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Me Chame Pelo Seu Nome - André Aciman

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precisava aceitar a natureza paradoxal do pensamento do filósofo, não<br />

simplesmente explicá-lo. Ele estava em paz com a ideia de que precisava<br />

consolidar seus argumentos, aceitava o paradoxo. Devia voltar ao início —<br />

também estava em paz com isso.<br />

Convidou minha tia mais nova para um tête-à-tête durante uma gita —<br />

passeio — de lancha à meia-noite. Ela recusou. Ele ficou em paz com a<br />

recusa. Tentou mais uma vez em alguns dias, mais uma vez foi rejeitado, e<br />

mais uma vez aceitou com leveza. Ela também não se importou e, se tivesse<br />

passado mais uma semana conosco, provavelmente aceitaria uma gita de<br />

lancha à meia-noite que duraria até o nascer do sol.<br />

Somente durante os primeiros dias tive a sensação de que aquele jovem de<br />

vinte e quatro anos tão obstinado, mas à vontade, descontraído,<br />

despreocupado, sereno, imperturbável, que aceitava com facilidade tantas<br />

coisas da vida era, na verdade, um juiz frio, alerta e perspicaz da natureza<br />

humana e das situações. Nada do que fazia ou dizia era por acaso. Ele sabia<br />

interpretar qualquer pessoa, exatamente porque a primeira coisa que<br />

procurava nos outros era aquilo que tinha visto em si mesmo e não queria que<br />

os outros vissem. Era, como minha mãe ficou escandalizada ao descobrir, um<br />

exímio jogador de pôquer que ia escondido até a cidade duas noites por<br />

semana para “jogar algumas mãos”. Foi por esse motivo que, para nossa<br />

completa surpresa, ele insistiu em abrir uma conta no banco assim que<br />

chegou. Nenhum dos nossos hóspedes tinha conta no banco. A maioria deles<br />

não tinha um centavo.<br />

Aconteceu durante um almoço para o qual meu pai tinha convidado um<br />

jornalista que havia se dedicado à filosofia quando jovem e queria mostrar<br />

que, embora nunca tivesse escrito sobre Heráclito, era capaz de discutir<br />

qualquer assunto. Ele e Oliver não se deram bem. Depois do almoço, meu pai<br />

disse: — Um homem muito espirituoso… inteligente também.<br />

— Você achou mesmo, Pro? — interrompeu Oliver.<br />

Não sabia que meu pai, embora também fosse muito tranquilo, nem sempre<br />

gostava de ser contrariado, muito menos de ser chamado de Pro, mesmo que<br />

tenha aceitado as duas coisas.

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