeuaos Capristanos e precedeu a RodoviáriaNacional). Começou a frequentara Casa Antero há cerca de 50 anosdurante a hora de almoço. “Se trazíamosalmoço, a D. Olímpia aque-cia-o e comíamos, senão íamos àpraça e as peixeiras normalmentedavam-nos peixe, que aqui gre-lhávamos e comíamos”, conta,acrescentando que o prato era sempreacompanhado de uma “ciganinha”.Naquele tempo o peixe era transpor-que os empregados semantêm, não se reno-vamsemanalmente,nem de seis em seismeses”, disse.O antigo cliente diz que osfilhos de Antero conseguiramdinamizar e modernizara parte de restauração, quetem actualmente uma clientelamuito eclética. Não perdeum jantar temático e consideraque “o Paulo está para futuro eo que ele [Antero Feliciano] me fez”, dissesegue as pisadas do pai, mantendoFrancisco Ribeiro, lembrando que trazia demuita amizade com os clientes”.casa, da Serra d’el Rei, duas ou três batatascom uma postinha de bacalhau e eles coziam-“Coziam-me as batatas comnas para o seu almoço. “Bebíamos na altu-bacalhau que trazia de casa”ra uma “ciganinha”, que era uma gar-rafa de cerveja ([2,5dl] cheia de vinhoSentado na antiga taverna a acompanhartinto tirado do barril e era apenas essaGuilherme Santos num prato de Bacalhau àa despesa que eu fazia”, recorda o cliente,que tinha na altura 23 anos e estava a esta-Brás, estava o seu cunhado, Francisco Ribeiro,74 anos, também ele cheio de histórias. giar no Tribunal Judicial das <strong>Caldas</strong>.Frequenta a Casa Antero desde 1959, do tempoem que o chão era de cimento, a mesa em nal de Tomar onde esteve durante três anos,Depois de estagiar foi colocado no Tribu-madeira com tampo de zinco, os bancos eram altura em que vinha aos fins-de-semana àscorridos e o espaço era iluminado à noite com <strong>Caldas</strong> visitar a namorada e também a Casadois candeeiros a petróleo.Antero. Em 1963 casa e vem trabalhar para oAcompanhou a vida dos responsáveis e Tribunal do Trabalho das <strong>Caldas</strong> (onde esteveconhece os filhos desde que eram pequenos. até se reformar) e continua a ir aquele estabelecimentoduas a três vezes por semana.“Foi uma grande família que aqui ad-quiri e que nunca mais deixei”, conta,acrescentando que lhes deve favores que nuncaconseguirá pagar. “Ninguém me fazia“É uma casa do melhor”, remata FranciscoRibeiro, que não se consegue decidirsobre qual dos petiscos prefere.“O peixe saltava da camioneta e era levado para ofogareiro do Sr. Antero”tado para as <strong>Caldas</strong> emcima das camionetas dacarreira, tanto de Penichecomo da Nazaré. “E àsvezes quando apareciaum peixe jeitoso, vinha“muito vivo” e saltavadas caixas para fora, eera levado para assarno fogareiro do Sr. An-tero”, recorda o funcionáriodos Claras que guardabastantes lembranças do convívio com o casalFeliciano.A esposa também frequenta a casa esporadicamente,quando vai às <strong>Caldas</strong>, e o filho, queOs cunhados Francisco Ribeiro eGuilherme Santos são clientes assíduos háO casal Ferreira ainda hoje vem daVermelha matar saudades à Casa Anterotrabalha nas Finanças, é cliente habitual.F.F.


UMA EMPRESA, VÁRIAS GERAÇÕESFerreira Mobílias - uma das mais antigas lojas de móvePai e filho. Manuel Ferreira fundou em 1955 a Ferreira Mobílias, numa pequena loja alugada na Praça da Fruta. O seu filho, António Ferreira (1935-2000) acabaria por expandir onegócio, que é hoje mantido pelas suas filhas, Teresa e Manuela Ferreira, que garantem a continuidade de uma empresa com 55 anos.Manuela, Teresa, Paula e Verónicacresceram a brincar entre móveis.Camas, roupeiros, cómodas ecolchões em tamanho real, não daquelesque as meninas tanto gostamde pôr e dispor nas suas casinhasde bonecas.As quatro irmãs partilham o apelidoFerreira, que dá nome a umadas mais antigas casas de móveisdas <strong>Caldas</strong> da Rainha, e foi lá quepassaram grande parte da sua infânciae juventude, ao final dos diasde escola, nos fins-de-semana, nasférias. Hoje, feitas mulheres, assumemas rédeas do legado que lhesfoi deixado pelo pai, que também jáo tinha herdado do seu pai. São aterceira geração à frente da FerreiraMobílias.Há que recuar mais de meio séculopara contar a história destaempresa. Uma história feita de muitossucessos, mas também de muitosmomentos penosos, e que hojeapenas pode ser contada pelas irmãs.Guiados pelas memórias de Manuelae Teresa, viajemos até 1955.Manuel Ferreira vê numa pequenaloja junto à Praça da Fruta a oportunidadede criar o seu próprio negócioe quem sabe fazer fortuna.Nascido em Lisboa, mas radicado nas<strong>Caldas</strong>, não deixa passar a oportunidadee decide alugar o espaço, propriedadedo Sr. Ramalho. Foi ali queabriu a primeira loja da Ferreira Mobílias,que se manteve a funcionaraté ao início deste ano. Um pequenoestabelecimento, longe do grandeprédio que ali existe actualmente.O negócio depressa vingou e poucotempo depois da abertura da loja,um dos filhos de Manuel Ferreira, oAntónio, foi trabalhar para lá. Rapazdos seus 20 anos, ainda solteiro,António Ferreira não precisou demuito tempo para ganhar gosto pelonegócio das mobílias. E ainda bem,porque quando em 1960 morre o seupai, Manuel Ferreira, é o jovem quefica encarregue do negócio, a parcom o irmão, Fernando Lopes Fer-reira.Mas dez anos depois António Ferreiravoltaria a ficar sozinho, quandoo irmão morre inesperadamente.Já casado com Maria Teresa, contacom o seu apoio, que, segundo asfilhas se revela “fundamental”para o sucesso da empresa.É nesta altura que a Ferreira Mobíliascomeça a crescer e aos poucosa loja na Praça da Fruta ganhanovos espaços, para exposição demobília e para oficinas. Primeiro umataberna que havia ali ao lado. Depoisa cocheira, onde eram guardadosos burros dos vendedores daPraça da Fruta. “Ainda me lembrodas senhoras entrarem com osburros numa porta que ali haviae prenderem os animais nu-mas argolinhas que havia pelaparede”, recorda Manuela. Poucotempo depois, o dono do prédio ondeficava a loja, com alguns apartamentospor cima, quis vender o edifício,e António comprou.Com mais espaço, a Ferreira Mobíliasaumentou a sua oferta. Àsmobílias de quarto ou de sala e aoscolchões – feitos ali mesmo por umdos trabalhadores da empresa e comforras cosidas pela mulher de AntónioFerreira – juntam-se então osarmários de cozinha, as tapeçariase os electrodomésticos, de fogões afrigoríficos e até televisões. “Eratudo para a casa, menos corti-nados”, recorda Manuela. “Maschegou a vender varões”, acrescentaa rir a irmã, Teresa.UMA AZÁFAMACONSTANTEA principal recordação que as irmãsguardam dessa altura é o movimentoconstante na loja do pai.“Comparado com o de hoje erauma azáfama completa. Umasérie de carros a carregarem,outra série a descarregar”.O que também se lembram bemé da forma como a mobília era expostana loja, bem diferente da exposiçãocuidada dos dias de hoje.“Quase que se procurava o buracoque havia ainda para ocu-par. Na altura era o espelho e asmesas-de-cabeceira dentro doroupeiro, a cómoda ficava porcima do roupeiro e a cama fica-va encostada”. E por mais caóticaque seja a imagem que a descriçãosuscita, o certo é que “isso era osuficiente para o cliente com-prar”. As pessoas vinham não só daregião, mas de vários pontos do paísà procura de mobílias que primavampela qualidade.“Há uma coisa que me marcouimenso, que foi uma mobília,caríssima para a altura, estara acabar de ser descarre-gada, sem costas, sem estarmontada, e eu vender essamobília ainda no corredor”, recordaTeresa.Entre o vaivém de carros commóveis e de clientes, António Ferreiratorna a sua loja num estabelecimentoinovador. É que naquelestempos as mobílias chegavamàs lojas “em branco”, sem estarempolidas ou envernizadas. “Eranecessário acabá-los aqui. Ha-via um polidor, havia quemmetesse as ferragens, quemdesse cor. O nosso pai foi oprimeiro nas <strong>Caldas</strong> a apre-sentar a mobília já acabadaaos clientes, que a podiam verassim que chegavam à loja”,lembram as irmãs.Esta visão empreendedora levatambém António Ferreira a procuraruma segunda loja na cidade,na Rua Raul Proença. Um espaçoque já há cerca de três décadasfoi pensado para expormobília de linhas mais moder-A história da Ferreira Mobílias faz-se das memórias das netas do seu fundador, Manuel Ferreira(falecido em1960), que já não está cá para as contar. António (1935-2000) e Fernando (1937-1970),os filhos que tomaram as rédeas à empresa a partir de 1960, também já partiram.Hoje é a Manuela e a Teresa Ferreira que cabe a gestão de uma empresa com 55 anos. Dos seusantecessores, as duas irmãs herdaram a aposta na novidade e na qualidade, mas principalmente o“querer servir bem quem entra”.Com a loja da Praça da Fruta encerrada há poucos meses, a Ferreira Mobílias conserva o estabelecimentona Rua Raul Proença. Mas as responsáveis pela empresa garantem que a diversidade dosprodutos que sempre caracterizou a loja se mantém.nas, uma novidade numa loja dedimensões fora do habitual para acidade, e do qual a esposa “tomouconta durante muitos anos”.Do edifício onde se instalou aprimeira loja restam apenas memóriasfotográficas. Cerca dedez anos depois de ter compradoo segundo estabelecimento,António Ferreira volta a aumentaro seu património e deita abaixoas instalações que foi adquirindona Praça da Fruta nos primei-ros anos da sua actividade. No seulugar fez nascer os dois prédios quese podem ver hoje e que durantemuitos anos albergaram a loja maisvoltada para o mobiliário clássico, aoficina da fábrica, alguns escritóriosalugados a terceiros e muito espaçode armazém. “Primeiro o prédiode trás, porque não o deixa-vam construir para a parte dafrente, por ser a zona históri-ca da cidade. Só quando teveautorização conseguiu cons-truir o prédio voltado para apraça”, contam as filhas.Manuela e Teresa não estranhamo sucesso que a empresa doseu pai teve. “Dantes era tudomuito mais fácil e também nãoãohavia muita oferta, agora é quetemos lojas por todo o lado”. Masas actuais responsáveis pela FerreiraMobílias não deixam passar emvão a importância que os valores tinhamnessa altura. “O nosso pai eas pessoas das <strong>Caldas</strong> e todosos nossos sos clientes bem o sa-bem, sempre foi uma pessoaséria e correcta em termosprofissionais. As pessoas confiavamna casa e ainda confi-am. Ele empenhava-se, semprese empenhou, no ramo dele, eviveu praticamente para isso”.Joana Fialhojfialho@gazetacaldas.comImagens do prédio onde Manuel Ferreira começou a empresa de móveis e que o filho demoliu para nele construir doisprédios que foram durante décadas o ex libris da empresa.


is da cidade mantém oferta do clássico ao modernoSempre a par de tudo o que se passava naempresa, Maria Teresa foi uma “peçafundamental” para o sucesso do negócioA Ferreira Mobílias encaixa naperfeição na designação ‘EmpresaFamiliar’. Mesmo sem ter estadocontinuamente nas lojas domarido, a mãe de Manuela e Teresanunca esteve afastada donegócio das mobílias. “Em casasempre se falaram de assuntosda loja, e o meu pai discutiacom ela todos os assun-tos, tudo o que se passava,todas as decisões que ele foitomando”, contam as irmãs Ferreira,recordando que foi assimaté à morte da mãe. Já as quatroirmãs também nunca passavammuito tempo sem estarem nas lo-Hoje, é a Teresa e Manuela que cabejas, “mesmo pequenininhas, to-a gestão da Ferreira Mobíliasdas nós temos recordaçõesdessa altura”.E se no início as crianças ocupavam o seu tempo a brincar umas com as outras,não foi preciso muito tempo para que as filhas ajudassem os pais, a acartaralmofadas ou os cabides de roupa. “Era um trabalho entre aspas. Éramosarrastadas, mas acabávamos por nos divertir na mesma”, lembram asirmãs.Manuela, Teresa, Paula e Verónica entraram para a sociedade da AntónioFerreira, Lda. em 1993, sete anos antes de o pai falecer. Entre 1960 e 2000, foisempre o pai “a tomar as decisões, pelo menos as mais importantes”. Apósa morte de António Ferreira as irmãs empenharam-se em manter o legado dosseus ascendentes, tanto ao nível da gestão da empresa, como da relação com osclientes e da aposta na qualidade dos artigos que comercializam.“Hoje as coisas estão diferentes, há muitas grandes superfícies, quenão são uma grande ameaça para nós, porque não temos o mesmoartigo. Nós temos artigo de muita qualidade e não estou a dizer que oartigo de casas como estas não tem qualidade, mas é outro tipo de artigo,para outro tipo de clientes”, diz Manuela Ferreira.Ao longo de 55 anos, a Ferreira Mobílias fidelizou muita clientela. “Muitos sãoda altura do nosso pai e muitos deles já trouxeram os filhos”, garantem. Oque os cativa, acreditam, é a oferta diversificada que ali podem encontrar.Acompanhando a evolução dos tempos e dos gostos, as duas irmãs não descuramas novidades e as tendências mais recentes. Mas também nunca abandonaram oestilo clássico. “Aqui nas <strong>Caldas</strong> praticamente não há lojas que vendameste tipo de clássico, como o estilo inglês por exemplo, , que é uma linhaantiga, mas que as pessoas continuam a gostar e que procuram”.Outra coisa que se mantém é a qualidade do mobiliário que ali se pode encontrar,produtos na sua esmagadora maioria de origem portuguesa. “O artigo nacionala nível de mobiliário é bastante melhor que o espanhol ou que qual-quer outro, sem dúvida nenhuma”, garantem as responsáveis, que têm fornecedoresde vários pontos do país. Alguns destes são empresas que vendem para aloja desde o seu início e que entretanto também já são administradas pelos filhosA empresa cinge-se hoje à loja de dois pisos na Rua Raul ProençaTerceira geração mantém aposta na qualidadeou netos dos fundadores. “Vai-se criando uma ligação e acaba por haveruma confiança mútua que é muito importante. Há mais sinceridade etrabalha-se de maneira diferente e eles também se vão actualizando”.De vários pontos do país chegam também os clientes, que têm os artigosentregues e montados nas suas casas sem qualquer custo adicional, sendo otransporte assegurado pelos funcionários da empresa, em veículos próprios. “Éum miminho para os clientes que nós tentamos manter”, afirma ManuelaFerreira, salientando que os tempos difíceis que correm levam muitasempresas a cobrarem montagem e deslocação. Mas os móveis da loja caldenseestão também já noutros países, como França e Holanda, procurados não tantopor emigrantes, mas sobretudo por estrangeiros que têm uma segunda habitaçãona região e que gostaram da mobília.No início deste ano as duas irmãs mais novas, Paula e Verónica, decidiramsair da sociedade e neste momento a Ferreira Mobílias está apenas a funcionarna loja da Rua Raul Proença. “Como ficámos só as duas, entendemos quenão precisávamos de duas lojas, que bastava uma”, conta Teresa, explicandoque dois pisos da loja da Praça da Fruta foram alugados. “Apareceuuma boa proposta, uma boa oportunidade de negócio sem ninguémesperar”, acrescenta Manuela, salientando que o funcionamento logísticodaquele espaço era dificultado pelo facto das camionetas grandes que transportamas mobílias não poderem ir ao centro da cidade. No edifício da Praça daFruta mantém-se algum espaço de armazenamento e a oficina da empresa.Alguns dos artigos da loja com quatro pisos estão disponíveis no estabelecimentoque se mantém. Para escoar o restante está a decorrer uma exposiçãocom descontos que podem ir até aos 80%, à qual se pode aceder pela Travessado Parque.A loja da Rua Raul Proença tem 1.200 metros quadrados de exposição e,garantem as irmãs, a mesma oferta diversificada que sempre caracterizou aempresa. “Temos o clássico, temos o contemporâneo e na cave temosa secção económica, com quartos e sofás baratíssimos, um económi-co que nos deixa à vontade porque tem qualidade”.Sem medo da concorrência das grandes superfícies, Manuela e Teresa acreditamnas vantagens do comércio tradicional. “Aqui o cliente está connos-co, podem estar uma hora, duas horas, as pessoas conversam e têmtempo. É sem dúvida algo único do comércio tradicional, não se encon-tra este tipo de relacionamento nas grandes superfícies”. Além disso,“as pessoas sabem que quando vão à Ferreira Mobílias compramartigo bom”.Longe dos tempos de azáfama em que o reboliço nas lojas era uma constante,a Ferreira Mobílias “continua a ter a mesma variedade, a apostar nasnovidades e a querer servir bem quem entra”. Para isso contribuem tambémos trabalhadores da empresa – Santos, Gilberto e Idália, que ali trabalhamhá várias décadas. Pessoas cujos anos de experiência lhes permite “fazeremum bocadinho de tudo”.Quando perguntamos a Manuela e Teresa se alguma vez pensaram deixar onegócio a resposta é imediata. “Não! Gostamos do que fazemos. Gosta-mos mesmo! O que quer dizer que as vezes que estivemos cá empequeninas não foi castigo”.J.F.“Tenho orgulho empertencer a esta casa”Fez no passadodia 1 de Junho31 anos que GilbertoJosé Monteirocomeçou atrabalhar na FerreiraMobílias.Nascido naLourinhã, veio viverpara as <strong>Caldas</strong>com oitoGilberto Monteiroanos. Aos 13 estava mais interessado em jogar à bolae em ganhar o seu dinheiro, do que em “perder tempo”com os livros. Foi por isso que mentiu aos pais e lhesdisse que tinha chumbado na escola, quando na verdadetinha passado de ano. Foi assim que conseguiuir trabalhar para a loja de móveis durante três meses.Quando a verdade se soube, a mãe repreendeu-o.“Queria que eu estudasse”, conta. Mas da cabeçade Gilberto não saíam as palavras de António Ferreira.“Disse-me: quando quiseres voltar, tensa porta aberta”.E Gilberto voltou, assim que em 1979 concluiu o 9ºano de escolaridade. Deixou a escola, “apesar denunca ter reprovado”, para trabalhar nos móveis,e hoje diz que não se arrepende. “É uma escola devida, aprende-se muito”.Dos primeiros anos guarda muitas e boas recordações.Lembra-se das actuais patroas, de idades próximasda sua, andarem na escola. Lembra-se sobretudoda imagem do patrão, um homem que “foi comoum pai” e que recorda muitas vezes. “Era um homemque hoje fazia muita falta na nossa sociedade,um empresário de sucesso, bastan-te honesto e empreendedor, que me deixouuma boa recordação”, afiança.O que Gilberto também se lembra bem é da azáfamade outros tempos, que obrigava os trabalhadoresda empresa a fazerem muitas noitadas até à meianoite.“Quase sempre, o meu patrão esperavapor nós e pagava-nos o jantar no antigo restauranteConvívio que havia na Praça da Fru-ta, outras vezes no Camaroeiro”.Hoje as coisas são muito diferentes. “Somos sódois, mas na altura chegámos a ser 14 empregados.Hoje há máquinas para tudo, anti-gamente não, e o cliente antes compravamuito mais. Lembro-me que os imigrantesentravam aqui e compravam um carrão demobília, uma camioneta cheia”, conta, desfilandoas suas memórias, o trabalhador que tem bempresentes os tempos em que as cadeiras eram estofadas,os móveis envernizados e as ferragens colocadasna oficina da Ferreira Mobílias.Na loja e na oficina, Gilberto Monteiro dá uma mãoem tudo o que pode. “Faço tudo o que é preciso,tenho prazer no que faço”, garante. E ao contráriodo que tanta gente se queixa, Gilberto congratulasepor ter um trabalho que “não tem nada de stres-sante” e que o faz correr o país a distribuir móveis.Confessadamente “dedicado à família”, Gilbertoafirma que os Ferreira são a sua segunda família. Lamentandover a loja da Praça da Fruta de portas fechadas,Gilberto Monteiro diz que “tinha pena seum dia isto acabasse. Ando nisto desde miú-do, era difícil fazer outra coisa”.E com alguma timidez acrescenta: “sinto orgulhoem pertencer a esta casa. Como um indivíduoque joga futebol e está num clube, apesar deser profissional, tenho amor à camisola”.J.F.


UMA EMPRESA, VÁRIAS GERAÇÕESMonteiro – a primeira casa comercial das <strong>Caldas</strong> aAntónio Monteiro fundou um negócio que foi seguido pelos seus filhos, Paulo e António. Hoje as suas empresas empregam 50 pessoas e facturam13 de Maio de 1949. O até entãovendedor-viajante, António Monteiro,começa uma nova etapa nasua vida. Recém-casado e à procurade uma situação mais estável,inicia uma sociedade com oseu amigo Carlos Arroja paravender tecido a metro.A loja Nobela, situada na RuaAlmirante Cândido dos Reis (Ruadas Montras) foi-lhes trespassadaà data por 100 mil escudos (cercade 500 euros), uma “quantiaastronómica para a época”,conta hoje o seu filho António JoséMonteiro, que juntamente com oirmão, Paulo, continuam a geriros negócios iniciados pelo pai.Para poder efectuar o trespasse,pediram algum dinheiro emprestadoe começaram a sociedade,que duraria três anos, atéque António Monteiro vende a suaquota e toma de trespasse umaloja na Praça da República e começaa vender tecidos.A pequena loja “transformouse”na primeira da cidade a termontras grandes, rasgadas, quepermitiam aos transeuntes ver osmodelos da agora casa de modasexpostos no seu interior.Mas a ambição não ficou poraqui. Em 1959 António Monteiroinicia a expansão do negócio tomandode trespasse, por 50 milescudos (cerca de 250 euros) oestabelecimento nº 45 da Rua dasMontras, onde actualmente permanecea loja de tecidos de decoraçãoMonteiro. Depois de feitasas devidas obras de remodelação,abre a primeira loja da cidadededicada apenas a artigosde bebé, e que apelidou de Ninho.Três anos mais tarde adquireuma antiga casa de loiças, juntoao seu estabelecimento, ondecomercializa apenas linhas e fiospara tricot, e que apelidou de Lãsli.Considerado por muitos umaventureiro, as suas lojas de es-cerca de 5 milhões de euros.pecialidade tornaram-se um sucesso,especialmente a das lãs,recordam os seus filhos.Em inícios da década de 60 AntónioMonteiro adquiriu uma máquinapara fazer saias plissadas,que estavam na altura muito namoda. O filho mais velho, AntónioJosé, lembra que parecia umaestufa, em que o tecido era colocadoem cima de cartões, ia aoforno e o pano ficava plissado. “Aideia era gira porque uma saiaque normalmente gastava ummetro de tecido para aqueleefeito necessitava de três ouquatro metros, mais mão-de-obra, que tinha que ser paga”,explicou.Além do que comercializa nasua loja, António Monteiro vendiatambém para outros estabelecimentosdo sector. “Aquilotrabalhava dia e noite, lem-bro-me de passar na rua e osvidros da casa estarem todosembaciados do calor da má-quina de plissar as saias”, recordao filho, destacando a visãodo pai ao correr o risco de investirnuma máquina que acaboupor se revelar um êxito do pontode vista da rentabilidade.A 1 de Abril de 1964 AntónioMonteiro dá sociedade a doisempregados - Vasco Teodoro Bicho(já falecido) e Joaquim Cordeiro,seu sobrinho – no estabelecimentoda Praça da Fruta,formando a firma Monteiro Lda.Entretanto dedica-se às suas lojassituadas na Rua das Montras.Natural da Foz do Arelho, António Monteiro (1918-2006) é uma das grandes referências comerciais das <strong>Caldas</strong> da Rainha. Umempreendedor nato, que cedo deixou a vida de caixeiro-viajante para, juntamente com um sócio, se estabelecer no ramo dostecidos. Dessa primeira experiência, rapidamente passou para uma loja sua, na Praça da República, onde inovou o conceitocomercial ao abrir rasgadas montras que deixavam mostrar todo o seu interior.Precursor das lojas de especialidade, António Monteiro acabou por se dedicar à decoração de interiores, com uma loja dedecoração no centro da cidade e uma empresa líder a nível nacional na distribuição de alcatifas e transformação de carpetes.“O meu pai foi o precursor da modernização do comércio nas <strong>Caldas</strong> da Rainha, naquela época”, contam os filhos,António José e Paulo Monteiro, actualmente sócios-gerentes da Casa Monteiro.Empresa líder nadistribuição de alcatifas etransformação de carpetesTrês anos mais tarde (1967) formoucom mais cinco amigos, aSantos Monteiro & Cª Lda, umasociedade grossista de fios, malhase miudezas, que funcionavanas traseiras da loja das lãs. Emfinais da década de 70, AntónioMonteiro comprou aos sócios asrespectivas quotas e aproveitoua firma, tendo feito uma sociedadecom o seu filho António JoséMonteiro, então com 23 anos.Actualmente a Santos Monteiro& Cª Lda é gerida pelo seu filhomais velho. Está sediada na Estradado Campo (em frente aoModelo) e é actualmente umaempresa líder, a nível nacional,na distribuição de alcatifas etransformação de carpetes. A firmaconfecciona carpetes por medida,uma actividade cada vezmais procurada pelos clientes.“Damos ao cliente um artigopróprio, não o obrigamos acomprar o produto standar-tizado”, diz António José Monteiro,destacando que o mercadoactual está ávido por coisas diferentes.António José Monteiro recordaque a firma Santos Monteiro & CªLda começou como distribuidorde uma fábrica de alcatifas nacional, a CUF Texteis. Passaram acomprar em fábricas no estrangeiro,sobretudo na Bélgica e Holandaque são os maiores produtoresmundiais do sector, mastambém da China e da Índia. Aalcatifa é comprada em rolo edepois transformada nas <strong>Caldas</strong>.A empresa trabalha tambémpara a hotelaria, vendendo e aplicandoos seus materiais por todoo país, tendo como clientes gruposcomo o Vila Galé, Pestana, ouos hotéis Rio, no Algarve.O negócio das alcatifas nasceuna loja da Praça da Fruta quando,com as primeiras obras da décadade 60, foi montada uma secçãode decoração onde, juntamentecom as cortinas e tecidosdecorativos, começou a comercializaçãode carpetes e alcatifas.Fátima Ferreirafferreira@gazetacaldas.comFotos de 1963 que mostram a loja das lãs, situada no nº 51 da Rua Almirante Cândido dos Reis


dedicar-se à decoraçãoA Monteiro Decorações, situada no coração da cidade, teve grandesobras de remodelação e actualmente possui 500 metros de área comercialFilhos expandem o negócio iniciado pelo pai há 61 anosAntónio José Monteiro (54anos) começou a trabalhar como seu pai em 1975, altura em quedeixou de estudar. Tinha 20 anose, até o pai deixar a gestão daempresa, não conheceu outropatrão.A firma Monteiro Lda. tem osquatro irmãos como sócios, masas duas irmãs, Amélia e NatérciaMonteiro, não trabalham naempresa. “Tiraram cursos di-ferentes e seguiram as suasvidas profissionais”, revelaAntónio José. A trabalhar consigotem o irmão, Paulo (43 anos),que ali começou a trabalhar aos18 anos. Mas já antes conheciabem os tapetes e os tecidos,pois as férias de verão erampassadas a trabalhar ao lado dopai.Gerem a empresa há uma década,mas o pai continuava aacompanhar os negócios, frequentandodiariamente a loja.Deixou de o fazer quando a doençao impossibilitou, cerca deseis meses antes de vir a falecer,em 8 de Agosto de 2006.Os filhos não escondem o orgulhoda coragem empresarialdo pai. “Foi muito inovador àépoca”, conta António JoséMonteiro, adiantando que estafoi a primeira loja nas <strong>Caldas</strong> adedicar-se à decoração, que erauma secção da loja de moda.“Começou com uma simplessecção, foi ganhando pesoaté se tornar o único neócioque ficou”, refere, adiantandoque a aposta foi feita porqueencontraram um “nicho demercado em expansão”.O filho mais velho lembra aindao arrojo do pai em apostarnas novidades. Da memória retiraa história do Sr. Edgar, caixeiro-viajantede uma empresaque fabricava tecidos de decoração,que convenceu o seu paia comprar peças de tecido parafazer cortinas. Embora desconfiadoda falta de lucidez do vendedor,António Monteiro comprouas quatro peças de cortinasque lhe propôs e colocou-asem exposição na prateleira.Meses mais tarde, quando o vendedorvoltou às <strong>Caldas</strong> as peçasde tecido mantinham-se nomesmo sítio. Não se tinha vendidonada. “O O meu pai queixou-se,mas o Sr. Edgar res-pondeu que o defeito era dafalta de sortido de cores, eque devia comprar mais. Omeu pai torceu o nariz, mascomprou mais peças e ascoisas começaram a funcio-nar”, recorda.“Todas as casas das<strong>Caldas</strong> ainda devem ter umcortinado ou uma carpetedo Monteiro”Actualmente a Monteiro Decoraçõestrabalha com algunsfornecedores nacionais, emboraa mercadoria provenha do estrangeiro.“A produção nestaárea em Portugal pratica-mente desapareceu e a queexiste é residual”, conta, recordandoque chegou a haverdemasiada produção têxtil, masas fábricas têm fechado, mantendo-seapenas duas ou trêsespecializadas em alcatifas alaborar.As mulheres são as principaisclientes na área da decoração,ao passo que os homens procurammais a instalação de pavimentos.Têm uma clientela basicamenteregional, embora hajampessoas de Lisboa, ou mesmodo Algarve, que se deslocamàs <strong>Caldas</strong> e acabam por fazeras compras nesta loja.E se agora a concorrência égrande, sobretudo devido àsO casal António e Amélia Rita Barros Monteiro.O empresário foi vereador do Turismo na Câmaradas <strong>Caldas</strong> durante o primeiro mandato de LalandaRibeiro e era um dos mais antigos membros doRotary Club das <strong>Caldas</strong>. Após o seu falecimento,em 2006, a autarquia deliberou atribuir-lhe o nomede uma rua, mas esta ainda não foi efectivada.grandes superfícies, noutrostempos a Monteiro era a únicacasa de decoração da região.“Todas as casas das <strong>Caldas</strong>ainda devem ter um cortinadoou uma carpete do Mon-teiro”, conta António José Monteiro,destacando que a boaqualidade dos seus produtosacaba por ser “má” para o negócio,pois aparecem clientes adizer que têm uma carpete alicomprada há mais de 30 anos eque continua em bom estado deconservação.Paulo, lembra também queainda há dias uma família deTorres Vedras foi à sua loja perguntarpela loja de roupa queali havia com o mesmo nome.“Expliquei-lhes que existiu,mas que já fechou há cercade 20 anos. Temos consciênciaque foi uma loja de refe-rência”, disse.Nessa altura era normal aspessoas deslocarem-se de Leiria,Torres Vedras, Santarém eoutras cidades para fazer assuas compras nas <strong>Caldas</strong>. Entretanto,“essas cidades fo-ram-se desenvolvendo e as<strong>Caldas</strong> perdeu esse estatutoaglutinador do comércio”,revela António José Monteiro,que não consegue definir comclareza uma actividade principalneste concelho.Referindo-se ao comércio é daopinião que este precisava demais abertura, melhoramentosnas ruas e melhores estacionamentose mais perto dos locaiscomerciais. Tudo isto aliado auma maior animação.Optimista por natureza, realçaque mais importante que dizero que está mal, é preciso“olhar em frente, modernizaros nossos estabelecimentos,sempre teimosos nas nossasambições e nunca desistir”.Aposta no mercadoespanholOs filhos herdaram o arrojo dopai em relação aos negócios. Afirma Santos Monteiro está numafase de expansão para Espanhae tem um projecto para fazer umnovo armazém na Zona Industrial,com quatro mil metros quadrados,continuando assim a aumentara gama de produtos quetem para oferecer aos clientes.“O O mercado espanhol estáem crise, tal como o nosso,mas estamos a tentar instalar-nosnas zonas mais próximas,como é o caso da Ga-liza”, conta António José Monteiro,ciente que neste momentode crise “não se venderá muitomas, quando as coisas melhorarem,já estamos insta-lados”.Ao nível da Monteiro Lda. foifeita uma grande remodelaçãoem 2008 e o objectivo actual é“tentar que as vendas, se nãosubirem, pelo menos que semantenham”, conta AntónioJosé Monteiro.“A perspectiva geral emtermos de comércio não énada famosa, mas acreditoque somos nós que temosque ter uma atitude activa eque o mercado tem que serabanado. Se viermos para omercado com produtos no-vos, pelo menos nós devemosconseguir vender”, refere,destacando que estão a investir“com força” numa altura difícil.Prova disso é a facturação dascasas que gerem. Em 2009 a casaMonteiro Lda rondou os 700 mileuros e a empresa Santos Monteiro& Cª Lda, 4,250 milhões.Fátima Ferreirafferreira@gazetacaldas.comO primeiro e único emprego deGraciete CarvalhoA firma Monteiro, propriedadedos quatro irmãos, conta com10 funcionários. Alguns deles,como é o caso de Graciete Carvalho,trabalham ali há mais de40 anos.Natural de Alfeizerão, começoua trabalhar na loja junto àPraça da Fruta com apenas 15anos e, até à data não conheceuoutro patrão. “Foi o meuprimeiro e único emprego”,conta, orgulhosa da empresaque acompanhou nas suas diversasfases. “O objectivo foisempre rentabilizar cada vezmais a empresa, o que felizmentese tem vindo a conse-guir”, conta.Graciete Carvalho começoupor trabalhar na caixa, onde estevedurante dois anos, passandodepois para o escritório,onde está há 39 anos. Diz gostarbastante do ramo da decoração,principalmente de tapeçaria,destacando que “se tivesseque estar na parte comerciale pudesse optar, trabalha-ria nesse ramo”.A funcionária lembra quequando começou a trabalhar naCasa Monteiro foi numa tarefade grande responsabilidade. Era<strong>Cronologia</strong>Graciete Carvalhotrabalha na casa desde os15 anoscaixa, mas frisa que o trabalhoera muito diferente de actualmente,destacando o grandemovimento que havia na alturaao ponto de não poder abandonaro local nem que fosse porinstantes, tendo que pedir a alguémque a substituísse. Lembrandoos tempos idos contaque no auge da confecção pormedida a casa empregava maisde 20 mulheres na secção demodas, e 18 na alfaiataria.Já a empresa Santos Monteiro& Cª Lda possui 40 funcionários,distribuídos pelo armazém,logística de corte e transformaçãoem carpete, comerciais, escritóriose atendimento.F.F.1949 – António Monteiro inicia a sua actividade comercial em sociedadecom Carlos Arroja1952 - António Monteiro vende a quota na sociedade e toma detrespasse um estabelecimento de tecidos na Praça da República1959 – Toma de trespasse um estabelecimento na Rua das Montrasonde dá início à venda de artigos para bebé (Ninho)1963 – O mesmo empresário toma de trespasse uma antiga casa deloiças, também na Rua das Montras, para comercializar exclusivamentelinhas e fios para tricot, com a insígnia Lãsli1964 – Dá sociedade a dois empregados no estabelecimento daPraça da República, que adopta a denominação social de MonteiroLda.1967 – Entra com 25% do capital social na criação de uma sociedadegrossista de fios, malhas e miudezas, denominada Santos, Monteiroe Cª Lda1983 – Compra as quotas aos seus sócios da Monteiro Lda. e entrapara a sociedade a sua esposa, Amélia. Ao mesmo tempo muda asede social para a Rua Almirante Cândido dos Reis.1991 – Cede aos filhos a sua posição da firma Santos, Monteiro e CªLda.1992 – Os filhos entram para sócios da Monteiro Lda.1993 – Integra a sua firma em nome individual, LãsLi na firmaMonteiro Lda. e fez uma redistribuição de quotas entre ele, suamulher e filhos.1998 – Realização de obras de remodelação na Loja Monteiro Decorações,situada na Rua Almirante Cândido dos Reis2006 – António Monteiro morre a 8 de Agosto


UMA EMPRESA, VÁRIAS GERAÇÕESE o frango de estaleca do Xaneca cresceu e multiplicOs proprietários do café noAvenal, que veio dar origem àchurrasqueira Xaneca, actualmentecom três estabelecimentosgeridos por pais e filhas, nuncavão saber quem foi o primeiro cliente.Foi no Carnaval de 1987 e essaprimeira venda, de um maço de tabaco,foi a um mascarado.Vinte e três anos depois a frase“tens razão ou Conceição, frango deestaleca só no Xaneca” virou quaseum mito nas ondas hertzianas locais.Esse foi o slogan criado por FernandoIrra para a então Rádio Clubedas <strong>Caldas</strong> (entretanto adquiridapela TSF) para um anúncio. Infelizmentea cassete com a gravaçãooriginal perdeu-se.Ao longo dos anos a empresaXaneca Snack-Bar, Lda foi crescendoe a família abriu mais dois estabelecimentoscomerciais, aumentandoe diversificando tambéma quantidade de produtos quevendem - o Xaneca II na rua ProfessorManuel José António, e oXaneca III, na rua José Pedro Ferreira(em frente ao CCC), onde têmagora mais clientes e maior facturação(embora a família tenhaoptado por não divulgar números).No total são 11 pessoas a trabalharnos três locais, incluindo oscinco membros da família. Ao nívelda gestão, para além de seremresponsáveis pelo dia-a-dia dos estabelecimentosonde estão a trabalhar,dividem tarefas.A mãe e a filha mais nova geremtudo o que tem a ver com acozinha, e o pai e a outra filha sãoresponsáveis pela parte administrativa.A empresa foi fundada por JoséJoão Eugénio e Maria Isabel Eugénio,numa altura em que as suasfilhas eram adolescentes. O nomeXaneca surge depois de uma conversaaté às três da manhã com oresponsável da empresa que fez oprimeiro reclamo luminoso. “A minhafilha mais nova, Alexan-dra, era tratada por Xaneca eficou esse nome”.José João Eugénio nasceu a 6de Março de 1945 nas Trabalhias(Salir de Matos) e veio morar paraas <strong>Caldas</strong> da Rainha quando secasou com Maria Isabel Eugénio.Até aos 17 anos, José Eugéniotrabalhou na agricultura. Depoisesteve embarcado e durante algumtempo teve uma sociedadenuma pecuária nas Trabalhias.Até abrir o café no Avenal quedaria origem à Churrasqueira Xaneca,ainda trabalhou em outrasáreas como a construção civil e acerâmica.Isabel Eugénio, nascida a 28 deNovembro de 1945, foi funcionáriada Euroaudio durante todosos anos em que a fábrica funcionou.A falência dessa empresalevou-a para o desemprego e foimais uma das razões para o casaldecidir investir num negócio próprio.“A mãe do meu maridoera cozinheira e ele teve sem-pre vontade de ter uma casade pasto“, explicou.“Começámos com umcafé”, conta José João Eugénio,que a princípio ainda continuou atrabalhar nos fornos da indústriacerâmica (passou pela Secla e A.Santos). “Tivemos muito traba-lho e foi preciso fazer muitossacrifícios”, refere o comerciante.A mulher e as filhas tomavamconta do estabelecimento, enquantoJosé Eugénio mantinhaainda outro emprego.Os petiscos e doces acabarampor surgir devido à procura. Vendiampão com chouriço e tartescaseiras, mas o berbigão, vindoda Lagoa de Óbidos, era a iguariamais famosa daquela casa.Os problemas que começarama surgir com o berbigão da Lagoafizeram com que decidissem apostarno frango assado cerca de trêsanos depois de terem aberto aUma reportagem numa publicação da empresa Avibom(ainda hoje fornecedora dos frangos) elogiava oscozinhados desta empresa caldensecasa. “A A venda de berbigão foiproibida. Começou-se a falarmuito mal dos bivalves e aspessoas deixaram de apare-cer”, contou.Como não havia muita oferta aonível dos frangos assados nas <strong>Caldas</strong>,o casal entendeu que seria uminvestimento a ter em conta.“Nessa altura os supermercadosainda não tinham má-quinas de assar frango, quesão a nossa maior concorrên-cia”, explicou José Eugénio.Apesar disso, o comercianteconsidera que nada substitui o saborapurado que conseguem darao seu produto. “Ainda hoje seouve dizer sobre a qualidadedo nosso frango assado. É damaneira de cozinhar. Até temosemigrantes que aparecemaqui porque têm saudadede comer o nosso frangui-nho”, referiu.O segredo tem sido sempre omolho e a qualidade dos frangos.Apesar de terem experimentadooutros fornecedores, há váriosanos que apenas adquirem os animaisàs empresas Avibom e Interaves.Chegaram a ser notícia numapublicação da Avibom, numa reportagemque enaltece os saboresque a família dá aos seus produtos.Para além do frango assado,a notícia referia então “o su-culento pão com chouriço”, asbatatas fritas caseiras, o pão caseiroe a tarte de frango.O responsável da empresa quelhes instalou o equipamento paraassar também lhes prognosticousucesso depois de ter provado oprimeiro frango. “A princípio foidifícil, mas depois correu tudobem. Tínhamos sempre umafila para vender frangos”, recordaIsabel Eugénio. Em poucotempo tiveram que comprar equipamentocom mais capacidade.Sempre que os frangos chegamàs instalações do Xaneca precisamde fazer a sua limpeza e tratamento(retirar as penas, os selose as gorduras).Os clientes e artistas doFerro VelhoPara além de estarem situadosnum bairro residencial, haviaPais, filhas, genros e netos. Três gerações fotografadas no Xaneca I, o café onde tudocomeçoumuita gente de outros locaisque se deslocava até ao Avenalpara comprar frango assado. Ostempos eram outros e fora doscentros urbanos havia poucaoferta deste produto. O factode serem vizinhos da antiga discotecaFerro Velho fez com quenessa altura alargassem o horárioe estivessem a funcionaraté de madrugada.“Tínhamos sempre gente atéàs tantas da manhã. As pes-soas vinham sempre aquibeber uma cervejinha ou co-mer uma bifana”, recordouJosé Eugénio. “Às Às vezes tra-balhávamos até às sete damanhã e depois era só ir tomarbanho a casa para vol-tar para aqui. Tínhamosque aproveitar tudo”.Nessa altura, o Ferro Velhoera local de passagem de cantorescomo Rui Veloso, Zé Praia,Nelo e Jorge Loução, entre outros.Os artistas iam sempre comerantes ao Xaneca e às vezesaté dedicavam alguns versosao frango assado nas suasactuações. “Às vezes aindaíamos assistir a algunsconcertos”, conta..Agora o maior movimentoacontece no Xaneca II e III, queestão localizados no centro dacidade. “Só temos é queagradecer a todos os clien-tes que confiaram em nós enos ajudaram a chegaraqui, apesar das dificulda-des”, salienta Isabel Eugénio.Dos nitrofuranos àconcorrência doshipermercadosO Xaneca começou por ser apenas um café, que abriu na rua do Avenal em 1987, mas ao longo dos anos transformou-se numaempresa familiar com três estabelecimentos comerciais em vários locais da cidade e longe vão os tempos da dedicação quaseexclusiva ao frango assado.Comida para fora, petiscos e doces fazem dos três Xanecas local de romaria para muitos caldenses, e não só.Actualmente, pais e filhas (e um dos genros) dividem-se pelos três estabelecimentos, trabalhando em conjunto e mantendouma ligação estreita. Os jantares semanais à segunda-feira servem para conviver em família, mas também para falar denegócios.Depois de alguns anos a trabalhar em nome individual, José João Eugénio criou a Xaneca Snack-Bar, Lda, numa sociedade coma mulher, Isabel, e as suas duas filhas, Alexandra e Carla.Para além dos fundadores e das filhas, trabalham nos estabelecimentos sete pessoas.A crise económica tem afectadotodos os sectores e a vendade frango não é excepção,mas foi com a polémica do nitrofurano(um anti-bacterianopotencialmente cancerígenoque foi utilizado ilegalmente poralgumas empresas na alimentaçãodas aves) que o negócio maisse ressentiu.“As As pessoas tiveram mui-to medo. Já tínhamos o segun-do estabelecimento e tínhamosdias em que nem um frango as-sado se vendia”, lembrou MariaIsabel Eugénio.Desde essa altura, o sector dofrango continua a não ter melhoriase cada vez vendem menos. Tal devesetambém à concorrência dos hipere supermercados que começaram afornecer o mesmo produto.Só que a família sempre soubeadaptar-se às necessidades dos clientes.A abertura do segundo estabelecimento,a 1 de Abril de1997, foi o primeiro passo paraessa diversificação. “Durante ofim-de-semana tínhamosmuitos clientes no Avenal,mas durante a semana aspessoas não apareciam” epor isso Isabel Eugénio convenceuo marido a abrirem umanova casa no centro da cidade.Chegaram a comprar primeiroo local onde actualmente funcionaa Xaneca III, mas acabarampor abrir primeiro as instalaçõesna rua Professor ManuelJosé António. Com uma sala derefeições e melhores condições,o sucesso foi imediato. Voltaramas filas para comprar frangoassado e grelhados.Entretanto, tiveram que seadequar mais uma vez à procurae começaram a investir tambémna cozinha tradicional portuguesae não apenas nos grelhados.O Xaneca III começou por servocacionado apenas para otake-away (comida para fora) equando abriu nem sequer tinhammesas, mas os clientes começarama querer mais e acabarampor fazer obras para podercolocar lugares sentados.Em pouco tempo começarama servir pequenos-almoços e refeiçõescom prato, com preçosconvidativos. À hora de almoçohá sempre muita procura pelospratos económicos e pela comidaa peso, “com um equilíbrioentre o preço e a qualidade”,como explica Alexandra Bastos.A família acaba por se dedicartotalmente a este negócio eaté as reuniões semanais familiaresacabam por se tornar tambémencontros profissionais. Amatriarca faz questão de juntarfilhos e netos na sua casa, queconstruíram no Avenal, todas assegundas-feiras.Mas José Eugénio teria preferidoque as filhas tivessem seguidooutro ramo profissional.“Esta vida exige muito trabalhoe tem muitas dificuldades.Cada vez está mais difí-cil”, afirmou.A mãe gosta que elas trabalhemconsigo, mas sabe que avida das suas filhas é muito difícile cheia de trabalho.Pedro Antunespantunes@gazetacaldas.com


ou-seO casal José João e Isabel Eugénio. Vinte anos separam estas duas imagens no estabelecimento onde se venderam os primeiros frangos.Alexandra Eugénio Barros tem35 anos e recorda-se de comogostava de uma máquina registadoraantiga que os pais tinham.“Eu só queria era mexerna máquina. Para mim aquilo eraum brinquedo”.Com 12 anos, os pais estavamsempre a dizer-lhe para não ficardentro do balcão porque eraainda muito nova. Mesmo quandocomeçou a ajudar, optarampor a colocar na cozinha “por-que eu era mais rebelde”. AlexandraBarros não se importounada “porque sempre gostei deexperimentar o que se cozinha-va”.A jovem lembra-se como noprimeiro Xaneca compunha comfrango assado, batatas fritas euma salada bem temperada,tudo servido em travessas dasFaianças Bordalo Pinheiro. Issodeixou de ser feito porque haviaclientes que não gostavam queo frango quente viesse misturadocom a salada.“A minha mãe foi muito luta-dora. Sempre que havia menosafluência de clientes, inventa-va sempre alguma coisa nova”,recorda.A irmã Carla Eugénio, maisvelha quatro anos, começou logoa trabalhar ao balcão para ajudaros pais. Dividia o atendimentocom o seu primo FernandoMarques, que só podia estarno café aos fins-de-semana.“Eu lembro-me de vir do li-ceu a correr, toda contente porvir trabalhar para aqui”, recordouCarla Eugénio. Depois o paicomprou-lhes uma “acelera”(pequena motorizada) e em 10minutos faziam a viagem entrea escola e o café. A primeiramota foi roubada, mas acabarampor ter de comprar outraporque facilitava muito a vidaàs duas irmãs.O primo tinha casado na alturaem que o primeiro Xanecaabriu e fazia um part-time nocafé. Uma ligação que ficou atéaos dias de hoje, acompanhandoa evolução do negócio.Um verdadeiro negócio de família“Lembro-me bem dos almo-ços de peixe-espada grelhadoque fazíamos ao sábado”, recorda,sublinhando o facto de semprese terem dado bem. Actualmentefica sempre na caixa registadorado Xaneca II aos finsde-semanae feriados.Alexandra Bastos frequentouo curso de Psicologia Organizacionalaté ao 4º ano na UniversidadeLusófona, mas como nãopôde seguir a vertente que pretendia,acabou por desistir.Foi nessa altura, em 2001, queabriram o Xaneca III pelo qual afilha mais nova ficou responsável.Antes disso, Alexandra Bastosesteve a trabalhar no Algarve,onde conheceu o seu marido,Ricardo Barros.Como era do Algarve já tinhamuita experiência na restauração,sector onde trabalhava todosos verões, mas tinha prometidoa si próprio que nuncamais trabalhava num restaurante.No entanto, acabou por setornar o responsável de sala doXaneca II.Embora tenha custado umpouco habituar-se às <strong>Caldas</strong> daRainha, porque era tudo muitodiferente de Albufeira, ondemorava, acabou por se adaptarbem e fazer novas amizades.“As pessoas ganham confian-ça comigo e eu às vezes atédecido o que eles vão comermuito tempo para conseguir faguidocom o nosso esforço. Ninporquepedem-me sempre opi-zer obras”, referiu José Eugé-guém nos deu nada. Nem sequernião”, contou.nio.tivemos ajuda dos pais”, concluiuIsabel Eugénio, salientan-A descendência está assegurada.Carla Eugénio tem um fidelaro Xaneca II e fazer obras do que para se ter um negócioO objectivo é voltar a remolhocom 11 anos e Alexandra de ampliação e melhoramentos próprio é preciso fazer muitosBarros tem dois filhos, uma meninade cinco e um rapaz commelhores condições aos clien-oito anos. As três crianças gos-tes e para isso vamos fazerP.A.tam de estar nos estabeleciobras,fazendo ao mesmo temmentos,até porque é uma for-po melhorias nas cozinhas”, re-no Xaneca III. “Queremos darsacrifícios.ma de estarem mais perto da feriu Isabel Eugénio.CRONOLOGIAfamília.Já adquiriram uma loja ao ladoPara Isabel Eugénio trabalhar do Xaneca III para poderem cri-1987 – abertura do Xanecacom a família tem vantagens e ar ali uma sala de refeições, masI, na rua do Avenal, por Josédesvantagens. Se por um lado é ainda esperam que o projectoJoão Eugénio, à data como estabelecimentoem nome indi-bom poder sempre contar com esteja concluído para avançartodos, sem que se reclamem os com o processo e as obras.direitos como trabalhadores, por “Temos que fazer obras pevidualoutro lado esse convívio laboralriodicamente porque estas ca-1993 – constituição da sociedadeXaneca Snack-Bar,desgasta o ambiente familiar.sas precisam de ser remodela-“Mas tem mais vantagens dodas”, considera a empresária.que desvantagens”, sublinha. Embora façam limpeza geral das Lda (sociedade com os pais emáquinas todas as semanas, filhas) com um capital socialContinuar a investir e aacham que também é importantefazerem intervenções de fun-1997 – abertura do Xanecade 100 mil euroscrescerdo para melhorar as condiçõesII, na rua Professor ManuelApesar da crise, a família dos seus espaços.pretende investir nos seus estabelecimentos.O pior é a bu-ou outras benesses, mas gosta-2001 – Abertura do XanecaA família não quer subsídios José Antóniorocracia que tem vindo a atrasaros projectos. “Andamos há“Tudo o que temos foi consevaque fosse mais fácil investir.III, na rua José Pedro FerreiraMãe e filha mais velha. Isabel e Carla estão à frente do Xaneca II. O take-away e ospetiscos são uma alternativa à redução do consumo de frangoA Xaneca 3 abriu em 2001. Alexandra Barros, filha dos fundadores (terceira a contar daesquerda) com as funcionários do terceiro estabelecimento.


UMA EMPRESA, VÁRIAS GERAÇÕESCasa Zelu veste noivas há mais de 40 anosMaria de Lourdes Ferreiranasceu em 1937 e teria 15 anosquando começou a trabalhar nocomércio caldense. Primeiro foifuncionária da Casa Antão, ondechegou a ganhar 150$00 (75 cêntimos)por mês. Este estabelecimentosituava-se no local ondeestá hoje a loja Ornatus e naépoca vendia tecidos e tinhaserviço de alfaiataria.Mais tarde passou para a CasaMonteiro, mantendo-se praticamenteno mesmo ramo de negócio,também dedicado a tecidos,lingerie e retrosaria.Nessa altura já namorava oseu futuro marido, José MariaAgostinho (1932-1972) que trabalhavana Casa Campos, tambémdo mesmo ramo e que ficavana Praça da Fruta.Maria de Lourdes conta quefoi então que lhe ofereceram umoutro emprego também no comércio,a ganhar mil escudos(cinco euros) por mês em vezdos 700 escudos (3,5 euros) queauferia na Casa Monteiro. Aindaponderou a oferta, mas acaboupor desistir em nome daconfiança que tinha no seu empregador.Acabou por ficar erapidamente se tornou encarregadade balcão. “Quando saída Casa Monteiro já ganha-va esse valor”, recordou a comerciante,que sublinhou váriasvezes a amizade que a ligavaao ex-patrão.A Zelu, um projecto do casal,abriu portas ao público a 15 deMaio de 1968 no nº 48 da RuaHeróis da Grande Guerra (ondeé a For Men). Vendia lãs, tecidos,atoalhados e têxteis-lar,como as lojas onde ambos tinhamtrabalhado.“Naquele tempo o comér-cio estava aberto nesse dia”,recordou a comerciante. JoséMaria Ferreira era uma pessoaatenta, sempre à procura de ino-José Maria Agostinho (1932-1972) foi um dos fundadores da Zelu. Ao lado Maria de Lourdes Ferreira acompanhada pelos filhos Paulo e SusanaAgostinho. Os três são sócio-gerentes do grupo.vação e ia com frequência a Lisboaver o que as casas da capitalfaziam nas suas montraspara poder inovar nas <strong>Caldas</strong>.A Casa Zelu abriu no Dia da Cidade em 1968 a vender tecidos a metro. Mal sabia ainda o casalfundador que iria especializar-se e tornar-se numa das primeiras casas do país especializada emnoivas. Quarenta e dois anos passados a casa cresceu e a matriarca Maria de Lourdes Ferreira jáconta com os dois filhos na gestão deste grupo empresarial caldense que possui quatro lojas(duas nas <strong>Caldas</strong> e duas em Lisboa). Em 2008 facturaram mais de meio milhão de euros.Chegava até a escrever propositadamentecom erros para aspessoas pararem, nem que fossepara corrigir o que estavaerrado. “Interessava era atra-ir gente à loja”, contou a comerciante.A primeira localização da Zeludurou 12 anos, já com uma pequenaárea dedicada às noivas.Durante este tempo nasceriamos dois filhos do casal – Paulo eSusana Agostinho.Em 1972 José Maria Agostinhofaleceu, vitima de doença prolongada.Paulo tinha oito anose Susana, quatro. A viúva nãose deixou abater e pegou emmãos o negócio que tinha iniciadocom o seu marido.As necessidades de mais espaçoeram óbvias e por isso amatriarca decidiu mudar para aloja actual, situada um poucomais à frente. “Só Só que tinhaum problema. Tinha umarenda de mil escudos e pas-sei a pagar 20 contos!”.Mas mudou-se. Na altura játinha duas empregadas e continuavaa vender tecidos, lingerie,atoalhados, bordados, cambraias,missangas e retrosaria.Mas aumentou a área especializadaem vestidos de noivas.“Era um sucesso. As pes-soas gostavam de ver asprovas e até cheguei a pen-sar que em vez de ter dedi-cado uma pequena parte,deveria ter concedido maisespaço para as noivas”. Essadecisão só a tomaria, porém,mais tarde.Nos anos oitenta a Zelu dedica-setambém à confecção echegou a ter 14 funcionárias, dasquais cinco a trabalhar no ateliere nove no balcão.Pouco a pouco começa a haveralgum desinteresse pelaárea dos tecidos e chega a horade apostar na especialização dosImagens da Zelu quando foi inaugurada, em 1968. Já tem vestidos de noiva mas ainda se dedica à venda de tecidosvestidos para noivas. Maria deLourdes Ferreira recorda-se deviajar aos armazéns do Nortepara fazer compras. “Eu Eu saíaàs cinco da manhã, levavaos meus dois filhos atrás.Tinha o melhor Fiat da altura,um 1500, que andou qui-lómetros e quilómetros...”,recordou a comerciante.A EXPANSÃO“Chegámos a vestir du-rante os meses de verão 20 a30 noivas por semana”, contouMaria de Lourdes Ferreira,referindo-se às décadas de 80 e90. Na sua opinião, o forte doseu negócio é o serviço pós-vendae não foram raras as vezesque iam vestir a noiva a casa,fosse ela de Ferreira do Alentejoou de Braga. ”Ninguém pa-gava mais por isso”, contou aempresária, explicando que éraro, mas ainda o fazem. “Fo-mos há dias à Nazaré poiscomo vestimos a mãe, ago-ra tivemos que vestir a filha”,contou.A casa Zelu veste noivas detodo o país e também quem estáemigrado. “Temos clientes daSuíça, Inglaterra e Françaque compram os vestidoscom um ano de antecedên-cia”, contou a empresária.Por sugestão dos fornecedores,mãe e filhos começaram afrequentar as feiras internacionais.E em 1989 Maria de LourdesFerreira toma a decisão deabrir uma loja em Lisboa.“Tínhamosduas ou trêscolecções que não se ven-diam nas <strong>Caldas</strong> porqueeram demasiado inovadorase precisavam de ou-tros mercados”, disse a empresária.Foi assim que abrirama loja Rebecca Noivas, nazona do Marquês de Pombal.Como fica na Rua CamiloCastelo Branco, escolheramaquele nome pois há umaobra deste autor onde há umapersonagem que é uma noivahomónima.A continuação da expansãodo negócio dá-se em 1994,através da abertura da terceiracasa do grupo, tambémperto do Marquês – a lojaCymbeline, uma marca francesaque tinha os proprietáriosda Zelu como seus representantesem Portugal.Em 1998 abre a quarta lojada família (e a segunda das<strong>Caldas</strong>). Também se chamaCymbeline e fica na Rua HenriqueSales. Os três sócios tiveramde convencer a marcafrancesa que a cidade erauma boa aposta porque osseus fornecedores preferiamoutra localidade de maior dimensão.Ao todo na estrutura trabalham10 pessoas, cinco nas<strong>Caldas</strong> e as restantes nas lojasem Lisboa. Há vários trabalhosque são pedidos emoutsourcing como, por exemplo,bordados específicos queas noivas queiram nos seusvestidos.Apesar da crise, a expansãodo grupo não parou, estandoprevista para breveuma nova abertura.Natacha Narcisonnarciso@gazetacaldas.com


Um gestor e uma estilista paracontinuar o negócio da família“Somos uma das primei-ras lojas da especialidadedo país”, disse Paulo Agostinho,45 anos, que tirou o cursode Gestão e desde os 24 que trabalhapara a empresa familiar.É o responsável pela vertenteadministrativa e financeira, enquantoque a sua irmã, SusanaAgostinho, é a criativa (ver caixa)da casa, hoje com sua própriamarca.Paulo Agostinho tinha quatroanos quando a Zelu abriu e recordaa capacidade inovadora dasua mãe que sempre apostouem acções de marketing. Brincavacom os amigos no Beco doBorralho enquanto a sua mãemandava fazer flyers de divulgaçãoda sua casa comercial,que ao fim de semana espalhavampelas aldeias da região duranteos passeios em família.Lembra-se também de quandoa mãe mandou fazer um filmesobre a Zelu que passavaantes dos filmes no cinema e quechegou a ser exibido no EstúdioUm. Também fez anúncios naRádio Renascença e páginas inteirasde publicidade nos jornaisda época para dar a conhecer aespecificidade do seu negócio.“Eram acções muito bem feitasque marcaram a diferen-ça”, contou o gestor.“Nós continuámos a mar-ca que as pessoas sabem queé rigorosa e cumpridora”, disseo empresário, que divide o negóciocom a mãe e a irmã.O segredo para manter umnegócio há 42 anos é apenas“trabalho, rigor, espírito desacrifico, muita dedicação etambém algum talento”, disseo empresário. Na sua opinião,a mãe, Lourdes Ferreira, “é onosso melhor balcão”.Segundo dados do INE, em relaçãoà última década dos anos90 “houve um decréscimo de<strong>Cronologia</strong>50% nos casamentos, aocionais para ser consultora.passo que a oferta aumen-“Criar um vestido de noi-tou”, disse Paulo Agostinho. Sóva é construir um sonho. Po-nas <strong>Caldas</strong> há cinco lojas. Hojedemos casar 10 vezes com oem dia é difícil saber como semesmo empenho, mas ne-chega às 40 mil pessoas que ain-nhum é como o primeiro”,da casam em Portugal.conta.As noivas que escolhem a Zelu Segundo a criadora de moda,continuam a chegar de todo o cada vestido e cada noiva sãopaís. Cerca de 70% são de fora do únicos. Logo tem que ser desenhadocom emoções.concelho das <strong>Caldas</strong>. Vêm de Braga,Sintra, Cascais, Montijo e “é Susana Agostinho diz que àuma pena que a cidade nãomedida que se vai aproximandotenha uma sinalética em con-a data, a cliente vai diminuindodições”, disse o empresário. a confiança e ficando mais nervosa.“É pois preciso manterloja tem no verso a localizaçãoa nossa qualidade e a nossados parques de estacionamen-inovação”, explicou a estilis-O próprio cartão de visita dato da cidade. Paulo Agostinho ta, que respeita o sonho dasdiz que as <strong>Caldas</strong> “tem bom co-suas clientes para aquele dia esmércioe lojas que não a deipecial,sem esquecer as carac-xam ficar nada mal”. Mas terísticas do seu corpo e as tendênciasda moda.meio envolvente não evoluiu“O nosso vestido não temtanto como deveria e não senada a ver com o da nossaadequa aos novos tempos”.mãe”, disse a criadora de moda,apesar dos bons espaços, “oexplicando que hoje uma noivaA festa não pode pararnão aceita vestir algo que nãopermita mexer-se. Hoje em diaa noiva quer dançar e estar àAinda a Zelu funcionava nonº 48 quando Susana Agostinhoassistiu a uma venda que lhemarcou o futuro - um vestido denoiva vermelho. “É mesmo istoque quero fazer!”, pensou paraconsigo e de facto todo o seu1968 – Inauguração da Zelu no nº 48 da R. Heróis da GrandeGuerra1979 – Mudança para as actuais instalações no nº 56 da mesmarua1989 – Inauguração da Rebecca-Noivas em Lisboa1994 – Inauguração da Cymbeline em Lisboa1998 – Inauguração da Cymbeline-<strong>Caldas</strong> na Rua HenriqueSalesO grupo é composto por duas sociedades por quotas - a Génova,Lda. (detentora das lojas Rebecca-Noivas e Susana Agostinho)e a Virtual, Lda. (que detém as lojas de marca Cymbeline).Ambas têm um capital social de 100 mil euros, repartido empartes iguais pelos três sócios. A primeira loja Zelu pertenceintegralmente à empresária em nome individual Maria de LourdesFerreira.vontade, “mesmo que queiraestar fantástica e ser o focoda atenção das 150 pessoasque convidou”.Susana Agostinho possui asua própria marca, faz as suaspróprias colecções e frequentaas feiras internacionais. Actualmentediz que estamos a voltaraos grandes românticos.percurso foi nesse sentido. “Atéporque sair todos os dias doColégio [Ramalho Ortigão] ever diariamente vestir princesasé algo que nos mar-“Em épocas de grandes cri-ca”, recorda.ses, as estruturas dos cria-Hoje a caldense, de 41 anos,dores não podem parar,tem a sua marca própria e é es-caso contrário o resto datilista de noivas. Foi estudar Essociedadeentra em deprestilismono Citex para o Porto du-são”, disse. Na sua opinião, arante quatro anos com o objectivoespecífico de apoiar a Zelu. ar e “se não se faz com 200Durante muito tempo Susanapessoas, faz-se com 100. MasAgostinho fui a única estilistaa rainha está lá na mesma”.portuguesa especializada emfesta também tem que continu-noivas e por isso muito “assedi-N.N.ada” por várias marcas interna-José Maria Agostinho e Mariade Lourdes Ferreira com o filho,Paulo, no ano em que o casaldecidiu investir na lojaO cor do vestido deve ser aquelaque a noiva sonharSusana Agostinho foi uma das primeiras estilistas emPortugal dedicada em exclusivo aos vestidos de noivaSócia-gerente, estilista residente,conselheira da marca,responsável por eventos. SusanaAgostinho é tudo isto e temainda a sua própria marca quevende nas suas lojas.“Estamos cá há 42 anos eas pessoas procuram-nospela credibilidade e porquesabem que são bem servi-das”, disse a criadora. A lojafaz provas aos sábados e até aosdomingos pois sabem que há clientesque não podem vir a outrosdias. “Estamos muitoatentos às necessidades dosnossos clientes”, disse a criadora.Este ano instituíram o DesignerDay, algo que se faz internacionalmente.Nesse dia SusanaAgostinho vem às <strong>Caldas</strong>(normalmente está em Lisboa)e apresenta as suas ideias aosclientes, com horas marcadas.“É uma inovação a que nospropusemos e que é feitapelas grandes marcas”, contou.Hoje em dia um vestido denoiva pode custar entre 300 e os3.000 euros e tudo o resto é escolhidoem função do tipo devestido. Este pode incluir saiote,que se usa ou não consoantea sua dinâmica. A lingerie tambémé escolhida de acordo comMãe e filha compraram osvestidos na Zeluo corte do vestido “pois traba-lhamos sobre uma formaque é o corpo da noiva, logoé um pormenor muita impor-tante”, disse a criadora.Segue-se a escolha dos sapatose dos acessórios como osanéis, pulseiras, apliques de cabeloe os brincos. Este últimospodem ser de família ou a noivapode preferir peças contemporâneas.Há quem queira seguira tradição inglesa e usar umapeça de roupa emprestado, outraoferecida, uma antiga e umade cor azul (há quem diga quetambém se deve levar uma peçaroubada).Indispensável é o bouquet ouuma estrutura que a noiva levena mão e que deve ser estudadopor quem cria o vestido.O uso do branco é uma ideiavitoriana pois antes as noivasvestiam-se segundo as cores dassuas cortes ou das épocas. “Acor do vestido de noiva deveser aquele com que ela so-nhar”, disse a criadora.E quais foram os vestidosmais invulgares que já venderam?Maria de Lourdes Ferreiracontou que há 30 anos vendeupara uma jovem do Chão da Paradaum vestido todo vermelho,plissado com um corte imperiale saia em soleil.Susana tinha 20 anos quandocriou o seu primeiro vestido colorido,neste caso, roxo. “O ves-tido de noiva é algo mágicoe tem esse dom - pode-se es-colher naquele dia a imagemque se quer recordar paratoda vida”, concluiu.Natacha Narcisonnarciso@gazetacaldas.comSofia Sousa, 49 anos, casouem Julho de 1979 e comprou oseu vestido na Zelu. “Já naque-le tempo esta era uma casade referência”, conta esta cliente,cuja filha, Patrícia Sousa,comprou recentemente o seuvestido na mesma casa.A arquitecta de 30 anos escolheuum vestido contemporâneoapós ter experimentado 18 modelose teve o aconselhamentode Lourdes Ferreira, que com elaconversou sobre o que preten-Patrícia e Sofia Sousa. A filha compra agora o vestido dedia para a festa que está mar-noiva na mesma casa onde a mãe comprou o seu há 31 anos.cada para uma quinta da regiãono próximo Outono.“As pessoas que dizemque não se querem casar éporque nunca experimenta-ram um vestido de noiva. Éuma verdadeira emoção,chorei logo quando experi-mentei o primeiro modelo”,contou a noiva.“Quero um vestido que aspessoas falem e que recordemdurante muitos anos”, dissePatrícia Sousa. Antes de ter ido àZelu foi a outras lojas e chegou alevar catálogos para experimentaros modelos que achava quelhe assentariam melhor.A mãe, Sofia Sousa, celebrana próxima quarta-feira, 21 deJulho, 31 anos de casada. “Foium casamentão, tinha 250convidados e durou trêsdias”, disse. Recorda que já naaltura gostou do atendimentoda Zelu e acrescentou que elese repetiu passadas três décadascom a sua filha.O seu vestido era um cai-caique em 1979 custou 30 contos(150 euros) e agradou aos 250convidados que assistiram à cerimóniareligiosa na Igreja doSenhor da Pedra.N.N.


UMA EMPRESA, VÁRIAS GERAÇÕESBraz Mendonça da Conceição, Lda. – da venda de prPara se conhecer a históriadesta firma é preciso recuar aoseu fundador, Braz Mendonçada Conceição (1923-1982), umescalabitano que veio fazer atropa às <strong>Caldas</strong> da Rainha nosanos quarenta e por cá ficou,tendo começado por trabalharno Thomaz dos Santos e empregando-semais tarde naCasa Caldeano.É nessa altura que se apaixona.O romance começounuma data e num local bemcaldenses: 15 de Maio de 1947,dia das Festas da Cidade, juntoao antigo casino (mais tardeCasa da Cultura). Ângela RibeiroMarques, então com 26anos, trabalhava nos Correioscomo telefonista e recordabem o dia em que conheceu ohomem que viria a ser o seumarido.Casaram-se em 1949 e durantemais de uma década, BrazConceição continuaria empregadoda Casa Caldeano, atéque em 1960 resolve trabalharpor conta própria num armazémque aluga na Rua da Electricidade(hoje Rua Dr. Saudadee Silva). A actividade centra-seno fabrico de cera parasoalho e em ganchos para telha(um artigo feito em arameque segurava as telhas burro,muito em uso na época). Fabricatambém, ele próprio (nãotinha empregados), os pacotesde papel pardo para o embalamentoe faz também filtrospara automóveis, chegandomesmo a importar feltro de Inglaterrapara integrar na suaprodução caseira.“Era muito habilidoso e ti-nha muitas ideias. E era umperfeccionista. Com condi-ções apropriadas, teriadado um bom engenheirode produção ou um projec-tista”, diz o filho mais velhoJosé Mendonça, ele próprio engenheiro,acerca do seu pai.Graças à sua habilidade ecapacidade de trabalho, o negóciocorria de feição. Ângelacontinuava como telefonistanos Correios e entretanto ocasal tivera já dois filhos: Joséem 1950, e Carlos em 1954.Mas às vezes a desgraçabate à porta e esta tomou aforma de um grande incêndio.“Avistava-se até na Foz daArelho”, conta Ângela Conceição,que ainda hoje, 40 anosvolvidos, fala com emoção daqueledia de 1962 em que o fabricode cera descambou numfogo que queimou a cara e asmãos ao seu marido e o obrigoua recomeçar do zero.Braz Conceição manteve oBraz Mendonça da Conceição (1923-1982) fundou a firma homónima em 1965 na Rua Dr. Miguel Bombarda, que é hoje gerida pela viúva e pelos dois filhos.É em Agosto de 1965 que Braz Mendonça da Conceição abre na Rua Dr. Miguel Bombarda uma casaque vende essencialmente atomizadores e motores de rega. Um passo de gigante para um empresárioque até então se dedicara a várias actividades comerciais, artesanais e industriais, mas quereceara avançar para que, à época, representava algum fôlego – um trespasse de 8000 escudos (40euros) para instalar a sua firma.Hoje esta casa é uma das mais conhecidas das <strong>Caldas</strong> e é gerida pela viúva do fundador e pelosdois filhos, ambos engenheiros, que souberam olhar para o futuro e criar ofertas para responder anovas necessidades.armazém, mas desistiu de fabricarcera. E continuou nos negócios:foi vendedor de aglomeradosde madeira e artigosde drogaria, lâmpadas, pilhas,fechaduras e - com o aparecimentodos plásticos - tambémde baldes e alguidares. Embreve está também numa actividadeprópria da época, queconsistia em zincar pregos. Efaz mesmo uma incursão narecauchutagem de pneus decamiões.Outros produtos emergemno mercado: os motores derega e os atomizadores, quevêm substituir os velhos pulverizadoresde cobre. É comestes que irá abrir em 1965 aloja que ainda hoje existe naRua Dr. Miguel Bombarda, geridapela sua mulher e os doisfilhos.“Ele soube que o espa-nhol ia trespassar a casa eandou muito indeciso. Omeu marido era muito tra-Braz Mendonça da Conceição e Ângela Ribeiro Marquesnuma fotografia de 1948balhador, mas dizia quegostava de dormir descan-sado. Tinha medo de tomarcompromissos que nãofosse capaz de cumprir. Eué que lhe dei força. Disse-lhe que a loja ficava mesmono caminho da estação”.Ângela Conceição conta quenaquele tempo a feira das segundas-feirasdecorria no espaçoque é hoje a Av. da IndependênciaNacional e queaquela rua era das mais frequentadasda cidade. “Estarua era um corrupio degente que chegava doscomboios... vinham à pi-nha”, recorda a viúva, hojecom 89 anos.O trespasse é formalizadonum documento que faria hojearrepiar qualquer notário oucausídico – um pedaço de papelpardo onde o “espanhol”Avelino Cendor Portela cede asua loja de chapéus de chuvaàs actividades de Braz Conceiçãopor oito contos (40 euros).A Braz Mendonça da Conceição,Lda. abre ao público a 15de Agosto de 1965. “Sem fes-tas nem inaugurações, quenesse tempo não havianada disse”, conta Ângela.A aposta do comerciante revela-seacertada: atomizadores,motores de rega e acessóriossão um mercado emergentepara o sector agrícolanos anos sessenta.Sempre cauteloso, BrazMendonça não arriscou pôrlogo um empregado e trabalhousempre sozinho à frenteda loja. Só poucos meses depoisda morte do seu fundador,em 1982, a firma viria ater um empregado – Paulo Sérgio,então com 14 anos que aindahoje nela se mantém (vercaixa).Carlos Ciprianocc@gazetacaldas.comNelson, Neves, Rui, José Mendonça e Paulo Sérgio. Funcionários e patrão em 1988 duranteuma mudança provisória de instalações para fazer obras na loja.


odutos agrícolas às energias renováveisA importância da engenharia“Somos uma empresa lí-der em sistemas de rega,somos especialistas embombagem, temos alvará deinstalação de sistemas foto-voltaicos [produção de energiaeléctrica para uso próprio evenda à EDP através de painéissolares], , e entramos no mer-cado do tratamento deáguas por via da nossa afi-nidade com a preservaçãodo ambiente”. É assim queCarlos Mendonça, 56 anos, caracterizaa empresa que o seupai criou e cuja gestão partilhahoje com o seu irmão e a suamãe.Em paralelo a loja vende aindaprodutos como os que haviahá quatro décadas, mas hoje acomponente agrícola da firmarepresenta 40% da sua facturação,quando noutros temposchegou aos 60%.Uma das etapas mais marcantesdesta empresa data dosanos setenta, com o boom dossistemas de rega. A firma apostaforte neste mercado e chegaa ter cinco empregados dedicadosa esta actividade (actualmentesó tem dois trabalhadores).Hoje este é um mercadomaduro, mas Carlos Mendonçadiz que sempre tiverama preocupação de perscrutarnovas actividades e daí a apostanos tratamentos de águas,bombagens e agora nas energiasrenováveis. Aliás, a montrada loja que em tempos tinhaprodutos para a agricultura,conta hoje com jogos didácticospara crianças baseadosem energia solar, alguns delesnascidos na Faculdade de Ciênciasde Lisboa.Durante estes anos, a empresafoi também uma espéciede escola que formou especialistasem sistemas de rega poisalguns dos funcionários que porlá passaram, acabaram por selançar também nos seus negóciosnesta área.E como foi que a loja que vendiaatomizadores é hoje líderem modernos sistemas derega? A história das empresasé, também, a história das pessoasque nelas trabalham.Carlos, o filho mais novo deBraz Mendonça, tinha 20 anosem 25 de Abril de 1974 e abraçoua revolução. Na altura estudavano ISEL (Instituto Superiorde Engenharia de Lisboa) ànoite e trabalhava de dia nasOGMA (Oficinas Gerais de MaterialAeronáutico) em Alverca,uma forma de então escaparà guerra colonial. “A alter-nativa era desertar”, contaCarlos Mendonça, que à datadetinha já uma postura activade oposição à ditadura.O seu empenho revolucionárioleva-o a interromper os estudose a dedicar-se à políticaa tempo inteiro. Esta experiênciadurará até 1980, quando opai o convida para trabalharcom ele, aproveitando aindapara concluir o curso de engenheiroelectromecânico à noite.No fim de contas, um engenheiroviria a ser muito útil àfirma, como mais tarde se viriaa provar.“Somos o típico comérciotradicional”E se um engenheiro já erauma mais-valia, dois engenheiroseram-no muito mais. JoséMendonça, o irmão mais velho,tem um percurso parcialmentecoincidente: também estudavano ISEL e trabalhava nas OGMA.E pela mesma razão de nãoquerer ir para uma guerra queconsiderava injusta.Termina o bacharelato em1976, mas antes disso já davaaulas. Trabalhos Manuais, maistarde Educação Visual e Tecnológica.O professor Mendonçaandou por escolas de Lisboa,Azambuja, <strong>Caldas</strong> da Rainha eÓbidos onde se pré-reformouO documento do trespasse da loja, escrito numa folha depapel pardo. À época a palavra e honra dos homens contavamais do que a burocraciaNo edifício da loja (que depois do trespasse acabariapor ser adquirida pelo fundador da empresa) funcionouentre 1936 e 1952 o Colégio Ramalho Ortigão. Recentementea montra do estabelecimento foi decorada com umaexposição que contava essa história.em 2007, antes de fazer 60 anos.“Não me estava a agradarentrar como avaliador noprocesso de avaliação dosmeus colegas”, conta, queixando-sedas políticas que geraram“um clima de concor-rência e competição poucosolidária” entre os professores.A reforma colocou-o a tempointeiro na gestão da BrazMendonça da Conceição, Lda.à qual, de resto, sempre estiveraligado. Em menino era paraa loja do pai que vinha depoisdas aulas e era ali que passavaparte das férias escolares.Naquela idade não pensavavir um dia para a firma, masreconhece que foram as actividadesque ali desenvolveu, ligadasaos motores, às máquinase a variados equipamentos,que influenciaram a sua vocaçãoe formação em engenharia.A mãe, Ângela, não é umafigura decorativa. Aos 89 anoscabe-lhe a parte administrativada firma e é vê-la, ao telefone,rodeada de papéis e dossiers.Carlos Mendonça diz que éprestação de serviços, mais doque a venda ao balcão, que representao grosso da sua facturação.“Somos o típico co-mércio tradicional. É rarovendermos uma coisa semter que explicar o que é ecomo funciona. E é isso quecaracteriza a relação deproximidade deste tipo decomércio”.A crise também se tem feitosentir neste sector e as vendasao balcão diminuíram. São osparticulares que se retraem nacompra de pequenos artigospara jardinagem e rega. E sãoos construtores civis que estãoparados e não lhes adjudicamalgumas subempreitadas (aempresa tem alvará para instalaçãode equipamentos mecânicose costuma montar sistemasde bombagem).Masonde a crise mais se nota é nospagamentos atrasados. “Te-mos clientes que dizem quenão nos pagam porquetambém não lhes pagam aeles...”, lamenta-se CarlosMendonça.A boa notícia é que desde háum ano a Braz Mendonça daConceição Lda. conseguiu serdistribuidora da prestigiada ITTque vende bombas Lowara eFlygt. Quem percebe deste sector,diz que é material topo degama e que só o facto de o representaremabona a favor daimagem.Para o futuro, dizem os irmãos,a estratégia passa por“consolidar as franjas demercado em que estamosimplantados e pugnar pelaassistência pós-venda que éuma coisa que nos tem dis-tinguido”.C.C.“Não gosto muito de mudanças”Paulo Sérgio tinha 14 anosquando veio para o balcão destacasa comercial. Natural daNazaré, vivia então em Salir doPorto e é um amigo da família,Joaquim Godinho, que lhe falada possibilidade deste emprego.Estava-se em Março de 1982,Braz Mendonça tinha morridotrês meses anos e a contrataçãodo jovem Paulo é um dosprimeiros actos de gestão deCarlos Mendonça.“Naquela altura havia ummovimento contínuo ao balcãode gente a comprar pe-ças para atomizadores emotores de rega”, conta o empregado,que ganhava entãoquatro contos por mês (20 euros),mas foi em poucos mesesaumentado para 4500 escudos.Do balcão, Paulo passa a assumiractividades administrativase técnicas. Acompanha aevolução da empresa e hoje partedo seu tempo é passado emtrabalho exterior em tarefas deinstalação, montagem e assistênciaa clientes. Admite que éCRONOLOGIAagradável trabalhar-se fora,mas tem o inconveniente de nãoter horários certos. Afinal nãose pode deixar um cliente penduradoe – se tiver que ser – odia de trabalho prolonga-se atétarde.Entretanto, casou, estudou ànoite na Bordalo Pinheiro parafazer o 10º ano (antes só tinha oantigo 2º ano do ciclo) e vivehoje no Chão da Parada. Mas há28 anos que trabalha no mesmosítio (com uma curta experiênciade três meses de trabalhona Suíça que não o entusiasmou).Porquê esta fidelidade a umaempresa numa época em que éfrequente mudar de emprego?“Tem a ver, por um lado,com a minha maneira de ser– não gosto muito de mudanças-, e por outro, com a en-tidade patronal pois semprenos demos bem e são pesso-as que eu considero”.C.C.O funcionário mais antigo da casa num dos poucosmomentos ao balcão. A maior parte do tempo está emtrabalho exterior.1962 – Braz Mendonça da Conceição regista-se como empresárioem nome individual1965 – Abre a loja na Rua Dr. Miguel Bombarda.1981 – Muda a firma para sociedade por quotas (Braz Mendonçada Conceição Lda.) com um capital social de 150 contos(750 euros), dos quais um terço são da sua mulher, ÂngelaRibeiro Marques Mendonça da Conceição1982 – Braz Mendonça da Conceição morre num acidente deviação1991 – Aumento do capital social da firma para 10 mil contos(50 mil euros) distribuídos entre a viúva e os filhos.Volume de negócios(em milhares de euros)


UMA EMPRESA, VÁRIAS GERAÇÕESAgência Funerária Neves foi criada nas <strong>Caldas</strong> da RaO empresário Jaime dos Santos Neves (hoje com 88 anos) e a esposa Laurinda Simões (1925-2003) fundaram a maior e mais antiga funerária caldense, negócio que o filho, JaimeNeves, prosseguiu a partir de 1975Jaime Neves organizou o primeirofuneral aos 14 anos. Ocalendário marcava o ano de 1963e o jovem ficara encarregadodos negócios da empresa familiarna ausência dos pais.“Apareceram os familiaresde uma pessoa que tinha falecidoe eu consegui orien-tar as coisas, juntamentecom um colaborador”, contao empresário, destacando quequando os pais chegaram, no diaseguinte, estava tudo tratado,à excepção da documentaçãoporque não tinha os 18 anos necessáriospara fazer a declaraçãodo óbito no Registo Civil.Esta foi a sua primeira “provade fogo”, mas Jaime Nevessempre se lembra de ajudar ospais na agência, fundada emJunho de 1955. Nessa altura sóhavia nas <strong>Caldas</strong> a Agência Ramos,da firma João Ramos eCompanhia, que já fechou assuas portas.O seu pais, Jaime dos SantosNeves (hoje com 88 anos), eraentão funcionário bancário eabriu a casa de móveis e agênciafunerária Neves, juntamentecom o sócio Manuel Soares.Esta sociedade viria a durar apenasum ano, ficando Jaime dosSantos Neves com a agência quese foi especializando na actividadefunerária.Filho único de Laurinda Simões(1925-2003) e de Jaime dosSantos Neves, Jaime Neves herdoudo pai, além do nome, aúnica actividade que viria a conhecerdurante toda a sua vidaprofissional. Nasceu em Leiria,mas foi criado na Rua do Jardim(hoje rua Alexandre Herculano),onde os pais residem e a agênciasempre se manteve. “Eupassei a ser um habitante darua e também um pouco“dono” dela”, brinca, lembrandoa sua vivência naquele espa-ço há mais de meio século.Naquela altura, e tambémmais interessado nas brincadeirasda rua, Jaime Neves nem seapercebia do trabalho dos pais.Só mais tarde viria a compreenderque é uma vida “relativa-A Agência Neves abriu portas em Junho de 1955 como casa de móveis e agência funerária, tendopor sócios Jaime dos Santos Neves e Manuel Soares. A sociedade acabaria foi terminar um anodepois ficando apenas Jaime dos Santos Neves, então com 34 anos, com o negócio que acabariapor especializar no ramo funerário e transformá-lo na agência mais conhecida das <strong>Caldas</strong>.O filho único de Laurinda Simões e Jaime dos Santos Neves, Jaime Neves herdou do pai, além donome, a única actividade que viria a conhecer durante toda a sua vida profissional. Uma profissãoque, apesar da sua especificidade, não deixou de sofrer também grandes alterações ao longo dotempo.mente presa porque os setedias da semana estão sem-pre incluídos em qualquerserviço fúnebre que venha aacontecer”.Ainda assim, o pequeno Jaimesempre ajudou a família notrabalho da funerária. A sua mãecostumava estofar o interior dasurnas - uma prática que já nãose faz porque agora as urnas vêmprontas de fábrica – que vinhamem tosco, sem acabamento interior.Aliás, como o pai trabalhavana sucursal do Banco dePortugal das <strong>Caldas</strong>, era a suamãe, Laurinda Simões Neves, queficava na agência durante o dia.Com os seus sete, oito anosjá se entretinha a “pregar asrendas no cetim e a dar caboda ponta dos dedos”, lembra,adiantando que cresceu praticamenteno meio das urnas quese encontravam dispostas pelaloja, até que passaram a ter umarmazém e na Rua do Jardim ficouapenas o escritório e serviçode atendimento do público.Com o serviço militar cumprido,em 1973, chegou a hora paraJaime Neves de escolher umaprofissão. “Naquele tempo eradepois da tropa que as pes-soas decidiam o que queri-am ser”, conta. No seu caso foifácil. “Esta é uma das activi-dades em que ou se gosta ounão se gosta. E eu sempregostei”.É assim que pega no negóciofamiliar, sucedendo ao seu pai,mas agora assumindo uma profissionalizaçãoque até entãonão existira.Mais tarde a empresa passaa ter funcionários. Antes, quandohavia funerais, recorria-seaos tarefeiros, normalmente osengraxadores da Praça da Fruta,conta Jaime Neves. Não eradifícil porque naquele tempohavia pelo menos uns 15 naquelazona da cidade.José Felizardo, empregado nacasa há 15 anos (ver caixa) contaque aprendeu o ofício com osseus colegas e o patrão, mashoje em dia já há formação profissionalnesta actividade, a cargoda ANEL (Associação Nacionaldas Empresas Lutuosas), daqual Jaime Neves, sócio nº 28, éactualmente o presidente daAssembleia Geral.DO CAIXÃO À URNANesta área também têm-seregistado muitas alterações. Aprimeira delas – com especialagrado do empresário – é a alteraçãodo termo caixão paraurna, pois trata-se do termo correcto.É que antigamente utilizava-seo nome caixão para designara caixa de madeira tosca,forrada a pano exteriormente,com que se faziam os enterramentos.Existem urnas de vários tipos,modelos e categorias, mas asfunerárias não conseguemabranger toda essa diversidade,acabando por ter meia dúzia demodelos com os quais trabalham.Jaime Neves explica mesmoque a zona Norte tem umtipo de urna diferente da deCoimbra ou Lisboa.Nas <strong>Caldas</strong> é o modelo Lisboao mais utilizado. Trata-sede uma urna rectangular, comlargura igual à cabeça e aos pés,enquanto que o modelo do Portotem à cabeceira uma largurasuperior aos pés.A acrescentar a estes formatos,existem ainda as de tampaou os baús, consoante a preferênciado cliente.“De De vez em quando surgemalgumas excentricidades,como o caso de quere-rem uma urna de amarelo”,conta Jaime Neves, que nãopode satisfazer estes pedidosporque prefere trabalhar apenascom os modelos tradicionais.“Mas há fábricas quetêm vermelhas ou verdes,para os adeptos clubísticosmais fervorosos”, conta oempresário, explicando que essa“tradição” passou para os potesde cinza, que os há de váriascores e formatos, como é possívelver na exposição que tem nasua loja.Um funeral pode custar entreos 300 euros estipulados peloGoverno como “funeral social”até aos 2000 euros ou muitomais. Depende em grande parteda urna, que pode variar dos325 aos 800 euros, embora ashaja também muito mais caras.Por exemplo, uma urna de mognopara jazigo pode custar 1100euros, em madeira munete já vaiaos 2500 euros e depois há urnasem pau santo que atingemquantias astronómicos.Seja como for, os funerais emjazigos estão fora de moda, peloque não é nesta segmento queJaime Neves faz o grosso do seunegócio. De resto, a actividadefunerária tem-se mantido maisou menos constante, residindoas principais diferenças numamaior opção pela cremação euma menor procura pelo serviçode jazigo.Apesar do aumento do númerode pedidos de cremação, oempresário não vê necessidadeda criação de um crematório nas<strong>Caldas</strong>, nem forma de o manter,explicando que, pela proximidadegeográfica, estão a deslocaros corpos a Lisboa paraserem cremados.Fátima Ferreirafferreira@gazetacaldas.comUm Chevrolet americano foi o primeiro carro da empresa. O veículo fez funerais atéfinais de 1976.


inha há 55 anosFaz falta um centro funerário nas <strong>Caldas</strong>O primeiro carro que a agência tevefoi um Chevrolet americano, depoisadaptado a carro funerário, cuja fotografiaainda hoje a firma ostenta, orgulhosamente,na parede do escritório.Nela é possível ver o carro estacionadona Rua Leão Azedo, junto às oficinas dosCapristanos (actual Rodoviária). “Naaltura podíamos escolher o lugarpara estacionar, à sombra ou aosol, porque poucos carros haviana rua”, lembra Jaime Neves, acrescentandoque o veículo manteve-se ao serviçoda empresa até Dezembro de 1976.Mas quando a Agência Neves foi formada,o veículo de transporte nos funeraiseram as célebres carretas, um génerode carroça transformada em viaturafunerária para a época, puxada por doishomens.Nessa altura os funerais eram a “passo”.Jaime Neves recorda-se, por exemplo,de todas as ruas do Bairro dos Arneirosserem em terra e só começar ahaver alcatrão já perto da ponte. Todosos percursos passavam também pelocentro da cidade, registando o empresáriona memória a esquina da merceariaPena como um local de passagem obrigatóriade qualquer funeral, que se dirigiaao cemitério antigo, junto à Secla.“Havia um respeito pelo per-curso em que se dava sempre aultima passagem pela cidade”,conta, acrescentando que os funeraiseram feitos a pé e o sacerdote acompanhava-o,desde o domicílio até ao cemitério.“Hoje em dia todas essas prá-ticas estão alteradas porque osacerdote faz as cerimónias eaguarda a chegada do corpo aocemitério”, explica, acrescentando que90% dos funerais são feitos pela IgrejaCatólica.Dessa altura Jaime Neves lembra umahistória engraçada. Os cortejos, a pé,abrangiam toda a largura da rua e cortavamo trânsito da Rua Heróis da GrandeGuerra até ao Largo Conde José deFontalva, em direcção ao cemitério.Quando se passava em frente á SantaCasa da Misericórdia e ao Hotel Lisbonensecomeçavam as tentativas dos automóveispara ultrapassar o cortejo. Háum dia em que um individuo ultrapassao cortejo e não repara que vem um carrode frente, batendo. “Dá-se um gran-de estardalhaço e toda a genteparou para ver o que era, mas ocortejo seguiu para o cemitériode Nossa Senhora do Pópulo”, contou,acrescentando que quando chegaramao cemitério “só estavam presen-tes meia dúzia de pessoas quevinham atrás do carro funerário,o padre e o sacristão. O restanteacompanhamento ficou a ver o aci-dente”.A Agência Neves também faz trasladações,perdão, “repatriamento de cadáveres”,que é a expressão mais correc-Anabela Neves e Jaime Neves. O casal detém desde 2002a sociedade por quotas proprietária da agênciata. E tanto os faz de portugueses quefaleceram no estrangeiro, como com osféretros de estrangeiros que pereceramem Portugal. É, contudo, uma fatia donegócio muito pouco significativa, diz oempresário, até porque hoje em dia é maiseconómico proceder-se à cremação e enviarapenas a urna com as cinzas para opaís de destino.Relativamente às <strong>Caldas</strong> da Rainha,Jaime Neves diz que “há falta de res-peito e de dignidade” da parte dasentidades competentes por não haver umcentro funerário em condições onde possamser velados os corpos. A Igreja deNossa Senhora da Conceição não temcapela mortuária e a capela de S. Sebastião,que foi utilizada como local de velamento,deixou de o ser quando foi transformadaem museu.“Os velamentos são feitos no Mon-tepio ou nas capelas dos próprioscemitérios, que não têm dignidadenem condições”, diz, realçando que umacidade com a dimensão das <strong>Caldas</strong> “deviade ter um local com dignidade e es-paço” para esta prática.Actualmente a agência possui duasviaturas funerárias e dentro de algunsdias terá mais uma. Em rigor, não existemcarros funerários originais. Estes veículossão carros normais que são posteriormentetransformados para este fim.Hoje em dia, porém, utilizam-se furgõese carrinhas para se transformarem emcarros funerários.O empresário escusou-se a divulgaro volume de facturação da sua empresa,que actualmente conta com quatro funcionários.Trata-se uma profissão marcadamentemasculina, muito devido ao esforço físicoque implica, mas Jaime Neves afirmaque também há mulheres, por quem dizter muito respeito e amizade, que sãoóptimas profissionais na actividade.E como será o futuro? O empresáriodiz que ideias há muitas, só que não sepodem concretizar, dada a conjunturado país.Actualmente com 61 anos, Jaime Nevesdiz querer aguentar a firma mais quatroanos. “Aos 65 anos quero ir fazeraquilo que nunca fiz em todosestes anos: ter férias, des-canso e não ter que estar preso anada”. É que, como realça, “são 365dias dedicados à actividade”, semter direito a férias. “De vez em quan-do lá consigo fugir dois ou trêsdias, mas mesmo assim o telefo-ne não pára de tocar”, conta, acrescentandoque têm que estar sempreprontos para dar apoio aos familiaressete dias por semana.O telefone sempre foi o meio de contactoprivilegiado da empresa, mas antesos familiares dos falecidos chegavama ir-lhe a casa bater à porta. Quando iaao cinema, Jaime Neves escolhia sempreo lugar da ponta porque, como aconteceuvárias vezes, antes do filme terminar,“vinha o porteiro chamar-me porqueestavam pessoas à minha pro-cura”. Outras vezes são jantares e almoçosque ficam a meio porque a emergênciaassim o obriga. “A família habituou-se a isso”, conclui o empresário.Hoje há telemóveis, a empresa temquatro empregados – três agentes funeráriose uma administrativa -, mas a profissãoexige uma disponibilidade total 24horas por dia. Jaime Neves não conseguedistinguir uma época do ano commais funerais. É totalmente aleatório.Por exemplo, este mês de Julho de 2009tem-se revelado o mais fraco em termosde negócio, coisa que aconteceu o anopassado em Abril.É, pois, normal viverem-se muitos diasseguidos de tédio numa agencia funerária.Mas também há picos de stress poisacontece realizarem-se cinco ou seis funeraisno mesmo dia.Já este é um sector imune à recessãoeconómica. Ou quase. “É óbvio queem tempos de dificuldades aspessoas não querem um funeralmais caro e optam pelo mais ba-rato”, constata o empresário, que realizauma média de 250 funerais por ano.Já o volume de negócios não o quis divulgar.Com duas filhas, ambas adultas ecom actividade profissional, o casal Jaimee Anabela não espera que estas algumavez venham a interessar-se pelo negocioda família. As áreas de interessesão outras: uma é licenciada em MatemáticasAplicadas e a outra em Inglês eAlemão.Para comemorar os 55 anos da empresa,Jaime Neves criou um boletim informativoe obituário, de distribuiçãogratuita. O primeiro número saiu em Junhoe tem como tema principal “Os espaçossagrados”, onde o empresáriofala sobre os cemitérios primitivos e asalterações que estes têm tido ao longodos tempos.O boletim dá ainda informações sobreo que fazer quando ocorre um óbitoe o obituário de Maio.Tintas e pincéis à espera dareformaF.F.O espírito curioso e atento de Jaime Neves levou-o a interessar-se pelo jornalismoe investigação da história local.Foi colaborador da <strong>Gazeta</strong> das <strong>Caldas</strong> na década de 60 do século passado,altura em que era chefe de redacção deste semanário Domingos del Rio. Entre asdiversas peças que fez, é o autor da rubrica “Sabe quem foi”, sobre personalidades,e do suplemento O Gazetário, que fazia juntamente com Micael Faria e cujos textosforam várias vezes cortados pela censura.Mais tarde, a partir de meados da década de 70, fez parte do Notícias das <strong>Caldas</strong>,onde era cooperador e o paginador do próprio jornal. “Era o trabalho que eutinha todos os domingos à noite”, lembra.Jaime Neves é também autor de um livro sobre a toponímia caldense e já possuiapontamentos sobre o roteiro das <strong>Caldas</strong>, que pretende vir a publicar. Está tambéma fazer um levantamento sobre os cemitérios desde a fundação da vila das<strong>Caldas</strong>, no qual julga poder publicar todos os cemitérios que existiram na cidade.A pintura foi um hobby que se prolongou durante dois ou três anos e que teve queabandonar por falta de tempo. “Comecei a fazer retrato e pintura sem darpor isso”, lembra, acrescentando que a dada altura também se dedicou à pinturade brasões.Mas a pintura exige alguma disponibilidade e, “nas alturas em que eumenos esperava”, surgia sempre um telefonema ou um pedido e Jaime Nevestinha que abandonar o que estava a fazer para ir tratar do assunto. “Estragueimuitos pincéis e tinta porque não havia tempo para limpar e arrumardevidamente”, conta, acrescentando que ainda mantém em casa todo o equipamentoà espera do dia em que venha a reforma.F.F.“Quando são crianças ejovens marca muito”O funcionário mais antigo, José Felizardo, ladeadopelos colegas Isidro Fiandeiro e Moisés SousaJosé Felizardo, tem 51 anos e longo da sua actividade profissionalteve duas situações quetrabalha há 15 anos na AgênciaNeves como agente funerário e foram particularmente difíceismotorista. Residente em Tornada,começou a trabalhar aos 12 anos, a uma terça-feira, tevede suportar. Há cinco ou seisanos no ramo automóvel e aí que ir buscar uma bebé de 23permaneceu durante mais de meses ao Hospital de Santaduas décadas, mas o encerramentodas várias empresas seguinte, fez o funeral de umaMaria. Depois, na sexta-feiraonde esteve levaram-no ao desemprego.crianças e jovens marca“Estou aqui há 15 anos emuito”, conta, acrescentandogosto do que faço”, diz, em-que qualquer uma das situaçõesjovem de 19 anos. “Quando sãobora reconheça que no início “é marca porque “somos humasempreum pouco difícil por-nos”.que é um serviço diferenteApesar de não ser um traba-do que estava habituado”.lho stressante, “marca emJosé Felizardo conta que tam-certas situações”, conta o funcionáriobémtêm que ser um bocadopsicólogos, ajudando as famíliasnaquelas horas tão difíceis. fissão. “Não vou para casaAprendeu o ofício com os funci-falar do trabalho, mas não éonários mais velhos e rapida-tabu”, refere José Felizardo,A família vê bem a sua promentecomeçou a tratar do cadáver,vestindo-o e preparando-com 12 anos, que não tem qual-adiantando que tem uma filhao.quer complexo com isso. “Mes-Também nesta área vão hamona escola os colegas savendoinovações e, por exem-bem o que o pai faz e isso éplo, agora existem produtos di-visto com naturalidade”, disseferentese mais modernos paraa preparação dos cadáveres.José Felizardo lembra que aoF.F.CURIOSIDADESGato Pingado - Nome que na gíria é dado ao agente funerário.A expressão advém do facto de, há séculos atrás, oindivíduo que acompanhava o funeral levar um archote ou umavela acesa que, durante o percurso, ia pingando. Como ficavatodo sujo de cera, era-lhe dado o nome de gato pingado.Auto-fúnebre – nome do carro funerárioServiço de archote – serviço da movimentação da urnaCRONOLOGIA1955 - Jaime dos Santos Neves e Manuel Soares fundamuma casa de móveis e agencia funerária1957 – Com a saída de Manuel Soares, Jaime Neves ficacom a empresa em nome individual.1975 – Jaime Neves (filho) sucede ao pai, mantendo a empresaem nome individual2002 – Por obrigação legal, é constituída uma sociedadepor quotas, com um capital social de 10 mil euros entre JaimeNeves e a esposa, Anabela Neves.


UMA EMPRESA, VÁRIAS GERAÇÕESCurel alia inovação e tradição num ofício secularLuís Matias nasceu a 11 de Setembrode 1940 no lugar de Cabeço doBoieiro, no Pego, para os lados de Alvorninha.Filho de gente humilde, quetrabalhava a terra, estudou até à 4ªclasse, com grande sacrifício dospais. Aos 12 anos, ainda gaiato e coma continuação dos estudos bem longedos seus horizontes, Luís foi obrigadoa fazer-se homem e a ajudar emcasa com o fruto do seu trabalho. Valeu-lhea “inspiração” do pai, queapós algum tempo a trabalhar com ofilho nas suas terras decidiu que, sehouvesse saída da pobreza, teria queser noutro ofício.“Nascido na aldeia, mal sabialer e escrever, mas era inte-ligente e marcava um bocado adiferença em relação às outraspessoas dali. Disse-me: ‘vaispara a escola”, conta agora LuísMatias, prestes a completar os 70anos de idade. “Quando a escolaacabou, fui trabalhar a terracom o meu pai, que teve, en-tão, esta ideia: o rapaz vaiaprender, vai para as navalhas,porque os navalheiros é tudouma pobreza muito grande, maspor ali pode haver uma saída.Agora isto da agricultura nuncadá nada. E o meu pai não se en-ganou”. Foi assim que Luís Matiasfoi “para as navalhas”.O seu primeiro ‘mestre’ foi FernandoPolicarpo, “um senhor que tra-balhava muito bem as navalhase era muito habilidoso”. Perto decasa, Luís Matias aprendeu os truquesde um ofício em que tudo era feito manualmente.“Nesse tempo trabalhava-sede manhã à noite, fazi-am-se muitos serões. Faziam-semuitas horas para ganhar sem-pre pouco”.Dois anos depois de ter começadoa laborar na oficina de Policarpo, aganhar 10 escudos [5 cêntimos] pormês, surge uma lei que manda que osnavalheiros não trabalhem mais deoito horas por dia. “O meu patrãoficou muito atrapalhado. Então,se nós trabalhávamos todo o diae fazíamos serão para ganharum ordenadito… Depois haviaquem dissesse que ia haver fis-calizações”. Ora, numa zona ondemuitos tinham “uma barraquita”onde faziam as navalhas, “toda agente ficou com muito medo”.Fernando Policarpo decidiu fechara sua oficina e ir trabalhar para a Ribafria,na Benedita, naquela que foi aoficina onde nasceu a Icel. Luís Matiasdecidiu então ir trabalhar para umaoficina, pertencente a Luís Gonzaga,na localidade de Casal Velho, perto daRamalhosa, “onde já havia algu-ma evoluçãozita, que já tinhaum motor para acabar as nava-lhas”. Luís Matias passou a ganhar12 escudos [6 cêntimos], “porqueeu já trabalhava muito bem”,afiança.Contudo não ficou com este patrãomuito tempo porque esta foi uma dasdiversas oficinas da zona que seriamfundidas numa só emprea – a Sovi –propriedade de António Ivo Peralta.É assim que Luís Matias passa aficar ao serviço deste seu terceiropatrão. No entanto, passa a trabalharmais longe de casa, tendo de deslocar-sea pé desde o Pego para SantaCatarina, muitas vezes às escuras,em estradas de carros de bois.“Viemos em Setembro, no fimdo Verão. Este caminho torto,com carreiros, lamas e ribeiras,nessa altura passava-se bem.Mas começou o Inverno e al-guns dos empregados, os queeram casados, ficaram a viverem Santa Catarina. Fiquei só eue um meu vizinho, o Avelino. Ficámosos novatos a fazer o ca-A Curel foi fundada em 1977 na localidade das Relvas, freguesia de Santa Catarina. Cinco anosdepois foi comprada por Luís Matias, que trabalhava a fazer navalhas desde os 12 anos de idade eque mais tarde passou a caixeiro-viajante de cutelarias, construindo uma pequena fortuna.Ainda que a história da empresa não tenha início com Luís Matias, foi com ele que a Curel se afirmouaquém e além fronteiras. Hoje, é o filho – Vasco Ivo Matias – que está ao comando da empresa, queproduz anualmente cerca de 2,5 milhões de facas e canivetes. Mas a história da fábrica de cutelariasde Santa Catarina faz-se das memórias de um homem ambicioso e é fruto da inspiração do seu pai,que quis um futuro melhor para o filho do que o trabalho na terra.minho, mas nós não tínhamosproblema”. Mas a companhia duroupouco mais de um ano porque o amigodesistiu. Só ficou Luís Matias, já com15 anos e a ganhar então 15 escudos[7,5 cêntimos] por mês.“Dava a maior parte do di-Matilde do Carmo Ivo e Luís Matias emmeados da década de setentanheiro que ganhava aomeu pai. Era com o que ganhavacom as horas extraordinári-as que me vestia. Era feliz. Nãotinha dinheiro, mas sabia quegostavam de mim no trabalho eeu gostava do que fazia”. E seisso não bastasse para o fazer ficar atrabalhar em Santa Catarina, o jovemtinha-se já enamorado pela irmã dopatrão, Matilde do Carmo Ivo, que hojeMétodos de fabrico quase artesanais eram ainda usuais na década de setentaé a sua mulher.Em 1961, com 21 anos, Luís Matiasfoi para a tropa. O serviço militar foicumprido em Chaves e em Angola.Saiu de Portugal, onde ganhava já 620escudos [3,10 euros] por mês, para oUltramar onde era ‘caçador especial’e lhe pagavam 1.300 escudos [6,5 euros].Mandava para os pais tanto quantopodia. E aproveitou para tirar a cartade condução e o curso de ‘GuardaLivros’, o nome que na altura se davaaos Técnicos Oficiais de Contas.Quando regressou à Metrópole(como então se dizia), em 1964, com ideiasde voltar para África, o patrão convenceu-oa “ir para a viagem”, isto é, aser caixeiro-viajante dos seus produtos.“Foi um sucesso muito gran-de”, garante Luís Matias, e “na fábricanão se falava noutra coisaque no meu sucesso, de todasas coisas novas que eu trazia,na boa revolução que intro-duzi na fábrica”.Entretanto já casado, Luís Matiasdecidiu estabelecer-se por conta própria.De início vendia o artigo do anti-Pai e filho, as duas gerações que apesar de não terem fundado a Curela tornaram numa marca de prestígio aquém e além fronteirasgo patrão à comissão, depois começoutambém a dedicar-se a outros produtos,sobretudo aos que eram feitosna zona, como a marroquinaria. Foi armazenistadurante 12 anos. “Ganheiimenso dinheiro”, afiança. E começaentão a projectar a sua própria fábricade cutelarias.É em 1982 que lhe propõem a comprada Curel, uma pequena cutelariamontada há cinco anos nas Relvas.Com 42 anos, Luís Matias fechou onegócio por 23 mil contos [114.863euros]. Da fábrica, ficou com tudomenos o edifício (onde só ficou durantecinco anos), mudando-se depoiscom os trabalhadores e o equipamentopara a nova unidade construída emSanta Catarina.“Uma fábrica construída apulso”Quando Luís Matias comprou a fábrica,Vasco Ivo Matias, um dos seusdois filhos, tinha 12 anos. Apesar datenra idade, aquele que hoje prossegueo negócio do pai lembra-se bemde ser pequenito e já andar entre facase canivetes. “Eu costumo dizerque nasci num cesto de li-malhas”, brinca.Dos seus tempos de menino, lembra-sedo aparecimento da electricidadena zona. “Um acontecimen-to extraordinário, foi quase ummilagre”. Também se recorda bemda construção das instalações ondeainda hoje se mantém a Curel. “Foramfeitas a pulso, praticamen-te por administração directa ecom as placas enchidas a balde.Aos sábados, convocavamseos trabalhadores todos. Todosos cantos da fábrica tive-ram pormenores de carinho”.Com as novas instalações, começaaquela que Vasco Ivo Matias dizter sido “uma fase extraordináriade investimento, principalmentenas condições de traba-lho das pessoas, na melhoria doseu relacionamento com a tec-nologia”. As instalações de SantaCatarina foram feitas “com o quede mais moderno existia na altura,e que ainda hoje está bas-tante actualizado”.Já reformado, o seu pai continua aacompanhar a fábrica de perto. Orgulhosodas certificações e credenciaçõesque atestam a qualidade dosseus produtos, Luís Matias afirmaque “esta é uma fábrica que tempernas para andar”.Joana Fialhojfialho@gazetacaldas.com


Facas da Curel cortam pelo mundo inteiroVasco Matias tem guardada toda a documentaçãoatinga da empresa, como este catálogo dos finais de décadade 1970, já em edição bilingueA Curel é hoje uma fábrica bem diferentedaquela que Luís Matias comprouem 1982 e os clientes espalhamsejá por diversas zonas do globo. Ainternacionalização foi um processoque se fez, dizem os protagonistasdesta história, devagarinho.“Fiz uma grande exportaçãopara Angola, na altura de dezmil e tal contos [mais de 50 mileuros], , cerca de um ano depoisde comprar a fábrica. Venditambém alguma coisa para Mo-çambique”, recorda Luís Matias.As primeiras solicitações aparecerampelo correio, de países como aAlemanha e a Venezuela. Com o aparecimentodas firmas publicitáriase das páginas amarelas, a divulgaçãoaumentou. Quando Vasco IvoMatias termina a tropa, em 1990, aempresa investe nos certames internacionais.Uma das primeiras foi aFeira Ambiente, em Frankfurt, ondeainda hoje marcam presença.As facas da Curel podem ser encontradasem diversos países dade dos produtos. Mas as questõesambientais não têm sido esquecidas.“Hoje em dia temos umaproveitamento a 100% detodos os desperdícios”, com aságuas usadas na tempra e no arrefecimentoa funcionarem em circuitofechado, com a reciclagem de tudoquanto é desperdício de aço e com oaproveitamento da exaustão de poeiraspara aquecimento. “Não háqualquer agressão ambiental”,assegura.Ao investimento necessário a todosestes processos juntou-se aaposta forte em tecnologias de ponta,na informatização da administraçãoe na computorização de muitosprocessos de fabrico e, comonão podia deixar de ser, no design,na criação de novas linhas com a colaboraçãode designers internos eexternos à empresa. O objectivo:“tornar as facas da Curel bastantemodernas e a acompa-nharem as tendências damoda, dos novos padrões enovos estilos de vida e a en-caixarem-se perfeitamente navida moderna”. A publicidade temtambém sido uma preocupação doempresário, com diversas acçõesna imprensa nacional e com projectospara a divulgação na televisão.Europa, nos EUA, Canadá, Brasil,Venezuela, Argentina, PALOP, ArábiaSaudita e Líbano. “Tentamos nãoestar dependentes de um sóConcorrência desleal emercado, pensamos que este éfalta de apoios põemum dos segredos de sobrevivên-indústria em riscocia deste sector”, explica VascoMatias.São investimentos como este quePara o mercado externo segue têm feito com que a Curel sobreviva àcerca de 50% da produção da fábri-“tentativa de destruição de alca,que ronda os 2,5 milhões de pe-guns distribuidores”, que importamças por ano. Um indicador da evoluçãodos processos de fabrico. “Háoutros países emergentes, mas cuja20 anos fazíamos, entre cani-falta de qualidade é rapidamente de-vetes e facas, cerca de 50.000tectada pelos consumidores.artigo por mês. Hoje fazemosCom cerca de 70 trabalhadores nauma média de 20.000 canive-sua empresa, Vasco Matias não he-tes por mês e 150.000 facas esita em afirmar que “a pressãocutelos. É uma coisa assusta-vem de todos os lados” e que dedora”, diz o filho de Luís Matias, que há duas décadas para cá, a formasimilares da China, do Paquistão e decifra a facturação anual na ordem como se vive a indústria mudoudos 1,2 milhões de euros.drasticamente. Da pressão exercidaPara a afirmação da marca nos pelas entidades públicas à falsificaçãodos produtos, passando pelo en-mercados nacionais e internacionaistem contribuído um investimentoconstante na melhoria dos energia e pela situação económicacarecimento das matérias-primas eprocessos de fabrico e na qualida-internacional, que não favorece a exportação,muitas são as queixas doempresário.Às autoridades locais e regionais,Vasco aponta a falta de apoio aum ofício com uma tradição seculare que foi implantada na zona pelosmonges de Cister que habitavam oMosteiro de Alcobaça. “É um patrimónioque espero que a cur-to prazo, com as promessasque temos dos políticos, sejamais aproveitado pelas autori-dades locais”, afirma.Outra queixa feita pelo empresáriopassa pela inexistência de formaçãode futuros cuteleiros nas escolasda região, e esta é uma das grandespreocupações quanto ao futuroda cutelaria. Um futuro que, acredita,passa pela manutenção e recuperaçãode alguns dos aspectos maistradicionais do ofício.“A grande memória que guardodos meus tempos de criançaé o carinho que todas as pes-soas desta região tinham pelascutelarias. Todas, directa ouindirectamente, estão ligadasao fabrico de facas, e é issoque também nos faz avançar”,diz o empresário.Vasco Ivo Matias quer manterviva a história da cutelaria em SantaCatarina e a memória colectiva.“Não queremos deixar que todoo trabalho que estas pessoastiveram, e em determinadas alturasbastante duro, seja es-quecido e seja trocado por umqualquer interesse comercial eimediato de mandar fazer foraas coisas que toda a vida sefizeram na nossa terra a trocode lucro fácil”.Uma das etapas de uma luta que,acredita, será longa, passa pelo relançamentoda marca mais antigadas cutelarias santacatarinenses, aSovi, que trouxe o seu pai para a vila.“Muitas pessoas, quer em Por-tugal quer no estrangeiro, serecordam da boa qualidade dosseus produtos e até do design,e esta é também uma forma dehomenagear o seu fundador, omeu tio”.Joana Fialhojfialho@gazetacaldas.comTrabalhador também seguiu aspisadas do pai“Nasci na cutelaria, não aprendi a fazer outra coisa,mas é disto que eu gosto muito”, diz António GonzagaAntónio Gonzaga, 53 anos, éandar de Ferrari”.filho de Luís Gonzaga (o segundopatrão de Luís Matias) e tra-saudosismo que recupera algu-Mesmo assim, é com algumbalha na Curel há 13 anos. Um mas das suas memórias. “Ape-número pequeno que escondesar de serem tempos difíceisuma vida inteira dedicada àsem termos de produção, re-facas.cordo-me dos tempos em“Na Ramalhosa, aindaque o meu pai agarravanão havia energia eléctricanuma mola de carroça, quee já o meu pai tinha nove fun-era sobreaquecida numacionários e usava um gera-forja com carvão de pedra.dor grande para poder tra-Forjado por duas pessoas,balhar com as máquinas”,uma com o malho a outralembra o cuteleiro. Também ocom o martelo, o aço comseu pai acabaria por se mudarespessura grossa era ma-para Santa Catarina com todaslhado até ficar em pequenosas suas máquinas e todos oslinguetes e a partir daí eraseus empregados, já lá vão 55cortado com corta frio, no-anos. Por isso, António Gonza-vamente aquecido, e assimga considera que pertence ase faziam os canivetes e asuma das mais antigas famíliasfacas”, conta.de industriais da cutelaria da Se hoje o mercado é muitozona.mais exigente no que diz res-“Eu recordo-me de há 45peito ao design, na altura os cli-anos, era eu menino e moço,entes eram bem mais práticos.havia pelo menos umas sete“As facas que mais se fazi-oficinas artesanais aqui emam eram as de matar os por-Santa Catarina”. Oficinas decos e os canivetes”.diferentes dimensões e mais ou Com uma vida inteira a trabalharnas facas, António Gon-menos evoluídas, com os donosa “comprar os chifres doszaga garante que não se imagi-bois, a trabalharem-nosna a fazer outra coisa. “Há pes-[para fazerem os cabos], , a fa-soas para quem o trabalhozerem tudo à mão”. Um ofícioé um esforço. Eu não vejoque ocupava muitas pessoas,isso assim. Nasci na cutela-muitas das quais a acabarem porria, não aprendi a fazer ou-desistir, por não conseguiremtra coisa, mas é disto que euacompanhar a evolução da in-gosto muito”.dústria.E o que torna a cutelaria tãoQuando lhe pedimos que viajeno tempo e nos diga qual foitria que todos os dias se está aa maior evolução no sector, dizinovar e isso é um incentivoque a mudança é drástica. “Épara o nosso trabalho”.como se nós andássemos decarroça e passássemos aJ.F.apaixonante? “Esta é uma indús-Fundada em 1977, a Curel é hoje uma fábrica amiga doambiente, em que nada é desperdiçadoNa cutelaria podem ver-se algumas máquinas com queos cuteleiros trabalhavam há 50 anosCRONOLOGIA1960 – Luís Matias começa a trabalhar para António Ivo Peralta1968/69 – Instala-se por conta própria como vendedor1977 – Compra a Curel e mantém-se nas Relvas1982 – Muda a fábrica para Santa Catarina1995 – Vasco Matias assume a gestão da Curel, através daempresa VCI – A Fábrica das Cutelarias, Lda, uma sociedadepor quotas com o capital social de 200.000 euros que ainda hojedetém a marca.


UMA EMPRESA, VÁRIAS GERAÇÕESPIROTECNIA BOMBARRALENSE – quatro gerações a dFoi um ribatejano da Moitado Norte (Vila Nova da Barquinha)que em 1934 fundou nosarredores do Bombarral umafábrica de foguetes que vaihoje na terceira geração, masse se tiver em conta que o seupai também já era pirotécnico,pode dizer-se que esta actividadeé assegurada por quatrogerações.Francisco Martins Júnior(1909-1982) tinha seguramentevisão para o marketing se talconceito já existisse nessa altura.À sua empresa chamoulheAlta Pirotecnia do Oeste.“Alta” para se distinguir dasdemais existentes no país, e“Oeste” porque, vindo de longee recém-chegado ao Bombarral,terá intuído certamenteque havia uma entidadeoestina. Ou, pelo menos, percebeuque o seu mercado eraregional e não meramente local.O seu pai, Francisco Martins,fora um homem dos sete ofícios.Teve várias actividades,mas quedou-se pela pirotecniacom quem trabalhava emsociedade com os seus setefilhos na Moita do Norte.“Mas um dia zangaram-se todos e cada um foi paraseu lado. Um para o Porto,outro para Torres Novas,outro para o Entroncamento,outros ficaram na Moita,e outro para o Bombar-ral... enfim foram espalhara arte da pirotecnia, da pól-vora e dos rastilhos pelopaís todo”. Quem o conta éAntónio Rabaça Martins, filhode Francisco Martins.Do seu pai, conta que fezduas ou três visitas ao Bombarrale achou que era um bomsítio para iniciar o negócio porquenão havia mais nenhumaFrancisco Martins Júnior (1909-1982) fundou a pirotecnia que o seu filho, António Rabaça e o seu neto, João Martins, viriam a ampliar e a transformarnuma empresa de referência no país no estrangeiro.indústria desse tipo na região.“Comprou um terreno demil metros quadrados aquino Pinhal do Concelho ecom a madeira dos própri-os pinheiros construiu seiscasinhas onde começou afabricar foguetes”.No início, a Alta Pirotecniado Oeste arrancou logo comtrês empregados e a coisa nãodeve ter corrido mal porquepassado poucos anos, as seisbarracas onde se fabricavamfoguetes deram lugar a noveedifícios em tijolo.Deve dizer-se desde já queuma pirotécnica não é uma fábricaqualquer. Não tem nadaa ver com a ideia de um pavilhãoou nave no interior do qualse realiza um processo produtivoonde entra matéria-primapor um lado e sai produto acabadopelo outro.Neste “métier” as restriçõesao nível de segurança obrigamUma situação impensável nos dias de hoje. Há 30 anos,ainda sem o rigoroso controlo do transporte de explosivos,os foguetes eram assim transportados em carrinhas.a que pessoas e máquinas laboremafastadas umas boasdezenas de metros entre sipara evitar a propagação de incêndioou de explosões emcaso de acidente.Por isso, a fábrica do “senhorRabaça” - como é conhecidono Bombarral o empresárioAntónio Rabaça Martins –mais parece um aldeamentoturístico, com muros e casaspintadas de branco, tanquescom água cristalina e muitasárvores e flores espalhadaspelos diversos pátios. Há tambémcontrafortes para seguraros edifícios em caso de acidentee um ruído de fundo de máquinasque não incomoda demasiado.O pior ali é mesmo aestrada municipal de acesso àfábrica, que aguarda há anospor um pouco mais de alcatrão.“CRESCI NO MEIO DAPÓLVORA”António Rabaça Martinssenta-se num gabinete rodeadode calendários e cartazesdo Sporting. Uma paixão quepassou para o filho e netos.Mas atenção. Também já fezespectáculos para o Benfica. Epara qualquer clube que lhoscompre. Negócios são negócios.Tendências clubísticas sãooutra coisa.E conta a sua história:“O meu pai veio para cá jáhomem, casado e com dois filhos.Eu e a minha irmã maisnova já nascemos no Bombarral.Desde miúdo que me lembroda fábrica e com dez anosjá vinha para cá ajudar o meupai. Cresci no meio da pólvora.”E desde sempre teve a percepçãode que iria suceder aopai à frente da pirotécnica?“Sim. Excepto uma vez...Foi quando em 1959 acabeina Escola Industrial e Comercialdas <strong>Caldas</strong> da Rai-nha [hoje Secundária RafaelBordalo Pinheiro] o quintoano do curso Industrial deCerâmica. Tive a melhornota do curso e o director,o Dr. Leonel Sotto Mayor,chamou-me e convidou-mepara ser professor de tra-balhos manuais em Vianado Alentejo. Só que o meupai e a minha mãe não medeixaram ir. Eu tinha 17anos e acharam que eu eramuito novo para ir para tãolonge”.O seu futuro definitivo naactividade pirotécnica ficariaali traçado e progressivamentepassa a envolver-se cada vezmais na empresa. Mas veioainda a tropa, em 1964, comuma comissão em Angola ondeesteve debaixo de fogo váriasvezes. A sua especialidade nãopodia ser outra – minas e armadilhas.Em 1967 regressa de Áfricae no ano seguinte casa-se comMaria Rosete. Vem decidido amodernizar a empresa do paie em 1969 ele próprio inventauma máquina de carregar canudos“que naquela altura jáfuncionava com três moto-res independentes”, conta.Isto representava um grandesalto qualitativo para umfábrica que apenas tinha umamáquina de cortar canas paraos foguetes. Num espaço deum ano, António Rabaça Martinsinstala 32 motores na pi-rotecnia, automatizando umprocesso produtivo que atéentão era integralmente manual.“Aquilo foi decisivo paraa expansão da empresapois mais ninguém tinhadisso em Portugal”, diz oempresário, recordando aquelasinovações. É que não erafácil conseguirem-se máquinaspara trabalhar com pólvorae explosivos porque o metalnão pode roçar no metal. Senão,à mínima faísca seria umacatástrofe. António Rabaçaconseguiu a proeza de inventarum moinho de galgas suspensasque ficavam a cinco milímetrosdo fundo da bacia.Em 1979 o fundador da fábricaadoece e deixa ao filho asua gestão. Francisco MartinsJúnior morre em 1982, orgulhosoda sua unidade fabril quecomeçara por ter mil metrosquadrados e tinha agora oitovezes mais de área. Na alturatalvez já adivinhasse que o seuneto João Martins (então comdez anos) seguiria o negócioda família, o que viria a acontecerdez anos depois.Carlos Ciprianocc@gazetacaldas.comUm projecto de 5 milhões deeuros“Se isto avançar, nãocriar novos postos de trabalhoserá só a maior pirotécni-pois, de outra forma, não vale-ca do país. Será uma dasria a pena ampliar as instala-maiores da Europa e doções.mundo”. António Rabaça O empresário desespera comMartins mostra uma planta a burocracia e queixa-se da desigualdadeentre Portugal e Es-com o projecto da fábrica quepretende construir no Bombarrale que aguarda há nove gentes directivas comunitáriaspanha na transposição das exi-anos por uma autorização camarária.deste tipo. “Enquanto cá te-A localização é precisamenmos200 metros de seguranteao lado das portagens daça entre os paióis e a auto-A8 no Bombarral (sentido sul-estrada, em Espanha nemnorte), num terreno compos-chega a 20 metros”, desaba-sobre segurança de fábricasto por uma enorme clareira fa. E isto é apenas um exemploverde no meio dos pinhais. em como tudo é mais complicadoem Portugal do que no paisMede 435 metros quadrados etem uma zona de segurança vizinho onde a legislação é muitomenos rigorosa. Deste modo,tão grande que a fábrica propriamentedita só ocupará três conclui, “até é um milagre quemil metros quadrados.a gente consiga competirO investimento previsto écom os espanhóis”.de 5 milhões de euros e AntónioRabaça diz que a ideia éC. C.


eitar foguetesA fábrica nos anos 70 e vista aérea do complexo fabril na actualidadeJoão Martins – “A pirotécnia é um negócio incompreendido”João Adelino Henriques Martins nasceuem 1969 e ainda se lembra de ver opai e o avô juntos na empresa. Hoje essavisão tê-la-á o seu filho de nove anos,João Pedro Martins, ao ver também opai e o avô na fábrica dos foguetes.João, bisneto do ribatejano que veiode Vila Nova da Barquinha para o Bombarralconstruir seis barracas ondefazia foguetes, é a primeira geraçãoda família a tirar um curso superior.Um, não. Dois. “Licenciei-me em Informáticano Instituto Superior de Engenhariado Porto. Adorei o curso, masa verdade é que senti a necessidadede estudar Gestão e acabei por me matricularna UAL em Lisboa e fazer emGestão de Empresas”, conta JoãoMartins. E explica porquê: “qualquerpessoa pode ter uma empresaou estar à frente de um negócio,mas a maior parte das pes-soas não tem a noção do que égerir uma empresa. Muitos têmsorte e porque são muito empe-nhados conseguem ter êxito,mas a verdade é que é precisoter formação em Gestão”.O empresário sublinha que “esta-mos num mercado global, comuma concorrência muito maiseficaz e bem organizada de ou-tros países”.João Martins diz que cresceu napirotécnica do pai. “Os outros miú-dos iam para a praia no Verão eeu vinha para aqui ajudar o meupai. É claro que ele me obriga-va, mas na minha geração issoentendia-se como algo de natural,era normal um filho começara integrar-se na empre-sa do pai e eu lembro-me de virpara aqui com 12 e 13 anos…Hoje se calhar diriam que eraexploração de mão-de-obra in-fantil… Mas ainda hoje guardoa nota de 50 escudos [25 cêntimosquefoi o meu primeiro di-nheiro que aqui ganhei.”Conclusão: “era de esperar quemais tarde ou mais cedo eu aca-baria por vir para cá”.E isso aconteceu em 1993 com ocurso de Gestão terminado. João Martinsregressa de Lisboa para o Bombarrale instala-se, ao lado do pai, àfrente do negócio da família.A equipa da Fábrica de Fogos de Artifício do BombarralNegócio, diz ele, que é “comple-tamente incompreendido”. Nãohaverá muitas actividades económicascom uma imagem tão negativaquanta esta. “Sempre que chegavao Verão começámos a ter que vivercom o estigma de que nós éra-mos uns incendiários. E por muitoque inovássemos, que fizéssemosprocessos mais seguros, esta ima-gem não se apagava”.É dentro deste contexto, e apósdois verões de muitos incêndios, quevem uma legislação particularmentedura: acaba-se com o lançamento defoguetes tradicionais durante toda aépoca estival.Uma machadada para o negócio. Masque obrigou a empresa a diversificar asua actividade. Agora as alvoradas dasfestas e as procissões são festejadascom balonas de tiro, um substituto develho foguete de cana e canudo.Em todo o caso, para a PirotecniaBombarralense longe vai o tempo emque este produto era o seu core business.Hoje em dia o que está a dar sãoos espectáculos de fogo de artifício eos clientes de outrora (associaçõese comissões de festas das aldeias)deram lugar às autarquias que ganharamo gosto por celebrar explosivamenteas comemorações dos feriadosmunicipais, as passagens de ano e osfestivais de Verão.Pagam tarde e a más horas, é certo.E João Martins não revela nada quetoda a gente não saiba, mas é - para obem e para o mal - uma importantefatia do mercado desta empresa. Osfoguetes tradicionais – que ainda podemir para o ar nos meses de Inverno– representam 20% da facturação e orestante é a venda de componentes pirotécnicos,muitos dos quais nem sãoproduzidos na própria fábrica, masimportados de Espanha, Itália ou daChina.Alguns destes produtos servempara integrar cenários no teatro, nocinema e na televisão. “Não me surpreenderiase houvesse em Hollywoodalgumas explosões re-alizadas com produtos vendidospor nós”, diz.E há ainda nichos de mercado surpreendentes,colaterais a esta actividade.Durante algum tempo a empresavendeu componentes para a Suécia,destinados a integrar um complicadoprocesso de fabrico de aço numasiderurgia daquele país.Da produção da fábrica, cerca de15% a 20% é exportada e João Martinsjura que já viu artigos seus, fabricadosno Bombarral, em certames internacionaiscom a designação madein Spain. “Depois os alemães, queos compram, ainda acham quenós somos mentirosos quandotentamos explicar-lhes queaqueles produtos são nossos.Dizem que aquilo é bom porqueé espanhol”, desabafa.“Recusamos alienar este saberque já vem de três gerações”Ao que parece há também outracoisa em que os pirotécnicos portuguesessão muitos bons – sabem conceberexcelentes espectáculos defogo de artifício, misturando sabiamenteos materiais por forma a proporcionarimagens únicas.“Utilizamos em cada espectáculoapenas 20% de compo-nentes fabricados por nós. Oresto compramos fora. No futu-ro até poderíamos prescindir danossa fábrica e ser uma empresade gestão de circuitos de distribuiçãoe de prestação de ser-viços. Mas recusamos alienareste saber que já vem de trêsgerações e queremos continu-ar a ser sempre uma fábrica.Nunca seremos uma empresa sóde import-export, embora eusaiba que esse até era um caminhoque nos daria mais visi-bilidade e até mais dinheiro”.De resto, o caminho a prosseguir éo oposto e passa por aumentar a produçãofabril numa unidade a construirde raiz (ver caixa). Dificuldades burocráticasatrasaram o processo eagora os dois administradores quaseagradecem tais obstáculos porque arecessão fez-se sentir forte e feio enão é este o momento mais adequadopara grande aventuras. “Reconheçoque não fabricamos nem comercializamosum bem de pri-meira necessidade”, diz o empresário.Em tempo de crise não há dinheironem ânimo para muitas festas e fogosde artifício, mas felizmente tememergido mais um nicho de mercado.Trata-se dos casamentos e baptizados,que ultimamente têm sido alegradoscom um mini-espectáculo defogo preso. Nos tempos que corremqualquer segmento de mercado é bemvindo.C.C.<strong>Cronologia</strong>1934 – Francisco Martins Júnior(1909-1982) funda a AltaPirotecnia do Oeste1977 – A firma passa a sociedadepor quotas com um capitalsocial de 350 mil euros ecom a designação de FranciscoMartins Júnior, Lda. ,tendocomo sócios o pai e o filho.1979 – A empresa volta a seruma sociedade em nome individualdesignada António R.Martins (filho do fundador)1994 – Volta a sociedade porquotas, agora chamada AntónioR. Martins, Lda, tendocomo sócios o pai e o filho (respectivamente,filho e neto dofundador)Volume denegóciosAnoFacturação(em milhões de euros)2001 1,22002 1,12003 1,02004 1,22005 1,12006 0,82007 0,92008 0,92009 0,8A proibição de foguetesnas festas populares,em 2005, teve umimpacto negativo nafacturação da empresa,obrigando-a adiversificar os seusprodutos e serviços.


UMA EMPRESA, VÁRIAS GERAÇÕESRestaurante A Mimosa comemora meio século em JJoão Francisco Machado (1913-2009) e Isaura de AlmeidaFrancisco Almeida ladeado pela esposa, Deonilde Azenha, e a filha, Maria Celeste AgostinhoDesde peque(1913-2004) foram os patriarcas deste negócio(Letinha) deram continuidade à casaMimosaA história da Mimosa tem iníerafilha única, muito estima-em redor que vinham à cidade. A todo o ano, também se transformounuma sala de refeições,cio num dia de 1960 quando o agri-da”, recorda Deonilde Azenha, segunda-feira era o dia de maiorUma casa familiarcultor João Francisco Machado(1913–2009), residente em Abuxanas(Rio Maior) visita as <strong>Caldas</strong> edepara-se com uma tabuleta detrespasse na então Casa de PastoFerradora na Praça 5 de Outubro,à época também conhecidapor Praça do Peixe por aí se realizaro mercado diário de pescado.A sua única filha tinha casadoe, como queria umadiantando que o seu pai nuncaquis que trabalhasse no campo.Aprendeu, durante uma semana,o ofício com os antigos proprietáriose, com o chegar dos seuspais, ficaram os quatro a trabalharno restaurante. Deonilde e amãe, Isaura de Almeida (1913–2004), cuidavam da cozinha, enquantoque o marido e o pai, Joãomovimento, até porque naquelaaltura havia também a praça dasgalinhas na rua ao lado da vendado peixe.“Assim que entrámos nestacasa tivemos sempre muitagente”, conta Deonilde Azenha,recordando que a sua mãe, quandoa veio visitar “viu viu tantos cli-entes, que percebeu que eudando assim origem ao espaçoactual, com capacidade para 80pessoas sentadas.Todas estas obras foram sendofeitas gradualmente, semnunca fecharem o restaurante.“Até a cozinha arranjámossem nunca fecharmos a por-ta”, conta Deonilde Azenha, explicandoque instalaram provisoriamentea cozinhaLetinha conhece cada canto da Mimosa de olhos fechados. Chegouali aos três anos e meio, pela mão da avó, e ficou com a família.No entanto, a sua colaboração no restaurante só veio muito maistarde.“Fui Fui filha única e nunca fiz nada, tinha uma avó que mefazia tudo, estudei, depois casei-me com 19 anos e fui viverpara Lisboa”, conta. Esteve quatro anos a residir na capital, masdepois o marido, o médico Silvestre Agostinho, resolveu voltar paraas <strong>Caldas</strong> há cerca de 28 anos.Nessa altura, Letinha começou por ajudar o marido no consultórioe tomava conta dos dois filhos pequenos. Depois começou a ajudarna ade-no restaurante e passou a gostar mais de trabalhar na Mimosa do quega, onde trabalhavamno consultório médico. “Passei a estar aqui a tempo inteiro há cercaen-de 10 anos”, altura em que os filhos já estavam crescidos.quanto decorriamAgora é uma espécie de relações públicas da casa, ao mesmo tempoas obras que faz os doces, serve à mesa e faz as compras diárias.de melhoramento.A grande maioria dos clientes tratam a Letinha pelo seu nome oudiminutivo. São pessoas das <strong>Caldas</strong> e arredores, mas também de“Só fechá-Lisboa (sobretudo ao sábado), os frequentadores dorestaurante.futuro melhorpara ela do que otrabalho na terra,achou que montarum negócio nas<strong>Caldas</strong> poderiaser a solução. “Omeu pai chegoua casa e disseque ficar comeste estabeleci-mento era uma oportunida-de”, lembra Deonilde Azenha, 71anos, que toma conta de um dosestabelecimentos mais emblemáticosda cidade, juntamentecom o marido, Francisco Almeida,e a filha Maria Celeste Agostinho,carinhosamente tratadapor Letinha.Deonilde Azenha veio para orestaurante a 28 de Janeiro de1961, juntamente com o marido,depois de ter pago um trespassede 40 contos (cerca de 200 euros).Na terra deixava a filha, com trêsanos e meio, ao cuidado dos avósque, na semana seguinte os vieramvisitar às <strong>Caldas</strong> e tambémpor cá ficaram.Na altura a Casa Ferradora resumia-sea um corredor, uma salapequena e um quarto. Uma outraparte da casa tinha as “casinhas”,que eram alugadas às vendedorasde peixe para ali guardaremas caixas, sal e demais utensíliosde apoio à venda. No quintal daentão casa de pasto tambémeram colocados uns fogareirosque permitia às pessoas ali assaremo peixe, que acompanhavamcom vinho tinto da casa.“Eu era uma menina quenunca tinha feito quase nada,Situada na Praça 5 de Outubro, o restaurante A Mimosa é uma referência na cidadecom a sua comida tradicional portuguesa. Os actuais proprietários, Deonilde Azenhae Francisco Almeida, adquiriram a casa de pasto que ali existia em 1961 e desdeentão têm ampliado o espaço que actualmente tem capacidade para 80 pessoas.O nome – A Mimosa - deve-se ao tom verde-claro com que o restaurante foi pintado,há cerca de 35 anos, deixando assim para trás o letreiro de A Ferradora.A história desta casa faz-se no feminino. Três gerações de mulheres (mãe, filha eneta) trabalham na Mimosa e garantem a sua manutenção.Em Janeiro de 2011 haverá festa para assinalar os seus 50 anos.Francisco Machado (1913–2009),eram responsáveis pela parte daadega e taberna.A família morava no primeiroandar do prédio e o nome Ferradora- alusivo ao facto de ali tambémse ferrarem animais – aindase iria manter mais alguns anos,até à altura em que viriam a serfeitas obras de remodelação noespaço comercial para ampliar asala de refeições.Nesses anos da década de 60os principais clientes eram as peixeirasque vendiam na praça etambém as pessoas das aldeiassozinha não conseguia darresposta e nunca mais se foiembora”, tendo ali permanecidocerca de 30 anos a ajudar.A elevada freguesia levou osproprietários a ampliar o espaço.Primeiro foi deitada uma paredeabaixo para ampliar a sala de refeições.Anos mais tarde avançarampara as traseiras, fazendooutra sala onde antes estava oquintal alugado às pessoas quevendiam na praça do peixe.A adega, que em tempos albergouseis grandes tonéis de vinhopara vender a copo duranteIsaura Almeida (1913-2004) à porta da Mimosa a olhar para os seusbisnetos João Francisco e Joana.mosdoisdias muitorecentemen-te para pôr um chão novo nacozinha”, conclui.O restaurante ganhou o nomeactual há cerca de 35 anos, porcausa das cores. Os proprietáriospintaram a casa de verde-claro eo pintor sugeriu o nome Mimosa,que foi aceite. Houve ainda a sugestãode restaurante se chamarLetinha, mas a jovem na alturanão achou a mínima graça.Os responsáveis não quiseramdar o valor da facturação.Fátima Ferreirafferreira@gazetacaldas.com“Gosto muito dos meus clientes e eles gostam de mim”, diz,chamando a atenção para o facto de agora já serem os “netos denossos clientes que adoram vir à Letinha”.O cozido à portuguesa é o prato mais conhecido da Mimosa, a parcom as sardinhas assadas no carvão que, durante o verão, trazemmuitos clientes à casa. “Não comem em lado nenhum iguais àsminhas”, garante Letinha.Há ainda outros pratos da cozinha tradicional portuguesa como obife com alho, feijoada ou dobrada, “que a minha mãe faz muitobem”, adianta.Deonilde Azenha, apesar dos seus 71 anos, continua a cozinhar.Chega ao restaurante pelas 7h30 e começa logo a trabalhar na cozinha.As empregadas chegam duas horas depois e, nessa altura, vaiao talho. Nunca sai antes das 23h00 ou meia-noite. Já a sua filha vemtodos os dias a pé da Quinta da Boneca para o restaurante, na Praça5 de Outubro. Às 8h30 vai à Praça da Fruta fazer as compras dosenchidos, verduras e fruta e depois vai ao mercado do peixe compraro que falta. “Todo o peixe vem da praça, não é do supermerca-do. Pode ser mais caro, mas garantimos a qualidade”, realçaAspecto do restaurante antes da última remodelação, há cerca de umadécada.


aneirona que Joana Agostinho, de 23 anos, ajuda a mãe e a avó naDeonilde Azenha.Referindo-se à aquisição do restaurante, a matriarca diz que “foia melhor escolha que fiz na vida”, destacando a presença dafilha, que garante a continuidade do negócio.Também a vida de Joana Agostinho, 23 anos, está estreitamenteligada à do restaurante Mimosa. “Lembro-me desta casa desdesempre, mesmo que não estivesse a trabalhar, estava sem-pre aqui”, conta, recordando que quando eram mais pequenos (Joanae o irmão) ainda iam jantar a casa, mas depois começaram atambém fazer as refeições no restaurante.Joana lembra-se de começar por ajudar com tarefas simples, comoir buscar as bebidas ou fazer algum favor à mãe, adquirindo depoisa experiência que lhe permite ser responsável pelo atendimento dasmesas. Contudo, ainda hoje continuam a haver algumas coisas quesó a mãe é que faz: “as as farófias continua a ser só a minha mãeque as tira, o melão é ela quem corta e o leite-creme é elaquem queima”.Aspirante a uma carreira no ensino, como professora de Inglês eAlemão, Joana Agostinho diz que o seu coração balança quandopensa no trabalho do restaurante, de que também gosta bastante.“Não excluo as possibilidades de ficar, ainda por cima porquenos tempos que vivemos é um bom negócio e temos mui-ta sorte em ter clientes fixos que gostam da nossa comida”,revela. A jovem diz que não exclui a hipótese de ajudar a mãe atémais tarde, mas ficar com o negócio “é complicado”.“Penso muitas vezes que o meu irmão era capaz de ficarcom isto porque é muito bom cozinheiro, mas também tem asua profissão”, adianta, sobre o jovem formado em Bioquímica.Sobre a Mimosa destaca o facto das pessoas serem todas amigase dá o exemplo das pessoas todas se cumprimentarem e conversarementre elas.Durante o tempo em que esteve a estudar na universidade, emLisboa, vinha sempre dar uma “mãozinha” no restaurante nos temposlivres que tinha e nas férias.O cozido, feito pela avó, assim como todas as variedades de bacalhau,estão no topo das suas preferências. “Para comer de formasaudável é sempre aqui”, deixa como sugestão.F.F.JOÃO EVANGELISTA, CLIENTE DE LONGA DATA“Ainda este ano não comi uma sardinha assada”O professor João Evangelistaé um entusiasta da cozinhada “Mimosa”. Começou a frequentaro espaço há cerca de15 anos, altura em que veio dirigiro pólo caldense da UAL eali se dirigia para almoçar comamigos. Em 2005 mudou-se,juntamente com a esposa, paraas <strong>Caldas</strong> e aquele restauranteera parte do seu quotidiano.“Tínhamos uma mesasempre guardada para nós.Depois passou a ser sópara mim, enquanto podialá ir”, recorda João Evangelista,que depois, devido a dificuldadesfísicas, deixou de irao restaurante, mas continuavaali a comprar a sua comida.Actualmente, com 90 anos, encontra-seinternado no Montepio.“Sentia-me lá muito bem,acabei por criar amizadecom os outros frequenta-dores, os nossos vizinhosde mesa e outros que lá iamfazer as refeições”, conta,lembrando que a certa altura“um senhor de certa idadelembrou-se de perguntar àLetinha o meu nome e des-cobriu que tinha sido meualuno aos 12 anos, num co-légio em Lisboa”.Neste restaurante João Evangelistareencontrou tambémamigos de infância. “Encontramo-nospor ali, conver-samos, sabemos o quecada um gosta, por issoestes ambientes são muitoespeciais”, sintetiza.Entre os pratos seus prefe-<strong>Cronologia</strong>ridos destaca as sardinhas assadas.“A minha grande sauda-de é este ano não ter comidouma sardinha assada, mas àsvezes faço uma malandrice,peço e trazem-mas fritas”, conta,divertido.O bom garfo destaca ainda quea Mimosa tem um bacalhau noforno que “é excelente”, assimcomo todo o peixe grelhado, comoé o caso do sargo, da sarda, ouda cavala, que “quando podia”gostava temperada com bastantesal. “Gosto muito da comi-da tradicional, não me doubem com as comidas esquisi-tas”, revela.João Evangelista diz ter umaestima muito grande pela zonada antiga Praça do Peixe (Praça 5de Outubro) pois foi o primeirosítio onde morou nas <strong>Caldas</strong>.Natural de A-dos-Negros, veioviver para as <strong>Caldas</strong> em 1926 (naaltura tinha seis anos) e por cáficou durante 11 anos. Lembraque a sua casa ficava do outrolado da praça e que a existênciado teatro Pinheiro Chagas o impossibilitavade ver o restaurante.Daquele tempo recorda a vendade enguias da Lagoa enroladasem areia, que o peixe miúdoera vendido às dúzias ou ao quarteirãoenquanto que o grosso éque era a peso. “E o chicharroou a cavala eram vendidos apares”, especifica.“Ainda sou do tempo em queao sábado à noite começa-vam a chegar galeras com agente da venda do peixe, paravenderem ao domingo”, desfilaentre as memórias, que incluemtambém a primeira camionetaque veio com peixe paraaquela praça e que era propriedadede um comerciante da Nazaré.As peixeiras também não estavama salvo das travessurasdos miúdos daquela zona:“aproveitávamos quandoelas estavam a dormir e rou-bávamos caranguejos”.Depois de já ter trabalhadona firma J.L. Barros (onde começouantes dos 10 anos) JoãoEvangelista foi estudar no cursonocturno da Escola ComercialRafael Bordalo Pinheiro (ondeobteve o primeiro prémio nacionaldo ensino técnico, em1938). Aos 18 anos partiu paraLisboa. Regressou 67 anos depois,com a esposa.João Evangelista (à esquerda) e a esposa recentemente falecida (à direita). Ao centro:José Paulo (cliente), Letinha e o marido. A amizade e camaradagem são uma dascaracterísticas desta casa. A fotografia data dos anos 801960 - João Francisco Machado (pai de Deonilde) sabe da intenção de trespasse da casa de pasto e informa a filha da possibilidade denegócio1961 – A sua filha Deonilde e o marido, Francisco Almeida, iniciam a exploração do estabelecimento. O resto da família junta-se ao negócio.1975 – Após obras de remodelação, o estabelecimento passa a chamar-se restaurante A Mimosa2000 - Maria Celeste Agostinho (Letinha), filha de Deonilde passa a colaborar no restauranteF.F.“Foi aqui que aprendi tudo o que sei hoje”Actualmente com 35 anos,Elisabete Martins começou atrabalhar no restaurante Mimosacom 12, pouco tempodepois de ter terminado a escolaprimária. Foi pela mão dairmã, que também ali trabalhava,que deixou a Serra doBouro e foi para o local ondeaprendeu “tudo que sei hojeporque nem um ovo sabiaestrelar”, recorda.A Beta, como as patroas lhechamam, passou o primeirodia a varrer umas águas furtadas,onde havia muita casca decebola, lembra, passando depoisa lavar a loiça, tarefa que aindahoje gosta particularmente de fazer.Há quatro anos engravidou edeixou de trabalhar. Voltou há umano à casa onde tem passadogrande parte da sua vida e onde,além de patrões tem amigos.balha Maria da Conceição Rodrigues,empregada da Mimosa há15 anos. Faz as limpezas e tratada roupa, além de ajudar a comporas mesas. “É um trabalhoque gosto de fazer porqueconvive-se com as pessoas”,disse.António Vieira é o responsávelpor tratar do carvão. Começou por“Gosto de cá estar, a minhamãe é a Dona Deonilde, foi aquique acabei de ser criada”, revela.Juntamente com Elisabete, traajudarFrancisco Almeida nessatarefa e agora é ele quem garanteo peixe assado, uma das especialidadesdesta casa.F.F.Elisabete Martins começou a trabalhar no restaurante Mimosa com 12 anos


UMA EMPRESA, VÁRIAS GERAÇÕESFamília Bernarda investe em negócios nas <strong>Caldas</strong> deJosé Pena Júnior (falecido em1973), fundador da MerceariaPena numa foto de 1950.Alberto da Bernarda e Noémiado Canto, de 71 e 66 anos,são naturais de duas aldeias ribatejanase vieram para as <strong>Caldas</strong>em Maio de 1964, já depoisde casados. O pai de Alberto daBernarda, António Lopes da Bernarda(1913-2003) possuía na aldeiado Canal uma mercearia etaberna, que também era postode correios.“Quando me casei o meupai não queria que eu ficas-se na aldeia achava melhorque eu fizesse a minha vidafora dali. Acabámos por es-colher as <strong>Caldas</strong>”, contou Albertoda Bernarda, acrescentandoque esta era então “uma ter-ra evoluída”, apesar de parase chegar ao Bairro dos Arneirosser ainda necessário atravessarterrenos de areia preta. A famíliainstalou-se no Bairro de AntónioElias pois “negociávamosazeite com os Elias, ne-gócios que foram iniciadospelo meu pai”.Pouco tempo depois surgiu aocasal a oportunidade de ficarcom a mercearia que existia naRua da Vassoureira (ou da Escoveira),na Rua da Estação. Eraassim designada pois existia aliuma fábrica de vassouras.A loja, que incluía taberna foitrespassada ao casal Bernarda emJulho de 1964 por 15 contos (74,82euros). “A minha mulher ficavamais na mercearia e eu na ta-bernica”, conta Alberto da Bernarda,que entretanto começou anegociar em madeiras, actividadeque não prosperou.Já mercearia ia de vento empopa “porque implementámoso conceito de mercearia de al-deia ali naquele bairro”. Vendia-sequase tudo avulso como eranormal naquele tempo - o azeite,o arroz, a farinha, o sabão, etc.Eram inclusivamente responsáveispor fazer produtos como a lixívia eAlberto da Bernarda recorda comoera comum “comprarmos 12quilos de hipoclorídrico e juntarmoságua para fazer 50 li-tros de lixívia”.Os clientes da Vassoreira eram,naturalmente, “os vizinhos, asfamílias que viviam na estação[à data um grande complexo fer-O casal fundador, Alberto da Bernarda e Noémia do Canto, com osfilhos Rui e Luís (hoje com 35 e 45 anos). Ambos se mantiveram namesma área de negócio e cada um já tem o seu mestrado em Marketingroviário onde trabalhavam e viviamdezenas de pessoas] e muitaspessoas do Bairro dos Arnei-ros”, contaram.Aos empregados da estaçãovendiam-se muitas “ciganinhas”(vinho tinto vendido nas garrafasdas minis que iam encher à taberna).Noémia da Bernarda conta queera o filho mais velho, Luís, nascidoem 1965, que ia muitas vezesaté ao muro que dividia a área daestação da cidade e aviava os ferroviários,trazendo e levando asgarrafas.“Lembro-me que num sábadode manhã, batemos o recordeao vender dois mil papo-se-cos. A fila de gente chegava àrua”, disse a empresária. Outro dossegredos da Vassoureira era tersempre as coisas que as pessoasnecessitavam e evitar a todo o custoter produtos em falta.Também a taberna prosperava.Alberto da Bernarda contou quechegaram a ter um vinho afamadonas <strong>Caldas</strong> e num só ano “chegá-mos a vender 30 mil litros devinho a copo”.O casal recorda que tambémaviava os indigentes que possuíamsenhas entregues pela Políciaque podiam ser, uma vez por mês,trocadas por bens alimentares.A mercearia abria às oito damanhã e o casal recorda que laboravaaté de madrugada pararepor os produtos. “Trabalha-va-se sábados, feriados edias santos. Os dias vagos,Domingos, era para limpar eencher a mercearia, não erapara passear”.Em 1970, Alberto e Noémia decidiramfazer obras e transformarama mercearia no primeirosupermercado da cidade, comuma caixa registadora e livreserviço. A “Vassoureira” foi aprimeira casa a modificar-se efomos “das primeiras a tirar15 dias de férias pois até essaaltura ninguém as tirava”.“NUNCA SERVI UM GALÃOQUE NÃO FOSSE COM OLEITE FERVIDO”Entretanto surge a hipótesede ficarem com o trespasse doCafé Pérola junto à estação (quede sucesso. A maioria da clientelaeram passageiros da CP eferroviários, isto numa épocaem que nem toda a gente tinhacarro, não havia auto-estradase o caminho-de-ferro era o principalmeio de transporte parase chegar e partir da cidade.“Logo de manhã estavamtudo quentinho em cima dobalão”, recorda o casal. Era tudofeito na altura e com um cuidadopouco habitual. Veja-se por exemploo galão: “nunca servi leite aosmeus clientes que não fossefervido e ia ao Pena buscar cafétar com um empregado e tomarama iniciativa de pedir a máquinado Totobola à Santa Casada Misericórdia e recordam queestiveram sete anos à espera daautorização para poder teraquele jogo.Entretanto, Alberto da Bernardareparte o seu tempo comum outro projecto ao qual dedicoualguns anos da sua vida – aCoopercaldas, uma cooperativade retalhistas, da qual foi cofundadorem 1973.Nos anos noventa, e acompanhandoo declínio da linha doA família Bernarda está nas <strong>Caldas</strong> há quase meio século e desde então nãoparou de investir em negócios. Há 46 anos ficou com uma mercearia e taberna,depois com um café e actualmente possui uma casa de jogos da sorte (Pérolada Sorte) e a Mercearia Pena.Pais e filhos – Alberto e Noémia, e Luís e Rui - são os sócios gerentes da firmaCarvalho & Irmão, Lda. e têm alma de comerciantes sempre em busca do crescimentodos seus negócios. Ao todo empregam nove pessoas e em tudo o quefazem distinguem-se pela aposta na qualidade.pertencia a Joaquim Anastácio)o que veio a acontecer em 1978.Os Bernarda - então já com doisfilhos - passam assim a deter aVassoureira e o café Pérola. Esteúltimo era detido pela firma Carvalho& Irmão, Lda., que passaagora para as mãos do casal Bernarda.Será através desta sociedadepor quotas que o casalfará os seus futuros negócios,nomeadamente a compra daMercearia Pena e a criação daPérola da Sorte.Em 1980 os Bernarda trespassama mercearia e investemmais forte no café Pérola, cujalocalização em frente à estaçãoera um dos principais motivosRui da Bernarda atendendo os seus clientes na mercearia. O empresárioaposta forte nos produtos tradicionais portugueses.d’Avó para lhe adicionar”,Oeste, o café passa a ter menoscontaram.clientes. A zona vive então umDurante muitos anos o café momento mal afamado. “Os Os to-funcionou entre as seis da ma-xicodependentes trouxeramnhã e as duas da madrugada.mau ambiente a esta zona.Entre o público preferencial es-Esperavam pela droga quetavam os tropas e os estudan-vinha de comboio…”, contou otes e, para além do negócio, casal, que pouco depois toma acontam que praticavam este decisão de fechar o café. Esta decisãocoincidiu com a vontade daentes não ficassem na rua aautarquia em demolir o próprioaguardar pelos comboiosedifício para ali construir um par-pois só fechávamos quandoque de estacionamento. Como nãotodos partiam”. Depois acha-eram proprietários e só pagavamhorário “para que os seus cliramque em nome do descanso renda, Alberto e Noémia chegaramera melhor praticar novo horárioe passaram a abrir às sete nhorio e mudaram-se para o céle-a acordo com a autarquia e o se-da manhã e a fechar à meianoite.Passaram também a con-fica na esquina em frente ebre “mamarracho da estação” queondeainda hoje possuem a Pérola daSorte, uma casa exclusivamentededicada ao jogo. Curiosamente,isso representava um regresso àmesma rua onde décadas antes tinhaminiciado a sua actividade comercialcom a Vassoureira.Para Noémia, era tempo demudar de actividade porque estavasaturada de 20 anos na merceariaVassoureira e 24 anos no caféPérola. “Eu não gostava dosnovos clientes que nos anos 90passaram também a frequen-tar o café”, conta.Contudo, ainda hoje há antigosclientes que “têm sauda-des dos nossos pastéis debacalhau e das nossas fati-as douradas”.Do café Pérola para a novacasa trazem as máquinas de registodos jogos de Totobola, Totoloto,alem de venderem tambéma lotaria. Mais tarde passarama ter também o Euromilhõese as raspadinhas.Na Pérola da Sorte já foramvendidos os primeiro, segundo eterceiro prémios da lotaria nacionale seis vezes o primeiro prémiodo Totoloto. “Temos clien-tes que jogam com a mesmachave há vários anos e hojejá atendemos os seus filhos”,disseram, explicando que sãoagentes da Santa Casa desde osanos oitenta.Nesta altura o casal detinhajá um outro negócio – a merceariaPena, que tinham compradoem 1997 e que dava trabalho atrês pessoas.Natacha Narcisonnarciso@gazetacaldas.comO Café Pérola acabou por ser demolido pelaA Mercearia Pena no passado e no presente. Este estabelecimento celebrou no ano passadoautarquia e hoje o local é um parque de estacionamento100 anos.


sde os anos 60“Comprámos a Mercearia Pena para queaquela casa centenária não fechasse”“As primeiras dificuldades começaramlogo com a abertura do Modelo”“Tinha muita pena queaquela casa fechasse, erauma referência nas <strong>Caldas</strong>e o senhor Vítor dava-se aoluxo de atender os clientesque queria”. Alberto da Bernardadiz que foi por essa razãoque comprou em 1997 a merceariado seu amigo Vítor Santos,que na altura estava em dificuldades.Numa primeira fase a MerceariaPena não foi alvo de grandesmudanças por parte dosnovos proprietários, mantendosecomo um estabelecimentotradicional no centro da cidade.Será em 2001 que Rui da Bernarda,filho mais novo do casal,enceta uma verdadeira revoluçãonaquela mercearia. Rui tinha25 anos, uma licenciaturaem Gestão de Marketing e experiênciacomo gestor em duascadeias de supermercados.(Curiosamente, o seu irmão,Luís, 44 anos, também está nomesmo ramo, mas vive em Lisboa,onde é gerente da cadeiaSpar, que possui 30 lojas em Portugale 13 mil em todo o mundo).“Para viabilizar a Mercea-ria Pena deixámos em doisou três anos de vender produtosde mercearia e de dro-garia”, disse Rui da Bernarda.Nos anos 90 as pequenas unidadesde retalho estavam a desaparecerao ritmo alucinantede cerca de 2000 por ano. Paraevitar que a Pena fosse maisuma, era preciso um grande investimentopara adaptar a lojaaos novos desafios.Rui da Bernarda manteve osmesmos funcionários (cinco) eos fornecedores e dá o desenvolvimentodevido a uma dasprincipais áreas: o café. Maisninguém vende Café d’Avó nacidade e desde que pegaram nonegócio já criaram novos lotes.Pena, Centenário, Bordalo e Óbidossão as últimas criações que<strong>Cronologia</strong>:ainda não conseguem concorrercom as vendas do centenário Caféd’Avó. Agora também já vendemapenas chicória pois há pessoasque, aconselhadas pelos médicos,estão a substituir o café por aqueleproduto.A Mercearia Pena ao longo dosúltimos anos tem apostado emprodutos com a marca da casa,como é o caso de um queijo daSerra e os bolos secos, que são feitosnas <strong>Caldas</strong>, bem como o licorde Café d’Avó que é também produzidona região.“Hoje 50% do negócio damercearia é dedicada à reven-da”, contou Rui da Bernarda, explicandoque vende café expressopara hotelaria e restauração. O empresáriorenovou totalmente aqueleespaço comercial uma décadadepois de o ter adquirido. Actualmentejá está a preparar a segundapágina da internet da merceariae orgulha-se de estar presentenas redes sociais e em páginas internacionaisde gastronomia queaté já lhe trouxeram clientes estrangeiros.“Temos que acompanhar ostempos e fazer com que os nossosnegócios não sejam ultra-passados”, diz o empresário que,apesar de tudo, sabe que a épocaé contrária à evolução de pequenosestabelecimentos como asmercearias, mas trabalha todos osdias para inverter esta tendência.Como? “Apostando forte nosprodutos tradicionais portu-gueses e estando atento àsnovas necessidades dos nos-sos clientes”.A Mercearia Pena já foi agraciadacom uma medalha de ouro pelomunicípio das <strong>Caldas</strong> e foi uma dascinco lojas nacionais finalista nacategoria Lojas com História doPrémio Mercúrio – O melhor do Comércio2008. Esta distinção é promovidapela Confederação do Comércioe Serviços de Portugal e pelaEscola de Comércio de Lisboa. Paie filho explicam:”é tudo apenasfruto do trabalho e da dedi-cação”.“OS NOSSOS NEGÓCIOSPRIMAM PELAEXCLUSIVIDADE”“Os nossos negócios primampela exclusividade e cen-tram-se em si próprios paranão haver dispersão, factoque normalmente mata osnegócios”, disse Rui da Bernarda.A firma Carvalho & Irmão temnove funcionários, quatro na Pérolae cinco na Mercearia Pena.Em 2009, esta sociedade por quotasfacturou 432 mil euros na MerceariaPena e cerca de 71 mil eurosna Pérola da Sorte.Questionado sobre se os seusnegócios estão consolidados, Albertoda Bernarda diz que se fossequestionado há uma década“diria que sim”, mas hoje consideraque nos negócios “nada épara sempre...”Tanto a Mercearia Pena comoa Casa Pérola da Sorte não estãoimunes à crise generalizada.“Ambos tiveram um decréscimode 10% a partir de Ja-neiro deste ano”, comentou Ruida Bernarda. No caso dos jogos,por estranho que possa parecer,até tem mais apostadores, mastem muito menos apostas. “Hojemuitas pessoas jogam ape-nas dois euros porque nãopodem jogar menos”, disse.De qualquer modo a famílianão baixa os braços e o próximoprojecto pode passar pelo alargamentodo conceito da MerceariaPena a um espaço de restauração.A ideia está a ganhar raízesde modo a que os clientespossam degustar uma boa sandesde queijo da Serra ou de umpaio de qualidade que vão buscara tantas zonas do país.Natacha Narcisonnarciso@gazetacaldas.comA história da Mercearia Pena(fundada em 1909) está intimamenteligada ao Vítor Santos,hoje com 84 anos, que nela começoua trabalhar em 1938.Em 1956 ascende a sócio-gerentepor iniciativa do fundador eentão proprietário José Pena Júnior(falecido em 1972), naturalde Folques (Arganil).Entre os anos cinquenta e 1997Vítor Santos é o principal rostodesta centenária mercearia.Nascido em 1925, este caldenserecorda que morava na Ruado Hospício, com a sua mãe eirmãs (o seu pai falecera cedo).Vítor Santos começa a trabalharcedo:“Nos anos trinta fui paraa Escola Comercial estudarde noite e trabalhar para aMercearia Pena durante odia. Trabalhei como marça-no, a fazer recados e a casateve sempre boa clientela so-bretudo de Óbidos”.Porquê de Óbidos? A históriajá é lendária: conta-se que JoséPena tinha ido a uma feira em Ados Negros e encontrou uma carteiracom muito dinheiro que fezquestão de a entregar ao dono.1948 - Constituição da firma Carvalho & Irmão Lda registada no nº 328 da Conservatório das <strong>Caldas</strong> (esta empresa era detentora do Café Pérolaque viria mais tarde a ser comprado por Alberto e Noémia)1964 – O casal Alberto da Bernarda e Noémia do Canto tomam de trespasse “A Vassoureira” (taberna e mercearia) na rua da Estação1970 – Transformação da mercearia no primeiro supermercado da cidade, com uma caixa registadora e livre serviço1978 – O casal toma de trespasse o Café Pérola, também junto à estação, passando assim a deter a totalidade do capital social da firma Carvalho& Irmão, Lda.1980 – O casal desiste da Vassoureira, trespassando o negócio, ficando ficam apenas com o café Pérola1996 - Dando cumprimento à legislação da época, Alberto da Bernarda aumenta o capital social da firma para 1500 contos (7482 euros).1997 – Aquisição da Mercearia Pena2002 – O café é demolido para dar lugar a um parque de estacionamento. O casal funda a Casa de Jogos Pérola da Sorte na Rua da Estação2006 - O capital social da empresa é aumentado para 50 mil euros2007 – Grande renovação da mercearia e criação de vários lotes de café e produtos com a marca PenaVítor Santos nos anos 50 na Mercearia Pena, quando ainda era apenas empregadoe em 1992, então já proprietário com a neta ao colo“Toda aquela gente passou atê-lo em grande consideraçãoe estima por ter sido um ho-mem sério”, passando muitosobidenses a frequentar o seu estabelecimento.Quando Vítor Santos foi para atropa, no RI5, em 1946, deixou umcompadre a cumprir as suas funções.O ainda empregado da mercearia,como era órfão de pai, pagoua praça, uma quantia de 2.500escudos (12,50 euros) e por isso “aoaofim de seis meses vim-me em-bora”.Regressa ao seu posto de trabalhoainda com 18 anos e assim quevoltou, “o o senhor Pena entre-gou-me a chave de sua casa,da loja e do cofre”, contou o futurosócio-gerente.Os principais produtos da casaforam sempre o café e o bacalhau.“O senhor Pena sempre foi umhomem que gostava de tertudo quanto era bom, fosseo queijo da Serra, as carnesou os enchidos”, recorda.Dado o bom gosto e a incessanteprocura de qualidade nosprodutos que vendia, tornava-senuma das casas mais conhecidasdas <strong>Caldas</strong> e região.Nos anos 50 lembra-se de quefoi adquirida para a Merceriauma máquina para cortar fiambre,uma grande inovação quesó uma outra casa comercial praticavanas <strong>Caldas</strong>. A MerceariaPena foi das primeiras a moer ocafé ao balcão e era também VítorSantos o responsável por torraros grãos. “A mistura doCafé d’Avó fui eu que a fiz. Olote que lá está ainda é meu:40% de café e 60% de chicória,que ainda hoje é dos pro-dutos que mais se vende”,contou.Foi em Março de 1956 queJosé Pena decide oferecer sociedadeao seu funcionário. Eragrande a confiança que neledepositava pois partia descansadopara as suas viagens pelaEuropa, deixando-o à frente detudo. A casa acabou por seralvo de remodelação nos anos60.Antes de falecer, Pena Júniorfez um pedido ao seu sócio:“que a casa não perdesse oseu nome”, conta Vítor Santos.O mesmo pedido que, anosmais tarde, este viria a fazer aAlberto da Bernarda quando viuque a saúde e as dificuldadespor que a casa passava não lhepermitiam continuar o negocio,preferindo cedê-lo ao amigo.“As primeiras dificuldadescomeçaram logo quandoo Modelo abriu, na dé-cada de noventa. Mas eu láme fui aguentando poismesmo com a aberturasdos grandes supermercadosainda tive alguns clien-tes que gastavam ao mêsna mercearia”, contou. Seguiram-seproblemas de saúde, queajudaram a determinar a decisãode venda da Mercearia Pena.Ao longo da história da merceariaforam vários os clientes aquem se levava as compras acasa. Actualmente há alguns aquem ainda se faz esse favor.Segundo Rui da Bernarda, provavelmenteo futuro poderá passarpelo retorno às entregas ao domicílio“se se calhar de uma for-ma mais internética”, rematou.Natacha Narcisonnarciso@gazetacaldas.com


UMA EMPRESA, VÁRIAS GERAÇÕESO filho do Joaquim da Lareira já segue as pisadas doO futuro dono da Lareira quando tinha sete anos em1951. Joaquim é a criança do meio, em baixo.Sérgio (de chapéu branco) e o seu pai (à direita) na cozinha do restaurante.A Lareira – o restaurante que veio da AlemanhaJoaquim Coito nunca teve fériase quando vai para fora das <strong>Caldas</strong>é em trabalho ou para conheceralgum estabelecimento para o qualé convidado.A sua mulher, Maria Beatriz Coito,trabalhou sempre ao seu ladoaté recentemente, mas está agoraa tomar conta da mãe que ficouacamada.Com 66 anos, Joaquim Coito nãose sente cansado e não pensa nareforma. “Ainda acho que sounecessário aqui”, afirmou.Mas o filho, Sérgio Coito, de 39anos, está a assumir cada vez maisfunções na empresa. Na cozinha éo cozinheiro principal e ao nível dagestão é o responsável pelas compras,por grande parte dos orçamentospara os caterings e por tudoo que são burocracias.A filha do casal, Susana Coito, éarquitecta na Câmara das <strong>Caldas</strong>.“Até seria bom que ela traba-lhasse connosco, mas ela tirouo curso de Arquitectura e gos-ta muito do que faz”, diz o pai.Para o empresário, a vantagemde ter uma empresa familiar é podertrabalharem em conjunto, masé importante saber dar a autonomianecessária a cada um.Embora Sérgio Coito, filho dofundador do restaurante, não quisesseadiantar o volume de negóciosanual, comentou que em 2009tiveram um decréscimo nas receitas,mas em 2010 a situação temmelhorado.De África à AlemanhaJoaquim Coito nasceu em 1944,no Peso (Santa Catarina) e foi morarpara Salir de Matos quando casou,em 1970.O seu primeiro emprego foi comoaprendiz de padeiro nas <strong>Caldas</strong> daRainha, aos 13 anos. Chegou a trabalharna Quinta do Sanguinhal, noBombarral, mas como não gostoumuito da agricultura voltou a serpadeiro, mas desta vez em Lisboa.Em pouco tempo, como o patrãogostava muito dele, passou para acaixa na padaria.“Mas a minha ambição eraembarcar porque aqui na zonaandava muita gente embarca-diça”, conta. Depois de tirar a cartamarítima, embarcou num barco depesca como ajudante demotorista e foi até África.Chegada a altura de fazer a tropa,em 1966, esteve primeiro colocadoem Portugal e acabou por seguirpara a Guiné, onde esteve doisanos, durante a guerra colonial.Quando regressou voltou a embarcar,mas agora a sua nova ambiçãoera emigrar. “Consegui umpassaporte turístico e fui paraa Holanda, onde embarqueinum navio americano”, contou.De 1968 a 1972 trabalhou nesse navio,até que decidiu deixar o marporque se casou com Maria Beatrize emigrou para Osnabrück, na Alemanha.Como no tempo da tropa aprenderainglês, começou a trabalharcomo tradutor numa firma alemãde peças de automóvel que em 1973contratou cerca de 600 portugueses.“Eram quatro fábricas e eufazia de intérprete para os por-tugueses que lá trabalhavam”.Esteve dez anos nestas funções,mas ao mesmo tempo foi criandoos seus próprios negócios. Seis mesesdepois de ter chegado à Alemanha,já tinha aberto uma merceariae ao fim de um ano investira numrestaurante. Entretanto trabalhavatambém como gerente numa agênciade viagens. E sobrou-lhe aindatempo para ajudar a fundar umacolectividade de portugueses - aAssociação Recreativa de Osnabrück.Face aos bons resultados, decidiuabrir mais um restaurante, deprimeira categoria, com a ajuda doseu irmão como cozinheiro. Comeste estabelecimento já teve maisdificuldades porque fazia questãode apresentar produtos de elevadaqualidade. Todas as segundas-feirasdeslocava-se a Paris para compraros peixes, legumes e outros artigosque usava no restaurante. Foitambém na capital francesa que JoaquimCoito frequentou um cursode molhos, no Instituto de Cozinha.Regresso a PortugalAo fim de dez anos a famíliadecidiu voltar para Portugal porqueo filho, Sérgio, tinha terminadoa quarta classe e a filha, Susana,ia iniciar o ensino primário, e ospais queriam que eles continuassemos estudos em Portugal. Paraalém disso, a sua mulher, que éfilha única, quis vir ter com os pais.No final de 1982 vendeu os doisrestaurantes, Tamar e Alberman,a um português casado com umaalemã e regressou. Ainda hoje osdois restaurantes existem, com osmesmos nomes.Já em Portugal, abriu uma espéciede mini-mercado gourmet – oCopacabana - junto à Praceta AntónioMontez.“Até em Lisboa não haviamuitos locais com os produtosque eu vendia, para uma cozi-nha mais sofisticada”, referiuJoaquim Coito. Vinham pessoas devários lugares do país para se abastecerem.O segredo estava nosbons contactos que o empresáriotinha e que lhe traziam produtosde qualidade de vários países, nomeadamenteos queijos e os patêsfranceses.Manteve o mini-mercado durantecinco anos e em 1983, optou porinvestir de novo num restaurante.Há 26 anos que a família Coito explora aquele que é considerado um dos melhores restaurantes daregião. A Lareira, no Alto do Nobre, é uma referência no domínio gastronómico das <strong>Caldas</strong> da Rainha edo Oeste, e o seu nome é conhecido não só pelo restaurante, mas também pelos serviços exterioresde catering em diversos eventos.O restaurante tem representado a gastronomia do Oeste em muitos certames e tem sido alvo dereportagem em várias publicações nacionais e internacionais.Do quadro da empresa fazem parte 13 funcionários (incluindo os sócios-gerentes), um número queaumenta quando é necessário responder a picos de trabalho.Actualmente há duas gerações que trabalham no restaurante: Joaquim Coito e o seu filhoSérgio. A transição de gestão já começou a ser feita e Sérgio Coito tem vindo a assumir cada vezmais protagonismo na empresa Joaquim Bernado do Coito Lda.A Lareira já existia desde a décadade 70, explorada por Fernando Cavaco,junto ao campo de tiro aospratos da empresa J. L. Barros, mastinha encerrado entretanto. JoaquimCoito alugou então o espaçopor 11 contos ao mês (55 euros),em sociedade com José Saraiva (ligaçãoque durou apenas um ano).Nessa altura não havia praticamentenada no Alto do Nobre anão ser aquele campo de tiro. “Aspessoas diziam que nunca iriaconseguir singrar, mas empouco tempo começámos atrabalhar muito bem”, contou.Começou com sete funcionáriose uma aposta na cozinha internacional,mas também com pratosde cozinha portuguesa. JoaquimCoito acredita que o seu estabelecimentoserviu de inspiração paramuitos restaurantes que depoissurgiram na região. Até porquemuitos antigos funcionários estabeleceram-sepor conta própria.“Eu Eu nunca escondi nada a nin-guém e ensinei muita gente.Muitos ex-funcionários estabe-leceram-se por si próprios eainda bem”, afirmou. A Lareiratornou-se assim uma “escola” paravárias gerações.Em 1984, já a trabalhar sozinho,comprou o restaurante e há 15anos fez obras para alargar o edifício,de modo a ter mais capacidadee albergar eventos como casamentose baptizados, entre outros.Antes disso já faziam serviço decatering em casamentos, mas sóno exterior.“As pessoas já sabem quetudo irá correr bem, quandotrabalham connosco”, consideraJoaquim Coito.O empresário e cozinheiro, deexcepcional simpatia e de elevadaqualidade de serviço, sempre tevemuito jeito para servir os clientescom aquilo que gostam, sem precisaremde dizerem o que querem.“Até quando preparamos asementas para os casamentos,na maior parte das vezes osnoivos nem escolhem nada. Eufaço várias sugestões e aca-bam sempre por decidir peloque eu sugiro”, exemplificou.Um dom que já vem do tempodos restaurantes na Alemanha,quando muitos empresários estrangeirosse colocavam nas suas mãospara as refeições.Pedro Antunespantunes@gazetacaldas.com


paiA família Coito e funcionários da casa numa imagem de 1987 e aspecto actual da entrada do restaurante. O recém-criado jardim fotográfico serve de cenário paraos noivos posaremSérgio Coito - entre a Alemanha e PortugalSérgio Coito nasceu em Salir deMatos e foi ter com os pais a Alemanhaquando tinha seis anos.Toda a instrução primária foi feitanaquele país e ao regressar a Portugalsentiu um grande choquecultural. “Fui Fui confrontado comuma cultura e hábitos comple-tamente diferentes, apesar depassar sempre as férias deVerão em Portugal”, contou.Era um adolescente quando ospais abriram A Lareira e desde oinício se interessou pelo restaurante.. “Participava e achava en-graçado, mas naquela alturanem sequer pensava que aque-le iria ser o meu futuro”, disse.Aos 16 anos já ajudava na PensãoCristina (um restaurante selfservice),na travessa da Cova daOnça, e aos 18 ficou a gerir um restauranteem Leiria, o Solar do Alcaide.Ambos negócios em que opai investiu, mas que foram vendidosporque Joaquim Coito decidiuapostar apenas na “Lareira” depoisdas obras de ampliação.Pouco tempo depois voltou àtambém para me auto-afir-mar”, explicou.Sérgio Coito quis provar que tinhaas capacidades necessáriaspara gerir também o negócio defamília e que era mais do que serapenas o filho do dono. Ao fim dedois meses numa unidade hoteleiraalemã já tinha funções de responsabilidadee percebeu que tinhamérito.O filho do fundador da empresaacredita que o facto de terem estadona Alemanha se reflecte naforma como trabalham, principalmenteao nível da organização.Em sua opinião, é mais fácil trabalharcom portugueses lá foraporque os emigrantes são maisesforçados. “Há Há empresas ale-mãs instaladas em Portugalque acham que é diferente aforma como os portuguesestrabalham lá fora e como o fa-zem cá”, referiu.“Se Se as pessoas emigram eregressam às suas origens, éporque só partiram porque re-almente tinham necessidade,para o ajudar, porque nessa alturaia fazer obras para abrir os salõespara eventos.Quando voltou criaram em 1995a sociedade entre pai e filho, como nome Joaquim Bernado do CoitoLda, com um capital social de 5000euros que foi entretanto aumentadopara 49.900 euros, devido à novalegislação.Sérgio Coito, que é auto-didacta,deu formação na Escola Hoteleirado Estoril durante três anos ealguns dos seus formandos dãoagora formação na congénere destaescola nas <strong>Caldas</strong> da Rainha.Recentemente investiu tambémnuma loja de fotografias no BairroAzul, Dimago Studio, que lhe dáapoio ao nível das reportagens fotográficasdos eventos no restaurante.Menos casamentosA ampliação do restaurante deveu-seà grande procura de umespaço para casamentos, porquehavia pouca oferta nesse ramocorridos”, comentou Sérgio Coito.Agora, não só servem casamentosno restaurante, como tambémtrabalham com algumas quintas daregião no serviço de catering, comoa Quinta dos Loridos e do Sanguinhal(ambas do Bombarral) e a daFerraria (Rio Maior). Actualmentesó servem dois casamentos forade portas por dia “para podermoscontinuar a garantir a nos-sa qualidade e o nosso nome”.Nas instalações do restaurantepodem fazer até quatro serviços, omesmo número de salas disponíveis.No mesmo dia podem-se juntarali até mais de 700 pessoas.Se antes conseguiam recebermais pessoas, a complexidade doscasamentos actuais faz com quetenham mais contenção no que aceitam.No entanto, Sérgio Coito lembraque o número de casamentos emPortugal reduziu-se drasticamentenos últimos anos. “As As pessoastêm mais tendência a junta-rem-se do que em casarem”,zerem-se casamentos de dois dias,como era tradição em Portugal, ecada vez há menos convidados. Hámais de 20 anos, chegaram a fazerserviços de três e quatro dias.As ementas começam a ser maispensadas tendo em conta os custos.Uma das opções é reduzir otempo que as pessoas passam norestaurante e assim ter disponibilizarmenos comida.O orçamento mínimo por pessoapara um casamento é de 40euros (mais IVA) e o máximo standardé de 72 euros (mais IVA). Paraquem não olha a custos, não hálimites no que se gasta e há váriasopções desde os melhores vinhosaos pratos mais elaborados.Aos domingos A Lareira recebetambém algumas centenas de idososque vêm em excursões de todoo país para os seus famosos almoçosregionais. Estes encontros nãoestão abertos ao público e acontecematravés de organizadores quemarcam essas excursões até às<strong>Caldas</strong>. “Isso também nos tor-na conhecidos em todo o paísnior do Inatel. Ao longo dos anos ALareira tem recebido vários prémiosa nível nacional.Actualmente estão a fazer obrasde remodelação, mas de estruturae que são pouco visíveis aos clientes.Criaram também um “jardimfotográfico”, para que os noivos econvidados possam ter um lugaraprazível para fazerem as fotografiasda cerimónia.Uma refeição no restaurantecusta à volta dos 20 euros, se nãofor acompanhada por um vinhomuito caro, e um casamento podeficar entre os 40 e os 72 euros porpessoa.Segundo Sérgio Coito, os municípiosda região não são os clientesque mais demoram a pagar,mas o mesmo não pode dizer emrelação a outras entidades e empresas,onde nota que há cada vezmais atrasos nos pagamentos.“Não há mês nenhum quenão tenhamos 150 ou 200 mileuros para receber”, referiu oempresário.P.A.Alemanha para trabalhar num res-mas, na verdade, gostam denesta zona. A maioria dessas cerimóniasrealizava-se em associa-seus serviços não tenha baixadopessoas de fora”, adiantou Sér-referiu, embora a procura pelose nos traz outros serviços detaurante sem qualquer ligação àestar cá em Portugal”, considera.CRONOLOGIAfamília. “Além da vontade devoltar a contactar com a culturaprofissional alemã e de que-rer ganhar experiência, fuiUm ano depois de ter ido para aAlemanha, já na década de 90, opai desafiou-o a voltar a Portugalções e outros espaços do género.“As pessoas queriam ter umlugar mais requintado, semmesas compridas e bancosassim tanto, porque têm mais quintasa procurarem pelos seus caterings.Começa também a ser raro fagioCoito.Em 2006 e 2007 receberam o prémiode melhor restaurante dos programasTurismo e Termalismo Sé-1974 – Joaquim Coito abre orestaurante Tamar em Osnabrück(Alemanha)1976 - Abertura do restauranteAlberman na mesma cidade1978 – Fernando Cavaco abreo restaurante A Lareira1982 – De regresso a Portugal,Joaquim Coito abre o minimercadoCopacabana nas <strong>Caldas</strong>da Rainha.1983 – Joaquim Coito arrendaA Lareira, que estava encerradahá alguns anos, por 11contos (55 euros) ao mês.1984 – Joaquim Coito comprao restaurante.1995 – Obras de ampliaçãopara as salas de cerimónias.1995 – Criação da sociedadeA equipa do restaurante, ainda antes de Beatriz Coito (na foto, de touca branca e calçasentre pai e filho “Joaquim Ber-Joaquim Coito com a filha Susana às compras na Praçapretas) se ter retirado. Sérgio (de branco e sem chapéu) é o quarto a contar da esquerdada Fruta numa foto dos anos 80e Joaquim Coito está à direita.nado do Coito Lda”.


24Centrais10 | Setembro | 2010, VUMAMA EMPRESAMPRESA, , VÁRIAS VGERAÇÕESAuto Júlio, SA – o pequeno stand da Mitsubishi que se tNasceu na Guarda há 59 anos,veio para as <strong>Caldas</strong> com apenasquatro e até estabelecer a AutoJúlio teve que percorrer um longocaminho, mas nunca até hojevirou a cara à luta, naquela queé, porventura, uma das suasprincipais características.Começou novo a trabalharcom o pai, na fábrica Júlio DomingosSousa e Filhos, Lda (situadaem S. Cristóvão e quemais tarde seria vendida à Rubetão),e apenas com 16 anosfez toda a instalação eléctricana casa dos pais. Completou osestudos à noite, para concluir ocurso de electricista no antigo5º ano, na Escola Industrial eComercial das <strong>Caldas</strong> da Rainha.Foi depois da tropa que saiuda fábrica, por divergências. Odestino foi Coruche, ainda noscimentos, como gerente de umafábrica de pré-esforçados, a Vigauto.Por lá ficou entre 1975 e1977, mas regressou às <strong>Caldas</strong>para se estabelecer como fabricantede blocos de cimento.“As coisas não me correramnada bem, acabei por vendertudo para pagar às pessoasa quem devia”, diz António Júlio.Foi então que um jornal lhemostrou outro caminho. “Vi umanúncio a pedir vendedor detractores e disse: nem é tardenem é cedo”. Viu o salário baixarde 25 contos para 11 (125 para55 euros), mas o passo atrás acabariapor compensar.O destino foi a Geopeças.Começou pelos tractores, depoiso patrão comprou a representaçãoda Mitsubishi, passando avender também os furgões damarca japonesa.Foram as dificuldades financeirasda Geopeças que o levarama sair da empresa, primeiropara continuar como comissionista,depois para formar a suaprópria empresa. “Foi posto láum doutor formado em economiapara resolver o proble-ma da gestão, mas o doutornão percebia nada de negó-cios, entrámos em ruptura esaí”, recorda o António Júlio.A decisão de continuar nosautomóveis foi tão simples comoa tomada uns anos antes, quandomontou a fábrica de blocosde cimento. “Já vendia Mitsu-bishi, era um bom vendedorda marca e estava integrado.Ou voltava para o cimen-to, que são coisas que eupercebo, ou seguia o sectordas camionetas e dos tractores,do qual já percebia al-guma coisa”.É nesta altura, em 1987, quedecide ir ao Porto tentar a representaçãoda Mazda, que não conseguiudevido às exigências doimportador. No mesmo dia insistiuatravés da concessão de Leiria,que lhe ofereceu a representaçãoda Mitsubishi. Acabou poraceitar, após duras negociações.Comprou a representação etudo o que estava associado àmarca ao antigo patrão pelovalor da dívida à Mitsubishi:10.500 contos na altura (cerca de52 mil euros) em 21 prestaçõesde 500 contos, tendo os paiscomo fiadores. A Auto Júlio fixava-seem São Cristóvão, juntoàs bombas da BP, numas instalaçõesque pertenciam aospais. “Foi assim que as coi-sas começaram”, relembra.No primeiro mês, todos osantigos colegas na Mitsubishiforam trabalhar à experiênciapara a nova empresa, assimcomo o ex-patrão da Geopeças- que assegurou os salários dessemês. “Eram 10, 12 pesso-as, depois escolhi os quequeria, ficaram quatro oucinco, dois deles ainda hojetrabalham comigo, os outrosvoltaram para a Geopeças”.No início da vida da Auto-Júlionão havia cargos específicos,incluindo para o próprio empresário.“Vendia carros, fazia acontabilidade, íamos buscaros carros, lavávamo-los an-tes de os entregar ao clientee quando comprei o primei-ro computador tive que irfazer formação para traba-lhar com ele... fazíamostudo”.EXPANSÃO ACONTECEUPOR NECESSIDADEQuando lançou a empresa,António Júlio estava bem conscientedo risco que estava a tomar,dados os valores elevadosem jogo. “Foi um risco doido”,sublinha. Os 500 contos mensais(2.500 euros) eram só para pagara dívida ao importador, depoisera preciso fazer face àsdespesas do dia-a-dia, mais ossalários e a aquisição das viaturas“que tinham que ser pagasem adiantado e tínha-mos que esperar uma ouduas semanas que o carrochegasse à concessão... nãoapareciam a crédito, ou àconsignação”.António Júlio considera tertido alguma sorte porque osmodelos da Mitsubishi “começarama vir com mais quali-dade e tiveram sucesso”. Mesmoassim as dificuldades erammuitas “e comecei a ver-meapertado, houve alturas quechorei, desesperado”. Desistirnão era, contudo, opção e afuga foi sempre para a frente.Comprou os armazéns doGama, em São Cristóvão - ondehoje funcionam as oficinas -, quecomercializavam gás e depoissoube que o posto Galp de SãoCristóvão, junto aos armazéns,estava disponível, adquirindo-otambém. É aqui que o negóciose alarga aos combustíveis.No mesmo sector adquiriumais tarde a Garagem <strong>Caldas</strong>,que vivia problemas financeiros.“Fui pagando durante cincoBruno Júlio, 35 anos, António Júlio, 59 anos, Luísa Fonseca Sousa, 52 anos, e CatarinaSousa, 27 anos, sãos oa administradores os Grupo Auto Júlioanos, fiquei com o negócio eos trabalhadores”, recorda. Acompra da Garagem <strong>Caldas</strong> permitiua entrada no negócio dadistribuição dos combustíveis.Mais tarde, para reforçar a presençano sector, o grupo foi tambémcriando postos de combustíveiscom imagem própria, tendoactualmente seis, no Campo,Santa Catarina, Usseira, Pombal,Sobral de Monte Agraço e Leiria.CHEGADA A LEIRIA FOI OGRANDE IMPULSOTambém no mercado dos automóveisa necessidade de gerarmais receita levou à expansão,quer na representação denovas marcas, quer na coberturade uma maior área geográfica.Quatro anos depois de fundada,a empresa estende-separa Peniche, onde foi criado umposto de venda Mitsubishi emsociedade com dois colaboradoresque lá tinha. António Júlio,porém, acabaria mais tarde porcomprar essa sociedade.A empresa apostou numanova marca em 1994 “quandochegámos à conclusão quenão podíamos ter todos osovos no mesmo cesto”. AHyundai estava disponível e,apesar de não ser muito conhecidana altura, tinha produtosdiferentes e o risco inerenteacabou por ser controlado. MaisComeçou a trabalhar no ramo dos cimentos ainda como adolescente, na fábrica do pai, e foi nessaactividade que deu os primeiros passos a solo, com uma empresa de fabrico de blocos que não resultou.Um anúncio num jornal levou-o a vender tractores na Geopeças, onde teve também o primeiro contactocom o sector automóvel. As dificuldades financeiras daquela empresa empurraram-no para uma novatentativa como empresário, agora no ramo automóvel, e assim nasceu a Auto Júlio. Foram a persistênciae espírito visionário que levaram António Júlio, hoje com 59 anos, a expandir o negócio e construir aquelaque é hoje uma das maiores empresas do distrito, que actualmente gere em conjunto com a esposa,Luísa, e os filhos Bruno e Catarina.O posto da Rua Capitão Filipe de Sousa já foi extinto e a Garagem <strong>Caldas</strong> é hoje uma loja de produtos chinesesrecentemente, em 2006, o grupoadquiriu a representação de umaterceira marca, sempre para fazerface “aos custos muitosgrandes que tínhamos”. ANissan “foi muito importantepara a estratégia do grupo”,reconhece António Júlio.Mas ainda antes da representaçãoda Nissan, o Grupo Auto-Júlio deu passos muito importantes.Em 1995, um ano depois deganhar a representação da Hyundai,surgiu uma oportunidade deouro que António Júlio agarroucom as duas mãos. “A Mitsubishiquis vender as instalações deLeiria, fez uma proposta a umconcorrente meu, mas nãochegaram a consenso, entãofizeram-me a proposta”. A expansãopara a capital do distritoabria grandes perspectivas de desenvolvimento,aumentando deforma exponencial o número depossíveis clientes, justificando oforte investimento. A aquisiçãodas instalações foi feita por 350mil contos (cerca de 1,75 milhõesde euros).“Nessa altura já tínhamosos combustíveis, mas tratadocomo um segundo negó-cio, e a instalação de Leiriaveio-nos enriquecer muito”,considera Bruno Júlio, filho deAntónio Júlio e hoje administradordo Grupo Auto Júlio.Três anos depois a Auto Júliochega ainda mais ao norte dodistrito, a Pombal, onde o representantelocal da Mitsubishi tambémestava mergulhado em dificuldadesfinanceiras. AntónioJúlio compra uma fábrica de alumíniosque havia em Pombal,reconverte-a num complexo comas marcas que vendia e ficou assimcom a parte norte do distrito.“Foi também uma belíssi-ma oportunidade”, refere.A presença no mercado automóvelfoi ainda reforçada comuma empresa de comércio deusados e outra de rent a car,nascida da necessidade de gerira frota interna. Hoje a AutoJúlio Rent tem uma parque de300 carros e marca presença nas<strong>Caldas</strong>, Ericeira, Torres Vedras,Pombal, Peniche e Leiria.“As duas marcas de auto-móveis que se juntaram, aaposta forte nos combustí-veis, o desenvolvimento darent a car e a modificação dapolítica de usados fez-noscrescer bastante. Não foi sóir ao sabor dos picos de mer-cado”, sustenta Bruno Júlio. “Secalhar a Auto Júlio está hojebem apesar do contexto económico,devido ao que fize-mos no passado, optimizarao máximo cada negócio donosso grupo de empresas”.Hoje o grupo representa umuniverso de 11 empresas queemprega cerca de 150 pessoasem todo o distrito, tendo facturadono ano passado 66 milhõesde euros. Bruno Júlio diz que trabalharno seio familiar por vezestem desvantagens: “às vezeseu quero ir para a direita e omeu pai para a esquerda,mas o que é certo é que quan-do paramos para pensar osresultados demonstram quefizemos uma boa dupla”.Joel Ribeirojribeiro@gazetacaldas.com


Centrais25ransformou num grande grupo económico regional10 | Setembro | 2010As primeiras instalações da empresa e uma das oficinas iniciais. São Cristóvão foi o berço deste grupo económico e o local onde este está sedeado.“O país precisava de vários António Júlio”"É uma pessoa de muita di-nâmica, o país precisava devários António Júlio". É assim queLuísa Fonseca de Sousa, de 52 anos,caracteriza o marido.O empresário diz que há diversosaspectos que o conduziram pelos caminhosdifíceis que teve que encontrar:"acreditar no que estamosa fazer, fazer contas, planear,ser exigente principalmenteconsigo próprio, mas tambémcom os outros, e ser teimoso,nunca me fico pelo não, tenhoque saber como ultrapasso onão, isso tem sido a chave emtoda a minha vida".Luísa Sousa acompanhou AntónioJúlio em todo o processo de incubação,nascimento e crescimento daempresa e, apesar de só há 10 anoster saído da EDP - onde esteve 24 anos- para assumir um cargo efectivo naAuto Júlio, onde é responsável pelaárea financeira, desde sempre foi umapoio importante para o marido.A ajuda recaía em todos os camposonde era possível. "Quandoadquirimos o posto da Galp, porexemplo, aconteceu a todos terque fazer limpezas", recorda.Luísa Sousa adianta que foramprecisos muitos sacrifícios e dácomo exemplo o nascimento da filhamais velha, Catarina. O tempo degestação estava no fim, mas era precisofazer um negócio e para não ficarsozinha acompanhou o marido,ficando em casa do cliente com aesposa deste. Voltaram para casadepois da meia noite e Catarina nasceulogo poucas horas depois.A decisão de largar um empregode longa duração para abraçar o projectodo marido não foi fácil. "Estavana EDP há muitos anos, po-dia não me adaptar e por vezesnão é saudável para um casaltrabalhar junto, mas para mu-dar tinha que ser numa alturaem que ainda tinha alguma coi-sa para dar e não estou nadaarrependida".A entrada dos filhos na Auto Júliofoi sendo gradual. Tanto Bruno Júliocomo Catarina Sousa foram crescendocom a empresa, onde trabalhavamnas férias."Hoje é ilegal trabalhar com12, 13 anos, mas eu trabalheinas férias e não me fez mal ne-nhum", diz Bruno Júlio, hoje com 35anos. "Aprendi o funcionamen-to de todas as secções e o quehoje me permite ter um conhe-cimento de cada área", conta.Fez de tudo, desde estafeta, recepcionistade oficina, a lavador de carros.Só em 1995, depois de cumprirserviço militar, assumiu um cargode chefia. A Auto Júlio tinha acabadode chegar a Leiria e era preciso ter àfrente uma pessoa de confiança. "Eutinha estado na Marinha e abraceio desafio, um pouco empurrado,um pouco por inicia-tiva, porque gosto muito dosector automóvel e tive que medesenrascar", conta.A irmã Catarina Sousa, hoje com 27anos, tinha quatro quando a Auto Júliofoi criada e ambas foram crescendolado a lado. Recorda ter aprendido aandar de bicicleta entre carros novos"lembro-me perfeitamente de omeu pai me largar e eu ir a pe-dalar e a olhar para os carroscom medo de os riscar, mascerto é que aprendi depressa".Aos 13 começou também a trabalharnas férias, como telefonista e recepcionista,mas mais tarde mudou derumo. Licenciou-se em gestão e estagiouna Sonae Sierra, depois de se formarfoi para o Grupo PT. Mas há precisamenteum ano sentiu vontade devoltar. "Quando uma pessoa cres-ce num negócio de família umdia sente que tem que dar umacontinuidade a esse trabalho".António Júlio sente "orgulho"por ter dois dos seus filhos já a liderara empresa e acredita nas possibilidadesde ambos. "Têm característicasdiferentes, comple-tam-se um ao outro".FUTURO PASSA PELOESTRANGEIROMesmo com as contas elevadaspara pagar na fase inicial, AntónioJúlio diz que nunca sentiu a empresaem perigo. A resposta à pergunta dequando sentiu maiores dificuldades,é respondida de forma pragmática:"é agora, não pela minha empresa,mas por este país e pe-las condições que estão a sercriadas, as coisas estão mal eparece que vão piorar".A empresa atingiu em 2009 o picodo endividamento, devido às reestruturaçõesque foram sendo feitas. "In-vestimos um milhão de euros emPombal e em Leiria, gastámosmuito dinheiro no pólo de SãoCristóvão, acabámos de pagarvários investimentos no anopassado e dentro de três anosnão teremos praticamente en-dividamento, o que nos tornaconfiantes", diz António Júlio.Mesmo em termos de volume denegócios, 2010 está melhor que 2009e a perspectiva é que o grupo possaexpandir-se mas… não em Portugal."Sinto necessidade e estou disponívelpara isso, mas não nestepaís, não vejo saída, foi criadauma cultura de ver os em-presários como os maus da fitae que levaram o país ao queestá".A presença no estrangeiro já existedesde há quatro anos, refere o filho,Bruno Júlio, numa espécie detubo de ensaio do que poderá ser umaexpansão futura.O administrador da Auto Júlio Investimentoscorrobora com o pai navontade de continuar a crescer:"mesmo que queiramos parar jánão conseguimos, temos quecrescer e nessa óptica o mer-cado nacional é pequeno, maisano menos ano temos que sair".A empresa marca presença comnegócios imobiliários na Gâmbia eno Brasil desde há quatro anos."Acreditamos que o futuro estáno Brasil, é um país enorme,dos maiores do mundo. Enquantona Europa os cresci-mentos são da ordem de 1% ou1,5%, no Brasil tem sido, 7 a8%, e já chegou a ser de doisdígitos", diz Bruno Júlio.Estes negócios funcionam comotubo de ensaio enquanto não é possíveluma estrutura permanente. "Umnegócio no exterior não podeser controlado à distância", dizo empresário, que compara as actividadespreliminares no estrangeirocomo um departamento de investigaçãoque mais tarde se transformanuma empresa.J.RJoão Lourenço e Margarida Alexandre sãocolaboradores desde o primeiro diaJoão Lourenço refere que “sempretrabalhámos para ser uma empresa dequalidade e forte”A Auto Júlio arrancou há 23 anos com quatrotrabalhadores, para além do proprietário, e doisdeles continuam a fazer parte da empresa desde oprimeiro dia. A estabilidade da empresa e o ambienteforam fazendo que ficassem, e já nenhumacredita que o futuro passe por outras paragens.João Lourenço, de 54 anos, era colega de AntónioJúlio na Geopeças quando este lhe lançouo desafio. "Fui ficando sempre, sobretudo pelogrupo de trabalho pois há uma boa ligação en-tre patrões e funcionários", conta.Na empresa fez de tudo. "Cheguei a ser con-siderado pela gerência um pronto-socorro", sublinha.Para além das peças, passou pelas vendas,pelos combustíveis e só passados sete anospassou a ter um cargo fixo, voltando à secçãodas peças, pelo qual é hoje responsável na AutoJúlio <strong>Caldas</strong>.Um dos segredos do sucesso, acredita, é aforma familiar como todos vestem a camisola."A empresa sempre privilegiou pela estabilida-de, começámos com poucos e fomos sendo uma<strong>Cronologia</strong>Margarida Alexandre diz que “não é fácilestar 23 anos no mesmo emprego, mas porvezes também não é difícil”família, sempre trabalhámos para ser uma em-presa de qualidade e forte".Também colaboradora desde o primeiro dia éMargarida Alexandre, que quando começou a trabalharna Auto Júlio tinha 22 anos.Hoje trabalha na parte comercial das viaturasnovas, mas no início, tinha que tratar de toda aburocracia inerente ao negócio: "fazia facturaçãoda oficina, peças, documentação dos car-ros". Na altura não havia computadores, recorda,e tudo era mais complicado que hoje, "Fazíamosmuitos serões e sábados", mas foi tudo por umaboa causa, sustenta. "Para se criar o que se crioué preciso alguém se predispor, porque sem traba-lho não se consegue nada".Acabada de completar 23 anos de casa, tal comoJoão Lourenço, diz que foi ficando "porque fuigostando, talvez devido à empresa ter vindo aevoluir e o ambiente de trabalho ser sempre agradável.Não é fácil estar 23 anos no mesmo em-prego, mas às vezes também não é difícil".J.R.1987 - António Júlio cria a Auto Júlio Lda nas <strong>Caldas</strong> destinada à venda de viaturas Mitsubishi1989 - A Auto Júlio Lda adquire o posto Galp em São Cristóvão1991 - É criada a Auto Júlio Peniche Lda, para comercializar viaturas Mitsubishi em Peniche1992 - Aquisição da Garagem <strong>Caldas</strong>, passando a comercializar combustível a granel e a fazer transportede combustíveis1994 - É criada a AJ Motor (<strong>Caldas</strong> Motor, SA) em <strong>Caldas</strong> da Rainha, representante da marca Hyundai1995 - É criada a Auto Júlio Leiria (Mitlei), representante da Mitsubishi em Leiria. O filho Bruno Sousa juntaseao pai na administração das empresas.1999 - Criação da Auto Júlio Rent, dedicada ao aluguer de viaturas. A administração das empresas passaa ser feita por António Júlio, Bruno Sousa e Luísa Fonseca2000 - O grupo soma mais três empresas: a AJ Ocasião, para comércio de viaturas usadas; a Auto JúlioImobiliária, que faz a gestão de imóveis do grupo; e a AJ Investimentos SGPS, para a gestão das participaçõese administração do grupo2003 - Surge a AJ Imobiliária para a construção do Pólo de Pombal. A empresa fica encarregue também dagestão dos imóveis do grupo e pelo arrendamento de lojas em Pombal2004 - A Auto Júlio passa a sociedade anónima, passando a agregar os negócios Mitsubishi, Posto Galp,Venda de Combustiveis a Granel, Hyundai, Galp Frota, Nissan e Posto BP. É criada a Auto Júlio Pombal,representante Mitsubishi2006 - A AJ Motor assume a representação da Nissan, enquanto a Auto Júlio Leiria passa a congregar as trêsmarcas do grupo, Mitsubishi, Hyundai e Nissan. A Garagem <strong>Caldas</strong> adere ao sistema Cartão Solrred2007 - A Auto Júlio Imobiliária assume a construção do Pólo de São Cristóvão e fica responsável peloarrendamento das lojas. A AJ Ocasião abre a oficina Bosch Car Service em São Cristóvão2008 - É criada a AJ Consulting para gerir a Exchange no Pólo de São Cristóvão2009 - A AJ Peniche abre uma oficina Bosch Car Service


24Centrais17 | Setembro | 2010, VUMAMA EMPRESAMPRESA, , VÁRIAS VGERAÇÕESTrofal – a qualidade como trunfo da sobrevivência doOs fundadores da Trofal, Manuel Marques do Couto e Maria Celeste. Ele faleceu em1983, deixando o filho mais velho à frente do negócio. Ela continua a fazer parte daadministração, mas não de forma executivaMaria da Luz e Luís Couto garantem a continuidade de uma empresa que alia apreocupação com a qualidade às preocupações ambientaisQuando Manuel Marques do Coutonasceu, a 15 de Maio de 1935, já os sapatoseram o labor da família. Contar ahistória da empresa obriga, por issomesmo, a saltar até aos primeiros anosdo século XX.O seu pai, Júlio do Couto (1903-1990),tinha herdado a profissão escolhida peloseu avô, António, que em 1903 deixou aagricultura para começar a fazer sapatosà mão, na freguesia vizinha de SantaCatarina. Nos finais dos anos 30, Júliodo Couto sai de Santa Catarina para ir paraa Ribafria, na Benedita, para trabalharcom um primo, Adelino Rafael Serralheiro,que tinha montado a primeira pequenaempresa das muitas que haviam devir a ser criadas naquela localidade.Alguns anos depois, Júlio do Coutomontou a sua própria oficina, onde alémde vários sapateiros, trabalhava o seufilho Manuel. Quando Manuel regressada tropa, em finais dos anos 50, eramtema de conversa as vantagens de criarpequenas fábricas, com alguns automatismos,que fizessem crescer as oficinasmanuais existentes. Jovem, dinâmicoe empreendedor, Manuel queria queo pai arriscasse numa fábrica, mas Júliodo Couto não quis. “Estava bem,não queria confusões”, conta hoje oneto Luís.Mesmo assim, Manuel não desistiue acabou por sair de negócio do pai parair trabalhar para outra oficina, a do ToinoFuncheira, no lugar de Fonte Quente,onde foi encarregado. É nesta altura quese casa com Maria Celeste, uma jovemdo lugar de Taveiro (Benedita), e poucotempo depois junta-se a um outro sapateiro,o Joaquim Adelino, e cria o seupróprio negócio de calçado. O primeirofilho, Luís, nasce em 1960. Um ano depois,nasce o segundo filho, António. Afamília ficou completa com as meninas,Clara e Maria da Luz.VONTADE DE CRESCERA vontade de querer mais de que ‘padecia’Manuel Couto, era um ‘mal’ de quesofriam muitos sapateiros da Benedita,que se uniram para criar aquela quehaveria de ser a segunda maior fábricade calçado do país, logo a seguir à Fábricade Calçado Campeão Português, emGuimarães. Nos primeiros anos da décadade 70 é criada a Fapocal, uma sociedadeanónima que junta seis oficinas,entre as quais a de Manuel do Couto, evários accionistas individuais. Bem nocentro da vila da Benedita, no local ondehoje estão o mercado e a Casa da Vila,começa a laborar uma fábrica cuja dimensãoé bem explanada pelo númerode trabalhadores, que chegou aos 400.“O meu pai era um dos admi-nistradores e o responsável portoda a área de produção. Na altu-Na década de 80 a Benedita era uma freguesia onde a mão-de-obra disponível não chegava para aazáfama das mais de 50 fábricas de calçado e marroquinaria que ali existiam. Hoje, restam pouco maisde uma dezena das empresas que na altura dela faziam uma das freguesias mais industrializadas dopaís.A Trofal – Fábrica de Calçado SA é uma das poucas que restam. Uma empresa que cedo percebeu quenão podia dedicar-se a um único produto e que tinha que ir de encontro às necessidades do mercado.Fundada em 1978 por Manuel Marques do Couto e pela sua mulher, Maria Celeste, a empresa está hojea cargo de Luís Fialho do Couto e de Maria da Luz Caetano, dois dos quatro filhos do casal. Uma duplaque tem sabido apostar na qualidade e nos artigos ecológicos como garante da continuidade dafábrica onde se fizeram gente grande.ra ele até fez um empréstimo àbanca para investir mais e paraaumentar a percentagem dele,porque era uma empresa em queele apostava bastante”, conta LuísCouto, que começou a trabalhar nestaempresa com apenas 13 anos, quandoacabou o ciclo.“Comecei no corte, a cortar osrestos dos desperdícios, passeipor todas as áreas. Aquilo erauma empresa grande, nem se-quer tinha contacto com o meupai lá dentro. O meu pai estavanum topo e eu no outro. No meioestavam os encarregados e to-dos os outros. Foi uma grandeescola para mim, essa empresa”,lembra. De dia trabalhava, à noite tiravao Curso Comercial no Externato Cooperativoda BeneditaMas a Fapocal foi apanhada no climada revolução, e o Verão Quente de 1975trouxe consigo tempos conturbados queacabariam por ditar o fim da empresa.Embora miúdo, Luís Couto lembra-sebem desses tempos. ”Houve um grupoapoiado pelo Partido Comu-nista que quis tomar o controloda Fapocal e começou a despe-dir os administradores”, conta,acrescentando que o pai “dizia mui-tas vezes que tinha sido saneadopelos comunistas”. Os trabalhadorestambém se deixaram contagiar peloespírito da época. “Paravam tudo ameio da tarde, agarravam noscarros da empresa e iam para oscomícios para Alcobaça. Eu eramiúdo, achava piada e ia tam-bém, em vez de estar agarradoao balancé a trabalhar”. E aquelaque “era uma empresa com todasas condições”, acabou por não resistira toda a instabilidade que se criou.“O meu pai saiu, mas tudo oque tinha estava investido lá, etinha até pedido um empréstimopara poder investir mais. Estavanuma situação complicada e nãose vislumbrava saída para aquelasituação, até porque houve algumaspessoas que se aprovei-taram desta confusão”, recorda oempresário.Saído da Fapocal o pai volta a meterseem novo negócio, desta feita a fazercalçado na Rosarte, uma marroquinariana Ribafria, pertencente a MartinhoGerardo. “Mas este senhor não ti-nha filhos e não tinha ambiçãode evoluir muito mais que aqui-lo”, enquanto Manuel Couto queria maispara a sua família. Já a ambição de Luís,na altura com 18 anos, era tirar um cursosuperior. “Então o meu pai pôs-me entre a espada e a parede edisse-me: se quiseres avançar,fazemos uma fábrica para a família.Se quiseres continuar a es-tudar vou criar porcos – que naaltura era o que dava dinheiro – ehei-de dar-te condições e aosteus irmãos para continuarem aestudar”.Sendo o mais velho de quatro irmãos,e habituado a ganhar o seu “ordena-dozinho” desde os 13 anos, Luís nãoquis ser um peso e respondeu ao pai:“vamos para a frente”.A ERA DO BOTIM DE PRATELEIRAA 28 de Dezembro de 1978 é criada aTrofal, em nome de Manuel do Couto eMaria Celeste. A empresa começou a laborarno dia 2 de Janeiro de 1979, ainda naRosarte. As instalações no Algarão, ondeainda hoje se mantém a fábrica, estavama ser construídas, de acordo com o quefoi planeado por Luís Couto.A passagem para as novas instalações,que mais não eram que um pavilhão,foi feita na Sexta-Feira Santa de1979. Maria da Luz, que na altura tinha10 anos, lembra-se bem desses dias, atéporque foram mais umas férias escolaresinterrompidas pelo trabalho no negóciodos pais. “Recordo-me da inau-guração da fábrica, de andarmosaqui a fazer a limpeza antes. Crescemosno meio de sapatos, nun-ca tínhamos férias pois quaisquerque elas fossem, assim que a es-cola acabava, vínhamos para aquiajudar. Só quando a fábrica fechavapara férias é que estáva-mos mais livres, e mesmo assimhavia sempre qualquer coisa parafazer, todas as mãos eram preci-sas”, recorda.E embora pequena, Maria da Luz ajudavanas mesas da costura, a cortar aslinhas, entre outras pequenas tarefas.“Lembro-me de uma altura que àsexta-feira eu e a Clara vínha-mos varrer a fábrica. Primeirobrincávamos e depois, quandonos cansávamos, lá íamos var-rer”, conta entre risos.Nos primeiros anos, apenas um produtosaía da Trofal – os botins de prateleira,que levavam muita gente da regiãoà Benedita. De Verão, a produção iapara os armazéns de revenda. “De In-verno vendíamos para algumassapatarias e não dávamos vazãoporque toda a gente queria”, con-ta Luís Couto. E se os botins da Trofaleram inicialmente vendidos apenas naregião, pouco depois chegavam aoNorte,através de um agente da empresa.“Aí já se podia pôr uma margemcomercial um bocadinho maiorporque não havia concorrência”.Em 1981, na altura em que a empresacomeçou a crescer, Manuel Couto adoeceue Maria Celeste, que era costureirana Trofal, largou tudo para tratar domarido. Aos 20 anos, Luís ‘desunhavase’para prosseguir com o negócio, masgarante que hoje já não aguentava o esforçoque era preciso naquela altura,sobretudo para levar os botins a outrospontos do país.“Carregava uma Ford Transitpequena, com os pares de cadacliente. A minha mãe alcançava-me os atados, muitas vezes achover, e púnhamos tudo por ordem.Às vezes chegávamos a fazerpilhas de dois metros no teja-dilho da carrinha que cobríamoscom oleados”. Com a carga pronta, ofilho dos donos da empresa saía por voltadas 03h00 e só depois de uma viagem deseis horas chegava ao Norte e começavaa dar a volta pelos clientes, acompanhadopelo agente da fábrica. “Chega-va normalmente às 03h00 do diaseguinte, porque só me despa-chava da volta pelas 19h00. NoInverno fazia isto uma vez porsemana. Deixava aqui o trabalhotodo organizado nos dias antes.Porque eu é que cosia, eu é quevergava, eu é que acertava. Dei-xava tudo preparado para poderir nestas viagens de 24 horas.Aguentava tudo”.Entretanto, começam a surgir nazona de Felgueiras imitações dos botins,mas coladas, o que implicava menostrabalho, menos tempo, um custoinferior. A Trofal deixou de conseguirvender o seu produto com tanta facilidadee teve que encontrar alternativaspara vingar.Joana Fialhojfialho@gazetacaldas.com


Centrais2517 | Setembro | 2010calçado artesanalNa Trofal pode ver-se uma pintura com desenhos de Luís, Manuel e Júlio Couto atrabalharem na oficina deste último. Uma imagem imaginada, dado que os três nunca seencontraram a trabalhar no mesmo local.“Quando o meu pai adoeceu,estávamos a começar a desen-volver a empresa, ainda eratudo muito artesanal, apenascom umas maquinetas. Afinaltínhamos começado do zero esem capital”, aponta Luís Couto.A precisar de diversificar a sua oferta,a Trofal acabou por aderir aoprojecto SIII – Sistema Integrado deIncentivos ao Investimento, quedava bonificações fiscais e nas taxasde juro dos créditos às empresasque quisessem investir e criarpostos de trabalho. “Aderimos aoprojecto e fizemos um investi-mento para comprar máquinase admitir mais trabalhadores,cerca de dez pessoas. Quería-mos organizar a empresa”, masa missão foi dificultada pela doençaprolongada do pai.Olhando para trás, Luís e Mariada Luz vêem quão fatídico para asua família foi o ano de 1983. EmJaneiro, faleceu a irmã Clara, nasequência de um acidente de viação.Em Novembro é o pai que perdea luta contra a doença. A juntaràs perdas, problemas com o bancofizeram com que as bonificaçõesdo SIII nunca chegassem. “Nessaaltura chegámos a pagar 40%de juros ao ano, pagos à cabe-ça, foi muito complicado”. Apenascom 21 anos, e com os irmãosainda na escola, Luís tinha que ser“pau para toda a obra, comprava,vendia, entregava, rece-bia e geria a parte da fábrica”.O produto escolhido para aumentara oferta da Trofal foi o sapatode luva em chevraux e mustang,peles de cabra para sapatos macios.Para iniciar a produção, a Trofalcomprou uma grande quantidadede matéria-prima. Mas a 30 de Outubro,uma semana antes de se começarema fazer os sapatos novos,a fábrica foi assaltada, e além deA fábrica, construída no lugar de Algarão, está hoje bem diferente do pavilhão ondeem 1979 começaram a trabalhar quatro sapateirosDo botim ao calçado técnico vendido em todo o mundovário calçado acabado, desapareceramas peles. Mais um revés numano que Luís e Maria da Luz dizemter sido “mesmo muito compli-cado”.CERTIFICAÇÃO NA DÉCADADE 90Maria da Luz entrou para a empresaem 1988, quando terminou o12º ano do curso Técnico-Profissionalde Contabilidade e Gestão. Aexportação dos produtos da Trofalera ainda muito residual. Para chegarà internacionalização, a Trofalcomeçou a marcar presença naMOCAP – Mostra de Calçado Português.Hoje, cerca de 80% da produçãoda fábrica destina-se a França,Alemanha, Itália, Inglaterra e outrospaíses, sobretudo da Europa.Para a conquista do mercadoeuropeu concorreu a produção deartigos técnicos. A primeira apostafoi o calçado militar. “Estivemosalguns anos muito dedicadosa esta área, embora nunca exclusivamente,e daí fomos sempreevoluindo para artigos téc-nicos”, para as áreas de golfe,motard, equitação e calçado técnicode bombeiro, “que temos vin-do a aperfeiçoar cada vez maise que continuamos a fazer muito,embora noutro calçado téc-nico já se tenha apostado mais,que isto agora com a concorrênciada Ásia é muito compli-cado”, explica Luís Couto.Ao mesmo tempo que apostavamno calçado técnico, os administradoresda Trofal perceberamque tinham que aperfeiçoar a componentede qualidade e começarama dar os passos necessários àcertificação da empresa. “Fomosa primeira empresa certificadado sector do calçado em 1995”,dizem orgulhosos. Mas para conseguirema certificação, foram necessários“cinco anos, muito papel,muitos documentos, e mui-to, muito, dinheiro, para umacoisa que hoje se faz em pou-cos meses”.A década de 90 foi de grandecrescimento na empresa. De talmaneira, que vinham trabalhadoresde fora para assegurar a produçãoquando havia mais encomendas.O recurso ao outsourcing é, deresto, uma política que se mantémna empresa, “uma maneira deconseguirmos controlar oscustos fixos, que também ajudaas empresas às quais recor-remos”. Por isso, a Trofal tem 30trabalhadores nos seus quadros, umnúmero que nunca foi ultrapassado,apesar da fábrica estar equipadapara receber mais de uma centenade operários.A AMEAÇA DA ÁSIA E OPERIGO DOS QUÍMICOSA Trofal mantém a certificação,e no ano passado foi distinguidacomo PME Líder. Na era da globalização,a aposta na qualidade é agorao grande trunfo da empresa.“Para indústrias como anossa, de mão-de-obra inten-siva, é muito difícil combatersalários escravos como os quese praticam na Ásia. Como todaa indústria da região, tambémnós sentimos essa pressão”, dizLuís Couto. Os empresários estãoconvencidos de que a China estáempenhada em ficar com o monopólioda produção do calçado. Provadisso, apontam, é o facto doschineses terem comprado no iníciodo ano “todo o couro que haviadisponível no mercado”.Como se combate esta ameaça?Apostando na qualidade, emsistemas de produção artesanais,como o Goodyear, e em materiaisecológicos e naturais. Uma preocupaçãocada vez mais importante,numa altura em que se começam afazer ouvir alertas sobre os impactosque os couros tingidos com químicostêm na saúde. Actualmente,o químico usado é o Crómio 6, que“encurta muito o processo, mastem um senão - é altamentecancerígeno”, e começam já aaparecer problemas graves de saúdepor causa deste método de tingimento.É que não há nada maisnatural que o suor dos pés e pernasquando se usa calçado fechado, e éo suor que faz com que os químicosentrem na corrente sanguínea.Quando as primeiras preocupaçõescom o uso de químicoscomeçaram a surgir, a Trofal estavaa tratar da sua certificaçãoe começou desde logo a exigirdos seus fornecedores courosisentos de químicos, pelo queteve que começar a importarmuita da matéria, sobretudo daItália. Um cuidado que, lançamo alerta, não está na ordem dodia para muitas marcas de calçado,que continuam a procurarartigos mais baratos na Ásia.O FUTURO ESTÁ NOSPRODUTOS ECOLÓGICOS“Estamos a tentar ser omais ecológicos possível eesse é o nosso trunfo”, diz LuísCouto. E é por aí que os dois irmãosacreditam que se faz o futuroda empresa.É neste contexto que se enquadraa mais recente aposta da Trofal,o calçado Vegan, que respeitaa filosofia de vida do veganismo– que rejeita qualquer produtode origem animal, alimentarou de outra natureza, produtosque tenham sido testados emanimais ou que nos seus ingredientesou processos de manufacturaincluam qualquer formapossível de exploração animal.Trata-se de um nicho de mercadopara o qual a Trofal se começaagora a virar, com uma percentagemde produção aindamuito reduzida e para a qual recorrema microfibras de altaqualidade, principalmente italianas,feitas de cânhamo, aloévera, outras fibras vegetais, “queaté podem ser melhores doque as peles curtidas”. Parajá, a fábrica conta com um clienteem Inglaterra e outro em Espanhapara a linha Vegan. Embreve espera lançar a sua própriamarca para vender online.Ainda na área da ecologia, aTrofal adopta “comportamentosmuito amigos do ambiente,investimos muito na re-ciclagem dos materiais. Istocria-nos só custos, aindanão nos trouxe nenhum proveito,mas pelo menos senti-mos que estamos a fazeralgo que deve ser feito”.Além das inovações, a empresa- que factura anualmente cercade um milhão de euros - mantéma representação da marca Dodgeem Portugal e Espanha e detémos direitos de francesa Elite em Portugal,uma marca de calçado de montanhismoque até já tem um clube defãs no nosso país.Cientes de que as questões económicaslimitam muitas vezes a escolhado calçado por parte das pessoas,Luís Couto e Maria da Luz garantemque um bom calçado é umautêntico investimento, e que ossapatos e botas que ali se produzemduram “uma vida inteira”.Joana Fialhojfialho@gazetacaldas.com<strong>Cronologia</strong>1903 – António Couto começaa fazer sapatos à mão,em Santa CatarinaDécada de 30 – Júlio doCouto (1903-1990), filho de António,vai para a Ribafria trabalharno calçadoDécada de 70 – ManuelMarques do Couto, filho deJúlio do Couto, é um dos accionistasda Fapocal, fábrica queresulta da fusão de várias oficinas1973 – Luís Couto, filho deManuel do Couto (1935-1983),começa a trabalhar na Fapocal1975 – Manuel Marques doCouto sai da Fapocal e regressaà Ribafria, onde começa atrabalhar por conta própria nasinstalações da Rosarte1978 – É criada a Trofal –Fábrica de Calçado Lda., tendocomo sócios Manuel Marquesdo Couto e Maria Celeste.Em 2000 a Trofal passa asociedade anónima com umcapital social de 100 mil euros1979 – A Trofal inaugura afábrica no Algarão, onde a empresase mantém ainda hoje1983 – Morre o fundadorda empresa, Manuel Couto1988 – A filha, Maria daLuz, entra para a empresa. ATrofal começa a exportar.Década de 90 – Fase degrande crescimento na empresa,que se vê frequentementeobrigada a subcontratar mãode-obrapara responder às encomendas.Aposta no calçadotécnico e militar1995 – A Trofal torna-se aprimeira empresa do sector docalçado certificada2010 – A empresa preparao lançamento da sua própriamarca Vegan, para vender naloja online


22Centrais24 | Setembro | 2010, VUMAMA EMPRESAMPRESA, , VÁRIAS VGERAÇÕESDiscoteca Green Hill – mãe e filho gerem uma casa qLuís Romão, fundador da discoteca, na cabine de som numa imagem dos anos 80 Filomena Félix com o filho, Ricardo Romão, e as netas, Lara e CarolinaO SONHO DE LUÍS ROMÃOFilomena Félix nasceu em 1955na Foz do Arelho, onde continua aviver. Os seus pais (que já faleceram)eram os proprietários do restauranteLagoa Bar, em frente ao Inatel,do qual fazia parte um posto decombustível.“Toda a gente conhecia acasa do Zé Félix. De Julho a Se-tembro passavam diariamentemilhares de pessoas pelo res-taurante”, lembrou. Filomena Félixcomeçou a trabalhar no restaurantedos seus pais desde pequena, apesarde ter estudado até ao ensino superior.“Estive no ISLA e só não aca-bei o curso por um ano”, contou.Filomena chegou a pensar sair dePortugal para trabalhar na área doseu curso (Secretariado), mas quandose casou com Luís Romão, em1975, abandonou os estudos e decidiuficar.Luís Romão é natural de Rio Maior,onde nasceu em 1954. O casalresidia na Foz do Arelho e Luís insistiaem concretizar o sonho deabrir uma discoteca. Chegaram apensar avançar com o projecto nagaragem da casa dos pais de FilomenaFélix, mas como esta ficavamesmo no centro da Foz, mudaramde ideias.O edifício onde agora funcionaa Green Hill era à época um pequenoarmazém, que era utilizadopelo pai de Filomena para criaçãode galinhas e de porcos. A parteda frente tinha os frangos e naparte de trás funcionava a pecuária.Foi o próprio Luis Romão, comum pedreiro, quem fez as obras.Enquanto isso, Filomena Félixdedicava-se à parte burocrática.“Já naquela altura era muitocomplicado tratar dos papéise quem me ajudou muito foio João Santos, que agora é osecretário do presidente daCâmara”.O investimento inicial na alturafoi de cerca de dois mil contos (10mil euros). “O O meu irmão estavanos Estados Unidos e trouxe aaparelhagem de som de lá”, adiantouFilomena Félix.A empresária diz que deu voltas àcabeça antes de encontrar o nomecerto para a discoteca. “Como aqui-lo era uma zona verde e eu sousportinguista e como, ainda porcima, ficava numa colina, fuiao dicionário e achei piada aonome – Green Hill”.Naquela altura a discoteca ficava“no meio das fazendas”, conta Mena.Ainda não havia a rotunda (hoje conhecidapor rotunda do Green Hill)UMA INAUGURAÇÃOESTRONDOSAQuando a Green Hill abriu portas,a 30 de Maio de 1980, tinha uma pequenapista de dança, uma cabine desom e um bar. De todo o edifício, obalcão do vestiário é o único elementoque se mantém desde a inauguração.Antes da abertura ao público, nanoite anterior, fizeram uma pré-inauguraçãocom alguns amigos, mas noprimeiro sábado tiveram logo casacheia. “Parecia haver uma necessidadeenorme de um espaçodestes. Foi uma inaugura-dem agora 45 funcionários”, referiu.Entre 1991, quando se divorciou deLuís Romão, até 1997, Filomena Félixesteve afastada da Green Hill. Voltouum ano depois do assalto ao seu exmarido,na sequência do qual Luís Romãoficou incapacitado. O empresáriosofreu graves lesões neurológicas aoser agredido depois de oferecer resistênciaa um assalto, na madrugada de8 de Setembro.Este foi o episódio mais negro dahistória da discoteca e que ainda hojeé difícil de abordar por parte da família.Ricardo Romão tinha nessa alturanem o acesso à praia pelo lado do mare até a estrada Atlântica não estavatoda alcatroada.O estabelecimento abre com adesignação oficial de “bar dancing”e foram muitas as dificuldadespara licenciar a casa. Trintaanos depois, Filomena continuaa queixar-se de ter que enfrentarmuita burocracia de cada vez quequer fazer alterações no edifício.A empresária não percebe porque há tantas casas do género queabrem de qualquer maneira e paraa sua discoteca seja necessárioapresentar tantos projectos decada vez que precisa de fazerobras.ção estrondosa e as pessoas17 anos de idade e ficou a gerir a disco-nem cabiam todas”, lembrou. teca com Paula Coito, que na altura eraApesar do início auspicioso, os primeirosanos foram difíceis. “Sempretempos muito complicados” e sófui muito selectiva à porta, mes-com a ajuda da família e de alguns for-mo quando tinha a casa vazia”,necedores é que conseguiu continuarcasada com Luís Romão. “Foram unsdisse a empresária, que durante muitos o negócio sem o seu pai.anos fez questão de estar à porta, logo a Entretanto, Ricardo Romão começoua assumir mais responsabilidadesseguir ao porteiro.Com 25 anos, Mena continuava a trabalharno restaurante dos pais e manti-DJ da casa, trata também de outrase, para além de ser um dos principaisnha o negocio da discoteca aos fins-desemana.questões da empresa.Na discoteca trabalhava com Luís AOS CINCO ANOS JÁ IA PARA ARomão (que era o DJ), um segurança,CABINE DE SOMdois barmen e poucos mais funcionários.“Éramos meia dúzia e aten-Nascido em 1976, Ricardo Romãodíamos tanta gente quanto aten-tinha três anos quando a discotecafoi inaugurada. <strong>Das</strong> primeiras recordaçõesque guarda é de ter ido brincarpara a cabine de som. “Eu Eu lembro-mede ter partido as agulhastodas dos pratos dos dis-cos de vinil e do meu pai andaratrás de mim”, recordou.Aos 12 anos teve a sua primeiranoite como DJ da pista principal.“Faltou um DJ e o meu pai che-gou ao pé de mim e disse quetinha chegado a minha oportu-nidade”. Nessa noite, que nuncamais esqueceu, chorou numa alturaem que cerca de 10 pessoas saíramao mesmo tempo da pista. “Fiqueimuito nervoso porque tiveTrinta anos de actividade para uma discoteca como a Green Hill, na Foz do Arelho, representammilhares de histórias passadas ao som da música.Avós, pais e filhos já dançaram na mesma pista de dança, fosse ao som de um slow ou dasbatidas mais fortes da música electrónica.A Green Hill nasceu em 1980 na Foz do Arelho, numa aldeia que hoje é vila e tornou-se umadiscoteca de nível nacional. Nestes 30 anos só houve um único fim-de-semana, no ano 2000, emque não funcionou (devido a trabalhos de remodelação).Para além dos muitos encontros e desencontros que aconteceram naquele espaço, a Green Hill étambém a história de uma família.Luís Romão e Filomena Félix eram casados quando inauguraram a discoteca. Ricardo Romão, oúnico filho do casal, tinha três anos.Actualmente, e após várias vicissitudes e dramas familiares, mãe e filho gerem a discoteca emconjunto, tendo criado em 2005 a Félix & Romão Lda, com um capital social de cinco mil euros.medo que a pista esvaziasse”,lembrou. Como era a sua primeiravez, temeu que as pessoas não estivessema gostar da música e quetodos se fossem embora.Para o DJ, a profissão que escolheupode não ser apenas pelo factode ser filho dos proprietários de umadiscoteca. “A paixão que tenhodentro de mim pela música se-ria igual”, salientou. “Desde mui-to novo que quis ser DJ”, garante.Os pais queriam que fosse para auniversidade, mas acabou por sairda escola quando acabou o 9º ano.Como DJ Romão, ou no projectoPhonic Lounge (com Ricardo Tempero),tem alcançado sucesso internacional.Suíça, Holanda, Espanha e EstadosUnidos têm sido alguns dos paísespor onde tem actuado. Só nãoaceita convites para actuar individualmentenas discotecas da região,por causa da associação do seu nomeà Green Hill.Ao contrário do que acontece agora,quando começou a ser DJ a profissãonão tinha nenhum “glamour”e os amigos perguntavam-lhe se nãopreferia estar do outro lado da cabinede som. “Agora é que é modaser DJ, mas naqueles temposas pessoas não ligavam nenhu-ma”.Quando começou, os discos quepunha a tocar eram de rock, com sucessosgarantidos. Nessa altura asduas pistas tinham poucas diferençasna música que se tocava. “OsOsdiscos eram praticamente osmesmos”, recorda.Um dia, no início da década de 90,Ricardo Romão convenceu o pai aapostar no som alternativo na pistadois, com bandas que não se ouviamem nenhuma discoteca do país, comoera o caso, por exemplo, dos Pixies.O sucesso foi imediato e estaaposta marcou uma geração. Sãomuitos os que ainda se recordamcom nostalgia desses tempos, de talforma que recentemente começarama fazer festas de evocação dessasnoites.Os tempos eram muito diferentestambém em termos musicais, e nofinal dos anos 90 começaram a fazer-seexperiências com a músicaelectrónica. A partir das 4h30 damanhã era o som forte das batidasdo techno que invadiam a pista dois.A partir de 2001 acabou-se o somalternativo e a música de dança reinana segunda pista, sendo que a primeiracontinua dedicada à músicamais comercial.Inúmeras gerações já passarampelo Green Hill e hoje já há netos dosprimeiros frequentadores da casaque não falham um fim-de-semanana discoteca. A marca é conhecidaem todo o país como uma das mais


Centrais2324 | Setembro | 2010ue é referência para várias gerações de clientesAspecto da discoteca nos anos 80 e na actualidade. A Green Hill continua a ser o mais importante espaço de diversão nocturna na região.antigas do género e já recebeu programasde rádio e de televisão, bemcomo festas de todos os tipos. Hámais de dez anos obteve um númerorecorde de visitantes – 4500 clientesnuma festa da revista Caras.DISCOTECA NUNCA PAROU DECRESCERAo longo destes 30 anos foram tantasas remodelações e ampliaçõesque os gerentes já nem sabem quantasforam.A primeira terá sido em 1985, alturaem que mudaram a cabine desom do lugar e criaram um novo espaço.Foi nesse local que chegarama fazer uma noite de gala com ShegundoGalarza.A segunda pista de dança foi construídano final da década de 80, quandocomeçaram a servir hambúrguerese outros petiscos. “O O meu fãnúmero um era o engenheiroPaiva e Sousa (ex-presidente daCâmara das <strong>Caldas</strong>) que ia sem-pre lá com os amigos comer assandes que eu fazia”, recordaMena.Outras das principais ampliaçõesfoi o primeiro andar, com vistapara a pista principal.Em 2001 Filomena Félix avançoucom obras de remodelação e abriu adiscoteca com um “staff” completamentenovo, que incluía alguns concorrentesde “reality shows” (comoo “Big Brother), músicos (Melão eGonzo) e actores (Diogo Morgado).Actualmente nenhum “famoso” fazparte do pessoal da casa. “Algunsainda aparecem às vezes, mascomo amigos”, conta Mena.A empresária conta que desde háquatro anos começou a notar-se quehá menos pessoas a sair à noite. Oconsumo de bebidas também desceumuito, principalmente desde 2007.“O ano de 2009 foi uma coisaterrível, mas em 2010 conse-guimos recuperar um pouco.Tenho feito tudo por tudo”, afirmoua empresária.Embora saiba que os outros estabelecimentoscomerciais desteramo não estão melhor, salienta quea sua casa tem maiores custos porcausa da sua dimensão.Isto apesar de não aumentaremos preços há quase 10 anos. Uma imperialcontinua a custar três euros,mas a bebida que se bebe mais actualmenteé o vodka.O ano passado remodelaram completamenteo antigo pub, para criarum clube para pessoas mais velhase o investimento revelou-se ruinoso.“Ainda hoje estou à espera queas pessoas mais velhas apare-çam”, ironizou. Acabou por começara utilizar o espaço para festas privadase jantares para grupos.Em breve o clube deverá voltar asofrer transformações. Para RicardoRomão, é importante que uma discotecacom uma dimensão tão grandecrie espaços diferentes, para diferentesestilos.TRABALHAR EM FAMÍLIACada vez mais é o filho quem tratadas relações com os fornecedores,algo que a mãe nunca gostoumuito de ter a seu cargo. “Ele temmuito mais à vontade do queeu para negociar”, afirma FilomenaFélix. O seu filho passou tambéma ser responsável por tudo o que dizrespeito à publicidade e ao pessoalda casa.Filomena Félix gosta de trabalharcom o seu filho, embora às vezes surjamalguns conflitos que não aconteceriamse fosse com outra pessoa.“Temos muita à vontade umcom o outro e por vezes sur-gem aquelas discussões entremãe e filho”, revelou.O facto de o seu filho ter passadoa adolescência com os pais a trabalharnuma discoteca acabou por serpositivo. “Aquilo que os pais sofremcom os filhos durante ado-lescência, cia, por não saberem poronde eles andam à noite, nãoaconteceu comigo. Ele saía da-qui e ia para casa da minha mãeao fim-de-semana”, salientou.O único medo que tinha era relacionadocom o consumo de qualquertipo de droga e por isso “sempre fiztudo o que pude para não ha-ver disso aqui na Green Hill”.Para Ricardo Romão também foibom porque assim conquistou a confiançados pais e quando precisavaia para outros locais divertir-se.“Nunca senti os holofotes emcima. Sempre fiz o meu traba-lho à vontade”, disse.Ricardo Romão também já é pai deduas meninas - Lara (cinco anos) eCarolina (12 anos) - que só visitam adiscoteca durante o dia. “Um diaem que estejam à minha frentena pista e eu a passar músicavou achar um piadão”, comentou.Embora não queira revelar o volumede negócios da Félix & RomãoLda., Ricardo Romão referiu quenuma noite podem pagar 15 mil eurospara um DJ famoso actuar semque tenham prejuízo por isso.A família também esteve por detrásde outros negócios. FilomenaFélix explorou a loja de música “MagicSom”, no centro comercial da Ruadas Montras, durante 20 anos. RicardoRomão também investiu numa lojade música e roupa entre 1996 e 2000.O seu pai, Luís Romão, explorou orestaurante “Príncipe Perfeito” e osbares “Adega do Borlão” e “Frenético”,na década de 90.Pedro Antunespantunes@gazetacaldas.comRicardo Romão tem uma carreira própria como DJ Romão e no duo Phonic LoungeCasa de encontros e desencontrosFundada em 1980 por Luís Romão e Filomena Félix, a discoteca atravessoutempos conturbados, mas sobreviveu às maiores contrariedades. Actualmente,Filomena Félix (mais conhecida como Mena) e o seu filho, Ricardo Romão,comandam um “barco” que dá trabalho a 45 pessoas e que movimenta milharesde clientes todos os fins-de-semana.As épocas mais fortes na Green Hill foram sempre os verões e o Carnaval.No último fim-de-semana de Maio fazem a festa de aniversário, que é sempreum sucesso.Desde há cinco anos deixaram de abrir todos os dias da semana em Agosto,como acontecia antes. Desde 2008 que só abrem à quinta, sexta e sábado,durante o Verão. No resto do ano a discoteca funciona às sextas-feiras e sábados.“Somos uma casa única, onde mesmo as pessoas que vêm defora se sentem bem desde a primeira vez”, considera Filomena Félix,que exige que todo o seu pessoal seja sempre simpático para os clientes.“Às Às vezes as pessoas não são muito justas e dizem muitas coi-sas da Green Hill, mas eu sempre fiz tudo para que os clientesfossem bem tratados”, comentou. Filomena Félix assume que muitas vezesé quase mãe de muitos jovens que frequentam a discoteca. “Há Há muitospais que quando os filhos começam a vir à Green Hill dizem-lhespara chamarem a Mena sempre que precisarem”, afirma orgulhosa.Embora exista o “Foz Bus by Night” (autocarro que faz a ligação entre as<strong>Caldas</strong> da Rainha e a discoteca aos sábados), ainda há muitos pais que optampor ir levar e buscar os seus filhos. “Se Se calhar houve uma altura em queos pais davam demasiada liberdade aos filhos e agora voltaram apreocupar-se mais”, considera.Filomena Félix tem sempre um carinho especial por alguns jovens das <strong>Caldas</strong>de quem conhece as mães.Apesar disso, a relação entre os caldenses e a discoteca foi sempre “deamor e ódio” porque há quem prefira sair para fora em vez de sair à noitemais perto de casa. Há noites em que a maior parte dos clientes da Green Hillsão pessoas de fora.Mas são muitos os caldenses (já pais de família) que ao regressarem àGreen Hill, depois de um jantar ou de uma festa, não conseguem evitar a nostalgia.“Muitas vezes vêm ter comigo e dizem ter muitas saudadesdas noites que aqui passaram”, referiu Mena. Há casais que começarama namorar na Green Hill ou que deram ali seu primeiro beijo. Mas também jáhouve cenas de ciúme, que muitas vezes acabam mal.CRONOLOGIA1980 – Luís Romão e FilomenaFélix abrem a discoteca GreenHill. A firma chama-se José Luísda Silva Romão e era um estabelecimentoem nome individual.1991 – Filomena Félix deixa agestão da Green Hill1996 – Luís Romão é vítima deum assalto e sofre danos neurológicosincapacitantes1996 – O filho, Ricardo Romão,P.A.então com 17 anos, assume responsabilidadesna discoteca1997 - Filomena Félix regressa àgestão do Green Hill que passa aser detido pela sociedade unipessoalMaria Filomena Filipe Félix2000 – Remodelação total dopessoal da discoteca2005 – Criada a sociedade Félix& Romão Lda. (apelidos da mãe edo filho) com um capital social de5000 euros


24Centrais1| Outubro | 2010, VUMAMA EMPRESAMPRESA, , VÁRIAS VGERAÇÕESProximidade do comércio tradicional e assistência técnicVasco Oliveira e Maria Rosa Oliveira foram os proprietários da empresa durante 35 anosQuinze de Maio de 1971. A cidadefestejava o seu dia com concertose cerimónias públicas. Quempassava pela Rua Engenheiro DuartePacheco encontrava no número23 uma montra engalanadacom candeeiros, pequenos electrodomésticos,frigoríficos e fogões,pronta para abrir as portaspela primeira vez no dia seguinte.Tratava-se de uma loja de electrodomésticose reparações eléctricascriada em sociedade porVasco Oliveira e Alfredo Cera. Volvidosseis meses, o segundo sóciodesiste e Vasco Oliveira adquire asua metade, que entrega à esposa,formando a empresa VascoOliveira Lda.Mas a ligação de Vasco Oliveiracom o mundo da electricidade é“genética”. Nascido em Silves, vempara as <strong>Caldas</strong> da Rainha com 10anos, junto com a irmã (um anomais velha), a mãe e o pai, queveio exercer o cargo de chefe doselectricistas dos serviços municipalizados.Prosseguiu os estudos na EscolaTécnica Industrial e Comercialdas <strong>Caldas</strong> da Rainha (hoje SecundáriaBordalo Pinheiro) onde fez ocurso comercial e, mais tarde, ocurso nocturno de electricidade.Nessa altura já passava os diasa trabalhar em electricidade na lojada mãe, Maria Paula Oliveira, noBairro da Ponte. Era uma casa deelectrodomésticos e instalações ereparações eléctricas, mas VascoOliveira lembra que electrodomésticoshaviam muito poucos. “Pou-co mais era que um frigorífifi-co”, lembra do tempo dos seus 14anos, quando aprendeu o ofíciocom o pai e os funcionários da loja.Depois de completar o curso,Vasco Oliveira concorreu à Escolada Marinha Mercante. Tinha 18anos e vontade de conhecer omundo, o que veio a acontecerentre 1958 e 1963, como oficial electricistada Marinha Mercante.No entanto, não esteve todoeste tempo embarcado, até porqueo jovem era um jogador defutebol promissor (viria a ser campeãonacional da terceira divisão)e manteve sempre a sua paixãopelo desporto rei. O próprio <strong>Caldas</strong>Sport Clube arranjou-lhe umemprego na Rol para o afastar domar e o manter perto de casa edos treinos.Na fábrica de Tornada trabalhavacomo rectificador, tendo por lápermanecido 18 meses. Entretantotinha casado e o primo José Fernando,que era desenhador, havia-lheoferecido o projecto de umacasa como prenda. Para construira moradia, Vasco Oliveira precisavade ganhar mais dinheiro e voltoua embarcar, estando na MarinhaMercante até 1969, altura emque regressou às <strong>Caldas</strong> para trabalharcomo electricista na loja deelectrodomésticos e instalaçõeseléctricas Inácio Abegão.Dois anos depois, a 15 de Maiode 1971, estabelece-se por contaprópria, formando uma sociedadecom o amigo Alfredo Cera. O trespasseda então loja de electrodomésticosJosé Verdasca e Verdianoà sociedade Vasco e Cera Ldacustou na altura 150 contos (750euros) divididos pelos dois sóciose, passados seis meses, quando osócio desistiu do negócio, VascoOliveira pediu emprestado ao bancoa metade necessária para ficarcom toda a empresa, que depoisdividiu com a mulher, Maria RosaOliveira.O empresário recorda que o primeiroelectrodoméstico que vendeufoi uma varinha de triturar asopa, depois começou a venderfrigoríficos, fogões e muitos candeeiros.“IA FAZER A INSTALAÇÃOELÉCTRICA E APROVEITAVAPARA OFERECER OFRIGORÍFICO”Vasco Oliveira passou a andarpelas freguesias e aldeias a fazerinstalações eléctricas e “aproveitavapara oferecer o frigorífi-co, a máquina de lavar, oaquecimento, as varinhas e oferro eléctrico, e as pessoasreagiam muito bem”, lembra.Havia lugares que não tinham aindaelectricidade e quando a “luz”lá chegava, era uma festa e o responsávelda instalação era vistocomo um “herói”. Vasco Oliveiraaproveitava essa alegria e mostravaas vantagens que se podiamter através da energia. “Normal-mente o ferro eléctrico ficavalogo, assim como o fogão agás”, conta, adiantando que nessaaltura trabalhava muito com afirma Manuel J Monteiro, de Lisboa,que lhe fornecia toda a mercadoria.“Lembro-me de uma vez terficado com uma contraparti-Pai e filha. Elisa Oliveira detém hoje 90% da quota da firma e acumula a sua gestãocom a advocacia.da de 40 frigoríficos do Supera pensar numa alternativa para aSete e, em duas semanas, ven-sua empresa. Necessitava de algodi-os na totalidade”, diz. Nesse de “consumo diário” para fazertempo, conta, não tinha sábados face à quebra do negócio imobiliárioe das vendas dos electrodo-nem domingos pois passava-os avender e entregar frigoríficos. mésticos.Na cidade, como tinha conhecimentoscom os grandes emprei-nas <strong>Caldas</strong> da Rainha, há cerca dePassou a ser agente do gás Essoteiros, começou a trabalhar com 15 anos.eles, fazendo a parte eléctrica de Desde então foram evoluindomuitos dos edifícios caldenses, no gás e actualmente têm uma boaentre eles o do cinema Estúdio 1, representação de gás de garrafa.recorda o empresário que chegou“Quando fiquei com o gása ter 15 funcionários a trabalharforam-me entregues 16 bilhascom ele.de 13 quilos, seis de 11 e trêsPerdem-se as contas aos quiló-ou quatro de 45 quilos”. Passadoum mês já tinha duplicado ametros de fio eléctrico que utilizounas instalações feitas desde a quantidade e depois o volume au-Começou a fazer reparações eléctricas ainda menino na loja de electrodomésticos da mãe, no Bairro daPonte, e seguiu a sua vocação na Escola Rafael Bordalo Pinheiro. Embarcado como oficial de electricidade,correu mundo na Marinha Mercante até que se estabeleceu, por conta própria, em 1971 no centro da cidade.A história de Vasco Oliveira está ligada à electricidade, aos electrodomésticos e ao gás, até que passou, háquatro anos, o testemunho à filha, Elisa Oliveira, também advogada, que acumula a gestão da empresafamiliar com a prática da advogacia.Pelo caminho ficam décadas de histórias de quem calcorreou praticamente todo o concelho a “levar luz” àspessoas e depois gás.A Vasco Oliveira Lda celebra em 2011 quatro décadas. Já este mês terá início uma remodelação da loja, com oobjectivo de mostrar mais a parte eléctrica e não só os electrodomésticos.Foz do Arelho ao Landal. “Os camentoumuito mais. Depois, comminhos eram difíceis e eu tinhaa difusão do gás natural começaumacarrinha Austin, onde lerama perder o mercado dos prédi-vava um ou dois empregadosos, começando a expansão pelase o material que precisávamosfreguesias, onde este tipo de ins-para trabalhar”, conta, lembrandoque entravam na loja às 8h00,“É um nicho de mercado, te-depois seguiam para o local demos representantes nas vári-destino e voltavam às 18h00 porasfreguesias, que abastecequeàs 7h30 Vasco Oliveira tinhamos com os nossos veículos”,treino de futebol.disse, falando na primeira pessoa“A vida naquele tempo erado plural, apesar de, tecnicamen-diferente, não havia férias”,te, já não ser proprietário da casa.talação ainda não chegou.conta o empresário, que se repartiaentre o negócio, o futebol e a o gás tem sido lucrativo, mas é umDe acordo com Vasco Oliveira,columbofilia (uma outra das suas tipo de negócio em que é “preci-paixões que ainda hoje mantém).so muito cuidado porque asO aparecimento das grandesmargens de lucro são peque-superfícies, na década de 80 donas e é preciso ser muito bemséculo passado, com preços muitogerido para dar rentabilidade”.mais baixos, levou Vasco Oliveira O empresário vê grandes diferençasno comércio nos últimos 40anos. “<strong>Caldas</strong> sempre foi umacidade comercial, mas as gran-des superfícies vieram abalarum pouco o pequeno comér-cio tradicional”, salientou, acrescentandoque com o crescimentodas cidades em redor também perdeualguma população aos finsde-semana,que aqui vinham àscompras às <strong>Caldas</strong>.“Mas ainda se nota que onosso comércio de fim-de-se-mana é bom”, expressou.O electrodoméstico não é umproduto que se venda diariamente,mas continua a vender-se, sobretudoo pequeno electrodoméstico,explica, adiantando que agrande valia destas casas são aproximidade com o cliente e a garantiapós venda. “A assistênciaé de grande importância parao ramo dos electrodomésticose foi isso que sempre tivemos.Damos assistência a tudo o quese vende”, garante Vasco Oliveira.Além do futebol, da columbofiliae da vida empresarial, este caldensepor adopção resolve tambémmeter-se na política. Em 1985concorre pelo PSD à Junta de Freguesiade Nossa Senhora do Pópuloe é eleito. Nunca mais de lásaiu.Nos primeiros tempos diz queera fácil conciliar as duas actividades- autarca e comerciante – porquea burocracia da Junta não eramuita.Mas em 1996 deixou o estabelecimentopara estar a tempo inteirona Junta de Freguesia. Ficou aesposa a geri-lo e há quatro anosdeu o estabelecimento à filhamais velha, Elisa Oliveira (45 anos)para o gerir. O filho, Vasco Oliveira,também é electricista e resideem Inglaterra.Fátima Ferreirafferreira@gazetacaldas.com


Centrais251 | Outubro | 2010a personalizada caracterizam a Vasco Oliveira Lda.Na década de noventa o pagamento da luz à EDP era feito na loja de Vasco Oliveira, oque explica estas filas de espera.Remodelação para destacar maisa componente eléctricaA Vasco Oliveira Lda. mantéma mesma firma, mas a responsávelé agora a filha do fundador,Elisa Oliveira, que detém90% das quotas, e um familiar.Elisa acumula agora as funçõesde mãe de família, advogadae empresária.“Sempre me conheci aqui.Saía da escola primária e vinhapara a loja onde era o lo-cal de encontro da família”,lembra, acrescentando queacompanhou de perto as quasequatro décadas da firma.Nos seus tempos livres semprecolaborou com a empresae apreciava particularmente daparte do comércio. “Gostavamuito do atendimento directoao público, do contacto com aspessoas”, recorda Elisa Oliveira.“E tinha jeito”, acrescenta opai, que diz não ter sido talhadopara o negócio, pelo que afilha “puxou à mãe”, conta.A agora empresária já tinhauma experiência profunda doramo porque quando terminouo 12º ano entendeu que queriatrabalhar e foi para o escritórioda empresa. Passado algumtempo surgiu a UAL nas <strong>Caldas</strong>e a jovem decidiu prosseguiros seus estudos, licenciando-seem Direito.A empresa continua a vendermaterial eléctrico, mas jánão faz reparações. “Vende-mos os produtos de ilumina-ção, electrodomésticos e gás,sendo que o maior volume denegócios da sociedade é a dis-tribuição de gás”, conta ElisaOliveira.Os clientes actuais continuama ser os da cidade. Vendemo electrodoméstico ao clientefiel, muitas vezes até pelotelefone. “Ele telefona-nos epergunta se temos determina-do tipo de electrodoméstico edepois combinamos e hora evamos entregar”, conta, acrescentandose trata de um tipode comércio baseado na confiança.No resto do concelho têm essencialmenteos clientes do comérciodo gás, entre revendedorese restaurantes.Os empresários pretendemfazer uma remodelação da loja,que mantém em grande parteo aspecto inicial. “Vamos mantera estrutura de loja, recuperandoo que existe, mas tentarmostrar mais a parte eléctrica– da iluminação e mate-rial eléctrico”, explica ElisaOliveira, que pretende mantertambém a linha branca doselectrodomésticos, mas nãotão expostos.“Queremos apostar mais naárea que poderá rodar mais.Hoje em dia as pessoas mu-dam, com facilidade, a parteda instalação eléctrica na pró-pria casa, e materiais como osinterruptores e tomadas já fazemparte da própria decora-ção”, disse, acrescentando quevão também apostar na iluminação.O projecto está feito e oupgrade da loja deverá ter iníciodurante este mês.CRONOLOGIA1937 – Vasco Oliveira nasceem Silves1947- Vem para as <strong>Caldas</strong>com a família porque o pai vemtrabalhar nos serviços municipalizados1955 - Ingressa na Escolada Marinha Mercante e tornouseoficial electricista1969 – Começa a trabalharcomo electricista na loja de“Estamos na expectativapara ver como os clientes nosvão abordar e aceitar a mudança.Na prática vamos voltarao início, ao retomar a par-te da iluminação e do materialeléctrico”, conta, expectantea empresária, que aceitou agestão da empresa com o objectivode dar continuidade aonegócio da família.“É uma empresa familiar,pequenina, que tem que ser ge-rida com muita cautela, quaseà pinça”, diz Elisa Oliveira,destacando a importância decumprir com os fornecedores,mantendo a “imagem de cre-dibilidade e confiança que osmeus pais sempre deram àcasa”.Apesar da solidez desta sociedadepor quotas, a empresáriareconhece que o comérciotradicional em Portugalestá a passar por grandes dificuldades.“A concorrência émuita e, por vezes, desleal”,diz, acrescentando que o pequenonegócio sente tudo issona pele porque as despesas sãoas mesmas e as receitas é quevão sendo menores.A empresa Vasco OliveiraLda. conta agora com quatrofuncionários, um deles aindado início. A outros, Vasco Oliveira“deu-lhes a mão”, ensinando-lheo ofício e actualmentesão electricistas credenciados.Fátima Ferreirafferreira@gazetacaldas.comelectrodomésticos e instalaçõeseléctricas Inácio Abegão.1971 – Vasco Oliveira e AlfredoCera abrem uma loja deelectrodomésticos1972- Alteração da sociedadepara Vasco Oliveira, Lda.que passa a ter como sócios,com quotas iguais, o fundadore a esposa, Maria Rosa Oliveira2006 - Elisa Oliveira tornasea sócia gerente da Vasco OliveiraLda.O interior do estabelecimento não mudou muito desde a sua inauguração. Por isso,Elisa Oliveira prevê remodelá-lo muito em breveO casal Rodrigues trabalha nafirma há mais de 30 anosO casal António e Conceição Rodrigues trabalha na mesma firma. Ele é ofuncionário mais antigo da casaAntónio Rodrigues, de 56anos, começou a trabalharcomo aprendiz na Vasco OliveiraLda em 1971, três mesesdepois desta firma abrir. Na alturatinha 17 anos e há trêsque trabalhava na Fábrica deFaianças Belo, situada na Ruada Fé. Simultaneamente andavaa tirar o curso de montadorelectricista na Escola Comerciale Industrial das <strong>Caldas</strong> ànoite.“Gostava muito da parteeléctrica, não sei se era pormorar no Bairro da Pontejunto à Central Eléctrica eser influenciado pelos elec-tricistas que andavam porali de um lado para o outrode escadas às costas”, disseo montador electricista que viverealizado com a sua profissão.Dos primeiros tempos lembrada azáfama do trabalho,pois eram poucos electricistas,e das distâncias que percorriamna cidade, a pé e com omaterial às costas.“Nós fizemos muita insta-lação de raiz em prédios.Nas <strong>Caldas</strong> praticamentetodos os prédios grandesforam feitos por nós”, recordao funcionário, especificando queo primeiro foi um edifício de 10andares junto ao Largo do Vaccum.Os trabalhadores juntavam-sede manhã na loja e depois partiacada um para a sua obra, carregandoos rolos de fita e o restodo equipamento. Já quando iamfazer serviço para as aldeias doconcelho, Vasco Oliveira transportava-osna carrinha.“Foram tempos difíceis,mas foi bom. Se eu mudasseagora não sabia fazer outracoisa”, diz António Rodrigues,que actualmente também ajudao colega na distribuição do gás.“Há serviços que se justificair duas pessoas e quandoestou mais livre vou apoiar omeu colega pois há pessoasque pedem duas botijas paraum terceiro andar e, sendodois, reparte-se o trabalho”,explica o funcionário que ali trabalhahá 39 anos.A Vasco Oliveira Lda além deser uma empresa familiar nagerência, é-o também ao níveldos funcionários. A esposa deAntónio, Conceição Rodrigues,de 53 anos, também ali trabalha,a atender ao balcão na loja.Nestes últimos 30 anos muitastêm sido as mudanças nacasa e Conceição Rodrigues conheceu-asbem. “Vendíamosmuito material eléctrico, fio,tubos, candeeiros, e a linhabranca, enquanto que agorasão mais pequenos elec-trodomésticos”, disse. A funcionárialembra mesmo um Natalem que “desapareceram”todos os frigoríficos e arcascongeladoras da loja.Actualmente vendem tambémmuito para as aldeias,nomeadamente para os “maisvelhotes, que não gostamde ir ao centro comercial”.Estes preferem ir à loja desempre, onde conhecem osproprietários e sabem que sãobem aconselhados. “Aindahoje vendi um esquentadora um senhor que chegou eperguntou pelo senhorVasco”, exemplifica ConceiçãoRodrigues, que gosta muitodo trabalho que faz, especialmentedo contacto com aspessoas.F.F.


228| Outubro | 2010Centrais, VUMAMA EMPRESAMPRESA, , VÁRIAS VGERAÇÕESFamília Sousa - do vinho a granel às garrafeiras BagO vinho une três gerações da famíliaSousa. José de Sousa Júnior(1915-1973), natural de SancheiraGrande (Óbidos), foi motorista e conduziagrandes camionetas, carregadasde vinho de um familiar que ovendia para o Norte, tendo feito muitasviagens sobretudo à zona do grandePorto.“Lembro-me que ele saía da-qui à meia-noite e chegava lá àssete ou oito da manhã”, conta ofilho Alfredo Sousa, de 68 anos, acrescentadoque só voltava a ver o pai nodia seguinte, quando ele regressava,por volta das cinco da tarde.Ao transporte do vinho José deSousa Júnior conseguiu, nos anos 40,juntar o seu próprio negócio tendoaberto na sua terra natal e com aajuda da esposa, Maria Salomé Sabino(hoje com 89 anos) uma mercearia,que incluía também uma barbeariae uma taberna.“Vendíamos ali de tudo, até oscomprimidos”, recorda AlfredoSousa, acrescentando que enquantoo pai andava no transporte do vinho,era a mãe que tomava conta donegócio.Estabelecidos na Sancheira Grande,e tendo em conta a sua experiênciacom o vinho, José de Sousa Júniore Maria Salomé Sabino decidem tornar-setambém armazenistas e nosanos 60 compram nas <strong>Caldas</strong> umacasa com quintal na Rua Sebastiãode Lima. Mandam o edifício abaixo econstroem de raiz o armazém de vinhoe dois apartamentos para a famíliano primeiro e segundo andar.Em simultâneo o casal comprauma mercearia e taberna na esquinada Rua do Sacramento com a RuaSebastião de Lima, muito próximodo futuro armazém.“Naquele tempo vendia-sebem o vinho e não havia tantaconcorrência como agora”, dis-O fundador da empresa, José de Sousa Júnior, abriu oseu próprio negócio nos anos 40 quando ainda conduziacamionetas com vinhose Alfredo Sousa. Na taberna, o tintoe o branco comercializava-se ao copoe ao garrafão. Os próprios clientesvinham aviar-se trazendo os garrafõesque enchiam a partir das cartolas(barris que levavam 200 litros)para os levar para casa. “Não haviavenda do vinho a granel. Decide, entretantovender a mercearia-taberna-barbeariana Sancheira Grande,onde começara a sua vida de comerciante.Finalizada a tropa em 1967, Alfredode Sousa vem ajudar o pai noempresário, acrescentando que às nove jáestava de volta às <strong>Caldas</strong> para descarregaro vinho nos depósitos do seu armazém.José de Sousa Júnior toma ainda a decisãode começar a engarrafar o vinho queadquiria em Alcoentre, Cercal, Manique doIntendente, Mata de Porto Mouro e Relvas.dias de descanso, trabalhava-se de segunda a segunda”, conta.O armazém do vinho fica prontoem 1967 e possui uma capacidade dearmazenamento de 150 mil litros. Joséde Sousa Júnior dedicava-se agora ànegocio até porque, durante o serviçomilitar, tirou a carta de pesados.Era pois vê-lo sair das <strong>Caldas</strong>, às seise meia da manhã, ao volante da camionetaBedford, de sete toneladas.“Íamos directamente aos produ-tores acartar o vinho”, lembra o“Engarrafávamos tudo à mão, sob amarca Jotesse [JS de José de Sousa].” AlfredoSousa conta que vendia muito vinhopara a zona da Anadia e, em troca, começaramtambém a adquirir bebidas já engarrafadas,num golpe de vista do patriarcaque abria, no fundo, caminho para aJosé Manuel de Sousa, neto do fundador, com os pais, Alfredo de Sousa e MariaHelena da Costa Sousaconstituição futura de umagarrafeira.JOTESSE FOI A MARCA DACASAEntre 1967 e 1973 pai e filhoA família Sousa possui duas garrafeiras nas <strong>Caldas</strong> da Rainha – Bago D’Ouro e Vinhos & Néctares. Sãoos únicos com casa aberta no centro da cidade a dedicarem-se à venda de bebidas alcoólicas. Quemvisita a Bago d’Ouro, na Rua Sebastião de Lima, não adivinha que aquele espaço já foi um local dearmazenamento e de engarrafamento de vinho onde trabalharam já três gerações da família.Os Sousa agora dedicam-se apenas à venda de garrafas e é através da grande diversidade de “néctares”,do atendimento personalizado e da entrega ao domicílio, nas <strong>Caldas</strong> e arredores, que fazemfrente à concorrência das grandes superfícies.Alfredo Sousa e Maria Helena Costa no dia do seu casamento, em 7/02/1965, à porta do armazém onde realizarama boda e numa foto actual, no mesmo sítio, hoje garrafeira Bago d’Ourovendiam garrafões de cincolitros com a marca Jotesse enos final dos anos 70 tambémpassaram a engarrafar aguardente- a Cantomar (branca)e a Contente (amarela).“Comprávamos no pro-dutor e engarrafava-se cá,tal como fazíamos com ovinho branco e tinto”, conta.Diz que a zona das <strong>Caldas</strong>era boa produtora de brancos,mas os tintos tinham quevir do Manique do Intendenteou de Alcoentre.“A qualidade sempre foifundamental, é a verda-deira alma do negócio”,contou o empresário, que hoje,aos 68 anos, dá uma ajuda aofilho José de Sousa, que estáà frente desta empresa familiar.Em 1973 o patriarca, Joséde Sousa Júnior, morre aos 58anos em consequência deuma trombose. Alfredo Sousae a mãe prosseguem o negócio,ficando agora a firmadesignada José de Sousa JúniorHerdeiros.Estava-se nos anos 80 e aconcorrência era cada vezmaior pois havia empresascom o processo de engarrafamentotodo automatizado, contrasas quais a firma caldense nãoconseguia lutar.Alfredo Sousa deixa então devender a granel e de engarrafar epassa a apostar apenas na comercializaçãode vinhos engarrafados.Em 1979 constitui-se uma novafirma, a Costa & Sousa, Lda. com aesposa e mãe, Maria Helena CostaSousa e Maria Salomé Sabino, respectivamente.A mulher de AlfredoSousa há muito que trabalhava como marido no negócio.Em 1983 abrem a garrafeira Bagod’Ouro, aproveitando o facto do armazémter uma boa frente para aRua Sebastião de Lima.“Esta é uma vida dedicada aovinho e tento estar por dentrodos vários assuntos relacionadoscom o tema, seja a utiliza-ção das novas tecnologias, sejaas novas castas ou quais sãoos melhores anos”, disse este empresárioque agora dá uma ajudaao filho na empresa.Alfredo Sousa acha que o sectorhoje “está mais parado pois asbebidas não são artigos de pri-meira necessidade e por isso aspessoas retraem-se”. Segundoeste responsável, as vendas deverãoter decrescido nos últimos anosna ordem dos 10%.Na sua garrafeira Bago d’Ouroaposta numa grande variedade debebidas pois se não fosse essa diversidade“não conseguiríamos so-breviver”, acrescentou. Tentamtambém ter os melhores preços paraos seus clientes pois como compramtudo o que podem na origem (emherdades alentejanas, por exemplo)conseguem bons preços para o clientefinal.Qual é o segredo do negócio? “Étrabalhar com seriedade e nãoandar com trafulhices”, rematouAlfredo Sousa.Natacha Narcisonnarciso@gazetacaldas.com


Centrais238 | Outubro | 2010o D’Ouro e Vinhos & NéctaresAtendimento personalizado e entregasao domicílio distinguem a casaJosé Manuel de Sousa tem 44 anose dirige o negócio iniciado pelo avô.Guarda na memória as idas com opai a localidades como Tagarro,Cercal e Manique do Intendentepara fazer negócio com os produtoresdo vinho. Era aos domingos quefazia estas viagens, quando tinha10 anos e lembra-se quando as adegasnão tinham bombas eléctricase era preciso usar uma bomba manualpara fazer a trasfega do vinhopara a camioneta. Feito o trabalho,“havia sempre um lanchinho depão com um bom chouriço quenos davam as pessoas das al-deias”, disse o empresário.Tal como pai, os estudos tambémnão eram o seu forte e, apesarde ter tentado concluir o ensino secundárioà noite, acabou por desistire por se agarrar ao negócio dafamília. Entre os 16 e os 18 anoscomeçou como ajudante na distribuiçãona empresa que hoje dirige.Ainda entre 1993 e 1997 teve, coma sua esposa, Alexandra Sousa, umbar no Painho (Cadaval), que fez naadega da casa que lhe deixou a avó.“Só Só trabalhávamos ao fim desemana”, contou sobre o Pipas Bar.José e Alexandra gostaram muitodesta experiência e dizem que nãoestá fora de questão regressaremum dia a um projecto deste tipo.Na garrafeira Bago d’Ouro vendemaguardentes velhas, whiskys,licores (ginja sai bem) e vinhos engarrafadosdo Douro, do Alentejo,do Ribatejo apesar dos Dãos e daregião Oeste estarem muito emvoga.“Uma das áreas mais fortesé o vinho do Porto”, disse o empresário,contando que a garrafamais antiga que possui é de 1890 ecusta cerca de 1300 euros.A revenda – para restaurantes ecafés - é uma parte importante donegócio da empresa representando70% do volume de negócios queJosé de Sousa prefere não revelar.“Vejo hoje as coisas mais difíceis,não só por causa da muitaconcorrência, como por cau-sa da própria situação do pais”,disse o empresário, que continua ater clientes de Peniche, Nazaré ouS. Martinho.José de Sousa diz que têm bonspreços para os seus clientes e queaposta no atendimento personalizadoe nas entregas ao domicílionas <strong>Caldas</strong> e arredores como elementosdiferenciadores que lhespermite enfrentar a concorrênciadas grandes superfícies. “Somostambém muito procurados porcausa dos portos e das aguardentes.Aconselhamos os nossosclientes e temos sempre no-vidades”, contou José de Sousa.“Temos clientes com quemtrabalhamos há mais de 20 anose já sabemos que lote de bebidaspretendem quando orga-nizam uma festa”, contou o responsável,acrescentando que tambémorganizam com regularidadejantares vínicos em restaurantes dacidade.O próximo projecto da Bagod’Ouro será a abertura de uma saladedicada à prova de vinhos, em colaboraçãocom os produtores, nolocal onde antes tinham os depósitosdo vinho.A empresa Costa & Sousa asseguraneste momento cinco postosde trabalho entre os sócios-gerentes,os vendedores e os distribuidores.Além do vinho também a aguardente era engarrafada naquele espaçocom as marcas Cantomar e ContenteA família deixou o negócio dos vinhos a granel e passou a dedicar-se à comercialização de bebidas engarrafadasVinho e produtos gourmet no coração da cidade“Vinhos & Néctares” é como se designa a segunda garrafeirada firma Costa & Sousa, que é gerida por Alexandra, esposa deJosé de Sousa. A loja fica na rua Heróis da Grande Guerra ondeanteriormente a empresária tinha uma loja de roupa. Além dosvinhos têm várias propostas gourmet como patés, massas ouazeites. A loja proporciona cabazes e ofertas em que o vinho éassociado a outros produtos.“A comida sempre esteve associada ao vinho”, comentoua empresária, que já conta com a ajuda da sua filha maisvelha para realizar os presentes.Há outro aspecto curioso. Alexandra Sousa tenta sempre terprodutos nacionais, desde os doces às conservas “até porqueo que cá se faz tem muita qualidade”.A clientela é diversificada e no verão há muitos estrangeirosque gostam de conhecer os vinhos da região e também consomemprodutos de gama média alta. “Há Há a ideia de que vendemossobretudo vinhos caros, mas esta não corres-ponde à realidade pois temos aqui de tudo dos váriossegmentos”, acrescentou a empresária. Tal como na Bagod’Ouro, esta garrafeira aposta forte na variedade dos vinhosdo Porto “que temos para todos os gostos e bolsas”, rematou.N.N.Uma das primeiras garrafas com a marca Jotessepirogravada, usada no tempo do pai de Alfredo SousaAlexandra Sousa e a filha mais velha na lojagourmet que fica na Rua Heróis da Grande GuerraCRONOLOGIAAnos 40 - José de Sousa Júnior abre mercearia,barbearia e taberna na sua terra natal.Como motorista, transporta vinho de um familiarpara o Grande Porto.1960 - Vendem o negócio na Sancheira etransferem-se para as <strong>Caldas</strong>, ficando commercearia e taberna. Em simultâneo apostana construção do armazém de vinho com capacidadepara 150 mil litros. Passam tambéma engarrafar o vinho com a marca Jotesse.1973 – Morre José de Sousa Júnior e a empresapassa a chamar-se José de Sousa JúniorHerdeiros1979 – Constitui-se a firma Costa & SousaLda. que tem como sócios Alfredo Sousa, amulher Maria Helena Rodrigues da Costa Sousae a sua mãe Maria Salomé Sabino. Passamtambém a engarrafar as aguardentes Cantomare Contente.1983 – Abertura da garrafeira Bago d’Ouro.2005 – Entra para a empresa o filho JoséManuel Rodrigues de Sousa que fica com aquota da avó. O capital social é de 5.486,77euros.2006- Abre a Vinhos & Néctares na Rua Heróisda Grande Guerra


22Centrais15 | Outubro | 2010, VUMAMA EMPRESAMPRESA, , VÁRIAS VGERAÇÕESZé do Barrete – a história de uma família de AlvorninOs últimos clientes saem porvolta das 23h00. É nessa alturaque César Santos e a mulherabandonam a cozinham e sejuntam ao irmão, José Luis, e àcunhada, que andaram a serviràs mesas. É assim que repartema tarefa: César procura darseguimento à cozinha tradicionalportuguesa que aprendeucom a mãe e José ocupa-se dosclientes.Ao fim da noite a pausa durapouco. Uma garrafinha de água,um licor e ala que se faz tardeporque é preciso ainda arrumaro restaurante e deixá-lo preparadopara o dia seguinte.Mas hoje o serão é para contarmemórias. Os dois irmãosestão lado a lado e não enganam- são mesmo parecidos.Falam da Alvorninha onde nasceram,mas da qual guardampouca memória porque vieramainda crianças para as <strong>Caldas</strong>.Alvorninha, ano de 1946. GracindaMaria Correia tem 16 anose nunca tinha cozinhado paratanta gente. É o primeiro casamentoque faz como cozinheira,tarefa que haveria de a arrancarao trabalho do campo. Duranteanos a fio, cozinha paracasamentos e baptizados, quenaquele tempo e naquele meiose realizavam sobretudo nascasas das pessoas, nas adegase nas garagens. Virá a casar játarde (sobretudo para os padrõesda época) com quase 30anos, com um rapaz da sua idade,Raul dos Santos, tal comoela, nascido em 1930 e naturalda mesma terra.Nos anos sessenta, em Alvorninhanão havia muitas maisprofissões e Raul é, como quasetoda a gente, agricultor. Mas é-lhe detectada uma artrose, doençanada compatível com o trabalhodo campo.O casal, já com três filhos (César,José Luís e Armando),muda-se para a cidade. E Gracindaaproveita para concretizarum sonho antigo – ter umrestaurante onde possa cozinharpara os clientes, até porquenunca largara essa activi-Raul e Gracinda com os filhos José Luís, Armando JorgeQuem os conhece diz que se dão como irmãos. É uma redundância porque César e José são, de facto,irmãos. Mas mais do que isso, são amigos e sócios. Tomam conta de uma das mais antigas casas derestauração caldense, o mesmo negócio com que os pais ganharam o sustento para os criar e que elesagora mantém, adaptando-o a outros tempos. Esta é a história do Zé do Barrete, o restaurante quecomeçou por ser uma taberna nos anos quarenta, quando José Faustino Leal, vindo de Vila Nova(Alvorninha) comprou a antiga carvoaria que havia na Travessa Cova da Onça. O estabelecimentohaveria de sofrer vários trespasses até chegar às mãos de Raul dos Santos e Gracinda Correia, em 27de Dezembro de 1966, que por sua vez o legariam aos filhos em 1985.e César Manueldade e chegara até a montaruma tasquinha na feira da RioMaior.Em 27 de Dezembro de 1966,por 40 contos (200 euros) Raul eGraciete tomam então de trespasseo Zé do Barrete, a já famosataberna e casa de pastoda Travessa Cova da Onça. Nãoperdem tempo e fazem obras.Ampliam espaços, constróemum forno e dão um cunho pessoalao projecto que abraçaram.A mulher trata da cozinha e omarido serve os clientes. Mas éela a alma do negócio. Com 43anos completa a 4ª classe (numtempo em que não havia NovasOportunidades e era mesmonecessário estudar-se para sepassar no exame) e tira a cartade condução. Raul (que faleceuem 2003) apenas sabia assinar oseu nome, mas os clientes recordam-nocomo a face visíveldo Zé Barrete, um homem cheiode boa vontade e simpatia, umautêntico relações públicas.A par deste negócio, o casalaproveita tudo o que pode paraarredondar os rendimentos. Alugaquartos aos aquistas que demandamo Hospital Termal, Gracietelava a roupa aos militaresdo RI 5 (hoje ESE) e Raul arranjaum ocupação diária curiosa – vaiO restaurante sofreu sucessivas modificações e hoje nada resta da antiga casa de pastoJosé Luís, Ana Paula, Gracinda Correia, César e Rymma Tupchiynuma motorizada ao quartelbuscar as refeições ali cozinhadaspara os reclusos da cadeiadas <strong>Caldas</strong>.No dia 16 de Março de 1974,com o país à beira de uma revoluçãoque abortou, o quartel das<strong>Caldas</strong> está cercado e não o deixampassar. Raul, que nada percebiade política, insistia em furaro cerco para ir buscar a comida.Dizia que os presos tinhamde comer e teimava em dirigirseao quartel. Impedido de o fazer,voltou para trás, foi falar como director da cadeia e arranjou asolução. Naquele dia os reclusoscomeram ovos estrelados comarroz e salsichas, tudo cozinhadono Zé do Barrete.“Ainda me lembro de veruns panelões enormes comessa comida nesse dia. Eutinha 11 anos…”, conta JoséLuís Santos.Os três irmãos crescem entreo bulício do restaurante e asbrincadeiras na Travessa Covada Onça. E seguem diferentescaminhos. Armando, o maisnovo, partiu para os EstadosUnidos, onde vive e tem dois filhos.César quer seguir a carreiramilitar e vai para a tropa paraLisboa. José Luís dá por si a trabalharcomo mecânico-electricistana F.A. Caiado (a fábricade tomate e conservas, entretantofechada, que tinha instalaçõesna Estrada da Tornada eno centro das <strong>Caldas</strong>).Em 1980 o casal, que até entãopagava renda pelo restaurante,compra o edifício por 850contos (4.240 euros). A vida nãocorre mal, apesar do intenso trabalhodiário.Há aqui um momento em queparece que ninguém vai pegarno negócio da família, mas vaiser José Luis – que na verdadesempre continuou ligado ao restaurantea ajudar os pais – quetoma uma decisão importantelogo a seguir ao seu casamentocom Ana Paula Marques, em1984. Na fábrica ganhava poucoe resolve que seria no Zé doBarrete que iria buscar o sustentopara a família.O irmão César acompanha-ona aventura. Diz adeus à fardade furriel em Lisboa e regressaàs <strong>Caldas</strong>, iniciando uma sociedadeque, diz quem os conhece,parece abençoada, tal é o graude sintonia entre os dois irmãos.Progressivamente os paisafastam-se e cedem-lhes o lugar,situação que é formalizadaem 1985 com a atribuição da gerênciaaos dois filhos (o maisnovo, Armando, emigrara paraos Estados Unidos onde aindahoje vive). A casa sofre remodelaçõeslogo nesse ano. E tambémem 1989 e em 2005. Da antiga casade pasto já hoje nada resta e oestabelecimento é actualmenteum restaurante vulgar, que guarda,contudo, um nome sonante ememórias que se cruzam com ahistória da cidade.Os dois irmãos são sócio-gerentesda firma Restaurante Zédo Barrete, Lda., formalmentecriada em 1998 e que tem hojeum capital social de 5000 euros.A empresa, que tem um volumede negócios anual que ronda os200 mil euros, é composta pelosdois sócios-gerentes irmãos etrês empregados: as respectivasmulheres e mais uma funcionária.A sociedade, porém, pagauma renda à Gracinda MariaCorreia – Sociedade Unipessoal,esta sim, a verdadeira proprietáriado imóvel.Carlos Ciprianocc@gazetacaldas.com


Centrais2315 | Outubro | 2010ha que veio viver para a Travessa Cova da OnçaJosé Faustino Leal - o fundadorJosé Faustino Leal comprou nos anosquarenta a carvoaria que existia na TravessaCova da Onça, uma artéria discretado centro da cidade que duranteanos concentrou tabernas e casas depasto, local também de muita circulaçãode burros e carroças de quem demandavaa Praça da Fruta e guardavaas “viaturas” numa cocheira que aliexistia.Deste homem, natural de Vila Nova,na freguesia de Alvorninha, sabe-seque durante uns tempos colocava umbarrete na cabeça, divertindo clientese amigos. Fazia-o na brincadeira, masa alcunha pegou e deu nome ao estabelecimento,atravessando todo o séculoXX e os sucessivos proprietáriosda então taberna com casa de pasto ehoje restaurante.Não foi possível reconstituir os váriosdonos do Zé do Barrete. Maria AméliaRamos Paulo e César Tempero já otomaram de trespasse a outro dono quenão o fundador da casa. E quando decidiramlargar o negócio, deixaram-noa uma senhora, de nome Emília, de Alcobaça,que em 1966 viria a trespassáloaos pais dos irmãos Santos.Parece que desde cedo o nome Zédo Barrete foi aceite como uma marcaque os seus quatro sucessivos proprietáriosquiseram manter. É um nomesaloio, ligado ao mundo rural, com raízesnum tempo em que os barreteseram usados pelos homens do campo,mas também associado a boa mesa, auma gastronomia caseira e a um serviçopersonalizado.No seu livro “Continuação”, João BonifácioSerra, descreve com grandeprecisão as suas memórias dos últimosBarretes nos anos cinquenta:“Eram pretos, compridos e tinham uma borla na ponta. Embora já não fossemusados pela maioria dos camponeses, constituíam um símbolo respeitado pormuitos, em especial os mais velhos. Punham-no de Verão e de Inverno e raramenteo tiravam (para assistir à missa, passar junto a um cemitério ou acompanharum funeral, cumprimentar pessoas de respeito, entrar em casa alheia).Quase sempre quem os usava tinha direito ao epíteto de Ti, que denunciava aidade e o respeito que inspirava. De dentro podiam sair várias pequenas surpresas.Do do Ti João Franco ou do Ti João Seco saíam duas carecas completamentelisas e completamente alvas, em contraste violento com a cara tisnada pelo sole enrugada pelo tempo. Mas também podiam sair um maço de mortalhas e umpacotinho de tabaco, uma moeda e, mais raramente, uma nota, uma carta recebidade um parente longínquo ou de um organismo público, trazida para pedir aquem soubesse ler que decifrasse o que lá vinha escrito”A família Tempero no Zé do BarreteAcabou-se o pico do Verão e a fraca procurano InvernoQual o segredo do êxito?O restaurante esteve durante alguns“A tradição e o nome”, responde anos aconselhado no Guide du RoutardJosé Luis. “A cozinha tradicional, quee José Luís conta que, graças a isso,segue a linha da minha mãe”, respondeCésar Santos. A localização bem clientes franceses. Ao ponto de ter de-era raro o dia em que não apareciamno centro da cidade também conta, corado a ementa da casa em francês.apesar de alguns se queixarem da difi-“Agora estamos pior no Verão eculdade em estacionar. E também osmelhor no Inverno. Antes trabalha-clientes que frequentam a casa há maisva-se três meses bons e procura-de 30 anos.va-se aguentar isto durante o res-As especialidades da casa passamto do ano. Agora não há picos. Épelos peixes frescos grelhados, o cozimaisou menos igual o ano inteidoà portuguesa das quartas-feiras ero”. É isso que constata José Luís.os filetes de pescada fresca às quintas.A clientela não falta e a recessão cinda Correia, hoje com 80 anos e do-Raul dos Santos morreu em 2003. Gra-não parece afectar o negócio.ente, ainda há poucas semanas tentavadescascar umas batatas e ajudar osÉ claro que já houve tempos melhores,mas isso não tem a ver com a crise filhos, mas passa grande parte do tempoeconómica mundial. Antes com a cidadee com o que ela já foi. Nos verões de gal e dois nos Estados Unidos, com ida-num lar. Tem quatro netos em Portu-há 15 anos os irmãos lembram-se de a des entre os três meses e os 22 anos.casa encher por completo ao meio-dia, Alguns já trabalham. Mas mais do quedepois às 13h00 e depois às 14h00. Eram um, particularmente sensibilizado comos aquistas que vinham mais cedo, os a história da família, já disse que “oemigrantes, os turistas, os caldenses.Zé do Barrete não pode morrer”.Grande parte da clientela vinha do Alentejo,de Elvas, Évora, Alandroal, Mou-C.C.ra, e vinham aos banhos às <strong>Caldas</strong>. Issoagora acabou.CRONOLOGIA1930 - Nascem Raul dos Santos e Gracinda Ferreira, futuros proprietáriosdo Zé do Barrete1966 - O casal toma de trespasse a então taberna e casa de pasto1980 - Raul e Gracinda compram o edifício por 850 contos (4240 euros)1985 - Os irmãos César e José Luís entram formalmente na gerência dacasa, sucedendo aos pais1989 - Remodelação interior do estabelecimento1998 - Criação da firma Zé do Barrete, Lda. pelos irmãos César e José Luís2005 - Última remodelação do estabelecimentoMaria Amélia Ramos Paulo (1928-2004) e César Mota Tempero (1928-2005) numa imagem do início da década de cinquenta. O casal esteveà frente do Zé do Barrete entre 1957 e 1960. César era empregado do café Zaira e a esposa assegurava o funcionamento, durante o dia, daentão taberna e casa de pasto. A filha, Ida Amélia, que hoje trabalha no Registo Civil das <strong>Caldas</strong>, nasceu em 1957 nessa mesma casa. Nas fotostem três meses e está à porta do estabelecimento ao colo do irmão, César Tempero, que então tinha seis anos e viria a ser muitos anos depoispresidente da Junta de Freguesia dos Vidais. A foto da direita, também com a bebé Ida, é uma das poucas imagens antigas onde se pode veruma parte do interior da casa do Zé do Barrete.


24Centrais22 | Outubro | 2010, VUMAMA EMPRESAMPRESA, , VÁRIAS VGERAÇÕESFamília Barosa – pais, filhos e um primo num negócioNascido nas <strong>Caldas</strong> a 1 de Junhode 1931, Manuel de Sousa Barosaacabaria por ter que sair dasua terra natal aos 20 anos. A SegundaGuerra Mundial tinha acabadohá pouco tempo e o empregonão abundava. “Eu fiz parteda juventude que abandonouas suas raízes para ir à procu-ra de uma actividade”, contamais de meio século depois.A busca de uma vida melhor levou-oa Moçambique. Durante 21anos, Manuel Barosa trabalhou naCaixa Económica e Postal e depoisno Banco de Crédito Comercial eIndustrial. Andou por Vila Gouveia(hoje Catandica), Beira e LourençoMarques (hoje Maputo), sempreacompanhado pela esposa,Cesaltina Rosário Filipe Barosa. Asnotícias da sua terra chegavam-lhepela <strong>Gazeta</strong> das Cal-das, que a sua mãe compravae lhe enviava pelo correio.Duas décadas depois de ter partido,Manuel Barosa decidiu voltar.“Cheguei à conclusão queestava errado em estar lá”, eacabou por voltar a Portugal em1973. Na altura mal adivinhava que,dois anos depois, a maioria dosportugueses que viviam em Moçambiqueregressariam em condiçõestrágicas após a independência.“Como resultado da minhaestadia por lá, a única riquezaque trouxe foram dois filhos” -Luíz, nascido em 1958, e Jorge, quenasceu em 1970.“Eu lá era bancário, mas nãoqueria voltar para a banca,não era que alguém me tratas-se mal, mas eu entendia queaquilo para mim era pouco.Então acabei por abrir umaempresa em Lisboa, ligado aum empresário de Moçambi-que da pesca de camarão”.Manuel Barosa geria a delegaçãoportuguesa da empresa Produmar,que também estava representadaem Joanesburgo e que comercializavaa marca Seastar. Um anoapós ter voltado de Moçambique,o caldense já sabia o que era tersucesso nos negócios.“Quando dei por mim era umdos três importadores de ca-marão deste país”, lembra. E naquelaaltura a procura pelo mariscoera tanta que “quando che-gava o barco a Lisboa com as10 ou 15 toneladas de cama-rão, estava tudo vendido. Erasó proceder à entrega, factu-rar e esperar pelos prazos depagamento”.Ainda que a empresa fosse emLisboa, Manuel Barosa nunca perdeua ligação às <strong>Caldas</strong>, onde voltavapara fins-de-semana prolongados.Mas o 25 de Abril veio trocaras voltas ao empresário. “Comtoda a trapalhada que houvenesta altura, os portuguesesque estavam em MoçambiqueEugénio Pego, Luíz, Manuel, Cesaltina e Jorge Barosa no dia em que foi criada a Manuel de Sousa Barosa, Lda. enuma imagem actual. Pais, filhos e um primo mantêm-se à frente de um negócio que ronda os 5 milhões de euros devieram-se embora e esta em-facturaçãopresa fechou. Na altura tinhaseis arrastões de pesca de ca-marão”.Manuel ficou novamente sememprego. As portas da banca continuavamabertas, mas esta erauma opção que continuava a nãolhe agradar. Decidiu então valersedos conhecimentos que tinhagranjeado no tempo que trabalhoupara a Produmar, “conhecimen-tos a nível internacional, domundo dos congelados. Foi aíque aprendi onde é que estavamos clientes, os produto-res”. Voltou de vez para as Cal-Cesaltina dava aqui no duro”,recorda o marido.Não foi preciso muito para quea garagem se tornasse pequenademais para o negócio e ManuelBarosa decidiu fazer aquele queseria o primeiro armazém da grandeempresa que hoje se pode verno nº10 da Rua São João de Deus.É também nessa altura que o filhomais velho decide ir trabalhar comos pais. “Eu queria estudar, mascomo não tinha conseguidoentrar na Faculdade de Direitodois anos seguidos… Duranteca Olá na zona das <strong>Caldas</strong>. Enquantoos vendedores da marca vendiamaos comerciantes que tinhamarcas da Olá, a família Barosa encarregava-sedos que não tinham.“O meu maior fornecedor era,simultaneamente, o meu mai-or concorrente”, conta o pai ManuelBarosa.Foi também neste ano que a empresadeu início à transformaçãode pescado congelado. “Fornecí-amos o comércio local e dasredondezas e já na altura comuma grande diversidade deManuel Barosa. “Quando che-guei o senhor Barosa disse-meassim: ‘Oh Pêgo, tens aqui umescritório’. . E eu olhei e vi umasalinha pequenina com umsofá e pensei ‘ele todo orgu-lhoso com um escritório tãopequenino, mas tudo bem, istofunciona’”’”.Numa zona litoral um dos principaisobstáculos com que a empresase deparou foi a aceitaçãodos clientes. “Não temos nadaa ver com o peixe de Peniche eNazaré, nós recebemos o pei-Pescados foi fundamental para quea empresa fosse cada vez maisbem vista junto dos seus clientes.Paralelamente, a representação daOlá também corria sobre rodas.“Esta empresa cresceu comestas duas actividades em con-junto” e à medida que o negócioexpandia, cresciam também asinstalações. Na altura, a Manuelde Sousa Barosa contava com setetrabalhadores. Era a D. Cesaltinaque orientava toda a parte de produçãoe facturação, o que aconteceuaté que a empresa sentiu necessidade,em 1986, de implantarum sistema informático que agilizasseÉ numa garagem com cinco arcas frigoríficas que começa em 1975 a história de sucesso dos negóciostodos os procedimentos.da família Barosa. Regressado de Moçambique e após ter orientado em Lisboa uma empresa de “Quando as vendas ultrapas-importação e venda de camarão, o caldense Manuel de Sousa Barosa decide arriscar um negócio porsavam o que nós tínhamosconta própria, tendo sempre ao seu lado a esposa, Cesaltina Barosa.embalado, tínhamos que fazerserão. Então eu ia para casaNo comando dos negócios juntam-se ao casal, 35 anos depois, os filho Luíz e Jorge, e o primofazer jantar para todos e sóEugénio Pêgo. E de uma pequena empresa em nome individual, o negócio dos Barosa transformouquandose acabava o trabasenum grupo de quatro empresas que factura anualmente cerca de cinco milhões de euros.lho é que o meu marido ia levaras raparigas que trabalhadase lançou-se num negócio decongelados. “Não havia nadadisto aqui”, lembra.Em Maio de 1975, Manuel deSousa Barosa regista-se como empresárioem nome individual. O negóciocomeçou na garagem dacasa do casal, um pequeno espaçoonde o empresário tinha cincoarcas frigoríficas. Marido e mulhernão tinham mãos a medir. Da venda,à entrega, passando pela embalageme facturação, tudo era asseguradopelos dois. E isto numaaltura em que “era tudo feito àmão”, lembra Cesaltina Barosa,que se recorda bem das noites emque chegava a casa “às duas outrês da manhã, quando o tra-balho estava todo feito”. Os filhosainda estudavam, e “a Donao Verão pintei o armazém todosozinho e disse ao meu pai “euvou trabalhar contigo”, contaLuíz Filipe de Sousa Barosa, quena altura tinha 20 anos.“A partir daí as coisas mo-dificaram-se. O que eu tinhaera uma brincadeira. Então, fizuma câmara frigorífica com 30metros cúbicos de capacida-de e foi com essa câmara quearrancámos”. Uma câmara queainda hoje existe, mas que estáinactiva.A CHEGADA DA OLÁEm 1979 surge um convite queiria definir o sucesso da empresa.A Manuel de Sousa Barosa foi desafiadapara ser a agente da marpeixeque íamos buscar à Gafanhada Nazaré e a importa-dores de Lisboa”. Peixe capturadona pesca longínqua, com especialdestaque para a pescada.Luíz Barosa explica como se processavaa transformação, numprocesso que não difere muito dométodo dos dias de hoje: “o peixevinha em blocos, congeladoem alto mar em barcos-fábri-ca. Já aqui era desagregado,serrado, vidrado e embalado.Em 1979 o peixe vendia-se todoa granel”. E lembra-se do primeirocarro da empresa: uma carrinhaMini Ima.Quem também se recorda bemdestes tempos é Eugénio ViriatoPêgo (nascido em 1946), um primoafastado que veio trabalhar comxe da pesca longínqua. Masquando íamos oferecer o nos-so peixe, os clientes diziam:não vale a pena que nós já re-cebemos peixe de Peniche”,lembra Manuel Barosa. “Demorouanos até que os nossos clientespercebessem que o peixeque os penicheiros lhes ven-diam não era de lá, vinha domesmo sítio que o nosso. É quetirando a sardinha e o cara-pau e algum safio, eles não têmmais nada”.Num país que é o terceiro domundo com o maior consumo depeixe per capita (apenas precedidopelo Japão e pela Islândia), “eapesar de comermos maiscarne que peixe”, salienta Luíz,a qualidade dos produtos Barosavam na embalagem a casa, àsvezes à meia-noite, uma ouduas da manhã”, lembra a mãe.A década de 80 foi, de resto,marcada por diversas obras. Construíram-semais câmaras e maispavilhões. Em 1987, a Manuel deSousa Barosa torna-se concessionáriaoficial da Iglo/Olá “e dá-seum boom muito grande nasvendas”, de tal forma que o empresáriofoi aconselhado a separarjuridicamente as duas vertentesdo seu negócio, o que aconteceem 1988 com a entrada da mulhere dos filhos como sócios dosnegócios. Tinha início uma novaera na empresa.Joana Fialhojfialho@gazetacaldas.comManuel Barosa com a esposa e os dois filhos, Jorge eLuíz, ainda em Lourenço Marques (hoje Maputo), de onderegressaram em 1973As instalações actuais da empresa familiar estão longe da pequena garagem onde tudo começou há 35 anos. Aexpansão obedeceu a um princípio fundamental: “primeiro criam-se as necessidades, depois investe-se”


Centrais2522 | Outubro | 2010de congelados que dura há 35 anosDe um pequeno negócio a um grupo com quatro empresasTreze anos depois de ter começado o seu próprionegócio na garagem da sua casa, em 1988,Manuel Barosa é um empresário de sucesso. Oêxito é partilhado com a família, a mulher Cesaltinae os filhos Luíz e Jorge, que a par com o empresáriose tornam sócios da Manuel Barosa Lda,criada especificamente para a comercializaçãode gelados. A transformação de pescado continuavaa cargo da empresa em nome individualManuel de Sousa Barosa.Luíz já trabalhava com o pai há dez anos.Jorge, com 18 anos nesta altura, estava aconcluir o ensino secundário e só dois anosmais tarde viria a integrar os quadros daempresa. O pai brinca: “ainda não esta-va a trabalhar e já era sócio, isto nãoé para toda a gente”. Logo o filho replica:“não trabalhava a tempo inteiro,mas vinha para cá nas férias desdeos 13 anos”.As duas empresas não param de crescerem dimensão e em volume de negócios. Jácom Luíz e Jorge inteiramente dedicados aonegócio, surge uma nova empresa – a Manuelde Sousa Barosa Lda, criada em 1994 paraa vertente de transformação e comercializaçãode pescado, que conta com os quatromembros da família Barosa e com EugénioPêgo como sócios. O primo torna-se, tambémneste ano, sócio da Manuel Barosa Lda.A Manuel de Sousa Barosa, com que tudocomeçou há 35 anos, nunca foi extinta. A empresamantém-se no activo, alugando as câmarasfrigoríficas às duas sociedades deresponsabilidade limitada que integram osnegócios da família. Em 2006 é criada umanova empresa – a Gelados e Mimos, que dánome à geladaria que a família tem em S.Martinho do Porto.As obras nas instalações das empresasforam-se fazendo sempre que havia necessidade.Hoje o grupo tem oito câmaras, a últimadas quais construída em 2008, o que lhesgarante uma capacidade de 3.000 metros cúbicosde frio negativo. “Não há nada aquià volta que se lhe compare”, afiançamos responsáveis. E foi precisamente esta capacidadede frio que “permitiu que nos últimosanos se atingisse uma factura-ção anual que ronda os cinco milhõesde euros”, acrescenta Manuel Barosa.O que também contribuiu para os bons resultadosfoi a criação de novas áreas de negócio.Actualmente as empresas do grupo Barosatêm muito mais para oferecer que geladosOlá e peixe congelado. Operando comcerca de mil referências, as empresas da famíliatêm uma vasta gama de produtos do mar(pescados, cefalópodes e crustáceos), salgados,snacks (refeições prontas), pastelariapequena e grande e padaria, de marcas próprias– a Barosa Pescados e a Barosa FoodService. A estas junta-se um vasto leque deartigos de marcas tão conhecidas como Nestlé,Knorr, Calvé, Heinz, Kellog’s, Vaqueiro,Azeites Gallo, entre muitas outras.O negócio estende-se por três canais: ocanal Horeca – Hotelaria, Restauração e Cafés,o canal tradicional (hiper e supermercados)e o canal social (lares, cantinas, refeitóriosescolares), em nove concelhos numa faixaque se estende da Lourinhã à Nazaré.O grupo está a apostar na internacionalizaçãodas marcas próprias e já exporta algunsprodutos para Espanha.No conjunto das empresas da família Barosaconta-se um total de 42 trabalhadores.E aqui está já incluído um neto, Francisco Barosade 24 anos, que se vai inteirando dosnegócios ao mesmo tempo que se forma numcurso que tem tudo a ver com a actividade dafamília - Engenharia Alimentar.DEDICAÇÃO E OPTIMIZAÇÃO DE CUSTOSE PROCESSOS NA BASE DO SUCESSOEm tempos de crise, o negócio da famíliaBarosa tem-se mostrado resistente. “Continuamosa honrar os nossos compro-missos, a pagar a trabalhadores e afornecedores a tempo e horas e nãoestamos dependentes dos bancos. Abanca é um parceiro nosso, mas nun-ca foi nosso sócio”, congratula-se ManuelBarosa.O sucesso das suas empresas é como umpuzzle, composto por várias peças. Uma delas,a qualidade dos produtos. A outra, a referidaindependência da banca (a empresacresceu quase sempre em auto-financiamento).Mas há outro aspecto fundamental:“a empresa capitaliza, não distribui”,e os lucros foram-se acumulando, permitindoenfrentar os tempos mais difíceis comalgum à vontade.Outra preocupação foi “estrangulartudo o que eram custos - foi tudo renegociado,da parte eléctrica aos serviçosque contratamos, dos combustíveisàs lâmpadas que temos nas instalações.E isto não acaba. É um es-quema que tem que estar sempre emcima da mesa”, salienta Jorge Barosa. Epara salvaguardar o seu stock, a empresa éhoje auto-suficiente durante três dias, comgeradores alimentados a combustível.Não menos importante que tudo isto é adedicação e o empenho de todos os sócios“que servem a empresa, e não o con-trário”. Está sempre alguém da gerênciapresente e todos os processos são acompanhadosde perto pelos responsáveis, quetodos os dias são os primeiros a chegar e osúltimos a sair. “Temos que ser muitobons e muito exigentes para não fa-lharmos na venda, na facturação, naentrega, nas encomendas, na gestãode stocks. Todos estes processos têmque estar muito bem optimizadospara que nada falhe. E uma das razõesdo nosso sucesso é nós conse-guirmos e sabermos fazer isto” sublinhaJorge, que orgulhoso acrescenta: “nóssomos peixeiros cinco estrelas”.A eficiência é também salientada porLuíz. “Nós vendemos num dia e entre-gamos no outro e isso faz com que osnossos clientes nos vejam como par-ceiros de negócio”.E desde cedo perceberam que para queisto fosse possível, teriam que se apoiar nainformática. “Fomos os primeiros a apa-recer no mercado com pocket pc, , naaltura eram uns tijolos muito gran-des, os vendedores não gostavamnada daquilo, mas nós ganhámosmuita rapidez e muitas horas de sono”,lembra o mais novo.Os dois irmãos são unânimes quando dizemque as empresas da família são muitobem vistas, tanto junto dos seus clientes comodos seus fornecedores, sobretudo no país vizinho,onde vão buscar muito do peixe que comercializam.“Em Espanha somos con-siderados, em termos de respeito,umas das três melhores empresas dePortugal, e isso é um motivo de orgulhomuito grande. Não temos a dimen-são que outras têm, mas em termos derespeito estamos muito bem cotadas.Vamos buscar produtos e temos asportas todas abertas”, garante Jorge.No seu próprio país, o reconhecimento dobom desempenho das empresas Manuel deSousa Barosa, Lda. e Manuel Barosa, Lda. reflecte-sena distinção, pelo segundo ano consecutivo,como empresas PME Líder.“A verdade é que 40 famílias (algunscasais) dependem desta empre-sa e sentem-se seguros, e nós temoso dever de lhes dar essa segurançacomo resposta”, diz Manuel Barosa. E ofilho mais novo acrescenta: “todos os trabalhadoresque respeitam esta empresasão sempre muito bem respei-tados”. E é por isso que muitos colaboradoresatingiram ali a idade da reforma e outros,que se mantêm, contam já com vinteanos ou mais de casa. Nas empresas da famíliaBarosa “toda a gente trabalhapara o bem comum e ninguém traba-lha sozinho”, garante Luíz.Confiantes no futuro, os membros maisnovos da família trilham novos caminhospara os negócios. A exportação, iniciada esteano, é um dos rumos a seguir. Outra apostaserá na imagem da empresa, pelo que é bemprovável que dentro de algum tempo as tãoconhecidas ondas em tons de azul que acompanhamo logótipo com um peixe e uma canade pesca, dêem lugar a uma nova imagem,mais virada para o século XXI.Joana Fialhojfialho@gazetacaldas.comManuel Barosa mostra uma das oito câmaras frigoríficas daempresa. A temperatura no local é de 28 graus negativos.“Nós também contribuímos para o orgulhoque é esta empresa”José Franco e João Pereira são dois dos mais antigostrabalhadores das empresas. Dois membros de uma equipa de 42colaboradores que lutam por um só objectivoJosé Fernando Franco, de 54 anos, tempo ao serviço da mesma empresa,trabalha para a família Barosa há mais e diz que isso é estranhado pelos maisde 25. “Comecei há muitos anos, nonovos. Mas esta é “uma empresa faprincípioera uma empresa peque-miliar que tem vindo a crescer comna. Hoje tem outros alicerces, maso apoio de todos, nalguns casoscontinua a ser uma família”, conta.com sacrifício de todos, e princi-Inicialmente, vendia e entregava.palmente com muita dedicação”.“Isto foi assim ainda durante al-Longe vai o tempo em que a famíliaguns anos. Era eu e outro senhor.Barosa vendia apenas pescado e gela-À segunda e terça vendíamos, àdos. E João Pereira acompanhou todaquarta ficávamos no armazém, àa transformação que se deu ao nívelquinta e sexta íamos fazer a entre-dos produtos que as empresas comer-ga”. Agora dedica-se apenas à venda cializam, que permitiu combater, pore há outros colegas para fazerem o trabalhoque se segue. Uma prova do gelados. “Neste momento somosquanto a empresa cresceu, não só aocapazes de montar uma pastela-nível do negócio e do número de trabaria.Há uns anos apenas lá púnhalhadores,mas também no que diz resmosa arca de gelados e os gelapeitoàs instalações. “O local ondedos. Hoje, a nossa oferta vai do pãoestamos era um eucaliptal”, lembra.aos salgados, e se for preciso atéE o que explica, na sua opinião, oos fornos lá pomos”, e acredita queexemplo, a sazonalidade da venda desucesso do negócio?se não fosse a crise, a evolução seria“É trabalharmos todos para oainda maior.mesmo. E a gente não falha, o pro-Acreditando que o futuro não é pre-duto que se vende é entregue”. Além ocupante, João Pereira afirma que “édisso, “estamos sempre a evoluir, oum motivo de orgulho trabalharmercado não pára e nós temos quenuma empresa tão bem vista, poracompanhar sempre esta evoluquenós de alguma maneira faze-ção”mos parte disto, contribuímosA mesma opinião é partilhada porpara o orgulho que é esta empre-João Pereira, 51 anos, a trabalhar há 18sa”.anos para os Barosa. O vendedor sabeque já começa a ser raro que os traba-J.F.lhadores se aguentem durante tanto<strong>Cronologia</strong>1952 – Manuel Barosa vai para Moçambique1973 – Regressa a Portugal com a mulher, Cesaltina, e os dois filhos Luíz eJorge1974 – É gerente na delegação de Lisboa da Produmar1975 – Estabeleceu-se como empresário em nome individual na garagem dasua casa nas <strong>Caldas</strong>1978 – Constrói o primeiro pavilhão da empresa e o filho Luíz começa atrabalhar com os pais1979 – A empresa é agente da Olá1983 e 1987 – Novas obras aumentam a capacidade de frio da empresa1988 – É criada a Manuel Barosa, Lda (400 mil euros de capital social) paracomércio de gelados com os sócios Manuel, Cesaltina, Luíz e Jorge Barosa. Aempresa Manuel de Sousa Barosa mantém a transformação e comercializaçãode pescado1990 – Jorge termina os estudos e junta-se à família1994 – É criada a Manuel de Sousa Barosa, Lda (100 mil euros de capitalsocial). Junta-se, como sócio, Eugénio Pêgo, que também entra para a ManuelBarosa, Lda.2005 – Aposta em novas áreas de negócio com a marca Barosa Food Service2006 – É criada a Gelados e Mimos, geladaria em S. Martinho do Porto2008 – Construída a mais recente câmara frigorífica da empresa, com capacidadesuperior a 3000 metros cúbicos de frio2010 – Início da internacionalização das marcas Barosa com exportaçõespara Espanha


18Centrais29 | Outubro | 2010, VUMAMA EMPRESAMPRESA, , VÁRIAS VGERAÇÕESSai farinha gourmet da moagem José Félix Quitério,Joaquim Rebelo (1883-1960) foi o precursorde uma actividade que já leva 70 anosJosé Félix Quitério (1924-2009), genro de Joaquim Rebelo, pegounos destinos da fábrica de moagem em 1976Filipe Quitério e a avó, Maria Luísa, são hoje a face visível deum negócio de várias geraçõesA necessidade aguça o engenho.O ditado é antigo e era levadoà prática por Joaquim Rebelo(1883-1960), um carpinteiro dasGaeiras que, numa tentativa demelhorar a vida nos anos durosdo início do séc. XX, construiu ummoinho de pedra, com a ajuda daesposa, e começou a moer trigopara fazer farinha.A obra ficou pronta em 1920,altura em que houve um terramotoem Benavente e JoaquimRebelo foi para lá trabalhar decarpinteiro, deixando a esposa,Luísa Rebelo (1889-1968) a tomarconta do moinho e da sua produção.“A minha mãe dormia lá coma minha irmã e trabalhava nomoinho toda a noite, fazendofarinha tal e qual como o meupai lhe ensinara”, recorda a filha,Maria Luísa Rebelo Quitério,hoje com 84 anos.Regressado de Benavente ocarpinteiro-moleiro Joaquim Rebelocontinuou a produzir farinhae o negócio deve ter corrido bemporque, 20 anos depois, em 1940,constrói uma moagem no centrodas Gaeiras (deixando o moinhoarrendado ao seu fiel funcionárioManuel, a quem dera trabalhoquando este tinha 14 anos).O casal Joaquim e Luísa Rebelotem, entretanto duas filhas: Alice,nascida em 1921 (faleceu em2004), e Maria Luísa Rebelo, nascidaem 1926. Esta recorda-se quea nova fábrica fazia sensação naaldeia das Gaeiras nos anos 40. Amoagem utilizava aquilo que paraa época eram novas tecnologias -mós francesas (uma novidade àépoca), seguindo-se a introduçãode pneumáticos e cilindros, permitindoo aumento da produçãoda farinha de trigo.Alice e Maria Luísa casam, respectivamente,com Gil Palma eJosé Quitério (1924-2009), que acabariampor vir juntar-se à actividadeda família.A filha mais nova de JoaquimRebelo lembra-se que se casouA empresa em nome individual José Félix Quitério – Farinha das Gaeiras foi criada em 1976, mas a suahistória é bastante mais antiga e traduz-se numa paixão que une já três gerações.No início do século XX o carpinteiro Joaquim Rebelo (1883-1960) constrói um moinho nas Gaeiras ecomeça a produzir farinha. O negócio prospera e em 1940 constrói uma fábrica de moagem no centroda aldeia, onde também começam a trabalhar os seus dois genros.Divergências após a morte do patriarca levaram a fábrica quase à falência, até que é adquirida em1976 por um dos genros, José Félix Quitério, que volta a dar-lhe um novo fôlego. Hoje é o neto maisnovo que está à sua frente e que pretende torná-la uma fábrica de futuro, mas assente nos valores dapalavra e do conhecimento, cimentados em muitos anos de relações comerciais transmitidos peloavô.A farinha das Gaeiras “feita 100% de trigo” tornou-se uma marca de qualidade e é comercializadapor toda a região.com 18 anos (1944) e que o maridoteve que ir assentar praça de seguida,levando-a para o Lumiar,em Lisboa, durante um ano. “Omeu pai ia lá todos os domin-gos ver-me e perguntar do queprecisava”, conta, acrescentandoque logo que a tropa foi terminadaregressaram às Gaeiras.Como José Quitério não tinha emprego,o sogro empregou-o na fábrica,junto com o cunhado.“Trabalhavam lá os dois,mas o meu pai era a travemestra que orientava aquilotudo”, conta Maria Luísa Quitério,que desde pequena ajudavao pai com as contas.Além do patriarca e dos genros,trabalhavam na moagemmais quatro pessoas.Em 1960 Joaquim Rebelo morree os dois genros herdam a fábrica,cuja administração passam aassumir, ficando Gil Palma responsávelpela contabilidade. A relaçãoentre dois é difícil, acentuando-secom o tempo, chegandoao ponto de praticamente não sefalarem.Por esse motivo, José Quitério começaa afastar-se da moagem passandoa dedicar-se à agricultura.CRIAÇÃO DE LOTES ESPECIAISDÃO FAMA À FARINHADevido à falta de uma verdadeiragestão, e sem rumo estratégico,em 1976 a fábrica encontra-sepraticamente parada e comdívidas à EPAC (Empresa Públicade Abastecimento de Cereais).Maria Luísa descobre pelas folhasde caixa que o montante em dívidateria que ser pago nos próximosoito dias ou todo o patrimónioiria “à praça”.O casal opta por lutar pela posseda fábrica, dado que não conseguiuacordo com os familiares.A operação de venda em hastapública decorre em 26 de Novembrode 1976. O preço base é de 10escudos (cinco cêntimos) e viriaatingir 2500 contos (25 mil euros).Na noite em que se decidia ofuturo da empresa, Maria Luísapermanece dentro do carro, àporta do escritório de um advogado,até às cinco horas da manhã àespera de saber o desfecho.“Chega o meu marido e diza fábrica é nossa! Começo dechorar e a dizer que ele nosdesgraçou porque não temosdinheiro”, recorda a octagenária,acrescentando que José Quitériologo a sossegou, dizendo queantes de ir para a licitação foi aobanco Totta & Açores (actual Santander)para pedir um empréstimo,que foi desde logo concedido.José Quitério entrega metadedos 2500 contos ao cunhado e fica,assim, senhor da empresa, apressando-se,também a pagar a dívidaà EPAC.“Ninguém tinha um tostão,não sei como sobrevivemos,foi duro”, recorda Luísa Quitério,que passou a tomar conta doescritório. Mas as dificuldades foram-seatenuando e “aquilo afi-nal correu bem”, conta, recordandoque em dois apenas pagarama dívida ao banco.Nos anos setenta, após a extinçãoda EPAC (que asseguravaa distribuição de trigo pelas moagensdo país) e com a liberalizaçãodo mercado dos cereais, houvemuitas empresas que faliram.“Antes éramos 70 e agora devemosser umas 20 ou 30 mo-agens a funcionar”, revela,dando conta que a sua sempresobreviveu porque é pequena etem um carácter artesanal quehoje é uma mais-valia.“Há ali um sistema muitomanual que faz a farinha tal equal como nós queremos,mais ou menos elástica, consoantese destina a pastelariasou à transformação ali-mentar”, explica.Pouco tempo depois de seremproprietários da fábrica, contrataramum especialista que foi àsGaeiras alterar o processo produtivo,aumentado a produção parao triplo.“Começámos a moer cadavez mais e a farinha começoua ter muita fama”, o que implicavaque todos os dias, um dosproprietários tivesse que ficar denoite a cuidar da fábrica.José Quitério criou uns lotes especiaisde farinha, que começarama granjear fama na região,vendendo não só para a as <strong>Caldas</strong>e Óbidos, como para os concelhosde Santarém, Peniche eAlcobaça.Com a fábrica a produzir em pleno,o casal Quitério pode entãopassear e Maria Luísa recorda hojeas viagens que então fizeram aoBrasil e Japão porque, “até até entãotinha sido só trabalhar”.Ainda hoje Maria Luísa, apesardos seu 84 anos, continua a fazera contabilidade da fábrica e a ajudaro novo gestor da moagem – oseu neto, Filipe Quitério.O que acontecera entretanto?José Quitério e Maria Luísa tiveramsó um filho – Gil Quitério, nascidoem 1945 - que acabaria porseguir um rumo diferente sendohoje professor universitário no InstitutoSuperior de Engenharia deLisboa.Aparentemente a família demoleiros estaria interrompidaaqui, mas o filho de Gil, Filipe Quitério(28 anos), acabaria por seguiras pisadas dos avós e dosbisavós.Fátima Ferreirafferreira@gazetacaldas.comJosé Félix Quitério numa mostra das actividadeseconómicas das Gaeiras em 2006


Centrais1929 | Outubro | 2010nas GaeirasUma empresa flexível que aprendeu a viver num mercado globalFilipe Quitério nasceu em 1982,quase um século depois do seubisavô e está agora a comandaros destinos da moagem José Quitério,dando continuidade à paixãodos avós e mantendo umaactividade que conta com 70 anosde existência.Criado em Lisboa com os pais(o professor universitário Gil Quitérioe Maria Manuela Dias, actualmentepresidente da Juntade Freguesia da Portela), ondeestudou Gestão no ISEG, FilipeQuitério sempre andou pela fábricadas Gaeiras, nas visitas quefazia aos avós, mas nunca tinhacolocado a hipótese de ali trabalhar.Mas quando já andava no segundoano da faculdade, o avôQuitério procurou-o e incentivouoa continuar-lhe os passos. “FuiFuisendo motivado pela manei-ra dele, pelos seus valores”,conta o jovem, que começou aaprender os “segredos” da moagemdo trigo há seis anos.Começou nas tarefas do quotidiano,em redor dos trabalhadores,a ver como faziam as farinhas,como funcionam as máquinas,e depois é que foi aprendera fazer as compras do cereal.“Em termos de trigo, porexemplo, não assino contra-tos com pessoas abaixo de60 anos, que também me en-sinam muito”, refere.Filipe salienta que uma dascaracterísticas desta fábrica é asua maleabilidade e capacidadede adaptar-se aos tempos.“O O que se passa agora éque temos força a mais paraa necessidade do mercado”,explica, precisando que o avôsempre trabalhou num sistemade produção que, embora sendopequeno, “é muito afinadi-nho”. Actualmente estão comuma produção média de 15,5 toneladasde farinha por dia, em10 horas de funcionamento.Os clientes e a fidelidade àmarca nunca faltaram, mas oscostumes foram-se alterando.Esta é uma farinha tradicional eos padeiros já conseguem compraruma farinha mais barata edepois retocá-la com conservantes.“A A nossa é farinha 100%trigo e tem quatro espéciesdiferentes”, refere Filipe Quitério,acrescentando que o segredoestá em comprar bom trigo.Usam cereal do Alentejo, de Espanha,França e Alemanha, quemisturam entre eles. O cereal deorigem alemã, por exemplo, é famosopor ser muito caro e melhoradordos outros mais fracos.“A globalização afectou to-dos e os grandes grupos do-minam m o mercado”, explica, realçandoque as empresas mais pequenas,como é o caso da sua, têmque ter uma oferta diferenciada ereconhecida pelas pessoas.“EU AINDA COMPRO TRIGOCOM UM APERTO DE MÃO”A passagem de testemunho foirelativamente fácil porque a avóLuísa continuava a ser um pontode referência em termos de fornecedorese clientes. “Todosconhecem a voz dela ao tele-fone. É uma marca”, conta FilipeQuitério, acrescentando queeste é um sector onde ainda édado valor à palavra e ao conhe-A fábrica produz diariamente 15,5 toneladas de farinhade trigoA velha fábrica de 1940 tem acompanhado o progresso tecnológico cominvestimentos sucessivos em maquinariacimento cimentado em muitosanos de relações comerciais. “EuEuainda compro trigo com umaperto de mão”, comenta o jovemempresário.Filipe Quitério costuma até dizeraos seus clientes que o seupapel é relativamente fácil porqueo avô deixou tão bom nome,que é bastante bem recebido nomeio. Na zona não há nenhumapanificação que não conheça amoagem das Gaeiras.É o neto que define o avô comosendo “um homem bom”, destacandoo seu envolvimento nosprojectos das Gaeiras, ondeapoiou a construção de algunsequipamentos e foi dirigente associativo.Em sintonia com esseespírito solidários, a viúva, MariaLuísa, doou à Junta de Freguesiao velho moinho construídopelo seu pai em 1920.O actual gerente destaca quea empresa não possui créditospendentes. “O dinheiro é nos-so e está tudo pago”, diz, escusando-sea divulgar o volumede negócios da empresa.Uma das preocupações para ofuturo é a falta de trigo. “Já di-zia o meu avô que é como ovinho: o trigo português émuito mais saboroso e esteano, por exemplo, há poucocereal”, explica o gestor da moagemdas Gaeiras que armazena600 toneladas de trigo porano, proveniente de terras lusas,a que junta o espanhol, alemãoe francês.Contudo, a escassez de trigoque se tem registado nos paísesconsiderados celeiro da Europanão lhe tira o sono, pois há semprealternativa, nomeadamentecom o fornecimento oriundo daAmérica.“Isto acontece porque nãohá gente nova no trigo”, refere,reconhecendo que esta produçãode trigo não é lucrativa, oque leva a que haja menos cerealde origem nacional e, consequentemente,com menos qualidade.O futuro deverá delinearseao nível da panificação, com oajustamento dos químicos e outrasformas artificiais de substituiçãoda farinha.“Isto será a minha vida”,conta agora Filipe Quitério, queestá a gerir a moagem desde queo avô faleceu, há um ano e meio.Conta com a colaboração dosempregados, “que estão cá háuma vida”, e da avó, que continuaa fazer a contabilidade, agoraem sua casa. Esta, em jeito debrincadeira, remata: “passei avida inteira a contar dinhei-ro, mas nunca era meu”, lembrandoque tinha apenas 10 anosquando o pai lhe entregou os dinheirose uma caixa que elaaprendeu a gerir com o guardalivrosque apoiava a fábrica. “ Iaaos bancos das <strong>Caldas</strong> e to-dos me conheciam: lá vem amenina das Gaeiras, diziam”.Há cerca de quatro mesescompraram um camião cisterna,para fazer as entregas aos clientes.“Vamos atrás do futuro”,conta o jovem gestor, que quercontinuar com a informatizaçãoda fábrica.Por agora, Filipe mora em Sacavéme desloca-se às Gaeirastodos os dias. Faz parte dos seusplanos vir morar nas Gaeiras porquedirigir uma empresa implicaestar mais presente.Entretanto, gosta do tempoque despende no percurso:“para cá pensa-se no que sevai fazer e no regresso pen-sa-se no que se fez”.Fátima Ferreirafferreira@gazetacaldas.comJoão Silva esteve 40 anos ao serviçoda fábrica“Sabia se a fábrica estava a trabalhar bem ou malsó pelo som que emitia”, recorda João Silva que “viveu”na fábrica entre 1965 e 2005.Natural das Gaeiras, onde nasceu em 1940, João Silva começoua trabalhar na moagem com 25 anos. Vivia-se o ano de 1965e tinha acabado de cumprir o serviço militar em Angola. Deregresso à terra natal começou a trabalhar à experiência por ummês e depois, “como era uma pessoa pacata, que respeita-va a casa, os patrões entenderam que eu era a pessoaindicada para lá trabalhar”. E foi o que fez toda a vida, atéque se reformou aos 65 anos e saiu, já lá vão quatro anos.João Silva foi trabalhar para a fábrica como ajudante e dasfunções faziam parte o carregamento e descarga do trigo, ensacara farinha e carregá-la para os clientes. Depois começou aaprender como se fazia a farinha com José Quitério, que era omoleiro, e passou a tomar conta da fábrica na sua ausência,como encarregado.“Sabia se a fábrica estava a trabalhar bem ou mal sópelo som que emitia”, diz. Foi ajudante de moleiro, mas faziao trabalho tão bem como se fosse moleiro e dá nota pública dosseus conhecimentos: via a água que o trigo tinha que levar,consoante o cereal era mais rijo ou mole, para que este ficassebem peneirado.A boa farinha resulta de um bom trigo mas, segundo esteantigo empregado da fabrica, também deve ser bem peneirada,de modo a dar interesse ao patrão e ao freguês. O braço direitode José Quitério na laboração da fábrica conta que nunca precisaramde um viajante para vender farinha pois são os própriosclientes que os procuram.“A nossa farinha era e é falada por todo o lado. É feitaao natural, com o que o trigo dá”, diz, pondo em contrapontoa produzida pelas grandes fábricas onde é colocado fermento.O especialista explica ainda que a farinha para ser boa “nãoprecisa ser muito branca, mas um bocadinho trigueira.Faz bom pão e não deixa que o pão enrije tão depressa”,afiança.Ainda hoje a esposa cose pão caseiro com a farinha JoséQuitério. “Assim sabemos que estamos a comer pão natu-ral, enquanto que no padeiro a farinha já tem aditivos”,explica.CRONOLOGIAF.F.1920 – Joaquim Rebelo constrói um moinho nas Gaeiras e começaa moer trigo e a fazer farinha1924 – Nasce José Félix Quitério, futuro genro de Joaquim Rebeloe futuro dono da fábrica de moagem de farinha denominadaJosé Félix Quitério1940 - Joaquim Rebelo constrói a fábrica de farinha nas Gaeiras1960- Morre Joaquim Rebelo, ficando os dois genros (José FélixQuitério e Gil Palma) a gerir a moagem1976 – José Quitério e Maria Luísa compram a fábrica salvando-ada falência2004 – Filipe Quitério começa a trabalhar na fábrica com o avô2009 – Morre José Félix Quitério e o neto, Filipe, assume agestão da fábrica


18Centrais5 | Novembro | 2010, VUMAMA EMPRESAMPRESA, , VÁRIAS VGERAÇÕESGabinete de Contabilidade Rosa Barreto há 30 anos cDuas fotos de família em diferentes contextos. Há 20 anos numa visita ao Cabo da Roca e na semana passada em frente à empresa. António e Rosa Barreto são responsáveispela área de Gestão Laboral, o filho mais velho, Eurico, pelo departamento de Contabilidade e o mais novo, Euládio, pela área dos Seguros.“Um gabinete de contabili-dade não deve fazer apenas acontabilidade. Deve estar aolado e ajudar o cliente porquecom o crescimento deles cres-cemos nós também”, afirma AntónioBarreto, o patriarca da família.Embora tenha nascido em Soure,desde bebé que António Barreto vivenas <strong>Caldas</strong> da Rainha, de onde osseus pais são naturais. Tem 59 anose é sobrinho do professor Abílio MonizBarreto, que foi director da EscolaComercial e Industrial Rafael BordaloPinheiro na década de 20 do séculoXX.Em 1968, com um meio irmão maisvelho, foi para França a salto porqueestavam contra a participação naguerra do Ultramar. Durante doisanos trabalhou em Saint-Maur numaempresa de montagem de componenteselectrónicos, mas começoua pensar no seu futuro e decidiu voltarpara Portugal em finais de 1970.“Fiquei doente por causa deum abcesso e comecei a pen-sar no que seria de mim se meacontecesse alguma coisa”, recordou.Curiosamente, acabou por termais problemas para voltar a entrarem Portugal do que para sair.“Quando foi para sair a salto,pagamos a alguém, mas no re-gresso foi mais difícil porquenão tinha passaporte”, contou.Ou seja, no Portugal de antes do 25de Abril era mais fácil fugir do paísdo que nele entrar voluntariamente.António Barreto acabou por conseguiro passaporte no consulado deBiarritz, depois de aconselhado pelapolícia francesa. “Ainda bem quetratei dos papéis porque nocomboio de regresso, e aindaestrada de Tornada (onde hoje estãoas instalações do grupo Fonsecas).A sua futura mulher trabalhava no escritórioe António nas oficinas. Umemprego provisório antes de partirpara o Ultramar.Poucos meses depois, em Angola,recebe notícia do nascimento dofilho, Eurico.que deu emprego a muita gen-te naquela altura”, comenta,acrescentando que ainda se lembrade colaborar na construção das instalaçõesda empresa. “Carregámosmuitos baldes de cimento e le-vantámos muitos pilares”, disse.Em 1978 António Barreto foi aju-em Espanha, apareceu a Pide”.Já em Portugal apresentou-sevoluntariamente para fazer a tropaem atraso e não teve problemas porqueera considerado refractário enão desertor. Fez a recruta em SantaMargarida, a especialidade no Portoe seguiu para Angola, onde esteve20 meses. “Vim mais cedo porcausa do 25 de Abril, em No-vembro de 1974”, referiu.Entretanto António conheceraRosa. Estava-se em 1971 e ambostrabalhavam nas oficinas Bento, naNa altura em que ficou grávida doprimeiro filho, Rosa Barreto sai dasoficinas Bento e começa a trabalharno escritório de contabilidade deMaria Efigénia e Abílio da Silva, narua Emídio de Jesus Coelho. “Aindahoje lhes estamos gratos porquelhe deram emprego mesmoestando grávida e apoia-ram-na sempre”, salientou AntónioBarreto.Quando regressou do Ultramar, ofuturo empresário começou por trabalharna Condaço “uma fábricadar o negócio de sucata do sogro(junto ao local onde agora existe arotunda dos silos) e em 1980 juntouseà sua mulher no gabinete de contabilidade.“No dia que eu fiz 30 anos, a23 de Novembro, a dona Efigé-nia propôs-nos ficarmos com oescritório de contabilidade”,contou o empresário. Fizeram umcontrato vitalício, no qual passarama pagar uma renda mensal (que temvindo a ser actualizada) à antiga proprietária.A designação “Gabinete Rosa Barreto”surge em 1980, mas ainda emnome individual. Há 30 anos atrás játinham cerca de 150 clientes, praticamenteo mesmo número que têmem 2010. Algum deles mantém-sedesde a criação da empresa. “HáHáclientes cujas famílias já vãona terceira geração e até háA celebrar em 2010 o seu 30º aniversário, o Gabinete de Contabilidade Rosa Barreto é uma empresafamiliar que vai na segunda geração, no qual toda a família assume funções distintas.O casal fundador da empresa - António e Rosa Barreto - é responsável pela área de Gestão Laboral, ofilho mais velho, Eurico, pelo departamento de Contabilidade e o mais novo, Euládio, pela área deSeguros.Como os dois filhos têm uma diferença grande de idade (10 anos), é como se coexistissem nogabinete três gerações diferentes.O trabalho que fazem é completo, desde o processo de criação de uma empresa, à gestão dos recursoshumanos, ou até a área dos seguros.alguns deles aos quais a Gaze-ta já fez esta reportagem”, referiuAntónio Barreto.“O O facto de sermos uma empresafamiliar é também por-que temos muita proximidadecom os clientes”, diz o empresário.E daí a necessidade de manterum número estável de clientes.Quatro anos depois de assumiremo gabinete, em 1984, mudam deinstalações para a rua Raul Proença,ao lado do antigo edifício da Ga-zeta das <strong>Caldas</strong>.“Estávamos numa sala mui-to pequena e precisávamos demais espaço”, explicou AntónioBarretoNo ano 2000 mudaram para instalaçõesna rua Visconde de Sacavém,onde estiveram até 2005, quando seinstalaram definitivamente na rua doFunchal, 39-A. Remodelaram totalmenteo espaço e criaram um escritóriocom condições para todos osfuncionários. “Temos investidosempre na empresa aquilo queganhamos”, adiantou António Barreto.Ao longo dos anos o trabalho foisendo facilitado por novas ferramentas(principalmente os computadores),mas complicado com as novasregras do Estado.“Fomos o primeiro gabinetede contabilidade das <strong>Caldas</strong> ater um computador, em 1984.Houve colegas nossos que vie-ram cá ver”, contou Rosa Barreto.O computador Olivetti custou 700contos (3.500 euros), mas com as impressorase o programa informático,o investimento total foi de 1200contos (5.100 euros).Se só havia nas <strong>Caldas</strong> um gabinetede contabilidade com computador,tal raridade era-o também aonível das empresas pois dos mais de100 clientes, só havia também em1984 uma empresa com essa novaferramenta.Rosa Barreto em 1974 quando dava os primeiros passos na contabilidade, ainda no gabinete de Maria Efigénia e Abílio da Silva, e dez anos depois no seu próprio escritório na R.Raul Proença. À direita, a jovem Cidália a escrever à máquina.


Centrais195 | Novembro | 2010om as contas em diaA aposta nos computadores surgiupela necessidade de fazer osmapas salariais e recibos dos ordenados,mas não para a contabilidadeem si. “Os programas que exis-tiam para contabilidade eramainda muito rudimentares”, explicouAntónio Barreto, que ainda serecorda das velhinhas disquetes de5 ¼ (discos amovíveis com capacidadeaté 500 kb).Na década de 80 também aindaprecisavam de se deslocar a Leiriapor causa das questões relacionadascom a Segurança Social, inclusivamentepara fazer os pagamentosdas empresas e particulares.Rosa Barreto diz que hoje os clientesestão cada vez mais bem informadose exigentes quanto ao trabalhode um gabinete de contabilidade.“Antigamente não sabiamde nada e agora têm acesso atoda a informação”, explica a empresária.“Às Às vezes acabam pordar menos valor ao nosso tra-balho porque pensam que ascoisas são simples, mas nãosão”, considera.“PRINCIPAL CAPITAL SÃO OSFILHOS”Em 1995 criaram a sociedadeRosa Barreto – Contabilidade e Gestão,Lda, com capital social de 120mil euros, passando pais e filhos aserem sócios.Para António e Rosa Barreto, oseu principal “capital” são os filhos.Desde que eles eram adolescentesincentivaram-nos a seguir para auniversidade e a frequentarem licenciaturasno sector de actividade daempresa.O casal está orgulhoso pelo factodos seus filhos se terem integradobem no gabinete e também por sedarem todos muito bem. O irmãomais velho chegou a dar de biberãoao mais novo e até a mudar-lhe afralda. “Era quase como paidele”, referiu Rosa Barreto.Como cada um se especializounuma área dentro do gabinete, contribuemtodos de igual forma. “Tra-balhámos sempre todos juntose nunca tivemos problemas”,afirmou a matriarca.No irmão mais velho, Eurico Barreto,desde cedo se notou que o seufuturo iria passar pelo gabinete decontabilidade e desde sempre pensouem trabalhar com a família.Aos 11 anos já ajudava os seuspais. “Ele andava na escola edepois vinha para aqui traba-lhar na máquina de escrever”,contou António Barreto.A primeira memória que EuricoBarreto tem é a de organizar o arquivo.“Recordo-me que nas fériasos meus amigos todos iam paraa praia e eu passava tardes aarquivar papéis”. Isto ainda no primeiroescritório, na rua Emídio deJesus Coelho. “Era do tamanhodesta sala em que estamosdem dos Técnicos Oficiais de Conta,agora e as escadas rangiam porà qual teria acesso directo mais tar-todo o lado”, recordou.de, por causa da licenciatura.Depois os pais convenceram-no Como responsável do departamentoda contabilidade torna-setambém a trabalhar em part-time,sendo recompensado monetariamentepor isso. “Essa parte sabiada empresa.bem e comecei a perceber aPara Eurico Barreto a maior van-noção do dinheiro. Comeceitagem de uma empresa familiar é alogo a meter dinheiro de parte,confiança absoluta que existe entretalvez pela minha tendênciaos sócios. “Nós temos uma rela-economicista”, lembrou. Era numção muito próxima”, afirmou.como uma das faces mais visíveisdos livros da colecção dos Três Mosqueteirosque guardava as notas, Um hábito que mantiveram mesmoQuase todos os dias almoçam juntos.para ficarem direitas.depois de Eurico Barreto se ter casado,há sete anos (tem um filho deAos 11 anos achava “uma seca”fazer aquele trabalho, mas ao entrar dois anos e uma filha de cinco anos).na adolescência começou a ler jornaise a interessar-se pela actuali-os papéis estejam bem definidosEssa relação tem ajudado a quedade. Tinha 16 anos quando Cavaco dentro da empresa.Silva, enquanto primeiro-ministro, “Hoje os meus filhos é quefoi para uma parte da sua geraçãodecidem quase tudo, especial-“um mentor”.mente o Eurico”, admite o pai. OEmbora não se interesse pela casal continua a fazer o seu trabalho,mas os filhos assumem um pa-vida partidária, assume que ter umprofessor de Economia como primeiro-ministronuma conjuntura favorápelcada vez mais preponderante.vel era fascinante para um jovem que FILHO MAIS NOVO APOSTAse interessava pela área económica.Mas hoje, em 2010, com 38 anos,NOS SEGUROSjá não dá muito crédito à política. Euládio Barreto, o filho mais novo,Eurico Barreto licenciou-se em nasceu em 1984, já depois da criaçãoda empresa.Economia na Universidade Autónomade Lisboa, depois de ter iniciado As primeiras memórias são daso curso no pólo das <strong>Caldas</strong>.brincadeiras que fazia. “Lembro-Embora admita que o curso deme de chegar ao gabinete, to-Gestão poderia ter sido mais práticarà campainha no rés-docopara o trabalho que faz, entendechão e subir até ao primeiroque o facto de ser economista o ajuandarde gatas. Não viam nindaa si e aos clientes. Até porqueguém a subir e depois eu já apa-optou por especializações na árearecia por detrás das pessoas”,da Contabilidade Analítica e Fiscalidade.Aos 17 anos começou a trabalharrecordou, divertido.Em 1995, com 21 anos e ainda sem mais a sério no escritório, a dara licenciatura concluída, assume a apoio administrativo. Mais tarderesponsabilidade do departamento passou também para a contabilidade.de contabilidade da empresa. Paratal, fez o exame de admissão à Or- Embora o seu sonho fosse a áreaEurico a dar de biberão ao seu irmão mais novo,Euládio.do Desporto, os pais influenciaram-noa seguir a área de Economiano ensino secundário.Euládio Barreto, com 26 anos,foi jogador das camadas jovens do<strong>Caldas</strong> Sport Clube, do Sport UniãoAlfeizerense e do Óbidos SportClube. “Os meus pais desmoti-varam-me sempre de seguira vida de futebolista”, referiu.Concluído o 12º ano, EuládioBarreto foi para o Instituto Superiorde Contabilidade e Administraçãode Lisboa, mas nunca chegoua concluir a licenciatura. “Nãome adaptei facilmente à capitale achei que seria melhorvir trabalhar para o ga-binete”, explicou.Ao mesmo tempo que trabalhavana empresa nas <strong>Caldas</strong>, continuoua licenciatura em Contabilidadeno Instituto Superior Politécnicodo Oeste, em Torres Vedras.Mas ficou desiludido com o ensinosuperior, porque aquilo que seensinava não tinha a ver com a práticado dia-a-dia.Durante dois anos esteve ligadoao sector da gestão financeirado gabinete, no qual teve um contactodirecto com os bancos. Essaexperiência fez com que começassea interessar-se pela área dosseguros.Esteve dois meses a tirar o cursode mediador de seguros e agoraassume este sector dentro daempresa. “É uma área do qualgosto muito, pelo contactocom as pessoas e pelos conhecimentosque se adqui-rem”.Euládio Barreto quer que o gabineteseja um dos maiores mediadoresda região e espera umdia ultrapassar em volume denegócios as outras áreas da empresa.“Mais do que razõesmonetárias, é uma ambiçãode fazer crescer esta em-presa”, salienta, afastandoqualquer hipótese de sair do negóciode família.“Um dos pilares para aminha formação como pes-soa e como empresário é omeu pai. É por ele que eutenho essa ambição de fa-zer crescer aquilo que elecomeçou com tantas difi-culdades”, disse.Isto apesar de achar queexistem mais desvantagens doque vantagens em trabalhar emfamília, por causa do desgasteque isso pode provocar na relaçãoentre todos. Como é o maisnovo, sente que precisa de estarsempre a provar o seu valor.Para já, tem tido bons resultadosporque a área dos seguros temcrescido bastante dentro do gabinete.Pedro Antunespantunes@gazetacaldas.comPME Líder há dois anosDe uma pequena sala a empresa cresceu para umasamplas instalaçõesCom um volume de negóciosde quase 460 mil euros e dandoemprego a 15 pessoas (incluindoos sócios), o Gabinete Rosa Barretoé a única empresa desteramo no distrito de Leiria distinguidacomo PME Líder, que premeiaas empresas com melhoresdesempenhos e perfis de risco.O estatuto é atribuído peloIAPMEI e Turismo de Portugal emconjunto com os bancos parceiros,com base em notações derating e em critérios económicofinanceiros.Segundo Eurico Barreto, a criseeconómica tem-se feito sentirnos seus clientes. “Nós per-cebemos bem as dificuldadesdos nossos clientes. Somosos primeiros a saber quandoas coisas estão mal”, revelou.Apesar de tudo, entre os clientestêm sido poucas as insolvências.“Podem não ser mui-tas, mas como antes nãoacontecia, para nós já é mui-to”, comentou Eurico Barreto. EmCidália Ribeiro foi a primeirafuncionária desta casa e, 18 anosdepois, ainda lá continua. Duranteeste tempo, Cidália Ribeiro foiaprendendo as suas funções naempresa onde foi parar “umpouco por acaso”. A principaldiferença que nota no seu trabalhoprende-se com a utilização doscomputadores “que tornou tudo2010 houve três empresas clientesque declararam insolvênciae em 2009 nenhuma. “Nós apoiamosbastante os nossos clientese ajudamos a ultrapassardeterminados proble-mas”.Na sua opinião, o principalproblema passa agora pela dificuldadede acesso ao crédito.“Há Há empresas que até têmnegócios bons e ideias paraimplementar, mas queremprogredir e não conseguempor causa dessas limita-ções”, considera, lembrandoque a Microsoft nasceu numagaragem.Outra dificuldade nas micro epequenas empresas é o facto deos empresários poderem serbons na sua área, mas depoistêm limitações ao nível da gestãodo quotidiano. Por isso, EuricoBarreto defende que osempresários devem saber apoiar-sedevidamente.A primeira funcionária continua naempresaCidália Ribeiro está no gabinete há 18 anosP.A.mais fácil”.A funcionária mais antiga dogabinete recorda-se de comocomeçaram numas instalaçõespequenas e foi com agrado queassistiu às sucessivas mudançase à evolução e consolidação daempresa.P.A.


20Centrais12 | Novembro | 2010, VUMAMA EMPRESAMPRESA, , VÁRIAS VGERAÇÕESA. Flores Lda. é uma das mais antigas empresas dasdiversificação da sua actividadeAbílio Flores (1921-2004) iniciou a sua actividadeempresarial em 1945. O seu sucesso deveu-se, em grandeparte, à capacidade de aproveitar os produtos em fase decrescimento.Abílio Flores nasceu em Santarémem 1921. Aos sete anosmudou-se para as <strong>Caldas</strong> da Rainha.Nesta altura, a residênciade Abílio Flores dependia deonde o pai, que era Sargento doExército, estava acantonado. Amudança de quartel foi o quetrouxe a família para as <strong>Caldas</strong>,de onde não mais sairia.Abílio Flores fez o seu percursoacadémico na Escola Comercialdas <strong>Caldas</strong> da Rainha, ondese formou com o grau equivalenteao antigo quinto ano, em 1935.A aprendizagem seguiu nas Finanças,onde esteve à experiência,seguindo-se um emprego noThomaz dos Santos, que durouaté à altura de abrir o seu próprionegócio. Fê-lo à sociedadecom dois bons amigos: FranciscoPereira Brazão, filho de um entãoreconhecido alfaiate caldense,e José Filipe de Sousa Campos.Estávamos em 1946.O nome da empresa foi escolhidoapelando ao coração. Juntavaas iniciais das namoradasde cada um. Clotilde era a namoradade Abílio Flores - professoraprimária com quem viria acasar e constituir família - e emprestouas três primeiras letrasdo nome para formar Clozaque.O ramo abraçado pelos trêssócios foi o dos electrodomésticos- ao qual a empresa aindahoje se mantém fiel -, que conheceuum período de grandeexpansão em meados do séc. XX.“Foi nessa altura que secomeçou a usar o gás emcasa e a empresa teve umpapel muito importante nasua introdução nos lares cal-denses”, diz Orlando Flores. Osfogões, quem os tinha, eram alenha. A água era aquecida aolume. O gás representava entãouma grande simplificação do usodo fogo nos lares e apesar de teresquentador em casa ser privilégiode poucos, afigurou-se umaimportante alavanca para o arranquedo negócio.A loja funcionava num pequenoescritório junto à Praça da Fruta,por cima do Pelicano, mas asociedade não se manteve pormuito tempo. Dos três sócios,Abílio Flores era o único que trabalhavaa tempo inteiro na empresae o único que dela dependiapara gerar rendimentos eacabou por ficar sozinho. A sociedadedesfez-se sem trauma.DIVERSIFICAÇÃO PERMITIUFAZER A EMPRESA CRESCEREm 1948 a empresa muda deClozaque para Abílio Flores econhece uma grande evoluçãocom a diversificação da oferta. Asegunda aposta recaiu sobreOrlando Flores (nascido em 1950) começou na empresa do pai como empregado e tem hoje a enormeresponsabilidade de a manter num tempo de profunda crise económicaoutra indústria que ganhavaenorme fôlego com o fim da IIGrande Guerra: o automóvel.“Ele dizia-me muitas vezesque o pai dele deixou-lhe asruas para passear”, conta OrlandoFlores. “Era muito novoquando começou, mas tinhaaquele espírito de querer sin-grar na vida. Era inteligente,perspicaz e muito trabalha-gward, ou ainda os jipes Willys-Overland, entre outras.Durante a década de 50 o negócioconheceu várias ramificações,embora sempre debaixo damesma denominação. “Umascoisas apareceram, outrasele foi à procura. Vieram outrasrepresentações e as coi-sas evoluíram rapidamentenos anos 50 e por aí fora”,dor, apanhou as novidadessublinha Orlando Flores.todas a aparecer e teve luci-Para além dos electrodomés-dez para as aproveitar. Issoticos e dos automóveis, a Abíliopermitiu-se solidificar a em-Flores comercializava nesta fasepresa e ganhar a dimensãocoisas tão distintas como máqui-que atingiu”, acrescenta. nas de escrever, motorizadas,A mudança deu-se no nome e colchões e tractores agrícolas.na localização. O stand de automóveis,que manteve o nome importante suporte do negócio. AEstes últimos eram também umClozaque, nasceu na esquina das representação foi conseguida atravésdas boas relações com o im-ruas Leão Azedo e SangremanHenriques e conheceu a representaçãode várias marcas. Al-relações familiares com o imporportadorda Mercedes, que tinhagumas chegaram aos dias de tador dos tractores Massey Fergusson.“Eram dos melhoresou Alfa Romeu. Outras já só seque existiam na altura e foi umencontram nos museus, como anegócio bastante bom en-inglesa Austin (responsável peloquanto a agricultura durou…”,célebre Mini) a Packard, a ame-diz Orlando Flores. A representa-hoje, como a Mercedes, Peugeotricana Studebaker, a alemã Borçãodurou cerca de 30 anos, até aoEstávamos em meados dos anos 40, no após II Guerra Mundial. As economias restabeleciam-se devários anos de depressão, ao passo que novas tecnologias chegavam aos lares e o mercadoautomóvel afirmava-se como o mais importante do séc. XX. Janelas de oportunidade para umjovem de 25 anos, que aproveitou para lançar uma empresa que dura até aos dias de hoje.Clozaque pode não ser um nome familiar a muita gente, mas foi com esta designação que começouaquela que viria a tornar-se uma das mais bem sucedidas empresas caldenses - a A. Flores,Lda.Abílio Flores (1921–2004) foi o jovem empreendedor que a lançou, em 1946 (então com mais doissócios). Hoje é o filho Orlando Flores, de 50 anos, que dá continuidade a esta empresa.início da década de 80.Em 1954 a empresa dava novopasso importante, ao mudar-separa o edifício dos Capristanos(hoje estação rodoviária). O edifíciosede da A. Flores, Lda. é propriedadeda empresa desde 1995,mas na época fazia parte do própriocomplexo dos Capristanos(mais tarde Claras, depois RodoviáriaNacional e hoje Rodoviáriado Tejo).Ali se concentraram a loja deelectrodomésticos - onde aindase mantém -, o stand de automóveise nasceriam ainda a lojade peças multimarca - que semudou para o Borlão em 1970 -, emais tarde a agência de segurosClozaque e uma papelaria.“O MEU PAI FOI O MEUGRANDE PROFESSOR NESTAACTIVIDADE”A década de 60 começa com achegada de um novo membro àfamília, com o nascimento deOrlando Flores.Habituado a crescer lado alado com a empresa do pai, Orlandoacompanhava-o muitasvezes nas deslocações de negócios,especialmente nas férias daescola. Passatempo de criançaera também acompanhar os funcionáriosda casa nos serviços.“Ia aos mais diversos sítios,na distribuição do gás, naassistência dos electrodomésticos,andava assim en-tretido”, recorda.O gosto pelos automóveis foicrescendo com os anos. “Fuiganhando interesse, essascoisas solidificam, ganhamuma dimensão, e depois deser o gosto pelos carros, passoua ser o gosto de ter o ne-gócio em si e transmitir estapaixão às pessoas”.Orlando Flores estudou até ao12.º ano e chegou a frequentar ocurso de Direito, mas desistiu eabraçou o negócio do pai em 1981.Começou por baixo, a trabalharnas peças, e passou por váriossectores até chegar a assessordo pai. Seguiram-se algunsanos de gestão conjunta. “Depoisfoi-me passando as pastasde forma gradual, deixou-me tomar as decisões maisimportantes e nos últimos 10anos de vida ele foi um con-selheiro”, diz Orlando Flores. Umpapel importantíssimo, sublinha,até porque ainda hoje tem emconta as ideias pelas quais AbílioFlores se regia. “No fundoele foi o meu grande professornesta actividade, foi vali-osíssimo”.Joel Ribeirojribeiro@gazetacaldas.com


Centrais2112 | Novembro | 2010<strong>Caldas</strong> e com maiorAutomóveis foram a âncora do negócioQuando em 1948 se iniciou no mercadoautomóvel, conseguindo a representaçãoda Peugeot e de outras marcasque estavam associadas ao mesmo importador,Abílio Flores construiu aquelaque seria a grande âncora da suaempresa.Apesar de nunca ter abandonado aideia que deu origem à empresa comos seus dois associados, no ramo doselectrodomésticos, foi o mercado automóvelque permitiu um considerávelcrescimento da A. Flores Lda.“Na altura havia muito poucosautomóveis nas <strong>Caldas</strong> e quandoele passou a ter representação dasmarcas era novidade”, diz OrlandoFlores. Uma novidade bem aceite e queteve grande expansão. À Peugeot juntaram-sevárias marcas durante as décadasde 50 e 60.Com o desaparecimento de marcasmais efémeras, formou-se um núcleocom o qual a A. Flores, Lda. passou atrabalhar: a Peugeot e a Renault eramas principais, apoiadas por Alfa Romeue Honda.Para além da venda de viaturas e respectivaassistência, o negócio expandiu-se,ainda nos anos 60, com ao ramodas peças multimarca. “Durante muitosanos foi um negócio muito for-te, mas com a evolução técnica dosautomóveis o negócio das peque-nas oficinas começou a fraquejar ea partir dos anos 90 deixou de justi-ficar”, explica Orlando Flores.Em 1978 foi também criada uma oficinaespecializada no serviço de chapae pintura, com o nome Floresauto, quemais tarde viria a fundir-se com a empresaA. Flores, Lda., ficando o nomeagregado ao negócio da Peugeot e daHonda.Nos anos 80, a Renault assumia umadimensão tal que obrigava, em 1983, àcriação de uma empresa dedicada. AFlorescar teve direito a casa nova naestrada Tornada, onde hoje se mantém,apesar de defender marcas diferentes.Em 1994 a intransigência daRenault em fundir os representantesnas <strong>Caldas</strong> e em Alcobaça resultou emruptura.“Essa situação não nos agradoue como a Renault colocou as coisas,ou era assim ou não era, optámospor dar o volte face à ques-tão: encontrámos a Volkswagen eentão dissemos não à Renault”,conta Orlando Flores.A mudança aconteceu em boa hora,defende, porque apanhou a Renault emfase de quebra e a Volkswagen em ascensão.“O importador mudou, tinhauma ideia de grande desenvolvi-mento, e na Alemanha a marcatambém estava em reestruturação,com mais vitalidade, com umagama maior e com um reposicio-namento de preços. Foi na melhoraltura que fizemos a mudança”.Agregada à Volkswagen veio a Audi,que era do mesmo importador, que começoua ser comercializada com a denominaçãoLubriflores.Cinco anos antes, a A. Flores, Ldatinha abandonado também a Peugeote a Alfa Romeu, mantendo a Honda.CRISE OBRIGOU A REESTRUTURAÇÃOA A. Flores, Lda chegou a dar empregoa 100 pessoas, mas actualmente,depois de uma profunda reestruturaçãooperada em 2007 para fazerface à crise, reduziu o seu quadro depessoal para 72 funcionários. “Fize-mos economias onde podíamosfazer, melhorámos performancesonde era possível, a empresa estáequilibrada e se as coisas melhorarempodemos evoluir significa-tivamente”, diz Orlando Flores.Em 2008 o grupo atingiu uma facturaçãode 12 milhões de euros, descendoem 2009 para 11 milhões. Paraeste ano estima-se um valor ligeiramentesuperior ao de 2008.Já quanto ao futuro, Orlando Floresestá apreensivo. “A economiado país está doente e precisa deum período de cura que vai serdifícil”, afirma. Essa cura é um cenáriodo qual a A. Flores, Lda não seexclui, “mas se o contexto melho-rar e o país tomar as medidas queé preciso tomar, é possível sobrevivercom muito sacrifício e cau-tela”.Entretanto, é possível que a empresapossa chegar a uma terceirageração. O filho de Orlando Flores,Afonso Flores, de 20 anos, está a tirara licenciatura em Gestão de Empresase apesar de não ser ainda certoque siga os passos do pai e do avô,Orlando Flores diz que vai fazer ospossíveis para que isso aconteça.“Ainda é cedo para saber se issovai acontecer, mas era uma ter-ceira geração a trabalhar nestaempresa. A decisão será dele,mas farei tudo para o influenciarnesse sentido”.J.R.Mário Freitas trabalhou com Abílio Floresdurante 20 anosCom 25 anos na A. Flores,Lda não é o funcionário commais anos de casa, mas, paraalém de ter sido um dos braçosdireitos de Abílio Floresnos últimos 20 anos de actividadedo empresário, MárioFreitas tem a particularidadede coleccionar artigosque se relacionam com a empresa.Chegou à A. Flores, Lda em1986, com 24 anos, para asvendas. Nessa altura já tinha“Abílio Flores era um homem de bom-o gosto pelas coisas antigassenso, todas as decisões que tomavae a curiosidade levou-o abatiam certo com o que dizia”perguntar as raízes da empresaao patrão. Abílio Flores não guardava arquivo de fotografias antigas, nemoutros documentos (no que constituiu uma dificuldade na feitura desta reportagem),mas acedeu a contar-lhe a sua história, desde a origem até à criação daempresa e o seu desenvolvimento. Depois, por iniciativa própria, Mário Freitaspesquisou nos arquivos e nos armazéns. “Guardava tudo o que encontrava deantigo, ele achava piada e passou a entregar-me também as coisas queencontrava”, conta.Ao fim de quatro anos, Mário Freitas passou a chefiar o departamento comercialda empresa, mas foi em 1994 que viveu um dos maiores desafios. A A. Flores, Ldatinha acabado de rescindir com a Renault para passar a representar a Volkswagen,mas durante um ano teve que manter as duas marcas. Mário Freitas ficou com asegunda marca juntamente com um vendedor e um mecânico, num espaço comcondições limitadas na Rua Heróis da Grande Guerra, à espera que as instalaçõesda Renault ficassem livres.Nessa altura Abílio Flores mostrava algum receio, devido aos preços mais elevadospraticados pela marca e pelo desconhecimento que havia, porque não haviarepresentação nas <strong>Caldas</strong> nessa altura. “Mas disse-lhe que íamos arrancar emforça e inundar as <strong>Caldas</strong> de Volkswagen e foi uma surpresa muito gran-de porque o volume de negócios foi muito superior ao da Renault com 40pessoas e um espaço muito maior”.Mário Freitas diz que, enquanto patrão, Abílio Flores era uma pessoa de bomsenso.“Ao longo dos 20 anos nunca tivemos um atrito, o que é raro ouquase impossível numa relação patrão funcionário. Por vezes não con-cordávamos e manifestávamos opiniões contrárias, mas ele aceitava-asperfeitamente”.Bom-senso que o ajudou nos negócios, acredita. “Todas as decisões quetomava batiam certo com o que ele dizia”, recorda. A esta característica MárioFreitas junta lucidez e coragem pois ele “enfrentava os desafios sem receios equando os tinha, ninguém notava”.Enquanto cidadão, Mário Freitas sublinha o altruísmo de Abílio Flores, que independentementede não ter nascido nas <strong>Caldas</strong>, sentia a cidade como sua terra natale não hesitava em participar na vida activa da cidade. Foi, de resto, dirigente de váriasassociações, como a ACCCRO, a ANECRA, o <strong>Caldas</strong> Sport Clube, e do Rotary Club das<strong>Caldas</strong> - do qual foi sócio fundador e ao qual se juntaram, mais tarde, Orlando Florese o próprio Mário Freitas. “Estava ligado a tudo e tinha muita vontade departicipar nas coisas, era uma pessoa dinâmica”.J.R.Panfletos publicitários da empresa e dos produtos que mais vendia. Desde os automóveis (numprospecto de 1954) aos colchões, aos esquentadores (que só se massificaram em meados do séc. XX) atéao material de escritório<strong>Cronologia</strong>1921 – Nasce Abílio Vicente Flores em Santarém1946 – Abílio Flores funda a Clozaque com os sócios Francisco Pereira Brazão e JoséFilipe Campos.1948 – Os dois sócios deixam o negócio que fica entregue a Abílio Flores, que passatambém a ser a designação da empresa.1954 – Mudança de instalações para o edifício dos Capristanos, na Rua Heróis daGrande Guerra1960 – Nasce Orlando Flores.1968 – Inaugurado o stand de Alcobaça, que ainda hoje existe1975 – A empresa muda o nome para A. Flores, Lda.1978 – É criada a Floresauto, empresa que gere uma oficina de chapa e pintura.1980 – O nome Clozaque é reabilitado para designar a nova agência de seguros1981 – Orlando Flores começa formalmente a trabalhar na empresa do pai1983 – É criada a Florescar, para gerir o negócio da Renault, que se instala naestrada Tornada1990 – As marcas Peugeot e Alfa Romeu deixam de ser comercializadas pela A.Flores, Lda1994 – A Florescar abandona a representação da Renault e passa a comercializar asmarcas Volkswagen e Audi1995 – Aquisição do prédio dos Capristanos à Rodoviária2004 – Morre Abílio Flores. A agência de seguros Clozaque encerra2006 – A loja de peças multimarca é transferida da Praça 25 de Abril, para a Estradada Tornada. É construída a nova área de exposição automóvel para a Volkswagene Audi


20Centrais19 | Novembro | 2010, VUMAMA EMPRESAMPRESA, , VÁRIAS VGERAÇÕESEmpresa Sérgio Simões é uma das mais antigas e coSérgio Simões e a esposa Maria Joana Simões com as filhas, Vanda e Margarida fotografados em 1979 no cais da Foz do Arelho e hoje na sede da empresa de filateliaVivia-se o início dos nos anos 50do século XX quando Sérgio Simõespediu autorização ao pai para arranjarum cantinho filatélico, na lojade tecidos e confecções. O pai, AbelSimões, era um entusiasta da filateliae por isso Sérgio Simões, quenasceu em 1934, desde os 11 quetambém coleccionava selos, que porvezes vendia aos colegas da escola.A loja dos Simões ficava no LargoHeróis de Naulila, em frente aoCafé Marinto e o cantinho filatélicosurgia junto a uma das janelas doestabelecimento comercial.Tinha então 17 anos e ajudava opai no negócio, depois de ter tiradoo curso de Comércio na Escola Comerciale Industrial (hoje Escola SecundáriaRafael Bordalo Pinheiro).Sérgio Simões recorda que nãoera fácil arranjar selos naquela alturamas “eu conhecia váriaspessoas que coleccionavam eque se aproximavam de mimpois comecei a mandar vir osselos de fora “, disse.A maioria vinha de Lisboa, provenientede diversas casas da especialidade.O filatélico caldensecomeçou por ganhar três a cincotostões em cada venda o que lhepermitia, naqueles anos, “fazer ummulher, três anos mais nova, eracontralto.Sérgio Simões foi inclusivamenteum dos participantes da famosaSérgio Simões começou a vender selos em 1952 na loja do seu pai no centro das <strong>Caldas</strong> e mal podiaimaginar que iria construir uma das mais conceituadas e hoje das mais antigas empresas de filateliado país.Actualmente são as suas filhas, Margarida Roque e Vanda Morgado, que dirigem o negócio. O paiainda dá uma ajuda, mas se antes se dedicava a escrever cartas e a fazer catálogos para os seusclientes, hoje constata que é através da internet que o negócio prospera.A empresa caldense é a representante de algumas marcas europeias de material de coleccionismo,área que representa uma parte importante do negócio.figurão!”, recordou o especialista.Abrantes, onde várias entidadesdeslocação do Orfeão Caldense aSérgio Simões conheceu a sua caldenses foram calorosamente recebidas. “Fizeram-nos uma re-1947) no Orfeão Caldense. Os encepçãotremenda e houve ensaiosrealizavam-se na época natre as pessoas das duas locali-Rua Leão Azedo.dades uma confraternização“Um dia abri a porta do localexcelente”.dos ensaios e assim que a vi,Este empresário cedo percebeuengracei logo com ela, estavaque a sua vida seria ligada ao co-pois o encanto feito”, disse o coleccionismoe começou então a alar-esposa, Maria Joana (nascida emleccionador, que tinha então 21 gar a sua rede de clientes. Passadospoucos anos do início da anos. Era barítono e a sua futuraactivi-As viagens sempre misturaram lazer e trabalho, já que tinham a filatelia como panode fundo. Actualmente Sérgio e Maria Joana estão semi-reformados.dade filatélica, já tinha coleccionadoresde vários ponto do país.Em 1957 Sérgio Simões organizaa primeira grande exposição filatélicanas <strong>Caldas</strong>, no Grémio do Comércio,onde hoje está instalado oMuseu do Ciclismo. A grande mostraserviu para assinalar o 30º aniversárioda elevação das <strong>Caldas</strong> daRainha a cidade.“CASEI-ME COM ELE E COM OSSELOS”Em 1962 Sérgio Simões e MariaJoana casaram, mas até a lua-demel,em Sevilha, decorreu com afilatelia sob pano de fundo. Alémde terem percorrido várias casa filatélicasà procura de selos aindavisitaram um coleccionador espanhol,a quem compravam e tambémvendiam exemplares.“Casei-me com ele e com osselos”, conta Maria Joana Simões,recordando os idos tempos em quefoi ajudá-lo para a loja do seu sogro.Colocavam-se os dois no cantoda loja a trabalhar nos selos: “eleescolhia-os e eu embrulhavaospara seguir para os Correi-os. Foi assim o início da nossaempresa”, disse a matriarca da famíliaSimões, que instigava o maridoa ter arrojo nas aquisições filatélicas.Durante vários anos Sérgio Simõesfoi o responsável pela SecçãoFilatélica na <strong>Gazeta</strong> das Cal-das , iniciada em 1955 e que seestendeu ao longo dos anos 60 doséculo passado.“Eu inicialmente brincavacom a filatelia”, conta hoje SérgioSimões pois no início da sua carreiraapareciam primeiro “os os tais clientesde cinco e de dez escu-dos”. Até que lhe apareceu JoãoVieira Pereira, conhecido médico dalocalidade que “fazia umas com-pras maiores”. Adquiriu-lhe umacolecção de valor superior a 200$00(cerca de um euro), um elevadomontante para a época. “Foi Foi o nos-so primeiro cliente a sério quedepois se tornou também umamigo”, contou. Desde então, foiSérgio Simões que acabou por ajudaro médico a constituir e a valorizara sua colecção filatélica.O médico começou a frequentarexposições da especialidade e assuas colecções chegaram a ser galardoadascom medalhas de prata.Sérgio Simões prometeu-lhe que oajudaria a adquirir a distinção máxima(medalha de ouro). E assimfoi, não só conseguiu distinções paraas suas colecções em Portugal e noestrangeiro.“Sempre tive gosto em aju-dar os meus clientes a adquirirboas coisas e por isso fiz mui-tos amigos ao longo da vida”,disse Sérgio Simões. Com a suaesposa viajava pelo país para participarnos eventos e até chegaram aconstituir o que designavam pelafamília filatélica. “No Dia do Selo,juntavam-se sempre muitos coleccionadorese organizáva-mos grandes convívios”, contaMaria Joana Simões.A venda de material para coleccionismoé algo que vem desde oinício da empresa. Antes era SérgioSimões que “ia à origem ecomprava no estrangeiro omaterial que lhe fazia falta”,enquanto que, na actualidade, sãoas marcas de material filatélico queseleccionam a empresa caldensepara os representar no país. O materialde apoio ao coleccionismo representahoje cerca de 60% do negócio.A empresa das <strong>Caldas</strong> adquire-o,importa-o e também o revende.“ESTA CAUTELA TEM QUE SERPARA SI!”Vinha Sérgio Simões pela rua,em 1966, quando o conhecido cauteleiroNunes o informou que tinhaali uma cautela e que esta “temque ser para si!”. Lá acedeu e acaboupor adquirir o bilhete. E eis queera premiado! Valeu-lhe 500 contos(2500 euros), uma verdadeira fortunana altura e que era o preço deuma casa naquela época.“Nós não tínhamos nada, vivíamosapenas do nosso tra-balho!”, contou o casal, que nãopodia ter ficado mais satisfeito. Viviamentão na Rua da Estação eapesar de Sérgio Simões pretenderfazer uma surpresa à esposa,já não foi a tempo. Segundo MariaJoana Simões, nesse dia, “estavaa comprar uns sapatos na Fé-lix [que ficava na Rua das Montras]e logo alguém me disse que tí-nhamos lotaria premiada”.O casal apressou-se a compraruma máquina de costura, podendoa partir daí fazer roupinhas para assuas filhas.Questionado sobre se pagou umalmoço ao cauteleiro Nunes, quetinha estabelecimento junto à Tália(hoje Foto Franco), Sérgio Simões,diz que não. Fez melhor:“comprei-lhe um fato”, contou,agradecido pela insistência do cauteleiroem querer vender-lhe aquelebilhete de lotaria.Com o dinheiro do prémio a famíliaconstruiu a sua vivenda, próximada Escola D. João II, que estavapronta em 1969. “Mandámos


nceituadas empresas de filatelia de Portugalfazê-la pensando também na sede daempresa”, explicaram Sérgio e Maria JoanaSimões acerca do local que ainda hojeé a sede da firma.ATÉ NO SERÃO DAS FÉRIAS SECONTAVAM SELOSNos primeiros anos da vida do casal Simõesnão era fácil tirar férias. “Eu ia comas filhas pequenas para S. Martinhodo Porto e o meu marido ia lá ter con-nosco à noite”, recordou Maria Joana Simões.Nessas alturas levava um ficheiropara trabalharem todos ao serão, colocandoos selos nos respectivos catálogos. “Hásempre muito trabalho para fazer,coisas para pôr em ordem, isto nuncapára...”, disse a esposa, acrescentando quehouve tempos em que o seu marido chegoua ter um ano de correspondência atrasada.Numa primeira fase só a mãe é que laboravana casa do casal pois Sérgio Simõescontinuava a trabalhar com o seu pai. “Custava-lhedeixá-lo pois era muito ape-gado à família”, disse a esposa. Mais tardetomou as rédeas do seu negócio.“Sou coleccionador na medida emque tenho selos para os meus clien-tes”, ironiza o empresário, que afinal atétem duas colecções que não vende: umasobre as Ilhas Virgens e outra sobre osEstados da Igreja.Tudo corria sobre rodas e a crescer, sobretudocom os coleccionadores que a empresatinha nas ex-colónias. Sérgio Simõesrecorda que era considerável o volume denegócios nas antigas colónias, já que o coleccionismoera um dos principais passatemposde pessoas, sobretudo profissionaisliberais. A empresa caldense vendiapara lojas, mas a maioria dos selos eramenviados a coleccionadores privados.“Tínhamos muitos clientes sobretu-do em Angola e Moçambique, era umacoisa louca”, recorda o empresário. Sóque o 25 de Abril de 1974 “foi como umabomba no nosso negócio… deitou-nostudo abaixo”. E o que para muitos foi“uma maravilha”, para esta empresa “fofo-ram sobretudo maus momentos”, recordou.Sérgio Simões teve que aguentar o barcoe, devagar, “conseguimos reerguer-nos”. Depois as coisas melhoraram, atéporque muitos coleccionadores regressarama Portugal.Outro período menos feliz foi o que seviveu em 2002 com a introdução do euro,em que a família Simões começou a notarque durante a época de transição os coleccionadorespassaram a comprar menos.“As pessoas deixam-se influenciarpelo próprio número e acabam porfazer menos compras que antes”, contouMaria Joana Simões.Também têm notado um decréscimo dointeresse dos jovens. Antes eram vários osque saíam da escola e se dirigiam à empresapara adquirir selos, mas vêem que agorahá novos interesses e muitas vezes trocamo coleccionismo pelas novas tecnologiase electrónica.Natacha Narcisonnarciso@gazetacaldas.com“Ele sempre gostou de controlartudo, não foi fácil perceber que es-tava na hora de passar o negócio”,conta a esposa. Sérgio Simões foi sempreo chefe e queria saber tudo o que sepassava na sua empresa. Hoje ainda vemtrabalhar um pouco. Já o tentaram colocarao computador, mas ainda é o responsávelpela correspondência que é dirigidaà empresa por carta.Há ainda uma outra vertente que SérgioSimões dominava - o marketing.Eram verdadeiras odes as que escreviaaos seus clientes. “São cartas deamor sobre selos”, conta a esposa,acrescentando que muitos clientes ligavama perguntar quando é que lheescreviam mais uma carta sobre o tema.Era também o responsável pelos boletinsfilatélicos. Hoje produzem-se conteúdospara o site da firma, tentandoter sempre a informação actualizada.E qual é o segredo do negócio e delongevidade da firma? “Sérgio Simõessempre foi impecável nas contas enos pagamentos”, contou a sua mulher.Além do mais é histórica a formacalorosa como recebe bem os seus clientesnas <strong>Caldas</strong>, tradição que aindahoje seguem. “Até pode levar um pou-co mais caro, mas serve bem”, disseMaria Joana Simões.A fama de competência do patriarca,estende-se por todo o país e atéchega ao estrangeiro. Recentemente umresponsável dos CTT foi ao Reino Unidoe ao ter contactado com uma empresafilatélica inglesa, imediatamente lhe referiramo nome de Sérgio Simões e dasua firma nas <strong>Caldas</strong> da Rainha.O casal Simões desde sempre estabeleceurelações pessoais com os clientes,chegando a frequentar as suas casas.Foram convidados para casamentos,sobretudo no Norte, onde o volumede negócios era maior. “Tínhamosmais amigos fora das <strong>Caldas</strong> do quecá e ainda hoje é assim. Sabe, osselos aproximam as pessoas”, contam.E se antes marido e mulher faziamcatálogos de selos para enviar por correioaos seus clientes, as suas filhashoje enviam newsletters pela Internet.Actualmente o negócio da filateliaestá bem entregue às suas filhas, VandaMorgado e Margarida Roque, quecontinuam a vender selos, mas apostaramfortemente na diversificação dematerial de coleccionismo, algo que nãoCentraisA importância da Internet e das feiras internacionais num negócio à escala globalfoi difícil pois bastou continuar o trabalhodo seu pai.Hoje são representantes das mais fortesmarcas de material filatélico a nívelmundial, assim como editores de catálogosde vários pontos do globo. São,por exemplo, os únicos representantesnacionais da marca alemã Lindner.A IMPORTÂNCIA DO MATERIAL DECOLECCIONISMOVanda Morgado (44 anos é formadaem Gestão) e veio em 1994 de Lisboa,onde trabalhava numa grande empresade telecomunicações , para tomar contado negócio da família. A sua irmã,Margarida Roque, de 46 anos, é advogadae trata das questões legais e contenciosasda firma.Já vão longe os dias em que erammiúdas e vinham ajudar o pai a descolaros selos “e e nós brincávamos com elesatirando-os ao ar”. Cresceram acompanhadaspelos selos e mesmo quandoandavam na faculdade vinha ajudar noque era preciso recordando que, talcomo hoje, “trabalhamos muito porcorrespondência”.Uma das tarefas era carimbar impressosdo correio e, segundo Vanda Morgado,a continuidade da empresa estáassegurada pois as suas filhas hoje tambémajudam naquela tarefa. A empresáriatem cinco filhas com idades entreos cinco e os 23 anos.Já os filhos da sua irmã, MargaridaRoque, dedicam-se às ciências. O filhoestuda no estrangeiro Engenharia Biomédicae a filha quer seguir Genética.Mas o marido, Paulo Roque, 51 anos,professor de Biologia, dá uma ajuda naA empresa conta com duas funcionárias, Zulmira Duarte (atrás) eFlorbela Mendes, que nela trabalham há cerca de 30 anosNa exposição mundial, em Outubro deste ano, a empresa caldensefoi uma das mais visitadasempresa. Uma colaboração iniciada em1989, altura em que veio montar o sistemainformático da firma.Se em tempos o “core business” daempresa era a venda de selos, hoje é omaterial de coleccionismo que representacerca de 60% do negócio. Além davenda a particulares, também se dedicamà revenda e já exportam para oBrasil.Neste tipo de material contam-se rolhasde garrafas, caixas para bolas degolfe, pinças, lupas, relógios, álbuns,classificadores e material filatélico e numismático.Os destinos mais distantes de clientesda filatélica caldense são Taiwan,China, Japão e Austrália.No ano passado o volume de negóciosde Sérgio Simões Filatelia rondou os200 mil euros. Além dos quatro sóciosgerentestrabalham nesta empresa, hácerca de 30 anos, duas funcionárias.Vanda Morgado explica que hoje emdia “os coleccionadores de selosfrequentam os eventos, vendem excedentescom preços baixos e é difícila sustentabilidade das empre-sas que só se dediquem à filatelia”.Apesar de várias vicissitudes - comoa que se viveu em 2005 e 2006 quandouma fraude com selos ao nível da PenínsulaIbérica acabou por ter repercussõesno negócio -, agora vivem-se diastranquilos.O desenvolvimento do negócio estáligado à Internet e no futuro pensammesmo em abrir uma filial em Lisboa.Mas a sede da firma continuará nas<strong>Caldas</strong>.<strong>Cronologia</strong>2119 | Novembro | 2010PRESENTE EM EVENTOSINTERNACIONAIS E MUNDIAISA empresa caldense Sérgio Simõesesteve na Exposição Mundial de Filateliaque se realizou na FIL, no Parque dasNações, em Lisboa. O certame decorreudurante 10 dias em Outubro e “foi umsucesso”, disse Vanda Morgado.A empresa caldense esteve presentecom material filatélico, numismático eteve a visita dos directores das marcasfrancesas e alemãs que representam.No seu stand distribuíram por coleccionadorese interessados canetas, réguas,lupas ou mini classificadores o quefez com que muita gente se dirigisse àrepresentação da empresa das <strong>Caldas</strong>.Já em 1998 realizou-se uma grandeexposição internacional na qual estaempresa também participou. “O maisimportante são os contactos directocom clientes e fornecedores e ain-da a publicidade que se faz à casa”,contou a gestora.Na exposição mundial participaramrepresentações de Espanha, Iraque,Cabo Verde, Macau, Marrocos, NovaZelândia e entidades como a Casa daMoeda, a Biblioteca Nacional, o Metro,a Carris ou a Associação Portuguesa deFilatelia. Empresas portuguesas do ramoque não fossem de Lisboa, só esteve afilatelia de Sérgio Simões.Foram também emitidos selos paraeste evento e houve um passaporte filatélicoque consistia na aquisição de umdocumento para colocação dos selos respectivosde cada administração postal presente.No total estiveram no certame 32representações de países e empresas ecada uma poderia colocar também umcarimbo por cima do selo. O tema destepassatempo foi “Boa viagem através dosselos, coleccionar também é descobrir!” .Do evento fez parte a colecção filatélicaReal Inglesa com o primeiro selodenominado Penny Black, datado de1840. Esta colecção é considerada a melhore mais abrangente do mundo. Tambémno mesmo stand estava a colecçãode SAS o Príncipe do Mónaco. Cerca de4000 quadros de exposição preencheramo pavilhão da FIL junto com comerciantesportugueses e estrangeiros, administraçõespostais e associações filatélicasnacionais e internacionais.N.Nnova, entra formalmente para a empre-1952 – Sérgio Simões inicia o cantinho sa para trabalhar na gestão e na partefilatélico na loja de tecidos do seu pai, financeiraAbel Simões, no Largo Heróis da Nauli-1997 - Sérgio Simões foi eleito comerciantedo ano pela Associação Filatélica1962 – Casa com Joana Simões e vão Alentejanalaem lua de mel para Sevilha por causa2002 – A introdução do euro induz umados selosredução pontual no volume de vendas1969 – Estabelecem-se em casa pró-2005 – Constituição da sociedade porpria com área preparada para o negóciona Rua Dr. Artur Figueiroa Rego, 25 do como sócios-gerentes o casal funda-1974 – Perdem o importante mercado dor e as filhas Vanda e Margarida. O ca-quotas Filatelia Sérgio Simões, Lda. ten-das colónias e registam uma quebra pital social é de cinco mil euros.muito acentuada2006 – Passa a ser representante nacio-1994 – Vanda Morgado, a filha mais nal da marca alemã Lindner


18Centrais26 | Novembro | 2010, VUMAMA EMPRESAMPRESA, , VÁRIAS VGERAÇÕESMercearia “O Ferreira” - O tradicional e o gourmet juLuís Ferreira (1896–1975) é recordadopelo neto Romeu como“um homem de pulso”. E foiesta firmeza do beneditense degema que ajudou ao sucesso dosdois negócios que abriu em 1926e que se traduziam num estabelecimentomuito normal naépoca - uma taberna e uma mercearia,divididas apenas por umaporta.Do primeiro negócio restamapenas as memórias dos seusfilhos e netos, e dos muitos homensque ao domingo, antes damissa, por lá passavam para beberos “pirolitos”, pequenos coposde aguardente a que chamavamde “mata-bicho”, dadasas suas comprovadíssimas propriedadesna protecção contradoenças e maleitas diversas.Já a mercearia ainda hoje éuma referência no comércio tradicionalda vila, mantendo clientesque há décadas ali se abastecem.E há de tudo naquelasprateleiras.Do casamento com Ana MariaBernardina Ferreira (1898–1987)nasceram quatro filhos: Maria,António, Joaquim e Ana. Os rapazesdesde cedo acompanharamos negócios do pai, e quandoAntónio, o mais velho, inicioua sua própria família, ficou coma taberna a seu cargo, mantendo-aaberta até à década de 80.A divisão dos negócios levoua uma mudança dos estabelecimentos,e na década de 60 amercearia “O Ferreira” muda-separa o local onde ainda hoje seencontra, na Rua da Serradinha.E foi na mercearia que JoaquimLuís Ferreira (nascido em 1929)trabalhou desde sempre. “Omeu pai trabalhou aqui todaa vida. A profissão dele émarceneiro, foi um dos mar-ceneiros da igreja daqui,mas com vinte e poucosanos começou a tomar contado negócio, tal como de-pois aconteceu comigo”, contaRomeu Ferreira.Em 1969 Joaquim Ferreira casacom Ana Rebelo Ferreira Luís(nascida em 1943) e, tal comotinha acontecido com o seu irmãoAntónio, assume o negóciodo pai. D. Ana, como todos osclientes a tratam, lembra-se bemdesses tempos. “Eu vim paraaqui trabalhar passados trêsmeses de me casar”, conta. Etudo era diferente. Se hoje sevende devidamente empacotado,na altura tudo era vendido avulso.“Pesava-se o açúcar, amassa, o arroz em pacotinhosde papel, uns pacoti-nhos de bico” que se lembra depassar horas a fazer.Além destes produtos, o azeite,o petróleo para as lamparinas- quando a electricidade paramuitos era ainda um privilégio -,Ana Maria Bernardina Ferreira e Luís FerreiraPais e filho. Romeu Ferreira projecta para o futuro o negócio iniciado pelo avô e que os paisem 1920, seis anos antes da abertura dageriram durante mais de três décadasmercearia e da tabernaeram produtos que ali levavammuita gente. O bacalhau, semprede boa qualidade e que osdonos da loja iam propositadamentebuscar à Figueira da Foz,é também uma das referênciasdo estabelecimento.Do património da merceariaainda fazem parte a balança usadana altura, com uma tabela quedava logo o preço de cada produto,as bombas que se usavampara retirar o petróleo dos bidõesde 50 litros em que esteslhes o biberão na boca, e elesbebiam sozinhos, que eu ti-nha que vir atender clientes”,conta.Olhando para trás, Ana FerreiraLuís garante que as diferençasentre aquela altura e os diasde hoje são abismais. “Traba-lhou-se muito naquele tempo,não tínhamos empregadospara nada. Era só eu e o meumarido”. O facto de viverem porcima da loja fazia com que a vidafamiliar e o trabalho se mistubretudoa partir da década de 80,garante de emprego, muitoseram os que pagavam as suascontas apenas quando recebiamo ordenado. “Quando por vezesnão recebiam logo vi-nham cá e pediam ‘Oh senhorJoaquim, posso pagar daquipor mais oito dias ou quinzedias?’. Há outros que espetaramo calote, nunca mais pa-garam”, lembra D. Ana.Hoje acabaram-se os livros eo hábito de vender fiado. Massuas queixas e desabafos, hojetudo é bem diferente. “Ninguémrefilava, as pessoas andavammais calmas, tudo espe-rava na sua vez, ninguématropelava ninguém. Agoraos clientes vêm todos commuita pressa”, diz D. Ana.Já o filho, Romeu, lembra-se“das sacas de açúcar louroque traziam uns grãos pre-tos, da humidade do açúcar.Davam-nos esses grãos eeram os nossos caramelos”.Data de 1926 a fundação da mercearia “O Ferreira”, a mais antiga da Benedita e uma das poucas queresiste numa vila onde nos últimos anos se fixaram quatro supermercados e hipermercados. Hoje, apequena loja é gerida por Romeu Ferreira, neto do fundador, Luís Ferreira.Bem longe dos tempos em que ali tudo era vendido avulso, há um sem número de produtos paradescobrir pelas prateleiras, dos mais antigos e tradicionais aos mais sofisticados, sempre com umaelevada aposta na qualidade. Esta é uma das razões pelas quais a mercearia tem conseguido fidelizarmuitos clientes e enfrenta o futuro de cabeça erguida e sem medo.chegavam à loja e uma máquinaregistadora que funcionava àmanivela quando a luz eléctricafalhava.D. Ana lembra-se, quando “acasa era muito pequenina etinha um balcãozinho e aspessoas não passavam paradentro, pediam tudo do ladode fora. Não era como agora,que são as pessoas que seservem”. Lembra-se de quandolevava para junto de si os filhosainda bebés – Joaquim AntónioLuís Ferreira (nascido em 1970) eRomeu Luís Rebelo Ferreira (nascidoem 1974). “Criei os meusfilhos aqui. Tinha ali uma cozinha,trazia-os para lá, deitava-os,coitadinhos, punha-rassem quase sempre. Depois osfilhos foram crescendo e começarama ajudar. A mãe recordaque muitas vezes os filhos iamajudar a pesar os produtos aosábado.NO TEMPO EM QUE SECOMPRAVA FIADOUma das principais diferençasera a forma como os clientespagavam o que compravam.O fiado ditava a regra e “eratudo para o livro”. As pessoasiam aviar-se e o que levavam eraapontado num livro. As contaseram feitas à semana, ao mês,como se combinasse. Numa terraonde as fábricas foram, so-por vezes, e sendo a proximidadena relação entre vendedorese clientes uma característica únicado comércio tradicional, porvezes ainda acontece que fiquena caixa um ou outro papelitoque é pago mais tarde.Da altura, restam não só asrecordações mas também muitosclientes. Uns iam lá na alturae mantêm-se fiéis à casa. Outrosiam com os pais ‘ao Ferreira’ fazeras compras para casa e hoje,homens e mulheres feitos, continuama gostar de ali ir. Mas sehá umas décadas o merceeiro“era o segundo padre da fre-guesia” e tinha sempre umapalavra para dar aos seus clientese um tempinho para ouvir asDA VENDA AVULSO AOSPRODUTOS EMPACOTADOSNa década de 80 foi proibida avenda avulso e dá-se uma enormemudança na oferta da mercearia“O Ferreira”, onde passoua vender-se tudo devidamenteembalado. Pouco a pouco foram-setambém introduzindonovos produtos, como o pão,feito pelos melhores padeirosda terra, ou os tão afamadossabonetes e águas de colóniada Ach Brito, artigos que hojese usam nas mais luxuosas casasdo país e da Europa (vendidosa peso de ouro em muitoslocais) e que ainda povoam asprateleiras da loja.Os clientes, que habitualmenteaos fins-de-semana iam àpraça aviar-se de frutas e legumes,começaram a pedir que sevendessem estes artigos namercearia. E quantos jovensadultos não se lembram de, aindacrianças, irem ‘ao Ferreira’comprar rebuçados? Aos produtostradicionais foram-se juntandoas novidades que iamaparecendo no mercado e amercearia encheu-se de produtosalimentares, artigos de higienepessoal e de limpeza, comidapara animais, ganchos eredes para os carrapitos dassenhoras, bilhas de gás.Nos anos 80 e 90 a mercearialutou para sobreviver, quandocomeçaram a aparecer na vila ossupermercados. E a aposta, quese mostrou acertada, foi na qualidadedos produtos como factordiferenciador. É em 2002 que RomeuFerreira se junta aos pais nonegócio da família. Formado emSistemas de Informação Geográficao jovem, na altura com 28anos, não conseguiu trabalho nasua área e decide que é precisosangue novo para que o negócioiniciado pelo seu avô resista notempo. Dois anos depois, um acidenteafasta o pai do trabalho naloja e foi nessa altura que o rapazse torna gerente da mercearia. Amãe diz que “é pena, porqueisto é muito cansativo, trabalha-semuito e ganha-se pou-co e é muita chatice”. O filhogarante que “é um gosto”.Joana Fialhojfialho@gazetacaldas.com


ntos num negócio com 84 anos na BeneditaO filho mais velho de Ana e Joaquim Ferreira,apanhado em 1985 com a mão dentro do boião dosrebuçados“As grandes superfícies já não nos fazem mal”Centrais1926 | Novembro | 2010Durante muitos anos, a mercearia“O Ferreira” não tevequalquer toldo ou placa que aidentificasse como estabelecimentocomercial. A projecçãode uma imagem para o exteriorfoi uma das grandes diferençasintroduzidas por RomeuFerreira no negócio dos pais edo avô, que escolheu como lema“Desde 1926 para o Bem Servir”.Mas quem não conhece amercearia por dentro, está longede imaginar que numa áreacom cerca de 80 metros quadradosse pode encontrar umtotal de cerca de seis mil referências,dos artigos mais tradicionaisaos agora tão em vogaprodutos gourmet e biológicos.No mesmo espaço, onde sepode comprar granulado paracoelhos ou o sabão azul e brancotão conhecido das donas decasa, encontra-se também ca-cada e tem que estar tudomuito bem organizado” eisso implica uma selecção cuidadados produtos que ali sevendem. A aposta é, assim, feitaem “produtos de grandequalidade e principalmentemarcas nacionais”. E é istoque tem contribuído para manteros clientes ano após ano.Os vinhos são um bom exemplo.O gerente da mercearia garanteque na garrafeira da lojase podem encontrar 200 vinhosdiferentes, “entre os quais os50 melhores do país”. Às melhoresmarcas nacionais juntam-seartigos conhecidos internacionalmente,como os chásda marca inglesa Twinings.Uma aposta recente, mas quecomeça já a dar que falar, umavez que se contam pelos dedosde uma mão os locais onde amarca está à venda no país.“Quem conhece chá,Joaquim Ferreira e Ana Luís na sua mercearia em 1984 e na semana passadaviar, mel em cortiço, trufas eaté o molho de melaço com quese comem as panquecas norteamericanase que muito dificilmentese encontra até nos maioreshipermercados.“Quando fazemos o balançoanual é que percebemosa quantidade de produ-tos que temos aqui”, diz Romeu,que prefere não divulgaro volume de negócios da mercearia,cujo capital social é de10 mil euros. E o que torna oinventário exequível é a informatizaçãodo sistema, sinal damodernização que projecta aloja para o futuro. Um futuroque se faz também através daInternet e de uma loja onlinequem gosta mesmo e quemse interessa um bocadinhopela sua história fica admi-rado por ver o Twinings àvenda aqui. Aconteceu noutrodia estarem umas senho-ras lá fora e quando viram ochá na montra ficaram ad-miradíssimas. Entraram,compraram logo umas latase acharam fascinante umaloja de província ter estechá”, conta.Os chás são, de resto, um dosprodutos em que a merceariaaposta mais. À Twinings juntasea marca Lipton e uma grandediversidade de chás mais específicospara bem-estar e saúde,como problemas de fígadomercearia, que só vende bolose doces frescos. “Sou o pri-meiro a dizer ao cliente queo bolo é do dia anterior, ocliente só o compra se qui-ser, mas fica avisado. Achoque a casa vence mais poresta honestidade e sinceri-dade com o cliente e peloatendimento personalizadoque mantemos já há muitosanos”, explica.CLIENTES VOLTAM AOCOMÉRCIO TRADICIONALQuando perguntamos a RomeuFerreira se o futuro é encarado comoptimismo, o “sim” reforçado trêsvezes não deixa margens para dúvidas.vantagens das grandes superfíciese aponta três factorespara o seu sucesso. Em primeirolugar, “é porque é umamoda que surgiu em Portugalaí há 15 anos e foi im-portada de fora”, depois éinegável a mais-valia que é oparque de estacionamento doshipermercados. Por último,acredita que em espaços maiores“as pessoas não se sen-tem tão vigiadas e não têmtanta vergonha de escolheros produtos mais baratos,ainda que piores”.No extremo oposto estão asmercearias, locais onde toda agente se conhece. Um facto queé simultaneamente uma des-superfícies nunca sabemquem é que os vai atender”,diz Romeu. Outra coisa que levaas pessoas a optarem pelo pequenocomércio é “saberemque se tiverem algum pro-blema que seja, há alguémque os ouve, e nos outroslados não. O merceeiro é osegundo padre na terra”.E quem acha que o comérciotradicional tem os dias contados,desengane-se. Romeu Ferreiradiz que se há uns anos tiveramque lutar contra as grandessuperfícies, hoje têm o seulugar bem definido e aos clientesfiéis juntam-se agora aquelesque começam a perceberque “nos supermercados“há menos tentação para secomprar o que não é preci-so em casa”, garante.E mais uma vez a qualidade,sobretudo nos produtos alimentares,marca a diferença.Há quatro anos foi implementadona mercearia o sistemaHACCP, que garante a segurançados alimentos, tanto ao nívelda sua produção como dasua comercialização. Um passo“fundamental” numa casa“aberta há 86 anos que nuncateve um problema alimen-tar”. E além de Romeu e damãe, o estabelecimento dá aindatrabalho a uma engenheiraalimentar. Nesse aspecto, a famíliaFerreira foi sempre muitoda mercearia (em ou estômago, diabetes ou“O nosso mercado é muivantageme uma vantagem dasnem todos os produtos sãorigorosa: “preferimos perderwww.merceari aoferreira.c om),utilizada sobretudo por clientesde Lisboa e Algarve.Mas como se consegue tertanta coisa num espaço tão pequeno?“As nossas pratelei-ras só têm um produto detranstorno do sono. “Neste mo-mento temos aí uns 30 chásdiferentes na nossa casa”,afiança o gerente.Já nos produtos de pastelaria,há um pasteleiro da zona aproduzir diariamente para ato específico e é muito peque-nininho, para termos medodas grandes superfícies. Elescomem-se uns aos outros, anós não nos fazem já mal. Jáfizeram, agora não”, diz.Romeu sabe bem quais aspequenas lojas. É que há quemnão troque o atendimento personalizadopor nada. “Aqui, seas pessoas têm alguma coisaa reclamar vêm falar di-rectamente com o dono daloja, enquanto nas grandesmais baratos que no comér-cio tradicional”. E dá o exemplo:“nos frescos e na fruta,os nossos preços são maisbaixos, além de que os pro-dutos são melhores”. Alémdisso, no pequeno comérciodinheiro a vender algo quepossa já não estar nas me-lhores condições. Primeiro aspessoas, depois o dinheiro”.Joana Fialhojfialho@gazetacaldas.comA imagem externa da loja é uma das apostas de Romeu Ferreira, quetambém investiu numa loja online<strong>Cronologia</strong>1896 – Nasce Luís Ferreira na Benedita1926 – Luís Ferreira abre a mercearia, juntamentecom uma tabernaDécada de 60 – Dá-se a divisão dos doisnegócios e a mercearia muda para as instalaçõesonde ainda hoje se encontra1929 – Nasce o filho, Joaquim Ferreira1969 – Joaquim Ferreira casa-se com AnaLuís e fica com a mercearia1970 – Nasce o filho mais velho, JoaquimFerreira, que optaria por ser professor1974 – Nasce Romeu Ferreira, que viria aser o sucessor do negócio da família2002 – Romeu Ferreira começa a trabalharcom os pais a tempo inteiro2004 – Romeu assume a gestão do negócio


18Centrais3 | Dezembro | 2010, VUMAMA EMPRESAMPRESA, , VÁRIAS VGERAÇÕESGilberto Santos fundou a Ourivesaria Beto e legou aGilberto Santos e os filhos nas <strong>Caldas</strong>quando regressaram de AngolaGilberto filho, Gilberto pai e Paulo Santos. O mais velho está emInglaterra a trabalhar no mesmo ramoO fundador da Ourivesaria Beto ao lado dos seussucessores: o filho Paulo e a nora, Fátima SantosGilberto Santos, mais conhecidopor Beto, nasceu em 1939 noBairro da Ponte, nas <strong>Caldas</strong> daRainha, no seio de uma famíliahumilde. Estudou até aos 10 anos,cumprindo a antiga quarta classena escola da Praça do Peixeantiga. Foi na escola que descobriuque tinha capacidades de artesão.Com apenas sete anos, andavana escola do Campo, tevecontacto com a olaria e impressionouo professor com o resultadode uma pequena peça. Mas ofuturo iria levá-lo para outro ofício.Quando saiu da escola, aindatrabalhou como polidor de móveis,na oficina do Ramalho, na Praçada Fruta - onde mais tarde se instalaramos Móveis Ferreira - e tambémtrabalhou nos mármores.Mas o gosto pelos relógios jáestava a nascer e começou a desenvolver-sequando os pais semudaram das <strong>Caldas</strong> para a SerraD’el Rei. Começou a arranjar relógiospara os vizinhos, numa tabernaem Ferrel. “Levava as mi-nhas ferramentas e tinha queesperar que os homens aca-bassem de jogar às cartaspara ter a mesa livre para fa-zer de bancada”, conta Beto.Os consertos já lhe rendiam unstrocados, mas rendimentos muitopequenos, pelo que a AugustoSantos não agradava muito que ofilho seguisse aquele ofício. Foi porisso à sua revelia que, quando aA história da Ourivesaria Beto é mais do que a história de uma empresa que passou de uma geraçãopara outra. É a história de como a paixão pelos relógios moldou a vida de um homem, Gilberto Santos(Beto), desde os 12 anos de idade, e que contagiou os filhos. Foi em 1977 que Gilberto Santos fundoua Relojaria Beto, então com 38 anos, mas a história começa mais de 20 anos antes, quando, aindacriança, começou a arranjar relógios numa taberna em Ferrel. Hoje em dia a Ourivesaria Beto é geridapelos dois filhos, Gilberto e Paulo Santos, virando-se para um ramo onde há uma grande falta deespecialistas: os relógios antigos.família regressou às <strong>Caldas</strong>, Betose dirigiu à oficina de conserto derelógios Agostinho, junto aos Capristanos,para pedir emprego.A resposta foi negativa, mas ainiciativa não foi em vão. “Disse-me que a loja era pequena, nãodava para ter empregados,mas garantiu que quandoGilberto Santos na Ourivesaria Sebastião, onde trabalhou entre1962 e 1965soubesse de alguém que pre-cisasse, me indicava”, conta.Augusto dos Santos era colchoeirona empresa de João Ramos,onde fazia colchões de palha - naaltura muito requisitados pelosmédicos para quem sofria da coluna- e foi para lá que Agostinhotelefonou, cerca de seis meses depois,com uma proposta de trabalhopara Gilberto. “Ele até se zan-gou, não sabia que eu tinhaido pedir trabalho”, relembraGilberto Santos.A oferta era para a RelojoariaAlcino, que se situava na Rua LeãoAzedo, hoje Rua Montepio RainhaD. Leonor, naquele que, aos 17anos, seria para Beto o primeiropasso a sério no mundo dos relógios.Estávamos em 1956.“Ainda me lembro do pri-meiro dia - ele entregou-me umrelógio pequenino todo des-montado e o meu trabalho eramontá-lo… e consegui”, recorda.O primeiro salário foi de 60escudos (30 cêntimos de euro).Beto lembra Alcino Pereira deBarros, aquele que considera o seugrande mestre, com enorme estima.“Era uma pessoa extraordinária,com uma grande sen-sibilidade, escrevia e recitavapoesia, era uma pessoa muitoquerida nas <strong>Caldas</strong> e até chegoua ser presidente dos Pim-pões, foi ele que me ensinoutudo”.Esteve no Alcino até 1962. Masobteve da Ourivesaria Sebastiãouma oferta de emprego em queganhava mais 100 escudos (50 cêntimos)por mês, o que na alturaera muito dinheiro. Gilberto aceitoue foi trabalhar com Sebastiãodo Coito Caramelo na Rua HenriqueSales.Em 1964 casou com Maria Antonieta,mãe dos seus dois filhos,tendo Sebastião como padrinhode casamento. Mas a relação patrãofuncionário não era das melhorese Beto resolveu voltar paraa Relojoaria Alcino, um ano depois.A Relojoaria Alcino, na Rua Leão Azedo, onde Gilberto aprendeu oofícioLUANDA FOI TERRA DEOPORTUNIDADESFoi no Alcino que conheceu Máriode Campos - que ainda hoje éproprietário de três ourivesariasem Leiria -, um agente dos relógiosTissot e dono de várias ourivesarias,uma delas em Luanda, paraonde convenceu Beto a ir trabalhar.“Eu não tinha vontade de ir,nem precisava em termos financeiros.Disse ao meu pa-trão que se me desse mais 200escudos (1 euro) ficava, mas osenhor Alcino não me quis cor-tar a sorte e disse-me paraaproveitar porque era novo eera uma boa oportunidade”,conta Gilberto Santos, que antesjá tinha recusado ir trabalhar paraa Suíça.Foi então para Luanda, em Junhode 1970. Sozinho, de avião, deixandopara trás a esposa e os doisfilhos, Gilberto, de seis anos, e Paulo,de dois anos, que só seguiriamviagem seis meses mais tarde.Em Luanda conheceu vários empregos,até porque as solicitaçõeseram muitas. Começou na OurivesariaCampos, mas depressa angariououtros clientes, arranjandoem casa relógios para várias ourivesarias.Uma delas, a OurivesariaBrasília, estava para fechar e odono referenciou-o para as oficinasda Omega e da Tissot. Era umagrande oportunidade para conheceralguma maquinaria de desenvolvimentode relojoaria suíça, quesó lá podia encontrar.Nas oficinas, geridas por um italiano,os processos de trabalhoeram bastante restritos. “Só sepodia arranjar dois relógiospor dia, se arranjássemos trêsera porque estavam mal arran-jados”, recorda. Mas o trabalhode Beto mereceu reconhecimentoe, apesar de só ter ficado cerca deseis meses nessa firma, foi suficientepara ser promovido.Mas em 1973, três anos depoisde ter partido, regressa à entãoMetrópole (Portugal). Gaspar, um


os filhos uma profissão de que eles se orgulhamdos moços de recados da Omega,natural de Moçambique e comquem Gilberto mantinha uma relaçãode amizade, avisou-o: “a re-volução vai rebentar em 73 ou74, vai-te embora”.E sem avisar mais ninguém paraalém do amigo, regressou com afamília para as <strong>Caldas</strong>, em 1973, abordo do navio Pátria.RELOJOARIA BETO NASCEUPOR IMPOSIÇÃOQuando regressou às <strong>Caldas</strong>, aRelojoaria Alcino tinha as vagaspreenchidas, mas havia outro localpara regressar. Um dos seusantigos patrões, Sebastião Caramelo,tinha falecido em 1971. Aviúva, Maria da Luz, ficara com aloja, mas não tinha quem fizesseo trabalho de oficina, pelo que convidouBeto a voltar, para salvaguardaro concerto dos relógios.Ao fim de quatro anos, em 1977,Maria da Luz ofereceu-lhe a oficina.Homem humilde, Beto nuncaencarou a sua profissão para láda bancada e o investimento numestabelecimento próprio não faziaparte dos seus planos. Mas aforma como a patroa colocou aquestão, ou aceitava ficar com aoficina, ou deixava de poder trabalharali, foi o impulso necessáriopara que nascesse a RelojoariaBeto.A oficina ficava na Rua MiguelBombarda, nas traseiras da ourivesariaSebastião e nem tinha porta,pelo que teve de se abrir umaatravés de uma janela.O relojoeiro era proprietário eúnico funcionário da casa… até osseus filhos começarem a trabalhar.“O meu pai sempre teve a suabancada em casa e no nossodia-a-dia sempre lidámos comrelógios, estiveram sempre lána nossa infância e começámosdesde muito cedo a me-xer, mesmo por iniciativa domeu pai”, conta Paulo Santos.Foi aos 16 anos (Gilberto em 1980,Paulo em 1984) que os dois iniciarama actividade profissionalmente.Por opção, ambos passaram aestudar à noite - Gilberto na EscolaRaul Proença, Paulo na Rafael BordaloPinheiro - para poderem abraçaro ofício do pai na Relojoaria Beto.Gilberto, o filho, lembra-se de irmiúdo para a loja com o pai. “Nãobrinquei muito porque ia como meu pai para a loja, mas iacom gosto porque aquilo fas-cinava-me, queria ser comoele”.Paulo comungava também davontade de seguir as pisadas dopai. “Reprovei de propósito umano porque o meu pai disse quese reprovasse ia estudar denoite e o que eu queria era irtrabalhar”, conta Paulo Santos.Gilberto seguiu a especialidadedo pai - os relógios mecânicos tradicionais.“Estive dois anos pra-ticamente só a ver como o meupai fazia porque é um proces-so muito demorado, estamossempre a aprender e ainda hojecontinuo”, sublinha.Paulo também começou com osrelógios de corda, mas nessa alturacomeçaram a surgir os relógiosde pilha e foi para esses que direccionoua aprendizagem em formade autodidacta. “Foi por tentati-va erro, explorando relógiosestragados, fui perguntando aquem percebia de electrónicanoutras áreas, porque cursosnão havia…”, recorda.PASSAGEM DE TESTEMUNHOO negócio sofre, no entanto,uma grande mudança. Como a lojavivia essencialmente do conserto,a venda era muito pouco exploradae foi-se tornando cada vez maisdifícil tirar dali rendimento paratrês pessoas.Em 1990, Beto e Maria Antonietadivorciaram-se e relojoeiro aposentou-se,passando a loja aos filhos.Mas perante a impossibilidade detirar rendimento para duas famílias,Paulo deixa o irmão mais velhoficar com Relojoaria Beto e procuraoutro emprego, até porque tinhacasado nesse mesmo ano.Apesar de mudar de ramo, PauloSantos manteve-se no ofício.Em casa montou a sua própriabancada, onde, depois de um diade trabalho, aproveitava as últimashoras do dia para arranjar relógiospara várias ourivesarias dacidade.Só no Natal toda a família sevoltava a juntar na loja, altura demaior movimento, mas no acto daseparação os irmãos fizeram umpacto: “acordámos que um dianos voltaríamos a juntar na em-presa”, diz Paulo Santos.E voltaram. Em 2000 os dois irmãosadquiriram as instalações daantiga Ramalho e Branco, passandoa loja a denominar-se OurivesariaBeto. Para além de manterem areparação, reforçam a componenteda venda de artigos em ouro eprata e igualmente de relógios.Chegaram também a ter uma partede mediação imobiliária, que entretantocessou actividade.Hoje trabalham na loja PauloSantos e a esposa Fátima Santos -Gilberto está em Inglaterra desde2006 a fazer uma especialização emrelógios de gama alta. Beto, aos 71anos, continua em casa a fazer oque sempre fez: sentar-se à bancadapara reparar relógios.A Ourivesaria Beto é uma sociedadeunipessoal e em tempos jáchegou a ter dois empregados. Osseus responsáveis não quiseram divulgara sua facturação anual.Joel Ribeirojribeiro@gazetacaldas.comArranjar uma máquina éuma satisfação enormeA relojaria é uma arte como as outras, embora semo mesmo reconhecimento e visibilidadePor muito simples que pareça, simplicidade é tudo o que arranjarum relógio não tem. Primeiro são as características decada marca - e os fabricantes são incontáveis - e modelo, depoisa singularidade de cada avaria, o tamanho quase microscópicodas peças que é preciso substituir, por vezes com a espessura deum fio de cabelo, sendo que nos relógios antigos já nem existempeças para substituição e têm que ser feitas à mão.Isto torna a relojoaria uma arte como tantas outras, emborasem o mesmo reconhecimento e visibilidade.Mas, para quem arranja um relógio, ver uma peça antigadanificada voltar a ganhar vida é qualquer coisa que não tempreço. “Dá-me um prazer enorme arranjar um relógio,pela minúcia que exige, e quanto maior for a complexi-dade, maior é a vontade de abraçar o desafio”, diz Beto.Aos 71 anos, continua a ter a mesma paixão que o levou acomeçar, há 54 anos atrás e ainda hoje é procurado pelas suasqualidades.Arranjar um relógio requer uma grande tranquilidade, peloque, agora, é de madrugada que desenvolve a actividade. “Hámuito mais silêncio e é preciso ter um controlo muitogrande sobre os movimentos. Durante o dia basta pas-sar um carro na rua para perturbar a concentração”,explica.J.R.Paulo Santos ainda adolescente na ourivesariado paiAo longo de 54 anos de carreira,Beto construiu importantelegado como especialista derecuperação de máquinas de relógios.Uma arte que os filhosherdaram e que querem aproveitaro melhor possível, atéporque hoje há muita falta deconhecimento na área e de genteque queira seguir a profissão.À Ourivesaria Beto vêm muitoscoleccionadores arranjar osseus relógios antigos. Algunssão da região Oeste, mas tambémvêm clientes da zona deLisboa, onde, diz Paulo Santos,a mensagem tem passado sobretudono passe a palavra.Apesar de ter criado umabase de sustentação com o comérciode artigos de ourivesaria,novos e usados, a apostana diferença faz-se pela especializaçãono conserto de relógios,nomeadamente os antigos.Com as marcas a chamaremcada vez mais a si o consertodos relógios, ora na fábrica, oranos agentes autorizados, “nãodão oportunidade de um re-lojoeiro como havia antesarranjar um relógio deles.Mas como existem muitosrelógios antigos, com 50, 100anos e mais, e o grande ob-jectivo desta casa é atraircoleccionadores e apreciadoresdestes relógios anti-gos para aqui consertaremas suas máquinas”, explicaPaulo Santos.Outra especialidade é a relojoariade alta gama, que apesarde ser bastante rara no nossopaís, é um mercado a explorar.Foi nesse sentido que Gilbertotentou a sorte, em 2006. Aproveitandoa mudança da mãe,Maria Antonieta, para Londres,Gilberto teve hipótese de ingressarnuma empresa de refe-CRONOLOGIACentrais193 | Dezembro | 2010O futuro está… no passadorência de Inglaterra no ramoda relojoaria de alta gama,onde trabalha com “as melho-res marcas do mundo”, frisa.Para se ter uma ideia, Gilbertoconta que o primeiro relógiocom que lidou foi umFrank Muller de valor superiora 210 mil euros.Pelas suas mãos passam,igualmente, muitas outrasmarcas que em Portugal sãopraticamente desconhecidas,como a Hublot, Audemars-Piguet,Piaget, Rolex, Cartier,entre muitas outras. Na empresainglesa, Gilberto é, aos 46anos, o funcionário mais novoreconhece a mais valia de trabalhare aprender com aquelesque considera os seus grandesmestres, Eddy, de origemiraquiana, e o português JoelFerreira, referências de váriasdestas marcas.“É uma especializaçãoque pode demorar 10 anos,todos os dias aparecem si-tuações novas”, sustenta. Naempresa, Gilberto tem formaçãocontínua com deslocaçõesfrequentes à Suíça, para aprendermais sobre uma marca específica.Esta é uma aprendizagemimportante para o futuro, tantoa nível pessoal, como da empresa.“Não existe muito estetipo de serviço em Portugal,mas um dia quando voltar,se me aparecer este tipo demarcas estarei preparado.E se não houver trabalho emPortugal, no estrangeiro hágrande solicitação porquehá uma falta enorme depessoal especializado”.Quando Gilberto Santos terminara sua formação, é vontadedo irmão, Paulo, seguirtambém esta especialização.J.R.1939 – Nasce Gilberto Augusto Jorge dos Santos, “Beto”, noBairro da Ponte1952 – Com 13 anos é admitido na Relojoaria Alcino1963 – Gilberto Santos muda-se para a Ourivesaria Sebastião1964 – Nasce Gilberto Santos, o primeiro filho1965 – Regressa à Relojoaria Alcino1968 – Nasce Paulo Santos, o segundo filho1970 – Parte para Angola, onde chega a trabalhar para aOmega e a Tissot1973 – Regressa às <strong>Caldas</strong> para a Ourivesaria Sebastião1977 – Gilberto Santos funda a Relojoaria Beto, em nomeindividual1980 – Gilberto Santos, filho, inicia a sua actividade na RelojoariaBeto1984 – O filho mais novo, Paulo Santos, inicia também a suaactividade na Relojoaria Beto2000 – A Relojoaria Beto passa a Ourivesaria Beto pela mãodos irmãos Gilberto e Paulo Santos


18Centrais10 | Dezembro | 2010, VUMAMA EMPRESAMPRESA, , VÁRIAS VGERAÇÕESDuas gerações transformaram a loja caldense DecorDA COSTURA À DECORAÇÃOIdalina Marques nasceu nafreguesia de Alvorninha em 1947,casou com Armindo Marques em1969 e está a viver nas <strong>Caldas</strong> daRainha há 38 anos. Já fazia trabalhosem costura quando começoua trabalhar na fábrica Mattelem Cristovão. “A partir dos14 anos comecei a fazer tra-balhos de costura porque aminha mãe também fazia”,contou.Como era costureira, a sua intençãoera fazer bonecas naquelaempresa, mas entretanto a Mattelpassou a ser Euroaudio, dedicando-seà produção de cassetespelo que Idalina Marquesacabou por trabalhar num ramoque não esperava.Doze anos depois, em 1976,saiu da empresa quando foramnegociadas as indemnizaçõespara cessão de contratos. Comesse dinheiro decidiu abrir umaloja em 1978. “Sempre gosteide trabalhar em costura e foiuma boa oportunidade”, conta.O seu marido, que era empregadoda Rol, incentivou-a nesseprojecto.Uns anos antes, quando se casara,Idalina Marques fez os cortinadospara a sua casa, um trabalhoque terá sido tão perfeitoque suscitou o entusiasmo deamigas e familiares. Ainda antesde abrir a loja foi contratadapara fazer os cortinados e as colchasda Pousada do Castelo emÓbidos. “Mas não gostava deficar em casa a trabalhar” epreferiu ter um estabelecimentocom porta aberta, o que viria aacontecer em 1978.Foram anos e anos a costurare a trabalhar directamente comos seus clientes, muitos dos quaisainda se mantêm. “Já Já fiz corti-nados para os pais, para osfilhos e já estou a fazer paraos netos”, contou.Através do seu trabalho acompanhoumuitos casamentos porque,como diz o ditado popular,“quem casa quer casa”. Agorahá menos casamentos “e os jo-vens também não têm muitodinheiro para gastar na de-coração”.Na década de 90 tiveram tambémdurante alguns anos umaloja na rua Raul Proença, que entretantoencerrou.Idalina Marques acha que muitomudou neste ramo nos últimosanos. “Eu tinha sempremuita variedade de produtospara as pessoas poderem es-colher” e actualmente utilizamsemais os catálogos. Do que nãoprescinde é da qualidade da confecçãopois “sempre tivemosuma confecção muito boa econtinuamos a mantê-la”, diz.Armindo e Idalina Marques com os filhos, Nelson e Ricardo (ao colo) no Jardim Zoológico em 1977. Actualmente ofilho mais novo dirige a empresa fundada pela mãe em 1978.Os gostos dos clientes é quetambém mudaram. “Antiga-mente fazia-se aqueles folhi-nhos e pregas nos cortinados.Acabava por ser mais complicadoporque era tudo mui-to mais trabalhado”, recorda.Há 32 anos, quando ainda não se falava em empreendedorismo, Idalina Marques, nascida em 1947,ficou desempregada e resolveu transformar o seu talento para a costura para num negócio próprio.Em 1978 abriu a primeira loja na rua Henriques Sales, com o nome comercial Decorações Lina. Era umespaço pequeno, com cerca de 25 m2, onde Idalina Marques recebia os clientes. A maior parte dotrabalho de costura era feito em casa. Em 1984 mudou de instalações para a actual loja na rua MiguelBombarda.Em 2006 Idalina Marques deu lugar ao seu filho mais novo, Ricardo Marques, então com 30 anos, quealiou à sua formação nesta área uma vontade de fazer algo mais moderno criando a DL Ambientes.“Quisemos aproveitar o ‘know-how’ das Decorações Lina e criar algo de diferente, maisactual e ajustado às necessidades do mercado”, explicou Ricardo Marques.A DL Ambientes tem uma actividade mais abrangente do que apenas a decoração de interiores,realizando também serviços de decoração para eventos, virtual merchadising (dinamização deinteriores para espaços comerciais) e vitrinismo, entre outros.Na empresa, para além de Ricardo Marques, trabalham mais quatro funcionários no atendimento,costura e entregas. A sua mãe continua também a ajudá-lo, mas não é funcionária da empresa. A DLAmbiente conta ainda com um atelier de costura e armazémOs tecidos mais escolhidos tambémeram outros, apesar daseda continuar a ter muita procura“mas com padrões dife-rentes”.Embora não tenha um vínculoprofissional à DL Ambientes “nofundo, faz tudo parte de mim”,disse Idalina Marques. A empresaé fruto do seu trabalho e dosseus filhos, por isso foi com satisfaçãoque viu o mais novo assumiro desafio de ficar à frentedo negócio de família. “É bomvermos a continuação donosso trabalho”, afirmou.DESDE PEQUENOA AJUDAR A MÃEO filho mais velho, NelsonMarques, tem 39 anos e desdecriança começou a ajudar a mãe.Até há um ano e meio manteve aligação com a empresa, emboratenha criado um negócio próprioem 2006, mas actualmente estáem Angola a trabalhar no mesmoramo.“A primeira recordaçãoque tenho é da minha mãe terficado desempregada da an-tiga Mattel e ter começado afazer trabalhos de costurapara várias primas que ne-cessitassavam de cortina-dos. Começou a fazer parauma depois para outra e foievoluindo para as vizinhas,amigas, tendo ganho umacarteiras de clientes”, contouNelson Marques por escrito, atravésdo correio electrónico.Ainda se recorda como os cortinadoseram confeccionados nasala e na mesa da cozinha decasa. “A máquina de costuraficava mesmo em frente à TVe fazia um barulho horrível aIdalina Marques nos anos sessenta quando trabalhava na antiga Mattel e anos mais tarde quando já eraproprietária do seu próprio negócioincomodar os meus dese-nhos animados”, brinca.Já quando a mãe trabalhavaem casa começou a ajudá-la.“Segurava nos tecidos paramedir, aturava o barulho damaquina e as pessoas emcasa”, escreveu.Só a partir dos 16 anos, em1986, passou a ser funcionário atempo inteiro da empresa, masantes disso chegou a fazer algunsserviços de montagem etambém tratava dos recados,como o seu irmão mais novo viriaa fazer.Na loja fez de tudo, do atendimentoao público, à ajuda na escolhados tecidos, mas tambémencomendas, execução das montrase consultoria, decoração earquitectura de interiores. Feztambém escolha de colecções ecolaborou na administração daloja.Nelson Marques recorda-se daforma como o negócio foi prosperarandoao longo dos anos.“De De início as clientes compra-vam os tecidos e a minha mãeapenas fornecia a mão deobra o gosto e ideias, e pe-quenos materiais”.Ainda se lembora do dia dainauguração da loja na rua MiguelBombarda quando, depoisde trabalhar até de madrugada,deu por ele, descalço, a empurraro carro porque o automóvelficou sem combustível e não haviapostos de abastecimentoabertos. “Recordo tambémque os materiais executadosde grande volume, cortinados,colchas e sanefas às vezescom três de comprimen-to, eram transportadas numFiat 127”, lembrou.A mãe recorda-se também dosucesso obtido pelo trabalho queNelson Marques fez na decoraçãoda albergaria Josefad’Óbidos.“Ajudei a criar e crescer aloja, como braço direito daminha mãe, tendo uma grandeparte do meu suor e dedicação,onde cresci como ho-mem”, concluiu.Em Angola, Nelson Marquestrabalha actualmente na empresade produtos de interiores“Pêra Angola”, como técnico especialistaem fabricação e montagemde estores de rolo e decoraçãode interiores.FILHO MAIS NOVOCONTINUOU O NEGÓCIONascido em 1976, o filho maisnovo, Ricardo Marques, ainda serecorda do primeiro estabelecimentocomercial da mãe na ruaHenriques Sales. “Lembro-mede um banco que ainda temos


Centrais1910 | Dezembro | 2010ações Lina em DL AmbientesMãe e filhos numa exposição, em 2003, numa altura em que os três trabalhavamjuntosRecentemente foi criada uma nova marca, a Aroma Living, dedicada aos aromas efragrâncias para a casae do balcão. No atelier emcasa eu brincava com os te-cidos e a minha mãe ralhavacomigo”, recordou.Os primeiros trabalhos que fezpara a mãe, a partir dos 12 anos,foram recados, como ir ao bancoou buscar linhas. “Mesmo du-rante as aulas conseguiaconciliar os estudos e as brin-cadeiras com algum trabalhona loja”, contou Ricardo Marques.“Os Os meus pais sempreme educaram que todos ti-nham de contribuir para obem-estar da família”.Quando era mais novo RicardoMarques dizia sempre que oseu futuro não seria na loja dedecorações, mas alguns anosmais tarde descobriu que a suavocação estava nesta actividade.“Eu Eu dizia sempre que adecoração era para as mu-lheres e que não tinha nadaa ver comigo, mas depois comeceia descobrir que gosta-va desta área”, contou. Primeirointeressou-se pelo vitrinismo,ao fazer a decoração da montrada loja. “Eram umas brinca-deiras, mas recebia elogiosdos clientes”, disse.Acabou por seguir a área deArtes na Escola Secundária RaulProença e depois de concluído o12º ano, em 1996, cumpriu o serviçomilitar obrigatório e acaboupor ficar no Exército durante umano. “Fui para lá contrariado,mas depois cheguei à conclusãode que até gostava da-quilo”, referiu. Como era o condutorde um oficial e estava emLisboa, confessa que gostou daquelavida durante algum tempo.“Foi uma altura da minhavida em que precisava mes-mo de sair das <strong>Caldas</strong> e deconhecer outras realidades”,disse.“Já desde a minha adoles-cência gostava de ir com osmeus amigos a Lisboa. Apa-nhávamos o comboio até aoRossio e íamos até às Amo-reiras”, recordou.O facto de ser motorista deum coronel do Exército tambémfoi vantajoso. “Era uma vidasanta. Ia buscá-lo a casa elevá-los às reuniões. Tinhaum horário e ordenado fixo”,comentou.No entanto, rapidamente chegouà conclusão de que não eraesta a vida que queria e decidiusair da vida militar para apostarna sua própria formação.Em 2001 concluiu o curso deespecialização profissional de vitrinismoe visual merchandisingna Escola de Comércio de Lisboae foi estagiar para o grupo ElCorte Inglés em Madrid.No final desse ano regressoua Portugal para colaborar naabertura do El Corte Inglés deLisboa. “O O estágio que fiz emEspanha era para fazer par-te da primeira equipa da lojaque viria a abrir em Portu-gal”, explicou. Quando regressoua Portugal ficou a morar nas<strong>Caldas</strong> e fazia a viagem de ida evolta para Lisboa todos os dias.Só trabalhou naquela empresaespanhola durante três meses,porque em 2002 teve umaproposta para abrir uma loja dedecoração de interiores em Lisboa,perto da avenida de Roma.“Queria poder ter a possibili-dade de fazer um trabalhomais criativo e por isso acei-tei o desafio”, disse.Na loja de decorações Interfusões(entretanto encerrada)acabou por ter a certeza de queo gosto pela decoração “está nosangue”.DAS DECORAÇÕES LINA PARADL AMBIENTESEm 2006 Ricardo Marques correspondea um pedido da mãe,que não queria continuar o negócio,e aposta na reformulaçãoda empresa, que passou a ter adesignação de DL Ambientes (oDL é de Decorações Lina). “Qui-semos manter a identidade ecaracterísticas que tínhamosaté aqui”, explicou o empresário.Em substituição da DecoraçõesLina (que funcionava emnome individual) Ricardo Marquescriou a Mind.Room - AmbientesPersonalizados, UnipessoalLda, com um capital social de5000 euros, do qual é o único sócio.A mãe continua a apoiá-lo,mas é agora o filho mais novoquem assume a gestão da empresa.“A A minha mãe estava cansadade toda aquela actividadeda loja, mas ainda con-tinua a ajudar-me muito”, explicou.Idalina Marques disse-lheque gostaria que um dos filhosficasse à frente do negócio, porquesenão iria encerrar a loja eRicardo achou por bem voltarpara as <strong>Caldas</strong>.Em 2006 Ricardo Marques aindaera sócio da loja de decoraçãoInterfusões, tendo acumuladoa gestão dos dois estabelecimentosdurante seis meses.Actualmente está apenas àfrente da loja das <strong>Caldas</strong>, mas étambém, desde há sete anos,formador de vitrinismo e visualmerchadising na Escola de Comérciode Lisboa.“Eu sentia que a loja da mi-nha mãe estava a precisar deuma grande mudança porqueestava a ficar desajusta-da em relação ao que são asnecessidades do consumidoractual na decoração de inte-riores”, referiu Ricardo Marques.Sempre que vinha de Lisboa evisitava a loja da mãe, achavaque era preciso fazer algo de diferente,porque senão o futuronão seria risonho.Depois de obras de remodelaçãoe já com nova imagem, deixaramde apenas ter vocaçãopara a área têxtil e passaram ater projectos de decoração integrais,englobando o mobiliário,papéis de parede, iluminação eoutros elementos.“Nós fazemos um serviçode consultoria em que o cli-ente diz-nos o que quer e nósdesenvolvemos um projectointegral. No caso de o clientepreferir, esse projecto podeser feito por fases e não todode uma só vez”, explicou. Tudopode ser escolhido através de catálogos,desde a mobília aosacessórios. Essa é a parte quemais gosta na sua actividade profissional.“Eu Eu gosto mesmo éde criar”, revelou.OS AROMAS DA CASARecentemente criaram umanova marca, a Aroma Living, dedicadaaos aromas e fragrânciaspara a casa, desde as velas aosambientadores, mas também papelde forro de gavetas com aromae sabonetes da Saboaria Portuguesa.“Nós queremos quetudo o que esteja dentro dacasa tenha sempre um bomaroma”, adiantou Ricardo Marques,que considera muito importanteesta componente nãosó em residências, mas tambémem estabelecimentos comerciais.“É importante que ao en-trar num espaço, além docheiro a limpo, exista um aro-ma agradável”, disse.O empresário tem procuradosempre inovar, tendo tambémsensibilidade ambiental. Porexemplo, os produtos mais pequenosque sejam adquiridos naslojas podem ser embrulhadoscom pequenos sacos confeccionadosno atelier com sobras detecido. “Reutilizamos as so-bras que não serviriam paranada, aproveitando o nossoatelier de costura especializa-do”, explicou.Ricardo Marques defende areciclagem de materiais, sempreque com isso se consigam tambémbons resultados em termosestéticos. Também por isso recentementecontribuíram com algumaspeças de decoração parao projecto Olha-te, que tem comoobjectivo promover actividades<strong>Cronologia</strong>para doentes oncológicos. “Deu-me muito prazer saber queaqueles produtos que esta-vam arrumados a um cantono armazém vão ganharvida”.Desde a reformulação realizadaem 2006 o mercado da decoraçãode interiores tem tido tambémvárias evoluções e RicardoMarques procura acompanhar asprincipais tendências. Começama existir cada vez mais produtosespecíficos e até os designers demoda começam a ter a sua próprialinha de decoração.A carteira de clientes (cercade 2000) tem crescido também porcausa dos estrangeiros que compramcasa na região. A firma dátrabalho a cinco pessoas, entreeles Ricardo Marques (que é gerente),duas costureiras, uma comerciale uma técnica de montagens.O responsável não divulgouo volume de vendas da empresa.A DL Ambientes tem parceriascom empresas de materiais daconstrução para projectos “chavena mão” e imobiliárias. “Cri-ámos muitas sinergias e issotraz bons resultados”, defendeu.A crise económica trouxe tambémalgumas condicionantes aonegócio, apesar do empresárionão se queixar de falta de trabalhos.“As As pessoas sentemseum pouco retraídas porquenão são artigos de pri-meira necessidade, mascomo cada vez vivemos maistempo nas nossas casas,procuramos mais conforto”,referiu.Por outro lado, teme o quepoderá acontecer com o aumentodo IVA em 2011. “Até é visí-vel o facto de haver clientesque estão a comprar agorapor causa do aumento doIVA”, comentou.Começaram também a teruma maior concorrência porparte das grandes superfícies,que vendem alguns dos produtoscomercializados pela DLAmbientes. “Isso também nosobriga a apostar ainda maisna qualidade”, concluiu, salientandoque encara sempre asua vida de forma positiva.Pedro Antunespantunes@gazetacaldas.com1947 – Nasce Idalina Marques1964 – Vai trabalhar na fábrica Mattel em S. Cristóvão1969 – Casa com Armindo Marques1978 – Abertura da loja Decorações Lina na rua Henriques Sales1984 - Mudança de instalações para a actual loja na rua MiguelBombarda1986 – O filho mais velho, Nelson Marques, torna-se funcionário daempresa1993 – Ricardo Marques, o filho mais novo, torna-se também funcionárioDécada de 90 – Loja de cortinados na rua Raul Proença2006 – Criação da DL Ambientes com a firma Mind.Room - AmbientesPersonalizados, Unipessoal Lda2008 – Nelson Marques parte para Angola para trabalhar no mesmoramo2010 – É criada a marca Aroma Living


18Centrais17 | Dezembro | 2010, VUMAMA EMPRESAMPRESA, , VÁRIAS VGERAÇÕESO café mais antigo da freguesia de Santo Onofre temAduíno Coito com o pai Diamantino Couto (1914-1978) em frente ao café nos anoscinquentaÀ terceira foi de vez. No mundodos negócios nem sempre seacerta à primeira. DiamantinoCouto (1914-1978) instala-se em1935 no Bairro Além da Pontecom a mulher, Ema Pilar Leal(1923-2006) e arrenda uma casano Largo Frederico Ferreira PintoBastos (à época Largo daMina) para montar a sua barbearia.A coisa não resultou e cincoanos depois abre uma taberninhano mesmo espaço. Mas tabernasjá havia muitas nas <strong>Caldas</strong>e em 1945 Diamantino arriscatransformar o seu estabelecimentonum café.Para a época pareceu uma decisãoum pouco arrojada, mas averdade é que não havia nadado género naquilo que é hoje afreguesia de Sto. Onofre e o CaféBordalo acabou por se revelarum sucesso. O próprio nome foiescolhido num tempo em queRafael Bordalo Pinheiro não eraa figura tão conhecida e estudadacomo hoje. Resultou deuma coincidência: Zé do Coito,o pai do jovem barbeiro e agoradono de um café, tinha trabalhadona fábrica de faianças deBordalo e de lá trouxera um bustodo artista que ainda hoje figuranuma parede do café e queesteve na origem do seu nome.O casal Diamantino e Emaacabaram assim por se iniciarnuma actividade que hoje já vaina terceira geração. Ou na quarta,se considerarmos que os bisnetosJoão, de 13 anos, e a Joana,de sete, também já ajudama tirar uns cafés e a limpar asmesas no velho - mas já porduas vezes remodelado - CaféBordalo.Apesar do sucesso do café,Ema Pilar Leal, descendente deespanhóis e nascida justamenteem S. Bartolomeu dos Galegos(Lourinhã), trabalha nos balneáriosdo Hospital Termal eajuda o marido no negócio, substituindo-oquando este vai paraos treinos. Diamantino joga futebol.É jogador do SportingClub das <strong>Caldas</strong> e mais tarde do<strong>Caldas</strong> Sport Club, onde fez umacarreira que ainda hoje é recordada.Da esquerda para a direita: João, Aduíno Coito, Pilar Leal, Joana, Sandra Coito e Jorge Reis.E um dos cafés mais antigos das <strong>Caldas</strong> e foi o primeiro a abrir portas no Bairro Além da Ponte, em1945. O mesmo espaço já tinha sido barbearia e taberna, mas foi como café que chegou até ao séculoXXI ao longo de três gerações, ou até mesmo quatro, se considerarmos que os bisnetos do seufundador, Diamantino Couto, já ajudam as mães e o avô nas lides do balcão e das mesas.Aduíno Coito, filho de Diamantino tem hoje 70 anos e é o patriarca da família que nasceu e cresceuneste estabelecimento do Largo Frederico Ferreira Pinto Bastos. “Dantes só se vendiam copos deleite, garotos, pirolitos, gasosas e rebuçados. E meia dúzia de bolos. Hoje vendemos entre80 a 100 bolos por dia”, conta acerca dos hábitos de consumo de várias gerações de caldenses.Um avô, filhas, netos e genro representam três gerações que dão continuidade ao café Bordalo.Em 1940 nasce o único filho Centro Hospitalar, mas acabado casal. Aduíno Manuel Leal do por não concluir o curso Comercial.Coito, hoje com 70 anos, cresceno café que era também a sua“Por causa disso só fuicasa. Frequenta a escola primácabona tropa, quando poriana antiga Delegação Escolardia ter sido furriel”, diz AduínoCoito. Mas na altura já tra-(perto do actual Vivaci) e ainda“inaugura”, como aluno, a esbalhava,sentia-se na obrigaçãocola primária do Bairro da Ponte.Emergindo de uma famíliaremediada, não se fica pela 4ªclasse e prossegue os estudos,à noite, na Escola Industrial eComercial das <strong>Caldas</strong> da Rainha,no edifício que é hoje o doConselho de Administração dode ajudar os pais no café e tambémcomeçara a namorar cedo,aos 17 anos, com uma jovem caldense,Manuela Silvestre (1942-2002), com quem viria a casar. Ocomércio foi quase sempre a suaactividade: primeiro na loja deroupa de José Luís Campos (naPraça 5 de Outubro), depois naNobela (Rua das Montras), a seguirna Casa Ramiro e mais tarde,como administrativo, noHospital Termal, onde tambémtrabalhava a sua mãe.Até que em Janeiro de 1961 échamado para a tropa. Assentapraça em Castelo Branco e seismeses depois está a bordo doVera Cruz a caminho de Angola.“Andei debaixo de fogo, sim”,conta. Dezanove meses no matoem aquartelamentos frágeis,sujeitos a ataques e correndoriscos quando as colunas sofriamemboscadas. De Portugal,perdão, da Metrópole, chegamlhecartas da família e da namorada,muitas vezes acompanhadasde fotografias tiradasno Café Bordalo. Um conjuntode imagens que hoje constituium precioso espólio da família.Sobrevive e regressa em Novembrode 1963, fazendo o percursohabitual ao de milharesde jovens que, regressados datropa e da guerra, casam. Tro-Meio século separam estas fotos, tiradas do mesmo ângulo do café. Em 1959 o Bordalo possui uma das primeiras televisões das <strong>Caldas</strong> e o café enchia-se, sobretudo quandohavia futebol, filmes portugueses, teatro, Natal dos Hospitais, Festival da Cancão e as Misses. Hoje o futebol ainda leva muitos convivas ao café.


Centrais1917 | Dezembro | 201065 anos e reúne três gerações ao balcãocou alianças em 1965, mas já unsmeses antes começara a trabalharcom o futuro sogro, AntónioVerdiano Silvestre, que tinhauma loja de produtos alimentares(Vardasca & Veridiano,Lda) na Rua da Electricidade.A primeira filha, Maria Pilardo Coito, nasce em 1966 e a segunda,Sandra Cristina, em 1970.Manuela Silvestre reparte agoraas atenções do café e dos clientescom as filhas, que, talcomo o pai, crescem no CaféBordalo, em torno do qual gira ahistória da família.Em 1970 Aduíno muda de emprego.O sogro embarca numaaventura que consistiu em unirgrande parte dos armazéns deprodutos alimentares das <strong>Caldas</strong>numa só empresa, a Unical,que para isso constrói um pavilhãona Estrada da Tornada (hojeparcialmente aproveitado peloPingo Doce). O genro acompanha-ocomo empregado de escritóriodurante os 16 anos queo projecto dura.“Fui dos últimos a sair, to-dos deram à sola quandoaquilo começou a corrermal”, conta. A falência da empresa,em 1986, acaba por setransformar numa oportunidade.“Comecei a pensar em re-modelar isto e ganhar aquia minha vida e em boa horao fiz. Só tenho pena de não oter feito antes. Na verdadeeu nunca tinha gostado deser empregado de escritório.Preferi sempre o contactocom as pessoas”.NO CAFÉ A TEMPO INTEIROA primeira coisa que faz é umaremodelação total. O café dosanos quarenta dá origem a umestabelecimento moderno, comvitrines, mas mantendo, mesmoassim parte das mesas que o paide Aduíno tinha comprado aoCafé Nicola, em Lisboa. São mesaspesadas, de ferro e mármo-re, seguramente com mais de90 anos de existência e que estãopara durar outros tantos.Diamantino só viu o princípioda remodelação. Morre em 1987.Mas dir-se-ia que tinha esperadopela concretização de um velhosonho – ver o filho a tempointeiro à frente do Café Bordalo.A remodelação revelou-seuma aposta certa e Aduíno deuseconta que afinal aquele negóciodava para viver sem precisarde mais nenhuma emprego.“Ultrapassou todas asexpectativas”, conta.Nos finais da década de oitentaa cidade conhece um surtode forte construção e cresce(também) para o Bairro da Ponte.Durante algum tempo o Bordalofoi o único café do bairro.Hoje contam-se várias dezenasem toda aquela zona da cidade(bairros da Ponte e dos Arneiros),mas nada que afecte o cafémais antigo.Também os hábitos de consumomudaram. Aduíno diz que antigamentehavia poucas coisas“Mais do que uma profissão, trabalhar aqui é um modo de vida”para vender num café. “Vendiam-secopos de leite, garotos,pirolitos, gasosas, rebuçados.E meia dúzia de bo-los. Hoje vendemos entre 80a 100 bolos por dia”, conta.Durante décadas perdurou a velhamáquina de café de saco,que viria a ser substituída poroutra que necessitava de umaalavanca para tirar as bicas.Hoje o café expresso sai, quente,de uma moderna máquinaMercury.Fiel à tradição do que entendeser um café, o seu proprietáriovai resistindo a nele venderpão e mini-refeições, comoo fazem tantos outros. “O cafédeve funcionar como umcafé”, resume.Carlos Ciprianocc@gazetacaldas.comSandra Coito (40 anos) e PilarLeal (44 anos) são a terceirageração atrás do balcãodo Café Bordalo. As duas filhasde Aduíno e Manuela Silvestrecresceram e brincaramno estabelecimento dos avóse que posteriormente ficoupara os pais. Em frente, o LargoFrederico Ferreira PintoBastos ainda não tinha muitoscarros. A vizinhança eraconhecida e o Bairro da Ponteera naquele tempo ainda quasecomo uma aldeia dentro dacidade. Mas à medida quecresciam as duas irmãs encararamcom normalidade aajuda que era preciso dar aospais e cedo começaram a trabalharno café quando vinhamdas aulas e durante as férias.“É como o João e a Joana”,dizem, referindo-se aos filhos,que são os bisnetos deDiamantino Coito e que tambémjá vêem o café como umaextensão das suas casas.Em rigor só Sandra Coito e omarido, Jorge Reis, são actualmentefuncionários do CaféBordalo – Sociedade Unipessoal.É lá que passam a maiorparte do seu tempo – de manhã,à tarde e à noite – numnegócio familiar, cuja facturaçãopreferiram não revelar, eque prescinde de empregados.A irmã Pilar pertenceu à geraçãoque aproveitou a vinda doensino superior para as <strong>Caldas</strong>e foi no antigo pólo da UALque tirou Direito, exercendohoje advogacia. Mas nem porisso perdeu o vínculo ao caféda família e tem até uma escalade duas manhãs e duasnoites por semana, nas quaisdeixa no escritório as questõesjudiciais e vem para o cafémais antigo do Bairro da Ponteservir bicas e galões, tostas,sumos e bolos.A irmã mais nova, SandraCoito, não chegou a concluir alicenciatura em Gestão, foitrabalhar para a Futur Kids(uma escola de informáticacaldense já desaparecida),mas entendeu que se o CaféBordalo foi o ganha pão do seuavô e do seus pais, então tambémpoderia ser o dela e dafamília.“Mais do que uma profis-são, trabalhar aqui é ummodo de vida. Não há ho-rários, nem fins-de-semanacompletos nem tempo parair jantar fora. É vivermosaqui dentro”, diz Sandra. Ocafé só fecha ao domingo.As filhas do senhor Aduínoassistiram também a algumastransformações nos hábitosdos clientes do café. Dantes asala enchia-se ao serão até àhora do fecho, mas agora aspessoas já não passam tantotempo nestes espaços sociais.Tomam a bica, bebem umaágua ou uma cerveja e vão paracasa. Há alguns resistentes,que são quase da família. E hátambém as excepções – a televisãojá não é uma novidade,mas nas noites de futeboleste café de bairro enche-se.É que ver um jogo da selecçãoou um Sporting-Benfica emgrupo cria um ambiente maisfestivo e tem muito mais piadado que assistir à partida emcasa. “E as mulheres prefe-rem ver a telenovela”, acrescentaAduíno Coito, que conheceos hábitos e motivaçõesdos clientes.Curiosamente, o edifício nãoé pertença da família, tendo oentão jovem Diamantino acordadocom o proprietário, seuamigo, o pagamento de umarenda mensal. Naquele tempoCRONOLOGIAbastava a palavra dada para sercumprida e só em 1970 é quehá um documento escrito noqual Diamantino se comprometea pagar 500$00 de renda pormês. Sim, na moeda de hoje só2,5 euros. Mas actualmente arenda é de 57 euros. Aduíno reconheceque é barato e insisteque não perdeu a esperançade comprar o rés-de-chãoonde nasceu e onde viveu todaa família.C.C.1935 – Diamantino Couto abre uma barbearia no edifício que éhoje o nº 12 do Lg. Frederico Ferreira Bastos1940 – Muda de ramo. Converte a barbearia em taberna.1945 – Muda novamente de ramo e inaugura o Café Bordalo, oprimeiro da actual freguesia de Sto. Onofre1970 – Assinatura do primeiro documento de arrendamento noqual o dono do Café Bordalo paga 500 escudos (2,5 euros) derenda por mês ao proprietário1986 – O filho Aduino Coito pega formalmente no negócio dafamília1987 – Morre Diamantino Couto1987 – O Café Bordalo sofre uma remodelação2002 - Sandra Coito, neta de Diamantino, entra formalmentepara o Café Bordalo - Sociedade Unipessoal2008 - O marido Jorge Reis também entra para a empresaA imagem mais antiga do Café Bordalo nosanos 40À esquerda Manuela Silvestre, então namorada de Aduíno, com os futuros sogros, Diamantino e Ema Pilar Leal. Na imagem dadireita Manuela está sentada e os proprietários do café estão atrás do balcão.


18Centrais24 | Dezembro | 2010, VUMAMA EMPRESAMPRESA, , VÁRIAS VGERAÇÕESTrês gerações de luso-galegos fizeram da PastelariaO Casal Perez em 1991 ladeado pelos empregados de então, António Maria, Patrícia Anjos e Fernando Vieira. À direita, Peregrina Molares à entrada da Pastelaria Machado napassada segunda-feira.A fundação da casa remonta aoséculo XVIII e as suas memóriassão agora contadas com sotaqueespanhol, da D. Peregrina Molares,a actual proprietária da casa,que gere com os seus filhos Marina(50 anos), Santiago (51 anos) eMiguel (49 anos).As irmãs Fausta eram doceirase terão começado a sua actividadeao lado do Hospital Termal, emmeados de 1800 mas depois mudaram-separa a Rua de Camões,onde ocuparam uma cocheira aíexistente que viria a ser a actualpastelaria Machado, apelido de umempregado da casa (Joaquim Machado)que viria a ser o proprietáriodepois das irmãs terem decididoabandonar o negócio.Joaquim Machado continuará aarte doceira tradicional caldense,sobretudo na primeira década doséc. XX, trabalhando na pastelariacom a sua família.A história da pastelaria Machado funde-se com a história da própria cidade. Ponto de referência nadoçaria regional, os seus bolos reis são presença habitual nas mesas de consoada.Aquela que é uma das casas mais antigas das <strong>Caldas</strong> ainda em actividade, remonta ao século XVIIIcom a Casa Fausta, cujas responsáveis, duas irmãs, contribuíram para a manutenção dois verdadeirosex-libris gastronômicos da cidade: as cavacas e as trouxas-de-ovos.José Fernandes Perez (1928 – 2000), um apaixonado pela doçaria, deu um impulso grande à casa,criando muitos dos mais de 60 bolos que diariamente são colocados nas prateleiras.A Pastelaria Machado é actualmente gerida por Peregrina Molares, viúva de José Fernando Perez, e osseus três filhos Santiago, Marina e Miguel.No início do anos 20 este comerciantedá sociedade a JoséPerez, um galego natural de Vigo,que viera para Lisboa com o intuitode emigrar para os Estados Unidos,mas que se quedou por Lisboaonde trabalhou na PastelariaBenard (Rua Garrett).A aprendizagem da doçaria serlhe-íadepois muito útil quando,nas <strong>Caldas</strong> da Rainha, começa atrabalhar com Joaquim Machado,de quem se tornou amigo, paraalém de sócio.Em 1944 o neto de José Perez émais um dos muito imigrantes galegosque fogem daquela provínciapobre de Espanha, tentando asorte em Portugal, neste caso, nas<strong>Caldas</strong> da Rainha, junto do avô quelhe dá protecção e emprego naPastelaria.A Cavacaria Machado em 1907, quando ainda era gerida por Joaquim Machado euma imagem actual do estabelecimento na Rua Luís de Camões (o centro históricoaguarda ainda por um plano que restrinja a circulação automóvel).Nessa altura José Fernandez Peres(1928-2000) tem 16 anos e malimaginava o papel importante queviria a ter nesta casa, uma vez quevai suceder ao avô e ao sócio, quemorrem, respectivamente, em 1954e 1950.Os galegos são como os portugueses.Sentimentais e nostálgicos.E por isso o jovem José FernandesPerez nunca deixou de visitara sua terra natal. É numa dessasvisitas que conhece PeregrinaMolares (nascida em 1935), filhade um padeiro de Vigo.O namoro tinha tudo para darcerto porque até as profissõeseram similares. Mas não foi fácil opasteleiro convencer a filha dopadeiro a partir para o sul, para adistante cidade das <strong>Caldas</strong> da Rainha.“Criei-me num clima demedo por causa da guerra ci-vil”, recorda hoje Peregrina Molares,acrescentando que quandoJosé Fernandes Perez lhe propôsnamoro não sabia o que responderporque não queria ir deixar asua terra natal.Acabaram por casar na Galizaem 1958, mas logo de seguida vierampara Portugal. No início Peregrinaainda passava algumas temporadasna sua terra natal, ondeviria a dar à luz os seus filhos maisvelhos, Santiago e Marina.A primeira impressão que PeregrinaMolares teve das <strong>Caldas</strong>da Rainha, em Março de 1958, foi auma cidade bucólica em que as“árvores estavam nuas e acheia cidade um bocado tristonha”.Meses depois, com o Verão, oburgo ganhou nova vida e Peregrinapassou a sentir-se melhor, atéporque, como referiu, o mar, omesmo Atlântico que banha a suaGaliza natal, também estava mutopróximo das <strong>Caldas</strong>.MAIS DE 60 VARIEDADES DEBOLOS POR DIAJosé Fernandes Perez aprenderacom o avô a arte da pastelaria.Tinha uma verdadeira paixão pelosdoces, o que o levou, por váriasvezes, a França, Suíça e Alemanhaa fim de acompanhar as novidades.Também comprava livros paraestar actualizado no seu métier.“Antes a casa não fabrica-va muitas coisas, todos estesdoces que agora conhecemosforam pesquisas que o meumarido fez e pôs em prática”,conta hoje Peregrina Molares.Na década de 60 trabalhavamcerca de 15 pessoas com o casalPerez - duas na copa e o resto nafábrica. E vendiam praticamentetudo o que produziam na loja, queatraía pessoas dos concelho vizinhos,onde poucas pastelarias existiam.“Quando vim para cá moía-mos a amêndoa à mão”, lembraa D. Peregrina. A massa paraas cavacas demoravam duas a trêshoras a amassar pois não existiamamassadoras e o trabalho tinhaque ser feito manualmente.Ao longo dos anos foram sempredesenvolvendo a sua própriapastelaria. Fernando Perez começoua criar, fez coisas novas e deuum impulso muito grande porquea casa era pequena e estava a ficarvelha. Entre as novidades estãoas “Florestas”, um doce comamêndoa, cuja receita descobriuna Alemanha e que originalmentetinha o nome de “Floresta Negra”.Actualmente os clientes continuama procurar muito este doce,assim como o bolo russo, as línguasde gato e os ossos de roer.A remodelação, que deu o aspectoque a casa ainda mantémdata de 1962. Há cerca de uma décadaforam feitos alguns melhoramentos,mas os clientes pedirampara não mexer na decoração,que inclui um painel de cobree as madeiras exóticas.A casa ao longo dos anos foialcançando muito prestigio. Inicialmentefornecia a Casa Real deLisboa, no reinado de D. Carlos (osdoces iam para a capital pelo caminhode ferro). Por ali passaramtambém figuras públicas como osanteriores Presidentes da RepúblicaAmérico Thomaz, Mário Soares,e personalidades ligadas à


Centrais1924 | Dezembro | 2010Machado uma referência nas <strong>Caldas</strong> e no paíscultura como Vasco Graça Mouraou Eduardo Prado Coelho. PauloRodrigues, um caldense (falecidoem 2010) que foi secretário de Salazar,levava doces da PastelariaMachado para o velho ditador.O atendimento e a qualidadedos produtos continuam a fazer onome da casa, que actualmentetem oito funcionários, além da família(mãe e três filhos), que alitrabalham diariamente.Os fins-de-semana são os diasde maior movimento e a Páscoa eo Natal são épocas altas para apastelaria. O seu bolo rei é presençaem muitas consoadas, ePeregrina Molares garante queeste continua a ser feito da mesmamaneira tradicional que o seusogro já fazia, embora reconheçaque desta forma o lucro é menor.O segredo do bolo rei da pastelariaMachado é ser feito com“produtos tradicionais”, comoa manteiga, ovos (em vez de essência)e fermento de padeiro. “Amassa demora oito horas alevedar”, explica a responsável. Épor isso que às vezes o bolo reinão chega para a procura porque“não se pode fazer à la minu-te”.No dia de Natal chegam a vender600 quilos de bolo. “É É a alturamais trabalhosa porque todaa gente gosta de levar paracasa um bolinho rei”, diz, acrescentandoque na Páscoa, porexemplo, já não há tanta procura.“Esta história de venderamêndoas baratas e de máqualidade já tirou a vontade àspessoas de comprar amêndoas.As nossas são de chocola-te e torradas e são sempreboas”, garante.Todos os dias a prateleira commais de 60 variedades de bolos éreposta, e ao fim-de-semana emmaior número. A azáfama começacedo e acaba tarde, com os pasteleirosa entrar às 5h30 da manhãpara começar a fazer os bolos. Apastelaria recebe encomendas debolos de aniversário, a maioriapara particulares, mas por vezes,também para restaurantes.Actualmente trabalham naqueleestabelecimento - cuja firma éuma sociedade por quotas designadaPastelaria Machado, Lda. -oito funcionários, juntamente comos quatro responsáveis (mãe e trêsfilhos), que não quiseram divulgarnenhuma ordem de grandeza acercado volume de vendas.À pergunta “o que é preciso paramanter o negócio tantos anos?”peregrina Molares só tem uma resposta:perseverança e um bocadinhode dinamismo. E a fórmula temdado resultado.Fátima Ferreirafferreira@gazetacaldas.com“A pastelaria é uma soma depormenores que vão ditar se é umacoisa excelente ou medíocre”Santiago Molares, 51 anos, com a empregada Fernanda Ribeiro. Santiago nasceuna Galiza, mas é caldense de toda a vida e é hoje o pasteleiro da casa. Os irmãosMiguel e Marina não estiveram disponíveis para colaborar neste trabalho.Santiago Molares, o filhomais velho do casal José ePeregrina, seguiu naturalmenteas pisadas paternas na pastelariae é ele, com o seu irmãomais novo, Miguel, queconfeccionam diariamenteuma doçaria de excelência.Com 51 anos, Santiago recorda-seque fez o seu primeirobolo com cinco para comemoraro aniversário do pai.“Fui ao livro de receitas delee escolhi um pão-de-ló quequis amassar como seamassa massa folhada”,conta, adiantando que era assimque via o seu pai trabalhar.Apesar da boa intenção,o resultado do seu primeirobolo não foi brilhante, recorda,rindo-se.Depois de ter feito o ensinosecundário, Santiago começoua trabalhar na pastelaria. Tinha18 anos quando teve o seuprimeiro contrato de trabalhonesta casa. Depois foi tirandocursos em Portugal, Espanhae Itália e aprendendo tambémcom o seu pai e as pessoasque ali trabalhavam.Considera que actualmenteos pasteleiros são uns “lords”porque muitos dos materiaisque utilizam já estãotransformados, deixando-lhesmais tempo para a criação e afeitura de bolos mais refinados.Esta facilidade também temum reverso, contribuindo emparte para a descaracterizaçãodas pastelarias. “A fruta dobolo-rei é igual em todo olado”, exemplifica o pasteleiro,que acha que as coisas terãoque mudar.O futuro da pastelaria teráque passar por uma estratificaçãomaior entre o que é o fabricotradicional, com as casas atrabalhar com produtos clássicos,e o industrial, com glutamatosde sódio e gorduras hidrogenadas.O pasteleiro, que diariamentecomeça a trabalhar pelas5h30, tem feito várias invenções,entre elas os bombons praline,que “as pessoas não vão encontrarem mais lado ne-nhum”, garante. É que este profissionalteve em conta, e tentoucolmatar, todas as falhasque encontrava nos bombonsexistentes, criando um de excelência.“A pastelaria é uma somade pormenores que, no fim,vão ditar se é uma coisa ex-celente ou medíocre”, disse.Os seus segredos irão passarpara o filho, actualmente com10 anos, se este quiser seguir aspisadas do pai, ou então irão,um dia, ser publicados em livro.Para Santiago, o paradigmado bolo continua a ser o pastelde nata de Belém. “Quandoconseguir fazer uma coisacomo aquela atingi a perfei-ção”, conta, garantindo queanda lá muito perto.Dos tempos actuais, Santiagodiz que a casa atravessa osproblemas comuns a todos osestabelecimentos comerciais.Lembra que antes, quando aEstrada Nacional que ligavaLisboa ao Porto passava pelas<strong>Caldas</strong>, muitas pessoas paravamna cidade para descansardas longas horas de viagem.“A história das <strong>Caldas</strong> edesta pastelaria modificousemuito desde que foi cons-truída a A1 que fez com as<strong>Caldas</strong> deixasse de ser umapassagem obrigatória”, recorda.O pasteleiro diz mesmo quequando tinha 10 anos estavaconvencido que as “<strong>Caldas</strong>iria ultrapassar Leiria emnotoriedade, dado o seu de-senvolvimento”. Era uma ilusão,porque entretanto deixoude ser um ponto de passageme “não foram feitas iniciati-vas que compensassem,tornando as <strong>Caldas</strong> comoum objectivo final, comopoderiam ser as termas”.Santiago Perez defende que adinamização do termalismo,assim como as faianças, poderiamajudar em muito o sectorcomercial.Os irmãos de Santiago - Marinae José Miguel Molares –também trabalham na PastelariaMachado, mas não quiseramdar o seu testemunhopara esta reportagem.Fátima Ferreirafferreira@gazetacaldas.comCavacaria MachadoEra a antiga Casa Fausta (Rua de Camões – 41-47), cujas origens seperdem no século XVIII.Gertrudes Fausta de Sousa citada em 1883 como moradora na rua Nova –foi, muito provavelmente, uma das célebres irmãs Fausta. Parece ter sidouma das conserveiras de maior fama em que mais contribuiu para a manutençãode uma actividade emblemática das <strong>Caldas</strong>: as cavacas.A par das trouxas de ovos, as cavacas são (também) segredos doces quepassaram através de muitas gerações. A família real e as elites do final doséculo XIX e do início do século XX vinham no verão às <strong>Caldas</strong> mergulhar nummundo de canastras de cavacas, pastelinhos de Marvão, queijinhos do céu,castanhas de ovos, lampreias, pão-de-ló de nata, lagartos, raivas, suspiros,esquecidos, queijadas e trouxas.Nesse tempo, eram ainda confeccionados alguns doces tradicionais, hojeignorados, tais como o “Manjar de Tornada” e os célebres “Cacos”.As irmãs Fausta foram contemporâneas, no final do século XIX, da cavacariadas Mendricas (na actual Praça da República) onde se reuniam RafaelBordalo Pinheiro, Manuel Gustavo Bordalo Pinheiro, Columbano, Lopes deMendonça, António de Andrade (então tenor em início de carreira), o PadreAntónio (de Almeida) de Óbidos (conhecido pela sua bela voz de barítono,bem como pelas pescarias e caçadas que organizava), Gomes de Avelar(editor dos Cavacos das <strong>Caldas</strong> e ceramista local), os maestros do Club deRecreio (Gaspar e depois Taborda), e Mariano Pina. Por vezes tambémcavaqueavam no café da Adelaidinha da rua Direita - onde mais tarde ficariaa pastelaria Gato Preto.Nesta época, havia ainda as seguintes casas e ou conserveiras: a MariaCarolina de Albuquerque (Já existia em 1887), a Cavacaria Pires (abriu em1892) e a Cavacaria Central (abriu em 1897) - ambas no largo das Gralhas(actual largo Dr. José Barbosa); a Gertrudes e a Mariana Rodrigues Valada(também citada em 1883 por Silvano Lopes) ambas na rua Nova; a CecíliaSantos na rua Direita; a Viúva Nunes, a Cesária Coelho e a Mariana César játinha casa aberta em 1884) - todas na então praça Maria Pia; a Jesuína Garciana rua General Queirós; o Pedro Prudêncio (emblema do Gato Preto) na ruado jardim nº 52 - premiado na Exposição de Paris de 1900; e a CavacariaConde, situada primeiro na Praça Maria Pia e depois na rua Direita (actualmenterua da Liberdade), que desde 1895 anunciava um doce que já não seprova nos dias de hoje - os Pastéis de D. Leonor.As Irmãs Fausta influenciaram as gerações seguintes de doceiras quefizeram época sobretudo no 1º quartel do século XX, tais como: as Carneirinhas:a Jade: a Adelaide Augusta do Café Sport na praça da Republica; a Florde Liz na Rua Heróis da Grande Guerra - depois na Av. da IndependênciaNacional e, nos anos 30, na praça da República; O Africano de FranciscoAntónio dos Santos - na Rua Almirante Cândido dos Reis; a Maria ReginaGarcia Pereira - e mais tarde a sua filha Regina - no largo do Conselheiro JoséFilipe; e o Joaquim Machado, na rua Camões, que herdaria a tradição daantiga casa Fausta.Joaquim Machado desenvolveu a sua arte da doçaria, sobretudo, na primeiradécada do século XX (vendia as suas famosas trouxas a meio tostãocada), sendo dessa altura o BPI.A Cavacaria Machado, como ficou a denominar-se o estabelecimento, foitomada de trespasse, em Maio de 1927, pela sociedade de Tiago LeopoldoPerez, que em Maio de 1928 adquiriu a denominação Tiago e Perez Lda..Ainda hoje existe e é gerida por um neto deste último.In Bilhete Postal Ilustrado das <strong>Caldas</strong> da Rainha, de Vasco Trancoso<strong>Cronologia</strong>1840 – As irmãs Fausta começama trabalhar em doçaria jun-José Fernando Perezres em Vigo que viria a casar comto ao Hospital Termal, transfe-1944 – José Fernando Perez vemrindo-se depois para a R. Luís de de Espanha para as <strong>Caldas</strong> e junta-seao avô na pastelariaCamõesInícios do século XX - Joaquim1950 – Morre Joaquim MachadoMachado fica com a pastelaria,1954 – Morre José Perez, avô deonde antes era empregado das José Fernando Perezirmãs FaustaDécada de 50 – José Fernando Perezcompra parte na sociedadeDécada de 20 – José Perez entrana sociedade da Pastelaria Ma-1958 - José Fernando Perez echado com uma quota de 30% Peregrina Molares casam1927 – Nasce José Fernando Pe-1964 – José Fernando Perez torna-seo único dono da pastelariarez em Gondomar (Galiza), netode José Perez, que viria a ser pro-2000 – Morre José Fernando Perez.Viúva e filhos dividem entre1935 – Nasce Peregrina Mola- si as quotas daprietário da Pastelaria Machadosociedade.


20Centrais31 | Dezembro | 2010, VUMAMA EMPRESAMPRESA, , VÁRIAS VGERAÇÕESEm Óbidos a família Martinho nunca deixou de ampliar aA 14 de Dezembro de 1984 erainaugurada a Albergaria Josefad’Óbidos. A primeira albergaria davila nasceu da visão e persistênciade António Silvério Martinho (1930-2000) que, por passar bastante tempoem Óbidos, foi-se apercebendoque chegavam muitos autocarroscom turistas que ali não permaneciampor não haver alojamento.António Silvério Martinho nasceuna Usseira em 1930 e ficou órfãode pai aos nove anos, alturaem que teve que deixar a escolaprimária para começar a trabalharpara ajudar a mãe. Casou em 1954com Maria Emília Rebelo, naturalda Capeleira, e trabalhava comopadeiro, contando com a ajuda daesposa no seu ofício.Entretanto abriu também umaloja de pesticidas junto à farmácia,à entrada de Óbidos, acumulandoas duas funções. Mas comoera um homem muito aventureiro,lutador e muito pouco satisfeitocom a vida, António Silvério Martinhocomeçou a pensar noutras formasde fazer negócio e tambémdar um futuro melhor aos seus doisfilhos, Carlos e Zélia Martinho,actualmente com 55 e 44 anos, respectivamente.Depressa se apercebeu da potencialidadeturística da vila. E serecusou uma primeira proposta desociedade para fazer um hotel na“casa assombrada”, à entrada deÓbidos, ficou-lhe o interesse pelapossibilidade de criação de umaunidade hoteleira.Um terreno com um quintal, umacasa de madeira e uma adega antigaà entrada da vila, pareceu-lheo ideal para concretizar o sonho.Falou com a esposa e filhos sobreo projecto e foi contactar com oproprietário, o tenente-coronelJustino Moreira a propor-lhe acompra.Justino Moreira viria a procurálona sua loja de pesticidas ondelhe disse que “a sua atitude ti-nha sido louvável porque erauma obra que ia dignificar avila e, como tal, iria vender pelaprimeira vez na vida um terre-no”, recorda hoje Carlos Martinho.As negociações começaram em1980 e seis meses depois é feita acompra. António Silvério Martinhoadquiriu o terreno por 400 contos(perto de dois mil euros) e emDezembro de 1984,abriram ao públicoas portas da albergaria.Os dois filhos estão na casa desdea sua abertura. Zélia, na alturacom 18 anos, deixara de estudar etinha ido trabalhar na recepção deum complexo de apartamentos emS. Martinho do Porto, para ganharexperiência no ramo, e viria a ser aprimeira recepcionista da casa.Carlos Martinho tinha ido trabalharpara a Suíça para um casino(onde esteve durante dois anos)mas o pai, em 1980, foi chamá-lopara integrar o projecto.“Não fazia ideia nenhuma dadimensão que iria ter, mas dediquei-mea isto porque é nos-so e foi o meu pai que fundou”,conta agora Zélia Martinho, adiantandoque é importante dar continuidadea este trabalho. Recordaque a hotelaria era uma área quedesconhecia, mas que mesmo assimforam logo às agências de viagemdar a conhecer a albergaria.Zélia reconhece também que naquelaépoca tudo era mais fácil.“Agora não era possível”,conta, destacando as exigênciasque são necessárias para a aberturade uma unidade, como aexistência de um director hoteleiro.Foram-se especializando como trabalho e agora conhecemmuita gente no meio. “Há, in-clusive, colegas que nos vêmpedir a opinião”, contam os irmãos.A mãe, Maria Emília, (actualmentecom 74 anos) fazia o trabalhode limpeza da casa e tambémajudava na cozinha. “Tra-tei sempre desta albergariacomo cuidava da minhacasa”, diz a matriarca da famíliaMartinho, adiantando queesta sempre foi a sua segundacasa e que isso mesmo é sentidopelos clientes, que ali se sentembem.A Albergaria Josefa d’Óbidos (situada na Rua D. João de Ornelas) soprou 26 velas a semana passada. Aempresa familiar, que nasceu em 1984 fruto da vontade de António Silvério Martinho, é actualmentegerida pelos filhos Carlos e Zélia Martinho, mas sempre com o apoio da mãe, Maria Emília Rebelo.Presentemente, os 1100 metros quadrados cobertos que compreendem o hotel, restaurante, bar e salade reuniões, fazem dela a maior unidade hoteleira da vila de Óbidos.Na década de 90 a discoteca D’Ayala, que funcionava no piso inferior, junto ao restaurante, fez furor naregião. Exemplo disso foram as passagens de ano que atraíram muita gente de fora, para se divertir aosom de disc-jockeys vindos de Lisboa.Os seus responsáveis continuam a adaptar o hotel às necessidades dos clientes, sendo disso exemploas recentes remodelações, e também estão a iniciar-se no sector imobiliário, tendo já iniciado junto àvila a construção de quatro apartamentos turísticos para alugar.A DISCOTECADE “SAPATINHO DE VERNIZ”XAntónio Silvério Martinho (1930-2000) foio fundador da Albergaria Josefa d’ÓbidosA Albergaria abriu com 14 quartose um bar de apoio. Mas depressaos proprietários perceberam quea capacidade de oferta era pequenapara a procura por parte dasagências de viagem. “E E não con-seguíamos, com este númerode quartos rentabilizar o inves-timento”, conta Carlos Martinho,adiantando que foi então que decidiramampliar as instalações, demaneira a poderem ter no mínimocapacidade para alojar os passageirosde um autocarro.Compraram então uma parcelade terreno ao lado da albergaria, aJoão Rodrigues (proprietário daagência funerária Tarzan), ondeinvestiram em mais 22 quartos. Aalbergaria Josefa d’Óbidos ficavaassim com um total de 34 quartos ecom a sala de pequenos almoçosampliada.Da parte de baixo do edifícioexistia uma garagem e, AntónioSilvério Martinho, como era umbom cozinheiro, transformou-a emrestaurante.Zélia Martinho recorda que estecomeçou a funcionar de formamuito rudimentar. O piso ainda erade cimento e os pilares foram pintadoscom riscas amarelas e colocadosvasos de flores, o tecto forradocom corticite das câmaras frigorificase as mesas feitas com astábuas das cofragens da construçãodo edifício.“Durante alguns anos funcionouassim até que foi melho-Maria Emília (viúva de António Martinho), e os filhos Carlos e Zélia,dão continuidade ao negócio iniciado há 26 anosrado”, recorda Zélia Martinho,acrescentando que as remodelaçõesforam sendo feitas progressivamente,consoante as possibilidades.O pai, que viria a falecer em2000, foi o primeiro cozinheiro daAdega da Josefa d’Óbidos e ali permaneceudurante cerca de trêsanos. Mas depois, como o trabalhoera muito, optaram por contratarum cozinheiro e António SilvérioMartinho passou a ocupar-se, entreoutras coisas, das compras paraa casa.Mal a albergaria abriu as suasportas, Carlos Martinho começoua incutir no pai o “bichinho” queuma discoteca poderia ser umaboa aposta, porque a entrada deÓbidos no início do séc. XX. A Albergaria Josefa d’Óbidos seria erguida 80 anos depois no local assinalado.dinheiro era imediata. A ideia começoua ganhar forma e viria aconcretizar-se em 1985, com a aberturada D’Ayala. Esta viria a funcionar,sempre aos fins-de-semana,durante 14 anos, até Maio de1999.“Ajudou-nos substancialmentedo ponto de vista eco-nómico”, conta o responsávelacerca do espaço nocturno quefez furor durante a década de 90e que chegou a empregar 11 pessoas.A D’Ayala atraiu muita gentedurante o seu funcionamento.“Tivemos noites de rodarmais de mil pessoas”, recordaCarlos Martinho, destacando queeste espaço funcionava maiscomo uma discoteca de hotel.Era a única na região que tinharaios laser e disc-jockeys,normalmente vindos de Lisboa,e com conhecimentos musicaisdiferenciados.Era na discoteca que faziam apassagem de ano. Esta estavaligada ao restaurante e as pessoaspodiam escolher a forma debrindar ao novo ano - quem queriaas músicas mais calmas para dançara dois, ficava no restaurante, equem queria “abanar o capacete”


Centrais2131 | Dezembro | 2010albergaria criada por António SilvérioAntónio Silvério Martinho foi durante muitos anos o dono da albergaria e o cozinheirodo restauranteia para a discoteca.A primeira noite de passagemde ano foi feita em 1986 e conseguiramencher o espaço com 340pessoas a divertirem-se ao som deum disc-jockey. “Foi um êxito”,recordam os irmãos Martinho, adiantandoque nos anos seguintes,entre outros convivas, atraírampessoas como José Mourinho, quedurante três anos seguidos ali passouo reveillon com a família eamigos.Carlos Martinho conta ainda quena última passagem de ano que oactual treinador do Real Madrid alipassou, veio propositadamente deum jogo que tivera em Coimbrapara se juntar aos familiares quejá lá estavam.A discoteca ficou conhecida emtoda a região pelos eventos originaisque promovia, tais como aspassagens de modelos e noitesde gala. Carlos Martinho lembraque ali decorreu, pela primeiravez na região, um desfile de modelosem lingerie, “mas comum respeito e dignidade in-crível”, fez notar.O mentor da discoteca temamigos que ainda hoje lhe dizemque traziam os sapatos engraxadosdentro do carro e só os cal-çavam para entrar na discoteca.É que ali era condição entrar desapato e como não se podia entrarde ténis, até lhe chamavama discoteca do “sapatinho de verniz”.Só na sua recta final, e com aagressividade da concorrênciada GreenHill, é que começarama facilitar a entrada, de modo anão perder clientes.APOSTA RECENTE NACONSTRUÇÃO DEAPARTAMENTOSEm 1992, quando foi terminadaa segunda fase da albergaria,o edifício foi avaliado em 600 milcontos (cerca de três milhões deeuros). “Foi um grande inves-timento e muito dolorosopara nós”, disse Carlos Martinho,lembrando que na altura ojuro estava a 35%. A sua irmãlembra que o investimento foi feitono ano em que o FMI esteve emPortugal para dizer que foi um anode crise mas também de oportunidades.António Silvério Martinho malsabia escrever o nome, mas eramuito bom nas contas, lembramos filhos, destacando a capacidadeempreendedora do pai. Porexemplo, na altura em que foi necessárioir ao Fundo de Turismopara pedir apoios para a albergaria,“ele ele acabou por arranjaramigos pois achavam curiosaa sua tenacidade e a persistên-cia de querer vingar”, destacam.O patriarca da família, porquenão tivera oportunidade de estudarem pequeno, viria a fazer oexame da quarta classe à noite em1956 numa época em que não haviaNovas Oportunidades. Tinhaentão 26 anos.Há dois anos o restaurante daJosefa D’Óbidos, com capacidadepara 250 pessoas, sofreu a últimaremodelação e em Fevereirodeste ano,foi a vez de dar umnovo ar à recepção e a 10 quartos.“Temos que inovar paranão saturarmos”, dizem.Os clientes também gostaramda mudança e têm-no feito sentiraos proprietários. Recentementetambém alteraram a formade confecção culinária, adoptandoa “nouvelle cuisine”, mascom mais quantidade.No início, em 1984, trabalhavamna albergaria a família e mais trêsempregados. Actualmente são 18os trabalhadores, mas já chegarama ser 22. “A crise força-nos aisso”, dizem os irmãos, que passarama ter um horário maior nacasa que começou por ser umaempresa em nome individual, denominadaAlbergaria Josefad’Óbidos de António Silvério Martinho.Em 1996 formaram uma sociedadepor quotas, entre os quatrofamiliares, que apelidaram Josefad’Óbidos EmpreendimentosTurísticos Lda. A mãe é actualmentea sócia maioritária e “nada se fazsem o consentimento dela”, dizemos filhos, que preferiram nãorevelar qual o montante de facturação.A sociedade aposta agora numaoutra vertente - a construção. Estãoa construir quatro apartamentospara alugar junto a Óbidos.“Estamos a fazer devagar, semrecurso a empréstimos”, explicaCarlos Martinho, adiantando quecontinuam a aplicar os velhos princípiosdo pai, isto é, investir semprecom capital próprio para nãoficar a dever nada a ninguém.Na albergaria são recebidosclientes de todo o mundo e durantetodo o ano. No entantodestacam que nos últimos tempostêm atraído muitos gruposde japoneses, russos e brasileiros,além dos portugueses. Nestacasa há várias épocas altas aolongo do ano, e o Natal é umadelas. Os eventos que se realizamem Óbidos também têm ajudadona procura de alojamento.O Festival do Chocolate e a VilaNatal “vieram trazer uma maisvalia à ocupação em Óbidos”,dizem, mas a crise também já secomeça a reflectir e agora notasemais a afluência ao fim-desemana.Cada um dos irmãos Martinhotem duas filhas. Ainda são pequenas,mas Carlos diz que gostariaque estas dessem continuidade àcasa e que a família Martinho continuassena hotelaria.Fátima Ferreirafferreira@gazetacaldas.comJosefa é nome de bolo e bebidada casaAs Josefas, pequenos bolos semelhantes a pasteis de feijão,foram uma criação da casa, logo nos seus inícios. MariaEmília lembra que os clientes perguntavam porque não criavamum bolo e, com a ajuda de um antigo funcionário, ÁlvaroSilva (actualmente um dos proprietários do Restaurante Alcaide)inventaram o doce. Durante alguns anos foi a marca dacasa que levavam para as feiras em caixas com o logótipo daAlbergaria. “Vendemos milhares de Josefas, mas depoisacabámos por desistir porque havia muito trabalho enão tínhamos disponibilidade para ir para as feiras”,lembra Carlos Martinho.O empresário recorda ainda um certame de doçaria quedecorreu na FIL, em Lisboa, em que logo no primeiro dia venderamtodo o stock que tinham previsto para os três dias etiveram que fazer mais.Josefa, nome da pintora obidense dá o nome à albergaria,foi também utilizado para baptizar a bebida da casa, um cocktailque ainda hoje “sai muito bem”, diz Zélia Martinho,escusando-se a revelar os segredos que o compõem.A bebida foi também criada por Álvaro Silva, com a ajuda deCarlos Martinho. A dupla foi ainda responsável por uma outrabebida - a D’Ayala - feita de propósito para a discoteca.Sobre o funcionário Álvaro Silva que esteve na base destascriações, Zélia Martinho lembra que este começou a trabalharna albergaria logo na sua construção, como servente de pedreiroporque depois queria ficar a trabalhar no espaço comobarman até inícios da década de 90. “Ele era um bom profis-sional”, acrescenta a mãe, Maria Emília.F.F.<strong>Cronologia</strong>1930 – Nasce António Silvério Martinho, que irá construir aAlbergaria Josefa d’Óbidos1980 – Começam as negociações e é feita a aquisição doterreno à entrada de Óbidos, pertença do tenente-coronelJustino Moreira1984 – A 14 de Dezembro é inaugurada a albergaria Josefad’Obidos1985 – Abertura da discoteca D’Ayala, que funcionou aosfins-de-semana até Maio de 19991992 – Termina a construção da segunda fase da albergaria,dotando-a de um total de 34 quartos1996 – Os filhos Carlos e Zélia Martinho integram formalmentea empresa, que passa a chamar-se Josefa d’ÓbidosEmpreendimentos Turísticos Lda2008 – Ultima remodelação do restaurante, na ordem dos75 mil euros2010 – Conclusão da mais recente remodelação da unidadehoteleira, com a redecoração da recepção e dez quartos numinvestimento de cerca de 20 mil euros2010 – Construção dos primeiros quatro apartamentos paraalugar junto à vilaA discoteca D’Ayala foi uma referência nos anos 90 e era famosa também pelas suaspassagens de ano.Aspecto do restaurante. Hoje a albergaria ocupa mais de mil metros quadradoscobertos e é composta por hotel, restaurante, bar e sala de reuniões


20Centrais7 | Janeiro | 2011, VUMAMA EMPRESAMPRESA, , VÁRIAS VGERAÇÕESA. Marques, Lda – a carroça do António transformou-se nMaria da Nazaré e o marido, António Marques foram os fundadores da firma Teresa Marques (nora dos fundadores) e Vítor Marques (filho) presidem agora aosdestinos da empresatrás. “Se algum estivesse nafazenda eu continuava a vol-ta e regressava depois”, conta.Cada dia tinha um percurso diferente.Para além dos clientesna cidade, havia voltas pelas diversasaldeias do concelho das<strong>Caldas</strong> da Rainha, mas tambémDepois de casar, António Marquesmudou-se para o Bairro dosArneiros, mais tarde para a RuaFormosa e em 1962 fixou-se naRua Henrique Sales.Foi ali que começou o processode separação do patrão paracomeçar a trabalhar por contaprópria. Arrendou uma casa - quee foi esse o valor que José Diaspediu para se fazer o negócio.“Mais que isso tinha eu a re-ceber das comissões, masnão tinha coragem de lho di-zer e foi a minha mulher quelhe fez ver as coisas”, contaAntónio Marques.Resolvido este assunto entreseguia comprar a primeira motorizada,com um atrelado, quepermitia não só aumentar as distânciaspercorridas, como o volumede produtos transportadoem relação à bicicleta.Dos tempos em que utilizou amotorizada, conta que só teveum acidente mais grave, em Óbi-Apesar da A. Marques, Ldaapenas ter sido oficialmente estabelecidacomo empresa em1990, a sua história confunde-secom a do seu próprio fundador,António Marques. Com apenas11 anos de idade, deixou o pequenolugar de Segade, no concelhode Miranda do Corvo, ondenascera em 1937, para aprenderno Oeste a profissão de vendedorambulante de azeite e petróleo.José Dias, natural da mesmafreguesia, era distribuidor deazeite e estava há alguns anosestabelecido nas <strong>Caldas</strong> da Rainhae foi quem trouxe AntónioMarques, não para as <strong>Caldas</strong>,mas para o Bombarral.Naquele tempo quase não haviaautomóveis e a venda era feitanuma carroça puxada por umamula. Nos primeiros meses AntónioMarques andou acompanhado,ou por um colega, ou pelopróprio patrão, mas ao fim demenos de um ano ganhou a confiançade José Dias, passando aandar sozinho nas voltas.A aprendizagem estava completa,mas já não voltou para aterra. Os 13 anos de idade foramfeitos nas <strong>Caldas</strong> da Rainha onde,entretanto, passou a morar naRua 31 de Janeiro, tendo ali começadoo negócio da sua vida.O dia começava às 5 horas damanhã para dar de comer à mulae preparar a carroça. Às 7 horasestava a caminho, quer o sol brilhasse,quer estivesse a chover.“Não me lembro de ter deixa-do uma volta por fazer porcausa do mau tempo”, recordaAntónio Marques. A carroçanão lhe dava protecção para achuva “e os Invernos erammuito maiores do que estes”,acrescenta.Para o caminho levava uma buchae ração para o animal, atéporque o dia era longo e haviamuitos quilómetros para percorrere clientes para visitar. O regressoera já noite dentro, porquenão deixava ninguém paraA A. Marques, Lda é uma das empresas de distribuição de bebidas de referência na região Oeste e é amaior distribuidora do país das bebidas do grupo Sumol + Compal, estando presente em 15 concelhosdos distritos de Leiria, Lisboa e Santarém. Esta empresa conta com mais de 2.600 clientes e temum volume de negócios que ascende aos 6 milhões de euros. Mas tudo começou com uma carroça euma mula, há 52 anos atrás. António Marques, de 71 anos, foi o fundador e dá nome à empresa quehoje é gerida pelo filho, Vítor Marques, de 46 anos, e a esposa, Teresa Marques, de 47 anos.nos concelhos vizinhos. Chegavaa ir à Delgada, Baraçais, OlhoMarinho, Atouguia da Baleia,Paínho.Desses tempos guarda a confiançaque havia entre as pessoas:“as cozinhas estavamsempre abertas, eu entrava,recolhia o garrafão de petróleoe a garrafa de azeite, dei-xava lá e sabia que depoiseles pagavam, criei uma con-fiança muito grande com aspessoas e hoje tenho gran-des amizades por isso”.Dias de descanso também nãohavia. Os sábados, feriados edias santos eram iguais aos outros.Ao domingo a única coisaque mudava era a volta: pegavanuma carroça diferente e ia venderazeitona.POR CONTA PRÓPRIA EM1962, NA RUA HENRIQUESALESQuando casou com Maria daNazaré, em 1961, António Marquescontinuava a trabalhar paraJosé Dias, mas à comissão. Já tinhaum armazém, ainda na Rua31 de Janeiro, em frente ao Thomazdos Santos. O espaço eradividido com um colega, Alfredo,que também trabalhava para omesmo patrão.servia de habitação e armazém -em seu próprio nome, o que desagradoua José Dias. “Ele que-ria que eu tivesse arrendadoa casa em nome dele. Levavapor semana 200 a 300 contos[1.000 a 1.500 euros] do traba-lho que eu fazia, mas nuncachegava a altura de fazer ascontas da minha comissão”,conta António Marques.Em início de vida de casado oatraso nos pagamentos era, nomínimo, desagradável para AntónioMarques, até porque dasvárias voltas que fazia, apenasduas lhe foram dadas pelo patrão.“As voltas dos outrosdias fui eu que as arranjei, aclientela era minha”, sublinha.Foi em conversa civilizada emvolta de uma mesa - depois deuma ida ao Campo da Mata paraassistir a um jogo de futebol -que as coisas se resolveram. Arelação de amizade e a gratidãode António Marques por José Diasempregado e patrão, é em 1962que António Marques começa oseu próprio negócio, em nomeindividual, contando com a ajudada esposa, Maria da Nazaré.António continuava nas voltas avender porta a porta pelas aldeiase pela cidade, agregando maisalguns produtos de mercearia aorol transportado na carroça. Aesposa ficava no armazém, apreparar as coisas da volta e avender ao público no lugar de frutase hortaliças criado tambémno número 48 da Rua HenriqueSales. “A minha mulher farta-va-se de trabalhar, tinha umaclientela boa, se arranjámosalguma coisa na altura foigraças a ela”, realça AntónioMarques.A presença na cidade tambémpermitiu alargar horizontes.Aproveitando a proliferação detabernas na altura, António Marquescomeçou a explorar essepotencial, para onde vendia nãosó bebidas espirituosas, comoprodutos de limpeza.A volta na cidade começou comuma bicicleta pasteleira equipadacom duas albardas onde con-- “devo-lhe muito, porque seforam os meus pais que mecriaram, foi ele que me ensi-nou a ser comerciante” - impediam-node confrontar o patrãoe por isso foi Maria da Nazaréquem tomou a iniciativa.roda da frente até levantava”,As voltas que António Mar-recorda.seguia colocar 10 garrafões. “Aques tinha angariado foram avaliadasem 75 contos [375 euros], em 1967 António MarquesCom a evolução do negócio,con-dos, na curva dos Arrifes. “Vi-nha da volta, por isso traziaos garrafões vazios, o atre-lado soltou-se e foi bater numcarro. Partiu-se tudo, mas fe-lizmente ninguém se magooue os estragos foram pagospelo seguro”, conta.PRIMEIRO AUTOMÓVELPERMITIU EXPANDIR ONEGÓCIOÀ moto seguiu-se a necessidadede comprar um carro… etirar a respectiva carta de condução.Como era sozinho nas voltas,não podia parar de trabalharpara ter as aulas. “Quando andavanas aldeias pedia páti-os emprestados para deixara carroça e uma bicicletapara ir ter a aula”, conta.Conseguiu a carta à terceiratentativa e em 1970 comprou oprimeiro furgão, uma Volkswagen“pão de forma”, na qual passoua fazer as voltas da vendaporta a porta, abandonando assima carroça e a mula.O automóvel permitiu aumentaras vendas, o que por sua vezaumentou o poder negocial comos fornecedores. Com preçosmais competitivos e um leque deprodutos cada vez mais abrangente,passou não só a vender aretalho, no porta a porta, como afazer venda por grosso para cafése mercearias.António Marques recorda aindao primeiro negócio maior quefez: “foi uma camioneta de salem caixas de 30 quilos, foi uminstante enquanto as vendi”.Para estes negócios de comprasem grande quantidade, aesposa tinha um papel fundamental,sublinha. “Ela semprefoi muito poupada, punha departe algum dinheiro como sefosse o ordenado dela equando precisava de com-prar quantidades grandespara ter bom preço, perguntava-lhese ela tinha e ela ar-ranjava o dinheiro”.Em 1973 António Marques eMaria da Nazaré então já com osdois filhos, Ana Marques e VítorMarques (na altura respectiva-O stand da firma nas feiras da Expoeste no início dosanos noventa


Centrais217 | Janeiro | 2011o maior distribuidor da Sumol + Compal em Portugalmente com 11 e 8 anos) e mudam-separa o Avenal. Tal comona Rua Henrique Sales, a novacasa serve de habitação, armazéme lugar de frutas e hortaliças.Dois anos mais tarde, depoisde adquirirem o lote em frente,abrem um café e melhoram amercearia, aproveitando o crescimentodo bairro. Ambos os estabelecimentosainda hoje existeme estão na família.À medida que os tempos foramevoluindo, também o negóciofoi mudando. O mercadogrossista começou a ganhar maiorrelevo face às vendas a retalhono sistema porta a porta, queforam decaindo com o surgimentode mercearias um pouco portodo o lado e também pela crescentefacilidade de deslocaçãodas pessoas. Esta vertente acaboumesmo por ser abandonadaem 1989.Também a família se foi integrandocada vez mais no negócio,com o crescimento dos filhos.Ana e Vítor Marques sempre aproveitaramtodos os tempos livrespara ajudar os pais no negócio eintegraram-no em definitivoquando concluíram o 12.º ano deescolaridade. Quando Ana Marquescasou, Carlos Rebelo, o marido,também integrou o negócio.No que a produtos diz respeito,a oferta continuou a alargar.“Comecei a negociar em tudo:papel higiénico, caixas deazeite, bebidas espirituosas,bacalhau, detergentes”, enumeraAntónio Marques.CONCORRÊNCIA DASCOOPERATIVAS LEVOU ÀESPECIALIZAÇÃOFoi na segunda metade da décadade 80, com o surgimento dascooperativas, como a Coopercaldas,nas <strong>Caldas</strong> da Rainha, e aCoopermonte, no Cadaval, quea família Marques teve que tomaruma decisão: ou continuavacom o comércio por grosso, masnum local fixo montando umcash and carry; ou especializava-senuma área de negócio.Foi esta segunda via a escolhida,até porque António Marquesjá estava de olho na distribuiçãodos produtos da Sumolis(as bebidas Sumol e 7 Up).“Sabia que o distribuidorpara <strong>Caldas</strong> da Rainha e Óbidosestava a passar por difi-culdades e ia ter que fechar,contactei a Sumolis e eles entregaram-mea representa-ção em 1987”, conta AntónioMarques.Este foi um grande ponto deviragem do negócio da A. Marques.Apesar de continuar a trabalharem nome individual, AntónioMarques chamou o filhoVítor Marques (então já com 22anos) para gerir a representaçãoda Sumolis, passando a dedicar-sea outros produtos, comoos vinhos e bebidas espirituosas.“E foi assim que a empresacresceu, com o nosso esfor-ço”, sustenta António Marques.Para receber a Sumolis, foipreciso criar novas condições. Oarmazém que tinha em casa erademasiado pequeno e por issoforam compradas duas lojas noCasal da Cruz, no Avenal, quedepressa se revelavam igualmentepequenas. Em 1988 alugaramum armazém ao cimo daladeira dos Calços, na Lagoa Parceira,e dois anos depois, em1990, eram construídos armazénspróprios na Lagoa Parceira, ondeainda hoje a empresa se encontra,com uma área coberta de1.000 metros quadrados e 1.500metros quadrados de parque.O ano de 1990 foi também o dacriação da empresa A. Marques,Representação da Sumol foi enorme passo para a empresaLda. como sociedade por quotas,com os sócios António Marques,a esposa Maria da Nazaré, o filhoVítor Marques e o genro CarlosRebelo. A empresa aglutinava todosos negócios da família: a representaçãoda Sumol, o minimercado e o café.Até aos dias de hoje a sociedadesofreu algumas alterações.Em 1997 fez-se a separação dasactividades. A A. Marques, Ldapassou a fazer apenas distribuiçãode bebidas, tendo por sóciosAntónio Marques, Maria da Nazarée Vítor Marques, sendo criadaa empresa Calisto Marques,Lda, de António Marques, Mariada Nazaré e Ana Marques, paragerir o café, o mini mercado e adistribuição do café Nicola.Em 2009, António Marques eMaria da Conceição cederam asquotas das respectivas empresasaos filhos e hoje a A. Marques,Lda tem como sócios Vítor Mar-Quando em 1987 António Marquesconseguiu convencer a Suques.A Xavier Marques foi-se desenvolvendoà mesma medidamolis a entregar-lhe a representação,estava longe de imaginara dimensão que o seu negó-da A. Marques, no que a territóriodiz respeito, contando jácio viria a atingir no futuro.com 230 máquinas espalhadasÉ o próprio que o afirma:pelos mesmos concelhos, dan-“nunca pensei que chegásdoemprego a cinco pessoas.semos a ter o património eNesta área a empresa contaas representações que te-com a Nestlé como principalmos, é um orgulho muitoparceiro de negócio, tendo-segrande, tanto pela parte co-especializado não só em máquimercial,como por ter a fa-A sede da empresa tem dimensões modestas, mas a frota dá uma ideia daimportância da actividade distribuidora.nas de moedas, como em má-mília que tenho”.quinas de chocolate quente eNestes 23 anos, tem havido umamo destas bebidas estavasignificaria para a A. Marques, os 6 milhões em 2010.capuccino para pastelarias,grande evolução da empresa, emainda pouco desenvolvidaLda a perda de 50% do seu volumede facturação, mas o novo das com aquele grupo represen-Apesar das vendas relaciona-área na qual tem representaçãoexclusiva da Nestlé na suadiversos campos, tanto nos produ-porque a oferta era muitotos, como na área de actuação epouca, mas foi-se desenvol-grupo decidiu manter, e mesmoreforçar, a confiança na emçãoda A. Marques, a empresatarem 80 por cento da factura-área de actuação.ainda na forma de actuar.vendo com o tempo”, contaA empresa começou a trabalharem regime de auto-venda, De forma gradual, a empresa“O estudo indicava queoferta com outras bebidas. “Te-CONTINUIDADE A UMVítor Marques.presa caldense.preocupou-se em completar aFILHOS PODEM DARcom três trabalhadores: Vítor foi também expandindo o seutodo o litoral e grandes cenmosparceiros como a Car-NEGÓCIO DE FAMÍLIAMarques, o cunhado Carlos Rebeloe um colaborador. “Levá-concelhos de <strong>Caldas</strong> e Óbidos etamente por eles, mas o quelhamos há 20 anos, ou a Par-Com três filhos, João, Diogovamos as coisas no carro emais tarde a Sumolis foi entreécerto é que nos convidamalat,e tivemos a preocupa-e Mariana, todos ainda estu-vendia-se o que estava nagando à A. Marques, Lda a dis-ram para fazer parte desteção de criar um portfoliodantes, Vítor Marques acreditacarrinha, fomos os primeitribuiçãonoutros concelhos. Pri-projecto novo e foi umacom vinhos da cada regiãoque o futuro desta empresa teráros na região nesta área demeiro Peniche, depois Rio Mai-grande prova de confiançademarcada para ter umacontinuidade na família.negócio a trabalhar em préor,Bombarral, Lourinhã e Cadaetambém um grande desa-oferta mais completa para“Haverá sempre uma persvenda,com pessoas especival,mais tarde Cartaxo e Azamfioque temos vindo a agar-os nossos clientes”.pectiva de algum deles vir aalizadas na venda e serviçobuja. “Houve uma evoluçãorar”, considera o empresário. Apesar do cenário de reces-fazer parte da empresa ede entrega”, conta Vítor Marnormal,foram-nos entregan-Não só a A. Marques, Lda é a são, as perspectivas de Vítoragarrar os seus destinos,ques. Foi em 1990 que este sis-do mais território fruto doúnica empresa do litoral e gran-Marques são que os resultadosporque empresas familiarestema foi introduzido, seguindotrabalhoque fomos desendescentros a ter a representa-de 2010 se possam manter,são isso mesmo, mas com ase, dois anos depois, a introdu-volvendo e também de coisasção da Sumol + Compal, como“através da consolidação deconsciência que o caminhoção de aparelhos PDA , no qualque correram menos bemrecebeu mais território que an-clientes e referenciando maisterá que ser escolhido porforam também pioneiros.com outros distribuidorestes era feito por estas empre-artigos aos nossos clientes”.eles e não imposto por nósTambém a gama de produtosque actuavam em territóriossas, nomeadamente Alcobaça, Aproveitando as sinergiaspais”.associados à Sumolis foi cres-contíguos ao nosso”, explica Nazaré, Santarém, Carregado, criadas pela A. Marques, Lda,território. Começou em 1987 nostros deveria ser feito direcvalhelhos,com quem traba-Dos três, Diogo Marques, decendo. Em 1987 a gama era aindareduzida. Além das garrafas É no final de 2008 que a em-O peso desta fusão na vida sa Marques lançaram a empre-Vítor Marques.Alenquer e Torres Vedras. em 1998 Vítor Marques e Tere-20 anos, que estuda Gestão, é oque está numa área que melhorde 25 centilitros e de 1 litro de presa sofre a maior transformação,por força da fusão entre a ferença dos números de 2008 e ção de máquinas de venda di-da A. Marques reflecte-se na disaXavier Marques, de explora-se enquadra ao trabalho da empresa.João, de 23 anos, estudatara retornável de Sumol e 7 Up,começavam também a surgir Sumol e a Compal. Curiosamente,na altura da fusão um estudo ram de 27 para 38, passando a“Foi uma oportunidade deanos, está no 7º ano.2009. Os funcionários aumentarecta.Bioquímica e Mariana, com 12estas bebidas em lata e tambémos primeiros néctares, da apontou como melhor estratégiauma abordagem directa ao tou de 3,55 milhões de eurosnossa área e decidimosJ.R.6 oz (125 mililitros). “O consu-mercado, o que, a confirmar-se, para 5,7 milhões, subindo paraavançar”, conta Vítor35 em 2010. A facturação aumen-negócio que se ligava com aCompal e da Frami, em latas deMar-ques, a esposa Teresa Marquese os filhos João, Diogo e MarianaMarques.Nos 23 anos de representaçãoda Sumol, a empresa aumentoude três trabalhadores para 40 etem uma frota de 30 carros. Fechou2010 comercializando 350referências de bebidas, que sãoentregues em 24 horas a umalista de 2.600 clientes activos, eregistou uma facturação recordede 6 milhões de euros, quefaz da A. Marques, Lda o maiordistribuidor da Sumol + Compalno país.Um estatuto que Vítor Marquesatribui “ao esforço e dedicaçãode todas as pesso-as que colaboram connoscoe que contribuíram para quea empresa chegasse ondehoje está”.Joel Ribeirojribeiro@gazetacaldas.com<strong>Cronologia</strong>1937 – Nasce António Marquesem Segade (Miranda doCorvo)1948- António Marquesvem para o Bombarral aprendero ofício de vendedor ambulante1962- Estabelece-se emnome individual como vendedorporta a porta, com armazéme lugar de frutas na RuaHenrique Sales1973- Passa para o Avenal,também com armazém e lugarde frutas e hortícolas1975- O lugar de frutaspassa a mini-mercado e abreum café (actualmente designadoCafé 2001)1987- António Marques garantea representação da Sumolis.Aluga duas lojas no Casalda Cruz, Avenal, como armazém.1988- Aluga um armazémmaior na Ladeira dos Calços(Lagoa Parceira)1989- A venda porta a portaem retalho é abandonada1990- É criada a sociedadepor quotas A. Marques, Lda,tendo como sócios AntónioMarques, Maria da Nazaré, VítorMarques e Carlos Rebelo.É construído um novo armazémna Lagoa Parceira1997- O café e o mini-mercadosaem da gestão da A.Marques , Lda. e pasa a dependerde nova sociedade formadapor António Marques,Maria da Nazaré e Vítor Marques1998- Vítor Marques e TeresaMarques criam a XavierMarques, Lda2009- António Marques eMaria da Nazaré cedem as quotasao filho Vítor Marques. AA. Marques, Lda passa a tercomo sócios Vítor Marques,Teresa Marques, João Marques,Diogo Marques e MarianaMarques


20Centrais14 | Janeiro | 2011, VUMAMA EMPRESAMPRESA, , VÁRIAS VGERAÇÕESO advogado João Frade e a cabeleireira Maria do Naque o pai e marido construiuJoão Jesus Frade (1952-2008) foi o relojoeiro que fundou a ourivesaria e joalharia Frade Maria do Nascimento e o seu filho João Pedro Frade asseguram a continuidade donegócio, embora não exerçam a actividadeEm 2011 a ourivesaria e relojoariaFrade celebra o seu 29ºaniversário, mas já não é o seufundador, João Jesus Frade, queestá à frente do negócio. Depoisda morte do relojoeiro eourives, em 2008, a família assumiuos destinos da loja, coma designação social João JesusFrade Herdeiros, mantendo assimviva a sua memória.Desde 1991 que a relojoariae ourivesaria está no número 1do Largo Heróis de Laulila, masa primeira loja abriu em 1981, apoucos metros, na rua da Nazaré.Durante algum tempo asduas lojas funcionaram lado alado, mas o primeiro estabelecimentoacabaria por fecharquando o relojoeiro morreu.João Jesus Frade nasceu emMira (distrito de Coimbra) em1952. Depois de terminar o cursode relojoaria, veio trabalharpara as <strong>Caldas</strong> da Rainha no finalda década de 70, como relojoeiro.“Nessa altura hou-mento conheceram-se poucodepois do jovem técnico ter vindopara as <strong>Caldas</strong>, através deamigos comuns. Casaram-sesua própria casa, e por issoficou muito contente”, recordoua mulher, embora salientandoque o seu marido era umave uma grande migração derelojoeiros e ourives da zonaCentro para a nossa re-gião”, recorda o filho, JoãoPedro Frade.João Jesus e Maria do Nasci-em 1975 e em 1982 João JesusFrade decidiu abrir a sua própriarelojoaria na rua da Nazaré,num local onde antes existiauma barbearia de ManuelFaca. “Era o sonho dele ter apessoa muito reservada.Só quando decidiu mudar oestabelecimento para o largoHeróis de Laulila, em 1991, éque a loja passou a ser tambémuma ourivesaria. “O esta-belecimento onde estavaantes era pequeno e ele jáse sentia um pouco aperta-do, até porque começou aEm 1981 João Jesus Frade, natural de Mira, abriu nas <strong>Caldas</strong> da Rainha, a sua primeira relojoaria narua da Nazaré. Dez anos depois abria a poucos metros, no largo Heróis de Naulila, a ourivesaria ejoalharia Frade, onde continuou a exercer a sua arte e passou também a vender peças em ouro eprata.Depois do seu falecimento, em 2008, seria o filho mais velho, João Pedro, e a sua mãe, Maria doNascimento, a assumirem o negócio, embora tenham contratado um funcionário para estar na loja.Apesar de ser advogado, João Pedro Frade foi quem sempre se interessou pela relojoaria e emcriança chegava a desmontar e montar relógios às escondidas. Mas a sua irmã, Ana Sofia, tambémsabe fazer algumas das tarefas mais simples.vender também algumaspeças em prata e ouro”, contouMaria do Nascimento Frade.A primeira loja esteve algumtempo fechada, até que JoãoJesus acabou por contratar umafuncionária para a reabrir, preservandoa memória da antigarelojoaria e a arte que era asua grande paixão. “Vinhampessoas de toda a regiãoaqui porque a qualidade dotrabalho dele era reconhe-cido”, recorda Maria do NascimentoFrade.A loja original fecharia definitivamentecom a morte deJoão Jesus Frade, mas o maisrecente estabelecimento comercialmantém essa maior vocaçãopara a relojoaria do quepara a ourivesaria, apesar deterem também algumas peçaspreciosas à venda e de fazeremtambém compra de objectosem ouro. “A nossa especialidadeé sem dúvida a re-lojoaria”, garante o herdeiro.No entanto, com a aberturaA família depois da cerimónia da benção das fitas da filha mais nova em Faro e na foto ao lado num fim-de-semana em Peniche durante a década de 80


Centrais2114 | Janeiro | 2011scimento garantem a continuidade da relojoariade vários estabelecimentos dedicadosà compra de ouro, estaúltima vertente perdeu alguminteresse. “O preço do ouroestá tabelado, mas como fazemuma publicidade agres-siva as pessoas optam poresse tipo de casas”, comentouJoão Pedro Frade, que nãoacredita na viabilidade de todosestas casas dedicadas àcompra daquele metal.Depois de terem feito publicidadena <strong>Gazeta</strong> das <strong>Caldas</strong>a anunciar que compravam artigosem ouro e relógios antigos,foi em relação aos relógiosque houve mais pessoas interessadasem vender. “Nas<strong>Caldas</strong> há dois ou três coleccionadoresque dão va-lor a estas peças, mas esseé um mercado que tem esta-do parado devido à crise”,comentou o filho do fundadorda relojoaria. Também a vendade peças em ouro e prata tiveramuma grande quebra nasvendas.Quando João Jesus Frade faleceu,em 2008, a sua mulher efilhos decidiram continuar coma ourivesaria e relojoaria a funcionar.O filho mais velho, JoãoPedro Frade, chegou a estar algumtempo com a ourivesaria,mas como é advogado passouapenas a gerir o negócio emconjunto com a sua mãe. Contrataramum funcionário, JoãoSantos, que tem vindo a aprenderos procedimentos necessários,para além de recorrerema outras pessoas especializadas.“Mas neste momentogrande parte dos trabalhosvoltaram a ser feitos aqui naourivesaria”, garantiu JoãoPedro Frade.“Pegamos num relógioque não funciona, desmon-tamos e conseguimos queele comece a trabalhar ou-tra vez”A mulher de João Jesus Frade,Maria do Nascimento, nasceuem Alvorninha em 1952 etem um salão de cabeleireiro.Depois de ter trabalhado noutrossalões nas <strong>Caldas</strong>, abriu,com uma sócia, o seu próprioestabelecimento em 1983. OSalão Azul funciona desde a suaabertura na rua Heróis da GrandeGuerra.A mulher sempre ajudou oseu marido na ourivesaria, tratandodo aspecto da montra eda limpeza da loja. Na alturado Natal também ajudava noatendimento ao público, comotoda a família.Nascido em 1977, João PedroFrade desde pequeno que selembra do estabelecimento comercialdo seu pai para onde iaquando regressava da escolaprimária da Encosta do Sol.“Lembro-me de vir com osmeus amigos até cá abaixoe depois a seguir ia almoçara casa com os meus pais”,recordou.Logo desde criança começoua achar curioso observar o paienquanto ele desmontava e arranjavarelógios. “Fiquei sem-pre com esse interesse pelarelojoaria. Acho piada à formacomo pegamos num relógioque não funciona, des-montamos e conseguimosque ele comece a trabalharoutra vez”, referiu.A sua mãe também se lembrada forma como João Pedrolevava para casa, às escondidas,alguns relógios para desmontare “fazer os seus ar-ranjos”.João Pedro Frade começou aajudar o pai na ourivesaria duranteumas férias de Verão,quando ainda estava na escolaprimária porque queria juntardinheiro para comprar um computador(numa altura em queesta ferramenta ainda não estavaao alcance de toda a gente).“Fiz um acordo com omeu pai, que me dava algumdinheiro por cada dia queestivesse na loja”, mas comoera criança, apenas fazia companhiae tratava de alguns recados.A partir da adolescência passoua trabalhar mais a sério naourivesaria ao fim-de-semanae nas férias da escola. Principalmentena altura no Natal,quando havia mais movimentona loja. Mesmo quando foi estudarDireito para Lisboa continuoua ajudar o pai ao sábado.“Ele sempre quis fazermever como era ter de tra-balhar, mas também passeiaqui bons momentos”, disse.Para além de ajudar no atendimento,João Pedro Fradeaprendeu a fazer pequenas tarefascomo trocar braceletes epilhas dos relógios. Ao fim dealgum tempo começou tambéma fazer trabalhos mais complexosnos relógios.A relojoaria é uma paixão defamília e João Pedro Frade temuma colecção de relógios debolso antigos em casa, algunsdos quais recuperados pelo pai.A filha de João Jesus e Mariado Nascimento Frade, Ana Sofia,nasceu no mesmo ano emque a o pai abriu a relojoaria eé educadora de infância no Algarve.“O meu pai sempre mepuxou mais a mim para es-tar na ourivesaria, mas elatambém ajudava”, contouJoão Pedro Frade. “A A minha fi-lha sempre teve mais jeitopara atender as pessoas.Vinha para aqui muitas vezesaos sábados e nas féri-as”, acrescentou a mãe, adiantandoque Ana Sofia tambémsabe executar algumas tarefassimples da actividade de relojoeiro.OURIVESARIA PRESIDE ÀASSOCIAÇÃO COMERCIALO filho do fundador da ourivesarialicenciou-se em Direitona Universidade Lusíada emLisboa e é actualmente advogado.Terminada a licenciaturaem 2003, estagiou em Coimbrae Lisboa, tendo trabalhado emduas sociedades de advogados.João Pedro Frade nunca seinteressou pela possibilidadede se formar na área da relojoariae o próprio pai nunca o incentivoua isso. No entanto,com o falecimento do pai, acaboupor se dedicar em parte aesta actividade e procuradotambém aprender mais sobre oofício, tendo até adquirido algunslivros da especialidadepara serem consultados pelofuncionário da loja.“Como não temos o co-nhecimento que o meu paitinha, tivemos de inovar eprocurar as técnicas maisrecentes”, disse. Têm apostadona modernização dos equipamentos.“Ainda esta sema-na comprámos uma novamáquina de limpeza por ul-tra-sons”.É em representação da ourivesariaque João Pedro Fradeocupa actualmente o cargo depresidente da Associação Comercialdos Concelhos das <strong>Caldas</strong>da Rainha e Óbidos (ACC-CRO), já no segundo mandato.“As As ourivesarias e relojoariassão sectores que não foramafectados pelas gran-des superfícies, embora jáexistam alguns centros co-merciais com lojas destas”,comentou.A principal preocupação dosector acaba por ser a segurança.Por causa do valor das peçasque comercializam, estaslojas têm sido um dos alvos preferenciaisdos ladrões e da criminalidadeviolenta. “É É porisso que são dos estabeleci-mentos comerciais commais segurança, como a vi-deovigilância e as grades deprotecção”, referiu. Para JoãoPedro Frade, caso os assaltosviolentos continuem, as ourivesariasterão que se adaptar efuncionar com ainda mais segurança,nomeadamente atravésde cofres de abertura retardadapara objectos mais valiosose restrições no acesso aoseu interior. “Esperemos quenão seja preciso chegar tãolonge, mas caso seja necessárioos próprios comerci-antes serão capazes de seadaptar”, defende.No caso da ourivesaria Fradeessa preocupação não é tãogrande porque não têm objectosde muito valor, tendo emconta que estão especializadosna relojoaria.Pedro Antunespantunes@gazetacaldas.com<strong>Cronologia</strong>1952 – Nascem João Jesus eMaria do Nascimento FradeInício da década de 70 – JoãoJesus Frade vem para as <strong>Caldas</strong>para trabalhar como relojoeiro1975 - João Jesus e Maria doNascimento Frade casam-se1977 – Nasce o filho do casal,João Pedro1982 – Abre a relojoaria Frade,na rua da Nazaré1982 – Nasce a filha do casal,Ana Sofia1991 – A ourivesaria e relojoariaFrade abre no largo Heróisde Naulila2008 – Falecimento de JoãoJesus FradeO mundo dos relógiosJoão Santos trabalha na joalharia há dois anos e meio Os relógios são a especialidade da empresa familiarHá dois anos e meio João Santos,que era proprietário de umasapataria que entretanto encerrou,foi convidado por João Fradepara trabalhar na ourivesariae joalharia.“Conhecia-o da direcçãoda Associação Comercial etinha confiança no senhorJoão”, explicou o filho mais velhodo fundador da loja.A princípio João Santos, de 53anos, só aprendeu a fazer trabalhosmais simples, como colocaruma pilha nova num relógio,mas a pouco e pouco foiaprendendo o ofício.“Faço todo o tipo de arran-jos nos relógios com meca-nismo quartz e também emalguns mecânicos”, explicou.Só nos casos dos relógios maisantigos é que recorrem a umserviço externo. “Há muitagente que nos procura paraesse tipo de trabalho e quenos trazem relógios até com100 anos”, referiu o funcionário.Para João Santos a relojoariaé uma área muito interessantee curiosamente há 25 anos tinhaaprendido a mexer nos mecanismos.P.A.


18Centrais21 | Janeiro | 2011, VUMAMA EMPRESAMPRESA, , VÁRIAS VGERAÇÕESAmaro da Silva, Lda. – O resultado de “uma vida inteAmaro da Silva, Fernanda, Maria dos Anjos, uma amiga da família e esposa Maria Luísa numa foto durante a década de cinquenta. Ao lado uma imagem do pai e das filhas(tirada na segunda-feira) que presidem hoje aos destinos da firma.Nascido em 1925 na Amadora,foi por terras da capital queAmaro da Silva se afirmou comojogador de futebol. Mas nostempos da sua juventude as habilidadescom a bola não erampagas a peso de ouro, comohoje. “Se calhar nasci cedodemais”, diz. Por isso, Amaroda Silva começou a trabalharcedo numa empresa de frio, aÁrtico, Lda., que hoje já não existe.Foi nesta altura que trabalhoucom um engenheiro alemãoque diz ter sido “um mestre notrabalho do frio”, não só parasi, mas para muitos outros quefizeram desta área a sua profissão.É no frio e no futebol quese torna homem, aliando sempreo trabalho ao desporto. Efoi pelo desporto que há quase58 anos deixa Lisboa para trás eruma à cidade termal, para jogarno <strong>Caldas</strong>.Consigo trouxe a família,mulher e duas filhas que aindahoje acompanham o pai nas lidesdo frio, à frente da Amaroda Silva, Lda.Maria dos Anjos, a filha maisFoi pelo futebol que Amaro da Silva veio parar às <strong>Caldas</strong>, em 1953. Aos 28 anos, aceitou o convite deArtur Capristano, na altura director do <strong>Caldas</strong> e seu “segundo pai”, para vir para a cidade termal a fimde jogar à bola acompanhado pela família, a esposa Maria Luísa e as filhas Maria dos Anjos e Fernanda(a mais nova tinha apenas um mês de vida).Além das habilidades dentro das quatro linhas, Amaro da Silva trazia consigo a experiência de mais deuma década a trabalhar no frio. E assim que aqui chegou começou a trabalhar sozinho, dando inícioàquela que hoje é uma empresa com mais de meio século de existência, que é uma referência a nívelnacional no que ao frio industrial diz respeito, com obra espalhada por todo o país, – a Amaro da Silva,Lda.velha (nascida em 1950), tinhatrês anos quando chegou às<strong>Caldas</strong>. Fernanda nasceu em1953 e tinha apenas um mês. Foinas <strong>Caldas</strong> que cresceram, estudaram,constituíram família ese tornaram empresárias de sucesso.Por isso mesmo hoje dizemque se sentem “comple-tamente caldenses”.Assim que chegou, Amaro daSilva começou a trabalhar sozinho,criando ‘A Reparadora deFrigoríficos das <strong>Caldas</strong> da Rainha’.E lembra-se bem dessestempos em que, sem um carropara se deslocar, sempre que erapreciso “agarrava na mala daferramenta e ia à bilheteirados Capristanos buscar umbilhete branco para viajarnas camionetas” para onde oserviço o chamava. Cerca de trêsanos depois, o então presidentedo <strong>Caldas</strong> deu-lhe um carro.“Um Ford Anglia preto”, lembra.O trabalho ficou mais fácil,depois de alguns anos a deslocar-seem camionetas.Sozinho, Amaro da Silva percorriaa zona Oeste, a repararfrigoríficos domésticos, balcõese vitrinas. “Depois comecei aser conhecido e conforme osanos foram passando fuiaumentando o serviço. Comojá não dava conta do recadosozinho, meti um emprega-do, depois dois”, conta o empresário,enquanto recorda“uma vida inteira dedicadaa fazer frio”.É na Rua do Cais, numa pequenaoficina, que a empresa dáum passo importante. Às reparaçõesque ocuparam os primeirosanos de actividade, vem então juntar-sea construção de armários,frigoríficos, balcões. Em 1967 Amaroda Silva muda o nome à suaempresa, para Frimóvel.Aliada à sua vida profissional, oempresário nunca deixou o mundodesportivo. Quando deixou de jogar,tornou-se treinador e não sótreinou o clube que o acolheu nas<strong>Caldas</strong> (onde também chegou amembro da direcção) como tambémalguns clubes da região, comoo Mirense ou o Marrazes. Mais doque da actividade profissional dopai, a que hoje dão continuidade, édesta vida ligada ao desporto queas filhas mais se recordam.“Recordo-me perfeitamentede ver o meu pai jogar no Cal-das. Naquela altura as coisaseram vividas de maneira diferente,todas as pessoas se jun-tavam para puxar pela equipae ao domingo a minha mãe le-vava-me ao futebol”, lembraMaria dos Anjos. Embora maisnova, Fernanda também guardamuitas memórias dessa altura.“Lembro-me de irmos para oAmaro da Silva quando era jogador do<strong>Caldas</strong>.As filhas Fernanda e Maria dos Anjos emcriançasPavilhão da firma montado no Parque D. Carlos I quando a Feira da Fruta ali serealizava nos anos oitenta


Centrais1921 | Janeiro | 2011ira dedicada a fazer frio”café dos Capristanos ao do-mingo, depois da bola. E paraa ‘Caseta’, na Estrada de Tor-nada, íamos jantar, convivercom as famílias dos outros jogadorese dirigentes, e eu ador-mecia lá muitas vezes”.Do trabalho do pai têm recordaçõesvagas, mas lembram-se “dopai a trabalhar numa divisãoda casa na Rua Fonte Pinheiro,numa oficina muito modesta,com o primeiro empregado, oZé, nos prédios do Viola”.O ‘Zé’ foi o primeiro de muitosempregados que passaram pelaempresa. “Todos os que mexemno frio passaram por aqui. Istofoi a casa-mãe, uma escola. Epassou por aqui muita gente”,afiança o empresário, que diz ser“uma das pessoas mais velhasem Portugal a trabalhar nofrio”. Afinal já lá vão mais de 60anos desde que começou a trabalharem Lisboa. “Nunca conhecioutro ofício, dediquei-me sem-pre ao frio”, vinca.FILHAS DEIXARAM SONHOS DELADO PARA AJUDAREM O PAIÉ nos finais dos anos 60 que afilha mais velha, Maria dos Anjos,começa a trabalhar com o pai. “Noinício lá ia eu na camionetados Capristanos e não erapreciso ter um gestor de con-ta nem ninguém. Metia tudona cabecinha e pronto, nemhavia facturas naquele temponem nada, nem tive grandesproblemas para rece-ber”, conta Amaro da Silva.Quando Maria dos Anjos acabao Curso Geral de Comércio naEscola Rafael Bordalo Pinheiro,o negócio do pai trabalhava jácom números maiores e a filha foiajudar com os papéis e as contas.“Vim, sempre na expectativa deque não era bem isto que que-ria”, lembra Maria dos Anjos, quena altura ainda alimentava o sonhode ser assistente de bordo.“Acabei por pensar mais como coração do que com a cabe-ça e fiquei”, conta.Uns anos depois de Maria dosAnjos, Fernanda torna-se o novoreforço da empresa de Amaro daSilva. “Quase vim por arrasto,CRONOLOGIAsempre ouvi dizer que quandoacabasse o curso comercialviria para a empresa”, conta afilha mais nova. Admite que a profissãoque gostaria de ter tido passavapelo contacto com o público enão pelo trabalho à secretária, mas“ao vir para a empresa sabiaque os estava a ajudar e nuncapensei ir embora e deixá-los”.A sociedade da Amaro da Silva, Lda.fica completa com a mãe, MariaLuísa, embora esta nunca tenhaefectivamente trabalhado na empresa.Hoje, as filhas garantem que nãose arrependem da opção que tomaramjá lá vão umas décadas.Maria dos Anjos diz que se entregaà empresa “de corpo e alma”. Elogo acrescenta: “aliás, temostodos dado o nosso melhor,uma empresa familiar não seaguenta se não puxarmos to-dos para o mesmo lado”.À união junta-se um outro aspectoimportante: muito trabalhoe muita dedicação. “Toda a vidatrabalhei muito”, afirma Amaroda Silva, e o trabalho obrigou-omuitas vezes a levantar-se durantea noite para dar resposta aospedidos. Numa vida inteira de dedicaçãosó se recusou a fazer doisserviços. Um era trabalho que implicasseandar de barco. “Fui cha-mado duas vezes para ir àsBerlengas, mas jurei para nun-ca mais”, e enquanto se lembrada peripécia garante até seagoniar com a memória. “Es-tive mesmo perto, mas omar estava tão mau quenão consegui e voltei paratrás. Dizia muitas vezesque podia ser o melhor ne-gócio, e mesmo assim eunão queria”.A segunda nega teve a vercom a manutenção das câmarasde conservação das morgues.“Ainda estava em Lis-boa e fui chamado à mor-gue de um hospital, tambémjurei para nunca mais. Mesmoagora, e com todo o de-vido respeito, ninguém aquise mostra disponível parafazer esse trabalho”.Joana Fialhojfialho@gazetacaldas.com1953 – Amaro da Silva vem para as <strong>Caldas</strong> para jogar à bola ecria ‘A Reparadora de Frigoríficos das <strong>Caldas</strong> da Rainha’1967 – A empresa inicial dá lugar à ‘Frimóvel’. Pouco tempodepois a filha mais velha, Maria dos Anjos, começa a trabalhar como pai1970 – Empresa muda-se da Rua do Cais para a Rua da Caridade,onde se mantém durante 39 anos. Cerca de um ano mais tarde,Fernanda junta-se ao pai e à irmã1976 – Amaro da Silva dá sociedade à esposa e filhas e é criadaa Amaro da Silva, Lda., capital social de 50 mil euros2009 – A Amaro da Silva, Lda. muda as suas instalações para aZona Industrial das <strong>Caldas</strong> da RainhaCrescimento sustentado, colaboradores e clientes na base do sucessoNa década de 80 a empresachegou a ter 30 empregados.Eram tempos diferentes. Por umlado, os armários frigoríficoseram feitos em madeira, o queobrigava a ter trabalhadores decarpintaria. Por outro, estes foramtempos áureos no sector daagricultura e fruticultura, sectorque foi sempre um importantecliente de Amaro da Silva.“Só em 1982 a Amaro da Sil-va, Lda. montou 92 câmarasfrigoríficas para fruta”, garanteo empresário.Com o passar dos anos, asexigências do mercado mudaram,o que levou a alteraçõesna empresa. O fim dos trabalhosem madeira tornou dispen-Uma das modernas instalações de frio que a Amaro da Silva, Lda. instalou.sável a colaboração de profissionaisde carpintaria. Além disso,os pequenos produtores começarama agrupar-se em cooperativase associações e aAmaro da Silva, Lda. passou aapostar em grandes câmaras,em vez das tradicionais pequenascâmaras frigoríficas.A viragem para o frio indusactividadede pessoal espe-cializado”, defende o fundador,acrescentando que a empresatem colaboradores que se mantêmna casa há muitos anos. “Aempresa está na vanguardado sector frio, mas este su-cesso não se deve apenas àgerência, mas também aosas coisas nos ultrapassamtemos que pedir ajuda e rodearmo-nosde pessoas com-petentes para poder vencerneste mercado que é bastan-te competitivo”, explica Mariados Anjos acrescentando que,além da empresa holandesa, aAmaro da Silva se apoia tambémnossos governantes e a Ban-ca apoiem os projectos queestão em cima a mesa paraque possa haver desenvolvi-mento do sector”, diz Maria dosAnjos.Em 2010 a facturação da empresarondou os 2 milhões deeuros, um valor ligeiramentetrial é um momento marcantenossoscolaboradores”,num gabinete de engenharia e mais baixo que o registado emna história da empresa. Hoje, aAmaro da Silva, Lda. trabalhasobretudo para grandes projectos,com “todo o género defrio e de grandes dimen-sões”, em todo o território nacional,continente e regiões autónomas,e em África. Mas porqueos sectores da agricultura efruticultura são os seus maioresclientes, o grosso do trabalhoda empresa realiza-se naregião Oeste e nas Beiras. Trabalhosde maiores dimensõesobrigaram, também, a instalaçõesmaiores. Por isso a empresaestá hoje num armazém daZona Industrial, para onde mudouem 2009, depois de 39 anosna Rua da Caridade, no centroda cidade.Hoje, a Amaro da Silva contacom 14 colaboradores, uma“peça fundamental para osucesso da empresa”, garantemos gerentes. “Esta é umaacrescenta Maria dos Anjos.“Sabemos que podemos contarcom os nossos colaboradores,e isso também nos aju-da a crescer”.À competência e qualidade doserviço prestado junta-se, comoingrediente para o sucesso, “atransparência com que sem-pre lidámos com os nossosclientes ao longo de todosestes anos”. E depois, a apostana inovação. “Apostamos for-te na atmosfera controlada,em que o frio é rigorosamen-te igual mas na qual se retiratodo o oxigénio das câmarasfrigoríficas”. Uma vertente dofrio virada para a fruticultura,que permite que a fruta não respiree, por isso mesmo, se conserveinalterada durante muitotempo.Para esta aposta a Amaro daSilva conta com o apoio de umaempresa holandesa. “Quandonum director financeiro.Mas a inovação de pouco servese a empresa não contassecom um historial de sucesso ecom clientes que se mantêm hámuitos anos. “Um dos lemas daempresa é trabalhar com honestidadee servir bem, aci-ma de tudo”, diz a filha maisvelha. “E nesta casa o clienteé rei”.Manter os clientes é muitoimportante para os gerentes, quenão descuram, no entanto, aprocura de novos clientes. “Anossa maior publicidade temsido o ‘boca a boca’ e paranós essa é a melhor e maisbarata publicidade que pode-mos ter”.Pai e filhas são unânimes aodefenderem que estes aspectostêm sido fundamentais para vencera crise. Mas também reconhecemque “a grande sortedesta empresa é estar no sectoralimentar, que é de primeiranecessidade, além de estarmuito bem situada geo-graficamente”. Além disso,“também conta a nossa ho-nestidade e o historial deuma empresa que dá semprea cara, que sempre deu mui-ta atenção à proximidade aocliente e à maneira como esteé tratado”.Numa altura em que tanto sefala da importância de revitalizara agricultura nacional, a2009. “Actualmente esta é umaempresa salutar, com algunsaltos e baixos, mas isto é qua-se como caminhar em cimade água, com cuidado, semcorrer grandes riscos”.Prontos para encarar o futuro,os três gerentes da Amaro daSilva, Lda. dizem que o crescimentoda empresa terá que continuara ser sustentado, como atéaqui, “tendo sempre em contaa nossa dimensão”. Um cuidadoque muitas vezes se traduzna subcontratação de serviços deoutras empresas quando o trabalhoaperta, o que depois permiteà empresa manter todos ospostos de trabalho quando hámenos procura.À frente da empresa já há algunsanos, e sem ninguém dafamília a inclinar-se para dar continuidadeao seu trabalho, asduas irmãs começam agora apensar em quem agarrará naempresa quando de quiseremreformar. O pai ri-se e diz: “eutambém dizia que aos 65anos já não fazia mais nada,mas cá vou andando”.Mas Maria dos Anjos logo atalha:“eu gostaria de me refor-mar aos 65 anos, não meimagino a trabalhar aos 85anos, como o meu pai”. E depois?“Logo se há-de ver. Poragora estamos todos dispostosa dar continuidade à em-presa”, garante.Amaro da Silva espera que o anoA atmosfera controlada, em que é retirado da câmaratodo o oxigénio é a aposta recente da firma, que ajuda ade 2011 seja um bom ano para oJoana Fialhomanter a fruta inalteradasector. “Só esperamos que osjfialho@gazetacaldas.com


20Centrais28 | Janeiro | 2011, VUMAMA EMPRESAMPRESA, , VÁRIAS VGERAÇÕESJá em 1898 Manuel Felizardo vendia máquinas de cochegou com o seu bisneto ao século XXIDa esquerda para a direita: Mário Felizardo (1912-1964), filho de Manuel Felizardo (de quem não existem fotos) herdou o negócio do pai e era um entusiasta da Foz do Arelho, noqual se pode ver, na foto seguinte, acompanhado da mulher Sara (1913-2010) e do filho Francisco. Este último, que viveu entre 1942 e 2004) foi um continuador do ramo da família,tendo-se especializado na mecânica das máquinas de costura. A quarta foto mostra o mais novo membro do clã empresarial, , Mário Felizardo (nascido em 1965), bisneto doprimeiro vendedor de máquinas de costura das <strong>Caldas</strong>.O caldense Mário Felizardo(nascido em 1965) é o herdeiroda Casa Felizardo, fundada em1898 pelo seu bisavô Manuel Felizardo,que é actualmente arepresentante exclusiva da marcade máquinas Bernina comercializadasem todo o territórionacional.“Vendemos o top das má-quinas de costura e damoscursos sobre o seu funcio-namento em todo o país,apoiando assim os nossosclientes”, disse Mário Felizardo,que vai guiar-nos pela históriada sua empresa, apesar depouco ou nada saber sobre o seubisavô fundador, pois não ficoupara a História qualquer registode como seria Manuel Felizardoe como afinal começou a históriada ligação desta família àsmáquinas de costura. De qualquerforma, Mário Felizardo crêque o seu familiar terá aberto aloja nas proximidades da actual,na Rua General Queirós. Dedicava-seà venda de máquinasde costura e, por facturasque ainda existem, pode apenasconfirmar que a fundaçãoda empresa decorreu em 1898.Quem herdou o negócio foi o seuavô, Mário Felizardo (1912-1964),de quem também herdou onome. Apesar de não o ter conhecido,diz que “foi verdadei-ramente empreendedor ecreio que teve que dar umnovo arranque ao negócioque o seu pai (e meu bisavô)criou”.O avô do actual responsávelmudou a instalação da loja em1937, para um pouco mais abaixoda localização inicial da sedeactual da firma. Hoje estão nonº 35 e antes estiveram no nº 26da Rua General Queirós.“O negócio que o pai lhedeixou, correu-lhe bem, ape-sar da concorrência apertarum pouco já na altura”, contao neto Mário Felizardo, acrescentandoque naquela época,nas <strong>Caldas</strong>, existia outro vendedorde máquinas alemãs, oJoão Valeriano, “que eram delonge tecnicamente superio-res às da Oliva” mas aindaassim, “o meu avô Mário ven-deu milhares de máquinas”.A avó, Sara Felizardo (1913-2010), era o braço direito domarido que, enquanto viajava deterra em terra para vender asmáquinas da marca Oliva, seocupava de dar os cursos debordados e também de corte ecostura, explicando assim comose poderia usar as máquinasacabadas de vender. As formaçõestambém decorriam nas aldeiasum pouco por todo o concelhoe também nos concelhosvizinhos.O trabalho do casal de comerciantesfoi tal que a marca acaboupor os reconhecer e, maistarde, “o avô acabou por fi-car com a concessão a nívelregional”. Trabalhava em exclusivocom a marca portuguesaOliva, que possuía fábrica emS. João da Madeira, após ter tidouma primeira experiência coma Singer, menos bem sucedida.“O meu avô foi um grandehomem e também teve sem-pre uma grande mulher aoseu lado”, diz hoje o neto econtinuador do negócio familiar.Para Mário Felizardo, a Foz doArelho “era tudo”, conta hojeo neto explicando que o seu avôpassava vários meses na localidadebalnear. “Ficava em casados compadres e comadrese arranjava maneira de lápassar metade do ano”, disseo neto, que agora mora nalocalidade predilecta do avô.Este ainda fez alguns negóciosimobiliários tendo construídodois prédios nas <strong>Caldas</strong>, o últimodos quais pouco antes defalecer, em 1964.“O meu avô era um defen-sor de causas sociais”, disseMário Felizardo explicando queo seu familiar chegou a integrara Junta de Freguesia das <strong>Caldas</strong>e colaborou no Montepio. “Foio primeiro radiologista quan-do a máquina veio para ainstituição”, contou o neto,acrescentando que o avô eratambém amigo do prestigiadomédico Vieira Pereira.O casal teve um filho, FranciscoFelizardo (1942-2004) queacabou por ser o continuador donegócio da família. “O O meu avômandou o meu pai durantetrês anos trabalhar para afábrica da Oliva em S. Joãoda Madeira, o que lhe permi-tiu ficar com um know howmuito bom ao nível da mecâ-nica”, contou Mário Felizardo,acrescentando que “nunca co-nheci tão bom mecânico demáquinas de costura comoo meu pai”.E enquanto o avô Mário erasobretudo um comercial e a avódava formação profissional(para usar um termo de hoje),“o meu pai continuou o negócio,vendeu muita máqui-na, mas apostou sobretudona reparações”, contou. MárioFelizardo acompanhava o seupai Francisco a eventos internacionaisdo sector, sobretudo naAlemanha e era ele que aferia aqualidade dos materiais. “Eleera um mecânico formidá-vel”, recorda.Francisco Felizardo casou em1962 com Manuela Felizardo(1942-1965) e têm no ano seguintea primeira filha, Cristina Felizardo.Esta tem hoje 47 anos e éprofessora na Escola SecundáriaRaul Proença não tendo enveredadopelo “métier” famili-Já são quatro as gerações da família Felizardo que se dedicam à venda de máquinas de costura. E seantes o bisavô Manuel e o avô Mário corriam as terras da região para vender as então inovadorasmáquinas de costurar, hoje Mário Felizardo patrocina eventos onde dá a conhecer a sua máquinaBernina que, com as coordenadas certas, até borda sozinha. É o admirável mundo da electrónicaaplicado a estes equipamentos que esta empresa caldense vende e dos quais é a única representanteno país.O jovem Francisco com os pais (ambos à direita)acompanhado de três funcionárias da loja Olivaar. Dois anos depois nascia MárioFelizardo, o actual continuadordo negócio familiar. A suamãe viria a falecer, vítima deacidente de viação, quando estetinha apenas 28 dias.Não terão sido tempos fáceispara Francisco Felizardo os anosde 1964 e 1965 pois primeiromorre o seu pai e, no ano seguinte,a esposa. Sozinho, tomaas rédeas do negócio e contacom ajuda de Henrique Garcia,irmão da sua avó Sara, para gerira empresa.Entre 1965 e 1970 a casa chegaa ter quatro funcionários,todos da região.E se o avô Mário se dedicavaem exclusivo à Oliva o seu pai,mais tarde, acaba por expandiro negócio às marcas Bernina ePfaff. “Mais tarde acabámospor deixar a Oliva pois amarca deixou de fabricar asmáquinas em Portugal, preferindocomeçar a importálasde outros países com implicaçõesgraves na qualida-de”, explicou Mário Felizardo.Começaram então a vender Pfaffe Bernina, mas neste momentoapenas trabalham com esta última,sendo os seus representantesnacionais.CASA FELIZARDOPARTICIPAVA NA FEIRADO 15 DE AGOSTOMário Felizardo vinha para aloja ajudar o pai e lembra-se depintar os pedais das máquinasde costura. Antes vendiam-se asmáquinas com as respectivassecretárias enquanto que hojeé um equipamento portátil. “NaNaaltura fazia parte das repa-rações tirar a ferrugem evoltar a pintar”, disse MárioFelizardo, contando que havianas instalações um tanque comsoda cáustica onde “eram mer-gulhadas as máquinas parase tirar as velhas tintas e aferrugem”. Um dia, claro está,e apesar dos múltiplos avisospara que tivesse muito cuidado“escorreguei e mergulhei oUma imagem dos anos cinquenta onde se vêem duasempregadas da firma e uma típica máquina de costura da época


Centrais2128 | Janeiro | 2011stura num negócio quepé no tanque, tendo ficadoaflito só que o ácido já esta-va pouco reactivo e nadaaconteceu, apesar do susto”.Ainda hoje Mário Felizardoguarda muitos decalques que sedestinavam a colocar nas máquinasentão reparadas, serviçoque ajudava o pai a fazer. O actualempresário ainda se lembrade irem buscar as máquinasde costura que chegavam às<strong>Caldas</strong> no comboio e de comoeram transportadas numa carroçaaté à loja, na Rua GeneralQueirós.Recorda-se igualmente da participaçãoda empresa em feirascomo a do 15 de Agosto, quandoesta se fazia na mata.A partir dos anos 70 a vendaMário Felizardo é o actual responsável por uma empresa, cujasde máquinas de costura decres-máquinas de costura já são hoje autênticos computadoresceu bastante, mas as reparaçõesforam sempre algo constante e que se manteve atédá para fazer tudo, até bordados tradicionais”,hoje. De qualquer modo o decréscimo nas vendas fez com acrescentou o responsável. Nos últimos cinco anos, aque as marcas apostassem na inovação.Casa Felizardo promove ainda workshops de pactchwork(técnica de produzir trabalhos com retalhosEm 1990, Mário Felizardo vem para a empresa e o seu pai,Francisco, passa a dedicar-se mais às relações públicas, além de tecido) e “só só o fazemos com formadores des-de se manter sempre ligado à assistência técnica.ta área que possuem percurso internacional”,O jovem Mário gostava principalmente de jogar à bola, contou Mário Felizardo. Este ano, em Maio, regressaráàs <strong>Caldas</strong> a especialista australiana Jenny Bo-ficando os estudos para segundo plano. Vai trabalhar a tempointeiro com o pai, sem ter terminado o ensino secundário, wker. A digressão desta formadora em patchworkmas vai fazendo uma completa aprendizagem das máquinas começará por Espanha e depois de Portugal aindaque sempre deram o sustento à família. Mário Felizardo passará por cidades como Bruxelas, Amesterdão outem-se deslocado à Suíça, à sede da marca Bernina, sempre Frankfurt.que há novas máquinas para fazer cursos de aprendizagem Estas máquinas podem custar entre os mil e osao nível de mecânica.seis mil euros. E se tiverem a electrónica aplicadaAgora as máquinas que a Bernina cria já trazem softwareque permite às utilizadoras dar as medidas correctas – designadas por computadores de costura. Este é umaos sistemas de costura e de bordar, chegam a sercomo se fosse um computador - e saírem os moldes perfeitosou, simplesmente, dadas as coordenadas certas, con-segmento de mulheres interessadas em realizar asnegócio destinado a nichos de mercado. Além de umseguem bordar sozinhas. Se o meu avô hoje tivesse opor-suas roupas ou os seus trabalhos manuais, neste motunidadede ver como as coisas evoluíram teria imenmento“já temos alguns designers de moda quesa curiosidade em perceber como é que hoje estasjá estão a trabalhar com as nossas máquinas”,máquinas trabalham”, disse o actual proprietário. Em 2004 disse Mário Felizardo.Francisco Felizardo faleceu, vítima de doença e fica o filho O empresário tem um colaborador a trabalhar consigonas <strong>Caldas</strong> (ver caixa) e “cinco co pessoas emvárias zonas do país que colaboram connosco em“O FUTURO É MESMO A ELECTRÓNICA”áreas como as vendas das máquinas ou na forma-ção”, contou o empresário.Mário Felizardo a tomar conta dos destinos da empresa.A Casa Felizardo possui inúmeras máquinas de costura. A Outra parte importante do negócio continua a ser aloja tem dois espaços de armazém, um para as máquinas reparação das máquinas e “damos assistência às vári-novas (electrónicas), e um outro onde estão as máqui-as marcas de máquinas de costura”, contou o empresárioacrescentando que vendem igualmente os acessóri-vezes já não existem no mercado”, disse Mário Feliospara estes equipamentos. Na verdade reparam máquinasantigas de onde se extraem peças “que muitaszardo, que também colecciona estes equipamentos. Algumasestão em exposição na própria loja e outras na todo o país, chegando inclusivamente a enviar peças paranas desde o Porto ao Algarve e dão assistência técnica porsua casa.os seus clientes. É através da publicidade que fazem emO empresário tem notado que há um novo interesse revistas da especialidade e principalmente através do sitepor esta área por parte de pessoas mais novas. “Comoda empresa que os clientes chegam à Casa Felizardo.hoje a roupa é mais barata e anda quase tudo ves-Cerca de 80% do negócio destina-se à revenda para lojastido de igual, há sempre quem se queira diferenci-de todo o país. Negociam com estabelecimentos de Lisare aposte por fazer alterações na própria rouboa,Cascais, Setúbal, Algarve, Porto Braga, Viseu e tam-pa”.bém nos Açores.E se Francisco Felizardo apostava nas feiras a nível Segundo o empresário, a empresa sente necessidadelocal, o seu filho Mário actualmente participa nos eventosnacionais. “Este ano estivemos na FIL – FIA queta de mais espaço e está a usurpar o espaço que se desti-se realizou na FIL em Lisboa e também na Fatacil,na ao atendimento dos clientes. “Na verdade este esta-no Algarve”, contou explicando que são sempre óptibelecimentoé mais uma oficina do que propriamenmasoportunidade para contactos e sobretudo para di-te uma loja”, diz o empresário, que pretende passar ade alterações. E isto porque a área da reparação necessivulgaçãodos serviços desta empresa caldense. oficina para outras instalações que possui.“Estamos a patrocinar em exclusivo a Academia“Temos que reformular a nossa organização eda Costura, uma iniciativa da revista Burda ondeprovavelmente colocar mais gente”, disse este res-se promovem cursos de corte e costura”, disse MárioFelizardo que assim tem um canal onde dá a conhecera potenciais clientes todas as vantagens das suasmáquinas electrónicas Bernina.”O futuro é mesmo a electrónica”, conta o empresário,que destacou também a garantia alargada (cincoanos a nível mecânico e dois anos na electrónica) destesequipamentos que fazem parte sobretudo do universofeminino. “Sabendo trabalhar com o software,ponsável, que prefere não revelar o volume de negóciosCasa Felizardo – Empresa em nome individual, cujo capitalsocial é de cinco mil euros.E quanto ao futuro da Casa Felizardo? “Esse só aDeus pertence...”, rematou Mário Felizardo, pai de doisfilhos, a Mariana que tem 17 anos e o Gonçalo, com 12.Natacha Narcisonnarciso@gazetacaldas.com“Enquanto houver roupa, haverá sempremáquinas de costura”José Bernardino, de 26 anos, não se atrapalhaneste mundo de agulhas, lançadeifazponto corrido, ou pontos falrasou caixas de bobine. A mecânica desos. É comum também fazer ro-uma máquina de costura não tem segre-lhões de linha ou dar lassadas pordos para este funcionário que desde os 17baixo”, especificou o mecânico.avaria? “Geralmente parte a linha,trabalha na Casa Felizardo.As máquinas que mais gosta de repararsão as mais antigas, até porqueÉ natural do Barreiro, mas desde os seisanos que veio viver para as <strong>Caldas</strong>. “Asconsidera que as novas “se limitam anotas na escola não eram grande coi-copiar as mais velhas e depoissa, começava a pesar na carteira dosacrescentam-lhes a electrónica”.meus pais e por isso vim procurar tra-Os equipamentos de antigamente nãobalho”, disse o único funcionário, além têm comparação sobretudo “pela qua-do proprietário Mário Felizardo, que tralidadedos materiais antes usabalhaa tempo inteiro para esta firma.dos”, acrescentou. As marcas que José“Disseram-me que o patrão da casa,Bernardino mais gosta de trabalhar sãoque costumava estar à porta precisa-a Oliva, uma marca portuguesa e tam-va de um funcionário. Vim cá, gostei ebém destacou a Pfaff e a Singer, refe-fiquei até hoje...”, conta enquanto acaba rindo-se sempre aos modelos mais antigos.o conserto de uma máquina. Toca o telefone,era uma cliente para saber se a sua Sobre Francisco Felizardo, o pai demáquina já estava reparada. “Já sim, se-Mário, não esconde palavras de admi-nhora, está pronta! Pode vir buscar quandopuder”, responde José Bernardino doguém muito amigo, gostava de aju-lado de cá da linha telefónica.dar e era prestável. Dizia que o seuNo próximo mês de Março completa 10berço tinha sido um caixote cheioanos de casa e não se vê para já a fazerde máquinas de costura”.outra tarefa. “Gosto do que faço e como“Além de patrão, Mário Felizar-dizia o meu patrão Francisco trata-sedo é também meu amigo e umade um trabalho de mecânica fina quepessoa muito acessível”, disse esteé interessante e no final até é simples”,funcionário que tem notado que há alração:“O senhor Francisco era al-disse o funcionário, que é o braço direito gumas clientes que vêm à loja pedirde Mário Felizardo no que diz respeito às para reparar a máquinas que eram dareparações. “Ás vezes basta uma moli-avó, para poder confeccionar as suasnha estar fora do sítio para provocarpróprias roupas.a avaria”, conta o jovem enquanto terminaa reparação de uma máquina. nam na loja cursos de iniciação ao cor-Atentos a este mercado, proporcio-Dependendo da avaria, consegue repararentre três a quatro equipamentos duquantohouver roupa haverá semranteuma manhã. “Esta, por exemplo,pre máquinas de costura. Mesmoestá quase reparada. Estava presa,que de vez em quando o negócioagora é só preciso experimentar parafraqueje, enquanto houver umaverificar que está tudo bem, uma prá-coisa haverá sempre a outra”.tica que se faz sempre no fim de repa-ração”, disse José Bernardino.N.N.E o que faz uma máquina que sofrete e costura. Para José Bernardino “en-umaJosé Bernardino, que aprendeu a profissão com FranciscoFelizardo, rodeado de centenas de máquinas de costura<strong>Cronologia</strong>:1898 – Manuel Felizardo, bisavô de MárioFelizardo, instala na Rua General Queirós umaloja de máquinas de costura1937 – O seu filho Mário Felizardo (1912-1964) continua no negócio na mesma rua com asua esposa Sara Felizardo (1913-2010)1960 –Mário Felizardo passa a coordenartambém uma loja da marca Oliva que primeiro seinstala na Praça da Fruta e mais tarde na Rua CapitãoFilipe de Sousa. O seu filho, Francisco Felizardopassa a trabalhar com o pai.1964 - Morre o avô Mário Felizardo, ficandoo filho Francisco a gerir a empresa com a ajuda doseu tio Henrique Garcia, irmão da avó Sara.1990 – Mário Felizardo (bisneto do fundador)vem para a empresa trabalhar com opai, Francisco Felizardo. Este último, alémda assistência técnica passa a dedicar-setambém às relações públicas da empresa1995 – A Casa Felizardo torna-se importadorada marca Bernina ficando com o exclusivoda sua comercialização a norte doTejo.2000 – A empresa caldense torna-se representanteexclusiva da marca para Portugal.2005 – Mário inicia os workshops especializados,investindo em nichos de mercado


16Centrais4 | Fevereiro | 2011, VUMAMA EMPRESAMPRESA, , VÁRIAS VGERAÇÕESJosé Soares de Oliveira & Filhos, Lda. – a arte do restJosé Soares de Oliveira (1901-1975), fundador daempresaFoi na Escola Comercial e Industrial(hoje Secundária RafaelBordalo Pinheiro), que JoséSoares de Oliveira aprendeu,ainda jovem, a desenhar e a talhara madeira. Mestre Elias foium dos professores do jovemcaldense que, com cerca de 21anos e regressado da tropa, decidiuque não queria seguir aspisadas do pai, que trabalhavana cerâmica.Nascido em 1901, o rapaz começoua trabalhar no mobiliáriocom pouco mais de 20 anos.Pouco tempo depois junta-se aLuís Pardal e decide criar umasociedade e levar o negócio maisa sério. A José Oliveira o queinteressava mesmo era o mobiliáriode linhas antigas, clássico.O colega, por sua vez, queriadedicar-se aos móveis contemporâneos.Os dois acabariam porse separar pouco tempo depois.É assim que José Soares deOliveira decide, em 1927, aventurar-sesozinho no mundo dosnegócios, com uma empresa emnome individual. Uma actividadedesenvolvida na Rua MiguelBombarda, no edifício onde aindahoje se mantém a loja daempresa e onde, naquela altura,se encontrava a oficina, a lojae a habitação da família. InácioConhecida pelo mobiliário de linhas clássicas e pelo restauro de móveis e talhas douradas dediversas igrejas, a firma José Soares de Oliveira & Filhos, Lda. nasceu em 1927. Na loja da Rua MiguelBombarda, nas <strong>Caldas</strong> da Rainha, as cadeiras, mesas e desenhos, entre muitas outras peças, sãoelementos de um passado em que a história da família se mistura com a história da empresa, hojeorientada por dois filhos, Inácio e Vasco, e um neto do seu fundador, José Heitor.À arte de trabalhar madeiras exóticas e de dar nova vida a artigos envelhecidos, juntam-se as memóriasdaquela que foi “uma verdadeira escola de marceneiros”. Uma casa de onde saíram mobíliaspara vários pontos do mundo e que tem resistido à evolução dos tempos e dos gostos.Oliveira, que há anos desenhaos móveis fabricados pela empresa,diz que “a maior pro-dução do Sr. José Soares deOliveira foi seis filhos”: Frederico,Adelino, Beatriz, Inácio,Vasco e José.Todos, como ‘manda a lei’,com uma média de dois anosentre si. “Não havia televisão,não havia planeamento fa-miliar”, diz, a rir, Inácio, hojeDa esquerda para a direita José Heitor, Inácio e Vasco, o neto e os dois filhos que dão continuidade à empresacriada em 1927com 76 anos. E todos eles passarampela empresa do pai.“Crescemos entre móveis”,conta. Com a habitação da família,onde chegou a nascer ofilho mais novo, mesmo em cimada oficina, não havia como ospetizes escaparem ao labor.Além disso, o pai tinha um tratocom eles: todos iriam estudarpara a Escola Comercial de dia.Caso perdessem o ano, iriamtrabalhar na mobília e estudarà noite, o que acabou por acontecercom muitos deles.Numa família de homens comuma actividade maioritariamentetalhada para homens, Beatriztalvez se tenha esquivado àmadeira, mas garante não terficado “a dever nada” ao trabalho.“Uma rapariga no meiode seis rapazes, o que é quese espera?”, lembra.O mesmo aconteceu com amãe. Dona Laurinda passoumuitas horas a fazer os abatjoursdos candeeiros que ali sefabricavam, exemplares quedurante anos puderam ser apreciados,por exemplo, na Casa daCultura, ou nos antigos Paçosdo Concelho caldenses. Empalharcadeiras era outra tarefada mãe. “Ninguém sabiacomo se fazia, mas apanhou-se aí uma cadeira, deram-seao trabalho de a desman-char toda para ver como erafeita e depois começou ela aempalhar”, conta a filha.Os trabalhadores, muitos dosquais iam para ali trabalhar aindacrianças eram também consideradosverdadeiros membrosda família de José Soares de Oliveira.Ainda hoje é conversa recorrenteo facto de um antigofuncionário da empresa, contarmuitas vezes que saiu da escolacom sete anos, poucos dias depoisdo pai o ter matriculado na1ª classe, e que foi naquela oficinaque aprendeu a ler e escrever,ensinado pela única filha dopatrão.Nas fotografias que testemunhamo passado da empresa, oslaços que uniam o patrão aostrabalhadores são facilmentecomprovados. Muitos dos retratossão de convívios que juntavamtodos à mesa. O neto, JoséHeitor, que aparece ainda jovemem muitos deles, lembra-sebem que o 1º de Maio, Dia doTrabalhador, era sempre assinalado(mesmo antes do 25 de Abril)“à beira da Lagoa, com umacaldeirada feita ali mesmo”.E esta empresa de cariz verdadeiramentefamiliar deu tambémorigem a novas famílias.Um exemplo é a filha do patrão,Beatriz, que acabaria por se casarcom um empregado do pai.“UMA FUNDAÇÃO RICARDOESPÍRITO SANTO EMMINIATURA”É com memórias e com asautênticas relíquias que seamontoam na loja da Rua Mi-A família (José Soares de Oliveira é o terceiro a contar da esquerda) e ostrabalhadores da empresa, em 1942, nas instalações da Rua Miguel Bombarda, onde seencontrava a habitação, a oficina e a lojaJosé Soares de Oliveira (ao centro, de chapéu) no meio de toda a família (filhos enetos) em 1964


Centrais174 | Fevereiro | 2011auro e do mobiliário antigo desde 1927guel Bombarda que se recuperaa história daquela que Inácio eJosé Heitor garantem ser umadas mais antigas empresas das<strong>Caldas</strong>. Uma firma que “foi sem-pre uma escola, que formoucentenas de marceneiros eartistas, que vinham paraaqui aprender ainda miú-dos”.O restauro foi sempre umaimportante vertente da empresa,responsável pela recuperaçãoda talha dourada que aindahoje se vê em muitos altares devárias igrejas da região. JoséSoares de Oliveira dedicava-setambém à recuperação de móveisantigos. “Sem falsas mo-déstias, somos capazes deser uma Fundação RicardoEspírito Santo em miniatura.Somos capazes de fazer oque eles fazem, sem subsídiosnenhuns, antes pelo con-trário”, diz, orgulhoso, JoséHeitor.O trabalho de restauro trouxeà empresa caldense algunsdos mais requintados exemplaresde mobiliário clássico. “Ogrande ensinamento destacasa foram as peças antigasque passaram por aqui paraserem recuperadas e quenos deram uma grande liçãode arte e de estilos”, afiançaInácio. Peças de pessoas ligadasà nobreza e às grandes famíliasque permitiram à empresaficar com os modelos parareproduzir.“Muitas das grandes ca-sas no Alentejo têm móveisnossos ou recuperados pornós”, dizem Inácio e José Heitor,acrescentando que a maiorparte dos clientes da empresa sesituavam, principalmente, em Lisboa.Os descendentes de JoséSoares de Oliveira garantem que“esta firma era motivo de trazermuita gente às <strong>Caldas</strong>. Vi-nha muita gente de fora cá,que”, invariavelmente, “almoçavapor aí, ia ao mercado e de-pois à Pastelaria Machado”.À medida que o passa palavratorna a empresa numa referênciae a procura aumenta, asinstalações da Miguel Bombardatornam-se pequenas e a oficinaé mudada para junto dosprédios do Viola, na Rua Fonte doPinheiro o que aconteceu em meadosda década de 60. Na Rua MiguelBombarda mantém-se a loja.Em 1969 foi dada sociedade aosfilhos, criando-se a José Soares deOliveira & Filhos, Lda. Seis anosdepois o fundador da empresa viriaa falecer e foram os seus descendentesque garantiram a continuidadedo seu legado.Joana Fialhojfialho@gazetacaldas.comA José Soares de Oliveira &Filhos, Lda. sempre apostou emmobiliário “de qualidade”, feitocom madeiras exóticas. Maisque simples peças de mobiliário,dali saem verdadeiras obrasde arte, onde todos os pormenoressão cuidados. “Há aí umacama que fazemos que sópara embutir o painel sãoprecisos quatro meses”,aponta José Heitor, dando umexemplo da minúcia a que podemchegar os móveis da suaempresa.Ora, os clientes da empresasempre foram “pessoas comalgum poder de compra egosto”, entre os quais o destaquevai, nos tempos iniciais,para as famílias aristocráticas,depois para membros de diferentesgovernos, fosse em Portugal,fosse no Ultramar. Quandoo país aderiu à CEE (agoraResistir na época do “mobiliário de plástico”O edifício da Rua Miguel Bombarda resume-se hoje à loja da empresa, onde se multiplicam peças de mobiliário eferramentas a fazerem lembrar outros temposUnião Europeia), “muitos dosclientes foram trabalharpara Bruxelas e levaram da-qui muito mobiliário”, contaJosé Heitor, acrescentando queas peças da sua empresa podemainda ser encontradas em França,Espanha, Inglaterra, Canadá,Estados Unidos, antigas colóniase até em Macau.Por cá, eram muitas as vezesque José Soares de Oliveira, edepois os filhos, arrancavam demadrugada para Lisboa, “comuma garrafita de vinho e amerenda feita pela mãenuma caixa de madeira” e alipassavam o dia, a montar aspeças de mobiliário, regressandosó à noite.Desenhos originais de cadeiras clássicas, feitos por Inácio Oliveira a tinta da China,Nos tempos áureos da empre-que ainda hoje se preservam com todos os cuidadossa, contavam-se ali cerca de 60trabalhadores, muitos dos quaiscomeçavam a trabalhar aindamiúdos e por ali ficavam até àidade da reforma. As encomendaseram mais que muitas.“Chegámos a ter uma listade espera de 12 e 13 meses”,diz o neto do fundador, recordandoque os avós “correramo país a trabalhar, e semprena furgoneta da empresa”.Em meados da década de 90a José Soares de Oliveira & Filhos,Lda. viu-se mesmo obrigadaa mudar de novo de instalações,desta vez para a Zona Industrial.“Hoje os jovens aderiramà comida de plástico e tam-bém aos móveis de plástico.Hoje não se pensa na quali-dade, é dois ou três anos edeitar fora e é o IKEA que elesescolhem”, lamenta José Heitor,que diz que a empresa temsesentido em grande medidacom “a alteração de gostos ecomportamentos... são épo-cas!”.Por isso mesmo, nos temposque correm a empresa é sobretudoprocurada para o trabalhode restauro e recuperação. “Oschineses ainda não restau-ram móveis, o IKEA tambémnão, e ainda se vai recupe-rando”.A ARTE DO TRABALHO FEITOÀ MÃOMas se os tempos são outros,há muita coisa que se mantéminalterada na empresa, como ofacto de grande parte do trabalhoser feito à mão. Há uma serraeléctrica e mais algumas ferramentasque facilitam o labor,mas a atenção ao detalhe, aarte e o engenho necessáriosmantêm-se inalterados.A qualidade das madeirascom que se trabalha, vindas sobretudodo Brasil e de África,continua a ser uma garantiadada pela empresa. “Sempretivemos um stock muito bomde madeiras, nunca trabalhámosa madeira no imediatopara não haver problemas.Nesta empresa a ma-deira sempre esteve à chuvae ao ar livre durante um anoe só depois era trabalhada,para podermos dar garanti-as”, e foi isso que permitiu quea José Soares de Oliveira & Filhos,Lda. não sentisse grandedificuldade em encontrar matériasprimas quando alguns dosseus principais fornecedorescomeçaram a fechar. “Por enquantonão sentimos escas-sez, também precisamos demuito menos madeira que aque precisávamos há unsanos”, aponta José Heitor.A maioria dos clientes continuaa ser de Lisboa. “Filhos enetos de primeiros clientesque mantêm a ligação à casaou conhecidos destes quevêem as nossas peças”, explicao neto do fundador.A empresa, que nos últimosdois anos registou uma facturaçãomédia na ordem dos 120 mileuros, está hoje reduzida a setetrabalhadores, entre os quaisInácio, que se dedica especialmenteao desenho das peças demobiliário, Vasco, “um verda-deiro artista” a trabalhar amadeira, e José Heitor. “Isto étudo muito bonito, sentir acamisola é muito agradável”,diz o mais novo. E chega? “Nãovai chegando. O mercadoestá diferente, as exigênciassão muitas”, lamenta.À semelhança dos gerentes,muitos dos empregados que semantêm também ali estão hávários anos. Além disso, JoséHeitor foi o único neto a dar seguimentoàs pisadas do avô.“Nas férias todos passavampor aqui, mas ninguém fezdisto vida profissional”.Uma pergunta se impõe:quem vai dar continuidade àempresa? “Por enquanto nãose sabe”, diz, garantindo manter-seoptimista quanto ao futuro.Joana Fialhojfialho@gazetacaldas.com<strong>Cronologia</strong>1901: Nasce José Soaresde Oliveira, fundador da empresa1927: José Soares de Oliveiracomeça a trabalhar emnome individualDécada de 60: A produçãoda empresa muda-separa um terreno da família,junto aos prédios do Viola1969: O fundador dá sociedadeaos filhos e é criadaa José Soares de Oliveira &Filhos, Lda. com um capitalsocial de 98.766 euros1975: Morre José Soaresde Oliveira1995: A oficina é transferidapara as actuais instalaçõesna Zona Industrial


20Centrais11 | Fevereiro | 2011, VUMAMA EMPRESAMPRESA, , VÁRIAS VGERAÇÕESClínica Veterinária S. Francisco d’ Assis foi a primeirjá vai na segunda geraçãoManuel Gama Lourenço nasceuem Óbidos em 1952. Estudou nas<strong>Caldas</strong>, no Externato Ramalho Ortigãoaté ao terceiro ano, de ondeseguiu para Lisboa, onde concluiuo antigo sétimo ano, em 1972, noColégio Manuel Bernardes.Filho de médico, sempre mostrouapetência para as questõesda saúde, mas garante que nãosofreu influência de qualquer espéciepara seguir medicina veterinária.“Quando somos estudantesnão sabemos ao certo o quequeremos, pelo menos foi assimcomigo e penso que é as-sim com a maioria”, considera.Por esse motivo, só na altura deescolher um curso superior é queoptou pela medicina veterinária.“Achava que era uma áreabastante curiosa e não estouarrependido”, conta.Entrou em 1972 para a EscolaSuperior de Medicina Veterinária,a única no país que leccionava estecurso na altura. Em 1977 estavaformado.O primeiro emprego foi comoprofessor na Escola SecundáriaRafael Bordalo Pinheiro, onde esteveseis meses, mas em Abril de1978 foi convidado para exercer asua profissão na ProPinto, umaempresa de exploração avícola quefuncionava na Serra D’el Rei. Quatroanos depois mudou para a Cooperativade Produtores de Leiteque existia então nas <strong>Caldas</strong> daRainha. Mas nas horas vagas játratava animais de companhia.São dois universos bem distintos,considera. “Num existe umO veterinário Manuel Gama Lourenço, hoje com 58 anos, abriu em 1984 a Clínica Veterinária S.Francisco d’ Assis. Trabalhava, na altura, em animais de grande porte na cooperativa leiteira das<strong>Caldas</strong>, mas era a área dos animais de companhia que mais interesse lhe despertava. Por issoarriscou e abriu aquela que foi a primeira clínica veterinária nas <strong>Caldas</strong> da Rainha. Funcionava duashoras por dia, a seguir ao horário de trabalho na cooperativa, mas o projecto foi singrando e em1989 o volume de clientes justificou que abraçasse o projecto a tempo inteiro.Hoje, 27 anos passados, a sua clínica veterinária é também o local de trabalho da filha mais velha,Margarida Gama Lourenço, também veterinária de profissão, que desde pequena se habituou aajudar o pai e vê aquele projecto como sendo da família.interesse puramente comerci-al, o objectivo é fazer com queManuel Lourenço há cerca de 20 anos com uma jovemcliente cujo cachorro acabara de ser tratadoO casal Gama Lourenço com os dois filhos, Margarida e Manuel Maria, ainda pequenos, em 1987, e pai e filha, hoje, ambos colegasos animais sejam rentáveis àempresa; no outro existe umaspecto afectivo muito marca-do, com o que isso tem de bome de mau”. Apesar de gostar e dever interesse técnico em ambas,acabou por optar pelos animais decompanhia pela mais simples dasrazões: “era a que gostavamais”.Abriu a clínica para poder exercera sua profissão porque até ali,na falta de instalações próprias,os animais eram tratados, unsnuma garagem na casa dos pais,em Óbidos, outros mesmo na rua,à porta das pessoas. “Por muitacompetência que se tenha, semmeios técnicos não é possívelprestar um bom serviço”, sustenta.A criação de um estabelecimentoera um passo fundamental paramelhorar a assistência aos animaisde companhia, dando-lhes maisatenção, mas principalmente possibilitavaum conjunto de meiostécnicos que permitiam tratar situaçõesmais complicadas, comocasos em que era necessário recorrerà cirurgia.Assim, em 1984 resolveu arriscara abertura daquela que seria aprimeira clínica veterinária nas<strong>Caldas</strong> da Rainha. Arrendou umaloja no número 27 da Rua VitorinoFróis por 20 contos (100 euros), “oque na altura era muito dinheiro...para se ter uma ideia re-parte do encorajamento, quer nopróprio trabalho, como o próprioveterinário faz questão de subli-cebia 40 contos na cooperatinhar:“ela foi uma grande dinavae metade era para a renmizadorada clínica, ajudava-da…”, recorda Manuel Gama Lou-me em tudo, inclusivamenterenço.nas cirurgias, das mais fáceisO espaço era grande, mas sóàs mais complicadas”.tinha um consultório, uma casa de O arranque da clínica teve momentosdifíceis, em que o rendi-banho e uma sala de espera tãogrande como vazia. “Só tinhamento que tirava pouco mais davaumas cadeiras que trouxe dedo que para pagar a renda. “Foicasa, porque os meios nãocom muito empenho e vonta-eram muitos e não sabia se ade que conseguimos crescer,clínica ia resultar”, diz.trabalhando aos sábados eChamou-lhe S. Francisco d’ As-aos domingos quando erasis por ser este o santo protectorpreciso, e de noite chegámosdos animais, e a clínica ficava soba deixar os filhos em casa aalçada da empresa com o mesmodormir para vir fazer cirurgiasnome, Clínica Veterinária S. Fran-complicadas, mas em tudo écisco D’ Assis, Lda., uma sociedaprecisofazer sacrifícios pordepor quotas cujos sócios são ain-que a vida não é fácil”, sublinhadahoje Manuel Gama Lourenço ea esposa, Filomena Gama Lourenço.movimento justificava que aban-Porém, ao fim de cinco anos oNo arranque, o veterinário tinhaque acumular os dois trabativados produtores de leite paradonasse em definitivo a cooperalhos,na cooperativa e na clínica. se dedicar em exclusivo à clínica,Por isso, esta funcionava apenas que passa a funcionar todos osduas horas por dia, quando ManuelGama Lourenço terminava o traente.dias úteis em horário de expedibalhona cooperativa.Daí em diante a clínica sofreuSem meios para ter funcionários,era a própria Filomena, profes-físicos, como em termos tecnoló-várias evoluções, tanto em termossora do ensino secundário, o grandeapoio para o marido, quer naevoluindo e crescendo. Adquigicos.“Felizmente veio sempreri mais espaço, mas tambémequipamento tecnológico dediagnóstico que hoje é deter-minante para desempenhar otrabalho com mais qualidade”.Numa primeira fase juntou maisum gabinete, mais tarde uma saladedicada em exclusivo à cirurgia.Em 1999 alargou o espaço com aaquisição da loja do lado, onde fezum escritório e uma sala para examescom Raio X. Em 2005 adquiriua loja que até ali estava arrendadae em 2010 a clínica voltou a sofrerremodelações, para ser criadauma sala de recobro e um espaçopróprio para banho e tosquias.A evolução da clínica acompanhatambém o desenvolvimento daprópria actividade, realça ManuelGama Lourenço. “Hoje é umaprofissão mais exigente doque era há 30 anos, mas commuito mais meios. Quando co-mecei era uma profissão difícildevido à falta de recursos etambém de colegas em quemnos apoiarmos, mas hoje fe-lizmente para nós e para osutentes evoluiu muito”.Ao fim de 27 anos de Clínica VeterináriaS. Francisco d’ Assis, oque dá mais gosto a Manuel GamaLourenço é ter muitos clientes fiéishá muitos anos, que são já maisamigos do que clientes. “Fazemparte do nosso currículo essaspessoas com quem criamosuma ligação mais forte e é umasatisfação saber que acredi-tam em nós, pessoas que porvezes nem vivem cá, mas quenos procuram nem que sejapara perguntar se está tudobem”.Joel Ribeirojribeiro@gazetacaldas.com


Centrais2111 | Fevereiro | 2011a a estabelecer-se nas <strong>Caldas</strong> e“É uma profissão que exige uma grande dedicação”Margarida Lourenço numa foto de quando andava a estudar veterinária e na passada terça-feira após uma operação cirúrgica a um “paciente”.Em 2007 Manuel Gama Lourençopassou a ter na filha Margarida,hoje com 29 anos, umacolega de trabalho. O filho maisnovo, Manuel Maria Gama Lourenço,de 26 anos, é gestor e porisso não integrou a clínica emtermos profissionais. Mas osdois irmãos foram presença assídua,ajudando no que podiamnas horas vagas, nos fins-desemana,ou nas férias da escola.Para o pai, ter a filha comocolega é uma satisfação, tantocomo progenitor, como em termosprofissionais. “Ela é umaóptima companhia e é muitoimportante introduzir gentenova com outras ideias, ou-tra formação e outra atitudeperante a vida e o trabalho,é uma lufada de ar frescoque renova a nossa mentali-dade”, considera.Para Margarida Gama Lourenço,integrar a clínica do pai foialgo que cresceu com ela própria.“Eu cresci aqui, não vimpara cá enganada. É umaprofissão que exige umagrande dedicação e espíritode sacrifício pois em qual-quer altura podemos ter quelargar o que estamos a fazerpara vir resolver um pro-blema, mas sabia para o quevinha e gosto muito do quefaço”, refere.Ao contrário do pai, Margaridasempre teve uma forte inclinaçãopara seguir medicina veterinária,“não que fosse umagrande paixão, como as pes-soas costumam dizer, masporque sabia que iria gostardisto”. Mas não foi fácil entrarna universidade. Chegou mesmoa tentar outro curso: terapiada fala. “Gostava da profis-são mas não do curso, nãohavia uma cadeira de quegostasse e desisti”.Acabou por conseguir entrarem medicina veterinária emCoimbra, formou-se em 2007 ecomeçou a trabalhar na ClínicaS. Francisco d’ Assis.Continuar o trabalho que o paicomeçou é algo que encaracomo uma grande responsabilidade,até porque “não imagi-no esta clínica sem nós cáestarmos”, afirma.Margarida tem consciênciaque existe hoje muita competitividadeno meio e, tal como osseus pais fizeram, também elavai ter que fazer sacrifícios paramanter a clínica, mas com umavantagem: “não tive que co-meçar sozinha, ultrapassaraquelas dificuldades iniciais,eles já o fizeram por mim etenho que dar graças a DeusA Clínica Veterinária S. Francisco D’ Assis, Lda. começou por ser apenas a parte dadireita na Rua Vitorino Fróis e alargou-se em 1999 ao lado esquerdo.por isso e esforçar-me parafazer andar este projectomais 25 anos”.Dos três anos de experiênciaque Margarida Gama Lourençoleva na actividade, o que achamais complicado é lidar com aligação, por vezes demasiadoforte, que as pessoas criam como seu animal de estimação.“O animal deve ser maisum membro da família, maspor vezes as pessoas esta-belecem com ele uma relaçãodemasiado forte”, o que porvezes condiciona quando é precisolidar com uma situação dedoença.Difícil de lidar é tambémquando os problemas de saúdedos animais não são ultrapas-Os cães e os gatos continuama ser os principais animaisde companhia, e também osque de forma mais comum continuama frequentar o veterinário.No entanto, os animaisexóticos começam também aaparecer, o que constitui umdesafio para os profissionais dasaúde veterinária.Manuel Gama Lourenço adiantaque já começam a aparecercoelhos, aves, alguns répteis,mas ainda em número reduzido.Mesmo assim, isso obrigaa uma constante aprendiza-sáveis e obrigam à eutanásia.“É É difícil porque não há con-solo possível para o dono, eé difícil porque temos quereconhecer que não conseguimosresolver aquele pro-blema, que até pode nem tersolução, mas é uma vida queestá em jogo e vai ser tiradapor nós”.Tendo dirigido a sua formaçãopara os animais de companhia,Margarida sente algumacuriosidade em trabalhar comgrandes animais, área onde opai começou e com a qual a veterináriatomou algum contactodurante o curso superior. “Otrabalho no campo, emboramuito duro, é muito bompara quem gosta”, refere,Animais exóticos já vão aparecendotido ainda oportunidade de fazeruma formação aprofundadanesta área, procura partilhar conhecimentoscom outros colegasque trabalham mais em animaisexóticos “para poder lidarcom o que aparece, porqueé difícil progredir em determinadaárea se o traba-lho que temos é pouco”.A veterinária sublinha, noentanto, que os donos deste tipode animais têm cada mais interessepelo bem-estar dos seusbichos. “Cada vez mais trazemo seu coelho, o seu porgem,“é um dos encantos daquinho da Índia para vaci-profissão”.nar, ou só para ver se estáPara Margarida Gama Lou-tudo bem, coisa que há unsrenço, estes animais são mes-anos era impensável”.mo um aliciante, “gosto imen-so”, afirma. Apesar de não terJ.R.acrescentando que se surgisseuma proposta “sentir-me-iatentada a dividir o meu tem-po entre uma coisa e outra,mas não é fácil porque nanossa zona não há muito tra-balho nessa área”.<strong>Cronologia</strong>J.R.1984- Manuel Gama Lourençoabre a Clínica VeterináriaS. Francisco D’ Assis na RuaVitorino Fróis sob o nome comercialde S. Francisco D’ Assis,Lda. cujos sócios são ocasal Manuel e FilomenaGama Lourenço1989- Manuel Gama Lourençoassume a clínica a tempointeiro.1999- A clínica expandesepara a loja do lado e passaa ter equipamento de Raio X2005- É adquirida a lojaque estava arrendada, passandoas instalações da clínicaa pertencer por inteiro àempresa.2007- Margarida GamaLourenço, filha do casal, junta-seao pai como veterináriada clínica2010- É criada uma salade recobro para os animais recém-operados


20Centrais18 | Fevereiro | 2011, VUMAMA EMPRESAMPRESA, , VÁRIAS VGERAÇÕESHenrique Querido, SA – o estucador que chegou a emcom o filhoA família Querido numa foto de 1982 Ricardo Querido e o pai. O irmão Vítor, que chegou a participar na gestão da empresa, morreu em 1992“Andei a dar serventia naqueleprédio onde o Abílio Flo-res tinha a loja de peças [juntoà igreja] com uma lata de mas-sa às costas. Naquele tempoera muito duro”, conta HenriqueQuerido. Depois, há cerca de40 anos atrás, o hoje empresáriofoi destacado para as obras noHospital das <strong>Caldas</strong>. As funçõescontinuavam a ser as de servente.Mas é aí que Henrique Queridorecebe uma proposta irrecusável.“Quando acabaram asobras, o patrão convidou-mepara Lisboa a fim de tomarconta da construção de umprédio de seis andares. Eudisse: Oh senhor engenheiro,vou para lá tomar conta dehomens que têm idade paraser meus pais. . E ele: Não te-nha medo”. Henrique Queridoaceitou, claro.Mudou-se, então, de malas ebagagens para Lisboa. Finda aobra, como a experiência correrabem, o jovem empreendedor vai“comandar” mais uma pequenaconstrução para a Costa de Caparica.Mas decide voltar às <strong>Caldas</strong>.“Estava fora da família etinha saudades”, explica. HenriqueQuerido tinha casado em1965 com Maria Filomena e optapor regressar, ainda que isso representassedeixar de ser encarregadode obra e voltar a trabalharapenas como estucador.“Antigamente ganhava odinheiro que queria”, diz comsatisfação. “O ordenado nor-mal era de 50 escudos [25 cêntimos]e eu já ganhava três aquatro vezes mais. É certo quemuitas vezes não me deitavapor estar a trabalhar, mas faziacom gosto aquilo que pou-cas pessoas sabiam fazer -aquelas flores todas no tectoem estuque, tudo ao porme-nor. Hoje já não sei fazer”, contao empreiteiro.No início da década de setentaforma uma empresa em nomeindividual – a Henrique BernardinoQuerido – e torna-se empresário.Chega a ter 35 homens a trabalharpor sua conta, numa épocaem os meios tecnológicos nãoeram os mesmos de hoje e a forçahumana era a “máquina” daconstrução.“As pessoas tinham quedar ao cabedal. Não é comoagora em que a grua pode teruma lança de 30 a 60 metrosde comprimento e que chegaa todo o lado. O pessoal tinhade andar com o balde pelaescada acima. Demorava diasa encher uma laje”, afirma.Com o 25 de Abril dá-se tambémuma revolução na empresade Henrique Querido. Durante ochamado PREC (Período Revolucionárioem Curso) as coisas nãoestão de feição para quem é patrãoe Henrique Querido resolve acoisa de forma pragmática – despedetodos os trabalhadores. Em1978, em vez de empresário emnome individual, junta-se a JúlioFialho e forma a Querido & Fialho,Lda, a primeira das várias sociedadespor quotas que faria aolongo da sua vida empresarial.“Quando parei de fazer es-tuque e pinturas, comecei acomprar terrenos e a construirapartamentos para ven-der. Foi aí que convidei o JúlioFialho para fazermos umasociedade”.A empresa constituída pelosdois construtores chegou a daremprego a 50 pessoas. Já haviabetoneiras eléctricas que misturavamareia, pedra e cimento parafazer betão. Uma novidade paraa época. “Amassavam um metrode betão de cada vez. Ago-ra já não trabalham com elas.Hoje faz-se um prédio muitomais rápido. Num dia enche-se os pilares todos”, declaraHenrique Querido. Como tudo temum fim, os dois sócios acabarampor separar-se, em 1986 e HenriqueQuerido fica com a quota deJúlio Fialho. Mas um ano antes, oempresário já tinha constituído asua própria empresa - a HenriqueQuerido Lda. que começa agoralaborar. A empresa tem por sócioso casal Henrique e Maria Filomenae o filho Vítor Querido (entãocom 20 anos e que faleceriaseis anos depois num acidente deviação).O espírito empreededor deHenrique Querido não se fica poraqui. Nos anos 80, aventura-senuma nova sociedade - a Edificaldas,desta vez com mais seteempresários: António Vibaldo,Abílio Pedro, António Leitão, JúlioFialho, Silvino Costa e José eLuís Norte (estes últimos pai e filho).O objectivo era criar uma grandeempresa de construção civil nas<strong>Caldas</strong>. “Foi uma brincadeira.Almoçávamos todas as quartas-feirasjuntos. Depois pensámosem comprar um terrenona Foz do Arelho. Construi-se um prédio de 12 andares,cada um ficou com um apar-tamento e vendemos outrosquatro. De toda essa malta, oúnico que ainda tem lá umapartamento sou eu”, dá contao empreiteiro.Da Edificaldas sai um dos maioresempreendimentos da altura:os prédios da Avenida 1º deMaio que fazem confluência coma Rua Raul Proença. Contudo, ecom tantos construtores, começaramos conflitos, e HenriqueQuerido sai da mega-empresa emfinais dos anos 80 para se dedicarà Henrique Querido Lda. Curiosamente,a Edificaldas, que mudouvárias vezes de sócios, só seriaextinta em 2008.PAI NA OBRA, FILHO NAIMAGEM DA EMPRESARicardo Querido, filho maisnovo do empreiteiro (nasceu em1975) entra na empresa com 20anos. Tinha terminado o 12º anohá dois e o seu sonho era tornarsearquitecto, mas, como o irmãofalecera três anos antes, decideajudar o pai na firma.“Ao mesmo tempo, semprepensei que acabava os estu-dos. Nunca o fiz. Embrenhei-me de tal forma no trabalhoque quando cheguei aos 22anos optei por agarrar com-pletamente a empresa”, conta.Três anos depois, Ricardo Queridofica a cem por centro na empresa,deixando para trás o sonhoda Arquitectura e a música,(chegou a ser viola baixo na bandaDeclínios).“Ao Ao princípio trabalhavajunto dos clientes a escolhermateriais”. Daí à direcção deuma obra foi um passo. Começoupor substituir o pai nos seus períodosde férias. “Quando che-Foi no final da década de 50 que Henrique Querido entrou como empresário no ramo da construçãocivil. Quase sempre foi patrão. Mas antes de o ser, este empreiteiro, natural do Carvalhal Benfeito,passou pela árdua tarefa de ser servente, numa época em que o imobiliário nas <strong>Caldas</strong> despontou deforma galopante.guei, as pessoas já me conhe-ciam desde miúdo. Tal comoo meu pai, também tive algumreceio: Então agora tambémvou mandar nesta gente?”,questionava-se, pensando na suaidade perante pessoas mais velhas.A juventude e o dinamismo deRicardo Querido ajudou à modernizaçãoda construtora. Questõescomo o marketing, imagem empresariale sistema informáticonão estavam assim tão presentesna Henrique Querido Lda.“Em 1994 estavam a apareceros grandes softwares de ges-tão que foram necessáriosimplementar. Gastou-se al-gum dinheiro, mas criou-seuma imagem”, conta.O pai admite que nunca estevetão vocacionado para a imagemda firma, mas permitiu que o filhopudesse trabalhar à vontade,pois também a construção civil temque saber atacar o mercado.O filho explica as suas razões:“O mercado da construçãocivil se calhar ainda é consideradoum mercado marginal.O construtor civil está es-tereotipado como o fulanoque vai enganar. Se nóstransmitirmos uma imagemséria, estável e organizada,dará certamente confiança aoconsumidor”.Hoje, aos 35 anos, Ricardo Queridoocupa o lugar de directorgeralde uma empresa que em2009 passou a sociedade anónima(ver cronologia). Garante quenunca pensou em desistir, mesmoquando se assustava com osvalores das compras dos terrenosdo pai.O gosto de ver um prédio a erguer-sedeu-lhe coragem paracontinuar a sua missão. “Temosuma relação de trabalho muitoboa. Contam-se pelos dedosde uma mão as desavençasque tivemos. Há diferentesopiniões, mas a nossa estratégiaenquadra-se na jun-ção de gerações. Mas se em1995 me perguntasse: Ricar-do esta é sua primeira opção?Eu diria claramente que não”,afirma. “Complementamo-nos”, acrescenta Henrique Querido,definindo assim obra construídaentre pai e filho.A EXPANSÃO PARA OALGARVEJá por si, o Algarve é sinónimode empreendimento. E foi isso quelevou Henrique Querido a expandir-separa sul, mais exactamen-


Centrais2118 | Fevereiro | 2011presário e detém hoje uma sociedade anónimate para a zona das Açoteias (concelhode Albufeira). Em 1992 deram-seos primeiros passos.“A escolha do Algarve emtermos económicos é quaseóbvia. O Algarve vendia muitoe bem. As margens de lucroeram muito grandes”, afirmaRicardo Querido.Pai e filho ainda hoje falam comorgulho no prédio que construíramnos Olhos d’ Água (concelhode Albufeira). Está erguido a 15metros do mar, tem 50 apartamentos,com uma piscina no quartoandar e com seis pisos debaixode terra. Contempla 555 lugaresde estacionamento. “Foi a obraque me deu mais gozo fazer.Custou dez milhões de euros.É a obra particular mais carade sempre desta empresa”, dizRicardo Querido.Todavia a crise também chegouao Algarve. O director-geralda construtora declara que asvendas são esporádicas, emboragaranta que o mercado lá nãoparou. “O grande cliente do Algarveera o inglês e o irlan-dês. A Irlanda está no estadoem que está. Neste momentoé muito difícil a um britânicoconseguir um financiamentoem Portugal. Assim sendo, omercado que volta a existircom força é o mercado de pri-meira habitação”, afirma.A obra da Henrique QueridoS.A. mostra-se em empreendimentosna cidade das <strong>Caldas</strong>, naFoz do Arelho, em Salir de Matos,Rio Maior e na Marinha Grande.Contudo, o empreiteiro dizpreferir a construção privada.“Embora estejam [para privados]a vender mal, nas obraspúblicas ganha-se muito poucodinheiro e pagam tardia-mente”, afirma Henrique Querido.Uma queixa comum a muitosempresários acerca dos atrasosdos pagamentos do Estado.“Mas somos muito fiéis às<strong>Caldas</strong>”, acrescenta Ricardo Querido.“Somos das poucas em-presas que podemos dizer quetemos algumas coisas porvender, mas também nos sus-tentámos. Fomos fazendo àmedida que o cliente foi aparecendo,apostando na quali-dade e em bons sítios”, remata.Hoje, a Henrique Querido S.A.já contempla cem prédios na cidade.É obra.Tânia Marquestania.marques@gazetacaldas.comCarlos Ciprianocc@gazetacaldas.comCombate à crise passa pelo mercado turístico, comerciale de serviçosSe há 40 anos o trabalho duro daconstrução civil era o esforço humano,hoje é duro tratar de toda adocumentação para se conseguir fazerum prédio. Desde o dia da comprade um terreno até ao dia da construçãodos apartamentos podempassar largos meses ou anos. A estruturaburocrática é grande e morosae não há empresário da construçãocivil que dela não se queixe.“As aprovações nas Câma-ras são lentas. A nossa estrutu-ra é cega ao investimento e àboa saúde financeira da empre-sa. Por isso é que se vai criandomais documentos para tratar.Devia dar-se um passo atráspara que as obras e edifícios fos-sem seguidos por projectos quejá existem”, diz Ricardo Querido.Aliada à burocracia das legalizaçõesdos empreendimentos, acrise teima em não largar o sectorimobiliário e para isso há que procurarnovas estratégias para a solidezda Henrique Querido S.A.. Solução?A empresa pretende expandir-seno mercado turístico, comércioe serviços. E a firma até estáconstituída desde 2002: H&Q, EmpreendimentosTurísticos, Lda. “Éum olhar para o futuro um bo-Para além da construção civil,Henrique Querido dedicousetambém a outra paixão: o<strong>Caldas</strong> SC. Na época 1982-83 tornou-sedirector do clube. No anoseguinte foi para director dasinstalações desportivas e noterceiro ano chegou a presidente,cargo que ocupou – alternadamente– durante oito anos,até à época 1999-2000. Tal comona construção civil, o filho tambémquis acompanhar o pai naslides desportivas. Ricardo Queridoesteve ligado ao futssal e éainda vice-presidente do <strong>Caldas</strong>,mas saiu a meio da época passadapor falta de disponibilidadepara o clube. É sócio há 25anos. “Não fui um presidentedo <strong>Caldas</strong>, fui um emprega-do do <strong>Caldas</strong> quase a tempointeiro”, resume Henrique Querido.“Deixei lá muita obra feita,por exemplo o arrelva-mento do campo da mata.Trabalhei muito nessa altu-ra porque o dinheiro nãocado cauteloso, mas conveni-ente.”, explica Ricardo Querido. Aempresa possui terrenos em Mortágua,perto da barragem da Aguieirae no Alandroal, perto da barragemdo Alqueva. Os motivos sãoóbvios: fazer ali alguma coisa relacionadocom o turismo rural ou agroturismo.Mas o momento actual éde pura expectativa.A sociedade tem 22 funcionáriosincluindo encarregados, engenheiros,motoristas, pessoal de escritórioe operários. Mas ainda há ummês havia mais de 120 homens atrabalhar para a empresa, mas emregime de subempreitada. Pai e filhodizem que hoje em dia, numprédio médio, 20 a 30% da obra éfeita em outsoursing.Grande parte dos trabalhadorespor empreitada são do Leste Europeue brasileiros. “Existem tam-bém alguns portugueses, maso trabalho da obra ninguém oquer”, afirma Ricardo Querido,dando a conhecer que no empreendimentonos Olhos d’ Água contabilizaramhomens de 24 nacionalidades(desde paquistaneses, senegaleseseaté indianos).( “Nin-guém o quer, mas qualquer diatambém têm que o gramar”,persiste Henrique Querido. “Estãomilhares formados no desem-prego. Se nós continuamos aformar mais jovens... Para quê?Para irem para o Modelo avi-ar? Se não querem ir para aagricultura, nem para a construção,o que vão fazer? Rou-Da construção civil para a presidência do<strong>Caldas</strong> SCHenrique Querido quando presidia ao <strong>Caldas</strong> SportClub entrega a chave de um carro sorteadoabundava. Tínhamos um or-çamento de 5800 contos [28mil euros]. . A Câmara tinha-nos prometido que davaquatro mil contos [20 mil euros]e era preciso arranjar osoito mil, a pedra e centenasde camiões de areia. Passeinoites inteiras sem me dei-tar”, conta.Uma construção da firma no centro das <strong>Caldas</strong> na década de noventa.Questões financeiras aparte,o empreiteiro fala com orgulhoda boa equipa que o <strong>Caldas</strong> SCtinha. “Andávamos nos luga-res cimeiros”. E também dasactividades para angariar fundospara o clube. “Fazíamosnoites de fados, jantares eaté sorteios de carros, todosos meses”. Porém, quando re-bar?”, questiona.Ambos concordam que formaçãona área da construção civil seriafundamental para incentivar osjovens a “construir” melhor o seufuturo.T.M.lembra esses anos, HenriqueQuerido não esquece a tristezade nunca ter sido agradecidopela “obra” que deixou ao clube.“Prejudiquei muito as minhasempresas, a minha fa-mília, para dar o máximo deapoio ao <strong>Caldas</strong>. Nunca fuiagradecido. Gastei muito dinheiroe quando vinha em-bora, passavam aquilo ameia dúzia de patacos”, diz.Quando saiu a última vez da presidência,dois anos depois convidavam-nopara retomar o cargo,mas já não aceitou.Ainda assim, o empresárionão se arrepende do que fezpelo clube. “As pessoas mu-dam, mas a colectividade fica.O <strong>Caldas</strong> não tem nada paradar a ninguém, as pessoas éque têm de dar ao <strong>Caldas</strong>”,concluí.T.M.CRONOLOGIA1941 - Nasce Henrique Querido1965 - Casa com Maria Filomena1966 - Nasce o primeiro filho,Vítor Querido1975 - Nasce Ricardo Querido1978 – Henrique Querido criaa sua primeira sociedade - aQuerido & Fialho Lda.Início dos anos 80 – HenriqueQuerido junta-se a maissete empresários caldenses ecriam a Edificaldas1985 – Constituição da HenriqueQuerido, Lda. tendo comosócios o casal Herique e FilomenaQuerido1986 – Júlio Fialho sai da sociedadeQuerido & Fialho eHenrique Querido fica com asua quota1992 – Vítor Querido morrenum acidente de viação1995 – O irmão, Ricardo, entrapara a firma2002 – Nasce a H&Q, EmpreendimentosTurísticos2009 – A empresa HenriqueQuerido passa a SociedadeAnónima com um capital socialde 1,3 milhões de euros.AnoFacturação2005 4,72006 10,72007 8,52008 11,52009 12,92010 7,74(em milhões de euros)


20Centrais25 | Fevereiro | 2011, VUMAMA EMPRESAMPRESA, , VÁRIAS VGERAÇÕESCasa Galinha há 55 anos na rua Leão Azedo a venderAntónio Galinha (1913-1990) foi o fundador da loja que levao seu apelidoSete anos depois, Maria JoséGalinha decidiu passar o negóciopara o seu irmão e sobrinha. A 19de Dezembro de 1997 foi constituídaa sociedade irregular “Casa Galinhade José Maria Marques e MariaZita Marques Mateus Silva dosSantos”. Tio e sobrinha, que dedicaramtoda a sua vida profissionalà loja, passaram a ser os dois únicossócios.O ramo de actividade oficial é avenda de solas, cabedais, peles eartigos para manutenção e restaurode calçado e de peles, como agraxa e as tintas para mudar decor. Para além disso, vendem cintos,colas, coleiras de cães, calçadeirase palminhas, entre outros artigos.Há produtos que ainda fazemsucesso, como os de tratamentopara sofás de couro, ou os utilizadospara impermeabilizar botas ecasacos ensebados.Ao longo da sua existência sótrabalharam naquele estabeleci-mento os dois cunhados AntónioGalinha e José Marques, bem comoas respectivas sobrinhas de ambos,Zita Santos e Fernanda Raimundo.Esta última foi trabalhar para a CasaGalinha aos 18 anos, mas emigrariapara os Estados Unidos algum tempodepois, onde ainda reside.DE CAIXEIRO-VIAJANTE ACOMERCIANTEA loja foi fundada em 1955 porAntónio Ferreira Galinha, queZita Santos ladeada pelos tios que a criaram nodia do seu casamento, em 1977era caixeiro-viajante de uma lojaque vendia solas e cabedais emCoimbra - a Faria Oliveira & C.ª,Lda, que ainda hoje existe.Na altura, um outro comerciantede Coimbra convenceu AntónioGalinha a investir na suaprópria loja de solas e cabedaisnas <strong>Caldas</strong>. A cidade tinha potencialdevido à estação de comboios,um transporte que poderiaser utilizado para recebermercadoria. Também não foi poracaso que se instalaram na ruaLeão Azedo, mesmo junto à centralde camionagem dos Capristanos,que tinha sido inauguradaseis anos antes.O prédio, propriedade de CarlosTomaz (já falecido) e da suamulher, Adelina Tomaz (que aindahoje mora por cima da loja),tinha sido construído em 1950 eo espaço já fora arrendado pelaUnião Caldense, um armazémde mercearias, cujos sócioseram António Rego e EduardoCarvalho, e que deu origem àUNICAL.Embora o primeiro contratoda Casa Galinha com os senhoriosdate de 1957, Zita Santosgarante que a loja abriu em 1955.Fundada em 1955, a Casa Galinha é um dos estabelecimentos comerciais mais antigos das <strong>Caldas</strong> daRainha, com a particularidade de nunca ter sofrido qualquer remodelação. Instalada na rua LeãoAzedo, começou por ser um local de peregrinação das centenas de sapateiros que existiam naregião, que ali se abasteciam de cabedais, solas e outros artigos necessários para o seu ofício.O fundador, António Galinha, foi proprietário do estabelecimento até que morreu, a 10 de Fevereirode 1990, com 77 anos. Nessa altura a mulher, Maria José Marques Ferreira Galinha, herdou a loja quepassou a ser gerida pelo seu irmão, José Marques, e por uma sobrinha, Zita Santos. “Ela Ela nemsequer precisava de vir aqui, porque confiava totalmente em nós”, refere hoje a sobrinha,que tem 55 anos.José Marques e a sobrinha Zita Santos à porta daCasa Galinha, que se mantém inalterada durante 55 anos.“Está tudo igual desdeessa altura, não se mexeu emnada. Nunca fizemos umaobra”, explicou Zita Santos. Hácerca de sete ou oito anos o tioquis fazer obras, mas a sobrinhainsistiu em manter tudocomo está. “Eu sou muito conservadorae também acha-va que não era por fazerobras que iríamos vendermais”, comentou.A maior parte dos materiaisutilizados ainda são os mesmos- a balança que está no balcãopara as gramas ou as balançasdecimais (uma para grandesquantidades e outra para pesosmenores), mas também umaferramenta de corte de pelesque terá mais de 100 anos e quefoi comprada em segunda mão.Em 2004 houve uma novidadena decoração da loja. Incentivadospelo discurso do então seleccionadornacional Scolari, colocaramà frente do balcão umabandeira nacional, que ainda semantém no lugar.DE SAPATEIRO ACOMERCIANTEJosé Marques, nascido em1930, trabalha na Casa Galinhadesde que esta abriu. CunhadoNa loja também se fazem furos nos cintos das calças José Marques na loja com dois clientes


Centrais2125 | Fevereiro | 2011peles e artigos para manutenção de calçadoJosé Marques com uma ferramenta de corte de peles que terá mais de 100 anos e quefoi comprada em segunda mão.de António Galinha, foi convidadoa vir trabalhar para as <strong>Caldas</strong>porque tinha experiênciacomo sapateiro em Freires (Benedita).Desde os 13 anos quese dedicava ao ofício de sapateiroe tinha por isso já algumaexperiência no ramo.O pai de José Marques era políciaem Angola, a então colóniaportuguesa para onde a mãe docomerciante nunca quis ir. “ElaElatinha medo de ir para lá e porisso acabámos por nuncamais saber nada dele”, recordouJosé Marques.Desde novo dedicou-se aossapatos, numa oficina em Freires,onde trabalhava com outrocunhado, acabando por se mudarpara as <strong>Caldas</strong> para responderao convite de António Galinhade quem ficou empregado.Nos primeiros anos, quandohavia muitos sapateiros, a lojateve um grande sucesso pois,para além dos das <strong>Caldas</strong>, vinhamabastecer-se à Casa Galinhapessoas de toda a regiãoOeste.José Marques nessa altura dedicavaalguns dias para sair àestrada como caixeiro-viajante,visitando várias centenas deoficinas, não só na região, masaté na zona da Grande Lisboa.“Quando fazia essa zonacostumava pernoitar numapensão em Vila Franca deXira”, recordou. As primeirasviagens fazia-as num Austin A40e depois foi preciso compraruma carrinha, da mesma marca,porque fazia entregas degrandes quantidades de material.“Eu chegava a ir duasvezes no mesmo dia à Bene-dita para entregar fardos decabedal”, salientou.Esses foram os tempos áureosda Casa Galinha, “apesar dehaver muito caloteiro”, masao longo dos anos os sapateirosforam desaparecendo. “Apare-ceram as fábricas e as pes-soas deixaram de quererCasa Galinha às nove da manhãmeter as mãos onde os ou-e fechava às 19h00. À noite iatros metiam os pés”, ironiza tratar dos porcos e nunca chegoua contratar nenhum funcio-José Marques.“Hoje são poucos os sapanáriopara o ajudar.teiros que existem nas Cal-Manteve a pecuária durantedas”, comentou Zita Santos, 26 anos, até que o negócio começoua dar prejuízo. Vendeu-amas segundo o seu tio chegarama ser uma centena. Alguns e com esse dinheiro comprou umdesses sapateiros caldenses, bar na Cidade Nova que é geridopor um dos seus filhos hácomo José Domingos, são clientesdesde sempre e mantêm-se cerca de 17 anos.em actividade. “O O melhor sa-José Martins reformou-se aospateiro das <strong>Caldas</strong> é o se-65 anos, mas não quis deixar anhor Abílio, um verdadeiroloja e todos os dias às nove daartista. Sabe restaurar tudomanhã está a abrir-lhe a porta.e faz artesanato em peles”,É ele também quem encerra oadiantou a comerciante. estabelecimento todos os diasAo longo do tempo tiveram às sete da tarde. Desde que foique se adaptar e começar a venderoutro tipo de artigos. apanha o autocarro que passacriado o Toma a sua sobrinha“Como quase não há sapa-em frente à Rodoviária às 18h20teiros, os nossos principaispara ir para casa. “Ainda bemclientes são as senhoras queque o meu tio continua aqui,procuram os nossos produ-porque sempre vai estandotos”, adiantou Zita Santos.entretido. Os homens nãoHá até clientes da zona de Lis-servem para ficar em casa”,boa que ao sábado de manhã gracejou a sua sobrinha.aproveitam uma visita às <strong>Caldas</strong> “Tenho amor a isto. Se fa-para comprar artigos que dizemlho um dia em vir cá parecenão encontrar em mais lado ne-que já não ando bem”, explicao comerciante.nhum, ou então que são muitomais baratos na Casa Galinha. Recentemente José Marquesvoltou a fazer pequenos serviçoscomo sapateiro. “Haviapessoas que pediam e comeceia colocar capas nos sa-patos”, explicou. Pedem-lhePELO MEIO, UMA PECUÁRIAtambém muitas vezes para fazermais um ou dois furos noscintos das calças.Há cerca de 30 anos, José Marquesestava descontente com asua vida financeira e decidiu arriscarnum outro negócio. “Ga-nhava pouco e comecei a termuitos filhos”, explicou. Dirigiu-seao Banco de Portugal naPraça da República e pediu umempréstimo de 50 contos (250euros). Com um ordenado na alturade 800 escudos (quatro euros)e sem nada em seu nome,teve de convencer o gerente earranjar dois fiadores para conseguiro empréstimo. Montouentão uma pecuária e conseguiupagar o empréstimo.Os dias de trabalho eram intermináveis.Abria a porta daZITA SANTOS TRABALHADESDE OS 13 ANOS NA LOJAZita Santos nasceu em 1953,na Benedita, dois anos antes daloja do seu tio António Galinhaabrir portas. Aos nove anos foimorar com os seus tios JoséMarques e António Galinha quea criaram. Antes disso, aindamorou com os seus pais em RioMaior, até terminar a quartaclasse.Zita Santos continua a pesar pregos como o fazia há 40 anos“Vinha sempre aqui às<strong>Caldas</strong> passar férias com osmeus quatro irmãos. Osmeus tios não tinham filhose a minha tia fez questão queeu, que era a mais velha, vi-esse morar com eles aosnove anos, mas continueisempre a relacionar-me bemcom os meus pais”, contouZita Santos.Logo nessa altura começou afrequentar a loja, mas apenaspara passar tempo. “Tanto eu,como outras pessoas que vinhampara aqui brincar ado-ravam mexer nas peles. Osnetos do meu tio tambémbrincaram todos aqui. As criançasrebolavam nos cou-ros”, recordou.Até ao dia do seu casamento,em 1977, Zita Santos morou semprecom os seus tios, junto aoTribunal das <strong>Caldas</strong>.Os tempos eram outros e ZitaSantos lembra-se que oito diasantes de se casar, a tia não adeixou ir com o actual maridocomer uma caldeirada a Peniche.Quando andou a estudar ànoite para fazer o curso comercial,na Escola Secundária RafaelBordalo Pinheiro, a sua tiatambém foi sempre muito rigorosa.“Eu saía daqui às sete eas aulas começavam às setee meia. Ia a correr para casa,jantava e depois ia para asaulas, que acabavam às22h50. Mas se eu não estives-se em casa às 11 horas, elaia à minha procura”, recorda-se.Ainda surgem algumas lágrimasquando Zita Santos se recordacomo a tia tinha sempre ojantar na mesa quando regressavado trabalho e precisava dese despachar para a escola. “Elaé que me criou. Os meus tiostrataram sempre de mim”,conta, emocionada.Zita Santos também recordaque começou a trabalhar oficialmentena loja a 1 de Outubrode 1966, tinha então 13 anos.“Ainda era pequenita”, comentou,agora mais bem-disposta.A comerciante lembra-setambém quando os sapateirosfaziam fila à segunda-feira paracomprarem o material de queprecisavam para o seu ofício.“Tinha 13 anos e ficava mui-to irritada porque o meu tiopunha-me a pesar os peque-nos pregos e depois ralhavacomigo a dizer que eu nãosabia pesar. Mas tenho muitassaudades desses tem-pos”, disse.A comerciante é casada comum empresário que tem uma fábricade sapatos na Benedita,lamentando-se que tambémesse negócio esteja a sofrermuito com a crise.Quanto à Casa Galinha, “sósóconseguimos manter a lojaaberta porque a renda é mui-to barata. Isto já nem sequerdá para tirarmos um orde-nado daqui”, lamenta.A primeira renda foi de 450escudos [2,2 euros] e actualmentepagam 150 euros. Semquererem adiantar números emrelação às vendas, vão dizendoque cada vez vendem menos. Éque, apesar de sempre irem tendovários clientes ao longo dodia, são sempre compras de baixovalor.DESCENDENTES NÃOQUEREM CONTINUARNEGÓCIOJosé Marques tem quatro filhose oito netos. Nenhum delesestá interessado em um dia continuaro ofício que o ocupa hámais de meio século.Zita Santos tem um filho com17 anos que está no 12º ano, mastambém não tem nenhum inte-resse em poder vir a trabalharna Casa Galinha.O projecto de regeneração urbanada Câmara das <strong>Caldas</strong> prevêque a rua Leão Azedo passea ser pedonal. Tio e sobrinhatêm opiniões diferentes sobre oque isso pode fazer pelo negóciodeles.Zita Santos teme que o calcetamentoda rua afaste aindamais as pessoas. “Tenho muitoreceio, porque muitas ve-zes os clientes vêm aqui decarro de propósito. Ultima-mente nem pessoas se vêemna rua”, opinou. Na sua opinião,desde que construíram o CCC eo prédio ao lado, acabando como estacionamento à superfícieexistente, as pessoas deixaramde passar na rua do Jardim.De qualquer forma, tem esperançaque as obras sejam benéficaspara o comércio.Para José Marques será melhorque se encerre a rua ao trânsito.“Isto agora é só carrospor todo o lado”, critica, esperançadoque a circulação depessoas venha a aumentar depoisdas obras feitas.Pedro Antunespantunes@gazetacaldas.com<strong>Cronologia</strong>1913 – Nasce António Galinha,fundador da loja1930 - Nasce José MariaMarques1953 – Nasce Zita Santos1955 – É fundada a CasaGalinha na rua Leão Azedo1966 – Zita Santos começaa trabalhar na Casa Galinha1990 – Morre António Galinha,fundador da loja1997- Constituída a sociedadeirregular “Casa Galinhade José Maria Marques eMaria Zita Marques MateusSilva dos Santos”

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