A Guerra dos Tronos, 2011-presente
MULHERES BEM COMPORTADAS RARAMENTE FAZEM HISTÓRIA SARA GALVÃO Os tempos já não são o que eram. Depois de anos e anos a ver filmes de cowboys contra índios (ou de rebeldes contra o Lado Negro), onde era claro e nítido de que lado é que devíamos estar, parece que o século XXI não se dá bem com dicotomias a preto e branco. De facto, se há uma tendência clara no cinema e, especialmente, na televisão produzidas no pós-11 de Setembro, é o estabelecimento do anti-herói como a personagem mais representativa das complexidades do mundo moderno. Após o ataque às Torres Gémeas — e, sete anos depois, o início de uma crise económica cujas consequências ainda se sentem uma década mais tarde — o zeitgeist mudou consideravelmente. Quando membros da audiência se sentem sem poder sobre as próprias vidas, não podendo confiar em políticos e políticas, e sem quaisquer novos idealismos que os “salvem”, só há duas saídas: a primeira, o velho escapismo, que se manifesta entre nós com os filmes de super-heróis. A segunda, muito mais interessante, é o anti-herói. O anti-herói — aqui compreendido como o protagonista que se rege por princípios morais não exactamente recomendáveis, ou como o vilão a quem damos o principal ponto de vista — funciona, ao mesmo tempo, como uma encarnação fiel dos defeitos humanos (e por isso mais facilmente identificável com a audiência) e como um avatar para os nossos desejos de rebelião. Frente a um mundo imperfeito, o anti-herói recusa ser facilmente categorizado, e não deixa a moral e a ética meteremse no seu caminho (também se pode ver o sucesso do anti-herói como o triunfo de um individualismo de tendência isolacionista). Para este protagonista, os desejos pessoais estão acima das convenções sociais. Pode ser o tornar-se um traficante de droga para pagar tratamentos de saúde, como Walker White em Ruptura Total (Breaking Bad, 2008- 2013); pode ser o assassino em série que se rege por um código de honra e mata outros assassinos, como Dexter na série do mesmo nome (2006-2013); pode ser, simplesmente, o médico anti-social e viciado em Vicodin que é obcecado por puzzles, como Gregory House em Dr. House (House MD, 2004-2012); ou então o político ambicioso que não hesita em fazer todos os possíveis — até matar — para chegar à Casa Branca, como Frank Underwood em House of Cards (2013-presente). De todas as formas, feitios e tamanhos, o anti-herói é tão popular que, se olharmos para os últimos 20 anos de Emmys, veremos os mesmos tipos de personagens ganhar prémios atrás de prémios. Personagens que saem dos moldes tradicionais do herói estão longe de ser um fenómeno recente. Travis Bickle (Taxi Driver, Martin Scorsese, 1976) ou, num extremo controverso, Patrick Bateman (Psicopata Americano/American Psycho, Mary Harron, 2000) mostram que o fascínio — e existência — do anti-herói na sétima arte já vem de longe. 13