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Eucaristia<br />
e apostolado
Cúpula da Basílica<br />
de São Pedro, Roma<br />
R. C. Branco<br />
Em sua essência,<br />
a Santa Igreja é<br />
totalmente imutável e<br />
incontaminada. Em meio às<br />
confusões, Ela é como<br />
uma coluna de brilhantes<br />
envolta pelas chamas de um<br />
incêndio. Podem as<br />
labaredas se elevar<br />
a qualquer altura,<br />
podem se expandir e se<br />
intensificar: pouco<br />
importa, a Igreja<br />
permanece de pé.<br />
As chamas não<br />
fazem senão<br />
iluminá-la...<br />
2
Sumário<br />
Eucaristia<br />
e apostolado<br />
Na capa, <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong><br />
em uma de suas<br />
conferências, na<br />
década de 80<br />
<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong><br />
<strong>Revista</strong> mensal de cultura católica, de<br />
propriedade da Editora Retornarei Ltda.<br />
CNPJ - 02.389.3<strong>79</strong>/0001-07<br />
INSC. - 115.227.674.110<br />
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EDITORIAL<br />
4 Ano da Eucaristia<br />
DATAS NA VIDA DE UM CRUZADO<br />
5 16 de outubro de 1993:<br />
Prestigioso lançamento<br />
DONA LUCILIA<br />
6 Ecos de Roma...<br />
ECO FIDELÍSSIMO DA IGREJA<br />
10 Rainha dos Corações<br />
14 Calendário litúrgico<br />
GESTA MARIAL DE UM VARÃO CATÓLICO<br />
16 O dia-a-dia no Movimento Católico<br />
DR. PLINIO COMENTA...<br />
22 Alegrai-vos no Senhor, ó justos!<br />
Preços da assinatura anual<br />
Outubro de 2004<br />
Comum . . . . . . . . . . . . . . R$ 75,00<br />
Colaborador . . . . . . . . . . R$ 110,00<br />
Propulsor . . . . . . . . . . . . . R$ 220,00<br />
Grande Propulsor . . . . . . R$ 370,00<br />
Exemplar avulso . . . . . . . R$ 10,00<br />
Serviço de Atendimento<br />
ao Assinante<br />
Tel./Fax: (11) 6236-1027<br />
O SANTO DO MÊS<br />
26 Santo Antônio Maria Claret,<br />
sacerdote fervoroso e pregador ardente<br />
LUZES DA CIVILIZAÇÃO CRISTÃ<br />
31 Hífen gaudioso<br />
ÚLTIMA PÁGINA<br />
36 À nossa espera...<br />
3
Editorial<br />
Ano da Eucaristia<br />
“N<br />
este mundo cada vez mais dominado pela busca do prazer terreno, há Alguém com A maiúsculo,<br />
eterno, Nosso Senhor Jesus Cristo, vivendo em todos os tabernáculos do Brasil e dos<br />
templos da Cristandade. Esse Alguém, que não percebemos com os sentidos da carne, existente<br />
sob as espécies eucarísticas, é o grande Apóstolo da época contemporânea, como o é de todas as<br />
eras.<br />
“E Ele multiplica as suas maravilhas: ao mesmo tempo em que a iniqüidade vai chegando ao seu auge,<br />
notamos frutos admiráveis da Sagrada Eucaristia, frutos da graça que dão no apostolado um resultado<br />
incomparável. Por toda parte vão se tornando mais numerosas as almas que, levadas por um anelo<br />
de perfeição absoluta, de ortodoxia completa, de obediência inteira à Igreja Católica, tudo abandonam e<br />
a tudo renunciam, dispostas a sofrer e a vencer tudo por amor a Jesus Cristo, presente na Sagrada Eucaristia.”<br />
Essas fervorosas palavras de <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> não poderiam ecoar em momento mais oportuno do que<br />
neste mês de outubro, marco inaugural do Ano da Eucaristia proclamado pelo Papa João Paulo II na<br />
passada solenidade de Corpus Christi. Inicia-se com o Congresso Eucarístico Internacional, na cidade<br />
de Guadalajara (México), e se estende até outubro de 2005, quando o Sínodo dos Bispos se reunirá<br />
no Vaticano, a fim de considerar o tema proposto pelo Pontífice: “A Eucaristia, fonte e ápice da vida<br />
e missão da Igreja”.<br />
Ao demonstrar seu contentamento em instituir esse ano especial, o Papa recordou que a “Santa<br />
Igreja vive da Eucaristia”, e que Nosso Senhor, “pão vivo descido do Céu, é o único capaz de saciar<br />
a fome de todo homem, em todo tempo e em todo lugar da Terra”. Verdade esta compreendida de<br />
forma profunda e ardorosa por <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong>, cuja entranhada devoção ao Sacramento do Altar apenas<br />
cresceu, ao longo de mais de 7 décadas de comunhões diárias. Era nesse convívio íntimo com o Coração<br />
Eucarístico de Jesus que <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> colhia forças para empreender sua gesta em favor da causa<br />
católica, e o mesmo recomendava aos seus discípulos:<br />
“Se para a vida interior de qualquer católico é indispensável a freqüência à Sagrada Mesa, quanto<br />
mais o será para um apóstolo que deve fazer consistir seu apostolado num transbordamento dessa vida<br />
interior! O zelo autêntico, baseado no desprendimento das coisas terrenas, só se alcança pela Eucaristia.<br />
O apóstolo é um reservatório cujas águas devem extravasar para beneficiarem a outros. Daí a necessidade<br />
de renová-las amiúde pela Comunhão. Além disso, a pessoa entregue às ações apostólicas se vê exposta<br />
a mil dificuldades, tentações e ocasiões perigosas. Só o alimento da Eucaristia poderá impedir que<br />
ela pereça.”<br />
À luz dos eloqüentes pensamentos de <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong>, devemos considerar com imensa alegria esse período<br />
de graças especiais que se abre para a Igreja no Ano da Eucaristia. Queira a Santíssima Virgem<br />
espargir sobre nós a abundância de suas bênçãos, auxiliando-nos a viver intensamente — conforme o<br />
desejo do Papa — este momento tão precioso da vida eclesial.<br />
DECLARAÇÃO: Conformando-nos com os decretos do Sumo Pontífice Urbano VIII, de 13 de março de 1625 e<br />
de 5 de junho de 1631, declaramos não querer antecipar o juízo da Santa Igreja no emprego de palavras ou<br />
na apreciação dos fatos edificantes publicados nesta revista. Em nossa intenção, os títulos elogiosos não têm<br />
outro sentido senão o ordinário, e em tudo nos submetemos, com filial amor, às decisões da Santa Igreja.<br />
4
DATAS NA VIDA DE UM CRUZADO<br />
16 de outubro de 1993<br />
Prestigioso lançamento<br />
N<br />
Edições do livro<br />
de <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong>,<br />
e as galerias<br />
Vitor Emanuel,<br />
em Milão<br />
essa data, era apresentado no Congresso<br />
da Associação Nobiliária da Europa,<br />
em Milão, Itália, na presença de<br />
personalidades de destaque desse continente, o<br />
livro Nobreza e elites tradicionais análogas, nas<br />
alocuções de Pio XII ao Patriciado e à Nobreza romana,<br />
obra magna de <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong>, contendo seus<br />
luminosos comentários aos célebres discursos do<br />
Papa Pio XII às famílias nobres de Roma.<br />
Esse último escrito de <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> veio a lume<br />
com cartas laudatórias de três Cardeais: Alfons<br />
Stickler, SDB, então Bibliotecário da Santa<br />
Romana Igreja; o Cardeal Silvio Oddi, Prefeito<br />
Emérito da Congregação do Clero, e o Cardeal<br />
Mario Luigi Ciappi, O.P., Teólogo da Casa<br />
Pontifícia. Não podendo comparecer ao ato, <strong>Dr</strong>.<br />
<strong>Plinio</strong> enviou aos ilustres participantes da assembléia<br />
uma mensagem da qual extraímos este<br />
trecho essencial:<br />
“Devemos ver nessas alocuções, sobretudo, o<br />
empenho do Pontífice em que cada qual oriente<br />
suas aspirações ideais em uníssono com ele, que<br />
cada qual trabalhe e concentre seus esforços principalmente<br />
em seu campo de ação imediato. Isto<br />
é, junto àqueles com quem convive no lar e no<br />
exercício da profissão. Se todos os católicos se ufanassem<br />
de se poderem sentir colaboradores do Papa<br />
nisto que é indiscutivelmente uma grande cruzada,<br />
quiçá a cruzada do século; se todos os católicos<br />
trabalhassem com afinco neste sentido, por<br />
cima de todas as organizações e de todas as coalizões,<br />
a vitória se afirmaria. A vitória das grandes<br />
causas não é assegurada tanto pelos grandes<br />
exércitos quanto pela ação individual das grandes<br />
multidões imbuídas de grandes ideais e dispostas a<br />
todos os sacrifícios para vencer. (...)<br />
“Parece-me importante realçá-lo, pois são excessivamente<br />
numerosos em nossos dias os que,<br />
para concentrarem toda a sua existência nos tranqüilos<br />
e despreocupados confins das conveniências<br />
pessoais, e se julgarem isentos de qualquer<br />
obrigação para com as grandes causas, alegam comodamente<br />
que a ação individual está reduzida à<br />
inocuidade, neste nosso século de enormes massas<br />
humanas aglomeradas nas concentrações urbanas<br />
de porte babilônico. (...)<br />
“Desejo acentuar isto, a fim de que a ninguém<br />
restasse pretexto para nada fazer, alegando sua impotência<br />
pessoal, as dimensões vermiculares de<br />
sua influência individual e, em conseqüência, a<br />
inutilidade de todo esforço seu. Que cada um, desde<br />
o maior até o menor, não poupe qualquer empenho<br />
na direção indicada pelo Pontífice, e a vitória<br />
estará assegurada.”<br />
<br />
V. Domingues<br />
5
DONA LUCILIA<br />
Ecos de Roma...<br />
Como vimos anteriormente,<br />
<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> se ausentara uma<br />
vez mais do convívio com Dª<br />
Lucilia, a fim de viajar para Roma,<br />
onde acompanharia as semanas iniciais<br />
do Concílio Vaticano II.<br />
Arcos-botantes de<br />
benquerença<br />
A Cidade Eterna se encontrava<br />
regurgitante de pessoas chegadas<br />
dos mais longínquos recantos do<br />
mundo. Era uma oportunidade única<br />
para alargar o âmbito de relações do<br />
jovem grupo dirigido por <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong>.<br />
Somando-se a isso os trabalhos diretamente<br />
concernentes aos debates<br />
do Concílio, não deveria sobrar<br />
muito tempo livre a ele para escrever<br />
cartas, pelo que sua correspondência<br />
nesse período é reduzida.<br />
Em sua primeira missiva, comenta<br />
a visita feita ao Capitólio romano,<br />
importante edifício, situado numa<br />
belíssima praça. O conjunto é, por<br />
sua perfeita harmonia e proporção,<br />
dos mais belos do mundo.<br />
Naturalmente, ao contemplar o<br />
magnífico cenário da Roma dos Papas,<br />
não poderia deixar de pensar<br />
em Dª Lucilia, cuja alma admirativa<br />
se encantaria com tudo aquilo.<br />
Se ela ali estivesse, percorreria devagarzinho<br />
aqueles espaços, apoiada<br />
no braço do “filhão”, e comentando,<br />
enlevada, este ou aquele aspecto —<br />
o belo azul do céu romano, os castelos<br />
de nuvens no horizonte a ressaltar<br />
a grandeza de milenares monumentos,<br />
o Tibre que vai serpeando<br />
vagarosamente por entre históricos<br />
edifícios e gloriosas ruínas — até<br />
que o declinar do sol lhe anunciasse<br />
o fim de tão agradável prosinha...<br />
Roma, 22-10-1962<br />
Luzinha querida do meu coração<br />
Estou esperando ansiosamente uma<br />
carta sua. Em todo o caso, já soube<br />
por carta de um rapaz do grupo, que<br />
a Sra. recebeu bem a notícia de minha<br />
viagem: graças a Deus!<br />
Aqui me tenho lembrado muito de<br />
minha Lú, e de sua conversinha que<br />
tantas saudades me faz, bem como de<br />
seus agrados, e de tudo o mais, de que<br />
sinto tantas saudades!<br />
Especialmente, lembro-me da Sra.<br />
quando vejo certas coisas bonitas, de<br />
que a Sra. gostaria muito. Ontem, por<br />
R. C. Branco<br />
6
exemplo, vi o Capitólio romano, que<br />
aliás já visitara em 1959. É estupendo.<br />
E logo pensei: como seria bom que a<br />
minha Lú do coração pudesse ver isto.<br />
Escreva-me logo, minha Querida,<br />
falando-me de tudo a seu respeito, e<br />
especialmente de sua saúde.<br />
Tenho trabalhado muito, comido<br />
muito, passeado um pouco em<br />
lugares lindos.<br />
Mando-lhe junto as cartas a<br />
Rosée e Maria Alice. Assim a<br />
Sra. ficará com um noticiário<br />
completo.<br />
Sou obrigado a interromper,<br />
pois são 16 hs. e às 17 terei uma<br />
reunião muito importante.<br />
Minha querida, minha boneca,<br />
minha marquezinha: cuidado<br />
com sua saúde, e reze pelo filhão<br />
que a quer muitíssimo, lhe<br />
envia milhões de beijos, e lhe pede<br />
respeitosamente a bênção.<br />
<strong>Plinio</strong><br />
Na carta seguinte, <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> manifesta<br />
como sempre uma qualidade<br />
sem a qual um autêntico convívio<br />
não se estabelece: a abnegação.<br />
Ao contemplar os cenários de Roma, <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> não<br />
poderia deixar de pensar em sua extremosa mãe,<br />
cuja alma admirativa se encantaria com todas<br />
aquelas belezas<br />
Vista da cidade de Roma com a cúpula de São Pedro;<br />
acima, Dona Lucilia no ínicio dos anos 60<br />
7
DONA LUCILIA<br />
Dir-se-ia que, nesse inefável relacionamento<br />
com Dª Lucilia, a renúncia<br />
de cada um a si próprio reverte generosamente<br />
em benefício do outro;<br />
tal como os arcos-botantes de uma<br />
catedral que por si sós não se sustentariam,<br />
mas, apoiando colossais paredes,<br />
formam com elas um todo esplendoroso.<br />
Manguinha de meu coração<br />
Minha caneta azul está quebrada.<br />
Por isto, lhe escrevo em vermelho.<br />
Gostei imenso de suas duas cartas.<br />
Tenho-as sobre meu criado mudo, para<br />
as ter sempre sob os olhos. E estou<br />
com umas saudades loucas de minha<br />
Mãezinha querida, de seus agrados, de<br />
sua presença, de sua prosinha, enfim<br />
dela, de tudo quanto é dela, e de tudo<br />
que a rodeia.<br />
Poucas coisas me poderiam alegrar<br />
tanto, quanto saber que a Sra. vai<br />
bem. Cuide-se: nada de melhor a Sra.<br />
poderia fazer por mim. Melhor do que<br />
isto, só uma coisa: rezar por mim...<br />
Não sei ainda bem o dia de minha<br />
volta, mas espero que não tarde.<br />
Escreva-me logo, meu amor do coração.<br />
Perdoe esta carta-relâmpago: estou<br />
ocupadíssimo.<br />
Com mil e mil beijos, todo o carinho<br />
do filho que a quer imensissimamente,<br />
e lhe pede com respeito as bênçãos<br />
e orações.<br />
P.<br />
Cartas laboriosamente<br />
confeccionadas<br />
Dois momentos da estada de <strong>Dr</strong>.<br />
<strong>Plinio</strong> em Roma: acima, a visita<br />
ao Capitólio; à direita, o jantar<br />
oferecido pelo Barão de Montagnac,<br />
no restaurante Ranieri (<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> é<br />
o 2º da direita para a esquerda)<br />
Dona Rosée continuava a dar notícias<br />
a seu irmão, por breves que<br />
fossem, do estado de Dª Lucilia. Em<br />
1º de novembro narrava ela de modo<br />
expressivo o quanto custava a sua<br />
mãe escrever aquelas comovedoras<br />
cartas:<br />
Você a esta altura já deve ter recebido<br />
pelos menos duas cartas das três<br />
que [mamãe] escreveu. Vou mandar<br />
agora outra que ela estava confeccionando<br />
laboriosamente ontem! (Acabo<br />
de passar em sua casa para pegar<br />
a carta e não está pronta. Segue amanhã.)<br />
No local que mais fazia recordar a<br />
Dª Lucilia a presença de seu querido<br />
filho, o escritório do apartamento,<br />
ela estabelecia muitas vezes com ele<br />
seu contato epistolar. Já com a vista<br />
enfraquecida, ocupava tardes inteiras,<br />
pacientemente debruçada sobre<br />
as folhas de papel, nas quais a pena<br />
ia traçando com lentidão e esmero<br />
cada letra, para formar palavras carregadas<br />
de afeto e doçura, que ainda<br />
hoje encantam quem as lê.<br />
Em resposta às duas cartas de <strong>Dr</strong>.<br />
<strong>Plinio</strong> acima transcritas, envia Dª<br />
Lucilia, com data de 1º de novembro,<br />
mais algumas linhas nas quais<br />
se percebe como estava preocupada<br />
com os grandes acontecimentos<br />
mundiais. Claro, sempre em primeiro<br />
lugar, por estar em causa a Igreja,<br />
sua atenção se voltava para o Concílio.<br />
8
São Paulo, 1º Novembro 1962<br />
<strong>Plinio</strong> tão querido de meu coração!<br />
Parece-me estar tão, tão longe o dia<br />
de tua volta para os meus braços! (...)<br />
Esta é a terceira carta que te escrevo.<br />
Mandei a segunda com a de Rosée<br />
e esta também vai em outra de Rosée.<br />
Espero em Deus que já estejas mais<br />
descansado, com bom apetite e cuidado<br />
com as perturbações de estômago!!<br />
Não repares na minha letra, pois<br />
estou com reumatismo nos pulsos!<br />
Com muitas saudades, beija-te e<br />
abraça-te muito, a tua velha Manguinha.<br />
Em 4 de novembro Dona Rosée<br />
escrevia a seu irmão, enviando uma<br />
rápida mas boa notícia sobre Dª Lucilia:<br />
Mamãe, graças a Deus, sempre ótima.<br />
Como o frio passou, até o reumatismo<br />
melhorou. Não lhe tem faltado<br />
companhia, mas naturalmente sonha<br />
com sua volta.<br />
“Se for da vontade de<br />
Deus... que se faça!”<br />
Em 10 de novembro de 1962, com<br />
a mente posta em Roma, Dª Luci-<br />
lia iniciou nova carta, na qual deixou<br />
falar seu coração, transbordante<br />
de desvelo materno e de saudades,<br />
cujas intuições a propósito do<br />
regresso de seu filho não seriam desmentidas:<br />
Filhão querido de meu coração!<br />
Você não estará comendo um pouco<br />
demais nestes excelentes hotéis? —<br />
Não há o que me tire da cabeça, mas<br />
prevejo que ficarás por aí até o fim do<br />
Concílio e assim passarão em Roma o<br />
grande dia 13 de Dezembro — nosso<br />
grande dia!!! Será possível?<br />
Estou te escrevendo às pressas, por<br />
isso deixo-te sem te dizer a falta enorme<br />
que me fazes!...<br />
Chegue bem forte, sempre bom para<br />
a manguinha e até outra carta!!<br />
Que Deus e Nossa Senhora te abençoem<br />
— Com todo o afeto te faz o<br />
mesmo, a mãe que te tem no coração,<br />
Lucilia<br />
Mais uma vez, pela escassez de<br />
correspondência de <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong>, pode-se<br />
deduzir como seu tempo estava<br />
tomado por intensa atividade.<br />
A carta seguinte de Dª Lucilia,<br />
inacabada, é um carinhoso queixume<br />
por essa “imperdoável” falta:<br />
São Paulo — 19-11-962<br />
“<strong>Plinio</strong>n”, meu coração, meu filho<br />
querido!<br />
Estava tão aflita por falta de notícias<br />
tuas, quando um dos moços do<br />
segundo andar entregou a D. Carlota<br />
uma carta tua para me ser entregue.<br />
Radiante abro o envelope e vejo que<br />
não havia senão belos postais, para<br />
Yayá, os Languendoncks, a Zili e Nestor,<br />
e para mim... nenhuma palavra.<br />
Como sabes vivo neste momento<br />
com o coração preso em Roma... recebo<br />
a carta... e nem um beijo, e nenhum<br />
abraço para mim...<br />
[O que segue foi escrito por Dona<br />
Rosée]<br />
Mamãe não acabou a carta e como<br />
estou com pressa vai assim mesmo.<br />
Muitos beijos e bênçãos de tua<br />
mãe,<br />
Lucilia<br />
A grande expectativa pela chegada<br />
de missivas vindas de Roma foi<br />
amenizada por uma fotografia publicada<br />
na Folha de S. Paulo, na qual<br />
Dª Lucilia pôde rever a fisionomia<br />
de seu “filhão”, o que a levou a escrever<br />
novamente. Não se pode deixar<br />
de notar a despretensão de seu<br />
comentário. Nenhuma ponta de orgulho,<br />
nenhuma euforia pela honra<br />
de que ele fora objeto. Após referir-se<br />
à notícia de jornal, seus dizeres<br />
continuam serenos, tratando de assuntos<br />
caseiros, entre os quais ocupa<br />
sempre primeiro lugar seu amor entranhado<br />
pelo filho.<br />
São Paulo — 22-11-1962<br />
Filho tão e tão querido!!<br />
Pelo que vejo, você ver-se-á obrigado<br />
a passar aí o dia 13 de Dezembro,<br />
dia de teus anos! — Sinto muito, mas<br />
se for da vontade de Deus... que se faça!<br />
Sinto muito, mas que fazer? — O<br />
Castilho enviou-me ontem dois números<br />
da Folha de S. Paulo que reproduzia<br />
a fotografia de um grupo de amigos<br />
do Barão de Montagnac que lhes<br />
ofereceu um jantar honroso com a tua<br />
presença no restaurant “Raniere de<br />
Roma”. Vê se me escreves um pouquinho<br />
mais... sim?<br />
Rosée tem me feito excelente companhia,<br />
e Maria Alice também, mas<br />
sempre às voltas com médicos, exames,<br />
jantares, em sua casa e para fora...<br />
isso cansa tanto! Yayá nas folgas<br />
do jogo vem sempre, às vezes para jantar.<br />
Dora e as meninas têm vindo menos<br />
com o avô doente!<br />
Você recebeu as cartas que escrevi<br />
na semana passada para você?<br />
Não tenho coragem de deixar de te<br />
escrever porque me parece que é te deixar<br />
um pouco mais longe!<br />
Recomenda-me aos teus amigos.<br />
Com minhas bênçãos envio-te muitos<br />
abraços, muitos e muitos beijos da<br />
tua “manguinha” que tanto te quer,<br />
Lucilia<br />
(Transcrito, com adaptações, da obra<br />
“Dona Lucilia”, de João Clá Dias)<br />
9
ECO FIDELÍSSIMO DA IGREJA<br />
Rainha dos Corações<br />
O<br />
reinado de Jesus Cristo nas almas, afirma São Luís Maria Grignion de<br />
Montfort, só será efetivo quando Nossa Senhora reinar de maneira<br />
plena nos corações dos homens. Com palavras pervadidas de veneração,<br />
<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> nos mostrará as grandezas das virtudes da Santa Virgem Maria<br />
e o altíssimo mérito que alcançou, dando-Lhe o direito, outorgado por seu<br />
Divino Filho, de exercer esse maternal e compassivo império sobre a vontade<br />
humana.<br />
Supunham os antigos — como<br />
ainda hoje o fazem certas pessoas<br />
sem instrução especial —<br />
que o pensamento era elaborado pelos<br />
miolos, os quais seriam, portanto,<br />
a fábrica das idéias. Eles não tomavam<br />
em consideração o papel espiritual<br />
da alma, determinante na gênese<br />
dos raciocínios. Ademais, achavam<br />
que os atos de vontade se formavam<br />
no coração, passando este a<br />
ser o símbolo das volições da criatura<br />
humana.<br />
Soberana da vontade<br />
dos homens<br />
Com base nessa última concepção,<br />
surgiu o culto aos corações de<br />
Jesus e de Maria, que é a devoção à<br />
vontade santíssima de Nosso Senhor<br />
e de Nossa Senhora.<br />
Por sua vez, a Mãe de Deus se torna<br />
Rainha dos Corações ao ser venerada<br />
como a soberana da vontade de<br />
todos os homens. Tal domínio devese<br />
entender, não como uma violação<br />
da liberdade das pessoas, mas pelo<br />
fato de Nossa Senhora nos obter e<br />
distribuir uma abundância de graças<br />
que nos induzem, atraem, com supremo<br />
agrado, doçura e clareza para<br />
o que Ela deseja de bom para nós.<br />
Assim, é através da celestial influência<br />
dessas graças que Maria nos<br />
aparece como Rainha de todos os<br />
corações.<br />
Em seu Tratado da Verdadeira Devoção<br />
à Santíssima Virgem, São Luís<br />
Grignion de Montfort escreve:<br />
“Maria é a Rainha do Céu e da Terra,<br />
pela graça, como Jesus é o Rei por<br />
natureza e conquista.”<br />
Ou seja, Nosso Senhor é o Rei do<br />
universo por natureza, pois, sendo<br />
Homem-Deus, sua essência O constitui<br />
Monarca de toda a criação. Já<br />
Nossa Senhora é Rainha, não por<br />
natureza, mas pela graça recebida de<br />
Deus. Rei também é Jesus, por conquista.<br />
Com sua Paixão e Morte redimiu<br />
o gênero humano e alcançou<br />
para Si a realeza sobre o Céu e a Terra.<br />
Continua São Luís:<br />
“Ora, como o reino de Jesus Cristo<br />
compreende principalmente o coração<br />
ou o interior do homem, conforme<br />
a palavra: ‘O reino de Deus está<br />
no meio de vós’ (Lc 17, 21)...”<br />
“No meio de vós”, quer dizer, sobre<br />
os vossos corações.<br />
“...o reino da Santíssima Virgem está<br />
principalmente no interior do homem,<br />
isto é, em sua alma, e é principalmente<br />
nas almas que Ela é mais<br />
glorificada em seu Filho, do que em<br />
todas as criaturas visíveis, e podemos<br />
chamá-La com os santos a Rainha<br />
dos corações” (nº 38).<br />
Aos pés da Cruz, última<br />
troca de olhares<br />
Essas verdades se prestam a algumas<br />
considerações.<br />
Imaginemos, por exemplo, uma<br />
pessoa na ilha Fernando de Noronha.<br />
Esse território é uma espécie de<br />
gigantesco navio parado, com suas<br />
âncoras agarradas ao fundo do oceano.<br />
A partir dessa posição maravilhosa,<br />
o visitante contempla o mar, regalando-se<br />
com aquele esplendor e<br />
se entusiasmando: “Como isto é belo!”<br />
Se for piedoso e amar Nossa Senhora,<br />
ele deve ter o hábito de reportar<br />
à Santíssima Virgem tudo<br />
quanto pensa, e dizer: “Como será o<br />
10
Por sua celestial<br />
influência na distribuição<br />
das graças divinas, Maria<br />
nos aparece como a<br />
Rainha dos Corações<br />
Nossa Senhora<br />
do Brasil<br />
T. Ring<br />
11
ECO FIDELÍSSIMO DA IGREJA<br />
Imaculado Coração de Maria, imensamente<br />
maior que todo esse panorama,<br />
não pelo tamanho físico, mas<br />
pelo valor, etc.”. E podem vir à sua<br />
mente outras cogitações muito boas<br />
sobre a extensão e a qualidade dos<br />
predicados de Nossa Senhora.<br />
Para compreendermos como o<br />
mar é uma vil gota d’água em comparação<br />
com a grandeza da alma de<br />
Maria, basta considerarmos a Mãe<br />
de Deus durante a Paixão. Seu sofrimento<br />
ao encontrar Nosso Senhor<br />
Jesus Cristo carregando a Cruz é indizível!<br />
Ela viu o divino Filho injustamente<br />
posto naquela situação, tratado<br />
de modo brutal por uma algaravia<br />
de gente péssima, aproximouse<br />
d’Ele e O abraçou. Esse gesto<br />
não significava apenas um consolo,<br />
mas também uma exaltação, como<br />
se Lhe dissesse: “Meu Filho, Eu vos<br />
louvo por estardes padecendo assim<br />
pela humanidade, para a glória de<br />
Deus!”<br />
Por quê? Porque é glorioso para<br />
Deus ter o reino das almas, e Jesus<br />
o estava conquistando ao redimir<br />
todas as almas criadas, vertendo por<br />
elas seu sangue preciosíssimo.<br />
Nossa Senhora consentiu nesse<br />
holocausto de Jesus, louvou-O e<br />
subiram juntos ao Calvário. A meu<br />
ver, a cena mais empolgante ali passada<br />
foi o último olhar de Nosso Senhor,<br />
indiscutivelmente dirigido à<br />
sua Mãe. E Ela O fitava nesse momento,<br />
pois tenho para mim que,<br />
durante todo o tempo junto<br />
à Cruz, Maria Santíssima<br />
não afastou seus olhos<br />
dos de seu Filho. Nessa<br />
suprema troca de<br />
olhares, Maria percebeu,<br />
notando<br />
o sofrimento<br />
extremo de Jesus, que a derradeira<br />
hora se aproximava.<br />
Nosso Senhor então disse aquelas<br />
palavras de despedida a Ela e a São<br />
João: “Filho, eis aí tua Mãe; Mãe, eis<br />
aí teu filho...”<br />
Co-redentora do<br />
gênero humano<br />
É oportuno recordar aqui o ensinamento<br />
da Tradição católica, segundo<br />
o qual o Padre Eterno, ao dispor<br />
que Cristo deveria morrer como<br />
vítima de expiação pelos nossos pecados,<br />
desejou para isso o consentimento<br />
da Santíssima Virgem. Claro<br />
está, absolutamente falando, não<br />
havia necessidade dessa anuência da<br />
parte de Nossa Senhora para que<br />
Deus Pai levasse a efeito seus desígnios<br />
sobre a Redenção dos homens.<br />
Pensemos, porém, cada um em<br />
nossa própria mãe, diante dessa pergunta:<br />
“A senhora quer entregar o<br />
seu filho, fulano de tal, para<br />
ser vilipendiado, perseguido,<br />
desprezado e odiado<br />
pelo povo, flagelado,<br />
coroado de espinhos, e<br />
em seguida arrastar uma<br />
cruz até o Calvário<br />
e aí ser<br />
S. Hollmann<br />
Rainha do Céu e da Terra, o império<br />
de Maria sobre os corações é<br />
incomparavelmente mais precioso que<br />
seu domínio sobre o resto do universo<br />
12
morto de modo atroz?”. Supérfluo<br />
dizer que ela não quereria! Nenhuma<br />
mãe deseja semelhante sorte para<br />
seu filho.<br />
Entretanto, a Santíssima<br />
Virgem, ciente de que deveria<br />
oferecer Jesus em holocausto<br />
para a salvação dos<br />
homens, não hesita um só<br />
instante, e se inclina<br />
à superior vontade<br />
divina. Por<br />
essa razão Ela sofreu espiritualmente<br />
uma dor tão acerba que, de modo<br />
figurativo, compara-se à ferida<br />
causada por um gládio que traspassou<br />
seu Coração. A iconografia católica<br />
perpetuou a lembrança deste<br />
padecimento da Virgem Santíssima,<br />
através da imagem de Nossa Senhora<br />
das Dores, venerada em inúmeras<br />
igrejas do mundo.<br />
Esse sacrifício participativo de<br />
Maria na Paixão de Jesus, o consentimento<br />
d’Ela em que o Salvador fosse<br />
imolado de forma tão cruel e dilacerante<br />
pela remissão de nossos pecados,<br />
os méritos desse sofrimento<br />
indizível da Virgem unidos aos méritos<br />
infinitos do martírio de Jesus, tudo<br />
isso granjeou-Lhe o título de Coredentora<br />
do gênero humano. Junto<br />
com Nosso Senhor, Ela abriu para<br />
nós as portas do Céu e nos alcançou<br />
a vida da graça. Tornou-se,<br />
Coroação de<br />
Nossa Senhora,<br />
Catedral de<br />
Reims (França)<br />
outrossim, digna de possuir o domínio<br />
de todos os corações.<br />
“Sede Rainha de minha<br />
alma, para eu ser<br />
inteiramente vosso”<br />
Compreendamos bem quão augusto<br />
é esse império sobre a vontade<br />
dos homens. Imaginemos o indivíduo<br />
mais inculto, mais tosco de sentimentos<br />
e de disposições mais vis<br />
que possa haver. Nossa Senhora ser<br />
a Rainha do coração dele representa<br />
uma grandeza incomparavelmente<br />
maior do que imperar sobre os mares,<br />
as constelações, os planetas e o<br />
universo inteiro criado! Tal é o valor<br />
de uma alma, ainda que a do último<br />
dos homens. Que dizer, então, do ser<br />
Ela soberana de todas as almas?!<br />
Reitero o que já tive oportunidade<br />
de afirmar: essa realeza de Maria<br />
é voltada de modo exclusivo para<br />
nos fazer o bem, para nos atrair para<br />
a prática da virtude, para nos conduzir<br />
à santidade a que somos chamados.<br />
É um poder que nos revela a<br />
sua onipotência suplicante em nosso<br />
favor, enchendo-nos de consolação e<br />
confiança no seu infatigável auxílio.<br />
Assim, imbuídos dessa verdade admirável,<br />
dirijamos a Nossa Senhora este<br />
filial pedido: “Minha Mãe, Vós sois<br />
Rainha de todas as almas, mesmo<br />
das mais duras e empedernidas,<br />
desejosas contudo de se abrirem<br />
à vossa misericórdia. Peço-Vos,<br />
pois, sede Rainha de minha alma,<br />
quebrai nela os rochedos<br />
de maldade, as resistências abjetas<br />
que de Vós me separam. Dissolvei,<br />
por um ato de vosso império,<br />
as paixões desordenadas,<br />
as volições péssimas,<br />
os restos dos meus pecados<br />
passados que tenham<br />
permanecido no meu íntimo.<br />
Limpai-me, ó minha<br />
Mãe e Rainha, para que<br />
eu seja inteiramente vosso.<br />
Amém.” <br />
13
CALENDÁRIO LITÚRGICO<br />
1. Santa Teresinha do Menino<br />
Jesus e da Sagrada Face, Virgem e<br />
Doutora da Igreja, séc. XIX. Chamada<br />
a uma extraordinária união<br />
mística com Nosso Senhor Jesus<br />
Cristo, fez-se carmelita aos 15 anos,<br />
em Lisieux (França). No claustro,<br />
trilhou célere as vias da santidade,<br />
tornando-se modelo de serena<br />
abnegação diante dos sofrimentos<br />
que a Providência permite se abatam<br />
sobre o homem. Movida por<br />
sua ardente caridade, entregou-se<br />
como “vítima expiatória ao Amor<br />
misericordioso”, e logo viu aceito o<br />
seu oferecimento. Consumida pelos<br />
padecimentos de uma inexorável<br />
tuberculose, rendeu sua alma ao<br />
Criador, quando ainda não completara<br />
24 anos de idade.<br />
2. Santos Anjos da Guarda.<br />
3. 27º Domingo do Tempo Comum.<br />
Bem-aventurados André de Soveral,<br />
Ambrósio Francisco, Presbíteros;<br />
e 28 companheiros leigos —<br />
Protomártires do Brasil, séc. XVII.<br />
4. São Francisco de Assis, Religioso,<br />
sécs. XII-XIII. Durante grave<br />
enfermidade que o acometeu<br />
na sua juventude, Francisco foi tocado<br />
pela graça divina, compreendendo<br />
como se deixara levar pelas<br />
coisas transitórias desta vida,<br />
em detrimento das verdadeiras riquezas<br />
da bem-aventurança eterna.<br />
Renunciou a tudo, para se consagrar<br />
a uma existência pautada pelos<br />
preceitos e conselhos do Evangelho,<br />
em especial a pobreza. Fundou<br />
a Ordem dos Frades Menores<br />
(os franciscanos), cujo apostolado<br />
e espiritualidade a transformaram<br />
numa das grandes glórias da Igreja<br />
em todos os tempos. Faleceu em 3<br />
de outubro de 1226, e até hoje o inconfundível<br />
aroma de sua santidade<br />
se faz sentir na região de Assis.<br />
É o Patrono da Itália.<br />
5. São Benedito, o Negro, Religioso,<br />
séc.XVI. Nasceu na Sicília,<br />
Itália, foi eremita no Monte San Pellegrino,<br />
e depois franciscano, como<br />
irmão leigo. Morreu em 1589, em<br />
Palermo.<br />
Santa Faustina Kowalska, Religiosa,<br />
séc. XX. Polonesa, religiosa<br />
das Irmãs da Bem-Aventurada Virgem<br />
Maria da Misericórdia. Recebeu<br />
visões de Nosso Senhor, quem<br />
lhe encomendou a difusão do conhecimento<br />
da Divina Misericórdia.<br />
Faleceu em 5 de outubro de<br />
1938, e foi canonizada por João Paulo<br />
II em abril de 2000.<br />
Santa Teresa de Jesus<br />
São Daniel, Religioso e Mártir,<br />
séc. XIII. Franciscano, decapitado<br />
em Ceuta, em 1227.<br />
12. Nossa Senhora da Conceição<br />
Aparecida, Padroeira do Brasil.<br />
Neste ano se celebra o Centenário<br />
da Coroação Canônica da milagrosa<br />
imagem.<br />
13. São Rômulo, Mártir, séc I.<br />
Foi mordomo do Imperador Trajano,<br />
e por ter mostrado horror às<br />
crueldades contra os cristãos, padeceu<br />
ele próprio por Cristo.<br />
14. São Calixto I, Papa e Mártir,<br />
séc. III.<br />
São Francisco de Assis<br />
6. São Bruno, Presbítero e Religioso,<br />
séc. XII. Fundador da Ordem<br />
dos Cartuxos.<br />
7. Nossa Senhora do Rosário.<br />
8. Santa Pelágia, Virgem e Mártir,<br />
séc. III.<br />
9. São Dionísio, Bispo, e companheiros<br />
— Mártires, séc. III<br />
10. 28º Domingo do Tempo Comum.<br />
15. Santa Teresa de Jesus, Virgem<br />
e Doutora da Igreja, séc. XVI.<br />
Sem dúvida uma das maiores figuras<br />
femininas a reluzir no firmamento<br />
católico. Nascida em Ávila,<br />
cedo manifestou o desejo ardente<br />
de servir a Nosso Senhor Jesus<br />
Cristo, de Quem se tornaria Esposa<br />
carmelita. Com seu zelo incomparável<br />
e firme ideal de perfeição<br />
empreendeu a reforma do Carmelo,<br />
fundando diversos conventos em<br />
toda a Espanha. Faleceu em 1582, e<br />
14
seu coração transverberado até hoje<br />
se acha exposto à veneração dos<br />
fiéis no Convento de Alba de Tormes.<br />
16. Santa Margarida Maria Alacoque,<br />
Virgem, séc. XVII.<br />
17. 29º Domingo do Tempo Comum.<br />
Santo Inácio de Antioquia, Bispo<br />
e Mártir, sécs. I-II. Sucessor de<br />
São Pedro como Bispo de Antioquia,<br />
sofreu o martírio em Roma,<br />
sob Trajano, no ano de 107.<br />
18. São Lucas, Evangelista, séc. I.<br />
Companheiro de São Paulo em suas<br />
viagens, que o chama “médico querido”<br />
(Col 14, 4), foi filho de pais<br />
pagãos e um dos primeiros gentios<br />
a se converter. Autor do terceiro<br />
Evangelho e também dos Atos dos<br />
Apóstolos. Artista, tornou-se o patrono<br />
dos profissionais da medicina,<br />
dos cirurgiões e pintores. Seus<br />
restos se veneram em Pádua (Itália).<br />
19. São João de Brébeuf, São<br />
Isaac Jogues, Presbíteros, e companheiros<br />
— Mártires, séc. XVII.<br />
Missionários jesuítas, martirizados<br />
no Canadá pelos índios iroquis.<br />
São Paulo da Cruz, Presbítero,<br />
sécs. XVII-XVIII. Italiano, fundou<br />
os Clérigos Descalços da Santa<br />
Cruz e Paixão de Nosso Senhor<br />
Jesus Cristo, mais conhecidos como<br />
Passionistas.<br />
20. Santa Maria Bertilla Boscardin,<br />
Virgem, séc. XX.<br />
21. Santo Hilarião, Eremita,<br />
sécs. III-IV.<br />
22. São Lupêncio, Abade, séc.<br />
VII.<br />
* OUTUBRO *<br />
Beato Frei Galvão<br />
23. São João de Capistrano,<br />
Presbítero, sécs. XIV-XV.<br />
24. 30º Domingo do Tempo Comum.<br />
Santo Antônio Maria Claret,<br />
Bispo, séc. XIX. Ver artigo na página<br />
26.<br />
25. Bem-aventurado Frei Antônio<br />
de Sant’Ana Galvão, Religioso,<br />
séc. XVIII-XIX. Brasileiro de Guaratinguetá<br />
(São Paulo), tornou-se<br />
franciscano e fundou o Mosteiro da<br />
Luz, habitado pelas freiras Concepcionistas,<br />
na metrópole paulistana.<br />
Varão de insigne piedade, distinguiu-se<br />
por sua entranhada devoção<br />
à Santíssima Virgem, e ainda em vida<br />
era venerado pela excelência de<br />
suas virtudes. Faleceu em 1822, sendo<br />
beatificado em 1998. Seus restos<br />
mortais se conservam na capela do<br />
Mosteiro da Luz, e muitos milagres<br />
são atribuídos à sua intercessão.<br />
26. São Luciano, Mártir, séc. III.<br />
27. Santo Evaristo, Papa e Mártir,<br />
séc. I-II. Foi o quarto sucessor<br />
de São Pedro.<br />
28. São Simão e São Judas Tadeu,<br />
Apóstolos. Segundo a Tradição,<br />
os dois pregaram juntos na<br />
Pérsia. Acredita-se que Judas Tadeu,<br />
irmão de Tiago o Menor, e primo<br />
de Nosso Senhor, era o esposo<br />
das Bodas de Caná. O parentesco<br />
com Jesus explicaria a presença<br />
de Maria Santíssima e seu Filho<br />
naquele banquete de casamento.<br />
São Judas tornou-se um dos Santos<br />
mais populares, freqüentemente invocado<br />
na solução de dificuldades e<br />
na obtenção de grandes favores para<br />
os seus devotos.<br />
29. Santo Honorato, Bispo de<br />
Vercelli (Itália), sécs. IV-V.<br />
30. Santos Cláudio, Vitor e Lupércio,<br />
séc. IV. Espanhóis, filhos<br />
de São Marcelo, o Soldado, e soldados<br />
eles próprios, morreram em<br />
León, sob Diocleciano, em 303. O<br />
pai morreu no dia 30 de outubro de<br />
298, no Marrocos.<br />
31. 31º Domingo do Tempo Comum.<br />
São Wolfgang, Bispo, séc. X. Bispo<br />
de Ratisbona (hoje Regensburg,<br />
Alemanha).<br />
São<br />
Lucas
GESTA MARIAL DE UM VARÃO CATÓLICO<br />
O dia-a-dia no<br />
Movimento Católico<br />
Após termos conhecido o ambiente social no qual <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> começou<br />
a exercer seu apostolado, penetremos no quotidiano de sua atuação<br />
no Movimento Católico e no relacionamento que mantinha com os membros<br />
das diversas associações religiosas.<br />
Em anterior ocasião, evoquei<br />
o ambiente sobrenatural<br />
que pairava nos edifícios sagrados,<br />
influenciando de forma profunda<br />
as almas.<br />
Harmonia entre as<br />
congregações religiosas<br />
Esta ação da graça tinha como resultado<br />
que entre todos os fiéis, participantes<br />
da vida interna da Igreja<br />
— não só quando se encontravam<br />
no templo, mas nas sedes das associações<br />
religiosas, ou mesmo na rua<br />
e se tratavam enquanto membros<br />
16
A vida diária no movimento<br />
católico era cercada de cortesia<br />
e benquerença entre as<br />
diversas entidades religiosas<br />
<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong>, jovem e influente<br />
Congregado Mariano; na página<br />
anterior, <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> (sentado, o<br />
3º da direita para a esquerda)<br />
com outros membros de<br />
instituições religiosas, e<br />
círculo de estudos numa<br />
associação católica<br />
17
GESTA MARIAL DE UM VARÃO CATÓLICO<br />
dessas entidades — havia concórdia,<br />
harmonia e respeito extraordinários.<br />
Demonstrava-se, na verdade, uma<br />
gentileza e uma generosidade das<br />
quais hoje não se tem idéia.<br />
Por exemplo, se eu, congregado<br />
mariano, estivesse andando de bonde<br />
e alguém de outra associação se<br />
sentasse ao meu lado — digamos,<br />
um vicentino —, embora não me conhecesse,<br />
ele logo iniciava uma conversa<br />
amigável. Apesar de serem instituições<br />
diversas, ambas promoviam<br />
a grandeza da Igreja e a conversão<br />
das almas, as duas favoreciam<br />
o bem: a Irmandade São Vicente de<br />
Paulo angariando esmola para os pobres,<br />
a Congregação mariana propagando<br />
a devoção a Nossa Senhora.<br />
A mesma amabilidade se verificava<br />
quando um congregado mariano<br />
entrava em qualquer paróquia e,<br />
reconhecido como tal pelo seu distintivo<br />
na lapela, era convidado a se<br />
dirigir à sacristia. Se precisasse falar<br />
com o padre, era levado até a casa<br />
deste, onde o recebiam com uma<br />
cortesia toda familiar. Pouco importava<br />
se não soubessem a que paróquia<br />
ele pertencia. Era congregado<br />
mariano!<br />
A par dessa harmonia, uma completa<br />
ausência de politicagem e rivalidade.<br />
Na hora de eleger os diretores<br />
das associações religiosas, não se<br />
fazia conchavo, agia-se despretensiosa<br />
e naturalmente. Por causa de tudo<br />
isso, havia imensa facilidade para se<br />
ajudar essa gente na prática do bem.<br />
Podia-se freqüentar qualquer desses<br />
ambientes religiosos e neles tratar<br />
dos temas mais requintados e tonitruantes<br />
da doutrina católica, que<br />
todos ficavam contentes, todos demonstravam<br />
grande abertura de alma<br />
para o nosso apostolado.<br />
O grupo do exemplo<br />
Comecei então a formar na Congregação<br />
Mariana de Santa Cecília<br />
um grupo — antes mesmo de pertencermos<br />
ao “Legionário” — que<br />
era expressão disto e trabalhava a favor<br />
dos assuntos da fé, para que andassem<br />
mais depressa. Esse grupo<br />
era muito bem visto e recebido em<br />
toda parte, exercendo uma imensa<br />
influência que ultrapassava os limites<br />
de São Paulo, e pouco a pouco se<br />
estendia pelo Brasil inteiro. Era considerado<br />
o grupo do bom exemplo.<br />
Em tudo isso havia um excelente<br />
senso de hierarquia e do dever. Por<br />
Formamos um<br />
grupo muito bem<br />
visto, com<br />
influência que logo<br />
se estendeu pelo<br />
Brasil inteiro<br />
O prédio da Rua Imaculada Conceição, sede da Congregação<br />
Mariana de Santa Cecília e do “Legionário”<br />
18
Visita do Almirante Yamamoto (centro) à sede do “Legionário”<br />
exemplo, nosso grupo se reunia no<br />
terceiro andar de um prédio, já demolido,<br />
situado na Rua Imaculada<br />
Conceição, e constituíamos o núcleo<br />
dos rapazes das famílias mais tradicionais<br />
na Congregação Mariana.<br />
Contudo, nos dávamos bastante bem<br />
com os outros membros dessa entidade.<br />
Em certas horas íamos conversar<br />
na sala de visitas, no andar superior<br />
do prédio, e convidávamos sempre<br />
algum deles para participar do<br />
nosso convívio. Tudo feito na maior<br />
concórdia possível.<br />
Projeção do “Legionário”<br />
no panorama nacional<br />
Nessa atmosfera de ardente ortodoxia,<br />
o “Legionário”, do qual eu<br />
era diretor, atingiu rapidamente o<br />
zênite, tornando-se não o maior jornal<br />
católico do Brasil, mas a folha religiosa<br />
que os outros liam para temperar<br />
os periódicos por eles elaborados.<br />
Ou seja, aquele que ditava a<br />
moda para os demais jornais, era o<br />
Com todo o<br />
seu prestígio, o<br />
“Legionário” se<br />
tornou a alma do<br />
movimento católico<br />
em São Paulo<br />
nosso. A tal ponto que qualquer estrangeiro<br />
católico distinto, de passagem<br />
por São Paulo, não deixava de<br />
fazer uma visita ao “Legionário”.<br />
Então, pregadores famosos, expoentes<br />
do catolicismo em seus respectivos<br />
países — como o Almirante Yamamoto,<br />
vencedor das guerras entre<br />
o Japão e a Rússia — e outros personagens<br />
do gênero vinham conhecer<br />
o “Legionário”, estabelecido no<br />
andar térreo daquele edifício da Rua<br />
Imaculada Conceição.<br />
Com esse prestígio, poder-se-ia<br />
dizer, sem exagero, que o nosso jornal<br />
era a alma do movimento católico<br />
em São Paulo, o qual, por sua vez,<br />
era a alma das associações religiosas<br />
difundidas em todo o Brasil. Essa<br />
pujança teve início, exatamente, com<br />
a formação e o desenvolvimento desse<br />
grupo constituído por nós no seio<br />
da Congregação Mariana de Santa<br />
Cecília.<br />
Ambiente e conversas<br />
no “Legionário”<br />
Convém recordarmos aqui, com<br />
mais pormenores, como eram as<br />
conversas e o ambiente no “Legionário”<br />
nesses primeiros tempos de<br />
nossa atuação.<br />
Naquela época, conforme a ordem<br />
natural das coisas, meu cabedal<br />
de leituras não era tão extenso quanto<br />
se tornou com o correr dos anos.<br />
Assim, a respeito da Revolução e<br />
da Contra-Revolução, possuía algumas<br />
idéias gerais que me serviam para<br />
analisar os assuntos mais de baixo<br />
para cima do que o inverso. Eu co-<br />
19
GESTA MARIAL DE UM VARÃO CATÓLICO<br />
mentava os acontecimentos internacionais,<br />
nacionais, de caráter político,<br />
cultural, religioso, ou fatos que<br />
se davam no ambiente social ao qual<br />
pertencíamos. Minhas análises, às<br />
vezes, geravam saudáveis discussões<br />
entre nós, não raro longas. Como os<br />
meus argumentos eram sempre baseados<br />
na doutrina católica, geralmente<br />
triunfavam.<br />
Ao mesmo tempo<br />
que censurava o<br />
mal, comecei a<br />
descrever as coisas<br />
favoráveis ao bem e<br />
apreciadas por mim<br />
Essas discussões duravam uma,<br />
duas horas. Eu elucidava problemas<br />
históricos, elogiava os personagens<br />
dignos da minha admiração e que<br />
haviam sido vilipendiados pelos professores<br />
dos meus companheiros.<br />
Além disso, invariavelmente exaltava<br />
as perfeições da Igreja, narrava<br />
episódios da vida dos Santos cuja<br />
biografia tinha lido, etc., aproveitando<br />
as ocasiões para tirar ensinamentos<br />
e formar nossa mentalidade<br />
contra-revolucionária. Aos poucos,<br />
ao mesmo tempo que censurava<br />
o mal, comecei a descrever as figuras,<br />
os lugares, as situações favoráveis<br />
ao bem e apreciadas por mim.<br />
Desse modo transcorriam as nossas<br />
conversas na sede do “Legionário”.<br />
Elas foram a semente das nossas<br />
reuniões atuais, com seus temas<br />
ampliados, elevados, desenvolvidos.<br />
No fundo as teses eram as mesmas,<br />
aprofundadas e consideradas sob um<br />
novo firmamento.<br />
Na volta para<br />
casa, convívio com<br />
Dona Lucilia<br />
Nossas reuniões se iniciavam após<br />
o jantar, e às 23 horas, infalivelmente,<br />
nos dirigíamos a uma confeitaria<br />
Propaganda do “Legionário”; e um almoço com membros de associações religiosas<br />
(<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> é o 2º da direita para a esquerda, ao lado do sacerdote)<br />
20
muito boa que havia na Rua Sebastião<br />
Pereira, chamada Elite. Como<br />
éramos fregueses assíduos — e todos<br />
bons garfos —, os garçons já estavam<br />
a postos, com tudo pronto para<br />
nos servir.<br />
Naquele tempo não havia Missas<br />
vespertinas, somente matutinas, nas<br />
quais deviam comungar os que desejassem<br />
fazê-lo. Por essa razão, o<br />
lanche terminava à meia-noite ou,<br />
no máximo, dois ou três minutos depois,<br />
limite permitido para se observar<br />
o jejum eucarístico. Após essa<br />
hora, não se podia ingerir mais nada,<br />
nem mesmo água.<br />
Encerrávamos a refeição, nos despedíamos<br />
e cada um retornava à sua<br />
residência.<br />
Por volta de meia-noite e meia eu<br />
estava chegando em casa, onde Dª Lucilia<br />
me esperava em alguma sala, no<br />
seu quarto ou no meu, rezando.<br />
Ao encontrá-la, infalivelmente a<br />
beijava, e ela a mim, em certas ocasiões<br />
várias vezes. Sentava-me perto<br />
de mamãe e começávamos a conversar<br />
sobre os assuntos mais diversos,<br />
criando oportunidade para ouvila<br />
contar algo do seu quotidiano de<br />
dona-de-casa.<br />
Maravilhava-me ver sua alma reagindo<br />
face aos episódios por ela narrados:<br />
recebeu fulana à tarde, visitou<br />
sicrana, mandou a doméstica comprar<br />
certo produto novo, a faxineira<br />
limpar o tapete, enfim, pormenores<br />
da vida de uma senhora.<br />
Quando alguma circunstância<br />
apresentava analogia com situações<br />
passadas, ela dizia:<br />
— É como tal fato assim.<br />
E contava alguns casos ocorridos<br />
com tios dela, mostrando os aspectos<br />
semelhantes. Embora eu não<br />
soubesse bem quem eram esses parentes,<br />
escutava com muito interesse.<br />
Naturalmente, mais por causa de<br />
Dª Lucilia do que pelo fato em si...<br />
Depois eu a colocava ao par do<br />
que sucedera comigo. Não a respeito<br />
de tudo, mas de algumas coisas<br />
<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> e Dona Lucilia na sede do “Legionário” — Após o lanche na “Elite”,<br />
ele se encontrava com a mãe em casa, para uma ponta de convívio<br />
que tinha vontade de lhe participar.<br />
Quando o assunto se enveredava por<br />
Conversavam sobre<br />
os assuntos mais<br />
diversos, e, não raro,<br />
a prosa durava<br />
uma hora inteira...<br />
comentários e idéias veementes de<br />
minha parte, mamãe se chocava, se<br />
arrepiava com as afirmações contundentes<br />
do filho, e perguntava:<br />
— Mas, isso estará bem pensado?<br />
— Como não, meu bem? Veja isso,<br />
aquilo, etc.<br />
Ela prestava muita atenção e concluía:<br />
— Se é assim, você tem razão.<br />
Às vezes, essa prosa durava uma<br />
hora inteira, ao cabo da qual nos<br />
despedíamos afetuosamente e íamos<br />
para nossos respectivos aposentos.<br />
Nem ela nem eu éramos tendentes<br />
a deitar cedo, ao contrário de<br />
meu pai, que não raro se levantava<br />
e dizia:<br />
— Vocês não vão dormir? Que é<br />
isso?<br />
— Olhe, papai, já vamos sim. —<br />
respondia eu.<br />
Ele já sabia que demoraríamos. E<br />
a conversa continuava... <br />
21
DR. PLINIO COMENTA...<br />
Alegrai-vos no Senhor, ó justos!<br />
Christus Rex Inc.<br />
“O Rei David<br />
em oração”,<br />
iluminura das<br />
“Ricas Horas do<br />
Duque de Berry”
Q<br />
uantas preocupações, abatimentos e dores palmilham nossa existência!<br />
Em determinados momentos, pensamos tudo abandonar. E a<br />
frase do Eclesiastes brota em nossos pensamentos: “Vaidade das vaidades,<br />
tudo é vaidade! Vi tudo o que se faz debaixo do sol, e achei que tudo era<br />
vaidade e aflição de espírito!” (Ecl 1, 2.14). Como conservar a alegria em<br />
meio às adversidades? Como enfrentar o sofrimento com inteiro ânimo?<br />
<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong>, comentando o Salmo 31, mostrará quão grande são as consolações<br />
daqueles que amam o Senhor, mesmo vivendo neste “vale de lágrimas”!<br />
Continuemos os comentários que vínhamos fazendo<br />
a cada versículo do Salmo 31.<br />
Tu és o meu refúgio na tribulação que me cercou;<br />
ó alegria minha, livra-me dos que me cercam.<br />
A esse penitente que se arrependeu e confessou seus<br />
pecados, Deus permitiu fosse oprimido por dificuldades.<br />
Porém, no meio desse cerco, ele pensa no Altíssimo como<br />
sendo a razão de sua alegria. Assim, encontra recursos<br />
para resistir e ser feliz.<br />
Como prêmio, o caminho do Céu<br />
Inteligência te darei, e ensinar-te-ei o caminho que deves<br />
seguir.<br />
Até aqui o Salmista tem se dirigido a Deus. Agora, é o<br />
Senhor quem lhe responde, prometendo-lhe uma recompensa<br />
nesta Terra. Mas esse prêmio não consiste em tornar<br />
a vida agradável, e sim ensinar o caminho do Céu.<br />
Ou seja, Deus concede ao homem a compreensão exata<br />
de todos os princípios e verdades que temos conhecido<br />
ao longo dessas considerações sobre os Salmos Penitenciais.<br />
Dessa maneira, o homem encontra o que precisa,<br />
isto é, aquele caminho a ser seguido por ele. Para onde?<br />
Em direção à bem-aventurança eterna.<br />
Portanto, Deus favorece a criatura humana com a inteligência<br />
e a força de vontade para trilhar as sendas que<br />
a conduzem ao Céu. Detrás das nuvens de todas as provações,<br />
ele diz ao homem: “Estou além dessas nuvens da<br />
dor. Atravessa-as, que tu me encontrarás. Vem a mim, ó<br />
meu filho!”<br />
E Deus acrescenta:<br />
Fixarei sobre ti os meus olhos.<br />
É a recompensa extraordinária. Vê-se que certas pessoas<br />
comuns são sofredoras, e os olhos de Deus estão sobre<br />
elas.<br />
Já tive oportunidade de recordar aqui a figura de<br />
uma senhora que me impressionava de modo particular,<br />
quando a observava se dirigindo para a igreja. Andava<br />
com um passo lépido, animada, levando freqüentemente<br />
uma sombrinha cuja utilidade parecia discutível, pois<br />
nem sempre havia ameaça de chuva ou sol forte. Entretanto,<br />
nela se notava algo como se fosse a bandeira da<br />
dor. Sua face era semi-encoberta por um pano, ocultando-lhe<br />
o nariz e a boca, sem impedir que pudesse falar à<br />
vontade. O véu, tanto quanto me era dado ver, invariavelmente<br />
limpo, de uma cor lilás profunda, quase azulmarinho,<br />
preso atrás da cabeça. Era patente que ela perdera<br />
o nariz.<br />
A senhora suportava essa cruz com alegria, tendo o<br />
mais das vezes um olhar ridente, gracejador.<br />
Deus a fitava. E nos olhos dela, percebia-se algo do lúmen<br />
do olhar do Criador.<br />
Entendimento para fazer<br />
a vontade divina<br />
Não queirais ser como o cavalo e o mulo, que não têm<br />
entendimento.<br />
Deus guia os homens, não porém à maneira como estes<br />
conduzem os cavalos. Porque o animal tem a natureza<br />
de se deixar levar, sem compreender nada. Apenas executa<br />
o que lhe ordenam. Entretanto, ao homem Deus dá<br />
entendimento, inteligência, para que ele conheça e corresponda<br />
à vontade divina. Por sua bondade infinita, o<br />
23
“Alegrai-vos, ó justos,<br />
pois tudo conduz ao<br />
Paraíso, e a felicidade<br />
do homem nesta Terra<br />
é a esperança do Céu!”<br />
V. Domingues<br />
Imagem de Profeta,<br />
Catedral de Santiago de<br />
Compostela (Espanha)<br />
Senhor nos oferece suas graças e seus dons celestiais, fazendo<br />
com que tenhamos atração pela santidade d’Ele.<br />
O homem então caminha rumo à união com Deus,<br />
não como um cavalo que apanha quando não cavalga direito<br />
— e, portanto, mais ou menos se deixa conduzir —<br />
mas sua alma deseja o que Deus quer, entende a verdade<br />
que Deus revela e ama o bem que Deus indica. Estabelecido<br />
o vínculo entre o Altíssimo e a alma, tornam-se<br />
amigos, aplicando-se a eles o que diz o Salmista em outro<br />
texto: “Tu que comigo, à minha mesa, comias doces frutos”<br />
(Sl 54, 15).<br />
A amizade é a convergência de duas almas no conhecimento<br />
e no amor de Deus; no amor e no conhecimento<br />
da Santa Igreja Católica Apostólica Romana.<br />
24
Qual é a definição de amigo? É aquele que — como<br />
eu — adora, entende e quer a Deus. Esse é meu amigo<br />
porque é um outro eu mesmo. A esse propósito, evoco o<br />
que por vezes acontece em nossa vida diária. Alguém me<br />
procura para expor seus problemas pessoais, não raro em<br />
horários inoportunos, transtornando meus afazeres, etc.<br />
Olho para o meu interlocutor e penso: “Como ele seria<br />
se fosse mau? Entretanto, ele é bom, vive habitualmente<br />
em estado de graça. Então, como o quero porque ele<br />
quer a Deus, como o amo porque ele ama a Deus, considerando<br />
o que nele há de católico, tomo-o como meu semelhante.<br />
E a semelhança atrai a amizade.”<br />
Um necessário exame de consciência<br />
Seria de grande proveito fazermos um exame de consciência<br />
diário, no qual rememorássemos todos aqueles<br />
do movimento com quem tratamos. E se nesse convívio<br />
pensamos o seguinte: “Como ele seria se não fosse do<br />
nosso grupo? E como ele é melhor sendo um dos nossos!<br />
O que poderá vir a ser, se for santo? De que modo brilhará?<br />
Como eu amo as esperanças que Deus deposita<br />
nesse meu irmão de vocação! Ah! Como me alegra o fato<br />
de ele perseverar e corresponder às graças divinas, aproximando-se<br />
o quanto possível dos desígnios de Deus sobre<br />
ele! Nosso Senhor o ama nessa perspectiva, eu também<br />
o quero assim!”<br />
Nesse sentido, precisamos nos querer intensamente. E<br />
estimar nosso irmão de vocação, não porque seja engraçado,<br />
porque conte coisas jocosas, nem por sua esperteza<br />
ou por sua generosidade para comigo, mas sim porque<br />
ele ama Deus, Nossa Senhora, a Santa Igreja Católica. E<br />
por causa disso, embora possa ter esses ou aqueles defeitos,<br />
há nele fundamentalmente tal linha. Esta linha eu<br />
amo como a luz dos meus olhos.<br />
Alguém poderia objetar: “Mas, ele não me entende,<br />
não gosta de mim”.<br />
Então, devo amá-lo duplamente. Porque se ele me dá<br />
algum desgosto, mas lembro-me de que é um membro<br />
de nosso movimento, e no essencial de sua vida tende a<br />
realizar nosso ideal, é diferente dos que me são estranhos,<br />
ofendem a Deus e não se incomodam.<br />
Em última análise, se um homem, ao pecar, agride o<br />
seu Criador, ele se torna digno de minha censura e rechaço.<br />
Se dá uma bofetada só em mim... que importância<br />
tem? Por mais especial que me julgue, sou uma mera<br />
criatura, “um verme e não um homem” (Sl 21, 7), como<br />
diz a Sagrada Escritura.<br />
Então não devemos resmungar: “Ele não reconheceu<br />
que tenho grande inteligência....”<br />
Ah! pobre miserável, você próprio não reconhece que<br />
não é nada?<br />
Lutar pela glória de Deus<br />
Com o cabresto e com o freio, sujeita as queixadas daqueles<br />
que não quiserem obedecer-te.<br />
Quer dizer, o homem deve sujeitar as pessoas que não<br />
queiram obedecer-lhe.<br />
Esse versículo encerra uma invulgar beleza, porque<br />
contradiz uma certa concepção piegas do católico, segundo<br />
a qual este deve apanhar sempre, ser um songamonga,<br />
incapaz de lutar, de se defender, de entrar numa<br />
querela, numa verdadeira discussão onde está em jogo a<br />
glória de Deus.<br />
Contudo, dir-se-ia haver uma discrepância entre essa<br />
atitude e o que dissemos anteriormente sobre a necessidade<br />
de não darmos importância — ou pouca, na medida<br />
do razoável — ao que se faz contra nós. E agora, esse<br />
versículo afirma que é preciso sujeitar quem não nos<br />
obedece.<br />
A explicação é a seguinte. Devemos desejar que todo<br />
homem, como nós, sirva e ame a Deus. E por isto, Deus<br />
declara: “Deixei um cabresto e um freio na tua mão, porque,<br />
se alguém não cumprir minha Lei e se revoltar, tu<br />
tens obrigação de sujeitá-lo”.<br />
Regozijo dos que têm coração reto<br />
Muitas dores esperam o pecador, mas o que espera no<br />
Senhor será cercado de misericórdia.<br />
Frase sobremodo bonita: muitas dores esperam o pecador.<br />
Ou seja, não pensemos que Deus não castiga o ímpio<br />
nesta vida. Apenas não o faz com aquela clareza que<br />
desnaturaria as coisas.<br />
E ao justo, o que acontece? Ele não sofre dores? Não<br />
está dito isso, mas sim que será cercado de misericórdia.<br />
Tudo para ele é clemência, até quando padece.<br />
Alegrai-vos no Senhor e regozijai-vos, ó justos, e gloriaivos<br />
todos os que sois de coração reto.<br />
Cumpre nos indignarmos diante dos pecados torpes e<br />
as injúrias graves a Deus que se espalham pela face da<br />
Terra. Entretanto, ao ouvirmos o Salmista que canta:<br />
“Alegrai-vos no Senhor e regozijai-vos, ó justos...”, devemos<br />
nos entusiasmar e estarmos felizes. Porque aos justos,<br />
Deus não diz: “Ficai contente com as coisas do mundo”,<br />
mas: Rejubilai-vos, pois tendes o coração reto e Eu<br />
vos cerco de misericórdia.”<br />
Mesmo a quem esteja sofrendo muito, padecendo<br />
martírios inenarráveis, a tal ponto que seja um milagre<br />
suportá-los, também é dirigida esta frase: “Alegrai-vos, ó<br />
justos”, etc., pois tudo conduz ao Paraíso, e a felicidade<br />
do homem na Terra é a esperança do Céu.<br />
Com esse pensamento concluímos nossas considerações<br />
sobre este belo Salmo 31.<br />
<br />
25
O SANTO DO MÊS<br />
Santo Antônio Maria Claret,<br />
sacerdote fervoroso e<br />
pregador ardente<br />
F<br />
lorão da estirpe dos homens providenciais que Deus suscita em todas<br />
as épocas para servirem de modelo e guia aos seus semelhantes,<br />
Santo Antônio Maria Claret — cuja festa se celebra no dia 24 deste mês —<br />
reluz no céu da Igreja por seu extraordinário vigor de alma e sua destemida<br />
devoção ao Papado. Assim no-lo apresenta <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong>, ao nos evocar os<br />
principais aspectos da vida desse Santo.<br />
Em 24 de outubro é comemorada<br />
a festa de Santo Antônio<br />
Maria Claret (1807-<br />
1870), Bispo e Confessor. Além de<br />
se destacar como insigne defensor da<br />
autoridade pontifícia, foi um grande<br />
devoto de Nossa Senhora, havendo<br />
fundado a Congregação dos Filhos<br />
do seu Imaculado Coração, conhecidos<br />
como claretianos.<br />
Tive oportunidade de admirar o<br />
perfil de Santo Antônio ao ler uma<br />
pequena biografia dele — com a<br />
qual me maravilhei! —, a fim de reunir<br />
elementos para pronunciar uma<br />
conferência em Rio Claro, cidade do<br />
interior paulista. Não pretendo repetir<br />
aqui essa palestra, embora os extraordinários<br />
e numerosos aspectos<br />
da existência deste Santo pedissem<br />
comentários mais extensos. Limitarme-ei,<br />
portanto, a considerar os lados<br />
mais marcantes de sua vida.<br />
Período de tibieza<br />
na juventude<br />
A Igreja desaconselha que se faça<br />
comparação entre os heróis da Fé<br />
elevados à honra dos altares. Não direi,<br />
pois, que Santo Antônio Claret<br />
foi o maior de seu tempo. Porém,<br />
penso que, se em cada quadra histórica<br />
alguns Santos sobrepujam os<br />
outros em importância aos olhos de<br />
Deus, nos planos da Providência um<br />
desses terá sido sem dúvida Santo<br />
Antônio Maria Claret.<br />
Mais do que Fundador de uma<br />
congregação religiosa, ele nos aparece<br />
como um varão exponencial, dominando<br />
completamente sua época,<br />
pelo simples fato de ter existido.<br />
Imagine-se um homem de baixa<br />
estatura, espanhol de temperamento<br />
ardoroso, catalão apimentado, filho<br />
de uma família bastante piedosa,<br />
dedicada à fabricação têxtil. Ainda<br />
jovem, morando em Barcelona, sentiu<br />
apelos divinos para algo de mais<br />
elevado, embora indefinido, pois<br />
não pensava na vocação sacerdotal.<br />
Mas, naquela cidade, envolveu-se<br />
com questões de tecelagem e se enfronhou<br />
nos assuntos práticos desse<br />
negócio, começando a esquecer o<br />
fervor da sua piedade dos tempos de<br />
menino. Passou alguns anos absorto<br />
no cuidado de máquinas, teares e<br />
coisas semelhantes.<br />
Praticava ainda a religião, mas,<br />
nesse período de sua vida, pode-se<br />
dizer que Santo Antônio Maria Claret<br />
— para usar a nossa expressão caseira<br />
— tendia a ser um “sabugo” 1 .<br />
Continuava a freqüentar a igreja, assistia<br />
à Missa aos domingos, comungava<br />
algumas vezes por ano e também<br />
recitava o Rosário. Mas, fora<br />
do cumprimento estrito dessas práti-<br />
26
Santo Antônio<br />
Maria Claret<br />
cas de piedade, só tinha pensamentos<br />
para o seu trabalho na indústria<br />
têxtil.<br />
Certo dia, indo nadar com os companheiros<br />
no litoral, o movimento<br />
muito forte das ondas o arrastou<br />
mar adentro. Apelou à Santíssima<br />
Virgem e, de forma inexplicável para<br />
ele, percebeu que flutuava na superfície<br />
do oceano, sendo levado por<br />
força misteriosa até a praia, sem ter<br />
tragado sequer uma gota de água.<br />
Varão exponencial,<br />
dominou sua<br />
época pelo<br />
simples fato de<br />
ter existido<br />
Salvo em terra, associou o episódio<br />
a uma lembrança que tinha tido, durante<br />
a Missa, das palavras de Jesus<br />
Cristo no Evangelho: “De que aproveita<br />
ao homem ganhar todo o mundo,<br />
se finalmente perde a sua alma?”<br />
(Mt 16,26).<br />
Padroeiro dos “sabugos”<br />
Eis um primeiro ponto de afinidade<br />
de Santo Antônio Maria Claret<br />
27
O SANTO DO MÊS<br />
conosco. Pois ele resolveu levar uma<br />
vida nova, o que, sob certo ponto de<br />
vista, foi uma recauchutagem, uma<br />
“desensabugagem” de sua alma.<br />
Algo de semelhante acontece em<br />
nosso grupo. A Santíssima Virgem<br />
atrai as pessoas as quais, uma vez fixadas,<br />
em geral entram no processo<br />
de “ensabugamento”. E se a misericórdia<br />
d’Ela não o impedir, acabam<br />
nesse lamentável estado de tibieza.<br />
A partir daí começa a segunda fase:<br />
é preciso remar até conseguir que<br />
elas se recauchutem ou se “desensabuguem”.<br />
E quando correspondem à graça,<br />
experimentam uma espécie de nova<br />
conversão. Em seguida, inicia-se<br />
Típico pregador<br />
popular, as<br />
multidões enchiam<br />
as praças públicas<br />
para ouvi-lo<br />
a terceira fase de sua vida espiritual.<br />
Se, com o auxílio de Nossa Senhora,<br />
não tivéssemos o cuidado de “desensabugá-las”,<br />
é de se temer que muitas<br />
dessas pessoas não perseverariam<br />
na vocação.<br />
Então, com profundo respeito,<br />
podemos dizer que Santo Antônio<br />
Maria Claret nos aparece como o padroeiro<br />
dos “sabugos”. Por sua fidelidade<br />
à graça da conversão, tornouse<br />
um modelo de “desensabugado”,<br />
digno de ser imitado por nós. Ele alcançou<br />
esse triunfo sobre a própria<br />
indolência espiritual porque sempre<br />
nutriu particular devoção a Nossa<br />
Senhora, e a Santíssima Virgem,<br />
que o predestinava a grandes feitos,<br />
ajudou-o a se reerguer e se “desensabugar”.<br />
Rumo aos píncaros<br />
da santidade<br />
Desde esse momento, com imenso<br />
fervor, ele empreendeu a marcha<br />
ininterrupta até atingir os píncaros<br />
de santidade, como veremos.<br />
Ordenado sacerdote, tornou-se<br />
missionário. E revelou-se como o típico<br />
pregador popular (e gostaria de<br />
acentuar a palavra “popular”), com<br />
algumas características eminentes.<br />
Por exemplo, tinha voz possante, capaz<br />
de se fazer ouvir pelas multidões<br />
que enchiam as praças públicas onde<br />
ele pronunciava seus sermões, pois<br />
o espaço interno das igrejas era insuficiente<br />
para conter todos os fiéis desejosos<br />
de escutá-lo. E não raro, as<br />
mesmas praças se verificavam pequenas<br />
para reunir o público que<br />
comparecia às suas pregações.<br />
Quando se dirigira de uma cidade<br />
para outra, sua fama de orador sacro<br />
era tal que grande parte da população<br />
de onde falara o acompanhava,<br />
processionalmente, até deparar com<br />
os habitantes da localidade vizinha,<br />
para a qual ele falaria. Durante o encontro,<br />
o Santo fazia um sermão de<br />
despedida de uns e de saudação aos<br />
outros, comovendo a alma de todos.<br />
Sendo um orador popular muito<br />
vivo, interessante, ardente, profundo,<br />
sólido, substancioso e dotado de<br />
carismas extraordinários, davam-se<br />
fatos espetaculares durante as suas<br />
homilias. Por exemplo, às vezes ele<br />
interrompia suas palavras, apontava<br />
para uma mulher na assistência e<br />
lhe dizia de súbito: “A senhora pensa<br />
que não morrerá tão cedo, e terá<br />
vários anos pela frente. Sua morte se<br />
dará dentro de... — suspense! — seis<br />
meses”. Naturalmente, a indicada<br />
desmaiava, caía em prantos, etc.<br />
Noutras ocasiões afirmava: “Vou<br />
expulsar o demônio que está pairando<br />
sobre este auditório”. E em seguida<br />
pronunciava a fórmula do exorcismo.<br />
Estrépito, raio em céu sereno,<br />
caem os sinos do campanário e a população<br />
fica apavorada. Havia conversões<br />
em massa, pois bem podemos<br />
imaginar o efeito de pregações<br />
dessa natureza.<br />
Santo Antônio compreendia de<br />
modo claro ter sido destinado por<br />
Deus à vocação de missionário junto<br />
ao povo. Nunca desejou tornar-se<br />
teólogo profundo, nem orador de<br />
alto porte, como um Pe. Antônio<br />
Vieira, um Bossuet, Bourdaloue, etc.<br />
Nascera para falar ao vulgo, e com<br />
sua oratória popular esplêndida,<br />
convertia multidões.<br />
Compreendeu, igualmente, ser um<br />
homem feito para suscitar zelo, mais<br />
28
“Oxalá pudesse eu<br />
consumar minha<br />
corrida, confessando<br />
essa grande verdade:<br />
o Sumo Pontífice é<br />
infalível!”<br />
À direita,a Praça de São Pedro no<br />
dia da proclamação do dogma<br />
da Infalibilidade Papal; abaixo,<br />
fachada da Basílica do Vaticano<br />
Fotos: R. C. Branco e S. Hollmann<br />
29
O SANTO DO MÊS<br />
do que coordenar o zelo que suscitara.<br />
Por isso, passava pelas províncias<br />
despertando por toda parte o amor<br />
a Deus, deixando depois que outros<br />
utilizassem aquela semente e aquele<br />
fogo para melhores finalidades.<br />
Era, portanto, um modelo de desprendimento,<br />
sem a preocupação<br />
de colher para si, mas plantando<br />
para que outros colhessem.<br />
Arcebispo em Cuba e<br />
confessor da Rainha<br />
Depois de uma estupenda<br />
pregação nas Ilhas Canárias, afinal,<br />
foi promovido a Arcebispo<br />
em Cuba, então colônia espanhola<br />
cuja situação moral se apresentava<br />
muito decadente. Santo Antônio<br />
Maria Claret dedicou-se à conversão<br />
da Ilha, e quando começou a obter<br />
a emenda dos costumes, desencadeou<br />
uma reação intensa contra ele.<br />
Sofreu tantas e tão fortes oposições,<br />
e até atentados, que a Rainha da Espanha<br />
acabou intervindo e o retirou<br />
daquelas terras.<br />
De volta à metrópole, Santo Antônio<br />
Maria Claret se instalou na<br />
corte, como confessor da Rainha Isabel<br />
II. Mulher de maus bofes, passou<br />
a se modificar e melhorar no contato<br />
com Santo Antônio, até que uma<br />
reviravolta política a destronou e a<br />
exilou para a França. Foi ele, portanto,<br />
quem provocou pelo seu zelo esse<br />
terremoto na Espanha, ao mesmo<br />
tempo em que desempenhava uma<br />
obra insigne, como missionário, em<br />
todo o país.<br />
Defensor da<br />
infalibilidade pontifícia<br />
Nesse período, fundou a Congregação<br />
dos Filhos do Imaculado Coração<br />
de Maria, cujo nome exprime<br />
o culto fervoroso que ele dedicava à<br />
Mãe de Deus, sob essa invocação.<br />
Alguns anos mais tarde, durante<br />
o Concílio Vaticano I, deu-se um dos<br />
Imaculado Coração de Maria,<br />
em homenagem ao qual Santo<br />
Antônio Maria Claret fundou a<br />
sua congregação religiosa<br />
célebres episódios da vida de Santo<br />
Antônio Maria Claret. Ele já estava<br />
Demonstrou que<br />
nas camadas<br />
populares, a<br />
pregação autêntica<br />
produz ótimos<br />
frutos<br />
idoso, doente, porém aureolado pelas<br />
mais altas graças que se possa receber.<br />
Por exemplo, o Santíssimo Sacramento<br />
nunca se deteriorava dentro<br />
dele, de uma comunhão a outra,<br />
de maneira que era um sacrário vivo,<br />
assim como Nossa Senhora que tinha<br />
Jesus vivendo n’Ela durante o período<br />
da Encarnação e da gestação.<br />
Pois bem, ao ouvir no Concílio Vaticano<br />
I pronunciamentos de alguns<br />
bispos contra a infalibilidade papal,<br />
Santo Antônio se levantou e fez um<br />
famoso sermão em que declarou:<br />
“Oxalá pudesse eu consumar minha<br />
corrida, confessando e dizendo<br />
da abundância do meu coração<br />
esta grande verdade: creio<br />
que o Sumo Pontífice Romano é<br />
infalível.”<br />
A atitude de alguns irmãos<br />
seus no episcopado o acabrunhou<br />
e o encheu de desgosto, a tal ponto<br />
que sofreu um começo de apoplexia,<br />
pela qual viria a falecer pouco<br />
depois, na França, recolhido numa<br />
Cartuxa. Era o ano de 1870.<br />
E assim terminaram os dias desse<br />
magnífico varão de Fé, ao qual nos<br />
honramos de tomar por patrono, como<br />
grande promotor que foi da devoção<br />
a Nossa Senhora, em especial<br />
ao Imaculado Coração de Maria,<br />
bem como por seu ardoroso amor à<br />
Santa Sé Apostólica. Além disso, é<br />
modelo para nós, pois demonstrou<br />
que, nas camadas populares, ao contrário<br />
do que pretende a Revolução,<br />
uma pregação autêntica e boa produz<br />
maravilhosos resultados.<br />
Todas essas razões nos levam a,<br />
no dia de sua festa, confiar de modo<br />
particular no patrocínio de Santo<br />
Antônio Maria Claret, e lhe pedir<br />
que nos alcance as melhores graças<br />
do Céu.<br />
<br />
1<br />
) Metáfora empregada por <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong><br />
para exprimir o estado de espírito de<br />
quem, tendo aderido com certo ardor a<br />
um ideal, deixa-se depois arrastar pelo<br />
desânimo, a languidez e a inação. Esse<br />
perdeu o fervor com que realizava as<br />
boas obras e o entusiasmo que tinha<br />
em cumprir a vocação, assim como a<br />
espiga de milho que perde seus grãos e<br />
se transforma em sabugo.<br />
30
LUZES DA CIVILIZAÇÃO CRISTÃ<br />
Hífen gaudioso<br />
Fotos: S. Hollmann, V. Domingues e R. C. Branco<br />
Ponte nas montanhas<br />
das Astúrias, Espanha<br />
Sempre se concebeu a ponte como algo de nobre e<br />
belo, digno de possuir fisionomia e características<br />
próprias. Ela é uma obra da inteligência e da habilidade<br />
humanas, construída para vencer as dificuldades e<br />
os entraves da natureza, impondo assim a vitória do rei<br />
da criação sobre aquilo que o desafia.<br />
A ponte é um hífen entre as duas partes de um caminho<br />
interrompido pelo precipício, pelo vale, por um rio...<br />
Traço de união, ufana-se de não pertencer a nenhum dos<br />
lados que ela aproxima, ciosa de sua individualidade e de<br />
sua nobreza. Seja a mais elementar, estendida numa trilha<br />
de roça, seja a mais monumental, projetando-se aci-<br />
31
LUZES DA CIVILIZAÇÃO CRISTÃ<br />
ma de águas famosas, ela possui peculiaridades que a diferenciam<br />
do restante do percurso.<br />
Pensemos na célebre ponte da Torre de Londres, sobre<br />
o Tamisa. Em determinados momentos, seu leito se<br />
divide e se ergue para dar passagem aos navios que, numerosos,<br />
sulcam o rio a serviço de um intenso comércio.<br />
Em seguida, ela se fecha, permitindo a fluência do trânsito<br />
da grande capital inglesa.<br />
Quer na sua posição horizontal, que nos transmite a<br />
idéia de firmeza, de solidez e força; quer quando suas<br />
partes se levantam lenta e solenemente, como se ignorassem<br />
a vida ao seu redor, e o rio começa a ser navegado<br />
diante da majestosa indiferença (ligeiramente indignada<br />
e sentida) dos batentes que se abrem — a ponte mantém<br />
aquele semblante próprio, fotografado e filmado de todos<br />
os modos possíveis por turistas do mundo inteiro.<br />
Há pontes lindas em outro gênero. Uma delas, a que<br />
transpõe o Rio Tibre, em Roma, e conduz ao Castelo<br />
de Sant’Ângelo. Esta antiga construção abrigava outrora<br />
os restos mortais do Imperador Adriano. Os despojos<br />
do César se desfizeram, e no período medieval essa<br />
mole se transformou no castelo fortificado onde as tropas<br />
dos Pontífices se acantonavam para a defesa da Cidade<br />
Eterna.<br />
A ponte, monumental, muito à maneira italiana é<br />
adornada com imagens de Santos e de Anjos, e no passado<br />
era favorecida por indulgências: o fiel que a atravessasse<br />
recitando determinadas orações junto a cada ima-<br />
32
Sobre as águas do velho<br />
Tibre romano, os Anjos<br />
lançam uma ponte espiritual,<br />
unindo a Terra ao Céu...<br />
Ponte e Castelo de Sant’Ângelo, em Roma<br />
gem, beneficiava-se de tais e tais privilégios concedidos<br />
pelos Papas. Assim, sobre as águas do velho Tibre romano<br />
que os imperadores contemplaram, os Anjos lançam<br />
uma fabulosa ponte espiritual, significando que a intercessão<br />
deles ajuda nossas almas a vencerem as distâncias<br />
entre a Terra e o Céu...<br />
Há, também, pontes de uma simplicidade maravilhosa.<br />
Não a singeleza fria, mal-humorada e tola, mas aquela<br />
feita de equilíbrio, distinção, e de beleza presentes<br />
apenas na forma dos seus arcos. Entretanto, parecem<br />
nos dizer coisas inenarráveis. Exemplo frisante, o Pont-<br />
Neuf, sobre o Rio Sena, em Paris. Construído por Henri-<br />
33
LUZES DA CIVILIZAÇÃO CRISTÃ<br />
que IV, não é mais que um conjunto de arcos lembrando<br />
um pouco ogivas, mas tão calculados, tão medidos na sua<br />
simplicidade que, tempo eu tivesse, passaria uma tarde<br />
inteira contemplando a sua beleza se refletindo nas prestigiosas<br />
águas do Sena.<br />
Lembra-me, ainda, a Ponte dos Suspiros, em Veneza.<br />
Não reúne dois pedaços de estrada, mas dois corredores<br />
de palácios. Tão simples! Tão pequena! Quase irrisória<br />
em comparação com os gigantescos viadutos modernos.<br />
Porém, ao contrário destes, ela é um capítulo da história<br />
da alma humana. Nem precisaria ser autêntico o fato<br />
de que passavam por ela os condenados à morte na Sereníssima<br />
República. Pois só a idéia de se chamar Ponte<br />
dos Suspiros a reveste de uma beleza ímpar. Como é<br />
nobre suspirar numa ponte, olhando para a água! Como<br />
é lindo! Que melhor lugar para um derradeiro gemido,<br />
um último murmúrio ouvido pelas águas que pranteiam<br />
a desdita de quem caminha para o suplício?<br />
A relação ponte-água nos faz pensar... A ponte se espelha<br />
no rio que passa sob ela. Pode-se dizer que a alegria<br />
deste é fluir por debaixo da ponte, recolher a imagem<br />
dela e levá-la muito além. É a realização dele: passou<br />
pela ponte tal.<br />
34
Mas, como é verdade o contrário! Imagine-se<br />
uma ponte a cujos pés as águas tenham<br />
deixado de correr, desviadas que foram<br />
para alguma represa. Desolada, envolta<br />
por uma triste solidão, a ponte vê seus fundamentos<br />
secos, percebe o vazio junto a ela:<br />
sua imagem já não se reflete em nada, não<br />
tem mais brilho, ela está seca, esturricada<br />
no ar. De súbito, abrem-se as comportas, a<br />
água começa a circular novamente...<br />
E da ponte, revigorada, rejuvenescida,<br />
parte uma exclamação de gáudio! <br />
A alegria do rio é fluir sob<br />
a ponte, recolher a imagem<br />
dela e levá-la muito além...<br />
Reflexo de ponte nas águas de Veneza<br />
Na página anterior: em cima, a Ponte dos Suspiros,<br />
Veneza; embaixo, ponte sobre o Rio Sena, Paris<br />
35
Timothy Ring<br />
À nossa<br />
espera...<br />
M<br />
eu filho, aqui estou<br />
Eu, sozinha,<br />
no canto a que teu desprezo<br />
me relegou, repleta<br />
daquele amor<br />
materno que tua rejeição<br />
comprime em<br />
Mim e impede que se<br />
expanda; daquele afeto<br />
que se conserva intacto<br />
em sua abundância e<br />
intensidade, palpitando<br />
de compaixão, à espera<br />
de que retornes<br />
para te purificar, te<br />
envolver e cumular<br />
com sua misericórdia<br />
inesgotável...<br />
Imagem Peregrina<br />
de Nossa Senhora<br />
de Fátima