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Psicose - Robert Bloch

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Capítulo 4<br />

AO ENTRAR no escritório, Norman tremia. Acontecera muita coisa junta. Não podia trazer<br />

tudo engarrafado por mais tempo.<br />

Garrafa... Era o de que precisava: um trago. Tinha mentido à moça, naturalmente. Era<br />

verdade que a mãe não admitia alcool em casa — mas êle bebia. Guardava a garrafa no<br />

escritório. Havia ocasiões em que era preciso beber — embora seu estômago não suportasse o<br />

álcool, embora bastassem uns goles para ficar tonto. Havia ocasiões em que desejava<br />

embriagar-se...<br />

Lembrou-se de descer a veneziana e apagar a luz do letreiro. Pronto! Fechado para a noite.<br />

Descidas as venezianas, ninguém repararia na luz frouxa da lâmpada da escrivaninha.<br />

Ninguém o veria abrir a gaveta, puxar a garrafa, mãos trêmulas como as de uma criança<br />

agarrando a mamadeira. Ê hora de dar a mamadeira ao garôto...<br />

Empinou a garrafa. Bebeu. Fechando os olhos. O uísque queimava, e isso era bom. Para<br />

queimar a amargura. O uísque desceu garganta abaixo, foi explodir no estômago. Talvez mais<br />

um trago também queimasse aquela sensação de mêdo.<br />

Um êrro ter convidado a moça para cear na casa. Soubera-o no mesmo instante em que<br />

abrira a bôca, mas era tão bonita, parecia tão exausta e desamparada. Êle sabia o que era estar<br />

exausto e desamparado, sem ter a quem recorrer, ninguém que compreendesse. Só o que queria<br />

— só o que fêz — foi conversar com ela. Depois, a casa era sua, não era? Tanto quanto de sua<br />

mãe. Esta não tinha o direito de ditar leis, como fazia.<br />

Mesmo assim foi um êrro. A verdade é que nunca teria ousado, não fôsse estar furioso<br />

contra a mãe. Queria desafiá-la. E foi ruim.<br />

Mas fizera coisa ainda pior, além do convite à moça: fôra dizer à mãe que ia cear<br />

acompanhado. Marchara diretamente para dentro do quarto e anunciara, como se dissesse:<br />

Atreva-se a impedir!<br />

Não devia ter feito isso. A mãe já estava bastante alterada e teve um ataque de nervos. Foi<br />

num paroxismo de nervos que encarou a coisa e pôs-se a gritar:<br />

Se a trouxer aqui, mato-a! Mato-a! Mato essa cadela!<br />

Cadela. Não disse essa palavra, mas foi como se dissesse. Estava doente, muito doente.<br />

Talvez a moça tivesse razão. Talvez fôsse melhor interná-la. Estava de tal jeito que êle não a<br />

podia manobrar sozinho. Nem a si próprio. Que costumava ela dizer sôbre êsse assunto de<br />

“manobrar sòzinho”? Que era pecado. Que a gente ia para o inferno.<br />

O uísque, sim, queimava. Mais uma dose — a terceira... Como precisava! Precisava de<br />

uma porção de coisas. Também nisso a moça tinha razão. Aquilo não era vida. Não podia<br />

continuar assim indefinidamente.<br />

Sentar-se à mesa com a moça fôra uma provocação. Receara que a mãe fizesse uma cena.<br />

Depois que fechou à chave a porta do quarto dela, trancando-a lá dentro, ficou a imaginar se

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