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seu RAP, foi emocionante. “Mais uma mulher negra, guerreando e lutando pra mudar o quadro de opressão contra usuários de drogas”, disse Ione, de 31 anos, uma das moradoras de rua recrutadas pela RENFA. Ela também lembrou o quanto as mulheres são mais vulneráveis quando em situação de rua, ainda mais quando estão sob o efeito de drogas. Enquanto esperávamos outra integrante, para fazer a foto do grupo completo, uma delas falou faceira para amiga: “dei meu nome masculino”. Era Jair Jr., participante do projeto há 3 meses. Notei nele enorme perspicácia para produção audiovisual. Antes da entrevista, fez <strong>que</strong>stão de pegar uma vassoura para limpar o chão. Eu disse <strong>que</strong> não precisava, pois não iria aparecer no quadro. Ele ignorou a frase e seguiu em frente. Foi lá, varreu o chão, depois o banco e então buscou uma manta e compôs um cenário, a seu modo, para acomodar a entrevista. Mais tarde, enquanto eu explicava a ideia de fazer uma foto com elas todas mostrando elementos da cidade, Jair Jr. retrucou: “Não... acho <strong>que</strong> o certo era fotografar a gente aqui, no dia a dia, no nosso lugar, não posando igual turista”, disse, mostrando personalidade. Enquanto eu registrava o grupo conversando, ele (<strong>que</strong> nasceu Graziela), sorriu pra câmera e acabou indo parar na capa da revista pois é um sorriso emblemático e cheio de significado. Obrigado Luana por ter nos recebido e trocado uma longa ideia sobre o trabalho de redução de danos e a cena do feminismo antiproibicionista em Salvador. Entrar nessa roda, entender um pouco da sua rotina, compartilhar dessa brisa, sem dúvida foi um dos melhores momentos dessa viagem. Última a chegar, mas rainha do papo reto, Sheila fez a síntese do empoderamento feminino implantado por lá: “Sou uma menina <strong>que</strong> tem 21 anos de rua aí lutando e mostrando <strong>que</strong> nós somos nós, somos maloca. E maloca tem valor. E vocês aí nunca estão escutando a gente. A gente vai mostrar pra vocês <strong>que</strong> a gente não vai cair, não. A gente vai é vencer, por<strong>que</strong> a gente confia no nosso talento, tá ligado. Que eu to aqui com meu bonde, é o bonde feminista, <strong>que</strong> é pra levar pra cidade, e pro Brasil, a ideia de <strong>que</strong> nós mulheres não estamos à toa”, disse ela. Enquanto fechava essa edição, Luana estava em viagem ao Uruguai fundando a Rede Latinoamericana e Caribenha de Feministas Antiproibicionistas. Apesar do desgaste de se trabalhar na ponta das políticas de drogas, posto <strong>que</strong> diretamente com os usuários, é fácil perceber <strong>que</strong> essa galera, de fato, faz o <strong>que</strong> gosta e está no lugar certo, contribuindo com uma sociedade melhor, menos repressora e mais igualitária. III: Qual a boa, pivete? É claro <strong>que</strong> o jornalismo sob drogas da <strong>Hempada</strong> tinha <strong>que</strong> apurar algo sobre os picos mais enfumaçados da cena local. Mas para não dar de locão, seguimos os passos de artistas de lá, pra ir desvendando, ao poucos, os mistérios culturais da terrinha. Pude conhecer três figuras expoentes do meio artístico soteropolitano e nosso encontro foi marola demais. Quem acha <strong>que</strong> viajar a serviço é moleza se engana tremendamente. Divertido é claro <strong>que</strong> é, mas o processo é trabalhoso e nada turístico. Ouvi de fontes diversas <strong>que</strong> lugares típicos da contracultura <strong>que</strong> não se pode deixar de conhecer são “Praia do Barracão”, o clássico “Rio Vermelho”, e um lugar de nome sugestivo, a “Praça Holanda”. Questionando sobre artistas da <strong>Bahia</strong> <strong>que</strong> são a favor da legalização, ouvi nomes como de “Kanário”, “Russo Passapusso” e a “banda EdCity”, afinal, todo mainstream dá seus tapas e tem seus representantes. Mas a gente não foi a ponto turístico ne- <strong>Hempada</strong>_8.indd 25 27/11/2017 11:24:06