CONEXÃO INTERNACIONALNOVOS RUMOS PARA REMEDIAÇÃODE ÁREAS CONTAMINADASJuliana G. Freitas, Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), BrasilMarcelo Sousa, Universidade de Waterloo, CanadáJason I. Gerhard, professor no Departamento de Engenharia Civil e Ambiental da Universidadede Western Ontario (London, Canada), lidera pesquisas na área de hidrogeologiaJason I. Gerhardde contaminantes, fluxo multifásico em meios porosos e engenharia para a sustentabilidade,indo da escala de poros até escala de campo. Seu grupo de pesquisa gerou resultados inovadores para contaminantesorgânicos em solos e rochas fraturadas. Com graduação em engenharia geológica, e mestrado e doutorado em engenhariacivil pela Queen’s University (Canadá), ele é co-inventor e pesquisador de uma nova tecnologia para remediação,baseada na combustão auto-sustentável de contaminantes. Jason estará no Brasil, em outubro, e será um dos palestrantesda “Darcy Lecture Series”, no dia 4. Mais informações no site: www.abas.org/darcylecture. Ele conversou com agente sobre o estado atual da remediação de áreas contaminadas e a sua percepção para onde estamos caminhando.Quais foram os principais avanços na remediação desolos e águas subterrâneas nas últimas décadas?Muitos avanços promissores aconteceram nas últimasdécadas. A pesquisa científica melhorou muito nossoconhecimento sobre fundamentos do comportamento decontaminantes em solos e rochas fraturadas. Nossa habilidadede simular o comportamento dos contaminantescom modelos matemáticos também levou a um melhorentendimento conceitual da contaminação em áreas contaminadas.Os modelos têm sido usados com sucessono projeto e otimização de sistemas de remediação. Avançosimpressionantes também foram feitos em diversastecnologias de remediação, principalmente aplicadas insitu,como oxidação química, tratamentos térmicos,surfactantes e biorremediação. As legislações ambientaistambém foram fortalecidas na maior parte dos países, oque resultou numa busca mais agressiva por soluçõesinovadoras pelos responsáveis. Além disso, financiamentotem sido disponibilizado para pesquisa, desenvolvimentoe teste piloto de novas tecnologias, que é um passofundamental antes que uma nova tecnologia possa seramplamente aceita num mercado conservador.Quais são os maiores desafios para a remediação desolos e águas subterrâneas? Quais são alguns mitoscomuns em relação à remediação?Muitos desafios ainda persistem. Muitos dos avanços naremediação foram feitos para contaminantes que são maisfáceis de tratar, como os contaminantes que não penetramo nível d’água, são muitos voláteis e facilmentedegradáveis, como a gasolina. No entanto, poucas opçõesexistem para os contaminantes mais tóxicos, mais estáveis,contaminantes densos que migram a grandes profundidades,resistentes a processos de transferência demassa para o ar ou água, e resistentes às reações biológicas– o que é um grande desafio para a pesquisa. Algunsexemplos são o creosoto, alguns hidrocarbonetos de petróleoe as bifenilaspolicloradas (PCBs). O segundo desafioé a complexidade do site, que frequentemente reduz aeficiência de uma técnica de remediação, tais comoheterogeneidade e a química de mistura de contaminantes.Um terceiro desafio são os contaminantes emergentes,como disruptores endócrinos, nanopartículas e compostosperfluorados. O quarto desafio é a transferência detecnologia e compartilhamento de conhecimento, de formaque a experiência e sucessos alcançados em lugaresdistantes sejam acessíveis e aplicáveis por todo o mundo.Um mito comum é que para uma área que apresente umageologia ou história complexa (como derramamento comvolume grande ou por longos períodos de tempo), umaúnica tecnologia será capaz de reduzir a contaminaçãoao ponto que a água se torne potável. A combinação detecnologias, ou “trem-de-tratamento”, e tecnologiasotimizadas para atuarem em conjunto com efeito máximoserão essenciais. Isso está sendo pesquisado por inúmerosgrupos ao redor do mundo. Por exemplo, eu e umgrupo de pesquisadores em Ontario, no Canadá, estamosdesenvolvendo um projeto de duração de seis anos, deUS$3 milhões, chamado INTEGRATE (InnovativeTechnologies for Groundwater Remediation), com foco nacombinação de tecnologias para a remediação de solose águas subterrâneas (http://integrate.utoronto.ca). Esseé também o foco de uma colaboração entre esse projetoe pesquisadores do Centro de Capacitação e Pesquisasem Meio Ambiente (CEPEMA) da Escola Politécnica daUniversidade de São Paulo (Poli-USP), chamado “SãoPaulo - Ontario: Soil and Water Remediation Consortium”.Quais são algumas tecnologias promissoras pararemediação?28 ÁGUA E MEIO AMBIENTE SUBTERRÂNEO SETEMBRO/OUTUBRO 2012
Antes do tratamentoDepois do tratamentoSondagens coletadas em área de estudo em escala piloto, emNew Jersey, com contaminação por alcatrãoUm dos desenvolvimentos mais excitantesé a nova tecnologia STAR (Self-SustainingTreatment for Active Remediation). STAR éuma técnica capaz de destruir completamentelíquidos orgânicos industriais altamenteresistentes, como creosoto e óleocru. A tecnologia se baseia no processode combustão latente auto-sustentável, queé a mesma reação que lentamente consomecarvão numa churrasqueira e gera calor.Os contaminantes oleosos no solo sãodestruídos e ao mesmo tempo geram aenergia para propagar a reação nasubsuperfície até que todos oscontaminantes sejam eliminados. Assim,tem um potencial de ser altamenteeficaz (destruição de mais de 99% damassa) e com custo relativamente baixo(já que somente uma pequena quantidadede energia é necessária para iniciaro processo). Atualmente, a tecnologiaSTAR está em estágio de testes piloto paraaplicações in-situ e ex-situ. Essa é uma daspoucas tecnologias completamente novasde pesquisas recentes. Mais informaçõesestão disponíveis no sitewww.siremlab.com/STAR.Quais serão as maiores mudanças nocampo da hidrogeologia no futuro?Certamente, nas próximas décadas, a avaliaçãoe a mitigação dos impactos dasmudanças climáticas nos recursos subterrâneosserão um dos principais focos. Amedida em que a água se torna mais escassa,a água subterrânea deve se tornarainda mais importante e a remediação, aconservação e a proteção serão mais importantes.Por outro lado, com a recessãoglobal, muitas nações devem reduzir osgastos e as empresas cortarão pesquisase desenvolvimento, criando novos desafiospara as pesquisas dos fundamentos científicose de novas tecnologias deremediação. É esperado que novas descobertase tecnologias surjam principalmentepor meio de uma forte colaboraçãointerdisciplinar entre áreas de conhecimentoaté então distantes; isso foi o queaconteceu para o desenvolvimento doSTAR, que surgiu de uma inesperadainteração entre a ciência de combustão ea hidrogeologia de contaminantes. Aintegração de estudos de contaminaçãoda subsuperfície, águas superficiais, mudançasclimáticas, modelos hidrológicosregionais e um melhor entendimento dasinterações entre águas superficiais e subterrâneascertamente nos permitirão entendermelhor as conexões dentro detodo o ciclo hidrológico.Você tem alguma sugestão para profissionaisno começo de carreira queatuam em águas subterrâneas?O mestrado está se tornando rapidamentea formação padrão nessa área. O escopoda área se expandiu tanto que umapós-graduação pode trazer muitas vantagens.É particularmente interessante desenvolverum trabalho de pós-graduação,pois desenvolve as habilidades de estabelecerhipóteses, testar com experimentosou modelos e elaborar artigos científicosque compartilhem suas descobertascom o mundo. Essa experiência e habilidadesnão necessariamente técnicas quesão desenvolvidas, como comunicaçãooral e escrita e capacidade de pensar criticamente,são fundamentais, mesmoque o seu futuro seja na indústria e nãona pesquisa. Além disso, procure umprograma acadêmico que seja amplo,que não se aprofunde somente emhidrogeologia. Muitos cenários deremediação envolvem um grande númerode disciplinas – como química,geografia, ciência do solo, física e muitasoutras – e, portanto, é vantajoso teralguma familiaridade com áreas fora dahidrogeologia. Alémdisso, também é vantajosocursar cursosfora das ciências puras,tais como direito,filosofia, ciências políticase letras. Tenhograduação em filosofia,que contribuiumuito para minha carreiraem engenharia,pois enfatiza a lógica,a ética e a habilidadede articular suasideias de uma formaconvincente.SETEMBRO/OUTUBRO 2012ÁGUA E MEIO AMBIENTE SUBTERRÂNEO 29